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Resenha de:

ARAÚJO, A.M.C. & TAPIA, J.R.B. Estado, Classes e Estratégia: Notas sobre um
debate. In: Crítica e Sociedade: revista de cultura política. v.1, n.1, jan./jun. 2011
Fausto Cafezeiro

O texto aponta que Poulantzas rompeu com o marxismo-estruturalismo e passou


a tratar o estado como campo relacional. As esferas econômica, política e ideológicas
passam a ser entendidas não como sistemas fechados entre si, mas em relação umas com
as outras. A proposta, em linhas gerais, é que as classes sociais e suas lutas são
indissociáveis, já que em lugar das relações de produção determinando as relações de
trabalho, nesse momento ele passa a propor que se tratam de relações que se
retroalimentam.

Em decorrência, [Poulantzas] permite compreender que a presença do Estado


nas relações de produção (enquanto campo que encarna, materializa e
concentra as relações político-ideológicas) significa sua primeira atuação na
formação e reprodução das classes sociais, e assim na luta de classes.
(ARAÚJO & TAPIA, 2011, p. 8)
Há o rompimento com a ideia de que o Estado seja o único locus do poder – não
que o Estado tenha um papel periférico ou secundário nisso, mas sim que o Estado
encarna poderes, que o podem superar. A ideia aponta para o caráter de arena de
disputa, ou de campo de forças dos conflitos e das lutas de classes. O texto afirma uma
influência foucaultiana para esta conceituação, através da ideia de um poder que não é
uma coisa, e sim um exercício. Poulantzas adota o sentido positivo do poder,
transferindo-o ao Estado – que não deixa de ser contraditório, já que localiza novamente
o poder como fruto das relações de produção, algo negado por Focault. O sentido
positivo do poder do Estado, de que ele cria e reorganiza relações, deve ser
compreendida, portanto, como um meio-termo entre Althusser e Focault: não se nega
nenhum dos dois autores integralmente, mas se aproveitam ideias e categorias, criando a
ideia do poder positivo do Estado.
Os autores criticam que a autonomia relativa (frente às frações do bloco
hegemônico e frente à hegemonia) do Estado presente nessa questão denunciaria um
certo viés ainda estruturalista, já que deixa em aberto a conceituação do que seja
hegemonia. Parece que Poulantzas está inspirado n’O 18 de Brumário de Luís
Bonaparte, um belo texto de análise de conjuntura em que Marx consegue visualizar o
fracionamento das classes que ocupam o Estado disputando-o.
Outra corrente abordada pelo texto é a abordagem sistêmica de Claus Offe,
inspirado na Escola de Frankfurt. O texto foca em analisar o conceito de seletividade
estrutural das insitituições estatais, tensionando com o poder relacional do Estado de
Poulantzas. A crítica de Offe é a de que não pode a política de Estado ser sempre
determinada por externamente a si. Em suma, para ele o Estado capitalista é “uma forma
organizacional do poder público com a produção materia” (p. 25).

Em suma, o poder político do Estado Capitalista está sujeito a uma dupla


determinação: segundo a sua forma institucional, ele é determinado pelas
regras do jogo democrático-representativo, pelo seu conteúdo é determinado
pelos requisitos e desenvolvimento da acumulação capitalista. (Op. cit., p.
26)
O sentido do poder do Estado, então, não estaria determinado pela luta de
classes, e sim pela sua própria organização burocrática. A questão, para ele, é mais
funcional, relativa à própria organização do Estado. Não parece que Offe negue as lutas
de classes, mas talvez, para ele, se trate de um outro campo de atuação. A questão é
mais da dependência que o Estado tem da acumulação – e não de que seja esta ou
aquela fração de classe a hegemonizá-lo – que o faz viabilizar as relações de troca.
O último autor trabalhado no texto é Bob Jessop, que relê Poulantzas criticando
que a a ideia de ser o Estado uma materialização das relações sociais não foi levada às
últimas consequências. Ele se baseia na ideia de estratégia para explicar o poder do
Estado. Seu ponto nevrálgico é a diferenciação entre dominação e hegemonia,
aplicando-a às esferas econômica, política e ideológica. Dominação diz respeito à
“forma
determinada de correlação de forças entre as classes que são condizentes com a
reprodução ampliada das relações capitalistas” (p. 43). Ela não diz respeito,
necessariamente, à hegemonia, definida como formulação estratégia, seja ela para a
acumulação (estratégia econômica) ou de um projeto (política). A estratégia ideológica
consiste em articular uma estratégia à outra.

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