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Aulas Teóricas
Faculdade de Direito da Universidade do Porto
Nota introdutória:
Bom estudo!
Pode distinguir-se entre objeto imediato e objeto mediato dos direitos subjetivos.
A distinção exprime a diversidade entre aquilo que diretamente está submetido aos
poderes ideais que integram um direito subjetivo e aquilo que só de uma forma indireta,
isto, através de um elemento mediador, está submetido àqueles poderes.
a) Pessoas. Estes direitos sobre outras pessoas, nos sistemas jurídicos modernos, têm
um conteúdo especial, pois não são direitos subjetivos do tipo comum, mas antes
poderes-deveres ou poderes funcionais. Exemplos desta figura são os direitos
integrados nos institutos do poder paternal e do poder tutelar. Aqui, a entidade
sobre que incidem os poderes-deveres do pai ou do tutor, consiste na própria
pessoa do filho ou do pupilo. O filho ou o pupilo estão sujeitos à potestas pátria
ou tutelar. São direitos que conferem poderes destinados a habilitarem os pais ou
o tutor ao cumprimento dos seus deveres para com o filho/pupilo. Isto não
constitui uma ofensa à dignidade da pessoa humana, como acontecia com a
instituição historicamente ultrapassada da escravatura, em que se admitia relações
jurídicas patrimoniais sobre pessoas físicas.
b) Prestações. Nos direitos de crédito, conforme foi aludido, o objeto é uma conduta
ou ato humano: a prestação. Nestes direitos, o objeto não é rigorosamente uma
coisa, mas um comportamento do devedor. As prestações podem ser
comportamentos positivos ou negativos.
c) Coisas materiais ou corpóreas. Nenhuma dúvida se pode suscitar acerca da
possibilidade de realidades físicas, carecidas de personalidade jurídica, serem
objeto de direitos subjetivos. É um fenómeno corrente, que ocorre tipicamente nos
direitos reais. Estes objetos corpóreos têm de revestir determinados requisitos:
existência autónoma, idoneidade para satisfazer interesses humanos, isto é, devem
ser úteis, possibilidade de sujeição jurídica ao poder exclusivo de um ou alguns
homens, isto é, devem ser apropriáveis.
d) Coisas incorpóreas ou bens imateriais. A atividade espiritual do homem pode
ser exercida no sentido da criação de obras, produtos do engenho, da inteligência
ou da sensibilidade humanas. Em consequência dessa aplicação do espírito
humano surgem obras artísticas, literárias, científicas, intelectuais, invenções
industriais, etc. Estes bens têm valor patrimonial autónomo, na medida em que
podem ser explorados economicamente. Para além desse valor patrimonial, alguns
deles estão intimamente ligados à personalidade do seu autor, pois ela está
v As coisas
Interessa fundamentalmente num estudo jurídico caraterizar a noção jurídica de
coisa.
§ Aceção filosófica: coisa é tudo aquilo que pode ser pensado, ainda que não
tenha existência real e presente. Este é o sentido corrente e amplo.
§ Aceção física: coisa é tudo o que tem existência corpórea ou, pelo menos,
é suscetível de ser captado pelos sentidos.
Quanto ao sentido jurídico de coisa, cumpre analisar o aritgo 202.º do Código
Civil, onde se contém a seguinte definição: “diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objeto
de relações jurídicas”.
Artigo 202.º
(Noção)
1. Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objeto de relações jurídicas.
2. Consideram-se, porém, fora do comércio todas as coisas que não podem ser objeto de direitos privados, tais
como as que se encontram no domínio público e as que são, por sua natureza, insuscetíveis de apropriação
individual.
Não pode considerar-se rigorosa tal definição. Esta noção leva-nos a pensar que
as coisas são sinónimos de objeto da relação jurídica, mas sabemos que não é assim. Com
efeito, há entes suscetíveis de serem objeto de relações jurídicas que não são coisas em
sentido jurídico. Desde logo, as pessoas e as prestações.
Quanto aos bens imateriais, objeto dos direitos de autor ou de propriedade
industrial/intelectual, e aos direitos, objeto de certas figuras de direitos sobre direitos,
podem integrar-se no conceito de coisas, embora tenham um regime especial
relativamente ao regime geral das coisas por serem coisas incorpóreas.
Conjugando estas ideias, podemos definir as coisas em sentido jurídico como os
bens ou entes de caráter estático, desprovidos de personalidade e não integradores
O Código Civil define várias categorias de coisas, decorrentes das classificações que
consagrou. Essas categorias têm interesse porque a lei faz, por vezes, corresponder
regimes jurídicos específicos a certas categorias e não a outras. São aqui pertinentes os
artigos 203.º e seguintes do Código.
As águas como coisas imóveis. Os outros são imoveis por destinação. Só são imóveis
porque têm uma relação especial com imóveis.
Os direitos sobre imóveis são imóveis e seguem o seu regime.
As partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos são classificadas como imóveis,
por causa da sua ligação ao imóvel. Mas podem ser separadas do imóvel e este continua
completo. No caso das partes integrantes, a propriedade só se irá transferir quando forem
desligadas dos imóveis. O contrato de compra e venda só opera o efeito real no momento
de separação da coisa face ao imóvel.
Os prédios rústicos e urbanos são imóveis per si. As águas são imóveis per si. A
propriedade de imóveis e a propriedade de águas. As outras alíneas do 204º referem-se a
imóveis por destinação.
As partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos, uma vez desligadas continuam
a existir e o imóvel continua a fazer a sua função sem estas partes. Distinguem-se das
partes componentes que são partes de um imóvel, mas que se desligadas do imóvel este
não cumpre a sua função (ou não a cumpre perfeitamente).
As partes integrantes e componentes têm especialidades quanto à transmissão do
direito real. A transmissão dá-se contrato válido (408º), salvo as exceções. O artigo
408º/2 diz que se a transferência respeitar partes componentes ou integrantes, a
transferência só se verifica no momento da separação. O efeito real só se dá no momento
da separação. Mas ainda assim, por causa do contrato. A transferência continua a ter por
base o contrato, mas precisa de um ato material. Por isso, não é uma exceção ao número
1 do artigo 408º. Precisamos de um contrato válido e de um ato material para a
transferência de um direito real. Mas o ato material individualmente não é suficiente. A
isto acresce o facto do artigo 880º que diz que na venda de partes componentes ou
integrantes o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o
comprador adquira a propriedade destas partes.
§ Coisas divisíveis e não divisíveis (209º) – se as coisas podem ser divididas sem
que se altere a sua substância ou não.
§ Frutos (212º) - fruto é tudo o que a coisa produz periodicamente, sem prejuízo
da sua substância. Existem frutos naturais que provém da própria coisa e frutos
civis que são o resultado de uma relação jurídica (ex: juros de depósitos).
Distinguem-se frutos pendentes e precedidos, que se associam à primeira
distinção. É uma noção importante dada a sua aplicação no regime do usufruto e
da posse.
§ Coisas sem dono - é uma classificação que apenas se aplica a coisas imóveis
(1345º). As coisas imóveis sem dono adquirem-se por ocupação.
Dentro dos simples atos jurídicos, é usual fazer-se uma distinção entre:
A regra geral é que que basta a declaração de vontade para que o negócio jurídico
produza efeitos jurídicos. Mas há exceções. Nos negócios jurídicos reais quanto à
constituição não basta uma declaração de vontade para que os efeitos jurídicos se
produzam, pois exige-se um ato material:
- O contrato comodato, previsto no artigo 1129º, pressupõe a entrega da coisa. Se o
sujeito se compromete a entregar a coisa mais ainda não entregou, há uma promessa de
contrato de comodato.
- O contrato de mútuo, previsto no artigo 1142º, é um contrato real quanto à constituição.
Neste negócio, há o empréstimo de quantia de dinheiro. Nestes contratos, exige-se um ato
material para que haja eficácia do negócio.
Por outro lado, no contrato de compra e venda a obrigação de entregar a coisa decorre
de um contrato anteriormente celebrado. A propriedade transmite-se por mero efeito de
contrato. Ou seja, basta a declaração de vontade para que o negócio jurídico produza os
seus efeitos. A entrega da coisa não é um ato material necessário à eficácia do negócio.
Críticas:
Este ponto de vista não fornece o correto critério para a determinação da relação que
intercede no negócio jurídico entre a vontade dos seus autores e os efeitos jurídicos
respetivos.
Mota Pinto avança que, a ser esta doutrina correta, só os juristas completamente
informados sobre o ordenamento poderiam celebrar negócios jurídicos. Ora, o que sucede
é que as partes dos vários negócios não têm uma representação completa e exata de todos
os efeitos que o ordenamento jurídico atribui às suas declarações de vontade.
Observando muitas vezes que os intervenientes não conhecem todos os efeitos que o
negócio produz, dado que muitos decorrem da lei e que se vão produzir em virtude de
normas de natureza supletiva, eles podem ser surpreendidos com efeitos do negócio. Aqui
reside uma das críticas, levando a que se avançasse com uma doutrina posterior.
Críticas:
Tal como define o negócio jurídico, este não se distingue dos compromissos ou
convenções celebrados sob o império dos outros ordenamentos normativos (cortesia,
moral, praxes sociais, etc.).
Os negócios não solenes são os que podem ser celebrados por quaisquer meios
declarativos aptos a exteriorizar a vontade negocial, porque a lei não impõe uma
determinada roupagem exterior para o negócio.
A exigência de forma para os negócios jurídicos é uma constante de todos os
tempos.
O princípio geral do Código de 1966 em matéria de formalismo negocial é o
princípio da liberdade de forma, consubstanciada no artigo 219.º. Quando, nos casos
excecionais em que a lei prescrever uma certa forma (casos que, embora representem uma
exceção, são numerosos e frequentes), esta não for observada, a declaração negocial é
nula (artigo 220.º).
Exemplos de exigências:
§ A lei exige documento autêntico. Estes são exarados por uma entidade dotada
de fé pública.
§ A lei obriga apenas ao documento particular. Não são exarados pelas entidades
que emitem os documentos autênticos, mas podem ser autenticados. São
documentos particulares confirmados mediante um notário ou outra entidade
dotada de fé pública.
O artigo 362.º define documento. O artigo 363.º refere-se aos documentos
particulares autenticados. Hoje, a autenticação de documentos não é feita apenas pelos
notários, pois é permitida a autenticação feita por outras entidades. O DL 76A/2006 de
29 de março, no seu artigo 38º, diz que sem prejuízo da competência atribuída a outras
entidades, os conservadores, oficiais de registo, advogados e solicitadores podem
autenticar documentos particulares. Não há uma hierarquização entre os documentos
autenticados pelas diferentes entidades, uma vez que eles têm a mesma força probatória.
Tendo os documentos particulares autenticados a mesma força probatória que os
documentos autênticos, se a lei exigir um documento autêntico este não pode ser
substituído por um documento particular autenticado. Se for substituído, o contrato é
nulo. Isto está expresso no artigo 377º CC.
§ A lei exige declaração expressa (artigo 595.º). Esta exigência não é uma exceção
ao princípio de liberdade de forma. Uma declaração expressa não tem de ser
formal, basta que seja dirigida com o sentido exigido por lei. A declaração tácita
tem um sentido que é retirado de um sentido diferente.
O testamento é um negócio formal (2204º). O artigo 875º diz que o contrato de
compra e venda de bens imoveis está sujeito a escritura pública ou documento particular
autenticado. Segundo o artigo 947º, a doação de imóveis só é valida se celebrada por
escritura pública ou documento particular autenticado.
A doação de coisas móveis não depende de formalidade externa, se for
acompanhada da tradição de coisa doada. A palavra tradição remete para a entrega da
coisa. E se a coisa não for entregue? Então, a doação só pode ser feita por escrito
particular para ser válida. A doação de coisas móveis não é um contrato real quanto à
constituição. A doação é um contrato consensual, pelo que basta o acordo das partes. A
questão da entrega da coisa prende-se com a forma do negócio. Se não houver entrega da
coisa, o negócio é inválido formalmente.
O contrato de mútuo também tem regras específicas quanto à forma, segundo o
artigo 1143º. Consoante o valor do contrato, é exigida forma ou não. Se for um valor ate
2 500€ não exige forma. Se for de 2 500€ a 25 000€ exige-se documento particular. Se
for superior a 25 000€ exige-se escritura pública ou documento particular autenticado.
O casamento é um negócio solene. A lei exige solenidades próprias para que o
negócio seja válido, segundo o artigo 1615º.
Por vezes, a lei exige, porém, que a declaração negocial seja expressa, por exemplo
na renúncia expressa à hipoteca (artigo 731.º).
Outras vezes a lei tem o cuidado de frisar que um certo negócio pode ter lugar por
declaração tácita, por exemplo na renúncia tácita à prescrição (artigo 302.º), o que já
resultaria do princípio geral consignado no artigo 217.º.
§ Protesto e reserva.
Emitido certo comportamento declarativo, pode o seu autor recear que lhe seja
imputado, por interpretação, um certo sentido. Para o impedir, o declarante afirma
abertamente não ser esse o seu intuito. A esta contradeclaração dá-se o nome de protesto.
Quer acautelar que esse comportamento declarativo não é dirigido a um determinado
sentido que não pretende.
A reserva é uma modalidade do protesto: consiste na declaração de que um certo
comportamento não significa renúncia a um direito próprio, ou reconhecimento de um
direito alheio.
efeito (por exemplo, dar-lhe mais clareza, tornar a prova mais segura, dar-lhe fé em face
de terceiros, etc.).
São meramente presunções relativas ou “juris tantum” (artigo 350.º).
distingue conforme os negócios sejam onerosos ou gratuitos. Nos negócios gratuitos vai
ao encontro dos interesses dos disponentes e nos negócios onerosos procura o equilíbrio.
E se chegarmos a uma contradição insanável entre os resultados da interpretação? Não
poderemos considerar a declaração eficaz, porque não é percetível o seu sentido. Mas
podemos aplicar analogicamente o artigo 224º/3. Se o destinatário da declaração não
consegue perceber o sentido, a declaração será ineficaz.
Pontualmente, o legislador estabelece regras especiais quanto à interpretação.
è Na interpretação das cláusulas contratuais gerais, o critério é o do sentido mais
favorável ao aderente (artigo 11º/2 do DL 446/85).
Não é possível uma opção rígida por um dos lados da dicotomia (teoria da vontade
– teoria da declaração). Com efeito, há diferenças entre as soluções específicas das várias
modalidades de divergência.
Ainda assim, pode proclamar-se a opção pelas modernas modalidades da teoria da
declaração, mais precisamente pela teoria da confiança. É a solução mais justa e mais
conforme aos interesses gerais do tráfico. O Código Civil tem uma tendência
marcadamente declarativa, de forma a proteger a aparência da vontade manifestada.
Cumpre agora atentar detalhadamente às caraterísticas particulares de cada
regime.
As modalidades da simulação
Uma primeira distinção é a que se estabelece entre simulação inocente e simulação
fraudulenta. A simulação é inocente se houve o mero intuito de enganar terceiros, sem
os prejudicar, e é fraudulenta se houve o intuito de prejudicar terceiros ilicitamente ou de
contornar qualquer norma da lei. Esta distinção é aludida no artigo 242.º nº 1, relevando
a mesma disposição legal o escasso interesse civilístico da referida dicotomia. A fraude
fiscal terá consequências próprias.
(artigo 2157.º). Nos termos do artigo 286.º, os herdeiros não teriam qualquer direito,
tratando-se apenas de uma simples expectativa. O legislador constata que esta situação
ocorre com alguma frequência, alargando o leque dos interessados, permitindo que eles
atuem já em vida, provando, além da simulação, que os negócios foram celebrados com
o intuito de os prejudicar (contornar as regras imperativas da sucessão legitimária).
Encontramos no nº 1 um esclarecimento relativamente aos simuladores, que
cabem no conceito de interessados do 286.º; enquanto no nº 2 temos verdadeiramente um
alargamento.
v Reserva mental.
Conceito. O artigo 244.º nº 2 define a reserva mental. São duas as notas que
definem o conceito: a emissão de uma declaração contrária à vontade real e o intuito de
enganar o declaratário.
Efeitos. Estatui-se a irrelevância da reserva mental, exceto se for conhecida
do declaratário. Por consequência, a declaração negocial emitida pelo declarante, com a
reserva, ocultada ao declaratário, de não querer o que declara, não é, em princípio, nula.
Trata-se de uma exigência elementar de justiça e de segurança. Não se poderia
conceber que a confiança na exteriorização de uma vontade pudesse ser afetada, se aquele
que declara alguma coisa como sendo a sua vontade pudesse invocar, para se desvincular,
uma vontade oculta contrária e a provasse em margem para dúvidas.
Deixará, todavia, de ser assim, sendo o negócio nulo, como na simulação, se o
declaratário teve conhecimento da reserva, por desaparecerem então as razões que
justificam aquele princípio geral. Se o declaratário conheceu a reserva, não há confiança
que mereça tutela.
Nos casos em que há dois declaratários, qualquer deles, que não conheça a reserva,
pode invocar a sua irrelevância.
A relevância da reserva impõe o efetivo conhecimento: não basta a sua
cognoscibilidade.
A rigidez desta doutrina poderá, todavia, ser atenuada, nalguns casos, por
aplicação da cláusula geral do artigo 334.º - abuso do direito. Com efeito excederá,
muitas vezes, os limites impostos pela boa fé e pelos bons costumes – por ser
clamorosamente contrária ao sentimento jurídico prevalente – a pretensão do declaratário,
no sentido da validade de uma declaração que o respetivo autor emitiu, com reserva
mental, para trazer vantagem ao declaratário (por exemplo, para o dissuadir do suicídio
ou de um ato patrimonialmente ruinoso, assumindo aqui a divergência um intuito
piedoso).
Efeitos. O Código Civil prevê a hipótese de o declarante ser “coagido pela força
física a emitir” a declaração. Tem-se em vista as hipóteses em que o declarante é reduzido
à condição de puro autómato e não aquelas em que o emprego da força física não chega
aos extremos da “vis absoluta”. São exemplos de coação física a hipótese de uma votação
por levantados e sentados, quando alguém é forçado irresistivelmente a levantar-se ou
permanecer sentado, ou o caso de uma assinatura a que alguém é forçado fisicamente,
agarrando-se-lhe a mão, ou um sequestro quando o silêncio tem valor declarativo.
A coação física ou absoluta importa, nos termos do artigo 246.º, a ineficácia da
declaração negocial (“a declaração não produz qualquer efeito”). A lei estabelece que a
declaração não produz qualquer efeito e não fala de nulidade. Não há qualquer dever de
indemnização a cargo do declarante.
anulado, pois nada justifica faze-lo valer como um sentido objetivo em que
nenhuma das partes confiou. É a teoria da aparência eficaz. Este tratamento
especial é o da anulabilidade sem a exigência dos requisitos do artigo 247.º.
6. Vícios da vontade
São aqui pertinentes as páginas 498 e seguintes do manual adotado.
Tratam-se de perturbações do processo formativo da vontade, operando de tal
modo que esta, embora concorde com a declaração, é determinada por motivos anómalos
e valorados, pelo direito, como ilegítimos. A vontade não se formou de um “modo julgado
normal e são”. O elemento interno coincide com o elemento externo, no entanto, o
processo de formação da vontade do declarante sofre alguma perturbação e, por isso,
temos um vício que afeta a própria génese da vontade.
Podemos enumerar os vícios da vontade a que o nosso direito atribui em geral
relevância autónoma:
o Erro-vício (252.º).
o Dolo (253.º).
o Coação moral (255.º).
o Incapacidade acidental (257.º).
o Estado de necessidade (282.º).
Determina-se no artigo 282.º que é anulável, por usura, um negócio jurídico,
quando alguém, explorando a situação de necessidade, inexperiência, ligeireza,
dependência, estado mental ou fraqueza de caráter de outrem, obteve deste, para si ou
para terceiro, a promessa ou concessão de benefícios excessivos ou injustificados. Não
consiste já numa certa desproporção de prestações (como descrevia o antigo Código Civil,
com o instituto da “lesão”), mas sim, igualmente, numa exploração da situação da outra
parte, em casos em que terá havido uma adulteração do modo de sã formação da vontade.
Os vícios redibitórios não têm autonomia no nosso Código Civil. Prendem-se com
os vícios ocultos do objeto negocial. Tornam a coisa impróprio para o uso a que se destina
de tal forma que o adquirente, se soubesse, não a teria adquirido. Há, porém, normas que
se referem a essa hipótese, como é os casos dos artigos 905.º e 913.º e do artigo 1035.º.
Em ambos os casos, remete-se o regime da anulabilidade para a verificação dos requisitos
legais do erro ou do dolo.
Como se qualifica a invalidade proveniente de erro-vício, dolo, coação moral ou
incapacidade acidental? Trata-se de uma anulabilidade. No entanto, a lei faz variar os
pressupostos para a anulabilidade consoante o tipo de vício em questão.
v Erro-vício.
Noção. O erro-vício traduz-se numa representação inexata ou na ignorância de uma
qualquer circunstância de facto ou de direito que foi determinante na decisão de efetuar
o negócio. Se estivesse esclarecido antes dessa circunstância, o declarante não teria
realizado qualquer negócio ou não teria realizado o negócio nos termos em que o
celebrou. A formação da vontade assentou em pressupostos errados.
Como regra geral, quando o processo formativo da vontade é perturbado de uma
forma determinante por erro, a validade do negócio não é afetada. Se o processo
formativo da vontade é apenas perturbado pelo erro, o negócio é válido. Para que o
negócio seja anulável com fundamento em erro, têm de estar em causa casos excecionais.
O interesse que prevalece é o do declaratário, porque ele não tem como aceder ao
processo formativo da vontade do declarante. O declarante tem de suportar o seu erro. É
uma forma de proteger o declaratário. A regra geral é a da irrelevância do erro, o que
consta no artigo 252º/1.
Mas também existem outros casos de erro em que o legislador favorece a
anulabilidade, como o erro sobre o objeto do negócio, sobre o sujeito e sobre a base
negocial. Em qualquer uma destas situações têm de ser respeitados alguns requisitos
(gerais):
o Essencialidade. É corrente na doutrina a afirmação de que só é relevante o erro
essencial, isto é, aquele que levou o errante a concluir o negócio em si mesmo e
não apenas nos termos em que foi concluído. O erro foi causa da celebração do
negócio. Já não relevaria o erro incidental, isto é, aquele que influiu apenas nos
termos do negócio, pois o errante sempre contrataria, embora noutras condições.
O erro indiferente, isto é, um erro tal que, mesmo sem ele, o negócio teria sido
concluído nos precisos termos em que o foi, não tem qualquer relevância. Com
efeito, o erro, para relevar, deve atingir os motivos determinantes da vontade
(artigos 251.º e 252.º). Só o erro essencial produzirá, desde logo, uma vez
presentes os restantes requisitos gerais e especiais, a anulabilidade do negócio. O
erro incidental não será, todavia, irrelevante: o negócio deverá fazer-se valer nos
termos em que teria sido concluído sem o erro.
- Que estas alterações não estejam cobertas pelos riscos próprios do contrato.
v Dolo.
Conceito. A noção de dolo consta do nº 1 do artigo 253.º. Trata-se de um erro
determinado por um certo comportamento da outra parte. Sempre que temos uma hipótese
de dolo, temos em simultâneo uma hipótese de erro-vício: a questão é que no erro-vício
o declarante engana-se, e na hipótese de dolo ele é enganado. O legislador considera mais
grave esta hipótese, facilitando a anulabilidade do negócio.
Só existirá dolo quando se verifique o emprego de qualquer sugestão ou artifício com
a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração – dolo
positivo ou comissivo, ou quando tenha lugar a dissimulação, pelo declaratário ou por
terceiro, do erro do declarante – dolo negativo, omissivo ou de consciência (há um
comportamento negativo no sentido de não esclarecer).
Existe também a distinção entre dolo inocente e dolo fraudulento. No primeiro
há um mero intuito enganatório, enquanto no segundo há o intuito ou a consciência de
prejudicar. A distinção não tem interesse prático, em ambos os casos se verificando os
mesmos efeitos.
A lei não inclui a ilicitude na definição de dolo. O comportamento positivo ou
negativo não tem de ser necessariamente ilícito.
Como sabemos se o dolo é lícito ou ilícito? O artigo 253.º nº 2 responde a esta questão:
§ No que se refere ao dolo positivo, quanto alguém usa artifícios para induzir
em erro outra pessoa, pode tomar um comportamento ilícito se for ilegítimo
segundo as conceções dominantes no comércio jurídico. O legislador opta
por um conceito indeterminado, pelo que exigirá preenchimento valorativo no
caso concreto.
§ No que se refere ao dolo negativo, é ilícito quando houver um dever de
esclarecimento e esse esclarecimento falhar.
Interesse prático da distinção entre dolo ilícito e dolo lícito. Só é relevante,
como fundamento de anulabilidade e de responsabilidade, o dolus malus ou dolo ilícito.
A lei tolera a simples astúcia, reputada legítima pelas conceções imperantes num certo
setor negocial. Com efeito, a lei declara não constituírem dolo ilícito, sendo, portanto,
dolus bonus, as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos, segundo as
conceções dominantes no comércio jurídico.
O dolo ilícito é relevante na medida em que, nos termos do artigo 254.º, a vontade
tenha sido determinada por dolo conduz à anulabilidade do negócio. Aquele cuja vontade
tenha sido determinada por dolo pode arguir a anulação, não sendo excluída a
possibilidade de o dolo ser bilateral.
O dolo só é fundamento de anulabilidade do negócio se tiver sido essencial e
determinante da declaração: é o requisito da essencialidade. Isto é assim sempre que o
dolo provenha do declaratário. Nestes casos, basta que o dolo seja determinante para o
negócio seja anulável.
A lei prevê ainda a hipótese do dolo que provém de terceiro. Nestes casos, a
declaração só é anulável se o declaratário tiver conhecimento do dolo. Se o declaratário
conhece o dolo e não esclarece, ele próprio também está em dolo. Se o declaratário não
conhecer o dolo de terceiro, o negócio não é anulável. Se o terceiro adquirir diretamente
v Coação moral.
Conceito. Define-se como a perturbação da vontade, traduzida no medo resultante
de ameaça ilícita de um dano, cominada com o intuito de extorquir a declaração negocial.
Só há vício da vontade quando a liberdade do coato não foi totalmente excluída,
quando lhe foram deixadas possibilidades de escolha, embora a submissão à ameaça fosse
a única escolha normal. Assim estaremos dentro do campo da coação moral, mesmo no
caso da ameaça com arma de fogo ou no caso do emprego da violência física, como
começo de execução do mal cominado, para compelir ao negócio. Só cairemos no âmbito
da coação física, quando a liberdade exterior do coato é totalmente excluída sendo este
utilizado como puro autómato ou instrumento.
São regimes distintos também quanto às consequências. Na coação física, dado
não haver verdadeiramente um comportamento declarativo, a consequência é a
inexistência do negócio. Na coação moral, o declarante colabora conscientemente com o
coator, conhecendo a pressão psicológica que está a ser exercida sobre si, e perante esta
ameaça ilícita, o declarante opta por ceder. Aqui, a consequência é a mera
anulabilidade.
Ao contrário do que se passa com o dolo, que pode ser lícito ou ilícito, a ilicitude
integra a própria definição de coação.
A vontade que vai ser declarada é uma vontade cujo processo formativo está
condicionado fortemente pelo receio da consumação da ameaça. A vontade declarada
corresponde exatamente à vontade interna (o elemento externo corresponde ao elemento
interno), mas foi pelo receio da ameaça que a sua vontade foi para um determinado
sentido.
A ilicitude da ameaça pode referir-se:
- Ao fim prosseguido: ameaça de atos ilícitos.
- Aos meios utilizados.
A lei exclui, desde logo, o chamado “temor reverencial” (255.º nº 2). Torna-se
necessário que o receio provenha de uma ameaça ilícita. Exige-se igualmente que a
cominação do mal vise extorquir a declaração negocial. O artigo 255.º nº 3 esclarece
que não constitui coação a ameaça de um exercício normal de um direito nem um simples
“temor reverencial”.
Se o credor ameaça executar judicialmente o devedor porque ele não paga, esta
ameaça não é uma ameaça ilícita. Supondo agora que alguém ameaça um devedor com
um processo de insolvência se ele não lhe conferir determinados benefícios que nada têm
a ver com o crédito respetivo, então aí temos uma ameaça ilícita.
A ameaça pode dizer respeito à pessoa do declarante, mas também pode dizer
respeito à sua honra ou à sua fazenda (património), e também terceiro (o nº 2 do artigo
255.º di-lo expressamente).
A ameaça pode provir de um terceiro eterno ao negócio, e a lei introduz
requisitos adicionais para que o negócio seja anulado. Os requisitos adicionais têm que
ver com a ameaça: que o mal seja grave e justificado o receio da sua consumação.
v Estado de necessidade.
Conceito. Define-se o estado de necessidade como a situação de receio ou temor
gerada por um grave perigo que determina o necessitado a celebrar um negócio para
superar o perigo em que se encontra. Pode ser originado por um facto natural ou por um
facto humano.
Poderá haver alguma confusão com a coação, nomeadamente quando é
ocasionado por um facto humano. Neste caso, estaremos perante a figura de estado de
necessidade quando a situação de perigo não for criada com o desígnio de extorquir um
negócio (falta de intenção de coagir).
Poderão igualmente surgir dúvidas se, criado o perigo por um facto natural ou
humano, o contraente que acode ao necessitado tinha o dever jurídico ou, mesmo, apenas
um imperativo dever moral de auxílio. Nesta hipótese, se o contraente não presta o auxílio
a que estava obrigado, os negócios referidos devem ter-se por nulos, com fundamento em
contrariedade à ordem pública ou ofensa dos bons costumes (artigo 280.º).
A hipótese dos negócios em estado de necessidade deve subsumir-se na previsão
do artigo 282.º, onde se estatui a anulabilidade dos chamados negócios usurários. O
legislador exige a verificação de:
- Requisitos objetivos (benefícios excessivos ou injustificados). Tem que haver
uma desproporção clara entre as prestações. O critério do dobro do valor será um limiar
a partir de cuja ultrapassagem se deve averiguar a existência das demais circunstâncias
objetivas e dos requisitos subjetivos da usura.
- Requisitos subjetivos (exploração de uma situação de necessidade,
inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de caráter de outrem).
Entre estes requisitos subjetivos figura, pois, ao lado de outras situações, o estado de
necessidade.
v Incapacidade acidental.
O Código Civil prevê e regula a incapacidade acidental, não na secção das
incapacidades, mas entre a falta e os vícios da vontade, dado o facto de não se tratar
normalmente de uma situação permanente do indivíduo, mas antes de um desvio no
- Disposições gerais.
Temos no artigo 258.º que, na medida em que tenhamos um negócio jurídico que
seja celebrado em nome do representado e nos limites dos poderes que lhe compete, esses
efeitos jurídicos irão produzir-se na esfera jurídica do representado e não do
representante. Isto abrange quer as hipóteses de:
è Representação ativa: aquele que emite uma declaração negocial em nome
do seu representado.
è Representação passiva: aquele que recebe uma declaração negocial em
nome do seu representado.
contrata pode exigir a prova dos poderes de representação. Assim, esta pessoa tem a
possibilidade de conhecer exatamente quais os poderes atribuídos naquela hipótese.
Se ao representado está vedado um determinado negócio, ao representante
também está vedado esse mesmo negócio.
Segundo o artigo 261º, são anuláveis os negócios celebrados pelo representante
consigo mesmo, seja em nome próprio ou em representação de terceiro. Isto porque um
negócio consigo mesmo pode potenciar um conflito de interesses.
No entanto, estes negócios não são anuláveis se o representado tiver
especificadamente consentido na celebração ou que no negócio se exclua por sua natureza
a possibilidade de um conflito de interesses.
O nº2 do mesmo artigo prevê situações em que o representante nomeia outra
pessoa para representar na sua vez o representado. Este subestalecimento de poderes não
apaga o negócio consigo mesmo.
- Disposições específicas.
A representação voluntária tem na sua base uma procuração, que aparece no
artigo 262º. A procuração é o ato pelo qual alguém atribui a outrem poderes de
representação. Este ato é um negócio jurídico unilateral. Portanto, a representação
voluntária assenta num negócio jurídico unilateral (que é a procuração). O procurador é
o representante voluntário.
A lei não se refere a nenhuma forma especial para a transmissão de poderes
representativos. Mas determina que a procuração tem de revestir a forma exigida para o
negócio que o procurador pretende realizar. Para sabermos se uma procuração é
formalmente válida, temos de saber qual o seu conteúdo.
O artigo 263º determina que o procurador não tem de ser uma pessoa com
capacidade de exercício. Pode ser uma pessoa incapaz. Isto porque os efeitos jurídicos da
sua atuação não se vão produzir na sua esfera jurídica. Quem assume os riscos é o
representado.
Quais os inconvenientes desta situação em que o procurador é incapaz? Os
regimes de incapacidade servem para proteger o próprio incapaz. Um representante
incapaz não precisa de ser protegido, na medida em que os efeitos jurídicos do negócio
celebrado por este produzem-se na esfera do representado. Portanto, não há nenhuma
objeção de princípio à incapacidade do procurador.
No entanto, o representado tem de ter capacidade jurídica. Caso contrário, a
procuração é anulável (artigo 125º).
O núncio não tem de ser capaz, na medida em que este se limita a transmitir uma
declaração.
A representação extingue-se quando o procurador renuncia a procuração ou
quando o cessa a relação que lhe serve de base, nos termos do artigo 265º.
A procuração é sempre livremente revogável pelo representado, não obstando
convenção em contrário ou renuncia ao direito de revogação. Se a procuração tiver sido
conferida também no interesse procurador ou de terceiro, não pode ser revogada sem
acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.
Podemos distinguir:
è Procurações gerais – conferem poderes para uma multiplicidade de negócios.
è Procurações especiais – conferem poderes para determinados atos em concreto.
Normalmente, confere-se a possibilidade de subestabelecer os poderes, ou seja, de
substituir o procurador, prevista no artigo 264º. Isto acontece muito regularmente nas
procurações conferidas a advogados. Ou seja, o procurador pode conferir os seus poderes
de procuração a outra pessoa. Isto pode estar previsto genericamente na própria
procuração ou pode ser permitir pelo representado numa situação em concreto. Como
regra, se nada for dito em sentido contrário, a substituição do representante não envolve
a exclusão do anterior representante. Ou seja, mantém-se os dois representantes, o
representante que é substituído não é eliminado. Se houver substituição autorizada, o
procurador só é responsável perante o representado se tiver agido com culpa na escolha
do substituto ou nas instruções que lhe deu. Se nada for dito em contrário, o procurador
pode munir-se de pessoas que o auxiliem.
dentro do direito que lhe é conferido, mas atua extravasando os interesses que levaram à
atribuição daquele direito.
Se o representante é alguém inábil para o negócio e faz um mau negócio, não temos
um abuso de representação. É apenas um mau procurador. Este risco cai sobre o
representado. Também não haverá abuso de representação nos casos em que o procurador
atua dentro dos poderes e colabora com outra parte conscientemente no sentido de
prejudicar os interesses do representado. Se houver um conluio entre o representante e
outra parte, o negócio jurídico é atentatório dos bons costumes e caia na alçada do artigo
281º. O negócio atentatório dos bons costumes é nulo.
(Ex: A confere a B poderes para B vender uma casa de que é proprietário e B vende a casa por
100 euros. B tem poderes de representação, mas abusa no seu exercício)
8.1 Condição
A condição pode ser suspensiva ou resolutiva, segundo nos dispõe o artigo 270.º.
è Condição suspensiva. O facto futuro e incerto pode suspender a eficácia do
negócio. Subordina o início da produção de efeitos a um facto futuro e incerto.
O negócio é celebrado validamente, mas a eficácia fica suspensa.
è Condição resolutiva. A cessação dos efeitos do negócio jurídico depende de
facto futuro e incerto. O negócio produz os seus efeitos cabalmente, mas se
determinado acontecimento ocorrer, cessa a eficácia do negócio.
As condições não se confundem com condições legais. Estas condições legais são
requisitos da lei para a verificação de determinados efeitos jurídicos. Por exemplo,
quando o artigo 687.º diz que a hipoteca deve ser registada sob pena de não produzir
efeitos, a eficácia da hipoteca está sujeita a um requisito. O registo não é uma cláusula
contratual para a produção de efeitos. É uma imposição legal para a produção de efeitos.
Cabe uma menção às condições impróprias. Estas não reúnem todas as qualidades que
caraterizam a condição verdadeira e própria: evento futuro, ao qual está subordinada a
eficácia do negócio; caráter incerto do evento; subordinação resultante da vontade das
partes. As condições próprias estão previstas no artigo 270.º.
São diversas as figuras das condições impróprias:
a) Condições impossíveis, visto que a não verificação do evento é, desde logo, certa.
b) Condições referidas ao passado ou ao presente, visto que o evento condicionante
não é futuro; não existe, portanto, incerteza objetiva (nem, consequentemente, o
período de pendência que nela se baseia); acontece apenas que a circunstância da
verificação ou não verificação está subtraída ao conhecimento das partes no
momento do negócio; os efeitos do negócio ou se produzem logo ou não se
produzem.
c) Condições necessárias: por exemplo, a condição de o declarante ou um terceiro
morrerem; o evento não é incerto.
d) Condições legais.
A lei dedica o artigo 271.º a condições impróprias, que são as condições ilícitas ou
impossíveis.
è Quanto às condições impossíveis, é nulo o negócio sujeito a uma condição
suspensiva que seja física ou legalmente impossível. Se a condição for resolutiva,
o negócio é válido e considera-se a condição como não escrita.
Uma vez verificada a condição resolutiva, a lei manda aplicar o artigo 434º/2.
Este artigo prende-se com a retroatividade da resolução. A resolução, como regra, tem
efeitos retroativos. Assim, a verificação da condição implica a destruição retroativa dos
efeitos do negócio.
No entanto, o nº2 do artigo 434º diz que nos contratos de execução continuada ou
periódica, a resolução não abrange as prestações já efetuadas. O legislador manda aplicar
à condição resolutiva o regime da resolução quanto aos contratos periódicos. Assim, a
retroatividade da condição não interfere com as prestações efetuadas nos contratos de
execução continuada ou periódica.
Para além disso, os frutos naturais adquiridos na pendência da condição resolutiva
ficam ressalvados da retroatividade, nos termos dos artigos 277º/3 e 1270º.
(Ex: Temos um contrato de prestação de serviços celebrado entre A e B condicionado a
um acontecimento futuro e incerto. O contrato deixa de produzir efeitos para o futuro,
mas não temos retroatividade. Os serviços prestados não vão ser devolvidos.)
(Ex: C vende a D uma coisa mediante uma condição resolutiva. Verifica-se a condição
resolutiva e tudo se passa como se D nunca tivesse sido proprietário. Mas os frutos ficam
ressalvados da retroatividade.)
8.2 Termo
O termo é regulado no artigo 278º. Não temos uma noção de termo no artigo.
O termo é o momento a partir do qual o negócio produz os seus efeitos ou deixa de os
produzir. Reporta-se ao início ou à cessação dos efeitos do negócio a um acontecimento
futuro e certo. Por isso, distinguimos o termo suspensivo ou inicial do termo resolutivo
ou final. O termo suspensivo marca o momento a partir do qual o negócio produz os seus
efeitos. O termo resolutivo marca o momento em que o negócio deixa de produzir efeitos.
Antes de se verificar o termo resolutivo tudo se passa como se o contrato não estivesse
sujeito a termo. Verificado o termo, o negócio cessa os seus efeitos para o futuro. O termo
não tem eficácia retroativa.
Apesar de se tratar de um acontecimento certo, o termo pode ser certo ou incerto. Isto
prende-se com o momento em que o acontecimento futuro e certo se vai verificar. Quando
se sabe exatamente quando o acontecimento se vai verificar, temos um termo certo.
Quando não se sabe ao certo quando o acontecimento se vai verificar, estamos perante
um termo incerto. Sabemos sempre que o acontecimento vai ocorrer, mas não se sabe
quando.
O artigo 278º manda aplicar o disposto no artigo 272º e 273º. Ou seja, quanto ao
termo, vale o que dissemos quanto à necessidade de atuar de boa fé na pendência do termo
e quanto aos atos conservatórios. Uma das partes deve atuar de boa fé de modo a não
prejudicar o direito da contraparte. O interessado pode praticar ato conservatórios do seu
direito.
Quanto à contagem do termo, as partes podem definir o momento a partir do qual
começa a contagem. Se não o fizerem, existem regras supletivas no artigo 279º.
(Ex: Supondo que alguém doa a outra pessoa os bens imóveis do seu património, mas
diz-lhe que um determinado valor do rendimento dos prédios terá de ser destinado a uma
obra de caridade. Isto é um modo. Temos uma doação, que é um negócio gratuito. Não
há uma contrapartida, mas há um encargo que é imposto ao beneficiário.)