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TA1 – 20 (vinte) pontos – MEDIAÇÃO, ARBITRAGEM E

CONCILIAÇÃO
10. Período Matutino e Noturno – Faculdade de Direito de Conselheiro
Lafaiete – Prof. Fabrício Veiga Costa
 
A partir do estudo dos MEIOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS DE
INTERESSES, responda o FÓRUM AVALIATIVO abaixo:
 
1) Desenvolva um estudo doutrinário e explique:

a) O que é a jurisdição?
Jurisdição é o poder dever do Estado Juiz, função ou atividade do Estado
que objetiva resolver conflitos de interesses entre particulares mediante a aplicabilidade
do direito ao caso concreto, buscando uma decisão mais justa entre as partes. É uma
atividade típica do poder Judiciário, mas não é exclusiva.
O magistrado no exercício da função jurisdicional deverá obrigatoriamente
fundamentar sua decisão com base no texto jurídico-legal e constitucional, além de ter o
dever de agir com imparcialidade. Sendo assim, podemos citar como características da
jurisdição: a impertatividade, a substituvidade, a imparcialidade, a obrigatoriedade de
fundamentação das decisões judicias, a inevitabilidade, a definitividade e a inércia.
Ademais, a jurisdição é regida pelos seguintes princípios: a investidura, a
indelegabilidade, a aderência ao território, a indeclinabilidade e a unidade da jurisdição.

b) Quem além do poder Judiciário poderá exercer a jurisdição?


O Poder Legislativo poderá exercer, excepcionalmente, a função
jurisdicional no momento em que julga o pedido de impeachment contra o presidente da
República.

 
2) Diferencie a finalidade prática e teórica da mediação e da conciliação,
mediante um estudo doutrinário sobre o tema proposto.

Na conciliação busca-se resolver a lide jurídica, ou seja, o acordo é


realizado sem adentrar nas raízes e nas causas do problema, motivo pelo qual as partes
podem voltar a entrar em conflito. Aqui, as partes irão dialogar e resolver de forma
amigável o conflito de interesses que existe entre elas. O conciliador poderá ser um juiz
ou alguém indicado pelo Tribunal e poderá participar do diálogo, dando opiniões,
sugestões e fazendo recomendações com a finalidade de solucionar o conflito, sendo
necessário que as partes façam concessões recíprocas para que seja possível um acordo.
Chegando a um acordo, o juiz irá homologar o mesmo em sentença definitiva. Caso não
cheguem a um acordo, a lide será resolvida pelo magistrado (meio heterocompositivo).
Já na mediação, busca-se resolver a lide sociológica, ou seja, o conflito será
resolvido trabalhando as suas causas e as raízes do problema, sendo mais difícil as
partes voltarem a entrar em conflito pelo mesmo problema. Ademais, a mediação é
regida pelo princípio da confidencialidade que estabelece que tudo que é dialogado e
discutido nas sessões de mediação, não poderá ser levado ao processo, podendo constar
no mesmo somente o resultado obtido da mediação, não tornando público as razões do
conflito. Além disso, o mediador não participará diretamente da resolução do
conflito,não podendo opinar, adotando uma postura mais equidistante, atuando como
um facilitador do diálogo para que assim as partes consigam chegar a uma solução sobre
o conflito.

 
3) Analise as principais distinções teóricas e práticas existentes entre a
jurisdição autocrática e a jurisdição democrática, demonstrando-se
claramente o entendimento da doutrina brasileira sobre o tema proposto.

A jurisdição autocrática é a exercida como atividade pessoal do juiz e não


como função do poder Judiciário, sendo incompatível com o Estado Democrático de
Direito, uma vez que permite ao magistrado utilizar de critérios metajurídicos e
axiológicos. É consideradouma afronta aos princípios da segurança jurídica e da
obrigatoriedade de fundamentação racional das decisões judiciais. As decisões são
proferidas unilateralmente pelo magistrado, ou seja, o juiz não compartilha com as
partes envolvidas no conflito de interesses a legitimidade na construção da decisão final
de mérito.
Já a jurisdição democrática tem como primeira característica a
obrigatoriedade de o magistrado fundamentar de forma racional todas as suas decisões
judiciais, não podendo se utilizar de critérios matajurídicos e axiológicos para
fundamentar suas decisões. Aqui, todas as alegações e provas produzidas pelas partes
deverão ser apreciadas pelo julgador no momento da decisão de mérito, não podendo
decidir o conflito de interesses de forma unilateral, ou seja, o julgador deverá garantir o
direito das partes de participarem da formação do conteúdo da decisão final de mérito.
De acordo com a doutrina brasileira, admitir que o magistrado utilize de
critérios valorativos, metajurídicos e axiológicos como critério de decisão é o mesmo
que relativizar a racionalidade crítica que deve reger as decisões judicias,
comprometendo de forma substancial a segurança jurídica.
Sendo assim, a jurisdição democrática é a considerada compatível com o
Estado Democrático de Direito.

A partir da leitura dos textos intitulados


 
 “IMPARCIALIDADE DO JUÍZO X A CONSCIÊNCIA DO JULGADOR NO
ATO DE DECIDIR: UM ESTUDO CRÍTICO DA PROCESSUALIDADE
DEMOCRÁTICA E DO ARTIGO 489 DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL”
e
“LAQUEADURA COMPULSÓRIA: ANÁLISE DA
TRANSDISCIPLINARIDADE DO “CASO JANAÍNA” A PARTIR DO ESTUDO
ETNOGRÁFICO REALIZADO POR PAULA MIRÁGLIA”, elabore um texto
dissertativo de no mínimo 5 (cinco) laudas explicando:
 
1)     A diferença de imparcialidade do juízo e neutralidade judicial.
 
2)    A relação existente entre imparcialidade do juízo com o princípio da
fundamentação racional das decisões judiciais no contexto do artigo 489
CPC/2015.
 
3)    A utilização da carga metajurídica na decisão judicial do caso Janaína e seus
reflexos no contexto do princípio da segurança jurídico e dos direitos fundamentais
da parte (Janaína).

Para a jurisdição autocrática o processo é constituído de uma relação


triangular onde o juiz ocupa uma posição hierarquicamente superior as partes, podendo
exercer a jurisdição como uma atividade pessoal, utilizando de critérios totalmente
metajurídicos e axiológicos para resolver a lide.
Sendo assim, nesse tipo de jurisdição, o juiz tinha total liberdade para criar
normas que se adequassem ao caso concreto, deixando de aplicar a norma positivada
caso a considerasse injusta.
Ademais, a jurisdição autocrática violava o princípio da segurança jurídica,
uma vez que o julgamento da lide era baseado nas convicções pessoais do julgador, o
que acabava ferindo os direitos constitucionais das partes.
Aqui, a imparcialidade do juiz era entendida como a não submissão do juiz
a nenhum tipo de autoridade superior, sendo ele considerado soberano no exercício da
jurisdição, o que é totalmente incompatível com a Hermenêutica Constitucional e,
consequentemente, com o Estado Democrático de Direito.
Dessa forma, na jurisdição autocrática, as partes ficavam submetidas as
vontades impostas pelo juiz, não tendo nenhuma participação na formação do mérito
processual.
O Código de Processo Civil brasileiro de 1973 adotava a jurisdição
autocrática, no qual o juiz possuía total liberdade para valorar provas e conduzir o
processo com a finalidade de formar o seu convencimento utilizando de critérios
metajurídicos e axiológicos como forma de decidir.
O modelo jurisdicional autocrático teve fim com o advento da Constituição
de 1988, dando lugar a jurisdição democrática, ao trazer para o processo o sistema
participativo, que prevê a atuação de todos os interessados juridicamente na lide na
formação do mérito processual.
Dessa forma, o juiz não tomava mais as decisões de forma unilateral além
de não poder decidir a lide de forma subjetiva, devendo observar as questões trazidas
pelas partes e tomar suas decisões de forma lógica e pautadas em embasamentos
jurídicos.
Sendo assim, a Constituição Federal de 1988 trouxe alguns princípios
constitucionais a serem observados durante o processo.
O princípio do contraditório é um princípio constitucional que está ligado
diretamente à obrigação do magistrado de apreciar todas as questões trazidas pelas
partes, sob pena de cerceamento de defesa.
O princípio da ampla defesa também é um princípio constitucional e permite
que as partes possam produzir provas e utilizar de todos os meios de provas necessários,
legítimos e compatíveis com a demanda em questão. O indeferimento de provas sem
fundamentação lógica e jurídica também configura cerceamento de defesa.
Já o princípio do devido processo legal é o princípio constitucional que veda
a possibilidade do julgamento ser realizado unilateralmente pelo juiz ao autorizar que as
partes participem do processo, ou seja, permite que as partes interfiram e participem da
construção do mérito processual. Ademais, o juiz deverá fundamentar juridicamente
todas as suas decisões a fim de garantir a segurança jurídica do processo.
Além dos princípios constitucionais explícitos citados acima, outro princípio
importante que rege o processo no Estado Democrático de Direito é o princípio da
imparcialidade.
A imparcialidade do julgador não pode ser confundida com a neutralidade.
Enquanto a imparcialidade é a atitude do julgador de se posicionar diante do caso
concreto através da utilização de fundamentos jurídicos baseados em preceitos
constitucionais, a neutralidade ocorre quando o julgador não decide a lide, produzindo
decisões obscuras que não negam e nem garantem direitos.
Dessa forma, no Estado Democrático de Direito, a imparcialidade do juiz
ocorre quando o mesmo decide a lide de acordo com o princípio da fundamentação
jurídica.
Assim, a decisão será considerada imparcial quando o juiz utilizar de
argumentos jurídico-constitucional que se adéquam melhor ao caso concreto trazido
pelas partes.
O princípio da fundamentação das decisões jurisdicionais, além de ser uma
garantia constitucional, também está previsto no artigo 489 do Código de Processo Civil
de 2015 e tem como principal objetivo evitar que as decisões processuais sejam
baseadas na subjetividade do julgador, ou seja, afasta do processo decisões
fundamentadas a partir de critérios axiológicos e metajurídicos e que não estão de
acordo com as provas produzidas durante o processo.
Posto isso, podemos dizer que o princípio da imparcialidade do juiz está
diretamente ligado ao princípio da fundamentação jurídica.
Ademais, a fundamentação jurídico-constitucional não é obrigatória
somente na sentença, mas em todos os atos praticados pelo juiz durante o processo.
Sendo assim, o princípio da fundamentação jurídica dá azo para que o
magistrado mantenha a sua imparcialidade durante todos os trâmites processuais,
garantindo assim o cumprimento de outros princípios constitucionais, como é o caso do
direito ao contraditório e da ampla defesa.
O “caso Janaína” exemplifica bem tudo o que foi dito até agora, pois se trata
de uma decisão autocrática, onde a mesma, a requerimento do Ministério Público e com
aquiescência do juízo de primeiro grau, foi submetida a uma laqueadura compulsória
por se encontrar em situação economicamente precária, ser moradora de rua, por já
possuir cinco filhos e ser usuária de drogas, sem que ao menos fosse oportunizada sua
participação no processo, ou seja, Janaína não teve direito de escolha, sendo a
laqueadura realizada sem o seu consentimento.
A decisão pelo juízo de primeiro grau foi realizada baseada somente em
aspectos estritamente jurídicos, sem que fosse analisado o contexto social, político,
econômico, racial e de vulnerabilidade em que a mesma se encontrava o que acaba por
causar uma limitação no que se refere ao debate do mérito e o que pode acabar trazendo
para o processo uma insegurança jurídica.
Aqui, percebe-se o julgamento baseado em uma decisão unilateral,
puramente técnica e dogmática, onde a vontade do judiciário é a que prevalece, sem que
a parte tivesse a oportunidade de participar da formação do mérito em questão,
inviabilizando, dessa forma, a análise de questões controversas importantes para a
construção do provimento final.
Sendo assim, o “caso Janaína” demonstra a grande carga metajurídica
utilizada pelo juízo de primeiro grau na decisão do mérito, uma vez que foi utilizado
como critério para a autorização da laqueadura os seus juízos de valores ao considerar
que esse procedimento seria o mais adequado a ser aplicado no caso concreto.
Nesse caso, verifica-se o total desrespeito por parte do judiciário pelos
princípios constitucionais que regem o processo, além de ser um grande desrespeito aos
direitos fundamentais da Janaína, uma vez que não foi dado a mesma a oportunidade de
integrar o conflito de interesses, ficando condicionada a uma demanda fundamentada
em juízos totalmente axiológicos e metajurídicos.
Nesse contexto, a atitude do magistrado acaba por configurar uma violência
contra a mulher e aos seus direitos fundamentais adquiridos, principalmente no que se
referem aquelas que se encontram em estado de vulnerabilidade.
No momento em que o magistrado decidiu autorizar a laqueadura sem o
consentimento de Janaína, ele feriu a dignidade da mesma, além de retirar o seu direito
de escolha, sua autonomia e a autoridade sobre o seu próprio corpo.
Entretanto, é possível verificar que além do estado de vulnerabilidade
vivenciada pela parte, existem outros fatores enraizados em nossa sociedade que
contribuíram para que o magistrado se colocasse na posição de se autolegitimar a tomar
a decisão por Janaína.
Entre esses fatores podemos citar a desigualdade de gênero, a dominação
masculina e a coisificação dos corpos que são características do patriarcalismo que
ainda faz parte da nossa sociedade.
São por esses motivos que garantir a jurisdição democrática, onde as partes
têm o direito de participar da construção do mérito e onde se é exigido que o magistrado
mantenha a imparcialidade em todos os seus atos através da fundamentação lógica,
jurídica e baseada em preceitos constitucionais se faz tão importante, pois é a partir
desses preceitos que se é possível garantir a segurança jurídica, evitando assim que
sejam proferidas decisões totalmente baseadas em preceitos subjetivos, axiológicos e
metajurídicos.

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