Você está na página 1de 2

A dimensão religiosa – análise e compreensão da experiência religiosa [Filosofia da Religião]

Prof.ª Joana Inês Pontes

SANTO ANSELMO (1033-1109): Nasceu em Aosta, na Itália. Em 1060 entrou para o Mosteiro
de Bec, do qual veio a tornar-se abade em 1078. Durante a sua estadia nesse mosteiro que
escreveu o Proslogion (1077-1078), no qual apresenta o argumento ontológico. Anselmo é
geralmente considerado como o maior teólogo do seu tempo.

ARGUMENTO ONTOLÓGICO

“Portanto, Senhor, Tu que dás o teu entendimento da fé, concede-me que, quando sabes ser-me
conveniente, entenda que existes como acreditamos que és o que acreditamos e que és o que
acreditamos [seres]. E na verdade acreditamos que Tu és algo maior do que o qual nada pode ser
pensado.
Acaso não existe uma tal natureza, pois o insensato disse no seu coração “não há Deus”?
Mas com certeza esse mesmo insensato, quando ouvir isto mesmo que digo, algo maior do que o
qual nada pode ser pensado, entende o que ouve e o que entende está no seu intelecto, ainda que não
entenda que isso exista. Com efeito, uma coisa é algo estar no intelecto, outra é entender que
esse algo existe. Com efeito, quando o pintor concebe previamente o que vai fazer, tem isso mesmo
no intelecto, mas ainda não entende que exista o que não fez. Mas quando já pintou, não só o tem no
intelecto como entende que existe aquilo que já fez. E, de facto, aquilo maior do qual nada pode
ser pensado não pode existir apenas no intelecto. Se está apenas no intelecto, pode pensar-se
que existe na realidade, o que é ser maior.
Se, portanto, aquilo maior do que o qual nada pode ser pensado está apenas no intelecto, aquilo
mesmo maior do que o qual nada pode ser pensado é aquilo relativamente ao qual pode pensar-se
algo maior. Existe, portanto, sem dúvida, algo maior do que o qual nada é possível pensar não
apenas no intelecto, mas também na realidade.”
Santo Anselmo, Proslogion.

Coisas que existem Coisas que não existem

ARGUMENTO ONTOLÓGICO
P1: Deus é o ser maior do qual nada pode ser pensado.
P2: Deus existe somente no pensamento.
P3: Se Deus existe apenas no entendimento, então podemos conceber outro ser maior do que Deus,
nomeadamente um que exista também na realidade. (contradição)
C: Logo, a suposição de que Deus apenas existe no entendimento é falsa.
Conclusão final: Deus existe também na realidade, ou seja, Deus existe.
A dimensão religiosa – análise e compreensão da experiência religiosa [Filosofia da Religião]
Prof.ª Joana Inês Pontes

GAUNILO de MARMOUTIER (século XI): foi um monge beneditino do convento de


Marmoutier, próximo de Tours, em França. Muito pouco se sabe acerca deste monge, e
nenhum outro escrito existe da sua autoria, exceto a sua crítica ao argumento
ontológico de S. Anselmo. Gaunilo procura mostrar que usando o mesmo padrão
argumentativo de S. Anselmo, podemos demonstrar que existe seja o que for, desde que
o concebamos como sumamente perfeito

Crítica ao Argumento de S. Anselmo


Em Defesa do Insensato

“Por exemplo: diz-se que algures no oceano há uma ilha a que, por causa da dificuldade (ou
antes, da impossibilidade) de encontrar o que não existe, foi dado o nome de “Perdida”. E
segundo reza a história esta ilha é abençoada com todo o género de riquezas e deleites sem
preço e em abundância, muito mais do que as ilhas Felizes e, não tendo dono nem habitantes, é
em tudo superior, na abundância de riquezas, a todas aquelas terras que os homens habitam.
Ora, se alguém me disser que é assim, facilmente compreendo o que se diz, dado que não há
qualquer dificuldade nisto. Mas, se depois me disserem, como se fosse uma consequência lógica
disto: Não podes duvidar que esta ilha, que é mais excelente do que todas as outras terras,
verdadeiramente existe algures na realidade, tal como não podes duvidar que existe no teu
espírito; e dado que é maior a excelência de existir não apenas no espírito, mas também na
realidade, tem necessariamente que existir. Pois se não existisse, qualquer outra terra existente
na realidade seria mais excelente do que ela, e assim esta ilha, que já concebes como mais
excelente do que as outras, não seria a mais excelente. Se alguém quiser persuadir-me de que
esta ilha existe realmente para lá de qualquer dúvida, irei pensar que está a brincar ou
terei dificuldade em decidir qual de nós é mais insensato – eu, se concordasse com ele, ou
ele, se pensar que demonstrou a existência desta ilha com alguma certeza, a não ser que me
tivesse convencido primeiro de que a sua própria excelência existe no meu espírito
precisamente como uma coisa que existe verdadeiramente e indubitavelmente e não apenas
como uma coisa irreal ou duvidosamente real.”
Gaunilo de Marmoutiers, Em Defesa do Insensato (1077)

Atividade

1. Apresente, na forma canónica, a objeção de Gaunilo ao argumento de Santo Anselmo.

Recursos na internet:
Kahane, Howard, (1983) “Há boas Razões para Acreditar que Deus existe?, in Filosofia e Educação,
http://filedu.com/hkahanehaboasrazoesparaacreditarquedeusexiste.html.

Você também pode gostar