Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
É normal que as pessoas tenham uma noção geral de alguns conceitos no dia a dia e essas
mesmas palavras sejam usadas com um significado mais específico em pesquisas
científicas. Também é relativamente comum que diferentes áreas usem o mesmo termo
com significados diferentes. Um exemplo é o conceito de calor, que usamos nos dias de
verão ou quando encontramos alguém muito querido e o abraçamos (calor humano).
Porém, em termodinâmica, o conceito de calor é basicamente a troca de energia
térmica, independente de temperatura.
Então é errado usar o termo calor como usamos em conversas cotidianas? Não! O que é
errado é tentar entender termodinâmica usando esse conceito.
Eu sei que o objetivo da Divulgação Científica é ser mais geral. Algumas vezes, porém, é
necessário esclarecer alguns termos como forma de acabar com mal entendidos. Então
vamos lá:
Comunicação:
Qualquer tipo de troca de informação. Pode se referir à comunicação, humana, a de outros
animais ou até mesmo a comunicação entre computadores;
Linguagem:
O objeto de estudo da linguística é a comunicação humana. Por mais que linguistas possam
se interessar pela comunicação de outras espécies, o estudo desses sistemas de
comunicação será comparativo. O linguista que estuda os animais busca compreender as
diferenças da comunicação humana para as outras que existem na natureza. Assim,
convencionou-se chamar essa forma de comunicação de “Linguagem”;
Línguas:
Apesar de a linguística usar o termo linguagem para se referir à comunicação dos humanos,
essa comunicação pode se concretizar através de diferentes formas. Existem diversos
sistemas de regras lógico-estruturais de formação de palavras (morfologia), de frases
(sintaxe), do som (fonética/fonologia), etc. Observe que língua e linguagem não são
sinônimos;
Fala:
O último dos termos que nos serão importantes aqui é a Fala, que é somente o meio pelo
qual transmitimos essas línguas, da mesma forma como os sinais manuais são o meio de
transmissão das línguas sinalizadas. Novamente, observe que fala e linguagem não são
sinônimos.
Repare que, seguindo essa terminologia, não é possível dizer que chimpanzés e outros
primatas tenham linguagem. Isso independe de suas capacidades comunicativas, do
conhecimento de uma ou de outra área da ciência ou de achismo. Se trata simplesmente da
definição terminológica. De todo modo, independente de terminologia, podemos revisar e
questionar os achados científicos sobre as diferentes formas de comunicação existentes na
natureza, como faremos a partir da seção seguinte.
Comunicação Gestual
Além das vocalizações, chimpanzés e outros grandes primatas possuem uma complexa
comunicação gestual. E embora os primatas de diferentes grupos em diferentes localidades
compartilhem o mesmo repertório de vocalizações (inatos e estruturas muito diferente das
línguas humanas), o repertório de expressões faciais e gestos podem ser inventados ao
ponto de termos diferenças menos sutis entre diferentes grupos da mesma espécie. Além
disso, as expressões manuais como apontar para objetos e as expressões faciais também
possuem diferenças menos sutis entre primatas humanos e não-humanos. Mas, para a
linguística, esse tipo de comunicação não está no centro das pesquisas ou, em outras
palavras, não é, exatamente, linguagem. Algumas áreas irão chamá-la de comunicação não-
verbal mas repare que essas expressões são diferentes das línguas de sinais, consideradas
verbais por terem estrutura lógica iguais as das línguas orais.
Repare também que é possível então dizer que a comunicação vocal de chimpanzés é inata
por não variar dentro da espécie, embora seu uso possa ser ligeiramente variável. Porém, no que
diz respeito à linguagem humana, só é possível dizer que a capacidade de aprender e usar uma
língua (linguagem) é inata, mas as línguas em si são fruto do contexto sócio-histórico da
comunidade que a usa.
Por outro lado, a comunicação gestual dessas espécies parece ser mais aberta a variação e
criatividade, embora ainda não variem tanto quanto as línguas humanas.
Aspectos biológicos
Há trabalhos que comparam diferentes aspectos da comunicação primata não-humana,
incluindo estudos neurocientíficos. Em aves, quanto maior o cérebro maior o número de
pios. Em primatas, porém, a diferença está nas estruturas cerebrais envolvidas com a
comunicação. E se compararmos com a comunicação humana, existe uma região cerebral
chamada LMC (Cortex Motor Laringeal) que é relacionada à aspectos da comunicação.
Caso danificada, essa estrutura causa perda de comunicação oral em humanos, que
mantém apenas as vocalizações inatas como choro, riso e gritos de dor. Por outro lado,
danos nessa área do cérebro em primatas não-humanos não resultaram em qualquer
modificação aparente na comunicação dessas espécies segundo as pesquisas. (KUMAR &
SIMONYAN, 2018).
Ainda assim, o estudo das linguagens (formas de comunicação) animais podem nos trazer
bons pontos de comparação para compreender as nossas próprias capacidades e evolução,
e esse é um dos caminhos da Biolinguística.