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Sebenta TGDC (M. Cordeiro) - Pessoas (Singulares e


Coletivas); Coisas; Representação, Legitimidade e Exercício
de Direitos
Teoria Geral do Direito Civil (Universidade de Lisboa)

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Sebenta de Teoria Geral do Direito Civil II -


Pessoas, Coisas e Representação

Tomo IV - As Pessoas
I. A pessoa no Direito Civil
Todo o Direito existe por causa dos Homens. Todo o Direito é pessoa, apesar de
o Direito admitir que possa ser consideradas pessoas outras realidades não
correspondentes a seres humanos: associações, fundações, sociedades e o próprio
estado (exemplos jurídicos do conceito de “Pessoas coletivas”).
Personalidade singular - dimensão jurídica do ser humano, enquanto realidade
racional, dotada de liberdade.

Passagem histórica da dignidade humana, de um conceito divino, assente em


textos religiosos, para o próprio homem, com a emergência do racionalismo
(maioritariamente por Kant). Para Kant, a categoria de pessoa assume uma mera forma
(de pensamento) e para Hegel assume-se como fonte própria de juridicidade.
Para o Direito, ser pessoa é muito mais que ser um ser final. Ser pessoa é ser
um centro de imputação de relações jurídicas.
Um banco é uma pessoa, mas não o é a nível material e funcional. Mas utilizam-
se as mesmas palavras. A pessoa trabalha num nível altíssimo de abstração. A pessoa,
sendo um dado axiológico que se impõe ao sistema, a mesma tem de ser tutelada.
Bem – realidade exterior ao direito que há de ser útil para atender a fins
humanos e ao interesse das pessoas;
Quando perguntamos se há um direito de personalidade, perguntamos se uma
delas pode invocar a tutela da sua pessoa em alguma das suas dimensões para alcançar
um certo resultado.
Não há um direito de personalidade à própria pessoa. Temos de perguntar qual
é o bem pessoal e o aspeto pessoal de determinada situação.

II. Direitos de Personalidade


Os direitos de personalidade exprimem posições jurídicas protegidas pelo
Direito objetivo (reportam-se à própria pessoa tutelada):Há que sublinhar o
condicionamento histórico e cultural da configuração dos direitos de personalidade.

Inicialmente, a tutelada da pessoa estava associada ao Direito romano à actio


iniuriarum. Depois, Donellus teve uma grande importância. Mas foram nas obras do

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jusracionalismo que a referência aos direitos sobre a própria pessoa reapareceu. A


manifestação mais emblemática ficou associada à Revolução Francesa.
É com Savigny que se inicia o questionamento da possibilidade de construir um
direito dirigido ao próprio titular. Jhering defendeu dogmativamente a figura que
Savigny disse que obscurecia a pessoa humana (os direitos de personalidade). Os
direitos de personalidade forem desenvolvidos na pandetística com o objetivo de dar
corpo aos vetores humanistas.

Os bens de personalidade:
Apresentámos o “bem” como uma realidade capaz de satisfazer necessidades
(sentido objetivo) ou apetências (sentido subjetivo) da pessoa. Assim, a própria
pessoa representa um bem para si.
Bens de personalidade:
- ao ser humano biológico: vida, integridade física e saúde
- ao ser humano moral: integridade moral, nome, identidade

- ao ser humano social: família, bom nome, reputação e respeito


Os bens de personalidade correspondem a aspetos específicos (o bem será
sempre algo delimitado, para poder suportar um direito subjetivo) de uma pessoa (estão
em causa bens de personalidade de uma pessoa, assim o bem “vida” não abrange o bem
“alimentos”, efetivamente presentes (uma vantagem futura, mesmo quando tutelada
pelo direito, não constitui algo de uma pessoa), e suscetíveis de serem disfrutados pelo
próprio (este opera como algo “egoísta”).
O direito de personalidade são um espaço de liberdade concedido ao sujeito: ou
não seria direito. Os direitos de personalidade têm como traço especial de regime o
não permitirem a sua própria supressão. O direito de personalidade, ao implicar uma
norma permissiva, é um tipo de direito subjetivo. A permissão facultada pelo direito
de personalidade é específica, não é genérica. Assim, excluímos a liberdade de
expressão por ser genérico, e incluímos a liberdade à confidencialidade como sendo um
direito de personalidade por ser específica.
O Artigo 70 reconhece uma proteção geral à personalidade; o direito à vida e à
honra são figuras subsequentes ao artigo. Este pode, contudo, dar azo a diversos direitos
subjetivos de personalidade: não há, neste sentido, tipicidade (MC). Qualquer ofensa à
integridade física ou moral da pessoa deve legitimar uma intervenção do direito; é o
objeto da intervenção jurídica. Neste Artigo há apologistas de que o direito de
personalidade deste artigo não pode ser entendido como um todo (Escola de Coimbra);
MC e OA dizem que há direitos típicos que a lei protege e de que é perigoso partir de
um direito geral de personalidade. Parte-se deste Artigo para a concretização individual
de direitos de personalidade atípicos, e de um particular para o geral, em vez de geral
para o particular, como em Coimbra

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Caraterísticas dos direitos de personalidade:


Têm de ser sempre respetivos a um presente, a uma ação/reação que efetiva está
a acontecerю

I. A absolutidade
Os direitos de personalidade são apresentados como direitos absolutos, por
dois aspetos - é, primeiro, por ser um direito oponível a todos (aspeto externo) e, numa
aceção interna, no sentido que a pessoa pode exercer o seu direito de personalidade
livremente, dispondo totalmente dele: o direito de personalidade típico carateriza-se
pela permissão de aproveitamento de um bem de personalidade, não havendo aqui
nenhuma relação. São, também, absolutos por terem de ser respeitados por todos,
caindo aqui na responsabilidade aquiliana do 483º1.

II. Natureza não-patrimonial


Não têm alcance económico, apesar de, ao ser dito assim, não ser correto. No
Art.79º1, o mesmo admite que o direito à imagem possa ser “lançado no mercado”;
patrimonialidade do direito de personalidade indireta
Direitos de personalidade não-patrimoniais em sentido forte: o Direito não
admite que os bens sejam permutados por dinheiro: direito à honra, à vida, à identidade.
Direitos de personalidade não-patrimoniais em sentido fraco: eles não podem
ser abdicados por dinheiro, embora em certos casos possam surgir como objeto de
negócios patrimoniais
Direitos de personalidade patrimoniais: são avaliáveis em dinheiro e podem ser
negociados no mercado: nome, imagem, fruto da atividade intelectual.
Contudo, têm de ser respeitados os limites à autonomia privada (A.280/281)

III. Inerência à pessoa (dupla inerência)


O direito de personalidade respeita a uma pessoa; é-o no sentido de a atingir
onde quer que ela esteja.
1. O direito de personalidade é constituído pela intransmissibilidade da sua
posição ativa - ele nasce na esfera de um titular e aí fica até à sua extinção
2. Está indissociavelmente ligado ao seu objeto - ele reporta-se a um bem de
personalidade, atingindo-o onde quer que ele se encontre.
= dupla e indissociável ligação do direito de personalidade ao seu titular e ao seu
objeto = dupla inerência

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Este pode, contudo, ser limitado, caso da colisão de direitos; pode ainda ser
auto limitada (A.81). Esta inerência é ainda quanto ao objeto, i.e, estando o bem onde
estiver, os outros têm sempre de respeitá-lo – ideia de que o direito persegue o bem
IV. O problema da prevalência - não a podemos apresentar como caraterística
dos direitos de personalidade, segundo MC
No conflito entre prevalência de direitos de personalidade sobre quaisquer
outros, prevalecerá o primeiro. No entanto, nenhuma regra o obriga. A jurisprudência
apela para o A.335.
Direitos de personalidade que nunca podem ser postos em causa: direito à
vida: os negócios assim celebrados são nulos.
Direitos necessários e eventuais
Direitos de personalidade necessários: estão presentes desde que exista uma
pessoa singular; caso do direito à vida e à integridade física. Quanto ao ónus da prova,
a sua mera invocação é bastante.
Direitos de personalidade eventuais: dependem da existência dos respetivos
bens de personalidade (caso do direito à confidencialidade de certas cartas missivas
derivar de estas terem sido escritas e por aí adiante). Quanto ao ónus, há que alegar e
provar a existência do bem protegido
Classificações dos bens de personalidade:
Círculo biológico, que abrangem a vida e a integridade física da pessoa - direito
à vida, integridade física, saúde e sono etc ( “””)
Círculo moral - integridade moral, bom nome e reputação da pessoa
(normalmente não têm conteúdo patrimonial)
Círculo social, que se prende com as relações entre sujeito e os demais - direito
à intimidade privada, ao nome e à imagem.

Direitos não limitáveis: o sujeito nunca os poderá restringir - direito à vida


Direitos limitáveis: admitem restrições - direito à imagem.
Direitos de personalidade nominados - são referidos na lei. Normalmente são
típicos: caso do direito ao nome, à confidencialidade de certas cartas missivas, à imagem
e à reserva e intimidade da vida privada
Direitos de personalidade inominados - não são referidos na lei. O direito à vida
e integridade física são típicos mas inominados; a lei aponta um regime mas não refere
o direito pelo seu nome A.70º1.
Direitos de personalidade típicos - dispõe de um regime tipificado na lei
Direitos de personalidade atípicos - não dispõe de um regime inscrito na lei

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Negociabilidade limitada, imprescritibilidade, respeito pela ordem


pública e demais requisitos
A.81º1 admite, em termos genéricos, a limitação voluntária dos direitos de
personalidade, desde que não se mostre atingida a ordem pública
O nº2 prescreve que a mesma é sempre revogável. MC chama uma forma de
“denúncia”, pois não há bilateralidade da revogação. A indemnização incide por factos
lícitos, não sendo uma indemnização pelo dever mas pela frustração de expetativas.
A.79º1 admite a hipótese de o retrato de uma pessoa ser “lançado no mercado”;
o nº3 repete-o.
Os direitos de personalidade implicam disponibilidade, na medida em que são
como os demais direitos subjetivos e por isso são posições de liberdade.
A81 fixa uma regra de livre revogabilidade, ainda que com obrigação de
indemnizar pelos prejuízos causados às legítimas expetativas da outra parte; em rigor
trata-se de denúncia e não de revogação (MC) O º1 consignou uma regra de não-
contrariedade aos princípios da ordem pública, devendo os negócios que envolvam
direitos de personalidade respeitar os vetores injuntivos do ordenamento a que se
chama “ordem pública”, havendo também que respeitar o A.280.
A lei não lhes coloca quaisquer limites temporais ou regimes de caducidade
(A.298 - os direitos de personalidade são imprescritíveis; um exercício tardio nunca
poderia obstar à sua eficácia.

A ressarcibilidade e a adoção de medidas adequadas de defesa


A violação dos direitos de personalidade dá azo à responsabilidade civil e à
adoção das “a pessoa ameaçada (exprime a ofensa eminente ou em curso a um direito
de personalidade, independentemente da intenção do agente) ou ofendida (exprime a
violação consumada, independentemente dos juízos em que incorra o agente) -
tratando-se de uma providência de proteção que deve funcionar mesmo em situações
independentes da culpa do agente - pode requerer as providências adequadas às
circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os
efeitos da ofensa já cometida” - A.70/2 2a parte
Os direitos de personalidade tratam-se de realidades dinâmicas e que
acompanham o ser humano do nascimento até à morte. Estes direitos de
personalidade rodeiam-se de deveres acessórios destinados a assegurá-los. Ex: deveres
de informação que precedem o ato médico. Claro, os direitos de personalidade e os
deveres acessórios instrumentais que acompanham-se. Os direitos de personalidade
reportam-se a bens; o que daqui resulta, muitas vezes, conflitos de direitos.

O direito à vida e à integridade física


O direito à vida; a inviolabilidade

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(Aula Teórica)
Direitos especiais de personalidade (dimensão mais significativa) identifica
vários bens jurídicos de personalidade que corresponde a um direito subjetivo
autónomo (escola de Lisboa). O Direito Civil reconhece e protege um conjunto de bens
jurídicos que são estruturantes para os vices. A estes bens pode ser reconhecido tutela
penal, que assenta num critério essencialmente político, o que difere dos bens que são
tutelados pelo direito civil. No entanto, muito dos bens civis fundamentais são
simultaneamente bens penais. No entanto, quando falamos do direito à vida falamos de
um direito jusprivado, e não de uma tutela penal: o que nos importa é o ilícito civil.

Exemplo: ninguém vai preso por violar um contrato, mas no âmbito civil este pode
ser responsabilizado por incumprimento contratual.
Bens de personalidade que identificamos a partir da tutela geral de
personalidade: lidamos com um conceito agnóstico de pessoa, mas não com um
conceito de agnóstico de personalidade. O bem jurídico que o direito tutela é a
realidade ôntica.

Nenhum jurista pode responder ao A.70 sem responder “o que é um homem”.


Assim, a distinção entre direitos de personalidade e a personalidade não é só técnico-
jurídica mas antropológica.
Personalidade física – está em causa, aqui, o suporte biológico da própria
personalidade, um suporto biológico da existência: o direito à vida e à integridade
física, entendida como o bem jurídico mais estruturante e fundamental
O direito à vida é também um direito indisponível pelo próprio titular.

Quando o suicídio, que é considerado um ilícito civil, atinge a esfera de


terceiros, por algum motivo, estamos perante um dano causado por um facto ilícito,
mas não há aqui o requisito da culpa, da censurabilidade jurídica, para o imputar à
esfera jurídica do terceiro: não é assim possível a alocação do dano. Contudo, isto tem
de ser casuisticamente, pois esta deliberação tem de ser pesada no tal “sistema
móvel”
Problema clássico: o dano-morte: a supressão do bem jurídico vida. Este,
segundo o A.496, é indemnizável como? Segundo Antunes Varela e OA indemniza-se o
sofrimento causado pela morte aos sujeitos aqui identificados no Artigo: a própria
frustração da vida não é indemnizável por razão lógica, porque se no momento da
morte cessa a personalidade jurídica, então não há esfera jurídica onde se atribua a
indemnização. Contudo, MC diz-nos que para além do ressarcimento dos danos
próprios dos sujeitos previstos no 496 nº2, e para além da indemnização
compensatória moral, pela sucessão e pela mortis causa, é indemnizado o bem jurídico
vida. Aqui é mais tutelado a justiça, pois o direito tem de conferir valor ao bem jurídico
máximo: deixamos de todo o campo técnico para passarmos ao campo ético. Contudo,
esta possibilidade tem de ser conferida antes da morte do sujeito: tem de se localizar
no momento antes da supressão da vida.

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O Direito ao nome só é patrimonial se for outorgado num documento, de forma


a haver a projeção de uma determinada identidade que pode trazer benefício ao
próprio.
A patrimonialidade e não patrimonialidade não pode ser apriorística.
Dano: frustração de uma vantagem associada a uma posição jurídica ativa.

O A.70º1 garante a proteção concedida por lei, aos indivíduos “contra qualquer
ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física” - garante o direito à
vida.
Outro atentado ao sofrimento que não o da preservação das funções vitais do
organismo biológico humano, atingirá outros direitos de personalidade que não o direito
à vida. O direito à vida não admite compreensão: em caso de colisão de direitos, o
mesmo nunca pode ceder. Apenas de põe em causa quando estiverem em causa direitos
à vida de diversas pessoas.
O direito à vida é indisponível. Significa isso que o seu titular não pode aliená-lo
nem proceder à sua supressão, através da morte ou suicídio. Qualquer ato que vise a
morte ou se relacione com o suicídio é nulo. Se for perpetrado por um terceiro,
equivale a uma violação do direito à vida. O auxílio ao suicídio é assim civilmente
ilícito.

Em caso de suicídio, a pessoa atuou ilicitamente, já que dispôs de um direito


indisponível. No entanto, o Direito Civil nada poderá fazer, pois não tem sentido
sancionar um falecido - apesar de em certas épocas históricas o mesmo ser sancionado
quanto ao confisco dos bens. No caso de tentativa de suicídio, todos os danos colaterais
caberão ao suicida tentado.
Como não se pode pôr o seu próprio direito na dependência de fatos futuros e
incertos, a roleta russa é proibida, bem como os jogos de risco, p.e.

Ilicitude da eutanásia
Argumento ético - incentivar ao cumprimento da inteligência. i-e, de nos
mantermos vivos.
Argumento social - com a morte de alguém, a sociedade perde um apoio e parte
dos seus objetivos, pois todo o Direito existe pelo homem e para o homem.

Argumento cultural - presença do pensamento cristão


Argumento técnico-jurídico - exigência da harmonia interna do Direito
A eutanásia não é admissível pelo Direito Civil. A eutanásia é um ilícito civil.

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A tutela pré-natal e post mortem


Há dificuldades.

1. A dependência fisiológica em que o ser humano pré-parto se encontra, pois


segundo o A66º1. a personalidade surge apenas com o nascimento completo e com vida.

Também a memória das pessoas falecidas deve ser tutelada - A.71.

O direito à integridade física


Proteção da integridade física do ser biológico nas diversas funções em que a sua
sobrevivência não seja diretamente atingida.

Assédio e bullying
Em termos civis o problema não é de discriminação mas antes de atentado à
integridade física e moral das pessoas e do direito à honra.

Atribuição das indemnizações e o dano-morte


A morte de uma pessoa causa danos morais e patrimoniais: quer na própria
vítima, quer no círculo dos seus familiares – o A,495 e 496 trata destes assuntos: no
entanto, presos a um ideário restritivo, em sede de danos morais e indemnizações; não
abrangem a matéria de forma cabal.
Inicialmente: a morte de uma pessoa provoca danos patrimoniais, bastando
pensar em todas as despesas havidas para tentar salvar a vítima (medicamentos,
internamento, etc). Tudo isso deve ser indemnizado, numa lógica que se estende à
hipótese de atentado à integridade física – A.495º1 e 2 – danos patrimoniais
emergentes. Contudo, antes destes temos os lucros cessantes.
A morte de uma pessoa provoca também danos morais. O A.496 versa sobre
essa matéria: o nº1 refere-o de modo deslocado, assumindo a designação de um
princípio geral da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais. O nº2 trata-se de uma
indemnização por iure próprio, i.e: recebidas pelos beneficiários por direito próprio,
partindo da perspetiva que estas são as pessoas que efetivamente sofreram com a
morte da vítima. Este artigo dá corpo às regras do ordenamento.

Caso:
Um jovem, abandonado pelos pais, vem a ser acolhido e criado pelos avós. Por
ato ilícito, injustificado e culposo de terceiros, vem a falecer. A quem caberá a
indemnização prevista no A.496? Seguramente, aos avós.

Como aponta MC, também o direito máximo deve ser indemnizado: o direito
à vida: pela sua supressão. Esta opinião, apesar de contrariada por Antunes Varela e
Oliveira Ascensão veio a ser adotada pela jurisprudência.

A “querela” em torno do dano-morte

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Não vale afirmar, como aponta MC, que a morte é computada no sofrimento
dos terceiros, porque isso seria um dano próprio destes. MC aponta 4 razões para
sustentar a impossibilidade da indemnização:
(POUCO IMPORTANTE)
1. Com a morte cessa a personalidade jurídica: logo não se pode constituir um
direito em algo que não existe;
Contra argumento: Se a morte não é ressarcivel, então a vida não é um
direito subjetivo; o que implicaria um retrocesso na Humanidade
2. Os trabalhos preparatórios do CC mostra essa impossibilidade
Contra argumento: estes trabalhos mostram apenas a intenção subjetiva de
quem os fez
3. O A.496 esgota o universo dos danos indemnizáveis e dos seus beneficiários

Contra Argumento: este Artigo não esgota o universo aplicável: importância


dos A.70/483/2024
4. Ao Direito Europeu este dano-morte não seria favorável.

---

Confluência doutrinária com MC: Galvão Telles, Almeida Costa, Leite de


Campos e Menezes Leitão – para além das indemnizações arbitrárias por via
do A.496, haja ainda por danos morais e pela supressão do direito à vida, do
próprio lesado e que depois siga por via hereditária.
Argumentos de MC:
1. Não faz sentido descobrir “direitos” e depois negar-lhes o regime: se existe
um “direito à vida” então há que dotá-lo da competente tutela aquiliana
2. A atual responsabilidade civil tem funções retributivas e preventivas, o
que faz com que tais funções se percam quando se admitam direitos que
desaparecem logo que violados
3. A aplicação isolada do A.496º2, desarticulado do ordenamento, conduz a
resultados inaceitáveis.
Ex: O agente responsável deve indemnizar o lesado ferido: mas se o
conseguir matar nada paga.
4. A indemnização parca do nosso tribunal e a necessidade de esta ser
impulsionada (50.000€)

O Direito à integridade moral. Ao bom nome e à reputação

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O Direito à honra
A honra constitui a consideração pela integridade moral de cada ser humano.
A honra social /externa exprime o conjunto de apreciações valorativas de que cada um
disfruta na sociedade, em contraposição com a regra interior, que corresponde à
autoestima ou imagem que cada um faz das suas próprias qualidades. Constitui, assim,
uma base para juízos éticos dos seus semelhantes, sendo que esses juízes se repercutem
na autoestima de cada um. No seu conjunto, isto dá corpo à formalidade do A.70º1 que
versa sobre a integridade moral.
A honra social comunica-se automaticamente às representações verbais de cada
pessoa, i.e, ao seu nome. A consideração de que cada um disfrute, na sociedade,
exprime o seu bom nome: este, na razão direta das valorações positivas que concite, dá
azo à reputação do sujeito.

Mc fala em autotestiama.
a. Reputação pessoal – envolve juízos valorativos positivos quanto à
integridade, seriedade e moralidade do sujeito
b. Reputação familiar
Entre outras…
A honra é hoje defendida e promovida não como bem absoluto em si, mas como
fonte de outras vantagens, de ordem social e patrimonial.
Para além deste preceito se integrar no A.70, está presente também no A.484 –
aqui, a ofensa do crédito ou do bom nome exige, em regra, medidas de correção e de
reposição da verdade, que não se esgotam na responsabilidade civil (a Const refere-o
no A.26…)

Atentados à honra: exceptio veritatis (exceção da verdade)?


Os atentados à integridade moral das pessoas – portanto, à honra – podem
concretizar-se de modos diversos. Normalmente, eles ocorrerão pela palavra, podendo
também concretizar-se de modo indireto, numa pública exigência do pagamento de
dívidas.
Uma das grandes questões que se coloca é a admissibilidade da exceptio
veritatis: tem-se por justificado o atentado à honra quando o agente logre provar a
verdade do que afirmou ou, até e porventura, provar que pôs, na averiguação do facto,
todo o cuidado exigível? Há alguma doutrina, como Fernando Pessoa, que fala da
natureza não-verídica dos fatos imputados como requisito da responsabilidade Civil do
484 – o valor da verdade sobrepõe-se. No entanto, a lei não exige como pressuposto
do funcionamento do A.484 a falsidade de quaisquer afirmações, limitando-se a
remeter, implicitamente para os direitos de personalidade.

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Tudo o que amputar a verdade, transmiti-la a sugerir algo diverso do que dela
resulte, redigi-la de modo a provocar valorações tendenciosas, levantar dúvidas ou
reticências, não pode reivindicar a veritas. Assim, será ilícito desde que atinja a honra
de alguém. Contudo, a firmação totalmente verdadeira pode atentar contra a honra
das pessoas. A afirmação falsa, tendenciosa ou incompleta é indicada para atingir a
honra. Todavia, a afirmação verdadeira também poderá sê-lo: a exceptio veritais, por
si só, não é justificativa.

O conflito com a liberdade de informação; outras liberdades


A tutela da honra – tal como a proteção da intimidade da vida privada – pode
entrar em colisão com a liberdade de informação, também legalmente garantida. À
partida, temos de entender que o direito à honra é um direito de personalidade. Marca
um círculo em que o interesse da pessoa beneficiária prevalece sobre quaisquer
pretensos valores superiores
Na determinação das fronteiras entre o direito à honra e a liberdade de
expressão, temos de trabalhar com dois critérios:

1. O da absoluta veracidade
2. O do interesse político-social
Nenhuma liberdade de comunicação justifica notícias inverídicas; pelo contrário:
a liberdade de informar e de comunicar exige uma verdade pura, sem equívocos e
sem sombras.
Para além disso, a mesma tem de corresponder a um interesse político-social.

Situações de dúvida; o sentimento de honra geral


O Direito protege a honra das pessoas, e com efetividade: como tal, caso um dos
sentidos da intervenção contunda com a honra, a atuação é ilícita, no seu conjunto. O
direito à honra é um direito subjetivo, encabeçado por um titular e isto faz com que o
mesmo não seja indeterminado: não existem direitos à honra indeterminados.
Há que atender que a tutela indemnizatória, prevista no A.484, é insuficiente.
Em regra, mais importante do que a compensação monetária é a reposição da verdade
ou a reparação da ofensa feita.

Direito ao nome
Cada ser humano é uma individualidade autónoma. Cada pessoa dispõe de uma
figuração vocabular, primeiro oral e depois escrita, que permite identifica-lo com
facilidade e segurança: o seu nome. O nome, é assim, uma representação linguística de
um ser humano. Ele é vocativo, porquanto permite designar a pessoa que o use, e
distintiva, por facultar destrinça-lo dos demais.
O direito ao nome é considerado um direito de personalidade: um direito
subjetivo absoluto e privado, com a proteção civil daí decorrente.

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O A.72º1 refere o “direito” a usar o nome, completo ou abreviado. Fica implícito


o poder de abreviar o nome, podendo fazê-lo como entender. Tem ainda o titular do
nome o direito a impedir que outrem o use. A lei refere “ilicitamente”; contudo, o uso
de nome alheio será, todavia, sempre ilícito, salvo situações marginais: de facto, nem
a autorização dada pelo próprio habilita outrem a usar nome alheio.
O A.72º2 regula, essencialmente, os conflitos de interesses, através da atuação
do tribunal.
As ações de defesa do nome podem ser exercidas pelo próprio titular ou, depois
da sua morte, pelo cônjuge sobrevivo ou por qualquer descendente, ascendente, irmão,
etc. – 71º2 remissão 73.
Pode considerar-se, ainda, outros sinais distintivos das pessoas, como aponta
Paulo Cunha, sinais figurativos, como insígnias, sinais verbais, como lemas, ou títulos
honoríficos, sendo aqui é necessário recorrer ao A.74: terão a proteção própria do
direito ao nome, quando gozem de notoriedade.

A natureza do direito ao nome


Inicialmente, e acolhida por Cunha Gonçalves e Pedro Chaves, o direito ao
nome começou por ser tomado como um verdadeiro direito de propriedade: esta foi
rejeitada pelo argumento pandetístico que só admite direitos reais sobre coisas
corpóreas.

Atualmente, o direito ao nome é apresentado como um direito de personalidade.


Cunha Gonçalves critica esta “nova teoria” pandetística, por duas razões:
1. O nome não distingue só a pessoa, mas também a respetiva família, o que
faz com que não seja um direito puramente pessoal; refutação: não é
possível construir um direito familiar

2. O nome sobrevive à pessoa, não se extinguindo com ela, como sucede com
os direitos de personalidade: refutação: há direitos de personalidade com
uma pós eficácia

As cartas-missivas confidenciais
O CC dedica quatro artigos à tutela das cartas-missivas confidenciais.
As cartas confidenciais integram-se no âmbito dos bens protegidos pelo direito
à intimidade da vida privada ou aos segredos das pessoas. O facto de constarem de
documento dirigido a terceiros levou o legislador a uma regulamentação com certa
minúcia, sendo que esta é ainda um manifesto de grande relevo ético e social.
Uma carta traduz-se num texto, exarado em papel e com um destinatário. É
confidencial quando contenha matérias que não possa ser comunicada fora do círculo

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entre o remetente e o destinatário. Podemos aqui integrar, também, analogicamente,


o correio eletrónico
Em termos puramente jurídicos temos:
1. O direito real de propriedade sobre a carta, que se transmite para o destinatário
por doação, assim que seja endereçada ou entregue ao destinatário

2. Os direitos de autor, patrimonial e moral, sobre o texto da carta: pertencem ao


autor, se da própria carta outra solução não resultar

3. Os direitos de personalidade que tutelam bens íntimos eventuais patentes na


carta: são do autor e seguem o regime do Direito de personalidade.

A confidencialidade
Direito de personalidade atípico
Quando a lei fala de “carta-missiva confidencial” a lei vai mais longe do que um
mero documento entregue de uma pessoa para outra. Segundo o A.75º1
1. O destinatário deve guardar reserva sobre o seu conteúdo
2. O destinatário não pode aproveitar os elementos de informação que ela
tenha levado ao seu conhecimento
Em suma: o destinatário de uma carta-missiva confidencial fica na
contingência de receber, tomar conhecimento, eventualmente responder e, depois
esquecer.
Teoria subjetivas: a natureza confidencial de uma carta resultará da vontade do
seu autor, devidamente declarada
Teoria objetivista: a confidencialidade teria de resultar do próprio teor da carta,
independentemente da vontade do remetente.
Teoria do direito de personalidade: a confidencialidade resultará do teor da
carta, embora o seu autor, dentro dos limites, possa interferir.

A pessoa que remeta uma carta, a outra, vai, na esfera e no espírito desta, criar
determinadas adstrições, sendo estas maiores quando se trate de carta confidencial.

Regime a âmbito de proteção da confidencialidade


Verificados os pressupostos da confidencialidade, o destinatário deve guardar
segredo e não pode pautar a sua atenção pelo que tenha passado a saber. Caso viole
estes deveres:
1. Incorre em responsabilidade civil por todos os danos patrimoniais que
cause
2. Idem, quanto aos danos morais

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3. Podendo ainda ser empreendidas diligências para fazer cessar o ilícito –


i.e, a apreensão da carta e a sua destruição ou a sua entrega ao remetente;
a divulgação da ilicitude cometida e da infidelidade do destinatário
A confidencialidade une o remetente e o destinatário num vínculo de
personalidade, sendo que estes deveres não se transmitem – em princípio – aos
sucessores do destinatário (A.2024 e 2025). Sendo que também se deve ter em conta a
providência quanto à carta: tal preocupação incide no 75º2 que prevê: a restituição da
carta, a requerimento do autor dela ou, tendo este falecido, das pessoas indicadas no
A.71º2; a sua destruição; o seu depósito em mão de pessoa idónea; qualquer outra
medida adequada.

A publicação de uma carta-missiva confidencial configurará uma forma


agravada de violação da confidencialidade. O A.76º1 prevê que a carta só possa ser
publicada com o consentimento do seu autor ou com o suprimento judicial. Na
verdade, o consentimento para a publicação de uma carta-missiva confidencial equivale
a um negócio pelo qual o autor se despoja, para todo o sempre, de um bem da sua
personalidade. Se o fizer, este não poderá eficazmente revogar a sua decisão.

Cartas-missivas não confidenciais; a confiança


Segundo o A.78, o destinatário da carta-missiva não confidencial só pode usar
dela em termos que não contrariem a expetativa do autor. Em termos técnicos, surge
aqui uma relação de confiança. Apesar de não se inserir regras explícitas de sigilo
profissional, o Direito não pode ignorar que se trata de assunto a não usar contra o
próprio autor. Aqui o Direito tutela a relação de confiança, em nome da paz social.
Mas, claro, se se apela à doutrina da confiança há que verificar os pressupostos
da confiança e se as “expetativas” do autor da carta eram fundadas e qual o seu sentido.
A confiança assenta, assim, na boa fé.
O tema das cartas de negócios encontra, em rigor, uma redução à luz da boa-
fé in contrahendo.

O Direito à imagem
Ideia de imagem: representação de uma pessoa na sua configuração exterior.
Esta ganhou bastante impacto com a fotografia, pois permiti que qualquer pessoa,
munida de uma câmara fotográfica pudesse copiar e reproduzir a imagem alheia. Esta
possibilidade deu uma dimensão pessoal – de personalidade- à imagem humana
A imagem materializada de uma pessoa é um bem de personalidade
fortemente objetivado. Nela recaem direitos reais – o direito de propriedade, mas no
que tange ao “direito à imagem” não é, todavia, esse o nível em causa. A imagem
permite a imediata identificação da pessoa de que se trate. O destino que se dê à
imagem é, de certo modo, um tratamento dado à própria pessoa. A imagem faz, assim,
a sua aparição no placo dos bens de personalidade. Em termos unitários a imagem é um

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bem de personalidade, apesar de sob a tutela da imagem podem encobrir-se valores


diversos.

Os valores em jogo; alargamento ao direito sobre a palavra


A imagem humana permite, caso circule ou seja reproduzida, a visualização do
retratado. Temos assim um primeiro valor em causa (1): o do resguardo ou da
intimidade privada. I.e: proteger a imagem, a este nível, equivale a tutelar a
intimidade e a tranquilidade de cada um.
A transmissão da imagem de uma pessoa raramente o será de modo abstrato:
em regra tratar-se-á de a associar a qualquer notícia ou mensagem que se pretenda
transmitir. Ora: tal imagem poderá não ser aprazível para o próprio, daqui emergindo
outro valor (2): o do bom nome e da reputação.
Como terceiro e possível valor em jogo (3) temos a capacidade lucrativa que
determinada imagem possa assumir, seja de forma direto (a venda) ou indireto
(publicidade). Tal quantia deve reverter para o próprio retratado, de forma a evitar o
enriquecimento alheio, e a facultar o reconhecimento da faculdade lucrativo ao
“dono” originário da imagem.
Conclusão: esta variedade de valores não põe em causa a unidade do direito à
imagem.
Estes valores em relação ao direito à imagem permitem autonomizar o direito
sobre a palavra: a palavra humana também pode ser gravada e reproduzida, tendo esta
caraterísticas que permitem reportá-la a uma determinada pessoa e apenas a ela. A
utilização de gravações pode afrontar a privacidade, o bom nome ou direitos
patrimoniais legítimos: tudo depende das circunstâncias. Dada a inexistência de uma
tipicidade dos direitos de personalidade, nenhuma dificuldade existe em extrapolar,
com base no A.70, ou do A.79, um direito à palavra

O regime civil vigente; a autorização


O A.79º1 consagra a regra básica: o retrato de uma pessoa não pode ser
exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela. O direito é
pós-eficaz: depois da morte da pessoa retratada, a autorização compete e pela ordem
nele indicada, às pessoas referidas ao A.71º2. Apesar de a lei referir as palavras
“exposto “reproduzido” e “lançado no comércio” o que realmente está subjacente é o
de que ninguém pode ser retratado sem o seu consentimento. Este consentimento
pode ser tácito, na medida em que uma pessoa que se apresente num palco para um
desfile está a revelar a sua concordância – A.217.

Há que perceber que esta ao autorizar a “exposição” ou “reprodução” pode


não estar a autorizar o “lançamento no mercado”, mas quem aceita esta última aceita
as duas primeiras.

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A lei portuguesa é muito clara ao incluir o direito à imagem entre os direitos de


personalidade. Por outro lado, qualquer disposição relativa ao retrato de uma pessoa
surge, efetivamente, como uma limitação ao direito à imagem. Assim, o A.81 será
aplicável:
1. Sindicando a limitação voluntária, perante os princípios da ordem pública
– refere-se, claro, ao A.280, fazendo estes aqui apelo a códigos de ética e a
regras de moral sexual e familiar
2. Permitindo a livre revogação da limitação, ainda que com o dever de
indemnizar

A delimitação em função das circunstâncias; teoria das esferas e


concretização
O A.79 depois de, no nº1, ter referido o direito à imagem em termos muito
amplos veio, no nº2, introduzir limitações severas.
Segundo elas, o consentimento do retratado não é necessário nalguma das
circunstâncias seguintes:
1. Quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe,
exigências de polícia ou de justiça, finalidades científicas, didáticas ou
culturais
2. Quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos,
ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente
No entanto, o nº3 corrige esta limitação severa, dispondo que, não obstante a
verificação dalguma dessas circunstâncias, o retrato não pode “ser reproduzido,
exposto ou lançado no comércio, se do facto resultar prejuízo para a honra, reputação
ou simples decoro da pessoa retratada”.
Procurando isolar até onde pode ir a intervenção na imagem da pessoa, em
função do contexto e aspeto da vida da pessoa em que está presente a imagem ou a
reserva; à medida que nos aproximamos aos aspetos mais nucleares ou reservados da
pessoa, vamos associar uma maior intensidade à tutela da imagem – num raciocínio
aplicável à vida privada e à sua reserva – a doutrina desenvolveu a teoria das esferas.
Assim teríamos:
Importante: qualquer consentimento é dispensado dentro da esfera, mas não o é
fora da esfera.
A teoria da esfera ajuda-nos a concretizar os limites do Direito à imagem e sobre a
Reserva da vida privada.

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Pode originar-se a Colisão de Direitos: A.335; se a personalidade confessar um


crime, o valor com que a intensidade com que aparece o direito à informação pode
sobrepor-se ao direito de personalidade.
è Esfera Pública – própria de atores, políticos e desportistas, o que implicaria uma
área de condutas propositadamente acessível ao público, independentemente
de concretas autorizações – Não é necessário autorização;
è Esfera individual-social – reporta-se ao relacionamento social normal as diversas
pessoas estabelecem com amigos, colegas e conhecidos: a reprodução das
imagens seria aí possível, salvo proibição, mas apenas para circular nesse mesmo
meio – Não é necessário autorização;
è Esfera privada – tem a ver com a vida privada comum da pessoa: apenas
acessível ao círculo da família ou dos amigos mais estreitos, equiparáveis a
familiares – É admissível com autorização;
è Esfera secreta – abrange o âmbito que o próprio tenha decidido não revelar a
ninguém; desde o momento em que ele observe a discrição compatível com tal
decisão, esta esfera tem absoluta tutela; aqui não há “como se o consentimento
tivesse sido prestado”; há um sigilo absoluto, uma reserva estrita determinada
pelo próprio.
è Esfera íntima – reporta-se à vida sentimental ou familiar no sentido mais estrito
(cônjuges e filhos); tem uma tutela absoluta, independentemente de quaisquer
prévias decisões do titular considerado.

(Inicialmente, Oliveira Ascensão apenas propunha 3 esferas: a secreta, a privada,


e a individual-social)
Este critério das esferas ajuda à solução de casos concretos, enquanto critério
de decisão. É assim uma resolução prima facie do caso concreto
Regra básica: a informação não pode saltar de uma esfera para outra sem o
consentimento do próprio
Contudo, o núcleo duro são sempre direitos pessoais.
Estas esferas têm, assim, como objetivo, a delimitação da tutela do direito à
imagem. As esferas privada, secreta e íntima nunca são acessíveis sem autorização.
Nenhuma notoriedade, cargo, exigências de polícia ou de justiça ou finalidades
científicas, etc, permitiram tal invasão. Além disso, só são admissíveis autorizações na
esfera privada: na esfera secreta e íntima deixariam de o ser surgirem autorizações de
ingerência, o que nunca pode ser presumido.
As esferas pública e individual-social permitem retratar sem autorização, consoante
as circunstâncias e os objetivos, mas apenas para documentar o que lá se passa: não
para, p.e, obter imagens para uma campanha publicitária. Mas mesmo nestas duas

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esferas, os retratos – em sentido amplo – não serão permitidos se puderem prejudicar


a honra, a reputação ou o decoro do retratado
No entanto, a lei exceciona, à autorização, os retratos tirados em lugares públicos,
de factos de interesse geral ou que hajam decorrido publicamente, pois, nas esferas
públicas ou individual-social presume-se que o interessado esteja a autorizar os
retratos. Aqui tudo depende do destino das imagens captadas: elas só podem visar
documentar o sucedido, não, p.e, animar campanhas publicitárias, sem autorização
do próprio – sempre, claro, sobre a sindicância do A.79º3

O Direito à reserva sobre a intimidade da vida privada


A.80 – Versa sobre o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada. Este
direito postula uma liberdade fundamental: a que cada um tem, sem prejudicar
terceiros, orientar a sua vida privada como entender. Aqui o bem é a vida privada do
sujeito, sendo que este bem – claramente de personalidade – torna-se o suporte do
inerente direito.

Realidades que a vida privada compreende:


è A origem e a identidade da pessoa
è A sua situação de saúde
è A sua situação patrimonial Em rigor, a vida privada
è A sua imagem abrangerá tudo o que não seja
público e profissional ou social
è Os seus escritos pessoais
è A suas amizades e relacionamentos sentimentais
è As suas preferências estéticas
è As suas opções políticas e religiosas

´
O direito à reserva sobre a intimidade da vida privada é, antes de mais, um direito
contra o Estado: este só pode interferir nesse campo com cobertura de leis
constitucionais e na estrita medida do necessário. É importante ainda reconhecer que o
Direito Civil reconhece, na privacidade, a existência de um valor autónomo. A
privacidade traduz um círculo de liberdade independente do Estado e de terceiros e
que o sujeito interessado poderá tratar como entender.

O regime vigente
A vida privada nunca é privada de um; é, no entanto comum a mais alguém. A
intimidade de alguém nunca é uma intimidade solitária, dependendo do caso e da
pessoa (A.80º2). Neste âmbito inserem-se também as esferas, para se saber, através

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desta densificação doutrinal, se um determinado comportamento é ou não uma


reserva da autonomia privada, se esta está ou não a ser violada.
A referência a uma “vida privada” inculca uma outra, a “vida pública”, em
relação à qual não haverá reserva – ou, pelo menos, o mesmo tipo de reserva. Aqui, há
que apelar para a Teoria das esferas e para o seu potencial descritivo e ordenador.
Assim, o A.80 protege as esferas privadas, secreta e íntima – e não já a pública ou social-
individual.
O nº2 delimita a proteção em função de dois elementos:
1. Um dado objetivo: a natureza do caso – tem que ver com os especiais valores
que, in concreto, possam conduzir à intromissão na esfera privada. Terão de ter
uma cobertura legal e deverão revelar-se mais ponderosos do que os valores
subjacentes à privacidade. Isto será o caso de exigências da polícia ou de justiça
que poderão conduzir, p.e, a escutas telefónicas – sob sigilo e no estrito limite
do necessário.

2. Um dado subjetivo: a condição das pessoas – reporta-se à notoriedade ou ao


cargo da pessoa considerada ou à própria postura que a mesma adote. Perante
um político ou uma celebridade, passarão a ser notícia factos que, noutras
condições, se tornariam irrelevantes.
A esfera privada de políticos ou celebridades não desaparece: e, sobretudo, nunca
ao ponto de atingir as esferas secreta e íntima, podendo, contudo, ser fortemente
suprimida, sem, contudo, se falar em atentado à privacidade.
Em qualquer dos casos, tem aplicação a delimitação negativa prevista no 79º3,
embora dirigida ao direito à imagem, não levantará dúvidas a sua aplicação extensiva
a situações similares.
Estes elementos subjetivos fazem com que um ato seja lícito para uma pessoa e
ilícito perante outra. P.e: será lícito relatar as férias do primeiro-ministro, mas já
relatar, sem mais, as férias de um cidadão, digno mas anónimo, será um atentado
contra a sua privacidade
Importa ter presente que as duas consequências civis da violação de direitos de
personalidade são, sempre, a responsabilidade civil e as medidas adequadas a fazer
cessar a intromissão – A.70º2. Aqui as “medidas adequadas” dispensam qualquer
requisito de “dolo ou neglicência”, como acontece na responsabilidade civil – A.483º1.
Isto quer dizer que perante qualquer atitude atentatória à privacidade, o Tribunal
poderá adotar as medidas que ponham, de imediato e com eficácia, termo ao desacato,
ainda que, por falta de requisitos, não possa haver responsabilidade civil. Aqui, o ónus
da prova cabe ao lesado – i.e, ele deverá demonstrar o ato prevaricador e o que
determinou o atingimento da sua honra – sendo, contudo, esta dispensada, quando
seja notório, publicamente, que a honra fora atingida.

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O A.81 não pode limitar algumas coisas; o nível biológico nem o nível moral; o
círculo social admite limitação com exceções.
Há que interpretar a ordem pública do A.81 em sentido amplo, integrando os bons
costumes (A.280).

Capítulo III – Pessoas Singulares


O início da personalidade jurídica
O direito à vida do nascituro
Como ponto de partida para a reflexão, assentamos em que o recém-nascido é
um ser humano e tem direito à vida. O direito à vida do nascituro, uma vez admitido,
surge com a vida: não é qualitativamente diferente na 10º semana ou na 20º ou no
termo da gravidez.
Tudo se inclina para o reconhecimento do direito à vida do nascituro,
reconhecimento esse que, de resto e por vias diversas, é praticamente pacífico. As
razões últimas que justificam o direito à vida do nascituro são precisamente as que
depõem a favor do direito à vida das pessoas, em geral.
Podemos perfeitamente admitir, num plano civil, o direito à vida do nascituro, sem
uma incriminação do aborto.
O direito à vida apenas é oponível ao próprio direito à vida. A licitude do aborto só
se poderia, assim, amparar na necessidade de salvar a mãe e perante a alternativa
concreta, real e comprovada, de a sobrevida do nascituro envolver a morte da mãe. Já
um aborto ad nutum, por opção de conveniência ou por razões económico-sociais, não
parece razoável.

Em conclusão: a existência civil do direito à vida do nascituro, sob reserva de


convenientes estudos de política legislativa criminal, recomendaria uma tutela penal
desse direito; a despenalização ocorreria na base de um cauteloso método de
indicações, que ponderasse os bens em presença, optando pelo sacrifício do que, em
concreto, fosse menos intenso

Danos causados ao nascituro; o próprio nascimento como dano?


Reconhecido que, civilmente, o nascituro tem direito à vida, não oferecerá
dúvidas extrapolar o direito à integridade física e moral. Pergunta-se se os danos
causados ao próprio nascituro são indemnizáveis
Ainda que tendo um direito à vida, o nascituro representa um fardo,
particularmente quando seja deficiente. O próprio nascimento poderá, assim, ser
considerado um dano?

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De facto, na hipótese de erro médico de que resulte uma gravidez não


programada, há lugar a uma indemnização reparatória. Não deixa de haver dano pelo
facto de, em consequência do erro, ter surgido um nascituro com direito à vida, e por
maioria de razão, uma criança com a plenitude das posições reconhecidas ao ser
humano.
Por ter sido celebrado um contrato de prestação de serviços médicos, a
interessa adquiriu o direito a um aconselhamento capaz e competente, e sendo esse
o caso, a tratamentos adequados. Quando o contrato seja deficientemente cumprido,
ele tem o direito a todas as demais despesas assim ocasionadas. Admitir que certos
contratos de prestação de serviço médico pudessem ser desleixadamente cumpridos a
pretexto de que daí “apenas” resultaria uma criança, é inadmissível: seria premiar a
irresponsabilidade e o enriquecimento ilícito, uma vez que o médico é pago pelos seus
serviços.
Atribuir uma indemnização à criança, por esta ter nascido equivaleria a
considerar a sua vida como um dano, sendo que a alternativa apontaria não para uma
vida “normal”, mas para a não-vida.
A intocabilidade da vida do récem-nascido conduzirá, assim, a que este não possa
demandar o médico … por estar vivo. Sendo a vida do filho inviolável, como podem ser
indemnizados por ele estar vivo.

114. O estatuto dos embriões


Civilmente os embriões são nascituros, embora (ainda) sem cérebro: têm
direito à vida.
O atentado à integridade do nascituro é um ato civilmente ilícito. Se do
atentado resultar lesão não letal, o próprio nascituro tem o direito, após o nascimento,
de ser indemnizado. Se da lesão resultar uma deficiência permanente, tal direito
abrangerá os alimentos necessários, devidamente reforçados ao longo de uma vida.
Antes do nascimento, o nascituro tem uma capacidade de gozo limitada ao
direito à vida. A morte do nascituro dará lugar a direitos à indemnização por danos
morais, funcionando o A.496
Quanto ao nascituro em si: não tendo havido nascimento, o direito à
indemnização do próprio não se constitui – tratando-se de uma consequência do
A.66º1 – i.e, não há personalidade, persona, não há indemnização direta e automática
que se possa efetivar no mesmo
Finalmente cabe perguntar quem age pelo nascituro. Cabe, aqui, recorrer aos
mecanismos próprios do poder paternal (A.1878º1, neste caso).

A aquisição da personalidade e de capacidade


A personalidade corresponde à qualidade que assume o homo sapiens quando
age no palco do Direito. Formalmente, ela exprime a potencialidade que o homo tem

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de ser destinatário de normas jurídicas ou, se se quiser: de ser titular de direitos e


adstrito a obrigações. Salvo a problemática específica do nascituro, esta prerrogativa
é hoje reconhecida a cada ser humano.
Todavia, os seres humanos não se apresentam, todos, em circunstâncias
idênticas, para agir em Direito. O recém-nascido ou o deficiente metal profundo não
podem dispor de certos direitos, assim como não podem exercer pessoal e livremente
direitos de que disponham. Assim, a determinadas pessoas – sendo que isto foi
enriquecido historicamente – não era reconhecido uma plena possibilidade de atuação
jurídica.

Assim, o Direito Civil é levado a distinguir personalidade jurídica (a qualidade


de destinatário de normas jurídicas) e a capacidade jurídica (medida concreta de
direitos e deveres de que se possa, respetivamente, ser titular e destinatário).

Dentro da capacidade jurídica:


1. Capacidade de gozo – traduz a medida das posições jurídicas que se possam
encabeçar
2. Capacidade de exercício – exprime a medida das posições jurídicas a exercer
pessoal e livremente
O recém-nascido tem personalidade jurídica – A.66º1 – e pode ser titular de
posições jurídicas: tem capacidade de gozo, ainda que não total [não pode cessar
– A.1601; a) – ou testar – A.2189, a)]; em compensação, o recém-nascido não tem
capacidade de exercício, devendo ser representado – A.123 e 124.
A doutrina atual distingue, em termos incisivos, a personalidade jurídica (que
seria um dado qualitativo – a possibilidade de encabeçar direitos e obrigações) e a
capacidade jurídica (que seria um dado quantitativo – a media abstrata de tais
direitos ou obrigações). Este aperfeiçoamento da análise deve-se a Paulo Cunha.

O sistema do Código Civil


O A.66º1 começa por proclamar que a personalidade se adquire com o
nascimento: parece, assim, uma noção qualitativa. Todavia, logo de seguida, o A.67ª
vem apresentar a capacidade jurídica como a possibilidade de se ser titular de
“quaisquer relações jurídicas”; a solução atualista acentua e muito o termo
“quaisquer”. A tónica da capacidade de gozo não reside no facto de poderem ser
sujeitos de “relações jurídicas”: isso já adviria da personalidade. Ela deriva, antes, de
poderem encabeçar quaisquer situações, de modo indiferenciado. Embora se esteja
perante uma qualidade, ela é apresentada pelo modo quantitativo do elevado número
de situações disponíveis, de tal forma que apenas genericamente elas podem ser
referidas.
Quanto à capacidade de exercício, esta terá de ser construída com base nas
“incapacidades” – A.122 e ss

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O A.68ª depõe sobre o termo da personalidade, atingido claramente a


capacidade, enquanto que o A.69ª, ao proibir a renúncia à capacidade, veda, de facto,
a renúncia à personalidade.

O começo da personalidade
Apesar de não haver relação direta, o A.66 e 68 são indissociáveis.

Concessão clássica: estatuto sem personalidade jurídica enquanto o nascituro


não nascer

Influência do Código de Seabra: associa o início da personalidade à capacidade


As matrizes dos direitos de personalidade escapam ao conceito de relação,
sendo, sobretudo, entendíveis no campo da situação – não dependem, assim da
interação com o outro: eu para ter um direito de personalidade não é necessário que
o mesmo seja atingido. Caso do nascituro: tem uma diminuição quanto à capacidade,
mas não quanto aos direitos de personalidade.
A estrutura jurídica do nascituro é própria dele.

O CC não refere a regra básica de que todo o ser humano é pessoa. Todavia
fixou o seu início no A.66º1 “no momento do nascimento completo e com vida”. Este
preceito pretendeu pôr termo a querelas anteriores, que aventavam, ainda, como
possíveis requisitos da personalidade, a viabilidade do recém-nascido e o ter ele figura
humana. Fica claro que tanto os nados vivos portadores de deficientes como os
monstros (i.e, os irmãos siameses ligados) são pessoas.
Pergunta-se depois em que consiste o sentido do “nascimento completo”. Em
termos rigorosos, o nascimento fica completo com o corte do cordão umbilical. No
entanto, o A.66 padece de demasiadas anomalias para dele se retirar, em definitivo,
um comando sobre o início da personalidade. Prudente é aqui enunciar o A.24 da CRP
sobre a inviolabilidade da vida humana.
Em termos dogmáticos, podemos dizer: se a personalidade se contenta com a
titularidade de um único direito, o nascituro é uma pessoa desde a conceção: tem,
como vimos, o direito à vida. Em relação à capacidade para deter outros direitos, ele
depende do nascimento: adiante veremos que entender por esta expressão e se ela
reforça ou não a personalidade do nascituro.

Nesta última afirmação reside a dimensão normativa do A.66. Segundo o seu


nº2 os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu nascimento. Os
nascituros têm direitos: os que a lei lhes reconheça. Todavia, estão sujeitos a condição
(legal) do seu nascimento. No entanto, como o CC não menciona o direito à vida, entre
os direitos de personalidade, este também não o menciona para o nascituro.

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Direitos específicos dos nascituros


O CC trata a matéria os nascituros de forma técnica. O termo tem uma aceção
ampla, de modo a abranger:
1. O nascituro em sentido próprio ou estrito: ser humano concebido e ainda não
nascido

2. O conceturo: entidade abstrata ainda não concebida


O A.66º2 admite direitos reconhecidos, por lei, aos nascituros: trata-se de
nascituros em sentido amplo. No entanto, aqui a lei é, na realidade, o Direito.
O nascituro é seguramente “filho”: seja biológica, seja ética ou socialmente.
Por isso, quando o A.496º2 se refere a “filhos”, nenhuma razão há para excluir os
nascituros.

A condição legal do nascimento


O A.66º2 dispõe que os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do
seu nascimento. Quer isto dizer que, a não haver nascimento, tais direitos têm-se por
não havidos: nascendo a criança, eles consolidam-se, com efeitos retroativos. Trata-
se, assim, de uma condição suspensiva.
Visa-se, não associar a personalidade ao nascimento, mas segundo o A.66, associar
o nascimento à capacidade (de gozo), relativa aos diversos direitos patrimoniais,
estando aqui sujeita a condição suspensiva do nascimento

O nascituro tem, assim, direito à vida, e, por essa vida, personalidade jurídica. A
sua capacidade geral de gozo também ocorre: mas sujeita à condição suspensiva do
nascimento

p.427 e ss

Domicílio
O CC não define domicílio. Limita-se, nos seus, A.82 ss, a indicar diversos
domicílios: voluntário, geral, profissional, eletivo, dos menores e interditos, dos
empregados públicos e agentes diplomáticos portugueses. Podemos inferir, todavia,
que o domicílio é o lugar no qual, juridicamente e para diversos efeitos, é suposto
encontrar-se determinada pessoa; é o lugar onde o cidadão tem a sua residência
permanente.
No domicílio está em causa a determinação de um local a que se associa, em
termos jurídicos, determinada pessoa singular. As pessoas coletivas não têm
“domicílio”.
O domicílio releva em quatro áreas:

1. Na individualização da própria pessoa: a indicação do seu domicílio é, sempre,


um complemento decisivo de identificação

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2. Na explicação do lugar do cumprimento das obrigações – A.772 e ss, 885º2 e


1039
O CC trabalha também com a noção de paradeiro: paradeiro traduz o lugar onde a
pessoa concretamente se encontre, no momento considerado; é um conceito
puramente fático. O CC não define paradeiro, tendo-o em conta no A.82º2 como o
último critério utilizável para definir domicílio.
Residência: exprime o lugar onde determinada pessoa habitualmente viva, aí
organizando a sua vida.
Tanto a residência como o paradeiro são noções de facto, opondo-se, assim, ao
domicílio, noção jurídica
O A.82º2 obriga a distinguir entre “residência habitual”, que não levanta dúvidas,
e a “residência ocasional” que será um lugar, apesar de com alguma habitualidade, o
visado se encontre. Caso contrário, temos um simples paradeiro
Domicílios civis: o domicílio geral voluntário
O CC fixa diversos domicílios, a que poderemos chamar civis.
è Quanto aos efeitos temos:
1. O domicílio geral: releva para uma generalidade de situações jurídicas
2. O domicílio especial: também dito particular: opera para situações jurídicas
específicas
è Quanto à escolha ocorrem:
1. Domicílio voluntário, dependente da opção do sujeito
2. Domicílio legal: corresponde a uma estatuição da lei

Contudo, estas distinções podem entrecruzar-se. Mesmo assim, a figura nuclear é


a do domicílio geral voluntário, que implica uma escolha do sujeito.

O domicílio, vai, sucessivamente, corresponder aos seguintes fatores:


a. A residência permanente, quando o sujeito se encontre, sem interrupção, num
determinado local
b. A residência habitual, quando, circulando por vários locais, ele tenha, todavia,
um de presença claramente dominante
c. Alguma das residências alternativas
d. A residência ocasional, quando não seja possível apontar ao sujeito uma
residência mais estável
e. Ao paradeiro, na falta de outro critério.

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Artigo 84 – Domicílio eletivo


O domicilio voluntário e especial deriva da livre escolha dos interessados e vale
apenas para determinados atos.
Pergunta-se se o domicílio eletivo deriva de contrato ou se pode provir de
negócios unilaterais. Depende. Este opera, normalmente, como uma cláusula num
negócio mais vasto, mas, poderá haver uma eleição de domicílio sem dependência de
um concreto negócio? O A.84 é claro e fala-nos em “para determinados negócios” –
i.e, na falta dessa especificação estaríamos perante um domicílio geral, que tem as
regras do A.82.
Além disso, um negócio que fixasse determinado domicílio para “negócios”, sem
especificar minimamente quais, sempre seria nulo por indeterminabilidade do
conteúdo – A.280º1.
Artigo 83 – Domicílio profissional
A pessoa que exerça uma profissão tem, quanto às relações que a ela se refiram,
domicílio profissional no lugar onde a profissão seja exercida. O nº2 complementa
que, se a profissão for exercida em lugares diversos, cada um deles constitui domicílio
para as relações que lhe correspondam. Este domicílio pode coincidir com os escritórios
de advogados ou médicos
Agora: este domicílio é voluntário ou necessário? O exercício de qualquer
profissão é voluntário. Assim, a escolha do local do exercício cabe, também e
formalmente, ao interessado. Ele é voluntário.
Artigo 85 – Domicílios legais
Nos casos em que a lei fixa os domicílios das pessoas, estes designam-se por
domicílios legais, tratando-se, em geral, de domicílios gerais.
Primeira hipótese: a do domicílio dos menores e dos interditos. Segundo o 85º1
o menor tem domicílio no lugar da residência da família
(ler os restantes subhipóteses do A.85; A.86 e 87).

Ausência e morte presumida


O Código de Seabra estabelecia, no fundo, dois esquemas distintos:

1. O da curadoria provisória – dominavam os interesses do ausente.


Providenciava-se quanto à administração dos seus bens, mas tudo era deixado
intacto, na expetativa do seu regresso;

2. O da curadoria definitiva – por oposição, aqui, dominam já os interesses dos


herdeiros do ausente. Estes vinham assim, a ser contemplados com os bens do
ausente, embora prestando caução.

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No termo do processo, embora a lei evitasse referi-lo, tínhamos já uma situação


próxima da morte presumida: os herdeiros ficavam libertos da caução e podiam
fazer o que bem entendessem, com os bens. Regressando o ausente, os bens ser-
lhe-iam restituídos, nas condições em que se encontrassem.
Na base do sistema temos a ideia de que, desaparecendo pessoa, há que
começar por providenciar quanto aos seus bens. Mantendo-se a ausência, atende-
se ao interesse dos sucessores: procede-se à justificação da ausência e os bens são
entregues aos herdeiros presumidos. Passando ainda mais algum tempo sem
notícias do ausente, surge a morte presumida, equivalente à morte: os bens são
definitivamente entregues aos herdeiros e o cônjuge deste pode contrair, em
certas condições, novo casamento.
Em qualquer dos casos, regressando o ausente, os bens são-lhe entregues no
estado em que encontrarem.

147. Curadoria Provisória


A curadoria provisória inicia-se, simplesmente, com a necessidade de prover
acerca da administração dos bens de quem tenha desaparecido quem que dele se
saiba e sem ter deixado representante, legal ou voluntário – A.89º1. O mesmo sucede
quando, havendo representante, este não possa ou não queria exercer as suas funções
– A.89º2; a hipótese mais natural será a de o representante, mercê do desaparecimento,
não ter instruções bastantes, sentindo-se sem legitimidade para improvisar.
Certos negócios podem exigir habilitações particulares ou, ainda, uma
disponibilidade ou uma localização geográfica mais vincada. A lei prevê a nomeação,
nesses casos, de um curador especial – A.89º3
Além da nomeação do curador provisório, a lei admite que possam ser adotadas
providências cautelares indispensáveis à preservação de quaisquer bens do ausente.
Tais providências podem incluir:
a. A entrega de certos bens a um depositário
b. A alienação de bens deterioráveis, que não constitui disposição
c. Pagamentos urgentes, por conta dos bens do ausente

d. Procedimentos cautelares relativos a ações de fundo a propor em nome e


por conta do ausente
A curadoria provisória e as providências cautelares podem ser requeridas pelo
Ministério Público, ou por qualquer interessado – A.91. O curador provisório é
escolhido de entre: o cônjuge do ausente, algum ou alguns dos herdeiros presumidos
ou algum dos interessados na conservação dos bens – A.92º1. Havendo conflito de
interesses, deve recorrer-se ao curador especial do A.89º3 – A.92º2

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De todo o modo, no entanto, na curadoria provisória há ainda uma grande


expetativa em torno do reaparecimento do ausente. O Interesse dominante é o deste,
o do ausente. Por isso o A.93º1 impõe que, antes de entregues ao curador provisório:
a. Os bens sejam relacionados;
b. O curador provisório preste atenção, sob pena de ser nomeado outro
curador – A.93º3
Contudo, em casos de urgência estas diligências podem ser dispensadas pelo
juiz – A.93º2.
O curador provisório pode ser substituído, a requerimento do Ministério Público
ou de qualquer interessado, logo que se mostre inconveniente a sua permanência no
cargo.
O curador fica na situação de um mandatário geral com poderes de
representação – A.94º1 e 2. Como tal:
a. Ele tem poderes gerais de administração; o paralelo será assim com o
mandato geral referido no A.1159º1;

b. Ele pode intentar as ações que não possam ser retardadas e contestar as
intentadas contra o ausente – A.94º2
c. Ele pode alienar ou onerar imóveis, objetos preciosos, títulos de crédito,
estabelecimentos comerciais e quaisquer outros bens cuja alienação ou
oneração não seja ato de administração – A.94º3 – desde que com
autorização do Ministério Público, a conceder no A.94º4.
O curador provisório deve ainda prestar contas do seu mandato ao tribunal
(A.95º1) ou curadores definitivos, quando seja deferida a curadoria definitiva (A.95º2).
Ele tem direito a uma remuneração equivalente a 10% da receita líquida que realizar
(A.96): um preceito a complementar em sede de integração de lacunas, já que
determinada curadoria pode ser essencial para defesa dos interesses do ausente e,
todavia, não originar quaisquer receitas líquidas. Aplicar-se-á então o regime de
remuneração do mandatário, previsto no A.1158º2.
Com base neste regime, podemos considerar que o curador provisório é um
representante legal do ausente, inserindo-se num regime próprio, decalcado do
regime do mandato. ´
A curadoria provisória termina segundo as cinco alíneas do A.98:
a. Pelo regresso do ausente
b. Quando o ausente providencie acerca da administração dos bens
c. Quando compareça a pessoa que legalmente represente o ausente ou um
procurador bastante

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d. Pela entrega dos bens aos curadores definitivos ou ao cabeça-de-casal, nos


termos do A.103
e. Pela certeza da morte do ausente
A curadoria provisória terminará, ainda, quando perca qualquer interesse
prático: designadamente pelo desaparecimento do património do ausente.

148. Curadoria definitiva


A curadoria definitiva segue-se à fase provisória. Ela é constituída por decisão
do tribunal, denominada “justificação de ausência” (dando azo a uma processo
especial: A.1103 a 1114 do CPC). Isto depende – A.99:

a. De terem decorrido dois anos sem se saber do ausente ou cinco quando


tenha deixado representante legal ou voluntário bastante;
b. De o Ministério Público ou algum interessado o terem requerido
Segundo o A.100, interessados são, aqui:
a. O cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens
b. Os herdeiros do ausente

c. Todos os que, sobre bens do ausente, tiverem direito dependente de


condição da sua morte

Justificada a ausência, o tribunal requisita certidões dos testamentos públicos


e manda proceder à abertura dos testamentos cerrados que existam: serão tomados
em conta na partilha e no deferimento da curadoria definitiva – A.101.

Os legatários e outras pessoas que, por morte do ausente, teriam direito a


bens determinados podem requerer, logo que a ausência seja justificada,
independentemente da partilha, a entrega dos bens – A.102.
Posto isto:

a. A administração dos bens cabe ao cabeça-de-casal, designado nos termos


do A.2080 e ss – 103º2
b. Segue-se a partilha – A.103º1
c. Com a entrega dos bens aos herdeiros do ausente, à data das últimas
notícias – idem
Os herdeiros e demais interessados, a quem tenham sido entregues bens do
ausente, são havidos como curadores definitivos – A.104. Caso apareçam outros
interessados com legitimidade bastante, procede-se às competentes correções –
A.105. Suspende-se a exigibilidade das obrigações que se extinguiriam com a morte
do ausente – A.106

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Apesar de todas as medidas apontadas, que nos aproximam já da sucessão


por morte, a situação, por lei, considerada definitiva.
Assim:
a. Tendo em conta a espécie e valor dos bens e, eventualmente, dos
rendimentos a restituir, o tribunal pode exigir caução aos curadores
definitivos ou a algum ou alguns deles – A.107º1
b. Enquanto não prestar a caução fixada, o curador está impedido de receber
os bens – A.107º2 1ª parte
c. Esses bens serão entregues, até ao termo da curadoria ou à prestação da
caução, a outro herdeiro ou interessado que ocupará, em relação a eles, a
posição de curador definitivo – A.107º2 2ª parte
(Ver o resto -> A. 108 a A.111º1 e 2)!

Aos curadores definitivos é aplicável o A.94: direitos e obrigações dos


curadores provisórios; cessam os poderes antes conferidos pelo ausente em relação a
esses bens – A.110. Daqui infere-se que tal como os provisórios, os curadores
definitivos são representantes legais do ausente, agindo na base de um mandato
geral. Apurando-se que, afinal, o ausente já tinha falecido eles serão, ipso iure,
representantes dos herdeiros do mesmo ausente o que, em regra, implicará a extinção
da representação por confusão.
A curadoria definitiva cessa por qualquer uma das quatro razões elencadas no
A.112:
a. Pelo regresso do ausente
b. Pela notícia da sua existência e do lugar onde resida
c. Pela certeza da sua morte

d. Pela declaração presumida de morte


Nas duas primeiras hipóteses os bens ser-lhe-ão entregues logo que ele o
requeira – A.113º1; a curadoria mantém-se enquanto não se verificar tal
requerimento – idem, nº2.

149. Morte presumida


Como última fase do processo de ausência, surge a morte presumida. Todavia,
esta não depende da prévia instalação das curadorias provisória ou definitiva,
podendo ser requerida diretamente, desde que se verifiquem certos requisitos legais
(ver A.1110 do CPC). São eles o A.114:
a. 10 anos sobre a data das últimas notícias ou 5 se, entretanto, o ausente
tiver completado 80 anos de idade – nº1 1ª parte

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b. 5anos sobre a data da maioridade do ausente, se fosse vivo – nº2


c. Requerimento dos interessados referidos no A.100 (portanto: cônjuge não
separado judicialmente de pessoas e bens, herdeiros do ausente ou todos
os que, sobre bens do ausente, tenham direito dependente da condição da
sua morte) n1 2ª parte.
A declaração de morte presumida produz os mesmos efeitos do que a morte,
salvo quanto ao casamento – A.115. Todavia, sendo este civil, pode o cônjuge do
ausente contrair novo casamento; na hipótese de o ausente regressar ou de haver
notícia de o mesmo estar vivo, quando foram celebradas as novas núpcias, considera-
se o primeiro casamento dissolvido por divórcio, à data da declaração de morte
presumida – A.116
Os bens são entregues aos sucessores do ausente, nos termos do A.101 e ss;
não há, porém, e agora, lugar a caução, podendo a mesma ser levantada, se tiver sido
prestada – A.117
Apesar de a declaração de morte presumida e os cuidados que a rodeiam,
pode sempre suceder que, afinal, o ausente regresse ou que dele haja notícias. Nessa
altura o património é-lhe devolvido no estado em que encontrava, com as seguintes
especificações – A.119º1:
a. É devolvido o preço dos bens alienados ou dos bens diretamente sub-
rogados;
b. São devolvidos os bens adquiridos mediante o preço dos alineados,
quando no título de aquisição se declare expressamente a proveniência do
dinheiro.
Havendo, contudo, ma fé dos sucessores, o assente tem o direito de ser
indemnizado do prejuízo sofrido – A.119º2. O nº3 desse preceito define a má-fé como
(3): “conhecimento de que o ausente sobreviveu à data da morte presumida”. Por
razões elementares de harmonia sistemática, deve considerar-se igualmente de má-fé
o sucessor que, com culpa, não conheça a sobrevivência do ausente.
A terminar a rúbrica, o CC denomina os direitos eventuais do ausente, i.e,
aqueles que sobreviveram ao ausente depois do desaparecimento sem notícias e que
sejam dependentes da condição da sua existência: eles passam às pessoas que seriam
chamadas à titularidade deles se o ausente fosse falecido – A.120. Desta feita, não
opera a presunção de que o ausente está vivo.
A lei tempera esta regra mandando aplicar o regime da curadoria provisória e
definitiva – A.121º1. Os que seriam chamados à titularidade dos “direitos eventuais”
em causa são havidos, perante eles, como curadores definitivos.
MC entende que também tem aplicação o A.119: demonstrando-se a
sobrevida do ausente, os direitos eventuais revertem para ele.

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A menoridade
Pelo nascimento a pessoa adquire uma capacidade de gozo tendencialmente
plena – e isso sem prejuízo da acima exposta tutela pré-natal. Não pode, porém, agir
pessoal e livremente: trata-se de uma incapacidade de exercício, ditada pela natureza
das coisas.
Proliferam, no Direito dos menores, as posições funcionais e os poderes-
deveres.
Segundo o A.128 “os menores carecem de capacidade para o exercício de
direitos”. Tratar-se-ia uma incapacidade geral de exercício, a suprir pelo poder
paternal ou pela tutela – 124. A “incapacidade” não é, em rigor, geral. Com efeito, o
A.127 apesar de epigrafado “exceções à incapacidade dos menores”, estabelece
termos tão amplos que inverte o dispositivo legal, por admitir uma lata capacidade.
Segundo o A.127º1 o menor pode celebrar:
º1.b – os negócios jurídicos próprios da sua vida corrente, ao alcance da sua
capacidade natural e que impliquem despesas ou disposições de bens de pequena
importância
Aqui a “pequena importância” deve ser prudentemente ponderada pelo
julgador, de acordo com o caso concreto e, particularmente, com a condição económica
do menor em jogo.
Em compensação, a grande maioria dos negócios que todos (maiores ou
menores) celebram são os “próprios da vida corrente” que implicam “despesas ou
disposições de bens de pequena importância”. A sua acessibilidade aos menores põe, só
por si, em crise a ideia de incapacidade geral de exercício.
Situações perante as quais os menores têm capacidade de exercício:
1. Capacidade para ser representante, desde que possa entender e querer o
negócio concretamente em causa – A.263
2. Capacidade para efeitos de responsabilidade civil, a partir dos sete anos –
A.488º2
3. Capacidade para adquirir por usucapião, sem limites -1281
(entre outras)

De fato, não se trata de verdadeiros desvio às regras “gerais” de capacidade.


Antes se verifica que o dispositivo nos A.122 e seguintes, aparentemente relativo à
incapacidade de âmbito genérico, só têm aplicação do domínio do Direito das
obrigações e no campo dos negócios mais significativos.
Uma regra geral de incapacidade é, ainda, inaplicável ao exercício de muitos
outros direitos, com o relevo para os direitos de personalidade e os direitos
fundamentais. O menor tem o direito à intimidade da vida privada, pelo menos a partir

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da adolescência. Além disso, ninguém pode dispor dos seus direitos à vida ou
integridade pessoal, invocando representação legal, salvo nos casos em que isso
imponha no interesse estrito do próprio menor
º1.c – os negócios jurídicos relativos à profissão, arte ou ofício que tenha sido
autorizado a exercer e os praticados no exercício dessa profissão, arte ou ofício
A celebração dos contratos de trabalho por menores está, hoje, muito
restringida: ela é possível desde que o menor tenha completado os 16anos de idade,
tenha concluído a escolaridade obrigatória e disponha de capacidades físicas e psíquicas
adequadas ao posto de trabalho – A.68º1 CT
º1.a – os negócios relativos à administração ou disposição de bens que o menor de
dezasseis anos tenha adquirido pelo seu trabalho.

O poder paternal (ou responsabilidades parentais)


Segundo o A.124, a incapacidade dos menores é suprida pelo poder paternal e,
subsidiariamente, pela tutela. Trata-se de dois institutos próprios do Direito da família,
de cujos princípios e teleologia comungam.
O poder paternal corresponde, na realidade, a um conjunto multifacetado de
direitos e poderes funcionais, todos a exercer no interesse dos filhos e que engloba –
A.1878º1
1. Velar pela sua segurança
2. Velar pela sua saúde

3. Prever ao seu sustento


4. Dirigir a sua educação
5. Exercer a sua representação
6. Administrar os seus bens
Quanto ao “poder de representação” do A.1881º1, ele compreende o “exercício de
todos os direitos e o cumprimento de todas as obrigações do filho, excetuados”:
1. Os atos puramente pessoais, com relevo para os de natureza familiar

2. Os que o menor possa praticar pessoal e livremente, como sejam os das


“exceções” do A.127 e toda a restante massa de atos que escape o Direito
contratual

3. Os que se reportem a bens cuja administração não caiba aos pais


De facto, o grosso da representação legal tem a ver com a administração dos bens
dos filhos. Além disso, ela inclui-se na lógica global do poder paternal, como um todo
Na constância do casamento, o poder paternal (exercício das responsabilidades
parentais) pertence a ambos os pais – A1901º1. Se um dos pais praticar um ato que

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integre o exercício desse poder, presume-se que age com o acordo do outro, salvo se a
lei exigir o consentimento de ambos ou se se tratar de um ato de especial importância
– A.1902º1. Estando um dos pais impedido, o exercício cabe unicamente ao outro
progenitor – A.1903 – o mesmo se observando na hipótese da viuvez – A.1904.
Nos casos de divórcio, separação judicial de pessoas ou bens, declaração de
nulidade ou anulação de casamento, o poder paternal é regulado por acordo dos
progenitores, a homologar pelo tribunal, em função dos interesses do menor; não
havendo acordo, o tribunal decide em função dos mesmos interesses – A.1905.
Quando o filho seja confiado a uma terceira entidade, cabem a esta os poderes e
deveres dos pais que forem exigidos pelo adequado desempenho das suas funções –
A.1907º1. Os outros aspetos são tratados nos A.1908 e ss, havendo, neste tema,
bastante casuística. A regulação do poder paternal deve ser feita tendo em conta os
interesses do menor.
O poder paternal pode ser inibido ou limitado, nos termos dos A.1913 e ss
A inibição opera de pleno direito – portanto, automaticamente – nas hipóteses do
A.1913º1: i) condenação por crime a que a lei atribua esse efeito e ii) interdição ou
inabilitação por anomalia psíquica. Esta pode ocorrer, ainda, por ação específica a tanto
destinada, quando os pais infrinjam culposamente os deveres para com os filhos, com
grave prejuízo para estes – A.1915º1
As decisões relativas ao poder paternal estão sujeitas a registo obrigatório,
devendo ser oficiosamente comunicadas à repartição do registo civil competente –
A.1920ºB
A adoção dá azo, igualmente, ao poder paternal. Estes mecanismos funcionam
sempre e beneficiam o menor.

155. A tutela
A tutela é subsidiária em relação ao poder paternal -A124. Segundo o A.1921º1,
o menor está obrigatoriamente sujeito a tutela:

a. Se os pais houverem falecido


b. Se estiverem inibidos do poder paternal quanto à regência da pessoa do filho
c. Se estiverem há mais de 6 meses impedidos de facto de exercer o poder
paternal
d. Se forem incógnitos
Como meio destinado a suprir o poder paternal, a lei prevê ainda o regime de
administração de bens, quando os pais estejam excluídos de o fazer ou quando a
entidade que designar tutor indique outra pessoa para o fazer – A.1922
A tutela pode ser oficiosamente promovida – A.1923, sempre no interesse do
menor. Ela é exercida pelo tutor e pelo conselho de família – A.1924º1. O tutor será

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designado pelos pais ou pelo tribunal de menores – A.1927. Pelos pais, para o caso de
virem a falecer ou de se tornarem incapazes – A.1928º1; pelo tribunal, nos restantes
casos – A.1931º1.
Posto isto, a lei prevê:
1. Inibições: pessoas que não podem ser nomeadas tutoras, segundo a lista do
A.1933º1
2. Escusas: pessoas que podem escusar-se da tutela – A.1934º1

O tutor tem os direitos e as obrigações dos pais, com determinadas modificações


e restrições – A.1935º1; devendo, aqui, exercer o encargo com a diligência do bom pai
de família.
A lei regula, depois, diversos aspetos patrimoniais atinentes à atuação do tutor –
A.1936 e ss
A tutela termina por alguma das causas enunciadas no A.1961: maioridade, salvo
o A.131, emancipação, salvo o A.1649, adoção, termo da inibição do poder paternal,
cessação de impedido dos pais ou estabelecimento de maternidade ou paternidade.
Finalmente: não havendo condições para exercer a tutela, o menor é confiado à
assistência pública, sendo as funções de tutor exercidas pelos diretores do
estabelecimento público … A.1962º

156. A anulabilidade
Os atos jurídicos praticados pelos menores são anuláveis. Os A.125 e 126
estabelecem um regime especial de anulabilidade: donde a necessidade de ressalvar,
logo no A.125º1, o disposto do A.287º2, que permite invocar a anulabilidade a todo o
tempo, enquanto o negócio não estiver cumprido.
A anulabilidade em causa é estabelecida no interesse do menor. Como tal, ela
só pode ser invocada pelo próprio menor ou pelo representante – A.287º1: e nunca
pela contraparte
Assim, a anulabilidade pode ser alegada pelo progenitor que exerça o poder
paternal, pelo tutor ou pelo administrador de bens, nas seguintes circunstâncias do
A.125º1 a):
1. Dentro do prazo de um ano a contar do conhecimento que o requerente
haja tido do negócio
2. Nunca depois de menor atingir a maioridade ou ser emancipado, altura,
naturalmente, em que ao próprio caberá agir, salvo se estiver pendente
ação de interdição

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A anulabilidade pode ainda ser invocada pelo próprio menor, no prazo de um


ano a contar da maioridade ou da emancipação – A.125º1, b). Pode, também, sê-lo
por qualquer herdeiro do menor, no prazo de um ano a contar da morte deste, desde
que ocorrida antes de expirado o prazo para o próprio menor a poder invocar –
A.125º1 c)
O menor não pode invocar a anulabilidade quando tenha usado de dolo para
se fazer passar por maior ou emancipado – A.126. O dolo aqui referido corresponde a
“.. qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência
de induzir ou manter em erro o autor da declaração” – A.253º1. Exige-se, como é óbvio,
que tal “artifício ou sugestão” sejam eficazes para produzir o engano quanto à idade do
menor. Na prática normalmente trata-se de um documento falsificado onde consta a
idade. O A.126 corresponde a um afloramento da locução Tu Quoque.
O A.125/1ºc permite, como vimos, aos herdeiros do menor invocar, em certos
prazos, a anulabilidade. Pensamos que não poderão fazê-lo quando o próprio menor
esteja incurso no A.126: dolo quanto à idade ou emancipação.
Já nenhuma razão existe para que o representante legal do menor doloso não
possa invocar a anulabilidade, aos prazos que lhe competem: estamos agora fora do Tu
Quoque
A anulabilidade em causa é sanável, nos termos gerais, mediante confirmação
– A.288º1. O A.125º2 procede à adaptação da regra:
1. A confirmação pode ser feita pelo menor, depois de atingir a maioridade
ou ser emancipado´
2. Pode ainda ser levada a cabo pelo seu representante legal que tivesse
podido praticar o próprio ato em jogo

A solução da mera anulabilidade dos atos dos menores, vício que,


além disso, apenas o próprio menor ou o seu representante podem
invocar, traduz uma solução presente no Código de Seabra; a tal nulidade
relativa ??????
No fundo, os atos praticados pelos menores tendem para a validade. Em
virtude da preocupação do Direito pelos jovens, permite-se um esquema da
“impunidade”: se o negócio se revelar desfavorável, o menor (ou o seu representante)
pode alijá-lo. Quem contrate com um menor assume, pois, o risco do negócio.

157. A maioridade e a emancipação


A denominada “incapacidade” dos menores cessa quando atinjam a
maioridade ou sejam emancipados, salvo as restrições da lei.
A maioridade atinge-se aos 18 anos – A.112 e 130.

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Contudo, estando pendente, contra o menor, ação de interdição ou de


inabilitação, o poder paternal ou a tutela mantêm-se até ao transito em julgado da
sentença – A.131
A incapacidade do menor cessa, também, pele emancipação. A pessoa
emancipada conserva-se menor: “menor emancipado”, conquanto que, em princípio,
com capacidade de exercício de direitos.
A idade núbil é fixada em 16 anos, pelo A.1601ºa)
Contudo, o casamento de menores requer a autorização dos pais que exerçam
o poder paternal ou do tutor – A.1612º1 – podendo a falta de autorização ser suprida
pelo conservador do registo civil, perante razões ponderosas – idem, nº2. Casando, dá-
se a emancipação – A.132
Se, porém, o menor casar sem autorização ou sem o seu suprimento, o
casamento é valido. Simplesmente “continua a ser considerado menor quanto à
administração de bens que leve para o casal ou que posteriormente lhe advenham
para o título gratuito até à maioridade” – A.1649º1
Este dispositivo é ressalvado pelo A.133, que atribui ao menor emancipado
“plena capacidade de exercício de direitos”

A interdição e a inabilitação
161. A interdição
O CC veio ocupar-se das interdições – A.138 a 151 – e das inabilitações – A.152
a 156 – em duas distintas subseções, uniformizadas, com a menoridade, sob a genérica
designação de “incapacidades, tratando-se, a meu ver, um ponto de eventual reforma
legislativa.
O CC não define a interdição; contudo pode extrair-se a ideia dos A.138 e 139
de que se trata do instituto aplicável a maiores que, por anomalia psíquica, surdez-
mudez ou cegueira, se mostrem incapazes de governar suas pessoas e bens,
equiparando-o, com as necessárias adaptações, ao menor.
A lei refere, como deficiências conducentes à interdição, a anomalia psíquica, a
surdez-mudez ou a cegueira. Trata-se de uma enumeração que temos como
exemplificativa e que aqui surge por razões de tradição histórica, que remonta aos
romanos. O que é decisivo é o facto de os visadores se mostrarem “incapazes de
governar as suas despesas e bens” – A.138º1, in fine. Se compararmos esse preceito
com o A.152, referente à inabilitação, verificamos que este último considera as
mesmas “anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira”; permanentes mas não tão
graves que justifiquem a interdição: a pedra de toque está, pois, na gravidade da
deficiência e nas suas consequências.

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Em compensação – e deixando de lado a prodigalidade – o A.152 refere o


(ab)uso de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes que deixe o visado incapaz de
reger convenientemente o seu património
Contudo, estas circunstâncias poderão reconduzir à interdição, dependendo da
concreta gravidade registada. O alcoolismo crónico e a toxiconomia incurável podem
ser convolados para “anomalias psíquicas”
É de notar que, em regra, a surdez-mudez e a cegueira não conduzem hoje em
dia à interdição, uma vez que não implicam a incapacidade para reger a sua pessoa e
bens. O A.141 DO CPC rege este regime. Ver!!
Para a interdição são competentes os tribunais comuns – A.140; aqui, perante
estes tribunais, há que seguir o processo especial regulado nos A.944 a A.958 do CPC´
A interdição pode ser requerida pelo cônjuge do interditando, pelo tutor ou
curador deste, por qualquer parente sucessível ou pelo Ministério Público – A.141º1
Na petição inicial devem ser mencionados os factos relevados i) dos
fundamentos invocados, ii) o grau de incapacidade e iii) as pessoas que, segundo os
critérios legais, devam compor o conselho da família, e exercer a tutela (ou a curatela,
tratando-se de inabilitação) – A.944 do CPC. É admissível a intervenção espontânea de
interessados.
A lei admite que a interdição possa ser requerida dentro do ano anterior à
menoridade, para produzir efeitos quando o menor se torne maior – A.138º2. Nessa
altura, apenas os progenitores que exerçam o poder paternal ou o Ministério Público
têm legitimidade para requerer a interdição – A.141º2

O A.143º1 indica a ordem pela qual a tutela é deferida:


1. Ao cônjuge, salvo se estiver judicialmente de pessoas e bens ou separado de
facto por culpa sua ou se for, por outra causa, legalmente incapaz
2. À pessoa designada, em testamento ou em documento autenticado ou
autêntico, pais ou pelo progenitor que exerça o poder paternal
3. A qualquer dos progenitores do interdito, que o tribunal escolha de acordo com
o interesse do mesmo
4. Aos filhos maiores, preferindo o mais velho, salvo se o tribunal, ouvido o
conselho da família, entender que algum dos outros dá maiores garantias de
bom desempenho do cargo.
Quando a tutela recaia no pai ou na mãe, estes exercerão o poder paternal, nos
termos do A.1878 e ss – A.144. Não oferecerá dúvidas a hipótese de esse poder ser
exercido conjuntamente pelos dois, nos termos do A.1901º. O facto de a tutela recair
sobre uma pessoa não exclui que – especialmente havendo conflito de interesses – a
representação, para certos atos possa incumbir a outra, particularmente ao produtor.

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O A.146 rege a escusa da tutela e a exoneração do tutor: o cônjuge do interdito


bem como os seus descendentes ou ascendentes não podem escusar-se da tutela nem
dela ser exonerados, salvo violação do A.143 – A.146. Contudo, os seus descendentes
podem ser exonerados, a seu pedido e ao fim de cinco anos, se existirem outros
descendentes igualmente idóneos – A.146º2
É bom transcrever o A.954º1 do CPC:
“A sentença que decretar, definitiva ou provisoriamente, a interdição ou
inabilitação, consoante o grau de incapacidade do arguido e independentemente de
se ter pedido uma ou outra, fixará, sempre que seja possível, a data do começo da
incapacidade e confirmará ou designará o tutor e produtor ou o curador e, se for
necessário, o subcurador, convocando o conselho de família, quando deva ser ouvido”
Quanto à data do início da incapacidade, ela constitui uma presunção de facto da
existência dessa incapacidade, num útil elemento para os efeitos da anulação de um ato
jurídico praticado em data posterior; poderá haver intervalos de lucidez: caberá aos
interessados na manutenção do ato provar essa eventualidade e demonstrar que a
realização do ato acorreu num desses intervalos.

162. Os atos do interdito e a natureza do instituto


A lei ocupa-se com pormenor do valor dos atos do interdito. Trata-se de um
ponto importante pois vem interferir com as respetivas expetativas criadas por
terceiros.

Tradicionalmente, entendia-se que a interdição jogava em defesa dos


interesses do próprio interdito e dos seus sucessores. O A.145 comete ao tutor o cuidar
especialmente da saúde do interdito, podendo, para o efeito, alienar os bens deste,
obtida a necessária autorização do tribunal. Este preceito parece-nos decisivo, pois
embora pensada no interesse do sucessor e família, a interdição é um instituto
assistencial do próprio visado. Todas as dúvidas e conflitos de interesses devem ser
solucionados no sentido que, in concreto, a estes se mostrem mais favoráveis
Segundo o A.148 são anuláveis os negócios jurídicos celebrados pelo interdito
depois do registo da sentença de interdição definitiva. Simplesmente, o A.139
remetera para a incapacidade dos menores. Pergunta-se se as “exceções” que a lei
contempla para os menores (portanto, as do A.127) são aplicáveis ao interdito. Atento
o interesse destes, a resposta é positiva, dependendo do concreto estado interdito,
não há razão para não o admitir a celebrar negócios da vida corrente, que estejam ao
seu alcance
Pela mesma ordem de ideias, deve-se entender que a anulabilidade dos atos do
interdito equivale à “anulabilidade especial” dos menores – A.125. Ela só pode ser
invocada pelo representante legal do interdito ou, teoricamente, pelo próprio
interdito, no prazo de um ano contado do levantamento da interdição.

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Antes da interdição definitiva e do seu registo, pode justificar-se a tomada de


providência provisórias – A.142. Tais medidas também estão referidas no A.953 do CPC,
podendo incluir:
1. A nomeação de um tutor provisório, que pratique em nome do
interditando os atos necessários, com a autorização do tribunal;
2. O decretamento da interdição provisória, quando haja que providenciar
quanto à pessoa do interditando ou dos seus bens
Isto dito, cabe apreciar o seguinte:
1. Os atos praticados pelo interditando no decurso da ação, depois de
enunciada a sua propositura, são anuláveis, desde que a interdição venha
a ser efetivamente decretada e se mostre que o negócio causou prejuízo
ao interdito – A.149º1; o prazo para a anulação só começa a correr a partir
do registo da sentença – A.149º2
2. Os atos praticados pelo interdito antes de enunciada a proposição da ação
é aplicável o disposto acerca da incapacidade acidental – A.150

A interdição pode, assim, ter influência em atos praticados antes da sentença.


Justifica-se, deste modo, que morrendo o arguido no decurso do processo, mas depois
de realizados o interrogatório e o exame, possa o requerente pedir que a ação
prossiga, para o efeito de se verificar a incapacidade alegada existia e desde quando –
A.957º1 CPC. Não há, por isso, habilitação dos herdeiros do falecido, prosseguindo a
causa contra quem nela representava – nº2. Assim, trata-se de um caso interessante de
pós eficácia da personalidade jurídica???????????

163. A inabilitação
Ela visa pessoas cuja anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira, embora
permanentes, não sejam de tal modo graves que justifiquem a sua interdição –
A.152º1. A inabilitação aplica-se ainda àqueles que, pela habitual prodigalidade ou
pelo ab(uso) de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes, se mostrem incapazes de
reger convenientemente o seu património – A.152º2

Ao pedido de inabilitação e ao decurso do processo aplicam-se,


subsidiariamente, as regras da interdição – A.156. O CPC trata isso nos 944 e ss,
cabendo ressalvar aqui que o juiz pode optar pela interdição ou pela inabilitação,
independentemente de lhe ser pedida uma ou outra – A.954º1 do CPC
A inabilitação não conduz a uma incapacidade geral: antes se reporta a
determinados atos ou categorias de atos. Por isso, a sentença que a decrete deve
especificar os negócios que devam ser autorizados ou praticados pelo curador – 954º2
CPC
Surge-nos assim o curador.

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No domínio da inabilitação, cabe ao curador assistir ao visado. O seu papel é


fundamentalmente autorizar “os atos de disposição entre vivos e todos os que, em
atenção às circunstâncias de cada caso, forem especificados na sentença” – A.153º1.
Na falta de autorização os atos praticados pelo inabilitado são anuláveis: é o que
resulta do A.148, aplicável ex vi A.156.
A autorização do curador pode ser judicialmente suprimida – A.153º2, havendo
que seguir os A.1425 e ss do CPC.
Contudo, o sistema de inabilitação é especialmente flexível: ele permite que o
juiz coloque a administração do património do inabilitado, no todo ou em parte, sob
o curador – A.154º1. Segue-se, então, um princípio de representação pelo curador, num
esquema semelhante ao da tutela: constituição do conselho de família, designação de
um dos vogais como subcurador e obrigação de prestação de contas, pelo curador –
A.154/2 e 3.
A especial diferença entre a interdição e a inabilitação mantém-se, nessa
altura, no domínio das situações de natureza pessoal; o curador – ao contrário do tutor
– não pode tomar quaisquer medidas no tocante ao inabilitado, o qual se conserva
livre, na esfera pessoal.
A inabilitação é levantada quando cesse a causa que a determinou – A.151 e
156. Todavia, quando advenha de prodigalidade ou do abuso de bebidas alcoólicas ou
estupefacientes, o seu levantamento só será deferido quando decorram cinco anos
sobre o trânsito em julgado da sentença que a haja decretado ou da decisão que tenha
desatendido um pedido anterior de levantamento – A.155
Quis o legislador civil certificar-se, quanto possível, o não haver o perigo de uma
recaída.
Antes o instituto funcionava em defesa do cônjuge ou dos herdeiros do
pródigo. Isso desapareceu com o A.152: a inabilitação por prodigalidade opera, hoje
em primeira linha, em defesa do próprio;; reflexamente: no dos herdeiros e familiares
do pródigo.
A lei não define prodigalidade: apenas se refere a incapacidade de “reger
convenientemente o seu património”. Com recurso a essa fórmula e jurisprudência,
podemos avançar que a prodigalidade resulta não de despesas elevadas em relação
aos rendimentos, mas de despesas injustificadas e reprováveis, que ponham em causa
o capital ou os seus bens de que provêm os rendimentos. Deve, em suma, ser feita uma
avaliação fortemente negativa quanto à gestão do pródigo, num juízo de Direito. Tal
juízo formar-se-á em função de factos que ao autor cabe levar ao processo,
demonstrando-os.
A regra básica do nosso sistema é a da liberdade económica. Por isso, a
inabilitação dos pródigos deve operar perante efetivas anomalias de comportamento;
não, apenas, perante maus negócios.

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O Termo da Personalidade
A morte
165. A comoriência
A morte de uma pessoa é constatada pelo seu cadáver. E o momento da morte
deriva da precisa ocasião em que tenham cessado as funções vitais e a atividade
do tronco cerebral. A determinação deste momento, é, assim, importantíssimo para
desencadear de diversos efeitos jurídicos.
Pode acontecer que várias pessoas morram em idênticas circunstâncias sem que,
concretamente, se possa apurar por que ordem. Esse fator poderia ser relevante,
em especial, tratando-se de pessoas sucessíveis entre si: o jogo das transmissões por
morte depende de quem sobreviva a quem.

Não sendo possível fazer a prova concreta da ordem dos falecidos, faz-se
presunções.

A comoriência tem como efeito prático o impedir quaisquer transmissões entre


os falecidos que ela envolva.

166. A morte declarada e a morte presumida


Em regra, a morte é declarada, atestada, como vimos, pelo médico. Todavia,
circunstâncias de ordem diversa podem levar a que não haja cadáver ou a que este
não possa ser encontrado.
Segundo o A.68º3, tem-se por falecida a pessoa cujo cadáver não foi
encontrado ou reconhecido, quando o desaparecimento se tiver dado em
circunstâncias que não permitam duvidar da morte dela.
Nessa eventualidade, a lei prevê um processo especial: para que não haja
dúvidas, a morte terá de ser declarada por uma entidade judicial, depois de
recolhidos todos os elementos. Falamos, por isso, em morte declarada.

Temos, finalmente, a hipótese de morte presumida, prevista nos A.114 e ss do


CC. Desta vez, o indício da morte advém apenas de uma ausência prolongada e sem
notícias, do visado.

As consequências da morte
O termo da personalidade jurídica
A morte há de ser algo inequívoco, mas não o : é diferente morrer aqui, nos EUA,
na China ou no Japão.
Classicamente, a morte era a falência cardiorrespiratória; no entanto, colocou-
se o problema do pense maker. Seguidamente houve uma alteração do critério: passou

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a designar-se por “morte indireta” – a cessação de todas as funções cerebrais, porque


se considerava que o cérebro tinha um papel central no organismo. Harvard, em 1969
criticou este estudo pelo utilitarismo.
James Bernard – teoria do organismo como um Todo
O mais importante passou a ser o tronco encefálico.

A morte de um ser humano equivale à supressão de uma pessoa singular, isto


é, de um centro autónomo de imputação de normas jurídicas.

A primeira consequência da morte é o termo da personalidade: A.68º1.


Efetivamente, o morto não pode ser destinatário de normas jurídicas nem, daí, titular
de direitos ou sujeito a obrigações. A morte envolve a cessação de quaisquer
titularidades ou adstrições ao falecido.
Podemos considerar a morte como um facto jurídico stricto sensu: um evento
não humano a que o ordenamento associa resultados jurídicos.
Efeitos que produz, no âmbito de Direito Privado, a morte:

1. Cessação da personalidade jurídica


2. Extinção dos direitos de personalidades, direitos pessoais e patrimoniais
3. A abertura da sucessão
No âmbito do Direito da Família, o casamento dissolve-se por morte, A.1788, o que
conduz à cessação das relações patrimoniais e pessoais entre os cônjuges – A.1688
Com isto, cessam os direitos à vida e à integridade física do falecido, por falta de
objeto. Também, neste sentido, os restantes deixam de se poder reportar a uma
pessoa e à especial dignidade que ela envolve. No entanto, toda a lei prevê uma tutela
post mortem. Aqui, é de notar que a personalidade cessa com a morte, sendo esta regra
de natureza absoluta (173 – a pós eficácia dos direitos de personalidade:
É de salientar que, mercê da autonomização dos direitos de personalidade, deu-
se a hipótese de estes manterem uma proteção mesmo depois da morte do titular,
ficando, neste caso, ainda alguns direitos de personalidade a produzir efeitos.
A.71
Cabe discernir, desde logo, as ofensas perpetradas antes da morte do visado e
depois dela. Quando a ofensa ocorra antes da morte, as consequências da violação
tomam corpo na esfera jurídica do ofendido, então vivo: a este compete agir. Quando
este o faça e a morte ocorra na pendência, cabe proceder à habilitação dos herdeiros.
Quando o não faça, uma de duas: ou o ofendido renunciou, com eficácia, à
atuação, ou nada faz. Na primeira hipótese, fica preludiada qualquer atuação
subsequente; na segunda, observa-se o A.71, na necessidade de prevenir conflitos de

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legitimidade, seja pre ou post mortem. O A.73, relativo ao direito ao nome, di-lo de
modo expresso, em termos que possa ser generalizado.
Vamos centrar-nos nas ofensas port mortem: importa distinguir os direitos de
personalidade que não possam ser eficazes, como o próprio direito à vida, daqueles
que representem bens perenes, como o direito ao nome, às cartas missivas, à imagem
e à reserva da vida privada
Quanto a estes últimos temos duas hipóteses:
1. Ou se trata de direitos de proteção absoluta – p.e, o bom nome – altura em que
qualquer violação desencadeia a legitimidade prevista no nº2
2. Se se tratar de direitos que admitem restrição, se for dada determinada
autorização – p.e: publicação de cartas – aplica-se, então, o nº3: só as pessoas
que, conjunta ou separadamente, tenham legitimidade para dar a autorização
em causa podem reagir perante a violação.
O A.71º2 dá legitimidade para requerer a tutela da personalidade, ao cônjuge
sobrevivo ou a qualquer descendente, ascendente, irmão, sobrinho ou herdeiro do
falecido. De forma a que este direito não seja paralisado, MC complementa-o com o
A.496º2, por patente analogia valorativa de situações, acrescentando-se os herdeiros.
A legitimidade prevista no primeiro daqueles preceitos assistirá, assim:
1. Ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos ou
outros descendentes
2. Na falta destes, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e
aos pais e outros ascendentes
3. Na falta destes, aos irmãos ou sobrinhos que os representem
4. Na falta destes, aos herdeiros do falecido. No limite o Estado.
Pergunta-se, depois, se a legitimidade conferida para a tutela post mortem diz
respeito, apenas às “providências adequadas” ou, também, ao pedido de
indemnização. Uma interpretação literal do A.71º2, º1ª parte, apontaria para a
exclusão da indemnização (Palma Ramalho adota esta posição literal); MC diz-nos
que esta posição acarreta dois equívocos:
1. O de que está em jogo a personalidade do falecido, que já nada pode
compensar
2. O de que o dinheiro é inadequado para resolver a situação.
De facto, já nada pode incomodar o falecido, por muito que se macule a sua
memória: a tutela post mortem é, necessariamente, uma defesa dos vivos. Não se
trata evitar atribuir indemnizações ao falecido, antes, iure próprio, aos familiares
legitimados para agir

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MC propõe a remissão em bloco, do A.71º2 para o A.70º2; i.e, as “providências


adequadas” são sempre possíveis “Independentemente da responsabilidade civil a
que haja lugar”
Finalmente, deparamo-nos com a bitola da violação e como ponderar as suas
consequências? Aqui deparamo-nos com quatro teorias:
1. A teoria da sensibilidade do falecido – a determinação da violação dos seus
direitos de personalidade deveria procurar reconstituir o que o próprio falecido
sentiria, se fosse vivo
2. A teoria da sensibilidade dos familiares vivos – apela para o atentado aos
sentimentos destes, mercê da ofensa feita ao ente querido desaparecido,
procurando, aqui, a lei, defender os direitos de personalidade do falecido
3. A teoria da ofensa da memória in abstrato – explica que não estão
propriamente em causa os direitos de personalidade do falecido, mas antes o
respeito devido à sua memória.
4. A teoria da memória in concreto – aceita a ideia do respeito devido à memória
dos mortos. Todavia, as quebras a esse respeito são sentidas pelos familiares
sobrevivos mais chegados. Aqui a bitola da violação não residirá na
sensibilidade do falecido ou dos familiares, mas antes no respeito concreto
pela memória daquele morto, tal como ele é sentido e sofrido pelos seus
familiares sobrevivos.

Contudo, apesar das doutrinas, a base da construção da tutela post mortem


será sempre constituída pela defesa in abstrato, da memória do falecido, tendo
esta, contudo, que ser complementada in concreto da situação efetivamente
registada. Assim, MC preconiza uma síntese entre a 3 e 4ª categoria.

A natureza da tutela post mortem


O A.71º1 surge contraditório quando tomado à letra: se os direitos de
personalidade gozam de proteção depois da morte do respetivo titular, como afirmar
que a personalidade deste cessou com a morte – A.68º1?
Há aqui três teorias:

1. Teoria do prolongamento da personalidade: a personalidade não se extingue


totalmente com a morte: a personalidade do defunto é que “empurrada” para
depois da morte (Diogo Leite de Campos)

Refutação MC: A manutenção da personalidade do falecido não pode ser


admitida; o falecido deixa de poder ser destinatário e beneficiário de regras
2. Teoria da memória do falecido como bem autónomo: a personalidade cessa
com a morte; o dispositivo não visa, portanto, a tutela dos direitos de
personalidade do falecido, mas um bem diferente: a sua memória (Oliveira
Ascensão)

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Refutação de MC: no máximo poder-se-ia tentar construir um dever geral do


respeito pelos mortos; contudo, como aferir que tal memória é, de facto,
ofensiva uma vez que não se pode recorrer às opções do falecido?
3. Teoria do direito dos vivos: a tutela em jogo visaria a proteção das pessoas
enumeradas no A.71º2, afetados por atos ofensivos à memória do falecido,
tendo estes direito à indemnização por danos morais e patrimoniais sofridos
(Mota Pinto e Carvalho Fernandes); MC concorda aqui.

Sujeitos de Direitos - entes suscetíveis de serem titulares de direitos (direito


subjetivo enquanto produto de uma norma jurídica permissiva) e obrigações
(resultado de normas impositivas e proibitivas), de relações jurídicas. A pessoa é o
centro de imputação de normas jurídicas. São-o as pessoas singulares e coletivas. Todo
o sujeito de Direito é necessariamente titular de facto de relações jurídicas; é pelo
facto de ser pessoa.
A personalidade jurídica traduz-se na aptidão autónoma para a titularidade de
relações jurídicas. Esta aptidão é nas pessoas singulares (seres humanos) uma exigência
do direito ao respeito da dignidade que se deve reconhecer a todos os indivíduos. Nas
pessoas coletivas, trata-se de um processo técnico de conexão das relações jurídicas
com um empreendimento coletivo.
Personalidade jurídica - aptidão para ser sujeito de relações jurídicas. A mesma
é inerente a capacidade de gozo de direitos. Consideramos assim a pessoa como um
ente capaz de direitos e obrigações. O artigo 67 traduz esta inerência da capacidade
jurídica à personalidade.

Fala-se em personalidade para exprimir a qualidade ou condição jurídica do ente


em causa - sendo que este pode não ter personalidade. Fala-se, por sua vez, de
capacidade jurídica para exprimir a aptidão para ser titular de um círculo restrito de
relações jurídicas - sendo que, apesar de ser sempre pessoa, pode ter-se um nivel maior
ou menor de capacidades.
Manuel de Andrade diz-nos que a mesma é a “ideoneidade ou aptidão para
receber - ou para ser centro de imputação - de efeitos jurídicos”
Por à personalidade jurídica ser sempre inerente a capacidade jurídica ou
capacidade de gozo de direitos, podemos considerar a pessoa como um ente capaz de
direitos e obrigações. Sendo que está consiste no A.67, i.e, estas serem “sujeitos de
quaisquer relações jurídicas”
Fala-se em personalidade para: exprimir a qualidade jurídica do ente em causa
Fala-se em capacidade jurídica para: exprimir a aptidão para ser titular de um
círculo de relações jurídicas

47. Capacidade jurídica e a capacidade para o exercício de direitos

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Capacidade de exercício / capacidade de agir – idoneidade para atuar


juridicamente, exercendo direitos ou cumprindo deveres, adquirindo direitos ou
assumindo obrigações, por ato próprio e exclusivo mediante um
……………………

50. Personalidade jurídica. Noção, começo e termo de personalidade. A


condição jurídica dos nascituros
Começo da personalidade jurídica – a personalidade jurídica é a aptidão para
ser titular autónomo de relações jurídicas. Segundo o A.66 “a personalidade adquire-
se no momento do nascimento completo e com vida”. Entende-se o nascimento
completo e com vida a separação do filho do corpo materno. A lei não exige qualquer
figura humana nem qualquer prazo de viabilidade mas que a criança “nasça
completamente e com visa”, ainda que não seja viável a sua sobrevivência. (p.202)

Capítulo IV – PESSOAS COLETIVAS EM GERAL


Secção 1- A personalidade coletiva
Na pureza dos princípios, apenas o ser humano pode ser destinatário de normas
jurídicas e, como tal, apenas ele pode encabeçar direitos e obrigações. Contudo,
historicamente falando foi desenvolvido o poder de várias entidades para, também,
encabeçarem direitos e obrigações. Pois bem: a pessoa singular é o ser humano; a
pessoa coletiva é toda a que não possa ser reconduzida a ser humano. Contudo, ainda
que substancialmente as coisas, os nomes, sejam idênticos, a maneira das coisas se
inserirem no espaço sobre o direito são diametralmente diferentes.
Quando o jurista invoca o conceito de pessoa coletiva, o mesmo não está sempre
a querer dizer o mesmo, pois os problemas para os quais ele usa o conceito vão-se
alterando. As várias possibilidades semânticas do conceito apontam para núcleos de
problemas. Nesta ambivalência de problemas na correta dependência da situação e do
caso, aparece-nos o exemplo do património que DEVE a pessoa coletiva, e do que ela é
DETENTORA. Como tal, temos de partir dos núcleos problemáticos: i.e, que problemas
concretos quero resolver quando invoco o conceito de pessoa coletiva

Evolução histórica:
Ø Os Romanos não tinham o conceito de pessoa coletiva, pois o conceito
metafísico e ontológico da pessoa coletiva não existia na antiguidade clássica.
Contudo, os mesmos resolviam os mesmos problemas em relação à pessoa
coletiva que nós hoje tentamos resolver
Ø Na tradição canónica houve vários pontos de evolução:

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• A invenção, nas escolas, do próprio conceito de pessoa, surgindo na


Teologia com dois problemas: o da trindade – em Deus existe uma única
natureza e três pessoas – e o problema cristológico – Cristo pode ser
pessoa e deus. Isto vai dar origem à união apostática do verbo
• Ideia de corpo místico – Como traduzir ontologicamente, do ponto de
vista do ser, i.e, a identidade da igreja
• Papa Inocêncio IV – Persona Ficta Et Representata – as realidades
patrimoniais que integravam a igreja eram, para o direito, como pessoas
ficcionais, representadas, e por isso sujeitas a um modo de atuação e
representação próprio e autónomo. Iniciou-se aqui a primeira dogmática
jurídica da pessoa coletiva
• Bártolo integra a figura do direito canónico para o direito civil
• No jusracionalismo a pessoa coletiva passou a ter um entendimento do
rácio a partir de um método racional: tudo o que não estava sujeito ao
método racional não era direito
• A Pandetística vai recuperar, por SAVIGNY, a ideia de Inocêncio IV, da
pessoa ficta, reeditando-a e criando a chamada “doutrina da ficção”: a
pessoa coletiva passou a ser uma pessoa ficcional que teve dois efeitos:
i) Porque é uma ficção não é nada
ii) …
• Rejeição da teoria da ficção e levantamento da primazia do realismo:
procurou-se dotar a pessoa coletiva de alguma realidade, e não sendo
esta uma mera ficção. VON GIERCHE: assim tal como existem pessoas
físicas, existem também nas sociedades organismos tao vivos como nós:
tal como nós formamos a nossa vontade segundo órgãos biológicos,
também as pessoas coletivas foram a sua vontade nos seus órgãos ->
Aparecimento da Teoria Orgânica, o que deu origem à Representação
Orgânica
• Para outros, a pessoa coletiva é um património, indo recuperar a ideia
canónica: o substrato da pessoa coletiva é um património de afetação
específica.
• Para Oliveira Ascensão, por exemplo, a pessoa coletiva é uma instituição.
• Para o neopositivismo a pessoa coletiva são um conjunto de normas, e
como tal partes do ordenamento jurídico
• Para o Realismo elas são uma realidade em si mas exclusivamente jurídica
• No Código de Seabra aparece-nos a pessoa coletiva
• PPV adota uma posição neo ficcionista, associando-a como uma pessoa
analógica
• Para MC é um modo coletivo de aplicação de regras: posição normativista
A unidade da pessoa coletiva alcança-se a partir dos seus núcleos problemáticos.
Apesar de o horizonte ser diferente, o problema e a resposta são o mesmo. Eu dialogo
com um jurista do séc. XIII e ambos partilhamos o mesmo problema e a mesma resposta,
apesar do seu modo explicativo de resolver o caso seja diferente.

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No fundo, a pessoa coletiva trata-se de uma contraposição à única pessoa que


realmente existe. Trata-se, por tal, como uma dogmatização. E por isso trata-se de um
centro de imputação de situações jurídicas que se distingue do outro que
eventualmente se poderia cogitar, o da pessoa singular.
Núcleos problemáticos:
1º Imputação
2º Responsabilidade

Quem atuou: de quem é a responsabilidade concreta pelos prejuízos


provocados.

A pessoa coletiva trás consigo uma periculosidade muito grande.


Marido e mulher não são uma pessoa coletiva autónoma, mas existem
coletivamente. A diferença reside aí e a razão tem que ver com a responsabilidade por
imputação. Por isso, NÃO CONFUNDIR PESSOA COLETIVA COM MODO COLETIVO DE
SITUAÇÕES JURÍDICAS.

As pessoas coletivas vão ter direito à vida, à morte, etc., porque são fenómenos
jurídicos.
Atualmente, não podemos desenvolver a nossa personalidade se não nos
relacionarmos com as pessoas coletivas. A pessoa singular não pode, atualmente, fazer
nada sem a pessoa coletiva.

Tipicamente o que está associado às pessoas coletivas é a segregação


patrimonial: elas são centros de imputação de situações jurídicas onde, por detrás disso,
se esconde a segregação patrimonial.

A.601 – Pelas minhas dívidas respondem e só respondem os meus bens; só o que


é meu responde e responde tudo o que é meu. Mas por aquilo que é dos outros não
responde aquilo que é meu.

Pelas dívidas da pessoa coletiva responde o património da pessoa coletiva, pelas


dívidas dos associados só responde o património dos associados e não o da pessoa
coletiva.
O património dos associados nunca responde em primeira linha. Tenho
primeiramente de esgotar o da pessoa coletiva, e se este for insuficiente, então aí ir
buscar o dos sócios.
Princípio da tipicidade – atendendo aos perigos que elas representam, só posso
criar as pessoas coletivas que a lei permite. Nas pessoas coletivas há uma espécie de
intervenção legal da lei…
Órgãos das Pessoas coletivas:
1º O que administra

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2º O que fiscaliza – a pessoa coletiva é perigosa e por isso deve ter alguém que a
controle (fiscalização dentro da pessoa)
3º O que delibera
Quanto mais personificada é a pessoa coletiva, entre os sócios, mais intensos são
os poderes dos sócios.

Qual é a finalidade das Sociedades Comerciais? – A.160. Pode o escopo, a


finalidade das Sociedades, coincidir com atos de beneficência? Quais são os limites da
pessoa coletiva quanto ao seu fim?

Posição adotada
Referir em Direito “pessoa” é considerar a presença de uma entidade
destinatária de normas jurídicas e, portanto, capaz de ser titular de direitos subjetivos
ou de encontrar adstrita a obrigações. A afirmação da personalidade será, pois, a
consideração de que o ente visado pode autodeterminar-se, no espaço de legitimidade
conferido pelos direitos de que seja titular, devendo agir no campo das suas adstrições.
Isto quer dizer que, considerar “pessoa”, é sempre considerar um determinado campo
de imputação de normas e relações jurídicas. Ela é singular quando esse centro
corresponda a um ser humano; o será coletiva, em todos os outros casos.
As pessoas coletivas são, assim, “centros coletivos de imputação de normas
jurídicas” que não a de “pessoa”. Normas que atribuem direitos ou reconhecem
deveres, etc. A pessoa coletiva é sempre o resultado de um determinado regime
jurídico.
Elementos da pessoa coletiva:
1. Substrato humano – caso, patente, p.e, nas associações civis; não é sempre
necessário: caso da fundação
2. Elemento organizacional/ institucional – nas associações civis, traduz-se em
haver órgãos
3. Elemento finalístico/final – ela serve para prosseguir um determinado fim,
um fim que é humano.

Secção II – Pessoas rudimentares e figuras afins –


A ideia de personalidade coletiva era classicamente apresentada como de cariz
qualitativo: bastaria a suscetibilidade de ser titular de um único direito ou adstrito a uma
única obrigação para se falar de pessoa coletiva.
Paulo Cunha teorizou o conceito de pessoas rudimentares, propondo, que ao
lado das pessoas coletivas propriamente ditas haveria que apontar a categoria das
pessoas rudimentares. As pessoas rudimentares tratar-se-iam de realidades a quem a

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lei recusaria a titularidade de direitos civis, admitindo-lhes apenas direitos processuais.


Aqui surgiram duas formas de encarar o problema:
1. A teoria tradicional – os “direitos” e demais posições jurídicas deveriam ser
imputados às pessoas singulares que constituíssem o ente questionado
2. A teoria da “capacidade parcial” – o ente questionado seria “pessoa” para
certos efeitos

A personalidade judiciária
O A.5/1 do CPC define a personalidade judiciária como a suscetibilidade de ser
parte. O nº2 explicita que quem tiver capacidade jurídica tem, igualmente,
personalidade judiciária. A contrário, poderá haver entidades com personalidade
judiciária mas sem personalidade jurídica – A.6 do CPC.

As personalidades económica, laboral e tributária


A personalidade económica traduz a aptidão que determinadas entidades
tenham de ser destinatárias de regras de direito da económica e de Direito patrimonial.
A empresa ruge como uma pessoa rudimentar: em todos os casos em que seja
destinatária formal de regras de Direito, sem assentar num ente personalizado. Caso a
caso e regra a regra haverá que determinar o alcance da personalização.
No campo fiscal surge a noção de personalidade tributária: a qualidade de se ser
sujeito passivo da obrigação de imposto

Pessoas coletivas em formação e em extinção


A pessoa coletiva retira a personalidade de um ato formal. Todavia, na ordem
normal das coisas, a pessoa coletiva prossegue objetivos práticos, surgindo dotada de
um substrato: de uma organização, pessoas que a sirvam, bens de afetação e um
objetivo geral. Esse substrato põe-se em ação antes do ato formal atributivo da
personalidade. Contudo, o substrato pode também advir depois do ato formal que, em
sentido contrário, visa a extinção da pessoa coletiva, vindo, em pleno, suprimir a
personalidade. Neste caso, o Direito reconhece a este substrato determinadas
potencialidades, enquanto sujeito de direito; este regime está regulada no Código das
Sociedades Comerciais – A.36 a 40.

As sociedades civis puras representam o tipo básico: a atuação conjunta de duas


ou mais pessoas para um objetivo económico que não seja de mera fruição – A.980.
Quer isto dizer que, no decurso da formação de um ato coletivo e antes de alcançada a
personalidade, havendo logo uma atuação dos interessados, cai-se nesse tipo. A própria
sociedades civil pura é – ou pode ser – uma pessoa coletiva rudimentar
Perante associações ou fundações em formação o problema resolver-se-á com
recurso aos A.195 e ss: associações sem personalidade jurídica e comissões especiais,
tratando-se de uma nova espécie de pessoa rudimentar

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A pessoa coletiva em extinção sofre uma evolução na personalidade,


equivalendo ao que temos vindo a designar por “pessoa rudimentar. Assim, com a
extinção deveria desaparecer o ente coletivo. Todavia, há que praticar os atos
conservatórios e os necessários, procedendo-se, ainda, às diversas operações de
liquidação – A.166º1, 184º1 e 194 do CC.
A transição da personalidade para a não personalidade não se faz de modo
brusco; há um processo no decurso do qual o ente autónomo vai perdendo a sua
existência. Neste processo, a personalidade rudimentar é útil para a comunicação desse
fenómeno.

Associações não reconhecidas, comissões, sociedades civis e


sociedades irregulares
Como novas hipóteses de pessoas rudimentares surgem-nos as associações não
reconhecidas, as comissões, as sociedades civis e as sociedades irregulares. As
associações não reconhecidas, as comissões e as sociedades civis têm personalidade
judiciária – A.6º b e c do CPC. As sociedades irregulares podem tê-la, por via da alínea d)
e, em geral, sempre que deem azo a um património autónomo – alínea a)
A associação sem personalidade dispõe de um fundo comum. Embora,
teoricamente, esse fundo esteja na titularidade de cada um dos associados, nenhum
deles pode exigir a sua divisão – A.196º2 – tal como nenhum credor dos associados o
pode fazer excutir – idem. As liberalidades feitas a favor de associação, embora
considerando-se feitas aos associados – A.197º1 – acrescem ao fundo comum –
A.197º2. Quanto ás comissões especiais: os fundos angariados devem ser afetos ao fim
enunciado, sendo os membros da comissão pessoal e solidariamente responsáveis pela
sua conservação – A.200º1

Em suma: mesmo em termos substantivos, há um modo coletivo de


funcionamento, fazendo, sim, sentido a referência a “pessoas rudimentares” no caso
das associações “sem personalidade”.

Quanto a sociedades civis puras umas são pessoas coletivas plenas, e outras
acolhem a figura de personalidade rudimentar.

As sociedades irregulares que não tenham personalidade coletiva caem nos A.36
ou A.52 do CSC. Elas produzem, ainda, alguns dos efeitos próprios da personalidade, seja
por remissão para as sociedades civis puras, seja por reenvio para um regime de
liquidação. A personalidade rudimentar é, sempre, a figura explicativa geral.

Esferas e patrimónios de afetação


Serão pessoas rudimentares as esferas jurídicas e os patrimónios de afetação.
Isto é: os conjuntos de direitos e obrigações que, em vez de estarem unificados em
função de uma titularidade unitária, o estejam por força de afetação que os una. O
exemplo mais claro é o da empresa. Ou seja: os bens e os deveres que constituem,
juridicamente, uma empresa, podem ou não pertencer ao mesmo sujeito; aqui, ainda,

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da mesma forma que uma única pessoa pode deter mais de uma empresa. A asserção
opera apenas por via do destino produtivo unitário.
A empresa, quando tomada em sentido subjetivo, operará como uma esfera de
afetação que, não se encontrando personalizada, dá corpo a uma “pessoa rudimentar”.
Da mesma forma opera o estabelecimento.

Figuras Afins
A chave da personalidade coletiva reside no modo coletivo de regulação jurídica.
O Direito determina condutas a entidades que, não sendo humanas, nunca as poderiam
acatar; todavia, tais regras são imputadas ao “ente coletivo”.
Quando o modo coletivo atinja toda a entidade considerada, teremos uma
pessoa coletiva. Quando ele apenas atinja parcialmente teremos, ou falaremos, em
pessoa rudimentar.
Contudo, uma 3ª categoria: a de situações em que o Direito trata, em conjunto,
realidades atinentes a várias pessoas, sem, todavia o fazer total ou parcialmente, sem
todavia o fazer como se de uma única pessoa se tratasse. Falaremos, aqui, em modo
coletivo imperfeito, sendo que as entidades daí decorrentes constituirão figuras afins às
pessoas coletivas. Este modo coletivo imperfeito está previsto no A.28 do CPC.

A mão-comum e a comunhão
De entre as figuras afins da personalidade coletiva encontramos a mão-comum
ou comunhão e a comunhão simples.
Na comunhão em mão-comum, duas ou mais pessoas detêm um direito em
conjunto, podendo exercer atuações restritas enquanto membros do grupo. Toda a
sua atuação passa pela mediação do grupo, não podendo estas dispor da sua parcela
ou pedir a divisão da situação.
Na comunhão simples duas ou mais pessoas são titulares de direitos sobre o
mesmo objeto, sendo esses direitos representados por quotas. A matéria vem a ser
tratada a propósito da compropriedade – A.1403 e ss – sendo aplicáveis a outras formas
de comunhão – A.1404. Embora hajam direitos que só em conjunto possam ser usados,
cada titular mantém uma individualidade, podendo alienar a sua quota ou pedir a
divisão da coisa.

Na administração da coisa há que recorrer às regras da sociedade – A.1407º1 –


o que acentua uma aproximação às pessoas rudimentares.

Secção III – Classificações de pessoas coletivas


Critérios de classificação

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As pessoas coletivas obedecem a regras que, dentro de certos limites, ditam a


sua conformação interna, o seu modo de atuar e o universo da sua atuação. Não
obstante essas limitações, elas podem desenvolver as mais diversas atuações humanas,
dando corpo a várias técnicas de atuação
Podemos classificar as pessoas coletivas de tipo associativo em:
1. Associações
2. Sociedades
Consoante tenham ou não fim lucrativo

Pessoas coletivas públicas e privadas


Uma primeira classificação separa as pessoas coletivas em públicas e privadas

….

Pessoas coletivas de utilidade pública


Algumas pessoas coletivas, de tipo associativo, prosseguem fins de interesse
público, devendo ser, devendo, ao Estado; sem prejuízo para estas pessoas da sua
natureza privada.
No Direito atual o interesse coletivo é prosseguido com recurso às técnicas
privatísticas.

Pessoas coletivas nacionais, estrangeiras, internacionais e comunitárias


As pessoas coletivas são consideradas nacionais quando tenham a sua sede
principal e efetiva em território português – A.33º1 CC/ 3/1 Código S. Comerciais. Tal
não suceda, elas haver-se-ão como estrangeiras. Como tal, a sociedade que tenha a sua
sede estatutária em Portugal, não pode opor a terceiros a sua sujeição a uma lei
diferente da portuguesa – A.3º/1 e 2 do Código das Sociedades Comerciais
As pessoas coletivas dizem-se internacionais sempre que retirem a sua
personalidade de fontes internacionais, máxime de tratados ou convenções
internacionais. Estas são designadas por “organizações internacionais”.

As pessoas coletivas comunitárias retiram a sua personalidade de fontes do


Direito europeu. Caso do Banco Central Europeu

Pessoas coletivas associativas e fundacionais


Contraposição entre pessoas coletivas (que se relaciona com o seu substrato,
tendo sido aperfeiçoada por SAVIGNY):
1. Pessoas Coletivas associativas (de base corporacional ou corporações) - o
substrato é constituído por uma agremiação de pessoas, que juntam os seus
esforços para um objetivo comum.
2. Pessoas coletivas fundacionais (ditas fundações, de base fundacional, de base
institucional ou instituições) – o substrato redunda num valor ou num acervo de

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bens que potenciará a atuação da pessoa considerada; A.167 pelas associações,


e fundações civis, A.185 e ss
Contudo, podemos localizar pessoas coletivas que mais não traduzam do que
acervos objetivos personalizados e que, todavia, não sigam a forma fundacional, mas
antes a associativa: caso das sociedades unipessoais A.270 -A do CSComerciais.
Estas distorções explicam-se por duas ordens de ideias:
1. Pelo arcaísmo do regime atual relativo a fundações e que impede que estas
tenham fins diretamente lucrativos
2. Pela impressividade de tipo ideológico e de mercado que assume a referência a
“sociedades” e que leva à adoção da corresponde forma.
A contraposição entre pessoas associativas e fundacionais pode ser seguida entre as
pessoas coletivas públicas. Uma associação pública é uma pessoa coletiva de tipo
associativo, enquanto um instituto público ou empresa pública assumem natureza
fundacional. As pessoas coletivas de população e território assumem natureza mista.

Pessoas coletivas com e sem fins lucrativos


As pessoas coletivas propõe-se a desenvolver determinadas atividades, com um
objetivo. Quando esse objetivo se analisa na busca de lucros, a pessoa coletiva tem
fins lucrativos e, tendo base associativa, surge como uma sociedade.
Quando não assuma tal fim lucrativo, será uma associação, e, se não tiver natureza
associativa, uma fundação.
Assim, as sociedades são isoladas das restantes pessoas coletivas, pois estas têm
como objetivo geral a procura de lucro (elemento finalístico – têm sempre em vista
uma finalidade aquisitiva)
Contudo, nada impede que uma função puramente benemérita seja desenvolvida
por uma sociedade, especialmente quando for congeminada para esse fim.
Quanto ás pessoas sem fins lucrativos, é sempre desejável que elas disponham de
rendimentos próprios, normalmente obtidos através de atuações lucrativas. Assim, o
seu objetivo geral poderá ser lucrativo ainda que afetando os lucros a fins beneméritos.
Assim, o fim lucrativo não é apriorístico: ele não dita, de modo fatal, a posição
assumida pela pessoa coletiva em jogo

Pessoas coletivas comuns e especiais


À partida, a pessoa coletiva comum rege-se pelo regime mais genérico.

As pessoas coletivas especiais dependem de regras diferenciadas, particularmente


previstas para a categoria que elas integrem.

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Será comum, a associação que se reja, de modo direto, pelo CC; será especial a
associação de estudantes que, além do CC, se irá reger pela legislação específica relativa
a associações de estudantes.
Assim, infere-se que uma pessoa coletiva possa ser “comum” ou “especial”,
consoante o ângulo por que haja sido abordada.
Importância desta distinção: permite, quando faltem normas vocacionadas para
regular a pessoa “especial”, fazer apelo subsidiário às regras comuns.

Tipologia de Pessoas Coletivas Privadas


209. A tipicidade
Uma pessoa coletiva representa, ainda que por obra artificial do Direito, um
centro autónomo de imputação de normas jurídicas. Nessa qualidade, tem direitos e
assume deveres, podendo, como tal, praticar diversos atos jurídicos. Quais? Todos
aqueles que se mostrem convenientes para a prossecução dos seus fins e que a lei não
proíba. Esta, a pessoa coletiva, é também protegida, pois no tráfego jurídico qualquer
operador pode provocar-lhe danos, incorrendo nas competentes indemnizações.
Para evitar surpresas, o Direito determina, em abstrato, as formas que as pessoas
coletivas podem assumir. Tais formas são especialmente aplicáveis aos particulares
quando, ao abrigo das suas liberdades de associação, constituam pessoas coletivas: eles
deverão escolher um dos sistemas disponibilizados pela lei.
Fala-se em tipicidade das pessoas coletivas, particularmente das privadas, para
designar o princípio segundo o qual elas devem obedecer a uma das formas – dos “tipos”
– previstos na lei. Os tipos legais de pessoas coletivas contêm os aspetos fundamentais
do ente considerado e, designadamente:
- os órgãos essenciais
- o modo de representação
- o regime de responsabilidade por dívidas
- os elementos que devam, necessariamente, constar dos estatutos.

Este tipo não tem se ser referenciado pela lei, sendo apenas exigido que a lei o
preveja

Aqui a tipicidade não é fechada, no sentido de dever conter, de modo exaustivo,


todos os elementos atinentes ao tipo considerado. Terá, no entanto, de compor
contornos mínios, sob pena de facultar às pessoas interessadas a constituição das mais
díspares e inesperadas figuras.
Como todos os tipos de pessoas coletivas constam da lei, é possível identificá-los e
seriá-los: uma operação impossível se dominasse um puro princípio de liberdade dos
interessados.

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Uma segunda consequência é a impossibilidade, por analogia, de construir novos


tipos de pessoas coletivas. Numa área normativa dominada por um princípio de
tipicidade, não há lacunas, pois a analogia recorreria à lacuna para efeito.
A personalidade coletiva constitui um instituto perfeitamente integrado na lógica do
nosso sistema jurídico. As inerentes normas vão ao encontro das valorações de ordem
mais geral que animam o ordenamento. Verificados os componentes pressupostos, elas
têm aplicação analógica, devendo, no limite, ressalvar-se o sistema de fontes específico
das sociedades comerciais.

Associações, fundações e sociedades civis


No Direito Civil a trilogia clássica de pessoas coletivas é constituída pelas:
1. Associações – A.166 e ss
As associações dão corpo a uma manifestação civil básica do princípio da
liberdade de associação

2. Fundações – A.185 e ss
As fundações têm o sentido de entregas em vida ou de deixas por morte do
interessado

3. Sociedades Civis – A.980 e ss


As sociedades correspondem ao produto da celebração de contratos de
sociedade, apresentado formas multifacetadas

Isto não se trata de nenhuma classificação, mas apenas de um alinhamento de tipos.


As associações e as fundações poderiam ser tomadas como uma classificação básica
de pessoas coletivas, atinentes à sua estrutura ou ao seu substrato. As sociedades
obedecem a um critério diverso mas, sobretudo, a uma tradição muito distinta e mais
antiga: a societas.
A matéria das pessoas coletivas não obteve uma regulação unitária na sistemática
do Código, tendo isto estas relegadas para o A.980 referente aos contratos em especial

Sociedades comerciais: cooperativas


As sociedades comerciais dão hoje lugar a um ramo diferenciado do Direito: o
Direito das sociedades comerciais, presente, as sociedades comerciais e a sua definição
no A.1.º2 do CSC

Elementos Essenciais
A aplicabilidade dos requisitos do NJ
Os elementos essenciais da pessoa coletiva são aqueles cuja presença é
necessária para o seu surgimento.

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Uma pessoa coletiva privada tem, em princípio, sempre subjacente um ato de


constituição. O CC pressupõe esse ato: A.158º1 “associações constituídas por escritura
pública” p.e.
Aqui há duas teorias:
1. Teoria da norma – defendida pelos organicistas que via no ato constitutivo
uma “fonte autónoma e própria
2. Teoria do contrato – vê na constituição de uma associação um contrato de
constituição, de tipo organizatório; na de uma fundação um negócio
(unilateral) de tipo fundacional
Não oferece grandes dificuldades a afirmação da natureza contratual e negocial
do ato de constituição das associações (Carvalho Fernandes), quando levado a cabo por
particulares; a constituição de uma fundação assentará num negócio unilateral.
Voltando ás associações, há um encontro de vontades, dotadas de liberdade de
celebração e de liberdade de estipulação.
Quer a lei civil como a lei comercial consideram o ato constitutivo da sociedade
comercial como “contrato” ou “pacto social”, sendo aplicável a este ato constitutivo
alguns Artigos referentes ao NJ, como o A.280.

Ato constitutivo e estatutos: forma e interpretação


A impossibilidade da distinção entre o ato constitutivo e os seus estatutos. O CC
fala tanto em constituição de pessoas coletivas como, por vezes, em estatutos
Ato constitutivo -> Corresponde a uma ou mais declarações de vontade, nas
quais os seus fundadores se identificam, dando conta da sua vontade de constituir uma
determinada pessoa coletiva, e aprovam os seus estatutos.
Os estatutos têm a natureza do ato constitutivo: trata-se de um negócio fonte
de situações jurídicas, contratual ou unilateral.
Quer o ato constitutivo quer os estatutos das associações estão sujeitos a
escritura pública – A.168º1. A instituição de fundação, quando feita por atos entre vivos,
deve também constar de escritura pública – A.185º3
Interpretação e integração dos estatutos de acordo com A.9 e 10 do CC, por
analogia de situações.

Conteúdo necessário dos estatutos


Apesar de o CC não indicar o conteúdo necessário dos estatutos, é possível
reconstruir a matéria com base no A.167 e A.186
O que deve constar do “ato de constituição” e dos estatutos? O A.167º1 contém
uma série de elementos que, de acordo com a experiência comum, deveriam constar
dos estatutos e não, como resulta da letra, do “ato de constituição”.

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Contudo, podemos assentar que:


- do ato constitutivo devem constar elementos circunstanciais atinentes à
constituição da pessoa coletiva e aos intervenientes no ato
- dos estatutos deverão constar as regras que, para o futuro, vão reger o ente
coletivo, as suas relações com os associados e as destes entre si, bem como as relações
com terceiros.
O A.167º1 refere como elementos que devem constar dos estatutos das
associações:
- os bens ou serviços com que os associados concorram para o património social

- a denominação
- o fim
- a sede
- o seu funcionamento
- a sua duração

Como elementos eventuais, o º2 acrescenta:


- os direitos e deveres dos associados
- as condições da sua admissão, saída e exclusão
- os termos da extinção da pessoa coletiva
O A.186 relativo ás fundações é menos explícito: os estatutos destas podem ser
lavrados posteriormente, por pessoa diversa do instituidor. Todavia, ele dispõe, como
elementos necessários a indicar pelo instituidor, no própria ato da constituição:
- o fim da fundação

- os bens que lhe são destinados


Podendo, ainda, indicar:
- a sede
- a organização e funcionamento
- a sua transformação ou extinção

- o destino dos seus bens


As regras que se referem às fundações podem ser completadas com recuso ao
disposto sobre as associações

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A matéria da sede e da organização e funcionamento devem constar dos


estatutos, sejam eles elaborados pelo instituidor ou posteriormente. Além do mais,
nenhuma fundação pode ter personalidade coletiva sem uma designação.
Pode, contudo, que os estatutos não contenham algum dos elementos essenciais
apontados. Nessa altura ou é possível suprir a omissão, por recurso a interpretação ou
a um ato superveniente, ou a constituição da pessoa coletiva é nula, por
indeterminabilidade do objeto (ou conteúdo) do ato de que ela dependa. Qualquer
interessado poderá, nos termos do A.286, promover a declaração judicial de nulidade,
devendo o Ministério Público fazê-lo tendo em conta o A.158-A

Sistematização de elementos; animus personificandi?


Na base do conteúdo dos estatutos estão diversos elementos:
- Elemento Pessoal ou Patrimonial
Este elemento tem que ver com a necessidade de associados, nas
associações e de bens, nas fundações. O A.167º1 consigna o requisito dos associados,
referindo os “bens ou serviços com que os associados concorrem para o património
social
A associação dispensa patrimónios, assim como dispensa que os
associados para ele concorram. Indispensável é, sim, a existência de associados.
Contraprova fácil: o A.182/1 d) considera causa de extinção da associação o falecimento
ou desaparecimento de todos os associados; nenhum preceito liga a extinção da
associação à ausência de património.
Nas fundações, a insuficiência de bens justifica o seu não-
reconhecimento – A.188º2 – sendo a insolvência uma causa da sua extinção – A.192/1
ºC

- Elemento Teleológico
O fim da pessoa coletiva – A.167º1 e 186º1 – tende a ser considerado o
fator fundamental. O fim da pessoa vai aditar:
- a sua idoneidade
- a sua capacidade
- o seu reconhecimento útil público

- o tipo de atuação requerido aos titulares dos seus órgãos


Diferença: enquanto que uma pessoa vale por si, a pessoa coletiva deve
aferir-se em função do escopo em vista.
- Elemento Organizacional

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Este abrange um conjunto de fatores: a denominação, a sede, a orgânica


e a forma do seu funcionamento – A.162 a 165, 167º1 e 186º2. É ele que dá corpo ao
modo coletivo de aplicação das normas
Pergunta-se: sobre a existência de um elemento voluntário ou animus
personificandi. A pergunta por um animus é mais do que a comum indagação pelo papel
da vontade nos negócios.
A constituição das pessoas coletivas inscreve-se na autonomia privada, operando
quando se mostrem pelos interessados os requisitos necessários. A vontade está sempre
presente no desencadear de efeitos jurídicos tributários da autonomia.

Organização e funcionamento
O elemento organizacional é o fator base da personalidade coletiva: ele
consubstancia o modo coletivo de aplicação das normas, base da personalidade coletiva.
A organização e funcionamento de uma pessoa coletiva cobrem a generalidade da sua
compleição e dos seus modos internos de funcionamento. Considerando:
- a denominação e a sede -> a denominação da pessoa coletiva equivale ao nome
das pessoas singulares, tendo este uma natureza legal de identificação
- a orgânica
- os titulares dos órgãos e a sua responsabilidade

Os órgãos
Os órgãos das pessoas coletivas são as estruturas de organização humana
permanentes, que permitem à pessoa coletiva autodeterminar-se, exercer os seus
direitos e cumprir as suas obrigações.
Cumpre aos estatutos da pessoa coletiva determinar quais os seus órgãos e qual
a sua composição – A.162, A.167º1 e 186º2.
Nas associações haverá uma assembleia geral de associados – A.170 – órgão que
faltará, naturalmente, nas fundações.
Em matéria de órgãos, podemos identificar os seguintes princípios:
1. Divisão de poderes
2. Colegialidade
3. Livre aceitação
4. Responsabilidade
O A.162 aponta para a existência separada de um órgão de administração e de
um órgão de fiscalização. A ideia é a de cindir posições, dotando o órgão de fiscalização
de um distanciamento mínimo para ser eficaz.

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A lei impõe que os órgãos sejam colegiais. Previne-se a administração ou a


fiscalização por uma única pessoa: além da concentração de poderes que isso implica,
poderiam gerar-se situações de menor atenção e cuidado.
A livre aceitação não é explícita, mas resulta clara da área em que nos
encontramos. Salvo disposição em contrário – A.146º1 - não há obrigatoriedade jurídica
de aceitação de quaisquer cargos.
Finalmente, os titulares de órgãos são responsáveis, perante a pessoa coletiva.
Eles têm, para com ela, as obrigações que resultem da lei e dos estatutos – A.164º1 –
sendo responsáveis pela sua violação. Aqui, aplicam-se subsidiariamente as regras do
mandato.
Teoria orgânica – os órgãos seriam parte da pessoa coletiva, constituindo um
dos seus elementos. Aqui a pessoa coletiva responderia pelos atos dos titulares dos
órgãos
Teoria da representação – os órgãos operariam como uma realidade exterior,
dotada de poderes de representação, em função a um vínculo a tanto direcionado. Pela
representação, a pessoa coletiva apenas responderia pelos atos dos titulares dos órgãos
quando a qualidade de representante fosse atuada.

Hoje ganha corpo uma ideia de responsabilidade que transcende a mera


representação – A.165

As construções normativas da pessoa coletiva – o tal modo coletivo de atuação


jurídica – são elementos próprias da pessoa coletiva.
Domina, assim, a doutrina orgânica.

A administração; gestão e representação


Como foi referido, a lei prevê, para todas as pessoas coletivas um órgão de
administração, de natureza colegial.
O poder fundamental da administração é o de gestão, i.e: o poder de dirigir os
assuntos próprios da pessoa coletiva, tomando todas as decisões concretas necessárias
e orientadoras para a atividade de prossecução de fins da pessoa coletiva.
O poder de gestão abrange a possibilidade de praticar atos materiais da mais
diversa natureza, de dar instruções internas e de praticar atos jurídicos.
A administração tem, ainda, o poder de representação. Trata-se de uma
representação orgânica, que lhe advém da simples pertença ao órgão coletivo em causa.
Contudo, este vínculo de representação é histórica e dogmaticamente modelado pela
representação voluntária in A.258 e ss.
A precisa determinação do poder de representar a pessoa coletiva depende dos
estatutos – A.163º1. Tendencialmente, estes remetem para a administração, o que

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normalmente faz com que a representação seja pela administração. A gestão, para ser
eficaz, deve ser apoiada em poderes de representação.~
O A.163º1 admite que a própria administração possa designar representantes.
Isso sucede, normalmente, para determinar negócios específicos ou situações nas quais
os administradores designados sejam insuficientes para celebrar todos os negócios
necessários.
Do D.163º2 resulta um princípio: o que de que as “anomalias” na representação
só são oponíveis a quem as conhecesse.
- a designação de representantes – em regra os próprios administradores – feita
pelos estatutos é oponível erga omnes;
- a designação de representantes pela administração só é oponível aos terceiros
que conhecessem ou deviam conhecer: é imponível a terceiros de boa-fé ou terceiros
que sem culpa desconhecessem.
O A.266º1, a propósito das modificações e da revogação da procuração, também
só as considera oponíveis quando levadas ao conhecimento de terceiros por meios
idóneos ou quando se mostre que delas tinham conhecimento, no momento da
conclusão do negócio. Daqui retira-se uma regra geral: as limitações introduzidas no
poder de representação dos administradores ou de qualquer representante só são
oponíveis a terceiros que conheçam ou devessem conhecer: são inoponíveis a terceiros
de boa fé, i.e, que sem culpa desconheçam ou que não tenham de conhecer.

A representação e gestão funcionam em conjunto para aprática de um ato que


envolva a intervenção de mais de um administrador. Isolado, quando um administrador
chega.

A fiscalização
Segundo o A.162, os estatutos das pessoas coletivas devem prever um conselho
fiscal, constituído por um número impar de pessoas. Quanto a associações, o A.171º1
dispõe que o conselho fiscal seja convocado pelo respetivo presidente e só possa
deliberar estando presente a maioria dos seus membros. Funciona, em princípio, por
maioria – idem nº2.

Capacidade e atuação
As pessoas têm capacidade jurídica: será a concreta medida de direitos e
obrigações de que sejam suscetíveis. No que toca às pessoas singulares, essa capacidade
de gozo é plena. Elas podem ser titulares da generalidade dos direitos admitidos pelo
ordenamento e podem ficar adstritas à generalidade dos deveres que a ordem em causa
conheça. Já quanto a pessoas coletivas, uma orientação com certa tradição pretende
que a sua capacidade seja limitada pelo princípio da especialidade: este princípio
especial admite que apenas abrangeria os direitos e obrigações necessários ou
convenientes à prossecução dos seus fins, segundo o A.160º1.

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Há que dizer que este princípio da especialidade não restringe a capacidade das
pessoas coletivas: tal como emerge do A.160º1, ele diz-nos que todos os direitos e
obrigações são, salvo exceções abaixo referidas, acessíveis às pessoas coletivas.

As limitações específicas: naturais, legais e estatutárias


O princípio da especialidade NÃO TEM ALCANCE DOGMÁTICO. Daqui não se
pode inferir que a capacidade de gozo das pessoas coletivas é idêntica à das singulares.
Ela pode sofrer diversas limitações, devendo distinguir:

1. limitações ditadas pela natureza das coisas – a violação destes limites implica
a nulidade do negócio – A.280º1
2. limitações legais – as limitações legais à capacidade de gozo das pessoas
coletivas referidas na primeira parte do A.160º2 “vedados por lei”. A
inobservância das limitações legais à possibilidade de prática, pelas pessoas
coletivas, de certos atos, conduz à nulidade do ato por violação de lei
expressa (A.294) ou por ilicitude (A.280º1)
3. limitações estatutárias – os estatutos podem limitar tanto pela positiva como
pela negativa os atos da pessoa coletiva. Mas as competentes disposições
estatutárias não podem limitar a capacidade de gozo da pessoa coletiva. As
limitações estatutárias são meras regras de conduta internas. Elas
adstringem os órgãos da pessoa coletiva a não praticar os atos vedados sem,
contudo, limitarem a capacidade da sociedade. A violação desses limites
estatutários conduz à anulabilidade prevista no A.177 e 178.
4. limitações deliberativas – o mesmo regime das limitações estatutárias deve
ser aplicado às limitações deliberativas: i.e, ás limitações que deliberações
internas da própria pessoa coletiva ponham à prática, por ela, de certos atos.
Há uma responsabilidade do autor, mas a capacidade da pessoa coletiva
mantém-se inata.
Segundo o A.160º2, excetuam-se ao âmbito da capacidade de gozo das pessoas
coletivas os direitos e obrigações “inseparáveis da personalidade singular”. Trata-se, por
exemplo:
- de situações jurídicas familiares que visam apenas pessoas singulares
- de situações de personalidade centradas nas pessoa singulares
… etc

A capacidade de exercício; a representação


A categoria “capacidade de exercício” é só aplicável ás pessoas singulares. Visa
retrar, aí, o problema dos menores e dos interditos, bem como dos inabilitados. Como
tal, esta categoria não tem lógica: não se pode dizer que uma pessoa coletiva está
“ferida de incapacidades”.

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Nas pessoas coletivas não cabe contrapor a capacidade de gozo à de exercício:


há apenas capacidade – Carvalho Fernandes
Na mesma linha é de perceber que os “representantes”, não são bem
“representantes”. Fala-se aqui de um “decalcamento” da representação orgânica das
regras da representação voluntária.

A responsabilidade das pessoas coletivas


Segundo o A.165, as pessoas coletivas respondem pelos atos ou omissões dos
seus representantes, agentes ou mandatários dos mesmos termos em que os
comitentes respondem pelos atos ou omissões dos seus comissários. Isto é aplicável ás
sociedades civis puras – A.998º1
Responsabilidade do comitente – A.500
Responsabilidade do representante – A.800

A pessoa coletiva responde diretamente pelos atos ilícitos dos titulares dos seus
órgãos, desde que tenham agido nessa qualidade. Perante o teor literal do A.165,
articulado com o A.6º/5 CSC (remissão), a doutrina tem sido levada apensar que, para
efeitos de “responsabilidade aquiliana, a pessoa coletiva é um comitente, sendo o seu
órgão um “comissário”, de modo a aplicar o A.500
A pessoa coletiva é uma pessoa. Logo, se o é, ela pode integrar “aquele que com
dolo ou mera culpa” referido no A.483. A culpa é-lhe diretamente aplicável.
O A.165 não se prende com a responsabilidade das pessoas coletivas por atos
dos seus órgãos: antes dos seus representantes eventualmente constituídos para
determinados efeitos, dos eus agentes e mandatários, fazendo, aqui, sentido aplicar a
imputação ao comitente.

O exercício de atividades comerciais


As fundações e associações não têm por fim o lucro: dos associados, no primeiro
caso (A.157) e em geral, no segundo (A.188º1)
Tecnicamente, as associações e fundações não são consideradas comerciantes.
Podem, contudo, praticar atos de comércio e desenvolver atuações lucrativas.
O fundamento jurídico do exercício de atividades comerciais por parte das
associações e fundações está na sua capacidade juridicamente plena: abrange tudo o
que for necessário e conveniente para a prossecução dos seus fins, na linguagem do
A.160º1.
A capacidade tendencionalmente plena de que dispõe as pessoas coletivas
habilita-as a exercer atividades comerciais.

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O levantamento da Personalidade Coletiva


A possibilidade de agir por via de pessoas coletivas tem limites. Desde logo, estas
não têm capacidade jurídica no tocante a situações exclusivas das pessoas singulares.
Além disso há normas proibitivas que impõem restrições.
A existência de pessoas coletivas permite limitar a responsabilidade patrimonial
e isentar os administradores e agentes das consequências dos atos imputáveis do ente
coletivo. A presença dos limites específicos implica que sejam chamadas a responder
outras pessoas ou que certos atos não se repercutam totalmente na pessoa coletiva a
que sejam formalmente imputados.
A fórmula levantamento da personalidade coletiva. Trata-se de uma locução
neutra.

Situações típicas de levantamento


O levantamento da personalidade trata-se de um instituto estabelecido para
resolver problemas postos pela personalidade coletiva, onde na sua origem
encontramos uma multiplicidade de casos concretos. A doutrina agrupa em
“constelações” esses casos concretos em que elas se manifestam

Confusão de esferas jurídicas – manifesta-se quando, por inobservância de


certas regras societárias ou por decorrência puramente objetiva, não fique clara, na
prática, a separação entre património da sociedade e a dos sócios. Estes casos reportam-
se às chamadas sociedades unipessoais.

A subcapitalização
Verifica-se uma subcapitalização relevante para efeitos de levantamento de
personalidade sempre que uma sociedade tenha sido constituída com um capital
insuficiente. A insuficiência é aferida em função do seu próprio objeto ou da sua atuação
surgindo, esta, como tecnicamente abusiva.
1. Subcapitalização nominal – a sociedade considerada tem um capital
formalmente insuficiente para o objeto ou para os ato a que se destina,
podendo, contudo, acudir com capitais alheios.
2. Subcapitalização material – aqui há uma efetiva insuficiência de fundos
próprios ou alheios.

Atentado a terceiros e abuso de personalidade


O atentado a terceiros verifica-se sempre que a personalidade coletiva seja
usada de modo ilícito ou abusivo, de modo a prejudica-los. Não basta, contudo, para
haver levantamento, apenas uma ocorrência de prejuízo causada a terceiros através da
pessoa coletiva: para haver levantamento será antes necessário que se assista a uma
utilização contrária a normas ou princípios gerais.

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O abuso do instituto da personalidade coletiva é uma situação de abuso de


direito ou de exercício inadmissível de posições jurídicas, verificada a propósito da
atuação do visado, através de uma pessoa coletiva. No fundo, o comportamento que
suscita a penetração vai caraterizar-se por atentar contra a confiança legítima (venire,
supressio ou surretio) ou por defrontar a regra da primazia da materialidade subjacente
(tu Quoque, exercício em desequilíbrio)

As Teorias do Levantamento
Apuradas as constelações de casos a propósito dos quais se tem suscitado o
problema do levantamento, cumpre analisar as diversas explicações para ele
apresentadas.
Sistematizações que existem:
Teoria Subjetiva – a autonomia da pessoa coletiva deveria ser afastada quando
houvesse um abuso da sua forma jurídica, com vista a fins não permitidos
Teoria Objetiva – exclusão de considerações subjetivas para efetuar o
levantamento da pessoa. Estas orientações dizem-se também institucionais
Teoria de Aplicação das Normas – nesta Teoria, o “levantamento” não traduziria
um problema geral de personalidade coletiva; tratar-se-ia, antes, de uma questão de
aplicação das diversas normas jurídicas. Elas aplicar-se-iam quando, por via do escopo,
visassem atingir a realidade subjacente à própria pessoa coletiva.
Orientações negativistas – estas teorias negam, direta ou indiretamente, a
autonomia ao levantamento da personalidade e a sua consideração enquanto instituto
autónomo. Deve-se, em oposição, determinar os deveres concretos que, em certos
casos, incidam sobre os membros das pessoas coletivas.

Posição Adotada
Como aponta MC, a total falta de unidade interna do instituto do levantamento
leva muitos autores a abandonar o interesse por este.
O levantamento é um instituto de enquadramento, de base aparentemente
“geográfica”. No fundo, o levantamento traduz uma delimitação negativa da
personalidade coletiva por exigência do sistema. Ou, se se quiser: ele exprime situações
nas quais as normas que firmam a personalidade coletiva são substituídas por outras
normas.
Levantamento amplo – abrange todas as situações de levantamento
Levantamento estrito – reporta-se às situações que apenas se reportam ás
exigências da boa-fé.

Capítulo V – Pessoas Coletivas em Especial

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Secção I – Associações
Caraterísticas gerais
A associação constitui o tipo paradigmático da pessoa coletiva de tipo
associativo. O seu substrato compõe-se de duas ou mais pessoas

A organização das associações é, também, exemplar: assembleia geral,


administração e conselho fiscal. Toda esta matéria está configurada pelos estatutos.

A associação personalizada responde, com o seu património, pelas dívidas


próprias; não responde pelas dos associados, assim como estes não respondem pelas
da associação.

O A.157 determina a aplicação das regras sobre as associações às que não


tenham por fim o lucro económico dos associados. Daqui pode inferir-se que embora a
associação possa desenvolver atividades lucrativas, praticando mesmo assim atos de
comércio, ela não pode visar lucros para os distribuir. Na hipótese de se constituir uma
associação que vise distribuir lucros aos associados, estaríamos já perante uma
sociedade civil pura – A.980. Contudo, nada impede que uma sociedade civil desse tipo
adote o figurino de uma associação; não poderá, todavia, beneficiar de algumas das
regalias próprias da associação, sejam elas:
- a total separação de patrimónios, coma subsequente irresponsabilidade dos
associados pelas dívidas da associação
- a natureza não-patrimonial da posição do associado, com a sua consequente
impenhorabilidade.
Na letra o A.157 refere as “associações que não tenham por fim o lucro
económico dos associados”. A contrário, elas poderiam visar o lucro económico próprio
ou o de terceiros.
A associação deve ter meios económicos para prosseguir os seus objetivos.
Assim, faz todo o sentido admitir que esta possa desenvolver atividades lucrativas. O
facto de a lei comercial a pedir que a mesma seja considerada “comerciante”, apenas a
isenta de um certo número de posições. Nada obsta, também, que a associação vise dar
lucros a terceiros.

Como tal, queda uma interpretação restrita do “lucro económico dos


associados”.

Distinção, com base nos critérios formais, das associações:


- pela variabilidade dos seus membros
- pela natureza não transmissível (ou não patrimonial) das suas posições
associativas.

A constituição; ato constitutivo, estatutos e publicidade

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A constituição das associações opera por contrato entre os associados


fundadores. Tal contrato deve ser celebrado por escritura pública – A.158º1 e 168º1
A lei distingue o ato de constituição e os estatutos – A.168º1. O A.167º1 e 2
parece mesmo contrapor que deveria constar de um e dos outros.
- o ato de constituição mencionaria os bens ou serviços com que os associados
concorressem para o património social, a denominação, fim e sede da pessoa coletiva,
a forma do seu funcionamento e a sua duração
- os estatutos especificam os direitos e as obrigações dos associados, as
condições da sua admissão e exclusão, bem como os termos em que uma pessoa
coletiva se extingue
Inicialmente, ato constitutivo e estatutos resultavam do mesmo documento.
Considera-se:

1. A personalidade adquire-se através da escritura; a não-aplicação de regras


daí advenientes só se justificará para tutela de confiança
2. A publicação em jornal oficial constitui presunção inilidível de conhecimento
3. Na falta de publicação, o ato de constituição e os estatutos não são oponíveis
a terceiros de boa fé.
Essa inoponibilidade terá como efeito o responsabilizar a pessoa singular
concreta que contrate com o terceiro, em moldes aplicáveis às associações sem
personalidade jurídica, nos termos do A.198º1
Antes da formalização da associação e da decorrente aquisição da personalidade
jurídica, podem os associados iniciar diversas atividades, praticando atos jurídicos.
Teremos a figura da “pré-associação” ou “associação sem personalidade jurídica”

A invalidade da Constituição
O ato constitutivo e os estatutos têm natureza contratual.

Segundo o A.158-A “é aplicável à constituição das pessoas coletivas o disposto


no A.280, devendo o Ministério Público promover a declaração judicial de nulidade”

Este preceito significa que é nula a constituição de uma associação cujo objetivo
seja físico ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável ou, ainda,
contrário à ordem pública ou ofensivo aos bons costumes. Posto isto, o Ministério
Público tem o dever de promover a declaração judicial de nulidade; contudo, qualquer
outro interessado o poderá fazer, nos termos gerais. Este vício atinge, tanto a
constituição como os estatutos.
Como tal, a declaração judicial da nulidade aqui em causa pode implicar a
extinção ou a liquidação da associação. Pode a invalidade reportar-se apenas a um ponto
setorial dos estatutos ou do ato de constituição, que não ponham em causa a
subsistência coerente do conjunto. Aplicam-se as regras do A.292, de tal modo que seja

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declarada apenas a invalidade do ponto questionado. Quando a redução não seja


possível, assiste-se, nos termos gerais, à destruição retroativa dos atos praticados e de
todos aqueles que destes derivassem. No caso de uma pessoa coletiva isso é impossível.
Como tal, a declaração da nulidade da constituição pode ter uma de duas
consequências:
1. Ou deriva de vício de forma, que ponha em crise a aquisição da
personalidade, altura em que se segue o regime das associações não
personalizadas – A.195 e ss
2. Ou emerge de qualquer outro vício, e cabe recorrer às regras da extinção e
da liquidação das associações
O A.182º2 prevê a extinção por ocorrência superveniente de alguns dos vícios
previstos no A.280.
Hipótese: o vício atingiria somente a presença do associado na agremiação. A
invalidação da declaração de vontade da pessoa em causa apenas ditaria a sua exclusão:
não determinaria a invalidade de toda a constituição da associação, salvo quando se
mostrasse que ela não teria sido constituída sem a presença do fundador inquinado –
A.292.

A posição dos associados


O primeiro e fundamental elemento de qualquer associação é constituído pelos
seus associados ou massa associativa. O associado encabeça uma situação jurídica
complexa. Globalmente, ele pode ser considerado como um conjunto de direitos
subjetivos ou associativos.

O CC não explicita os direitos e os deveres dos associados. Limita-se no A.167º2


a dizer que eles podem ser especificados pelos estatutos. Contudo, é possível indicar as
obrigações e os direitos típicos.

Aqui, distingue-se:
1. Direitos especiais dos associados – os especiais são aqueles que conferem,
pelo estatuto a algum ou alguns sócios.
2. Direitos gerais dos associados – direitos que assistam, por igual, a todos os
associados

Podemos distinguir, no tocante a direitos gerais de associados, podendo os


estatutos delimitar estes direitos, sujeitando-os a regulamentos ou à
administração:

1. Direitos participativos

Estes direitos envolvem o:


- direito de participar na assembleia geral

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- direito de solicitar informações à administração

2. Direitos de disfruto de benefícios associativos

Os direitos de disfruto de benefícios associativos dependem da natureza da


associação de que se trate, podendo abranger vantagens puramente internas
ou externas.

3. Direitos honoríficos

Estes direitos honoríficos ou designativos redundam, fundamentalmente, na


possibilidade reconhecida aos associados de certas associações de usarem o
inerente título ou de exibirem os respetivos sinais distintivos ou insígnias.
Fala aqui, também, em “direitos associativos morais”

Obrigações dos associados; o princípio do igual tratamento; categorias


Podemos distinguir vários tipos de obrigações dos associados:
1. Obrigações contributivas

O A.167º1 dispõe que o ato de constituição “especificará os bens ou serviços com


que os associados concorrem para o património social”. Em regra, porém, os associados
devem contribuir: quer no momento da adesão (jóia), quer periodicamente (quota)
2. Obrigações participativas
As obrigações participativas prendem-se com imposições estatutárias de
participação: nos órgãos associativos, nas atividades correntes ou em eventualidades.

3. Deveres acessórios
As obrigações participativas prendem-se com imposições estatutárias de
participação: nos órgãos associativos, nas atividades correntes ou em eventualidades.
Os deveres acessórios decorrem da boa-fé. À partida, eles adstringem os
associados a manter uma postura conforme a sua posição, não prejudicando a imagem
ou os interesses da associação e não atendendo contra os outros associados, nessa
qualidade.
Quando os estatutos nada especifiquem, eles retiram-se do A.762º2,
cristalizando-se em deveres de lealdade, sigilo, de oportunidade.
O princípio da igualdade tem uma projeção útil: a da proibição do arbítrio. Na
atuação da associação e na postura desta e dos seus órgãos perante os associados, não
podem ser adotadas posições que não tenham cobertura legal ou estatutária.

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Número mínimo; ingresso, saída, exclusão; variabilidade e


intransmissibilidade
A lei portuguesa não prevê um número mínimo de associados. Terá de haver
mais do que um, para se poder outorgar o contrato constitutivo. Para além disso, apenas
o A.182º1 alínea d) prevê a extinção da associação pelo falecimento de todos os
associados.
O ingresso de pessoas, como membros, numa associação pode ser:
1. Inicial – quando se trate de entidades que tenham outorgado no ato
constitutivo ou que os estatutos enumerem como associadas
2. Supervenientes – pela adesão à sociedade.
A adesão tem natureza contratual: depende de uma proposta, feita pelo próprio
interessado, pela associação através da administração ou de assembleia geral. As
condições de admissão constam dos estatutos – A.167º2
Como foi referido, certas associações não podem condicionar a admissão de
novos associados, desde que reúnam os pressupostos mínimos: isso depende de leis a
tanto dirigidas. Na falta de tais leis, os estatutos são soberanos, nos limites do A.280.
A saída de um associado corresponde à sua retirada voluntaria de determinada
associação. Em princípio, tal retirada é livre, ainda que com as consequências do A.181:
o mesmo perde o direito ao património social, mantendo-se, contudo, responsável por
todas as prestação relativas ao tempo em que foi membro da associação
A exclusão de um associado equivale à extinção dos seus direitos associativos,
por decisão da associação: seja da administração ou da assembleia geral. Contudo, a lei
é omissa: no silêncio dos estatutos, admitimos que a exclusão possa operar por
aplicação analógica do A.1003.
O A.180 dispõe a natureza pessoal da qualidade de associado: “salvo disposição
estatutária em contrário, a qualidade de associado não é transmissível, quer por ato
entre vivos, quer por sucessão ; o associado não pode incumbir outrem de exercer os
seus direitos pessoais”
Daqui resulta a intransmissibilidade supletiva da posição de associado. Os
estatutos podem dispor de outro modo: nessa altura devem explicitar o tipo de
transmissão admitido.
O a.176º1 admite a representação para efeitos de voto.

O A.180 quando refere “direitos pessoais” tem em vista os desempenhados que


dependam das qualidades pessoais do associado considerado, e certos direitos
participativos, como os relativos a exercícios de cargos sociais, direitos de disfruto e
direitos honoríficos.

O poder disciplinar associativo

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A lei civil apenas refere a eventualidade da exclusão: A.180. Ora a exclusão


constitui a sanção mais grave que pode ser aplicada a entidades privadas. Aqui
encontramos a ideia de poder disciplinar: a faculdade que as associações têm de aplicar
sanções aos seus associados.
O poder disciplinar deve estar previsto nos estatutos. Estes devem regula-lo. Será
competente para aplicar a sanção o órgão estatutariamente indicado: normalmente a
comissão disciplinar. Nada dizendo, recai a inerente competência na assembleia geral,
que concentra todas as funções residuais, i.e: não atribuídas a outros órgãos – A.172º1.
A justificação é necessária e os estatutos não podem prescindir dela
As sanções aplicáveis são as previstas nos estatutos ou nos regulamentos. Nada
dizendo, só são possíveis duas sanções:
- a interpelação ou aviso de que tem obrigações por cumprir
- a exclusão
A natureza do poder disciplinar associativo tem sido discutida por duas grandes
orientações:

1. Teoria da pena – o poder disciplinar das associações derivaria da efetiva


assunção, por estas, do poder de punir os seus membros, como forma de
melhor realizar os seus fins
2. Teoria negocial – a associação não pode usurpar o poder do juiz

A natureza dos direitos associativos: o status do associado


Os direitos associativos correspondem a um acervo complexo. Eles dão lugar a
uma relação duradoura entre associado e associação. Dessa relação derivam direitos e
deveres mútuos, entre ambas as entidades.
Os direitos associativos estão marcados pelo escopo da associação a que
respeitem e traduzem a participação do seu titular em todo um sistema de atuação e
ordenação.

A assembleia geral das associações


A assembleia geral surge como órgão que detém as competências básicas da
associação. Ele deverá corresponder, tendencialmente, à reunião de todos os
associados.

O CC regula com algum pormenor o tema da convocação da assembleia geral.


Regra básica: resulta do A.173º1: a assembleia deve ser convocada, pela
administração, nas circunstâncias fixadas nos estatutos ou em qualquer caso para a
aprovação do balanço.

O A.173º2 admite, depois, uma convocatória pedida por um número mínimo de


1/5 dos associados, com “um fim legítimo” se outro número não for estabelecido nos

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estatutos. Os estatutos, podem, contudo, elevar esse número: mas não ao ponto de
tornarem inviável a convocação feita por associados, à margem da administração
Quando a administração não convoque a assembleia, nos casos em que deva
fazê-lo, qualquer associado pode efetuar a convocação - A.173º3.
Segundo o A.174º1 a assembleia é a convocada por meio de aviso postal,
expedido para cada um dos associados com antecedência mínima de oito dias. No aviso
deve indicar-se o dia, a hora e o local da reunião e a sua ordem do dia – idem , 2ª parte.
O A.174º2 dispensa o aviso postal quando os estatutos prevejam a sua
publicação, nos termos previstos para os atos das sociedades comerciais.
A convocatória é uma declaração recipienda, com os seguintes efeitos:

1. Permite a reunião da assembleia geral, fixando a as suas coordenadas


geográficas e temporais
2. Confere aos associados o direito de lá comparecer
3. Fixa a ordem do dia
De acordo com estas regras dos atos recipiendos, a convocatória só se torna
eficaz com a receção ou conhecimento – A.224º1. A presença de todos os associados
sana qualquer irregularidade de convocação, desde que nenhum se oponha à realização
da assembleia – A.174º4

Funcionamento
A Assembleia não pode deliberar, em primeira convocação, sem a presença de,
pelo menos, metade dos seus associados: i.e, dos associados que nela tenham assento
com direito de voto – A.175º1 – o chamado quórum constitutivo. Em segunda
convocação a assembleia poderá deliberar com qualquer número de associados
presentes: o quórum deliberativo.
As deliberações são tomadas por maioria absoluta dos associados presentes –
A.175º2. (VER A.175 – restantes artigos – Funcionamento)
O associado pode-se fazer representar na assembleia: seja através de outro
associado seja através de terceiro. A possibilidade de representação por outro associado
está prevista no A.176º1
A representação é uma possibilidade geral que só deve ser afastada por normas
expressas que o determinem. Segundo o A.262º2 a procuração nem teria de assumir
qualquer forma solene. De todo o modo, como o presidente da mesa e a própria
assembleia podem exigir a justificação dos poderes do representante – A.260º1 -,
justificação essa que deve ser produzida na altura, é conveniente que a procuração
conste de instrumento escrito e assinado pelo representado.

O A.176º1, sob a epígrafe “privação do direito de voto” estabelece a inibição do


votante em caso de conflito de interesses: entre a associação e ele, seu cônjuge,
ascendente ou descendente.

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Quando o impedido vote, a deliberação é anulável se for essencial à maioria


verificada – A.176º2; não sendo esse o caso, a falha considera-se colmatada.

Competência
A competência de um órgão incide sobre as matérias em que o mesmo pode
decidir ou deliberar. No que toca à assembleia geral, distinguimos:

1. Competência legal – esta competência reporta-se aos temas que, por


disposição da lei, devam necessariamente ser atribuídos à assembleia. São
eles, segundo o A.172º2:
- destituição dos titulares dos órgãos da associação
- aprovação do balanço
- alteração dos estatutos
- extinção da associação

2. Competência estatutária – esta é toda aquela que lhe é conferida pelos


estatutos

3. Competência subsidiária ou residual – esta competência reportar-se aos


assuntos que, por lei ou estatutos, não sejam atribuídos a outros órgãos –
A.172º1
A inobservância das regras de competência determinam a invalidade das
competentes deliberações.

A invalidade das deliberações associativas


As deliberações da assembleia geral das associações têm o valor de atos
jurídicos.
Segundo o A.177: “As deliberações da assembleia geral contrárias à lei ou aos
estatutos, seja pelo seu objeto ou em virtude de irregularidades havidas na convocação
dos associados ou no funcionamento da assembleia, são anuláveis”. O regime desta
anulabilidade está fixado no A.178: pode ser adquirido no prazo de seis meses, pelo
órgão da administração ou por qualquer associado que não tenha votado a deliberação
-nº1; que não tenha sido convocado regularmente para a reunião da assembleia, o
prazo só começa a contar a partir da data em que ele teve conhecimento da deliberação
– nº2

Segundo o A.158-A, à constituição da pessoa coletiva é aplicável o A.280,


coadjuvando essa orientação o A.295.

Daqui resulta que as deliberações legalmente impossíveis, contrárias à lei ou


indetermináveis sejam nulas. Às deliberações nulas aplica-se o A.286 em vez do A.178
O A.179 protege os direitos que o terceiro de boa-fé tenha adquirido em
execução de deliberação anulada

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A administração e o conselho fiscal das associações


A.170º1 – compete à assembleia geral designar os titulares dos seus órgãos,
quando os estatutos não estabeleçam outro processo de escolha. Nos termos do A.162,
entre esses órgãos haverá um órgão de fiscalização e outro de administração.
O nº2 do A.170 prevê a “revogação das funções dos titulares eleitos ou
designados”. Não se trata de qualquer “revogação de funções”, mas na destituição dos
titulares em causa. Tal destituição pode ser, pelos estatutos, condicionada a “justa
causa” – nº3 – que deve ser aproximada do motivo justificado presente na revogação
do mandato também sob a locução de “justa causa”
O órgão de administração – portanto, o conselho de administração ou direção –
e o conselho fiscal dispõem, cada um, do seu presidente. A pessoa do presidente pode
derivar dos estatutos ou pode ser designado pela assembleia geral. Se não ocorrer
nenhuma dessas eventualidades, o presidente será eleito pelo próprio órgão que esteja
em causa.

Cabe ao presidente convocar o órgão respetivo – A.171º1, 1ª parte – e dirigir os


seus trabalhos. O 171º2 dá ainda aos presidentes um direito a voto de desempate.
Recorde-se que não se admitem abstenções, sendo os membros em causa responsáveis
pelo que deliberem – A.164º2.
A competência da administração ficará na total disponibilidade dos estatutos.
Supletivamente, ele terá funções de representação – A.163º1

Invalidade das deliberações


Quaisquer órgãos que deliberem podem, fazendo-o, desrespeitar a lei ou os
estatutos. Nessa ocasião, as deliberações daí resultantes serão inválidas, nulas ou
anuláveis, a propósito das deliberações da assembleia geral.

A modificação e a Extinção das Associações


O CC refere no A.175º3 as alterações de estatutos das associações, requerendo,
para elas, uma maioria qualificada de três quartos dos associados presentes.
A fusão e a cisão de associações é possível: deve ser entendida como uma
modificação das entidades preexistentes e não como uma combinação de extinções e
de constituições. Assim haverá que seguir a via da alteração dos estatutos, com a
maioria qualificada dos três quartos de associados presentes e não a da maioria
qualificada dos três quartos de todos os associados – A.175 º3 e 4

A extinção
O A.182 enumera as causas da extinção. Este deve ser cotejado com o A.1007
que enumera as causas da extinção da sociedade.

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è A extinção simples dispensa uma decisão judicial expressamente dirigida a esse


efeito. Ela pode ocorrer, segundo o A.182º1:
- por deliberação da assembleia geral; remeter para o A.175º4
- pelo decurso do prazo; A.175º4 + A.183º1

- pela verificação de qualquer outra causa extintiva prevista no ato de


constituição ou nos estatutos; A.182º2 a) + A.183º1
- pelo falecimento ou desaparecimento de todos os associados
- por decisão judicial que declare a sua insolvência ; A.183º3
è Por decisão judicial, a associação extingue-se quando – A.182º2
A declaração de extinção pode ser pedida pelo Ministério Público ou por qualquer
interessado.
As causas da extinção do A.182 devem ser interpretadas taxativamente.

Efeitos da extinção
A extinção da associação não pode fazer desaparecer instantaneamente todas as
situações jurídicas que dela dependam. Abra-se assim um período de liquidação que
visa:
- o exato apuramento do ativo e do passivo da associação
- a satisfação do passivo
- atribuição dos bens remanescentes de acordo com o A.166
Os órgãos da associação extinta mantêm-se em funções. Todavia, os seus
poderes ficam limitados à prática dos atos meramente conservatórios e necessários,
quer à liquidação do património social, à ultimação dos negócios pendentes – A.184º1/
1ª parte. Os restantes atos responsabilizam solidariamente os administradores que os
pratiquem – idem, 2ª parte. A associação só responde perante terceiros de boa-fé se à
extinção não tiver sido dada a devida publicidade
No tocante a associações civis, mantém-se, também, a sua personalidade: mas
apenas na medida do necessário, como se infere do facto de não ficarem vinculadas,
perante terceiros, por novos atos dos administradores e salvo boa-fé e falta de
publicidade da extinção – A.184º2. Assim, podemos considera-las pessoas
rudimentares.

Secção II – Fundações
Caraterísticas gerais

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As fundações têm um substrato constituído por um acervo de bens. Falta-lhes


um substrato humano. E, por maioria de identidade, a sua autodeterminação será
inferior.
Pelas dívidas da fundação responderão os bens que constituam o seu
património. As fundações devem ter um interesse social – A.157 e A.188º1.

Formação; a instituição; a deixa fiduciária


A fundação tem uma lógica constitutiva diferente da das associações.
Distinguem-se três fases na sua formação:

1. A Instituição
É um negócio unilateral, entre vivos ou mortis causa. Através desse negócio, uma
pessoa afeta um património a uma pessoa coletiva a criar, com determinados objetivos
de tipo social. Em rigor, a declaração não é recipienda.

A fundação distingue-se de deixa fiduciária: por esta, determinados bens são


deixados, em propriedade, a uma pessoa já existente, singular ou coletiva, para que os
administre e deles disponha.

Quando a instituição ocorra entre vivos, não há propriamente, na altura, um


beneficiário que o possa aceitar. Por isso, o A.185º3 admite que ela seja revogável, mas
apenas até que seja requerido o reconhecimento ou principie o respetivo processo
oficioso. Se se tratar de testamento, o A.185º4 não permite, aos herdeiros, a revogação
da instituição: fica, todavia, assegurada a sucessão legitimária.
O ato de instituição deve indicar o fim da fundação e os bens que lhe são
destinados (A.186º1).De outra forma, o negócio será nulo por indeterminabilidade do
objeto – A.280º1.
Ainda no ato de instituição, pode o instituidor indicar a sede, a organização e o
funcionamento da fundação e regular os termos da sua transformação ou extinção,
fazendo o destino dos respetivos bens (A.186º2)
O ato de instituição, quando conste de escritura pública, deve ser publicado em
jornal oficial. Enquanto tal não suceder, ele não produzirá efeitos perante terceiros: é o
que resulta do A.185º5 que remete para o A.168º2.
Ato de fundação – constituía-se a fundação
Ato de dotação – oferecia-se-lhe um património
No tocante ao instituidor, prevalece o sentido menores oneroso – A.237.

2. A Elaboração dos Estatutos

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Os estatutos da fundação devem conter todos os demais elementos relativos à


pessoa coletiva em causa e que não constem do ato de instituição; recordando-se aqui
a enumeração do A.186º2
Os estatutos podem ainda ser elaborados pelo próprio instituidor – A.186º2.
Quando o não seja ou eles surjam insuficientes, cabe a sua elaboração:
1. Aos executores do testamento – A.187º1
2. À autoridade competente para o reconhecimento quando os referidos
executores os não elaborem no prazo de um ano posterior à abertura da
sucessão – A.187º2
3. A essa mesma autoridade, quando a instituição não conste de testamento
– A.187
Em qualquer dos casos de elaboração dos estatutos por terceiros, ter-se-á em
conta, na medida do possível, a vontade real ou presumível do instituidor ou fundador
– A.187º3
Os estatutos devem ser publicados no jornal oficial, não produzindo efeitos,
perante terceiros, antes disso: é o que resulta do A.185º5 e da sua remissão para o
A.168.

3. O Reconhecimento
As fundações não surgem como expressão de liberdade de associação. Elas não
correspondem, pelo menos à primeira vista, a uma forma de exercício de livre iniciativa
económica.
O reconhecimento pode ser pedido – A.185º2
- pelo próprio instituidor
- pelos seus herdeiros ou executores testamentários
- pela autoridade competente, oficiosamente

O pedido de reconhecimento ou o início do seu processo oficioso tornam a


instituição irrevogável – A.185º3. O reconhecimento opera ainda como aceitação da
deixa.
Este ato de reconhecimento deve obedecer a dois requisitos:

1. A idoneidade do fim: ele deve ser considerado de interesse social – A.188º1


2. A suficiência patrimonial: os bens afetos devem ser bastantes para a
prossecução do fim visado, não havendo fundadas expetativas de
suprimento da insuficiência – A.188º2
Negado o reconhecimento por inidoneidade do fim, deve considerar-se
sem efeito a instituição.

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Do silêncio da lei é a solução que resulta dos princípios gerais e do próprio


A.188º3
Solução do A.188º3:
- se o instituidor for vivo, a instituição fica sem efeito

- se já houver falecido “serão os bens entregues a uma associação ou


fundação de fins análogos, que a entidade competente designar, salvo
disposição do instituidor em contrário”

Funcionamento, modificação e extinção das fundações


O CC não contém regras expressas sobre a administração das fundações. Limita-
se a dizer que ela pode apresentar, à entidade competente para o reconhecimento,
propostas de alteração dos estatutos – A.189 – e que ela deve ser ouvida, para efeitos
de transformação – A.190º1. Por via das regras gerais – A.162 – sabemos que a
administração, a sua composição e os seus poderes devem resultar dos estatutos.
Toda a competência residual que não seja aplicável, por leis ou pelos estatutos,
a outro órgão ou ao conselho fiscal, a mesma reporta-se, numa fundação, à
administração.
Dizer – o que não acontece – que a administração tem poderes de disposição
sobre os bens que constituem o património da sua fundação é aproximar os
administradores dos trustee anglo-saxónicos. No Direito português nada obsta que a
própria fundação possa, para prossecução dos seus fins, alienar elementos do seu
património.
No silêncio e a lei nada dizendo, cabe à administração agir.
Também o perfil e a designação do conselho fiscal deverá resultar dos estatutos,
dentro dos condicionamentos do A.162.

A modificação
A modificação da fundação pode traduzir-se numa mera alteração dos aspetos
regulamentares dos estatutos ou numa verdadeira transformação, assente numa
mudança de fins.
A alteração dos estatutos é possível a todo o tempo, pela entidade competente
para o reconhecimento e por proposta da administração. Com dois limites importantes
– A.189:
1. O respeito pelo fim essencial da fundação
2. O respeito pela vontade ou fundador do instituidor
Nos termos gerais (A.185º5 + 168º3) a alteração só produz efeitos, perante
terceiros, após a sua publicação.

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A verdadeira transformação de uma fundação resulta de assunção, por esta, de


um fim diferente. Tal fim só pode ser atribuído pela entidade competente para o
reconhecimento, ouvida a administração e o instituidor, se ele for vivo, nas seguintes
circunstâncias – A.190º1:
- quando o fim inicial estiver preenchido ou se tornar impossível
- quando o fim inicial perca o interesse social
- quando o património se torne insuficiente para a prossecução desse mesmo
fim
O novo fim deve aproximar-se, o tanto possível, do anterior – A.190º2. Em
qualquer caso, não há lugar à mudança de fins se o ato de instituição prescrever a
extinção da fundação.
Caso especial de modificação: o que derive de um encargo prejudicial aos fins da
fundação. O instituidor pode cometer à fundação, para além dos fins de interesse social,
o satisfazer determinado encargo predeterminado. Esse encargo introduzirá um fator
de rigidez suscetível de prejudicar a atuação geral da fundação, impossibilitando-a ou
dificultando-a gravemente – A.191º1 1ª parte. Nessa altura, a entidade competente
para o reconhecimento poderá “suprimir, reduzir ou comutar esses encargos, ouvido o
fundador, se for vivo”
Pode, porém, o encargo ser motivo essencial da instituição. Nessa ocasião, pode
a entidade competente para o reconhecimento – A.191º2
- considerar o cumprimento do encargo o fim (único) da fundação;
- incorporar a fundação noutra pessoa coletiva capaz de satisfazer o encargo à
custa do património incorporado, sem prejuízo dos seus próprios fins.
Operações mais complexas como a fusão ou a cisão de fundações serão possíveis
pela conjunção de regimes dos A.189 e 190.

A extinção
As causas de extinção das fundações constam do A.192: um preceito claramente
paralelo ao A.182, relativo à extinção das associações.
Assim a extinção é aparentemente automática na hipótese de ser alcançado o
termo, sendo temporária ou na de verificação de qualquer outra causa extintiva prevista
no ato de instituição – A.192º1 a) e b). A extinção ocorre ainda na hipótese da falência.
O A.193 prevê no entanto, em todos estes casos, que a administração da fundação
comunique o facto à autoridade competente para o reconhecimento: está irá declarar a
extinção “… e tomar as providências que julgue convenientes para a liquidação do
património”
O A.182º2 elenca as causas de extinção que exigem uma tomada de iniciativa
por parte da entidade competente para o reconhecimento: esgotamento ou

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impossibilidade do fim; fim real diverso do expresso; meios ilícitos ou imorais;


contrariedade à ordem pública.
Ocorrendo a extinção da fundação segue-se a sua liquidação. A entidade
competente para o reconhecimento deverá tomar “providências especiais”. Não o
fazendo, é aplicável o regime previsto para as associações.

Secção III – Associações sem personalidade jurídica e comissões especiais.


A chave de associação sem personalidade reside no A.195º1, quando entra na
matéria referindo a “organização interna”, a “administração” e “os associados”. Tal
associação disporá:
- de uma organização, com administração

- de um elemento pessoal, constituído por vários associados


Na falta de algum deles, o A.195 e ss são inaplicáveis.
As associações sem personalidade jurídica regem-se, em primeiro lugar, pelas
“regras estabelecidas pelos associados”; isso sucede no plano interno (organização
interna) e, em certos limites, no externo (administração) – A.195º1ª parte. Tais regras
representam autênticos estatutos, só que não formalizados. Nos termos gerais do
A.219, elas não requerem qualquer forma solene. Têm, é claro, natureza contratual.
Quer isto dizer que uma pessoa que dê o seu acordo a uma ASP (associação sem
personalidade) fica vinculada: donde o A.195º3, que à saúda de associados, manda
aplicar o A.181.
No que as regras adotadas pelos associados sejam omissos, são aplicáveis as
disposições legais relativas às associações, excetuadas as que pressuponham a
personalidade – A.195º1, 2ª parte. Aqui ficam abrangidas não apenas as regras dos
A.167 e ss mas também a dos A.157 e ss.
Regras que o CC admite que vêm atenuar a falta de personalidade jurídica:
1. As limitações impostas aos poderes normais dos administradores (só) são
oponíveis a terceiro quando este as conhecesse ou devesse conhecer – A.195º2;
a contrario, os poderes normais dos administradores são oponíveis a terceiros.
2. O fundo comum integra as contribuições dos associados e os bens com elas
adquiridos – A.196º1; enquanto a associação subsistir, nenhum associado pode
exigir a sua divisão e nenhum credor dos associados tem o direito de o excutir –
A196º2
3. As liberdades a favor de asp acrescem ao fundo comum – 197º2
4. O fundo comum responde em primeira linha pelas obrigações da associação; na
falta deste, o património de quem as tiver contraído; e na falta deste, o dos
restantes associados, na proporção à sua entrada para o fundo comum – A.198º1
e2

Natureza

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As associações sem personalidade correspondem a mais uma importante


manifestação da liberdade de associação.
Caso das liberalidades em favor da asp, que se consideram feitas aos associados
– A.197º1; como, porém, elas integram o fundo comum – A.197º2 – os associados não
podem pedir o seu quinhão, enquanto a associação subsistir – A.196º2 – perdendo
qualquer direito com a saída da associação – A.195º2.

Comissões especiais
Estas comissões vêm tratadas nos A.199 e 200 e 201.
A lei não dá uma noção direta. Refere apenas “comissões constituídas para
realizar qualquer tipo de plano de socorro ou beneficência. São agremiações restritas a
pessoas que visam fins diferentes dos do lucro dos envolvidos; surge contudo uma
condição negativa: A.199 2ª parte “não pedirem o reconhecimento da personalidade de
associação ou não a obtiverem.
Elas não têm o substrato organizatório e pessoal que faria delas umas ASP
Do A.200 infere-se ainda que as comissões recolhem fundos de terceiros,
afetando-os aos tais fins não lucrativos.
Segundo o A.201 os membros da comissão e os encarregados de administrar os
fundos respondem pessoal e solidariamente pela sua conservação e pela afetação ao
fim assumido. Para além disso, respondem pessoal e solidariamente pelas obrigações
contraídas em nome dela -A200º2
Por seu turno, os subscritores só podem exigir o próprio valor subscrito quando
não se cumpra o fim para que a comissão foi constituída – A.200º3
O A.201 dispõe sobre a possibilidade de aplicação dos bens a outro fim. Prevê
três hipóteses:
1. Os fundos angariados serem insuficientes para o fim anunciado
2. Esse fim mostrar-se impossível
3. Restar algum saldo

Natureza
A natureza jurídica das comissões especiais presta-se a uma interessa discussão,
entre três teorias:

1. Teoria associativa – a comissão traduziria uma associação específica entre os


seus membros

2. Teoria da fundação – vê nas comissões fundações não reconhecidas ou não


personalizadas

3. Teoria dualista/mista ~

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Estas não têm personalidade jurídica plena; apenas para certos fins limitados
surgem como pessoas rudimentares.

Sociedades Civis Puras


O CC define contrato de sociedade como – A.980 “aquele em que duas ou mais
pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de
certa atividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros
resultantes dessa atividade”
O contrato não está sujeito a forma especial, salvo se assim exigirem os bens em
jogo – A.981º1; todavia a lei prevê, para a inobservância da forma, esquemas reforçados
de redução de conversão – idem, nº2. As alterações ao contrato devem ser unânimes,
exigindo-se ainda o acordo do próprio para a supressão de direitos especiais: tudo isto
sujeito a cláusula em contrário – A.982.
Quanto ás relações com os sócios cabe reter o seguinte: os sócios estão sujeitos
às obrigações de entrada fixadas no contrato – A.983 – aplicando-se-lhes regimes
diferenciados consoante a sua natureza – A.984.
A administração é supletivamente entregue a todos os sócios – A.955º1. Todavia,
qualquer dos administradores pode opor-se ao ato que outro pretenda realizar,
cabendo então à maioria decidir – nº2. A cláusula que atribua a administração a
determinado sócio pode ser revogada, ocorrendo justa causa – A.986º1. Aos
administradores são aplicáveis as regras do mandato – A.987º1

(ver Direitos dos Sócios; A.988 e ss)


No tocante a relações com terceiros, o A.996º1 dispõe que a sociedade é
representada em juízo e fora dele pelos seus administradores; as modificações ou
poderes de representação dos administradores não são oponíveis a terceiros de boa fé
– A.996º2

Pelas dívidas da sociedade responde ela própria e, pessoal e solidariamente, os


sócios – A.997º1; todavia, estes podem exigir a prévia excussão do património social –
nº2. A sociedade responde, ainda, como comitente, pelos atos ilícitos dos sócios –
A.998º1
O credor do sócio só pode exigir a liquidação da quota do devedor depois de
esgotados outros meios – A.999. A compensação entre o que um terceiro deve à
sociedade e o crédito dele sobre alguns dos sócios não é permitida, outro tanto
sucedendo com a que se pretenda entre o que a sociedade deve a terceiro e o crédito
que sobre este tenha algum dos sócios – A.1000
Paulo Cunha -> a sociedade civil pura constitui uma individualidade diversa da
dos sócios que a componham.
Regulação das matérias da morte, exoneração ou exclusão de sócios – A.1001 a
1006. O A.1007 prevê as matérias da dissolução.

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Dissolvida a sociedade, procede-se à liquidação do seu património – A.1010. A


liquidação compete aos administradores, podendo surgir liquidatários especiais –
A.1012 1 e 2

Tomo V – Representação, Legitimidade, Exercício


de Direitos

Legitimidade - realidade mais curta, menos expansiva, do que quando falamos


em LEGITIMAÇÃO.

Crivo da legitimidade - quem pode, no fundo, exercer certas situações jurídicas.


Não e só quem pode, mas quem pode exercê-las de forma juridicamente
relevante. É alguém por referência a uma certa situação - não é um “alguém” abstrato.
Quem é aquele que melhor pode discutir um determinado objeto, para que a decisão
seja o mais justa possível (quem melhor pode produzir os efeitos úteis daquela situação).
A legitimidade não pressupõe necessariamente esse vínculo de titularidade - pode advir
da legitimação de poderes; pode ser exercida pelo titular ou o titular pode dar-lhe
poderes para a mesma ser exercida noutra esfera.
Quando alguém atua dizendo que não é o titular, mas o faz em nome dele, ele
atua a coberto de um vínculo de representação.
è A.892

Aqui encontra-se a regra básica relativa à falta de legitimidade para venda de


bens, que, neste caso, não lhe pertencem. Esta regra é aplicável aos contratos
onerosos.
Legitimidade e nulidade - associação destes 2 conceitos. A falta de legitimidade
conduz à nulidade, quando esteja em causa a transmissão de bens. A legitimidade liga,
assim, o titular ao exercício de um direito.
è A.895

Originariamente o título não valia, mas a lei convalida-o, torna-o válido - mas
para isso, o direito tem que ter entrado na esfera daquele que o dispôs. O título
supervenientemente se convalidou.

è A.897
A ignorância útil de não ser proprietário - a boa fé passa a estar associada a um
conhecer (dever conhecer), mas não a um dever de agir, do 226. Está relacionada com
o saber ou dever saber. Há assim uma tutela do terceiro de boa fé, impondo, o Direito,
um dever de conhecimento para conseguir aproveitar o negócio e proteger o terceiro.

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è A.288
Temos de ler lá a palavra legitimidade. Tem legitimidade para confirmar aquele
que pode requerer a anulação. Quem pode confirmar é quem pode anular. Ele pode
superar a nulidade, confirmando o negócio - Princípio do Aproveitamento Máximo do NJ
através da confirmação.

Exercício jurídico
Sentido amplo: atuação humana relevante para o Direito - abrange-se, pois,
todos os atos jurídicos, lícitos e ilícitos, bem como todas as práticas negociais.
Sentido estrito: concretização, por uma pessoa, de uma situação, ativa ou
passiva, que lhe tenha sido conferida pelo Direito.

O exercício jurídico implica uma decisão do agente - este procede a uma concreta
aplicação jurídico-normativa, dando lugar a uma nova situação jurídica. Esta situação:

1. Resulta da posição exercida e dos fatos que haviam presidido o seu surgimento
2. Do tipo de exercício decidido.
No entanto, este tipo de exercício, por ser muito diversificado, é só apreensível
abstratamente. Tipos de exercício
- Exercício de direitos (corresponde a atuações possibilitadas pela permissão
específica de aproveitamento do bem em causa) e o cumprimento de obrigações
(concretização da conduta a que o sujeito estava adstrito)
- Exercício de liberdades gerais (o sujeito move-se ao abrigo de permissões
genéricas; ex: celebração de um contrato)
- Exercício de outras posições (atuação de um poder ou faculdade, um ato de
posse, uma exceção material)
Temos:
Exercício puramente jurídico - condutas significativas para o campo do Direito;
ex: aceitação de uma proposta, invocação de um prazo, a ratificação de um negócio.
Exercício material - implica imediatas modificações do tipo físico: um ato de
consumo alimentar ou uma edificação.
Exercício direto - o exercício é levado a cabo pelo próprio agente interessado

Exercício indireto - o agente opera através da colaboração de uma outra pessoa:


representante, mandatário.
A diferença aqui é que aqui o representante afirma ostensivamente que não é
o titular do bem em jogo. No entanto, apesar de ele não o ser, ele atua e produz efeitos
em tal esfera. E claro, para haver legitimidade indireta tem de haver uma fonte de

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legitimação por parte do representado e para com terceiro, pois o mesmo tem de
explicar a razão da sua legitimidade
Exercícios legais/ contratuais (consoante a natureza da posição em jogo)
A situação mais imediata, em termos de exercício, é a atuação de posições ativas,
particularmente do direito subjetivo

A legitimidade (MC)
Mc - Legitimidade - qualidade de um sujeito que o habilite a agir no âmbito de
uma situação jurídica considerada. Enquanto as liberdades podem ser exercidas por
todos, as situações jurídicas só são atuáveis pelos sujeitos a que respeitem ou que
disponham de habilitação jurídica
Legitimidade não se confunde com:

- Titularidade - que nós dá as qualidades do sujeito enquanto beneficiário de


uma situação jurídica ativa, mas o sujeito pode carecer da possibilidade de agir no
âmbito dessa situação, por menoridade (A.123)

- Adstrição - É o equivalente passivo da titularidade; o sujeito vinculado a uma


obrigação pode não ter a liberdade de a cumprir, por menoridade, ex.

- Com capacidade (de gozo ou exercício) - a legitimidade equivale a uma


realidade específica, enquanto a capacidade de gozo é genérica: uma pessoa pode ser
plenamente capaz mas não ter habilitação para exercer uma situação jurídica: por falta
de titularidade, ex.
Legitimidade direta - Assiste de modo automático ao titular ou ao destinatário
da situação considerada. Quem atua é o alegado titular da situação sobre a qual se está
a intervir - ligação de alegada titularidade. É alegado porque para o não ser tem de ser
esgotado categoricamente em tribunal.
Legitimidade indireta - Exige um ato suplementar de legitimação, uma
procuração, p.e , uma ratificação, uma convalidação, uma retransmissão dos direitos,
etc( a tal necessidade de fontes por parte do terceiro para provar a legitimidade
doutrem a agir em nome de alguém). A diferença aqui é que aqui o representante afirma
ostensivamente que não é o titular do bem em jogo. No entanto, apesar de ele não o
ser, ele atua e produz efeitos em tal esfera. E claro, para haver legitimidade indireta tem
de haver uma fonte de legitimação por parte do representado e para com terceiro, pois
o mesmo tem de explicar a razão da sua legitimidade

Legitimidade ativa - Está em causa o desencadear de uma conduta, ex: o


exercício de um direito
Legitimidade passiva - Está em causa o benefício dessa conduta

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Legitimidade jurídica - Possibilidade de desencadear puramente exercícios


jurídicos (ex: vender)
Legitimidade material - Possibilidade de desencadear efeitos materiais (
consumir ou construir, ex)
Legitimidade inicial- Inicial quando o agente esteja, no momento do começo do
exercício, habilitado para a exercer
Legitimidade superveniente - Na falta de habilitação, o exercício so se verifique
subsequentemente (a tal ratificação do A.268)
A legitimidade, enquanto qualidade do sujeito reportada a determinada situação
jurídica, deriva de uma ou mais ocorrências ou conjunções: os fatos legitimadores. Há
fatos positivos (conferem legitimidade a quem beneficia, caso da titularidade, que aqui
é o fato legitimador poe excelência; o titular de uma posição tem legitimidade para
desencadear os diversos exercícios que ela faculte) e fatos negativos (retiram
legitimidade a quem a teria). Havendo titularidade poderá faltar a legitimidade;
introduz-se um novo fato legitimador: a autorização. Esta pode ser necessária:
- para proteção do agente (A.153º1) ; (1889) e (1938)
- para proteção de terceiros (1038) e (1340)
- perante a pluralidade de interessados. (1408º1)
A autorização é, em regra, prévia ao ato, de modo a conferir ao seu autor a
necessária legitimidade, de modo a conferir ao seu autor a necessária legitimidade.
Sendo subsequente trata-se de confirmação (A.125º2), em ratificação (268º1),
reconhecimento (A.1061) e em consentimento (1372).
Forma de a legitimidade ser suprida previamente: A.262 e ss (procuração),
ratificação (268º1) gestão representativa ou não-representativa (471) a convalidação
(895) e a retransmissão dos direitos objetivos no exercício do mandato sem
representação (1181) -> Repare-se aqui que tudo isto são formas indiretas de
legitimidade.
O que a legitimidade faz, no fundo, é delimitar os âmbitos de autodeterminação
privada, complementando as esferas de liberdade representadas pelas situações
jurídicas. Prolonga, assim a ideia de permissão específica
Carvalho Fernandes: A legitimidade é a suscetibilidade de uma pessoa exercer
um direito ou cumprir uma vinculação resultante de uma relação existente entre essa
pessoa ou a vinculação em causa. MC contraria-o, dizendo, no caso p.e do Artigo 892,
que o vendedor pode não ser o titular da coisa (faltando pois a relação pessoa-coisa)
mas todavia ter legitimidade para a venda. Aqui a legitimidade pode ter decorrido de
uma procuração, de uma autorização com efeitos representativos

A representação

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O fenómeno representativo
A representação é um instituto jurídico que consiste no exercício jurídico em
nome de outrem com imputação jurídica na esfera da pessoa em cujo nome se atua.
Aqui, uma pessoa atua, manifestando uma vontade que depois se vai repercutir direta
e imediatamente na esfera jurídica de outrem. Na representação há uma separação
entre quem age (o representante) e aquele em cuja esfera jurídica se produz a eficácia
jurídica da ação (representado) e a quem é imputada a autoria do agir representativo -
o autor. O ato praticado ou celebrado pelo representante é juridicamente imputado à
autoria do representado.

Para que esta seja eficaz, torna-se necessário que o representante atue “nos
limites dos poderes que lhe competem” -> A.258 ou que o representado realize,
supervenientemente, uma ratificação. Estes poderes de representação podem ser
atribuídos por um ato voluntário pelo representado ao representante, falando-se, aqui,
de representação voluntária. Este “ato voluntário” pelo qual se atribui os poderes é
designado por procuração. Este pode resultar dos estatutos de uma pessoa coletiva
(representação orgânica ou estatutária) ou ser concebido pela lei a representantes
legais (curadores ou tutor)
Isto faz com que, com a representação, se alargue o âmbito de autonomia
privada, na medida da atribuição de poderes.
Os menores ou interditos, aqui, no caso de representação legal, não têm
autodeterminação de capacidade, i.e, não desfrutam de autonomia privada. Então, o
ordenamento jurídico fornece um sucedâneo da capacidade de exercício de direitos
inexistente
A representação equivale a um direito potestativo do representante, direito esse
que lhe permite através da contemplatio domini, produzir efeitos jurídicos na esfera do
representado - sendo-o, a situação do representante enquanto tal é ainda um direito
funcional; o representante não é inteiramente livre dentro da permissão básica que lhe
assiste. Ele antes se enquadra numa função, devendo prosseguir o interesse do
dominus.
O funcionamento da representação depende da presença de um negócio
jurídico. A representação implica ainda uma atividade jurídica. Vale a dimensão jurídica
daquilo que, com legitimidade e consentimento do representado, o representante pode
produzir, por agir sobre o representado, na esfera deste. Trata-se também de uma
atividade humana (manifestação da autonomia privada)

Requisitos da representação, de existência:


1. Contemplatio domini – a realização do negócio em nome do representado,
para que a outra parte saiba ou possa com quem, realmente, está a
contratar.
o Atua jurídica em nome de outrem (nomine alieno)

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2. Tem de existir uma declaração de uma vontade própria do representante


e não unicamente do representado.

Pressupostos de eficácia da representação


O ato deve estar integrado nos limites dos poderes que competem ao
representante. O negócio vale em relação ao representado. Não vale em relação ao
representante; este não é parte negocial. Deve existir, por parte do representante,
legitimação representativa, que pode ser originária ou conferida
supervenientemente/subsequentemente pela ratificação.
Os atos praticados por um representante sem poderes ou falsus procurator são
ineficazes em relação à pessoa em nome da qual se celebrou o negócio, salvo se tiver
lugar a ratificação - A.268º1. Não havendo ratificação. O representante sem poderes,
verificada culpa sua, como será quase sempre o caso, responde perante a contraparte,
com fundamento em responsabilidade pré-negocial - A.227
Haverá abuso de representação quando o representante atuar dentro dos limites
formais dos poderes conferidos, mas de modo substancialmente contrário aos fins da
representação.
O caráter formal ou consensual da ratificação, como também da procuração,
depende das exigências formais do negócio representativo - A.268º2 e 262º2
Na representação sem poderes, o mesmo está ferido pela anulabilidade (A.261)
e não de ineficácia, como, prima facie, se poderia pensar.
A razão de ser da proibição do negócio consigo mesmo versa sobre a colisão de
interesses
1. Refere-se à legitimidade do representante para agir em nome do
representado, sendo esta legitimidade:
o Originária (ínsita nas clausulas da procuração)
o Superveniente (ratificação)

Fenómeno de substituição
Na representação ocorre um fenómeno de substituição. O representante
substitui o representado no exercício jurídico -> Principal utilidade da representação.
Caso o representado esteja impedido, a representação permite suprir o impedimento,
fazendo agir outra pessoa em nome do representado - não é necessário impedimento,
pode ser mais conveniente, apenas. Ex paradigmático: a representação em tribunal pelo
advogado ou os menores. Na representação, embora a autoria jurídica seja do
representado, o agir material é o do representante, que o substitui.
A.606, caso da sub-rogação, em que o credor pode exercer direitos do devedor -
caso em que a inércia do devedor no exercício de um seu direito patrimonial o deixe em
situação de não poder pagar ao seu credor.

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Para haver representação basta que o negócio seja concluído em nome do


representado, não sendo necessário que o seja no interesse do representado. Assim, na
representação legal, aquela em que a legitimidade representativa provém da lei, tem
lugar sempre no interesse do representado, aqui um representado incapaz, a
represnetação voluntária pode ter lugar por força dos casos em que os poderes
representativos são conferidos no interesse do próprio procurador.
Não, igualmente, coincidência entre as noções de representação e de mandato,
pois o mandato é um contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou
mais atos jurídicos por conta da outra parte (A.1157): trata-se de uma modalidade
particular do contrato de prestação de serviço.

Hipóteses:
1. Pode haver mandato sem haver representação, quando o mandatário não
recebeu poderes para agir em nome do mandante; age por conta do mandante (pelo
interesse de), mas em nome próprio - A.1180
2. Pode haver representação sem haver mandato. A representação voluntária
resulta de um ato - a procuração A.262 - que pode existir autonomamente - negócio
unilateral - como não.

Representação e legitimação
Para haver representação tem de ter havido atuação em nome de outrem. 1
coisa é perguntar se estamos perante a representação, outra é a se tinha ou não a
possibilidade de agir por conta de outrem (aqui implícito está a legitimação).

A representação envolve também um fenómeno de legitimação. O


representante nao poderia atuar em nome do representado e não poderia agir sobre
bens e interesses do representado por falta de legitimidade. Se o fizesse, a eficácia
jurídica não se reproduziria na esfera do representado (A.268º1) A representação atribui
ao representante legitimidade para agir em nome do representado, e constitui título de
legitimidade ou de legitimação. Caraterística mãe da representação = eficácia
representativa. O agir jurídico do representante se produzir na esfera jurídica do
representado e ser juridicamente imputada à sua autoria (do representado). Os atos
praticados pelo representante são tidos como praticados pelo representado.
A.464 - “uma pessoa assume a direção de negócio alheio no interesse e por conta
do respetivo dono, sem para tal estar autorizada”. A ação do gestor produz efeitos na
esfera do dono do negócio se for desenvolvida por sua conta e no seu interesse, sem
que lhe tenham sido atribuídos poderes de representação.

Os efeitos da representação

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O negócio jurídico celebrado pelo representante em nome do representado, nos


limites dos poderes que lhe compete, produz os seus efeitos na esfera jurídica do
representado - A.258 -> atuação nomine alieno
Repercussão dos negócios na esfera do representado:
1. É imediata - i.e, independentemente de quaisquer circunstâncias, ela para no
preciso momento em que o negócio ocorra. A existência de poderes de representação
implica uma modelação da esfera imediata do representado.
2. É automática - i.e, não exige outro evento para que ela ocorra
Apesar do poder de disposição se manter na esfera inicial (do representado) ele
vai ser atuado na esfera do representante. A representação é uma situação complexo
se for precedida por mandato
A.259 -> “À exceção dos elementos em que tenha sido decisiva a vontade do
representado”, quanto a estados subjetivos relevantes, como a falta ou vício da
vontade, é na pessoa do representante que estes devem verificar para motivos de
nulidade da declaração. Contudo, há que entender este “à exceção dos elementos em
que tenha sido decisiva a vontade do representado” significa os ilícitos pré-contratuais
cuja prática tinha sido resultado de instruções ou indicações do representado, sendo
imputada na esfera dele a responsabilidade in contrahendo de tais ilícitos culposos e
danosos que venha a emergir face ao terceiro.

E a representação por incapazes só é viável quando a autonomia


requerida pela situação concreta o consinta.
259º2 -> a má fé do representado prejudica sempre, mesmo que o representante
esteja de boa fé. Aqui, a má fé está aplicada em termos muito amplos, exprimindo o
conhecimento, o desconhecimento culposo e a prática de ilícitos

Justificação dos poderes do representante; outros conflitos de


“Interesses”
O destinatário da conduta tem o direito, nos termos do 260º1, de exigir que o
representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes: doutro modo, a
declaração não produzirá efeitos. - isto dá credibilidade à representação e evita situação
de incerteza quanto a negócios futuros; este deixa claro, também, a necessidade da
existência de tais poderes.
Segundo o 260º2, o terceiro pode exigir uma cópia do documento assinado pelo
representante.
A.261 -> Negócio consigo mesmo - dispondo de poderes de representação, o
representante poderia ser levado a usá-los num contrato em que, ele próprio, fosse a
outra parte
Possibilidades do 261:

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1. O negócio celebrado pelo representante consigo mesmo e em nome próprio:


o representante usa os seus poderes para contratar mas fá-lo com ele próprio,
comprando, por exemplo, o que tinha poderes para vender
2. O negócio celebrado pelo representante consigo mesmo mas em
representação dum terceiro: o representante usa os seus poderes para contratar mas
fá-lo com ele próprio, em representação de outro terceiro de quem detinha poderes
bastantes; p.e: compra o que tinha poderes para vender, fazendo-o com poderes de
outro terceiro que tinha para comprar
3. O negócio celebrado por pessoa a quem o representante tivesse
subestabelecido os seus poderes de representação, com o próprio representante -
A.261º2 - Subestabelecimento – quando o Bártolo tivesse delegado os poderes que
tivesse delegado numa pessoa e depois celebrasse o NJ consigo mesmo; este
subestabelecimento pode haver substituição; ou subrepresentação, pode ser uma mera
delegação. E aqui ficam os 2 com poderes de representação. É anulável porque o
representante pode deixar de agir por conta do representante, e deixar de proteger o
representante do dominus, e passar a proteger os seus próprios interesses. Visa-se no
fundo evitar/afastar um perigo para os interesses do representado.
O legislador considera o negócio consigo mesmo como anulável,
independentemente de ser ou não prejudicial; ressalvando os casos em que o
representando deu o seu assentimento ao negócio em causa ou de não poder haver
conflito de interesses.
Outros casos de conflitos de interesses: quando uma pessoa surja como
representante, em simultâneo, de duas pessoas que tenham interesses opostos -> esta
ideia de oposição traduzir-se-á na incompatibilidade de procuração paralela das
relações subjacentes. A boa fé que acompanha as relações em causa (762º2) obrigará,
de imediato, o procurar a dar conta, ao representado, do conflito existente. Nada
podendo fazer por essa via, o duplo procurador coloca-se no âmbito do A.335: conflito
de direitos (ou de deveres). Através da ponderação, sacrificará uma delas a favor doutra.

Representação e interposição
Na representação existe um fenómeno de interposição de pessoas. Entre o
representado e a outra parte introduz-se uma outra pessoa: o representante. Ocorre
com frequência a interposição de um terceiro no caso do mandato sem representação
(A.1180), em que o mandatário age em nome próprio e se produz na sua própria esfera
jurídica a respetiva eficácia. É designado, por vezes, por representação indireta.
Há uma intermediação não representativa no caso núncio; o núncio limita-se a
transmitir, e não a emitir.
Atuação em nome de outrem (comtemplatio domini) e atuação por conta de
outrem

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O A. 258 exige na sua letra que o representante atue “em nome do


representado”. Quer isto dizer que o representante, no agir representativo, deve
anunciar e deixar claro que não está a atuar em seu nome, mas sim em nome e
representação de outrem.
Contemplatio domini -> invocação da qualidade e do nome do representado no agir
representativo; i.e, através de uma representação voluntária, um representante, por ter
recebido os necessários poderes de uma outra pessoa - o dominus, que concede os
poderes de representação - celebra um negócio, esclarecendo, na altura, que o faz em
nome e por conta do representado.

1. A vontade do dominus, ou do representado, concede os poderes de


representação
2. O representante tem a vontade em celebrar o negócio
3. A vontade do representante em fazê-lo. Não por si, mas para o dono, dizendo-
o (contemplatio domini)

Representação orgânica
Há aqui mais um esquema de imputação de efeitos às pessoas coletivas
Para Savigny, a pessoa coletiva seria incapaz de agir, ficando numa situação similar
à dos menores -> Teoria da representação
Teoria orgânica -> a pessoa coletiva traduz uma realidade autónoma, tendo vias
próprias de atuação; assim, ela agirá através de órgãos próprios

Apesar de bastante controversa, não se trata bem de uma “representação”; a


pessoa coletiva age através, e simplesmente, dos seus órgãos; ela não é uma verdadeira
representação.

Representação legal
Na representação legal, o representante é indicado, verificada certa situação
pela lei. São poderes de grande amplitude traduzindo-se em legitimidade para
representarem o menor ou o interdito em todos os seus assuntos pessoais ou
patrimoniais. Verificam-se, porém, limitações.
Na representação legal a lei impõe a representação - caso das incapacidades - O
Direito entende que as pessoas não estão em condições suficientemente boas para se
autodeterminarem. A.123. Nos casos da representação legal a interposição do
representado é muito relevante
Conjunto de esquemas destinados a suprir a incapacidade dos menores:
compete aos pais: A.1878 e 1881 ou ao tutor 1935.

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Enquanto que a representação voluntária visa ampliar a vontade e o raio de ação do


principal, a “representação legal” pretende a proteção patrimonial e pessoal dos jovens
seres humanos.

Representação voluntária
Na representação voluntária, os poderes do representante e a respetiva
extensão provêm da vontade do representado, manifestada na procuração.
A258 a 261 -> Matéria virada para a representação voluntária

Segundo o A.260 pode-se exigir que o representante faça prova dos seus poderes
dentro de um prazo razoável “sob pena de a declaração não produzir efeitos”, Revelado
que a atuação é em nome de outrem, os seus efeitos nunca poderão produzir-se na
esfera jurídica do representante. A outra parte está consciente que o representante nao
age em nome próprio e por isso nunca 1podem contar com a produção dos efeitos
juridicos do agir representativo na esfera do representante. Se ao representante
faltarem os necessários poderes (representação sem poderes) a sua atuação, segundo
o 268º, é ineficaz.
Atuar em nome alheio é diferente de atuar por conta de outrem. O
representante atua em nome do representado e por conta do representado.
É lícito atuar por conta de outrem sem representação: assim sucede no mandato
sem representação (A.1178 a 1184), em que o mandatário age em nome próprio mas
por conta do mandante. -> a eficácia dos atos do mandatário sem representação produz-
se na sua própria esfera jurídica, ficando este obrigado (A.1181) a transferir para o
mandante as situações e posições adquiridas sem execução do mandato.

Na gestão dos Negócios (A.464 a 472) em que uma pessoa age sobre “negócio
alheio” no interesse e por conta do respetivo dono, sem para isso estar autorizada, se
dá licitamente um caso de atuação por conta de outrem.

Sentido de agir por conta de outrem: atuar sobre bens ou interesses de outra
pessoa que não os daquela que age

O interesse no agir representativo


A representação é exercida no interesse do representado. Na normalidade dos
casos, o interesse que domina é o do representado. É o interesse do representado que
domina o exercício representativo na representação legal do menor e do interdito: o
critério de ação do titular do poder paternal e do tutor está no interesse do
representado. Na representação orgânica, o titular do órgão da pessoa coletiva deve
pautar a sua atuação pelo interesse daquele e não pelo seu próprio. Na representação
voluntária rege a autonomia privada
O interesse, no agir representativo, tal como no direito subjetivo, interliga a
pessoa com os meios que sejam hábeis para a realização dos seus fins e traduz-se na
tensão entre a pessoa que quer realizar um fim e o meio que carece para o alcançar.

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O interesse que rege o exercício representativo resulta da relação fundamental


(Oliveira Ascensão). Assim, na relação de menores ou interditos é na relação de filiação
ou na tutela que se deverá procurar quais os interesses regentes e que devem orientar
o agir representativo (relação subjacente), sendo aqui que se encontra o critério dos
interesses reitores do exercício pelo representante dos poderes que emergem da
procuração. Assim, os interesses emergentes da relação subjacente orientam os
critérios do agir representativo, mas também os da revogabilidade ou irrevogabilidade
da procuração.

A relação subjacente ou fundamental


Normalmente, a representação só pode ser entendida em ligação com a relação
subjacente, com a situação ou a relação jurídica ao serviço da qual vigora o regime
representativo.
Representação legal dos menores e dos interditos insere-se no regime do poder
paternal ou da tutela. A chamada representação orgânica é inseparável da
personalidade coletiva.
Relação subjacente/fundamental = constitui a causa jurídica da representação,
o regime representativo que vigora.
Na representação dos menores ou interditos o representante deve reger o agir
representativo pelos interesses do representado de acordo com as coordenadas e
critérios de atuação emergentes do poder paternal ou da tutela. A simples
contemplação da representação sem o contributo da relação subjacente não permite
discernir quando há ou não abuso de representação. Mas, se forem outorgados poderes
representativos através de uma procuração, sem que exista uma relação subjacente, o
agir representativo com terceiros de boa fé é eficaz face ao representado.

Figuras semelhantes à representação


è Representação mediata ou imprópria – uma pessoa, normalmente por via de
mandato, age por conta de outra mas em nome próprio: as pessoas com ela
contratem desconhecem a existência de um mandato; contudo, concluído o
negócio, o mandatário deverá proporcionar a aquisição pretendida pelo próprio
mandante; o A.1182 confere a autorização para agir por conta própria mas em
nome alheio. Não há aqui um fenómeno de representação.
Representação imprópria - não há a contemplatio domini
Representação própria - há contemplatio domini (atuação em nome de outrem)

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è Gestão de negócios representativa: aqui o agente - o gestor - atua em nome


do dono, mas sem dispor nem invocar poderes de representação. Se houver
ratificação os negócios que pratique inscrevem-se na esfera do dominus.
è Do contrato para a pessoa nomear: aqui uma parte reserva-se o direito de
nomear um terceiro que adquira os direitos e assuma as obrigações
supervenientes desse contrato - A.452º1; os efeitos não se repercutem
automaticamente na esfera do nomeado; antes se exige um instrumento de
ratificação ou de procuração anterior ao mandato – A.453; Na representação
própria o negócio representativo produz efeitos na esfera do representado ou,
na hipótese de falta de legitimação representativa é ineficaz: no contrato para
a pessoa a nomear, os direitos e obrigações provenientes do contrato são
apropriados, a partir da celebração do negócio pela pessoa nomeada e o
contrato produz efeitos relativamente ao contraente originário (A.455);
Na representação imprópria (mandato sem representação) o
mandatário age em nome próprio, adquirindo os direitos e obrigações
decorrentes dos atos que celebra, e é obrigado a transferir para o mandante os
direitos adquiridos. sendo este obrigado a assumir as obrigações contraídas
pelo mandatário (A1180/81 e 82); no contrato para a pessoa a nomear, um dos
contraentes declara contratar para um terceiro, reservando-se apenas o direito
de o nomear e os efeitos do negócio são encabeçados pela pessoa nomeada,
retroativamente e sem necessidade de um ato especial de transmissão dos
direitos e das dívidas. Assim, quem contrata com a pessoa a nomear assume os
riscos da incerteza sobre a pessoa da sua contraparte

è Do recurso a núncio: O representante, ao contrário do núncio, nunca recebe,


nem mesmo quando a procuração é especialíssima, um mandato absolutamente
específico e imperativo. Decide o se do negócio e o conteúdo. O representante
emite uma declaração em nome de outrem; o núncio transmite uma declaração
de outrem. O representante consuma e o núncio transmite o já consumado.
1. O representante não precisa de ter plena capacidade legal, mas carece de
capacidade natural de entender e querer, exigida pela natureza do negócio que
haja de efetuar (A.263) quanto anúncio bastará a capacidade natural para
transmitir a declaração de vontade, podendo uma criança atuar como núncio.
2. Se o representante excede os seus poderes de representação, o negócio é
ineficaz em relação ao representado (A.268); se este não atribuir àquele
legitimidade representativa ex post facto (ratificação); se o núncio transmitir a
sua declaração inexatamente, o dominus poderá ficar vinculado nos termos da
declaração emitida, se não se verificarem os requisitos exigidos no A.250 para a
relevância, no sentido da anulabilidade, do erro na transmissão da declaração

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è Da ratificação: o ato é praticado por conta do visado mas sem poderes de


representação; esta permite a eficácia do ato em causa na esfera da pessoa por
conta da qual foi praticado
è Da aprovação: o ato é praticado por conta duma pessoa que recusa a
ratificação, valorizando, todavia, a conduta eticamente reprovável do agente,
inibindo-o de responsabilidades.
è Do consentimento: o agente é autorizado a agir em nome próprio na esfera
alheia; a procuração visa a pessoa, enquanto o consentimento visa o bem.
è A representação e a simples autorização ou consentimento para atos de
outrem - A.153. O representante atua e na simples autorização inibe-se ou
aprova-se uma iniciativa e uma atuação de outrem
è A representação e os contratos a favor de terceiros - A443. Na representação,
o representante não se torna titular de quaisquer direitos ou obrigações, sendo
sujeitos emergentes das relações o representado e a outra parte.
è 444 Nº2 -> A faculdade a exigibilidade; ele também pode exigir, não para
ele próprio, mas para o terceiro, i.e, aquele a quem se atribui o benefício -> CASO
DE SUBSTITUIÇÃO EVIDENTE; o promissório age em nome próprio para o
terceiro.
è A representação e as “declarações sob o nome de outrem” - na representação,
o representante atua em nome de outra pessoa que se não confunde com ele:
na atuação sob o nome de outrem, o declarante assume o nome de outrem,
fazendo-se passar por essa pessoa - A decide fazer negócio com B e este faz-se
passar por A.
Extinção da relação subjacente/ fundamental = caducidade da representação -
A.265 estatui isso mesmo, a propósito da procuração, ao determinar a sua extinção
quando cessa a relação jurídica que lhe serve de base
A maioridade -> cessação da representação do menor,

A cessação da incapacidade -> a do interdito.


Sem a relação subjacente, a relação deixa de ter fundamento e deixa de haver
critério para o exercício dos respetivos poderes.

O mandato
Representação voluntária -> A.262 a 269.
Para surtir os seus efeitos, a procuração postula um negócio subjacente, que a
complete e lhe dê um sentido. No entanto, o negócio tipicamente subjacente à
procuração é o contrato de mandato. Assim, o estudo da representação voluntária deve
ser precedido por uma análise prévia do mandato.

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Assim, o A.1157 postula a implicação para o mandatário uma prestação de facto/


de facere e mais precisamente:
- a prática de um ou mais atos jurídicos
- por conta de outrem - o que significa que os atos a praticar pelo mandatário se
destinam à esfera do mandante. Por conta de = no interesse de alguém

A. 1158º2 , a retribuição é remetida para:


- o acordo das partes
- as tarifas profissionais
- os usos
-os juízos de equidade

A. 1159
º1 mandato geral - abrange uma generalidade não especificada de atos que
compreende apenas os atos de administração ordinária
º1 mandato especial - reporta-se a concretos atos nele referidos, abrangendo
ainda os necessários à sua execução.
A.1160
1º parte - a pluralidade de mandatários dá lugar a tantos mandatos quantas as
pessoas designadas
2º parte - assim o não será quando o contrato exare que eles devam agir
conjuntamente: co-mandato0
A.1161
A) deveres de atuação (constituem o núcleo do mandato - visa-se a prática dos
atos previstos no contrato
B) Deveres de informação e comunicação (os deveres de comunicação referem-
se à execução ou há hipotética não execução do mandato e às razões que o possam
eventualmente ter levado a)
C) Deveres de informação e comunicação (“””)

D) deveres de prestação de contas


E) deveres de entrega (abrange pela letra da lei, uma atividade material de
entrega de dinheiro)
A.1163
Fixa os termos da aprovação tácita do mandato, haja ou não execução deste: vale
como aprovação o silêncio do mandate.

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A.1162 -> ius variandi -> i.e, permite-lhe não executar o mandato ou afastar-se das
instruções recebidas, excecionalmente
1170º2 -> passam-se procurações relativas a negócios concretos, no interesse do
representante, irrevogáveis e eficazes pos mortem. O terceiro aqui é protegido.
Pergunta-se o que se pode entender por “também no interesse do mandatário ou de
terceiro”. Como vimos no mandato, o “Interesse” reporta-se aqui a um direito subjetivo
do representante ou de terceiro. Esse direito subjetivo resulta não da procuração mas
da relação subjacente: p.e, pelo mandato

Espécies
A representação imprópria não é uma verdadeira representação.
Representação ativa - atuação em nome de outrem na emissão de declarações
negociais
Representação passiva - receber declarações negociais em nome de outrem

Admissibilidade da representação
Tanto a representação legal como a representação voluntária promanam do ato
voluntário denominado procuração.
Na representação legal, o seu domínio de aplicação resulta das disposições que
a consagram para o efeito de se suprir a capacidade dos menores - A.124, 139 e 154.
Na representação voluntária - 262 ss o mandato com representação (A.1178), no
qual se convalida a procuração, i.e, a fonte mais frequente de representação voluntária.

A procuração e o negócio-base
Negócio-base - para quê, os modos, daquela situação jurídica em representação;
é este que vai responder às perguntas que possam ser feitas no âmbito representativo;
se há abuso ou não, se há ou não representação sem poderes, etc.
A procuração é um negócio unilateral. Implica liberdade de celebração e de
estipulação e surge perfeita apenas com uma declaração de vontade. Não é necessário
aceitação para que produza efeitos, basta a declaração de vontade. O mesmo não tem
de dizer se quer ou não: se não a recusar, é o representante. O beneficiário basta a
renunciar a ela, extinguindo-a - 265º1. Esta pode ser tácita.

Salvo disposição legal em contrário, a procuração pode ter por objeto a prática
de quaisquer atos. Caso do testamento -2182º1. A procuração tem que ter em conta os
A.280 ss; ela é nula se o objeto for indeterminável. Para o negócio se realizar, a
procuração deve revestir a forma exigida por lei - A.262º2; a procuração deve ser verbal
quando vise negócios consensuais, devendo ser passada por escrito sempre que essa
seja a forma requerida para o negócio a celebrar.

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Procuração que concede poderes gerais - permite ao representante a prática


duma atividade genérica, em nome e por conta do representado
Procuração que concede poderes especiais - destina-se à prática de atos
específicos
Isto vai ser encontrado no A.1159 -> aqui, tratando-se de poderes gerais, com
relevo para a “administração ordinária, a representação resultará da própria situação
considerada. Os “poderes especiais” exigirão um ato explicito do representado.

O negócio base; relevância na procuração


A lei pressupõe que, sob a procuração, exista uma relação entre o representante
e o representado, em cujos termos os poderes devam ser exercidos:

A.265º1 -> Teoricamente poderíamos assistir a uma atribuição puramente abstrata


de poderes de representação; todavia, tal “procuração pura” não daria, ao procurador,
qualquer título para se imiscuir dos negócios do representado. A efetivamente
concretização dos poderes implicados por uma procuração pressupõe o negócio base.
Normalmente, este negócio-base será um contrato do mandato. Aqui mandato e
procuração ficarão numa situação de união. De resto, a própria lei - A.1178 e 1179 -
manda aplicar ao mandato regras próprias de procuração.

Regras quanto ao procurador e à substituição


Segundo o A.263 o procurador não necessita de ter mais do que a capacidade
para entender e querer exigida pela natureza do negócio que haja de efetuar. -> regra
específica de capacidade; ela permite que uma pessoa incapaz para praticar pessoal e
livremente um determinado ato de sua conta, possa praticá-lo validamente, como
representante de outrem; isto deriva do procurador enquanto mero núncio e o controlo
da sua aplicação derivará da “natureza do negócio que haja de efetuar”. O procurador,
tem, contudo, de ter outorgado validamente no negócio-base, pois de outro modo a
invalidade deste implica a da procuração, por aplicação analógica do A.265º1.
A. 264º1 admite a substituição do procurador em três hipóteses:

1. Se o representado o permitir
2. Se a faculdade de substituição resultar do conteúdo da procuração
3. Se essa mesma faculdade resultar da relação jurídica que a determina
Substituição com reserva - o procurador não é excluído; ele mantém os poderes
que lhe foram conferidos
Substituição sem reserva - aqui verifica-se a exclusão
No A.264º2 o regime supletivo é o da substituição com reserva: o procurador
primitivo não é excluído.

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A. 264º3 -> Culpa in eligendo ou in instruendo: o procurador só responde se


tiver agido com culpa na escolha do substituto ou nas instruções que lhe deu
A. 264º4 -> Admite que o procurador se sirva de auxiliares na execução da
procuração, podendo opor-se o negócio-base.

A cessação da procuração
265º1 e 2 -> Fórmulas de extinção da procuração:
1. Renúncia do procurador
2. Cessação do negócio-base
3. Revogação pelo representado
O procurador pode sempre renunciar à procuração. Apesar da liberdade, a renúncia
súbita a uma procuração pode prejudicar o representado. Assim temos de perceber que,
sem prejuízo para a regra de livre renunciabilidade aos poderes, por parte do
procurador, este poderá ter de indemnizar se causar danos e a sua responsabilidade
emergir da relação-base. Se estiver em causa um mandato com representação, a
renúncia à procuração implica a sua revogação - A.1179 - aplicando-se o 1172 quanto à
obrigação de indemnizar.
A irrevogabilidade da procuração só é válida quando encontre fundamento na
relação subjacente e não na teia de interesses que dela emirja. Este pode ser do
procurador ou de terceiro, mas também do constituinte ou contra este. Assim, o
constituinte só pode revogar livremente a procuração quando seja o titular exclusivo
do interesse que lhe é subjacente e que emerge da relação fundamental
A irrevogabilidade, contudo, nunca é absoluta. Mesmo quando resulte do interesse
primário do procurador ou de terceiro, a procuração pode sempre ser revogada com o
consentimento de todos os titulares dos interesses e quando corra justa causa de
revogação
Constitui a “justa causa de revogação” da procuração irrevogável a violação pelo
procurador, no exercício representativo, dos deveres emergentes da relação
fundamental. O incumprimento ou o abuso por parte do procurador dos poderes que
lhe foram conferidos confere ao constituinte o poder de revogar unilateralmente a
procuração. Este regime cessa, o da irrevogabilidade, com a extinção da relação
fundamental.
A cessação do negócio-base acarreta o termo da procuração que, em princípio, não
se mantém sem aquele (sem o mandato, normalmente) No entanto, a lei admite que a
procuração subsiste se “se outra for a vontade do representado” Tratando-se de
mandato, ele caduca A.1174 -> por morte ou interdição do mandante ou do mandatário
ou pela inabilitação do mandante

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A. 1175 -> a morte, interdição ou inabilitação do mandante não faz caducar o


mandato quando este tenha sido conferido também no interesse do mandatário ou
terceiro
A morte, a interdição ou a incapacidade natural do representante, por aplicação
analógica do A.1176º1, obriga os herdeiros deste a prevenir o representado e a tomar
as providências adequadas até que ele próprio esteja em condições de providenciar; o
nº2 faz recair uma obrigação idêntica. Na pluralidade de representantes funcionará o
1177.
A.265º2 -> A revogação da procuração pelo representado é de livre
renunciabilidade, e a isto deve-se a livre confiança mútua postulada pela representação
voluntária.
A.1179 e 1172 -> dever de indemnizar em caso de mandato
A.265º3 – Este estatui que não pode ser revogada sem justa causa ou sem o acordo
do interessado a procuração que “tiver sido conferida também no interesse do
procurador ou de terceiro” É da relação fundamental que resulta quais os interesses que
regem o exercício dos poderes representativos e é daí que resulta o regime da
revogabilidade. Quando se fala de interesse exclusivo do procurador ou de terceiro é
preciso não confundir o interesse na outorga da procuração com o interesse que rege o
seu exercício. Quem outorga uma procuração tem sempre algum interesse em fazê-lo,
pois sem ele não o faria. Também tem interesse em saber e controlar o modo como são
exercidos os poderes representativos, pois esse exercício repercute-se necessariamente
na sua esfera, de tal modo que o ABUSO DE REPRESENTAÇÃO CONSTITUI UMA JUSTA
CAUSA de revogação.
É necessário, pois, distinguir entre:
è Interesse como critério do exercício representativo (que pode ser exclusivo
do procurador ou de terceiro
è Interesse como fundamento da procuração, que o seu outorgante não
deixará de ter
Como tal, há que distinguir entre:
è Interesse primário (procuração no interesse exclusivo do procurador ou
de terceiro) – deverá ser aferido na perspetiva da execução do negócio
que constitui a relação subjacente. Esta posição própria do procurador
atribui-lhe um poder próprio que legitima o procurador a exercer contra
o outorgante da procuração uma pretensão de execução ou de
cumprimento e garantia, cujo conteúdo corresponda à tutela e
satisfação de interesses do procurador não do outorgante da
procuração. É este critério que ajuíza quanto ao abuso do procurador

è Interesse secundário – explica a outorga da procuração pelo seu


outorgante e o exercício dos poderes representativos pelo procurador

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A.1171 -> Consubstancia uma modalidade de revogação tácita. Se esta norma for
aplicável à procuração, o representado que designe outro procurador para a prática dos
mesmo atos está, implicitamente, a revogar a procuração primeiro passada.
A.267º1 -> Refere a hipótese de a procuração ter “caducado”; subjacente temos a
ideia de que a extinção atinge o negócio subjacente, o que arrasta a caducidade da
procuração

A tutela de terceiros
O terceiro é parte quando o representante negoceia com ele.
A procuração serve para o terceiro poder constatar os efetivos poderes do
representante

A representação voluntária, serve, em primeira linha, os interesses próprios do


representado. Através da representação, o representante contrata com terceiros. Estes
têm tanto interesse quanto o próprio representado. A procuração não pode, pois, ser
tratada como uma relação exclusiva entre o representante e o representado. Os
terceiros ficam envolvidos. No entanto, este terceiro não intervém na constituição nem
nas possíveis modificações da procuração, apenas se implica nelas. E claro, tão pouco
pode interferir na relação subjacente à procuração.
Assim, o Direito dispensa uma tutela aos terceiros. Não o faz diretamente por via da
representação, mas por outro corpo de regras.
Proteção perante as modificações e a extinção da procuração
Procurando contemplar os interesses e a confiança dos terceiros, mas sem descorar
a proteção do representado, o A.266 estabelece que:
- Tratando-se de modificações ou de revogação da procuração - portanto, por
atuações que dependam da iniciativa do representante - devem ser levadas ao
conhecimento de terceiros por meios idóneos; trata-se de um encargo em sentido técnico
(Terminologia de MC)
- Nos restantes casos de extinção da procuração, não se refere um expresso
dever de dar a conhecer aos terceiros; não obstante, elas não podem ser opostas ao
terceiro que “sem culpa, as tenha ignorado” nº2.
A diferença reside no regime do ónus da prova, na º1 o representado terá de
provar que os terceiros conheciam a revogação; no segundo, a invocação de boa-fé
caberá a terceiros.
Explicação a produção de efeitos da procuração cuja extinção mantém eficácia,
por não ter sido comunicada a terceiros:
- Teoria da aparência jurídica - entende que a procuração se extinguiu
efetivamente; todavia mercê da aparência e para tutela de terceiros, ela mantém
alguma eficácia -> O A.266 OPTA POR ESTA; i.e, ela mantém alguma eficácia mesmo
depois de extinguida.

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- Teoria do negócio jurídico - subscreve, contrariamente, que a procuração só se


extingue quando a sua cessação seja conhecimento pelos terceiros a proteger.

A procuração tolerada e a procuração aparente


A.266 protege os terceiros perante modificações ou perante a revogação da
procuração, de que não tivessem, de uma ou de outra, sem culpa, conhecimento

Procuração tolerada – Ocorre quando alguém invoca poderes de representação


de outrem que, embora lhos não tenha expressamente concedido, tem conhecimento
e tolera essa atuação, permitindo assim que seja criada uma situação de aparência de
representação e de confiança, por parte de terceiros, na efetiva vigência dos
invocadores poderes de representação. Na ordem jurídica portuguesa tem o valor de
procuração tácita quando a existência dos poderes de representação seja de concluir,
com toda a probabilidade, do comportamento tolerante daquele de quem a
representação é invocada. O comportamento tolerante do representado constitui uma
declaração negocial tácita. Sempre que a procuração deva obedecer a uma forma
especial, o nº2 do 217 exige que se verifique essa mesma forma nos factos dos quais a
concludência resulta. Se assim não for, a validade será prejudicada e haverá
representação sem poderes.
A proteção de terceiros pode justificar-se em alguns casos: na procuração
tolerada - ou procuração de tolerância - porque o representado “tolera a conduta dele
desconhecida, do representante, e essa tolerância, segundo a boa fé e considerando os
usos do tráfico, pode ser interpretada pela contraparte no negócio no sentido de que o
representante recebeu procuração de representado para agir por ele”
Procuração aparente – Alguém invoca poderes de representação de outrem e
afirma atuar em seu nome, sem que o suposto representado lhe tenha conferido esses
poderes e sem que tenha conhecimento de que assim sucede, embora pudesse e
devesse saber que assim sucedia, se tivesse agido com a diligência devida.
Na aparência de poderes de representação - caso em que o representante atuou
sem poderes de representação - há que perguntar se o terceiro que contratou com ele
- e que confiou numa aparência jurídica é protegido pela atribuição de efeitos ao
negócio em relação ao representado. A resposta é negativa, pois sendo antes ao terceiro
que incumbe exigir ao representante a justificação dos seus poderes de representação
(A.260)
Não é possível alargar o A.266 aos casos em que falta para e simplesmente uma
procuração. A previsão protetora assenta num instrumento de representação
efetivamente existente, cuja cessação não foi comunicada a terceiro que nele acredite:
razão forte para a tutela da aparência. A confiança, no direito português, é protegida
pela boa-fé e pelo abuso do direito. No entanto, o terceiro que seja colocado numa
situação de acreditar justificadamente na existência de uma procuração, poderá ser
protegido se se verificar venire contra factum proprium

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A.260 - permite exigir, do representante, a prova dos seus poderes, prova essa
que, se não for feita num prazo razoável, deixa a declaração sem efeitos. Compreende-
se que a tutela da aparência exija uma prévia procuração, manifestando-se quando
sobrevenham modificações ou extinções (266)
Procuração institucional - surge sempre que uma pessoa, de boa fé, contrate com
uma organização em cujo nome atue um agente em termos tais que seja tranquila a
existência de poderes de representação.
Procuração post mortem
A.265 -> Reporta-se à extinção da procuração; ela ocorre por renúncia ao
procurador, por revogação do representado ou pela cessação da relação subjacente.
Serra irrevogável se tiver sido concedida no interesse do procurador ou terceiro. Infere-
se, aqui, que a morte do representado não implica a caducidade da procuração.
No caso do mandato, a procuração caduca com a morte do representado, em
virtude da cessação da relação subjacente - 1174ºa, envolvendo o termo da procuração
que o acompanhe - 265º1; 1175.

Eficácia interna e externa das vicissitudes da procuração


O relacionamento interno – é entre constituinte e procurador e segue, no que se
refere a modificações, revogações, instrução e extinção da procuração, o regime normal
dos NJ.
Relacionamento externo – aqui, a eficácia das vicissitudes da procuração,
perante a outra parte, os terceiros, depende do seu conhecimento.
No que se refere ao A.269, resulta que a violação de instruções ou dos deveres
emergentes da relação fundamental só podem ser opostos a terceiros que as
conhecessem ou não devessem desconhecer. A regra é esta: tudo o que estiver
convencionado entre constituinte e procurador, ou que resulte dessa convenção, é
inoponível a terceiros que desconhecessem e não devessem conhecer. Aqui, destaca-se
o ónus de comunicação das vicissitudes a terceiros com clareza nos A.266 e 269. Assim,
quem quiser opor a terceiros a violação pelo procurador das instruções, deverá levar ao
terceiro o conhecimento dessas vicissitudes. Este conhecimento segue o A.224 e 225.
Ao conhecimento efetivo é equiparada a situação da pessoa que podia e devia
saber da vicissitude – conhecimento normativo; aqui determina o 224 aquando da chega
das declarações como forma de eficácia da mesma.
O A.266º2 introduz a noção de culpa no desconhecimento: o desconhecimento
culposo não impede a oponibilidade.
O A.269 fala-nos da expressão “devia conhecer”, aqui devendo ser entendida
como uma diligência razoável que qualquer terceiro deveria ter tido.

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Assim, a diferença entre o 266º2 e o 269 é que o 266º2 exige a censurabilidade


– a culpa – do desconhecimento, enquanto que o 269 contenta-se com uma
cognoscibilidade razoável de acordo com a natureza das coisas.

Subestabelecimento
O procurador pode conferir a outra pessoa os poderes de representação que lhe
foram conferidos pela procuração. Trata-se de uma subprocuração, designada por
subestabelecimento. O A.264 admite-o “se o representado o permitir ou se faculdade
de substituição resultar do conteúdo da procuração ou da relação jurídica que o
determina”
Este pode ser feito com reserva, caso em que o procurador mantém os poderes
de representação que tinha, ou sem reserva, caso em que cessam os poderes do
procurador inicial que subestabeleceu os seus poderes.
Segundo o nº2 este entende-se como sendo feito COM RESERVA.
O nº3 fala-nos em culpa in eligendo/instruendo, i.e, o procurador é responsável
pela sua escolha, ou in contrahendo, quanto às instruções que lhe tenha dado.

Representação sem poderes e abuso de representação


Estas figuras inserem-se no domínio da tutela dos terceiros e dentro do
fenómeno representativo.

è Representação sem poderes


Transferir uma coisa sem representação é representação sem poderes, não venda
de bens alheios.
Aqui, não existe uma relação jurídica entre o falso representante e o suposto
representado, mas sim falso representante e terceiro

A.268 - ocupa-se da representação sem poderes, i.e, do ato praticado em nome


e por conta de outra pessoa sem que existam os necessários poderes de representação.
Falta-lhe a legitimidade. Todavia, este negócio pode ser favorável ao dominus: todo o
instituto da gestão representativa do negócio assenta nessa eventualidade - A.471.
Donde o dispositivo do A.268º1 nos diz que o negócio é eficaz em relação ao dominus
se não for por ele ratificado. A ratificação surge deste modo como um ato jurídico em
sentido estrito pelo qual o “representado” acolhe o negócio em causa na sua esfera
jurídica. Esta não se confunde com a aprovação da sua prática, i.e, com a da gestão onde
ele se inclua - A.469. A aprovação apenas implica que o dominus renuncie a eventuais
indemnizações que lhe poderiam cabar por danos causados com a atuação sem poderes
do “representante” e que está disposto a compensar o representante pelas despesas e
danos que ele tenha sofrido com a sua atuação. Assim, a aprovação traduz a vontade do
representado de não invocar os mecanismos do incumprimento eventualmente

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perpetrado pelo falsus procurator - assim, rompendo um mandato, o mandatário pratica


atos não cobertos pelos seus poderes de representação que lhe foram conferidos: assim,
este ato traduz uma violação contratual; assim, pode só haver ratificação, e não
aprovação, de tal modo que se mantenha, incólume, a responsabilidade contratual do
mandatário.
Não há qualquer contradição na hipótese de ratificação sem aprovação. O
negócio celebrado sem poderes, mesmo quando represente uma violação de direitos do
domius ou traduza o incumprimento de um contrato celebrado, pode vir a ser
aproveitável, seja de forma intrínseca, seja por negociações feitas pelo dominus. A
ratificação não prejudica, então, o caráter eticamente reprovável da conduta do agente.
A ratificação está ainda sujeita à forma requerida para a própria procuração - A.268º2 -
e tem eficácia retroativa. Se for negada, o negócio ficará sem quaisquer efeitos. Não
havendo ratificação, o negócio mantém-se; todavia, é ineficaz em relação ao
“representado”. Enquanto se mantiver essa ineficácia, poucos efeitos práticos irá
surtir. De todo o modo, o próprio terceiro fica vinculado a ele. Para não protelar esta
situação, a lei distingue duas hipóteses:
è a de o terceiro ter conhecimento da falta de poderes do representante, no
momento da conclusão -> aqui o terceiro pode fixar um prazo para que
sobrevenha a ratificação: se o prazo for ultrapassado, a ratificação é negada -
A.268º3 - ficando o negócio sem efeito. Se ele não for fixado, o terceiro sujeita-
se que o “representado” protele a situação. Mas este, segundo o A.411, pode
pedir ao tribunal que fixe um prazo razoável;
è a de ele não ter tal conhecimento - aqui o terceiro pode, a todo o tempo revogar
ou rejeitar o negócio;

Na representação, o relacionamento interno estabelece-se entre


representante e representado, enquanto que o relacionamento externo
entre representante e terceiro.
Na relação externa avulta o que o representante pode faze (agir),
enquanto que na relação interna o modo como o deve fazer -> Larenz
è O abuso da representação
O abuso é uma questão interna, entre representante e representado e não
pode, em princípio, ser oposta a terceiros. Ele deve ser oponível ao terceiro,
ressalvando, quando este soubesse ou tinha o dever de saber.
A.269 reporta-se ao abuso da representação. Determina a aplicação do regime
da representação sem poderes “se a outra parte conhecia ou devia conhecer o abuso”.
Este abuso vem a ser o exercício dos inerentes poderes em oposição com a
relação subjacente: com o que dela resulte ou por violação de deveres de lealdade. É
inoponível a terceiros de boa fé, salvo se o terceiro conhecesse ou devesse conhecer.

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Há doutrina, como Antunes Varela e Pires de Lima, que exigem para o regime do
abuso a consciência do mesmo pelo representante. Contudo, isto não tem muita lógica,
como aponta o STJ, pois a própria ideia de abuso tem inerente uma reprovabilidade e
uma consciência.

Relacionamento externo vs relacionamento interno


Na representação sem poderes não existe uma relação jurídica entre o falso
representante e o suposto representado. A atuação do falso procurador é ineficaz em
relação ao suposto representado. Este tem o poder potestativo de ratificar a atuação do
mesmo e de assumir, assim, os atos que este praticou em seu nome.
No relacionamento externo, aqueles perante quem os falsos poderes de
representação forem invocados também nenhum poder têm contra o suposto
representado. Este fica eficazmente protegido contra o falso representante e em relação
a terceiros. Quem fica protegido é aquele que, em certos casos, se relaciona com o
representante.

Não havendo poderes de representação, nada pode incidir na esfera do


representado que tenha sido provocado pelo representante.
No relacionamento interno, o representado pode exigir do representante infiel
a indemnização dos danos sofridos. Mas no relacionamento externo, não pode opor aos
terceiros o abuso, salvo quando consiga demonstrar que estes conheciam ou deviam
conhecê-lo. Contudo, o risco do abuso recai no representado e na escolha deste, neste
caso, do representante.

O que verdadeiramente distingue a Representação sem poderes do Abuso de


Representação:

• Enquanto que na Representação sem Poderes – mais do que um desvio, há uma


atuação, por parte do representante, num determinado campo em que o mesmo
não estava habilitado a atuar; como tal, o representante pratica um ato sem
estar habilitado para tal, i.e, sem ter os devidos poderes de representação. Este
tipo de problemas torna-se fácil quando não existe, sequer, uma outorga da
procuração por parte do representado.
• O Abuso de Representação – há um desvio notório em relação à relação base,
i.e, à causa jurídica do contratar, ao modo estipulado pelas partes (representado
e representante); ele ( o representante) age assim em desconformidade com as
instruções acordadas na procuração.
Em qual delas há uma maior proteção de terceiros?

• Protege-se mais os terceiros no Abuso de Representação pela confiança que


estes criaram e que o Direito tutela, obviamente, em face do abuso do

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representado. O negócio é assim válido, mesmo que estes não peçam/exigem a


prova documental e comprovativa dos poderes do representante – A260.

Capítulo III - A Repercussão do tempo nas Situações


Jurídicas
55. O tempo e o Direito

O Direito Civil ocupa-se da estabilidade das situações jurídicas, apesar de o ser


humano ser um ser transitório. Por isso, o tempo não terá influência no campo das
realidades jurídicas. É por isso que, ontologicamente, o direito tenterá segurar uma
realidade em permanente mutação. Apesar de “segurar”, o Direito, por vezes, reconhece
um papel ao tempo: o caso das situações jurídicas.

58. Enumeração de Institutos; a primazia da prescrição e outras formas

No A.298 verificam-se 3 distintas figuras:

- A prescrição -º1

- A caducidade - º2 – aplica-se a direitos que sejam temporários. Os direitos que


devam ser exercidos durante certo tempo são suscetíveis de caducidade

- O não-uso - º3 – aplica-se aos direitos reais que a lei exclui da prescrição e opera
em casos especiais – A.1569º1

60. Âmbito dos prazos civis

Salvo norma em contrário, os diversos prazos são civis, seguindo as regras do


A.279

O A.279 fixou dois tipos de regras


è Regras destinadas a interpretar as declarações de vontade feitas pelas partes,
a propósito das estipulações do termo
è Regras mais gerais sobre o cômputo dos prazos
62. Regras Transitórias
A. 297 -> Se o prazo se tiver iniciado pela lei velha e a lei nova o encurtar:
reinicia-se a contagem, à luz da lei nova e à data de vigência desta; posto isto,
aplica-se o da lei velha ou o da lei nova, consoante o que primeiro expirar; Na
mesma situação e se a lei nova alongar o prazo, este tem aplicação, mas computa-
se, nele, o tempo decorrido desde o início
A.299 -> No tocante a alterações de qualificação de prescrição para
caducidade:

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è A nova qualificação, com todas as consequências, aplica-se às situações em


curso
è A lei nova não atinge as suspensões da prescrição ocorridas pela lei velha.

Secção II – A Prescrição
Na Prescrição interrompe-se judicialmente a capacidade do exercício de um
direito. Esta aplica-se a todos os direitos que não sejam indisponíveis (como o de
personalidade); aplica-se a direitos de crédito e reais.
Esta é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular do direito no seu
exercício, traduzindo-se em o direito prescrito sofrer um enfraquecimento pela pessoa
vinculada poder recusar o cumprimento ou a conduta a que esteja adstrita. Assim, o
devedor invoca a prescrição, i.e, a recusa a um cumprimento, se o credor deixar de
exercer durante um certo tempo o seu direito. Está é, assim, um meio de defesa do
devedor e que ele opõe ao direito do credor. Tem a utilidade de dispensar o devedor de
cumprir, depois de esgotado o prazo legal.
Segundo o A.300, “são nulos os negócios jurídicos destinados a modificar os
prazos legais da prescrição ou a facilitar/dificultar por outro modo as condições em que
ela opere os seus efeitos”. É também proibida a renúncia antecipada à prescrição –
A.302º1. Ela é, por sua vez, só possível, de modo expresso ou tácito, quando decorrer o
prazo prescricional e desde que operada por quem tenha legitimidade para dispor do
benefício que a prescrição tinha criado – A.302/ º2 e 3.
Assim, a prescrição torna-se um instituto integralmente imperativo, podendo as
partes somente fixar prazos mas de caducidade – A.330º1
Fundamentos da prescrição:
è Fundamentos atinentes ao devedor: aqui a prescrição visa relevar o
devedor de prova; caso das situações em que, com o passar do tempo,
no caso dos recibos, e por ninguém os guardar, torna-se difícil a prova
do pagamento que se tenha efetuado. A não haver prescrição, qualquer
pessoa poderia a todo o tempo ser demandada por quase tudo o que
pagou ao longo da vida
è Fundamento de ordem geral: atinente à paz jurídica e segurança. No
entanto, o tribunal não pode, de ofício, constatar a prescrição – A.303
Contudo, é unânime que a opinião que a prescrição visa tutelar o interesse do
devedor, tal como o usucapião (pela qual a posse prolongada por longo tempo
causa a titularidade do direito, normalmente de propriedade) . A prescrição é
uma posição privada concedida no interesse do devedor. Este usá-la-á ou não
Em suma, o Direito Civil sabe o quão difícil é dar-se o que não se tem. Por isso,
defende as pessoas limitando a autonomia privada.
77. Natureza das normas sobre prescrição; a rigidez dos prazos

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Quando fixe um prazo, a norma torna-se autossuficiente: vale por si, esgotando-
se na missão de fixar um prazo predeterminado
78. Renúncia à invocação da prescrição
A prescrição não pode ser dificultada ou excluída, nem mesmo por acordo das
partes: só depois de ter decorrido o seu prazo e de se ter constituído o direito
potestativo de a invocar, é que se admite a renúncia -> 302º1 ; em rigor, o simples
decurso do tempo dá lugar ao aparecimento de um direito potestativo: o de invocar a
prescrição.
A renúncia será, assim, uma declaração unilateral que visa a extinção do direito
potestativo de invocar a prescrição. A renúncia pode ser, contudo, tácita. Renuncia
tacitamente à prescrição quem, depois de decorrido o prazo prescricional, reconheça a
dívida exequenda (em execução), obrigando-se a pagá-la.
Segundo o A.305º1 esta também pode ser invocada por terceiros com “o
legítimo interesse na sua declaração” – esta tem, contudo, a sua sede geral, no âmbito
da legitimidade que é dada aos credores para exercer certos direitos relativos ao
devedor, no A.605 e ss. – Remissão. Assim, ela pode ser invocada por outrem que não
o seu direto beneficiário.
Segundo o 305º2, o caso julgado, em si, só é eficaz entre quem tenha sido parte
no processo que o originou.
80. Início do prazo
Sistema objetivo -> o prazo começa a correr assim que o direito possa ser
exercido e independentemente do conhecimento que tenha ou possa ter o respetivo
credor
Sistema subjetivo -> só se dá quando o credor tenha conhecimento dos
elementos essenciais relativos ao seu direito
A.306º1 adotou o esquema objetivo: dispensa qualquer conhecimento por parte
do credor. A prescrição só se conta depois de o direito poder ser exercido.
79. Beneficiários e invocação
A.301 diz-nos que a invocação aproveita a todos os que dela possam tirar
benefícios, sem exceção dos incapazes.
PPV – a) prescrição comum e presuntiva
Prescrição comum – o beneficiário só precisa de invocar e demonstrar a inércia
do titular do direito no seu exercício durante o tempo fixado na lei. Este regime é
neutro quanto à relação de cumprimento ou incumprimento: a prescrição ocorre, quer
o devedor tenha ou não cumprido. Se já tiver cumprido, o devedor deixa de ter de
invocar e demonstrar o cumprimento, basta-lhe invocar a prescrição; é de destacar que
a prescrição não extingue o direito nem a vinculação – a pessoa recusa-se, simplesmente,
a cumprir: apenas confere ao obrigado o poder de recusar o cumprimento.

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è A.309 – prazo ordinário da prescrição comum é de 20 anos


Prescrição presuntiva - funda-se na presunção do cumprimento. A ratio legis é
clara: passado certo tempo sem o credor exigir o cumprimento, presume-se que o
devedor já cumpriu. O A.316 fala-nos de 6 meses para certos créditos. Esta prescrição
presuntiva é uma prescrição júris tantum que pode ser refutada por prova em contrário,
tal como sucede com o regime normal da presunção (A.350º2); a prova, i.e, a prescrição
presuntiva só pode ser contrariada por confissão do devedor originário.
O A.317 prevê prescrições de dois anos.
A confissão, segundo o A.352, é o reconhecimento que a parte faz da realidade
de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária. No caso da prescrição
presuntiva, a confissão consistirá no reconhecimento de que afinal a dívida não foi paga.
No entanto, a prescrição é muito forte, pois apenas pode ser confessada pelo próprio, e
não, neste caso, pelo credor – A.313; esta tem ainda de ser feita pelo devedor originário
– A.313º1
o A confissão pode ser judicial ou extrajudicial (sendo que nesta
última só pode ser feita por escrito – A.313º2
o A confissão judicial pode ser:
§ Espontânea – produzida por iniciativa do confitente
§ Provocada – quando feita por iniciativa do juiz ou a
requerimento do credor
Para se provocar a confissão o credor chama o devedor a prestar o depoimento
perante o juiz que o interroga sobre o cumprimento. O A.314 diz-nos que há
confissão tácita se o devedor se recusar a depor
A.315 -> os direitos sujeitos a prescrição presuntiva prescrevem também nos
termos comuns
b) Invocação da prescrição
A prescrição dá azo ao direito de a invocar; se este direito não for exercido, a
obrigação mantém-se civil, não havendo quaisquer efeitos. Se ela for invocada, teremos
uma obrigação natural – 403º1
A prescrição para ser eficaz tem de ser invocada pelo beneficiário
Depois de ter cumprido, o devedor não pode já vir a invocar a prescrição e pedir
a repetição da prestação prestada (A.304 nº2) -> irrepetibilidade do cumprimento
espontâneo da obrigação prescrita; esta não tem de ser feita em plena consciência: a
mesma mantém-se mesmo quando feita na ignorância.
A renúncia pode ser:
è Expressa ou tácita

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è Não necessita de ser aceite pelo beneficiário


è Só pode ser feita por quem tenha legitimidade para dispor do benefício
que a prestação tenha criado (A.302); aproveita a todos os que dela
possam tirar benefícios, sem exceção dos incapazes (A.301)
c. Início do prazo da prescrição
A prescrição pressupõe, sempre, a inércia do titular do direito. Por isso, o seu
prazo não começa a correr enquanto o direito não puder ser exercido, i.e, quando não
for possível o exercício do direito por parte do credor e sim a prescrição pelo devedor.
d. Suspensão da prescrição
A.318 – 322 -> Casos de suspensão da prescrição.
O curso do tempo da prescrição pode ser suspenso: uma vez cessada a
suspensão, o tempo volta a contar. A suspensão não utiliza o tempo já corrido. Assim, o
tempo volta a contar e soma-se o já ocorrido antes da suspensão.
Podemos distinguir
è Causas bilaterais - Implicam uma suspensão da prescrição entre duas
pessoas particularmente relacionadas: p.e, entre cônjuges; A.318; na
alínea c e d o problema é de conflito de interesses
è Causas subjetivas – suspensão favoráveis a pessoas e onde o direito
tutela: ex: pessoas na guerra; a prescrição, tanto nas causas subjetivas
como objetivas, só faz sentido enquanto instituto ao serviço da
segurança. O A.319 só terá, assim, aplicação nos casos de guerra
constitucionalmente declarada.
Regras do A.320:
2. A prescrição não começa nem corre enquanto não tiverem quem os
represente ou administre os seus bens, salvo se respeitar a atos para os
quais o menor tenha capacidade – 320º1 1ª parte
3. Mesmo então, a prescrição não se completa sem ter decorrido um ano
sobre o termo da incapacidade – 320º1 2ª parte
4. A prescrição presuntiva prossegue mas não se completa sem ter
decorrido um ano sobre a obtenção do representante ou administrador
ou sobre aquisição pela da capacidade – 320º2
Sendo que tudo isto é aplicável a interditos ou inabilitados – A.320º3,
sendo que a suspensão dura um máximo de três anos, ideia que se
exprime através de “a incapacidade considera-se finda…”

è Causas objetivas – casos de força maior; A.321. Contém, por fim, as


causas objetivas de suspensão. São duas:

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1. A suspensão nos últimos três meses do prazo, enquanto o titular


estiver impedido de fazer valer o seu direito, por motivo de força
maior;
2. Idem, na hipótese de dolo do obrigado, que o impeça de tal exercício
O nº2 do 321 destina-se a evitar que este possa tirar partido do ilícito próprio,
invocando a prescrição que provocou.

Distinção da suspensão da prescrição com figuras limítrofes:


- a imprescriptibilidade: a situação suspensa está sujeita a prescrição
- o não-vício: normalmente por não poder ser exercido, certo dizer não vê,
correr a prescrição; A.306
Distinção entre as suspensões:
- suspensão inicial – A.318 – 20 “ a prescrição não começa…”
- suspensão intercalar – “a prescrição não… corre …” – ela já se tinha iniciado
quando ocorre a causa suspensiva
- suspensão final – “a prescrição não se completa sem ter decorrido um ano..” –
320º1 in fine; “a prescrição suspende-se no decurso dos últimos três meses do prazo”
321º1 “… não se completa antes de decorridos seis meses” A.322
A suspensão funciona, assim, como um direito potestativo de deter o
funcionamento da prescrição, suspendendo o conteúdo do respetivo prazo. Uma vez
invocada, a suspensão tem eficácia retroativa: eles operam desde que se reúnam os
requisitos.

Interrupção da prescrição
Enquanto que a suspensão permite o aproveitamento do prazo que tenha decorrido
antes dela, a interrupção inutiliza todo o prazo anterior, obrigando a nova contagem
a partir do zero
A interrupção mais não será do que a ausência súbita do processo de
prescrição.
Podemos definir a interrupção da prescrição como o ato ou o efeito de pôr termo
ao processo prescricional. A interrupção, quando ocorra, inutiliza todo o prazo
porventura já decorrido. Se verificados os requisitos poderá haver depois, apenas, um
reinício. Não obstante, a interrupção da prescrição corresponde a uma evidência lógica
e por isso sempre se impõe. Basta ver que, se estão sujeitos a prescrição pelo seu não
exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, determinados direitos – A.298º1
-, o processo cessa logo que eles sejam exercidos – para Dias Marques, fala-se aqui de
“prescrição extintiva”.

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Interrupção promovida pelo titular:


Segundo o A.323º1 a prescrição interrompe-se:
1. Pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima a intenção
de exercer o direito
2. Podendo essa intenção ser expressa direta ou indiretamente
3. Seja qual for o processo a que ato pertence
4. Ainda que o tribunal seja incompetente.
Segundo o A.323º2 a interrupção mantém-se mesmo quando haja anulação da
citação ou notificação: prova de que não se trata de praticar atos judiciais, mas de levar
ao conhecimento do devedor a intenção de exercer um direito.
No A.323º2 dispõe que se a citação ou notificação não se fizer dentro
de cinco dias depois de ter sido requerida por causa não imputável ao
requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram cinco dias.
è O reconhecimento: A prescrição é interrompida pelo reconhecimento
do direito, efetuado perante o respetivo titular, por aquele contra quem
o direito pode ser exercido – A.325º1; o nº2 admite o reconhecimento
tácito.
è O reinício: Como vimos, a interrupção inutiliza todo o tempo
anteriormente decorrido. A partir dela, começará a contar-se nova
prescrição, sujeita ao prazo primitivo – A.326 – salvo hipótese de
prescrições de curta duração: estas passam ao prazo ordinário, quando
os respetivos direitos sejam reconhecidos por sentença transitada ou
caso sobrevenha um título executivo . A.311.
è Prescrições especiais: A.482 e 498º1 são relativos ao direito e à
restituição por enriquecimento e ao direito de indemnização,
estabelecendo um regime de prescrição diferenciado:
o uma prescrição de três anos a contar da data em que o
credor teve conhecimento do direito que lhe compete
e da pessoa do responsável (no enriquecimento) ou do
direito que lhe compete, embora com
desconhecimento da pessoa do responsável e de
extensão integral dos danos
o mantendo-se, em ambos os casos, a prescrição
ordinária, a partir, do enriquecimento e do facto
danoso.
O direito de regresso entre os responsáveis prescreve, também no
prazo de três anos – A.498º2

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SECÇÃO IV – A Caducidade e o Não-Uso


Caducidade
è Em sentido amplo - esquema geral de cessação de situações jurídicas, mercê
da superveniência de um facto a que a lei ou outra fonte atribuiu esse efeito:
traduz-se na extinção de uma posição jurídica pela verificação de facto de
eficácia extintiva.
A caducidade liga-se:
2. À verificação de um termo
3. À impossibilidade superveniente de prestações, por razões:
a. Subjetivas (morte ou incapacidade do devedor
b. Objetivas (perda da coisa ou expropriação
4. À ilegitimidade superveniente (cessação dos poderes que presidiram à
celebração do contrato).
è Em sentido estrito - forma de repercussão do tempo nas situações jurídicas que
devam ser exercidas dentro de certo tempo. Expirado o respetivo prazo sem
que se verifique o exercício, há extinção.
1. Caducidade simples – a lei limita-se a prever ou referir a cessação de uma
situação jurídica pelo decurso de certo prazo;
a. Ex: prazo de 1 ano para arguir a anulação (A.287)
2. Caducidade punitiva – o Direito impõe a cessação de uma posição jurídica
como reação ao seu não-exercício, no prazo fixado; vê-se pela expressão “sob
pena de caducidade”. Esta relaciona-se mais com direitos potestativos: a lei
prevê que estes direitos sejam exercidos com prontidão ou então cessem
a. A.436º2
A aplicação do regime da caducidade depende da determinação da sua
natureza: prazo de prescrição ou prazo de caducidade?. O A.298º2 contém uma solução
clara para a determinação da caducidade: “Quando, por força da lei ou da vontade das
partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras de
caducidade, a menos que a lei se referia expressamente à prescrição”. Na hipótese de
“prazo” fixado pelas partes, dificilmente se poderia cair na prescrição: se esse fosse o
caso, a cláusula seria nula, dado o A.300. Perante um prazo legal: ou ele tem a palavra
“prescrição”, ou caímos na reserva da caducidade. Assim, trata-se de normas plenas e
apenas interpretadas através do seu sentido literal: não admitem analogia nem redução
teleológica. De outro modo, perder-se-ia a segurança jurídica.
Não se pode entender, contudo, que dado o A.298º2 no Direito português a
regra geral é a da caducidade; pelo contrário, é da prescrição, pois a ela estão sujeitos
todos os direitos disponíveis que a lei não declare isentos de prescrição – A.298º1.

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Tipos de caducidade:
1. Caducidade legal ou convencional, seja ela predisposta por lei ou
pelas partes – A.330º1
2. Caducidade relativa a matéria disponível (as partes podem alterar o
regime legal) e indisponível (as partes não podem alterar o regime
legal)
a. Perante direitos disponíveis surge o reconhecimento do
direito como facto impeditivo (331º2)
3. Caducidade relativa a ações judiciais (A.332) – propõe-se uma ação
em juízo.

Início e suspensão:
O prazo da caducidade, salvo se a lei fixar outra data, começa a correr
no momento em que o direito puder legalmente ser exercido – A.329. Esta
norma distingue-se, em dois pontos quanto à prescrição – A.306
1. Prevê que a lei possa fixar outra data
2. Não associa o início do decurso do prazo à exigibilidade – a que se
deve, no caso inverso, da prescrição estar ligada geneticamente às
obrigações
No domínio da caducidade não se aplicam as regras sobre suspensão e
interrupção do prazo que funcionam perante a prescrição – A.328. O CC, só a propósito
da prescrição, anuncia isto expressamente – 318 e ss e 323 e ss
O A.328 ressalva a hipótese de a lei determinar a aplicação, ao prazo de
caducidade, das regras sobre a suspensão e a interrupção – casos de caducidade
convencional A330º2; aqui funciona, tal como na prescrição, o instituto da suspensão:
melhor exemplo é o do 2308/3
A caducidade só é detida pela prática, dentro do prazo legal ou convencional, do
ato a que a lei ou a convenção atribuam o efeito impeditivo.
A caducidade do direito de pedir a rescisão do contrato de trabalho não é afetado
pela suspensão desse mesmo contrato.
Dúvida: remissão 332º1 – 327º3
Tratando-se de caducidade convencional ou caducidade relativa a direito
disponível, o A.331º2 admite que ela seja detida pelo reconhecimento do direito por
parte daquele contra quem deva ser exercido
Reconhecimento oficioso: No que toca à apreciação oficiosa é fundamental
saber-se se a matéria em jogo é disponível ou indisponível. Perante situações excluídas
da disponibilidade das partes, a caducidade é apreciada oficiosamente, podendo ser
alegada a qualquer fase do processo- A.333º1

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O A.331º2 remete para o 303 -> o tribunal não pode suprir, de ofício, a
prescrição.

Natureza e eficácia da caducidade.


è Distinção entre caducidade e prescrição
o Por exigir, a caducidade, específicas previsões: legais ou contratuais; a
prescrição contenta-se com a previsão geral do A.298º1
o Enquanto que a caducidade se reporta a direitos potestativos, a
prescrição assume uma feição dirigida às obrigações (Direito de crédito)
o A prescrição é imune à vontade das partes (A.300) e, pelo contrário, a
caducidade pode ser modelada pela autonomia privada; seja prevendo
novas hipóteses, seja fixando regras distintas das legais (A.330º1)
o As regras de prescrição são de natureza imperativa. A lei ressalva, in fine
330º1, que nunca seria possível afastar as regras da prescrição: quaisquer
cláusulas contratuais a tanto destinadas, caem na invalidade por
contrariedade à lei (280º1)
o A caducidade tem prazos em regra curtos (10 a 15dias), ao contrário da
prescrição, cujo horizonte é constituído pelo prazo ordinário de vinte
anos (A.309). Mesmo as presuntivas, ficam pelos seis meses de prazo
(A.316)
o Na prescrição, a lei prevê os casos de suspensão (318), interrupção
(323). Já na caducidade, isso não se sucede (a.328); exige-se uma
aplicação supletiva da suspensão às caducidades convencionais
(A.330º2)
o Finalmente, a caducidade estabelecida em matéria indisponível é
oficiosamente apreciada pelo tribunal (A.330º1), o que nunca se verifica
no caso da prescrição (A.303)
Efeitos e natureza:
Como vimos, a prescrição tem como objetivo final o de converter as
obrigações civis em naturais: o beneficiário pode opor-se, por qualquer modo,
ao exercício do direito prescrito (A.304º1); todavia, se realizar
espontaneamente a correspondente prestação, mesmo na ignorância da
prescrição, já não a pode repetir (304º2)
1. Caducidade reportada a posições indisponíveis – traduz uma
delimitação temporal às situações envolvidas: atingido o prazo
fixado, elas cessam
2. Caducidade reportada a posições disponíveis – confere, ao
beneficiário, um direito potestativo: o de, através da declaração de

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vontade que consiste em invocar a própria caducidade, pôr termo à


situação jurídica atingida.

O Não Uso
Não uso equivale ao não exercício do direito real em jogo; devia dizer-
se “não gozo”
Surge como um dos três institutos legalmente previstos que traduzem a
repercussão do tempo nas situações jurídicas.
Infere-se do não-uso
2. O Não uso tem uma aplicação taxativa aos direitos enunciados no
A.298º3: todos eles direitos reais e de gozo
3. Ainda então exigindo uma nova e especial previsão – que emerge
das caraterísticas próprias dos direitos reais: a extinção de um
direito faz, em regra, surgir direitos noutra esfera: isto deve estar
explicitado na lei, tendo em conta o princípio da tipicidade
(A.1306º1)
Direitos reais sujeitos ao não uso : 1476º1C

è Supressio ex bona fide

Perde a posição jurídica a pessoa que não a exerça por um período de tempo
e em circunstâncias tais que não mais seja de esperar tal exercício.

o Além dos institutos enumerados taxativamente no 298, além, pois, da lei,


também as partes podem criar esquemas inovadores de repercussão do
tempo nas situações jurídicas disponíveis – neste caso A.330º1, onde a
lei permite modificar o regime legal da caducidade. A própria condição
(A.270) pode induzir fatores que envolvam o tempo.
o Esta figura (a supressio ex bona fide) consiste na supressão por exigência
da boa fé – surge como um corretivo necessário para complementar as
situações particulares e individuais que não consigam ser perscrutadas
pela sonda da caducidade e da prescrição
o O manuseio da supressio é vaga e pressupõe uma série de ligações à
tutela de confiança e à boa fé, enquanto regra de conduta. Trata-se, por
isso, a matéria a examinar a propósito do abuso do direito

Abuso de Direito
Controlo direto da justiça material do caso: ter cuidado, claro, com a utilização e com
o ónus de fundamentação do caso.

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Contradição entre a desconformidade e a estrutura do ordenamento jurídico.


Antes de mais, depreende-se por “ilegítimo” a “ilicitude” ou a “não permissão” – A.334;
o preceito exige ainda que este exercício exceda “manifestamente” certos limites.
Exercício inadmissível de uma posição jurídica porque contrário à boa fé; exercício
ilícito, porque inadmissível, de uma posição jurídica.

Há 3 fontes de ilicitude, 3 locuções normativas que a prescrevem:


è Os limites impostos pela boa fé – neste caso a objetiva
è Os bons costumes – regras da moral social; igual aos do A.280
è O fim social ou económico do Direito

Nesta exposição, o legislador não apela a conceitos técnicos precisos, limitando-se a


fazer uma remissão direta para a Ciência do Direito. Estas locuções são aproximações de
uma ideia, que em bom rigor, é a justiça material. Como tal, a centralidade do abuso de
direito está na boa fé.
Como tal, o exercício de uma posição jurídica é ilícita, em abuso de direito, quando
for materialmente injusta. O exercício daquele Direito, legítimo, é feito em
circunstâncias tais que naquele caso concreto há uma situação de injustiça material
O A.334 é, assim, a válvula de escape do sistema: quanto tudo está a correr bem mas
ocorre uma situação materialmente injusta, vamos à válvula de escape, pois o direito
não suporta condutas materialmente injustas.
Como tal, recorre-se a dois institutos:

Primazia da materialidade subjacente – O direito não gosta de situações


formalmente corretas mas materialmente injustas

Tutela da Confiança – O Direito não gosta de frustração de expetativas que tenham


sido legitimamente constituídas

No Direito Romano havia a “emulacio”/emulação, que consistia em retirar proveito


de um direito sem o mesmo ter uma utilidade específica, simplesmente com o fim
de prejudicar alguém. Como tal, o exercício de um direito emulativo constitui um
abuso de direito

Há 5 modalidades de abuso de direito, sendo que a sua categorização é imprecisa:


è Exceptio Doli / exceção do dolo – traduz-se no poder de paralisar a pretensão
de certo agente quando este pretendesse prevalecer-se de sugestões ou
artifícios não permitidos pelo Direito – A.253º1.

è Verine Contra Factum Proprium (vir contra o facto próprio a nível literal e
materialmente falando contradizer o seu próprio comportamento)

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– “Nada é concedido àquele que vem contra o seu próprio facto”; pressupõe
dois comportamentos contraditórios diretamente:
1. Um facto proprium (um comportamento próprio do sujeito)
2. Um outro comportamento que entra em colisão com o anterior
I.E: Eu faço A e em momento posterior venho fazer não A

o Como tal, há uma desconformidade de comportamentos, uma contradição.

Tipos de Venire:
1. Venire positivo – uma pessoa manifesta uma intenção ou gera uma convicção
de que não irá praticar certo ato e depois pratica-o
o Exercício de direitos potestativos
o Exercício de direitos comuns
o Atuações no âmbito de liberdades gerais

2. Venire negativo – o agente em causa demonstra ir desenvolver certa conduta e


depois nega-a.
Há quatro doutrinas quanto ao Venire:
1. A da boa fé – em que, claramente, o venire, porque dotado de carga ética e
psicológica atenta contra a boa fé: implica a natureza legal dos deveres que dela
promanem
2. A doutrina da confiança
3. Da doutrina do negócio – Pergunta-se: pode um incapaz venire contra factum
proprium? E se houver simulação, reserva mental, incapacidade acidental, erro,
dolo, etc? A doutrina prevê o venire objetivamente: não se requer culpa, por
parte do titular, na ocorrência da contradição. Contudo, não se pode dar mais
consistência ao venire do que ao NJ. A derivação do venire a partir da boa fé
implica a natureza legal dos deveres que dela promanem. Canaris admite uma
aplicação tendencial das disposições referentes às declarações de vontade, à
formação das previsões de confiança, e por isso ao factum proprium.
4. A da dissolução
A doutrina atual segue o princípio da Tutela da Confiança
A doutrina atual reconduz o venire a uma manifestação da tutela da confiança. A
base legal insere-se no 334 e na boa fé objetiva. A confiança permite um critério de
decisão: um comportamento não pode ser contradito quando ele seja de molde a
suscitar a confiança das pessoas. Trata-se de imputar aos autores respetivos as
situações de confiança, que de livre vontade, tenham suscitado.
Falando em confiança, é bom relembrar a sua concretização:
1. Uma situação de confiança (subjetiva) – é expressada pela ideia de boa fé
subjetiva e ética, própria da pessoa que, sem violar os deveres de cuidado que

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ao caso caibam, ignore estar a lesar posições alheias; aqui, para relevar o Venire
tem que se atender à normalidade típica- A.236
2. Uma justificação para essa confiança (objetiva) – expressa na presença de
elementos objetivos capazes de provocarem uma crença plausível e de adesão
de uma pessoa normal; o tal elemento subjetivo de que o confiante aderiu, de
facto, ao facto gerador de confiança. Do ponto de vista do declaratário, o que o
declaratário conferiria.
3. Um investimento de confiança – a pessoa desenvolveu uma atuação baseada na
própria confiança; atuação essa que não possa ser desfeita sem prejuízos
inadmissíveis (neste caso, uma confiança puramente interior); em consequência
do factum proprium que aderiu, o confiante ter desenvolvido uma atividade tal
que o regresso à situação anterior seja impossível em termos de justiça; o
investimento de confiança deve merecer tutela: na prática de atos materiais ou
jurídicos que tenha por fundamento a confiança justificada.
4. A imputação da situação de confiança – implica a existência de um autor a quem
se deva a entrega confiante do tutelado. Ao proteger-se de uma pessoa vai-se,
em regra, onerar outra: isto implica que a outra seja a responsável pela situação
criada.
Isto tudo, claro, articulado enquanto sistema móvel.

Inicialmente, historicamente falando, a doutrina falava em comprovativo de eticidade.


Seguidamente, com o desenvolvimento da boa fé objetiva, e da tutela da confiança, a
doutrina foi transitando-se de uma mera justificação ética para o âmbito da tutela da
confiança: o relevante para que o verine paralise o Direito não é a mera contradição de
comportamentos mas a frustração de uma tutela – fala-se, aqui, em “objetivação do
instituto”, i.e, se o verine não for relevante, e se não o for não frustra a tutela de
ninguém, o seu reconhecimento não é relevante.

è O verine é ambivalente porque:


1. Corresponde a um grupo de casos particulares
2. A própria formulação corresponde à tradução de ideia geral de abuso, de um
princípio geral.
o Contudo, por regra ele corresponde a um grupo de casos reservados.
o No que se refere ao ponto 2, há que entender que a invocação do Venire
apenas deve acontecer quando esgote todas as modalidades de abuso de
direito, pois sendo um princípio geral, todas as outras hipóteses
assemelham-se com o Venire

è Tu Quoque (também tu!)

O tu Quoque exprime a regra geral pela qual a pessoa que viole uma norma
jurídica não pode depois, sem abuso:

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1. Ou prevalecer-se da situação daí decorrente


2. Ou exercer a posição violada pelo próprio
3. Ou exigir a outrem o acatamento da situação já violada
o O que distingue o tu quoque do venire é que o factum proprium (o
comportamento inicial que eu tomo) é a violação de uma norma legal: i.e, de um
ilícito.
o No Tu Quoque alguém pratica um ilícito e posteriormente vem a retirar desse
ato uma vantagem; caso do A.126 onde o menor com dolo enganou o terceiro,
pois ao celebrar o ato com o mesmo, vem agora invocar a invalidade do mesmo
em seu próprio proveito
o Se o A.242 não existisse o tu quoque impediria a arguição da simulação
o Diferentemente, do Venire, o que está em causa não é uma existência de
confiança a tutelar, mas a questão do factum proprium ser um ilícito
o Presença da Materialidade subjacente – que aqui é o tirar vantagem do ilícito

è Suprecio surretio
Supressio -Posição do direito subjetivo – ou melhor, de qualquer situação jurídica –
que, não tendo sido exercida, em determinadas circunstâncias e por um certo lapso
de tempo, não mais possa sê-lo por, de outro modo, ser contrária à boa fé.
Pressupostos e exigências

1. Que todos os direitos ou posições similares lhe estão sujeitos, salvo


determinadas exceções;
2. Que se exige um certo decurso de tempo sem exercício, tempo esse que varia
conforme as circunstâncias
3. Que, além disso, se requerem indícios objetivos de que o direito em causa não
será exercido.
É um instituto totalmente objetivo, pois não requer qualquer culpa do titular atingido,
mas apenas o facto da sua inação.
A Supressio é, no fundo, uma forma de tutela da confiança do beneficiário, perante a
inação do titular do direito.
Aqui o factum proprium não é uma atuação positiva mas uma omissão.
Modelo de decisão, destinado a proteger a confiança de um beneficiário, com as
seguintes proposições:
1. Um não-exercício prolongado – uma pessoa normal perceberia de que a posição
em causa não iria ser mais exercida
2. Uma situação de confiança -
3. Uma justificação para essa confiança
4. Um investimento de confiança – mercê da confiança criada, o beneficiário não
dever ser desamparado, sob pena de sofrer danos dificilmente reparáveis

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5. A imputação da confiança ao não-exercente – é uma imputação objetiva: não se


exige culpa. Social e eticamente isso entende-se pela sua atuação.

No fundo, a Supressio faz com que se dê o surgimento, ex bona fide, de uma


nova posição jurídica.
o O Direito considera inadmissível quando o titular de uma posição juridicamente
relevante não a exerce durante um determinado tempo. A inadmissibilidade
advém da abstenção do exercício e desta entrar em conflito com a esfera de um
terceiro que levou à constituição de uma situação confiança e que vem a ser
frustrada pelo exercício intempestivo.
o Aqui o factum proprium é a abstenção, o não exercício: há contradição de
comportamentos porque eu não fiz nada durante muito tempo e depois lembro-
me de arguir o direito.
o Aqui está mais presente a Tutela da Confiança
o Suprecio significa suprimir: suprimir a posição jurídica de alguém que não a pode
exercer, pois estaria em abuso. Como este deixa de poder exercer, aquele que
tem uma posição jurídica tutelada pelo Direito adquire uma vantagem – a
surrectio
o No entanto, surrectio e suprecio estão de mãos dadas: sempre que há uma há
outra
o Adquire uma posição de vantagem ex bona fide (a partir da boa-fé)

è Inalegabilidades formais

o Chamamos inalegabilidades formais à situação em que a nulidade derivada


da falta de forma legal de determinado negócio não pode ser alegada sob
pena de se verificar “abuso de direito” contrário à boa fé.
o Devem mencionar-se, para além das versões já referidas:
1. Doutrina da confiança – “o doloso provoca, na outra parte, a impressão
de que o negócio é eficaz e assume, assim, a confiança desta: deve
responder pela situação de confiança obtida”. A pretensão de
cumprimento seria, uma necessidade ético-jurídica.
2. Saídas negociais – estas partem, aqui, da construção de confiança. O
contrato nulo, pela seu regime e feitos, é um contrato verdadeiro – esta
orientação vai longe demais
3. A natureza das normas formais
Para além dos requisitos, como no verine, dos pressupostos de confiança (os quatro),
nas Inalegabilidades o mesmo acontece, acrescentado-se, todavia três proposições:
1. Devem estar em jogo apenas os interesses das partes envolvidas, nunca os de
terceiros de boa fé
2. A situação de confiança deve ser censuravelmente imputável à pessoa a
responsabilizar
3. O investimento de confiança apresentar-se-á sensível.

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o Há que atender que, nas inalegabilidades formais o factum proprium é um


contrato formalmente nulo
o Aqui dá-se a impossibilidade de alegar um vício de forma. Neste caso o ilícito é a
violação de uma forma legal, em tais circunstâncias, que vir agora alegar a
consequência da falta de forma, constitui abuso de direito.
o É muito idêntica ao Tu Quoque
o A Ciência do Direito não a consegue distinguir axiomaticamente do Tu Quoque
o MC inicialmente era da opinião que era inadmissíveis
o Basicamente, eu promovo um vício de forma no NJ suscitando a confiança, na
outra parte, de que esse vício não vai ser relevante entre nós, e ulteriormente
invoco a nulidade do NJ por falta de forma e com o intuito de tirar benefícios
disso.
Há que ter em conta que a posição primordial é a da pessoa contra quem se vai
pretender valer a nulidade formal. Esta posição equaciona-se em dois aspetos:
1. A sua relação com o vício formal – deve entender-se a necessidade de boa fé
subjetiva (aqui com deveres de indagação e informação acrescida) por parte de
quem queira fazer valer a inalegabilidade, ou seja, o desconhecimento aquando
da celebração do contrato de necessidade formal – i.e, a evidência da falta de
forma ou a negligência
2. As consequências para ela emergentes da nulidade – a jurisprudência tem dito
que a inalegabilidade surge justificada apenas quando a destruição do NJ tivesse
para a outra parte efeitos consideráveis.

è Exercício em desequilíbrio

o Está em causa a Materialidade Subjacente, ocorrendo sempre que a


vantagem que eu retiro de uma situação ativa tem uma desvantagem
para outro sujeito, completamente desproporcional: há uma
desproporcionalidade gritante entre a vantagem que eu retiro do
desequilíbrio e o sacrifício que a outra parte sustenta: há abuso por
contrariedade à boa fé

o Ex: Não pode pedir obras ao senhorio, porque a vantagem económica


que o senhorio retira é desproporcional À obra, à exigência.
o Ideia de proporcionalidade
o Justiça comutativa
o Proporcionalidade
Categorias de desequilíbrio no exercício com três sub-hipóteses:

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1. A do exercício danoso inútil – o titular atua no âmbito formal da permissão


normativa que constitui o seu direito. Porém, não retira qualquer benefício
pessoal, antes causando um dano considerável a outrem
2. A do dolo agit (quit petit quod statim redditurus est), i.e, age com dolo aquele
que exige o que deve restituir logo de seguida). Como tal, a exigência do que
deva ser restituído é inútil, sendo ainda danosa para a contraparte.
Aqui, há dois vínculos entre as partes, sendo que o i) habilita o titular a formular
uma determinada exigência e um ii) impõe-lhe a restituição.

3. A da desproporção entre a vantagem do titular e o sacrifício por ele imposto a


outrem.

Sistemas: interno, externo e móvel


Sistema interno, externo e móvel.

Sistema externo – modo como a normatividade nos é revelada, especialmente quanto


às suas fontes. Vamos à procura dos tópicos normativos que depois se convalida no
sistema interno.

Sistema interno – a relação entre estes dois sistemas é um fator complexo e profundo.
Sistema interno é fundamentalmente a falar princípios de valorações axiomáticas que
dão identidade ao próprio ordenamento. É o que dá a solução ao problema, ao caso.
Sistema móvel – recorremos ao sistema móvel sempre que para aplicar uma
determinada solução dizemos que os critérios que têm de estar verificados para a sua
aplicação, é mais a intensidade dos critérios que se apresentam do que a exaustão da
sua verificação; um conjunto de critérios que preenchem a aplicação do instituto, pode
algum deles não pode estar preenchido, porque a intensidade problemática dos outros
elementos é de tal modo intensa, presente, que ainda assim a solução que o instituto
faculta deve ser aplicada ao caso. Na figura das inalebagilidades formais, esta
modalidade ganha mais esteticidade, porque estamos perante normas absolutas
(Menezes Cordeiro). É, assim, a última válvula de escape do sistema.

COISAS - TOMO IV
NOÇÃO E PAPEL
A designação tradicional era a de coisas ou cousas; referia-se, embora e por
vezes, com um sentido semelhante, a “bens”. O bem traduz a utilidade que a coisa pode
proporcionar ao homem, exprimindo as coisas efetivamente apropriadas.
O termo “coisa” é, tecnicamente, o mais adequado para traduzir a realidade em jogo
nos artigos 202º e seguintes. O termo “bem” pode ser usado em paralelo, embora com
conotações próprias:

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v Ou por surgir em áreas periféricas, abarcando elementos patrimoniais mais


vastos: “regime de bens” ou “bens da herança”, por exemplo;
v Ou por corresponder a cosas incorpóreas: “bens imateriais”;
v Ou por assumir conotações valorativas mais amplas do que a mera res: “bens
humanos” ou “bens de personalidade”;
v Ou por corresponder à categoria económica oposta à dos serviços.

A noção de base, no coração do Direito Civil, mantém-se, todavia, a de coisa.

AS DIMENSÕES DE COISA
Em torno de coisa podemos tecer inúmeras considerações sociológicas,
antropológicas, físicas e, mesmo, filosóficas.
Uma primeira ideia a reter é a de que “coisa” se contrapõe a “pessoa”.

José Tavares distinguia:


ü Uma noção lata: coisa é tudo o que não for pessoa;
ü Uma noção própria: coisa é tudo o que, não tendo personalidade, possa ser
objeto de direitos e de obrigações;
ü Uma noção restrita: coisa é o objeto material apropriável, por oposição a direitos
ou a bens imateriais.

Na distinção de diversos “estratos” de coisa está, seguramente, a possibilidade de a


definir com alguma utilidade. Em termos linguísticos, qualquer uso será legitimo.

Pires de Lima, criticando o Código de Seabra pela latitude da sua noção, propôs a
definição hoje inserida no artigo 202º:

“Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objeto de relações jurídicas”

A definição vale pelo seu sabor pandetistico. Tecnicamente, é inaproveitável: basta


ver que as pessoas não são coisas podendo, não obstante, ser objeto das tais relações
jurídicas, enquanto os direitos reais, sendo absolutos, não implicam quaisquer relações,
embora, por definição, se reportem a coisas.

A coisa terá o atributo de economicidade ?


Provavelmente, haverá uma categoria de “coisas económicas”; nem todas,
porém, a integram. O Direito não admite que as pessoas “monetarizem” ou

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“economizem” tudo aquilo em que toquem. Há coisas que, de fato e nas condições
reinante, não têm teor económico.

A coisa terá o atributo da utilidade?


Há realidades úteis que por terem natureza humana, não são “coisas”: pense-se
nos bens de personalidade. Verificamos que há coisas que, embora sem natureza
económica, são úteis: o ar atmosférico ou a água do mar. Porém, a coisa que,
circunstancial ou estruturante, não tenha a mínima utilidade não deixará de o ser. Há
coisas que não são bens, por não terem qualquer utilidade. E há bens que não são coisas,
por terem natureza humana.

A coisa será permutável e ocupável?


A permutabilidade representa a possibilidade de, sobre a coisa, se tecerem
relações de mercado; a coisa será entregue, a uma pessoa, a troco de outra coisa. A
ocupabilidade traduz a possibilidade de uma coisa fica sob o controlo material exclusivo
de uma pessoa.
Podem, porém, ser afastadas:

• Pela natureza, que ponha fora do alcance humano a coisa ou coisas


consideradas;
• Pelo próprio Direito, que proíba operações jurídicas sobre certas coisas.

A coisa será rara?


A “raridade” de uma coisa traduz, porém, apena a ideia de que existe uma certa
resistência à oferta, pelo que, para ser alcançada, se exige um sacrifício. Nesse sentido,
a raridade também não surge como característica da coisa. É no entanto evidente que o
interesse do homens, e daí, do Direito, se vai concentrar sobre as coisas raras.

A coisa será delimitada ?


A delimitação corresponde a uma ideia subjacente a “coisa”. Esta evoca sempre
uma porção delimitada da realidade, mas com significado social.
Quanto à materialidade: a cultura românica não limita as coisas à matéria.
Coisa é, antes de mais, o que não for pessoa. Ora o universo das pessoas é
definido pelo Direito. O universo das coisas é determinado pelo Direito. Clamar pelo
formalismo desta noção só revela uma negação não sumida da própria substancialidade
da ordem axiológico-normativa.
O Direito é sensível à realidade. A natureza das coisas impõe-se-lhe, ainda que
não predetermine as soluções e, sobretudo, o modo de as alcançar.

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A coisa é Direito porque só o ser humano a vê como coisa. A objetivação da ideia


de coisa faculta a sua juridicidade.
Poderemos definir coisa, em sentido jurídico, como toda a realidade
figurativamente delimitada a que o Direito dispense um estatuto historicamente
determinado para os seres inanimados.
O Código Civil, admitindo embora um conceito amplo de coisa, acabou, no
fundamental, por se concentrar numa dogmática de tipo pandetístico: a dos objetos
materiais. Não obstante, os quadros dos artigos 202º e seguintes têm uma aplicação de
principio aos diversos objetos de direitos ou de “relações jurídicas”. As categorias
articuladas nos artigos 202º e seguintes são chamadas a valorar problemas e a justificar
soluções.
A doutrina mais recente, trata este tema pelo prisma do objetos dos direitos ou,
se se quiser, das relações jurídicas. O objeto constitui o ponto de referência das
imposições, das proibições e das permissões que dão corpo à proteção concedida pelos
direitos subjetivos.

Mas podemos ir mais longe. Com a sua materialidade, a coisa evidencia o mundo
exterior, pelo qual o ser humano se debate. O Direito disciplina-o. Mas fá-lo tendo, em
vista as figurações reais. A ordenação dos bens assenta numa dogmática dirigida para o
objeto: principalmente, para a coisa. Nos planos ordenadores e significativo-ideológicos,
a coisa, tem, também, um papel fulcral.

AS COISAS E O ÂMBITO DO DIREITO CIVIL


O Código Civil apresentou, no seu artigo 202º/1, uma definição de coisa. E logo
no nº2, veio acrescentar. Pois bem: quer a fórmula adversativa utilizada pelo legislador
– “consideram-se, porém”- quer a insusceptibilidade de direitos privados ou de
aquisição privada implicam que, às coisas fora do comércio, não se aplique o Direito Civil
ou, pelo menos, todo o Direito civil.
O conhecimento do Direito civil português implica, no tocante às coisas, a
delimitação prévia do seu âmbito de aplicação.

A TEORIA DO DOMÍNIO PÚBLICO


A partir do Código de Seabra, a teoria do domínio público conheceu, entre nós,
uma vincada atenção.

Na base encontramos o Estado, no sentido mais lato – abrangendo, portanto, o


Estado Central, as autarquias e outras entidades dotadas de poderes públicos. O Estado,
para o prosseguimento das suas funções, carece de meios materiais: entre estes, as
coisas. Temos, pois, de nos colocar pelo prisma da atuação do Estado.

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O Estado é sujeito de Direito privado. Tradicionalmente, domínio público traduz


o conjunto de bens que o Estado aproveita para os seus fins, usando poderes de
autoridade, ou seja, através do Direito público.
O Direito positivo português vigente, admite a categoria técnica e conceitual de
domínio público. Este designa uma categoria de coisas, e ainda, os poderes do Estado
sobre elas.
As coisas públicas são enunciadas pela lei. Evidentemente: não se trata de coisas
que, por si, tenham a virtualidade de ser públicas; é sempre uma questão de regime. O
Direito indica-as: não a natureza. Doutrinariamente e na sequência de Marcello
Caetano, distinguem-se dois grupos de distinções, de acordo com o critério a que
obedeçam:
Ø O critério do destino das coisas;
Ø O critério das características que apresentam.

O destino dos bens abrange, ele próprio, três subcritérios:

O uso público: são públicas as coisas destinadas ao uso de todos;


O serviço público: são públicas as coisas utilizadas pelos serviços públicos ou
sobre as quais incida a atuação destes;
O fim administrativo: são públicas as coisas que, diretamente, satisfaçam os fins
de uma pessoas coletiva pública.

O critério que recorre às características das coisas dá azo a dois subcritérios:


§ A afetação: são públicas as coisas destinadas a produzir utilidade pública;
§ A lei: são públicas as coisas assim consideradas por fonte bastante.

O último subcritério deve ser considerado o mais ajustado. Os restantes, nas


palavras de Marcello Caetano, mais não são do que indícios tidos (eventualmente) em
conta, pelo legislador.

REGIME E NATUREZA
O Direito público não é um Direito codificado. Assim, muitos dos regimes que
nesse surgem têm uma generalização problemática. Estas considerações aplicam-se ao
domínio público. As diversas hipóteses dominiais têm as suas regras.
Como vetores normativos gerais atinentes ao domínio público, encontramos os
seguintes:
ü A constituição, a transmissão, a modificação e a extinção da situação dominial
pública regulam-se pelo Direito público e, designadamente: (a) só a lei pode
determinar a publicização de um bem ou a sua desafetação, (b) a

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comercialidade dos bens público não é possível em termos de Direito privado;


(c) só podem ser titulares pessoas coletivas de Direito público;
ü O aproveitamento decorre em termos de Direito público, de modo a
corresponder aos fins do Estado;
ü A sua defesa é feita diretamente pelo Estado que, sem necessidade de prévio
recurso aos tribunais, faz uso do seu ius imperii.

A UTILIZAÇÃO PELOS PARTICULARES


Um tema importante para o Direito civil é o da utilização do domínio público pelos
particulares. Em termos gerais, podemos distinguir:
v O uso comum;
v O uso privativo.

O uso comum é o consentido a todos ou a uma categoria genericamente


determinada de pessoas: pense-se numa praia. O uso privativo é o facultado apenas a
alguma ou algumas pessoas individualmente determinadas e que disponham, para tal,
de um título jurídico bastante.
Por seu turno, o uso comum pode ser ordinário – acessível a todos, sem autorização,
ainda que dentro de certos limites; pode ser extraordinário sempre que seja acessível a
todos, mas mediante prévia autorização.

O uso comum é, muitas vezes, gratuito. Mas pode implicar o pagamento de taxas ou
de portagens, de acordo com o que esteja legalmente estabelecido. O uso comum do
domínio público integra uma liberdade de atuação.

O DOMÍNIO PRIVADO DO ESTADO


O Estado é sujeito de Direito privado. Nessa qualidade, ele poderá atuar como
qualquer pessoa, sem poderes de autoridade ou ius imperii. E assim, ele pode adquirir
os diversos direitos reais compondo, com eles, um património de tipo privado.
O domínio privado do Estado equivale a esse património ou, noutro prisma:
traduz o direito ou direitos do Estado sobre ele.
A propriedade técnica – portanto: o direito privado de propriedade sobre
imóveis – do Estado segue o regime geral do Código Civil. Pode, porém, haver
especificidade. Desde logo, o Estado não atua, em termo internos, como qualquer
pessoa coletiva privada. Há regras de competência, regras orgânicas contabilísticas a
observar.
O Estado não é um proprietário comum: ele tem o poder legislativo próprio da
soberania. Assim, ao longo dos tempos, e ainda que invocando sempre o interesse

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público, o Estado foi promovendo certas regras especiais que vêm perturbar a própria
lógica da existência de um domínio privado do Estado.
Na falta de norma específica que satisfaça os apontados requisitos, o regime
geral do Código Civil encontra aplicação: nesse sentido dispõe o artigo 1304º.
É comum, no domínio privado, a distinção entre domínio disponível e
indisponível. Como explica Marcello Caetano, esta distinção não deve ser tomada à
letra. Em principio, o domínio privado disponível reporta-se a bens que não servem
nenhuma especial função especificamente administrativa do Estado. Intensificam-se,
aqui, os vetores que levam à aplicação do Direito civil.
O domínio privado indisponível já respeita a bens que, embora não incluídos,
pela lei, no domínio público, têm a ver com funções do Estado, sendo indispensáveis. A
lei pode, então, prever um regime específico que designadamente, restrinja as hipóteses
de alienação.
Na falta de normas em contrário, todo o domínio privado é disponível. A sua
alineação deve, contudo, operar por concurso ou equivalente: trata-se de um esquema
clássico destinado a assegurar a imparcialidade do Estado nos seus negócios e a
proporcionar os melhores resultados.

PATRIMÓNIO CULTURAL E ARTÍSTICO


A defesa do património cultural e artístico não deve ser alheada do Direito civil.
Quer se queira, quer não, ele corresponde ao sentir profundo dos povos,
particularmente sensível nos países do Sul, com uma História longa.
No seu conjunto, legislação vai dando corpo a uma especial categoria de coisas:
os bens culturais, globalmente referidos como património histórico-cultural. O seu traço
mais característico é o serem dotadas de uma proteção de tipo absoluto: no sentido de
ela ser dispensada pelo Estado e pelo Direito, independentemente das opções do seu
proprietário ou, até, de ele ter danos. A categoria do património histórico-cultural
interceta, ainda, os tradicionais domínio público, domínio privado disponível e
propriedade privada.
O Direito civil deve acompanhar e dogmatizar toda esta evolução. No terreno, a
tutela do património cultural português é francamente deficiente.

MODALIDADES DE COISAS
A noção de coisa é muito ampla. O artigo 203º do Código Civil, precisamente
epigrafado “classificação das coisas”, vem dispor.
A doutrina é unânime: trata-se de um preceito não exaustivo. O próprio artigo
202º, no seu nº2, subentende uma contraposição entre coisas no comércio e fora do

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comércio, apesar de não a inserir na enumeração do artigo 203º. Outras classificações


basilares, como a que separa as coisas corpóreas das incorpóreas, mau grado a sua
ascendência gaiana, foram esquecidas.

COISAS CORPÓREAS
À partida, as coisas corpóreas têm existência exterior, sendo percetíveis pelos
sentidos. Pelo contrário, as incorpóreas correspondem a meras criações do espírito.
Apesar de omitida no campo das classificações “oficiais” de coisas, o Código Civil
pressupõe a presente classificação e em troços importantes, no artigo 1302º.
O “direito de propriedade” é usado, aqui, no sentido intermédio de “direitos
reais”. As coisas corpóreas, recordam, desta forma, todo esse importante ramo do
Direito civil.
As coisas corpóreas correspondem, ainda, a um autonomização requerida pela
natureza, tal como é vivida pelo sentir social. As coisa corpóreas são delimitáveis e
domináveis. Enquanto realidades exteriores percetíveis pelos sentidos, as coisas
corpóreas sofrem a atuação humana direta, no sentido mais imediato de atuação física.
O ser humano pode controlá-las, com ou sem base jurídica, excluindo os seus
semelhantes de fazer outro tanto.

Em suma: as coisas corpóreas são suscetíveis de posse. A posse, para além do


controlo material excludente, comporta um corolário: traduzindo um exercício físico
sobre uma coisa percetível pelos sentidos, ela própria é visível por quem entre em
contato com a coisa ou com o possuidor. Sendo cognoscível pela comunidade, a posse
dá lugar à publicidade espontânea. O Direito interessa-se pela posse, seja para a
justificar e defender, seja para a contraditar e penalizar: tudo depende de quem a exerça
e de como ela tenha sido constituída. Além disso, o Direito retira consequências várias
da publicidade possessória e, designadamente: presume que, havendo publicidade, há
posse e, verificando-se esta, há direito real. O possuidor aparente está garantido até que
alguém prove um direito incompatível com o controlo de fato registado.

As coisas corpóreas abrangem, desde logo, as porções limitadas de matéria em


estado sólido. Mas, são coisas corpóreas, também, os líquidos e os gases.

São ainda coisas corpóreas os documentos ou os suportes materiais que


contenham obras de espírito.
Como coisa corpórea, o documento é:
1. captável pelos sentidos,
2. suscetível de posse e, sendo possuído,
3. dá azo a uma publicidade socialmente relevante.
A suscetibilidade que, pela natureza, os documentos sempre têm de ser tratados
como (simples) coisas corpóreas cria uma permanente tensão com o regime, em
princípio mais elaborado, dos bens intelectuais.

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COISAS INCORPÓREAS
As coisas incorpóreas são criações do espírito humano. Elas podem ser
comunicadas através da linguagem e ser incorporadas em documento.

As coisas incorpóreas compreendem três grandes categorias:


1. os bens intelectuais,
2. as prestações e os
3. quia jurídicos.
Elas apresentam-se como uma categoria autónoma.
Os bens intelectuais abrangem as obras literárias e artísticas, os inventos e as
marcas. As obras literárias ou artísticas são criações do espírito exteriorizado por
qualquer forma: linguística, musical, plástica ou cinética.

Perante um bem intelectual, o Direito só pode tomar duas linhas de atuação,


quando queira defendê-lo: em termos morais, evitando a sua deturpação ou, ainda, que
quem não tenha sido o seu autor se arrogue a sua paternidade; em termos económicos,
atribuindo a alguém, normalmente, ao seu autor, o exclusivo material do seu
aproveitamento.
A prestação é uma conduta humana. O Direito pode atribuir a alguém – o credor
– o poder de exigir a outrem – o devedor – uma certa atuação: a prestação.
Como conduta humana virtual, a prestação apenas existe em abstrato: só no
momento do cumprimento ela passará a ter uma consistência no mundo dos fatos.
Economicamente, ela corresponderá a um serviço.
A prestação pode ser considerada coisa incorpórea. E na verdade, boa parte das
categorias fixadas no artigo 202º e seguintes tem aplicação ao campo das prestações:
basta pensar em coisas divisíveis, coisas futuras ou coisas acessórias.
As realidades ou quia jurídicos apresentam-se como figurações técnicas e sociais.
As realidades jurídicas são vista, por vezes, como coisas: os iura latinos. Estão em causa
a generalidade das situações ativas – direitos, poderes, faculdades e expectativas – e,
por vezes, as próprias situações passivas.

A análise dos quia jurídicos permite distinguir duas grandes categorias:


1. aquela em que o direito é considerado “coisa” apenas como forma de referir
a própria realidade sobre que ele recaia e
2. a que se prende com a figura do direito sobre outro direito.

Os direitos que recaiam sobre imóveis têm o regime jurídico correspondente aos
direitos sobre imóveis.

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O direito sobre outro direito é, no fundo, apenas um direito sobre um objeto já


atingido pelo direito de “primeira linha”. As coisas incorpóreas são, hoje, os bens
intelectuais.
Não se admitem, como coisas, os “bens de personalidade”. Ligados à pessoa
humana, tais “bens” são tratados a propósito dos próprios direitos de personalidade.
Pressupõe-se, naturalmente, que, para além de “coisa”, outras realidades possam ser
objetos de direitos. A esse propósito, cumpre assinala que a tradição jurídica portuguesa
ia no sentido de excluir os bens de personalidade do universo das coisas. Manuel de
Andrade tomou posição inversa, influenciando alguma doutrina. O pensamento jurídico
atual opõe-se, porém, à reificação de quanto tenha a ver com a pessoa, admitindo tertia
genera diversos, entre a coisa e a pessoa. Bastará atentar na evolução que, neste
momento, se processa em relação aos próprios animais.

OS IMÓVEIS: PRÉDIOS, AGUÁS E PARTES INTEGRANTES


A classificação das coisas corpóreas em móveis e imóveis tem uma importância
fundamental. À partida, podemos afirmar que a coisa imóvel corresponde à terra sendo
móveis as restantes. Com o passar do tempo a categoria acaba por depender do Direito,
exprimindo as realidades a que a lei atribua a características da imobilidade.
O Código Civil optou por enumerar, no artigo 204º, as coisas imóveis e por
considerar, no artigo 205º/1, todas as restantes como móveis. Da enumeração do artigo
204º resulta a ideia basilar de que coisas imóveis são as que, dentro de critérios de
normalidade e habitualidade, não podem ser deslocadas da posição que ocupem, na
superfície do Planeta. As próprias águas, apesar da sua permanente deslocação, estão
contidas nas margens que as delimitem. A imobilidade material perde, todavia, clareza
uma vez que o artigo 204º refere os próprios direitos. Além disso, temos diversas
dificuldades derivadas das coisas acessórias e das pertenças.
O artigo 204º/1 refere, como imóveis, os prédios rústicos ou urbanos e, depois,
as águas, as árvores, os direitos e as partes integrantes. “Prédio” tem um sentido
técnico, que não esgota todas as parcelas fixas do Planeta: surgiriam, assim, “imóveis”
não contemplados no artigo 204º, os monumentos, as estrelas e as minas, os poços, os
aquedutos, as pontes e os pelourinhos e as auto-estradas. E a insuficiência da menção a
“prédios” mais se agrava quando, destes, se tenha em vista a aceção comum.
Perante a dificuldade, há três posições:

• A de considerar o teor do artigo 204º como taxativo;


• A de sustentar, pelo contrário, que essa enumeração não é taxativa;
• A de defender que, embora taxativa, ela deve ser complementada (MC)
Já defendemos a terceira orientação (MC). Hoje, porém, propendemos para a
segunda. Por duas razões fundamentais: leis avulsas pressupõem como imóveis coisas
que, de todo em todo, é impossível reconduzir ao artigo 204º; o Direito civil é aplicável
ao domínio público onde se multiplicam os imóveis que só com violência semântica

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poderiam passar por prédios. O artigo 204º não é, pois, taxativo. Mas constitui uma
base legal que apenas por outra lei ou por apoiado desenvolvimento jurídico-científico
pode ser afastada. Afigura-se-nos feliz o apelo, feito pelo Prof. Coelho Vieira, à
tolerância do preceito.
De todo o modo, há que ter presente o seguinte: o conceito técnico de prédio é mais
extenso do que o seu uso comum. A margem de imóveis que escapam ao artigo 204º é
pequena. Mas existe.

OS PRÉDIOS: RÚSTICOS E URBANOS


A figura nuclear do imóvel é o prédio. O Código Civil, todavia, não o definiu:
antes optou por, no seu artigo 204º/2, apresentar separadamente o prédio rústico e o
prédio urbano.

O prédio rústico é “... uma parte delimitada do solo e as construções nele


existentes que não tenham autonomia económica ...”, enquanto o prédio urbano é “...
qualquer edifício incorporado no solo com os terrenos que lhe sirvam de logradouro ...”.
O prédio pressupõe uma delimitação artificial, feita pelo homem, de acordo
com regras jurídicas, através de linhas reais ou ideais de separação. Poderemos então
defini-lo como uma parcela de solo, com ou sem construções, as quais, a existirem, se
incluem no próprio conceito de prédio.

Quando contrapôs imóveis a móveis, o legislador teve o cuidado de precisar os


primeiros e de remeter por defeito, todo o restante, para os segundos. Mas no tocante
à dicotomia prédios rústicos-prédios urbanos, o legislador quis definir uns e outros. As
duas definições parcelares, daí resultantes, não se articulam inteiramente. Resultam,
daí, problemas complexos que, até hoje, não têm encontrado uma solução segura.
Na doutrina portuguesa mais recente, podemos apontar as seguintes teorias:
Ø Teoria do valor;
Pela teoria do valor, o prédio que compreenda elementos das duas naturezas
será rústico ou urbano, consoante a parcela que represente maior valor

Ø Teoria da afetação económica;


Pela da afetação económica, teríamos de apurar se o conjunto visa o
aproveitamento do terreno ou o da construção: no primeiro caso, o prédio é
rústico, sendo urbano, no segundo

Ø Teoria do fracionamento;
A teoria do fracionamento parte da afetação económica. Simplesmente, quando
se apure que quer o terreno, quer a construção têm autonomia económica, opta
pelo fracionamento: haveria dois prédios, sendo um rústico e outro urbano

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Ø Teoria da consideração social.


Finalmente, nós próprios apresentamos uma proposta de distinção, segundo
a qual os prédios são rústicos ou urbanos consoante, na comunidade jurídica, sejam
havidos por terrenos ou por construções.
Na lógica do artigo 204º/2, “edifício” é uma construção importante, ou de habitação
ou pronta a habitar; todavia, o prédio urbano não se reduz ao espaço delimitado pela
paredes e telhado, antes abrangendo também os terrenos que lhe sirvam de logradouro.

A ideia de “logradouro” torna-se, assim, a chave da distinção. Na falta de definição legal,


surge como um conceito jurídico indeterminado, que só se trona preciso aquando da
aplicação ao caso concreto.

OS LIMTES DOS PRÉDIOS


Em moldes naturalísticos, o prédio é uma porção delimitada da crosta terrestre.
No plano da superfície, ele abrange a área comportada pelas suas extremas, isto é, por
linhas reais ou idealmente traçadas no terreno.

O Código Civil, no artigo 1334º faz as suas considerações. Muitos códigos tratam
este problema a propósito da propriedade.

OS PRÉDIOS URBANOS
Os prédios urbanos são, fundamentalmente, edifícios ou casas. A lei não define
edifício, tendo-se entendido que remete para a conceção comum. Deve, todavia, ser
uma construção de certo relevo. Além disso, o artigo 204º/2, 2ª parte, exige a
“incorporação” no solo: ficam excluídos barracões, tendas ou construções elementares,
meramente assentes, no terreno.

Pergunta-se, na hipótese de um edifício composto de diversos fogos, se estamos


perante vários imóveis, um imóvel composto ou um imóvel único com várias partes.
O processo de licenciamento dos edifícios destinados a propriedade horizontal e
a técnica regista, conjuntamente com a existência das partes comuns levam-nos, de
todo o modo e hoje, a aderir à posição de Oliveira Ascensão: o prédio urbano traduz
um único imóvel; as frações autónomas são parte desse mesmo prédio.

O prédio urbano engloba, necessariamente, uma porção delimitada de solo.


Trata-se de uma regra tão impressiva que, no domínio da propriedade horizontal, a lei
define o solo como uma das partes necessariamente comuns do edifício – artigo
1421º/1, a).

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AS ÁGUAS
O Código Civil enumera, como segunda categoria de coisa imóvel, as águas.
Trata-se de águas particulares, suscetíveis de comportar apropriação privada.
Com efeito, o artigo 1385º distingue as águas públicas e particulares. Apenas
esta últimas se sujeitam à dogmática privada.

águas podem estar em movimento: assim sucederá na hipótese de um rio ou


curso de água. Quando isso suceda, elas são havidas como imóveis, porquanto
delimitadas pelo leito e pelas margens do curso considerado.
As águas surgem como imóvel na medida em que, por lei ou por negocio, possam
ser tratadas como coisas autónomas. De outro modo, elas são partes componentes do
prédio em que se integram.

ÁRVORES, ARBUSTOS, FRUTOS E DIREITOS


O Código Civil, além dos prédios e das águas, considera imóveis as árvores, os
arbustos e os frutos naturais, enquanto estiverem ligado ao solo, os direitos inerentes
aos imóveis mencionados nas alíneas anteriores e as partes integrantes dos prédios
rústicos e urbanos – alíneas c) a e) do artigo 204º/1.

No tocante a árvores, arbustos e frutos, impõem-se duas precisões. Em


princípio, essas três realidades são partes integrantes dos prédios a que pertençam.
Como tal, não têm autonomia. Ao considera-las “imóveis”, a lei diz-nos simplesmente
que elas fazem parte do prédio em que se integrem. Quanto à segunda precisão: uma
vez separadas, essas coisas passam a ser móveis. Assim, quem comprar árvores em pé
está, na realidade, a adquirir coisas móveis futuras: enquanto estiverem ligada ao solo,
elas são imóveis, não suportando negócios jurídicos autónomos. A mesma regra é
aplicável aos arbustos e aos frutos naturais.
A única margem em que as árvores, arbustos e frutos naturais, sem perderem a
natureza de imóveis, têm autonomia, ocorre nos casos em que a lei permite a celebração
de negócios separados que se lhes reportem.

PARTES INTEGRANTES
As partes integrantes vêm definidas, no nº3 do artigo 204º. As partes
integrantes não têm autonomia: elas inserem-se no imóvel a que pertençam.
Apenas na medida em que sejam possíveis negocio jurídicos autónomos sobre
“partes integrantes”, a natureza imóvel destas assumiria um papel independente. Em
principio, tais negócios não são possíveis.

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O problema voltou a pôr-se a propósito do tipo de conexão exigida para se poder


falar de “parte integrante”. Para uma teoria dita tradicional, teria de haver uma ligação
material: a parte integrante deveria estar fixada, presa ou unida ao prédio, nas palavras
de Manuel de Andrade. A ela opor-se-ia a doutrina da destinação económica: o móvel
passaria a imóvel quando, independentemente de uma definitiva ligação material ao
prédio, ele estivesse ao seu serviço. O anteprojeto de Pires de Lima, depois de vertido
em lei, pôs-lhe, definitivamente, cobro: a ligação deve ser material, sendo compatível,
em casos eventuais, com a separabilidade, de resto sempre teoricamente possível.
O Código Civil, acabaria por não dar, com o regime das partes integrantes. Parece
claro que elas seguem o destino do imóvel em que se integrem.

Cumpre frisar a natureza dos negócios que se reportem a partes integrantes. À


partida e uma vez que estas não têm uma identidade jurídica diferente da da coisa a que
pertençam, tais negócios não podem ter eficácia real: não atingem a titularidade da
“parte integrante”. Podem, todavia, ter outros efeitos. O valor fundamental prosseguido
pelo Direito quando, às partes integrantes, retira autonomia jurídica, é o de proteger a
mais-valia social e económica que resulta da sua junção no todo. Desarticular uma coisa
não produz riqueza: pelo contrário.

O REGIME: CONSEQUÊNCIAS
Os imóveis dispõem de um regime bastante diferenciado. Os negocio relativos a
imóveis estão, em princípio, sujeitos a forma solene e, designadamente, a escritura
pública ou o documento particular autenticado.
A legitimidade para a celebração de negócios relativos a imóveis torna-se, por
vezes, mais exigente requerendo-se, ainda certas autorizações.
Os imóveis sujeitam-se a um esquema de publicidade racionalizada, organizada
pelo Estado: o registo predial. Aplica-se-lhes, assim, todo um complexo normativo de
relevo, com princípios próprios e regras pormenorizadas.
É um lugar comum a afirmação de um crescente valor dos móveis, em
detrimento dos imóveis. Essa deslocação confirma-se com a supremacia do sector
secundário e, sobretudo, do terciário, sobre o primário.
As coisas imóveis traduzem, no essencial, uma parcela da superfície do Planeta.
À escala humana, elas são praticamente imutáveis. Não se podem esconder e não
escapam nem à vista de todos, nem à soberania do Estado. O seu valor é intrínseco: não
depende de regras jurídicas nem de convenções. Em regra, os imóveis exprimem um
tipo de apropriação duradouro, suscetível, pela sucessão hereditária, de sobreviver a
cada um.
As coisas móveis podem ter muito valor.

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Os imóveis, embora batidos como riqueza absoluta, mantêm, pela natureza das
coisas, um elevado valor. Além disso, eles correspondem a uma evidente realidade física
e sociológica, dotada de características inconfundíveis e à qual o Direito não pode eixar
de dispensar um tratamento diferenciado. Finalmente: eles comportam regras
matriciais que são, depois, a base de normas aplicáveis noutras fórmulas de apropriação.
Num curioso retorno histórico: parece estar em curso uma “reabilitação” da
propriedade imobiliária. E assim sendo, as especialidades jurídicas dirigidas aos imóveis,
além de explicáveis, têm justificação e futuro.

OS MÓVEIS
CATEGORIA GERAL
Nos termos do artigo 205º/1, a categoria das coisas móveis é residual: abrange todas
as coisas que o Direito não considera imóveis. Ficam particularmente em causa:

Os objetos materiais;
A energia;
Os móveis sujeitos a matrícula e registo;
As coisas representativas.

Os bens intelectuais são coisas incorpóreas, ficando fora da contra-posição entre


móveis e imóveis; esta abre, apenas, no universo das coisas corpóreas. No entanto, na
medida em que se deve fazer apelo às regras gerais sobre as coisas, para reger os bens
intelectuais, relevam as relativas às coisas móveis: elas congregam as normas mais
gerais relativas aos objetos das situações jurídicas. O mesmo se poderá dizer em relação
aos quia jurídicos. Assim, os “ordenados, vencimentos e salários” serão móveis, outro
tanto sucedendo com os direitos sociais dos sócios.
A energia é considerada uma coisa móvel, na generalidade dos Direito. No entanto,
ela suscita regras especiais.

MÓVEIS SUJEITOS A MATRÍCULA E A REGISTO


Em princípio, os móveis, mesmo os de menor valor, são reconhecíveis pelos seus
donos e pelas pessoas que os circundem: desde sinais particulares até à sua simples
localização: tudo pode contribuir para a sua imediata identificação.
Certos móveis, porém, em função do seu valor económico, de razões de polícia
ou da facilidade com que mudam de localização, requerem um esquema público de
identificação. Isso consegue-se, comodamente, através da aposição de uma matrícula e
da sujeição do móvel a um registo público. Estão em causa, fundamentalmente, os
automóveis, os navios e as aeronaves.

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A ENERGIA
A energia, em muitas das suas formas, pode ser apreendida pelos sentidos.
Noutros casos, tal é indiretamente possível, com recurso a instrumentos científicos
adequados.

O Código Civil não refere a energia entre as coisas, embora se lhe reporte, a
propósito da responsabilidade e dos privilégios creditórios.

A energia tem existência objetiva, podendo ser, nalguns casos, apropriada.


Embora a aplicação do regime dos direitos reais, à energia, suscite algumas dificuldades,
ela tende hoje a ser considerada como uma coisa corpórea móvel, tanto pela doutrina,
como pela jurisprudência. Alguns autores incluem, dentro das coisas corpóreas, a
energia como uma coisa imaterial.

COISAS REPRESENTATIVAS; DINHEIRO; TÍTULOS DE CRÉDITO E CARTÕES


Uma especial categoria de móveis é a das coisas representativas, isto é, daquelas
que, mercê de convenção sócio-jurídica, representam seja um valor que as transcende,
seja uma determinada posição jurídica. Nessa ordem de ideias ocorre, em primeiro
lugar, o dinheiro ou melhor, as espécies que o exprimem. Assim entendido como espécie
monetária, o dinheiro é uma coisa móvel.
O título de crédito é um documento: uma coisa corpórea móvel. O seu sentido
transcende-a, porém e por natureza. Não obstante: regras do seu regime básico advêm-
lhe da sua qualidade de coisa.
Finalmente, temos os cartões. Também aqui uma coisa móvel assume um
sentido figurativo e operacional, que em muito a transcende.
Determinadas regras referentes a coisas imóveis aplicam-se, todavia, às coisas
representativas.

COISAS FUNGÍVEIS, CONSUMÍVEIS E DETERIORÁVEIS


COISAS FUNGÍVEIS E NÃO FUNGÍVEIS
No Código Civil foi proposta uma definição no termo seguintes – artigo 207º.
O próprio Código – assim, no artigo 408º/2 – fala ainda em coisas
“indeterminadas”. Estas, porém, só poderão ser reconduzidas às fungíveis quando a
determinação implique operações de conta, de medida ou de pesagem.
O Código pretendeu dizer que são fungíveis as coisas que, na situação jurídica
considerada, se determinem pelo género, qualidade e quantidade. Isto é: apenas in
concreto (quando constituam objeto ...) se poderá afirmar se há ou não fungibilidade.
Uma moeda será fungível ou não conforme os casos: uma moeda de coleção ou a moeda

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“da sorte” não são fungíveis; precisamente a mesma moeda, noutras circunstâncias, sê-
lo-á. Note-se que a fungibilidade, não sendo evidente, deve ser invocada e
demonstrada.
A classificação entre coisas fungíveis e não fungíveis pode ser transportada para
o domínio das obrigações. Aí, a “prestação fungível” é aquela que tanto possa ser
executada pelo devedor como por terceiro, o que permite, a este, realizar o
cumprimento (767º, onde se mantém a ideia de uma possível não-fungibilidade
convencional). O artigo 828º fala em “fato fungível”. Prestações essencialmente
fungíveis são as que constituam o objeto de obrigações genéricas (539º).

COISAS CONSUMÍVEIS E NÃO-CONSUMÍVEIS


O Código Civil define, no seu artigo 208º, as coisas consumíveis como aquelas
cujo uso regular importa a sua destruição ou a sua alimentação. Trata-se,
assumidamente, de um conceito jurídico e não naturalístico.

COISAS DETERIORÁVEIS E DURADOURAS


Ao lado da classificação das coisas em consumíveis e não-consumíveis, outra
surge: a que separa as coisas duradouras das deterioráveis. As primeiras mantêm-se
como tais, mau grado o uso; as segundas, perante o seu uso, mesmo regrado e regular,
vão perdendo qualidade e valor: é o que sucede com o vestuário ou com os automóveis,
por exemplo. A natureza deteriorável de uma coisa não faz, dela, uma coisa
consumível. Tem, todavia, diversas implicações, no campo, por exemplo, do usufruto:
veja-se, assim, o artigo 1452º. A presença de coisa deterioráveis requer, aí, um critério
de diligência no seu uso: este deve ser regular, mantendo-se no que lhe é próprio e não
devendo haver “culpa”.
O Direito Civil conhece, ainda, a categoria das coisas “suscetíveis de
deterioração”: artigo 1889º/1, a), por exemplo. Desta feita, trata-se de coisas que,
independentemente do seu uso, tenham uma duração limitada; pense-se nos alimentos.

COISAS DIVISÍVEIS, FUTURAS E PRINCIPAIS


COISAS DIVISÍVEIS E INDIVÍDUAIS
São divisíveis – diz o artigo 209º - as coisas que podem ser fracionadas sem
alteração da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo para o uso a que se
destinam. O legislador indicou três critérios heterogéneos, sendo clara a dominância do
segundo: sem diminuição do valor. Trata-se, como bem diz o Supremo, de um critério
jurídico e não físico, uma vez que tudo, sem exceção do átomo, é divisível.
A jurisprudência sublinha que as qualidades da coisa que permitam a
divisibilidade devem ser aferidas no momento em que se ponha o problema. O fato
de, no futuro, a coisa poder ser divisível não permite, desde logo, qualificá-lo como tal.
Assim, não é considerada divisível a casa cuja repartição implicaria obras de reparação
e de remodelação.

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As aplicações da noção de divisibilidade centram-se, desde logo, nas hipóteses


de comunhão. Nos termos do artigo 1412º, ninguém é obrigado a permanecer na
indivisão.
Finalmente, a divisibilidade das coisas tem uma aplicação importante, quando
transposta para o domínio das obrigações. Aí, há divisibilidade sempre que a prestação
possa ser fracionada, sem prejuízo para o interesse do credor. Não obstante, mesmo
perante prestações divisíveis, o cumprimento deve ser efetuado por inteiro (artigo
763º/1).

Assim, não será na hipótese de complexidade subjetiva – portanto: de surgir uma


obrigação com vários sujeitos – altura em que tem aplicação o regime especial do artigo
534º.
À luz do Direito positivo português, a indivisibilidade seria, sempre, a relativa.

COISAS PRESENTES E FUTURAS


O Código Civil estabelece uma distinção entre coisas presentes e coisas futuras.
As coisas futuras são apresentadas pelo artigo 211º.

Temos, em abstrato, duas situações bastante diversas. Por um lado, pode haver
coisas objetiva (Biondi) ou absolutamente (Castro Mendes) futuras: coisas que não
existem, ainda, na facticidade mas que se espera venham a surgir. Por outro, pode-se
lidar com coisas subjetiva ou relativamente futuras, isto é, coisas que já existem, mas
que não se encontram no património do disponente. Esta última situação absorve a
primeira: quando o disponente adquira a coisa, é porque esta, além do mais, já existe.
É, então, seguramente presente.
Quando se celebrem negócios sobre coisas futuras, o disponente fica obrigado
às diligências necessárias para que elas se tornem presentes – artigo 880º/1.

COISAS SIMPLES E COMPOSTAS


COISAS SIMPLES

Raúl Ventura vem apontar, como simples, as coisas seguintes:


Ø A coisa produzida pela natureza: um animal, uma árvore ou uma pedra;
Ø A coisa produzida pelo homem, em reprodução de matéria natural;
Ø A coisa de tipo novo, criada pelo homem.

É possível apresentar os seguintes traços próprios do regime jurídico das coisas simples.
Assim:

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ü A coisa simples pode conter elementos substituíveis, sem prejuízo da sua


natureza;
ü Ela implica a unidade dos atos jurídicos que a tenham por objeto;
ü Sobre ela existe, ainda, um único direito.

COISAS COMPOSTAS
No Direito romano, distinguiam-se, opostas às simples, as coisas compostas.
Estas podiam ser compostas ex contingentibus ou ex distantibus.

As coisas compostas ex contingentibus são formadas por conjuntos de coisas


móveis, devidamente conectadas.
As compostas ex distantibus implicam agrupamentos de seres animados
distintos, dotados, todavia, de uma alma comum.
Na evolução subsequente, podemos dizer que se assistiu a um duplo movimento.
Por um lado, encurtaram-se os termos da distinção, reconduzindo as coisas compostas
ex contingentibus às simples; como compostas manter-se-iam, apenas, as ex
distantibus. Por outros lado, porém, alongou-se o universo das coisas compostas através
da introdução de uma categoria medieval: a das universalidades.
Distinguiam-se a universitas rerum ou universalidade de coisas, aqui em causa,
da universitates personarum ou universalidades de pessoas, de tipo corporacional.
Guilherme Moreira distinguia as universalidades de causas, dando, como
exemplo, um rebanho e as de direitos, exemplificadas com a herança. Ambas seriam
unificadas em função de um escopo, sendo tratadas pelo Direito, como uma única
realidade.

TERTIUM GENUS ? POSIÇÃO ADOTADA


Pires de Lima limitou-se a traduzir o Código italiano. Simplesmente, enquanto
este falava em “universalidades de móveis”, passando a defini-las, Pires de Lima veio
adotar a epígrafe “coisas compostas”, referindo “coisa composta ou universalidade de
fato”.
Oliveira Ascensão preconiza outra terminologia: distingue coisas simples e
complexas: as primeiras, ao contrário das segundas, não se poderiam analisar noutras
mais simples; dentro das complexas, distingue as compostas das coletivas: as
compostas corresponderiam às ex contingentibus e as coletivas às ex distantibus ou
universalidades de facto.

As antigas coisas compostas ex contingentibus são, hoje, coisas simples. Por seu
turno, as universalidades de direito traduzem patrimónios de afetação: não são coisas,
sem prejuízo de, em certos casos, o Direito admitir um seu tratamento unitário.

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Temos pois: por um lado coisas simples, que abrangem as coisas com várias
peças, cuja autonomia ficou perdida com a junção, isto é, as antigas ex contingentibus;
por outro, as compostas, que englobam várias coisas simples, pertencentes à mesma
pessoa e com um destino unitário: estas absorvem as antigas ex distantibus, bem como
as subsequentes universalidades de fato.
As coisas compostas podem ser objeto de ato jurídicos unitários, para
comodidade do titular e da comunidade; todavia, implicam direitos autónomos sobre as
coisas componentes, podendo haver especialidades. Os exemplos são clássicos: o
rebanho, a biblioteca ou a coleção de moedas. As coisas compostas conservam-se como
tal enquanto operar o elemento que aglutine as coisas que as componham.

Finalmente: a lei vigente (206º/1) limita as coisas compostas aos conjuntos de


móveis. A ideia é clara: um “conjunto” de imóveis, justamente pelas regras formais, de
registo e outras que sobre eles impendem, nunca poderia ser tratado como uma coisa
única. Conseguimos, assim, retirar um fio condutor, em toda esta matéria
historicamente controversa.

COISAS ACESSÓRIAS, FRUTOS E BENFEITORIAS


SEGUE; O REGIME
As coisas acessórias não se apresentam como mera partes integrantes. Por isso,
elas são objeto de direitos autónomos. A razão de ser da “acessoriedade” jurídica ou
relação de pertença reside, desde o Direito romano, na possibilidade de,
automaticamente, lhes aplicar o destino da coisa principal. No período intermédio, esse
vetor foi fixado como recurso ao brocardo accessorium principale sequitur.
Pires de Lima veio considerar a solução do Código italiano como uma inovação
não apoiada: parte do princípio de que ela é uma alternativa à antiga categoria de
imóveis por destinação. E assim, preconizou, para o então futuro Código Civil, a pura e
simples abolição da regra accessorium principale sequitur, substituindo-a por uma
norma inversa. Tal norma consta hoje do artigo 210º/2.
O negócio relativo à coisa principal deveria abranger as acessórias ou, pelo
menos: aquelas que, de imediato, por todos são reconhecidas como tais.
Procurando delimitar os problemas práticos suscitados pela impensada
solução do artigo 210º/2, Castro Mendes propôs a manutenção das diferenças entre
coisas acessórias e pertenças. O artigo 210º/2 aplicar-se-ia às primeiras; não às
segundas. Segue-o, no essencial, Carvalho Fernandes. Também Oliveira Ascensão apoia
essa orientação indo mesmo mais longe: invoca, pelo menos nalguns casos, um costume
contra legem que teria revogado a lei. Estamos perante uma linha doutrinaria coerente,
que já conta quase meio século e que, quanto ao fundo, parece adequada. Deve, no
entanto, ser tecnicamente reestruturada, até permitir uma maior eficácia.

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Não nos parece viável estabelecer uma diferença de fundo entre coisas
acessórias e pertenças (MC): há uma equiparação de regimes – e não, apenas, de
qualificações – que não vemos possa ser afastada. Quanto ao costume contra legem:
tanto quanto sabemos, o artigo 210º/2 tem sido aplicado sempre que invocado; falta
uma prática reiterada de afastamento.
Quedam-nos, então, os seguintes instrumentos de normalização sistemática:

• Alargamento das partes integrantes, em detrimento de coisas acessórias;


• Aproveitamento das regras de interpretação e de integração dos negócios;
• Deveres acessórios derivados da boa-fé;
• Defesa do consumidor.

Pois bem: à luz desta regra, a coisa deverá sempre ser vendida com o seu acessório,
quando ele seja necessário para realizar a sua função.

FRUTOS
O Código Civil fez as seguintes opções essenciais:
v Definiu fruto como o que a coisa produza periodicamente, sem prejuízo da sua
substância – artigo 212º/1;
v Distinguiu, apenas, frutos naturais e civis: os naturais provêm diretamente da
coisa, enquanto os civis correspondem a “rendas ou interesses” que a coisa
produza “em consequência de uma relação jurídica” – artigo 212º/2;
v Precisa o que entender por furtos de universalidades de animais – artigo 212º/3.

Todo o regime dos frutos está moldado à ideia de que, regularmente, eles vão
surgindo: só assim é possível dispor sobre a partilha dos frutos (artigo 213º), sobre os
frutos colhidos prematuramente (artigo 214º) e sobre a restituição de frutos (215º).
Uma indeminização por privação indevida de uma coisa não pode ser considerada fruto.
A determinação dos frutos naturais deve ser feita em concreto.
Os frutos naturais seguem a coisa: só com a colheita ganham autonomia. A ideia
do Direito é a de respeitar os processos produtivos naturais; por isso, os frutos
pertencem a quem tiver direito a eles, no momento normal da colheita; se forem
colhidos prematuramente, devem ser restituídos a quem, naquele momento, tenha o
direito em causa (artigo 214º). Tendo alguém direito a frutos naturais até um certo
momento faz seus os frutos percebidos na vigência do seu direito, em nova
manifestação daquele princípio (artigo 213º/1). Já tratando-se de frutos civis, a partilha
é proporcional à duração do direito de cada interveniente (idem, nº2).
Os frutos são pendentes ou separados, consoante estejam ou não ligados à
coisa produtora; quando separados por ação humana, dizem-se percebidos, sendo
percebiendos os frutos que, devendo ser percebidos, o não foram. Os frutos extantes

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não se encontram no património de determinada pessoa, enquanto os consumpti estão


em situação inversa.
O principio básico do respeito pelos ciclos produtivos ocorre ainda no artigo
215º, a propósito da restituição dos frutos. Quem deva restituí-los tem direito a ser
indemnizado “... das despesas de cultura, sementes e matérias-primas e dos restantes
encargos de produção e colheita, desde que não sejam superiores ao valor desses frutos
...” – nº1. Mas se os frutos estiverem pendentes, o obrigado à entrega da coisa já não
tem direito a qualquer indemnização, salvo nos casos especialmente previstos na leis –
nº2: trata-se de um reflexo do disposto no artigo 213º/1.

BENFEITORIAS
O Código Civil acolheu a matéria em sede geral das coisas, mas apenas para
definir benfeitorias (artigo 216º/1) e para as classificar, de acordo com a apontada
tripartição (idem, nº2 e nº3).
Segundo a definição legal (216º/1), benfeitorias são todas as despesas feitas
para conservar ou melhorar a coisa. A jurisprudência permite precisar esta noção:
assim, não são benfeitorias as despesas feitas com sementeiras, limpeza de matos e
árvores, adubação destas e retirada de ramada; também um pequeno barraco de
madeira para WC não é considerado uma benfeitoria útil; despesas de transporte e de
deslocação não são benfeitorias: não se encorporam na coisa. As benfeitorias
necessárias equivalem a reparações.

TEORIA DO PATRIMÓNIO
A teoria romana das coisas encarava-as em si mesmas, isto é:
independentemente da posição que ocupassem perante as pessoas, sujeitos de Direito.

Surgiu, assim, a ideia de património, cuja construção mais acabada – a teoria


clássica – pertence, aos Autores Aubry e Rau.
O património seria uma emanação da personalidade humana. Como tal, além de
direito, ele compreenderia, também, obrigações.
Desta conceção geral, Aubry e Rau retiram diversas consequências, que fazem
parte da “teoria do património”, ainda que progressivamente alterada. Assim:
1. O património é uma universalidade jurídica;
2. O património está ligado à pessoa;
3. O património só compreende posições patrimoniais.

TEORIA MODERNA
A conceção clássica de património suscitou diversas criticas. Na origem
encontramos Gény, que sublinha a teoria clássica do património é uma pura conceção

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do espírito; ela parte de uma constatação para erguer um edifício do qual retira
consequências práticas. Estas, fixadas a priori, não correspondem ao verdadeiro regime
jurídico-positivo em jogo e impedem inovações jurisprudenciais importantes, como as
que admitem patrimónios de afetação.
No essencial, ela entende que o património é algo de objetivo, relativamente
independente da pessoa do seu titular. Poderia haver pessoa com vários patrimónios
distintos. No fundo, o património isolar-se-ia pelo seu fim ou pela sua destinação.

Na sua globalidade, podemos considerar que a doutrina moderna apresenta uma


menor carga humanista, no tocante ao património e à forma subjacente e de entender
o Direito Civil. São, todavia, tecnicamente mais aperfeiçoadas.

A DOUTRINA DE PAULO CUNHA


Paulo Cunha vem fixar-se na seguinte ideia: o património traduz um conjunto
de bens ou de relações jurídicas, com carácter pecuniário, tendo entre si qualquer
coisa de comum que dê, a essa pluralidade, uma coesão.
Passando a determinar os grandes vetores que enformam o instituto do
património, Paulo Cunha apura os seguintes:
ü Não existe uma relação central entre as noções de patrimónios e de
personalidade;
ü Embora raramente, pode haver pessoas sem património;
ü Não pode haver património sem qualquer conteúdo: trata-se de uma noção
quantitativa que, a não haver conteúdo, ficaria sem base alguma;
ü O património não compreenderia nem os chamados bens inatos, nem bens
futuros.

Paulo Cunha apresenta o património como um conjunto de bens unificado por


uma identidade de regime jurídico, quanto à responsabilidade por dívidas. O conceito
de patrimónios poderia ser dado pela fórmula sintética: massas de responsabilidade.

POSIÇÃO ADOTADA
A doutrina mais recente apresenta-se com desânimo perante O tema do
património. Este é entendido como uma noção não definida na lei, suscetível de diversas
aplicações. Fundamentalmente consistente num conjunto de direitos e deveres, o
património tem, todavia, uma aceção a determinar caso a caso, pela interpretação.
Podemos apresentar o património como um conjunto de posições ativas
patrimoniais unificado em função de determinado ponto de vista.

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Decompondo a noção temos:


v Um conjunto: o património é uma noção plural; ele não se coaduna com
realidade virtuais ou singulares; há que manter a ideia de património distinta da
de capacidade;
v De posições ativas: não se trata de “direitos e bens” ou de “direitos e relações
jurídicas” – realidades heterogéneas que não podem sobrepor-se; o património
reúne diretos subjetivos e outras realidades a eles equiparáveis;
v Patrimoniais: estão em causa realidade que o Direito trata como tendo natureza
económica sendo, assim, avaliáveis em dinheiro;
v Unificado: o património visa, precisamente, tratar em conjunto realidades que
têm autonomia e que, por isso, exigiram um tratamento analítico.

Confirmamos, pois, à luz do Direito português vigente, o diagnóstico feito nos


Direitos alemão e italiano: apenas pela interpretação, realizada em cada contexto,
poderemos apurar o sentido preciso do “património”, dentro da aceção geral acima
expendida. Resta ainda acrescenta que, muitas vezes, as leis falam em “bens” ou
“direitos# quando, com propriedade, poderiam dizer “património”.

TEORIA DA EMPRESA
Em sentido objetivo, o interesse traduz uma relação de apetência entre o sujeito
considerado e as realidades que ele entenda aptas para satisfazer as suas necessidades
ou os seus desejos; em sentido objetivo, interesse traduz a relação entre o sujeito com
necessidades e os bens aptos a satisfazê-las. A noção de interesse, porém, só terá algum
relevo quando se defira, ao próprio sujeito, a função de definir quais os interesses e
como os prosseguir. Doutra forma, a lei mandaria, ad nutum, adotar certa atuação: seria
uma mera norma de conduta.
A noção de interesse não é, dogmaticamente, aproveitável, no estado atual da
Ciência do Direito. “interesse” tem, no Direito civil, uma vocação multifacetada, a
determinar, pela interpretação, em cada norma: não permite avançar no domínio aqui
em causa.
A doutrina portuguesa tem reconduzido o interesse da sociedade ao interesse
comum dos sócios. Brito Correia vem dizer que o chamado interesse da sociedade se
reconduz a interesses de pessoas físicas relacionadas com a sociedade.
Oliveira Ascensão considera, de fato, um interesse da sociedade, contraposto ao
dos sócios, assente numa visão institucional de empresa.
Aqui temos a chave do artigo 64º do CSC. Os “interesses”, nele referidos, são,
simplesmente, normas e princípios jurídicos. Os administradores devem usar de
determinada diligência, acatando as normas e princípios relativos à sociedade, isto é,
aos sócios e aos trabalhadores, mas em modo coletivo, ou seja, através da particular
técnica da personalidade coletiva.

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A novidade está, no fundo, na referencia aos trabalhadores. Perante os valores


que enformam as modernas sociedades pós-liberais, a ideia parece adequada.

O ESTABELECIMENTO
A teoria da empresa aproxima-se pois, da da personalidade coletiva: as leis usam
a expressão empresa para designar, global e praticamente, os agentes económicos e as
suas organizações.

Com frequência, porém, surge a empresa para traduzir, apenas, organização em


si.

O tema aproxima-se, nesta aceção, da ideia de estabelecimento: uma


organização de meios humanos e materiais aptos para uma atividade articulada,
normalmente económica. O Código Civil opta, sistematicamente pela expressão
“estabelecimento”, evitando “empresa”.
Quer a empresa que, por maioria de razão, o próprio estabelecimento, têm um
papel fundamental na moderna teoria das coisas.

Muitas das classificações inseridas no Código Civil e das regras a elas inerentes
têm aplicação.

Todavia, as aceções “empresa” e “estabelecimento” são algo flutuantes. Apenas


em concreto se torna possível apurar o seu significado.

OS ANIMAIS
A própria natureza das coisas diz-nos que o animal não é idêntico à planta ou ao
mineral. Ele tem, pelo menos, a faculdade de se mover por si.
O Código Civil não dedicava preceitos aos animais, exceto a propósito da
ocupação e noutros domínios periféricos. Tão-pouco existe, na lei civil, qualquer norma
especificamente destinada a protegê-los, com exceção do artigo 1124º que, todavia,
tem uma estrutura de pura proteção contratual dos interesses do dono do animal.
A proteção dos animais constitui, já hoje, um valor estruturante das modernas
sociedades pós-industriais, quer a nível interno, quer a nível internacional. Abre-se,
assim, uma problemática no seio do Direito civil. O Direito civil deve acompanhar a
evolução dos tempos, incentivando-a ou corrigindo-a conforme as circunstâncias.

FUNDAMENTAÇÃO ÉTICA
Existe, hoje, um consenso sócio-cultural alargado no sentido de se dever uma
proteção aos animais. À partida, não haveria proteção. As grandes religiões sempre

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procuraram moderar esse estado de coisas. O Budismo indiano e o Confucionismo


chinês condenam a morte de seres vivos. O Islamismo, embora entendendo que Deus
pôs a natureza à disposição do homem, coloca-os sob proteção divina.

Também o Judaísmo e o Cristianismo determinam ou pressupõem regras de


proteção, recordando a proximidade entre o homem e o animal. Em termo filosóficos,
a tutela dos animais tem tradições. Aristóteles descobre nos animais almas vegetativa e
sensitiva, às quais o homem somaria a alma intelectiva.
Normalmente, os racionalistas são apontados como menos favoráveis a uma
tutela alargada: Platão e, sobretudo, Descartes. O romantismo e o neo-kantianismo
dariam novo ênfase à dignidade animal.

FUNDAMENTAÇÃO SÓCIO-CULTURAL
A sensibilidade é um todo. Não é pensável ser-se cruel para os animais e bondoso
para as pessoas: uma coisa implicará a outra. O respeito pela vida é uma decorrência
ética do respeito pelo seu semelhante. Condenar os animais pela não inteligência é abrir
a porta à morte dos deficientes e dos incapazes. Há um fundo ético-humanista que se
estende a toda a forma de vida, particularmente à sensível. O ser humano sabe que o
animal pode sofrer; sabe evitar fazê-lo. A sabedoria dá-lhe responsabilidade. Nada disso
o deixará indiferente.
A biologia explica, hoje, que o homem não é estruturalmente diferente dos
diversos animais: há muitas mais semelhanças do que diferenças, em termo genéticos.
Têm antepassados comuns. E estarão, provavelmente, juntos no futuro, até ao fim da
vida na Terra.

Em termos económicos, é bem evidente que boa parte da atual prosperidade


humana assenta na exploração, a todos os níveis, da vida animal.

A PROTEÇÃO JURÍDICA
A TUTELA EM PORTUGAL
A tutela dos animais tem tradições antigas. Por diversas vezes, os Reis de
Portugal proibiram as touradas: houve leis do Marquês de Pombal e de Passos Manuel,
nesse sentido.

Hoje releva a Lei de Proteção dos Animais. A Lei de Proteção dos Animais é um diploma
sintético, com dez artigos, ordenados em três capítulos:
Capítulo I – Princípios gerais – artigo 1º;

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Capítulo II – Comércio e espetáculos com animais – artigos 2º a 4º;


Capítulo III – Eliminação e identificação de animais pelas câmaras municipais –
artigos 5º a 10º.

A PROTEÇÃO CIVIL
No seu conjunto, a ordem jurídica portuguesa dispõe de múltiplos instrumentos
de tutela dos animais. Torna-se desejável o seu desenvolvimento e a complementação
da lei básica de 1995.
O Direito civil deve exercer a sua função de reflexão, de conceitualização e de
afeiçoamento do sentimento jurídico geral.
Não sendo os animais coisas, como qualificá-los ? Não se vislumbra qualquer
intenção legislativa de os equiparar às pessoas: em sentido jurídico, só o ser racional
pode ser destinatário de deveres – e, logo, de direitos. A exata qualificação dos animais
ficou, pois, em aberto, seno apenas seguro que disfrutem de proteção. A alteração
legislativa tem, de todo o modo, efeitos práticos globais, nunca devendo ser tomada
contra os valores humanos: antes a favor da vida no Planeta.
No Direito Português, o problema não se põe, ainda, com tanta acuidade. Uma
proposta de modificação do Código Civil, no sentido de proclamar que os animais não
são coisas, foi bloqueada por pruridos políticos. De todo o modo, a proteção existente
permite:
v Ou qualificar os animais como um tipo específico de coisa;
v Ou pôr em causa a estrita dicotomia pessoa/coisa.

Ambos os vetores são válidos, não estando, na ordem do dia, considera-los


“pessoas”. A ideia de coisa como algo de totalmente submetido à vontade humana deve
ser abandonada. Há regras a observar. No caso dos animais, tais regras são
suficientemente incisivas para forçar a uma certa relativização de conceitos. Embora
objeto de direitos, os animais têm uma proteção que faz, deles, “coisas” cada vez mais
diferenciadas. Parece de resto claro que a ideia de coisa está moldada sobre a de objeto
inanimado, sendo, por isso, distorcia quando aplicável aos animais.
O Direito português, no seu conjunto, comporta já princípios estruturantes
claros, no sentido da tutela dos animais. Em termos ético-culturais, o tema está maduro
para se considerar, na generalidade, recebido pelo sentir jurídico das pessoas.
Pode-se, com propriedade, falar numa deontologia humidificada. A tutela dos
animais integra, pois, plenamente, a cláusula dos bons costumes e, por essa via, o
coração do Direito civil.

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ANOMALIAS IBÉRICAS
A proteção dos animais surge como uma decorrência cultural do mundo
civilizado. Afigura-se um ponto pacífico, que o passar dos anos tem vindo a sedimentar
e a pacificar. Todavia, na Península Ibérica, com uma projeção limitada na América
Latina, mantêm-se duas práticas cruentas: as touradas e o tiro aos pombos.
Nas touradas procede-se à “lide” e, em certo casos, à morte de touros. O touro
é um herbívoro não violento mas que, quando espicaçado, investe. A “lide” consiste em
provocar um sofrimento crescente no animal, com recurso a técnica experimentadas
que não lhe dão qualquer hipótese, desnorteando-o, ainda, com imagens que ele não
sabe (nem pode) interpretar: capas, cavalos e sons. No final, com o ser esgotado e
mutilado, procede-se à sua morte ou à “pega”: tudo em público.
No tiro aos pombos – por vezes, pudicamente, dito “tiro em voo” – também
admitido apenas em Portugal e em Espanha, o atirador, travestido de desportista, tenta
abater pombos, largados para o efeito. Antes de largado, o pombo, previamente
enfraquecido pela fome e pela sede, é mutilado, através do arrancamento das penas
traseiras. Supostamente para ter um voo irregular.

TOURADAS
As touradas foram, ao longo da História, proibidas diversas vezes. Mas renascia,
sob diversos pretextos, ainda que sem estruturas organizadas.
O atual sistema político-partidário joga contra a defesa dos animais. Nenhum
dirigente político corre o risco d perder um voto que seja, por semelhante coisa. Há,
assim, que percorrer um caminho longo, com pedagogia e paciência. Seria decisivo que
os “agentes tauromáquicos” fizessem evoluir o espetáculo, de modo a manter os
aspetos coreográficos mais animados, banindo, progressivamente as práticas cruentas.
A cultura teria, com isso, tudo a ganhar.
De todo o modo, cumpre-nos rebater os três grandes argumentos pró-touradas:
(a) a cultura; (b) a ancestralidade; (c) a existência de outros males. Assim:
ü A cultura que exista numa tourada não pode ter a ver com a tortura pública de
um herbívoro; residirá, antes, na cor, nos trajos, na equitação e na música; ora
este aspetos podem ser ressalvados, sem os resquício cruentos;
ü A ancestralidade não se documenta com clareza; há uma tradição muito antiga
de proibição de espetáculos sangrentos, particularmente em Portugal; de todo
o modo, cabe às leis combater as práticas inadequadas, por antigas que sejam:
para isso a Humanidade criou o Direito;
ü Outros males, como o sofrimento dos animais nos matadouros, não se justificam
coisa nenhuma: a não ser a necessidade de, também aí, a lei intervir, para evitar
sofrimentos inúteis.

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TIRO AOS POMBOS


O tiro aos pombos, com as características acima apontadas, é frontalmente
contrário ao artigo 1º/1 da Lei nº92/95: sem qualquer necessidade, tal prática traduz-se
em infligir a morte, com sofrimento cruel, a um animal inofensivo. O processo mental
que consiste em justificar tal prática com o “desporto” é incompreensível. Desde logo,
o desporto envolve uma ética e uma responsabilidade diametralmente opostas a
práticas cruentas. De seguida, é desnecessário: o trio ao voo faz-se com prato, que
podem ser preparados para um trajeto irregular.
Os tribunais, confrontados com o problema, começaram por, corajosamente,
tomar a posição que deles se esperaria: proibiram “torneios” de tiro ao pombos. E nisso
foram apoiados por uma plêiade de jovens jurisconsultos.
Todavia, ilustres publicistas de peso nacional vieram opinar em sentido
contrário. E hoje, algumas decisões dos tribunais superiores consideram “justificada” a
violência perpetrada por esta prática.

Aulas práticas
Caso Prático 63
Segundo MC, para estarmos perante um fenómeno representativo há três
pressuposto que têm de ser preenchidos: primeiro, tem que haver uma atuação em
nome de outrem (contemplatio domini), i.e, o representante (Bártolo) deve agir em
nome do representado - esclarecendo a contraparte e todos os demais interesses que
age nessa qualidade – segundo as diretrizes do A.258- ; seguidamente, tem que se agir
por conta dessa pessoa, i.e, a representação visa a esfera jurídica do representado e é
aí que a mesma produz efeitos “… produz os seus efeitos na esfera jurídica deste
último…” parte final do A.258 designada por “nomine alieno” (sendo que a repercussão
dos negócios na esfera do representado dão-se de forma imediata e automática); e, por
fim, o representante tem que dispor de poderes para o fazer: sendo que, aqui, Analecto
confere a Bártolo poderes para o mesmo vender a vivenda X
1º Hipótese:
O fenómeno representativo envolve também um fenómeno de legitimação, i.e,
o representante (Bártolo), nesta hipótese, agiu em nome do representado (Anacleto)
mas, agiu sobre bens e interesses não prescritos no documento que ambos assinaram,
i.e, na procuração. A procuração é um negócio unilateral onde não é necessário
aceitação para que a mesmo produza efeitos. A mesma pode produzi-los por
entendimento tácito ou por renúncia : A.265º1. Neste caso, Anacleto ao redigir o
documento e ao conferir a Bártolo poderes para este somente vender a vivenda x,
estamos perante uma procuração que concede poderes especiais – aplicação analógica
do A.1159. Há que entender, contudo, que sob a procuração a lei pressupõe que exista

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uma relação entre o representante e o representado, em cujos termos os poderes


devem ficar esclarecidos para motivos de prova e verificação: a relação base. A relação
base constitui o “para quê” e os modos daquela situação jurídica em representação. Na
1º Hipótese, Bártolo ao trocar a vivenda x de Anacleto pelo aparamento y de Celso está
a exercer poderes de que não tem legitimidade para, i.e, de que não lhe os foram
concedidos na relação subjacente (terminologia do prof Oliveira Ascenção). Agiu, assim,
como falso representante, caindo na “representação sem poderes” ou “representação
imprópria” (terminologia usada pelo prof Mota Pinto) – A.268. Não sendo este assistido
de uma atribuição superveniente de poderes de representação (parte final do º1)
designada por “ratificação”, a mesmo é ineficaz.
Contudo, Há que entender que, quando falamos em representação voluntária,
esta serve em primeira linha os interesses do próprio representado. É através da
representação que o representante contrata com terceiros. A procuração não pode,
pois, ser tratada como uma relação exclusiva entre o representante e o representado.
Os terceiros (neste caso Celso) ficam envolvidos. Contudo, não pode aqui haver um
fenómeno de abuso de representação porque Bártolo pratica um ato sem poderes para
o fazer: a troca da casa, em vez da venda, que fora acordado. Assim, só pode haver abuso
se houver representação. Se não há representação não pode haver abuso.
Há ainda que atender que o preço, neste caso o veículo da venda é a própria
venda, é acordado pelo representante e representado, onde o terceiro apenas sabe
aquilo que o representante lhe comunica. Este tem, pois, liberdade de ação, caso
contrário estaríamos a falar de um mero núncio. O terceiro( Celso) tinha conhecimento
dos poderes de representação, neste caso não dos falsos poderes, mas dos aparentes,
não lhe podendo ser imputada a parte final do A.269 porque o mesmo não sabe, nem
tem de saber, o que foi acordado entre representante e representado. O A.266 º2
protege os terceiros “das restantes causas extintas da procuração”, i.e, aquelas que, por
estando de boa fé, não lhe podiam ser impostas.
MC e a maioria da doutrina, contrariamente ao que argumento, considera que,
no âmbito de uma procuração aparente, ao terceiro incumbe exigir o comprovativo do
documento de representação ao representante -A260. Caso se entenda que o terceiro
tinha o dever, o A.269 diz-nos que a aplicação do mesmo é válida “se a outra parte
conhecia ou devia conhecer o abuso”. Assim, para quem o entenda em forma de abuso,
o A.260 diz-nos que o terceiro pode exigir ao representante “a prova dos seus poderes”
nº1 ou uma “cópia do documento” nº2, recaindo em Celso a exigência do comprovativo
de tais poderes.
Sustento a minha resposta com base no argumento de que Celso estava de boa
fé e que por isso não tinha de “conhecer ou dever de conhecer” o abuso. Se existir
abuso, ele é interno, i.e, diz respeito à relação interna entre o representante e o
representando, só podendo esta passar para o relacionamento externo se o terceiro
(Celso) estivesse de má fé, o que significaria que ele tinha o dever ou o conhecimento
do abuso, o que não se sucede.

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2º Hipótese
Contrariamente à hipótese anterior, Bártolo, tendo os mesmos poderes de
representação e legitimidade – A.258 -, agiu, não em representação sem poderes, mas
em abuso de representação – A.269. A diferença residual que existe entre a
representação sem poderes e o abuso de representação incide no campo de atuação do
representante e a sua conexão com a outorga de poderes na procuração e no negócio
base: quando nos referimos a representação sem poderes há uma atuação, por parte
do representante (Bártolo), geneticamente inabilitada, comprovada pelo negócio base
ou pela procuração, para o exercício de uma certa ação: como tal, o representante
pratica um ato sem estar habilitado para tal, isto é, sem ter os devidos poderes. Por sua
vez, quando nos referimos a abuso de representação, referimo-nos, não a uma
inabilitação por parte do representante, uma falta de poderes num determinado campo,
mas um num desvio notório em relação à base em que as partes contrataram, agindo
em desconformidade com as instruções acordadas na procuração.
Em ambas as figuras há também divergências quanto ás consequências jurídicas
do interesse prosseguido: enquanto que na representação sem poderes pode admitir
um regime superveniente de validação representativa (a ratificação) por partes do
dominus, se a este for proveitoso o negócio, e por isso, se não for, ao terceiro pode
pesar uma certa “exigência” ao lhe ser exigido que comprove os poderes do
representante (A.260), não admitindo que o mesmo pode e deve ser protegido (A.266),
no regime do abuso de representação o negócio é sempre válido, independentemente
da validação ética da conduta do terceiro, acabando por se proteger mais o terceiro
devido ao investimento de confiança que o mesmo criou na competência de poderes do
representante. A lei aqui é clara: o negócio apenas é ineficaz (POR REMISSÃO DO A.268)
se o terceiro tivesse a cognoscibilidade da falta de poderes representativos do
representante; se não tiver a cognoscibilidade desses poderes, nem o dever de a ter, o
negócio é valido.
No âmbito da relação subjacente, relação interna, e não externa, como o abuso
de representação, insere-se o mandato. O mandato é uma relação de base (um interesse
ínsito numa relação). Nós temos, antes da procuração, um mandato. A.1161 a) segunda
parte -> ANACLETO pode recorrer ao A.798. Em princípio essa indemnização seria 250mil
(metade do preço)
3º Hipótese
261 – Age em dupla qualidade: ele é em i) representante; e ii) ele não é
representante, age em nome próprio e por conta própria.

261º2 – Subestabelecimento – quando o Bártolo tivesse delegado os poderes


que tivesse delegado numa pessoa e depois celebrasse o NJ consigo mesmo; este
subestabelecimento pode haver substituição; ou subrepresentação, pode ser uma mera
delegação. E aqui ficam os 2 com poderes de representação. É anulável porque o
representante pode deixar de agir por conta do representante, e deixar de proteger o

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representante do dominus, e passar a proteger os seus próprios interesses. Visa-se no


fundo evitar/afastar um perigo para os interesses do representado.
O consentimento .340 e A.1682
A terceira hipótese revela-nos um caso de Negócio consigo mesmo – A.261.
Neste caso, o negócio celebrado pelo representante (Bártolo) consigo mesmo foi feito
“por escritura que outorgou em nome de Anacleto”, ou seja, foi feito “em representação
de terceiro” – consistindo aqui o “terceiro” no representado. O legislador é bem claro:
considera o negócio consigo mesmo anulável independentemente de este ser ou não
prejudicial, ressalvando certos casos. A lei pressupõe, contudo, dois casos em que o
autocontrato é válido: i) quando o representante consentiu especificamente na
realização, pelo representante do negócio consigo mesmo, ou ii) quando seja o negócio,
dada a sua natureza, de molde a excluir a possibilidade de um conflito de interesses (há
uma comunhão de interesses; caso de contitularidade de direitos: o prop de um
estabelecimento contrata com um mercado que também é seu) por dele não puder
resultar prejuízo para o representado.
O negócio é anulável; ele tem 1 ano. Se não fizer nada, caduca. Ele pode
confirmar (A.288)
VER BEM AS DISTINÇÕES DOS REGIMES AFINS
4º Hipótese

Salvo disposição legal em contrário, “a procuração revestirá a forma exigida para


o negócio” – A.262 - , querendo isto dizer que o caráter formal ou consensual da
procuração , tal como da ratificação – A.268 - , depende das exigências formais do
negócio representativo, o que, no caso da procuração para venda de um imóvel, é
exigido, como consta no artigo, “…. salvo uma disposição legal”, ou seja, se não houver
uma disposição legalmente exigida, a procuração reveste uma forma acordada pelas
partes para o negócio. No entanto, neste caso a lei exige uma forma legal: a escritura
pública – A.875. Trata-se, contudo, de uma forma legal exigida devido à relação base
em que se fundamenta a causa jurídica do contratar: a venda de uma vivenda. Se se
tratasse de uma atribuição de poderes que não envolvesse o regime prescrito para a
disposição legalmente exigida, o negócio seria válido, pois a lei não exige disposição legal
a não ser nos casos expressamente enunciados. Como tal, a transmissão da procuração,
dos poderes representativos de Anacleto para Bartolo é nula, por inobservância de
forma legal (A.220). Constatamos, assim, que há um vício interno e genético na
formulação da própria procuração, da outorga de poderes representativos, o que em
regra nos diz que nunca chegou a haver negócio, pois o problema reside logo na emissão
da procuração
Como tal, Bártolo não consta de poderes representativos para fazer o negócio
com Celso, porque o mesmo não os detém. Contudo, é ainda necessário apreciar o
estado em que Bártolo se encontrava: “embriagado”. O A.259 diz-nos que, “à exceção
dos elementos em que tenha sido decisiva a vontade do representado”, quanto a

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estados subjetivos relevantes, como a falta ou vício da vontade, é na pessoa do


representante que estes devem verificar para motivos de nulidade da declaração.
Contudo, há que entender este “à exceção dos elementos em que tenha sido decisiva a
vontade do representado” significa os ilícitos pré-contratuais cuja prática tinha sido
resultado de instruções ou indicações do representado, sendo imputada na esfera dele
a responsabilidade in contrahendo de tais ilícitos culposos e danosos que venha a
emergir face ao terceiro. Isto significa que o representado ao acordar com Bártolo a
emissão da procuração para a venda de um imóvel num guardanapo, e ao isto inferir na
esfera de Celso (o terceiro) como um ilícito culposo e danoso, está a praticar um ilícito
que vai frustrar e danificar a esfera de terceiro (Celso), e sabendo, de ante mão, que
Bártolo, logo depois de fazer a “suposta procuração” com Anacleto, fez “seguidamente”,
a venda com Celso, o que se consegue depreender que, através do advérbio
“seguidamente”, Anacleto tinha a noção que Bártolo estava incapaz para ter
discernimento daquilo que fazia ou dizia, encontrando-se embriagado , e por isso,
celebrou um contrato com um incapaz, prescrevendo o artigo 257 que a declaração
negocial expressada por Bártolo é anulável e não é possível utilizá-la para motivos de
vontade contratual. Argumento ainda que, ainda dentro deste raciocínio, e devido ao
estado embriagado e incapaz de Bártolo, lhe é impossível imputar o “conhecimento ou
ignorância dos fatos” prescrito na ressalva do A.259.

Quanto ao negócio celebrado entre Bártolo e Celso, o nº2 do 257 diz-nos que o
facto só se considera notório “quando uma pessoa de normal diligência o poderia
notar“. É possível aqui haver divergência quanto ao ónus de diligência do declaratário
(aqui o terceiro) em entender que a mesma estava a ser proferida por um incapaz.
Contudo, como o enunciado não nos revela mais pormenorizadamente a atuação de
Bártolo, é impossível aferir este critério à luz do A.236.
Há ainda, contudo, uma via que pode desenvolver-se pelos caminhos da
Representação sem poderes, por parte de Bártolo, apesar de o mesmo não ter agido
dolosamente ou de má fé, sendo ela aplicável tanto a representante na ação de má ou
boa fé.

Contudo, considero que não nos poderíamos referir à representação sem


poderes pois, em rigor, não houve um fenómeno representativo e o problema encontra-
se logo na emissão da procuração, onde a culpa é imputável ao representado e não ao
representante. Mais: o terceiro, notando o estado em que o representante se
encontrava, era-lhe exigido que pedisse prova do documento que comprovasse a
outorga de poderes representativos A.260, e de que tivesse em conta o estado subjetivo
do representante.

A cognoscibilidade é a do representante (pressuposto do erro)


Há aqui um problema de base: temos de ter em conta os requisitos do NJ

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Teoria da representação – é na pessoa do representante – neste caso é aqui; se ele


estive em erro por alguma razão – ocaso- ela releva; “factos relevantes” é a
cognoscibilidade. Argumentos: adesão à realidade; quem age, declara, é o
representante, e sendo ele que age, o direito não pode ignorar este dado que, sendo ele
a negociar e celebrar o contrato, é na sua pessoa que devemos verificar se é na pessoa
se há um conhecimento relevante ou desconhecimento irrelevante.´
MC; AO; O desconhecimento culposo do representado sobrrpõe-se ao conhecimento do
representante
Teoria do NJ – Temos de ver se os requisitos desses requisitos se verificam na pessoa do
representado/representante; é no A que vão ser produzidos os efeitos do NJ, logo dá-se
prevalência a este.; Atende ao destinatário que vão ser produzidos a partir da
representação/celebração do contrato. A representação serve apenas para uma
“cooperação”; na verdade, o autor da declaração é o A, não o B. É a ele que pertence a
declaração negocial.
Atender à automia da vontade do A

A.259º2 boa fé sentido amplo para os defensores da teoria do NJ


Teoria da representação 259 nº1 2ª parte – era válido; não está em causa uma boa fé
do B, logo seria uma coisa diversa.
Teoria do Nj era anulável
5º Hipótese
Primeiramente, há que indagar a atribuição de poderes representativos de
Anacleto para Bártolo, sendo este menor. Segundo o A.263, o procurador “não necessita
de ter mais do que a capacidade de entender e querer exigida pela natureza do negócio
que haja de efetuar”. Este Artigo, ao prescrever a regra específica de capacidade, refere-
nos a “natureza do negócio” que – neste caso o menor – “haja de efetuar”, tendo em
conta a capacidade que o mesmo necessita para o fazer. Considera-se que o negócio
que Bártolo vá efetuar é um negócio formal, em que se exige escritura pública
autentificada e, como tal, maioridade. É exigido ainda para a validade desta regra
específica, que a mesma tenha sido consentida pelo representado e, como tal, que seja
enunciada no negócio-base, pois de outro modo a invalidade desta implica a da
procuração – A.265º1. É questionável, pela natureza do caso, se Anacleto estaria de má
fé ao atribuir poderes representativos a Bártolo, sabendo a priori que este era menor e
que, como tal, não tinha capacidade de exercício (A.123). É também questionável se a
transmissão de poderes de Bártolo a seu pai, corresponde a uma figura de substituição,
e que por isso se integraria no regime de representação voluntária e no regime do A.264.
Contudo, não acredito ser o caso, pois não estamos no âmbito da autonomia privada –
pois o representante é menor – mas na proteção patrimonial e pessoal da representação
que o menor contraiu. Como tal, o presente caso encaminhar-nos-ia para o A.1881, onde
consta o poder de representação, compreendendo este “todos os direitos e o
cumprimento de todas as obrigações do filho, exceptuados os atos puramente pessoais

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em que o menor tenha o direito de praticar”. É de salientar que a venda de um imóvel


contraída pela outorga de uma representação não corresponde a um ato que um menor
possa “livremente” exercer, pois no máximo, e neste caso, o mesmo apenas teria
poderes de gozo do imóvel, se se tratasse do usufruto do mesmo, mas em caso algum o
de venda ou transação do mesmo, por incapacidade genética. Há que ainda explicar o
porquê do A. 1176 não se puder aplicar aqui analogicamente: aponto, essencialmente,
uma grande razão: a caducidade implica sempre um facto extintivo superveniente à
celebração de um contrato ou a uma adstrição a uma prestação: neste caso há uma
patologia antes mesmo se haver uma efetiva prestação ou, neste caso, o exercício de
poderes representativos: Bártolo, vendeu a vivenda a Ernesto. Encontra-mos aqui
presente, neste ato de Bártolo, uma Representação sem Poderes (A.268) porque,
terminologicamente falando, Bártolo nunca teve qualquer tipo de capacidade para
poder vender a vivenda. É questionável, ainda, e também, se o A.266 podia ser invocado
para a proteção de Ernesto, devido a ter havido uma modificação na procuração, pela
emissão desta no âmbito da representação legal. Acredito que não: a ressalva do A.266
fala-nos da exceção da aplicação do regime de proteção de terceiros quando “delas
(entende-se, da modificação ou revogação) os mesmo tinham conhecimento no
momento da conclusão do negócio”, sendo-lhe aqui aplicável o A.260 para que o
terceiro consiga comprovar, através da exigência que o representante faça prova dos
seus poderes nº1, ou que o terceiro exija a cópia do documento, para que assim consiga
avaliar a veracidade dos poderes do representante. Se o fizesse, saberia que o mesmo
não tem poderes para tal e que a outorga da representação pertenceria agora ao pai do
menor.
Em tese de conclusão: o negócio é ineficaz.

Temos de olhar a capacidade em concreto do melhor, tendo em conta a sua


capacidade concreta, com o tipo do negócio e com os valores do NJ celebrado envolve.
Falta a capacidade do procurador 263;

Se o A desconhece com culpa, o NJ é válido. Não pode ser anulável, porque o A fica
vinculado ao negócio; tendencialmente ele é aplicável. O 259º2 apoia-nos.

Se ele não soubesse que era menor, o Nj podia ser anulado ou ser confirmado.
A logica formal e estrutural da representação assenta na anulação sempre. No entanto,
tem que haver uma redução teleológica.
=/ estado subjetivo, que é o conhecimento ou desconhecimento
263 o rep não tinha de entender e querer suficientes para atender aos interesses do
dono tendo em conta o negócio
A representação legal do 263nº1 não supre a sua incapacidade. Não pode porque a
relação de base pressupõe confiança: ela só se constitui em relação aquelas pessoas que
fazem parte da relação.

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Mas mesmo que fosse maior, ele não podia substituir 264 segundo os 3 pressupostos.
O negócio cairia no 268.
Anacleto tinha um encargo de indagar Bártolo.
259 Pressupõe um problema. Se ele ´valido, não se aplica o 259.

Nulo = interesse de ordem pública


Autonomia da vontade do representado
Tutela da confiança do terceiro
Nº2 do 259 – se o representado estiver má fé, e se ele soubesse do vício ou devesse
conhecer o vício, o facto relevante para a validade ou invalidade do NJ, então, não há
razão para defende-lo. -> Protege-se o terceiro de boa fé. O NEGÓCIO É VÁLIDO. Porque
há um desconhecimento culposo por parte do representado.
Má fé sobre um facto relevante, sobre um aspeto relevante do representado faz com
que esteja de má fé. A MÁ FÉ DO representado leva à invalidade.
6º Hipótese
Bártolo, ao entregar uma cópia do documento subscrito por Anacleto a Flávio
agiu ao abrigo do A.260º2. Este artigo visa, essencialmente a credibilidade da
representação de forma a evitar situações de incerteza quanto a negócios futuros.
O representado (Anacleto) pode revogar, segundo o A.265, a procuração, i.e, a
atribuição de poderes representativos que o representado atribui ao representante. O
Artigo dispõe, ainda, outras situações de extinção da procuração, como a renúncia por
parte do procurador ou a cessação da relação jurídica de base – i.e, o disposto acordado
na relação de base, ressalvando que a vontade do representado é sempre a exceção
reguladora. Não obstante a prevalência do interessado no Artigo, o nº3 confere também
a tutela da confiança face ao representante e ao terceiro, ressalvando que a mesma não
pode ser revogada sem justa causa – o que, a meu ver, se sucede, pois Anacleto foi”
contra o que ambos tinham combinado”. Como tal, a procuração nunca se extinguiu,
pois depreende-se tacitamente do comportamento de Bártolo, ao contratar com Flávio
mesmo sabendo do dissídio entre ele e o Anacleto, que nunca considerou a revogação
da proposta como algo legalmente verosímil.
O negócio é válido.
Represente não tem deveres, porque ele não é parte aqui. Ele só tem Direitos
1170 mandato livremente revogável porque se funda numa relação de confiança.

Revogação do mandato por ser unilateral (recipienda quando conhecida pelo


representante). 1170º1 e º2.

Cessação da relação subjacente 1170 mandato

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265º3 porque pode haver vantagens para o próprio representante; a procuração,


num caso hipotético, de um banco.
1170º2
266º1 – a procuração só cessa quando o terceiro tiver um conhecimento efetivo
ou um dever de conhecer – interpretação puramente literal. Isto quereria dizer que o
dono do negócio que todo e qualquer potencial 3º tivesse ser informado de qualquer
modificação ou revogação. MC posição restritiva – o flávio devia ser protegido. O
terceiro que saiba e não devendo saber que a procuração foi revogada, inoponibilidade
da procuração face ao terceiro. O título cessa com a declaração emitida
É válido porque se o terceiro estiver de boa fé porque foi feita justificação dos poderes
de representação (260), a procuração para cessar precisa de uma procuração dirigida ao
terceiro e ao representante.
266 nº1 afasta o 268. Se a procuração já cessou como é que a procuração produz
efeitos?
É a tutela da confiança
Procuração aparente porque ele pensava que a procuração tinha sido revogada. Ele
julga que a procuração cessou. Procuração aparente post factum
Ónus do representante informar o terceiro – ónus de prova. Nos outros casos de
extinção da procuração, é o terceiro que tinha de demonstrar que ele não sabia e que
não tinha o dever de saber, nem o encargo de se informar, se a procuração estava ou
não a valer.
Ele tinha que restituir o título, o Anacleto, 267. A disparidade da formalidade entre o
meio escolhido para a procuração e o meio escolhido para a revogação – ele revoga por
tlm.
Procuração aparente:
1. Hipótese – relação de facto: explicação da procuração por via do NJ.~

Principio da tutela da confiança – vamos resolver o prob como se houvesse uma


procuração. Anacleto fundada na aparência, na confiança que é criada junto do
terceiro.
1º situação de aparência – alguém confia e alguém que acredita nela
2º Confiança merecedora de proteção
3º Investimento nessa confiança
4º Imputação da confiança – uma ideia de “responder por”; ter de aceitar as
consequências. Aquela a quem vamos imputar a situação de aparência, tem de
responder perante a aparência que criou. Ideia de causalidade entre a situação
de aparência e o dono do negócio.

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DL 178/86 - Na agência podemos, alem de atos jurídicos, ter atos materiais Promover a
situação futura de negócios entre duas pessoas – a pessoa que o incumbiu e o terceiro
– aplicável maioritariamente só nos casos comerciais.

CIC OU responsabilidade da tutela da confiança - VER


7º Hipótese
1174 a) -> cessou a relação subjacente. Neste caso, deu-se uma impossibilidade
superveniente de Bártolo prestar o que acordara na procuração com Anacleto, aqui por
uma razão subjetiva. Segundo o 1176, o mandato ao caducar por morte, faz cessar a
relação, e, como tal, os seus herdeiros devem prevenir o mandante e tomar as
providências adequadas. Providencias adequadas não é exercer um poder que não se
tem, nem significa que os poderes de representação sejam translatícios: Gil agiu em
representação sem poderes (A.268); mas não só: a procuração deste era aparente. I.e:
ele invocou poderes de representação de outrem e afirmou atuar em seu nome, sem
que o suposto representado lhe tenha conferido esses poderes e sem que tenha
conhecimento de que assim se sucede. Neste caso, o terceiro não é protegido porque
ao mesmo seria exigido que perguntasse ao representante a justificação dos seus
poderes de representação (A.260). O terceiro é apenas protegido pelo ordenamento,
nomeadamente pela boa fé e pelo abuso de direito, no caso de procuração aparente,
quando exista venire contra factum proprium.
Anacleto tem duas opções: ou ratifica ou anula.

Caso Prático 64
Houve uma procuração outorgada por Adélio conferido poderes a Braulio, mas
sem que este expressasse o seu consentimento. No entanto, estamos perante uma
outorga de poderes representativos, sendo que a esta é aplicado o regime da
unilateralidade: i.e, para a procuração ser válida não é necessário a assinatura de ambos
os sujeitos, bastando que ela seja conferida por A a um determinado representante; esta
pode ainda ser conferida, segundo o presente caso prático, sem nenhuma forma
legalmente exigida (A.262 º2). Ficou ainda estipulado na relação subjacente que o bem
em causa podia ser vendido pelo preço que Braulio entendesse – isto reporta à
prestação geral do mandato – A.1159 nº1. Adélio, ao contactar Bráulio e referindo-se a
este que pretendia o pagamento integral do preço, e Adélio sabendo isto, este rompe
as obrigações que o mesmo tinha, e por isso vai contra o A.1161 A. Este desvio
representativo praticado por Bráulio, cai no regime do abuso de representação – A269.
Depois do acidente provocado por Celso, e estando num caso de reserva de Abuso de
representação específico, a Celso não era expectável nem presumível que exigisse a
verificação das clausulas do mandato a que Bráulio estava adstrito .Assim, a Celso não
se poderia imputar o regime do A.260 pelo seu desconhecimento sem culpa e pelo sua
incapacidade de ter o dever de conhecer o abuso de Bráulio. O terceiro estava de boa
fé. Estando de boa fé, há que tutelar a confiança que o mesmo depositou no

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representante, bem como protege-lo do seu desconhecimento sem culpa – A.266. A


questão coloca-se quanto à proteção do terceiro que efetivamente acreditou no
fenómeno representativo, investindo a confiança nos poderes e na capacidade do
representante, que sendo assim, validaria o negócio, e a posição de Adélio, que,
sofrendo de abuso de representação, exige o dinheiro a Celso, e que, devido a isto, lhe
seja facultado, a Adélio, a possibilidade de o mesmo anular o negócio. Contudo, se este
o anulasse, a posição do terceiro sairia enfraquecida face à do representado.

A relação de base é um mandato. Aqui há instruções.


Não está tudo bem
Atendendo às circunstâncias e há relação onde se insere o abuso, a patologia no
processo de representação dos poderes conferidos insere-se na relação interna, sendo
que a mesma não pode ser oponível ao terceiro que, de boa fé, tenha confiado e
investido na situação de confiança. O negócio é valido.
Contudo, há que tutelar também a posição do representado, para além da do
terceiro. Como tal, Bráulio terá de indemnizar Adélio – A.798
Modificação da procuração – o texto legal da procuração é alterado

Dizer que é um mandato com representação 1157

Caso 64 nº2
A situação jurídica que ele está a exercer abusivamente é o crédito
indemnizatória.
O abuso de direito insere-se no A.483
Boa fé objetiva e conta nas duas feições.

64 º2
Quanto mais tempo passar, este serve para tornar mais justificável
Não é Surretio porque não é o nada fazer, ele agiu.
Não temos elementos suficientes no caso para dizer que Celso investiu na
confiança.
Salvar a hipótese: sistema
A tipicidade ajuda-nos a perceber e fundamentar a situação do caso. O A.334 é
uma CCG.
Há fortíssimas razões para proteger a posição do Celso

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É móvel relativamente ao investimento.


Consequência: O dimas não pode exercer o direito à indemnização.

Perspetiva do Dima que falta à palavra dada


Perspetiva do Celso: que o Celso acreditou na declaração de Dimas.
P839 e ss
Paulo Mota Pinto – Sobre os comportamentos contraditórios – Boletim Fac
Coimbra

Caso nº66
Manuel, depois de ter emprestado a Nuno uma certa quantia, pelo prazo de um
mês, há 19 anos, aceitando a alegação de Nuno de que este não poderia pagar apesar,
inclusive, de manter conversas diárias com este, vem hoje alegar a restituição do capital
em dívida. Manuel, ao agir nestes parâmetros, incorre em abuso de direito (A.334). No
presente caso, a restituição do capital em dívida, por não ter sido exercido em
determinadas circunstâncias e por um certo lapso de tempo, vir agora exigi-lo é
contrário à boa fé. Aqui, o factum proprium foi a omissão / abstenção de Manuel por
não ter exercido o Direito. Isto faz com que estejamos perante a modalidade Suprecio
Surretio. Esta modalidade de decisão destina-se a proteger a confiança de um
beneficiário, através das seguintes proposições: i) um não exercício-prolongado – na
medida em que a pessoa em causa, i.e, um confiante normal colocado na posição do
real confiante, compreenderia que a posição em causa não iria ser mais exercida.
Seguidamente ii) é necessário que haja uma situação de confiança (subjetiva); neste
caso, o elemento subjetivo a que o confiante aderiu não consta presente no caso, ou
podendo este fundir-se com a justificação para a confiança criada (iii), i.e, uma confiança
objetiva, expressa na presença de elementos tais, capazes de provocarem a crença
plausível de adesão de uma pessoa normal, sendo que aqui o facto gerador de confiança
fora o silêncio prolongado de Manuel. Tem, também, que haver um investimento nessa
confiança criada, que aqui resulta na confiança nesse factum propium omisso, i.e, no
silêncio prolongado e no investimento na confiança do que esse silêncio significava: i.e,
a absolvição do pagamento. Esta confiança deve, por fim, ser imputada a alguém, de
forma objetiva, neste caso entregando a responsabilidade da situação criada ao Manuel.
No presente caso, a adquirição da posição de vantagem ex bona fide, i.e, na
supressio, é o não cumprimento da prestação a que Nuno estava vinculado. Contudo,
Manuel age dentro do prazo legal de prescrição comum (i.e, 20 anos), o que faz com que
ao mesmo, enquanto credor, não possa, pela parte do devedor (Nuno), ser arguido a
recusa do cumprimento da prestação contraída, pois este situa-se ainda dentro do prazo
prescricional (A.309). Não sustento que a prescrição em causa possa ser presuntiva, pois
de acordo com o A.316, esta apenas diz respeito a determinados créditos.
Assim, dá-se que Manuel tem o direito de exigir a prestação contraída por Nuno,
pois esta encontra-se dentro do prazo legal, i.e, não excede os 20anos. No entanto, a

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meu ver, o mesmo caiu no regime de abuso de direito, e por isso, não pode, depois de
tanto tempo e daquilo que deu a entender, exigir o pagamento da prestação. Posto isto,
dá-se uma colisão de direitos (A.335) onde, na minha opinião, se terá que tutelar mais a
posição de Nuno e a confiança a que este aderiu, e com razão.
Obrigações puras -obrigações exigidas pelo seu cumprimento a qualquer momento pelo
credor
OBRIGAÇÕEs sujeitas a prazo - só podem ser exigidas quando o cumprimento só
possa ocorrer decorrido….
Neste caço só podia ser exercido passado 1 mês.
Aqui o facto era o prazo prescricional.

A boa fé intervém quando a injustiça do caso seja desconforme.


Suprecio – direito não exercido, ou situação jurídica ativa que não vai ser
exercida durante muito tempo e a dada altura… blablá blablá
Na surrecio alguém tem uma situação ativa mas, em consequência do não
exercido dessa liberdade, ou desse direito, cria a conveni-ência que a outra pessoa seja
titular do direito.
Extingue-se uma situação ativa em Manuel e uma passiva no Nuno; correlativa
extinção da situação passiva de uma esfera e passiva noutra, apesar de não ser sempre
assim. Não é SURRECIO porque NÃO SURGE UMA SITUAÇÃO ATIVA.

Caso nº71
No presente caso, ao Birmínio estabelecer um diálogo, com Asdrúbal, sobre a
sua vida pessoal e familiar, gravando, inclusive, a conversa que este tivera com Asdrúbal,
e sem o consentimento deste nem conhecimento deste, para depois reproduzir a
conversa no seu programa de rádio, faz com esta atuação colida com o respeito pela
teoria das esferas, i.e, pela delimitação objetiva da tutela, neste caso, do direito à
intimidade da vida privada (A.80). Ao falar “sobre a sua vida pessoal e familiar”, a
presente expressão refere-se ao âmbito privado da esfera de Asdrúbal, o faz com que
esta apenas possa ser publicitada num programa de rádio se o mesmo o consentir e tiver
conhecimento (o que não se sucede).
Há que atender, neste âmbito, aos pressupostos que o A.80º2 refere. Quanto à
natureza do caso (que se confere como os valores que, objetivamente e in concreto,
conduziram à intromissão na esfera privada) que facilmente se depreende que os
valores subjacentes à privacidade se sobrepõe ao comportamento de Birmínio, e
quanto à condição das pessoas, sendo que aqui este pressuposto é analisado por um
vetor subjetivo, e por isso, varia conforme os sujeitos. Isto faz com que a esfera privada
de políticos ou celebridades não desapareça totalmente e que por isso seja lícito, por
exemplo, documentar, numa rádio, a vida pessoal do primeiro-ministro. No presente
caso, isso não se sucede. Asdrúbal pode requerer as providências adequadas com o fim

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de evitar os efeitos que possam surgir do programa de rádio de Birmínio (A.70º2),


podendo, ainda, responder por danos causados (A.483).
---
Reconhecer direito geral de personalidade no A.70º1 ou A.79.

Generalização da personalidade, da jussubjetivação do A.70º1 é perigosa (faz


coincidir os direitos de personalidade com uma realidade ontologicamente difícil de
definir que é a personalidade; começamos a descobrir bens de personalidade
individualizados em todo o lado e acabamos por correr o risco de normalizar aquilo que
é um setor jurídico que convoca uma especial relevância de tutela – Escola Coimbra
parte do A.70º1; Lisboa parte do particular para o particular, em rigor, ou geral, partindo
por analogia – A.79; Direito à palavra inserindo-se no Direito à imagem.
Há também duas leituras possíveis do A.70º1
Há quem entenda que a lei do A.70º1, o drt personalidade não incide sobre a
dimensão da personalidade mas sobre uma norma de tutela; mas é claro que para haver
norma de tutela tem que haver uma dimensão de base de personalidade.
A.80 nº2 + interesse público + Teoria das Esferas
Natureza do caso – não podemos ver o bem em causa como um bem absoluto;
outros bens podem estar em jogo e podem obrigar a uma compreensão desta natureza;
pode ser restringido, por interesse social ou pela verdade – ponderação da utilidade
social da informação: não havia nenhum interesse que justificasse a violação daquela
entrevista.
Esfera privada
Ele pode 70º1 – 483 – 496
Pode, também, A.70º2

2ª hipótese
O nome corresponde a uma representação linguística de um ser humano, sendo
vocativo porquanto permite designar a pessoa que o use, e distintivo, por permitir
facultar a destrinça dos demais. Torna-se assim um direito subjetivo absoluto e privado,
com proteção civil daí decorrente, considerando-se, pois, como um direito de
personalidade.

O A.72º1 refere o “direito” a usar o nome, retirando-se daqui, implicitamente,


que o pode abreviar – caso do que acontece com Birmínio. Sendo que o mesmo não está
a infringir o A.72º, na medida em que não se situa no campo prejudicial dos interesses
de quem tiver um nome idêntico ou parcialmente idêntico, a este nada pode ser
imputado. O mesmo agiu licitamente.

Não é; é pseudónimo (A.74)

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Dois direitos de personalidade: direito do anízio e do de Asdrúbal


Pseudónimo, sendo um nome falso, se houver notoriedade ele, apesar de não
ter a mesma importância significativa, não tem a mesma relevância: há aqui um
interesse ao nível da identificabilidade – a mesma função que o nome assume:
equiparação ao nível da tutela, mas não se pode dizer que seja o mesmo
reconhecimento da importância significativa ao direito ao nome
Qual deve prevalecer? Prob é o do A.72º2 – começando-se, claro, pelo nº1
a.335 – ponderar os meios em jogo, as questões temporais – quem usava À mais
tempo – a utilidade que cada um retira; que benefícios retira; a importância dos bens
em causa; a vantagem ou dimensão das vantagens que o exercício permite a cada um;
a circunstancia do direito permitir um enriquecimento injustificado; grau de culpa: o
conflito ter sido intencionalmente provocado
Direito ao Nome é mais importantes; tem uma dimensão social mais relevante
Anízio está a usar o pseudónimo há mais tempo; já se tinha tornado conhecido
Havia argumentos para as duas posições. De qualquer das formas, havia alguma
margem, do tribunal do A.70º2, a conjugar a “concretização prática” dos bens em
conflito: obrigando os dois a adotar uma medida identificativa; ou um segundo nome
3º hipótese
Apesar de, inicialmente, e mediante pagamento, Asdrúbal ter consentido que a
revista dirigida por Birmínio utilizasse uma fotografia sua, este, dias depois, proibiu a
divulgação da mesma, i.e, revogou a limitação voluntária que inicialmente tinha
consentido – A.81. Sem prejuízo do disposto neste artigo, apesar da limitação ser
revogável, esta dá origem à obrigação de indemnizar os prejuízos causados às legítimas
expetativas da outra parte – in fine. Contudo, a direção, ao ignorar a comunicação de
Asdrúbal, violou o A.79º1, na medida em que o retrato de Asdrúbal foi lançado no
mercado sem o consentimento deste. Ao surgir, no interior da revista, um texto com
relatos sobre alegados antecedentes criminais de Asdrúbal, desconhecendo-se a
falsidade ou verdade dos factos relatados – excluindo-se uma hipotética “excetio
vertatis (exceção da verdade) -, para além de o mesmo não ter sido consentimento por
Asdrúbal, e mesmo se o fosse poderia ser tutelado pelo direito como um resultado do
prejuízo para a honra (A.79º3), Birmínio incorreu numa violação à vida privada de
Asdrúbal, violando, assim, o seu direito à intimidade da via privada (A.80), como tal,
estendendo-se esta conforme a natureza do caso (natureza objetiva), i.e, dos dados que
in concreto conduziram à violação – neste caso, a publicação de informação privada sem
consentimento de Asdrúbal – e, seguidamente, à condição da pessoa, tornando-se ilícito
documentar o antepassado de alguém sem notoriedade, cargo público ou político, sem
o consentimento deste.
Houve aqui uma violação do direito à honra – A.484

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Como tal, Asdrúbal, ao se deslocar às instações da revista e agredindo o diretor,


depois de ter contactado a revista e de não ter obtido informações, respostas, requereu
“as providências necessárias às circunstâncias do caso, com o objetivo de evitar a
consumação da ameaça” (que neste caso, seria uma forma de defesa da sua própria
intimidade privada) – A.70º2.
Deu-se, assim, uma colisão de direitos A.335, podendo Birmínio exigir uma
indemnização por danos não patrimoniais (A.496) e Asdrúbal uma responsabilidade por
factos ilícitos (A.483)

4ª hipótese
Dentro da tutela post mortem importa distinguir os direitos de personalidade
que não possam ter efeito prático, como o direito à vida, daqueles que representam
bens perenes, como o direito ao nome, às cartas missivas, à imagem e à reserva da vida
privada. Quando Birmínio faz divulgar na comunicação social que o pai de Asdrúbal
enriqueceu com o tráfico de estupefacientes, esta acusação representa uma prejuração
feita ao nome do agora morto pai de Asdrúbal. Como tal, o A.71 prescreve que, apesar
da morte do titular, os direitos de personalidade usufruem de tutela post mortem: eles
mantêm uma proteção mesmo depois da morte do titular. Contudo, cabe discernir que
quando as ofensas perpetradas ocorram antes da morte do visaso, as consequências da
violação e a competência de agir recai na esfera jurídica do ofendido; quando este esteja
morto ou na pendência de, cabe agir aos herdeiros previstos com legitimidade para tal
(A.71ºb), servindo este artigo como uma espécie de prevenção para um hipotético
conflito de legitimidade entre herdeiros Como referi, se se tratar de direitos de proteção
absoluta, como o direito ao bom nome – o que é o caso - , é desencadeado o nº2; se se
tratar de direitos que admitem restrições, aplicasse o nº3.

Mc dá legitimidade, no º2, para requerer a tutela da personalidade a todos os


enumerados no Artigo e, de forma a que este direito não seja paralisado, acrescenta,
por analogia, o A.496º2 onde acrescenta os herdeiros.
Pergunta-se ainda se a legitimidade conferida para a tutela post mortem diz
respeito apenas às providências adequadas ou também ao pedido de indemnização.
Uma interpretação literal do A.71º2 1ª parte, como defende Palma Ramalho, apontaria
para a exclusão da indemnização. Contudo, MC aponta dois argumentos para este
equívoco: i) o de que está em jogo a personalidade do falecido, que já nada se pode
compensar e ii) o de que o dinheiro é inadequado para resolver a situação. Concordo
com a opinião doutrinal de MC, na medida em que a tutela post mortem é
necessariamente uma defesa dos vivos: trata-se não de atribuir indemnizações aos
falecidos mas, iure próprio, aos herdeiros legítimos.

MC defende também a remissão em bloco do A.71º2 para o 70º2, sendo que


estas “providências adequadas” são o sempre “independentemente da
responsabilidade civil que haja lugar”

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Adoto aqui a posição da teoria da memória in concreto, na busca pela


ponderação das consequências e da bitola de violação dos direitos de personalidade;
onde aqui a bitola da violação não residira na sensibilidade do falecido mas antes no
respeito concreto pela memória daquele morto, tal como ele é sentido e sofrido pelos
familiares – apesar de, contudo, esta teoria ter de ser conjugada com a teoria da defesa
da memória in abstrato – posição, aliás, adotada por Menezes Cordeiro.
Conjuntamente com esta teoria, há que aplicar também a posição doutrinária do
direito dos vivos, intitulada “Teoria do Direito dos Vivos”, que visa a proteção das
pessoas enumaradas no A.71º2, que foram afetados por atos ofensivos à memoria do
falecido, o que é o caso de Asdrúbal, tendo estes direito à indemnização por danos
morais e patrimoniais sofridos (MPinto, MC e Carvalho Fernandes a defender esta
Teoria).
Como tal, excluindo, por falta de informação, a aplicação do A.70º2 nas
providencias adequadas, há que aplicar o A.496 sobre a indemnização por danos não
patrimoniais a Asdrúbal, por uma dupla causa: por ter sido atingindo violentamente na
cabeça no jogo de futebol, com a intenção de, e pelos danos que a ofensa ao pai possa
ter desencadeado.

Ambiente do risco permitido; consentimento do lesado. Contudo, o significado


do seu comportamento é agredir o adversário. Temos uma ofensa à integridade física.
340+ A.81
4º caso:
Falhando o suprot eontologico, ele remete para os bens de personalidade de
terceiros . A.71º2

Caso nº 73

Direito em causa: intimidade à vida privada

Princípio da necessidade

Proporcionalidade em sentido estrito


Min dano
(A.334) Bons costumes – moral positiva entre familiares (MC diz que não tem grande
impacto; respeito pela moral familiar, sexual, atos jurídicos ou contratos contrários etc
etc – no entanto a lei pressupõe, à priori, estes ilícitos – ideia da chaminé cairia para a
violação dos bons costumes
Contrariedade com o fim social e económico do direito – maioria da doutrina: não serve
para nada; drt subjetivo é isento de estipulação de fins, traduzindo-se o direito na

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liberdade de escolhe nos próprios fins da pessoa. Como pode o direito subjetivo
contrario a um fim prévio? Só acontece em poderes funcionais (caso do pai poder pôr o
filho em castigo

Aproveito de um da permissão da personalidade


A tutela da imagem não é meramente relacional, mas interna, constitutiva, da própria
individualidade.
O º2 não vale sem limites: serva para atender aos fins.

Determinabilidade finalistas… bla bla bla direito à imagem VEEER

Tutela inibitória e primária do A.70º2 –


Retirar da circulação do Caso 67. Ele quer que cesse o comportamento lesivo (tutela
negatória)
“Providências adequadas” podem querer dizer uma infinitude de cosias; tutela plástica
e diversificada; as providências são as que, no caso concreto, sejam boas e idóneas, para
fazer cessar as consequências da violação já cometida
VER A .878 E 880 DO PROCESSO CIVIL
878 – ação comum principal
O risco do tempo corre contra ele; nestes comportamentos lesivos dos bens de
personalidade, para acautelar o direito útil, é necessário um meio processual que seja
mais rápido. ;
Providências cautelares
A.332 e ss do CPC

O 808 é próximo do A.70 nº2


Interesse não patrimonial que merece tutela.
Responsa extraobrigarcional – pelas suas pessoas serem anónimas
A.483 – tutelar direitos absolutos; de genéricos de respeito; oponíveis erga homens
A.496 – Poderá ser não patrimonial?????????? – os danos não patrimoniais
nunca admitem uma reparação in natura, perfeita. A indemnização que em si já é um
segundo melhor, um sucedâneo, é um sucedâneo menos conseguida de nos
aproximarmos da situação hipotética – mais ainda do que na indem patrimonial –
indemnização compensatória. Reconst natural sui generis

O a.81 a limitação é acompanhada do aproveito, de terceiro, do meu bem de


personalidade.

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O a.81 é um desvio ao 406


Se o contrato tiver limitação limitada, não há denuncia. Porque a denúncia existe para
contratos duradouros. É uma revogação excecionalmente unilateral.
MC a responsabilidade Civil deve estender-se a indemnização aos direitos de
personalidade violados

a.483 “ de outrem” – direitos de personalidade com tutela aquilina.


Difamação: difusão de uma informação que conduza à diminuição da consideração da
honra dessa pessoa; divulgação pública dessa informação. A calúnia é a divulgação a
uma certa pessoa, da honra que terceiros tenham por ela, mas dirigido ao próximo.

No direito civil o paradigma é o da igualdade, da conjugação de esferas de autonomia,


de liberdade – diferente do direito penal
Colisão de Direitos – 335; é necessário saber se a informação vem beneficiar o público
(Art 3 da Lei 2/99 de 13 de Janeiro)
Respeitar a concordância prática
Não se sobrepõe o direito à informação à honra.
Liberdade de imprensa:
1º Proteção da verdade – não enquanto bem em si, mas enquanto bem prima
facie2
2º A informação deve ser partilhada; que há um interesse público. Não há
nenhuma conexão relevante entre a atividade da revista e a divulgação daquela notícia.

A COLISÃO DE DIREITOS É ENTRE O DIREITO À LIBERDADE DE IMPRENSA E O


DIREITO À HONRA.

A.335 NÚMERO 2!!!!!!


------------------------------------

A vantagem não deve ser para compensar os danos patrimoniais sofridos.

Caso nº78
1ª hipótese
Anulabilidade do negócio “no interesse do menor ou do representante” -
a.287º1, e nunca pela contraparte. Esta pode ser alegada pelo progenitor (Pedro) que
exerção poder paternal, dentro do prazo de um ano a contar do conhecimento que o
requerente (Nuno) haja tido (teve) do negócio – A.125º1a). É de enunciar, também, que
o exercício dos poderes paternais engloba a administração dos bens do filho A-
A.1878º1.

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É de dizer que a mesma anulabilidade é invocada a todo tempo, enquanto o


negócio não estivesse cumprido: e, efetivamente, Pedro ao exigir “sem êxito o
pagamento do preço a Nuno” torna-o, ainda, por cumprir – A.287º2.

Uma coisa é legitimidade, de quem pode arguir a anulabilidade.

Outra hipótese: vender um PC a um miúdo que parecia melhor. Pode ou não pode fazer.
Se a menoridade gera apenas a validade do negócio mas também aquele que o menor
tiver contratado – aplicação do A.251.

Raul Richard Alves – admite a anulabilidade pela contraparte.


Só no erro sobre a pessoa releva a anulabilidade por parte da contraparte
Erro relevante: idade enquanto elemento essência para a formação da vontade.
Fora destes casos ,não, não há anulabilidade pelo menor.
MC defende que os representantes legais possam invocar a anulabilidade do
negócio aquando de Tu Quoque. A doutrina geral não.
2ª hipótese
Raul, ao casar com Raquel, segundo o A.132, emancipou-se. A idade núbil é
fixada nos 16 anos – A.1601ºa. A emancipação atribui ao menor a plena capacidade de
exercício de direitos, habilitando-o a reger a sua pessoa e a dispor livremente dos seus
bens como se fosse maior – A.133 - , ressalvando os casos em que o mesmo casou sem
consentimento dos pais – A.1649; emancipação mitigada, relativa.
A.951 – se ela for menor, o NJ seria unilateral.

Aplicação da caducidade no caso por o direito ter desaparecido, a caducidade no


exercício
…..

3ª hipótese
A125. Nº1 alínea c)
Manda ter em conta, para a arguição da anulabilidade pelos herdeiros (neste
caso, não tendo, presumo que seja o poder paternal) o prazo de um ano. Ora, a mesma
pode ser arguida, pois encontra-se dentro do prazo de um ano (11 meses que vai de
Junho e 88 a Maio de 89). Contudo, ressalva que a mesma tem de ter ocorrido antes de
expirado o prazo para o próprio menor a poder invocar. E, neste sentido, a anulabilidade
a requerimento do próprio menor pode suceder-se se a mesma ocorrer no prazo de um
ano a contar a sua maioridade
+36 ou emancipação. Ora, se for a contar da sua maioridade, definitivamente que a
anulabilidade pode ser arguida pelos herdeiros (pais, neste caso); contudo, se tomarmos
em conta o critério da emancipação como decisivo ( já que o mesmo se emancipa aos

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17anos, e os herdeiros vêm arguir a anulabilidade 1 ano e 11 meses depois), a mesma


não pode ser invocada.

Para o MC, 124 enquanto regras especiais e não gerais.

“prossecução ao fim”::… ato potencialmente apto a atender o fim, mesmo uma abstrata
que se possa porventura ser regulado. Pensamos em última rácio no longo prazo. E ele
quase nunca é indiferente, inútil ou prejudicial, tendo em conta a finalidade da pessoa
coletiva em vista – A.160. Entender a “capacidade” em termos muito amplos. Seria uma
capacidade de gozo, não de exercício

A pessoa coletiva não tem vontade, como as pessoas singulares


A.163 nº1 – representação orgânica. Não é a mesma das outras representações,
porque aqui não temos verdadeiramente duas pessoas a aturar enquanto o tal, porque
enquanto que na voluntária temos o dono do negócio e o autor material do ato, o
representante. Nas pessoas coletivas não temos essa diferença. Juridicamente, nunca
existe uma competência negocial própria da representação orgânica: ele atua, de início
sempre através do administrador: é uma imputação orgânica. Não carece de um NJ que
atribua esses poderes de representação, nem vamos ter duas esferas em atuação. –
A.996.

Atuação da estrutura própria, e não do representação do representante. Não


precisamos do A.259.
Parte final do A.263 – a própria pessoa coletiva que atua através dos órgãos de
administração, que é um órgão colegial, dependendo dos estatutos: seja 1 ou 2
administradores, ou mais, para representar a pessoa coletiva. Aqui na parte final a
representação voluntária: a pessoa coletiva a atribuir poderes de representação a um
terceiro: esse terceiro vai agir em … o contrato é celebrado pelo procurador, com um
terceiro, sendo designado pelo administração, atuando pela pessoa coletiva. É a pessoa
coletiva que fica vinculado ao negócio. Pratica atos em nome e por conta da pessoa
coletiva.
A.164 – mandato, tal como o mandatário AGE EM Relação com o mandante,
assim tmb o administrador tem que agir…. A administração age por conta e no interesse
dos representados – os associados, o interesse coletivo – o tal fim social subjacente à
fundação – ou então os sócios. Não há verdadeiramente um contrato de mandato: não

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é uma condição necessária. O regime jurídico é o do mandato. Aplicamos os A. Do


mandato, mas nem sempre. Pode haver uma deliberação geral, que elege ou aponta
uma pessoa como administradora – que representa organicamente a pessoa coletiva: o
que interessa são as situações jurídicas. Não há mandato nenhum: a fonte dos efeitos
pode resultar, até, de uma decisão judicial.
A.165 – Um administrador que está a conduzir o carro da associação , ou
sociedade, e atropela um gatinho que pertence a um terceiro: quem deve responder?
Propósito das pessoas – prosseguir de forma conjunta e coletivamente certos e
determinados interesses.
Quem retira os proveitos, deve suportar os riscos – A.500 + 165. Aquele por conta
de quem atua o responsável, uma vez que retira as vantagens desse responsável,
atuando no seu interesse, deve suportar os danos que esse tiver causado a terceiros.
A.500 – Caso do trabalhador: tem que haver NJ que institua a relação comissão
“desde que sobre o comissário caiba a obrigação de indemnização”; mesmo que um
museu não tenha culpa de escolher aquela pessoa como trabalhadora, responde da
mesma: é independente de culpa: mas é necessário que o trabalhador também
responda

Responsabilidade do museu: responsabilidade de garantia: atenuar o risco de


insolvência. Nas pessoas coletivas é a própria pessoa coletiva a que responde na
primeira linha.

A.165 duas situações:


1. Responsabilidade dos mandatários e comitentes
2. Responsabilidade dos agentes – não é materialmente justo. A pessoa coletiva não
pode agir com culpa nem agir ilicitamente. Quem atua, bem ou mal, culposamente ou
não culposamente, são sempre as pessoas: PORTANTO, A IMPUTAÇÃO É AUTOMÁTICA.
Não se deve exigir que os representantes orgânicos sejam responsáveis para que a
pessoa coletiva deva responder também.

Quando é que uma pessoa coletiva conhece ou desconhece determinado facto?


A pessoa coletiva não conhece, ou desconhece, ou tem vontade, não tem, ela não age
de má fé – em ultima análise sim, mas teve que haver alguém que desconheça com culpa
determinado facto: tem de haver um processo de imputação: o conhecimento ou
desconhecimento de certos pessoas possa ser imputados à pessoa coletiva: que pessoas
são essas?
Conhecimentos em causa:
1. Essencialidade do erro
2. A cognoscibilidade, da outra parte, da essencialidade do erro para a outra.
O Estado subjetivo é o encargo do conhecimento de determinado aspeto,
elemento negocial.

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Devemos perguntar aos administradores essa cognoscibilidade. Porque eles são


representantes orgânicos. Eles constituem a primeira linha do conhecimento da pessoa
coletiva.
Mas se o administrador não souber e o procurador souber? -> IMPORTANTE!!!!:
A.259
Teoria do conhecimento do absoluto – organicista: que ´são só os
administradores que devem conhecer ou podem conhecer.
Teoria do conhecimento elativo – representação do conhecimento – facto
verdadeiro, que não nos podemos cingir aos representantes orgânicos ou voluntários:
porque, assim, as pessoas coletivas iria furtar-se do risco: princípio de favor das pessoas
coletivas mais favorável que as singulares. São-lhes imputados os conhecimentos ou
desconhecimentos que o administrador… os desconhecimentos e conhecimentos de
“Uma espécie de procurador” que tme competência para interagir com terceiros –
A.259 se for procurador. Nesta espécie de procurador tudo vai ser imputado À pessoa
coletiva: ela vai suportar o risco do seu conhecimento.

Conhecimento adquirido por uma pessoa fortuita – não releva mas pode
justifica-se os princípios

Teoria do risco da organização – teoria segundo a qual relevam os


conhecimentos que só não cheguem aos órgãos de representação orgânica porque esta
não se soube organizar, diligentemente e organizado ao seu concreto funcionamento:
ideia de risco: responsabilidade pelo risco.

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