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1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem

Direito Civil - Coisas

1ª FASE OAB XXXV EXAME

Direito Civil – Coisas

Prof. Maitê Damé


1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
Direito Civil - Coisas

Olá, Alunos!
Meus Amores!!!!!
Dando sequência a nossa preparação no Direito Civil, a
partir de agora vamos trabalhar com Direito das Coisas.
O material foi elaborado para facilitar a compreensão de
vocês sobre o conteúdo e deixar o estudo tranquilo e
sereno.
Além disto, utilizo meu Instagram para postar dicas e
elas podem auxiliar nesta intensa preparação.
Ao final deste curso, vocês estarão preparados para
encarar a prova da OAB de frente. Que tenham um
estudo tranquilo e sereno!

Maitê Damé @maitedame


1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
Direito Civil - Coisas

1ª FASE OAB | XXXV EXAME

Direito Civil – Coisas


Prof. Maitê Damé

1. Coisas, Direitos Reais E Posse ...................................................................... 4


2. Coisas, Direitos Reais E Posse .................................................................... 19
3. Direitos Reais. Propriedade: Disposições Gerais, Descoberta, Formas De
Aquisição Da Propriedade Imóvel ....................................................................... 32
4. Direitos Reais. Propriedade: Disposições Gerais, Descoberta, Formas De
Aquisição Da Propriedade Imóvel ....................................................................... 52
5. Condomínio................................................................................................... 69
6. Direitos Reais Sobre Coisa Alheia. Direito Real De Aquisição. Direitos Reais
De Garantia. ........................................................................................................ 84

Olá, aluno(a). Este material de apoio foi organizado para a 1ª Fase OAB e deve ser utilizado
como um complemento para as respectivas aulas. Além disso, recomenda-se que o aluno
assista as aulas acompanhado da legislação pertinente.

Bons estudos, Equipe CEISC.


Atualizado em fevereiro de 2022.
1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
Direito Civil - Coisas

1. Coisas, Direitos Reais E Posse

Prof. Maitê Damé


@maitedame

1.1. Conceito e Noções Introdutórias

O Direito das Coisas é um ramo do direito civil – direito privado, portanto – que se preocupa
em estudar as relações jurídicas que se estabelecem entre as pessoas e coisas determinadas,
no que diz respeito a apropriação destas coisas. Trata, pois, do domínio e do pertencimento de
um determinado bem a uma pessoa. Para Penteado o Direito das Coisas disciplina “as normas
jurídicas que dispõem sobre situações jurídicas que desencadeiam direitos que têm por objeto
coisas”. Tartuce afirma que “o Direito das Coisas é o ramo do Direito Civil que tem como
conteúdo relações jurídicas estabelecidas entre pessoas e coisas determinadas, ou mesmo
determináveis”. Assim, o Direito das Coisas estuda os direitos subjetivos que incidem sobre
coisas.
Quando se estudam os bens jurídicos (parte geral) percebe-se que existem bens jurídicos
materiais e bens jurídicos imateriais. Entende-se, com base em Gagliano e Pamplona Filho que
coisas são os bens corpóreos, materiais e, segundo Tartuce , coisas é tudo aquilo que não é
humano. Os bens, por sua vez, são tanto os objetos corpóreos e materiais (coisas) quanto os
ideais e imateriais, de forma a justificar que a liberdade, a honra, a imagem, a vida de alguém
possa ser considerado como bem jurídico (ainda que não seja uma coisa).
É preciso que se esclareça que o Direito das Coisas estuda os bens jurídicos corpóreos,
ou seja, as coisas, pois somente elas podem ser objeto de direitos de posse e de direitos
subjetivos reais. A coisa possui três características que lhe identificam: o caráter corpóreo,
material; a possibilidade de apropriação; a utilidade ou valor econômico.

__________________
PENTEADO, Luciano de Camargo. Direito das Coisas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
E-book. Disponível em: https://proview.thomsonreuters.com. Acesso em 02 out. 2020.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020,
p. 1. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16
out. 2020.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: parte geral.
18. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 329-330.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 4. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020,
p. 1. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530989354/cfi/6/10!/4/8/2@0:0. Acesso em 16
out. 2020.
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O caráter corpóreo da coisa refere-se a sua existência física, material. Como regra, o
Direito das Coisas aplica-se somente às coisas materiais. Contudo, havendo previsão expressa
em lei pode ser, também, aplicado aos bens incorpóreos ou direitos, como nos casos dos direitos
autorais (propriedade intelectual), em que é admitido falar em propriedade sobre bens
intelectuais (obra artística, literária, científica, programa de computador, etc).
Diante das inovações impostas ao Código Civil pela lei da liberdade econômica, Tartuce
apresenta a seguinte crítica:
A propósito, como o Código Civil de 2002 trata, no livro do Direito das Coisas, de bens
corpóreos ou materiais, merece críticas o novo tratamento dos fundos de investimentos,
incluídos na codificação privada por força da Lei da Liberdade Econômica (Lei
13.874/2019), entre os seus arts. 1.368-C a 1.368-F. Como é notório, tais fundos são
compostos por bens incorpóreos ou imateriais e, como advertimos quando dos debates
para a conversão da originária MP 881 em lei, esse tratamento deveria estar em lei
especial. Todavia, nossas ressalvas, e também de outros doutrinadores, não foram
ouvidas e, agora, o Código Privado tem uma impropriedade e falta de coerência nesse
tratamento.

As coisas podem ser apropriadas pela pessoa, ou seja, podem tomar posse da coisa,
tornar a coisa como sua, adquirir a propriedade. Ademais, possuem utilidade ou valor
econômico, ou seja, a coisa é capaz de satisfazer as necessidades.

1.2. Direitos Reais x Direitos Pessoais – distinções conceituais preliminares

Existem discussões sobre a nomenclatura mais adequada: direito das coisas ou direitos
reais. A partir do momento em que se compreende que o direito das coisas, enquanto ramo do
direito civil, preocupa-se, metodologicamente, em estudar as relações estabelecidas entre
pessoas e coisas determinadas, no que diz respeito a apropriação destas coisas, necessário,
agora, conceituar os direitos reais e, então, diferenciá-los dos direitos pessoais.
Tartuce estabelece os direitos reais como sendo “as relações jurídicas estabelecidas
entre pessoas e coisas determinadas ou determináveis, tendo como fundamento principal o
conceito de propriedade, seja ela plena ou restrita”. De certa forma, pode-se dizer que Direito
das Coisas é o campo de estudo dos Direitos Reais, mas não só deles (também se estuda a
posse).
Importante observar que o Direito Civil estuda os direitos patrimoniais e os não
patrimoniais (direitos de personalidade, por exemplo). Os direitos patrimoniais se dividem em
direitos pessoais e direitos reais.
Os direitos patrimoniais pessoais são previstos pelo direito de obrigações, pelo direito
dos contratos, pelo direito empresarial. Já os direitos pessoais patrimoniais são disciplinados
pelo direito de família e sucessório. Nestas relações o sujeito ativo pode exigir apenas do sujeito
passivo a prestação sobre a qual estão vinculados. Ex.: no contrato de locação, o proprietário do
imóvel pode exigir do locatário o pagamento do aluguel, assim como o locatário pode exigir do
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locador o respeito aos direitos originários do contrato de locação. Os efeitos são, portanto, inter
partes. Neste caso, havendo inadimplemento do negócio (da locação, por exemplo), a
vinculação será da pessoa e não incidirá sobre a coisa.
Por sua vez, os direitos patrimoniais reais são disciplinados pelo Direito das Coisas e
refere-se as situações que podem incidir sobre um bem corpóreo determinado, sobre o qual o
titular poderá exercer seu direito, exigindo-o contra qualquer pessoa que se oponha. Neste caso,
partindo do mesmo exemplo do contrato de locação, o locatário pode exigir de qualquer pessoa
o respeito a posse direta que exerce sobre o imóvel locado, inclusive sobre o proprietário do
imóvel. Os direitos reais tem efeito, portanto, erga omnes. Neste caso, havendo o
inadimplemento do negócio (tomando-se como exemplo uma hipoteca, onde tem-se um bem em
garantia, caso o valor não seja pago, o bem ofertado em garantia, fica vinculado a esse
empréstimo.

1.3. Direitos Reais – teorias justificadoras

De forma clássica, existem duas teorias que explicam o conceito de direitos reais: teoria
personalista e teoria realista.
a) Teoria personalista: segundo tal teoria, os direitos reais seriam as relações jurídicas que se
estabelecem entre sujeitos, mas intermediadas por coisas. O sujeito ativo seria o titular e o sujeito
passivo seria indeterminado (contra quem poderia ser exigido o respeito ao direito do titular).
b) Teoria realista ou clássica: para esta teoria, o direito real consistira em um poder imediato
que o titular exerce sobre a coisa, com eficácia erga omnes. Para esta teoria a relação seria
sujeito/titular – coisa (e a oposição seria erga omnes).
Deve-se destacar que ambas as teorias possuem doutrinadores de renome a elas filiados
e esta diferenciação é mais no âmbito conceitual do que, propriamente, prático.
1.4. Direitos Reais – características

Os direitos reais possuem como características mais marcantes:


a) Oponibilidade erga omnes: produzem efeitos diretos contra todas as pessoas (coletividade).
Toda e qualquer pessoa deve se abster de molestar bem alheio .
b) Direito de sequela: os direitos reais aderem a coisa, concedendo ao titular do direito real “o
direito de perseguir a coisa no local em que ela se encontrar e com quem estiver indevidamente
o bem alheio” .
c) Publicidade: é dar visibilidade para o titular do direito sobre o bem. A partir daí, em se tratando
de direito real sobre bem móvel, a transmissão se dá pela entrega/tradição (art. 1.226, CC).
Contudo, se o direito real incidir sobre bem imóvel, a transmissão somente ocorre pelo registro
no Cartório de Registro de Imóveis (art. 1.227, CC). Estes atos (tradição e registro) é que dão
publicidade.
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d) Rol taxativo: o rol de direitos reais no Brasil é taxativo e está previsto no art. 1.225, CC, de
forma que, como regra, não se admite interpretação extensiva, mas apenas aqueles previstos
legislativamente (numerus clausus), embora não exclua, de forma absoluta, a possibilidade de
inclusão de novos direitos reais. Trata-se de uma característica e não de uma definição absoluta,
pois já existem decisões como no caso da multipropriedade imobiliária em que restou
reconhecido direito real.
e) Perpetuidade: os direitos reais permanecem enquanto existir o objeto, ou seja, sua existência
não se extingue pelo não uso.
f) Preferência: o titular de um direito real tem direito de preferência. Ex.: no recebimento de
créditos, aquele que tiver um direito real de garantia, como a hipoteca, por exemplo, tem
preferência sobre os credores quirografários, “porque nos direitos reais de garantia o bem dado
em garantia fica afetado ao cumprimento da obrigação” .
g) Possibilidade de abandono: é possível a renúncia a direitos reais.
h) Incorporação da coisa pela posse: pelo exercício do domínio fático da coisa por certo tempo.
i) Aquisição via usucapião: em razão do exercício da posse, o direito real pode ser adquirido
via usucapião (bens imóveis, móveis ou servidões).

A) POSSE
Existe muita discussão acerca do conceito de posse. Alguns entendem ser um mero fato
e, outros, entendem ser um direito (é o que a maioria da doutrina entende). Neste sentido,
Tartuce afirma que:
Nessa linha igualmente me posiciono doutrinariamente. Isso porque a posse pode ser
conceituada como sendo o domínio fático que a pessoa exerce sobre a coisa. A partir
dessa ideia, levando-se em conta a teoria tridimensional de Miguel Reale, pode-se afirmar
que a posse constitui um direito, com natureza jurídica especial. Como dito no capítulo
anterior, a posse é um conceito intermediário, entre os direitos pessoais e os direitos reais.
Mas esse caráter híbrido não tem o condão de gerar a conclusão de que não constitui um
direito propriamente dito.
_______________________
MELO, Marco Aurélio Bezerra de. Direito Civil: coisas. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p.
4. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530986216/cfi/6/20!/4/34/2/2@0:0. Acesso em 16
out. 2020.

MELO, Marco Aurélio Bezerra de. Direito Civil: coisas. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p.
5. E-book. Disponível em:
https://grupogen.vitalsource.com/#/books/9788530986216/cfi/6/20!/4/34/2/2@0:0. Acesso em 16
out. 2020.
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Art. 1.225. São direitos reais: I - a propriedade; II - a superfície; III - as servidões; IV - o usufruto;
V - o uso; VI - a habitação; VII - o direito do promitente comprador do imóvel; VIII - o penhor; IX
- a hipoteca; X - a anticrese. XI - a concessão de uso especial para fins de moradia; XII - a
concessão de direito real de uso; e XIII - a laje.
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO.
MULTIPROPRIEDADE IMOBILIÁRIA (TIME-SHARING). NATUREZA JURÍDICA DE
DIREITO REAL. UNIDADES FIXAS DE TEMPO. USO EXCLUSIVO E PERPÉTUO
DURANTE CERTO PERÍODO ANUAL. PARTE IDEAL DO MULTIPROPRIETÁRIO.
PENHORA. INSUBSISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. O
sistema time-sharing ou multipropriedade imobiliária, conforme ensina Gustavo
Tepedino, é uma espécie de condomínio relativo a locais de lazer no qual se divide
o aproveitamento econômico de bem imóvel (casa, chalé, apartamento) entre os
cotitulares em unidades fixas de tempo, assegurando-se a cada um o uso exclusivo
e perpétuo durante certo período do ano. 2. Extremamente acobertada por princípios
que encerram os direitos reais, a multipropriedade imobiliária, nada obstante ter feição
obrigacional aferida por muitos, detém forte liame com o instituto da propriedade, se não
for sua própria expressão, como já vem proclamando a doutrina contemporânea, inclusive
num contexto de não se reprimir a autonomia da vontade nem a liberdade contratual
diante da preponderância da tipicidade dos direitos reais e do sistema de numerus
clausus. 3. No contexto do Código Civil de 2002, não há óbice a se dotar o instituto
da multipropriedade imobiliária de caráter real, especialmente sob a ótica da
taxatividade e imutabilidade dos direitos reais inscritos no art. 1.225. 4. O vigente
diploma, seguindo os ditames do estatuto civil anterior, não traz nenhuma vedação nem
faz referência à inviabilidade de consagrar novos direitos reais. Além disso, com os
atributos dos direitos reais se harmoniza o novel instituto, que, circunscrito a um vínculo
jurídico de aproveitamento econômico e de imediata aderência ao imóvel, detém as
faculdades de uso, gozo e disposição sobre fração ideal do bem, ainda que objeto de
compartilhamento pelos multiproprietários de espaço e turnos fixos de tempo. 5. A
multipropriedade imobiliária, mesmo não efetivamente codificada, possui natureza
jurídica de direito real, harmonizando-se, portanto, com os institutos constantes do rol
previsto no art. 1.225 do Código Civil; e o multiproprietário, no caso de penhora do imóvel
objeto de compartilhamento espaço-temporal (time-sharing), tem, nos embargos de
terceiro, o instrumento judicial protetivo de sua fração ideal do bem objeto de constrição.
6. É insubsistente a penhora sobre a integralidade do imóvel submetido ao regime de
multipropriedade na hipótese em que a parte embargante é titular de fração ideal por
conta de cessão de direitos em que figurou como cessionária. 7. Recurso especial
conhecido e provido. (REsp 1546165/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA,
Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em
26/04/2016, DJe 06/09/2016)

A posse é, pois, o domínio físico que alguém tem sobre a coisa, que vem a ser protegido
pelo Direito, sendo, portanto, concedido efeitos jurídicos a este domínio. Segundo Loureiro ,
posse “é o exercício, em nome próprio, das prerrogativas inerentes a um direito real”, “é o
exercício de fato de um dos poderes inerentes à propriedade”. Assim, é domínio físico/fático
sobre a coisa, mas também direito, pois assim a lei reconhece.
I) Posse – teorias justificadoras
O conceito de posse vem explicado por duas grandes teorias justificadoras: a teoria
subjetivista de Savigny e a teoria objetivista de Jhering.
Teoria subjetivista ou subjetiva – corpus + animus domni: para esta teoria, a posse
seria o poder físico sobre a coisa (corpus) e a vontade de ser dono desta coisa (animus domni),
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ou seja, de ter a coisa para si próprio. No exemplo da locação, o locatário de um imóvel tem o
poder físico sobre a coisa, mas não a intenção de tê-la para si.
Teoria objetivista – corpus: para esta teoria, a posse seria a disposição física da coisa,
ou seja, o poder físico/fático sobre a coisa, dispensando o “animus domni”, mas agindo, o agente,
com o intuito de explorar a coisa de forma econômica. Esta é a teoria adotada pelo Brasil, pois o
art. 1.196, CC, ao tratar da posse, prevê: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato
o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”.
II) Posse x detenção
Necessário se faz, compreender o conceito de detenção, pois ele difere-se do conceito de
posse. Na posse, o sujeito que possui o domínio físico da coisa age como se dono fosse, pois
objetiva ter a coisa para si. Já na detenção, embora tenha o domínio físico da coisa, o sujeito
sabe que a coisa não é sua e pretende devolvê-la após o uso (objeto da locação, livro da
biblioteca, etc).
O art. 1.198, CC prevê que “considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de
dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou
instruções suas”. Assim o detentor tem a coisa em razão de uma situação de dependência
econômica ou de subordinação. Ex.: o capataz da fazenda tem a detenção do imóvel,
conservando a posse em nome do proprietário, em cumprimento de suas obrigações.
Tartuce ainda traz como exemplo de detenção, a situação de alguém que deixa seu carro
em um estacionamento. Nesta situação, a empresa, proprietária do estacionamento detém a
posse do veículo, em razão do contrato firmado entre o proprietário e o estacionamento (mesmo
que verbal). Já o manobrista (funcionário do estacionamento), este tem detenção do veículo, pois
exerce a posse em nome do estacionamento.
O detentor exerce a posse em nome de outrem. A ele, em nome próprio, não é permitido
exercer as ações possessórias, mas ele pode exercer o direito de defesa da posse alheira, por
meio da autotutela , nos termos do enunciado 493 das Jornadas de Direito Civil: “O detentor (art.
1.198 do Código Civil) pode, no interesse do possuidor, exercer a autodefesa do bem sob seu
poder” (Enunciado n. 493).
Mas é possível transformar a detenção em posse, desde que rompida a subordinação,
conforme entendimento do enunciado n. 301 das Jornadas de Direito Civil: “É possível a
conversão da detenção em posse, desde que rompida a subordinação, na hipótese de exercício
em nome próprio dos atos possessórios”.
O STJ tem entendimento firmado de que a ocupação indevida de bem público também se
configura em detenção: “Súmula 619, STJ. A ocupação indevida de bem público configura mera
detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e
benfeitorias”.
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O mesmo Tribunal decidiu que no caso de um proprietário que deixa seu veículo na
concessionária para a realização de reparos, que a concessionária é detentora do bem, não
detendo sua posse e, com isto, não podendo retê-lo em caso de falta de pagamento pelo serviço
prestado. O STJ entendeu que a concessionária tem a detenção do veículo, que “ficou sob sua
custódia por determinação e liberalidade da proprietária, em uma espécie de vínculo de
subordinação” (STJ, REsp 1.628.385/ES, 3.ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j.
22.08.2017, DJe 29.08.2017).
III) Posse – classificação
Estudar a classificação da posse é importante em razão dos efeitos desta posse, pois,
conforme for ela de boa ou má-fé, justa ou injusta, direta ou indireta, serão os efeitos advindos
daí.
1) Posse direta e posse indireta – art. 1.197, CC
Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em
virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida,
podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.

A posse direta é aquela em que o sujeito tem o controle material, físico e imediato do bem.
Ex.: o locatário, no contrato de locação, exerce a posse direta do imóvel, com autorização do
locador.
A posse indireta é aquela exercida através de outra pessoa. Trata-se de uma concessão,
geralmente por parte do proprietário, para que terceiro exerça a posse direta. Ex.: o locador, no
contrato de locação, exerce a posse indireta do imóvel, e o locatário, a posse direta.
Essas duas posses são coexistentes, ou seja, uma não anula a outra (art. 1.197, CC) e
ambas podem ser tuteladas. Ex.: possuidor indireto (locador) pode utilizar-se dos interditos
proibitórios para defesa de seu direito contra terceiros, mas não pode exercer contra o possuidor
direto (locatário), pois este último exerce a posse em razão de um contrato (uma relação pessoal)
. Ex.: o possuidor direto (locatário) pode exercer sua posse contra terceiros e, também, contra o
possuidor indireto, mesmo que este seja proprietário do imóvel.
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2) Composse – art. 1.199, CC


Art. 1.199. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer
sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores.

A composse ocorre quando existir uma posse comum sobre uma coisa, isto é, quando
duas ou mais pessoas possuírem o domínio fático da coisa. Neste caso, há um condomínio de
posse e este pode ser derivado da herança ou de ato inter vivos (contrato).
Cada compossuidor pode usar a coisa e exercer direitos possessórios contra terceiros,
mas não pode impedir que os demais compossuidores também a utilizem. Assim, tem-se como
exemplo a situação dos herdeiros, que, pela transmissão da herança (princípio da saisine)
recebem os bens que compõe o acervo hereditário como um todo unitário e indivisível (art. 1.791,
CC). Os herdeiros são compossuidores dos bens da herança. Podem usá-los durante o período
da indivisão (do óbito até a efetivação a partilha), mas não podem impedir que os outros herdeiros
também os usem.
O STJ decidiu em 2010 que os herdeiros podem manejar as possessórias, uns contra os
outros, sempre que houver turbação ou esbulho da posse de um dos herdeiros por parte dos
outros.
Princípio saisine. Reintegração. Composse. Cinge-se a questão em saber se o
compossuidor que recebe a posse em razão do princípio saisine tem direito à
proteção possessória contra outro compossuidor. Inicialmente, esclareceu o Min.
Relator que, entre os modos de aquisição de posse, encontra-se o ex lege, visto que, não
obstante a caracterização da posse como poder fático sobre a coisa, o ordenamento
jurídico reconhece, também, a obtenção desse direito pela ocorrência de fato jurídico – a
morte do autor da herança –, em virtude do princípio da saisine, que confere a transmissão
da posse, ainda que indireta, aos herdeiros independentemente de qualquer outra
circunstância. Desse modo, pelo mencionado princípio, verifica-se a transmissão da posse
(seja ela direta ou indireta) aos autores e aos réus da demanda, caracterizando, assim, a
titularidade do direito possessório a ambas as partes. No caso, há composse do bem
em litígio, motivo pelo qual a posse de qualquer um deles pode ser defendida todas
as vezes em que for molestada por estranhos à relação possessória ou, ainda,
contra ataques advindos de outros compossuidores. In casu, a posse transmitida é a
civil (art. 1.572 do CC/1916), e não a posse natural (art. 485 do CC/1916). Existindo
composse sobre o bem litigioso em razão do droit de saisine é direito do
compossuidor esbulhado o manejo de ação de reintegração de posse, uma vez que
a proteção à posse molestada não exige o efetivo exercício do poder fático – requisito
exigido pelo tribunal de origem. O exercício fático da posse não encontra amparo no
ordenamento jurídico, pois é indubitável que o herdeiro tem posse (mesmo que indireta)
dos bens da herança, independentemente da prática de qualquer outro ato, visto que a
transmissão da posse dá-se ope legis, motivo pelo qual lhe assiste o direito à proteção
possessória contra eventuais atos de turbação ou esbulho. Isso posto, a Turma deu
provimento ao recurso para julgar procedente a ação de reintegração de posse, a
fim de restituir aos autores da ação a composse da área recebida por herança.
Precedente citado: REsp 136.922-TO, DJ 16.03.1998” (STJ, REsp 537.363/RS, Rel. Min.
Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJRS), j. 20.04.2010).
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A composse pode ser pro diviso ou pro indiviso. Quando os compossuidores possuírem
apenas uma fração ideal da posse, esta composse será pro indiviso, como no caso dos herdeiros
sobre os bens da herança, onde todos os herdeiros são detentores da posse sobre uma fração
ideal da coisa. No caso em que os compossuidores sabem, no plano fático, a parte da coisa
sobre a qual exercem a posse, está-se diante da composse pro diviso, como no caso de dois
sujeitos que exercem a posse sobre um terreno grande, um deles, na parte da frente e, o outro,
na parte dos fundos, havendo uma cerca que divide o terreno ao meio. Neste caso, embora
ambos exerçam a posse sobre o terreno, cada um está sobre uma porção real do imóvel.
3) Posse justa e injusta – art. 1.200, CC
Art. 1.200. É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.

A posse justa, conforme a redação do art. 1200, CC é aquela que não for violenta,
clandestina ou precária, ou seja, ela não ofende a previsão legal, tendo sido adquirida de forma
legítima e merecendo proteção legal. Trata-se de uma posse limpa.
A posse injusta, é aquela obtida de forma violenta, clandestina ou precária, de forma que
sua aquisição tenha sido ilícita, ou seja, viciada por ter sido adquirida por violação da lei. Assim,
a posse violenta é a retirada da coisa do antigo possuidor contra a sua vontade, “obtida por meio
de esbulho, for força física ou violência moral” . A posse precária é aquela adquirida a partir do
abuso de confiança ou do abuso de direito, que resulta da “retenção indevida da coisa que deve
ser devolvida ao seu possuidor indireto” . Por fim, a posse clandestina é aquela obtida de forma
oculta, às escondidas (não pública).

Os vícios (posse injusta) estão ligados ao momento de sua aquisição, de forma que até
podem deixar de existir.
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não
autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a
violência ou a clandestinidade.

Contudo, há entendimento que, mesmo nestes casos, a posse não deixa de ser injusta,
pois sua origem derivou de uma forma contrária a lei.
4) Posse de boa e má-fé – art. 1.201, CC
Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede
a aquisição da coisa.

Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova
em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.

A posse de boa-fé é aquela na qual o possuidor acredita ser proprietário da coisa, por
ignorar existência de vício que impeça a aquisição da mesma. A boa-fé é do possuidor que, no
momento da aquisição da coisa não sabia que estava lesando o direito de alguém, ou seja, o
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possuidor não tinha ideia de que existisse algum obstáculo que impedisse que ele viesse a
adquirir a propriedade da coisa.
A doutrina afirma que a boa-fé implica um “desconhecimento não culposo”, isto é, se o
indivíduo, na aquisição, recebeu a posse por um justo título, sem saber da existência de um
defeito que impedisse a aquisição da propriedade. Neste aspecto, Tartuce afirma que: [...] o
possuidor de boa-fé é aquele que ignora os vícios que inquinam sua posse. Esses vícios podem
ser os da violência, os da clandestinidade ou os da precariedade, mas não necessariamente, ou
seja, os vícios estão presentes, mas são por ele desconhecidos. Daí, sua ausência de
consciência significar boa-fé subjetiva.
A doutrina afirma que a boa-fé implica um “desconhecimento não culposo”, isto é, se o
indivíduo, na aquisição, recebeu a posse por um justo título, sem saber da existência de um
defeito que impedisse a aquisição da propriedade. Neste aspecto, Tartuce afirma que: [...] o
possuidor de boa-fé é aquele que ignora os vícios que inquinam sua posse. Esses vícios podem
ser os da violência, os da clandestinidade ou os da precariedade, mas não necessariamente, ou
seja, os vícios estão presentes, mas são por ele desconhecidos. Daí, sua ausência de
consciência significar boa-fé subjetiva.
Assim, a existência de um justo título, pela redação do art. 1.201, parágrafo único,
presume a boa-fé (um contrato de promessa de compra e venda, uma cessão de direitos
possessórios, etc.). O enunciado 312 das Jornadas de Direito Civil traduz esta situação: “Pode
ser considerado justo título para a posse de boa-fé o ato jurídico capaz de transmitir a posse ad
usucapionem, observado o disposto no art. 113 do Código Civil”. Ainda, o enunciado 313 das
Jornadas de Direito Civil traz a previsão do instrumento de cessão de direitos como sendo justo
título, embora não exista a necessidade de estar a transmissão materializada por instrumento:
Considera-se justo título, para a presunção relativa da boa-fé do possuidor, o justo motivo
que lhe autoriza a aquisição derivada da posse, esteja ou não materializado em
instrumento público ou particular. Compreensão na perspectiva da função social da posse.

Contudo, se ele não observou os deveres de cuidado que uma pessoa normal deveria ter,
se ele foi negligente quanto a aquisição da coisa, equipara-se a posse de má-fé. De má-fé é,
também, a posse em que o indivíduo sabia que sua conduta, ao adquirir a coisa, violava direito
de outrem, pois ele tinha consciência de sua conduta.
A posse de boa-fé pode transformar-se em posse de má-fé a partir do momento em que
o possuidor toma ciência do vício ou que possui a coisa indevidamente.
Art. 1.202. A posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o momento em que
as circunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente.

Assim, se o indivíduo sabe da existência de vício ou obstáculo à aquisição da propriedade


da coisa, sua posse torna-se de má-fé. De se observar que a boa-fé é presumida, cabendo a
parte contrária fazer prova da existência de má-fé por parte do possuidor. Por fim, pode-se dizer
que a posse de má-fé é aquela em que o indivíduo sabe da existência do vício, mas, ainda
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assim, toma a coisa para si, passando a exercer o domínio fático sobre esta. Este possuidor não
tem um justo título.

1.5. Posse com título e sem título

A posse com título é aquela na qual a transmissão da posse se deu, de um indivíduo para
outro, baseada em uma causa representativa, especialmente por um documento. De se observar
que não se exige a formalização deste documento, mas sim a existência de uma causa
representativa da transmissão da posse.
A posse sem título é quando inexiste (ou aparentemente não existe) esta causa
representativa de transmissão do domínio. Ex.: alguém que encontra uma faca com cabo de
prata e ouro no meio do campo e toma posse dela. O indivíduo não tinha a intenção de encontrar
a faca, e, neste caso, não havendo uma vontade relevante para que se perfectibilize o ato, torna
este como um ato-fato jurídico (não há uma vontade juridicamente relevante para a existência
do ato).

1.6. Posse nova e posse velha

Esta classificação da posse, em razão do tempo de exercício, traz efeitos processuais,


pelo uso ou não, do procedimento previsto no art. 558 e seguintes do CPC/2015.
Art. 558. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas
da Seção II deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da turbação ou
do esbulho afirmado na petição inicial.

Parágrafo único. Passado o prazo referido no caput , será comum o procedimento, não
perdendo, contudo, o caráter possessório.

A posse nova é aquela que conta com menos de ano e dia, ou seja, é a posse de até um
ano. A posse velha é que possui, pelo menos, um ano e um dia.
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* Para todos verem: esquema


1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
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1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
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Questões Exames Anteriores


1) (XXIX EXAME) Em 05/05/2005, Aloísio adquiriu uma casa de 500 m2 registrada em nome de
Bruno, que lhe vendeu o imóvel a preço de mercado. A escritura e o registro foram realizados de
maneira usual. Em 05/09/2005, o imóvel foi alugado, e Aloísio passou a receber mensalmente o
valor de R$ 3.000,00 pela locação, por um período de 6 anos. Em 10/10/2009, Aloísio é citado
em uma ação reivindicatória movida por Elisabeth, que pleiteia a retomada do imóvel e a
devolução de todos os valores recebidos por Aloísio a título de locação, desde o momento da
sua celebração. Uma vez que Elisabeth é judicialmente reconhecida como a verdadeira
proprietária do imóvel em 10/10/2011, pergunta-se: é correta a pretensão da autora ao
recebimento de todos os aluguéis recebidos por Aloísio?
a) Sim. Independentemente da sentença de mérito, a própria contestação automaticamente
transforma a posse de Aloísio em posse de má-fé desde o seu nascedouro, razão pela qual todos
os valores recebidos pelo possuidor devem ser ressarcidos.
b) Não. Sem a ocorrência de nenhum outro fato, somente após uma sentença favorável ao
pedido de Elisabeth, na reivindicatória, é que seus argumentos poderiam ser considerados
verdadeiros, o que caracterizaria a transformação da posse de boa-fé em posse de má-fé. Como
o possuidor de má-fé tem direito aos frutos, Aloísio não é obrigado a devolver os valores que
recebeu pela locação.
c) Não. Sem a ocorrência de nenhum outro
fato, e uma vez que Elisabeth foi vitoriosa em
seu pleito, a posse de Aloísio passa a ser
qualificada como de má-fé desde a sua
citação no processo – momento em que
Aloísio tomou conhecimento dos fatos ao
final reputados como verdadeiros –, exigindo,
em tais condições, a devolução dos frutos
recebidos entre 10/10/2009 e a data de
encerramento do contrato de locação.
d) Não. Apesar de Elisabeth ter obtido o
provimento judicial que pretendia, Aloísio não
lhe deve qualquer valor, pois, sendo
possuidor com justo título, tem, em seu favor,
a presunção absoluta de veracidade quanto
a sua boa-fé.
2) (XXVIII EXAME) Eduarda comprou um
terreno não edificado, em um loteamento distante do centro, por R$ 50.000,00 (cinquenta mil
reais). Como não tinha a intenção de construir de imediato, ela visitava o local esporadicamente.
Em uma dessas ocasiões, Eduarda verificou que Laura, sem qualquer autorização, havia
construído uma mansão com 10 quartos, sauna, piscina, cozinha gourmet etc., no seu terreno,
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Direito Civil - Coisas

em valor estimado em R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). Laura, ao ser notificada por
Eduarda, antes de qualquer prazo de usucapião, verificou a documentação e percebeu que
cometera um erro: construíra sua mansão no lote “A” da quadra “B”, quando seu terreno, na
verdade, é o lote “B” da quadra “A”. Diante do exposto, assinale a afirmativa correta.
a) Eduarda tem o direito de exigir judicialmente a demolição da mansão construída por Laura,
independentemente de qualquer indenização.
b) Laura, apesar de ser possuidora de má-fé, tem direito de ser indenizada pelas benfeitorias
necessárias realizadas no imóvel de Eduarda.
c) Laura, como é possuidora de boa-fé, adquire o terreno de Eduarda e a indeniza, uma vez que
construiu uma mansão em imóvel inicialmente não edificado.
d) Eduarda, apesar de ser possuidora de boa-fé, adquire o imóvel construído por Laura, tendo
em vista a incidência do princípio pelo qual a superfície adere ao solo.

Gabarito
1) C
2) C
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2. Coisas, Direitos Reais E Posse

Prof. Maitê Damé


@maitedame

2.1. Aquisição e transmissão da posse

Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível


o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à
propriedade.
A aquisição da posse ocorre no momento em que os poderes inerentes à propriedade
passam a ser exercidos pelo possuidor. Esta aquisição pode se dar de forma originária, quando
não houver qualquer vinculação entre a posse atual e a anterior, ou derivada, quando existir uma
transmissão da posse pelo antigo possuidor ao atual.
Importante observar que na aquisição derivada, a posse é transmitida nos mesmos
moldes em que foi adquirida pelo antigo possuidor:
Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos
caracteres.

Significa dizer, então, que se a aquisição da posse se deu de forma viciada, os vícios
também são transmitidos ao atual possuidor, mesmo que ele esteja de boa-fé. Donizetti e
Quintella apresentam o seguinte exemplo:
Silvio, que havia furtado a coisa, vende-a a Helena. A posse de Silvio era injusta
(clandestina) e, por mais que Helena se torne possuidora de boa-fé, por desconhecer o
defeito da posse que lhe foi transmitida, terá posse injusta.

Assim, salvo prova em contrário, a posse mantém o mesmo caráter com o qual foi
adquirida (art. 1.203, CC).
A) APOSSAMENTO
A aquisição originária ocorre pelo apossamento ou ocupação, quando o sujeito assume
o controle, o domínio fático da coisa. Ex.: alguém que encontra um celular no lixo. Trata-se de
um apossamento, pois o sujeito adquire a posse daquela coisa de forma originária.
O apossamento também pode ocorrer pelo esbulho, quando alguém toma para si a coisa,
apoderando-se dela e retirando do domínio fático de outrem.

B) TRADIÇÃO
A aquisição derivada ocorre pela tradição, ou seja, quando o antigo possuidor transmite
ao atual possuidor o domínio fático da coisa. A tradição independe de existência de documento
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escrito transferindo a coisa, bastando a conduta de entregar (antigo possuidor) e receber (atual
possuidor) a coisa.
A tradição pode ser real – quando há a efetiva entrega da coisa pelo antigo possuidor –,
simbólica – quando a transmissão não é da coisa em si, mas de algo que represente a coisa
(chaves de um imóvel, por exemplo) – ou ficta – é a que ocorre por presunção, pela transmissão
de um documento, sem que exista qualquer contato com a coisa (inquilino que adquire, por
compra e venda, a propriedade do imóvel em que reside).

C) CONSTITUTO POSSESSÓRIO
Trata-se de uma forma de aquisição derivada, pelo modo simbólico, pois a coisa não é
entregue de forma física, apenas simbólica, mas a posse é transmitida. Ocorre o constituto
possessório quando houver uma cláusula de convenção, pela qual o cedente, ainda que
transmita a coisa, permanece na posse dela, como possuidor, em nome do adquirente.
Ex.: o proprietário de um apartamento vende o imóvel, mas segue alugando o mesmo do
novo proprietário.

D) QUEM PODE ADQUIRIR A POSSE


Art. 1.205. A posse pode ser adquirida:
I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;
II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.
A posse pode ser adquirida: pela própria pessoa e, neste caso, ocorrer diretamente ou
por seu representante; ou por terceiro, sem mandato de representação, dependendo, neste
último caso, de ratificação do ato por parte da pessoa em nome de quem se adquire.
A partir daí, verifica-se que o representante legal ou convencional da parte não é possuidor
da coisa, mas mero detentor (art. 1.198, CC).

E) TRANSMISSÃO SUCESSÓRIA DA POSSE


Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos
caracteres.

Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao


sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.

Uma vez que tenha ocorrido a morte, abre-se a sucessão e a herança é transmitida aos
herdeiros como um todo unitário e indivisível (princípio da saisine). Assim, na sucessão, quando
se está diante de uma sucessão a título universal, existe uma continuidade na posse, por parte
dos sucessores com relação ao falecido . A posse é a mesma, transmitindo-se com todos os
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vícios ou qualidades, ou seja, não se trata de nova posse, mas a mesma exercida pelo
antecessor. Vale observar que, tanto na sucessão legítima, quanto na sucessão testamentária
(mesmo no caso do legado que é sucessão a título singular), o sucessor continua a posse do
falecido.
Já na aquisição a título singular, o novo possuidor pode escolher entre continuar o
tempo da posse do antecessor ou iniciar nova posse. Ex.: aquele que adquire um imóvel por
compra e venda pode optar por somar sua posse à posse do antecessor/vendedor ou, então,
zerar a contagem e iniciar novo prazo de posse. De toda forma, a transmissão da posse ocorre
com as mesmas características anteriores.

F) ATOS QUE NÃO INDUZEM POSSE


Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não
autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a
violência ou a clandestinidade.

Os atos de permissão ou tolerância não induzem posse. Este é o caso do detentor, que
conserva a posse em nome do dono (art. 1.198, CC). De igual forma, os atos clandestinos ou
violentos não autorizam a aquisição da posse. Significa que nos casos de conflitos de terra, por
exemplo, em que haja a tomada violenta da posse da área, estes não poderão adquirir a posse,
em razão da violência do ato. Contudo, depois que cessar a violência ou a clandestinidade
poderão eles adquirir a posse.
Assim, a proteção liminar nas ações possessórias, havendo violência e clandestinidade,
só ocorre quando estas datarem de menos de ano e dia, nos termos do art. 558, CPC/2015.

2.2. Efeitos da posse

O Código Civil estabelece, dos arts. 1.210 ao 1.222 os efeitos da posse. Tais efeitos
podem ser de ordem material ou processual.
Os efeitos materiais dizem respeito a percepção dos frutos e suas consequências, ao
direito a indenização e retenção das benfeitorias, as responsabilidades e ao direito de usucapião.
Já os efeitos processuais dizem respeito a possibilidade de utilização dos interditos
possessórios, as ações possessórias e a legítima defesa da posse e do desforço imediato.
A) PERCEPÇÃO DOS FRUTOS
Quanto a percepção dos frutos, deve-se, por primeiro, considerar se a posse é de boa ou
má-fé. Assim, o Código Civil prevê os seguintes dispositivos quanto ao recebimento (ou não) dos
frutos.
Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
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Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser
restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também
restituídos os frutos colhidos com antecipação.

Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são
separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.

Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem
como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se
constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.

O possuidor de boa-fé tem direito aos frutos percebidos (colhidos). Já os frutos pendentes
(ainda não colhidos) devem ser restituídos, assim como aqueles que tenham sido colhidos por
antecipação. Já o possuidor de má-fé deve devolver todos os frutos colhidos ou pendentes, bem
como aqueles que deixou de colher por culpa sua (art. 1.216, CC), devendo, neste último caso,
ser responsabilizado no caso de perecimento do frutos não colhidos por sua culpa (reparação de
danos – responsabilidade civil). Mas tem direito, o possuidor de má-fé a ser indenizado pelas
despesas de produção e custeio.
Os frutos naturais são aqueles provenientes da coisa principal (frutas, por exemplo).
Estes, tão logo sejam separados da coisa principal consideram-se colhidos.
Os frutos industriais são aqueles que derivam de uma atividade humana (tudo o que venha
a ser produzido em uma fábrica, por exemplo). Estes, assim, como os naturais, logo após
separados consideram-se colhidos.
Os frutos civis derivam de uma relação jurídica ou econômica (rendimentos de aplicações
financeiras, aluguel de imóveis, por exemplo). Estes são percebidos na data prevista para
vencimento do aluguel ou do “aniversário” da aplicação financeira.
B) RETENÇÃO E INDENIZAÇÃO DAS BENFEITORIAS
Conforme estudado na parte geral, as benfeitorias são acessórios que se agregam a coisa
principal, ou seja, obras artificiais, realizadas pelo homem, na estrutura da coisa principal – já
existente – com o propósito de conservá-la, melhorá-la ou embelezá-la. Estas benfeitorias podem
ser classificadas em necessárias, úteis e voluptuárias .
Quanto a relação entre o exercício da posse e as benfeitorias, os arts. 1.219 a 1.222, CC
também consideram a existência de uma posse de boa ou má-fé para autorizar (ou não) a
indenização e a retenção das benfeitorias:
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e
úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o
puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das
benfeitorias necessárias e úteis.

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias;


não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as
voluptuárias.
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Art. 1.221. As benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao ressarcimento


se ao tempo da evicção ainda existirem.

Art. 1.222. O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé,


tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo; ao possuidor de boa-fé
indenizará pelo valor atual.

Abaixo, um resumo, da relação entre as benfeitorias e a posse:


Benfeitorias necessárias. O possuidor de boa-fé tem direito a ser indenizado quanto a
estas benfeitorias (pelo valor atual) ou exercer o direito de retenção pelo valor delas. O possuidor
de má-fé tem direito de ser ressarcido apenas quanto a estas benfeitorias (aquele que tiver o
dever de indenizar tem direito de optar entre o valor atual da coisa e o custo dela), não possuindo
direito de retenção.
Benfeitorias úteis. O possuidor de boa-fé tem direito a ser indenizado quanto a estas
benfeitorias (pelo valor atual) ou exercer o direito de retenção pelo valor delas.
Benfeitorias voluptuárias. O possuidor de boa-fé tem direito a ser indenizado quanto a
estas benfeitorias ou de retirá-las, desde que não haja detrimento da coisa (que não haja a
desvalorização do imóvel, por exemplo), caso não lhes sejam pagas. O possuidor de má-fé não
tem direito a levantar as benfeitorias voluptuárias.
C) RESPONSABILIDADE PELA PERDA OU DETERIORAÇÃO DA COISA
Os arts. 1.217 e 1.218, CC tratam da responsabilidade do possuidor com relação a perda
ou deterioração da coisa:
Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a
que não der causa.

Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda
que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse
do reivindicante.

Pela redação dos dispositivos, percebe-se que essa responsabilidade é somente do


possuidor de má-fé, que deverá indenizar o proprietário em razão da perda ou da deterioração
da coisa, mesmo que acidentais. Essa responsabilidade somente será afastada havendo prova
de que a perda ou deterioração ocorreria mesmo que a coisa estivesse na posse do reivindicante
(art. 1.218, 2ª parte).
Ex.: João se apossa do cavalo de Pedro. Neste caso, se o cavalo morrer na posse de
João por ter ingerido veneno, ele deverá indenizar a Pedro. Contudo, se a morte do animal
ocorrer por uma doença cardíaca grave, ou seja, mesmo que estivesse na posse de Pedro ele
morreria, não terá João o dever de indenizar. CUIDADO, pois, neste caso, depende de PROVA!
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Direito Civil - Coisas

D) USUCAPIÃO
O principal efeito da posse é o direito de usucapião, ou seja, o exercício de posse de uma
coisa por certo tempo gera a chamada prescrição aquisitiva, que dá direito ao titular a pleitear a
propriedade da coisa através da pretensão de usucapião.
E) PROTEÇÃO POSSESSÓRIA
Dentro dos efeitos da posse encontra-se a possibilidade que o possuidor tem de se utilizar
das ações possessórias (ou interditos possessórios) para proteção e defesa de sua posse.
Importante observar que as ações possessórias tanto podem ser exercidas pelo proprietário
detentor da posse, como também por aquele que, embora não tenha a propriedade, se encontra
na posse da coisa.
Quanto a proteção possessória, o CC prevê os seguintes dispositivos:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído
no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.

§ 1 o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria


força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do
indispensável à manutenção, ou restituição da posse.

§ 2 o Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou


de outro direito sobre a coisa.

Art. 1.211. Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á


provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de alguma das
outras por modo vicioso.

Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o


terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era.

Art. 1.213. O disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões não aparentes,
salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do prédio serviente, ou
daqueles de quem este o houve.

De se observar, contudo, que, em se tratando de ações, a parte de procedimento está


tratada no CPC (art. 554 e seguintes).
Assim, conforme a situação, é permitido ao possuidor defender sua posse, derivando daí
os nomes defesa em sentido estrito (evitar o incômodo da posse – turbação) e desforço
imediato (para recuperar a posse – esbulho). Assim, nascem as três principais ações
possessórias:

• Interdito proibitório – caso de ameaça ou risco ao exercício da posse do titular.


Proteção de perigo iminente.
• Ação de manutenção de posse – caso de turbação ou perturbação à posse, ou seja,
houve um atentado à posse, mas sem retirá-la do possuidor. Preservação da posse.
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• Ação de reintegração de posse – caso de esbulho ou retirada da posse, quando o


atentado se concretiza e o possuidor é destituído da sua posse. Devolução da posse. Cabível
sempre que houver invasão, mesmo que parcial, do imóvel.

Estas diferenciações são fundamentais para fins de exame da OAB, mas,


processualmente falando, existe o princípio da fungibilidade e da instrumentalidade das formas,
ou seja, mesmo que se ingresse com uma ação de manutenção e a ação adequada seja a de
reintegração, será processada (art. 554, CPC).
Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz
conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos
estejam provados.

§ 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de


pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e
a citação por edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público
e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública.

§ 2º Para fim da citação pessoal prevista no § 1º, o oficial de justiça procurará os ocupantes
no local por uma vez, citando-se por edital os que não forem encontrados.

§ 3º O juiz deverá determinar que se dê ampla publicidade da existência da ação prevista


no § 1º e dos respectivos prazos processuais, podendo, para tanto, valer-se de anúncios
em jornal ou rádio locais, da publicação de cartazes na região do conflito e de outros
meios.

Havendo várias pessoas no polo passivo das possessórias, será procedida citação
pessoal dos ocupantes encontrados no local e por edital dos demais. Haverá intimação do
Ministério Público e, caso envolva pessoas em situação de hipossuficiência econômica (como
nos casos de invasões de terras). Nestes casos, ainda, o juiz determinará a publicidade da
existência da ação e dos prazos processuais através de jornais, rádios, publicação em meio
digital (no site do Tribunal, por exemplo).
Importante, ainda, considerar que as ações possessórias adotarão o procedimento
especial, previsto no art. 554 e seguintes do CPC sempre que se tratar de ação de força nova
(art. 558, CPC). Considera-se de força nova as possessórias ingressadas dentro do prazo de
ano e dia (lembre-se da diferença entre posse nova e posse velha), cabendo medida liminar. Se
a posse for de mais de ano e dia, considera-se a possessória de força velha e, neste caso, não
cabe a respectiva liminar e deve-se utilizar o procedimento comum. Merece, ainda, destaque, a
previsão do art. 565, CPC, que permite a concessão de medida liminar, nas ações possessórias
coletivas, desde que realizada previamente uma audiência de conciliação.
Nas ações possessórias que tramitem pelo procedimento especial (de força nova), é
admitido cumulação de pedidos (art. 555, CPC) e, ainda, que seja imposta medida para evitar
nova turbação ou esbulho ou cumprir a tutela provisória ou final (podendo ser requerida multa,
portanto):
Art. 555. É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:
I - condenação em perdas e danos;
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II - indenização dos frutos.


Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e
adequada para:
I - evitar nova turbação ou esbulho;
II - cumprir-se a tutela provisória ou final.

As possessórias de força nova, que adotam o procedimento especial, possuem natureza


dúplice, permitindo ao réu de qualquer ação possessória que, em contestação, apresente pedido
contraposto, alegando que sofreu ofensa a sua posse, demandar a proteção desta e indenização
pelos prejuízos sofridos. Tartuce entende ser desnecessária a propositura de reconvenção neste
caso:
Esse pedido contraposto pode ser de proibição, de manutenção ou mesmo de
reintegração da posse em seu favor. Portanto, está totalmente dispensada a necessidade
de uma reconvenção para a aplicação das medidas previstas no art. 555 do Estatuto
Processual em vigor, entendimento que sempre prevaleceu quanto ao art. 922 do
CPC/1973.

Nas ações possessórias não se permite propor ação de reconhecimento de domínio, salvo
contra terceira pessoa (art. 557, CPC). Se o réu provar a falta de idoneidade financeira do autor
para eventual sucumbência ou responsabilidade pelos danos, nos casos de manutenção ou
reintegração de posse, o juiz lhe concederá prazo de 5 dias para prestar caução, sob pena de
depósito da coisa litigiosa, ressalvada a impossibilidade da parte hipossuficiente (art. 559, CPC).
Ainda, importante é a possibilidade prevista no art. 1.210, § 1º, CC, que permite a legítima
defesa da posse e o desforço imediato, como formas de autotutela ou autodefesa. Quando
houver ameaça ou turbação viável a legítima defesa da posse. Havendo esbulho, cabe o
desforço imediato. Para que esses institutos possam ser utilizados, deve-se ter uma defesa
imediata, que o possuidor, ao agir, deve fazer dentro do limite do indispensável para
retomar/recuperar sua posse, evitando-se qualquer tipo de abuso. São considerados como
parâmetro o fim social e econômico, a boa-fé objetiva e os bons costumes.
Contudo, sendo o caso de judicializar a demanda que discute a posse, o CPC, além das
disposições gerais quanto as ações possessórias, ainda apresenta disposições específicas para
cada as ações de manutenção e reintegração de posse e interdito proibitório.

2.3. Ações possessórias

Além das três típicas ações possessórias: manutenção e reintegração de posse e interdito
proibitório, existem outras formas de proteção da posse, o que será discutido neste item.
A) REINTEGRAÇÃO DE POSSE
A ação de reintegração de posse tem lugar quando a posse de alguém for esbulhada, ou
seja, quando de forma violenta, precária ou clandestina alguém retira a posse de outrem.
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Os arts. 560 a 566, CPC fundamentam a ação de manutenção e reintegração de posse


para as ações de posse nova, ou seja, com menos de ano e dia. As ações de posse velha, com
mais de ano e dia, devem ser propostas pelo procedimento comum.
Segundo o art. 561, CPC o autor, na inicial, deve provar sua posse, o esbulho ou turbação
praticados, bem como a data em que ocorreu e a perda ou continuação da posse, embora
turbada. Recebendo a inicial e estando devidamente instruída, o juiz deferirá a liminar de
manutenção ou reintegração de posse independentemente da oitiva do réu. Não havendo a
devida instrução, o réu será citado para a audiência de justificação da posse, onde o autor deverá
prove/justifique a alegação de turbação ou esbulho (art. 562, CPC) e, considerando suficiente,
expedirá o mandado de manutenção ou reintegração (art. 563, CPC). Contra as pessoas jurídicas
de direito público não serão deferidas as liminares de reintegração e manutenção sem prévia
audiência.
Independentemente de concessão da liminar, o autor deverá promover a citação do réu
no prazo de 5 dias, com prazo de contestação de 15 dias. No caso de audiência de justificação
prévia, o prazo de contestação conta da intimação da decisão que defere ou não a liminar.
Nos litígios coletivos de posse, quando a turbação ou o esbulho tiver ocorrido há mais de
ano e dia, o juiz deverá, primeiro, designar audiência de mediação, a ser realizada no prazo de
30 dias.
Além destas disposições específicas, devem ser observadas as disposições gerais sobre
as ações possessórias, previstas nos arts. 554 a 559, CPC.
B) MANUTENÇÃO DE POSSE
A ação de manutenção de posse tem lugar quando a posse de alguém for turbada, ou
seja, quando há um incômodo da posse. Significa que o possuidor segue exercendo a posse,
mas alguém está lhe importunando, incomodando no exercício desta posse.
Em termos de procedimento, devem ser analisados, tanto os arts. 560 a 566, CPC, os
quais fundamentam tanto a ação de manutenção, quanto a de reintegração de posse, para as
ações de posse nova (neste sentido, observar o que foi descrito no item relativo a reintegração
de posse). Além destas disposições específicas, devem ser observadas as disposições gerais
sobre as ações possessórias, previstas nos arts. 554 a 559, CPC.

C) INTERDITO PROIBITÓRIO
O interdito proibitório visa impedir a turbação ou o esbulho da posse. Utilizada quando
houver uma ameaça a posse, tendo como pedido principal uma abstenção (não atentar contra a
posse), ou seja, uma obrigação de não fazer, sob pena de incidência de multa (art. 567, CPC).
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D) NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA


A nunciação de obra nova, apesar de não prevista no CPC/2015 é uma ação que visa
impedir a continuação de obras no terreno vizinho que prejudiquem o possuidor ou proprietário
de uma coisa. Ex.: vizinho que inicia a construção de um muro fora do lugar, invadindo o terreno
alheio em alguns metros.
Trata-se de ação possessória que adota o procedimento comum e, portanto, eventual
liminar deve observar os requisitos de concessão de tutela de urgência.

E) AÇÃO DE DANO INFECTO


A ação de dano infecto visa prevenir que o vizinho que está demolindo seu prédio ou em
que haja um vício de construção, cause prejuízo ao autor. Visa uma espécie de caução por
eventuais danos futuros. Pouco usada na prática.
Segue o procedimento comum.

F) EMBARGOS DE TERCEIRO
Os embargos de terceiro podem ser utilizados para a defesa da posse ou da propriedade
naquelas situações de turbação ou esbulho ocorridos via judicial (arresto, sequestro, penhora,
etc) e manejados por aqueles que não sejam parte no processo. Esta ação é de procedimento
especial dos arts. 674 a 681, CPC (neste aspecto, sugere-se a análise específica deste
procedimento especial).

G) AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE


A ação de imissão de posse deve ser manejada por aquele que pretenda ingressar na
posse de um bem que nunca teve. Trata-se de uma ação petitória e não possessória.
Geralmente, decorre do direito de propriedade. Ex.: alguém que adquire em uma alienação
judicial um imóvel e não consegue tomar posse.

H) AÇÃO PUBLICIANA
A ação publiciana também é uma ação petitória, que se fundamenta no domínio. Também
segue procedimento comum do CPC.

2.4. Perda da posse

A perda da posse ocorre quando alguém deixa de agir como se dono/proprietário fosse.
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Art. 1.223. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o
poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196.

Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando,
tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é
violentamente repelido.

A perda pode ocorrer de várias formas, mas quatro delas são as principais: derrelicção,
ou abandono voluntário da coisa; tradição, que é quando há a transmissão voluntária da posse
a terceiro; esbulho, que é quando a posse é tomada/subtraída do seu possuidor, contra sua
vontade; destruição da coisa, ou seja, quando a coisa deixa de existir.
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Questões Exames Anteriores


1) (XVI EXAME) Mediante o emprego de violência, Mélvio esbulhou a posse da Fazenda Vila
Feliz. A vítima do esbulho, Cassandra, ajuizou ação de reintegração de posse em face de Mélvio
após um ano e meio, o que impediu a concessão de medida liminar em seu favor. Passados dois
anos desde a invasão, Mélvio teve que trocar o telhado da casa situada na fazenda, pois estava
danificado. Passados cinco anos desde a referida obra, a ação de reintegração de posse
transitou em julgado e, na ocasião, o telhado colocado por Mélvio já se encontrava severamente
danificado. Diante de sua derrota, Mélvio argumentou que faria jus ao direito de retenção pelas
benfeitorias erigidas, exigindo que Cassandra o reembolsasse.
A respeito do pleito de Mélvio, assinale a afirmativa correta.
A) Mélvio não faz jus ao direito de retenção por benfeitorias, pois sua posse é de má-fé e as
benfeitorias, ainda que necessárias, não devem ser indenizadas, porque não mais existiam
quando a ação de reintegração de posse transitou em julgado.
B) Mélvio é possuidor de boa-fé, fazendo jus ao direito de retenção por benfeitorias e devendo
ser indenizado por Cassandra com base no valor delas.
C) Mélvio é possuidor de má-fé, não fazendo jus ao direito de retenção por benfeitorias, mas
deve ser indenizado por Cassandra com base no valor delas.
D) Mélvio é possuidor de má-fé, fazendo jus ao direito de retenção por benfeitorias e devendo
ser indenizado pelo valor atual delas.

2) (XXIII EXAME) À vista de todos e sem o emprego de qualquer tipo de violência, o pequeno
agricultor Joventino adentra terreno vazio, constrói ali sua moradia e uma pequena horta para
seu sustento, mesmo sabendo que o terreno é de propriedade de terceiros. Sem ser incomodado,
exerce posse mansa e pacífica por 2 (dois) anos, quando é expulso por um grupo armado
comandado por Clodoaldo, proprietário do terreno, que só tomou conhecimento da presença de
Joventino no imóvel no dia anterior à retomada. Diante do exposto, assinale a afirmativa correta.
a) Como não houve emprego de violência, Joventino não pode ser considerado esbulhador.
b) Clodoaldo tem o direito de retomar a posse do bem mediante o uso da força com base no
desforço imediato, eis que agiu imediatamente após a ciência do ocorrido.
c) Tendo em vista a ocorrência do esbulho, Joventino deve ajuizar uma ação possessória contra
Clodoaldo, no intuito de recuperar a posse que exercia.
d) Na condição de possuidor de boa-fé, Joventino tem direito aos frutos e ao ressarcimento das
benfeitorias realizadas durante o período de exercício da posse.
Gabarito
1) A 2) C
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3. Direitos Reais. Propriedade: Disposições Gerais,


Descoberta, Formas De Aquisição Da Propriedade
Imóvel

Prof. Maitê Damé


@maitedame

3.1. Direitos reais

Loureiro conceitua os direitos reais como sendo aquele que “refere-se habitualmente
sobre um bem corpóreo determinado, em face do qual o titular exerce diretamente seu direito”.
O Código Civil estabelece, nos arts. 1.225 a 1.227 as disposições sobre os direitos reais.
Art. 1.225. São direitos reais: I - a propriedade; II - a superfície; III - as servidões; IV - o
usufruto; V - o uso; VI - a habitação; VII - o direito do promitente comprador do imóvel; VIII
- o penhor; IX - a hipoteca; X - a anticrese. XI - a concessão de uso especial para fins de
moradia;XII - a concessão de direito real de uso; e XIII - a laje.

Art. 1.226. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou transmitidos por
atos entre vivos, só se adquirem com a tradição.

Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre
vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos
títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.

Possuem algumas características, as quais já foram mencionadas no item I (noções


introdutórias e conceituais), pelo que não será retomado. Traz-se, novamente esta referência
aos direitos reais, para fins de observar a ordem disciplinada pelo Código Civil e para que, a
partir daqui, sejam analisados de forma específica, os direitos reais previstos no art. 1.225, CC.
Importante observar que os direitos reais sobre coisas móveis são constituídos ou transmitidos
pela tradição (art. 1.226) e os direitos reais sobre bens imóveis através do registro do título
aquisitivo no Cartório de Registro de Imóveis (art. 1.227).

3.2. Propriedade

A) PROPRIEDADE – CONCEITO
O direito de propriedade é um direito real que determina que uma coisa fica submetida a
vontade de uma pessoa, limitada pela lei e pela função social ou cláusulas derivadas da vontade
impostas sobre a coisa. Seu conceito está mais direcionado aos atributos do direito de
propriedade do que, propriamente, a uma definição. Este direito consiste em poder usar, gozar
e dispor do bem, podendo, também, reaver contra aquele que injustamente detenha ou possua.
Apenas para ilustrar, dos vários conceitos apresentados pela doutrina, Tartuce entende que a
propriedade é
o direito que alguém possui em relação a um bem determinado. Trata-se de um direito
fundamental, protegido no art. 5.º, inc. XXII, da Constituição Federal, mas que deve
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sempre atender a uma função social, em prol de toda a coletividade. A propriedade é


preenchida a partir dos atributos que constam do Código Civil de 2002 (art. 1.228), sem
perder de vista outros direitos, sobretudo aqueles com substrato constitucional.

Como visto o direito de propriedade é direito fundamental, inscrito no art. 5.º, XXII, da CF
que pode ser oponível contra todos os membros da sociedade (direito erga omnes). Deve atender
a uma função social, em benefício da coletividade. Por fim, seu conceito/definição está
diretamente ligado aos atributos ou faculdades relativas à propriedade: usar, gozar, dispor e
reaver (art. 1.228, CC), sendo, portanto, um direito exclusivo do titular e complexo.
B) ATRIBUTOS (PODERES) DA PROPRIEDADE
Direito de uso, ou seja, utilização da coisa conforme as permissões legislativas, ou seja,
existem limites ao uso como, por exemplo, o direito de vizinhança, a desapropriação ou o
tombamento.
Direito de gozo ou fruição, ou seja, a possibilidade de retirar da coisa os frutos que ela
produz (sejam eles naturais ou civis), como, por exemplo, a locação de um imóvel.
Direito de disposição, ou seja, sendo o proprietário da coisa, poder transmiti-la a terceiro,
seja por ato entre vivos (compra e venda) ou causa mortis (testamento), seja de forma onerosa
(mediante pagamento) ou gratuita (negócio benéfico, sem pagamento).
Direito de reinvindicação, ou seja, possibilidade de, através de ação petitória, com
fundamento na propriedade, reivindicar a coisa de quem a detenha injustamente. A ação
reivindicatória é a ação petitória mais comum, tratando-se de ação real fundada no domínio.
Tartuce afirma que pode-se “afirmar que proteção da propriedade é obtida por meio dessa
demanda, aquela em que se discute a propriedade visando à retomada da coisa, quando terceira
pessoa, de forma injustificada, a tenha, dizendo-se dono”. Existe discussão acerca do prazo
prescricional da ação reivindicatória. Pela previsão do CC o prazo seria o do art. 205, CC, ou
seja, 10 anos a contar da violação do direito de propriedade. O STJ, contudo, tem entendido ser
imprescritível tal ação, tendo em vista seu caráter declaratório. Neste sentido, Tartuce afirma:
Na realidade, deve-se entender que a ação reivindicatória não é sujeita à prescrição ou à
decadência, embora se trate de ação real, porque o domínio é perpétuo e somente se
extingue nos casos previstos em lei e que serão estudados oportunamente. O efeito da
ação reivindicatória é de fazer com que o possuidor ou detentor restitua o bem com todos
os seus acessórios. Porém, se no caso concreto for impossível essa devolução, como nos
casos de perecimento da coisa, o proprietário terá o direito de receber o valor da coisa se
o possuidor estiver de má-fé, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.

A ação reivindicatória é, pois, uma ação real, que visa a restituição da coisa, provando-se
que o proprietário tinha a posse e injustamente a perdeu. Esta ação segue o procedimento
comum.
Estes quatro atributos da propriedade: Gozar, Reivindicar, Usar e Dispor, são resumidos
na expressão GRUD. Se uma pessoa tiver todos estes atributos terá a propriedade plena.
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Contudo, faltando algum deles ou, caso esses atributos sejam divididos entre duas ou mais
pessoas, haverá a propriedade restrita.

C) PROPRIEDADE – DISPOSIÇÕES PRELIMINARES


Os arts. 1.228 a 1.232, CC estabelecem as disposições preliminares acerca da
propriedade.
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa,
e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua
ou detenha.
§ 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades
econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o
estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e
o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

§ 2 o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou


utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

§ 3 o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por


necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso
de perigo público iminente.

§ 4 o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir


em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de
considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou
separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico
relevante.

§ 5 o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao


proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em
nome dos possuidores.

Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes,


em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a
atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não
tenha ele interesse legítimo em impedi-las.

Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos
minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens
referidos por leis especiais.

Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de


emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação
industrial, obedecido o disposto em lei especial.

Art. 1.231. A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário.

Art. 1.232. Os frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando separados, ao
seu proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a outrem.
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Direito Civil - Coisas

O art. 1.228, caput traz os atributos da propriedade, os quais já foram estudados


anteriormente.
Já o § 1º determina que o direito de propriedade deve ser exercido conforme sua função
social, e o § 2.º proíbe a prática de atos que não tragam ao proprietário qualquer utilidade ou
comodidade e visem apenas prejudicar outrem, ou seja, o exercício da propriedade deve permitir
benefícios para o titular, mas, também, para a sociedade em geral. Diante disto, quando se fala
em função social da propriedade, deve-se pensar no “para que” da propriedade e, a partir daí
exercê-la observando os limites impostos pela lei como, por exemplo, a desapropriação por
necessidade ou utilidade pública ou, ainda, por interesse social.
Em outras palavras, a propriedade deve servir para que a sociedade se mantenha
saudável, para que as pessoas tenham acesso aos bens de que necessitam e para que a
economia seja impulsionada, gerando empregos e renda. Em termos específicos, será
necessário analisar cada bem, para então descobrir qual é a sua função social.

Assim, ao mesmo tempo em que uma fazenda de 1000 hectares pode se prestar para o
cultivo de lavouras de soja, consorciada com a criação de gado, estando, com isto, cumprindo
com sua função social; uma mesma fazenda de 1000 hectares pode encontrar-se abandonada,
com sua casa em ruínas e tomada pelo mato, de forma a não cumprir com sua função social. Em
termos do § 2.º, poderia ser usado como exemplo a demolição de um casarão histórico
devidamente tombado. Este ato traz prejuízos a sociedade. Tartuce ainda apresenta um
exemplo, tratando do § 2.º, onde um proprietário de apartamento faz festas em seu imóvel todas
as noites, e o excesso de barulho prejudica aos vizinhos. Esta situação envolve uma
responsabilidade civil objetiva.
O § 3.º do art. 1.228, CC trata das sanções pela inobservância da função social da
propriedade, através da desapropriação da coisa por necessidade ou utilidade pública ou
interesse social e da requisição no caso de perigo. A própria CF prevê no art. 5.º, XXV, a
possibilidade da desapropriação e da requisição de bens particulares.
Os §§ 4.º e 5.º do art. 1.228, CC tratam da chamada desapropriação privada por posse
trabalho, que, na realidade é a possibilidade de desapropriação de imóvel, quando se configurar
em área extensa que esteja sendo ocupada por um considerado número de pessoas, que
exerçam posse ininterrupta e de boa-fé por mais de 5 anos, tendo nela realizado obras e serviços
de interesse social e econômico relevante. Em situações como esta será o imóvel desapropriado,
fixada indenização justa, a ser paga ao proprietário pelos possuidores, que só adquirem a
propriedade com o pagamento e o registro da sentença no Cartório de Registro de Imóveis (ver
julgamento do STJ no caso conhecido como Favela Pullman).
Importante mencionar alguns enunciados das Jornadas de Direito Civil sobre essa
temática.
Enunciado 82 - É constitucional a modalidade aquisitiva de propriedade imóvel prevista
nos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do novo Código Civil.
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Enunciado 83 - Nas ações reivindicatórias propostas pelo Poder Público, não são
aplicáveis as disposições constantes dos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do novo Código Civil.

Enunciado 84 - A defesa fundada no direito de aquisição com base no interesse social


(art. 1.228, §§ 4º e 5º, do novo Código Civil) deve ser argüida pelos réus da ação
reivindicatória, eles próprios responsáveis pelo pagamento da indenização.

Enunciado 240 - A justa indenização a que alude o § 5º do art. 1.228 não tem como critério
valorativo, necessariamente, a avaliação técnica lastreada no mercado imobiliário, sendo
indevidos os juros compensatórios.

Enunciado 241 - O registro da sentença em ação reivindicatória, que opera a transferência


da propriedade para o nome dos possuidores, com fundamento no interesse social (art.
1.228, § 5º), é condicionada ao pagamento da respectiva indenização, cujo prazo será
fixado pelo juiz.

Enunciado 304 - São aplicáveis as disposições dos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do Código


Civil às ações reivindicatórias relativas a bens públicos dominicais, mantido, parcialmente,
o Enunciado 83 da I Jornada de Direito Civil, no que concerne às demais classificações
dos bens públicos.

Enunciado 305 - Tendo em vista as disposições dos §§ 3º e 4º do art. 1.228 do Código


Civil, o Ministério Público tem o poder-dever de atuar nas hipóteses de desapropriação,
inclusive a indireta, que encerrem relevante interesse público, determinado pela natureza
dos bens jurídicos envolvidos.

Enunciado 306 - A situação descrita no § 4º do art. 1.228 do Código Civil enseja a


improcedência do pedido reivindicatório.

Enunciado 307 - Na desapropriação judicial (art. 1.228, § 4º), poderá o juiz determinar a
intervenção dos órgãos públicos competentes para o licenciamento ambiental e
urbanístico.

Enunciado 308 - A justa indenização devida ao proprietário em caso de desapropriação


judicial (art. 1.228, § 5º) somente deverá ser suportada pela Administração Pública no
contexto das políticas públicas de reforma urbana ou agrária, em se tratando de
possuidores de baixa renda e desde que tenha havido intervenção daquela nos termos da
lei processual. Não sendo os possuidores de baixa renda, aplica-se a orientação do
Enunciado 84 da I Jornada de Direito Civil.

Enunciado 309 - O conceito de posse de boa-fé de que trata o art. 1.201 do Código Civil
não se aplica ao instituto previsto no § 4º do art. 1.228.

Enunciado 310 - Interpreta-se extensivamente a expressão "imóvel reivindicado" (art.


1.228, § 4º), abrangendo pretensões tanto no juízo petitório quanto no possessório.

Enunciado 496 - O conteúdo do art. 1.228, §§ 4º e 5º, pode ser objeto de ação autônoma,
não se restringindo à defesa em pretensões reivindicatórias.

Já o art. 1.229, CC trata da extensão do direito de propriedade ou conteúdo da


propriedade, que abrange o solo e projeta-se tanto para o espaço aéreo, como, também, para o
solo, em altura e profundidade que sejam úteis ao exercício. Assim, embora possa construir
tantos andares quantos necessário ao uso do solo, não pode o proprietário, por exemplo, impedir
aviões de voarem sobre sua propriedade em altura que não lhe interesse.
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O art. 1.230, CC determina que a propriedade do solo não abrange os recursos minerais,
potenciais de energia elétrica, etc. Estes, nos termos do art. 20, IX VIII e X, CF, pertencem à
União, permitindo ao proprietário do solo o uso dos recursos minerais de emprego imediato na
construção civil, desde que não se submetam à transformação industrial. Ex.: possibilidade de
extração de areia para construção civil, não podendo causar danos ambientais. Ex.: extração de
pedras para utilização em alicerce.
D) PROPRIEDADE PLENA E PROPRIEDADE LIMITADA
O art. 1.231, CC diz que se presume ser plena a propriedade, até que seja provada sua
limitação.
Propriedade plena – o proprietário da coisa reúne os atributos de usar, gozar, dispor e
reivindicar.
Propriedade restrita – o proprietário possui alguns atributos, mas, em razão da incidência
de algum ônus, como, por exemplo, a hipoteca, a servidão, o usufruto (direito real sobre coisa
alheia), não é plena sua propriedade ou, então, nos casos de ser resolúvel a propriedade, em
face de condição ou termo. Nestes dois casos (existência de ônus ou propriedade resolúvel), um
ou alguns atributos estão em mãos de terceiros (direito real sobre coisa alheia). Ex.: João é
proprietário do imóvel X. Paulo é usufrutuário do imóvel X.
A partir daí, pode-se dividir a propriedade em nua-propriedade e domínio útil. A nua-
propriedade pertence ao titular do domínio, ou seja, o proprietário, aquele que tem o bem
registrado em seu nome. Não possui os atributos do uso e fruição. Já o domínio útil refere-se
aos atributos de usar, gozar e dispor da coisa. Quando estes dois elementos estiverem sendo
titularizados pela mesma pessoa, haverá a propriedade plena.
E) CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DE PROPRIEDADE
A propriedade tem características muito próximas das características dos direitos reais. A
propriedade possui características de ser um direito fundamental, constante no art. 5.º, XXII e
XXIII da CF, determinando sua proteção e sua função social. Como qualquer direito real é
oponível contra todos, ou seja, é erga omnes. O proprietário pode usar da coisa conforme seu
interesse, desde que não se oponha ao direito de terceiro e nem viole a lei. Assim, o proprietário
não deve tolerar a intromissão de terceiros em sua propriedade. É um direito exclusivo,
complexo, absoluto e perpétuo. A propriedade é o direito real mais complexo. Embora se fale em
direito absoluto, é certo que a propriedade pode ser relativizada em algumas situações, como
nos casos de desapropriação em razão do não cumprimento da função social. É um direito
exclusivo, pois uma coisa, por regra, pertence a uma pessoa, salvo nos casos de condomínio ou
copropriedade. O direito de propriedade é perpétuo, ou seja, independente do exercício, ou seja,
não sendo extinta pelo não uso, somente quando houver causa modificativa ou extintiva do direito
deixará de existir a propriedade (usucapião, por exemplo).
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F) DESCOBERTA
Os arts. 1.233 a 1.237 do CC tratam da descoberta, que nada mais é do que o achado de
uma coisa alheia que esteja perdida.
Art. 1.233. Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo
possuidor.

Parágrafo único. Não o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e, se não o


encontrar, entregará a coisa achada à autoridade competente.

Art. 1.234. Aquele que restituir a coisa achada, nos termos do artigo antecedente, terá
direito a uma recompensa não inferior a cinco por cento do seu valor, e à indenização
pelas despesas que houver feito com a conservação e transporte da coisa, se o dono não
preferir abandoná-la.

Parágrafo único. Na determinação do montante da recompensa, considerar-se-á o esforço


desenvolvido pelo descobridor para encontrar o dono, ou o legítimo possuidor, as
possibilidades que teria este de encontrar a coisa e a situação econômica de ambos.

Art. 1.235. O descobridor responde pelos prejuízos causados ao proprietário ou possuidor


legítimo, quando tiver procedido com dolo.

Art. 1.236. A autoridade competente dará conhecimento da descoberta através da


imprensa e outros meios de informação, somente expedindo editais se o seu valor os
comportar.

Art. 1.237. Decorridos sessenta dias da divulgação da notícia pela imprensa, ou do edital,
não se apresentando quem comprove a propriedade sobre a coisa, será esta vendida em
hasta pública e, deduzidas do preço as despesas, mais a recompensa do descobridor,
pertencerá o remanescente ao Município em cuja circunscrição se deparou o objeto
perdido.

Parágrafo único. Sendo de diminuto valor, poderá o Município abandonar a coisa em favor
de quem a achou.

Assim, quem encontrar, deverá restituí-la ao dono e a não devolução constitui crime de
“apropriação de coisa achada”. Se não souber quem é o dono, deverá entregar à autoridade
competente, que deverá dar conhecimento da descoberta através da imprensa. Se passados 60
dias da publicação da notícia ou do edital não aparecer o proprietário, o bem deverá ser levado
a hasta pública, deduzidos o valor da recompensa e despesas do descobridor e o saldo
pertencerá ao Município onde a coisa foi descoberta. Deve ser observado que aquela máxima
de que “achado não é roubado” não é de todo verdade, pois o descobridor, aquele que encontra
a coisa perdida, não se torna proprietário da coisa, pois lembre-se que o direito de propriedade
não se extingue pelo não uso.
Contudo, o descobridor tem direito a receber uma recompensa que não pode ser inferior
a 5% o valor da coisa, além do reembolso das despesas para a conservação da coisa e
localização do proprietário. Caso não haja o pagamento, o proprietário pode abandonar a coisa
e, neste caso, o descobridor pode adquirir a propriedade pela ocupação.
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O descobridor não tem responsabilidade quanto aos danos sofridos pela coisa, salvo se
proceder com dolo, ou seja, se intencionalmente causar dano, devendo, neste caso, indenizar o
proprietário.
G) FORMAS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL
Assim como ocorre na posse, a propriedade pode ser adquirida de forma originária ou de
forma derivada. Tartuce apresenta um esquema sobre a aquisição da propriedade no qual é
possível se ter a visualização das formas:

A aquisição originária ocorre sem que a propriedade venha com as características


anteriores, sem que haja manifestação de vontade do antigo dono. Nesta modalidade, não existe
transmissão.
A aquisição derivada ocorre quando há manifestação de vontade do antigo dono,
transmitindo a propriedade a outra pessoa. Neste caso, a propriedade segue com as
características anteriores.
G.1) FORMAS ORIGINÁRIAS
I) Acessão
Enquanto forma de aquisição originária refere-se ao direito do proprietário sobre tudo o
que for incorporado ao bem, ou seja,
[...] a acessão pode ser conceituada como um modo originário de aquisição do domínio
pelo aumento do volume ou do valor da coisa, de modo que ficará pertencendo ao
proprietário tudo aquilo que a ela aderir ou incorporar, tendo em vista o princípio geral do
direito que “o acessório segue o principal”. Destarte, o dono do principal também será dono
do acessório .
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Direito Civil - Coisas

Acessão é, pois, uma anexação de um bem acessório novo a um bem principal já existente
. Pode ocorrer por formação de ilhas, aluvião, avulsão, abandono de álveo, plantações e
construções (art. 1.248, CC).
II) Formação de ilhas
Para fins do direito civil, as ilhas que se formarem em rios não navegáveis ou particulares,
pertencem ao domínio particular.
Art. 1.249. As ilhas que se formarem em correntes comuns ou particulares pertencem aos
proprietários ribeirinhos fronteiros, observadas as regras seguintes:
I - as que se formarem no meio do rio consideram-se acréscimos sobrevindos aos terrenos
ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção de suas testadas, até a linha
que dividir o álveo em duas partes iguais;
II - as que se formarem entre a referida linha e uma das margens consideram-se
acréscimos aos terrenos ribeirinhos fronteiros desse mesmo lado;
III - as que se formarem pelo desdobramento de um novo braço do rio continuam a
pertencer aos proprietários dos terrenos à custa dos quais se constituíram.

Para explicar esse dispositivo, Donizetti e Quintella apresentam esquemas bastante


representativos:
No caso do inciso I, a divisão das ilhas que se formarem no meio dos rios, serão
divididas de forma proporcional aos proprietários ribeirinhos de ambas as margens,
conforme esboço abaixo.

No caso do inciso II, as ilhas formadas do meio para uma margem, pertencerão aos
proprietários daquela margem, proporcionalmente a sua testada, conforme esboço
abaixo:
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Por fim, no caso do inciso III, as ilhas que se formarem em razão de um “novo braço
do rio” continuam a pertencer aos proprietários dos terrenos da margem em que se
constituíram, conforme representação:

III) Aluvião
Aluvião são acréscimos formados por depósitos e aterros naturais de forma quase
imperceptível.
Art. 1.250. Os acréscimos formados, sucessiva e imperceptivelmente, por depósitos e
aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou pelo desvio das águas destas,
pertencem aos donos dos terrenos marginais, sem indenização.

Parágrafo único. O terreno aluvial, que se formar em frente de prédios de proprietários


diferentes, dividir-se-á entre eles, na proporção da testada de cada um sobre a antiga
margem.
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Estes acréscimos formam-se em razão do desvio natural do leito de rios ou por depósito de
sedimentos e adere a propriedade do terreno em que houve o acréscimo, sem que haja o dever
de indenização por parte deste proprietário.

IV) Avulsão
Ocorre avulsão quando há um deslocamento natural, mas brusco de terras de um terreno,
que acaba se unindo a outro. Para que ocorra avulsão o deslocamento deve se dar por FORÇA
NATURAL VIOLENTA, ou seja, sem culpa do proprietário do imóvel de onde se desloca a terra.
Art. 1.251. Quando, por força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um
prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a propriedade do acréscimo, se indenizar
o dono do primeiro ou, sem indenização, se, em um ano, ninguém houver reclamado.

Parágrafo único. Recusando-se ao pagamento de indenização, o dono do prédio a que se


juntou a porção de terra deverá aquiescer a que se remova a parte acrescida.

Neste caso, a propriedade pode ser adquirida de duas formas:


a) Se o proprietário do imóvel em que o deslocamento de terras se unir indenizar o dono
do imóvel do qual a porção de terras se deslocou;
b) Se, embora não indenizando, passar mais de um ano e ninguém reclamar;
Pela redação do parágrafo único, se o proprietário do imóvel em que as terras se uniram
não concordar em indenizar, mas concordar na retirada da parte acrescida, ele não adquire a
propriedade.

V) Abandono do álveo
Álveo abandonado ocorre quando um curso d’água muda seu curso, de forma natural.
Assim, o curso anterior (álveo) acaba sendo abandonado.
Art. 1.252. O álveo abandonado de corrente pertence aos proprietários ribeirinhos das
duas margens, sem que tenham indenização os donos dos terrenos por onde as águas
abrirem novo curso, entendendo-se que os prédios marginais se estendem até o meio do
álveo.
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O álveo abandonado é dividido entre os terrenos marginais, através de uma linha


imaginária.

VI) Plantações e construções


Como regra geral, a respeito das plantações e construções, que são bens móveis que
acedem ao imóvel por conduta humana, o art. 1.253, CC estabelece que elas se presumam feitas
pelo proprietário do terreno e a sua custa, salvo prova em contrário.
Art. 1.253. Toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo
proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário.

Art. 1.254. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com sementes, plantas
ou materiais alheios, adquire a propriedade destes; mas fica obrigado a pagar-lhes o valor,
além de responder por perdas e danos, se agiu de má-fé.

Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do
proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a
indenização.

Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do


terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo,
mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.

Art. 1.256. Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as sementes,


plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões.

Parágrafo único. Presume-se má-fé no proprietário, quando o trabalho de construção, ou


lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação sua.

Art. 1.257. O disposto no artigo antecedente aplica-se ao caso de não pertencerem as


sementes, plantas ou materiais a quem de boa-fé os empregou em solo alheio.

Parágrafo único. O proprietário das sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do


proprietário do solo a indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou
construtor.
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Art. 1.258. Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo alheio em
proporção não superior à vigésima parte deste, adquire o construtor de boa-fé a
propriedade da parte do solo invadido, se o valor da construção exceder o dessa parte, e
responde por indenização que represente, também, o valor da área perdida e a
desvalorização da área remanescente.

Parágrafo único. Pagando em décuplo as perdas e danos previstos neste artigo, o


construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo que invadiu, se em proporção
à vigésima parte deste e o valor da construção exceder consideravelmente o dessa parte
e não se puder demolir a porção invasora sem grave prejuízo para a construção.

Art. 1.259. Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio exceder a vigésima
parte deste, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde por perdas e
danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área perdida
e o da desvalorização da área remanescente; se de má-fé, é obrigado a demolir o que
nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão devidos em dobro.

Plantações e construções sempre acedem ao solo, ou seja, são bens acessórias, que não
vivem sem o principal. Desta forma, o art. 1.254, CC, estabelece que aquele que planta ou
constrói em terreno próprio, com materiais ou sementes alheias, tem o dever de indenizar o dono
pelo seu valor, sem prejuízo de eventuais perdas e danos, no caso de ter agido de má-fé.
O art. 1.255, CC determina que aquele que usar suas sementes e materiais na plantação
ou construção em terreno alheio, perde estes para o proprietário do solo, podendo receber
indenização pelo valor respectivo se tiver agido de boa-fé. Ademais, se a plantação ou a
construção exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que plantou ou construiu
adquire a propriedade do solo, devendo indenizar o proprietário pelo valor ajustado ou, caso não
haja acordo, pelo valor fixado judicialmente.
O art. 1.256, CC determina que se ambas as partes (aquele que planta ou edifica em terreno
alheio e, também, o proprietário do solo) estiverem de má-fé, o proprietário do solo adquire a
propriedade das acessões, mas deverá ressarcir o valor das mesmas. Considera-se de má-fé o
proprietário quando a atuação se deu em sua presença e sem impugnação.
Quando a construção invade o prédio vizinho em porção igual ou inferior a vigésima parte
deste, o art. 1.258, CC, prevê duas situações. Quando a construção for feita por o construtor de
boa-fé, este adquire a propriedade do solo invadido quando o valor da construção exceder o
valor do solo, devendo indenizar o valor da área e a desvalorização a remanescente. Ex.: Terreno
invadido que vale R$200.000,00; construção que vale R$50.000,00 e não ultrapassa a vigésima
parte do terreno invadido (10.000,00). Neste caso, deverá indenizar em R$10.000,00 e pela
desvalorização da área remanescente.
Neste mesmo caso, se o construtor estiver de má-fé e a construção ultrapassar
consideravelmente o valor da fração invadida, adquirirá a propriedade se pagar 10 vezes o valor
da área perdida e da desvalorização e, ainda, não for possível demolir a porção invasora sem
grave prejuízo para a construção. Ex.: Terreno invadido que vale R$200.000,00; construção que
vale R$500.000,00 e não ultrapassa a vigésima parte do terreno invadido (10.000,00). Neste
caso, deverá indenizar em R$10.000,00 + desvalorização da área remanescente = total x 10.
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Quando a construção invade o prédio vizinho em porção superior a vigésima parte.


Também, neste caso, há a previsão de boa-fé e má-fé. Se o construtor age de boa-fé, ele adquire
a propriedade da porção invadida e indenizará o proprietário do terreno invadido em quantia que
corresponda a valorização que a construção terá pela invasão + indenização pelo valor da porção
invadida + desvalorização da área remanescente. Ex.: Terreno invadido que vale R$200.000,00.
Invasão foi de 50% do terreno (100.000,00). A área remanescente passou a valer (80.000,00),
tendo havido desvalorização da área remanescente de R$20.000,00. Construção que invadiu
valorizou R$80.000,00 a mais. Assim, o valor a ser pago é: 80.000 (valorização da construção)
+ 100.000 (área invadida) + 20.000 (desvalorização da área invadida) = 200.000. Se o construtor
estiver de má-fé, deverá demolir o que construiu e pagar perdas e danos em dobro.
VII) Usucapião de bens imóveis
A usucapião é a forma mais comum de aquisição originária de propriedade. Quanto a ser
feminina ou masculina a palavra, isto não altera o instituto (o Código Civil de 2002 trata como “a
usucapião” e o Código Civil de 1916 tratava como “o usucapião”. Trata-se de forma de aquisição
de propriedade ou outros direitos reais em face do decurso do tempo, condicionada a existência
de posse justa e com a observância dos requisitos de lei1.
Para que se configure o/a usucapião deve-se ter posse com a intenção de ser dono (posse
ad usucapionem), ou seja, não é somente comportar-se como se dono fosse, mas ter a intenção
de tornar-se proprietário. Esta posse deve ser mansa e pacífica, ou seja, sem oposição, deve ser
contínua (pelo prazo determinado pela lei, conforme a modalidade), nem pode conter vícios
(precária, clandestina ou violenta). Além da posse ad usucapionem, para a configuração da
usucapião, há que se ter o transcurso do lapso temporal prescrito em lei, o qual somente
começa a transcorrer quando houver posse mansa e pacífica (sem contestação e sem
interrupção). Necessário lembrar que, se a posse for violenta ou clandestina, após ano e dia dela,
convalesce o vício.
VIII) Usucapião extraordinária (art. 1.238 do CC)
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como
seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo
requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro
no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor
houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços
de caráter produtivo.

Requisitos: posse ad usucapionem e lapso temporal de 15 anos. Dispensa a existência de


justo título e boa-fé.
Redução de prazo: O prazo poderá ser reduzido para 10 anos se o imóvel for utilizado
para moradia habitual ou se tiver sido realizado obra ou serviço de caráter produtivo.
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Direito Civil - Coisas

IX) Usucapião ordinária (art. 1.242 do CC)


Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e
incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.

Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido
adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório,
cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua
moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.

Requisitos: posse ad usucapionem, lapso temporal de 10 anos, justo título e boa-fé.


Redução de prazo: O prazo reduz-se para 5 anos se o imóvel tiver sido adquirido, de forma
onerosa, devidamente registrado e, posteriormente, tiver o registro cancelado e desde que os
possuidores tenham estabelecido lá sua moradia ou realizado investimentos de interesse social
e econômico.
Justo título. É um título hábil a transferir a propriedade. Não precisa ser, necessariamente,
um documento escrito, pois a sucessão hereditária é considerada justo título. STJ entende que
a promessa de compra e venda, mesmo não levada a registro, constitui-se de justo título.
Enunciado 86, Jornadas de Direito Civil - A expressão "justo título" contida nos arts. 1.242 e
1.260 do Código Civil abrange todo e qualquer ato jurídico hábil, em tese, a transferir a
propriedade, independentemente de registro. Enunciado 302, Jornadas de Direito Civil - Pode
ser considerado justo título para a posse de boa-fé o ato jurídico capaz de transmitir a posse ad
usucapionem, observado o disposto no art. 113 do Código Civil.
Boa-fé. Quando o possuidor desconhece eventuais vícios que maculam sua posse ou
quando não há vícios.
X) Usucapião especial rural
Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como
sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior
a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela
sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Esta modalidade de usucapião também é conhecida como usucapião constitucional, por ter
previsão no art. 191 da CF ou, ainda, de usucapião pro labore, por exigir produtividade.
Requisitos: posse ad usucapionem, lapso temporal incontestado e ininterrupto de 5 anos,
área rural de até 50hectares, produtividade ou moradia, não ser proprietário de outro imóvel
urbano ou rural.
XI) Usucapião especial urbana
Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinquenta metros
quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua
moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de
outro imóvel urbano ou rural.
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Direito Civil - Coisas

§ 1 o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher,


ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2 o O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo


possuidor mais de uma vez.

Também chamado de usucapião constitucional, por estar previsto na Constituição Federal,


no art. 183.
Requisitos: posse ad usucapionem, lapso temporal incontestado e ininterrupto de 5 anos,
área urbana de até 250m², usada para moradia, não ser proprietário de outro imóvel urbano ou
rural.
XII) Usucapião especial urbana por abandono do lar conjugal
Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição,
posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta
metros quadrados) cuja propriedade dívida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que
abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio
integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (Incluído pela
Lei nº 12.424, de 2011)

§ 1 o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma
vez.

Introduzido no CC pela lei que institui o programa Minha Casa Minha Vida
Requisitos: posse ad usucapionem exercida de forma direta; lapso temporal incontestado
e ininterrupto de 2 anos; área urbana de até 250m², usada para moradia (posse direta); do qual
o usucapiente seja proprietário em conjunto com ex-cônjuge ou companheiro que tenha
abandonado o lar; não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
XIII) Usucapião especial urbana coletiva
Art. 10. Os núcleos urbanos informais existentes sem oposição há mais de cinco anos e
cuja área total dividida pelo número de possuidores seja inferior a duzentos e cinquenta
metros quadrados por possuidor são suscetíveis de serem usucapidos coletivamente,
desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar
sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.

§ 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante
sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis.

§ 3o Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor,


independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo
escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas.

§ 4o O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de extinção, salvo


deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de
execução de urbanização posterior à constituição do condomínio.
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§ 5o As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão tomadas por


maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também os demais, discordantes
ou ausentes.

O Estatuto das Cidades – lei 10.257/2001 – prevê a possibilidade da usucapião especial


urbana coletiva.
Requisitos: núcleos urbanos informais (aquele clandestino, irregular ou no qual não foi
possível realizar, por qualquer modo, a titulação de seus ocupantes, ainda que atendida a
legislação vigente à época de sua implantação ou regularização); posse ad usucapionem; lapso
temporal de 5 anos; área por possuidor, inferior a 250m²; não serem os possuidores proprietários
de outro imóvel urbano ou rural.
A pretensão de usucapião dos possuidores deve ser julgada por sentença, onde o juiz irá
determinar a formação de um condomínio indivisível entre os possuidores, e a cada um caberá
uma fração ideal igual na área do terreno, independentemente da área ocupada.

XIV) Aquisição derivada


Do registro do título
A primeira forma e, talvez, mais corriqueira de aquisição derivada de propriedade seja o
registro do título. Para que a transmissão se efetive, não basta a celebração do contrato. É
necessário, também, o registro do título aquisitivo.
Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo
no Registro de Imóveis.
§ 1 o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como
dono do imóvel.
§ 2 o Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do
registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do
imóvel.

Art. 1.246. O registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao oficial
do registro, e este o prenotar no protocolo.

Art. 1.247. Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar
que se retifique ou anule.
Parágrafo único. Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel,
independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente.

Daí deriva a máxima de que “quem não registra não é dono”, pois somente o registro do
título translativo é que a propriedade será adquirida. Enquanto não houver o registro, o imóvel
continua em nome do alienante e, caso ele, agindo de má-fé, aliene o imóvel a outra pessoa e
esta leve o título ao registro, esta adquirirá a propriedade e, o primeiro adquirente apenas poderá
demandar a responsabilização civil do alienante.
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Da sucessão hereditária de bens imóveis


Segundo o art. 1.784, CC, no exato instante da morte do proprietário, seus bens, sua
herança, transmite-se aos herdeiros. Esta transmissão ocorre como um todo, unitário e indivisível
(art. 1.791, CC), e há a necessidade de realização da partilha da herança entre os herdeiros e o
registro dos formais de partilha para que se efetive a transmissão da propriedade no Registro de
Imóveis e reste regularizada a propriedade. Contudo, desde a morte do autor da herança, seus
bens já são de propriedade dos sucessores (embora não tenha havido, ainda, a individualização
dos bens ou quotas parte).

Questões Exames Anteriores


1) (XXVIII EXAME) Aline manteve união estável com Marcos durante 5 (cinco) anos, época em
que adquiriram o apartamento de 80 m² onde residiam, único bem imóvel no patrimônio de
ambos. Influenciado por tormentosas discussões, Marcos abandonou o apartamento e a cidade,
permanecendo Aline sozinha no imóvel,
sustentando todas as despesas deste. Após
3 (três) anos sem notícias de seu paradeiro,
Marcos retornou à cidade e exigiu sua
meação no imóvel. Sobre o caso concreto,
assinale a afirmativa correta.
a) Marcos faz jus à meação do imóvel em
eventual dissolução de união estável.
b) Aline poderá residir no imóvel em razão do
direito real de habitação.
c) Aline adquiriu o domínio integral, por meio
de usucapião, já que Marcos abandonou o
imóvel durante 2 (dois) anos.
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Direito Civil - Coisas

d) Aline e Marcos são condôminos sobre o bem, o que impede qualquer um deles de adquiri-lo
por usucapião.

2) (XXVI EXAME) Diante da crise que se abateu sobre seus negócios, Eriberto contrai
empréstimo junto ao seu amigo Jorge, no valor de R$ 200.000,00, constituindo, como garantia,
hipoteca do seu sítio, com vencimento em 20 anos. Esgotado o prazo estipulado e diante do não
pagamento da dívida, Jorge decide executar a hipoteca, mas vem a saber que o imóvel foi
judicialmente declarado usucapido por Jonathan, que o ocupava de forma mansa e pacífica para
sua moradia durante o tempo necessário para ser reconhecido como o novo proprietário do bem.
Diante do exposto, assinale a opção correta.
a) Como o objeto da hipoteca não pertence mais a Eriberto, a dívida que ele tinha com Jorge
deve ser declarada extinta.
b) Se a hipoteca tiver sido constituída após o início da posse ad usucapionem de Jonathan, o
imóvel permanecerá hipotecado mesmo após a usucapião, em respeito ao princípio da
ambulatoriedade.
c) Diante da consumação da usucapião, Jorge tem direito de regresso contra Jonathan, haja
vista que o bem usucapido era objeto de sua garantia.
d) Sendo a usucapião um modo de aquisição originária da propriedade, Jonathan pode adquirir
a propriedade do imóvel livre da hipoteca que Eriberto constituíra em favor de Jorge.
3) (XXV EXAME) Jonas trabalha como caseiro da casa de praia da família Magalhães, exercendo
ainda a função de cuidador da matriarca Lena, já com 95 anos. Dez dias após o falecimento de
Lena, Jonas tem seu contrato de trabalho extinto pelos herdeiros. Contudo, ele permanece
morando na casa, apesar de não manter qualquer outra relação jurídica com os herdeiros, que
também já não frequentam mais o imóvel e permanecem incomunicáveis. Jonas decidiu, por sua
própria conta, fazer diversas modificações na casa: alterou a pintura, cobriu a garagem (que
passou a alugar para vizinhos) e ampliou a churrasqueira. Ele passou a dormir na suíte principal,
assumiu as despesas de água, luz, gás e telefone, e apresentou-se, perante a comunidade,
como “o novo proprietário do imóvel”. Doze anos após o falecimento de Lena, seu filho Adauto
decide retomar o imóvel, mas Jonas se recusa a devolvê-lo. A partir da hipótese narrada, assinale
a afirmativa correta.
a) Jonas não pode usucapir o bem, eis que é possuidor de má-fé.
b) Adauto não tem direito à ação possessória, eis que o imóvel estava abandonado.
c) Jonas não pode ser considerado possuidor, eis que é o caseiro do imóvel.
d) Na hipótese indicada, a má-fé de Jonas não é um empecilho à usucapião.
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4) (XXIV EXAME) Quincas adentra terreno vazio e, de forma pública, passa a construir ali a sua
moradia. Após o exercício ininterrupto da posse por 17 (dezessete) anos, pleiteia judicialmente
o reconhecimento da propriedade do bem pela usucapião. Durante o processo, constatou-se que
o imóvel estava hipotecado em favor de Jovelino, para o pagamento de numerários devidos por
Adib, proprietário do imóvel. Com base nos fatos apresentados, assinale a afirmativa correta.
a) A hipoteca existente em benefício de Jovelino prevalece sobre eventual direito de Quincas,
tendo em vista o princípio da prioridade no registro.
b) A hipoteca é um impeditivo para o reconhecimento da usucapião, tendo em vista a função
social do crédito garantido.
c) Como a usucapião é modo originário de aquisição da propriedade, a hipoteca não é capaz de
impedir a sua consumação.
d) Quincas pode adquirir, pela usucapião, o imóvel em questão, porém ficará com o ônus de
quitar o débito que a hipoteca garantia.

Gabarito
1) C
2) D
3) D
4) C
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4. Direitos Reais. Propriedade: Disposições Gerais,


Descoberta, Formas De Aquisição Da Propriedade
Imóvel

Prof. Maitê Damé


@maitedame

4.1. Formas de aquisição da propriedade móvel. Formas originárias e derivadas


A aquisição da propriedade móvel pode se dar, assim como da propriedade imóvel, por
aquisição originária e derivada. São formas de aquisição da propriedade móvel: usucapião,
ocupação, achado de tesouro, tradição, especificação, confusão, comissão (comistão) e
adjunção.

4.1.1. Usucapião de bens móveis (arts. 1.260 a 1.262 do CC).


Os bens móveis também são sujeitos a aquisição originária através da usucapião. Existem
duas formas de usucapião: ordinária e extraordinária.
Art. 1.260. Aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente
durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a propriedade.

Art. 1.261. Se a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, produzirá usucapião,
independentemente de título ou boa-fé.

Art. 1.262. Aplica-se à usucapião das coisas móveis o disposto nos arts. 1.243 e 1.244.

4.1.2. Usucapião ordinária.


Prevista no art. 1.260, CC, exige posse ad usucapionem, lapso temporal de 3 anos, justo
título e boa-fé.

4.1.3. Usucapião extraordinária.


Prevista no art. 1.261, CC, exige posse ad usucapionem, lapso temporal de 5 anos. Não
exige justo título e nem boa-fé.

4.1.4. Ocupação
Art. 1.263. Quem se assenhorear de coisa sem dono para logo lhe adquire a propriedade,
não sendo essa ocupação defesa por lei.

É quando alguém toma para si coisa que não tem dono, adquirindo, assim, sua propriedade.
Tanto pode ser objeto da ocupação uma coisa sem dono, como, também, uma coisa
abandonada. O requisito mais importante desta forma aquisitiva é a “coisa sem dono”. Ex.:
alguém que pesca um peixe no rio, adquire-lhe a propriedade.
1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
Direito Civil - Coisas

Havendo dono, é coisa perdida. Ex.: alguém que encontra um livro e pega para si. Neste
caso, alguém esqueceu ou perdeu.
Se a coisa é sem dono, há justo título. Se a coisa é perdida ou esquecida (tem dono), não
há justo título (achado de coisa perdida = descoberta – art. 1.233, CC).

4.1.5. Achado do tesouro (arts. 1.264 a 1.266 do CC).


Art. 1.264. O depósito antigo de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória,
será dividido por igual entre o proprietário do prédio e o que achar o tesouro casualmente.

Art. 1.265. O tesouro pertencerá por inteiro ao proprietário do prédio, se for achado por
ele, ou em pesquisa que ordenou, ou por terceiro não autorizado.

Art. 1.266. Achando-se em terreno aforado, o tesouro será dividido por igual entre o
descobridor e o enfiteuta, ou será deste por inteiro quando ele mesmo seja o descobridor.

Aquele que achar coisas de valor, preciosas, tesouros, que estejam ocultas e que não se
sabe ou não se tem memória de quem seja seu dono, adquire metade dos bens, pois a outra
metade é do proprietário do prédio onde o tesouro foi encontrado. Ex.: um pedreiro que está
demolindo uma parede e encontra uma pepita de ouro no meio dos tijolos.
Se o próprio proprietário do terreno ou prédio encontrar o tesouro (ou alguém a seu mando),
adquirirá a propriedade de todo o achado.
Por fim, o art. 1.266, CC regula o achado em terreno aforado. O aforamento refere-se a
enfiteuse, instituto que passou a ser proibido pelo CC/2002. Contudo, ainda existem enfiteuses
de Marinha, em terras na costa brasileira. Nestas situações há a divisão em domínio direto e
domínio útil. O domínio direito fica nas mãos do proprietário das terras e o domínio útil nas mãos
do enfiteuta. Este último poderá usar, fruir, dispor e reivindicar o bem, pagando um foro ou
laudêmio. O tesouro será dividido por igual entre o descobridor e o enfiteuta ou integralmente
deste último se ele for o descobridor.

4.1.6. Da especificação (arts. 1.269 a 1.271 do CC)


Art. 1.269. Aquele que, trabalhando em matéria-prima em parte alheia, obtiver espécie
nova, desta será proprietário, se não se puder restituir à forma anterior.

Art. 1.270. Se toda a matéria for alheia, e não se puder reduzir à forma precedente, será
do especificador de boa-fé a espécie nova.

§ 1 o Sendo praticável a redução, ou quando impraticável, se a espécie nova se obteve


de má-fé, pertencerá ao dono da matéria-prima.

§ 2 o Em qualquer caso, inclusive o da pintura em relação à tela, da escultura, escritura e


outro qualquer trabalho gráfico em relação à matéria-prima, a espécie nova será do
especificador, se o seu valor exceder consideravelmente o da matéria-prima.

Art. 1.271. Aos prejudicados, nas hipóteses dos arts. 1.269 e 1.270, se ressarcirá o dano
que sofrerem, menos ao especificador de má-fé, no caso do § 1 o do artigo antecedente,
quando irredutível a especificação.
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Direito Civil - Coisas

Ocorre especificação quando alguém, por seu trabalho, altera a coisa, transformando-a em
outra. Ex.: artista que transforma mármore em obra de arte. Assim, se a matéria-prima (mármore)
pertence ao artista (chamado de especificador), a obra de arte (escultura) por ele desenvolvida
lhe pertence.
A questão é saber quando a matéria-prima não pertence total ou parcialmente ao
especificador. O art. 1269 estabelece que se a matéria-prima pertence parcialmente a
terceiro, o especificador adquire a propriedade.
Se a matéria-prima for totalmente alheia, o art. 1270 determina que o especificador de
boa-fé adquire a propriedade da espécie nova, desde que não possa desfazê-la, reconstituindo
a matéria ao estado anterior. Se for possível desfazer, o dono da matéria a reaverá. Não sendo
possível e tendo o especificador agido de má-fé, o dono da matéria adquire a propriedade da
espécie nova. Contudo, se o valor da espécie nova ultrapassar consideravelmente o valor da
matéria-prima, o especificador adquire a propriedade.
O proprietário da matéria-prima tem direito a ser indenizado pelos prejuízos sofridos.

4.1.7. Da confusão, da comistão/comissão e da adjunção (arts. 1.272 a 1.274 do CC)


Art. 1.272. As coisas pertencentes a diversos donos, confundidas, misturadas ou
adjuntadas sem o consentimento deles, continuam a pertencer-lhes, sendo possível
separá-las sem deterioração.

§ 1 o Não sendo possível a separação das coisas, ou exigindo dispêndio excessivo,


subsiste indiviso o todo, cabendo a cada um dos donos quinhão proporcional ao valor da
coisa com que entrou para a mistura ou agregado.

§ 2 o Se uma das coisas puder considerar-se principal, o dono sê-lo-á do todo, indenizando
os outros.

Art. 1.273. Se a confusão, comissão ou adjunção se operou de má-fé, à outra parte caberá
escolher entre adquirir a propriedade do todo, pagando o que não for seu, abatida a
indenização que lhe for devida, ou renunciar ao que lhe pertencer, caso em que será
indenizado.

Art. 1.274. Se da união de matérias de natureza diversa se formar espécie nova, à


confusão, comissão ou adjunção aplicam-se as normas dos arts. 1.272 e 1.273.

Confusão é a mistura de substâncias, formando um líquido homogêneo. Comistão é a


mistura que forma um sólido homogêneo. Adjunção é a justaposição entre duas susbstâncias2.
Quando estas substâncias pertencem ao manipulador, lhes pertence o resultado/produto,
mas quando não lhes pertence, necessário considerar que:
Sendo possível a separação das substâncias, sem deterioração, cada uma segue
pertencendo ao seu dono. Se a separação não for possível ou ainda que seja, torne-se
1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
Direito Civil - Coisas

dispendiosa, o produto – considerado indivisível – pertencerá aos donos das substâncias, em


condomínio, em fração proporcional ao valor da substância que lhe pertence.
Podendo-se considerar uma das coisas como principal, seu dono adquire a propriedade,
indenizando os demais. Ex.: cola e madeira para montar uma estante. A madeira é considerada
a matéria-prima principal e, portanto o dono da madeira adquire a propriedade da coisa, devendo
indenizar o proprietário da cola.
Havendo má-fé por parte daquele que mistura as substâncias alheias, o prejudicado pode
escolher entre adquirir a propriedade da coisa, pagando o que não for seu, deduzido do valor
que lhe pertence ou, então, renunciar ao bem que lhe pertencia e passou a formar um novo.
Neste último caso, receberá indenização do valor do bem móvel cuja propriedade renunciou.

4.1.8. Da tradição
Art. 1.267. A propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da
tradição.

Parágrafo único. Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir pelo


constituto possessório; quando cede ao adquirente o direito à restituição da coisa, que se
encontra em poder de terceiro; ou quando o adquirente já está na posse da coisa, por
ocasião do negócio jurídico.

Art. 1.268. Feita por quem não seja proprietário, a tradição não aliena a propriedade,
exceto se a coisa, oferecida ao público, em leilão ou estabelecimento comercial, for
transferida em circunstâncias tais que, ao adquirente de boa-fé, como a qualquer pessoa,
o alienante se afigurar dono.

§ 1 o Se o adquirente estiver de boa-fé e o alienante adquirir depois a propriedade,


considera-se realizada a transferência desde o momento em que ocorreu a tradição.

§ 2 o Não transfere a propriedade a tradição, quando tiver por título um negócio jurídico
nulo.

A propriedade de coisas móveis transfere-se pela tradição/entrega da coisa, que pode ser
real (entrega da própria coisa), simbólica (entrega de algo que simbolize a coisa) ou ficta (que se
dá por presunção, por possuir a coisa em nome alheio e passar a pertencer em nome próprio).
Quanto ao art. 1267, Tartuce3 afirma que se entende por tradição:
– Quando o transmitente continua a possuir pelo constituto possessório (tradição ficta).

– Quando o transmitente cede ao adquirente o direito à restituição da coisa, que se


encontra em poder de terceiro (tradição simbólica – traditio longa manu).

– Quando o adquirente já está na posse da coisa, por ocasião do negócio jurídico (tradição
ficta – tradição brevi manu).
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Direito Civil - Coisas

O art. 1268 determina que a tradição feita por terceiro que detém a coisa, mas não é
proprietário, não aliena a propriedade (traditio a non domino). Seria ineficaz tal alienação (terceiro
degrau da escala ponteana). Existe a exceção, prevista na parte final do caput, que se refere as
situações em que a coisa é ofertada em leilão, aparentando que o alienante seja o dono.

4.1.9. Da sucessão hereditária de bens móveis


Como a herança é transmitida como um todo unitário e indivisível, desde o óbito, não
importando se trata-se de bens móveis ou imóveis, deve-se considerar que a sucessão
hereditária é forma de aquisição derivada de bens móveis.

4.2. Perda da propriedade imóvel e móvel


Embora considere-se perpétuo o direito de propriedade, transmitindo-se com a morte do
titular aos seus herdeiros, existem modos de perder a propriedade, previstos no art. 1275, CC.
Art. 1.275. Além das causas consideradas neste Código, perde-se a propriedade: I - por
alienação; II - pela renúncia; III - por abandono; IV - por perecimento da coisa; V - por
desapropriação.

Parágrafo único. Nos casos dos incisos I e II, os efeitos da perda da propriedade imóvel
serão subordinados ao registro do título transmissivo ou do ato renunciativo no Registro
de Imóveis.

Art. 1.276. O imóvel urbano que o proprietário abandonar, com a intenção de não mais o
conservar em seu patrimônio, e que se não encontrar na posse de outrem, poderá ser
arrecadado, como bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade do Município ou à
do Distrito Federal, se se achar nas respectivas circunscrições.

§ 1 o O imóvel situado na zona rural, abandonado nas mesmas circunstâncias, poderá ser
arrecadado, como bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade da União, onde
quer que ele se localize.

§ 2 o Presumir-se-á de modo absoluto a intenção a que se refere este artigo, quando,


cessados os atos de posse, deixar o proprietário de satisfazer os ônus fiscais.

A) Alienação
Por esta forma, ao mesmo tempo em que a propriedade é adquirida (por aquisição
derivada) por aquele que “compra”, é perdida por aquele que “vende”. Ex.: contrato de compra e
venda; troca/permuta; doação.
No caso de imóveis, há a necessidade de registro no Cartório de Registro de Imóveis para
efetivar a transmissão e, no caso de móveis, há a necessidade da tradição.
B) Renúncia
Ocorre quando o proprietário abre mão do seu direito. Ex.: renúncia da herança – art. 1804
e seguintes do CC. Para a eficácia da renúncia de bem imóveis, há que se ter o registro do título
renunciativo.
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Direito Civil - Coisas

C) Abandono
Ocorre quando o dono abandona a coisa, deixa ela com a intenção de não a ter mais para
si. Também chamada de derrelicção, ou seja, ato praticado com a intenção de perder a
propriedade. A propriedade originária da coisa abandonada pode ser adquirida por ocupação
(móveis) ou por usucapião (móveis ou imóveis).
O art. 1276, § 2.º, CC estabelece, quanto aos bens imóveis, que haverá presunção do
abandono quando o proprietário, além da derrelicção, parar de pagar os impostos referentes ao
imóvel.
D) Perecimento da coisa
Ocorre quando a coisa, o bem, é perdido, ou seja, quando algum fenômeno excluir o objeto
do direito de propriedade do mundo fático. Ex.: uma casa que é demolida; um quadro que pega
fogo; o colar da Rose, jogado em alto mar em Titanic. Os direitos de propriedade sobre esses
bens são perdidos.
E) Desapropriação
Ocorre quando o poder público, por necessidade, finalidade púbica ou interesse social
adquire a propriedade através do pagamento de justa e prévia indenização. A desapropriação é
revista no art. 5.º, XXIV, da CF. A desapropriação independe da vontade do proprietário,
podendo, apenas, discutir o valor da indenização.

4.3. Direito de vizinhança


Os direitos de vizinhança são limites impostos ao exercício da propriedade, tendo em vista
a convivência social e que se relacionam aos limites, as linhas que separam os prédios vizinhos.
A vizinhança pode causar conflitos, assim, o exercício de um direito sobre o próprio prédio pode
refletir no prédio vizinho, como, por exemplo, a abertura de uma janela.

4.3.1. Uso da propriedade


Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as
interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam,
provocadas pela utilização de propriedade vizinha.

Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização,


a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e
os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança.

Art. 1.278. O direito a que se refere o artigo antecedente não prevalece quando as
interferências forem justificadas por interesse público, caso em que o proprietário ou o
possuidor, causador delas, pagará ao vizinho indenização cabal.
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Direito Civil - Coisas

O proprietário de uma coisa/prédio não pode usar de sua propriedade de forma a impedir
ou limitar o exercício da propriedade por parte do prédio vizinho. Desta forma, o art. 1.277, CC
permite que o proprietário de um prédio faça cessar as interferências prejudiciais a utilização da
sua propriedade.
Existe, portanto, uma proibição ao uso nocivo da propriedade, que importa em perturbação
da segurança, do sossego ou da saúde dos vizinhos4. Pode-se usar como exemplos deste uso
nocivo da propriedade: um prédio encravado, onde o prédio vizinho impeça a passagem para a
via pública; a construção realizada no prédio vizinho que impeça o acesso a água em uma
propriedade rural; construção no prédio vizinho que impeça o acesso a luz solar; terreno ou
imóvel em que mantém água parada e verifica-se a proliferação de mosquito da dengue; enfim,
são situações que a realização de obras – ou o próprio exercício da propriedade – em um imóvel
provocam danos ao prédio vizinho.
De se observar que essa proteção trazida pelo art. 1.277, CC é conferida tanto ao
proprietário como, também, ao possuidor que podem se utilizar de medidas variadas
(responsabilidade civil, obrigação de não fazer, nunciação de obra nova, etc) para fazer cessar
a interferência. Estas proibições de interferências levarão em conta a utilização e localização do
prédio, limites ordinários e tolerância dos moradores da vizinhança.
O art. 1.278, CC, por sua vez, determina que não prevalece o direito de fazer cessar a
interferência, se as mesmas forem justificadas por interesse público. Em uma situação como
esta, haverá o dever, por parte do proprietário do prédio que causa o dano, de indenizar o vizinho.
Ex.: construção de açudes que invadem parte da propriedade vizinha, passagem de rede elétrica.
Sempre que for possível, o vizinho poderá exigir a redução ou eliminação das interferências,
ainda que por decisão judicial devam ser toleradas – art. 1.279, CC. Ex.: foi tolerada a construção
do açude, mas o mesmo secou e, neste caso, o proprietário pode recuperar o uso da sua
propriedade.
Quando o prédio ameaçar ruína, o proprietário o prédio vizinho pode exigir demolição ou
reparação, além de poder exigir caução pelo dano iminente. Art. 1.280, CC. Sempre que houver
iminência de dano, na construção sobre o prédio vizinho, poderá o outro exigir garantia de
eventual prejuízo (art. 1.281, CC).

4.3.2. Árvores limítrofes


Art. 1.282. A árvore, cujo tronco estiver na linha divisória, presume-se pertencer em
comum aos donos dos prédios confinantes.
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Direito Civil - Coisas

Art. 1.283. As raízes e os ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do prédio,


poderão ser cortados, até o plano vertical divisório, pelo proprietário do terreno invadido.

Art. 1.284. Os frutos caídos de árvore do terreno vizinho pertencem ao dono do solo onde
caíram, se este for de propriedade particular.

Havendo árvores sobre a linha divisória entre duas propriedades, presume-se que as
mesmas pertençam a ambos os prédios. Há casos, inclusive de que as árvores são utilizadas
como delimitação entre os terrenos. Trata-se de um condomínio necessário, de forma que
nenhum dos condôminos pode cortar a árvore sem a anuência do outro, salvo se houver perigo
de dano iminente. Art. 1.282, CC.
Toda raiz ou ramo que ultrapassar o limite da divisão, podem ser cortados pelo dono do
terreno invadido, no limite da linha divisória. Art. 1.283, CC. Trata-se do direito de corte do
proprietário do terreno que sofre a invasão dos galhos e raízes da árvore do terreno vizinho.
Obviamente que o corte não pode comprometer a vida da árvore e, ainda, devem ser observadas
as questões e legislação ambiental.
Quanto aos frutos, os que caírem para dentro do terreno vizinho e estiverem no solo,
pertencerão a este. Se os frutos caírem em uma praça, por exemplo, que é solo público,
consideram-se coisas sem dono e sua propriedade pode ser adquirida pela ocupação. Art. 1.283,
CC.

4.3.3. Passagem forçada


Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode,
mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem,
cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário.

§ 1 o Sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar


à passagem.

§ 2 o Se ocorrer alienação parcial do prédio, de modo que uma das partes perca o acesso
a via pública, nascente ou porto, o proprietário da outra deve tolerar a passagem.

§ 3 o Aplica-se o disposto no parágrafo antecedente ainda quando, antes da alienação,


existia passagem através de imóvel vizinho, não estando o proprietário deste
constrangido, depois, a dar uma outra.

Todo imóvel deve ser acessível e, em razão disto, o dono do prédio encravado – sem
acesso – pode exigir do vizinho a passagem forçada. Essa passagem será concedida pelo imóvel
mais natural e que mais facilmente se preste a passagem, mediante indenização cabal (conforme
o valor da área da passagem + a desvalorização) e o rumo (localização da passagem) será fixado
judicialmente quando não houver acordo entre as partes.
O enunciado 88 das Jornadas de Direito Civil prevê que esse direito a passagem forçada
“também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado,
consideradas, inclusive, as necessidades de exploração econômica”.
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Direito Civil - Coisas

De se observar que a passagem forçada é diferente da servidão de passagem. Esta última


é direito real e se constitui por acordo entre os proprietários de prédios vizinhos, quando um
deles seja encravado. Ademais, deve ser levado a registro no Cartório de Registro de Imóveis.
A passagem forçada é obrigatória e a servidão é facultativa.

4.3.4. Passagem de cabos e tubulações


Art. 1.286. Mediante recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização
da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu
imóvel, de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade
pública, em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou
excessivamente onerosa.

Parágrafo único. O proprietário prejudicado pode exigir que a instalação seja feita de modo
menos gravoso ao prédio onerado, bem como, depois, seja removida, à sua custa, para
outro local do imóvel.

Art. 1.287. Se as instalações oferecerem grave risco, será facultado ao proprietário do


prédio onerado exigir a realização de obras de segurança.

Ainda dentro do direito de vizinhança, existe a previsão da possibilidade de passagem


forçada de cabos e tubulações referentes a serviços de utilidade pública, pelo imóvel vizinho
quando tal passagem foi impossível ou excessivamente onerosa por outra forma. Quando da
realização dessas instalações, se houver risco grave, o proprietário do prédio serviente poderá
exigir a realização de obras de segurança.

4.3.5. Águas
Art. 1.288. O dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas que
correm naturalmente do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu fluxo;
porém a condição natural e anterior do prédio inferior não pode ser agravada por obras
feitas pelo dono ou possuidor do prédio superior.

Art. 1.289. Quando as águas, artificialmente levadas ao prédio superior, ou aí colhidas,


correrem dele para o inferior, poderá o dono deste reclamar que se desviem, ou se lhe
indenize o prejuízo que sofrer.

Parágrafo único. Da indenização será deduzido o valor do benefício obtido.

Art. 1.290. O proprietário de nascente, ou do solo onde caem águas pluviais, satisfeitas as
necessidades de seu consumo, não pode impedir, ou desviar o curso natural das águas
remanescentes pelos prédios inferiores.

Art. 1.291. O possuidor do imóvel superior não poderá poluir as águas indispensáveis às
primeiras necessidades da vida dos possuidores dos imóveis inferiores; as demais, que
poluir, deverá recuperar, ressarcindo os danos que estes sofrerem, se não for possível a
recuperação ou o desvio do curso artificial das águas.

Art. 1.292. O proprietário tem direito de construir barragens, açudes, ou outras obras para
represamento de água em seu prédio; se as águas represadas invadirem prédio alheio,
será o seu proprietário indenizado pelo dano sofrido, deduzido o valor do benefício obtido.
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Art. 1.293. É permitido a quem quer que seja, mediante prévia indenização aos
proprietários prejudicados, construir canais, através de prédios alheios, para receber as
águas a que tenha direito, indispensáveis às primeiras necessidades da vida, e, desde que
não cause prejuízo considerável à agricultura e à indústria, bem como para o escoamento
de águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagem de terrenos.

§ 1 o Ao proprietário prejudicado, em tal caso, também assiste direito a ressarcimento


pelos danos que de futuro lhe advenham da infiltração ou irrupção das águas, bem como
da deterioração das obras destinadas a canalizá-las.

§ 2 o O proprietário prejudicado poderá exigir que seja subterrânea a canalização que


atravessa áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou quintais.

§ 3 o O aqueduto será construído de maneira que cause o menor prejuízo aos proprietários
dos imóveis vizinhos, e a expensas do seu dono, a quem incumbem também as despesas
de conservação.

Art. 1.294. Aplica-se ao direito de aqueduto o disposto nos arts. 1.286 e 1.287.

Art. 1.295. O aqueduto não impedirá que os proprietários cerquem os imóveis e construam
sobre ele, sem prejuízo para a sua segurança e conservação; os proprietários dos imóveis
poderão usar das águas do aqueduto para as primeiras necessidades da vida.

Art. 1.296. Havendo no aqueduto águas supérfluas, outros poderão canalizá-las, para os
fins previstos no art. 1.293, mediante pagamento de indenização aos proprietários
prejudicados e ao dono do aqueduto, de importância equivalente às despesas que então
seriam necessárias para a condução das águas até o ponto de derivação.

Parágrafo único. Têm preferência os proprietários dos imóveis atravessados pelo


aqueduto.

Toda propriedade, para que possa cumprir com sua função social necessita ser servida de
água. Assim, considerando as situações ambientais pertinentes, o direito de vizinhança dispõe
acerca da passagem das águas. Quanto as águas, deve-se, sempre considerar, também, as
disposições ambientais respectivas.
A primeira disposição acerca das águas – art. 1.288 – diz respeito a obrigatoriedade do
prédio inferior a receber as águas naturais que correm do superior, sendo vedadas obras que
impeçam o fluxo das águas naturais. Neste caso, havendo obstrução, o proprietário do prédio
superior poderá ajuizar ações para afastar as obstruções, independentemente de eventuais
perdas e danos. Contudo, o prédio inferior também não pode ser prejudicado – com infiltrações,
por exemplo – por conta das obras feitas pelo prédio superior.
Em se tratando de águas artificiais, ou seja, colhidas pelo prédio superior e escoadas
artificialmente para o inferior, o dono do prédio inferior pode requerer que sejam elas desviadas
ou que lhe seja indenizado o prejuízo que eventualmente sofre. Desta indenização será deduzido
eventual benefício obtido (art. 1.289). Não se pode esquecer, contudo, da viabilidade da
passagem forçada de tubulações prevista nos arts. 1.286 e 1.287, CC.
O art. 1.290 prevê a situação das nascentes e do escoamento das águas pluviais entre
prédios limítrofes, determinando que o proprietário do terreno onde há a nascente pode
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abastecer-se dela para consumo, mas não pode impedir que ela corra naturalmente para os
prédios inferiores. Também não pode o proprietário poluir as águas indispensáveis aos imóveis
inferiores devendo, se for o caso, recuperá-las e, caso não seja possível deverá desviá-las ou
indenizar o proprietário dos imóveis inferiores para onde correrem as águas poluídas (art. 1.291).
O direito de vizinhança permite que o proprietário possa represar águas pela construção de
açudes e barragens. Isto, contudo, não autoriza que impeça o fluxo das águas, prejudicando o
prédio inferior com a escassez de água. Mais. Prevê o art. 1.292 que, se houver danos no prédio
inferior, este poderá exigir indenização pelos danos causados por eventual vazamento, deduzido
o valor do benefício.
O art. 1.293 regula os aquedutos, ou servidão de aquedutos, ou seja, a construção de
canais de irrigação, que passem por prédios vizinhos. O custo dessa construção será sempre do
proprietário do aqueduto. Tal possibilidade prevê, contudo, a necessidade de indenização dos
proprietários prejudicados pela passagem do canal, os quais poderão exigir que a passagem
seja subterrânea, canalizada, nas áreas edificadas e nas de pastos, hortas, jardins ou quintais.
Prevê, também, o direito dos terrenos prejudicados com eventuais infiltrações ou interrupções
provenientes do aqueduto.
Os proprietários dos imóveis por onde passarem os aquedutos poderão deles se utilizar,
podendo, também, sobre eles – quando subterrâneos – construir, devendo, contudo, observar
sua conservação. Art. 1.295, CC.
Por fim, prevê o art. 1.296 a possibilidade que outros proprietários canalizem o aqueduto
para servir suas próprias necessidades. Havendo canalização, os proprietários prejudicados
deverão ser indenizados, assim como o dono do aqueduto.

4.3.6. Limites entre prédios e do direito de tapagem


Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o
seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à
demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos
destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as
respectivas despesas.

§ 1 o Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios, tais como sebes vivas, cercas
de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, até prova em contrário,
pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade
com os costumes da localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua
construção e conservação.

§ 2 o As sebes vivas, as árvores, ou plantas quaisquer, que servem de marco divisório, só


podem ser cortadas, ou arrancadas, de comum acordo entre proprietários.

§ 3 o A construção de tapumes especiais para impedir a passagem de animais de pequeno


porte, ou para outro fim, pode ser exigida de quem provocou a necessidade deles, pelo
proprietário, que não está obrigado a concorrer para as despesas.
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Art. 1.298. Sendo confusos, os limites, em falta de outro meio, se determinarão de


conformidade com a posse justa; e, não se achando ela provada, o terreno contestado se
dividirá por partes iguais entre os prédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda, se
adjudicará a um deles, mediante indenização ao outro.

Os proprietários dos prédios vizinhos devem repartir as despesas referentes as divisas,


sendo permitida a construção, para fins de demarcação entre os imóveis, de cercas, muros, valas
ou qualquer forma de separação. Cada proprietário deve concorrer em partes iguais para a
realização dos tapumes. A divisão também pode se dar por sebe vivas (cercas vivas), árvores
ou plantas, as quais só podem ser cortadas ou arrancadas de comum acordo entre os
proprietários dos imóveis limítrofes.
Havendo a necessidade de construção de tapume para impedir a passagem de animais de
pequeno porte, as despesas correrão por conta de quem deu causa a necessidade. Ex.: imóveis
divididos por cerca viva e a necessidade de evitar que o cachorro ingresse na propriedade do
vizinho.
Se os limites forem confusos, a divisão será feita pela posse justa, conforme art. 1.298, CC
ou, então, será o terreno divido em partes iguais ou, então, adjudicado a um, mediante
indenização ao outro.
Não sendo possível estabelecer a demarcação entre os prédios vizinhos de forma
consensual entre os proprietários, qualquer deles tem legitimidade para promover Ação
Demarcatória, conforme procedimento especial previsto nos termos do art. 574 e seguintes do
CPC.

4.3.7. Direito de construir

Art. 1.299. O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver,
salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.

Art. 1.300. O proprietário construirá de maneira que o seu prédio não despeje águas,
diretamente, sobre o prédio vizinho.

Art. 1.301. É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de metro
e meio do terreno vizinho.

§ 1 o As janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória, bem como as
perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de setenta e cinco centímetros.

§ 2 o As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não
maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais
de dois metros de altura de cada piso.

Art. 1.302. O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que
se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não
poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir,
ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho.
1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
Direito Civil - Coisas

Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual for a quantidade,
altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo, levantar a sua edificação, ou
contramuro, ainda que lhes vede a claridade.

Art. 1.303. Na zona rural, não será permitido levantar edificações a menos de três metros
do terreno vizinho.

Art. 1.304. Nas cidades, vilas e povoados cuja edificação estiver adstrita a alinhamento, o
dono de um terreno pode nele edificar, madeirando na parede divisória do prédio contíguo,
se ela suportar a nova construção; mas terá de embolsar ao vizinho metade do valor da
parede e do chão correspondentes.

Art. 1.305. O confinante, que primeiro construir, pode assentar a parede divisória até meia
espessura no terreno contíguo, sem perder por isso o direito a haver meio valor dela se o
vizinho a travejar, caso em que o primeiro fixará a largura e a profundidade do alicerce.

Parágrafo único. Se a parede divisória pertencer a um dos vizinhos, e não tiver capacidade
para ser travejada pelo outro, não poderá este fazer-lhe alicerce ao pé sem prestar caução
àquele, pelo risco a que expõe a construção anterior.

Art. 1.306. O condômino da parede-meia pode utilizá-la até ao meio da espessura, não
pondo em risco a segurança ou a separação dos dois prédios, e avisando previamente o
outro condômino das obras que ali tenciona fazer; não pode sem consentimento do outro,
fazer, na parede-meia, armários, ou obras semelhantes, correspondendo a outras, da
mesma natureza, já feitas do lado oposto.

Art. 1.307. Qualquer dos confinantes pode altear a parede divisória, se necessário
reconstruindo-a, para suportar o alteamento; arcará com todas as despesas, inclusive de
conservação, ou com metade, se o vizinho adquirir meação também na parte aumentada.

Art. 1.308. Não é lícito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos ou quaisquer
aparelhos ou depósitos suscetíveis de produzir infiltrações ou interferências prejudiciais
ao vizinho.

Parágrafo único. A disposição anterior não abrange as chaminés ordinárias e os fogões


de cozinha.

Art. 1.309. São proibidas construções capazes de poluir, ou inutilizar, para uso ordinário,
a água do poço, ou nascente alheia, a elas preexistentes.

Art. 1.310. Não é permitido fazer escavações ou quaisquer obras que tirem ao poço ou à
nascente de outrem a água indispensável às suas necessidades normais.

Art. 1.311. Não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço suscetível de provocar
desmoronamento ou deslocação de terra, ou que comprometa a segurança do prédio
vizinho, senão após haverem sido feitas as obras acautelatórias.

Parágrafo único. O proprietário do prédio vizinho tem direito a ressarcimento pelos


prejuízos que sofrer, não obstante haverem sido realizadas as obras acautelatórias.

Art. 1.312. Todo aquele que violar as proibições estabelecidas nesta Seção é obrigado a
demolir as construções feitas, respondendo por perdas e danos.

Art. 1.313. O proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o vizinho entre
no prédio, mediante prévio aviso, para:
1ª FASE OAB XXXV Exame de Ordem
Direito Civil - Coisas

I - dele temporariamente usar, quando indispensável à reparação, construção,


reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório;

II - apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente.

§ 1 o O disposto neste artigo aplica-se aos casos de limpeza ou reparação de esgotos,


goteiras, aparelhos higiênicos, poços e nascentes e ao aparo de cerca viva.

§ 2 o Na hipótese do inciso II, uma vez entregues as coisas buscadas pelo vizinho, poderá
ser impedida a sua entrada no imóvel.

§ 3 o Se do exercício do direito assegurado neste artigo provier dano, terá o prejudicado


direito a ressarcimento.

O proprietário tem o direito de construir sobre seu terreno devendo, contudo, respeitar os
direitos de vizinhanças e as normas relativas a edificação e ocupação do solo (plano diretor do
município). Nesta construção, não poderá despejar água no terreno vizinho. Qualquer construção
que extrapole os limites do direito de vizinhança poderá ser atacada através de ação
demolitória, através de procedimento comum ou nunciação de obra nova, por exemplo.
As construções de janelas, terraços, varandas devem observar a distância mínima de 1,5m
da divisa do terreno vizinho, para respeitar a privacidade entre os confinantes. Se a janela não
for voltada para a linha divisória, a distância será de 0,75m (75cm) 5. Este regramento não se
aplica a aberturas de luz ou ventilação com tamanho entre 10cm largura e 20cm de comprimento,
que sejam construídas a mais de 2m de altura do piso. Esse regramento visa a proteção do
direito a intimidade e vida privada das pessoas, tratando-se de uma espécie de limitação,
restrição legal ao direito de propriedade.
É permitida, pela súmula 120 do STF a construção de parede de tijolo de vidro, pois não
viola a privacidade do vizinho.
O vizinho que se incomodar com a construção de janela, terraço, sacada, tem prazo
decadencial de ano e dia para o desfazimento da mesma, contado da conclusão da obra (art.
1.302, CC). Caso de ação demolitória.
Na zona rural, a exigência de distância é de 3 metros para qualquer construção.
O art. 1.304, CC refere-se a possibilidade de utilizar-se da parede divisória do vizinho para
dar início a sua construção, nos casos em que as construções utilizam-se de toda a largura do
terreno, podendo o prédio vizinho, desde que a parede já existente suporte, apoiar a sua, desde
que indenize metade do valor da parede e do chão correspondente. Ex.: casarios coloniais
brasileiros. Segundo Tartuce6 é o “que se denomina como direito de travejamento ou
de madeiramento, ou seja, de colocar uma trave, viga ou madeira no prédio vizinho nos casos
em que há o referido alinhamento”.
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Na mesma linha, o art. 1.305, CC prevê a situação da “parede meia”, ou seja, paredes
divisórias, quando a construção é feita no limite dos terrenos, podendo o que primeiro construir,
utilizar-se de 50% do alicerce e construção da profundidade da parede para dentro do terreno
vizinho (meia espessura). Neste caso, o dono do outro terreno, pretendendo travejá-la, deverá
indenizar o que primeiro construiu em metade do valor da parede. As chamadas meia-paredes
podem ser utilizadas por cada condômino no limite da metade da espessura (art. 1.306, CC).
Ex.: fixação de armários.
Se, contudo, não pretender travejá-la, não poderá o dono do segundo prédio a ser
construído, “fazer-lhe alicerce ao pé sem prestar caução àquele, pelo risco a que expõe a
construção anterior. Eventualmente, caberá a ação de dano infecto para se exigir a caução” 7.
A parede divisória pode ser elevada em altura por qualquer dos condôminos e a sua custa,
a não ser que o vizinho pretenda adquirir meação da parte aumentada (art. 1.307, CC).
O art. 1.308 proíbe encostar na parede divisória lareiras, fogões, fornos ou chaminés
capazes de produzir infiltrações para o vizinho, podendo utilizar-se sempre de nunciação ou
demolição para evitar. Aqui, entende-se casos de fogões a lenha e não os fogões tradicionais de
cozinha, pela leitura do parágrafo único. Também são vedadas construções que possam poluir
ou inutilizar águas de poço ou nascente preexistentes a construção (art. 1.309, CC), bem como
a realização de escavações ou obras que retirem de poço ou nascente alheia a água para suas
necessidades (art. 1.310, CC).
Qualquer obra realizada no terreno vizinho deve observar as normas de segurança e, sendo
necessário, antes de realizar qualquer obra ou escavação no próprio terreno, necessário realizar
obras acautelatórias, a fim de evitar dano ao prédio vizinho. De toda forma, se realizada a obra
não observando-se estas cautelas, o prejudicado poderá utilizar-se de nunciação de obra nova,
ação de dano infecto ou demolitória, sem prejuízo do direito de ser indenizado, havendo danos
ao seu prédio.
O art. 1.312, CC prevê que as violações aos direitos de vizinhança através de construções
que não observem as normativas, podem ser objeto de ação de demolição, sem prejuízo das
perdas e danos.
Por fim, o art. 1.313 estabelece as situações em que o acesso de um vizinho no prédio do
outro deve ser tolerado, mediante aviso prévio: a) dele temporariamente usar, quando
indispensável à reparação, construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro
divisório, corte de árvores ou cercas vivas, reparo e limpeza de esgotos, goteiras, poços, etc; b)
apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente (exemplo: bola
de futebol dos filhos que “teima” em passar para o pátio do vizinho). Neste caso, o vizinho pode
autorizar a entrada ou, então, devolver o objeto.
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Questões Exames Anteriores


1) (XXVI EXAME) Ronaldo é proprietário de um terreno que se encontra cercado de imóveis
edificados e decide vender metade dele para Abílio. Dois anos após o negócio feito com Abílio,
Ronaldo, por dificuldades financeiras, descumpre o que havia sido acordado e constrói uma casa
na parte da frente do terreno – sem deixar passagem aberta para Abílio – e a vende para José,
que imediatamente passa a habitar o imóvel. Diante do exposto, assinale a afirmativa correta.
a) Abílio tem direito real de servidão de passagem pelo imóvel de José, mesmo contra a vontade
deste, com base na usucapião.
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b) A venda realizada por Ronaldo é nula, tendo em vista que José não foi comunicado do direito
real de servidão de passagem existente em favor de Abílio.
c) Abílio tem direito a passagem forçada pelo imóvel de José, independentemente de registro,
eis que seu imóvel ficou em situação de encravamento após a construção e venda feita por
Ronaldo.
d) Como não participou da avença entre Ronaldo e Abílio, José não está obrigado a conceder
passagem ao segundo, em função do caráter personalíssimo da obrigação assumida.

Gabarito
1) C
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5. Condomínio

Prof. Maitê Damé


@maitedame

Quando houver mais de um titular sobre o mesmo direito de propriedade, cada um com
uma fração ideal sobre a mesma coisa, haverá condomínio ou copropriedade. São três as
espécies de condomínio: voluntário (decorrente da vontade dos proprietários), necessário
(decorrente da lei, em função da indivisibilidade da coisa) e edilício (condomínio de unidades
autônomas, com partes comuns).
5.1. Condomínio voluntário ou convencional
O condomínio voluntário ou convencional decorre de instituição das partes, por contrato,
quando duas pessoas adquirem juntos um imóvel; ou por negócio unilateral, através de doação
ou herança, quando os herdeiros recebem de herança do pai uma Fazenda. Na instituição do
condomínio voluntário é possível a determinação de que a coisa permaneça em comum por
prazo não superior a 5 anos, podendo haver prorrogação (art. 1.320, § 1.º, CC), ocorrendo da
mesma maneira a instituição do condomínio através de doação (§ 2.º). O § 3.º prevê a
possibilidade de que o juiz determine a extinção/divisão deste condomínio a qualquer, sempre
que houverem razões graves para determiná-la.
Cada condômino tem direito a uma parte ideal do bem, sem localização (parcela ideal e
não parcela material). Significa dizer que cada condômino terá uma fração determinada (50%,
30%, 5%, etc) do bem. Não havendo estabelecimento, presume-se que cada condômino seja
titular de uma porção igual a dos demais. Ex.: 3 condôminos, onde cada um tem 33,3333% de
titularidade. Mas esta presunção é relativa. Art. 1.315, CC. E cada condômino pode usar e gozar
da coisa, mas não pode excluir o igual direito dos demais condôminos. Tartuce8 afirma que “fica
claro que cada condômino tem a propriedade plena e total sobre a coisa, o que é limitado pelos
direitos dos demais”. Pode, inclusive reaver a coisa que esteja em poder de terceiro. Art. 1.314,
CC.
É possível que um condômino utilize a coisa sozinho, mas neste caso deverá pagar uma
“indenização pela utilização exclusiva do bem”, como se fosse um aluguel (embora não seja a
expressão mais apropriada). Além disto, tanto no uso comum ou individual, a destinação da coisa
deve ser observada, de forma que não pode um imóvel residencial ser utilizado para fins
comerciais.
Entre os condôminos existe o direito de preferência, previsto pelo art. 504, CC:
Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se
outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento
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da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o


requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.

Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior
valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a
parte vendida os comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço.

Também nesse sentido é a determinação do art. 1.322, CC, referindo-se ao condomínio


indivisível o direito de preferência dos condôminos, em iguais condições de oferta, a terceiros.
Havendo vários condôminos, o que tiver realizado benfeitorias de maior valor ou, então, tiver
maior parte terá preferência na aquisição. Se nenhum dos condôminos estiver nessa situação,
será feita a licitação da coisa, com oferta de propostas sigilosas, adquirindo aquela que ofertar
maior valor.
Sobre a questão do direito de preferência no condomínio, necessário deixar claro que
embora a previsão dos dispositivos diga respeito a condomínio indivisível, a posição do STJ é
no sentido de aplicação da preferência, também ao condomínio de bem divisível. Nesse sentido,
Tartuce9 manifesta-se que:
Assim, a jurisprudência superior acabou por acompanhar posição contrária daqueles que
participaram da IV Jornada de Direito Civil, inclusive a deste autor, honrosamente citado
no último decisum. Desse modo, para os devidos fins práticos, no caso de o condomínio
ser pro indiviso e o bem indivisível ou mesmo divisível, cada condômino só pode vender
sua parte a estranhos se antes oferecer aos outros condôminos. Tal situação poderá
abranger tanto os bens móveis quanto os imóveis.

Em caso de alienação a terceiro, sem ser dado o exercício do direito de preferência, esse
direito deve ser exercido dentro do prazo de 180 dia, a contar da ciência da venda, requerendo
a adjudicação para si da quota alienada a terceiro.
Quando houverem dívidas provenientes do condomínio, cada um dos condôminos
responde por sua quota-parte, podendo eximir-se do pagamento, desde que renuncie a sua
fração (art. 1.316, CC). Contudo, se algum dos condôminos contrair dívida sozinho, em nome do
condomínio, este é que responderá pelas mesmas. Terá ele, contudo, direito de regresso contra
os demais.
Cada condômino tem direito a participação quanto aos frutos da coisa comum, em
percentual que equivalha a sua quota-parte. Não pode um condômino locar a coisa a terceiro
sem a anuência dos demais.
Os arts. 1.323 a 1.326, CC estabelecem a forma de administração do condomínio
voluntário, que será exercida por um dos condôminos, havendo consenso ou, então, por
administrador, que poderá ser estranho ao condomínio, mas que dependerá de deliberação por
maioria. O cálculo da maioria é realizada pelo quinhão dos condôminos e a deliberação deve ser
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realizada por maioria absoluta, ou seja, da totalidade dos condôminos e não dos presentes na
deliberação.
O condomínio voluntário pode ser desfeito a qualquer tempo. Nos termos do art. 1.319, CC
é lícito que o condômino exija a divisão da coisa comum sempre que for possível tal intento (há
condomínios que são indivisíveis por natureza), e cada condômino deverá responder pelas
despesas de divisão de sua parte.
Para a extinção/dissolução/divisão do condomínio, devem ser aplicadas as regras de
partilha de herança, previstas nos arts. 2.013 a 2.022 do CC (art. 1.321, CC) à ação de divisão
de condomínio. Esta ação de divisão está prevista no CPC nos procedimentos especiais, art.
569 e seguintes.
Neste caso, sendo a coisa divisível ela será dividida e, para tanto, poderá ser necessária
realização de perícia para determinar/propor a forma de divisão. Não sendo possível a divisão,
deverá haver a alienação da coisa e repartido entre os condôminos o valor, sempre que um deles
não pretender adquirir a parte do outro

5.2. Condomínio legal ou necessário


O condomínio necessário é o que deriva de determinação legal, sendo chamado, então, de
condomínio forçado. Sua caracterização mais corriqueira se dá pelas paredes, cercas, muros e
valas divisórias das propriedades, remetendo, portanto, às normas do direito de vizinhança (art.
1.327, CC).
Assim, pode o proprietário de um imóvel realizar a obra de divisão, mas deverá cientificar
o proprietário lindeiro. Neste caso, deverão dividir as despesas e, caso não haja consenso, será
arbitrado o valor por peritos (art. 1.329, CC). Também pode o proprietário do terreno vizinho
adquirir a meação da cerca ou muro divisório, pagado àquele que fez a obra, a metade do valor
atual dela (art. 1.328, CC) e, enquanto não pagar, não poderá fazer uso da parede ou muro
divisório (art. 1.330, CC).

5.3. Condomínio edilício


O condomínio edilício é tratado pelo CC do art. 1.331 a 1358 e é assim considerado aquele
condomínio formado por unidades autônomas, pois existem condomínios considerados edilícios
e que são apenas loteamentos e não edifícios. Nesta modalidade, a propriedade é dividida em
planos horizontais, utilizando-se o solo e subindo para o “céu”.
O condomínio edilício é composto de partes comuns e partes individuais (art. 1.331, CC).
As partes individuais, são as unidades autônomas (apartamentos, salas, escritórios, lojas, etc).
No caso de um edifício de apartamentos, cada unidade, cada apartamento, é considerado a
fração real, ou seja, pode esta fração ser alienada independentemente do exercício do direito de
preferência previsto no art. 504, CC. Significa dizer que se o proprietário de um apartamento em
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um condomínio edilício resolver alienar seu imóvel, não necessitará notificar os demais
condôminos.
Contudo, o box de garagem só pode ser alienado ou alugado a pessoa estranha ao
condomínio se houver autorização da convenção de condomínio. Neste sentido, prevê o art.
1.339, CC:
Art. 1.339. Os direitos de cada condômino às partes comuns são inseparáveis de sua
propriedade exclusiva; são também inseparáveis das frações ideais correspondentes as
unidades imobiliárias, com as suas partes acessórias.

§ 1 o Nos casos deste artigo é proibido alienar ou gravar os bens em separado.

§ 2 o É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro


condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do
condomínio, e se a ela não se opuser a respectiva assembleia geral.

O box acaba sendo considerado como acessória, sendo possível a alienação a outro
condômino, desde que não haja vedação pela assembleia geral.
Com relação a área comum: solo, telhado, áreas comuns do condomínio (garagem, saguão,
etc), estas não podem ser alienadas em separado, pois constituem o todo condominial, havendo
fixação de uma fração ideal, em percentual para cada unidade autônoma, quanto ao solo e
quanto as áreas comuns edificadas. Estas são objeto, portanto, de copropriedade. O terraço
entende-se, como regra, sendo de área comum, salvo existência de disposição condominial que
estabeleça pertencer a apenas uma ou alguma das unidades. Nenhuma unidade autônoma pode
ficar sem acesso a via pública, nem sem elevador, mesmo que inadimplentes com o condomínio.
Há que se destacar o entendimento do STJ, firmado na jurisprudência em teses (edição 68,
n.16 – TESE DO STJ), no sentido de que é possível a reforma e utilização exclusiva de área
comum do condomínio, desde que haja autorização da assembleia geral. Tartuce 10 usa como
exemplo “nos prédios com um apartamento por andar, o uso do hall do elevador privativo da
unidade”.
Também importante mencionar que outra TESE DO STJ é no sentido de que na relação
entre condomínio e condôminos não se aplicam as normas do CDC (edição 68, n.10): “10) Nas
relações jurídicas estabelecidas entre condomínio e condôminos não incide o Código de Defesa
do Consumidor – CDC”.
Embora existam discussões doutrinárias e jurisprudenciais, o condomínio é considerado
um ente despersonalizado, ou seja, não é uma pessoa jurídica.
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5.3.1. Instituição, constituição e regulamentação do condomínio edilício

O art. 1.332, CC estabelece que o condomínio edilício pode ser instituído por ato intervivos
ou por testamento, devendo ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis, onde deverá
constar: a) a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva,
estremadas uma das outras e das partes comuns; b) a determinação da fração ideal atribuída a
cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; c) o fim a que as unidades se destinam.
Já a regulamentação do condomínio, que estabelecerá seu funcionamento, direitos e
obrigações, ocorrerá através da convenção de condomínio, a qual deve ser subscrita por, no
mínimo 2/3 dos titulares das frações ideais, tornando-se de observância obrigatória tanto pelos
proprietários, quanto daquelas pessoas que apenas tenham detenção ou posse das unidades
(art. 1.333, CC). Assim como o ato de instituição, o ato de regulamentação – convenção de
condomínio – também deve ser registrada no CRI, para que produza efeitos perante terceiros.
De se observar, contudo, que a súmula 260, do STJ prevê que mesmo não havendo registro da
convenção de condomínio, entre os condôminos ela é de observância obrigatória: “A convenção
de condomínio aprovada, ainda que sem registro, é eficaz para regular as relações entre os
condôminos”.
Essa convenção de condomínio não pode fazer a previsão de proibições excessivas:
vedação de animais de estimação que não causem embaraço aos demais condôminos; vedação
de uso das áreas comuns pelos inadimplentes de condomínio, etc.
A convenção deve estabelecer, além das cláusulas do art. 1.332, CC:
a) a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos
para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio. Estas despesas se
constituem de obrigações propter rem, ou seja, próprias da coisa, de forma que seguem o bem
esteja ele com quem estiver. Neste sentido, a convenção deve fixar a forma de rateio dessas
despesas e a TESE DO STJ (Edição 68, n.9) é no sentido de que possa ser “de maneira diversa
da regra da fração ideal pertencente a cada unidade”.
b) sua forma de administração, com previsão de reeleição ou não, duração dos mandatos
de síndico e subsíndico;
c) a competência das assembleias, forma de sua convocação e quórum exigido para as
deliberações, observando-se as determinações do art. 1.350, CC que prevê que a primeira
assembleia anual deve aprovar o orçamento, prestar contas e determinar o valor das
contribuições anuais. Além disto, as assembleias extraordinárias podem ser convocadas pelo
síndico ou por ¼ dos condôminos, nos termos do art. 1355, CC.
d) as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores, como nos casos de
multas por importunação, por violação do silêncio, etc.;
e) o regimento interno, que seria o estabelecimento de regras de convivência no
condomínio, horários de funcionamento, proibições e permissões, etc.
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5.3.2. Direitos e deveres dos condôminos. Estudo das penalidades no condomínio edilício.
O condômino antissocial

O art. 1.355 estabelece os direitos dos condôminos, os quais poderão usar, fruir e
livremente dispor de suas unidades; usar as partes comuns, conforme a destinação e
obedecendo o regramento do condomínio, não podendo excluir a utilização dos demais
condôminos; votar nas deliberações, desde que esteja quite com suas obrigações.
Por sua vez, o art. 1.336, CC estabelece os deveres do condômino e, a primeira delas é a
contribuição para as despesas do condomínio, ficando sujeito a juros e multa de até 2% sobre o
débito. Além disto, não pode o condômino realizar obras que comprometam a segurança do
prédio, nem alterar a forma ou cor da fachada, partes e esquadrias externas. Por fim, deve o
condômino utilizar a edificação para o fim a que se destina, não prejudicando o sossego dos
demais. Nestes dois últimos casos (realização de obras que comprometam a segurança ou
alteração da fachada e, ainda, que perturbar o sossego), prevê o § 2.º do art. 1.336 a
possibilidade de que 2/3 dos condôminos restantes imponham multa ao violador, que será de até
5 vezes o valor da sua quota condominial.
O descumprimento reiterado das obrigações permite que seja imposta multa de até 5 vezes
o valor das contribuições mensais, por deliberação de ¾ do restante dos condôminos. Se o
condômino apresentar comportamento antissocial, com perturbação permanente do sossego, a
multa pode chegar a 10 vezes o valor de suas contribuições mensais (art. 1.337, CC).
O art. 1.338, CC prevê a preferência dos condôminos para alugar o abrigo de veículos
(garagem).
No caso de uso de área comum com exclusividade – saguão do elevador em edifício de um
apartamento por andar por exemplo ou, então, uso do terraço – cabe ao condômino pagar as
despesas relativas a tal parte. Art. 1.340, CC.
Deve-se observar que as obrigações condominiais são consideradas propter rem, ou seja,
seguem com a coisa. Assim, a aquisição da propriedade, traz consigo os débitos do condomínio,
inclusive quando há compromisso de compra e venda (mesmo não registrado), havendo TESE
DO STJ (Edição 68, n. 4) definindo que a obrigação é tanto do proprietário, quanto do promitente
comprador: “Havendo compromisso de compra e venda não levado a registro, a responsabilidade
pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o
promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto. (Tese julgada
sob o rito do art. 543-C do CPC/73 - Tema 886)”.
Ainda. Importante mencionar a possibilidade de penhora do imóvel – ainda que seja o único
(art. 3º, IV, lei 8009/90) – para a garantia do pagamento das despesas de condomínio, havendo,
neste sentido TESE DO STJ (Edição 68, n.1): “É possível a penhora do bem de família para
assegurar o pagamento de dívidas oriundas de despesas condominiais do próprio bem”.
Por fim, ao tratar da regulamentação do condomínio, o CC determina a necessidade de
contratação de seguro contra incêndio, destruição parcial ou total. Art. 1.346, CC.
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5.3.3. Realização de obras

O art. 1.341 e seguintes prevê a possibilidade e o regramento para a realização de obras


no condomínio. Sendo obras necessárias as mesmas podem ser realizadas pelo síndico
independentemente de autorização. Se forem úteis necessário o voto da maioria absoluta dos
condôminos. Se forem voluptuárias necessário o voto de 2/3 dos condôminos. Sempre que
possível, deve-se buscar a autorização da assembleia para a realização das obras necessárias,
mas sendo urgentes, poderão ser feitas, comunicando-se posteriormente. A construção de novo
pavimento no edifício depende de autorização por unanimidade dos condôminos.

5.3.4. Administração do condomínio

A administração do condomínio é exercida pelo síndico, o qual pode ser condômino ou


terceiro, inclusive pessoa jurídica. Deverá ser eleito em assembleia, por prazo não superior a 2
anos, permitindo-se reconduções. É possível que seja eleito um conselho fiscal, por igual
período, composto por 3 membros, para fiscalizar as contas. O síndico pode ser remunerado ou
não, conforme previsão na convenção de condomínio e votação da assembleia.
O art. 1348, CC estabelece as atribuições do síndico, que poderá transferir a terceiro,
parcial ou totalmente, as funções administrativas, desde que com a aprovação da assembleia:

Art. 1.348. Compete ao síndico:


I - convocar a assembléia dos condôminos;
II - representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os
atos necessários à defesa dos interesses comuns;
III - dar imediato conhecimento à assembléia da existência de procedimento judicial ou
administrativo, de interesse do condomínio;
IV - cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da
assembléia;
V - diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos
serviços que interessem aos possuidores;
VI - elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano;
VII - cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas
devidas;
VIII - prestar contas à assembléia, anualmente e quando exigidas;
IX - realizar o seguro da edificação.
§ 1 o Poderá a assembléia investir outra pessoa, em lugar do síndico, em poderes de
representação.

§ 2 o O síndico pode transferir a outrem, total ou parcialmente, os poderes de


representação ou as funções administrativas, mediante aprovação da assembléia, salvo
disposição em contrário da convenção.

Anualmente, o síndico deve convocar assembleia ordinária, para aprovação do orçamento


e da contribuição mensal. Se não o fizer, poderão convocar tal assembleia a representação de
¼ dos condôminos. Art. 1.350.
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Havendo irregularidades, praticadas pelo síndico, a assembleia poderá destituí-lo, com voto
da maioria absoluta (metade mais um) dos condôminos. Art. 1.349, CC.
As deliberações da assembleia, salvo quando houver exigência de quórum especial, serão
tomadas por maioria dos votos dos presentes (art. 1.352, CC), desde que haja a representação
de, pelo menos, metade das frações ideais. Além disto, os votos são contabilizados conforme a
fração ideal que representam, ou seja, terão pesos diferenciados.
Qualquer alteração da convenção de condomínio exige aprovação de 2/3 dos votos dos
condôminos e a mudança da destinação do prédio exige a unanimidade.
Nessa votações, admite-se o voto do locatário.

5.3.5. Extinção do condomínio

O condomínio pode ser extinto em três hipóteses: venda de todas as unidades a um único
condômino (neste caso a propriedade passa a ser individual); destruição parcial ou total do
condomínio; desapropriação.

5.4. Condomínio de lotes


A lei 13.465/2017 inseriu o art. 1.358-A no CC, passando a dispor a respeito do condomínio
de lotes, que seria uma forma de condomínio edilício, mas sem construção, onde existem partes
de propriedade exclusiva e partes comuns. Seria a regulamentação dos chamados “condomínios
fechados”.
Aplica-se a esta espécie, as disposições acerca do condomínio edilício e toda infraestrutura
necessária ao empreendimento deve ser realizada pelo empreendedor.

5.5. Multipropriedade ou time sharing


A multipropriedade foi inserida no CC através dos arts. 1.358-B a 1.358-U, CC. Deve-se
observar a possibilidade de incidências das regras do CDC, por força do art. 1.358-B.
Trata-se de uma forma de condomínio, geralmente utilizada para locais de lazer, em que
se divide a utilização do imóvel em tempo fixo, ou seja, é estabelecido o tempo/período de
utilização de cada condômino e, durante aquele período, ele exerce com exclusividade (art.
1.358-C). Ex.: aquisição de um apartamento/casa na praia por 3 pessoas. Elas dividirão o período
de tempo de utilização e este tempo não pode ser inferior a 7 dias, podendo ser em períodos
fixos do ano ou de forma “flutuante” ou alternada (art. 1.358-E). Além disto, as frações de tempo
são indivisíveis, não podendo desdobrar seu período de tempo em porções menores 11. Como
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regra, os multiproprietários dividem o tempo em frações iguais, mas nada impede que possa um
deles ter maior período de tempo, conforme a contribuição para a aquisição (art. 1.358-E).
A multipropriedade não se extingue nem mesmo se todas as frações de tempo forem do
mesmo multiproprietário (art. 1.358-C, parágrafo único).
O art. 1.358-D traz as características da multipropriedade: imóvel indivisível (não cabe ação
de divisão) e móveis e equipamentos domésticos.
A instituição se dá por ato intervivos ou por testamento, devendo ser registrado no Cartório
de Registro de Imóvel, com a fixação dos períodos de tempo (art. 1.358-F). Além disto, deve ser
feita uma convenção de condomínio, que poderá fixar regramento estabelecido pelos
multiproprietários e, ainda (art. 1.358-G): I - os poderes e deveres dos multiproprietários,
especialmente em matéria de instalações, equipamentos e mobiliário do imóvel, de manutenção
ordinária e extraordinária, de conservação e limpeza e de pagamento da contribuição
condominial; II - o número máximo de pessoas que podem ocupar simultaneamente o imóvel no
período correspondente a cada fração de tempo; III - as regras de acesso do administrador
condominial ao imóvel para cumprimento do dever de manutenção, conservação e limpeza; IV -
a criação de fundo de reserva para reposição e manutenção dos equipamentos, instalações e
mobiliário; V - o regime aplicável em caso de perda ou destruição parcial ou total do imóvel,
inclusive para efeitos de participação no risco ou no valor do seguro, da indenização ou da parte
restante; VI - as multas aplicáveis ao multiproprietário nas hipóteses de descumprimento de
deveres.
O art. 1.358-I estabelece que o instrumento de instituição da multipropriedade e a
convecção de condomínio poderão estabelecer os direitos multiproprietário, mas garante ainda
que este poderá: I - usar e gozar, durante o período correspondente à sua fração de tempo, do
imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário; II - ceder a fração de tempo em locação
ou comodato; III - alienar a fração de tempo, por ato entre vivos ou por causa de morte, a título
oneroso ou gratuito, ou onerá-la, devendo a alienação e a qualificação do sucessor, ou a
oneração, ser informadas ao administrador; IV - participar e votar, pessoalmente ou por
intermédio de representante ou procurador, desde que esteja quite com as obrigações
condominiais, em: a) assembleia geral do condomínio em multipropriedade, e o voto do
multiproprietário corresponderá à quota de sua fração de tempo no imóvel; b) assembleia geral
do condomínio edilício, quando for o caso, e o voto do multiproprietário corresponderá à quota
de sua fração de tempo em relação à quota de poder político atribuído à unidade autônoma na
respectiva convenção de condomínio edilício.
O art. 1.358-J traz as obrigações do multiproprietário: I - pagar a contribuição condominial
do condomínio em multipropriedade e, quando for o caso, do condomínio edilício, ainda que
renuncie ao uso e gozo, total ou parcial, do imóvel, das áreas comuns ou das respectivas
instalações, equipamentos e mobiliário; II - responder por danos causados ao imóvel, às
instalações, aos equipamentos e ao mobiliário por si, por qualquer de seus acompanhantes,
convidados ou prepostos ou por pessoas por ele autorizadas; III - comunicar imediatamente ao
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administrador os defeitos, avarias e vícios no imóvel dos quais tiver ciência durante a utilização;
IV - não modificar, alterar ou substituir o mobiliário, os equipamentos e as instalações do imóvel;
V - manter o imóvel em estado de conservação e limpeza condizente com os fins a que se destina
e com a natureza da respectiva construção; VI - usar o imóvel, bem como suas instalações,
equipamentos e mobiliário, conforme seu destino e natureza; VII - usar o imóvel exclusivamente
durante o período correspondente à sua fração de tempo; VIII - desocupar o imóvel,
impreterivelmente, até o dia e hora fixados no instrumento de instituição ou na convenção de
condomínio em multipropriedade, sob pena de multa diária, conforme convencionado no
instrumento pertinente; IX - permitir a realização de obras ou reparos urgentes.
O § 1.º do mesmo dispositivo traz as sanções por descumprimento das obrigações, as quais
deverão constar da respectiva convenção de condomínio em multipropriedade: I - multa, no caso
de descumprimento de qualquer de seus deveres; II - multa progressiva e perda temporária do
direito de utilização do imóvel no período correspondente à sua fração de tempo, no caso de
descumprimento reiterado de deveres.
As despesas decorrentes de reparos no imóvel serão divididas entre os multiproprietários,
quando derivadas do uso normal, ou, então, suportadas pelo multiproprietário que deu causa ao
estrago, sem prejuízo da multa (§ 2º, art. 1.358-J).
Alienações da fração de tempo/propriedade do multiproprietário não dependerão de
anuência dos demais. (§ 2º, art. 1.358-L), de forma a não existir, neste caso de condomínio, o
direito de preferência (como regra, podendo estar estabelecido em convenção esta preferência).
A multipropriedade será administrada pela pessoa indicada no instrumento de instituição
ou convenção de condomínio ou, não havendo, pela pessoa escolhida na assembleia (art. 1.358-
M). As atribuições são as mesmas do síndico: I - coordenação da utilização do imóvel pelos
multiproprietários durante o período correspondente a suas respectivas frações de tempo; II -
determinação, no caso dos sistemas flutuante ou misto, dos períodos concretos de uso e gozo
exclusivos de cada multiproprietário em cada ano; III - manutenção, conservação e limpeza do
imóvel; IV - troca ou substituição de instalações, equipamentos ou mobiliário, inclusive: a)
determinar a necessidade da troca ou substituição; b) providenciar os orçamentos necessários
para a troca ou substituição; c) submeter os orçamentos à aprovação pela maioria simples dos
condôminos em assembleia; V - elaboração do orçamento anual, com previsão das receitas e
despesas; VI - cobrança das quotas de custeio de responsabilidade dos multiproprietários; VII -
pagamento, por conta do condomínio edilício ou voluntário, com os fundos comuns arrecadados,
de todas as despesas comuns.
Os arts. 1.358-O até 1.358-U estabelecem as disposições gerais acerca das unidades
autônomas de condomínios edilícios. O condomínio edilício pode adotar a modalidade
multipropriedade através de previsão no instrumento de instituição ou deliberação da maioria
absoluta dos condôminos.
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PROPRIEDADES TEMPORÁRIAS
Como regra geral, a propriedade é perpétua, perene, mas a lei prevê algumas formas de
propriedade especial que são temporárias: a propriedade resolúvel e a propriedade fiduciária.
5.6. Propriedade resolúvel
Entende-se por propriedade resolúvel aquela que pode ser resolvida pelo implemento de
uma condição resolutiva ou pelo termo final (lembre-se da escala ponteana, degrau da eficácia
e subordinação dos efeitos a elementos acidentais). Uma vez resolvida a propriedade, o
proprietário a quem beneficia da resolução pode reivindicar a coisa em poder de quem ela esteja.
Ex.: compra e venda com cláusula de retrovenda (vendedor se reserva o direito de
recomprar dentro de certo prazo – até 3 anos). Neste caso, a propriedade do comprador é
resolúvel até se operar o prazo de 3 anos.
Ex.: venda com reserva de domínio. Até o pagamento final das parcelas, a propriedade do
comprador é resolúvel.
Ex.: disposição testamentária com cláusula de fideicomisso e o direito do fiduciário – art.
1.953, CC
Deve-se observar que a propriedade resolúvel deve estar inscrita no Cartório de Registro
de Imóveis para que produza efeitos perante terceiros.
Se a resolução da propriedade se deu por fato superveniente – no caso da doação com
encargo, havendo descumprimento do encargo, é possível a resolução da doação pela ingratidão
– e tiver havido a alienação da propriedade – o donatário tiver alienado – o doador (antigo
proprietário) não poderá se valer da reivindicação contra o terceiro adquirente, mas poderá se
utilizar de ação contra o ingrato, para reembolso do valor do bem.

5.7. Propriedade fiduciária


Propriedade fiduciária é “a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível, que o devedor,
com escopo de garantia, transfere ao credor. Trata-se, portanto, do contrato de alienação
fiduciária de bens móveis”12.
No caso da alienação fiduciária, a propriedade é resolúvel por uma causa contida no próprio
título de propriedade, que se fundamenta em um contrato de alienação fiduciária em garantia.
Geralmente utilizado com relação a veículos. O devedor (fiduciante), embora mantenha a posse
direta do bem, transfere a propriedade do mesmo ao credor (fiduciário). Art. 1.361, CC + Decreto-
lei 911/1969. O devedor pode se utilizar da coisa, mas deve guardá-la com diligência (art. 1.363,
CC).
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A propriedade fiduciária configura-se pelo registro do título no Registro de Títulos e


documentos ou, no caso de veículos, junto ao DETRAN e no ato constitutivo/contrato, deve
constar o valor da dívida, o prazo para pagamento, a taxa de juros, descrição da coisa, etc. (art.
1.362, CC).
Com a quitação da dívida a propriedade transfere-se das mãos do credor para o devedor
(fiduciante) (art. 1.361, §3.º). Se não for quitada, o credor deve alienar judicial ou
extrajudicialmente o bem e, com o produto, pagar seu crédito e entregar o saldo ao devedor (art.
1.364, CC), sendo vedado o pacto comissório (art. 1.365,CC), ou seja, ficar com a coisa se a
dívida não for paga. Se a venda não for suficiente para saldar a dívida, fica o devedor obrigado
com relação ao restante (art. 1.366, CC).
A propriedade fiduciária em garantia de bens móveis ou imóveis, segundo o art. 1.367, CC:
“sujeita-se às disposições do Capítulo I do Título X do Livro III da Parte Especial deste Código e,
no que for específico, à legislação especial pertinente, não se equiparando, para quaisquer
efeitos, à propriedade plena de que trata o art. 1.231”. As disposições do CC indicadas são as
constantes nos arts. 1.419 a 1.430, CC.
No que diz respeito a bens imóveis, aplica-se a lei 9.514/97, art. 22 e seguintes. Se a dívida
vencer e não for paga total ou parcialmente, tendo sido constituído em mora o fiduciante,
consolida-se a propriedade do imóvel em nome do fiduciário (art. 26). Neste caso, o devedor
será intimado para em 15 dias pagar a dívida. Caso seja purgada a mora, o contrato de alienação
fiduciária convalesce. Não sendo purgada, haverá a consolidação da plena propriedade nas
mãos do fiduciário, comprovando-se a quitação do imposto de transmissão. Em seguida, o
fiduciário, no prazo de 30 dias, a contar da averbação na matrícula da consolidação da
propriedade, deve promover leilão do imóvel. Não havendo oferta ou se esta for menor que o
valor do imóvel, realizar-se-á segundo leilão em 15 dias. Se mesmo vendido o bem, o valor
apurado não for suficiente para saldar a dívida, o devedor segue responsável pelo restante.
Prevê o §5.º do art. 27 que se após duas tentativas, em dois leilões, o maior lance não for igual
ou superior ao valor da dívida, despesas, prêmios de seguro e encargos, a dívida considera-se
extinta e o credor exonerado de indenizar benfeitorias.
Fundo De Investimento
A lei 13.874/2019 acrescentou os artigos 1.368-C a1.368-F no CC. Tratam estes
dispositivos do fundo de investimento, que é um condomínio destinado a aplicação de ativos
financeiros. Cabe à Comissão de Valores Mobiliários as regulações acerca destes fundos. O
registro dos regulamentos dos fundos junto à CVM é suficiente para oponibilidade perante
terceiros. Este regulamento deverá conter: a limitação da responsabilidade de cada investidor ao
valor de suas cotas; a limitação da responsabilidade, bem como parâmetros de sua aferição, dos
prestadores de serviços do fundo de investimento, perante o condomínio e entre si, ao
cumprimento dos deveres particulares de cada um, sem solidariedade; classes de cotas com
direitos e obrigações distintos, com possibilidade de constituir patrimônio segregado para cada
classe.
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A responsabilidade limitada pelo fundo de investimento só tem validade para fatos ocorridos
após a mudança do regulamento.
Os fundos respondem de forma direta pelas obrigações assumidas e os prestadores de
serviço não respondem por estas obrigações, mas pelos prejuízos que causarem quando
procederem com dolo ou má-fé.
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Questões Exames Anteriores


1) (XX EXAME) Vítor, Paulo e Márcia são coproprietários, em regime de condomínio pro indiviso,
de uma casa, sendo cada um deles titular de parte ideal representativa de um terço (1/3) da coisa
comum. Todos usam esporadicamente a casa nos finais de semana. Certo dia, ao visitar a casa,
Márcia descobre um vazamento no encanamento de água. Sem perder tempo, contrata, em
nome próprio, uma sociedade empreiteira para a realização da substituição do cano danificado.
Pelo serviço, ficou ajustado contratualmente o pagamento de R$ 900,00 (novecentos reais).
Tendo em vista os fatos expostos, assinale a afirmativa correta.
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A) A empreiteira pode cobrar a remuneração ajustada contratualmente de qualquer um dos


condôminos.
B) A empreiteira pode cobrar a remuneração ajustada contratualmente apenas de Márcia, que,
por sua vez, tem direito de regresso contra os demais condôminos.
C) A empreiteira não pode cobrar a remuneração contratualmente ajustada de Márcia ou de
qualquer outro condômino, uma vez que o serviço foi contratado sem a prévia aprovação da
totalidade dos condôminos.
D) A empreiteira pode cobrar a remuneração ajustada contratualmente apenas de Márcia, que
deverá suportar sozinha a despesa, sem direito de regresso contra os demais condôminos, uma
vez que contratou a empreiteira sem o prévio consentimento dos demais condôminos.

2) (VI EXAME) Timóteo e Leandro, cada qual proprietário de um apartamento no Edifício Maison,
procuraram a síndica do condomínio, Leonor, a fim de solicitar que fossem deduzidas de suas
contribuições condominiais as despesas referentes à manutenção do parque infantil situado no
edifício. Argumentaram que, por serem os únicos condôminos sem crianças na família, não
utilizam o aludido parque, cuja manutenção incrementa significativamente o valor da contribuição
condominial, bem como que a convenção de condomínio nada dispõe a esse respeito.
Na condição de advogado consultado por Leonor, assinale a avaliação correta do caso acima.
A) Timóteo e Leandro podem ser temporariamente dispensados do pagamento das despesas
referentes à manutenção do parque infantil, retomando-se imediatamente a cobrança caso
venham a ter crianças em sua família.
B) Timóteo e Leandro podem ser dispensados do pagamento das despesas referentes à
manutenção do parque infantil, desde que declarem, por meio de escritura pública, que não
utilizarão o parque infantil em caráter permanente.
C) Leonor deverá dispensar tratamento isonômico a todos os condôminos, devendo as despesas
de manutenção do parque infantil ser cobradas, ao final de cada mês, apenas daqueles
condôminos que tenham efetivamente utilizado a área naquele período.
D) Todos os condôminos, inclusive Timóteo e Leandro, devem arcar com as despesas referentes
à manutenção do parque infantil, tendo em vista ser seu dever contribuir para as despesas
condominiais proporcionalmente à fração ideal de seu imóvel.

Gabarito
1) B
2) D
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6. Direitos Reais Sobre Coisa Alheia. Direito Real De


Aquisição. Direitos Reais De Garantia.

Prof. Maitê Damé


@maitedame

Além da propriedade, existem outros direitos reais, conforme previsão do art. 1.225, CC e
esses direitos podem vincular um sujeito a uma coisa que pertença a terceiro. São os chamados
direitos reais sobre coisa alheia e o CC traz essas previsões entre os arts. 1.369 a 1.510.
Classificam-se em direitos reais de uso e fruição; direito real de aquisição; direitos reais de
garantia.
6.1. Direitos Reais De Uso E Fruição
Nos direitos reais de uso e fruição, o titular do domínio não concentra em suas mãos todos
os atributos da propriedade (art. 1.228, CC). Neste caso, os atributos de gozar e fruir da coisa
são transmitidos a outra pessoa. Acaba se concretizando, nas hipóteses a serem apresentadas,
direitos reais sobre coisa alheia.
Assim, dos direitos reais previstos no art. 1.225, CC consideram-se direitos de uso e fruição:
II - a superfície; III - as servidões; IV - o usufruto; V - o uso; VI - a habitação; XI - a concessão de
uso especial para fins de moradia; XII - a concessão de direito real de uso; e XIII - a laje.

6.1.1. Superfície

Pelo direito de superfície, o proprietário do imóvel concede a outrem, por tempo


determinado ou indeterminado, o direito de construir sobre seu terreno. Essa autorização pode
se dar de forma gratuita ou onerosa, mas sempre por escritura pública, que deve ser registrada
no Cartório de Registro de Imóveis (art. 1.369, CC) e autoriza apenas o uso do solo para cima,
não autorizando o uso do subsolo.
No direito de superfície, estão presentes as seguintes figuras: fundieiro ou concedente, que
é o proprietário do imóvel; superficiário, que recebe a coisa, podendo nela plantar ou construir,
além de poder usar e gozar do imóvel pelo período previsto na escritura pública. Essa
transmissão do direito de uso e gozo, pode ser de forma gratuita ou onerosa, permanente ou
temporária, sendo o superficiário responsável pelo pagamento dos tributos relativos ao imóvel.
O direito de superfície pode ser transmitido a terceiros ou a herdeiros, em caso de morte
do superficiário. Em qualquer caso, o concedente (fundieiro) não tem direito a receber pagamento
pela transferência. Contudo, em caso de alienação do terreno ou do direito de superfície, terão
direito de preferência o superficiário e o concedente, respectivamente.
Ocorre a extinção do direito real de superfície pelo advento do termo previsto (quando por
prazo determinado), podendo, também, ocorrer a extinção pela destinação diversa para a qual
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foi concedida. Havendo extinção, o direito de uso e gozo retorna para o proprietário do terreno.
Consolida-se a plena propriedade, inclusive sobre as obras, benfeitorias e acessões realizadas
sobre o terreno, independentemente de indenização, salvo se pactuada na escritura pública (art.
1.375, CC).

6.1.2. Servidão

A servidão é o direito real pelo qual os proprietários de dois imóveis estabelecem, através
de escritura pública ou por testamento, devidamente registrada no Cartório de Registro de
Imóveis, a concessão de benefícios de um imóvel para o outro. Geralmente a servidão é de
passagem, que beneficia o prédio encravado, gravando o prédio serviente, com o direito de
usar/passar pelo prédio de outra pessoa.
A servidão pode se constituir, também, através de usucapião, pois, nos termos do art.
1.379, CC, o exercício inconstestado de uma servidão aparente por 10 anos, autoriza a registrar
a servidão no Registro de Imóveis, valendo a sentença como título. Se não houver título, o prazo
de usucapião será de 20 anos.
Na servidão, estão presentes as seguintes figuras: prédio serviente, que é o imóvel sobre
o qual se institui a servidão, para beneficiar ao prédio dominante, que é aquele que tem a
servidão a seu favor.
A doutrina traz as seguintes características para a servidão: predialidade, pois as
servidões incidem sobre imóveis; acessoriedade, pois elas dependem da existência do prédio
sobre o qual recaem para existir (não existem sozinhas); ambulatoriedade, pois em caso de
alienação do imóvel serviente, a servidão acompanha a transmissão; indivisibilidade, não
podendo se adquirir ou perder por partes; perpetuidade, não se estabelece por tempo
determinado, embora possa ser extinta a servidão.
A ação confessória é o meio através do qual se reconhece o direito à servidão e a ação
negatória é o meio de afastar a pretensão do proprietário do prédio serviente de estabelecer
servidão.
A servidão é diferente da passagem forçada. A primeira é facultativa, enquanto a segunda
é compulsória e exige pagamento de indenização. A servidão é direito real de gozo ou fruição e
a passagem forçada, instituto do direito de vizinhança. A passagem forçada aplica-se a casos de
prédio que não tem acesso a via pública. A servidão pode ser instituída para melhorar o uso do
imóvel dominante.
A servidão classifica-se em: urbana ou rústica; positiva ou negativa; contínua ou
descontínua; aparente ou não aparente.
Urbana é a servidão de imóvel urbano. Rústica é a servidão que incide sobre imóvel rural.
Positiva é a servidão que concede um direito de ação, como, por exemplo, a passagem.
Negativa é a servidão que determina um dever de abstenção, como por exemplo, não plantar
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árvores para não gerar sombra no canteiro vizinho (pouco usada) ou não construir sobre o
terreno.
Contínua é a servidão quando seu exercício independe da ação, ocorrendo por fato da
natureza, como é o caso passagem de luz ou de som. Descontínua é a servidão que depende
de ação, como no caso da servidão de trânsito/passagem.
Aparente é a servidão que se manifesta por obras visíveis, como o caminho traçado pelo
trânsito, o aqueduto, etc. Não aparente é a servidão que não tem visibilidade, que é a que ocorre
quando há trânsito, mas sem caminho marcado.
Somente pode haver posse de servidão aparente, sendo possível sua aquisição por
usucapião e proteção possessória. Neste sentido é a súmula 415 do STF: “Servidão de trânsito
não titulada, mas tornada permanente, sobretudo pela natureza das obras realizadas, considera-
se aparente, conferindo direito à proteção possessória”.
O art. 1.381, CC prevê que o dono do prédio dominante pode realizar as obras necessárias
a conservação e ao uso da servidão. As despesas, neste caso, serão do(s) proprietário(s) do(s)
prédio(s) dominante(s).
O dono do prédio serviente não pode embaraçar o uso da servidão (art. 1.383, CC), de
forma que em se tratando de servidão de passagem, não poderá impedir o exercício regular.
Contudo, poderá impedir a passagem de veículos se o convencionado for passagem a pé. O
prédio serviente deve sofrer a menor restrição, assim, o uso da servidão deve limitar-se a
necessidade do prédio dominante. Mas se a servidão por de passagem de caminhões, por
exemplo, entende-se abrangida a passagem de carros e a pé. Mais, o exercício da servidão deve
ocorrer no local estipulado e não em local diverso, admitindo-se a alteração de local, conforme o
art. 1.384,CC, nas hipóteses de ser realizada pelo dono do prédio serviente e à sua custa, se em
nada diminuir as vantagens do prédio dominante; ou pelo dono do prédio dominante e à sua
custa, se houver considerável incremento da utilidade e não prejudicar o prédio serviente.
Por natureza a servidão é indivisível e, havendo divisão do prédio serviente, ambos
responderão pela servidão e, se a divisão for do prédio dominante, ambas as partes seguem se
beneficiando da servidão (art. 1.386, CC).
Segundo o art. 1.387, CC, a servidão pode ser extinta pelo cancelamento no Cartório de
Registro de Imóveis, em razão de determinação legal ou desapropriação. O art. 1.388, CC prevê
as hipóteses que autorizam que o dono do prédio serviente peça o cancelamento judicial do
registro da servidão: quando o titular houver renunciado a sua servidão; quando tiver cessado,
para o prédio dominante, a utilidade ou a comodidade, que determinou a constituição da
servidão; quando o dono do prédio serviente resgatar a servidão. Além disto, o art. 1.389, CC
prevê as hipóteses de cancelamento da servidão, mediante a prova da extinção: pela reunião
dos dois prédios no domínio da mesma pessoa; pela supressão das respectivas obras por efeito
de contrato, ou de outro título expresso; pelo não uso, durante dez anos contínuos.
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6.1.3. Usufruto

O usufruto concede a terceiro o direito de usar e fruir da coisa alheia por determinado
período de tempo. Assim, acaba determinando que a propriedade se torne nua, pois o
proprietário tem os direitos de dispor e reivindicar, mas não pode usar, nem fruir do bem que lhe
pertence. Daí decorre que: o direito de usar, de locar o imóvel é do usufrutuário. Por outro lado,
o direito de vender o imóvel é do nu-proprietário. A ação reivindicatória só pode ser proposta pelo
nu-proprietário, pois só ele possui o direito de reivindicar. As ações possessórias podem ser
manejadas por ambos, pois o usufrutuário tem a posse direta e o nu-proprietário a posse indireta
da coisa.
Segundo o art. 1.390, CC o usufruto pode recair sobre bens móveis ou imóveis (um ou
vários), inclusive sobre todo o patrimônio. Em se tratando de usufruto de bem imóveis, necessita
de registro no Cartório de Registro de Imóveis, podendo ser objeto de aquisição via usucapião.
O usufruto é inalienável, mas seu exercício pode ser objeto de cessão gratuita ou onerosa
(art. 1.383, CC).
O usufruto classifica-se em:
1) quanto ao modo de constituição. Judicial é o usufruto requerido pelo exequente em
processo de execução, que entende que, dessa forma, terá a satisfação de seu crédito. Legal é
o determinado pela lei, como nos casos de bens de propriedade dos filhos menores de idade,
onde o usufruto pertence aos seus pais enquanto durar o poder familiar (art. 1.689, I, CC).
Convencional é o instituído unilateralmente, através de testamento ou por acordo de vontades,
em um contrato. Por usucapião ocorreria na hipótese em que aquele que constituiu o usufruto
não era proprietário da coisa.
2) quanto ao objeto. Próprio é quando a mesma coisa entregue ao usufrutuário é devolvida
ao nu-proprietário. Impróprio é quando o usufruto recai sobre coisa consumível, sendo outra de
mesma espécie, qualidade e quantidade restituída ao nu-proprietário.
3) quanto à duração. Vitalício é o usufruto que dura a vida toda do usufrutuário,
extinguindo-se pela sua morte. Por prazo determinado é quando houver um prazo de duração.
4) quanto ao número de usufrutuários. Individual é o usufruto que beneficia apenas uma
pessoa. Simultâneo é o exercido por mais de uma pessoa.
Os arts. 1.394 a 1.399 do CC estabelecem os direitos do usufrutuário quanto a possuir, usar
e fruir da coisa, podendo cobrar dívidas quando o usufruto for de títulos de crédito; receber os
frutos naturais pendentes no tempo da instituição do usufruto; receber os frutos civis que se
venceram na data final do usufruto. Além disto, poderá o usufrutuário alterar a destinação
econômica do prédio desde que tenha autorização expressa do proprietário.
Os arts. 1.400 a 1.409 do CC estabelecem os deveres do usufrutuário, que envolvem,
principalmente, inventariar os bens que receber, determinando o estado em que se acham, e dar
caução, fidejussória ou real, se for exigida, de velar-lhes pela conservação, e entregá-los findo o
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usufruto. Não é obrigado a dar caução o doador que se reserva do usufruto da coisa doada. Se
o usufrutuário não puder prestar a caução exigida, perde o direito de administrar a coisa, ficando
essa função nas mãos do nu-proprietário que, então, deverá, mediante caução, entregar os
rendimentos ao usufrutuário. O usufrutuário deve responder pelas despesas de conservação da
coisa, mas não responde pelas deteriorações do uso regular. Importante a disposição do art.
1.408, CC que determina que no caso de destruição do prédio, não é obrigado o nu-proprietário
a reconstruir a coisa. Mas se houver sua reconstrução em razão da indenização do seguro, o
usufruto se restabelece.
Extingue-se o usufruto nos casos previstos nos arts. 1.410 e 1.411, CC, mediante
cancelamento do registro no Cartório de Registro de Imóveis: I - pela renúncia ou morte do
usufrutuário; II - pelo término do prazo; III - pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem
o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se
começou a exercer; IV - pela cessação do motivo de que se origina; V - pela destruição da coisa;
VI - pela consolidação; VII - por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar
os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos
de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art.
1.395; VIII - Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai. No caso de usufruto
simultâneo, com a morte de um dos usufrutuários, salvo disposição expressa em sentido
contrário, extingue-se o usufruto sobre a parte do falecido.

6.1.4. Uso

O uso envolve o direito de utilizar a coisa para seu próprio bem. Por exemplo, uso de jazigo
em cemitério. Por se tratar de direito real, deve estar inscrito no Cartório de Registro de Imóveis
(até para diferenciar da locação).
Teoricamente não envolve o direito de fruir (neste caso, seria usufruto), mas o art. 1.412,
CC determina a possibilidade de fruir quando as necessidades do usuário ou da família exigirem.
Por fim, aplicam-se as regras de usufruto ao uso no que forem cabíveis.

6.1.5. Habitação

O direito real de habitação envolve o direito de usar a coisa para fins de moradia. Não
permite alugar, nem emprestar a coisa, apenas habitar na coisa alheia. Se for constituído em
favor de várias pessoas, todas podem exercer o direito, sem impedir as demais e, se uma delas
habitar sozinha, não terá dever de pagar aluguel às demais.
Em se tratando de direito real de habitação convencional, o instrumento de instituição
deverá ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis. Todavia, em se tratando de direito real
de habitação legal, não haverá essa necessidade, como no caso do art. 1.831, CC (direito real
de habitação do cônjuge/companheiro sobrevivente no imóvel de residência do casal).
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6.1.6. Laje

O direito real de laje está previsto nos arts. 1.510-A a 1.510-E do CC e refere-se à
possibilidade do proprietário de uma construção base ceder a superfície superior ou inferior de
sua construção para terceiro edificar unidade distinta daquela originariamente construída sobre
o solo.
O titular do direito real de laje poderá abrir matrícula própria no Registro de Imóveis, mas
não será titular de parcela ideal do terreno. Terá apenas o direito de laje (construir sobre a
construção já existente). A construção base e o terreno pertencerão ao proprietário do imóvel
base.

6.1.7. Enfiteuse

A enfiteuse passou a ser vedada pelo CC/2002, nos termos do art. 2.038, embora não tenha
extinto as já existentes. Trata-se de instituto antigo no Direito brasileiro e que envolve a divisão
da propriedade em titularidade do imóvel (domínio direto) e direito de uso, gozo, disposição e
fruição, considerado domínio útil. Assim, o enfiteuta ou foreiro, titular do domínio útil, poderia
construir sobre imóvel de propriedade de terceiro (senhorio ou enfitente), que teria direito a
receber anualmente um valor fixo, chamado de foro.

6.2. Direito real de aquisição


O direito real de aquisição é proveniente de promessa de compra e venda, com cláusula de
irrevogabilidade e devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
A promessa de compra e venda pode ser firmada por instrumento público ou particular, mas
para gerar o direito real à aquisição do imóvel, necessita estar registrada no CRI. Assim, o
promitente comprador, que tenha efetivado o pagamento da coisa, pode exigir do promitente
vendedor ou de terceiros, a outorga da escritura pública definitiva de compra e venda e, havendo
recusa, ingressar com ação de adjudicação.
Importante observar que se o compromisso de compra e venda não for registrado na
matrícula, obriga apenas as partes celebrantes, resolvendo-se no âmbito do direito obrigacional.
Não se converte em direito real. Mas a súmula 239 do STJ, autoriza a adjudicação compulsória
mesmo não havendo registro da promessa: “O direito à adjudicação compulsória não se
condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”.
6.3. Direitos reais de garantia
Os artigos 1.419 a 1.510 do CC tratam de direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e
anticrese. Tais direitos referem-se a garantias reais – vinculação a um bem – para pagamento
de dívidas. Assim, estabelecem uma vinculação entre o credor e uma coisa dada em garantia
para cumprimento de uma obrigação.
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Os direitos reais de garantia referem-se a hipoteca, penhor e anticrese, enquanto formas


de deixar bens em garantia de dívidas. Trata-se de uma garantia mais formal do cumprimento
da obrigação, já que, se não quitada pelo devedor, autoriza o credor a satisfazer seu crédito
sobre o bem deixado em garantia. Já a fiança e o aval também são garantias para pagamento
de dívidas, mas obrigam as pessoas, pois são relações pessoais.
Apenas quem tem poder de alienar a coisa é que pode dá-la em garantia (art. 1.420).
Havendo condomínio sobre a coisa, ela não pode ser dada, em sua totalidade, em garantia, mas
a parte do condômino pode.
Constitui-se a garantia real sobre coisa imóvel quando o contrato é levado a registro. No
caso dos móveis, havendo a tradição, se a lei não exigir, também, o registro.
Assim, havendo inadimplemento, o credor deverá levar o bem a leilão (se móvel) ou praça
(se imóvel), sendo vedado o pacto comissório, ou seja, que o credor poderá ficar com a coisa
em pagamento da dívida, sendo nula a cláusula que contenha tal previsão (art. 1.428, CC). O
valor obtido com a alienação judicial será utilizado para quitar o débito. Se superior, devolve-se
ao devedor o saldo. Se inferior, permanece o débito quanto ao saldo. Pode o credor, após o
vencimento da dívida, dar a coisa em pagamento (art. 1.428, § único).
Os credores com garantia real terão preferência para receber seus créditos quando houver
concurso de credores.
Pagamentos parciais do débito não exoneram a parte correspondente da garantia, ou seja,
enquanto não for quitada a totalidade da dívida, não será liberada a garantia.
Considera-se vencida a dívida de forma antecipada (art. 1.425, CC): I - se, deteriorando-
se, ou depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor, intimado,
não a reforçar ou substituir; II - se o devedor cair em insolvência ou falir; III - se as prestações
não forem pontualmente pagas, toda vez que deste modo se achar estipulado o pagamento.
Neste caso, o recebimento posterior da prestação atrasada importa renúncia do credor ao seu
direito de execução imediata; IV - se perecer o bem dado em garantia, e não for substituído; V -
se se desapropriar o bem dado em garantia, hipótese na qual se depositará a parte do preço que
for necessária para o pagamento integral do credor.
No caso de falecimento do devedor, seus sucessores não poderão resgatar parcialmente o
penhor ou hipoteca. Deverão saldar o total e se sub-rogar nos direitos do credor sobre as quotas
dos demais herdeiros.

6.2.1. Penhor

O penhor é uma forma de garantia real sobre bem móvel, através da qual o devedor entrega
ao credor o bem, sendo, ainda, exigido o registro do instrumento de penhor no Cartório de Títulos
e documentos (art. 1.432). O credor é chamado de credor pignoratício. No caso dos penhores
especiais tratados abaixo, o próprio devedor fica na posse da coisa, funcionando como um
depositário.
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Penhor é diferente de penhora. Penhor é direito real de garantia. Penhora é garantia judicial
de dívida (instrumento processual).
O art. 1.433, CC estabelece os direitos do credor pignoratício: I - à posse da coisa
empenhada; II - à retenção dela, até que o indenizem das despesas devidamente justificadas,
que tiver feito, não sendo ocasionadas por culpa sua; III - ao ressarcimento do prejuízo que
houver sofrido por vício da coisa empenhada; IV - a promover a execução judicial, ou a venda
amigável, se lhe permitir expressamente o contrato, ou lhe autorizar o devedor mediante
procuração; V - a apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu poder; VI
- a promover a venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, sempre que haja receio
fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore, devendo o preço ser depositado. O
dono da coisa empenhada pode impedir a venda antecipada, substituindo-a, ou oferecendo outra
garantia real idônea. O credor só deve devolver a coisa após o pagamento integral da dívida.
O credor pignoratício tem como obrigações: I - à custódia da coisa, como depositário, e a
ressarcir ao dono a perda ou deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na
dívida, até a concorrente quantia, a importância da responsabilidade; II - à defesa da posse da
coisa empenhada e a dar ciência, ao dono dela, das circunstâncias que tornarem necessário o
exercício de ação possessória; III - a imputar o valor dos frutos, de que se apropriar (art. 1.433,
inciso V) nas despesas de guarda e conservação, nos juros e no capital da obrigação garantida,
sucessivamente; IV - a restituí-la, com os respectivos frutos e acessões, uma vez paga a dívida;
V - a entregar o que sobeje do preço, quando a dívida for paga, no caso do inciso IV do art.
1.433.
O penhor extingue-se pela extinção da obrigação; pelo perecimento da coisa; pela renúncia
do credor; pela confusão, na mesma pessoa, do credor e dono da coisa; através de adjudicação
judicial, remissão ou venda da coisa empenhada (art. 1.436, CC). A produção de efeitos da
extinção ocorre a partir do cancelamento do registro (art. 1.437).
O penhor possui formas especiais: penhor rural; penhor industrial e mercantil; penhor de
direitos e títulos de crédito; penhor de veículos; penhor legal.

6.2.2. Penhor Rural

É o penhor agrícola ou pecuário, que se constitui por meio de instrumento público ou


particular a ser registrado no CRI. O penhor agrícola, que pode recair sobre máquinas,
implementos, colheitas pendentes, frutos armazenados, lenha cortada, carvão vegetal, animais
de serviço, tem prazo máximo de 3 anos, prorrogável por igual prazo. O penhor pecuário, que
pode recair sobre animais que integram a atividade pastoril, agrícola ou de laticínios, tem prazo
máximo de 4 anos, também prorrogável por igual prazo.
Admite-se a emissão de um título de crédito – cédula rural pignoratícia – quando o devedor
compromete-se a pagar a dívida em dinheiro. O credor pignoratício rural tem direito de
inspecionar a coisa empenhada, já que ela permanece nas mãos do devedor como depositário.
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Os animais podem ser alienados com autorização do credor. Havendo notícia de pretensão
de alienação dos animais sem autorização do credor, este poderá requerer que sejam os animais
depositados sob a guarda de terceiro. Se os animais empenhados morrerem e outros forem
comprados no lugar para substituí-los, estes serão sub-rogados no lugar.

6.2.3. Penhor industrial e mercantil

Na qualidade de penhor especial, o devedor permanece na posse da coisa empenhada,


incentivando o crédito da indústria e do comércio. Podem recair sobre máquinas, aparelhos,
materiais e instrumentos, instalados e em funcionamento, com os acessórios ou sem eles;
animais utilizados na indústria; sal e bens destinados à exploração de salinas; produtos de cultura
de suínos e animais destinados à industrialização de carnes e derivados; matérias-primas e
produtos industrializados.
Constitui-se mediante instrumento público ou particular a ser registrado no CRI, admitindo-
se, também, a emissão de título de crédito – cédula de penhor industrial ou mercantil.

6.2.4. Penhor de direitos e títulos de crédito

O penhor de direitos é constituído por instrumento público ou particular a ser registrado no


Registro de Títulos e Documentos, incidindo sobre coisas móveis passíveis de cessão (art. 1.451,
CC). O titular de direito empenhado deverá entregar ao credor pignoratício os documentos
comprobatórios desse direito, salvo se tiver interesse legítimo em conservá-los. No caso de
penhor de créditos, este só terá eficácia após notificação do devedor, que deve declarar-se ciente
o penhor, por instrumento público ou particular.
É dever do credor conservar o direito empenhado, cobrar o crédito empenhado após tornar-
se exigível.

6.2.5. Penhor de veículos

Veículos de qualquer espécie de transporte ou condução são passíveis de penhor, pelo


prazo máximo de 2 anos, prorrogável por igual prazo, constituído através de instrumento público
ou particular a ser levado a registro no Cartório de Títulos e Documentos e anotado no certificado
de propriedade. Como penhor especial, o bem fica na posse do devedor.

6.2.6. Penhor legal

O art. 1.467, determina que são credores pignoratícios, independentemente de convenção:


I - os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis, jóias
ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem consigo nas respectivas casas ou
estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que aí tiverem feito; II - o dono do prédio rústico
ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio,
pelos aluguéis ou rendas.
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Nestes casos, o credor pode tomar em garantia um ou mais objetos para chegar ao valor
da dívida, requerendo homologação judicial.

6.2.7. Hipoteca

A hipoteca é uma garantia real que recai, como regra, sobre imóveis, podendo incidir,
também, sobre alguns móveis previstos na lei. Pode recair, ainda, sobre direitos reais. Necessita
de registro no Cartório de Registro de Imóveis. Admite-se a emissão de cédula hipotecária, nos
termos do art. 1.484, CC.
A hipoteca pode ser convencional ou legal, conforme resulte ou não da vontade das partes.
Na hipoteca, o bem se mantém nas mãos do devedor, sendo vedada/nula cláusula que
proíba o proprietário de vender o imóvel. Além disto, pode ser constituída mais de uma hipoteca
sobre o mesmo imóvel.
O art. 1.473 estabelece que podem ser objeto de hipoteca: I - os imóveis e os acessórios
dos imóveis conjuntamente com eles; II - o domínio direto; III - o domínio útil; IV - as estradas de
ferro; V - os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo onde se
acham; VI - os navios; VII - as aeronaves; VIII - o direito de uso especial para fins de moradia; IX
- o direito real de uso; X - a propriedade superficiária.
No caso de existirem várias hipotecas sobre o mesmo bem, vencendo-se a segunda
hipoteca, a execução só pode correr após o vencimento da primeira, salvo nas hipóteses de
insolvência do devedor. Há, portanto, um direito de preferência no recebimento das hipotecas.
A hipoteca estabelece o direito de sequela, ou seja, não impede a venda do bem, mas permite
ao titular que busque a coisa nas mãos de quem se encontrar. O adquirente pode exonerar-se,
pagando a dívida ou abandonando ao credor hipotecário o imóvel.
A hipoteca poderá ser prorrogada por até 30 anos da data do contrato, desde que requerida
a averbação por ambas as partes. Após este prazo, necessitará reconstituição por novo título e
novo registro, mantendo a precedência sobre outras hipotecas. Art. 1.485, CC.
Admite-se a instituição de hipoteca para garantia de dívida futura, nos termos do art. 1.487,
CC, desde que estabeleça o valor máximo do crédito a ser garantido.
Súmula 308, STJ: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou
posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes
do imóvel”.
A hipoteca legal ocorre nos casos previstos no art. 1.489, CC, que determina que a lei
confere hipoteca: I - às pessoas de direito público interno (art. 41) sobre os imóveis pertencentes
aos encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos fundos e rendas; II -
aos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras núpcias, antes de fazer o
inventário do casal anterior; III - ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do
delinqüente, para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas judiciais;
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IV - ao co-herdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da partilha, sobre o imóvel adjudicado
ao herdeiro reponente; V - ao credor sobre o imóvel arrematado, para garantia do pagamento do
restante do preço da arrematação.
Segundo o art. 1.497, CC as hipotecas legais dependem de registro para que produzam
seus efeitos e, somente a partir de então constituem-se de direito real.
A hipoteca extingue-se: I - pela extinção da obrigação principal; II - pelo perecimento da
coisa; III - pela resolução da propriedade; IV - pela renúncia do credor; V - pela remição; VI - pela
arrematação ou adjudicação. Além disto, extingue-se a hipoteca pela averbação do
cancelamento do registro.
As hipotecas das vias férreas serão registradas no local onde estiver localizada a estação
inicial da linha.

6.2.8. Anticrese

Anticrese é o direito real pelo qual o devedor entrega ao credor o bem imóvel, autorizando
que ele perceba os frutos e rendimentos da coisa, compensando na dívida. Para sua constituição,
necessário que o contrato onde há o ajuste da garantia, seja registrado no Cartório de Registro
de Imóveis. Anualmente, o credor anticrético deve fazer balanço do que tiver recebido. O credor
pode arrendar o imóvel a terceiro, mantendo direito de retenção do imóvel até que seja paga a
dívida. Eventuais deteriorações que o imóvel sofrer por culpa do credor anticrético, serão por ele
respondidas, assim como os frutos que não forem percebidos. Extingue-se a anticrese quando
liquidada a dívida.
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Questões Exames Anteriores

1) (XXX EXAME) Lucas, um grande industrial do ramo de couro, decidiu ajudar Pablo, seu amigo
de infância, na abertura do seu primeiro negócio: uma pequena fábrica de sapatos. Lucas doou
50 prensas para a fábrica, mas Pablo achou pouco e passou a constantemente importunar o
amigo com novas solicitações. Após sucessivos e infrutíferos pedidos de empréstimos de toda
ordem, a relação entre os dois se desgasta a tal ponto que Pablo, totalmente fora de controle,
atenta contra a vida de Lucas. Este, porém, sobrevive ao atentado e decide revogar a doação
feita a Pablo. Ocorre que Pablo havia constituído penhor sobre as prensas, doadas por Lucas,
para obter um empréstimo junto ao Banco XPTO, mas, para não interromper a produção,
manteve as prensas em sua fábrica. Diante do exposto, assinale a afirmativa correta.
a) Para a constituição válida do penhor, é necessário que as coisas empenhadas estejam em
poder do credor. Como isso não ocorreu, o penhor realizado por Pablo é nulo.
b) Tendo em vista que o Banco XPTO figura como terceiro de má-fé, a realização do penhor é
causa impeditiva da revogação da doação feita por Lucas.
c) Como causa superveniente da resolução da propriedade de Pablo, a revogação da doação
operada por Lucas não interfere no direito de garantia dado ao Banco XPTO.
d) Em razão da tentativa de homicídio, a revogação da doação é automática, razão pela qual os
direitos adquiridos pelo Banco XPTO resolvem-se junto com a propriedade de Pablo.

2) (XXIX EXAME) Arnaldo institui usufruto de uma casa em favor das irmãs Bruna e Cláudia,
que, no intuito de garantir uma fonte de renda, alugam o imóvel. Dois anos depois da constituição
do usufruto, Cláudia falece, e Bruna, mesmo sem “cláusula de acrescer” expressamente
estipulada, passa a receber integralmente os valores decorrentes da locação. Um ano após o
falecimento de Cláudia, Arnaldo vem a falecer. Seus herdeiros pleiteiam judicialmente uma
parcela dos valores integralmente recebidos por Bruna no intervalo entre o falecimento de
Cláudia e de Arnaldo e, concomitantemente, a extinção do usufruto em função da morte de seu
instituidor. Diante do exposto, assinale a afirmativa correta.
a) Na ausência da chamada “cláusula de acrescer”, parte do usufruto teria se extinguido com a
morte de Cláudia, mas o usufruto como um todo não se extingue com a morte de Arnaldo.
b) Bruna tinha direito de receber a integralidade dos aluguéis independentemente de estipulação
expressa, tendo em vista o grau de parentesco com Cláudia, mas o usufruto automaticamente
se extingue com a morte de Arnaldo.
c) A morte de Arnaldo só extingue a parte do usufruto que caberia a Bruna, mas permanece em
vigor no que tange à parte que cabe a Cláudia, legitimando os herdeiros desta a receberem
metade dos valores decorrentes da locação, caso esta permaneça em vigor.
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d) A morte de Cláudia extingue integralmente o usufruto, pois instituído em caráter simultâneo,


razão pela qual os herdeiros de Arnaldo têm direito de receber a integralidade dos valores
recebidos por Bruna, após o falecimento de sua irmã.

3) (XXVIII EXAME) Os negócios de Clésio vão de mal a pior, e, em razão disso, ele toma uma
decisão difícil: tomar um empréstimo de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) com Antônia, dando,
como garantia de pagamento, o penhor do seu relógio de ouro e diamantes, avaliado em R$
200.00,00 (duzentos mil reais). Antônia, por sua vez, exige que, no instrumento de constituição
do penhor, conste uma cláusula prevendo que, em caso de não pagamento da dívida, o relógio
passará a ser de sua propriedade. Clésio aceita a inserção da cláusula, mas consulta seus
serviços, como advogado(a), para saber da validade de tal medida. Sobre a cláusula proposta
por Antônia, assinale a afirmativa correta.
a) É válida, tendo em vista o fato de que as partes podem, no exercício de sua autonomia privada,
estipular esse tipo de acordo.
b) É nula, tendo em vista o fato de que o Código Civil brasileiro proíbe o pacto comissório.
c) É válida, uma vez que Clésio como proprietário do bem, não está impedido de realizar o
negócio por um preço muito inferior ao de mercado, não se configurando a hipótese como pacto
comissório.
d) É válida, ainda que os valores entre o bem dado em garantia e o empréstimo sejam díspares,
nada impede sua inserção, eis que não há qualquer vedação ao pacto comissório no direito
brasileiro.

4) (XXIV EXAME) Laurentino constituiu servidão de vista no registro competente, em favor de


Januário, assumindo o compromisso de não realizar qualquer ato ou construção que embarace
a paisagem de que Januário desfruta em sua janela. Após o falecimento de Laurentino, seu filho
Lucrécio decide construir mais dois pavimentos na casa para ali passar a habitar com sua
esposa. Diante do exposto, assinale a afirmativa correta.
a) Januário não pode ajuizar uma ação possessória, eis que a servidão é não aparente.
b) Diante do falecimento de Laurentino, a servidão que havia sido instituída automaticamente se
extinguiu.
c) A servidão de vista pode ser considerada aparente quando houver algum tipo de aviso sobre
sua existência.
d) Januário pode ajuizar uma ação possessória, provando a existência da servidão com base no
título.
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5) (XXIII EXAME) George vende para Marília um terreno não edificado de sua propriedade,
enfatizando a existência de uma “vista eterna para a praia” que se encontra muito próxima do
imóvel, mesmo sem qualquer documento comprovando o fato. Marília adquire o bem, mas, dez
anos após a compra, é surpreendida com a construção de um edifício de vinte andares
exatamente entre o seu terreno e o mar, impossibilitando totalmente a vista que George havia
prometido ser eterna. Diante do exposto e considerando que a construção do edifício ocorreu em
um terreno de terceiro, assinale a afirmativa correta.
a) Uma vez transcorrido o prazo de 10 anos, Marília pode pleitear o reconhecimento da
usucapião da servidão de vista.
b) Mesmo sem registro, Marília pode ser considerada titular de uma servidão de vista por
destinação de George, o antigo proprietário do terreno.
c) Mesmo sendo uma servidão aparente, as circunstâncias do caso não permitem a usucapião
de vista.
d) Sem que tenha sido formalmente constituída, não é possível reconhecer servidão de vista em
favor de Marília.
Gabarito
1) C
2) A
3) B
4) D
5) D
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