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DE CUPIS, Adriano. Os direitos da personalidade.

Campinas: Romana Juridica, 2004

CAPITULO IV – O DIREITO À HONRA E O DIREITO AO RESGUARDO PESSOAL

(pag. 121/178)

Seção I – O DIREITO À HONRA

1. Conceito de honra e tutela penal

O direito à honra é um direito primário entre os direitos da personalidade relativos a moral


da pessoa. (pag. 121)

“A ‘honra’ significa tanto o valor moral íntimo do homem, como a estima dos outros, ou a
consideração social, o bom nome ou a boa fama, como enfim, o sentimento, ou consciência, da
própria dignidade pessoal. Quando entendida unicamente no primeiro sentido, a honra está
subtraída às ofensas de outrem e é alheia, por conseqüência, à tutela jurídica; entendida no segundo
e no terceiro significados, está, pelo contrário, exposta às referidas ofensas. Aopinião pública é
bastante sujeita à recepção das insinuações e aos ataques de toda a espécie produzidos contra a
honra pessoal; assim também o sentimento da própria dignidade é diminuído, ferido pelos
referidos.” (pag. 121)

“Podemos, pois, dar, no campo jurídico, a seguinte definição de honra: a dignidade pessoal
refletida na consideração dos outros e no sentimento da própria pessoa” (pag. 122) “A tutela
jurídica, não existe senão relativamente à honra da pessoa; a injúria e a difamação, como observou
Carnelutti, Usucapione della proprietá industriale, cit. P. 57, são figuras de ilícito desconhecidas
para as coisa” (nota de rodapé nº 3, pag. 122)

A lei penal intervém nos casos de ofensas à honra, punindo os crimes de injúria e de
difamação, onde “nos dois casos, é ofendido o sentimento que a pessoa tem, da própria dignidade”
(pag. 122).

“a tutela da honra também existe para as pessoas jurídicas. Embora não possam ter o
“sentimento” da própria dignidade, esta pode sempre se refletir na consideração dos outros.” (pag.
123)

“A tutela da honra apresenta-se de modo diferente, segundo se admita ou não a exceptio


veritatis, ou seja, a exceção respeitante à verdade ou a notoriedade do fato atribuído à pessoa
ofendida.” (pag. 123) As hipóteses de admissão são expressas no código.

“Se a verdade do fato se prova, ou se a pessoa a quem o fato é atribuído é por ele condenada,
o autor da imputação não é punível” (pag.124)

“Quando não é admitida a exceptio veritatis (exceção de verdade), pretende-se assegurar o


respeito do indivíduo, garantindo a sua dignidade mesmo se a esta não correspondem efetivamente
virtudes pessoais; compete, então, à pessoa o direito de preservar a própria dignidade, mesmo que
fictícia e, portanto, também contra os ataques da verdade. Poder-se-ia, assim, falar do direito ao
segredo da desonra.” (pag. 124/125)

“Ao contrário, quando admitida a exceptio veritatis, a dignidade pessoal assume relevância
jurídica somente se se apóia sobre o efetivo e concreto valor do indivíduo.” (pag. 125)

2. O direito à honra e as sanções civis

“Coma morte, extinguindo-se a pessoa, deixa ela também de ser titular de direito (como de
obrigações), dos quais a personalidade constitui o pressuposto; por conseqüência, não terá mais
direito à honra.” (pag.126) , em razão da intransmissibilidade dos direitos da personalidade.

Qual o sujeito ofendido pelas ofensas à chamada memória do defunto?

“Impossível é reconhecer em tal memória uma nova pessoa, e menos ainda pode ser atribuída a
personalidade à família, considerada como ente coletivo.” (pag.127)

“Convém ponderar que a ofensa à memória do defunto pode ser, ao mesmo tempo, ofensa aos
parentes próximos que lhe sobreviveram ... Com efeito, a depreciação do bom nome do defunto
pode facilmente traduzir-se em uma depreciação do nome dos seus parentes próximos. Alem disto,
estes podem sentir-se ofendidos, não só no seu bom nome, mas também no sentido de piedade pelo
defunto.” (pag. 127)

Consentimento – “O direito à honra é intransmissível, mas plenamente disponível mediante


“consentimento”, não assumindo o interesse público força incondicionada. A supremacia do
interesse individual manifesta-se ainda na exigência da queixa (acusação, denúncia, querela), para
que seja punível a injúria e a difamação (art. 597 do Codigo Penal).” (pag. 128)

“Dois atos emanados da autoridade pública têm o poder jurídico de diminuir a honra pessoal: a
condenação penal e a declaração penal e a declaração de falência. A esta legítima diminuição da
honra correspondem, em tais casos, determinadas limitações da capacidade do sujeito.” (pag. 128)

Seção II – O Direito ao Resguardo

5. O direito à imagem: significado e extensão

“Resguardo pode ser definido como sendo o modo de ser da pessoa, que consiste na
exclusão do conhecimento pelos outros daquilo que se refere somente a ela” (pag. 139)

“Uma das manifestações importantes do direito ao resguardo é o chamado direito à imagem.


Com a violação do direito à imagem, o corpo, e as suas funções não sofrem alteração; mas verifica-
se relativamente à pessoa uma mudança da discrição de que ela estava possuída, e também uma
modificação de caráter moral ( a circunspeção, reserva ou discrição pessoal, embora não faça parte
da essência física da pessoa, constitue uma qualidade moral dela).” (pag. 140)

“De fato, duas soluções completamente diferentes são possíveis. Ou se atribue ao direito à
imagem uma importância geral, que pode ser limitada somente por exceções específicas impostas
pelo interesse público; ou o direito à imagem é compreendido na esfera do direito à honra, no
sentido de que a tutela jurídica encontra aplicação somente no caso de a difusão da imagem da
pessoa ser prejudicial para a honra dela. Se se seguir esta última solução, não é o resguardo em si e
por si considerado que assume valor de bem jurídico, uma vez que a razão determinante da
intervenção do direito é construída pela ofensa à honra.” (pag. 141)

“Mas, além disso, pode suceder que o direito não se limite a intervir contra os atos de
difusão da imagem ofensivos da honra, e exija também a existência de circunstâncias particulares
para proteger com as suas normas o bem do resguardo. Todo indivíduo desenvolve parcialmente a
sua vida em circunstâncias e em ambiente subtraídos ao exame de terceiros, e esta é a esfera da
vida, considerando ilegítima a reprodução da sua imagem, quando ela reflita as circunstâncias e
ambiente referidos.” (pag. 141)

“O direito à imagem prevalece sobre o direito de autor daquele que fez o retrato. Uma vez
que o sujeito é tutelado contra a publicidade da sua imagem, o direito de autor é despojado do seu
conteúdo.” (pag. 143)

O código Civil italiano proíbe, ‘não que se colha a imagem da pessoa, mas que seja dada
difusão ao retrato expondo-o, reproduzindo-o ou lançando-o no comércio” (pag. 143)

“Por outro lado, pode existir um real e considerável interesse em que o conhecimento da
imagem não se difunda no público, com até não se conserve por parte de certas pessoas por virtude
do retrato. Um tal interesse é reconhecível quando, reproduzindo-se a imagem da pessoa, é refletida
a esfera íntima da sua vida privada” (pag. 143)

“Embora a tutela da imagem encontre a sua mais freqüente aplicação co campo fotográfico,
é indiferente, do ponto de vista jurídico, o modo de confecção do retrato da pessoa: ao lado da
fotografia, a pintura, a escultura, e outras ...” (pag. 144)

“... não existiria outro direito à imagem fora da esfera dos direitos da personalidade” (pag.
145), isto é, não existe direito à imagem de uma casa. Porém em caráter relativo. “É que o autor de
um quadro pode opor-se, em virtude do direito de autor, à reprodução abusiva da sua obra. Tem-se
também sustentado que, mesmo aquele que tem o direito de propriedade material sobre uma obra
artística, pode opor-se às reproduções abusivas da mesma obra”. (pag. 145)

6. Limitações derivadas do consenso e da lei

“Pode dispor-se do direito à própria imagem.” ... “A eficácia deste consentimento deve estar,
no entanto, contida nos precisos limites em que ele for dado. Primeiramente, o consentimento é
eficaz apenas em relação à pessoa ou pessoas a quem foi dado; quando a todas as outra o jus
imaginis (direito à imagem) continua inalterável, subsistindo o poder de consentir ou recusar a
exposição.” (pag. 146)

O consentimento tácito deve ser admitido com cautela (pag. 146)

O Código Civil italiano elenca os casos nos quais a exposição ou publicação é permitida
pela lei: notoriedade da pessoa, cargo público exercido, necessidades de justiça ou de polícia, fins
científicos, didáticos ou culturais, repercussão relacionada com fatos, acontecimentos, cerimoniais
de interesse público ou ocorridos em públicos. (pag. 147)

“De qualquer modo, mesmo as pessoas revestidas de notoriedade conservam o direito à


imagem, relativamente à esfera íntima da sua vida privada, em face da qual as exigências da
curiosidade pública têm que se deter. A limitação estabelecida pela lei deve entender-se, por sua
vez, com esta restrição.” (pag. 148)

“O cargo público exercido é incluído pela lei entre os casos de limitação legal do direito à
imagem. O interesse da sociedade estende-se sobre todos os que desempenham uma função pública
de notável importância e que são rodeados, a tal título, de notoriedade. Sob este último aspecto, a
hipótese não tem caráter autônomo relativamente à precedente.” (pag. 149)

7. Atos de difusão da imagem lesivos da honra

“A pessoa é defendida contra o exame e a indiscrição alheias, mesmo se, por tais vias, a sua
dignidade não for comprometida. Portanto, a tutela do resguardo distingue-se da tutela da honra.”
(pag. 149)

9. Extensão do direito à imagem; direito respeitante a determinados parentes.

“Com a morte da pessoa o direito à imagem atinge o seu fim. Determinadas pessoas que se
encontram em relação de parentesco com o extinto, têm direito de consentir ou não na reprodução,
exposição ou venda do seu retrato e, não consentido, podem intentar as ações pertinentes.” (pag.
153)

“Isso, naturalmente, não significa que o direito à imagem se lhe transmita, mas
simplesmente que aqueles parentes são colocados em condições de defender o sentimento de
piedade que tenham pelo defunto. Trata-se, em suma, de um direito novo conferido a certos
parentes depois da morte da pessoa.” (pag. 154)

“Quando o retrato reproduzido, exposto ou posto à venda, é lesivo da honra, tal lesão pode
também repercutir-se sobre a honra dos referidos parentes, como, por exemplo, no caso do retrato
de uma senhora falecida ser publicado de maneira e em circunstâncias tais,q eu suscitem a
convicção da sua imoralidade, o marido poderá sentir-se ofendido, não só no sentimento de piedade
para com a mulher falecida, mas mesmo na sua própria honra.” (pag.154)
10. Outras manifestações do direito ao resguardo

Proteção a reprodução da voz, de gestos da pessoa.

Acontecimentos e desenvolvimento da sua vida.

Limitações: pessoas de certa notoriedade (interesse público) – pag. 157

“... tal direito não está circunscrito à esfera daquilo que deve permanecer completamente
inacessível ao conhecimento dos outros, isto é, secreto; mas compreende sim o que, embora
acessível ao conhecimento alheio, não deve ser indiscretamente difundido. Pense-se, por exemplo,
em certos dados do registro civil, como seja a idade de uma senhora ou de uma menina que, apesar
de resultarem oficialmente do registro civil, não devem ser indiscretamente divulgados.”(pag.
157/158).

Seção III – O direito ao segredo

11. O direito ao segredo. O segredo da correspondência

“O direito do segredo constitui um aspecto particular do direito ao resguardo.” ... sendo


especialmente considerado no aspecto da correspondência . (pag. 158)

Correspondência epistolar:

“a propriedade da carta, materialmente considerada, refere-se ao destinatário.”... “Quando


eventualmente, a carta contenha um trabalho de valor científico ou literário, o seu autor, remetente
da carta, será titular do direito de autor sobre o mesmo trabalho.” (pag. 159)

“Completamente distinto do direito de propriedade material sobre a carta e do direito de


autor sobre o seu conteúdo intelectual, é o direito ao segredo epistolar, o qual, como manifestação
particular do direito ao segredo, faz parte dos direitos da personalidade. Tem ele por objeto não um
bem exterior à pessoa – como acontece com o direito de propriedade material sobre a carta e com o
direito de autor sobre o seu conteúdo intelectual – mas, sim, aquele estado de reserva que
acompanha os sentimentos e as opiniões pessoais manifestados na carta, pois a pessoa vive
moralmente através das opiniões e sentimentos próprios, e o resguardo sobre estes constitui um bem
estritamente pessoal.” (pag. 159)

“Em conclusão: relativamente à correspondência, pode falar-se de um verdadeiro direito ao


segredo, porque os sujeitos (remetente e destinatário) são tutelados mesmo contra o conhecimento
de um só indivíduo que tenha caráter abusivo; quando, ao contrário, o conhecimento é legítimo, é
vedado dele aproveitar-se para publicar a correspondência sem o consentimento previsto pela lei.
No primeiro caso, a tutela atua através de sanções penais e civis; no segundo tem apenas caráter
civil, mas diz respeito sempre ao mesmo interesse dos mesmos sujeitos.” (pag. 164)
12. Segredo documental e segredo profissional

“É necessário que o conteúdo do ato ou documento tenha sido destinado a permanecer


secreto. Pode ele apresentar tal caráter que exija, por natureza, o segredo e pode dar-se o caso de o
sujeito que dispõe do ato ou documento lhe atribuir um valor particular tal o que exija, da mesma
forma, o segredo.” (pag. 170)

13. As informações sobre terceiros

“... é legítima a atividade tendente a procurar informações sobre uma pessoa para fornecê-la
a outra, a menos que tais informações digam respeito à esfera realmente íntima da vida privada, a
fatos destinados a permanecer ciosamente ocultos.” (pag. 172)

14. O segredo doméstico

“Mas, além disso, na tutela da habitação está também compreendida a tutela do segredo
doméstico, pois compreende a defesa da indiscrição dos outros, as atitudes mais íntimas da pessoa,
assumidas no lugar destinado a subtraí-las ao exame de terceiros.” (pag. 174)

“Segredo doméstico é, precisamente, não o segredo daquela resi que seria a casa, mas sim
uma forma de segredo pessoal, isto é, das atitudes íntimas da pessoa assumidas na sua habitação.”
(pag. 174)

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