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Para Sotelo, a urgência “para além da singularidade de cada caso, sempre confronta o
sujeito com o excesso” (2014, p.26, tradução nossa). Mas é possível perguntar em que
consiste tal excesso? Há, na urgência, um excesso de angústia, um transbordamento, que
extrapola as capacidades do sujeito de dar sentido, ao menos inicialmente, à experiência que
está sendo vivenciada, deixando-o sem palavras, o que pode se tornar um processo
traumático.
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No pronto-socorro e também em outros setores hospitalares, a solicitação ao
psicanalista comporta, em geral, uma urgência subjetiva já instalada, ou seja, ele não é
chamado geralmente quando tudo, ao menos aparentemente, corre bem e de acordo com o
previsto. É justamente a irrupção de algo que de algum modo sai do controle que acende uma
espécie de alerta, convocando o psicanalista para lidar com tal questão. Todavia, como
ressalva Sotelo (2014), é preciso localizar quem é o sujeito dessa urgência, a qual nem sempre
se encontra com o paciente. É possível recorrer a uma cena, trazida por uma psicóloga
entrevistada, para ilustrar tal situação:
A assistente social me chamou, ela estava super angustiada, quase começou a chorar.
Teve o maior B.O.8 lá no pronto-socorro, disse que o pai quase bateu nela e parece
que quase bateu mesmo. E ela ( e era um traumatismo crânio-encefálico) (...) e ela:
“eu já acionei o conselho tutelar e eu falei para ele que ele era mal-educado e não sei
que”. Aí eu pensei: “essa mulher está angustiada, parece que a angústia é mais dela.”
Mas aí eu também pensei: “Mas tem essa criança que caiu e esse pai que passou toda
essa situação com ela, vamos lá ver como ele está.” E a equipe também me chamou
e eu fiquei com medo né. Falei: “se esse moço está assim com a equipe, se eu chegar
lá e falar que eu sou a psicóloga, ele vai querer sei lá né”. E ele foi super receptivo,
ele estava super ansioso e falou o que aconteceu em casa. (informação verbal)
Nota-se que, nesse exemplo, a urgência subjetiva maior que mobiliza o chamado da
psicóloga estava centrada na profissional de serviço social e não no paciente (a criança) ou em
seu familiar (o pai). O que fazer com isso? Independentemente de quem tem a urgência, ainda
que seja essencial localizá-la, é necessário um certo encorajamento por parte de um outro para
que o sujeito fale e produza uma narrativa que lhe permita situar onde essa urgência aparece,
tecendo um discurso sobre a mesma que a torne própria (Sotelo, 2014). Ainda para a autora
(2014), o manejo do psicanalista visa à subjetivação da urgência, ou seja, tornar a urgência de
fato subjetiva a partir da apropriação dela pelo sujeito. Podemos então depreender que a
urgência psíquica não é já subjetivada de antemão e sim torna-se subjetiva.
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B.O. é uma sigla utilizada para designar o termo boletim de ocorrência, documento oficial que visa a
notificação e o registro de um crime à autoridade policial ou judiciária. No trecho descrito acima, a entrevistada
utiliza o termo de modo informal para afirmar que algo equivocado ocorreu, isto é, aconteceu uma confusão ou
problema.
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(SOTELO, 2014, p. 28,tradução nossa). Ao invés de buscar imediatamente eliminar a angústia
sintomática característica da urgência, o psicanalista a sustenta. Diferentemente da urgência
médica, a urgência subjetiva não necessita e, pode-se dizer, nem deve, ser aplacada de
imediato. Tal urgência não está remetida a um tempo cronológico e, sendo subjetiva, está sim
vinculada ao inconsciente que como sabemos, desde Freud (1915/1996), é atemporal. Moura
(2000) assinala que há o tempo do sujeito o qual não é, portanto, o tempo da ciência médica,
esse sim cronológico. É com este primeiro tempo que o psicanalista trabalha.
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