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ISSN: 1984-6290

B3 em ensino - Qualis, Capes


DOI: 10.18264/REP

Breve estudo sobre Lev Vygotsky e o sociointeracionismo

Priscila Romero
Pedagoga, orientadora educacional e especialista em Educação Especial e Inclusiva

Vygotsky entende o homem e seu desenvolvimento numa perspectiva sociocultural, ou seja, percebe que o homem se constitui na interação
com o meio em que está inserido (RESENDE, 2009). Por isso, sua teoria ganhou o nome de socioconstrutivismo, sendo também denominada
sociointeracionismo.

É importante afirmar que essa interação entre homem e meio é considerada uma relação dialética, já que o indivíduo não só internaliza as
formas culturais como também intervém e as transforma (RESENDE, 2009). Sua obra tem como temas centrais o desenvolvimento humano e a
aprendizagem – dois processos indissociáveis que se constituem reciprocamente (RESENDE, 2009).

Linguagem e pensamento
Vygotsky afirma que o desenvolvimento da linguagem implica o desenvolvimento do pensamento, pois pelas palavras o pensamento ganha
existência (MIRANDA; SENRA, 2012). “A linguagem age decisivamente na estrutura do pensamento e é ferramenta básica para a construção de
conhecimentos”. Intervém no desenvolvimento intelectual da criança desde seu nascimento (STADLER et al). “A linguagem fornece os conceitos
e as formas de organização do real que constituem a mediação entre o sujeito e o objeto de conhecimento” (FOSSILE, 2010).

Percebemos, portanto, que dar voz às crianças é de fundamental importância para que elas exercitem o pensamento. Nós, educadores, não
devemos cerceá-las. Devemos ouvi-las e agir como mediadores, auxiliando também em sua construção intelectual.

Vygotsky afirma que a linguagem possui duas funções básicas: intercâmbio social e pensamento generalizante. A função de intercâmbio social
é bem visível nos bebês, uma vez que conseguem, por meio de gestos, expressões e sons, demonstrar seus sentimentos, desejos e
necessidades. A função de pensamento generalizante pode ser exemplificada quando falamos, por exemplo, a palavra boi. Independentemente
de ter visto de perto algum boi ou de comer ou não sua carne, nosso pensamento classifica tal palavra na categoria animais e nos remete à sua
imagem.

Dentre as manifestações da linguagem encontramos também a fala privada – é a fala consigo mesmo. Vygotsky a considera uma ligação entre
linguagem e pensamento, já que, conforme a fala privada se desenvolve, a criança torna-se capaz de orientar e dominar ações (MIRANDA;
SENRA, 2012).

Estes são os pilares básicos do pensamento de Vygotsky:

1. “As funções psicológicas têm um suporte biológico, pois são produtos da atividade cerebral”. O cérebro é um sistema aberto, pois é
mutável. Suas estruturas são moldadas ao longo da história do homem e de seu desenvolvimento individual;
2. O funcionamento psicológico tem com base as relações sociais, dentro de um contexto histórico;
3.  A cultura é parte essencial do processo de construção da natureza humana;
4. A relação homem-mundo é uma relação mediada por sistemas simbólicos. Entre o homem e o mundo existem elementos mediadores –
ferramentas auxiliares da atividade humana (STADLER et al).

Para Vygotsky, as funções psicológicas superiores (ações e pensamentos inteligentes que só encontramos no homem, como pensar, refletir,
organizar, categorizar, generalizar...) são construídas ao longo da história social do homem (STADLER et al).
Mediação
O contato que o indivíduo tem com o meio e com seus iguais é mediado por um conhecimento e/ou experiência assimilado anteriormente, uma
vez que o indivíduo não tem contato direto com os objetos, e sim mediado. Por isso, ele tem a sua teoria como socioconstrutivista, pois percebe
que interação é mediada por várias relações, diferentemente do construtivismo, em que o sujeito age diretamente com o objeto (MAGALHÃES,
2007).

A mediação, conceito central de sua obra, é a intervenção de um elemento intermediário em uma relação. Para Vygotsky, existem dois
elementos mediadores: os instrumentos e os signos. Ambos oferecem suporte para a ação do homem no mundo (STADLER et al). Instrumento
é todo objeto (externo) criado pelo homem com a intenção de facilitar seu trabalho e sua sobrevivência, enquanto os signos são instrumentos
psicológicos (internos), que auxiliam o homem diretamente nos processos internos. Quando o homem cria uma lista para ir ao mercado, está
criando signos, ou seja, instrumentos psicológicos que o auxiliarão, mais tarde, na realização da ação (compras no mercado) (STADLER et al).

As representações da realidade e a linguagem são sistemas simbólicos que fazem a mediação do homem com o mundo. É o próprio grupo
cultural quem fornece as representações e o sistema simbólico, pois, ao interagir com o outro, o indivíduo vai interiorizando as formas
culturalmente construídas, as mesmas que possibilitam as relações sociais (STADLER et al).

Zonas de desenvolvimento
Vygotsky, em sua teoria socioconstrutivista, afirma que sempre que há um tipo de troca (relação) existe aprendizagem. O homem não é um ser
passivo, visto que é um ser que, ao criar cultura, cria a si mesmo (STADLER et al).

Como afirmar, então, que uma criança só adquire conhecimento quando passa a frequentar a escola? O pensamento de Vygotsky é contrário:
fora da escola, a criança desenvolve seu potencial, sim, com todas as trocas estabelecidas, também quanto ao desenvolvimento da língua
escrita. Porém Vygotsky não diminui a importância do ambiente escolar, pois quando a criança se familiariza com o mundo escolar ocorre algo
fundamentalmente novo em seu desenvolvimento: a criança sai da sua zona de desenvolvimento real e passa, com auxílio do professor ou outro
mediador, para a zona de desenvolvimento potencial – caracterizando a zona de desenvolvimento proximal (MAGALHÃES, 2007).

A zona de desenvolvimento real refere-se à etapa em que a criança soluciona os problemas de forma independente, sem ajuda; a zona de
desenvolvimento potencial refere-se à etapa em que a criança está pronta para compreensão de problemas mais complexos, mas ainda
necessitando da ajuda de um mediador (STADLER et al).

A zona de desenvolvimento proximal é uma metáfora criada para explicar como ocorre a aprendizagem. É a distância entre o nível real e nível
potencial da criança (MAGALHÃES, 2007).

Escrita
A escrita é um produto cultural, construído historicamente, que vai além do domínio da grafia. “É um sistema de representação simbólica da
realidade, a qual medeia a relação dos homens com o mundo” (RESENDE, 2009).

Luria, pesquisador e colega de Vygotsky, afirma que a criança antes de adquirir a idade escolar já é capaz de assimilar técnicas que preparam o
caminho para a sistematização da escrita e que a memória é a precursora da escrita. Enquanto isso, Vygotsky critica a forma como as escolas
realizam o processo da escrita, uma vez que utilizam um ato puramente mecânico, exigindo que as crianças desenhem as letras e construam
palavras sem ensinar a linguagem escrita (RESENDE, 2009). Sendo assim, ignoram-se os aspectos psíquicos da criança. “Aprender a escrever é
construir nova inserção cultural, é aprender uma forma de interagir com o meio no qual está inserido” (RESENDE, 2009).

Além disso, Vygotsky afirma que, para escrever, as crianças devem entender a linguagem falada; sua incursão na escrita ocorrerá quando elas
perceberem que podem também desenhar o que se fala (RESENDE, 2009).
Ambiente e educador
O ambiente de ensino deve ser estimulador e favorável. O educador deve ser paciente e afetuoso com o aprendiz, além de buscar conhecer seus
alunos, o meio em que vivem, as relações que estabelecem nesse meio e compreender o que seus pupilos já sabem, já adquiriram. É de extrema
importância que o educador alfabetize letrando, ou seja, “ensinando a ler e a escrever no contexto das práticas sociais”. Dessa forma, a
aprendizagem poderá ser significativa e satisfatória, completando o ciclo de desenvolvimento do aluno (RESENDE, 2009).

Vygotsky é contra uma “pedagogia diretiva e autoritária”, pois para ele a intervenção no desenvolvimento da criança tem maior preocupação
com o meio cultural e as relações entre os indivíduos. Vygotsky, em sua teoria socioconstrutivista, é a favor da reelaboração e reconstrução do
conhecimento (RESENDE, 2009).

Dessa forma percebemos o valor da Educação e da escola como um todo.

Referências
FOSSILE, Dieysa K. Construtivismo versus sociointeracionismo: uma introdução às teorias cognitivas. Revista Alpha, Patos de Minas, UNIPAM.
2010. Disponível em: http://alpha.unipam.edu.br/documents/18125/23730/construtivismo_versus_socio_interacionsimo.pdf.

MAGALHÃES, Mônica M. G. A perspectiva da Linguística: linguagem, língua e fala. Rio de Janeiro, 2007.

MIRANDA, Josete Barbosa; SENRA, Luciana Xavier. Aquisição e desenvolvimento da linguagem: contribuições de Piaget, Vygotsky e Maturana.
2012.

RESENDE, Muriel L. M. Vygotsky: um olhar sociointeracionista do desenvolvimento da língua escrita. Disponível em:
http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrID=1195. Publicado em: 25/11/2009.

SMOLKA, Ana Luiza B. Concepção de linguagem como instrumento: um questionamento sobre práticas discursivas e educação formal. 1995.
Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X1995000200003.

STADLER, Gesane; ROMANOWSKI, Joana P.; LAZARIN, Luciane; ENS, Romilda T.; VASCONCELLOS, Sílvia. Proposta pedagógica interacionista.
 Disponível em: http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2004/anaisEvento/Documentos/CI/TC-CI0087.pdf.

Leia mais artigos sobre autores que abordam a temática da linguagem e suas teorias.

Publicado em 28 de abril de 2015

Creative Commons - Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional (CC BY-NC 4.0)

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TEORIA DE VYGOTSKY

Vygotsky, psicólogo nasceu na Rússia em 1896 e morreu em 1934 com apenas 37


anos, vítima de tuberculose. Estudou na Universidade Popular
de Shanyavskii, formando-se em direito, mas também se dedicou aos estudos
intelectuais de Filosofia, Literatura, História e Psicologia.

Estudou Francês, Alemão, Inglês, Hebraico, Latim e Grego. Teve um tutor particular
até entrar na escola, para fazer o curso secundário, graduando-se com medalha de
ouro. Desde adolescente, seus colegas o chamavam de “o pequeno professor”, pois
ele já gostava dos estudos intelectuais que marcariam sua vida. Foi professor e
pesquisador no campo de Defectologia, das Artes, Literatura e Psicologia. Além do
fato de ser professor, a preocupação de Vygotsky com a educação tinha também
motivos políticos, pois era um de seus compromissos revolucionários. Formou-se
também em Medicina e a partir de 1924, no Instituto Soviético de Medicina
Experimental, aprofundou suas investigações na Psicologia.

Já tuberculoso, iniciou um período de intensa produção de conferências, textos e


pesquisas, principalmente com crianças portadoras de deficiências visuais e auditivas.
Trabalhou no Instituto de Psicologia de Moscou, onde iniciou um período de intensa
produção de textos e pesquisas a respeito do desenvolvimento
intelectual, defendendo que todo conhecimento é constituído socialmente, a partir das
relações humanas. Dono de uma inteligência brilhante, ele buscou na Psicologia
respostas para suas dúvidas e acabou por elaborar uma teoria do
desenvolvimento intelectual, sustentando que todo conhecimento é
construído socialmente, no âmbito das relações humanas. Para ele, “na ausência do
outro, o homem não se constrói homem”.
Na sua teoria, Vygotsky diz que para o homem se desenvolver e evoluir, é necessário
o convívio com outras pessoas, e partir daí, ele vai adquirir e assimilar
conhecimentos, desenvolvendo-se mentalmente. Acrescenta que a
vivência em sociedade é essencial para a transformação do homem de ser biológico
em ser humano. É pela aprendizagem nas relações com os outros que construímos
os conhecimentos que permitem nosso desenvolvimento mental. O conhecimento
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é sempre intermediado. Nenhum conhecimento é construído pela


pessoa sozinha, mas sim em parceria com as outras, que são os mediadores. Na
escola, o professor e os colegas mais experientes são os principais
mediadores, daí ser o objetivo da escola transformar os conceitos espontâneos, que a
criança desenvolve na convivência social, em conceitos científicos. A linguagem é
para Vygotsky, o principal instrumento de intermediação do conhecimento entre os
seres humanos, e tem relação direta com o próprio desenvolvimento psicológico.
Para ele, a aprendizagem está relacionada ao desenvolvimento desde o início da
vida humana e inclui relações entre os indivíduos.
A relação ensino-aprendizagem é um processo global de relação interpessoal que
envolve alguém que aprende, alguém que ensina, e a escola é o lugar por excelência
na qual o processo intencional ensino-aprendizagem ocorre, podendo envolver
intervenção que conduza à aprendizagem.
Vygotsky elaborou uma teoria do desenvolvimento intelectual,
sustentando que nenhum conhecimento pode ser elaborado sozinho,
criou o Socioconstrutivismo, ou como preferem alguns
especialistas, Sociointeracionismo, justificando como fundamental a questão cultural
e a questão afetiva. Para o ser humano, o meio é sempre revestido de significados
culturais. O fator cultural é a diferença central entre os dois teóricos, Piaget e
Vygotsky.
Considera a capacidade do homem de raciocinar, como também de sensibilizar-se e
se emocionar. Dessa forma, um sistema dinâmico de significados em que o afetivo
e o intelectual se unem, buscando compreender o sujeito como uma totalidade.
Acreditava que o desenvolvimento mental do aluno se determina em dois níveis: O
nível de Desenvolvimento afetivo e a Área de Desenvolvimento Potencial.
Vygotsky viveu apenas 37 anos, mas sua produção intelectual foi intensa e relevante,
chegando a produzir 200 estudos científicos sobre diferentes temas, controvérsias e
discussões da psicologia contemporânea, da pedagogia e das ciências humanas de
um modo geral. Prefaciou a tradução russa de A Linguagem e o Pensamento da
Criança de Jean Piaget em 1923. Para a Pedagogia, a contribuição de suas obras
para nós educadores se reveste de grande importância, porque traz para o campo
educacional uma visão integrada de conhecimentos. Acusado de idealista por Josef
Stalin, suas obras foram proibidas por vinte anos, só voltando a ser publicada na
antiga URSS em 1956, mesmo assim parcialmente. Atualmente prepara-se a edição
integral de todos os seus trabalhos.
Para o cineasta Sergei Eisenstein (1898-1948), o considerava um dos psicólogos
mais brilhantes de nossa era, capaz de ver o mundo com claridade celestial.
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Destaques na Teoria de Vygotsky:

* O socioconstrutivismo é uma tendência cada vez mais presente no debate


educacional;
* Considerado o teórico social da inteligência;
* O conhecimento é sempre intermediado;
* A vivência em sociedade é essencial para a transformação do homem de ser
biológico em ser humano;
* É pela aprendizagem nas relações com os outros que construímos os
conceitos que permitem nosso desenvolvimento mental;
* Segundo Vygotsky a evolução cultural é caracterizada por saltos qualitativos de
um nível de conhecimento para outro;
* A criança nasce dotada apenas de funções psicológicas elementares, como o
reflexo e a atenção involuntária, presentes em todos os animais mais desenvolvidos;
* O meio é sempre revestido de significados culturais;
* A inteligência é construída a partir das relações recíprocas do homem com o
meio;
* O homem para se desenvolver e evoluir, é necessário o convívio com outras
pessoas;
* Através das concepções do materialismo histórico e dialético tentaram explicar
o desenvolvimento das funções mentais superiores, a qual dedicou maior tempo de
seus estudos, através da teoria sociocultural, contestando criticamente que as
funções intelectuais do adulto não são resultado unicamente da maturação;
* Entendia o pensamento como reflexo generalizado da realidade, transmitido
através da fala e esta como importante mecanismo que estrutura e organiza o
pensamento;
* É no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva em vez de
uma esfera visual externa, dependendo das motivações internas e não
unicamente dos incentivos fornecidos pelo objeto externo;
* O trabalho em duplas facilita o aprendizado, mas cabe ao professor
acompanhar individualmente o aluno;
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* O professor é o condutor do processo, atuando na zona de desenvolvimento


proximal;
* O erro faz parte do processo de aprendizagem. O professor não pode esperar
que o aluno descubra sozinho seu erro;

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