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Copyright ©2021 Alessa Ablle

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Penal Brasileiro.

Título: Dominados – Versão Estendida


Imagens da capa: Depositphotos.com
Ilustração da capa e Diagramação: Artessa.
Revisão: Carla Fernanda e Amandda Bennett

1ª ed. – Rio de Janeiro: Alessa Ablle, 2021


Série Máfia Lawless; 1 e 2.

1. Romance | 2. Ficção | 3. Crime Internacional | 4. Erótico | 5. Suspense

Texto fixado conforme as regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo n° 54, de 1995).

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos que aqui serão descritos, são produtos da imaginação da
autora. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.
Sumário
Sinopse
Nota Da Autora
Glossário
Prólogo
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Epílogo
Biografia
CONHEÇA SEUS OUTROS LIVROS
Nesse livro contém:
Dominada Por Ele + Dominado Por Ela + A Noveleta: Dominados.

Eles lutaram muito contra seus sentimentos.


Contra seus passados marcados por falta de afeto e tortura.
Conta as escolhas ruins que tomaram e de seus pais.
E lutaram bravamente contra um inimigo incomum.
Quando puderam “respirar” de novo se perguntaram se os dias que viriam seriam tranquilos
ou tumultuados?!
Se os outros inimigos estão bem atentos para perceberem que o casamento deles não fora
como todos os outros da Famiglia, por estratégica. Pois era visível para os próximos, que eles se
amavam.
A pergunta era: Eles vão precisar esconder a verdade para poderem manter os inimigos
longe ou revelarão ao mundo que o que sentem os tornam ainda mais perigosos.
Com cenas fofas, passagens de tempo e outros personagens dando seu ar da graça.
DOMINADOS é um conto rápido e delicioso do primeiro casal da série Máfia Lawless.
LEIA, É IMPORTANTE :D

meus amores... Eu queria dizer que sinto muito a demora para o lançamento deste
livro. Infelizmente, algumas pessoas conseguem nos atingir profundamente e destruir nossa alegria e
entusiasmo. E, acima de tudo, quero deixar um recado para você: NÃO PERMITAM QUE AS
PESSOAS OS RESUMAM A DÚVIDAS E A TRISTEZA. Infelizmente, eu fui fraca e deixei-me
levar pela situação, e sinto muito por vocês e muuuito por mim. Mas agora é bola pra frente.

E sobre o livro.
Primeiro:
Vamos deixar claro que não compactuo com nenhuma das atitudes ilegais dos personagens.
Não sou favorável a nenhuma perversidade, maldade, brutalidade ou covardia. Este é um livro de
ficção baseado em estudos sobre a máfia italiana e usando o bom senso da licença poética, minha
criatividade, para criar os cenários e acontecimentos. Não tentem abolir nenhuma atrocidade aqui
para o romântico ou “defensável”. É um livro. Na vida real é errado.
Segundo:
Dominados é a versão estendida dos livros: Dominada Por Ele e Dominado Por Ela,
história de Travis e Madeleine, mais uma noveleta inédita deles dois. Os capítulos foram colocados
em ordem do Prólogo ao Último como um único livro.

E É ISSO!
Estou explicando para não ficarem confusos. Okay!

Para os fãs de Madeleine e Travis.


OBRIGADA POR TUDO!
Para os novos “Dominados”, sejam bem-vindos e fiquem avisados:
É sobre a MÁFIA sim! USO O PLANO DE FUNDO DA MÁFIA ITALIANA DE FORMA
ESTRATÉGICA E TÉCNICA AS VEZES, MAS É UM ROMANCE! Temos as maldades, tretas,
regras e tradições, porém o forte é o nosso mocinho (anti-herói) se apaixonar pela mocinha
(guerreira), e vice-versa.

Ps.: Sobre os outros livros da série, preparei um vídeo para explicar a ordem e qualquer
dúvida é só perguntar no Instagram.
Curta a playlist que fiz no SPOTIFY para me ajudar a escrever esse livro que tanto amei escrever,
mesmo me tirando o sono.

https://open.spotify.com/playlist/3vFM09S2z6RmT7wVGsNaEh?si=XiC4VLZyRqGzlzBE5965Yg
BASEADO NA LICENÇA POÉTICA E EM PESQUISAS.
Esse glossário é tanto para vocês como para mim. Vamos ter essa base todos os livros de máfia meu.

B OSS : é o CHEFÃO, que toma conta dos Capos. O supremo poder da máfia.
Os Capos aposentados, mas muito perigosos. Sempre os mais antigos
(muuuito velhos) que conquistaram o cargo a duras penas. Os postos são
passados de pais para filhos, por isso eles dão tanta importância aos filhos
homens. As mulheres não assumem cargos altos e nem de longe podem ser
Capo e chefe menor.

C APO : O cabeça chefe de cada território, só deve respeito ao Boss, e que


comanda as Famiglie compostas de: Capo, Testa, Underboss, Cinistro,
Consigliere, Soldados, Associados (os que não tem ligação consanguínea ou
italiana, porém atuam e “trabalham” para a máfia) e Clãs (as distintas
famílias: pais, esposas e filhos).

T ESTA : Muito respeitado e temido. Homem de extrema confiança. Serão os


irmãos dos Capos.

U N D ER B OSS : Chefe menor ou gerente do Capo, são incumbidos pelo Capo, a


cuidar e zelar dos territórios dominantes. Aplicam as leias dos Capos, mas
não podem fazer o que quer.

C ON SIGLIER E: Cada posto principal tem seu próprio conselheiro (Boss,


Capo, Testa e Underboss) para orientar e muitas vezes frear decisões.

C IN ISTR O : Quem é o braço esquerdo. Muitas vezes incumbido de fazer a


“limpeza”. Mata ou acompanha as ações.

F AM IGLIA : Nome dado aos grupos organizados. Eles se denominam assim e


defendem a ferro e fogo seus homens e suas famílias (clãs). É a junção das
várias organizações criminosas que formam A Máfia Organizada Italiana,
que, com a americana, é a mais importante das organizações mafiosas do
mundo.

M Á F IA I TA LIA N A : As organizações originais da Máfia Italiana, que se


expandiu pelo mundo e nos Estados Unidos, pelas regiões e ganharam nome,
para defender a ordem, comandar o crime organizado e etc. São as 4
grandes Famiglie. Cosa Nostra, Camorra, ‘Ndrangheta e a Sacra Corona
Unita.

P o r é m , há outros países com suas organizações criminosas; no país. Irei


colocar as que serão presentes no livro.

M Á F IA M E X IC A N A : Após uma longa pesquisa não encontrei nada, então vou


usar minha licença poética: H EC HOS .

M Á F IA Y A K U ZA : Famosa por muitos filmes de Hollywood, é um grupo de


crime organizado nativo que usa ameaças e extorsão para obter o que
querem. Sua origem data do século XVII. Todos os membros são marcados
com tatuagens, e exigem atos extremos de dedicação que envolvem a
amputação do dedo mindinho quando algum membro comete um erro. Como
uma forma de desculpas.

M Á F IA R U SSA : é, talvez, a mais perigosa. Teve origem na extinta União


Soviética e agora possui influência em todo o mundo. Estão envolvidos em
crimes organizados em Israel, Hungria, Espanha, Canadá, Reino Unido,
EUA e Rússia, entre outros. Denominada de B RATVA .

M AD M AN : Os homens que são iniciados na “máfia”. Homem feito.


G R A MA : Codinome dado pela Lawless para chamar os territórios,
principalmente os que estão com restrições.

T EM HOTA : Tatuagens dos prisioneiros russos. Geralmente denotam o


ranking em que está o criminoso.
PARTE I
Os olhos são como uma lâmpada,
concedendo luz ao corpo.
Quando seus olhos são bons,
todo o seu corpo se enche de luz.
Mas se os seus olhos forem maus,
todo o seu corpo se enche de trevas.
Por tanto, se a luz que está dentro
de você for feita de trevas...
que tremenda escuridão te habita?

Batman – Hush
Agosto De 2010.

Fecho os olhos, cerro a mandíbula e as mãos, forçando-as com tanto vigor, que sou capaz de
arrebentar o saco de pancada com um golpe só, e dou um soco.
O ódio me corrói. Me domina. Me devora. Mas isso eu já estou acostumado desde que sou
pequeno. Aprendi muito cedo que o amor não existe. Que a afeição é para os fracos e sentimentos
não valem a pena. Então, não entendo o porquê de eu estar com tanta raiva agora.
Ele está morto.
Ele finalmente está morto. O homem que ajudou a minha existência ser real nesse mundo, está
definitivamente, enfim, calado. O homem que não teve piedade de mim e nem dos meus irmãos, e
muito menos da minha mãe, não tem mais forças contra nós e ninguém mais. O homem, que é a causa
de eu ser tão odioso e as pessoas me virem como um homem sem coração, morreu.
Talvez eu verdadeiramente não tenha a merda de um coração no peito. Porque não sou fraco.
Porque sou mau. Eu sou tudo, menos um perdedor e talvez seja por isso que estou com raiva agora.
Sinto como se tivesse perdido a batalha. Na verdade, foi quase isso, embora eu não tenha
participado da tocaia que meu pai tinha armado para Vitorio.
A menção de Vitorio Malvez me transforma em um monstro e, recuando, tomo distância e
força para atingir o saco de pancada, mais uma vez. Ele matou meu pai e vai pagar. Todos eles.
Com a respiração ofegante, abaixo as mãos, deixo os ombros caírem e arfo. Recuso-me a
fracassar. Não posso ter medo agora, nem ser um desistente. Eu sou Travis Lozartan e não temo nada.
Desde muito cedo soube o que era meu mundo e abandonei qualquer vestígio de dor e sentimento. Em
cada surra que tomei, eu me tornei quem sou hoje.
As memórias me assombram e fecho os olhos relembrando, para não esquecer: o amor não
existe. A dor é minha casa. O ódio é minha força.
Foi a cada chibatada.
A cada golpe.
A cada pancada em minhas costas, que a dor irradiava por todo o meu corpo. Eu sentia como
se facas estivessem arranhando tudo. Ali, deixei o menino morrer e o monstro tomar seu lugar, nascer
entre as marcas de maus-tratos.
Lembro-me de que recusava a chorar por aquilo e sentir dor. Era apenas lamentável por quem
eu estava apanhando. Eu não tinha culpa. Apanhava pela raiva de um sentimento direcionado para
outra pessoa, mas bater em uma criança de oito anos era mais fácil.
Eu era frágil.
Não sou mais.
O que mais me doía não era em si as pancadas do cinto do meu pai. E sim porque eu estava
ganhando aquela surra injustamente pela pessoa que deveria me amar.
Mas o amor não existe.
Não no meu mundo.

— Agora vá e tome uma ducha fria.


Levantei-me, deixando de ficar de joelhos e, sem limpar as lágrimas que me
tornavam fraco – mas só por fora –, saí do quarto.
Corri pelo corredor para chegar ao meu quarto o mais rápido e bati a porta,
trancando-a. Andei até o banheiro da suíte – como todos os quartos da casa – e tirei
minha calça de inverno da escola, já que estava sem a blusa – que ficara no chão do
outro quarto – e entrei no box.
O jato de água fria queimava minha pele e, em menos de cinco minutos, eu tinha
a sensação de que estava com hipotermia.
Las Vegas nunca ficava realmente fria no inverno, mas ninguém em sã
consciência, em qualquer lugar do planeta, tomava banho gelado no inverno por
vontade própria, ou porque gostava.
O desabafo foi se esvaindo...
...a cada gota de sangue que escorria das minhas feridas.

Não foi a primeira vez que ganhei uma surra daquelas, contudo, todas as vezes eu me sentia
mais um lixo do que um menino. Sozinho. Abandonado. Eu não podia contar com ninguém e reclamar,
só faria com que eu apanhasse de novo; e, como aprendi, virei o “escolhido” para sempre ganhar a
ira da minha mãe.
Essa era a dor que eu sentia, que fazia meus sentimentos se exporem. Ela ser minha mãe. A
pessoa que deveria me proteger. No entanto, ela me espancava por todos os motivos. Porque meu pai
batia nela, brigava com ela ou porque tinha pego ele com uma de suas amantes. Eu sempre apanhava
sem ela se importar de descontar o motivo em mim, sem ter culpa alguma.
Ódio não era o sentimento que aprendi com isso. Mas foi quando meu irmão Colen nasceu,
que ela me escolhera para apanhar e cada vez mais meu pai gritava com ela. Por oito anos tive uma
infância até tranquila, mas bastou Colen nascer e depois Dario, para tudo piorar. Ainda bem que
Marinne nasceu quando eu já era um homem feito e, por sua vez, não podia e não queria mais aceitar
ninguém levantar a mão para mim. Porém, por anos, minha mãe batia em Dario e Colen, mas era em
mim que descontava sua maior fúria.
Fui fraco. Não conseguia odiá-la e coloquei na cabeça de que, talvez, vim ao mundo servir
somente para isso: ser a válvula de escape para ela.

Quando fui à casa dos meus pais, onde vivi recebendo a ira que ela sentia pelo meu pai, vi as
pessoas (funcionários e guardas do meu pai, seus soldados e aliados, pois não temos amigos)
andando pela casa e se lamentando.
Realmente foi lamentável, mas ainda o que passou na minha cabeça quando recebi a notícia.
Ele morreu assim como ela.
Eu tinha sentido tanto alívio quando ela se foi. Minha mãe, a mulher que me colocou no
mundo, que, em vez de ensinar coisas boas, me ensinou a virar uma fera, havia partido e agora meu
pai também.
E hoje não sou mais o menininho bobo que apanha.
Hoje quem bate sou eu.
Quem faz sofrer sou eu.
Meus inimigos recebem toda a minha dor de quando criança. Virei aquilo que sentia. Virei
meu próprio medo. Foram anos com as costas sempre fervendo, queimando de dor. Pele machucada.
Com Rosália (a mulher que realmente cuidou de mim e de meus irmãos) passando arnica nas feridas
para aliviar a ardência.
Mas ontem, quando olhei o corpo do meu pai falecido, não senti nada. Nem mesmo alívio.
Ele não merece. Até meus quatorze anos senti o couro do cinto em minha pele. Mas, pensando bem,
isso me transformou e me ensinou a esconder meus sentimentos. Talvez eu nem tenha mais. Engoli
tanto choro, tanta dor, que não sei mais como se faz. Agora não sinto nada por ele estar morto e nem
por ninguém.

— Eu sinto muito — Rosália disse ao meu lado segurando a mão de Marinne,


que estava triste.
Minha irmã não conheceu a verdadeira face de nossos pais por ser a menina e,
embora eu tenha tido dois monstros como pais, eles não foram um terço para minha
irmã do que fora para mim e meus irmãos.
Fiz um aceno de cabeça e coloquei a mão no ombro dela.

E foi tudo que me limitei a fazer. Não tinha nada o que falar. Eles estavam mortos para mim
desde quando fui morar na casa dos meus avós, a vinte milhas de distância, onde vivi por anos e eles
me acolheram para eu poder estudar, pois uma das melhores escolas ficava próxima à mansão deles.
Eu queria me formar. Sempre gostei de estudar, e mesmo que meu destino fosse fazer parte da
Famiglia; ser um matador sem alma e piedade. Eu não quis ser um ignorante e boçal como meu pai e
seus homens. Meu avô é o líder maior de todos nós, nosso Boss, e, quando Capo, foi muito
inteligente. Queria ser como ele foi um dia. Ter a crueldade, frieza e artimanha para ser o melhor.
Tudo realmente está no meu sangue.
Sou leal a isso e agora serei o líder. Minha família vem em gerações sendo líderes e
comandando Nevada. Faço tudo pela Famiglia, meus homens e minha linhagem.
O dia do meu juramento está com os dias contados, já que meu pai está morto. E mostrarei
que meus estudos irão nos guiar melhor. É irônico querer ser inteligente para cortar a garganta de
alguém, mas que se foda! Será assim.
Me tornarei o chefe dos chefes, tomando o lugar dele.
Sentimento é uma mera idiotice, filha da puta, que pega as pessoas mais fracas. Meus pais me
ensinaram a ser frio, violento e a dor me fortaleceu apenas. Quando chega a hora, eu luto, dou meu
suor, minha fúria, meu sangue por aquilo que tem valor. Nasci neste mundo insano e me moldei nessa
loucura que arrancou meu coração do peito e enterrou no deserto escaldante de Nevada.
Abril de 2011.

Meus olhos estão por todos os lados da boate. Não consigo tirar a tensão que está comigo
desde a hora que acordei. Merda! Não sei qual o problema comigo hoje.
— Está tudo bem, senhor? — pergunta Luca, meu cinistro.
Desde antes de eu tomar a posse que fora do meu pai, morto há seis meses, ele está do meu
lado. Achei lógico ele manter o posto, mesmo que eu não confie nem mesmo em minha própria
sombra e, no fundo, não confie muito nele. No entanto, enquanto não acho meu próprio braço direito,
fico com ele, odiando a ideia de estar à sombra do meu pai em tudo ainda.
— Mais ou menos — respondo seco.
Nunca estou de bom humor, acho que nem tenho, e estou no grau de matar um gato com um
pisão. Isso está se arrastando desde o funeral do meu pai e me deixando muito puto comigo mesmo.
Eu não achei que ficaria assim. Nem era para estar. Sua morte fatídica com seus capangas me trouxe
a “coroa”, vamos dizer assim. Há cento e oitenta e um dias, eu sou o rei de Nevada, embora me sinta
mais o rei de Las Vegas. Sempre terei a imagem de meu avô como rei dessa merda toda, mas sei que
uma hora também tomarei seu lugar, principalmente levando em conta seu estado de saúde há um mês.
Luca faz um aceno com a cabeça e me deixa em paz, indo para a porta do meu escritório.
Ótimo. Aprecio muito mesmo quando meus homens entendem do que eu preciso.
Como sempre, fico enfurnado no meu escritório resolvendo os problemas do dia e os que vão
surgindo durante a noite. É incrível como uma boate precisa ser controlada. Fora que, mesmo aqui,
tenho total controle dos meus cassinos e do cabaré. Quem fica de olho nos hotéis são meu consigliere
e eu, quando preciso, apenas.
Mas hoje não estou com muita vontade de trabalhar. Quero ao menos beber um pouco e
relaxar. Chegar em casa e me jogar na cama, amanhã resolvo tudo.
Irrita-me como as pessoas acham que ser um líder é fácil. Sinceramente, preferia ter meu pai
vivo apenas para eu poder voltar a curtir minhas horas como eu gosto: bebidas, mulheres e cassino.
Eu gosto muito de jogar.
Virando-me, vou até a minha mesa e pego meu copo de uísque. Entorno toda a bebida,
deixando o copo vazio de lado. Pego meu paletó e saio do escritório.
A música alta e eletrônica me atinge de forma ensurdecedora. Estou acostumado e consigo
quase fazê-la sumir, tornando-a um zumbido no fundo da minha mente.
Com poucos passos, estou no corredor dos camarotes que leva ao meu. Vejo meu irmão mais
velho, sorrindo para mim, no meio de várias mulheres. O costumeiro de Colen. Faço um aceno de
cabeça, caindo para o lado esquerdo e ele assente entendendo que estou indicando que vou para o
camarote da família. Onde eu me permito ser apenas um homem querendo me distrair.
— Boa noite, senhor — diz Antonela Braz, minha assistente pessoal.
Podemos dizer que ela trata dos meus interesses internos e externos. Afinal, é quem consegue
as mulheres para mim, pelo menos as que eu não pego no fogo da paixão. O que acontece é que
Antonela pesquisa e puxa informações da minha amante, ou pretendente de uma noite só, sem ter o
risco de se tornarem uma pedra no meu caminho depois e acabar terminando em banho de sangue.
Sou prevenido e não gosto de me meter em problemas sem motivos, diferente dos meus
irmãos e do meu pai. Aquele lunático era tão sem compromisso com nada, que chegou a comer a
mulher do seu primeiro consigliere, que, no fim, o cara foi morto na cama com a própria esposa, que,
segundo informações, pediu para se manter como amante do meu pai.
— Boa noite — devolvo e passo por ela calmamente.
— O senhor não disse que viria hoje. — Ela vem atrás de mim e permito.
Antonela é como se fosse meu braço direito na boate. Gosto do fato de ela ser fofoqueira e
me contar tudo, absolutamente tudo, que se passa por aqui.
Depois que entro no camarote falso, o qual os estranhos podem entrar, abro a porta secreta e
realmente entro no camarote da família, que mandei fazer para eu curtir a boate e ficar de olho em
tudo.
— Eu sempre venho de surpresa, Antonela, não estou entendendo você.
Escuto-a resmungar, mas ignoro.
Subo os três degraus e me sento no grande sofá preso à parede e com uma mesa oval no
centro, em frente a ele. O fato de ficar um patamar acima do chão me permite ver a boate toda. Além
disso, o camarote se localiza no canto esquerdo, próximo ao palco e do DJ. Mandei fazê-lo todo de
vidro, chão e as paredes para a boate, totalmente camuflado. Ninguém desconfia que ele está aqui e,
como disse, poucos o conhecem.
A porta para entrar é falsa, uma parede que se abre puxando uma garrafa de uísque de mentira
do lado de dentro do outro camarote, mas não é tão simples assim. A garrafa tem detector de digitais,
que só funciona comigo e meus irmãos. Aqui só entra quem nós confiamos de verdade e em nossa
companhia. Com toda certeza posso falar que é o lugar mais seguro da boate, até mais do que o
escritório.
Por precauções de possíveis divergências com inimigos e outros, preparei-o para proteger
meus irmãos e quem eu achar que precisa ficar aqui dentro até eu resolver que pode ser liberado.
Como quando escondi uma garota do namorado violento. Ainda bem que não tive que matar ninguém
naquela noite. Foi por pouco.
Desabotoando meu paletó, vejo Antonela mexendo no seu tablet impacientemente, e depois
colocar entre o braço e me direcionar um olhar fixo.
— Eu não quero nada hoje. Vim para me distrair e me contento em ficar em silêncio. —
Espero que pegue a dica.
Meneia a cabeça, concordando.
— Mas um Bourbon seria muito bom.
— Sim, senhor. Vou providenciar, mas qualquer coisa dou meu jeito. — Pisca o olho e dá seu
sorrisinho safado.
É claro que ela dá seu jeito.
Já perdi as contas de quantas vezes trepei com ela pela boate. No escritório, na sala de
reunião e até no salão, inclusive no sofá onde estou sentado com as pernas separadas e os braços
abertos sobre o encosto. Sei muito bem o efeito que essa posição causa.
— Claro — afirmo.
Dando-me outro sorriso, agora mais aberto e determinado, Antonela vai atrás da minha
bebida.
Ela é uma ótima distração quando estou com a cabeça cheia. Mas tirando-a, tenho outras
formas de tirar meu foco dos deveres que adquiri sendo Capo.
Eu não penso em matar o tempo todo. Não fico planejando dominar outros territórios
enquanto jogo pôquer com meu irmão. Sou um homem normal, com um trabalho normal, porém
peculiar. Defendo meu domínio nos estados que faz parte da Lawless. Digamos assim.
Por exemplo, sinto-me cansado hoje e essa música está me irritando.
Fecho os olhos e deixo minha cabeça cair no encosto do sofá, massageando minha testa com
o polegar e o indicador. Acho que a última missão não foi tão proveitosa assim. Ainda estou meio
surdo por causa do barulho do disparo da arma de Luca. O imbecil simplesmente atirou tão perto do
meu ouvido, que por pouco não arrancou minha orelha. Aquele idiota!

Quando eu penso que iria relaxar hoje, me vem uma dor de cabeça iminente prestes a
explodir nas minhas mãos. Tudo por conta de uma filha mimada de um policial, que, francamente, era
para ser a ordem, não um ser tão desprezível.
Levanto-me decidido e dou um olhar de comando aos meus homens. Que se foda meu
descanso! A minha lei e a minha ordem, eu faço.
— Tirem ela daqui agora!
— Por que, Travis? — pergunta Luca Bracy.
Há vinte minutos, estou atento olhando para o terceiro camarote do canto oeste da boate.
Paolo, meu consigliere e amigo de infância, já me deu as informações de quem o alugou: um grupo de
universitárias animadas e dispostas a curtir a madrugada. No entanto, um dos nomes é familiar e não
gosto de saber disso. Se ela causar merda aqui dentro, eu mesmo vou me encarregar de fechar o
caixão.
O vinco da minha testa fica mais apertado encarando meu cinistro bem sério. Tombo a
cabeça para o lado e cerro a mandíbula.
— Quem é o chefe mesmo?— Minha voz soa amedrontadora.
— O senhor.
— E quem dá as ordens?
— O chefe.
— E o chefe quem é?
— O senhor.
— Ótimo, estamos esclarecidos. Então, não preciso da sua opinião. Vai até lá e manda ela
sair ou a tire à força se não obedecer.
Luca assente e se vira saindo do camarote falso; e, no mesmo instante, Colen aparece com o
copo cheio e seu sorriso constante.
— Parece que Travis arrumou um novo brinquedo.
Reviro os olhos e volto para o camarote da família, e claro que ele vem atrás, tagarelando
como sempre. Eu amo meu irmão, mas ele poderia levar as coisas mais a sério.
— Por que você cismou com essa menina?
— E por que você não leva as coisas a sério?
Ele sorri e balança a cabeça, apoiando-se na parede de vidro, e de propósito tapando minha
visão dela.
— Eu levo e por isso acho que você está fazendo uma tempestade em copo d’água.
— Não é. — Pego o copo e beberico meu uísque. — Falando nisso, você poderia parar com
a infantilidade e ir buscá-la para mim.
— Eu não vou buscar ninguém. Ela não está fazendo porra nenhuma, man.
— Ela está infringindo a lei número um do código de sigilo. Você sabe muito bem que o pai
dela tinha um acordo com o nosso e onde eles faziam negócios, mas a Famiglia nunca poderia chegar
até a esposa ou a filha dele. A não ser que...
— Ela estivesse dentro do nosso território — Colen completa, agora sério.
— Justamente — findo o assunto. — E você sabe que tem gente aqui dentro que estou
vigiando há muito tempo. Eu posso ter vindo com o propósito de relaxar e curtir uma noite de sexta-
feira, mas, no fundo, estou trabalhando. Se o imbecil do Yuri Avilov pisar fora da grama, ele morre
hoje.
Lembro-me como se fosse ontem quando aprendi as regras de território, e como era – e é –
fundamental cada um não invadir o espaço do outro ou sair do seu. É uma das regras principais que
aprendemos quando viramos um Madman.
É muito fácil criar um conflito entre as Famiglie, seja grande ou pequeno, simples ou um
banho de sangue, e em apenas pisarmos na grama do outro. Nos territórios ou de locais que estão
banidos. Um conflito é um conflito.
Meu irmão concorda com um aceno de cabeça e finalmente sai da minha frente, e me
surpreendendo também fica de olho nela.
A filha de Beluzzo é uma dor de cabeça para o pai e a Lawless há anos. Pelo que eu soube,
ela não gosta do que fazemos. Acha que todos nós deveríamos apodrecer na cadeia pelas mortes e
delitos diários cometidos. Ela é a moralista de uma família torta. A fruta boa no cesto estragado. O
pai, um policial vendido e vigarista, um dos associados do meu pai, que passara para mim. A mãe,
filha de um soldado – da época do meu avô – sanguinário, que casou a filha com um policial, porque
todos os meios têm um fim em nosso mundo. Luma Beluzzo é uma viciada em cassino, que, graças à
lábia do marido, não morreu seis anos atrás porque ele fez um acordo com meu pai (mais um
acordo). Desde então virou um associado ao meu pai, não apenas para a Famiglia.
— Eu não vou me meter — Colen diz pensativo, ainda de olho na garota. — Ela não é mais
criança e acho que sabe o que faz. Já é uma mulher crescida. Não é mais uma criança precisando de
babá.
Concordo mentalmente e movo o pescoço, forçando-o até estalar. Estou dormindo mal há
dias. Talvez eu precise dos serviços de Antonela. Para falar a verdade, não sei muita coisa a respeito
da herdeira de Edgar Beluzzo, apenas que é uma menina e nada mais que isso, além do seu caráter
solidário e honesto. Não sei quantos anos tem e a única vez que a vi, ela era uma pirralha. Não me
lembro dela. E tenho receio dela virar uma pedra no meu sapato como o pai fora para o meu.
— Você não quer saber, mas parece saber informações que eu não sei.
Colen ri e vira apenas o rosto para mim e diz:
— Acho que é óbvio que ela é uma mulher crescida. Acabou de terminar a faculdade e está
bebendo sozinha com as amigas em uma boate às três da manhã.
— Já pegamos várias adolescentes com identidade falsa, seu imbecil!
— Mas ela se formou — fala impaciente, desencostando-se da parede e vem se sentar nos
degraus perto da mesinha, onde deixa seu copo. — Às vezes, você é muito chato, Travis. Vai arrumar
uma mulher, pelo amor de Deus!
Ergo a sobrancelha, fitando suas costas e me levanto do sofá, ficando perto da parede de
vidro. Procuro-a no camarote e não encontro. Então foco na boate, no bar e a encontro.
— O que ela está fazendo agora? — solto em um resmungo impaciente.
— O quê?— Colen aparece ao meu lado.
A garota, mulher, não me importo, está correndo pela boate como se estivesse fugindo de
alguém. Ela olha para trás, parecendo com medo e acabo olhando também, procurando alguém tão
desesperado quanto ela. Merda!
Yuri Avilov.
Ele está atrás dela, passando pela multidão, empurrando as pessoas e uma de suas mãos está
dentro de seu casaco de couro. Ele é filho de um magnata russo, aliado à Bratva (que é nossa rival
desde que o mundo do crime é mundo): Ivon Avilov. Entretanto, a lei do meu pai era não misturar
lazer com negócios. Assim todos os cassinos, bordéis, boates e danceterias da Famiglia sempre
estariam abertas para eles, e todos de Nevada e visitantes.
Bene, manel mio regnonessunolofarà.[1]
— Vai na frente, que eu te sigo — digo virando-me e pegando meu celular no bolso de dentro
do paletó. — Vou ligar para o Paolo.
Sem dizer uma palavra, Colen sai às pressas atrás dela.
Faço uma ligação ao meu consigliere, que atende rapidamente.
— Travis?
— Você ainda está perto do bar?
— Sim.
— Então intercepta Yuri Avilov agora. Ele está atrás de uma garota e, se ele derramar um
pingo de sangue aqui dentro, eu derramo o dele no café da manhã do pai dele antes do galo cantar. —
Desligo.
Dando uma última olhada, encontro-a escondida atrás da pilastra perto do banheiro. Ela olha
para todos os cantos; quando vê Paolo indo até Yuri e o parando, aproveita e entra no banheiro.
Garota esperta!
Saio do camarote, trancando-o. No corredor vejo Antonela falando com alguém.
— Qual o problema, Travis? — pergunta me seguindo, pois não parei para ela. — Você
parece preocupado. Me fala, que resolvo.
— Não. Fique aqui — digo, já descendo os primeiros degraus da escada.
Queria entender, qual é o problema de eu querer resolver tudo? Meu pai sempre foi de
mandar resolverem as crises, mas eu não. Por que diabos eu não posso fazer?! Que inferno!
Pego meu celular e aperto a rediscagem. Paolo atende prontamente de novo.
— Não fala meu nome.
— Okay.
— Eu quero que você chame Luca e o mande me encontrar na porta dos fundos. Mas não diga
isso assim. Fale em códigos. Quero saber o que Yuri quer com a filha de Beluzzo.
— Sim. — ele afirma.
Encerro a ligação, guardo o aparelho no bolso e com passos firmes atravesso o mar de
pessoas, mexendo-se o tempo todo, dançando a música eletrônica. Em uma noite normal, eu acabaria
aqui também. Hoje não. Desde que começou o dia, eu estava agitado. Devo ter alguma ligação com o
inferno para saber das merdas que acontecerão a seguir no submundo, que seria a superfície, a face
do crime.
O que os russos querem com Edgar Beluzzo?!
Enquanto vou me aproximando do banheiro, um estalo acontece na minha cabeça e lembro o
nome dela: Madeleine. Eu a encontrei um ano atrás, na última festa que meu pai fez. Lembro-me de
como ela me olhou. Jurava que ia vomitar a qualquer momento em meus pés. Realmente deve odiar o
que fazemos e, com certeza, a ligação que seu pai tem. Bene, ela era para odiar mais o próprio pai.
Edgar não é apenas um policial corrupto à procura do seu bem-estar sem medir os danos.
Acredito que nunca pesou seus atos. É inescrupuloso e não tem limites, nem mesmo para com sua
família.
Quando começou a mexer com o jogo de poder da máfia, muitos anos atrás, deparou-se com
Vitorio Malvez, Capo da Blood Hands, que por diversas vezes tentou (e tenta) dominar Nevada e
derrubar meu avô e meu pai, até que conseguiu matar meu pai há poucos meses, mas Nevada ainda é
nossa. Agora está sob meu domínio.
Há uns dez anos, Vitorio estava fazendo um acordo com Edgar, para ele ajudá-lo a passar
pelos nossos homens que ficam espalhados por Las Vegas, onde residimos, e chegar até o nosso
maior cassino e tomá-lo. Uma verdadeira guerra em seu plano de domínio. Nisso haveria banho de
sangue e muitas vidas inocentes perdidas. Vitorio não tem limites, e Edgar também não.
Porém, eles não contavam com uma ajudinha, que meu pai chamou de divina. Embora a
ironia, ele chegou a fazer o sinal da cruz quando soubemos que Madeleine Beluzzo dedurou o próprio
pai para a Lawless, nossa Famiglia. Ela nos odeia, mas não queria morrer. Sua visão de mundo é
certa. Vitorio não cumpriria o acordo e não teria a mesma compaixão com os Beluzzo.
O fim dessa história foi Edgar pedindo desculpas ao meu pai, tentando barganhá-lo de todas
as formas que um Capo pode precisar de um homem dentro da lei. E tivemos Malvez e seus homens
recuando com um aviso de retorno.
Meu pai não aceitou de bom grado o perdão de Edgar, mas jurou que sua filha sempre estaria
protegida por nós, como um agradecimento pelo que ela fez. Só que nós não poderíamos protegê-la
do próprio pai. No mês seguinte, soubemos que ela foi mandada para bem longe de Nevada. Desde
então não soubemos mais nada sobre a garota.
Até esta noite. E talvez só estou prestes a entrar em um banheiro feminino por honrar as
palavras do meu pai. Não posso passar por cima das palavras dele simplesmente porque morreu. Ele
foi meu Capo e, mesmo odiando-o como pai, respeitava como meu líder. Preciso honrar sua palavra,
sua ordem.
Estou a meros passos de chegar ao banheiro quando sinto meu braço sendo puxado e
apertado. Viro-me e encontro meu irmão.
— Não entre aí.
— Ela está lá dentro.
— Eu sei, Travis.
Dou-lhe um olhar interrogativo.
— Deixa que eu me entendo com ela.
— Mas por quê? Você não queria se meter e agora quer bancar o herói? — Puxo meu braço.
— Você acha que isso vai levá-la pra sua cama?!
— Não fode! — Colen esbraveja. — Só não quero problemas. Eu sei como você é. Que
merda, Travis! É por isso que eu vou embora e fazer minha faculdade longe. Vou ficar longe de você
e dessa merda de mundo. Não sei o que estou fazendo aqui.
— Colen, não é hora pra ter crise de meia-idade.
— Não é isso, porra! Eu quis ficar com você, passar minhas férias com minha família antes
de voltar para Boston, mas não estou te aguentando depois que o pai morreu. Você está se esquecendo
do seu juramento de irmão e virando realmente um Capo como o nosso pai. — Ele fecha a cara e
cerra a mandíbula. — Não se transforme nele.
Engulo em seco, sentindo a garganta queimar pela ira.
— Só estou fazendo o meu dever.
— Não. Você está louco, irmão. Tomar conta de tudo o tempo todo é loucura. Nem o pai foi
assim.
— Por isso o mataram.
— Ele morreu porque todos nós um dia somos pegos. Não se engane. Não é se, é quando,
Travis.
Fecho meus punhos. Se ele não fosse meu irmão e eu não desse meu sangue por ele, já teria o
acertado no meio da cara.
— Não importa. — Puxo o ar e solto arfando.
— Fica aqui que eu vou ver a garota, que não fez nada.
— Eu sei muito bem quem é o pai dela e vê-la correndo por aqui, fugindo de alguém, não é
algo que posso ignorar. Você está enganado se acha que vou machucá-la. Eu quero salvá-la.
Colen toma uma postura diferente e pisca rápido.
— Não foi isso que você deu a entender lá em cima.
— Isso foi antes de eu descobrir quem ela é. De lembrar dela.
Ele franze a testa.
— Como assim?
Faço um resumo da história de como Madeleine se transformou na queridinha do nosso pai e
até minha, pois confesso que fiquei admirado na época que soube da sua audácia. Ela é corajosa.
— Então agora você vai cuidar dela?
— É pela lei. Quando um Capo diz algo, devemos honrar. E mesmo que ele já tenha morrido,
eu vou protegê-la.
— Está fazendo isso por você então?
— Não. Estou fazendo pela honra.
Colen abre um sorriso de entendimento e assente.
— Então agora, Madeleine está sob seu domínio?
Dou um simples aceno de cabeça como resposta.
Ela estará sob meu radar, só enquanto o pai dela continuar a, possivelmente, atrapalhar meus
passos. Tem algo que não cheira bem nas ações de Edgar Beluzzo.
Eu poderia estar dentro de casa quietinha hoje. Por que fui na onda da Bárbara? Merda
mil vezes! Às vezes, considero-me uma mulher tão esperta, tão adulta e decidida, mas então eu me
esqueço de que o mundo não é um filme e existem perigos por toda parte, inclusive quando tenho um
pai filho da puta.
Por que ele foi se meter justamente com a Bratva?
Já faz anos que descobri seu envolvimento com os russos e que o dedurei para o Manda-
Chuva de Las Vegas, para não acontecer uma atrocidade por aqui e tirar eu e minha mãe (mesmo que
ela seja uma lunática e só pense nela e nos seus vícios) do perigo iminente. Eu posso ter sido enviada
para longe por ter a boca grande, porém não mudei minhas convicções. Acho que, durante esses oito
anos longe, peguei mais raiva dele e desse mundo imundo de impunidade e crimes.
Com dificuldade, limpo minha boca com o papel higiênico e saio da cabine do banheiro
empurrando a porta com o cotovelo. Na pia, encaro uma garota pálida, que a única cor que sobressai
é o vestido vermelho (colado demais no corpo, que a amiga escolheu com segundas intenções para o
término dessa noite) e os cabelos que eram castanhos há dois meses e agora são loiros quase brancos
(que todo dia parece ser uma novidade) e os olhos azuis que a maquiagem extremamente exagerada,
que eu não queria, faz sobressair.
Respirando fundo, apoio minhas mãos na pia e deixo a forte pressão que sinto na cabeça
tomar conta de mim. Sinto-me sem forças e tento me acalmar, agora que meu coração bate normal
após eu jogar tudo que comi o dia inteiro para fora, no vaso sanitário mais sujo que já vi na vida.
Merda! Desde que voltei para Nevada, minha vida anda muito complicada; mesmo sabendo
disso e estando ciente da situação, não sei o que aconteceu lá fora. Porque, de repente, apareceram
homens estranhos atrás de mim no meio de um ninho de cães e gatos. E eu sou a ratinha sendo
perseguida.
Isso me deixa afoita novamente. Minha respiração está tão acelerada, que preciso puxar e
soltá-la para não ter um infarto. Quando abro os olhos e enxergo melhor onde estou pondo minhas
mãos, faço um som de nojo e corro para lavá-las. Credo, por que mulher tem que fazer isso em
banheiro público?! Sempre procuro acreditar que nas casas delas, elas são limpas, ou pelo menos
conservam a limpeza que alguém faz.
Sacudindo as mãos, caminho até o secador e, assim que posiciono minhas mãos embaixo do
eletro, o barulho da música eletrônica do lado de fora cessa e só me restam ruídos e o som de um
vento forte saindo, atingindo minhas mãos.
Por alguns minutos me esqueço de que estou sendo seguida e o frio na minha barriga
desaparece, e então ouço:
— O que você está fazendo?
Franzo a testa para a voz grossa e rouca. Virando-me rápido para a saída, vejo um homem de
terno de risca de giz, cinza, e uma gravata azul-escura.
— Quem é você? O que está fazendo aqui?
— Você sabe quem eu sou. Então faça o favor de responder à minha pergunta.
— Mas primeiro você tem que me dizer quem é.
Dando dois passos, ficando mais perto de mim, ele solta as mãos ao lado do corpo e as
pernas se afastam em uma postura que, com certeza, deve usar muito para impor respeito e medo.
— Esqueceu o que você fez dez anos atrás? Porque eu não. Mesmo com tantas coisas na
minha cabeça, não consegui esquecê-la e o que fez para os homens que tanto odeia.
— De certo modo, não fiz por você e nem pelos seus homens. Odeio a máfia e tudo o que fiz
foi porque eu queria viver mais um dia.
— Ora, ora, parece que você se lembrou de quem eu sou, e o que fez. Seria bom lembrar
também o que está fazendo aqui agora e, por que esses homens estão atrás de você? Será que se
meteu no assunto que não lhe diz respeito de novo, Madeleine?
A voz dele está um pouco alta demais e sua paciência já não está lá tão certa. Enfiando as
mãos nos bolsos da calça, arfa com força. Acho que gosto do fato de ele ficar irritadinho perto de
mim.
— Eu não sei, e a única coisa que quero agora é ir para a minha casa.
Ele dá uma risada meio macabra, tipo aquelas de filmes de terror, e balança a cabeça
negando.
— Isso você pode apostar que não vai acontecer agora.
— Como é que é? Você não pode me impedir de sair. — digo entredentes, querendo mostrar a
minha convicção de que não pode me dar ordens, ninguém pode. Eu sou maior de idade. Lamento
extremamente esse pensamento adolescente e rebelde. Ah, que se dane!
Ele dá mais um passo e sua mão vai parar dentro do paletó.
Ai, merda! É agora que vou morrer!
Se vou morrer hoje, que seja com dignidade. Aprumo minha postura e pisco algumas vezes
para limpar minhas vistas, que ficaram embaçadas.
Vou em sua direção, querendo me desviar e seguir para a porta e sair.
— Vai aonde? — pergunta, segurando-me pelo braço.
Desço meus olhos e fito sua mão rodear em cheio meu braço, como se eu fosse uma mera
criança. Franzo a sobrancelha, na verdade fecho a minha cara na careta mais zangada possível, e
levanto meu rosto para encará-lo.
— Aonde eu quiser.
Suas sobrancelhas erguem-se sutilmente. E me soltando, projeta o corpo a ficar na minha
frente e, definitivamente, não irei sair daqui a não ser que deixe.
— Não é assim, signorina.
Respiro fundo e fito seus olhos azuis. Sua beleza confunde como a luz para um pernilongo.
Nos enfeitiça até nos levar à morte.
Embora eu saiba disso, não deixo de admirar o quão belo é. Seu rosto parece ter sido
esculpido por um artista, os traços bem delineados e firmes. Os lábios carnudos e claros, as maçãs
do rosto acentuadas e levemente cobertas por uma barba rala, sobrancelhas na distância certa e
grossas. O nariz me chama atenção por ser tão certinho e a ponta quase quadrada, assim como seu
queixo, que fica mais firme o contorno quando cerra o maxilar. No entanto, o que me deixa mais
hipnotizada, são suas íris azuis. Um azul-escuro e denso.
Eu deveria fugir... Mas, ops, ele é o muro de um metro e noventa, que me impede de fazer o
certo. Ficar o mais longe.
— Algum problema?
Enfurecida, levanto minha voz e digo bem furiosa para ele.
— Você colocou seus homens atrás de mim. Eu não sou como vocês. Não sou uma criminosa
e assassina.
— Eu não...
— Quem você pensa que é? — Atropelo sua fala.
— Cale a boca e me deixa falar!
— Quem você pensa que é?! — repito, me sentindo ofendida.
— Cale a boca! — grita mais alto e dá um passo intimidador.
Levanto a cabeça para conseguir manter o contato visual.
— Eu não coloquei ninguém atrás de você. Na verdade, eles vieram depois que você
começou a correr.
— Eu não acredito em você. — Dou um passo, ficando muito perto e aumento minha voz. —
Eu não confio em você. Eu. Não. Conheço. Você!
— Mas sou a única pessoa que pode ajudar você a sair daqui viva. — Cerra os olhos, bem
intimidador. — Então terá que se contentar com isso, se não quiser morrer esta noite.
A raiva me corrói, porém o tipo de reação que o olhar mau dele provoca me deixa meio sem
ar e, mentalmente, estou me abanando. Porque não sou cega para negar como ele é lindo. Até o seu
nariz meio tortinho e o canto direito da sua face, que tem uma leve falha que, ao dar seu sorriso
perverso, enruga a sua boca. Não é muito grossa, nem muito fina e ele é tão musculoso, que algumas
veias do seu pescoço são saltadas. E consigo perceber, mesmo com o terno, os pelos do seu peito.
Oh, meu Deus do céu! Ele me causa calafrios, um medo terrível e um tesão alucinante. Eu deveria
pensar em outra coisa que não seja sua beleza.
— Você vai me acompanhar por bem ou por mal?
— Acha mesmo que vou confiar em você.
— Essa é a alternativa — fala entredentes. — Ou morrerá aqui pela Bratva. Você que sabe.
— Mas eu não te conheço.
— Olha, Madeleine, vamos deixar as coisas bem esclarecidas. — A voz dele está baixa e
ouço com total clareza. O que é estranho. — Você sabe quem eu sou e isso já basta. E tenho certeza
de que se recorda de que eu não gosto muito de brincadeiras.
Reprimo a vontade de rir e ponho minhas mãos na cintura, sendo ousada. Claro que me
lembro dele. Nunca conseguiria esquecer seus olhos azuis penetrantes olhando para mim com certo
nojo e desconfiança. Ele foi um babaca, porque não acreditava que eu estava lá ajudando o pai dele.
Se não fosse eu, tenho certeza de que não estaria vivo e não teria a permissão de me tratar como está
fazendo agora, mas talvez eu tenha que confiar nele agora e dar o braço a torcer, mesmo que eu odeie
essa situação.
— Como é que é o seu nome mesmo?
— Travis, e você sabe disso. Mesmo que se esforce para esquecer, acho que nunca vai
conseguir apagar da sua memória aquela tarde onde foi procurar o meu pai para falar do seu.
— O seu mal é que você é convencido demais. — digo com vontade de dar uma resposta
malcriada, mas sou interrompida quando a porta do banheiro abre abruptamente e outro homem, tão
parecido com Travis, surge.
— Vocês vão demorar muito? Porque parece que a Bratva não está com muita paciência.
— Podemos ir.
— Para onde você vai me levar?
Travis vira-se para mim e responde olhando em meus olhos, fixamente:
— Primeiramente, pra fora da boate, depois eu decido.
— Eu posso ir pra casa e aí você não precisa tomar essa responsabilidade, que não está nem
um pouco a fim de fazer.
— Se eu não quisesse estar aqui, não estaria. — Toca meu queixo. — Para sua informação,
não sou eu o encarregado de lidar com crises como a que você está causando na minha boate.
— Então, agora eu sou uma crise?!
— Com certeza, e está me deixando extremamente irritado. E você... — ele fica mais
próximo, no seu limite, fazendo seu perfume almiscarado penetrar em minha alma, assim como seu
olhar cruel — não quer me ver irritado. — termina a frase.
— Vocês podem discutir dentro do carro ou de algum lugar mais seguro porque estou falando
sério. Eles estão loucos para pegá-la.
O frio na minha barriga fica mais intenso e, respirando profundamente, aceno mostrando
confiança e determinação. Embora seja tudo fingimento. O que eu queria mesmo era estar na minha
casa.
Travis não diz mais nada, pega o celular, dá as costas para mim e, dizendo algo para o outro
homem, passa por ele e sai.
— Você deveria se sentir lisonjeada dele querer resolver isso com as próprias mãos.
Oras, não vou nem dormir.
— Agora vamos. — Dá-me as costas também e diz: — Me siga e quietinha.

Desconfiada, como já era esperado, entro no carro, um gigante e preto Escalade, e logo
em seguida Travis entra falando com o outro homem que invadiu o banheiro.
— Ele se mandou?
— Na verdade foi pra garagem.
Travis balança a cabeça.
Uma batida forte soa pela frente do carro junto com uma voz:
— Já podemos ir?
— Claro — o outro homem responde e pega o celular no bolso de dentro do paletó, tão
parecido com o... Na verdade, ele lembra muito o Travis. Mesma cor dos olhos, mesmo queixo e
porte físico. Até a altura parece quase igual.
— Vocês são parentes? — pergunto, porque definitivamente não sei calar a minha boca.
O que parece ser o mais novo, que entrou depois no banheiro e tem os cabelos mais claros,
olha para mim e abre um sorriso presunçoso de lado.
— Somos irmãos — responde com uma voz rouca e consegue abrir mais o sorriso.
Mm... Agora está explicado o olhar gélido. Tão cruéis e silenciosos.
— Hum... — Travis solta um resmungo, sem olhar para mim, enquanto mexe no celular.
Por que ele tem que ser tão rabugento? Que cara chato!
Acho que esse é o jeito dele de sempre. Forçando minha mente, consigo lembrar a primeira
vez que o vi. Ele estava todo de preto, calça de linho e um suéter cinza. Mais jovem, até tinha o rosto
um pouco doce e amigável, mas os olhos compenetrados e atentos são os mesmos. Lembro-me de
que, enquanto o pai me ouvia falar sobre o meu, Travis ficou ao lado, distante, observando e
desconfiado. Eu o peguei me fitando mais de uma vez naquela tarde, que perdurou até a noite, já que
fiquei umas quatro horas na casa dos Lozartan. Eles quiseram me deixar lá por algum tempo,
protegendo-me. Temiam o que aconteceria comigo após ter feito aquilo. Meu pai é um babaca e
sempre teve suas alianças erradas, mas não acredito que me faria mal de propósito. Pensando bem,
fico indignada em como meu pai consegue continuar fazendo merda.
Nunca gostei dessas Organizações. Acho que todos eles são lunáticos e gostam de botar
pavor nos que não tem nada a ver com as maracutaias deles, porém, não posso omitir e ser leviana
em questão de como são protetores com suas famílias e com seus homens.
Aquela tarde foi marcada para mim como um divisor de águas, onde consegui enxergar quem
são os Lozartan e como atuam de forma clara e certa. Como uma frase muito comum, para eles é tudo
Preto no Branco. E, pelo que eu vi hoje, Travis não deixa isso passar despercebido. Mesmo que você
não tenha nada a ver com a organização de Las Vegas, se ele estiver disposto a te salvar ou tiver
algum interesse envolvido com a sua vida ou seus negócios, ele irá até o fim.
Ironicamente me sinto lisonjeada, a contragosto, mas não irei dizer isso em voz alta nem sob
tortura. Continuo odiando a máfia com o mesmo fervor, assim como odeio todas as decisões do meu
pai. Travis tem razão. Eu tenho uma mãe viciada que não liga para ninguém. Ela não era para ser um
terço da mulher que é hoje, pela criação que teve. Vovô foi chefe dos soldados na Era do Boss de
Nevada quando Vincenzo, o avô de Travis, era Capo.
Meu pai é totalmente maquiavélico, interesseiro e tenho uma forte impressão de que os
homens que estavam me procurando na boate têm a ver com alguma merda que ele fez mais uma vez.
Meus pensamentos são interrompidos quando meu celular toca dentro da bolsa. Pegando,
atendo a ligação da minha amiga que estava na boate comigo.
— Meu Deus do céu, Madeleine, ainda bem que você atendeu! — diz desesperada, sem
fôlego. — Onde você está?
— Bárbara, não fique em pânico. Eu estou bem — murmuro para não chamar atenção.
— Aonde você está? Já saiu da boate?
— Sim, eu já saí e acho que estou segura. — Quando digo isso, os olhos de Travis levantam
cerrados para mim, como uma flecha que atinge o meio do peito.
Não sei qual é o tipo de sensação que acabo de presenciar, mas é algo entre o pânico e,
sendo sincera, não sei qual o nome que posso dar. Em seus olhos azuis há uma certa desconfiança,
incredulidade e até ironia. Acho que ele não esperava eu falar que me sinto segura perto dele quando
deixo tão claro que o odeio. Okay, eu não o odeio particularmente, mas o que representa.
— Ainda bem que você está bem. Quando chegar em casa você me liga, por favor.
Assinto antes de dizer:
— Tudo bem, Bárbara. Quando eu chegar ao meu destino, ligo pra você. Pode ter certeza
disso!
Essa frase foi duplamente intencionada para Travis, afinal de contas, estou prometendo para
uma pessoa que irei ligar quando estiver segura dentro de algum lugar, seja na minha casa ou aonde
ele quer me colocar.
Então, ele tem agora o compromisso de, pelo menos, deixar eu ligar, até mesmo se me
sequestrar. Sei muito bem que eles fazem isso para conseguir informações “amistosas”, para não
dizer o contrário.
— Eu vou esperar. Não deixe de me ligar. Aqueles homens me assustaram.
“A mim também, amiga”, penso, fitando o rosto de Travis abaixado, atento ao celular.
— Está bem, Bárbara. Eu não vou deixar de ligar para você e deixa de ser chata.
— Beijo, amiga.
— Beijo — replico e logo encerro a ligação, colocando o aparelho de volta na bolsa.
Travis ainda está olhando para o celular, mas assim que fecho minha bolsa, cujo zíper faz um
som alto, ele olha para mim. Agora seus olhos estão cerrados e ele endireita o corpo, aprumando.
Está atento e, quando coloca suas mãos sobre os joelhos, que estão afastados numa posição nada
sedutora para um homem extremamente lindo, abre um sorriso de lado.
Espero-o dizer algo, e nada vem após alguns segundos. Portanto, tomo a iniciativa. Que
coisa! Ele fica me olhando assim com esse olhar frio e calculista. Esse sorriso maquiavélico. Ao
mesmo tempo em que meu coração acelera, certas partes do meu corpo ficam arrepiadas, sensíveis.
Como se eu precisasse das suas mãos em mim. ODEIO isso. Ele é o pecado com todas as palavras.
— Você vai me dizer agora para onde está me levando?
— Quando chegar você vai ver, e pode ter certeza de que vai ligar para a sua amiguinha. —
Fica sério e abaixa o tom da voz, deixando-a rouca. — Eu não pretendo fazer nada de diferente e
nada do que está passando por sua cabeça.
— Ainda bem que está me dizendo isso. — Dou um sorriso de lado. — E não tem nada
passando por minha cabeça. — Cruzo os braços, dando-lhe um sorriso cínico.
Ele mexe as sobrancelhas, zombeteiro, e pega o celular de novo, que eu não ouvi e nem
ninguém. É provável que o aparelho nem tenha som nunca, estrategicamente, para manter o silêncio.
Por que correr o risco de ser pego em uma emboscada desnecessariamente? É uma droga eu saber
tanto sobre eles e tudo por culpa do idiota interesseiro do meu pai.
— Sim? — indaga Travis, simples e calmo: O dono do mundo. — Pode ser. Fique na porta.
Estamos chegando.
Curiosa, olho para a janela e tento enxergar para onde estamos indo. Só vejo luzes e ouro.
Pilastras altíssimas e flores. Os cassinos de Las Vegas são tão mágicos e hipnotizantes como a beleza
de Travis. Quando o comparei com as lâmpadas para os insetos, bem, os cassinos têm o mesmo
efeito. Nos puxam, nos sugam, até nos matar ou deixar sem nada. Vale muito a sorte.
O carro pega a Av. Harmon 32 passando – sem se preocupar com o sinal no amarelo – pelo
hotel Paris Las Vegas e logo entra no retorno, porém me surpreende quando segue em frente, entrando
pelo caminho principal do Bellagio. Abro a boca e espero o carro parar. O irmão de Travis sai
primeiro e segue com dois homens de ternos pretos que estavam no carro que nos seguia. O motorista
e o outro, que estava no banco do carona, sai e espera Travis, que me deixa ainda mais surpresa
quando estende a mão para mim ao sair.
— Algum problema para você não ter saído ainda do carro?
— Tem certeza de que vai me deixar aqui?
Seu rosto sempre indiferente e frio, cria um vinco na testa, mostrando confusão.
— Sim. Por quê? — Oferece a mão e balança como se dissesse para eu aceitar de uma vez.
E eu faço, seguido de uma pergunta:
— Para quê?
Olho para ele, que está ainda mais fechado. Sua máscara poderosa e cruel está em total
sincronia com seus passos marcantes. As pessoas o olham com respeito e, talvez, medo.
— Não precisava ser tão luxuoso.
Ele não me olha, mesmo eu falando com ele. Porra! Minha cabeça está virada, o pescoço
erguido e quase caio quando tropeço.
— Presta atenção — diz agarrando meu braço, impedindo-me de cair.
— Então me responde!
— Senhor Travis, boa noite.
Viro-me e vejo uma mulher linda, loira, alta, peituda e sorridente demais.
Sem dizer uma palavra, ele estende a mão e pega uma daquelas chaves de cartão e volta a
caminhar, entrando na parte do hotel.
Espera aí... Sem check-in?!
— Você conhece alguém daqui?
— Ele é o dono — responde uma voz nova.
Virando-me, dou de cara com um homem tão tenebroso, que recuo um passo, afastando-me.
Ele é muito alto, até mais do que Travis, tem os cabelos castanho-escuros com vários pontos
brancos, marcando sua idade ou, como alguns homens, o grisalho chega mais cedo, afinal seu rosto
não aparenta que tem muitos anos. Só o que vejo em seu rosto, marcado por uma máscara nítida de
frieza e maldade, são os olhos negros e a sombra de um sorriso que não sai, como se fosse o ponto
alto da sua intimidação para os outros. Travis tem os olhos azuis impactantes, esse homem tem o
sorriso. Meu Deus! Ele me causa um misto de repulsa e pavor, mais do que Travis.
— Buonanotte, signorina.
Meneio a cabeça aceitando o cumprimento, e desfocando sua atenção de mim, Travis o chama
pelo nome. Paolo.
Espera aí... Paolo?! Esse nome não é estranho.
Já ouvi Edgar falar seu nome várias vezes lá em casa, no entanto, nunca o vi por lá. E meu
pai adora levar “trabalho” para casa, à mesa de jantar como se fosse a coisa mais normal do mundo
os “negócios” que ele trata com seus amiguinhos. Argh! Che stronzo .
[2]

Os dois homens conversam baixo, o que deixa suas vozes roucas; e, para completar, falam em
italiano o que aconteceu na boate comigo esta noite. Paolo diz que não tem nenhuma informação no
momento para dar a Travis, o que o deixa irritado. Vejo isso pelo gesto que já noto ser a marca forte
da sua impaciência. Ele aperta as mãos ao lado do corpo e cerra a mandíbula.
— Está tudo bem. Continue procurando informações sobre Yuri e ele. — Tenho certeza de
que se trata do meu pai. — E assim que tiver, fale comigo imediatamente.
— Sim, senhor — Paolo murmura e com o único aceno de cabeça, afasta-se seguindo para
longe com três homens em seu encalço.
Todos eles sempre andam em “bando”, nunca sozinhos. Não sei como conseguem gostar
dessa vida. Para eles é sinal de poder. Eu vejo isso de outra forma. Uma prisão sem grades. Uma
vida insegura e suja.
— Vamos — Travis diz e eu o olho.
Seu rosto está sério de novo e não consigo enxergar nada. Ele é uma esfinge que eu preciso
descobrir qual é o enigma a todo o momento.
Balançando a cabeça, como se estivesse perdendo a paciência, ele se vira dando as costas
para mim e volta a caminhar.
Agora somos eu, ele e dois homens, e um deles é o que estava no banco do carona e na boate.
Ele o segue a todo momento. Ele vai para perto de Travis e fala alguma coisa no seu ouvido. Ele
assente, como se assimilasse a informação e aperta o passo para chegar logo ao elevador. Sou
obrigada a dar uma leve corridinha porque ele é grande. Todos esses homens são tão altos quanto
Travis, e eu sou pequenininha. Minhas pernas são muito curtas. A alternativa é correr dando saltinhos
e isso me irrita muito. E que merda de sutiã que não segura nada. Tenho que cruzar os braços na
frente do meu peito para eles não ficarem sacudindo. Acho que já estou chamando atenção demais
sendo acompanhada por esses homens, que todo mundo deve saber quem são por aqui. Travis é o
Capo e o chefe de todos aqui. Porra! Ele é o dono desse cassino e estou embasbacada como ele
conseguiu o Bellagio e desde quando.
Entramos no elevador a sós e fico surpresa quando os homens fazem um aceno para Travis,
se mantêm do lado de fora e a porta se fecha.
— Eles não vão nos seguir?
— Não se preocupe — responde frio e claro.
— Não estou preocupada. — Olho para o seu perfil, que logo se vira para mim e cerra os
olhos com o ar irônico.
Devo ser uma palhaça porque ele vive achando graça do que falo.
— Sei que não, mas estou te tranquilizando e informando. Iremos para a suíte Real.
Assinto e, como não consigo mesmo controlar minha curiosidade, pergunto:
— Como você conseguiu esse cassino? Esse hotel, porque não vamos esquecer esse detalhe.
E... não se esquecendo também de que o Bellagio é o mais famoso, maior e rico cassino e hotel de
Las Vegas.
— Temos as concorrências, mas tenho que concordar com você. — Seus dentes aparecem de
relance num sorriso convencido e orgulhoso. — Ele ainda continua sendo o rei de Las Vegas.
— Como você o conseguiu?
— Com um homem, que é extremamente burro e não sabe jogar pôquer.
— Você acha que eu vou acreditar nisso? Que você ganhou esse hotel valiosíssimo numa
mesa de pôquer? Quem seria burro em fazer essa aposta?
— Não foi só uma jogada e não foi só na mesa de pôquer, foi em vários jogos e felizmente
ganhei. — Meneia a cabeça, soberbo. — No mundo do jogo, não é questão do que você está jogando
e nem da sorte. É de como você joga.
— E você joga limpo?
Seu rosto tomba um pouco para o lado, pensativo. Ele vira-se para mim e com três passos,
acabando com a distância entre nós, murmura com um sorriso:
— Quando necessário, eu jogo limpo; quando não, eu não jogo. — Solta o ar pela boca. —
Mas naquela noite, sim.
— Então foi sorte.
— Não! Eu jogo muito bem.
Meu coração acelera pela forma que sua voz soa: baixa, rouca e sexy como o diabo. Meu
Senhor! Esse homem é um perigo. E dentro de um elevador, é quase impossível eu negar como ele me
afeta. Seu cheiro, seu poder, sua força bruta e a beleza. Esses olhos azuis intensos são capazes de me
deixar de joelhos e pedir misericórdia. Preciso repetir, para reforçar e lembrar: Eu odeio a máfia.
— Que bom para você — digo com sinceridade apesar de ter soado malcriada.
Ele assente e respira fundo lentamente.
Sorrio e mudo de assunto para o meu cérebro parar de analisar se seus cabelos são macios
como parecem. Eles vão até sua nuca. Uma cascata negra e brilhante.
— Por que ninguém sabe que esse cassino é seu? Nunca ouvi falar de, pelo menos, da
mudança de dono, venda e que você é o dono. Que sua Organização o comanda.
— Pela primeira vez, você não disse máfia.
Verdade e eu sei como eles odeiam serem chamados assim. Meu pai já “esquentou” a maçã
do meu rosto várias vezes ao ouvir da minha boca essa palavrinha.
— Enfim, eu fiz um acordo com o antigo dono e ele ainda tem uma parte do cassino. Com
isso, ainda aparece como dono para as pessoas, e quem interessa para mim, não saberem da verdade.
É mais para mantermos as coisas aonde elas têm que estar e nada de ruim acontecer.
— Então quase ninguém sabe que você é o dono do Bellagio.
— Só quem precisa saber e eu confio.
Hum...
— Preciso me sentir lisonjeada de novo?
— De novo? — Ele franze a testa. E fica tão lindo. Porra! Se concentra, Madeleine!
— Seu irmão disse que, se você está perdendo seu tempo comigo, eu deveria me sentir
lisonjeada.
Travis balança a cabeça e curva o canto da boca, com seu sorrisinho cruel.
— Foi isso mesmo que o Colen disse?
Finalmente descobri o nome do outro Lozartan.
— Não com essas palavras. Ele disse: “Que eu deveria me sentir lisonjeada por você querer
resolver este problema, no caso eu, com as próprias mãos.” — Sorrio e engulo em seco, erguendo o
rosto. — E tem algum motivo especial para você mesmo querer me trazer até aqui e me salvar hoje
da Bratva, Travis?
Ele se afasta, desviando os olhos; enfia as mãos no bolso e me responde fazendo um
movimento com os pés, que faz seu corpo balançar para frente e para trás como uma cadeira de
balanço.
— Não! Só estou devolvendo o favor que um dia você fez para a minha família.
— Isso tem tanto tempo. — Franzo a testa e tombo a cabeça para o lado, atenta, querendo
entendê-lo.
Fui bem sincera agora porque não consigo entender. Tem uns dez anos que fui à casa dele
dedurar o meu pai porque seu plano iria acabar com Las Vegas, por ele ser um traidor filho da puta, o
que continua sendo.
— A Cosa Nostra nunca esquece o que fazem por ela e, mesmo você odiando o que fazemos
— ele vira o rosto para mim —, ajudou a todos nós, que moramos aqui nessa cidade. Não foi apenas
você que teve mais um dia para acordar. Muitas outras pessoas também, inclusive seu pai.
É claro que ele tinha que jogar uma ameaça no fim, mesmo que foi a parte mais humana e
agradável que apareceu nele durante a noite toda, esse “pedido” de gratidão.
— Não foi nada e como o mundo da máfia fala: “Uma mão lava a outra”. — Sou sensata em
falar isso. — Não fiz aquilo por você, nem pelos meus pais. — Giro o corpo para me projetar para
ele, mostrando totalmente a minha verdade, minha expressão. — Eu fiz aquilo para mim e para me
sentir, de alguma forma, fazendo algo de bom para essa cidade. Eu ainda tinha muitos sonhos para
morrer tão jovem e para ele... — Pauso balançando a cabeça, perdendo as palavras, porque nem eu
mesma sei o que meu pai ganharia com aquilo.
— Por causa de poder — ele completa para mim e levanto rosto, fazendo nossos olhos se
encontrarem. — Seu pai ganharia poder e dinheiro e, claro, a sua morte e da sua mãe e a da minha
família. Então, como você não quer que a Cosa Nostra se lembre do que você fez?
— Então, agora nós estamos quites?
Ele demora um pouco para responder e, mexendo as mãos dentro dos bolsos, vira o rosto
para as portas douradas do elevador e responde:
— Acredito que sim.
Acredito que você acabou de me dizer uma mentira. Só não sei se, no final, ela é uma boa
ou uma má informação.
Estou mesmo tentando manter a calma e fazer as coisas da maneira certa e não explodir
metade de Las Vegas para achar aquele cretino. Já faz uma semana que Edgar sumiu do mapa e não é
fácil se esconder dos meus homens, e muitos dos que coloquei na cola dele, para procurá-lo, já
tiveram suas penas por causa de Beluzzo. Fiz de propósito, porque não há nada melhor do que um
soldado com causa pessoal.
Como gosto de deixar claro, eu arrumo soluções e não conflitos. São meus inimigos que
precisam manter o foco no que andam fazendo.
Edgar está começando a ser uma pedra grande e chata demais dentro do meu sapato, para eu
ignorar. O acordo dele era com meu pai e, se continuar a ser um babaca que é, ele vai conversar com
meu pai pessoalmente. A sete palmos da terra.
Fecho as mãos com raiva enquanto escuto Luca falar com os soldados que eles precisam
continuar procurando o desgraçado do Edgar até achar. Sei que ele acabou de ser redundante e noto
como isso incomoda Paolo, quando meu consigliere faz uma cara de nojo. Sou difícil de rir, mas
sinto a vontade vir e ir embora.
— Continue procurando e não se esqueça de me manter informado. — Luca faz uma pausa e
xinga nervoso. — Não importa. O Capo quer ele vivo e, assim que puder, na sala dele.
Balanço a cabeça, detestando a postura infantil dos meus homens, e o espero encerrar a
ligação, que faz assim que dá um grito de ordem. Às vezes, Luca pensa que os soldados são
cachorros.
— Não vejo necessidade alguma de você falar assim com os soldados. Sandro não é um
imbecil, como você pensa.
Luca cerra os olhos soltando a respiração.
— Eu não fiz porra nenhuma.
Paolo balança a cabeça sem humor e se levanta da cadeira onde estava sentado, jogando a
jaqueta para longe com força.
— Você podia parar de olhar e falar alguma porra, Travis.
— Opa! Estou apenas assistindo.
— E não vai dizer nada?
— Não, porra! — Agora me irrito e me levanto olhando para os dois bem sério. — Eu não
tenho que dizer nada e não vou. Sou o Capo de vocês e não amigo. Exijo respeito. Então parem e vão
trabalhar. Enquanto ficam aqui, parecendo duas mocinhas tricotando, o filho da puta do Edgar está
sumido e colocando provavelmente muita coisa em risco. Não seria a primeira vez.
Parece que, de vez em quando, eles lembram quem manda. Ainda é difícil estar na sombra do
meu pai e trabalhando com os homens que foram seu braço esquerdo, o direito sempre fui eu depois
que meu avô parou de se envolver com os negócios, embora ainda seja o Boss que comanda o
território leste da Cosa Nostra. Vincenzo Lozartan ainda é o Boss da Lawless. E não me incomodo de
ser o vice dele, mas odeio ser a sombra do meu pai.

Estou andando para lá e para cá, agoniado, nervoso, e não sou assim. Nunca fui. Nada me tira
do sério. Eu crio soluções, não problemas. Como também não pioro as coisas.
Fecho os olhos e respiro profundamente, pela milionésima vez, tentando encontrar um
equilíbrio dentro de mim, para não explodir ou tacar fogo em Las Vegas inteira até achar esse rato
ladrão e safado.
Porque que ele foi inventar de se meter com a Bratva? De novo, não posso me esquecer desse
detalhe. Detesto ter que limpar sujeira que não é minha e esse calhorda de merda está me fazendo
beber como se eu fosse um bebum viciado. Acho que sou um dos únicos homens feitos que não bebe
ou usa droga como um delinquente. Mas esse é o nível no qual me encontro por todo esse estresse.
— Travis, maneira na bebida, irmão — Dario, meu irmão mais novo, pede, se sentando ao
meu lado no camarote.
Vim me distrair um pouco, ou tentar, na boate.
— Senhor?
Viro-me e vejo Luca aparecer na porta.
— O que foi?
— Já faz muito tempo que estamos procurando-o incessantemente. Os homens...
— Os homens vão continuar — interrompo antes que fale mais merda. — O fato de já ter
passado mais de vinte e quatro horas procurando esse desgraçado — enfatizo a palavra gritando —
não quer dizer que têm que parar. Eu mandei vocês pararem de procurar?
Minha voz está saindo bem alta. Caralho! Sei que estou gritando, perdendo o equilíbrio e a
concentração. E não posso demonstrar esse sinal de fraqueza para os meus homens. Vou acabar
matando o Edgar ou dando ele para a Bratva e assistir quando eles fizerem picadinho dele.
— Travis, nós estamos fazendo tudo que podemos para encontrá-lo.
— Então faça mais porque, pelo visto, não fizeram o suficiente. Las Vegas não é tão grande.
— Como você tem tanta certeza de que ele não saiu daqui ou, até mesmo, do país?
— A não ser que ele tenha encontrado uma identidade nova, ele não conseguiu sair do país,
mas eu tenho quase certeza de que esse filho da puta está só escondido. Ou espero que esteja morto,
pois é a única justificativa para vocês não terem encontrado.
Vejo o olhar do meu irmão me criticando enquanto fecha os olhos e se levanta. Dario pega
mais bebida no bar e sai do camarote.
Vir à boate do cassino não foi apenas por querer me distrair, mas eu precisava trabalhar.
Fazer tudo funcionar corretamente, como gosto.
Embora encontrar Edgar Beluzzo seja importante, cuidar dos meus homens e dos meus
negócios também é. Preciso encontrá-lo e rápido. Ele é uma ponta solta desse vespeiro, que é a
organização da Costa Leste, e não quero ter problema com a Bratva por causa dele. Sem contar que
não consigo esquecer a filha dele. Há oito dias que a salvei de Yuri e agora tenho que encontrar
meios para achar o pai dela. Isso não é coincidência. Edgar fez alguma merda e é por isso que estou
tão empenhado em encontrá-lo. Não é porque me importo. Estou pouco me fodendo se encontraremos
ele ou o corpo dele. Tenho a sensação mais satisfatória de encontrá-lo morto do que vivo, porque só
em imaginar que precisarei ouvir a voz dele e toda sua ladainha de babaca que é, irrita-me.
— Agora podem ir — digo para Luca. — Não quero mais falar. Só voltem aqui com alguma
informação que vale a pena interromper o meu momento de silêncio.
Luca e Paolo assentem e vão embora com os dois soldados que o estão acompanhando.
— Você sabe que eles vão começar a desconfiar dessa ira toda para encontrar um homem —
comenta Colen, surgindo do nada no camarote.
Cerro os olhos e noto que está um pouco aéreo. Tenho certeza de que fumou.
— Encontrar um homem que pode ferrar com a nossa vida, Colen. — Vou até o bar e
finalmente encho meu copo de novo de uísque. — Edgar não é simplesmente um homem. Ele está
devendo à família, movimentando os homens da Bratva e colocando a sua própria família em risco,
então não é nada simples.
— Meu irmão — coloca a mão em meu ombro encarando-me —, você fala tanto que não quer
ser a sombra do papai e o que você está fazendo é justamente isso, Travis.
— Caralho, Colen! — Tiro sua mão de mim, empurrando meu ombro contra ele. — Não estou
fazendo nada que eu não teria que fazer. Eu quero encontrá-lo e resolver isso com minhas próprias
mãos.
Ele ergue os olhos, interrogativos, então digo:
— Sim, eu quero matá-lo com minhas mãos; mesmo que seja maravilhoso encontrarem logo o
corpo dele sem vida em algum beco, eu prefiro ter que olhar nos olhos dele e matá-lo.
— Está pensando na recompensa?
— Que recompensa, Colen?
— A filha dele — responde, como se não fosse nada de mais e se explica: — Pensa só. Se
ele estiver morto, você pode ficar com ela.
— De onde você tira essas ideias?
— De lugar nenhum. — Mexe as sobrancelhas. — Eu sou observador e você ficou de olho
em Madeleine, como um cão faminto observando um pedaço de carne.
Dá de ombros e se joga no sofá em L, que fica na parede oposta às paredes de vidro, que fiz
para observar o movimento da boate. Todas as minhas boates são assim.
— Você é louco!
— Sei... e, tipo, realmente ela é muito baixinha para você, mas gostosa e deve ser uma...
— Cale a boca, Colen! Você está me irritando.
— Viu só?
— Colen! — Aproximo-me dele e o fito nos olhos.
— Olha como você está ficando todo eriçado porque estou falando da garota.
— Ela não é mais uma garota.
— Deu para perceber. Afinal de contas, com aqueles peitos...
Sento-me ao seu lado pensando nela. Madeleine deve ter uns vinte e cinto anos e realmente é
muito bonita. Os olhos dela chegam a me incomodar de tão intensos.
— Cale a boca! Se você me irritar muito vou atirar em você. Eu quero silêncio. — Fecho os
olhos e relaxo meu corpo no sofá.
— Então não deveria estar na boate.
Arranco forças não sei de onde e preciso contar até dez para realmente não dar um tiro no
meu irmão. Derramo de uma vez o líquido âmbar, que desce pela minha goela queimando, e bato o
copo com força sobre a mesa ao lado. Levanto-me e vou até os vidros. Observo minha boate e enfio
as mãos nos bolsos tentando ter algum sinal ou ideia de onde o caralho de um traidor como Edgar
Beluzzo pode estar.

Depois de insistentes batidas na porta, abro com minha arma em riste e minha cara de
poucos amigos.
— Morto! Meu pai está morto. — Olhos tão azuis e imensos me fitam com pavor e
desespero.
Sem pensar duas vezes, abaixo minha arma e a trago para dentro da minha casa. Fecho a
porta e olho para Madeleine Beluzzo. Ela acabou de me acordar às dez para quatro da manhã batendo
na minha porta desesperadamente, gritando por socorro e me xingando, e nem sei o que fiz. O mundo
parece cair lá fora esta noite e, ao abrir a porta, encontrei-a toda molhada e chorando.
Uma trovoada alta nos pega de surpresa, e o clarão ilumina minha sala de estar e o hall onde
estamos, e onde a vejo pingar e molhar o tapete persa. A chuva torrencial é ideal para a notícia, para
a situação. Edgar está morto e mereceu. Esse desgraçado me fez gastar muito tempo, dinheiro e
energia dos meus homens, para descobrir que está morto.
Pode parecer horrível, mas sinto muito alívio por aquele filho da puta ter colhido o que
plantou. Espero que a Bratva tenha o feito sofrer um pouquinho.
— Sente-se aqui, e me explique o que está acontecendo. Que história é essa de que ele
morreu?
Não sei de onde veio essa calma. Normalmente, eu estaria gritando e ela, com certeza, estaria
do lado de fora olhando para mim toda molhada. Isso não é o meu normal.
— Ele está morto! — afirma virando-se para mim e relutante em se sentar. — E eu sei que
foram vocês. Foi esse mundo horrível e cruel.
— Nós fizemos o quê? — Minha voz sai ríspida porque essas acusações dela estão me
deixando puto. — Você pode me explicar agora o que aconteceu porque, sinceramente, não sei de
nada. Estou procurando seu pai há mais de uma semana.
— E aí quando vocês o acharam, mataram ele.
— Eu nem sabia que seu pai estava morto, porra!
Falo por cima da voz de Colen, que me viro e o vejo atravessar a casa gritando. Ele aparece
no meio da sala olhando para nós dois com a testa franzida.
— Eu já sei que ele está morto, Colen — antecipo o que ele veio me informar.
— Isso! Isso, ele está morto! — Madeleine berra chorando. — Morto!
Cerro os olhos e a vejo ir para cima do meu irmão, só que eu a seguro antes que consiga
bater nele. Posso tolerar as coisas que ela faz comigo, mas Colen vai acabar revidando e nada ficará
bem com isso.
— Ei, garota. Nós nem sabemos de nada. Se acalme.
Surpreende-me a orientação dele. Geralmente, ele teria gritado com ela.
Que porra de efeito alucinógeno Madeleine causa?!
Ela cai no chão e murmura algo que não entendemos, então pedimos para repetir. Tremendo,
ela ergue a cabeça e nos encara.
— Eles arrancaram a cabeça dele e...
— Provavelmente mandaram para você. — meu irmão completa, olhando para Madeleine e
depois para mim. — Porque eles deixaram como presente para nós no Bellagio, bem na entrada, as
mãos dele com um recado: “Tome o traidor de vocês”.
Fecho os olhos, tentando não acreditar no que acabo de ouvir. A Bratva está querendo mexer
comigo e estou pagando para não entrar numa briga, mas se eles apertarem os meus botões, não vou
querer saber. Estou pouco me fodendo. Vou matar todos eles, um por um.
— Para mim também tinha uma carta junto com a... cabeça.
A voz de Madeleine me traz para o presente novamente. Viro-me para ela e cerro os olhos
para sua fisionomia ainda apavorada.
— E a minha mãe... — engole em seco e olha para mim, com as primeiras lágrimas
escapando — eles levaram.
— Como é que é? — eu e Colen falamos automaticamente.
Vejo de relance quando Paolo entra na casa com Luca atrás dele e Lorenzo.
— Eles invadiram minha casa e reviraram tudo. Quando pegaram minha mãe, que estava na
hidromassagem, bateram na sua cabeça e ela ficou desacordada. — Madeleine sacode a cabeça
quando olha para o chão. — Eles iam me pegar, só que consegui fugir pelos fundos. Mas consegui
ouvir que eu seria a próxima e você também — fala olhando para mim.
— O quê? — Aproximo-me dela para entender melhor.
— Que eu sou a próxima, e sei porque ouvi eles falando. — Respira fundo. — Que você é o
próximo... é porque estava na carta do meu pai. “Um traidor precisa morrer. P.S.: Avise ao chefe que
ele será o próximo. Por mim ou por algum amiguinho desse traidor.”.
Passo a mão nos cabelos e cerro a mandíbula. Se Edgar não estivesse morto, eu com certeza
o mataria nesse instante.
Puta que pariu!
— Agora entendo o porquê você acha que eu o matei.
Ela apenas assente, calada.
— Mas não fui eu, porém, depois dessas circunstâncias, com certeza eu o mataria com
minhas próprias mãos. Seu pai era um homem imundo. E não vem — dou um passo para ela, detendo
as ofensas que adora jogar na minha cara — me dizer que todos nós somos. É verdade, mas o seu pai
era um dos piores homens que já tive o prazer de estar dentro de uma mesma sala. Ele não tinha
respeito nem pelas palavras dele. Era um traidor. E muito menos tinha respeito por você ou por sua
mãe. Espero que ele tenha morrido muito feio. Você pode me odiar mais ainda — digo isso, pois vejo
a veia do seu pescoço saltar com minhas palavras —, mas o seu pai apenas colheu o que plantou.
Madeleine é obrigada a engolir o que presumo ser seu discurso de que eu também mereço
uma morte dolorosa. Sei que é verdade, mas foda-se!
— Quando veio pra cá, você observou se alguém a estava seguindo? — Colen pergunta,
mudando o foco do assunto.
— Eu não sou tão idiota assim e quando...
— Ninguém disse nada disso, Madeleine.
Caralho! Quantos anos ela tem. Treze?! Tudo me irrita.
Contrariada, ela faz um aceno para o meu irmão com a cabeça e diz:
— Pode ficar despreocupado. Tomei cuidado. — Dá um suspiro pesado e seus olhos azuis
fitam os meus. — Não quero morrer e não quero que me levem. E mais, vou ser bem sincera. Não
estou triste porque mataram meu pai; como você mesmo disse, ele cavou a própria cova, mas a minha
mãe era minha família. Se preocupava comigo. Só não fiquei para ajudá-la porque não estou muito a
fim de morrer. Tenho apenas vinte e cinco anos e quero continuar viva. Até agora não fui
integralmente envolvida nesse mundo sujo da máfia. Porém... não precisava ter a cabeça do meu pai
em uma caixa de presente com rosas vermelhas e pétalas brancas, como se fosse um presente. Eu sei
o quanto esse mundo é terrível e cruel, só vim parar aqui porque era a única opção de sobreviver a
isso. Estou me ajudando, porque quero continuar viva. E vim avisar a você do recado e pedir sua
ajuda para...
— Quer que eu procure sua mãe? — completo sua frase.
— É isso que estou pedindo.
— Bom, o nosso acordo já foi pago ou você se esqueceu de que eu te salvei na boate? —
lembro-a, frio e calculista.
— Você quer comparar uma chacina em Las Vegas com um resgate bobo naquela boate? Sem
contar que me colocou no seu cassino chique por dois dias, sem opção de saída. E não vem falar que
estava me protegendo na sua fortaleza. Pelo amor de Deus! Eu mereço mais do que aquilo, pelo que
fiz anos atrás.
— Ninguém obrigou você a fazer nada antes.
— Sim, mas eu fiz e agora quero o reconhecimento.
— Okay, você fica aqui.
Madeleine solta uma gargalhada e chega mais perto de mim, muito perto. Ela não tem um
pingo de medo de mim. Está abusando da confiança que dou.
— Se no seu hotel chique eu odiei ficar presa, imagina aqui na sua casa. Não! Não quero
isso.
— É tudo que vou conseguir fazer para te manter viva. Você não quer isso, viver? — Coloco
as mãos na cintura, empurrando meu casaco para trás. — Ou, se quiser, coloco em qualquer outro
lugar.
— Só quero ficar a salvo até você encontrar minha mãe.
“Se ela ainda estiver viva”, penso em silêncio, porque não aguento ver mulher chorando. Me
irrita.
Depois de um minuto de silêncio, ela fala:
— A sua ideia é... — Madeleine tenta terminar a frase.
— É que ela fique aqui com a gente?! — Colen diz parecendo espantado e meus homens se
entreolham.
— Sim! — digo com firmeza e sem espaço para discussão. — Ela vai ficar aqui.
— Eu não quero!
— Não vai ser por muito tempo.
Não sei o porquê de eu estar insistindo. Ela não é problema meu. Que merda de mulher
teimosa!
— Então é até você conseguir que eu vá embora?
Franzo a testa e deito a cabeça para o lado, sem entender.
— Você vai arranjar um jeito de eu sair desse país e ficar bem longe dessa sujeira toda.
Por mil infernos! Era só o que me faltava! Ter que ser babá da garota e, talvez, ainda na
sombra de uma promessa do meu pai. Jurar por sua honra de merda. Esse acordo, esse favor, é só
pelo fato do meu pai pedir a ela que, quando precisasse realmente de ajuda, era só recorrer a ele, a
nós. Merda! Eu sei que o que ela fez por nós não se compara com minha “ajudinha” com Yuri naquela
noite. Mas ter que ficar com ela na minha casa é foda! Vou acabar estrangulando-a e sua boca grande,
que não perde uma oportunidade de me ofender. Será que ela era assim com o pai?
Deixo esses pensamentos de lado e dou o único passo que nos mantém afastados, de fato, e
digo encarando seus olhos:
— A única saída para você continuar viva é ficar comigo. Queira ou não, goste ou não,
Madeleine. Você precisará estar aqui! Comigo.
Ela engole em seco, segura a respiração e concorda com o aceno de cabeça mais forçado da
história da Terra.
Oh, mulher teimosa!
Nem em mil anos pensei que vir pedir ajuda a Travis Lozartan me colocaria em um dos
quartos da casa dele e com vários... “presentes” no dia seguinte.
Parada como uma estátua, analiso as roupas, sapatos e acessórios dentro das bolsas e
algumas jogadas sobre a cama, que ele mandou vir das butiques mais caras de Las Vegas, que, por
incrível que pareça (estou sendo irônica), fica dentro do cassino milionário dele.
— Eu não pedi nada disso! — digo em voz alta.
A empregada, que está cuidando de guardar tudo no closet e sempre está cuidando da casa,
olha para mim com uma cara neutra e diz:
— Você deveria se sentir lisonjeada dele se preocupar com a senhorita.
— Mas não estou.
Ela entra no closet e eu me jogo na cama de braços abertos, pouco me importando de estar
amassando o paletó branco e lindo da Prada, que deve ter custado uma fortuna. Ou, pelo menos, um
valor que não posso pagar. Meu pai tinha dinheiro, sempre tive de tudo, porém não como Travis.
Ninguém é mais rico e poderoso que Travis Lozartan no território dele.
A mulher volta para o quarto e, como está olhando para mim, fico de pé e cerro os olhos,
pronta para ouvir o que está na ponta da sua língua.
— Fale! — ordeno com moderação.
— O senhor Travis é um bom homem.
Solto uma risada e balanço a cabeça.
— Eu sei o que a senhorita pensa sobre ele e muitos têm o mesmo temperamento perto dele,
mas Travis não é como o pai e eu sei que a senhorita o conheceu.
Franzo a testa, com força por sinal, e ouço a explicação:
— Todos nós sabemos quem é a senhorita e o que fez por nós.
— Nós?
— Sim, a Famiglia é uma só; e, quando você ajuda um de nós, principalmente o nosso Capo,
ajuda a todos nós. Quando acontece de haver uma retaliação ou guerra de gangsteres, todos nós
sofremos. Não sei por que é tão difícil de você compreender que é uma salvadora e, talvez por isso,
embora o senhor Travis prefira ficar sozinho em sua casa, tenha permitido você aqui e ainda se
preocupou. — Ela sorri e caminha até a cama, pega o paletó que eu estava amarrotando e diz
virando-se para o closet de novo: — Por favor, dê uma chance a ele. Tente enxergar o que eu vejo e
todos os homens dele.
Penso em várias frases para dizer, perguntas e dúvidas que passam na minha mente, mas
escolho dar um pequeno sorriso sem mostrar os dentes.
— Sem ser grossa, quem é você nessa casa? Porque eu tenho a estranha sensação de que é
alguém importante.
Pela primeira vez, ela abre um sorriso simpático para mim e responde:
— Eu sou Rosália, a governanta da casa e por muitos anos babá das crianças, incluindo
Travis. Ele era um menino único quando pequeno e por isso falo com tanta propriedade sobre a
personalidade dele e que é um homem bom.
Engulo em seco e tento não contorcer muito o rosto.
— Você sabe a diferença de um “homem bom” para “bom homem”, certo?!
— Claro que sim, criança. — Pega o terninho da Prada e ajeita no cabide. — Ele é um Capo,
um chefe, cruel e impiedoso com seus inimigos, mas com os irmãos dele e com quem ele escolhe ser,
é um homem bom.
Sugo o ar pelo nariz e assinto. Não vai custar nada tentar compreender esse homem que todos
respeitam, não temem. Acho que nem eu o temo. Só prefiro provocar porque ele é tudo o que mais
odeio no mundo desde criança.
Ele representa minha repulsa paternal, os vícios que convivi através da minha mãe, a
hierarquia de homens e mulheres dos tempos de vestidos de cauda e condes, a desigualdade de poder
(nunca existiu uma mulher no poder), a vingança sem freio e a morte e sangue, que há em suas mãos.
Inocentes ou culpados, não importa. Ele, ou nenhum homem, não deveria tirar a vida de
ninguém; e, por julgamento, não há um homem na máfia que não mereça a mais dolorosa morte. Todos
nós, até eu por ter compactuado com aquela vingança anos atrás.
Também mereço morrer sentindo gosto de ferro. Me afogar no meu próprio sangue. Aliás,
também sou parte da Lawless. Odiando isso ou não, é um fato sobre mim. Talvez por isso também me
odeie, às vezes.
Calada, peço licença e saio do quarto, deixando-a em paz para cuidar das arrumações.
Com passos lentos, passo pela casa monstruosa de Travis Lozartan, o cara conhecido pelo
apelido carinhoso de “O Cruel”. Com certeza, ele não deve ser a melhor visita para os seus inimigos
ou mesmo para os seus homens. Ninguém quer vê-lo mostrar porque é chamado assim.
Confesso que também não quero. Estou aqui nessa casa impecavelmente linda, rica e
basicamente ornada em dourado (tenho quase certeza de que é ouro) porque não tenho saída. Ou fico
aqui, ou saio e a Bratva me pega.
Meus pés estacam quando vejo uma figura um tanto esquisita num quadro enorme que toma
quase a parede toda que leva para o corredor da cozinha, após as escadas duplas que lembram muito
a de um castelo. A casa é linda, tanto por dentro quanto por fora. A figura é um lobo gigante, quase
atacando uma mulher com um vestido vermelho sangue decotado demais e mangas fofas. Parece de
uma época antiga. É lindo, porém amedrontador e não sei o porquê me imagino sendo essa mulher.
Sendo dominada por algo mais forte, maior e perigoso.
Engolindo em seco, passo pelo quadro e dou de cara com uma sala enorme e vazia, a única
coisa que tem dentro é um piano preto de cauda e o banquinho. É lindo e, se eu soubesse usar, com
certeza me arriscaria. Nas paredes têm mais quadros com pinturas abstratas e campos verdes, e em
cima das portas em arco, um relógio dourado marcando cinco e meia da tarde.
— Uau! O tempo está se arrastando — penso em voz alta e logo sinto meu estômago roncar.
— Preciso comer algo.
A última coisa que me lembro de ter comido foi uma maçã no café da manhã, que preferi ficar
no quarto. Não quis olhar na cara do Travis.
Saindo da sala do piano, volto para as escadas e entro no quarto que está minhas coisas, que
não tem mais a presença da empregada. Fecho a porta, passo o trinco e tiro minhas roupas. Um banho
refrescante é sempre bem-vindo para me acalmar. Vou ficar limpa para jantar. Pelo horário, já estão
preparando a comida e vou descer para pegar um pouco e comer no quarto. Evitar qualquer pessoa
dessa casa é uma missão para mim.

Ajeito a alça do meu vestido vermelho de verão que Rosália deixou pendurado para mim, e
prendo meu cabelo com uma presilha enquanto saio do quarto. Ainda bem que ela escolheu algo
confortável para comer e ir dormir logo. Não sou de usar pijama. Gosto de ser livre, então vai ser
bom. Pois o livre quer dizer que durmo de calcinha, quando a peça fica em mim. Prefiro dormir como
vim ao mundo.
Cantarolando, entro na cozinha e vejo uma mulher sorridente servir um prato de sopa muito
cheiroso e que francamente, se antes eu estava com fome, agora estou faminta.
— Boa noite, senhorita! — Rosália diz animada.
Sorrio para ela e me aproximo da mesa que fica na cozinha.
— Não se sente aqui.
— Por quê? — Franzo a testa.
— A mesa já está posta, mas na sala de jantar.
Respirando fundo, concordo com um aceno e a sigo quando ela pede para acompanhá-la. Sem
esperar, quando entro na sala de jantar, vejo grandes olhos azuis escuros penetrantes e intensos me
fitarem com uma das sobrancelhas erguidas. Travis Lozartan, o homem da casa, está sentado na
cabeceira da mesa com seu terno cinza escuro de três botões e sei disso porque está fechado, assim
como ele mesmo, que nem parece estar em casa. Por que ele não fica à vontade na sua mansão de rei?
Que homem louco!
— Pensei que ia fazer guerra de fome também. — Travis comenta quando apareço na porta
da sala de jantar. — Já que não comeu o seu café da manhã e almoço.
Franzo meu rosto todo com a raiva passando por mim. Chego a sentir meus nervos pulsando e
tremo. Respiro fundo e o ignoro. Sento-me em uma das cadeiras douradas acolchoadas com o tecido
mais macio que pus as mãos na vida, na cor creme. A mesa é toda de vidro com pés dourados
também. A casa é basicamente decorada em marfim e dourado. É linda.
— Foi você que decorou essa casa?
— Não. — responde com a testa totalmente enrugada.
Mordo a boca para não sorrir abertamente e abaixo a cabeça olhando o creme de cebola no
prato de louça branca com feixes dourados. Tudo de ouro! Aff... Que exagero!
— Não gostou da decoração também?
— Também? — Encaro-o sem entender e engulo a sopa.
— Você não gosta de mim. Não gosta do que faço, não gostou de ficar aqui e agora não
gostou da decoração. Você gosta de algo?
Ai! Eu senti essa alfinetada, mesmo não querendo.
— Sim, eu gosto, e a questão da decoração não tem nada a ver com isso. E eu não disse que
não gostei.
— Então é o quê?
— É exagerado demais. Acho que você fica tanto nos seus cassinos, que não se dá conta de
que vive na casa de Alexandre, o imperador.
Um sorriso pequeno e presunçoso surge no canto da sua boca. Pensei que iria dizer algo
desaforado ou ser grosso, como foi no elevador com um dos seus homens, mas fica em silêncio e
devora o prato que Rosália coloca na sua frente e depois me serve também.
— Bom apetite.
Agradeço com um sorriso e olho para o prato. Macarrão ao molho branco com peixe trufado.
Está com uma cara incrível.
— Não gosta de macarrão?
Tiro meus olhos do jantar e encaro Travis. Eu queria conseguir não achá-lo tão lindo e
irresistível com essa cara fechada de mau humor.
— Gosto sim.
— Então por que, em vez de comer, está olhando?
Suspiro com leveza para não ser tão malcriada.
Foi apenas uma pergunta, Made.
— Porque estou surpresa.
— Com o quê?
Levanto meus olhos para ele e o flagro, fitando-me genuinamente.
— De o prato ser preparado com tanto cuidado. É bonito e parece que estou realmente no seu
hotel.
Vejo-o fechar os olhos, balançar a cabeça como se achasse o que acabei de dizer uma
idiotice, que não deixa de ser bobo, e engolir outra garfada. Para um homem do porte dele, deve
comer bastante. Escondo minha cara pensativa e, com certeza com as bochechas vermelhas, baixando
o rosto e comendo em silêncio.
Pelos próximos trinta minutos, os únicos sons entre nós são dos nossos garfos batendo no
prato de louça, quando trocam o prato vazio do macarrão pelo de siri com trufas flambadas e a taça
de vinho ora batendo na mesa ou quando são preenchidas por Rosália.
Não deixo de observar como ela trata Travis com zelo. Talvez ela tenha razão e ele não seja
a fera que gosta que os outros pensem que é e eu acredito que seja. Ah, porra! A culpa não é minha.
Ele é grosso e nem um pouco humorado, é difícil não pensar que é um monstro.
Assim que termina, não se demora. Levanta jogando o guardanapo de pano sobre a mesa e
pega o celular que estava ao lado do prato. Bebe o que restou do vinho e chama Rosália. Antes que
ela apareça, levanto-me também.
— Você já soube da minha mãe?
Ele direciona apenas o olhar para mim e responde:
— Não.
— Estou aqui há quase dois dias e você não sabe de nada?!
— E você só foi lembrar dela depois que jantou e se deslumbrou com todo o luxo da minha
casa, que parece que nunca viu.
— Cale a boca! — berro e chego até ele com alguns passos, pouco me importando que possa
me dar um tiro e me matar. — Cale a boca!
Travis aperta o maxilar, cerra os punhos me olhando nos olhos.
— Não pense que está falando com qualquer um. Eu posso estar sendo cordial em ajudá-la
pela promessa do meu pai, mas não sou obrigado a tolerar seus abusos. Acima de qualquer coisa, eu
sou seu Capo, querendo ou não. Você faz parte da Cosa Nostra, é filha de um ex-aliado e neta de um
ex-soldado. Deveria saber como se trata seu Capo, menina.
Engulo minha ira e as palavras tão verdadeiras dele. Palavras que eu odiava ouvir quando
pequena: ordens, respeito e poder. Por isso odeio esse mundo. Por ter nascido, crescido e pertencer
a ele para sempre. Nunca vou poder ser nada além de uma subordinada aos homens feitos, aos
homens da Cosa Nostra.
Baixo a cabeça fechando os olhos e respiro fundo. Eu tenho que ceder porque preciso saber
da minha mãe. Ela pode ser uma viciada em jogo e bebida, quase levando-nos à morte e ruína, mas é
minha mãe e se preocupava comigo de verdade. Meu pai era por interesse. Eu podia me casar (seria
melhor dizer me unir) com um homem mais poderoso ou rico, para que ele continuasse a ter o que
mais gostava: seus vícios e seus negócios sujos. Meu maior medo, até ele morrer anteontem, era ser
vendida para Bratva ou alguma organização criminosa tão filha da puta quanto. Posso estar aliviada
por não sofrer mais desse perigo, contudo agora tenho outros. Travis não tem obrigação comigo, a
não ser sua palavra. E o que é uma palavra, um acordo, para um homem que tortura, mata e mutila
seus inimigos ou soldados quando fazem algo errado?
Portanto, sou obrigada a engolir minhas convicções e ideias se quero continuar viva para ver
o amanhã. E tenho que lembrar disso vinte e quatro horas ou, pelo menos, perto dos Lozartan e de
seus soldados.
— Espero que não precise lembrar a você as boas maneiras.
Concordo com um aceno e ergo o queixo para fitá-lo nos olhos, que Travis os cerra me
encarando muito sério.
— Fique quieta e, quando tiver novidade, falo com você.
— Obrigada — murmuro sentindo o gosto azedo da palavra.
— Ótimo. Agora, se quiser, pode ir dormir ou se sinta livre para aproveitar a casa. — Dá um
passo, ficando tão perto de mim, que temo que me estrangule, e coloca a mão no meu queixo,
erguendo ainda mais meu rosto. — Não quero que tenha medo de mim, apenas respeito.
— Fica difícil com tudo que você representa, meu Capo. — Eu poderia vomitar por tais
palavras.
Ele respira fundo, bem lentamente e audível, e abre um sorrisinho.
— Com o tempo, você se acostuma — diz e me solta, virando as costas.
Nesse momento parece que vou cair no chão, como se fosse um sorvete fora da geladeira no
deserto escaldante de Nevada. Esse homem, com certeza, consegue o que quer. Isso não é poder, é
quase magia.
Vejo-o sair, sem olhar para trás, da sala de jantar acompanhado de Rosália e dois homens,
que nem vi chegarem. Que ódio! Ele me tratou como uma criança e depois como uma de suas putas na
frente deles.
Argh!

Resolvo dormir logo. Não há nada nessa casa que me desperte interesse, principalmente com a
raiva que passa por meu corpo. Subo as escadas depressa e entro no quarto, tranco a porta e me
encosto. Inspiro e expiro com força. O que acaba de acontecer não deve mais se repetir.
Corro para o banheiro e me encaro no espelho.
— Você precisa fechar essa boca, Madeleine.
Deixo a onda de medo e raiva passar, e jogo uma água no rosto. Depois que escovo os
dentes, penteio os cabelos, tiro o vestido, jogando-o no recamier, que fica nos pés da cama, e me
jogo na cama.
— UAU! — murmuro quase como um orgasmo sentindo o colchão. — Odeio que tudo nessa
casa seja bom — penso em voz alta e completo mentalmente: menos o dono.
Apago a luz do abajur e fecho os olhos, torcendo para que o dia seguinte seja melhor ou que
eu dê a sorte de não ver Travis. Ele ficando puto ou não, vou comer dentro do quarto. O mais longe
dele.
Não sou o típico cara que fica pensando em coisas fúteis, principalmente quando está no
trabalho, quando estou em uma tocaia, mas não consigo esquecer a voz daquela abusada me
chamando de Meu Capo.
Puta que pariu! Ela escapou de ser agarrada por mim por um fio. Se estivéssemos na sala de
estar, eu a agarraria e a jogaria no sofá; com certeza calaria sua boca. Precisei de todas as minhas
forças para não a beijar e rasgar aquele maldito vestido vermelho decotado tão apertado no seu
corpo delicioso. Caralho! Estou ficando duro de novo e isso não é bom. Não é bom querer foder
violentamente a mulher que está sendo uma pedra no meu sapato. Não é bom criar relações com uma
protegida. Isso não pode dar certo. Eu nunca misturo negócios com prazer. Ela é apenas um negócio.
— Senhor? — Escuto Luca pelo ponto no meu ouvido.
Estou escondido no telhado do prédio, que fica em frente ao balcão onde Yuri Avilov está, e
Luca no carro, na esquina, esperando o momento certo para interceptar aquele filho da puta. Eu
poderia estar no cassino ou em casa, tenho homens para fazer a função que estou exercendo hoje.
Porém, meus problemas com Ivon Avilov e a Bratva vão além do limite e da minha paciência. Eles
estão me provocando e por isso têm minha presença exclusiva esta noite.
— Sim?
— Vi um dos homens dele sair do balcão. Acho que estão se preparando para sair.
— Às vezes, não. Talvez só esteja conferindo o perímetro. Enzo ainda está onde eu o mandei
ficar?
— Sim e disse que consegue ver tudo.
Como disse, tenho homens o suficiente para interceptar meus inimigos, ou alguns “amigos” e
clientes que passam do limite, mas eu não sou meu pai. Eu gosto de pôr a mão na massa e, de vez em
quando, apertar o gatilho, se for preciso. Eu mandei Enzo se esconder em um dos apartamentos onde
estou no telhado (precisamente no foco, sem a hipótese de me virem e o plano dar errado), com a
arma de longo alcance apontada e preparada. Vigio tudo pela mira do fuzil.
— Ótimo, agora mantém o foco e, assim que perceber algum movimento, me avise.
— Sim, senhor.
Deixo a transmissão no mudo para mim, mantendo o áudio deles. Eles podem me ouvir o
tempo que for, mas eu não sou obrigado a aguentar os papos idiotas que sempre acontece, e eles
fazem justamente porque deixo no mudo. Luca é um péssimo piadista.

Quando meu pai era Capo, eu nunca o vi fazer o trabalho “braçal”. Ele era mais de mandar e
esperar o momento certo para colocar suas mãos no trabalho, mas eu não. Gosto de sentir o pânico
dos meus inimigos e confesso que não apenas sinto prazer, como preciso estar presente quando um
traidor é pego.
Solto a respiração, caminho com passos largos pelo corredor do hotel onde escolhemos
interrogar Raul Patrício, um dos meus soldados, e posso adiantar, que será ex em alguns minutos.
Deixo Paolo e Luca passarem na frente, entrarem (fazerem o que fazem de melhor) e assim
que recebo o sinal, entro no quarto deixando Enzo e mais um soldado na porta; nem precisava disso,
e não gosto de chamar atenção em local que cuidamos para não ter tanto envolvimento conosco.
— Travis, eu juro que não...
— Calado! — Luca dá um soco com toda força na cara dele e, chegando para trás, agarra os
cabelos compridos do homem e puxa para o alto até ele estar olhando para mim com apenas um olho,
pois o outro já está roxo e sangrando.
Meu cinistro nunca me espera.
— Não fale se não falarem com você.
Paolo se aproxima de Luca e coloca a mão no seu ombro, apertando para pará-lo do excesso.
Luca é meu cão brabo e muitas vezes precisa ser colocado na coleira, como todo cachorro louco. No
entanto, ele é um bom homem para a Famiglia.
Enchendo os pulmões de ar, pego uma das cadeiras de madeira da mesa do quarto, e virando-
a, ao contrário para mim, me sento e encaro Raul.
— Você me conhece...
— Sim, eu conheço e...
— Não me interrompa — peço com a voz baixa e cerro a mandíbula.
Ele abre a boca, mas desiste e acho bom.
— Eu quero saber onde está a minha encomenda.
Ele balança a cabeça histericamente e arregala os olhos.
— Não sei do que você está falando, Travis.
Meneio a cabeça para a direita, cerro o maxilar e, fechando os olhos, arfo com força.
Fazendo um sinal com os dois dedos para Luca, ele pega Raul pelo pescoço e o faz ficar mais perto
de mim. Olho dentro dos seus olhos e digo:
— Vou repetir só mais essa vez. Onde está a minha encomenda?
— Que encomenda? Eu não sei de nada. Juro que... — Paolo não o deixa terminar quando
pega sua arma e encosta no meio da sua testa.
— Responde o que ele mandou.
— Mas eu...
— Bastardo! — solto com raiva e me levanto, jogando a cadeira para longe. Pego-o pela
gola do casaco de couro que está usando e arrasto seu corpo até a parede, enforcando-o lentamente.
— Você vai morrer de qualquer jeito, mas seria bom morrer com o que resta da sua dignidade. Você
me traiu. Traiu a família.
Ele engole em seco.
— E você sabe o que acontece com traidores — concluo. Puxando o ar de novo, forço minha
mão no seu pescoço e digo com minha voz baixa e rouca: — A questão é... vai continuar relutando
em não falar aonde está a minha encomenda?
— Mas... Travis, eu juro que... — tenta respirar — não sei.
— Como é que você não sabe? Acabei de pegá-lo na “Toca da gazela” e tenho informações
de que você vem traindo a Lawless há muito tempo por dinheiro, seu drogado de merda! Eu não sou
meu pai! — Cerro o maxilar. — Eu não vou te dar um tiro no meio da cabeça e pronto, e acabou. Vou
fazer você sofrer. Vou arrancar os seus dedos começando pelas unhas. Vou cortar lentamente cada
pedacinho, depois vou arrancar sua mão, se não me falar a verdade agora.
— Travis — interrompe-me e eu espremo meu antebraço em seu peito.
— E se você se importa com seus pais, seria bom abrir a boca.
Raul treme e seu olho bom pisca rápido. Acho que agora toquei no ponto certo. Sinto que o
fato de ele estar ficando sem ar também não faz as minhas palavras serem levianas. E todo mundo
sabe que eu não faço promessas em vão.
— Você vai abrir a boca agora?
— Travis... Não faça nada com meus pais... po-por favor. — Tenta engolir.
— Eu não vou fazer, porque não quero. — Deixo bem claro isso para ele. — Eles não têm
culpa de terem um filho traidor.
Desfaço um pouco a pressão na sua garganta para ele respirar. Preciso dele vivo nos
próximos três minutos.
— Você era um bom soldado. — Acerto um soco com toda força no seu estômago e o deixo
cair no chão. — Agora, fala onde está?
Raul tosse um pouco, cuspindo sangue e se recupera depois de tomar algumas respirações.
— Agora... só vai ter seu dinheiro. — Sua voz sai fraca.
Franzo a testa e me agacho, sentando-me em meus calcanhares e apoio os cotovelos nos
joelhos para conseguir olhá-lo nos olhos.
— Como é que é?!
— Já usaram.
Olho para o lado para não estourar os miolos dele agora.
— Usaram meio quilo de cocaína em uma noite?
Ele cochicha algo, que não entendo.
— Não ouvi!
Engole com muito esforço e levanta um pouco a cabeça para mim.
— Ele vendeu.
Figliodi una cagna!
Limpo a garganta e me levanto.
Viro-me para Paolo e, sem dizer mais nenhuma palavra, saio do quarto e os dois soldados
entram para fazer companhia a Luca. Paolo vem comigo. Eles fecham a porta, mas antes ouço o
primeiro de muitos gritos que Raul dará pela próxima hora. Não gosto que percam tanto tempo
torturando quando já tenho as informações. No corredor, dou um olhar para Enzo, que prontamente se
coloca em movimento do meu outro lado.
— Ele falou onde está?
— Produto já em uso. Nada a fazer, apenas ficar de olho no dono do “Toca da gazela”.
— Sim, senhor.
— Travis — Paolo chama minha atenção quando fala o meu nome preocupado e me direciona
um olhar nervoso.
— O que foi? — indago, entrando no elevador e abrindo meu paletó.
— O que você quer que faça com o que resta?
Meneio a cabeça, cerrando os olhos e fixo minha atenção nos números que passam no visor
do elevador.
— Eu deveria mandar um recado para os pais dele, mas... — faço uma pausa e encaro Paolo.
— Apenas se desfaça dele e dá a notícia. O pai dele era um dos melhores soldados e, portanto, não
terá retaliação por algo que não fez.
Meu consigliere assente, embora não aprovando.
— Agora vou para casa. Enzo, venha comigo.
Com um aceno, eles acatam minhas ordens. Saímos do hotel, Paolo entra em um carro, eu no
meu veículo com Enrico dirigindo e Enzo ao lado. Pego meu celular e vejo como estão meus irmãos.
Colen anda me preocupando e mandei Pietro ficar com ele, mesmo não sendo sua função como
general dos soldados. Mas eles são amigos e, antes que eu me arrependa, prefiro essa escolha. Me
preocupo que os rompantes de Colen sobre a Famiglia possa levá-lo a cometer erros que ponha ele e
a todos nós em risco, principalmente agora com o problema do desgraçado do Beluzzo com a Bratva,
e não vai demorar para eles descobrirem que a filha dele está sob minha vigília. Apenas espero que
demore. Não quero me arrepender disto também.
São duas da manhã e a única coisa que quero é a porra da minha cama. Deitar-me, fechar os
olhos e desligar a mente, embora teria adorado uma mulher em minha companhia. Mas hoje não deu,
depois que resolvemos o probleminha com Raul, fui para o Bellagio ver os balanços e aproveitei
para jogar. Fui para que, de alguma forma, salvasse a noite estressante demais. Não gosto de lidar
com traição. Façam tudo que podem contra a mim, menos trair.
Assim que o carro passa pelos portões, noto algo diferente nas luzes da casa. Provavelmente,
Marinne deve estar dando trabalho com a paranóia do medo de escuro. Esfrego minha face com a
mão aberta e mal espero o carro parar em frente às portas duplas, e saio subindo apressadamente as
escadas.
Geralmente, quando chego em casa a esta hora, estão todos dormindo. Todos que moram aqui,
a governanta, que não foi minha opção, ela fica porque não tem lugar para ficar – viúva e sem filhos
– e sempre que possível está na cozinha fazendo receitas incríveis. Rosália já me fez ganhar uns
quilos por estar frustrada e analisando a luz acesa da cozinha, acho que tem problemas no ar. E
tirando ela, tem Marie Rose, que é, para todos os fatores, a babá de Marinne. Minha irmã me dá
muita dor de cabeça porque é uma criança. Dario e Colen moram em outra casa, e agora também
mora – na verdade é mais uma hóspede – Madeleine.
Tiro e jogo o paletó no sofá maior da sala e caminho até a cozinha para tomar um pouco de
água e ver quem está por lá. Franzo as sobrancelhas vendo uma cena interessante. Comendo, não sei
o quê, assisto Madeleine apoiada na ilha do balcão da cozinha com seu lindo traseiro para o alto e os
pés mexendo ritmados. Não resta dúvida de que tem uma música em sua mente.
Ela parece que sente a minha presença e logo se vira para mim aprumando a postura. Engole
seja o que está mastigando com pressa e arregala os olhos.
— Boa noite — cumprimento cerrando os olhos para ela. — Dormir não parece uma opção.
Ela mexe os olhos e quase sorri.
Não está com medo hoje, mas curiosa e ansiosa. Acho que não deve estar acostumada a ver
um homem com a camisa suja de sangue, o coldre no peito com duas armas. Embora o pai dela tenha
sido policial, duvido muito que chegava em casa armado até as meias – duas no coldre, uma atrás no
cinto e duas facas nas panturrilhas – e todo sujo. Sem contar que aquele filho da puta não era alguém
que eu possa comparar a mim. Sei que sou um assassino, mas tenho honra em todos os meus atos.
Edgar era um viciado em prostituta, dinheiro e um poder alucinado. Ele poderia ter sido um grande
aliado a Lawless.
— Não consegue dormir? — pergunto indo até a geladeira para pegar uma garrafa de água.
— Mais ou menos isso.
Viro-me para ela tomando um grande gole d’água e deixo a garrafa no balcão para apoiar
minhas duas mãos ao lado.
— Aconteceu alguma coisa enquanto eu estive fora?
— Por que acha isso? — Eleva o queixo e vejo de relance os olhos cerrarem.
— Você não está muito feliz por estar aqui, então — deixo a frase em aberto.
— Não aconteceu nada. — Respira fundo e, comendo um pedaço de maçã, pergunta após
engolir: — Já conseguiu alguma informação sobre a minha mãe?
— Ainda não.
Sinceramente, eu não quero falar para ela que as últimas ordens foram para parar um pouco
com as procuras de Luma. Pelo menos por dois dias. Temos outros assuntos mais importantes que o
fato de ter quase certeza de que ela já está morta.
— Então... está bem. — Pega o prato, o copo e lava bem rápido.
Fico olhando, sem parar, seu corpo e a frase dela de mais cedo quase me deixa de pau duro
de novo.
— Cazzo — murmuro.
— O que disse? — pergunta quando está colocando a louça para secar.
Apenas balanço a cabeça e vou jogar a garrafa no lixo, o que me faz ficar muito perto dela.
Madeleine engole em seco e levanta bem o rosto. Nos encaramos e sou o primeiro a desviar o olhar
para a sua boca. Seus olhos me deixam desconfortável e isso não é comum para mim. Nada me deixa
dessa forma.
— Hum-hum... — limpa a garganta e recua se afastando. — Eu já vou... Vou me deitar de
novo. Boa noite.
— Boa noite. — devolvo e deixo ela e seu corpo delicioso passar por mim.
Cazzo! Cazzo! Cazzo! Ela não deveria ficar andando com essa camisola, sem roupão, pela
casa. Estou ficando louco para trepar com ela e ficar andando assim, só torna as coisas mais difíceis
de controlar meus instintos.
Apagando a luz da cozinha, dou passos largos e logo estou do seu lado. Encontro-a na escada
e Madeleine me olha pelo canto de olho, de cabeça baixa e os cabelos loiros quase brancos
disfarçam o jeito que está me olhando. Posso admitir só para mim que o meu irmão tem razão. Ela me
desperta interesse de todas as formas, principalmente o sexual. É de dar água na boca e acho que o
fato de odiar as regras da Famiglia, não acho que a mais séria ela quer fazer. Casar virgem não
parece ser algo que ela se preocupe e nem com um bom pretendente para alianças, como tem que ser
a minha futura esposa, que Paolo vive enchendo minha cabeça sobre o assunto. Merda! Um assunto
entrou em outro sem eu nem saber o porquê. Vou acabar entrando em colapso com meu consigliere.
Chegando ao corredor do segundo andar, continuamos a andar lado a lado e, quando
chegamos à porta do seu quarto, escuto-a suspirar alto antes de entrar.
Desligando o despertador do meu celular, jogo-o para longe pelas cobertas da cama e fecho
os olhos. Não quero sair daqui. Estou irritada, entediada e puta da vida. Sinto falta de fazer as
minhas coisas: sair, ver minhas amigas e ter minhas coisas. Travis me trancou na sua fortaleza de
marfim e não se deu o trabalho de perguntar se preciso de algo. Ele pode achar que está fazendo um
favor para mim, mas no fundo está me sufocando.
Também tem o fato dele despertar um desejo louco dentro de mim. Ontem fechei a porta
quase batendo na sua cara e, por pouco, não corri pelo corredor, fugindo do seu calor.
Detesto me sentir atraída por Travis Lozartan. Ele é um assassino, um criminoso e não meu
herói. Estou aqui apenas por causa de um acordo de anos atrás e, embora eu tenha pedido ajuda, não
quis ser sua prisioneira. A “obrigação” de honra dele era cuidar, não virar meu novo pai.
Argh! Como eu posso achar atraente a camisa suja de sangue dele e suas armas? Ele deveria
ter a decência de trocar a camisa antes de aparecer assim. Ou não. Acho que o objetivo é impor o seu
poder e o medo também sobre todos.
— Acho que preciso colocar meus direitos na mesa.
Levanto-me jogando as cobertas para o lado e, decidida, vou até o banheiro tomar um banho
refrescante. Preciso de muita força de vontade para falar com Travis. Aquele homem parece sugar
toda a energia do ambiente e de quem está em sua volta.

Sorrio me olhando no espelho e satisfeita com o impacto que terei sobre Travis. Eu não sou o
tipo de mulher que é acanhada e tem vergonha de usar a sedução quando é preciso. Claro que tudo
sob medida e esse vestido causará um forte apelo para as minhas palavras. Tenho uma sombra de
certeza de que Travis me enxerga como uma criança ainda, mas esse decote, essa saia curta e a cor
vermelho-sangue desse vestido não vai deixar mais nenhuma dúvida de que sou uma mulher adulta.
Passando mais uma vez a escova nos meus cabelos, retoco o batom vermelho, da mesma cor
do vestido, e me levanto da penteadeira.
Sei o que eu quero, mas não sei exatamente como dizer para ele. Não acho que Travis vai me
impedir de sair ou fazer algo que quero, no entanto ele pode tranquilamente desistir de querer me
proteger. Que deve ser o que passa na cabeça dele, na minha ele está me trancafiando, isso sim. Há
três dias presa nessa casa gigante e vazia.
Dio santo! Ando muito confusa depois de tudo que aconteceu: voltar para Las Vegas; ter meu
pai enchendo meu saco; minha mãe ainda pirando nos vícios de jogos, e logo depois ser perseguida;
saber que meu pai morreu. Merda mil vezes!
Agora a única coisa que eu quero saber é sobre a minha mãe. Será que ela ainda está viva?
Por que aqueles homens precisaram levá-la? E por que mataram o meu pai? Edgar Beluzzo sempre
teve acordos com as outras organizações, então por que agora eles decidiram matá-lo? O que ele fez
de errado? Qual foi a grande burrada que aquele imbecil fez e por que eles querem a mim também?
São tantas perguntas girando sobre meus pais e esse mundo insano que eles não só fazem
parte como se lambuzam na sujeira.
Talvez minha mãe tenha feito alguma aposta e nem meu pai pôde intervir. Ou meu pai tenha
traído eles. Argh! Infelizmente, eu tive o desprazer de ser filha desses dois viciados, interesseiros e
desumanos, mas nada posso fazer sobre isso.
Só posso cuidar do que controlo e, com o acordo com Travis, vou ficar sob sua proteção até
tudo se ajeitar ou, pelo menos, eu poder sair de Las Vegas, ou até mesmo dos Estados Unidos. E
pensando melhor, ainda não fiz isso porque ele parece não querer. Travis me quer por perto. Ele
pode me dar informação comigo na Itália. Meus avós maternos moram em uma antiga província em
Roma. Então eu tenho onde ficar e um grande refúgio protegido e seguro. Então vem o
questionamento: Por que Travis me quer aqui? Não consigo entender.
Pegando meu celular, saio do quarto fechando a porta. Caminhando pelo corredor, acho
estranho não escutar nenhum barulho que me dê algum sinal de que já tem alguém acordado; embora,
pela manhã, eu apenas veja todos os dias os homens dele e os empregados pela casa, menos ele. O
cara é noturno. Mas hoje não escuto nenhum som que confirma uma alma por aqui. Confiro no relógio
do celular as horas e já passa das oito da manhã. Hum... Tem algo muito estranho acontecendo por
aqui hoje. Será?!
Termino de descer as escadas e olho de um lado para o outro procurando os homens de
Travis. Sempre tem um parado na porta. Não entendo o porquê. Será que é medo de eu fugir ou... tem
mais alguém aqui que precisa ser vigiado. O irmão dele não parece ser “quieto”. Bem, às vezes estão
tomando conta mesmo da casa. Todo chefão tem muitos inimigos e basicamente todos os magnatas,
poderosos e criminosos de Las Vegas querem o pescoço de um dos Lozartan. Prova disso foi o
assassinato de Vincenzo Segundo.
Chegando à sala de jantar, onde é servido o café da manhã, surpreendo-me vendo uma
garotinha de cabelos compridos e castanhos, tomando café sentada à cabeceira da mesa, onde o
Travis geralmente se senta.
Ela está comendo cereal em uma vasilha rosa com purpurina e muito brilhosa, do lado um
prato com mamão, morangos e banana picados, que ela decide o que vai comer às cegas porque seus
olhos estão vidrados no iPad, que com certeza passa algum desenho animado pelas vozes engraçadas
e o riso constante em seu rosto.
— Bom dia — digo para puxar assunto e chamar sua atenção para mim.
Quando seus olhos enormes e azuis registram minha presença, um estalar acontece na minha
cabeça. Travis tem uma filha e eu não estou sabendo disso?
Ela é séria e muito expressiva. Não parece gostar da minha presença. Ergue as sobrancelhas,
mexe na franjinha e desvia o olhar.
— Bom dia. — simplesmente devolve a saudação, com a atenção para o seu desenho.
Eu não tenho muito tempo para reagir a sua presença e pouca simpatia, pois Rosália chega me
cumprimentando com um sorriso e perguntando o que eu quero para comer.
— É... — Dou de ombros. — Eu como o que tiver na mesa. Não se preocupe — respondo um
pouco perdida e distraída porque meus olhos não conseguem se livrar da menina. Ela é tão linda e
impactante quanto Travis.
— Essa é a senhorita Marinne, irmã do senhor Travis — Rosália esclarece, matando minha
curiosidade e pergunta silenciosa.
Franzo a testa e digo em voz baixa para Rosália:
— Travis tem uma irmã pequena? Hum...
— Eu não sou tão pequena assim. — A menina levanta o rosto e me encara sem muita
simpatia. — Eu tenho quatorze anos. Não sou nenhuma criança e, se você está aqui, deveria saber um
pouco mais sobre a família do Sr. Lozartan. E você, quem é? — Ergue o queixo em desafio.
O gênio é do irmão.
— Não sabe quem eu sou?
— Da mesma forma que você não sabia quem eu era.
Resposta na ponta da língua. Eita!
— Deve ser uma das hooker que o Travis traz para casa. — fala isso passando os olhos pelo
meu vestido de cima a baixo e fazendo uma cara de desdém.
Ela acabou de me chamar de puta?! Que menina atrevida.
— Eu já falei para ele não ficar trazendo qualquer uma pra cá, que ele acha por aí e...
— Marinne! — A voz ecoa pelo ambiente e todas nós congelamos no lugar. — Olha a sua
boca, menina! E peça desculpas a Madeleine. Ela não é nada disso que você está falando.
Viro-me e dou de cara com o todo-poderoso preparado para mais um dia do seu trabalho tão
glorioso, para ele se dar o trabalho de se vestir como se fosse um magnata poderoso: calça social
preta, cinto marrom, camisa de linho branca, passada e dobrada ¾, colete azul-escuro, que fazem
seus olhos sobressair as cores das íris, e por cima o coldre auxiliar com as armas, uma de cada lado
do peito. Só consigo pensar: O Capo. Seus cabelos estão penteados, tocando de leve o colarinho, a
barba feita e o perfume que chega até a mim.
Mio Dio! Maledetto!
Consigo catalogar cada coisa que faz esse homem ser perfeito, mas imediatamente meu
cérebro dá um choque de alerta. O sinal bem vermelhão soando: “Ele é um assassino! Para de
cobiçar esse corpo. Isso não vai acontecer”.
— Bom dia... Madeleine — diz com sua voz inquisitória, pois seus olhos passam lentamente
por meu corpo e chegam aos meus olhos como uma flecha.
Engulo em seco e devolvo:
— Bom dia.
Ele cerra os olhos para mim, faz um som com a garganta e meneia a cabeça antes de se mover
até a outra cadeira, que fica à cabeceira, e se sentar. Olha para mim fixamente e posso ler sua ordem:
senta!
Como eu não vi sua irmã antes? É a pergunta que eu faço sentando-me no meu lugar. Entre
todas as cadeiras.
Em três dias, e um ar de persuasão, e por costume meu, Rosália já tinha preparado o lugar
entre as cinco cadeiras que ficam de frente para o arco que dá passagem para a sala de estar.
Sério, para que uma mesa tão grande, com doze lugares, se nunca vi ninguém aqui? Por acaso,
Travis faz algum jantar de negócios? Quantos irmãos ele tem? Porque que eu não paro de pensar
nisso?
— Marinne, você pode, por favor, comer sua comida e largar o desenho? — ele fala,
capturando minha atenção para o presente. — Só por um minuto?!
— Você pode largar do meu pé?
Ele dá um soco na mesa, assustando a irmã, e eu também, e esbraveja:
— Não fala assim comigo, ragazza testarda. Tenha respeito.
Meus olhos vão de um para o outro e percebo como ela tem medo dele. Não como eu tenho
ou ninguém de Las Vegas, mas como seu irmão mais velho. Minha nossa! Ele tem mais do que o
dobro da idade dela. Sério, Marinne deveria ficar mais quieta (eu também) na presença dele. Se eu
não me engano, Travis é vinte anos mais velho do que ela. Tem idade de ser seu pai. Como deve ter
sido essa criação? Será que ele é bom para ela?
— Me desculpe — ela fala solene. — É que o... episódio é novo e eu...
Ele solta a respiração bem lentamente enquanto coloca a xícara de volta sobre o pires. Ergue
a sobrancelha bem de leve como não se importasse com o que ela vai falar e que a ordem dele é mais
importante do que o desejo dela. Parece o jeito que ele fala comigo e eu não gosto disso.
— Me desculpa, Travis. Eu vou terminar de comer e me preparar pra ir.
Ele dá um aceno de cabeça e continua a comer antes de olhar para mim se demorando por
longos segundos. Sou eu a primeira a cortar o contato. Não quero ficar olhando para ele. Sinto um
frio na barriga, que vai da espinha até o dedinho mindinho do pé e volta até o último fio de cabelo.
Sugador de energia.
— Bom dia, pirralha.
Levanto o rosto para registrar um homem chegando. Esqueci o nome dele. Ele senta-se do
outro lado da mesa, de frente para mim e cheio de humor. Ele é sorridente.
— Já falei para não ficar falando assim comigo na frente de estranhos.
Travis solta um som com a garganta chamando atenção da irmã silenciosamente. Ele
realmente não gosta do jeito que ela fala com os outros. Isso mostra o novo caráter de Travis
Lozartan. O pai educador severo? Acho fofinho. Os inimigos dele não iriam gostar disso e é por isso
que ele é tão mau com todos, menos com seus irmãos. Eu percebi como ele interage com Colen, o
irmão que me resgatou junto com ele da boate. E até mesmo com seus homens e Rosália.
Limpo a garganta, chamando atenção de todos e encaro Travis.
— Eu... — murmuro. — Nós podemos falar depois?
— Podemos, sem problema — responde curto e grosso.
— Ok — digo assentindo e me concentro em tomar meu café e ocupar minha boca. A mente
pode ser o que eu quiser, o problema é deixar minha língua solta. Eu falo muito quando estou nervosa
ou ansiosa.

Bato o pé impaciente, esperando a liberação para entrar na sala de Travis. É muita


palhaçada mesmo isso, viu? Ele já sabe que eu quero falar com ele e fica esses dois abutres me
impedindo por quê?! Que idiotas!
Dou um olhar zangado para o que aprendi o nome hoje, Enzo. Ele é o capitão dos soldados de
Travis, e mesmo com este posto tem um sorriso aberto e constante. Alto, mulato da cor de um
chocolate e preciso confessar, ele é muito lindo. Os olhos são negros e o terno preto com a camisa
cinza, transforma-o em uma beleza perigosa.
Enzo aperta os olhos quando volta a me encarar, assim que o soldadinho se afasta para ir não
sei onde.
— Será que eu posso entrar agora? — questiono empertigando a postura e sem o mínimo
respeito pela minha vida.
Mal pergunto e Paolo, que não sai de perto de Travis (e que parece não ir com a minha cara),
surge ainda mais sério vindo de dentro da sala. Tenho uma vontade louca de perguntar qual o
problema dele comigo, mas não sou tão corajosa assim.
— Pode entrar — responde com a voz grave.
Estufo o peito de ar e passo por eles sem dizer nada.
Logo que meus pés estão dentro da sala, a porta se fecha com uma pancada forte que me
assusta. Engulo em seco e observo o ambiente. É um escritório consideravelmente grande e com
muitos livros; um bar no canto, com garrafas numa bandeja de espelhos e mais algumas em uma
geladeira com portas de vidros; um sofá de couro de três lugares e mais duas poltronas, com uma
mesa de centro no meio com um jogo de tabuleiro. Mas o que se destaca é que a mesa de madeira
marrom clássica, parece aquelas mesas de filmes de presidente. É linda e o homem por trás dela, na
sua cadeira giratória de couro e rodinhas, faz tudo isso aqui exalar poder.
Travis cerra os olhos com curiosidade e esperando que eu diga algo.
— Então? — Mas não espera e faz o contato.
— Eu quero sair.
Ele pisca bem devagar e relaxa o corpo na cadeira fazendo-a reclinar para trás, e deixa os
braços apoiados nos braços da cadeira. Puxa o ar, um tanto audível, e fica me olhando sem
expressão. Isso me dá agonia. Esse silêncio tão “alto”.
— Seja mais específica.
Agora eu respiro fundo e me aproximo com passos lentos até estar entre as duas cadeiras em
frente a sua mesa chique.
— Eu quero ir lá fora. Quero ver minha amiga Bárbara e pegar algumas coisas no meu
apartamento.
— Você não me disse que tinha um apartamento.
— Estranho é você não saber.
Fita-me com ar de interrogação.
— Você deveria saber sobre tudo e sobre todos. E não saber que eu não moro mais na casa
dos meus pais, é uma delas.
— Eu não acho que é tão importante assim eu saber que você não mora com eles — diz com
desdém.
— Eu acho que é relevante, sim. Principalmente porque parece que você sabe de tudo e
deixou escapar essa informação tão importante assim de graça. Onde eu moro de verdade.
— Olha — ele passa a mão no rosto —, vamos encerrar esse assunto. Me diz logo o que
você quer.
— Já disse o que eu quero. Acabei de falar! — Sei que estou bancando uma criança mimada,
mas ele está me irritando. — Eu quero sair. Quero ver minha amiga e ir ao meu apartamento pegar
minhas coisas e talvez voltar para cá.
— Talvez voltar para cá? — Ele se levanta junto com sua voz brava. — Foi você que veio
pedir ajuda. Foi você que bateu na minha porta desesperada.
— E foi você que me ofereceu para ficar na sua casa, como alternativa para eu continuar viva
— interrompo-o.
— E você acha isso errado? Você acha isso ruim? Eu não tenho obrigação nenhuma com
você, apenas assumi as palavras do meu pai quando prometeu que cuidaria de você se pedisse ajuda
e nada mais.
— E sua ideia de ajuda é me trancar na sua casa?
— Me diz o que seria melhor?
— Me coloca em um dos seus hotéis. Eu não me incomodo. Eu não quero mais ficar aqui.
— Se eu colocar você lá, vai correr um risco desnecessário. No entanto, se é assim que está
querendo.
— Não é assim que eu estou querendo, porém eu... — respiro fundo — estou me sentindo tão
trancafiada e sufocada. Parece que não estou com medo, só que não é verdade, mas eu não quero
deixá-los decidirem o que devo fazer e nem você.
— Se você quiser, sai. Quer ir onde?
— Aonde eu quiser.
Travis trava a mandíbula fazendo um biquinho de raiva.
— Cazzo. Quer saber, vai para o quinto dos infernos, mas... — ele contorna a mesa até estar
na minha frente obrigando-me a levantar meu rosto para conseguir encará-lo — se acontecer qualquer
coisa com você, a responsabilidade é sua. O problema é seu. Não tenho nada a ver com isso. Você
não é minha irmã, não é minha filha, não é minha esposa, então eu não tenho realmente necessidade
de me preocupar com a sua vida. Você não é da minha família.
— Por que com você é sempre assim?
Ele me encara por longos minutos.
— Eu estou jogando em pratos limpos com você, Madeleine. Mas você quer dificultar as
coisas mais ainda, ragazza. Estou dando uma alternativa de cuidar de você, por enquanto, e você
quer sair, porra! — esbraveja levando as mãos para o alto, dando-me as costas e indo até o bar.
Ele resmunga alguma coisa em italiano enquanto serve-se de uísque até a boca do copo, que
logo toma em uma golada quase esvaziando.
Fico esperando que diga mais alguma coisa e nada acontece em cinco minutos. Bem, acho
que ele desistiu de mim e seu silêncio é carta branca para eu ir embora. Eu tenho muita vergonha na
cara e, portanto, me encaminho para a porta e óbvio, que para fora dessa casa.
— Onde você está indo?
Viro-me com a mão na maçaneta e o encaro. Travis larga o copo no balcão do bar e vem até a
mim. Seus olhos parecem a visão de um oceano revoltado em meio a uma tempestade de um céu
escuro. Ficamos muito perto um do outro e meu coração acelera de tal forma, como se eu tivesse um
motor no peito.
— Estou indo embora — falo baixo. — Acho que já conversamos o suficiente.
— Não.
— Você me deu as costas.
— Cazzo, Madeleine! — esbraveja nervoso. — Eu estava pensando e...
— E?
— Se você quiser sair, saia, mas o Enzo irá com você.
— Nem pensar! — Afasto-me dele e ando até o meio do escritório e viro-me para ele em um
movimento rápido, colocando as mãos na cintura. — Eu não vou mesmo ficar sendo seguida por um
dos seus homens.
Travis inspira profundamente com lentidão e solta o ar erguendo as sobrancelhas para mim,
visivelmente tomado pela ira, mas quando fala se controla. Acho que ele contou até dez nessa
respiração.
— Você que sabe. — Enfia as mãos nos bolsos da calça. — Quer ir, vá. Não vou mais me
meter.
— Já sei — murmuro e caminho até a porta, agora decidida. — Não sou problema seu.
Deixo minha frase rebelde passando por ele, e fechando a porta o flagro virando-se e
olhando para mim.
— Ah, dane-se! — digo em voz alta encarando o corredor do seu “palácio”.
Enzo, que ainda está vigiando a porta, agora sentado em um sofá sem encosto, levanta-se
olhando para mim, mas se detém para falar algo quando atende seu telefone. Mas não me interessa
nada sobre ele e nem sobre Travis. Dou-lhe as costas indo para as portas da saída. Ninguém vai me
deter de sair daqui. Não mesmo!
No quarto onde estão minhas coisas, troco esse vestido ridículo, que não pareceu abalar
Travis em nada, por uma calça jeans e uma camisa simples. Visto uma jaqueta, pego minha bolsa e,
saindo do quarto, ligo para Bárbara.
— Made! Até que enfim você me ligou!
— Desculpe não ligar antes, mas agora preciso que você me ajude. — falo descendo as
escadas, e ao terminar de descer dou de cara com Travis saindo do seu escritório, que é de frente
para as escadas.
De novo temos a dinâmica de ficar nos encarando sem dizer nada, contudo, dessa vez eu
escolho ignorá-lo e vou direto para as portas dizendo bem alto:
— Vem me buscar, por favor. Agora!

Logo que saio pelos portões da casa de Travis, sinto uma sensação estranha. Pensei que ele
não iria ceder, mas agora já faz duas horas que não estou mais sob seu domínio. Encarando minhas
roupas penduradas no meu guarda-roupa, com as mãos na cintura, puxo o ar com força.
Sei que estou bancando uma idiota, porém eu pensei que ele fosse lutar mais por mim. Como
estive enganada. É, ninguém nunca realmente se dá o trabalho por mim ou pelo que eu quero. Céus!
Nem meu pai fez, quem dirá o Capo, que tem apenas um dever “significativo” comigo e o simples
dever de honrar a promessa do pai. Travis não liga para mim de verdade.
Minha cabeça está um turbilhão de pensamentos. Eu só queria voltar para o que eu era antes
de voltar para Las Vegas.
Embora tenha ficado muito triste de ter sido mandado embora, sentindo-me rejeitada e
renegada pelos meus pais, agora a única coisa que eu queria era ir embora. Talvez eu faça isso. Vou
para Cecília, para a casa dos meus avós. Lá é seguro e vou ter pelo menos um pouco de amor.
— Ei, Made. Qual o problema? — Bárbara entra no meu quarto e joga-se em minha cama.
— Não tem problema nenhum — respondo de costas para ela, mexendo nos vestidos de noite.
Não sei o que tem na minha cabeça. Me sinto fora de mim.
— Claro que tem. — A voz dela me desperta.
Viro-me e a encaro de longe.
— Até agora você não me explicou o que estava fazendo na casa do Capo.
Odeio que ela também faça parte da Cosa Nostra. Seria mais fácil se fosse uma amiga
qualquer, mas as limitações da Famiglia não permitem se envolver tanto com o mundo externo,
principalmente quando seus pais são de dentro. Eu tenho amigos de “fora” e se Bárbara fosse um
deles, eu podia mentir para ela dizendo que Travis é qualquer coisa e não o chefe da organização
criminosa. Ele poderia ser apenas um magnata ricaço e poderoso de Las Vegas.
Mas não, ela sabe quem ele é muito bem e tem o mesmo tipo de respeito que todos têm, que
eu nunca tive e por isso talvez ele não ligue para mim. Ele sabe que eu não gosto do que representa.
Embora eu tenha o conhecido um pouquinho melhor nesses últimos dias, ainda não consigo parar de
julgá-lo. No entanto, reconheço que Travis tem um bom coração com as pessoas que ele (pelo menos)
tem consideração. Acho que no fundo não gosta de ninguém e só mataria metade de Las Vegas se
acontecesse algo com um dos seus irmãos. Fora isso,ele não liga para ninguém.
— Eu só... estava lá porque... sabe aquela noite na boate?
— Claro que sei. Fiquei nervosa pra caralho.
Reviro os olhos com o jeito dela de falar.
— Então, não sei o que houve e depois meu pai morreu e... O que eu fiz, anos atrás quando
meu pai quase acabou com todos nós. Sabe o que é?!
— É claro que eu sei! — diz com nojo. — Por isso que eu odeio seu pai e não sinto nada
pela morte dele. Foi mau. — Engole em seco e tenta se desculpar. — Mas ele era horrível. Um filho
da... — Pausa e se corrige. — Um homem extremamente ganancioso.
— Não precisa usar palavras bonitas perto de mim, Bárbara. Eu sei que meu pai era um filho
da puta e mereceu a morte, que provavelmente deve ter sido uma tortura.
— U-hum — Bárbara resmunga e morde os lábios, cerrando os olhos para mim. — Agora
você vai me explicar a verdade? Eu não acho que você foi até o Capo apenas por isso.
— Mas foi! Não tenho nada a ver com Travis e os Lozartan. Fui lá para pedir ajuda.
Levanta-se rápido e pega minhas mãos.
— Você está com medo de que eles vão pegar você também?
— Eles pegaram a minha mãe e quase... — Solto a respiração. — Eu fiquei sim com muito
medo deles me matarem.
— E é só isso que você vai me falar? Eu sou sua melhor amiga e você deveria contar tudo
para mim.
— Você me conta tudo?
— Absolutamente tudo. Não tenho nenhum segredo com você. — Ela foi tão honesta agora
que me senti mal.
— Sério, nunca? — Tento ser engraçada. — Nem quando eu fui para longe?
— Para com isso, Made. — Se afasta de mim, dá um giro no lugar, agitada como sempre e se
vira olhando-me séria. — A gente se ligava todos os dias e eu sempre contei tudo sobre mim, e você
também contava. Então, por que está relutante em me dizer tudo? Mesmo longe de mim, sempre tentei
te ajudar.
Sentindo-me derrotada pelos seus argumentos, vou me sentar na minha cama. Bárbara se
senta ao meu lado e eu desabafo. Conto o que houve quando levaram minha mãe, o que Travis fez
para mim na boate e na sua casa. Como ele era com o pessoal da sua casa.
— O QUÊ? — Ela se levanta quando escuta tudo e ignoro.
— Eu pensei que, pelo que eu fiz naquela época, o Travis pudesse... Sei lá. Ter um tipo de...
— Sentimento por você?
Levanto o rosto e fito seus olhos verdes.
— Não! Eu acho que... eu não sei. Talvez ele poderia ter tido um pouco mais de
consideração. Paciência comigo. Eu só queria te ver e pegar minhas coisas.
— Mas o que exatamente você disse para ele?
Fito o tapete de frufru em frente ao meu guarda-roupa e sou obrigada a contar com todos os
detalhes a última conversa com Travis.
— Porra, Madeleine! — Ela parece furiosa colocando as mãos na cintura e me encarando
brava. — Você disse para ele que “talvez ia voltar”? Qual o seu problema? Metade da Cosa Nostra
queria ser protegido pelo Travis e ele faz isso por você, abrindo uma exceção e você fala isso para
ele?! Sinceramente, eu também iria ignorar você e foda-se se a Bratva te matasse. Dio mio,
Madeleine!
Sentindo-me derrotada, deixo meus ombros caírem e escondo meu rosto entre as mãos.
— Você sabe que eu nunca gostei da máfia.
— Eu também não gosto.
Olho para ela quando diz isso com tanta ênfase.
— Não gosto do fato da gente ser tão imposta às regras dos homens e colocadas de lado. Não
temos direito de nada a não ser servir, casar e dar filhos, ficando calada sempre, mas... eu não posso
mudar quem sou e de onde eu nasci, posso apenas querer o melhor que essa vida consegue me dar.
Me adaptar e viver bem. — Dá de ombros. — E o meu pai é um soldado do Travis e nunca reclamou
dele nesse pouco tempo que ele está no comando.
Assinto, ouvindo-a.
— Papai falou que ele sempre foi o melhor dos filhos e que seria um Capo excelente. E eu
sei que a excelência de um Capo é ele ser mau e violento. Os seus inimigos o temerem, então
consequentemente ele tem que ser um assassino, o que nós duas não concordamos, mas Madeleine —
se aproxima e senta-se ao meu lado de novo — eu queria ser protegida por ele, por seus mil
soldados em minha volta, para nada me acontecer, do que morrer e ter medo. Eu sei que não é vida. É
perder a liberdade, só que... pelo menos eu estaria viva. Faria tudo o que eu quisesse na medida do
possível sem ficar com medo de olhar para o lado, e seria por enquanto.
— Não sei — murmuro.
— É claro que sim. Você acha que Travis não está investigando o que o seu pai fez de tão
ruim para a Bratva decidir matá-lo e, ainda por cima, ir atrás do Travis? Não acha que é mais válido
estar com ele do que ficar aqui correndo risco de morte. Você não acha que poderia ceder só um
pouquinho?
Engulo a vontade de gritar e aperto o casaco que estou vestindo em minha volta.
— Eu não consigo te entender, Made. Você está triste porque ele não veio atrás de você? Está
zangada porque ele não liga para você? Eu também não ligaria.
Franzo a testa e a fito.
— Quê?
— Made, ele abriu mão da casa dele, que é seu santuário. Abriu mão do sigilo e da segurança
dos seus irmãos, e de tanta coisa para honrar o crápula do pai dele e você diz que quer sair e que
talvez vai voltar. Me desculpa, amiga, eu amo você como se fosse minha irmã, mas é imperdoável o
que você fez.
— Eu...
— Madeleine, você sabe que todos nós fomos criados com honra. Eu sei que é um mundo
sem fim e feio, mas nós temos um pouco de liberdade. Mas imagina Travis e os irmãos dele que tudo
que fazem é por aliança. Todo movimento tem que ser na medida do possível para a Cosa Nostra não
perder nenhum território. Pensa um pouquinho, Made.
— Odeio que você seja a voz da razão e sempre foi. — Sorrio para ela e aceito seu abraço
quando se aproxima.
— Por favor, aceita a ajuda dele. Fica lá um pouquinho e... — Se afasta para me encarar. —
Eu tenho certeza de que ele não vai te impedir de ligar para mim e eu posso pedir ao meu pai para
implorar para eu poder te ver de vez em quando. Mas eu quero você viva, amiga. Esse sacrifício no
momento é válido, então faça, Madeleine.
— Eu sei, mas hoje eu só quero curtir o dia com você. Amanhã eu volto.
— Está bom — diz sorrindo, dá um nó nos seus cabelos e se levanta indo até meu banheiro.
— Vou tomar um banho e aí a gente pode ir almoçar no restaurante que tem lá no Bellagio. Lá é
incrível.
— Por que você quer ir logo no Bellagio? Você sabe que o Travis é dono de lá?
— Claro que eu sei. Meu pai é um dos soldados dele, dã!
Ela aparece na porta apenas de calcinha, sutiã e a touca de banho nos cabelos. Acho que ela
os escovou ontem. As mechas ruivas vivas vão até sua bunda, estão lisos ao invés de cacheados.
— Sei muitas coisas e não porque meu pai fala. Acho que Travis arrancaria a cabeça dele.
Enfim, sei por que sou bisbilhoteira e fico, às vezes, atrás da porta quando meu pai está falando com
alguém importante no escritório.
— Isso é muito feio. Você não deveria sentir orgulho disso.
Ela solta uma gargalhada.
— Ah, para com isso. Você fez a mesma coisa, mocinha! — ela grita do banheiro. — Ou se
esqueceu como descobriu que seu pai ia fazer aquela merda? Que eu me lembre foi porque você
estava atrás da porta ouvindo a conversa.
Essa memória me faz rir e, ao mesmo tempo, me dá um aperto no coração. Se eu
simplesmente aceitasse onde eu nasci, que Travis não tem tanta culpa assim de quem ele é, seria mais
fácil para todos. Fomos fadados a esse mundo quando nascemos de quem nascemos. A vida parece
ter imprevistos, mas no fundo nada é por acaso. Doa a quem doer.
Bárbara tem razão em tudo e, principalmente, na excelência dele. Eu não tenho medo de
Travis e nem das suas ações, pelo menos comigo, mas morro de medo de algo realmente sair do
controle e ele não ter escolha. Não quero culpa na minha consciência de nenhuma forma e, Dio mio,
eu não posso negar que me sinto atraída por ele de uma forma estranha. Se eu voltar, vou ter que
controlar a língua e todas as minhas vontades perto dele.
Sei que a minha vida não era para ser fácil. Eu sei disso desde que sou criança. Porra, eu
nunca pude fazer nada que realmente queria. Sempre fiz tudo sob medida e premeditado. E depois de
virar Capo, a tendência foi piorar, aumentando as regras e cuidado com meus passos. Já acordo com
bombas sendo jogadas sobre mim e a melhor parte dos meus dias é quando vou dormir.
Não estou reclamando do que faço ou do que sou, eu gosto desse poder e de tudo que essa
vida me dá, no entanto, os meus sonos eu prezo demais. E fora, que eu não penso em morte e
vingança vinte e quatro horas. Não quando eu não quero. Vingar-me é honrar a minha palavra e os
meus negócios. Gosto de me vingar porque odeio, com todas as minhas forças, traidores,
aproveitadores e oportunistas. Eu realmente não gosto de pessoas que não precisam de mim.
E agora o que meu mais prezo como minha “paz” está sendo bagunçado. Estou com
pensamentos confusos e dispersos, no meu momento de descanso, deitado na cama sem poder fugir
daquela maledetta. Oh, mulherzinha! Mesmo que eu force minha mente para parar, com toda a força,
aquela praga de italiana não some dos meus pensamentos. Que inferno!
Desisto de dormir e me levanto. Prontifico-me imediatamente de entrar debaixo do chuveiro
sem ao menos esperar a água esquentar. De alguma forma, eu preciso esquecê-la. Madeleine fez sua
escolha quando foi embora.
Com a toalha enrolada na cintura, vou até meu closet e me visto para ir até a academia, que
fica do outro lado da quadra e a piscina. Calço o tênis e logo estou saindo e descendo as escadas.
Não tem ninguém acordado pela casa, pois são quase duas da manhã.
Estou saindo pelas portas dos fundos da cozinha, tentando ao máximo ser discreto, quando
sinto meu celular tocar e o pego com raiva. Não estou com a mínima paciência para resolver
problemas e esse número só toca para isso.
— Fala logo o que é porque eu não estou nem um pouco paciente.
— Estão atrás dela.
Solto a respiração com força e fecho os olhos com a fala de Luca.
— Explica melhor isso, porra!
— Paolo disse que Madeleine está no MGM e que tem uma confusão acontecendo. Acha
que estão atrás dela.
— Cazzo. Eu vou acabar mesmo trancando ela numa jaula. — Arrependo-me assim que me
dou conta de que falei em voz alta. — Tente intervi-la, que eu já estou chegando — digo já em
movimento para o meu quarto para trocar de roupa.
— Intervir?
Às vezes me pergunto qual nível de escolaridade meus soldados têm para não entender uma
palavra tão simples. Que merda!
— Fica de olho nela, porra. Não permita que ela saia daí, ou melhor, se conseguir, leve para
um dos quartos ou para a sala de interrogatório.
— Acho muito difícil — ele resmunga e eu solto a respiração, pensando que ele tem muita
sorte de eu estar a quilômetros de distância, senão ele iria levar um soco na boca do estômago. Luca
é um soldado legal, mas sua boca poderia ser mais controlada. Puta que pariu!
Desligo a ligação assim que entro no quarto e jogo o aparelho na cama. Troco de roupa tão
rápido, deixando a roupa de correr sobre a calça e a camisa social. Coloco meu coldre, um casaco
grosso e pego meu celular descendo, indicando-me para o carro, que Pietro já estava me esperando
dentro.
— Vá o mais rápido que você puder — peço com a voz sintética.

Geralmente numa situação como esta, o método é totalmente diferente. Se fosse em outro
caso, outra pessoa, Madeleine já estaria dentro de uma sala esperando eu chegar para termos uma
“conversinha”. Essas salas são preparadas para jogadores que trapaceiam – às vezes, na cara de pau;
outras tão excelentes que não os puno, apenas advirto.
A maior parte da riqueza da minha família vem dos cassinos, que por sua vez traz os hotéis e
resorts, apesar de pensarem que ganhamos dinheiro por extorsão de estabelecimentos e outros
métodos que a Bratva e outras organizações fazem e, claro, o contrabando de drogas e produtos fora
da alfandega. A Lawless tem como – posso nominar de – método o “jogo” limpo com nossos hotéis e
estabelecimentos fiscalizados e organizados. Não toleramos trapaça e francamente, todos os cassinos
são colheitas de máfias disfarçadas.
Quando eu consegui – finalmente – o maior de todos em um jogo de azar além do limite, a
Lawless dominou as três grandes potências dos hotéis cassino de Las Vegas, mas esse peso quem
carregou e carrega sou eu. Meu pai gostava de se envolver com o lado obscuro e que por nossas leis
era preciso fazer e vigiar. E depois que ganhou maturidade, deixou para mim o lado limpo e mais
profissional, que agora tenho poder para os dois.
Todos os dias eu sei de tudo que se passa em Las Vegas, sobre os estabelecimentos, as
drogas, movimentos das outras organizações – principalmente a Bratva – e outros assuntos que
apenas o Capo pode decidir; e, quando finalizo meus deveres no submundo, vou ao Bellagio, checo
as informações dos ganhos e perdas dos três cassinos, já que o cofre geral fica no mesmo.
As raras vezes que vou aos outros hotéis e cassinos, é apenas por algum problema grave. E é
por isso que todos os olhares estão em mim ao passar pelas portas do MGM. Sinto as entranhas deles
se contorcerem por medo. A pergunta de um milhão de dólares: “O que fizemos agora?”
Dando um aceno de cabeça para Bruce, gerente do hotel, continuo o meu caminho para a
boate.
— Onde falaram que ela está? — indago assim que vejo Luca surgir na minha frente.
— Ela sumiu das nossas vistas.
— O quê? — Passo a mão na cara e solto a respiração. — Cazzo. Vocês são uns inúteis.
— Senhor, a festa estava lotada e, quando ela nos viu, parecia assustada.
Fecho os olhos, exasperado.
— É claro. Eu falei para ficar de olho nela com discrição e fizeram totalmente ao contrário.
Agora temos que resolver mais esse problema.
Luca assente e Enzo faz uma careta de irritação.
— Agora chega de conversa. Encontrem e a levem para a sala. Não faça nenhuma merda
dessa vez, porque não...
— Senhor — Paolo me interrompe parando ao meu lado.
Cerro os olhos, encarando-o e esperando o que precisa dizer.
— Ela está nas máquinas de caça-níquel. Ryan está com ela.
— Ótimo — digo colando-me em movimento. — Peça para não espantá-la e diz que já estou
indo. Não vou ficar correndo trás dela como um cão caçador. Eu nem era para estar aqui, merda!
Aperto o passo e atravesso o hotel rapidamente. Quando chego na parte do cassino e vou até
as máquinas, logo vejo Ryan perto de uma mulher morena jogando em uma das máquinas. Confuso,
aproximo-me ficando atrás dela e ele faz um sinal de que ela é quem eu procuro. Ela pintou a merda
dos cabelos. Não sei se foi para nos confundir ou quem está atrás dela, apenas sei que não funcionou
para nenhum dos casos. Cerro os punhos, irritado. Mulher teimosa!
Indo para o canto vazio de onde está sentada, faço um sinal para Ryan e, quando se afasta
com seu disfarce de jogador, fico finalmente na frente dela. Madeleine está linda com um vestido
preto, colado ao corpo, um pouco curto demais, sapatos vermelhos que chamam minha atenção, os
cabelos escovados e agora castanho-escuros, e quando nossos olhos se encontram uma onde de
desejo primitivo me atinge.
Mexo os pés inquieto e aprumo ainda mais a postura.
— Travis? — Ela arregala os olhos e se levanta, deixando algumas moedas caírem do chão.
Tentando recuperá-las, atrapalha-se ainda mais, deixando mais uma porção escapar do copo. —
Droga!
— Deixa essa merda aí.
— Não! É meu dinheiro — responde com malcriação, nem preciso sentir seu bafo para saber
que está bêbada. — E você não manda em mim. Staizitto, stronzo.
Ela mandou eu calar a boca e me chamou de imbecil?! Ah, maledetta!
O sangue sobe na minha cabeça e num movimento rápido, curvo-me o suficiente e agarro seu
braço, colocando-a em pé de volta e faço-a me encarar muito perto.
— Me deixa em paz. — Puxa o braço da minha mão.
— Não! Cazzo.
— Como é que é?
— Não sou de abrir mão quando tomo algo para mim.
— Mas o quê?! Do que você está falando? — Ela se revolta e sai andando para longe de
mim. — Para de me seguir, cazzo.
— Se não estivesse, você já estaria morta hoje.
— Grandes merdas! — grita virando-se para mim.
Respiro fundo e solto um rosnado. Sim, eu soltei um rosnado como se fosse um dos meus
rottweiler, e agarro seu braço, dessa vez decidido a não soltar.
— Você não é muito de obedecer, não é?
Ela deixa a cabeça cair para o lado e cerra os olhos fitando-me com indignação.
— Vamos.
— NÃO!
— Madeleine — digo seu nome entredentes. — Você precisa sair daqui.
— Você não manda em mim. Ninguém manda.
— Molto bene. — Empurro-a para perto de Paolo e Luca, que a segura, sem força. Não quero
machucá-la ou que alguém faça. — Hai l'audacia e lacaparbietàdi tua madre. Che cazzo.[3] —
resmungo passando a mão nos cabelos, jogando-os pra trás e dando-lhe as costas, a caminho dos
elevadores.
— Eu entendo italiano perfeitamente e até latim! — fala alto, fazendo olhares fixarem-se em
nós.
Engulo em seco e, quando paramos em frente às portas de aço do elevador, que Enzo chama,
Madeleine me oferece um sorriso debochado.
— E não poderia concordar mais com você sobre isso. Eu tenho mesmo a teimosia da minha
mãe e a audácia italiana, a mesma que escorre em suas veias assassinas.
— Não começa com isso, ragazza.
Como uma criança mimada, ela tem a petulância de bater o pé no chão. Minha vontade de
pegá-la à força pelo braço, é grande, no entanto escolho ser pacífico.
Assim que o maldito elevador chega, entramos com Luca, Enzo e Paolo.
— Você está em qual quarto?
— Como você sabe que estou num quarto?
Olho para ela com os olhos cerrados e levanto o queixo.
— Porque eu sou o dono daqui.
— Também?! Droga, eu vim para cá não querendo ter contato com você! Merda!
Ignoro-a e pergunto novamente qual seu quarto. Em silêncio chegamos no andar e, quando
entramos na droga do seu quarto, sentencio:
— Vamos, recolha suas coisas.
— O quê? Por quê?
— Você quer ser assassinada, porra?
Seu corpo sacode em um sobressalto.
— Pega logo suas coisas. Estou perdendo a paciência.
— Mas por que eu...
— Vou te dar três minutos — interrompo-a — para tomar a decisão certa. Se não quiser ir,
foda-se! Vou deixar a Bratva fazer o que quiser com você então. Não ligo.
— Não parece.
Fecho os olhos, respiro profundamente e, quando os abro novamente, direciono um olhar
penetrante a ela, dando um recado silencioso. Mulher teimosa. De saco cheio, viro-me em ponto de
partida. Não posso mais ficar perto dela.
— Cuide de tudo, senão eu vou matá-la.
— Sim, senhor — garante Paolo.
Saio do quarto e vou em direção ao elevador para ir à sala gerencial. Vou lá uma vez ao mês,
mas não tenho o que fazer no momento e me manter longe dela, enquanto teima em não nos
acompanhar, é a melhor saída. O que tem na minha cabeça para insistir nessa maledetta.
Tem dez minutos que estou parada olhando para o meu reflexo – olhos esbugalhados e o
cabelo, que ainda estou me acostumando, todo despenteado – no espelho do banheiro da suíte, que eu
pensei ser a melhor rota de fuga do radar de Travis Lozartan e seus homens, mas errei.
Ainda estou sem acreditar que ele me achou e me deu novamente um ultimato. Que merda! Eu
nunca gostei da possibilidade de alguém ditar o que eu devo fazer. Mesmo que seja para o meu bem.
Mas sendo sincera comigo mesma, e nunca ninguém irá saber desse pensamento, eu preciso
ceder desta vez. Ter o Capo atrás de mim – pela segunda vez –, por minha segurança, eu só tenho é
que agradecer e, por enquanto, ficar sob suas asas.
Tomando uma respiração profunda, lavo minha boca para tirar um pouco o gosto do vômito
que não sei se foi dos oito Cosmopolitan ou o nervosismo de ver Travis Lozartan na minha frente.
Eu queria muito odiar todo o poder que Travis emana, mas a verdade é que tudo nele me
atrai. Eu queria muito não sentir isso e talvez é um motivo a mais para eu não querer voltar para a
casa dele. Essa atração que sinto já me compromete demais. E eu prometi desde criança, que não me
envolveria – além de que já sou ligada a Lawless e a Famiglia – com eles. Com nenhum dos
Lozartan.
Saindo do banheiro, dou de cara com Paolo. Esse olhar profundo dele... é quase óbvio que
não curte o tratamento que o chefe dele está dando para mim. Oras, eu não pedi por isso.
Erguendo a cabeça, passo por ele e vejo mais um homem. É nítido que eles estão aqui para
pressionar que eu saia logo daqui. Rio por dentro. Acho que já passei quinze minutos enrolando-os e
agora estou pronta para ir.
Dando um sorriso debochado para o consigliere, que agora sim vai me detestar, pego minha
bolsa e vou em direção à porta.
— Ainda bem que você se decidiu rápido — Travis fala com sarcasmo, parado no corredor
com as mãos nos bolsos e sua postura toda-poderosa.
Esse homem é lindo e meu corpo fica fervendo. É um perigo enorme estar perto dele. É um
perigo ter todos esses sentimentos por ele. Argh! Ainda bem que eu tenho a apelação de odiá-lo,
senão... Não sei como responderia por meus atos ou o tesão que ele me dá.
— Por que você precisa ser tão rude? — pergunto indo atrás dele, que anda rápido demais,
ou talvez é porque ele tem quase dois metros de altura e eu apenas meus um e sessenta e cinco.
Antes de me responder, ele ergue a sobrancelha direita e curva o canto da boca de leve, do
mesmo lado, e espera o elevador fechar.
— Você não me dá escolha. Tem uma teimosia sem fim e eu tenho uma paciência escassa.
Para segurar o riso, mordo a boca. Essa braveza toda dele é engraçada as vezes, se... Não
fosse o risco de ser presa na masmorra.
— Eu não te dei escolha? — Coloco as mãos na cintura. — Por acaso, você ouviu eu pedir
para me policiarem em tudo que eu faço? Me seguirem? — Juro que estou me erguendo o máximo
que posso sem parecer ridícula.
— Você é uma mulher muito difícil de lidar e é... — pausa, cerrando os olhos e passando a
mão gigante dele de cheio no maxilar — engraçado essa revolta toda. Essa repulsa tão grande pela
Lawless. Você não foi introduzida na Cosa Nostra como uma mera desculpa ou coincidência. Você
nasceu nessa merda. Nasceu nesse mundo que odeia tanto. Que não consegue respeitar uma simples
regra de sobrevivência. — Fecha os olhos por breves segundos e, quando os abre, parece olhar
minha alma. — Eu só quero que você me acompanhe e fique na minha casa até eu poder esfriar o
inferno para você passar e viver sua vida como bem quiser. Mas eu não sou seu pai, seu irmão, seu
marido. Então, é com você, Madeleine.
Estou de boca aberta, de verdade, e minhas palavras são travadas por ter que ir atrás dele
quando o elevador chega no lobby do hotel. Seguimos com passos rápidos até o carro, entramos, nos
acomodamos e, quando olho pela janela que já estamos na avenida, engulo em seco encarando Travis
e falo:
— É... — Olho para baixo e, caralho, ele está certo e eu estou sendo uma idiota. — Eu...
pensei melhor... — solto a respiração. — Vou ficar com você. Na sua... vou ficar na sua casa.
Ele faz um simples gesto com a cabeça assentindo.
— Que bom que recobrou a lucidez.
— Mas...
Travis curva o canto da boca em um sorriso cínico.
— Claro que teria um “mas”.
— Eu quero que você cuide da minha segurança e não me coloque como sua prisioneira.
— Quando foi que eu fiz isso?
— Acha que eu sou boba?
Ele arregala os olhos com o tom da minha voz e minhas palavras.
— Você não apareceu no MGM à toa. Por mais que você seja o dono, foi direto até a mim e
eu percebi seus homens me seguindo um pouco antes. Não sei qual é o verdadeiro problema...
— O problema é que estavam te seguindo — me interrompe — e você não sabe por que meus
homens, que tanto despreza, interceptaram antes de chegarem até você. E respondendo sua pergunta:
o verdadeiro problema é que deixar você morrer mostraria minha fraqueza.
Então... o que o motiva é apenas isso? Mostrar seu poder.
— Sinceramente. Não consigo aceitar você brincar com sua vida assim — ele voltar a falar,
e captura minha atenção.
Respiro fundo e meneio a cabeça sentindo mil sensações dentro de mim, inclusive uma que
não sei interpretar. Encaro-o e digo:
— Vou parar de brincar e você apenas me mantenha viva, mas não como uma prisioneira.
Travis dá um simples aceno afirmativo com a cabeça e abre o paletó, soltando-o do seu
corpo. Assisto-o pegar uma garrafa no compartimento que tem no carro – parece um mini frigobar –,
um copo baixo e redondo, e se servir de uma bebida amarela. Deve ser uísque. Ele se ajeita no banco
e com seus intensos olhos azuis magnéticos, dá uma golada com os olhos em mim. Caramba!
— Quer um gole? — Sua voz é um comando. Uma fúria silenciosa.
Nego com a cabeça freneticamente, engolindo em seco. Fazendo a melhor cara de “não
abalada por ele”, viro-me no banco que fica de frente para ele.
Fito através das janelas do veículo as ruas de Las Vegas. Meu inferno na Terra. Para muitos o
paraíso, a cidade do pecado, o parque de diversão dos adultos; para mim, o meu pesadelo. Se
arrependimento matasse, eu não teria voltado.

— Buonpomeriggio — escuto atrás de mim.


Viro-me depressa e dou de cara com Paolo e seus olhos cinza calculistas e desconfiados.
— Boa tarde também — devolvo o cumprimento em inglês mesmo, pois não sou obrigada a
ficar falando italiano como se fosse parte da cúpula dele, que só fala em italiano – muitas vezes –
para ninguém de fora da Famiglia entender.
— Está procurando alguma coisa? — ele pergunta e quem fica desconfiada sou eu.
— Não. Só vim beber um pouco d’água.
Ele faz um meneio com a cabeça e não sai do lugar. Fico me perguntando o quê que ele está
esperando e, quando a espera vence minha paciência, eu me movo.
Va bene, eu não vou ficar aqui nesse impasse encarando-o enquanto ele parece que está
traçando meu perfil, lendo meu perfil e com milhões de pressuposições sobre mim. O cara não vai
com a minha cara e deixa tão explícito isso, que me sinto oprimida perto dele.
Talvez nem seja pessoal o motivo de ele não confiar em mim. Ele é o braço direito de Travis
e automaticamente precisa ficar desconfiado de tudo e de todos para que o seu Capo não receba uma
facada enquanto dorme ou algo parecido. Que não seja traído e tudo mais. Entendo perfeitamente a
posição dele, porém já estou dentro dessa casa – de fato – e aceitando que preciso ficar aqui por
enquanto, há duas semanas, entre sentimentos e sensações estranhas que rondam a minha cabeça e o
meu corpo o tempo todo.
Eu não fiz nada esses dias, e basicamente essas duas semanas não vi Travis. Ele tomou chá
de sumiço. Só o vejo na hora da janta, e as outras pessoas dentro dessa casa parecem desaparecer
também e só surgem de volta no café da manhã. Acho que até por este motivo, que estou passeando
pela casa a essa hora. Geralmente as tardes são vazias e silenciosas, que até consigo ouvir meus
dentes rangendo enquanto durmo a tarde inteira. O que eu estava fazendo? Não aguento mais ficar
sem fazer nada. Preciso arrumar alguma coisa para ocupar minha mente. E pensar nisso tem a
hipótese e a necessidade de ter que falar com meu querido e digníssimo Capo delcapi. Francamente,
nunca pensei que eu teria que pedir permissão para um homem que não deveria mandar em mim,
pessoalmente e depois de adulta.
Sem trocar mais nenhuma palavra com Paolo, direciono-me para a cozinha. Enquanto pego
água e coloco no copo, sinto-me sendo observada. Ele está com as mãos nos bolsos e um olhar
compenetrado, dá até para perceber que está com milhões de pensamentos.
Meu lado abusada ganha vida e dando a volta no balcão, deixo o copo em cima e me apoio,
colocando minhas mãos embaixo do queixo igual aquelas estátuas engraçadas que ficam na janela e
dou um olhar para ele com a mesma arrogância, ou tento, porque não sou tão intensa como esses
caras da Famiglia.
— Algum problema?
— Não. Por que deveria ter? — indaga, mexendo as mãos dentro dos bolsos.
— Eu não sei. É você que fica me olhando como se tivesse algum problema.
— Já que você tocou no assunto, o problema é você.
— Eu? — Dou uma risada surpresa, entredentes. — Por que eu sou um problema?
— Toda essa situação que o seu pai colocou entre a Cosa Nostra e a Bratva, é um grande
problema; e Travis ter que tomar conta de você é outro grande problema; e ainda não ter sinal da sua
mãe, outro enorme grande problema. Então você é um problema e essa dependência de ter que cuidar
de você faz Travis bancar um idiota — ele se aproxima — e eu sou a pessoa que faz o Capo não ser
um idiota e observo você o tempo todo, porque não sei como eu posso confiar inteiramente em uma
pessoa que não conheço.
— Eu lhe faço a mesma pergunta, já que também não conheço nenhum de vocês e estou aqui
dentro. — Mexo as sobrancelhas. — Eu sou mais vulnerável e precisamos concordar que em menor
número. Mesmo que eu seja um perigo, de alguma forma na sua cabeça, antes mesmo de fazer
qualquer coisa vocês me matam e já tem duas semanas que estou aqui dentro e nada aconteceu além
do normal.
— Além do normal? — Caminha até a mim, ficando mais perto e intimidando-me. — Você
quer dizer com Travis tendo perturbações com você muito maiores do que ele tem com a irmã dele
mais nova?
— Eu não vejo nada de errado pedir um pouco mais de liberdade e, em breve, teremos mais
problemas pelo visto — digo aprumando a postura.
Dou-lhe as costas enquanto devolvo o copo para a pia, virando e caminhando até ele,
colocando as mãos na cintura e sem medo dele me dar um tiro com a arma que está no seu coldre,
digo com muita certeza:
— É uma pena você não gostar de mim e deixar tão explícito. Eu posso lhe garantir que não
vou fazer nada. O que eu mais quero é me livrar dessa prisão de marfim.
— Eu posso te ajudar a se livrar daqui, se é essa sua maior vontade.
— Entenda bem, Paolo. Eu quero me livrar daqui, mas não para ir para o cemitério.
— Te matar não me daria prazer algum e nenhum benefício. — Ele é tão rude, seco. — Se
você quer sair daqui, posso convencer Travis a te mandar para a casa de seus avós.
Engulo em seco. Essa proposta é tentadora, mas...
— Eu vou pensar sobre isso, mas por enquanto a única coisa que eu quero é ter alguma
atividade aqui dentro dessa casa ou... se o meu Capo, nosso Capo, permitir — digo com um enorme
tom de deboche —, eu posso fazer algo em um dos seus cassinos. Sempre fui muito boa de
matemática, observadora e jogo muito bem pôquer.
Paolo faz uma cara de mafioso malvadão e assente.
Com minhas últimas palavras deixo-o com seus pensamentos e com uma leve inclinação de
que iria retrucar. Sério, eu sou um pouco lesada e fraca em comparação a esses homens, contudo,
quando eu quero ser irritante, já provei ao mundo, pelo menos o mundo de Las Vegas e a Cosa
Nostra, que consigo ser.

Sento-me na cama depressa, com uma sensação estranha passando por meu corpo. Tem algo
errado. Olho para os cantos do quarto, recuperando o fôlego e olho as horas no relógio que fica na
cabeceira da cama: 02:08.
Resmungo deixando meu corpo cair, ouvindo as notas singelas de um piano tocando no fundo
da minha mente. É tão bonito e hipnotizante. Deitada na cama, percebo que não vem de um aparelho
de som e sim lá debaixo, no piano que eu pensei ser apenas de enfeite na casa. De olhos fechados
sorrio e fico só aproveitando o som. É como um espetáculo, um concerto clássico que uma vez assisti
em um filme.
De repente, as notas parecem ganhar vida e meu coração acelera.
— Preciso ver isso de perto.
Inquieta, levanto-me da cama com um pulo, visto um casaco e abro a porta de fininho para
quem quer que seja a pessoa tocando o piano não pare porque é lindo. Desço as escadas como uma
rata, viro para os fundos da casa e passo direto pelo corredor.
— Uau! — murmuro. Estou tão surpresa que meus pés grudam no chão de mármore. Travis
Lozartan toca piano! E não é só isso: toca lindamente, de uma forma que me leva direto para o
século XIV e me sinto a Senhorita Bennett, em Orgulho e Preconceito. Eu leio – e assisti demais –
Jane Austen.
Caramba, ele é surpreendente. Um homem tão bruto, empoderado e violento como ele, sentar-
se no banquinho em frente a este piano chique e tocar uma música tão singela, é de ficar com a boca
aberta. E acho que estou assim mesmo. Queixo caído e babando. Não sou cega e Travis é lindo. Uma
perfeição de músculos, determinação e força. Ele nem precisa falar – apesar de que sua voz é
magnífica – para me deixar em alerta, e não apenas no sentido amedrontador. Eu fico admirada com
ele o tempo todo. Da sua crueldade à sua gentileza, que só acontece para os seus irmãos.
Ele continua tocando, totalmente imerso na canção que nunca escutei. Algumas notas não são
desconhecidas, achei que era uma que minha mãe gostava de Beethoven, porém conforme ele toca,
não reconheço. É uma melodia linda.
Pego-me com um sorrisinho idiota ao pensar que ele é uma miragem do Christian Grey. No
entanto, Christian tocava no livro melodias melancólicas, tristes. Travis tem a pegada totalmente
diferente. É doce, suave e alegre. Poderia ficar ouvindo-o tocar até seus dedos cansarem. Ela me dá
vontade de correr em um pasto longo e verdinho cantando a música da Noviça Rebelde. Minha mente
é apaixonada, pois vivia de livros e filmes quando mais nova. Era a forma dos meus pais me
trancarem e eu me sentir “solta”. Pois imersa nas histórias, eu estava em outro mundo e parava de me
intrometer na vida deles. Pensando nisso agora, acho que é isso que Travis procura em seu piano.
Esquecer do seu mundo impuro e cruel.
Hipnotizada, deixo meu corpo cair, para me apoiar na parede, mas não percebo que na
verdade é a porta de correr que separa essa antessala do resto da casa. Merda. Aqui é o segredo do
Travis e eu não deveria estar aqui, e quando ele bate com força a tampa do piano e se levanta, tenho
certeza de que não sou bem-vinda.
Santo inferno! É hoje que ele me mata.
— Hum... — solta com os olhos cerrados e completa com a voz rouca, evidenciando sua
impaciência: — Tinha que ser você.
Engulo em seco e, infelizmente, minha língua atrevida é mais rápida que meu cérebro
protetor.
— Quem mais seria, se só tem eu e você nessa casa hoje.
Colen sumiu de vista há uma semana, os homens não ficam dentro da casa à noite, apenas se
estiver acontecendo algum problema, e Marinne está no colégio interno.
Vejo sua sobrancelha direita se erguer sutilmente e tão rápido, que mais parece um reflexo
muscular. Quando o nervinho treme sob os olhos.
— Você não deveria estar na sua cama?
Odeio quando ele fala comigo como se eu fosse uma criança.
— Sim, mas seu piano me acordou— respondo e, por costume, tomo a postura de combate,
estufando o peito e deixando o rosto elevado. Eu não vou mesmo me curvar a ele.
Travis sorri de lado – o sorriso diabólico que me deixa com raiva da minha libido – e passa
a mão no cabelo. Acho que ele acabou de contar até dez para não me jogar lá fora e me fazer dormir
com os cachorros. Embora os dois dobermanns gigantescos e assustadores gostem de mim.
— Vou providenciar um “tapa-ouvido” pra você, então — diz se aproximando.
Grosso como sempre.
— Não precisa— respondo quando ele está na minha frente, pois estou impedindo de ele sair
enquanto permaneço no meio do caminho. — Estava lindo. Você toca muito bem.
Da mesma forma que ele mexeu sua sobrancelha segundos atrás, o canto da sua boca quase –
quase mesmo – forma uma curva em sinal de um sorriso.
— Fico feliz que agrado — diz com empáfia.
— Deixa de ser implicante também, Travis. — Balanço a cabeça e cruzo os braços. — Estou
te elogiando, porra!
Isso o faz rir, e é tão raro ouvir isso. Acho que é a primeira vez. Quer dizer, eu não o vejo há
algum tempo e senti falta até dos olhares intensos dele.
— Não estou implicando. Estou falando a verdade.
— Mas não é assim que se fala.
— É como então?
— Agradecendo o elogio como qualquer pessoa normal faria.
— Bene, eu não sou como todo mundo.
— É, eu sei. — Abro um sorriso atrevido. — Você é um ser único.
Agora sim o sorriso toma forma, mas bem suave e sexy como um inferno.
Caramba. Ele é tão bonito.
Sem muito esforço, meus olhos descem por seu queixo, pescoço e, quando olho seu peitoral,
me dou conta de que, por baixo do roupão de algodão, não tem nada. Ele só veste uma calça de
flanela azul-escura como seus olhos e o roupão preto. Ele sempre está de preto e fica muito lindo.
Puta que pariu! Como se estivesse possuída, passo meus olhos por seu peito musculoso, largo, lindo,
cheiroso e com muitos pelos, que eu poderia achar horrível em qualquer homem, mas nele... tudo se
encaixa e o deixa maravilhoso.
Engulo em seco e tento achar o ar. Piscando várias vezes, recuo e encontro seus olhos de
novo e respiro fundo finalmente. Safado, ele já sabe o efeito que tem em mim e em todas as mulheres.
E adora, é claro.
— Posso ir agora ou ainda não acabou de admirar?
— Você é peludo.
— Cazzo — ele solta rindo alto e apoia uma das mãos no batente da porta, agora livre da
minha pessoa, porém sua escolha de posição deixa-o quase sob mim. Possessivo e dominador.
Ele gargalha com força e o riso dele é lindo. Rouco e empolgante, tanto que estou rindo
também.
Eu sou tão bocuda. Deus me ajude!
Com o tempo, o riso vai perdendo as forças e nos encaramos. Travis cerra a mandíbula e com
dois passos, está tão perto de mim que preciso levantar a cabeça para conseguir encará-lo.
— Está explicado.
— O quê? — indago com um fio de voz.
— É por isso que seu pai não gostava de você.
— Meu pai gostava de mim.
O sorriso no canto da boca surge, diabólico, e ele diz:
— Se gostasse de verdade, não ficaria se livrando de você e não teria feito uma oferta
ridícula com Vitorio. Seu pai era um hipócrita e eu entendo quando você fala com tanta raiva sobre a
Lawless. Você foi posta no meio da batalha mais antiga que a história, Cosa Nostra e Bratva, por um
homem que não tinha o mínimo de respeito a alguém que é puro e honesto.
Meu peito sobe quando encho os pulmões de ar. Estou sufocada com a aproximação e o jeito
que ele me olha.
— Para de ficar com medo de mim.
— Não é medo.
Ele dá um aceno com a cabeça e seus olhos dizem mais que isso.
— De certa forma é.
— Não, e você está errado. Meu pai gostava de mim.
— Pode ser, mas não amava. — Em câmera lenta vejo sua mão pegar meu queixo e seu rosto
ficar mais próximo do meu quando ele se inclina. — Eu o conhecia e sempre soube o quão estúpido
ele era, mas não pensei que desperdiçaria alguém assim. Pessoas como você, Madeleine, fazem falta
no mundo e você tem razão. Seu lugar não é no meu mundo. Você merece mais.
— Então por que não me deixa ir de uma vez? — questiono e, ao mesmo tempo, sinto algo em
meu peito se contrair. Odeio essa sensação.
Os olhos dele ficam escuros, o oceano azul que sempre enxergo some e surge um céu escuro e
nublado.
— Porque você não pode demonstrar fraqueza, hum? — digo atrevida.
Como uma fumaça, ele solta meu rosto, vira-se e vai embora, murmurando sobre os ombros:
— Boa noite, Madeleine.
Fito suas costas até sumir pelo corredor e sinto meus ombros pesarem como se tivesse um
muro sobre eles.
Deus! O que eu estou fazendo?
Espero o carro parar em frente à escola interna da minha irmã, ajeito minha roupa e saio em
direção aos portões gigantes de ferro preto. Eu detesto ter que deixar Marinne aqui, mas sei que é
mais seguro do que ela estar em casa. Também porque aqui ela tem crianças, amigos e brinca com
eles. O que eu ia arrumar pra fazer com minha irmã pequena? A hipótese era de tirá-la do meio da
Lawless enquanto pode. Mais tarde, nada que eu faça a livrará de algumas regras da Famiglia terem
que ser feitas.
Entro na escola depois que passo pelos seguranças e vejo a inspetora, que me olha estranho
quando chego ao pátio. Dou um aceno de cabeça para ela. Não entendi. Mulher louca.
Logo vejo Marinne rindo e conversando com uma menina ruiva, sorridente e falante que nem
ela. Esse é o motivo de eu não querer tirá-la daqui.
Ficando mais perto, minha irmã me vê e seus olhos se arregalam. Ela se atrapalha pegando a
mochila e se despedindo da amiga com um abraço rápido. Logo vem correndo em minha direção e
para, abruptamente, quando chega à minha frente. Sinto como ela deseja me abraçar, mas não faz. Às
vezes, acho que eu sou um monstro mesmo.
— Oi, baixinha — falo com humor. — Vamos?
Marinne assente com um sorriso fixo em seu rosto angelical, e quando viramos em direção à
saída, ela dá até logo para a sua amiga e a inspetora que estava perto delas.
— Adoro quando você vem me buscar, mas isso acontece tão raras vezes que... — ela
começa a falar quando chegamos perto do carro.
— Que o quê? — Abro a porta para ela entrar.
Depois que se acomoda, joga a mochila para o lado, tira o blazer da escola e responde:
— As únicas vezes que você veio me buscar, Travis, foi porque aconteceu alguma coisa.
Sinto a sua apreensão.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não — respondo olhando para o seu rosto e balanço a cabeça. — Por que você está
perguntando isso?
— Porque você só veio me buscar quando aconteceu o incidente com o papai e depois
quando ele morreu. Você não vem me buscar, Travis. — Dá de ombros de leve.
Acabo de me sentir pior ainda por ouvir isso. Depois que mamãe morreu, a única pessoa que
sempre cuidou da minha irmã fui eu e Rosália, mas ela é paga para isso. Meu pai nunca ligou para
Marinne, e ver que eu não dou atenção para ela como deveria, me incomoda.
— Eu faço de tudo para você e, se eu não venho te buscar mais vezes, é porque estou
ocupado.
— Travis — ela vira o corpo para mim, dando um pulo no banco do carro —, eu não estou
reclamando, só estou surpresa e... — ela abaixa a cabeça e brinca com seus dedos, passando eles um
pelo outro como se fossem imãs opostos.
— Pode falar.
Eu nunca briguei com a minha irmã por nada. De todos os meus irmãos, Marinne nunca viu
minha ira. Eu não gosto que ela fique com medo, inclusive de mim.
— Eu estou surpresa e com medo. — Seus olhos estão idênticos aos meus, fixos em uma
tentativa de tentar me ler. Algo que essa pestinha consegue muito bem. — Aconteceu alguma coisa
com o Colen ou com Dario?
— Não.
— Rosália e a Marie Rose?
— Não. Já disse que não aconteceu nada.
— Então a Madeleine foi embora?
— Você se importa com ela?
— Sim — responde com aquele jeito adolescente “meio autoritária” e como se fosse a
resposta mais óbvia do mundo, já que as últimas vezes não parecia que elas eram próximas.
— Eu pensei que você não gostava dela.
— Dã! Eu pensei isso também, mas depois de ter que ficar trancada naquela casa, só eu e ela,
acabou que eu percebi que ela é bem legal. Gosto da companhia dela.
— Você acha? — pergunto como quem não quer nada.
Marinne cerra os olhos com um sorrisinho, que não sei identificar a expressão e acena com a
cabeça que sim antes de dizer:
— Eu a acho muito legal, bonita, gentil e, por mais que Rosália e Marie Rose sejam legais
comigo, elas são pagas para gostar de mim e cuidar. A Madeleine não, então... é por isso que eu
gosto dela lá em casa. — Dá de ombros, um pouco insegura. — Ficarei muito triste se ela for
embora. Quer dizer... — limpa a garganta, faz um gesto com a mão e volta a me encarar. — Quando
ela for embora.
— Quando ela for embora? — pergunto curioso com a resposta.
— É! Eu sei que a presença dela é provisória, por causa da segurança dela e por causa do
problema que o pai dela arrumou com a Bratva.
— Como você sabe disso tudo? — Coloco peso em meu olhar. — Já falei para você não
ficar ouvindo por trás das portas e nem as conversas sobre a Lawless.
Ela cruza os braços na frente do peito e faz a cara mais abusada que eu já vi, tão parecida
com Colen que me irrita.
— Eu não ouvi. Foi sem querer. Fui beber água e escutei o Paolo falando com um dos
homens... eu não lembro o nome dele. Acho que foi o Érico.
Hum... Bom saber.
— E o que eles estavam falando?
— Sobre arrumar um jeito de você aceitar mandar Madeleine para a Sicília antes do prazo ou
do combinado que você fez com ela. Eu não sei muito bem. — Ela dá de ombros e mexe de novo nos
dedos, agora brinca com as unhas. — Só sei que eu gosto dela e...
— E?
— Que você está sumido de casa.
— Eu estou sumido de casa? Eu vou para lá todo dia. É você que não fica lá — digo e dou
um sorriso rápido para ela.
— Você vai para lá tomar café e, às vezes, janta. Fora isso eu não te vejo, e olha que eu fico
cinco dias da semana fora de casa e pareço que eu moro mais lá do que você no último mês.
— Eu não sei do que você está falando.
— Você sabe sim e eu acho que é por causa da Madeleine. Você está fugindo dela.
— Não fala besteira, criança.
— Não me chama assim. Não me trate assim!
O arrependimento de entrar numa discussão com a minha irmã mais nova bate à porta, mas eu
não dou o braço a torcer porque o que ela está falando não faz sentido.
— Me desculpa, mas você está provocando. O que você está falando é de extrema teimosia,
pois eu estou dizendo que não tem nada a ver e você está insistindo.
— Travis... — Ela chega mais perto de mim e com um pouco de receio segura minha mão. —
Por que você está fugindo dela? Você... por acaso tem vontade de...
— O quê? — Cerro os olhos para ela, porque se falar alguma besteira vou botá-la de castigo.
— De matar ela?
É inevitável a minha gargalhada.
— Por que eu iria querer matar Madeleine?
— Eu não sei — responde cheia de autoridade. — Mas sei que você não a levou lá para
dentro de casa porque gosta dela. É só por causa daquela coisa do papai.
— Você está sabendo muito das coisas — pondero com uma crítica, mas orgulhoso. Minha
pequena é terrível.
— Isso ela me contou.
— Então vocês conversam sobre várias coisas.
— Sim, conversamos. Não vejo nada de mais e é melhor do que ficar brincando o tempo todo
com videogame e outras coisas. Sei lá, minhas bonecas ou arrumando um novo jeito de mudar o
estilo do meu cabelo, do meu armário. — Deixa os ombros caírem. — Não tenho nada para fazer,
então conversar com a Made está sendo maravilhoso.
— Made?
— É — responde com um sorriso cheio de carinho. — Gosto dela e por isso que eu não
quero que você a mande embora. Pelo menos, não tão cedo. — Fica triste de repente. — Sei que uma
hora você vai ter que fazer.
— Eu sei — lamento e dou um sorriso fraco. — Sinto muito você se sentir assim. De
verdade.
— Eu sei que são só dois dias que fico em casa, mas é um saco me sentir sozinha e mesmo
que você fique em casa, a gente não fica mais como antes. — Engole em seco. — Antes de você ser o
Capo.
Limpo a garganta e aperto sua mão entre as minhas.
— Vou tentar mudar isso. Só que no momento está sendo complicado, e você gostar dela é
bom, mas ela... quer dizer o pai dela me trouxe grandes problemas, que preciso resolver o quanto
antes.
— Eu sei que a Bratva não brinca. Seria tão mais legal e fácil ela ter entrado nas nossas
vidas de outra forma.
— Teria sim.
Marinne fica um tempo me olhando, e por fim fala:
— Você gosta dela também.
— Não. Não tem nada a ver isso.
Ela abre um sorriso enorme e novamente seus olhos tentam me ler.
— Tudo bem. Você ainda não a conhece direito, mas tomara que um dia você dê oportunidade
e que não seja tarde demais, Travis.
— Para quê?
— Para você admitir os seus sentimentos pelas pessoas e suas preocupações reais. Não se
sinta mal por gostar de alguém que você não deveria sentir nada. Na sua cabeça, ela é só uma forma
de honrar a palavra do nosso pai, que você odiava, como também de mostrar a Bratva que é um Capo
mais corajoso que o papai. Mais forte. Você gosta de ser poderoso e eu acho isso legal. — Afaga
minha mão com carinho. — Amo isso em você, mas também detesto quando o deixa cego para outras
coisas.
Sorrio para ela e a pego de surpresa, lhe dando um abraço forte e rápido.
— Também amo você, baixinha, e se eu pudesse faria você ser minha Testa.
— Mas eu sou seu braço direito e esqueço de qualquer forma, irmão. — Ela faz um biquinho
e sorri acanhada. — Você é o único pai que eu conheço. Que eu tive. Antes de perder o papai e
depois. E espero, torço de todo coração, para que você nunca seja como ele.
Cazzo. Ouvir isso é forte. Apenas ela faz eu me sentir pequeno.
— É uma honra ouvir isso e eu prometo nunca te decepcionar.
Isso faz a minha irmã abrir um sorriso tão grande, que me deixa feliz de um jeito único. A
última vez que senti isso foi quando eu fui pego em flagrante tocando piano. Detesto ter que admitir
que a minha irmã esteja certa – em vários sentidos – e acabou de conseguir me ler perfeitamente. É
verdade, seria maravilhoso ter encontrado Madeleine em outras circunstâncias.
Assim que a bala explode do meu revólver e mato meu soldado, sinto um arrepio na espinha
percorrer meu corpo todo, e em seguida um grito surge atrás de mim. Virando-me, vejo uma
Madeleine com as mãos na boca, petrificada, olhando para mim.
— Ah, que merda — resmungo baixo.
Não tenho tempo de fazer nada a não ser assistir ela correndo para dentro de casa, às pressas,
e eu vou atrás dela pedindo para que pare.
— Espera, Madeleine, por favor. Espera.
Mas não adianta, ela sobe as escadas e, quando estou perto de alcançá-la, ela entra no quarto
fechando a porta com uma batida forte. Puta que pariu, isso era tudo que eu não precisava.
— Por favor, abre a porta.
— Não! — Sua voz está seca, firme.
Um paradoxo total da postura que ela me mostrou e de como estou me sentindo agora.
Meu corpo todo está tremendo. Olho para os meus dedos, para as minhas mãos que tremem e
o único arrependimento que tenho, é dela ter assistido aquilo e eu não ter prestado atenção. Não
deveria ter feito isso dentro de casa. Todos os cuidados que eu sempre tive com Marinne e agora com
ela foram por terra minutos atrás.
Vacilante, seguro a maçaneta e preciso de todo meu autocontrole para não ser um bruto nesse
momento, e me dou mal quando percebo que ela trancou o quarto. Se trancou lá dentro, protegendo-se
de mim.
— Abre a porta, por favor. Eu preciso falar com você.
— Não precisa nada.
— Você vai mesmo falar isso para mim? Você acabou de ver eu matando um homem.
— Mas esse é o seu trabalho.
— Eu sei, cazzo. Mas não era para você... — Respiro profundamente. — Você ter visto. Não
quero que você me veja...
— Como um monstro?
Nunca, em toda a minha vida, de todas as atrocidades que já fiz por vingança, por prazer ou
por ter que fazer, nunca fiquei ferido por nada. Sempre soube quem eu sou, porque eu vim ao mundo,
mas nunca pensei ouvir isto tão abertamente. E odiar saber que sentem nojo de mim. Fecho os olhos,
que queimam, e me vejo no quarto da minha mãe enquanto ela me batia com a fivela nas costas. O
moleque indefeso que não podia fazer nada, a não ser apanhar calado, sem demonstrar nenhum tipo
de sentimento. Porque eu nunca fui fraco e eu não sei sentir nada.
— Deixa eu falar com você. Te explicar.
— Você não tem nada o que me explicar, Travis. Eu que não tinha que ter visto nada. Está
tudo bem. Desculpa se eu...
— Não precisa pedir desculpas. Sou eu que tenho. Não era para ter feito isso aqui. Eu nunca
fiz. — Como se importasse. Ela já me odiava e agora nunca mais vai sair desse quarto. — Me dá um
voto de confiança e converse comigo.
— Não precisa — ela diz e parece que está chorando, e eu não sei o motivo.
— Prometo que eu não vou machucar você — falo rápido e sem pensar. — Eu dou minha
palavra que nunca vou machucar você. Acredita em mim?
Ela fica um tempo em silêncio, e acho que não vai me responder.
— Acredito.
O alívio toma conta de mim de uma forma estranha, como se tivesse tirado uma pedra de
cima do meu coração.
— Então abre a porta e me deixa explicar pra você o que aconteceu.
— Você não tem que me explicar nada, Travis.
— Mas eu... acho... que preciso.
Depois de mais um novo longo silêncio, a porta se abre e o que vejo, me causa repulsa. Os
olhos dela estão marejados, vermelhos e distantes.
— Está tudo bem — digo tentando trazer segurança para ela. — Está tudo bem agora e me
desculpa pelo que você viu. Eu nunca faço essas coisas aqui.
Ela assente com o rosto para baixo e eu peço com a voz calma para que ela olhe para mim, e
demora um pouco para ela me encarar.
— Aquele homem estava fazendo parte do tráfico de meninas e sou veementemente contra
esse tipo de acordo, por isso que o puni com a morte. Estávamos atrás dele há um bom tempo,
precisávamos saber quem de nós estava se metendo nesse meio, mas isso não justifica eu fazer... —
Encontro as palavras na minha mente perturbada. — Eu fazer o meu trabalho em casa.
— Está tudo bem. Eu também não deveria estar lá fora.
— Não, de forma alguma. Você mora aqui agora e pode ir a qualquer canto da casa. O erro
foi meu.
Ela faz um som afirmativo com a garganta, embora não pareça confiante.
— Não tenha medo de mim. Eu nunca iria machucar você — digo mais uma vez. Preciso que
ela acredite e confie em mim. — Você acredita?
— Uhum — murmura.
— Então pega na minha mão. — Estico meu braço com a mão aberta. — Segura na minha
mão.
Ela olha do meu rosto para a minha mão algumas vezes antes de encarar em definitivo minha
mão.
— Você confia em mim?
Ela tira as mãos de trás do corpo e noto como os seus dedos se movem nervosos. Em câmera
lenta, ergue sua mão e põe sobre a minha, que logo eu aperto, fazendo-a levantar o rosto e me
encarar.
— Eu não vou te machucar. Está tudo bem.
Ela assente, movendo a cabeça devagar.
— Desculpa chamar você de monstro.
— Não que eu não seja... às vezes.
Madeleine desvia o olhar rapidamente e engole em seco. E quando ela mexe os pés,
desconfortável, preciso soltar sua mão e me afastar.
— Te vejo na hora do jantar?
Ela concorda com um aceno de cabeça e, antes que eu fale mais alguma coisa que me
arrependa no futuro, viro-me para ir embora.
Assim que desço as escadas, encontro Paolo, que logo está na minha frente com uma cara
preocupada e alarmante. Não entendo o motivo.
— Algum problema com a garota?
— Não. Me deixa em paz um pouco. Vou para o meu escritório agora. Qualquer coisa, você
resolve ou fala comigo por telefone.
— Travis, nós precisamos falar sobre o Roberto.
Só de ouvir a menção do soldado desgraçado, que me causou a dor de cabeça do contrabando
de crianças e mulheres e mais esse problema agora, minha vontade é de matá-lo de novo.
— Depois nós conversamos — dou o meu ultimato e entro no escritório fechando e trancando
a porta.
Tem muitas coisas que podem transformar um homem. Algumas podem ser dolorosas, que
marcam sua vida para sempre com uma cicatriz que cura um dia, mas você sempre vai enxergá-la te
encarar profundamente. Outros são delicados como um sofrimento momentâneo.
Eu sempre fui contido quando era abalado com a realidade brutal desde os meus 12 anos.
Minha avó decidiu me ensinar a tocar piano na época e eu tinha achado uma besteira, cheguei a
recusar, mas conforme o tempo passou, percebi que o meu mundo era tão obscuro e, um dia, eu teria
que viver tudo que o meu pai viveu. Isso nunca foi tão verdadeiro quanto os últimos meses e o
arrependimento, nos últimos segundos.
Sirvo-me generosamente de uma porção de Bourbone, pretendo beber até esquecer. Minha
morte deve ser dolorosa. Sou um monstro. Sei disso, mas Madeleine falar isso para mim, me
incomodou. Talvez eu seja um monstro porque mesmo sabendo da crueldade que estou fazendo,
permaneço ali e continuo. Eu vou até o fim da bainha da minha faca. Nunca recuo e nunca repenso, só
faço. Eu não posso lamentar quem eu sou. Ter que lidar com esse fato vai ser difícil, no entanto, terei
que encontrar um caminho.

Sinto um calafrio por estar sendo espionado, mas não de uma forma ruim, como quando
estou em guarda nas ruas. Eu sei quem é. Controlo a vontade de sorrir e franzo a testa. Meus dedos
deixam o piano e pisco olhando para o nada. Virando o rosto para a janela, vejo pelo reflexo do
vidro Madeleine no canto, atrás do batente da porta. Acho que ela não vai mais tentar se encostar na
porta e nem correr, apesar dos últimos episódios entre nós.
Volto a tocar, percebendo quando ela começa a entrar na sala e a olho de cabeça baixa,
virando de leve e cerrando os olhos. Ela abre um sorriso amarelo, de desculpa, e noto seus ombros
se encolherem.
— Oi — murmura. — Já estou indo. — Ela se vira.
Rapidamente paro de tocar e levanto o rosto.
— Pode ficar. Não incomoda.
Ela suspira e para. Cerro a mandíbula esperando suas frases malcriadas, mas sou
surpreendido quando ela gira o corpo para a sala, e prefere ficar encostada no batente calmamente
para não fazer a porta correr e fazer barulho. Já percebi que ela é estabanada.
— Chega mais perto. Eu não mordo. — Não era para eu pensar sacanagem ao dizer isso, no
entanto fica difícil quando estou vendo uma mulher linda na minha frente com um roupão que cobre
sua camisola de seda que vai até os pés descalços.
Merda. Ela está querendo o quê?!
Madeleine sorri e, enquanto caminha até o piano, até a mim, noto que ela está incomodada
com alguma coisa. Parece cansada. É inevitável não pensar que os últimos acontecimentos entre nós
abalaram seus sentimentos e confiança. Fiz aquela cena ridícula de pedir para segurar minha mão e
confiar em mim, mas não sei se funcionou. Sou um crápula quando quero, afinal antes disso falei que
o pai dela não gosta dela. Não que não seja verdade, mas nenhum filho gosta de saber que o pai não o
ama. Por isso não pretendo ser pai. Não sei amar ninguém.
— Algum problema? — questiono quando ela fica perto do piano e acaba apoiando os
cotovelos em cima, com as mãos no rosto.
Ela é uma graça, sinceramente.
— Não — responde baixo.
Cerro os olhos, encarando-a, tentando ler sua reação.
— Você é terrível mentindo.
— Mas é verdade. Não tem nada de errado comigo.
— Se você está dizendo.
— É sim — diz rápido.
Sento-me, voltando a tocar e olho de relance quando ela sorri.
— Pode tocar aquela? Era tão bonita.
Óbvio que prefere mudar de assunto e escolhe o tom de voz amigável e próximo. Ela pode
não ser uma Lozartan, mas quanto mais fica aqui dentro, mais astuta está ficando.
— Posso — respondo concentrado nas teclas do piano. — Eu também gosto dela.
— Qual o nome? Eu pensei que era uma que minha mãe gosta, mas não.
E agora temos um relaxamento do muro que nos separa. Sei que tenho o meu próprio muro,
erguido não apenas para ela. Para o mundo inteiro, que flexibilizo para Marinne às vezes.
— Se chama Piace Pieca, do Bill Evans. É muito bonito.
— É calma. Fiquei surpresa de você tocar uma música deste estilo — confessa, concentrada
em meus dedos.
— Por que diz isso? — pergunto concentrado em seu rosto sonhador enquanto toco, seus
olhos sobem, encontram os meus e desvio.
Caramba.
— Primeiro, eu não pensei que você tocava piano. — Sua voz puxa minha atenção e paro de
tocar.
— Então para quê eu teria um? — Franzo a testa.
— Para enfeitar, como qualquer pessoa que tem muito dinheiro e não sabe onde enfiar.
Solto uma risada irônica.
— Eu não sou esse tipo de pessoa.
— Eu sei. Eu sei. Você é único.
Balanço a cabeça e torço a boca, irritado.
— E segundo, fiquei surpresa de você tocar algo tão delicado e bonito. Diferente do...
— De quem?
— Um homem que eu conheço. — diz rápido, como uma desculpa e é claro que está
mentindo, mas não me interessa quem ela conhece ou conheceu. — Ele tem um perfil parecido com
você e só... que toca coisas tristes, melancólicas. Achei que você faria esse tipo de homem. Ou rock
and roll.
— Porque eu sou um matador sem coração.
Ela limpa a garganta e mexe as sobrancelhas, incomodada.
— Tipo isso — solta rápido, sem pensar e completa: — Mas eu pensei melhor e talvez você
toque esse tipo de música para fugir desse mundo terrível que vivemos, e não estou falando da
Famiglia e sim do mundo todo.
Eu não gosto de como ela consegue me entender. Isso é desconfortante.
— Ou eu tenho um bom gosto.
Ela ri e faz uma graça com os olhos. Acho que uma careta.
— Está bem, Travis, é por causa disso. — Ela solta a respiração. — Pode ficar
despreocupado que ninguém vai saber que você é um pianista sensível e brilhante.
Brilhante? Acho que ela está exagerando ou não tem noção nenhuma sobre tocar piano. Eu
não toco tão bem assim. Isso aqui é um passatempo e justamente para eu me acalmar, esquecer o
mundo. Minhas frustrações, raiva e ultimamente ela. Os Beluzzo deram uma reviravolta no meu
cotidiano. Edgar foi o estopim, a mãe ainda não tenho sinal e ter Madeleine e sua boca sem filtro,
está consumindo meus dias, minhas noites. As drogas dos meus pensamentos.
— Você conhece alguma de Bach? — Sua pergunta me tira do transe.
— Conheço algumas, mas não toco tão bem. São notas difíceis.
— Tenta aí — sugere com um sorriso secreto.
Chegando ao topo da escada, deixo ela passar à frente. Ficamos até tarde lá embaixo, eu
tocando para ela. Descobri que ela adora os clássicos e até me diverti quando saí do piano e ela
tentou tocar. Foi terrível.
Paramos em frente à porta do quarto dela. Madeleine suspira e vira-se para mim.
— Obrigada por... tocar para mim — diz entre sua respiração e sorri.
— Foi um prazer e nunca mais tente tocar. Você vai fazer todos os cachorros uivarem.
Ela solta uma gargalhada e eu sorrio também. Quando paramos de rir, nos encaramos, sérios.
Ela engole em seco e levanta as sobrancelhas. Minhas mãos coçam para tocá-la.
Que caralho é isso?
— Boa noite — falo apressado e vou para o meu quarto sem pensar uma segunda vez.
— Pra você também, Travis. — Escuto-a antes de bater a porta do quarto.
Meu coração está acelerado. Sinto algo indescritível. Não sei o que é. Ela me deixa... ela faz
eu me sentir um monstro enjaulado. Um animal tentando ter algo que não pode. Não quero. Não
preciso.
Minhas mãos estão suando, a garganta seca, e meu coração bate tão forte que estou preocupada
de sofrer um ataque.
— Sério, eu preciso me controlar — penso em voz alta, encarando-me no vidro da janela
enorme que tem na sala.
O problema é que eu não sei se consigo me controlar.
Esse vestido está me sufocando e muito apertado nos meus peitos. Droga! Eu não sou muito
chegada em vermelho e a merda desse pano que me cobre até os pés – mas deixando meus peitos
parecendo duas bolas inflamadas e imprensadas – é vermelho sangue. Nada apropriado para a
ocasião, para não dizer ao contrário.
Hoje é a festa do Cassino do gângster, do mafioso, o Capo que eu infelizmente tenho uma
queda tão forte quanto as Cataratas do Niágara.
Estamos no final do agosto e completo três meses dentro dos aposentos do chefão da
Lawless, e para o infortúnio da minha vida, sem sinal da minha mãe e ainda sobre a mira da Bratva.
Sendo bem franca, nada mudou nesses últimos meses, no entanto, em junho e julho algumas
coisas melhoraram, nada de mais, só que Travis começou a afrouxar um pouco minha segurança –
nisso quero dizer que saio com três seguranças sendo um deles o melhor soldado: Enzo. O que aquele
homem tem de lindo e elegante (minha melhor amiga está apaixonada por ele e o chama secretamente
de Diamante Negro. Se ele souber...), ele tem de astuto e intenso.
Embora ainda preocupado demais com tudo, Travis me deu liberdade para sair e ficar com a
minha amiga na casa dela, e sei que é porque o pai da Bárbara é o general dos soldados dele. Saio
para cortar cabelo, fazer compras com Marinne – só aconteceu duas vezes, mas entra na lista –, fazer
as unhas, ir à livraria comprar livros e depois sapatos e tudo o que eu quero. Ah, também estou
liberada para gastar um pouco de dinheiro nos cassinos dele, que, pensando bem, não gasto nada, já
que o dinheiro é dele. Eu só vou jogar um pouquinho e me divertir no SPA do Bellagio.
Mas Travis ainda não confia em mim no sentido de eu não me meter em encrenca. Ele vive
falando isso para mim e por isso duvido que arrume um trabalho ou algo de útil para eu fazer da
minha vida fora dessa casa, ou dos seus soldados. Mas acredito que uma hora ele vai confiar. Eu não
tenho dado mais dor de cabeça para ele. Não tentei fugir, não joguei na cara dele o fato de todo
dinheiro que gasto ser dele ou brigado para ir embora. Não brigamos mais, não o vi matar mais
ninguém e passamos junho, julho e os vinte e poucos dias de agosto em harmonia. Está tudo bem,
mesmo que não tenhamos novidades sobre o paradeiro da minha mãe.
Sei lá, às vezes acho que ele tem informações, só não me passa. Enfim, nada de novidade por
aqui... a não ser que... nas noites em que eu vou assisti-lo tocar piano, o meu coração fica acelerado
de uma forma esquisita.
A cada noite que nos encontramos, conversamos e ele até tentou me ensinar a tocar piano;
depois de dizer para eu nunca mais tentar, algo mudou e, quando nos despedimos, as coisas ficam
mais estranhas ainda. Sério, acontece algo e... ou eu fujo dele, ou ele foge de mim.
Confesso que adoro a companhia dele, embora fiquemos juntos somente nessas horas. Eu o
vejo apenas no café da manhã e depois das sete, quando chega para o jantar e nas madrugas. Fora
isso, não o vejo por canto nenhum dessa casa monstruosamente grande.
Em casa, Travis vive entocado no escritório ou na casa adjacente, que eu aposto que é onde
ele “trabalha” com seus soldados. E mesmo adorando tudo isso, ainda me critico, 24 horas por dia,
por gostar dele. Por gostar do homem que ele é, mesmo sendo outro homem comigo. Contudo, isso
não banaliza de forma alguma as atrocidades que faz e seus crimes. O sangue que tem em suas mãos,
são dos seus inimigos e das alianças que faz com outras organizações tão bárbaras quanto a Lawless
ou piores. Mesmo Las Vegas não sendo tão brutal como a Blood Hands.
Mas aprendi que não é porque você faz aliança com gente errada que você é ruim de algum
jeito. A lógica de você ter que ficar perto dos seus amigos, e muito mais dos seus inimigos, para
saber quais são seus passos, na Lawless faz todo o sentido.
Se você não levar a vida como num jogo de xadrez, fica difícil sobreviver. Aprender como
os peões têm que se mover e os reis e as rainhas sobreviverem às torres, precisa de muita tática,
paciência e, de vez em quando ceder, um “quadradinho” para se esquivar.
Estou falando em enigma por que Travis está me ajudando a jogar xadrez. É, nós fazemos
tantas coisas juntos... Bem, além de ele tocar piano e eu assistir, às vezes jogamos xadrez, baralho e
Dama. Ninguém acreditaria quão legal ele é. Nem parece o mesmo homem que todo mundo teme e
eu... odiava.
Porque a verdade, é que eu não o odeio mais. Não consigo mais odiá-lo. Podem me acusar de
tudo, mas se não fosse ele, eu não estaria mais viva. Embora não seja um cavaleiro sobre um cavalo
branco e de bom coração. Travis Lozartan é o meu cavaleiro das trevas, que veio em um cavalo
negro de olhos vermelhos, sangue nas mãos e um vigor ferrenho de acabar com os homens que
querem me pegar. Ele é o meu cavaleiro. O meu herói selvagem.
Mas a questão aqui é: eu não queria ir nessa festa que vai acontecer no cassino. Ter que ver
Travis com um monte de mulheres em volta e os outros homens maquiavélicos e tudo que ele precisa
ser fora de casa, faz eu sentir um misto de ódio e amor. O Travis Capo é frio, calculista e mau.
Distante demais.
Existem dois Travis nitidamente. Dentro de casa é legal, paciente, um homem generoso e de
família. Fora de casa, o Travis chefe, o Boss, o Capo. Um trapo nojento que eu ainda ódio. Apesar de
que, quando está literalmente vestido para matar, fica ainda mais magnífico.
— Você está tão bonita. — Escuto a voz de Marinne atrás de mim e me viro.
Linda está ela. Uma menina linda e fofa com um vestido de gola alta, bem estiloso, azul-
escuro com a saia no estilo de princesa. O irmão faz todas as vontades dela. Seus cabelos castanhos,
que vão até a cintura, estão escovados e lisos. A franjinha que quase esconde seus olhos azuis tão
parecidos com os do irmão mais velho – por isso pensei que era filha de Travis. Os lábios um batom
rosinha em seu sorriso doce.
Essa menina tem algo de encantador e acho que por isso Travis é outra pessoa perto dela.
Não tem como não sermos melhores perto dela.
— Você está tão bonita, de verdade — ela repete parando na minha frente.
— Você é que está linda. Eu não estou nada de mais.
— Não vai ser isso que vão pensar — diz cheia de sugestão e cerro os olhos como
advertência.
Travis não gosta dela falando ou pensando como adulta ainda, e eu concordo. Ela precisa ser
criança enquanto pode. Ainda é novinha demais para falar frases com duplo sentido. Nosso mundo
acaba com nossa inocência rápido demais e prezar por isso é tudo que podemos fazer enquanto
pudermos.
— Está bem. Se você está dizendo — falo ajeitando a luva branca ¾. A festa é de gala.
Cassino Royal.
Ela dá um sorrisinho e pisca os olhos antes de dizer:
— Acho que Travis vai ficar de boca aberta com você hoje.
Meu coração acelera bem rápido com seu comentário e balanço a cabeça.
— Não seja boba.
— Por quê? — Ela se afasta, rindo de mim. — Por que você fica negando que gosta do meu
irmão?
— Mas isso não existe! Para de falar essas coisas, Marinne.
Ela franze a testa, nitidamente não acreditando em mim. A mesma careta que Travis faz
quando está desconfiado.
— Da próxima vez, eu tiro uma foto.
— Do que você está falando, menina?
— Daquele dia que eu mostrei as fotos do Travis quando era mais novo. Você tinha que ver
os seus olhos e o sorriso. — Dá uma risadinha. — Você chegou a suspirar. — Fica mais perto e
cochicha: — Eu sei que ele é maravilhoso, mas também cruel e, se eu fosse você, faria que nem eu.
Separe o homem da fera e, então, você verá o quão surpreendente Travis é e assim você se apaixona.
— Eu não tenho motivo para me apaixonar por seu irmão.
— Por que não? Vocês são muito parecidos. É só observar. Seriam um par perfeito.
Quando penso em responder, escuto passos e nós duas paramos no lobby da casa, um pouco
depois das escadas, e viramos para assistir Travis e Colen na companhia de quatro soldados, que não
estão à altura e elegância dos irmãos Lozartan e seus smokings.
Falando da parte técnica sobre o smoking de Travis; é de um azul-marinho quase preto, mas
no reflexo da luz percebo que é azul. As lapelas são grossas de outro tipo de tecido e elas sim são
pretas, da cor da gravata borboleta e do paletó, que é um pouco maior do que seu corpo, pois ele
nunca está desarmado.
Agora, falando da parte da perfeição que Deus fez esse homem, que eu não consigo nem
piscar os olhos, temos o seu maxilar rígido e quadrado, perfeitamente desenhado, sobre uma barba de
dois dias. As sobrancelhas grossas, que estão neutras em um olhar fixo para a frente. Os cabelos
castanho-escuros, um pouco maiores que fazem ondas e leves cachos. Ele parece rebelde, sedutor e
mais novo com esse cabelo.
Estou meio abobalhada olhando para ele e, quando percebo que Travis nota meu momento de
devaneio e admiração descabida – um pouco obcecada –, preciso olhar para o chão para não ficar
encarando demais.
Mordo meus lábios, mania de quando estou nervosa, sentindo meu coração, que não sabe bem
o que fazer: Se deve bater ou não.
Meu Deus! Ele está tão lindo que posso estar louca ou sofrendo alucinação, pois acho estou
sendo espionada. Acho, só acho, que enquanto eu estava o admirando, ele estava me olhando
também.
— Podemos ir, moças? — Colen pergunta com seu jeito zombeteiro e sempre humorado,
aproximando-se de Marinne. — Me dá a honra, senhorita? — ele diz, oferecendo seu braço para ela.
— É claro que sim, “senhorito”.
— Você nunca perde uma piada. — ele crítica de brincadeira.
Sorrio, vendo-os sair falando e rindo.
Colen faz bem a ela também, porém de um jeito mais tranquilo. Travis é mais o irmão zeloso,
a figura paterna e, às vezes, duro demais. Pelo que ela me disse, ele sempre foi o “pai” dela.
Bem cedo perdeu a mãe e o pai nunca fez questão. Marinne disse que chorou no enterro dele
não por ele morrer, mas por nunca ter sido seu pai. No entanto, diz ter sorte por Travis ser o pai que
a vida lhe deu. É uma graça ela falando dele.
Eu levanto o rosto para ver Travis, que tem os olhos em mim. Engulo em seco quando ele se
aproxima.
— Você está pronta também? — Sua voz está num tom bem grave, quase rouca.
— Aham — respondo, piscando muito rápido.
Nervosa demais, Madeleine.
Sem esperar, ele para ao meu lado e oferece seu braço.
— Colen roubou minha dama de companhia, então... — meneia a cabeça como um sinal de
desculpas — se topar ser a minha. — Indica o braço mexendo-o em minha direção.
Deixo escapar um suspiro e mordo a boca para não abrir um sorriso.
— Sem problema. Eu não tenho também... um par.
Ele fica parado em silêncio, olhando-me nos olhos e por fim diz:
— Perfeito.
Encaixando nossos braços, ele me leva para fora de casa.
No pátio gigantesco, com enormes palmeiras pela estrada que leva aos portões de ferro
preto, e muros de uns seis metros com cerca elétrica, vejo quatro carros, sendo que o segundo em
direção à saída, tem a porta aberta e Sandro parado, provavelmente esperando.
Travis nos guia até o automóvel e espera eu entrar para depois fazer o mesmo. Fico surpresa
quando não vejo Marinne e Colen.
— Eles vão no outro carro. — Travis responde minha questão silenciosa.
Assinto. Deve ser para não amarrotar a roupa – penso isso mesmo sabendo, e percebendo,
que este carro é bem grande. Dio mio. Tem até o barzinho que Travis sempre tira uma garrafa de
dentro do compartimento portátil e se serve de uísque hoje de novo. Ele bebe olhando para mim e,
dessa vez, não oferece. Sabe que vou recusar.
— Está nervosa — comenta, apoiando o copo no joelho e erguendo o queixo daquele jeito
dominante.
Balanço a cabeça negando e desvio o olhar para minhas unhas pintadas à francesinha.
— Por que você insiste em mentir para mim?
— Eu não estou mentindo, Travis. Eu não estou nervosa.
— E por que você está brincando com essas unhas, não está me olhando nos olhos e mexe o
pé direito sem parar? Sem contar que morde a boca a cada dez minutos.
Levanto a cabeça, franzindo a testa e arregalando os olhos depois.
— Você parece que esquece que eu sei ler as pessoas muito bem.
— Mm... — resmungo meneando a cabeça e suspiro. — É o vestido.
— O que tem ele? — Parece está interessado de verdade.
— É... — Seguro a respiração e fecho os olhos ao falar, para não ser tão patética. Sério,
como vou falar para um homem – absolutamente hétero – que estou incomodada com meus peitos
sendo apertados no vestido. — É... ele está — mexo as mãos na frente dos meus peitos — apertando
aqui.
Travis abre um sorriso rápido e se mexe no banco do carro. Pera lá. Ele está sentado com as
pernas abertas, o paletó desabotoado e o copo com um dedo de uísque apoiado no joelho. E ao se
mexer, ficou com as pernas mais abertas. A sedução em forma de homem.
— Eu gostei do vestido. — Cerra os olhos, enquanto passa pelo meu decote e vai descendo.
— Gosto de mulher com muita roupa porque quando tira, é como se revelasse um segredo.
Mas eu não vou tirar a roupa para ele. Oi?!
— Você pensa demais, Madeleine.
— Eu não penso demais. — Coloco força na voz. — Você que fala demais.
Balançando a cabeça, solta a respiração forte pelo nariz e descaradamente decide me ignorar,
mexendo no celular e depois olhando para frente sem nunca virar o rosto para mim, até chegar ao
nosso destino.
E quando chegamos, meu estômago começa a revirar de novo.
— Mm... — Deixo escapar um resmungo quando estou saindo do carro, o que faz Travis
finalmente me encarar e apertar minha mão, me ajudando.
— Está se sentindo mal?
— Não — respondo rápido e aprumo a postura.
Ele cerra os olhos e tomba a cabeça para o lado.
— Ainda não sei identificar o seu problema, mas lhe darei três minutos, enquanto entramos
no cassino, para tentar explicar.
— Não lhe devo satisfação.
— Madeleine — diz com um tom de advertência e suaviza, mantendo-a baixa. — Não
começa com rebeldia. Estou tentando te ajudar. Qual o problema?
Ele ainda está segurando minha mão e aperta de leve meus dedos quando eu quase tropeço
entrando no Bellagio.
— Presta atenção! Por favor. — Esse por favor foi naquele tom que odeio quando ele fala
comigo.
— Desculpa — murmuro e endireito a postura.
— Não peça desculpas. Olhe para o chão.
Ele para na recepção, me pondo pra frente segurando minha cintura – me arrepiando toda – e
fala com algumas pessoas. Passamos pelo lobby de entrada, seguimos para o salão do cassino maior
e ele nos posiciona para tirar fotos, isso sem me soltar em nenhum momento. Vejo ao longe Colen,
Marinne e Dario conversando com alguns convidados.
— Agora, por favor, fala o que houve.
— A gente está tirando foto.
Ele para de dar atenção aos fotógrafos e vira o rosto para mim, impassível e impenetrável.
Frio e distante.
— Não tem nada de mais, Travis — digo olhando em seus olhos. — Eu só...
— Está com medo porque tem algum receio de acontecer algo com você? Porque nada vai
acontecer. — Essa afirmação tem tanta certeza que sinto meu corpo ficar febril e arrepiado, e não de
uma maneira boa.
— Não é bem isso que estou sentindo, Travis. É só porque estou muito exposta.
— Está falando de novo do vestido? Do seu decote? Sinceramente — ele olha
descaradamente para os meus peitos e depois para o meu rosto — está lindo, aproveita. Você tem um
corpo maravilhoso e muitas mulheres adorariam ter o seu corpo para vestir esse vestido. Enquanto
isso, você está reclamando e enchendo meu saco, quase tropeça e dá de cara com o chão. Seja uma
boa menina e curta a festa, só um pouquinho. — O braço que ele me envolve e a mão que segura
minha cintura, puxa-me um pouco mais ao encontro do seu corpo alto, musculoso e muito cheiroso.
— Se esse é o único problema para você estar tropeçando hoje, já resolvi.
— E se não for só isso?
Esse rosto selvagem e perfeito com a mandíbula cerrada, fitando meus olhos desse jeito,
sinceramente, acabei de esquecer o que eu ia reclamar com ele.
— Depois eu resolvo. Agora eu quero que você sorria, entre e se divirta. Faça o que você
quiser, na medida do possível, é claro, e depois a gente se encontra para jantar.
— Quer dizer que a gente vai ficar separados?
— O quê?
— Eu... eu pensei que era sua dama de companhia e iria ficar... — Paro de falar porque estou
sendo patética. — Nada, esquece.
— Você quer ficar ao meu lado a noite toda? — Ele abre um sorriso quase que imperceptível
e eu poderia apostar todas as fichas que gostou dessa ideia.
— Não. Não era... Não era isso que eu quis dizer.
— Você se sente mais segura ficando comigo? Se for esse o problema, não tem motivo para
ficar com vergonha.
— Eu não disse isso.
— Não fica na defensiva — diz com sua voz de barítono, encarando-me fixamente. — Vai
ficar tudo bem. — Assim que fala isso, voltamos a dar atenção aos fotógrafos e logo entramos de vez
na festa.
Acho que essa noite vai ser longa.

— Me fala que você está com os olhos fixamente para a frente. Que você não está olhando
para nada em específico.
Franzo a testa e desvio minha atenção para a minha melhor amiga. Bárbara está linda com um
vestido branco pérola, tomara que caia, com uma flor pintada de rosa e azul. É um Gucci e parece um
vestido de criança, porém sexy, e no seu corpo alto e cheio de curvas, ficou lindo.
— O quê? — pergunto olhando para ela, que deve ter algo passando em sua mente fértil.
— Você está olhando para o Travis sem piscar já deve ter... O quê? Uns trinta, quarenta
minutos e eu estou tentando presumir o motivo.
— Não estou nada. — Fecho a cara e me sento de novo, cruzando os braços.
— Já te falaram que você é horrível mentindo? — A voz dela é calma, sem emoção, mas sei
que está debochando de mim.
— Me falaram sim — resmungo e tomo um gole grande do meu champanhe esvaziando minha
taça.
— Você dormiu com ele?
— Mas o quê? — Viro-me para ela, fazendo careta.
— Parece tão ofendida? Mm... sei.
— Estou ofendida.
— Me poupe, Madeleine. Qualquer mulher na face da Terra adoraria ir para a cama com esse
homem, e vamos esquecer o fato dele ser um criminoso assassino, que você parece nunca esquecer.
— Quem falou alguma coisa sobre isso?
— Ah, andare a merda. — Ela tira a taça da minha mão, porque estava brincando com a
borda, passando a ponta do dedo e colocando em cima da mesa, quase quebrando. — Presta atenção
no que estou falando. Você está olhando para ele quase sem piscar e, eu perguntar se você foi para a
cama com ele, não é nada.
— Não, não fui.
— Mas você quer! — Quase grita em meio a um sorriso.
— Como você disse... — falo entredentes — qualquer mulher da face da Terra adoraria ir
para a cama com Travis. E por que eu seria diferente?
Bárbara dá uma risada mais alta, bem na hora que um garçom passa, e ela pega duas taças
com champanhe.
— Vamos brindar porque dessa vez, minha amiga, eu acho que a sua virgindade tem horas
contadas.
— Não fala merda.
— Não estou falando. Afinal, ele também fica olhando para você. — Abre mais o sorriso. —
E seria épico perder a sua virgindade com Travis Lozartan. Nosso cruel Capo.
Sim. Épico e errado.
Sinto involuntariamente meus olhos arregalarem-se e, porra, meu coração precisa parar de
fazer isso. Sinto até dor com as batidas.
— Agora vamos dançar.
Bárbara se levanta, puxando-me pela mão para o salão de dança que, para minha alegria, tem
Travis dançando com uma loira alta, muito bonita, em seu vestido preto coladíssimo no corpo.
— Viu? — cochicho para a minha amiga e olho na direção deles para ela entender o que quis
dizer.
— Aquilo não é nada de mais, ragazza.
— Sério? Bárbara, como não é nada de mais, o homem que você disse que ficou olhando
para mim e eu para ele, que talvez a gente vá para a cama, está dançando com outra mulher muito
mais bonita do que eu, não tem nada de mais?
— Dio mio! Você está com ciúme, Madeleine. Então... — Ela faz uma pausa dramática
abrindo a boca, os olhos, coloca as mãos na cintura e, de repente, fica séria. — Eu pensei que você
sentisse atração por ele, não que...
— Não que o quê?
— Não que estivesse apaixonada.
— Você escuta o que fala, Bárbara Mancini?
— É claro que eu escuto o que falo e sei muito bem o que estou vendo nos seus olhos.
Madeleine, o que você sente não é só atração. Você gosta dele.
— Por que você fala isso como se eu estivesse cometendo um crime? Se... Isso for verdade, é
claro.
— Isso é verdade, e o problema de você se apaixonar por ele... — Ela levanta o rosto
fazendo um sinal negativo com a cabeça e nitidamente em lamento, por seja lá o que for.
— Será que você pode me falar o que está passando na sua cabeça? Eu não sei ler mentes.
— Não é nada de mais, amiga. Mas proteja o seu coração e eu não estou falando isso só
porque ele é um criminoso. E nós, embora tenhamos nascido nesse mundo, odiamos. Mas, como você
gosta de ficar lembrando, ele é perigoso e porque...
— Made, vem dançar comigo! — Marinne chega entre nós e pega minha mão, levando-me
para o meio da pista, literalmente.

A música fica mais calma, mais romântica e lenta, os casais se aproximam para dançar.
Bárbara está com o primo, Luciano; e Marinne dança com Colen, os pés sobre os do irmão. Quando
digo que ela é uma graça, é por isso. Ela tem um toque mágico que faz os homens dessa família
molengas. Eu, sozinha e desanimada, vou indo para a saída, no entanto, de repente sinto uma mão
segurar a minha e me viro para ver quem é.
— Dança comigo? — Travis pergunta e sinto sua voz percorrer meu corpo inteiro.
Ficar tão perto dele em uma dança, em público, não me parece algo certo. Eu já ando confusa
com meus pensamentos e sentimentos.
— Dançar?
— Duas pessoas com as mãos unidas, — fica mais perto, e a voz com um timbre de
rouquidão — mexendo os pés para lá e pra cá. — Mexe a sobrancelha. — E têm outras variações
também, se você não sabe.
O fato dele falar essa frase irônica e engraçada, com o semblante sério, me faz abrir um
sorriso sem mostrar os dentes. Esse é o Travis que, de vez em quando, toca piano para mim e baixa a
guarda.
— Está bem, mas... — Dou de ombros. — É porque...
— Vamos combinar uma coisa... — Se aproxima mais.
Levanto o rosto, surpresa e ansiosa.
— Sim... — murmuro.
— Quando você quiser falar alguma coisa que, talvez na sua cabeça, me deixaria irritado ou
você ache errado, fale mesmo assim. É bem melhor do que ficar enrolando, falando nas entrelinhas e
não completar as frases. — Seus ombros erguem-se de leve, aprumando a postura. — O que eu estou
pedindo é um pouco mais de coragem sua perto de mim, pelo menos.
Assinto e, quando ele oferece sua mão mais uma vez, vou de bom grado para a pista, dançar
uma música lenta com o todo-poderoso Travis Lozartan.
Ficamos na posição de valsa. A mão dele desliza em minha cintura bem devagar,
posicionando em minha lombar. Minha mão direita fica no seu ombro e ele pega a esquerda, unindo
nossos dedos, que fica perto do meu rosto.
O cheiro dele, a altura dele, o poder que ele emana. Travis me conduz com estilo,
sensualidade e, posso dizer, um pouco agressivo. Dentro de mim, a ansiedade me percorre e o frio na
minha barriga não passa. Preciso sugar uma respiração profunda, o que me faz sentir com mais
intensidade seu perfume. Meu coração está batendo daquele jeito que fico preocupada.
A primeira canção acaba e continuamos dançando em silêncio e sem conversar. Uma vez ou
outra, olho para cima e o flagro com o rosto erguido para frente, pensativo e distante. Seus olhos
atentos aos outros. E não acho que são bons pensamentos que rondam sua mente. Sua mandíbula está
rígida, parece até que ele queria falar alguma coisa, mas não faz.
Outra música inicia, dessa vez conheço, My Way, do Frank Sinatra, e ainda continuamos
dançando. Ele me puxa mais para os seus braços e, nervosa, sem querer piso no pé dele. Travis solta
uma risada rápida e rouca.
— Você é incorrigível — comenta com humor olhando para mim. Seus olhos passivos.
— Seria melhor dizer que sou desastrada. — Rio sem graça.
— Não querendo ser grosso, você não é só desastrada.
Os olhos dele, o sorriso, a voz. Tão próximo de mim... agora é sério, acho que vou ter um
infarto. Será que dá para ouvir de longe o meu coração batendo? Parece que estou com um soluço
preso no meio do peito. Bem no meio da caixa torácica. É bem esquisito.
— Eu não sou assim — ele fala de repente, os passos ficando mais devagar enquanto me
conduz.
— Do que você está falando?
Travis movimenta as sobrancelhas de um jeito engraçado, pensativo e me responde olhando
pra frente, menos para mim.
— Calmo.
— Você é calmo quando toca piano.
— Não foi isso que eu quis dizer. — Ainda está com os olhos distantes. — Eu não sou calmo
quando quero alguma coisa e... isso aqui é um erro, e você sabe.
— O quê? Dançar comigo é um erro? — Sinto-me bem ofendida.
Nos encaramos de novo e ele aperta meus dedos de leve, seus olhos azuis estão brilhantes,
quase cintilantes.
— Dançar com você, não. Querer você, sim.
— Me querer? — Se ele me ouve, é por sorte. Perdi a voz. Me quer?
— Você é um pouco devagar para entender as coisas, já percebi, mas eu sei que você
entendeu e talvez por isso, fica fugindo.
— Eu... — pauso balançando a cabeça e engulo em seco. — Eu não fujo mais.
— Sério? — O timbre da sua voz faz meu estômago gelar. — Acho que você não sabe
comparar fugir com ter medo e ficar apreensiva. O medo e a mentira são duas coisas muito parecidas
e, quando você estava nervosa em casa e depois dentro do carro, mentindo para si mesma que estava
só irritada com o seu decote, é porque você tem medo. Não sei do que, mas tem. — Novamente faz
uma pausa, dessa vez encarando-me e querendo me ler. — Ainda é medo de mim? Acha que eu vou te
machucar?
Desvio o olhar e foco na minha mão que está no seu ombro, os dedos brincam com a lapela
do paletó. Se eu fosse um pouquinho mais alta daria pra tocar o cabelo. Meus poucos um e sessenta e
cinco não comportam seus um e oitenta e cinco, infelizmente. Bem, o que ele disse é um pouco
verdade. Crio milhões de pretextos para no fim, ser medo o que sinto. O fato da Marinne e a Bárbara
ficarem falando o tempo todo sobre gostar dele e eu negar, é porque não era para eu sentir nada,
nunca, por um homem como ele, contudo não tenho medo dele. Tenho medo do que sinto por ele
agora.
— O que posso fazer pra você entender que eu não vou machucar você. Não sou um monstro.
— Não acho que você vai me machucar. Meu medo não é esse — respondo olhando em seus
olhos.
— Se você for franca, vai ficar com vergonha depois?
Esse homem é um bruxo. Como consegue saber o que sinto, penso e desejo?!
— Provavelmente — reafirmo minhas palavras assentindo.
— Eu entendo — diz e, quando engole em seco, vejo seu pomo de Adão subir e descer, de
um jeito sexy.
O movimento na pista de dança nos chama atenção porque todos estão saindo dela e não tem
mais música. Ouvimos o recepcionista informar que o jantar e o leilão começarão.
— O jantar já vai ser servido. Vai querer ir comigo? — Travis pergunta, ainda me segurando
como se estivéssemos dançando, mas estamos parados.
Eu estava gostando tanto. Droga! Minha alegria sempre dura pouco.
Afasto-me, saindo do seu abraço e passo as mãos do meu vestido, um pouco sem graça. Não
sabendo onde enfiar as mãos. Olhando para Travis, vejo-o enfiar as mãos nos bolsos – jogando o
paletó para trás com o movimento. Ele é tão meticuloso e elegante. Quem olha assim nem imagina o
que esse homem faz às vezes. Para todos, ele é só um magnata ricaço.
— Vem comigo. — Ele pega minha mão, levando-me não sei para onde.
Saímos do salão e chegamos perto dos soldados.
— Nos acompanhe, Enzo! — Travis ordena.
— Sim, senhor — ele responde imediatamente o que o Capo pede.
Nós seguimos para longe do cassino, pegamos o caminho para fora do hotel e passamos por
uma ponte muito linda sobre um rio artificial. Esse lugar todo é um espetáculo. Caminhamos mais um
pouco e daqui consigo ver a fonte do Bellagio. Uau! Paro rapidinho, olhando admirada a dança das
águas.
— É exuberante — murmuro quando Travis também para.
— Adoro olhar pra ela, para pensar — ele comenta olhando a fonte.
— É aqui que você anda ficando, então.
Franze a testa virando o rosto para mim.
— O quê?
Por que minha boca não tem um zíper? Ou meu batom não tem supercola? Que merda!
— Às vezes, você... não vai pra casa.
Ele volta a olhar pra frente, inspira com força e solta o ar devagar. Fica um bom tempo em
silêncio.
— Vamos. — Volta a andar na direção que estávamos.
Entramos em outra parte do Bellagio, a dos quartos apenas, e seguimos até uma porta dupla e
um corredor com várias portas. Paramos em frente a um elevador, esperamos chegar e entramos só eu
e Travis, que dá uma nova ordem:
— Não deixa ninguém me incomodar. Qualquer coisa, o Colen e o Paolo estão aí. Não sou
babá de vocês para resolver todas as coisas.
Enzo faz um gesto com a cabeça, nitidamente incomodado, e responde:
— Sim, senhor.
Eu pensei que ele fosse bater continência antes das portas de aço se fecharem. E por este
motivo, esse pensamento tão preocupante, não percebi que Travis estava me levando para a
cobertura. Só eu e ele. Ele e eu. Ai... Meu... Deus!
Encaro o chão sem saber o que fazer e mordo minha boca. Meu vestido agora parece apertar
todos os cantos do meu corpo, não apenas meus peitos. Todas as dúvidas que já tive em minha vida
rondam minha mente.
— Isso é não ter medo.
Seguro a respiração e olho para cima. Ele está virado para mim, o olhar intenso, as mãos nos
bolsos e sua postura relaxada, dominante. Ele parece tão incrível e cheiroso. Ficar dentro de um
elevador com ele não é uma boa ideia. Nunca.
— Você vai me estuprar?
O canto da sua boca curva-se levemente num sorriso perverso.
— Não, ragazza. Mulher que vai pra cama comigo é porque quer — inclina-se e murmura:
— Sempre.
Ele faz uma pausa e cerra os olhos.
— Como você consegue dizer que confia em mim, se ao ficar a sós comigo só falta suar frio?
— Uma acusação um tanto provocadora da parte dele.
— Eu não...
— Sabe, — a voz dele é um sussurro e apenas o assisto ficar mais perto, pressionando meu
corpo na parede do elevador, que não chega nunca na cobertura — eu sou um homem de poucas
palavras. Faço mais e falo menos.
— Uhum... — deixo escapar.
Ele cerra os olhos e se afasta. Sinto frio sem seu corpo tão perto de mim.
Percebo seu afastamento quando ele me acompanha para fora do elevador. A cobertura é
como todo o hotel, impressionante, e vejo que as portas da varanda estão abertas, as cortinas que vão
até o chão balançam com o vento e fico surpresa vendo o que tem lá fora. Uma mesa posta para dois.
— Isso é o nosso jantar? — indago meio dúbia.
Fito as costas de Travis, que está parado em frente às portas da varanda. Depois do que
parece alguns minutos, ele se vira e vem em minha direção decidido. Me pega em seus braços e cola
seus lábios nos meus. Tento resistir, mas para que mentir? Eu queria esse beijo há um mês, desde a
noite que tocamos piano juntos e ficamos tão pertos um do outro.
Travis me beija com fome, com sede, me devora, e eu aceito. Eu quero mais. Nunca fui
beijada desse jeito. Mal fui beijada. E é tão animalesco e intenso. Palavras não conseguem
descrever esse beijo, que é imoral e sedutor.
Eu quero que ele continue, mas meus pulmões começam a queimar por falta de ar. Sem a
mínima vontade, afasto-me com muito esforço dele, que não me solta. Meus pés não tocam o chão,
meu sapato escorrega, está preso só pelos dedos.
Solto entre uma lufada de ar:
— Travis?
— Sim, sou eu.
Arregalo os olhos, encarando-o. Eu posso estar maluca, mas como ele falou isso, foi quase
como se dissesse: “Sim, infelizmente sou”.
Meu corpo está arrepiado, o coração parece congelar e depois volta a bater alucinadamente,
meus olhos se fecham quando arfo com força.
Ele tenta se afastar de mim, me soltar, mas eu agarro o seu paletó pedindo silenciosamente
para que não me solte. Odeio a sensação que passa por mim agora, que faz meu corpo se arrepiar. É
tão errado eu estar aqui, eu gostar de estar aqui, e querer que ele continue. Sinto tudo e o arrepio
que parece um calafrio, é sobre tudo: medo, raiva, desejo. Pena por mim mesma, por gostar de estar
aqui e por ele ser quem é.
Porém, talvez... eu não estaria aqui. Ele não estaria aqui. Nós não seriamos nós. Não
seríamos Travis e Madeleine. O meu corpo não almejaria na calada da noite o seu. Meus ouvidos não
esperariam ouvir sua voz e os seus dedos tocando nas teclas do piano e nem o meu nariz ficaria tão
feliz de sentir o seu perfume. Eu não seria eu. Ele não seria ele. Não estaríamos aqui. Contudo, eu
tenho medo sim. Estou morrendo de medo porque nunca fiz isso, mas eu sei o que eu quero.
Ele espera, não fala nada, só respira e me segura. Me acomoda em seus braços. Fecho os
olhos apertados e eu o abraço bem forte, deitando minha cabeça em seu ombro lentamente. Ele pousa
meus pés no chão, mas não me solta. Não sei qual é o próximo passo que dou. E eu sei que ele sabe
que estou com medo. Nunca fiz isso. Eu nunca estive numa situação como esta.
— O que você quer que eu faça agora? — pergunta perto do meu ouvido, enquanto passa suas
mãos em meu corpo.
— Faça aquilo que você faz de melhor — respondo sendo bem ousada, com uma coragem
totalmente fingida.
— E o que eu faço de melhor?
— Você toma domínio sobre as coisas. Eu preciso que você seja assim agora. — Me afasto
do seu abraço para poder ver seus olhos. — Preciso que você faça isso agora, Travis, porque eu não
sei o que fazer... e tenho medo de tomar a atitude errada.
— O que seria o errado? — pergunta erguendo a sobrancelha. — Ficar... ou correr?
É inevitável engolir em seco e ponderar os prós e contras de ficar ou correr.
— Se eu ficar, sei que vou adorar, mas vou me arrepender depois. Se... eu correr, só vou me
arrepender. — Termino assentindo freneticamente.
— Touché, mia cara — ele cochicha e toca meu rosto com as costas da mão. — Vem comigo.
— Essas palavras nunca tiveram tanta importância e foram tão cheias de promessas em toda a minha
vida.

Eu sei que no mundo não existe mais príncipes encantados, e eu não sou uma donzela do século
XVIII que encontra um cavalheiro para viver este momento. Esses “sonhos” não existem para
ninguém mais, ou se acontecer é raridade. A primeira conexão de um homem e uma mulher hoje em
dia é mais brutal, sensual e selvagem do que antigamente. Um beijo valia muito mais do que um
pedaço de terra. Contudo, eu não imaginei que seria com o Capo a minha primeira vez. Que eu fosse
para a cama com Travis Lozartan. Dio mio. Para a cama de um homem e não só dormir. Eu não estou
no quarto de luxo da cobertura de um hotel para dormir com Travis.
Fecho os olhos e mordo os lábios, aproveitando esse momento. Para o meu azar, ou sorte, não
sei, Travis teve que atender um telefonema assim que chegamos ao quarto, e enquanto isso, fiquei
parada no meio do cômodo encarando, quase que absorta, a cama de lençóis brancos e macios,
vários travesseiros e uma cabeceira que parece banhada a ouro. Posso não ser uma princesa, mas
aonde estou parece sair de um castelo.
Sinto um arrepio e as mãos dele marcam sua presença e aproximação. Ele desliza
calidamente as pontas dos dedos do meio da minha coluna até conseguir apertar minha cintura. Com
um puxão, ele dá de encontro nossos corpos. Seguro a respiração ao sentir o quão excitado estou. Sua
ereção é marcante e nítida perto da minha bunda. Estar de salto hoje me deu grandes vantagens e
assim não estou tão intimidada e minúscula perto dele, e acho que ele aprecia também, pois não há
muita necessidade dele se curvar agora e beijar meu ombro.
Sua boca corre do meu ombro até o pescoço, seus dedos se enfiam em meus cabelos, puxando
de leve para trás e então, beija a ponta da minha orelha, lambe meu maxilar e logo seus dentes
arranham. Minha respiração começa a ficar turbulenta e aperto com força o pano do meu vestido,
tentando controlar meu gemido, sendo que minhas forças acabam quando ele desce sua boca de novo
até meu pescoço e passa a língua enquanto suas mãos pegam em cheio meus peitos, os apertando.
Jogo a cabeça para trás e é involuntário quando rebolo. Dio mio, eu vou arrebentar minha boca de
tanto que mordo meus lábios.
Travis me coloca de frente para ele, num movimento veloz e possessivo. Sem timidez,
aprecio-o enquanto ele remove meu vestido lentamente, seduzindo-me. Esse homem é de uma beleza
impressionante e com esse smoking chega a ser pecado, mas, sendo sincera, não consigo parar de
imaginar quando estiver nu. Meu devaneio é interrompido quando ele se afasta e me encara sério.
— O que foi? — Franzo a testa. — Algo errado?
— Não — responde rápido e sucinto. — O que você está pensando?
Dio mio! Será que eu dei bandeira?
— Que você está lindo de smoking. — Tento deter o resto do pensamento, mas falho
miseravelmente. — Mas deve ser um espetáculo nu.
Travis meneia a cabeça daquele jeito sério e dominante, as feições neutras, segura com força
minha cintura. Sem replicar minhas palavras, faz melhor. Me arranca o fôlego beijando-me,
devorando minha boca com a sua. Ele me agarra pela nuca aprofundando o beijo, parece que quer me
devorar. Não consigo me controlar e levo minhas mãos até seus cabelos; finalmente segurando e
matando minha curiosidade se são macios e... Meu Deus! Esse homem é realmente uma perfeição.
Meu coração bate tão forte por estar em seus braços. Foram tantos dias desejando isso.
Acaricio o couro cabeludo, virando meu rosto para o lado oposto do seu enquanto ele ainda me
beija. Travis me domina, estou em suas mãos em todos os sentidos. E odeio ter que fazer o inevitável
para a minha sobrevivência, afasto-me e tomo uma respiração profunda, com os olhos grudados nos
dele. Ele tem total poder sobre mim, e claro que sabe, por isso me pega, tirando meus pés do chão,
levando-me para mais perto da cama.
Pensei que fosse me jogar nela, mas ele apenas me vira como se eu fosse uma boneca, abre
meu vestido e tira. Puxando as mangas com tanta velocidade que quase rasga. Isso tira meu fôlego,
que parece um soluço.
— Tudo bem? — pergunta segurando meus ombros.
— Uhum... — Só consigo fazer isso e o puxo pela nuca de novo, unindo nossas bocas
violentamente.
Suas mãos afagam minhas costas, apertando minhas dobrinhas e arranhando possessivamente
com suas unhas curtas. Caralho! Eu vou gritar gozando se ele continuar.
Gemo bem alto, sentindo sua língua em cada pedacinho da minha boca, seus dentes no meu
lábio inferior, suas mãos procurando o fecho do meu sutiã; quando ele acha, o abre e, por fim, sua
boca está nos meus seios. Fico mole em seus braços e não ligo de parecer uma boba, só me delicio
quando sou pega e colocada na cama.
Seus impressionantes olhos azuis fitam de relance os meus antes de percorrer as laterais do
meu corpo, levanta meus pés e tira meus sapatos. E quando percebo suas intenções de abrir minhas
pernas, não deixo. Sento e o puxo pelo paletó.
— Não. Não é justo.
— Não estamos jogando. — A rouquidão da sua voz é apaixonante, mas...
— Não importa — digo com a boca perto da sua, fazendo-o se curvar até a mim.
Travis segura meu rosto e com essa aproximação, consigo puxar seu paletó e tenho meu
momento de apreciar seus braços com a camisa social branquíssima. Impecável é a palavra certa
para esse homem e o poder que ele acaba de me dar ao permitir que tire seu coldre com as duas
armas, me deixa emocionada.
Ele pega meu rosto e me beija, sinto a intensidade e não perco tempo em tirar os botões das
casas da camisa, ainda bem que ele me ajuda. E logo, segura minhas mãos, se afasta e, sem
cerimônia, termina de retirar suas roupas na minha frente.
Fica uns minutos nu, pelado dos pés à cabeça, como veio ao mundo, na minha frente, minutos
que eu passo contemplando. Seu corpo parece feito de aço coberto de carne, músculos definidos e
delineados. Não tem nada de errado ou fora do lugar, tirando as cicatrizes. Estou em frente à
perfeição, a um deus.
Tem uma tatuagem que vai do seu ombro até o braço direito, terminando um pouco acima do
pulso. Não sei identificar, são várias e bonitas até. A outra fica no antebraço esquerdo. No peitoral
atlético, vejo a pontinha da tatuagem do ombro e múltiplas cicatrizes e marcas.
Estou quase babando e curiosa sobre suas marcas, quando sou pega com força. As mãos de
Travis agarram minhas coxas, fazendo-me envolver seu quadril e assim me colocar mais para o meio
da cama. Sua boca está na minha, sedenta, as mãos acariciam minha pele e seus dedos seguem o
caminho para dentro da minha calcinha.
— Dio mio... — solto um gemido, sentindo seu dedo deslizar para dentro de mim e outro
acariciar meu clitóris. — Traaavi-vi-vis...
— Shhh... — murmura no meu ouvido. — Relaxa.
Reviro os olhos e enfio as unhas no seu braço, sentindo algo que não sei pôr em palavras.
Meu peito parece queimar conforme meu orgasmo vem surgindo, mas a pressão é interrompida.
Odeio quando ele para e se afasta.
Estou sem fôlego e ele abre a boca, parece querer dizer algo, mas não faz.
Morde minha boca, acaricia meu rosto e fica de joelhos entre minhas pernas. Com os olhos
fixos nos meus, terminando de me dominar, arrebenta minha calcinha como se fosse um simples
barbante e abre um sorriso malicioso enquanto solto um suspiro trêmulo. Só que logo dou um gemido
alto porque ele acaricia meu clitóris com dois dedos. Sente, obviamente, como estou molhada e
espalha pelos lábios do meu sexo, enfiando novamente os dois dedos com pressão, chegando a
curvá-los e me faz gritar.
Esse homem é... Porra!
Gozo como se tivesse descendo a montanha-russa. Nunca. Nunca. Nunca mesmo, senti isso na
vida. Podia não ter experiências com homens, mas não era uma virgem imaculada e intocável. Eu me
divertia sozinha, contudo, nada se compara a isso, e acho que nunca vai. Nem em mil anos.
Não posso me recuperar, pois ele me pega pela cintura, me vira na cama e me coloca de
quatro. Empurra meu corpo como se quisesse que eu beijasse o colchão e agarra minhas coxas,
colocando-me na posição que quer e sem pedir permissão ou...
— AH, MEU DEUS! — grito, puxando as colchas e lágrimas se formam nos meus olhos.
— Puta que pariu! — ele xinga bem alto e para os movimentos. — Eu não acredito,
Madeleine Beluzzo.
Choro baixinho, chegando a miar e tento me controlar. Sinto suas mãos falharem enquanto me
segura no lugar pela cintura e, quando ameaça sair de dentro de mim, travo meus pés nas pernas dele
e estico meus braços para trás para colocar as mãos nas suas.
— Não — balbucio.
— Não? — Ele parece realmente confuso e, com calma, desce o corpo para abraçar o meu,
deitando-nos na cama quase de lado. — Você está chorando. Por que não disse que era virgem?
— Não sei — respondo com os lábios trêmulos e escondo o rosto na cama.
— Tudo bem e... — Faz uma pausa longa. — Como você está? Fala a verdade — exige,
firme.
— Eu-eu... não sei.
Solta a respiração no meu ouvido, com raiva e pega meu queixo, vira para ele, e consegue
fitar meus olhos.
— Você está com dor? Eu não vou te comer sofrendo ou chorando. Não sou um monstro sem
alma.
Engulo em seco e encolho os ombros. Preciso ser franca e nada além disso.
— Doeu sim, mas agora só está desconfortável e... quer saber? Um dia tinha que acontecer.
— Sabe que não é assim que funciona na Famiglia.
— Travis, não se preocupe com isso. Eu quis e quero — assim que digo, rebolo fazendo seu
pau massagear meu interior, e infelizmente solto um gemido misturado com um resmungo.
Ele cerra os olhos, detendo meu movimento com sua mão grande e poderosa na minha cintura.
— Se você quer, vou fazer, mas da maneira certa.
Franzo a testa, que logo fica lívida, pois entendo o que ele quis dizer ao deslizar sua mão em
minha vagina e massagear meu clitóris, levando-me a ficar na beira do abismo e revirar os olhos.
— Se contorça de prazer — murmura com a voz rouca no meu ouvido.
Como não dá para beijar minha boca, ele chupa a pele do meu pescoço e mordisca meu
ombro enquanto lentamente ondula o corpo, para frente e para trás, penetrando-me com lentidão. Os
dedos se mantêm no meu clitóris, dando o prazer necessário para eu não pensar tanto na dor. No
entanto, ainda sinto um incômodo. Acho que se ele também não fosse tão grande ajudaria, porém
assim ele não seria tão magnífico.
As sensações, o tesão, o delicioso alargamento em meu núcleo, é ao mesmo tempo assustador
– porque é tudo novo – e alucinante. Seus dedos ganham velocidade, embora não mexa um milímetro
além do seu quadril. Posso presumir errado, mas acho que ele está com medo de me machucar, ou
não sei.
O calor aumenta, meu coração parece que vai explodir e finalmente, com mais alguns
estímulos dos seus dedos, gozo dando um grito.
Mal sinto quando Travis aproveita essa brecha para sair de dentro de mim. Não gosto disso,
só que adoro quando me deita de barriga para cima, abre minhas pernas, enfiando-se no meio e me
penetra de uma vez.
Abro a boca em espanto e aperto minhas mãos nos seus pulsos, que me prendem na cama.
Minha nossa! Agora não dói, apenas é intenso e bem-vindo.
E para sustentar uma forma de tortura, se mantém distante de mim. Pega minhas mãos e as
prende no alto com uma das suas, a outra está no meu quadril. Ele me tortura com seu vaivém, sem
me tocar nenhuma vez. Meu clitóris parece explodir, almejando contato, mas nada.
Travis me tortura. Olha em meus olhos, sabe o que preciso e não dá. O contato que tenho
onde desejo é o resvalar do seu corpo no meu quando estoca para a frente, jogando meu corpo para o
alto toda vez.
Num misto de fúria e tesão, giro minhas mãos e consigo agarrar a sua, que me prende. E
agarro com força, enfiando as unhas.
Ele cerra os olhos, desce mais o corpo e acelera entrando em mim. Lágrimas se formam em
meus olhos. Um rosnado escapa de sua boca, que raspa na minha testa de vez em quando. Ele parece
um animal, louco para ganhar a corrida e agora parece que não liga nem um pouco para mim. Seus
olhos quebram o contato, mas eu continuo encarando-o. Travis fica tão lindo, tão poderoso enquanto
me fode intensamente.
Finalmente ele me solta, deixa eu o abraçar e faz o mesmo. Jogo a cabeça pra trás gemendo
seu nome e pedindo, por favor, e nem sei o quê. Estou passando de todos os limites. Nunca senti algo
tão maravilhoso. Enfio as unhas nas suas costas e ganho uma mordida no ombro. Ele se desloca de
mim de novo, entrelaça nossas mãos e leva para o alto da cama, mas o peso do seu corpo ainda está
sobre o meu.
Tento beijá-lo, mas ele não permite. Apenas desliza sua boca na minha, passa o nariz no meu,
sua língua na minha boca, sem me beijar nenhuma vez, torturando-me. No meu ouvido ele rosna, seu
corpo consegue abrir mais minhas pernas e assim acelera os movimentos, dá estocadas ferozes.
— Cazzo! — O maldito palavrão é liberado em meio a um rugido.
Meu interior ferve, dói e repuxa. É enlouquecedor. Ele fala algo que não entendo, aperta suas
mãos nas minhas, nossos corpos se enrijecem. Sem palavras, ele exige de mim mais um pouco e com
uma estocada certeira, chegamos ao clímax como dois loucos. Gemo seu nome alto, soltando minhas
mãos das suas, faço meus braços e pernas envolverem seu corpo com toda força que me sobrou.
Travis respira fundo, deixando escapar uma lufada de ar no meu pescoço e fica um tempo parado,
congelado em cima de mim.
Não sei ao certo o que se passa em sua mente. Na minha, eu estou em inércia. Porém, noto
quando se afasta, pedindo para soltá-lo sem palavras. Faço com relutância e o assisto sair da cama,
deixando-me sozinha.
Meu peito sobe e desce enquanto tento, em vão, recuperar o fôlego. Estou soando, eufórica,
minha pressão alta e com batimentos ainda acelerados. Passo um tempo catalogando as oito lâmpadas
do lustre sobre a cama.
Sugo uma respiração forte, me sento reclamando com a dor no meio das minhas pernas, e
puxo a coberta para cima de mim, deitando-me de novo bem a tempo de vê-lo voltar do banheiro com
uma toalha enrolada na cintura.
Não consigo nada observando seu rosto. Está lívido, em branco, mesmo que a mandíbula
esteja rígida.
— Não vou poder ficar — fala parando em frente a cama, com as mãos na cintura, formando
uma visão espetacular. — Tenho um assunto importante e você sabe do leilão.
Pisco rápido e por reflexo, me encolho dentro da colcha, chegando a afundar meu corpo no
colchão.
— Tudo bem — digo sem demonstrar emoção.
Como se eu esperasse ele me abraçar e passar a noite depois de transarmos.
Travis cerra os olhos, encarando-me desconfiado e torna a falar:
— Espere aqui. Vou pedir para trazerem uma coisa para você e quando quiser, se quiser,
desça e volte para a festa.
— Se eu quiser? — Sento-me na cama, deixando sem querer meus seios visíveis.
Seus olhos vão com magnetismo para os meus peitos. Assisto-o engolir em seco e fechar os
punhos, soltando os braços ao lado do corpo. Sem jeito, volto a me cobrir e ergo o queixo, esperando
a explicação.
— Se você preferir pode ficar. Até amanhã se quiser.
Fito-o, desconfiada.
— Madeleine, só se você quiser — pondera com a voz ríspida. — É uma oferta. Sei que
gostou do quarto.
Assinto umas três vezes e sei que estou fazendo cara feia. Travis se mexe, caminha até o lado
da cama, pega suas roupas e, antes de ir se vestir, olha para mim.
— O jantar ainda está no terraço.
— Uhum.
Ele fica um tempo me olhando em silêncio, mas quando seus motivos vencem, some da minha
frente.
Sentindo-me confusa, deixo meu corpo cair na cama e pego um travesseiro para esconder
meu rosto e abafar meu resmungo alto.
— Travis? — Escuto a voz de Paolo e viro o rosto, franzindo a testa. — Você está bem?
— Estou. Por que a pergunta?
— Me diz você. — Ergue a sobrancelha. — É você quem está distraído e nem escutou te
chamar as outras cinco vezes. — Me encara curioso e avalia: — Eu sei que não gosta muito de
eventos abertos e nem que o cassino fique tão disponível ao público, correndo o risco de pessoas
que a gente não deseja entrem ou já estejam aqui, mas não é só isso que parece que está lhe
incomodando.
A máscara de frieza não é apenas para meus inimigos, para Paolo também. Ele não precisa
saber tudo que penso ou esteja sentindo, merda!
— Não tem nada me incomodando, Paolo. Eu tenho tudo sob controle.
— Tem certeza disso? — indaga descrente. — Sabe que eu posso resolver seus problemas,
seja eles quais forem.
Puxo a respiração com força e enrijeço a mandíbula.
— Não tem nada — pontuo as palavras. — Só preciso de uma bebida forte. — Sem mais,
levanto-me indo direto para o bar.
Escuto-o atrás de mim, dando ordens aos dois soldados que nos acompanham.
— Você poderia ter pedido para alguém pegar a bebida para você. Não precisa se locomover
pra isso.
— Por quê? — Olho para ele quando paro no bar e faço sinal para o barman. — Eles já
ficam o tempo todo atrás de mim andando pra lá e pra cá.
— Andam o tempo todo? Como assim, Travis?
Levanto a voz, girando meu corpo rápido para poder impor minhas palavras:
— Eu passei as últimas seis horas sentado.
Uma perturbação passa em seu rosto como um flash.
— Viu como você está distraído? — Enfia as mãos nos bolsos e meneia a cabeça. — Você
não ficou nem cinco minutos sentado ouvindo o leilão.
Porra! Tento controlar o rosnado ao me virar para o bar novamente.
— O que está te preocupando, Travis? Quem você está procurando?
Fico em silêncio ouvindo meu cão latir no meu ouvido.
— Acha que eu sou cego e não estou percebendo que você está procurando alguém? Seus
olhos varreram pelo salão o tempo todo enquanto esteve sentado e vindo pegar sua bebida — ironiza.
— Me diz quem é, que eu resolvo.
Paciência nunca foi meu forte, para nada e para ninguém, porém controlo-me para não chamar
atenção dos demais.
— Eu não vou te dizer nada — respondo baixo, mas firme e viro para ele. — Já conversamos
sobre isso. — Aproximo-me dele para baixar ainda mais o tom da voz e apenas ele me ouvir, ainda o
respeito e sei que os soldados estão perto. — Você está aqui para me aconselhar, não para mandar
em mim. Se eu estiver com algum problema, com uma coisa que esteja me incomodando, acho que eu
sou bem grandinho para resolver meus problemas.
— Eu não estou aqui para mandar em você, Travis. Apenas quero o seu bem. — Ele parece
honesto, mas foda-se.
— E eu por acaso não pareço bem?
— Para ser sincero, não. Está calado além do normal, distraído, os olhos distantes e se eu
não te conhecesse tão bem, acharia que você cheirou.
Controlo-me para não apertar o seu colarinho na frente de todo mundo.
— Apenas me acompanhe como um bom conselheiro e fique calado pelas próximas horas. —
Acho que esse recado é o suficiente para ele saber que estou puto da vida agora. — Provavelmente,
não vou querer olhar na sua cara durante uns três dias.
— Isso não é problema — pontua sério. Ele está acostumado comigo.
— Que bom.
Assim que estamos conversados, finalmente peço uma dose dupla de conhaque. Whisky hoje
é muito fraco para mim. Acho que conseguiria beber um litro de gasolina, já que estou me sentindo
incendiar mesmo.
Eu nunca cometo erros. Não sou um homem de falhas, mas falhei há algumas horas e estou
arrependido, e irei manter em segredo até conseguir resolver. O problema com Madeleine não é fácil
de solucionar e ela não é a pessoa mais fácil. Porém, existe um jeito de acertar a merda que a gente
fez naquele quarto. Porra! Só que eu duvido muito que ela vai querer... e se esse fosse o único
problema.
Já estou no terceiro copo quando me viro para o salão e a vejo entrando. Ainda bem que meu
coração acelerado não fica visível e eu sei esconder muito bem o que sinto. Termino minha bebida,
derramando na garganta com uma única golada, deixo o copo sobre o balcão do bar e caminho até
ela.
— Então, você resolveu descer.
Noto nitidamente quando seu corpo treme ao ouvir minha voz antes de parar, respirar fundo e
virar para mim erguendo o rosto. Seus olhos gritam raiva, medo e socorro. Não gosto do que vejo.
— Obrigada pela calcinha nova — agradece com frieza.
Não tenho a palavra certa para responder a isso, apenas meneio a cabeça.
— Já jantou?
— Está preocupado agora? — cospe as palavras. — E sim, eu comi aquela merda de comida
que você deixou para mim e... — Chega mais perto e seus olhos não estão nem um pouco amigáveis.
— Eu nunca me senti tão lixo como hoje e é engraçado por que... Lembro de você dizer que eu era
uma pessoa rara e que meu pai me tratava de forma errada, pois eu não merecia. — Engole a saliva
com dificuldade. — Você tem noção de que fez muito pior?
— Madeleine...
— Você me fez... — interrompe-me, embora faça uma pausa gaguejando. — Você me tratou
como... se eu fosse uma prostituta e nem sei... se consigo te perdoar por isso, Travis.
— Mas você quis continuar — digo entredentes. — Você me pediu. Quase implorou.
— Mas que merda! — ruge destilando ódio.
Ela tenta se virar e se afastar de mim, mas a seguro pelo braço.
— Por favor, me acompanhe e a gente vai poder conversar.
— Conversar sobre o quê? — murmura.
Apesar da raiva, ela se porta como eu, sendo discreta. Um dos motivos de admirá-la é por
isso, e ferrei com tudo.
— Você me diz em uma noite que eu sou especial e na outra me trata como um lixo. — Faz
uma pausa, parece pensar e por fim conclui: — Sabe, sendo bem sincera, eu não quero mais ouvir
nada de você. Pensei que fosse um homem de honra, de palavra, mas o que você fez hoje...
— Por que não me disse isso antes?
Ela pisca os olhos, perdida, balançando a cabeça e, por fim, dá de ombros.
— Lá em cima — explico. — Por que não me pediu para ficar e conversar?
— Quando eu ainda estava recobrando meus sentidos? Quando eu ainda estava tentando
assimilar todas as sensações que passavam pelo meu corpo? Você quer mesmo que eu diga o porquê?
— Perde o ar. — Pelo amor de Deus, Travis! Você é um homem inteligente, senão não seria quem
você é. Eu não pedi para você casar comigo e nem quero.
— Mas é o certo. — As palavras escapam e me arrependo.
— Só porque você tirou minha virgindade?
Eu a pego pelo braço e a levo para um canto do salão.
— Fala baixo.
— Mas eu estou falando baixo — defende-se e olha para os lados. — É você que está prestes
a fazer um show e fazendo todo mundo olhar pra gente. Eu posso não ser ninguém aqui dentro, mas
você é.
Sua frase me irrita ao extremo.
— Por que você insiste em dizer que não é ninguém?
Ela arregala os olhos e dá de ombros sem palavras.
— Eu não te deixei lá em cima porque eu queria, precisava estar aqui embaixo e pensei que
oferecer ficar no quarto era... legal. Era a melhor coisa a se fazer...
— Talvez você nunca tenha estado nessa posição — interrompe-me, mais uma vez. — Eu
entendo, mas não vou te perdoar — soa tão distante. — Não precisava me beijar e dormir comigo,
sei lá. — Ela abaixa o rosto e parece triste. — Eu só quero ir para casa agora.
— Não precisa. Fica aqui. A gente vai embora junto.
— Não quero — responde se afastando de mim, aprumando a postura. — Eu não quero mais
nada de você. Aliás, quero. A única coisa que eu quero e vou precisar é continuar na sua casa até eu
poder ir embora e nunca mais olhar para você.
— Madeleine... — Tento segurá-la pelo braço de novo, mas ela não deixa. É mais rápida do
que eu, se afastando.
— Por favor, peça para o Enzo ou outro soldado me levar para casa. E se possível, pelo
menos lá... respeite o mínimo de integridade que ainda me resta.
Algo dentro de mim corrói de raiva. Apenas concordo com um aceno, cerro o maxilar.
Levanto a mão, fazendo sinal para Enzo que está na minha cola como se fosse um carrapato.
— Por favor, leve a senhorita Beluzzo para casa.
— Sim, senhor.
Satisfeita, ela faz um aceno afirmativo com a cabeça e me dá as costas, indo embora. Enzo já
está atrás dela quando o chamo:
— Sim?
— Fica por lá. Cuida dela para mim e se ela precisar de qualquer coisa, faça. Menos levá-la
para outro lugar — ordeno sem chance de questionamento. — Não se atreva a levá-la para lugar
algum.
Leva um tempo para entender a frase, acho, mas concorda.
— Sim, senhor. Vou fazer o que manda.
Enfio as mãos nos bolsos, olhando para ela se afastando e enfim sumindo das minhas vistas.
Sinto algo que não sei identificar – raiva dela ou de mim, agonia, insegurança –, mas logo passa. Eu
não posso deixar isso acontecer. Não posso ser fraco e entrar no joguinho dela. Sei que as mulheres
gostam de confundir e, sendo franco, já estou perdido nessa conversa. Eu ofereci o que seria prudente
e ela recusou. Cazzo! Eu fiz uma merda tão grande ao ceder meu desejo por ela.

O silêncio sempre foi a melhor coisa para eu conseguir me concentrar, e estava analisando os
papéis e verificando, quando, de repente, a porta do meu quarto se abre estrondosamente. Levanto,
puxando a arma debaixo da mesa e apontando para Paolo. Infeliz. Ele era o único que saberia onde
estou. Parece que tenho um rastreador em algum canto do corpo.
— Que caralho! Não sabe bater mais, não?
— Sim, mas já tem duas semanas que você não aparece. Não trabalha e não quer saber como
anda a Lawless e...
Sento-me de volta, jogo meu corpo para trás, fazendo a cadeira reclinar e cruzo os braços
encarando-o.
— Espera aí, será que você está vendo miragem — sou irônico. — Eu estou cheio de papéis
e trabalhando neste momento.
Com sua carranca, ele cruza os braços.
— Travis, tem uma semana que você está dormindo nesse hotel. Tem uma semana que você
não vai pra casa. Tem uma semana que você nem vê a sua irmã, coisa que você faz religiosamente.
Parece que o mundo não existe mais para Travis Lozartan.
— Eu estou ocupado. A festa do Bellagio foi um pouco além em certos termos. Saiu do
controle. Estou trabalhando nisso com Smith — menciono o contador para ele entender que não estou
de brincadeira.
— Se seus inimigos vissem a forma patética que você está agora e como mente mal, ficaria
enrascado.
Fecho os olhos, perdendo a paciência.
— Fala logo o que você quer, Paolo.
— O que eu quero é que você volte à ativa, volte para casa e dê atenção a Marinne. Ela não é
minha irmã e não é irmã de Madeleine para aquela garota ter que cuidar dela.
— Ela está? — Levanto-me da cadeira.
— Está — Paolo responde seco e fazendo uma expressão confusa. — O que aconteceu com
você, Travis? Está estranho desde aquela noite da festa. Não vai me dizer que não é nada pois não
vou acreditar. Não nasci ontem.
— É uma coisa que estou tentando resolver.
— Eu nunca vi alguém tentar resolver alguma coisa trancado dentro de um hotel, mesmo que
ele seja seu e você deu a desculpa de que está apenas trabalhando. — Seu cenho enruga rapidamente,
plantando mil ideias na sua mente fértil. — Você não é homem de fugir.
— Não, não sou e no momento eu não estou fugindo. O problema está bem na minha frente.
Bem aqui.
— Está aqui? — Olha para o corredor que dá no banheiro. — Está aqui nesse hotel de quinta
categoria que você tem para se esconder?
— Paolo! — direciono minha voz de alerta.
— Ninguém sabe desse seu pardieiro e você chama essa merda aqui de escritório.
Mexe com nojo os papéis sobre a mesa que fica no canto do loft, não é nada cinco estrelas,
porém não tão ruim como ele está falando.
— Isso daqui é um chiqueiro, não um escritório como você gosta de dizer. Quantas mulheres
você fodeu essa semana enquanto esteve aqui?
Ele é o único homem que consegue ver quando estou com a guarda baixa e por isso eu faço
questão de expressar minha insatisfação de ele estar aqui, então reviro os olhos e arfo com força.
— Eu já estava indo pra casa. Só preciso resolver essas coisas aqui e já estou indo.
— Está bem, eu espero você.
— Não precisa.
— Eu sei, mesmo assim vou ficar. Adoro assistir você trabalhando também.
— Essa frase é repugnante! — reclamo e foco nos papéis.
— E a verdade é que eu gostaria de falar outra coisa com você e já que você está resolvendo
problemas, seria bom começar a resolver este outro problema.
Franzo a testa, relaxando o peso do corpo na cadeira, embora esteja fervendo por dentro.
— De que merda você está falando agora? — pergunto, soltando a caneta em cima dos
papéis.
— Valentina Ferrari. — diz sem rodeios. — Lembra-se dela ou, pelo menos, do pai dela?
— Sei muito bem quem são. Mário Ferrari era um dos melhores amigos... — Paro e me
corrijo rapidamente: — aliados, do meu pai.
— E também o consigliere de Giovanni D’Ângelo.
— E eu com isso? — Faço a pergunta entredentes, desconfiado.
— Você sabe melhor do que ninguém que a Lawless sofreu algumas baixas e, para a visão
dos interessados e aliados, nós estamos fracos e sem contar que você resgatar a senhorita Belluzzo
nos trouxe uma tensão. Você arrumou um tendão de Aquiles e, para momentos como estes, o seu pai
tinha resolvido com algumas cartas na manga.
— Que seria?
— Uma aliança nova. No caso, que você se casaria com Valentina Ferrari.
— Repense essa merda. Eu não vou me casar com o caralho de ninguém.
— Falar palavrão e mostrar a rebeldia como se você tivesse a idade da Marinne, não vai
resolver os seus problemas graves.
— Como é que você ficaria? — Levanto-me dando a volta na mesa para poder ficar na sua
frente. — Você vem do nada aqui atrapalhar o meu momento de paz.
— Que durou até demais.
— Eu posso levar quantos dias eu quiser! Eu sou o dono dessa porra. Eu sou o chefe. O seu
Capo! Se eu quiser, fico quantos dias eu bem entender dentro do meu quarto, que por sinal, resolvi
muitas coisas e você vem aqui falar de um jeito como se eu estivesse aqui fumando, cheirando e
fodendo o tempo todo sem fazer o meu trabalho. — Dou mais um único passo, intimidador. — Agora
me explica que história é essa de eu ter que me casar com Valentina Ferrari.
Primeiro ele se afasta e vai até o bar, pega uma dose de uísque e se senta no sofá bem
distante de mim. Ótimo. Cruzando os braços, sento-me na beira da mesa.
— O seu pai tinha essa carta na manga e, explicando de forma clara para o senhor, meu Capo,
o seu pai fez um acordo com Ferrari que, se um dia, um dos dois estivesse com os campos minados
ou com a guarda baixa, por alguma eventual discussão ou conflito, no caso, sua circunstância foi o
problema com Edgar Beluzzo. Você se casaria com a filha dele, Valentina. Assim manteriam a força e
união entre Las Vegas e Nova York.
Fecho os olhos e solto o ar com força. Eu nunca fui mandado para fazer nada. Meu pai me
criou para ser um homem feito e que toma suas próprias decisões. Ele pode não ter sido o melhor pai
do mundo, mas me ensinou valores, que agora estão sendo postos na mesa como se fosse merda
nenhuma.
— Eu não vou me casar com ninguém — determino encarando Paolo.
— Você não tem escolha.
— Eu não tenho escolha é o caralho! Eu não teria se tivesse tirado a sua virgindade e a
engravidado. — Dizer isso me deu uma dor de cabeça porque lembrei o meu erro. Não quero tomar
uma atitude sem falar com ela primeiro e Paolo já está me aborrecendo demais para saber sobre isso.
— Eu sei que não gosta que ninguém mande em você ou lhe dê ordens. Ou tire o seu poder de
forma alguma, mas você precisa pelo menos conversar com Mário Ferrari, senão o próprio Giovanni
virá até aqui e aí as coisas vão ficar piores. — Levanta-se, abotoando o caralho do paletó. — Você
não quer brigar com a própria Cosa Nostra tendo a Bratva incessantemente querendo seu pescoço.
Enrijeço o maxilar.
— Quando eu falei para você não resgatar Madeleine, não aceitá-la de volta e deixar o
problema para as autoridades, já que o pai dela era um policial, você não quis me ouvir, Travis.
Agora nós temos basicamente quatro problemas para lidar.
— Quatro problemas?
— Número um, como é que você vai se livrar da garota? Dois, você ainda tem que resolver
as questões com a Bratva, porque eles precisam entender que você não tem aliança ou nunca teve
com Edgar Beluzzo.
— Mas e o meu pai?
— Você precisa esclarecer que Travis Lozartan não é Vincenzo Segundo.
Assinto em silêncio. Ele está certo.
— Continuando a lista. Número três, conversar com Mário Ferrari e propor uma aliança de
outra forma, já que não quer se casar com Valentina. Apesar de que a aliança de sangue, um
casamento com herdeiros futuros, é uma das mais fortes, simples e sustentáveis da Cosa Nostra.
— Você, por acaso, se esqueceu de alguns conflitos de interesse, que mesmo com casamentos
arranjados sofreu perdas irreparáveis e por isso hoje estamos literalmente brigando por nossas
gramas?
— Não me esqueci, mas sei que você é lúcido. Sabe até que ponto pode apertar o inimigo e
ceder às chantagens.
Faço um sinal com a cabeça. Ainda bem que ele sabe quem sou.
— E número quatro e não menos importante, conversar com Giovanni D’Ângelo. Vocês
precisam selar um acordo e podem fazer churrasco juntos para mostrar que são melhores amigos.
— Você está querendo que eu, literalmente, me venda?
— Às vezes, algumas circunstâncias são necessárias para a sobrevivência e eu sei que você
não gosta do Giovanni e muito menos do Mário, mas o que a gente pode fazer, Travis? — Pausa,
demonstrando impaciência. — Eu não quero mais um problema, que seria uma guerra. Você sabe
muito bem que Vitorio Malvez casou uma das filhas com o Underboss de Tennesse. E nós temos
noção do problema que é arrumar briga com a Blood Hands.
Meu sangue sempre fervia quando ouvia o nome de Vitorio. Ele ainda pagaria pelo que fez.
— Eu sei. — Enfio as mãos nos cabelos, impaciente e fecho os olhos. — Agende uma
reunião com Mário, e o Giovanni pode vir junto.
— O certo era você ir até lá.
— Não posso sair de Las Vegas — digo olhando para ele fixamente. — Tem muitos
problemas para ser acertados aqui. Você mesmo acabou de apontá-los e a minha irmã precisa de
mim.
— Precisava de você essa semana também e você não fez nada, pela primeira vez.
Remorso não é um sentimento conhecido, mas sei reconhecê-lo.
— Você já disse que a Madeleine resolveu o problema. Por que que fica enchendo meu saco
com isso?
Paolo fecha a cara, mais uma vez, e se aproxima de mim.
— Porque um dia aquela mulher vai ter que ir embora, e aí a Marinne vai ficar sem ninguém
se você der outro ataque de existência! — esbraveja. — Me diz quem é que vai cuidar da sua irmã
melhor do que você? Eu posso tentar e até o Colen, que é um ótimo irmão, mas ninguém faz Marinne
cumprir os seus deveres e ser uma boa menina, então agora me diz, Travis: Quando Madeleine
Beluzzo sair da sua casa, o que você vai fazer?
Sinto vontade de responder, mas a minha boca não abre. Pisco, olhando para a frente sem
focar em nada.
Engulo minha ira e finalmente digo:
— Quando aquela mulher sair da minha casa, eu dou um jeito.
— Ótimo, então volte para casa — diz suas últimas palavras antes de sair e me deixar em
paz.
Tenho um sobressalto quando escuto a porta bater com força e tudo dentro de mim se
contorce. Sinto raiva. Não sei nem pôr em palavras o que sinto. Eu sou um homem de muitas
palavras. Sou um homem forte, decidido, mas agora me sinto como se o meu jogo de xadrez tivesse
dado errado. Meu peão, minha torre e meu cavalo estão se quebrando. Eu sou um rei no meio das
peças brancas, encurralado.
Recomponho-me, pego e visto meu paletó jogado na mesa, e saio do quarto ordenando:
— Vamos para casa, Luigi.

Sei que todos que não estão frequentemente dentro da Lawless, pensa que somos uma espécie
de homens frios e perversos. E na verdade, somos criados para isso mesmo. Madman não são
criados para serem carinhosos com quem quer que seja, isso apenas mostra fraqueza e um alvo
certeiro para quando for necessário. Mas a minha irmã era uma menina doce e eu gostaria que ela
fosse criada da melhor maneira possível, pelo menos enquanto criança. Assim que Marinne se tornar
adulta sei que ela saberá o seu lugar na Lawless. Depois da reunião com Paolo, agora sei mais do
que nunca, que um dia ela será uma moeda de troca para uma paz eminente, ou uma guerra. Esse
momento está chegando mais cedo do que previ.
Subo para o seu quarto com passos firmes. São sete da noite e a casa está silenciosa e vazia.
Quando chego à porta do seu quarto, a vejo aberta, bato devagar para chamar sua atenção e digo:
— Oi, baixinha.
Assim que ela me vê, levanta-se sorrindo e vem correndo direto para os meus braços,
deixando o que estava assistindo na tela do computador sobre sua escrivaninha para trás.
— Você voltou, finalmente.
— Voltei só por causa de você — falo, colocando seu cabelo atrás da orelha. — É verdade
que você não está indo para a escola?
— Eu queria ver você — responde e seus olhos ficam cheios d'água.
O ódio me domina. Ela é a única pessoa que consegue quebrar o muro que ergui para
sentimentos e fraqueza.
— Ninguém me falava onde você estava. Você não foi me buscar na escola na sexta, então eu
pensei que tinha acontecido alguma coisa grave. Ninguém queria me dizer. Ninguém, Travis! Por isso
voltei e falei que não ia para a escola. Então, me tranquei no meu quarto.
— Mas a porta estava aberta agora — digo, limpando as lágrimas embaixo dos seus olhos.
— A Madeleine acabou de sair daqui.
Eu assinto ouvindo e de novo ela me abraça.
— Ainda bem que ela estava aqui. — Dá de ombros. — Eu sei que o Colen tenta ser você
para mim, mas no dia que... Que eu não tiver mais você... Não sei o que eu vou fazer.
Vai ter outro homem. O pensamento não me agrada. Abraço-a forte e beijo o topo da sua
cabeça.
— Estou aqui agora e prometo que não vou mais me afastar. Só estava resolvendo as coisas.
— Está bem. — Ela se afasta, limpa os olhos e dá um sorriso forçado. — Você vai jantar
com a gente?
— Com a gente?
— É! A Madeleine foi fazer comida para mim com as cozinheiras.
— É mesmo? Por quê? — Estou confuso, afinal temos cozinheira.
— Eu pedi uma coisa que as meninas não sabem fazer e, por coincidência, ela sabe. Eu... —
Faz uma pausa.
— Fala.
— Eu nunca tive carinho de mãe e ela... — Marinne dá de ombros com um rosto tão feliz. —
É legal ter ela aqui. Estamos nos fazendo companhia.
— Isso é bom. — Mantenho-me distante emocionalmente.
— É sim e esses dias ela estava chorando...
— Ela estava chorando, por quê? — interrompo-a.
Marinne faz a carinha de quem deixou escapar um segredo, mas responde:
— Ela falou que é saudade da mãe dela e disse que, em breve, vai embora. — Sua feição
doce fica entristecida. — É verdade?
— Creio que sim.
— Por quê? Por que ela não pode ficar aqui com a gente?
— Porque não, Marinne.
— Porque não, não é resposta. — Fecha a cara. — Você sempre fala isso para mim.
Tento manter a paciência e me lembrar de que ela é uma criança.
— A Madeleine só está aqui provisoriamente. Você mesmo disse isso para mim, porque ela
disse isso para você. Você sabe que ela vai ter que ir embora e viver com os avós dela na Sicília,
que é o lugar mais seguro para ela.
— Eu não acredito que nenhum outro lugar no mundo é mais seguro do que ficar com você.
— Eu não sou invencível, Marinne.
— Mas você é o Capo. Todo mundo te respeita e não é louco de mexer com sua família. Ou
com um dos seus. Acho que se você quisesse que ela ficasse, deixaria. — Marinne fecha ainda mais
a expressão. — Mas eu acho que você não quer nem mesmo pensar no assunto.
— O que você quer? Que ela vire a sua babá, por acaso?
— Eu não me oporia.
Escuto atrás de mim e me viro, dando de cara com Madeleine que está com uma bandeja nas
mãos. Ficamos um tempo nos encarando sem dizer nada, e quando ela vence o duelo silencioso,
passa por mim entrando no quarto da minha irmã.
Ela coloca a bandeja na mesa, deixa o prato e o copo com suco de laranja arrumados para
Marinne, que senta com um sorriso aberto.
— Espero que a senhorita goste da comida. — diz com carinho. — Não sou cozinheira, mas
fiz com todo carinho.
— Eu sei que vou gostar. Cadê o seu prato?
— Ah... Eu não estou com fome. — Madeleine responde parecendo cansada.
— Mas eu faço questão de você comer comigo. Pensei que, quando se ofereceu para fazer
comida, sentaria aqui e comeria comigo como das outras vezes.
— Eu sei, querida, mas eu preciso... — Faz uma pausa e sei muito bem que ela está nervosa.
— Eu tenho uma coisa para fazer lá na cozinha ainda.
Marinne não fica satisfeita, mesmo assim é gentil ao dizer:
— Está tudo bem, mas faço questão da gente ver filme hoje até tarde.
Madeleine abre um sorriso e toca no nariz da minha irmã.
— Você prometeu para mim que, quando seu irmão chegasse, voltaria para a escola.
A interação delas duas é parecida com a minha e Marinne. Acho que encontrei alguém que
pode me substituir.
— Eu sei, e irei na semana que vem — Marinne responde olhando para mim. — Só vou se
ele continuar em casa. Ele pode estar me enganando. Apareceu aqui apenas para querer me levar.
Entro mais em seu quarto enquanto respondo:
— Não é bem isso, mas tudo bem. Segunda-feira você volta pra escola.
Madeleine assente com um sorriso, nem um pouco feliz para mim, mas quando vira o rosto
para Marinne é sincero. Não entendo o porquê. Ela coloca as mãos na cintura e pede:
— Agora coma a comida, senão não vamos ter filme hoje.
— Está bem! — minha irmã rebate focando no prato e dando uma garfada no macarrão.
Satisfeita, Madeleine faz um aceno com a cabeça e se vira. Sai do quarto passando por mim
sem dizer nada. Com calma fecho a porta e consigo encontrar Madeleine no topo da escada.
— Obrigado por cuidar dela. — Minha voz a faz parar e empertigar o corpo quando se
arrepia.
— Não fiz por você!— retruca, virando-se para mim. — Fiz porque eu gosto dela e ela
estava triste.
— Você também parece.
— Pareço o quê?
— Cansada.
Um pouco indecisa, ela faz que não com a cabeça.
— Impressão sua. Eu estou ótima. Só estava indo ajudar as meninas a limpar para poder ir
dormir.
— Você não vai comer mesmo? Pensei que apenas não queria ficar lá com ela. Sei que
Marinne fica distraída quando tem alguém por perto e acaba não comendo. Fala o tempo todo.
Por algum motivo isso a faz rir, contudo é bem rápido, logo levanta o rosto e me vê, ficando
séria de novo.
— Eu sei disso, mas eu não estou com fome. Só isso.
Resolvo aceitar o que ela fala e assinto.
— A gente já acabou? — As palavras saem depressa da sua boca.
Franzo a testa sem entender.
— Como assim?
— Essa conversa, a gente já acabou? Posso... me retirar?
— Por que está falando assim comigo? — Dou alguns passos, descendo as escadas,
terminando com nosso afastamento. — O que aconteceu?
Os olhos dela brilham, quase iguais aos da minha irmã quando me viu chegar, mas a emoção
é diferente.
— Nada. — responde vacilante, de novo.
Ficamos nos encarando e, quanto mais olho em seus olhos, menos sei.
— Boa noite, Travis. — Vira-se, terminando de descer as escadas basicamente correndo.
Um calafrio percorre meu corpo e fecho os punhos com raiva.

Novamente estou aqui, discutindo o suposto casamento com Valentina, porque Paolo quase deu
com a língua nos dentes para o meu avô. Se meu Boss, meu avô, o único que de fato pode me fazer
baixar a cabeça, ficar sabendo e aceitar, terei uma briga feia e com o fim de uma decisão não minha.
— Você sempre soube que teria que se casar...
— Sim, mas com quem eu quisesse — interrompo meu consigliere. — Não adianta ficar
apertando nessa tecla que eu não vou me casar com filha de ninguém para fazer aliança.
O tom da minha voz não era para ele argumentar, mas ele insiste:
— Travis! — Paolo bate com força na mesa e se levanta. — Não seja turrão, ragazzo.
— Terminamos a reunião — determino.
Deixando Paolo falando sozinho, saio da casa adjacente atravessando o quintal com passos
largos. Quando entro em casa, vejo Enzo parado no posto de vigília, que fica perto da porta.
Tomando o caminho das escadas, paro para falar com ele.
— Se alguém perguntar por mim fala que eu estou dormindo. Não quero nenhum
aborrecimento. De forma alguma quero ser interrompido. Amanhã eu resolvo o que tiver que
resolver.
— Sim, senhor.
Com um único aceno de cabeça, termino de subir as escadas. Chego ao meu quarto, fecho a
porta e retiro meu paletó e o coldre, deixando sobre a mesa. A camisa, gravata, calça e os sapatos,
abandono no sofá que tem no closet. E assim que estou livre das roupas, entro no banho.
Deixo a ducha quente cair sobre meus ombros que estão doloridos. O peso que estou
carregando é muito alto. A cada dia mais conflitos aparecem, mais aborrecimentos. Ter iniciado na
Lawless já tendo um consigliere é uma coisa boa, porém, às vezes, acho que Paolo age por si mesmo
e esquece dos meus direitos e das leis. Eu gosto dele, confio nele, mas me irrito quando se esquece
até onde pode ir suas demandas.
Saindo do banho, enrolo uma toalha no meu corpo e depois que me seco, caminho até minha
cama e me jogo, a fim de relaxar. Encontrar algum jeito para conseguir esvaziar meus pensamentos.
Com o mínimo de esforço, meus pensamentos vão para ela. E não porque fico pensando nela.
Madeleine no momento é um sacrifício para mim. Eu a desejo ardentemente e ter que ficar enganando
a mim mesmo de que não adoraria finalmente ter mais uma noite com ela, é uma tortura. Fora que a
pressão para uma atitude sobre o casamento com Valentina, azedou tudo.
Levanto-me da cama com um impulso e indo até o closet, coloco uma calça de moletom e
visto uma camisa. Calço os chinelos e saio do meu quarto, indo em direção ao dela.
Levo um tempo antes de abrir a porta e entrar. Madeleine está dormindo, deitada de lado no
meio da cama com os travesseiros em volta, um deles no meio da perna. O lençol, não sei onde foi
parar no meio da bagunça que está a roupa de cama, mas sei que mal cobre suas pernas e o seu
pijama é curto. É como se fosse um banquete exposto para mim e eu sou um mendigo morto de fome
que adoraria deliciar-me com cada pedaço.
É uma tentação ver sua bunda, cintura fina, os cabelos jogados na cama e as costas quase
nuas. Porém, só vim aqui porque queria falar com ela ou pelo menos vê-la.
Umedeço meus lábios com a língua. Preciso recobrar o juízo. Ela vai ficar assustada se me
ver aqui. Vai pensar que quero fazer o que ela me acusou da outra vez, apesar da gente ter transado
uma vez, não seria correto aparecer aqui do nada. Preciso sair do quarto e bater na porta, assim vou
parecer menos um serial killer ou um observador maníaco.
Do lado de fora, fico pensando que talvez não deveria bater na porta, mas que se dane. Eu
faço e espero ela abrir, e fico satisfeito quando escuto o barulho do lado de dentro, mais ainda
quando ela abre a porta com a cara amassada e os olhos cerrados. Uma das mãos esfrega o olho
direito e depois a cabeça.
— Oi. Está tudo bem?
Em vez de responder com palavras, apenas dou de ombros. Ela leva um tempo tentando
entender e por fim diz:
— Que entrar?
Concordo com um aceno de cabeça e, quando ela dá passagem, entro no seu quarto e espero
que ela feche a porta e se aproxima de mim. Está tão sonolenta, que acho que não tem noção das
coisas e nem de que o pijama é um pouco transparente.
— Aconteceu alguma coisa? — pergunta com a voz suave.
— Não — respondo, cerrando a mandíbula.
Mas ela fica um tempinho me olhando, duvidosa e por fim caminha até a sua cama e tenta dar
um jeito naquela situação.
— Você parece ter um sono bem... turbulento.
Ela dá uma risada e vira-se para mim.
— Acho que sim. — Engole em seco. — Eu estava com calor, mas depois senti frio e depois
senti calor de novo. — Ri baixinho. — Eu fico sempre desse jeito quando chove — aponta com a
mão para a janela — assim.
Realmente, a chuva torrencial está alta. Os relâmpagos clareiam seu quarto através das
cortinas.
— Entendo.
— Quer ver algum filme?
A pergunta dela não tem um pingo de malícia e o que eu sinto é estranho. É igual quando
Marinne faz algo e me agrada. Estou sem saber o que dizer, já que nunca ninguém faz nada gentil para
mim. Talvez nem seja gentileza. Não sei reconhecer essas coisas.
— Está bem, pode ser.
Escuto mais do que vejo quando ela solta a respiração e se vira. Terminando de ajeitar os
travesseiros, se deita e cobre as pernas, pegando o controle e ligando a tevê que fica em frente à sua
cama.
— Você vai ver daí?
Volto minha atenção para ela, esquecendo a tevê.
— Não, eu... Você quer que eu deite do seu lado?
Madeleine fica uns bons segundos me encarando. Para um homem que sabe ler as pessoas,
não entender seu olhar me irrita.
— Eu não mordo. — Abre um sorriso e bate no seu lado da cama, vazio.
Caralho, ela está brincando com fogo! Isso, sim.
Ignorando meus instintos totalmente, vou me sentar ao seu lado. Copio a posição dela,
deitado com as costas apoiadas na cabeceira e as pernas esticadas cobertas.
Fito o travesseiro no meio da cama nos separando. Não sei se ela fez de propósito, mas acho
um limite a ser conquistado.
— Qual filme você gosta de ver? Ação ou terror?
Levanto a cabeça e olho para ela.
— Porque só tem essas duas opções para mim?
— Porque você é homem. — Dá de ombros. — Geralmente só gostam desses tipos de coisa.
— E mulheres não?
Ela abre um pequeno e breve sorriso.
— Não! Nós gostamos de quase tudo e temos ainda mais opções. Romance, comédia,
desenhos, infantil e, claro, ação e terror. — Seu tom triunfante é animador. — É muito difícil os
homens gostarem de tudo que as mulheres gostam. Sei lá. Dizem que o mundo é feito para os homens,
mas eu discordo.
— É?
— Uhum. Para mim o mundo foi feito para as mulheres e para os homens agradarem as
mulheres. É só uma questão de perspectiva.
Pensando bem, até que é verdade.
— Então, o que você vai querer ver?
— Pode colocar um filme de ação.
— Ok — murmura.
Quando o filme começa, passo a gostar da escolha. 007 sempre é uma boa escolha. Ficamos
em silêncio, assistindo.
O tempo passa e vou percebendo que, conforme vai chegando na metade, não escuto a
respiração dela e nem sinto suas pernas se mexendo ou suas mãos. Comprovo o que eu estava em
dúvida quando olho para o lado e a vejo dormindo. A respiração baixinha, o rosto virado para o
lado, sereno.
Paro de ver o filme para assisti-la dormir. Adoro quando ela está acordada, gosto de muitas
coisas que faz, mas ela dormindo é suave. Vou odiar o dia que tiver que mandá-la embora. Vou sentir
falta dela e Marinne também.
Mas por que preciso que ela vá embora?!
Oras, a resposta é simples. Ela não quer ficar.
Fico em alerta quando ela se mexe e deixando o corpo cair, deitando-se na cama e ficando na
posição que a encontrei. O corpo virado de lado e seu sono é tão leve que a boca está aberta.
Assisti-la dormir chega a me dar sono.
Acho que devo ir para o meu quarto.
Merda. Eu nem deveria cogitar a hipótese de estar aqui. Estou cometendo tantos erros e me
perdendo nas minhas promessas. Eu disse que nunca machucaria ou decepcionaria minha irmã, e
sinto que estou prestes a fazer as duas coisas. Porém, por que estou tão incomodado com essa
situação? É apenas um sacrifício, e muitos já fizeram pior do que abrir mão de um desejo.
Preciso ir, mas antes vou comunicar a Madeleine.
Quando começo a me mexer, saindo da cama, sou surpreendido com sua voz murmurando e
sua mão segurando o meu braço.
— Não precisa ir. Pode ficar aqui.
— Eu não acho que é uma boa ideia.
Ela abre os olhos, sonolentos, e diz:
— Porque foi uma má ideia lá no hotel?
— Não vamos confundir as coisas.
— Eu não estou confundindo nada, Travis. — Me encara séria. — Por que você pode transar
comigo num dia e no outro não pode... Não pode conversar ou dividir uma cama?
Abro a boca para explicar, mas ela é mais rápida.
— Eu sei que você se sente sozinho. Eu só queria dizer que você não está. Eu estou aqui,
pelo menos por enquanto, porque não aproveita? Deita aqui um pouquinho e dorme. Amanhã é um
novo dia e aí você volta... a não falar comigo.
— Eu não estou fazendo isso.
Ela senta-se na cama e fica tão perto de mim que sinto o cheiro adocicado do seu perfume.
— Você não está ficando perto de mim nem como antes. — Mordisca a boca e desvio o olhar.
— Você se arrependeu?
— Claro que não. Por que está falando isso?
Levanta o olhar e responde:
— O seu jeito operante que está me dando essa indicação.
— Não tem nada a ver.
Ela fica mais perto de mim e toca meu rosto bem de leve.
— Fica aqui hoje — pede baixinho. — Eu prometo que não vou te tocar, nada. Eu só quero
que você durma.
— Meu medo não é o que você pode fazer, e sim eu.
— Se você fizer, eu prometo não fazer nada.
— Não está ajudando.
— Sabe de uma coisa... — Sua voz fica ainda mais suave e rouca, ela me pega de surpresa
quando monta no meu colo e pega meu rosto entre suas mãos, beijando minha boca. Um beijo rápido
e bruto. — Eu só queria que você dormisse, mas já que você não quer, a gente pode transar e você
vai dormir mais calmo lá no seu quarto. Está bom assim?
Eu prometi que não ia fazer mais.
— Madeleine — solto morrendo de vontade de tocá-la, chego a apertar as colchas da cama.
— Não posso.
— Só porque você tirou minha virgindade? Deixe de besteira, Travis.
— Não é uma besteira.
— Escuta... — ela sussurra. — Eu jamais seria usada como moeda de troca, de paz, de uma
família para a outra, então a virgindade nunca foi um prêmio. Não valho nada.
Seus olhos brilham, e uma raiva me abrange feito uma brasa.
— Então não tem nada de mais, a não ser as vias normais da honra de uma mulher. Eu quis
dar para você esta honra e você deveria se sentir e ficar feliz, não criar um bicho de sete cabeça.
— Você não está levando a sério — arfo com força. — Nunca leva nada que eu falo a sério.
— Eu estou levando! É você que está criando algo que... — Ela para de falar soltando um
riso e balança a cabeça. — Se você não quer, tudo bem, mas me diz porque veio ao meu quarto que
eu paro de fazer qualquer pergunta.
Nem eu sei o porquê de ter vindo para cá. Só sei que queria vê-la.
— De algum jeito, você me traz aquilo que sinto quando a Marinne está em casa.
Observo quando ela engole em seco e, por alguns segundos, fica sem fôlego. Piscando com
pressa, recobre a postura.
— A sua irmã representa sua paz, Travis. Aquela menina representa o humano que você tem
aí dentro e o quanto você a adora. Ela é a sua família e você não deve se sentir envergonhado disso.
Assinto e a puxo para os meus braços, apertando com força. Tenho medo até de machucá-la.
— Não é fraqueza amar as pessoas — murmura em meu ouvido. — Sentir falta da sua irmã
não tem nada de mais.
Solto o ar pela boca e, sabendo que não devo, deito a nós dois na cama e puxo o edredom
para nos cobrir. Ela fica quieta nos meus braços e fecho os olhos.
— Eu também preciso disso, sabia.
— O quê?
Madeleine fica um tempo em silêncio, respirando devagar até que sinto algo molhado no meu
peito através da camisa. Como seu rosto está perto, sei do que se trata.
— Eu me sinto sozinha— confessa. — Jogada no mundo. A Deus dará. Você tem tanta sorte
de ter seus irmãos.
Abro os olhos e enxergo seus cabelos perto da minha boca.
— Acha mesmo isso?
— É claro que sim — responde, afastando o rosto para poder me encarar.
Nossos olhos se encontram e uma energia maluca passa entre nós.
— Eu daria tudo para ter uma família que nem a sua. Irmãos, quero dizer, mas talvez eu... Sei
lá, fico pensando que eles iriam ser como minha mãe e meu pai, então de qualquer forma eu ficaria
sozinha.
— É, a gente pensar que os nossos irmãos podem puxar nossos pais, fica difícil quando
temos pais terríveis.
— Uhum — ela solta uma risada nervosa. — Por isso que eu digo que você tem sorte.
Marinne é incrível, o Colen parece ser legal e o Dario... bem, eu quase não o vejo, não posso dizer.
Mas é óbvio que eu gosto mais da Marinne.
— Ela também gosta de você.
— Que bom que ela gosta. — Sorri, porém rápido. — Vou sentir saudade dela.
— Ela falou a mesma coisa.
— Ela falou isso? Quando?
— Quando eu fui buscá-la na escola uma vez. Ela disse que gosta de você e que vai sentir
saudade quando for embora.
Ela faz um som com a garganta e deita a cabeça no travesseiro, afastando-se de mim. Suspira
e fecha os olhos.
— Ela me lembra tanto você. Só é menos rude.
— Está querendo dizer que eu sou rude?
Madeleine sorri de olhos fechados enquanto diz:
— De vez em quando é um grosseiro mal-educado, mas eu também sou. — Vira o rosto para
mim e seus impressionantes olhos azuis me fitam. — Mas eu sei que tem um coração aí dentro. Todo
mundo é um pouco chato com todo mundo. Todos nós temos defeitos. Não se sinta ofendido, está
bem?
Concordo com a cabeça. Ajeito meu corpo, deitando-me de lado e apoio minha cabeça no
meu braço, assim posso olhar para ela. De lado também minha ereção não fica tão ridícula.
— O que mais você acha? — Sei que é um risco fazer isso, porém é mais legal saber dos
segredos das pessoas enquanto estão sonolentas do que torturando. E eu jamais a torturaria.
— O que eu mais gosto na Marinne é que ela é legal comigo e a gente conversa muito. E
quando ela é mandona lembra você. — Sorri como se achasse isso divertido. — Ela me disse que
ama você. Que você é como um pai para ela. — Pausa me encarando e, quando fica constrangedor,
continua: — Isso me deixou surpresa. Essa não é a imagem que todo mundo vende de Travis
Lozartan.
— E o que falam de mim?
— Que sempre foi o melhor dos filhos para ser o novo Capo, isso se tivesse a opção de
Colen tomar seu lugar, é claro. Que o seu apelido é “O Cruel”, que seus inimigos morrem apenas
quando pedem perdão e que odeia mentiras. E... que é... muito bonito.
Ergo a sobrancelhas surpreso com o final.
— Bom saber disso.
— Você precisa concordar que tudo que falam é verdade.
— É mesmo? — indago entredentes.
— Você é um bom líder, Travis. Não gosta de mentira e já me falou isso tantas vezes, que me
pergunto se já menti, sem querer, e se você me puniria. E você sabe que é bonito.
Sem conseguir controlar, rio e mudo de assunto:
— Isso que estamos fazendo... eu gosto. Essas conversas são reveladoras.
— Mm... Sei o que está fazendo.
— O quê?
— Tudo bem, Travis. — Sinto a ironia em sua voz. — E quem me deu essa informação é
muito frio tratando-se de você e conseguiu dizer que você é lindo.
— Obrigado. Você também é linda.
— De nada. — Ela devolve com um sorriso, que fica no seu rosto e perde franzindo sua testa
e dizendo: — Você está me enganando.
— Por que está falando isso?
Ela dá uma risadinha de nervoso e imersa o corpo para baixo das cobertas.
— Você conhece muitas pessoas. Então, é um grande elogio ouvir isso, já que dormiu com
tantas mulheres. Mas não acredito.
— Acho que não conheço tantas pessoas assim e nenhuma mulher como você.
— Ah! Para com isso. Não exagera.
— Eu estou falando a verdade. Porque você pode me achar tão bonito e eu não posso achar
você também?
— Eu sei que sou bonita, mas não tão bonita assim. E você está falando isso porque está com
pena de mim. A pobre menina órfã que não tem ninguém e nem nada. Sabe que eu nunca parei para
pensar que se não fosse você eu estaria ferrada.
— Isso não é verdade. Seus avós não deixaram você desamparada, e o seu pai guardou algum
dinheiro. A casa que você morava é própria. Você não está desamparada e ainda estamos procurando
sua mãe.
— Está bem, mas estou um pouco perdida. — Pisca, perdendo a batalha do sono. — Todo
mundo fica um pouco perdido em algum momento da vida. Porém, se tiver vontade, se acha rapidinho
— suspira alto. — Acho que gosto do Travis calmo. Combina com a beleza.
— Você falando assim parece que eu sou um deus.
Ri baixinho antes de balbuciar:
— Sinceramente é quase isso. Quando eu olho para você, fico meio lesada. Perco até o que
eu estava pensando.
— Por isso que você está falando de olho fechado? — brinco.
— Provavelmente — ri de novo. — Se eu abrir o olho, vou esquecer o que eu estava falando
e só vou ficar babando.
Agora eu rio alto. Seu comentário me agrada e, involuntariamente, minha mão passa pelo seu
corpo quando me aproximo dela. Minha mão chega a subir o shortinho da sua camisola e a camisa.
Adoro a pele dela. É tão macia.
— A gente pode dormir agora? — questiona quase dormindo.
— É só relaxar.
— É só relaxar — repete sorrindo.
É, basta a gente fechar os olhos e pegar no sono. O filme está acabando e é a única luz do
quarto.
— Eu tive um pesadelo hoje — comenta de repente. — Parece que você sentiu o cheiro e
veio me salvar.
Franzo a testa.
— Mas eu pensei que eu era o bicho-papão.
— Não. Você não é não mais — ela sussurra antes de pegar no sono de vez.
O canto da minha boca se curva involuntariamente, me inclino e dou um beijo na sua têmpora.
— Bons sonhos, angele.
Certificando-se de que está num sono profundo, saio da cama lentamente. Abandonando seu
quarto com a certeza de que eu não deveria ter vindo aqui. Ela é doce demais para um monstro como
eu. Basta Marinne ter que conviver comigo.
De todos os sentimentos, o que eu menos gosto de sentir é o arrependimento. Suspiro com força
e balanço a cabeça, fechando os olhos com mil pensamentos dentro da minha mente turva.
Sinceramente, não sei se cometi um grande erro em deixar Travis entrar no meu quarto
naquela noite. Não sei o que deu em mim. Mas, naquele momento, eu senti pena dele pela primeira
vez e eu não sou uma pessoa que se comove com nada. Quando abri a porta do meu quarto, só
enxerguei um homem preocupado com alguma coisa que não quis desabafar com ninguém, solitário e
se sentindo sobrecarregado. Abri a porta também porque, na verdade, eu não conseguiria arrumar
mais desculpas para continuar ignorando-o e fingindo que ele não existe. Dio mio! Eu moro na
mesma casa que ele e, até se não fosse o caso, apenas em estar no mesmo Estado, a sua presença me
domina.
Hoje completa uma semana que ele foi ao meu quarto e tivemos aquela interação atípica. O
maior erro daquela noite foi quando me desesperei e tentei quebrar aquele muro que ele ergue na
frente da sua armadura de capo e malvado. Seu domínio, sua posse poderosa de tudo.
Eu só queria extrair um pouco de contato humano da parte dele, que não é pedir muito. Pelo
menos, não é pedir muito para uma pessoa comum, mas estou falando de Travis e eu não sei nem o
que esperar dele.
Se alguém me perguntar se ainda sinto raiva pelo... pela primeira noite da minha vida com um
homem, e esse homem ter sido Travis Lozartan, que simplesmente me ignorou, sendo sincera, sim e
muito. Ele me usou e jogou fora. Fiquei com muita raiva dele nos primeiros dias. Uma raiva que não
sabia qualificar direito a profundidade e se algum dia senti algo parecido, até mesmo pelo meu pai.
Acho que não. Eu nunca liguei pelo que meu pai fazia comigo. Eu senti sim, raiva por ser
ignorada por anos e anos por ele e depois de ter sido mandada embora. Foi como se ele tivesse me
selado, calado sobre suas falcatruas e a minha mãe nunca foi uma mãe. Sempre soube disso e aceitei
essa realidade, por isso não ligava. Não sentia nada.
Mas com Travis, eu sentia algo se quebrar e doer dentro de mim. Não porque esperava algo
melhor dele, mas porque ele me disse que eu merecia ser tratada bem. As palavras que eu disse para
ele depois que consegui recuperar minhas forças foram verdadeiras. Minha maior mágoa não foi ele
ter sido frio depois que a gente transou, e sim ele ter feito justamente o que o meu pai fez comigo
durante anos e ele mesmo não aprovava. No fim, Travis foi um hipócrita.
Tentei de todas as formas me convencer de que ele fez aquilo porque não sabe ter sentimentos
por ninguém, o que não deixa de ser verdade.
Claro que percebi como ele interage com Marinne, que apesar de serem unidos e ela adorar
ele, Travis não é o melhor irmão do mundo em questão de devolver os sentimentos. Ele não sabe
retribuir os sorrisos carinhosos da irmã, nem o amor transparente que ela demonstra para ele, muito
menos admiração.
Por isso que eu não o esperava deitar comigo depois e ficar abraçadinho e me beijar até
dormir. Ou que me desse flores no dia seguinte. Não esperava nada disso. Mas também não esperava
que ele fosse se levantar imediatamente, tomar banho e se vestir indo embora cheio de pressa. E para
piorar, ficar duas semanas sumido, sem nenhum sinal. Por um lado, foi bom porque nesse tempo
pensei.
Pensei naquela noite, como foi incrível estar em seus braços. Embora tenha doído e sido
bruto, foi prazeroso. Travis é um homem dominador sem muito esforço.
Pensei também em perdoá-lo, entender que, na verdade, toda minha raiva é só porque eu
queria que ele sentisse um pouquinho de qualquer coisa por mim, menos desprezo.
Acho que foi por isso que o deixei entrar, convidei para ver um filme e tentei barganhar
tentando ser ousada. Fiquei chocada por ele ter odiado o que eu fiz. Ele me mostrou que não é um
monstro, só está confuso, mas porra, eu também estou.
Queria ter alguém para fazer uma pergunta. Alguém que pudesse me responder no momento,
mas eu apenas estou olhando para mim, sentada na penteadeira do quarto tentando entender o que é
essa coisa que meu coração faz quando escuta a voz dele.
Depois que a gente transou, nunca mais fiquei tão perto dele, só no dia que ele veio ao meu
quarto e agora faz uma semana que sumiu de novo.
Não tem mais o piano tocando, nem as ordens dele para Marinne se comportar no café da
manhã, nem me dando boa noite depois que janta. Não tem nada. Ele sumiu e eu sinto um vazio dentro
de mim.
Odeio ter que admitir que, talvez, eu esteja me apaixonando. As lágrimas que escorrem no
meu rosto não são porque o amo loucamente, mas porque eu não deveria sentir nada. Talvez gratidão
e nada mais. Porém sinto, e não sei quando começou. Não sei ao certo identificar como é que é estar
apaixonada e nem como começa. Eu sei que gosto do homem que ele é sem sua máscara de frieza.
Escuto alguém bater na porta, despertando-me e me viro para olhar enquanto libero a entrada.
— Senhorita, o jantar está pronto. Vai descer para comer com a senhorita Marinne? —
Rosália indaga do lado de fora, com sua mão na maçaneta.
— Eu já estou indo Rosália, obrigada — respondo sem olhá-la diretamente.
Com um aceno de cabeça, ela fecha a porta e vai embora.
Recomponho-me rapidamente, virada para o espelho e secando meu rosto enquanto retoco a
maquiagem para ficar em casa. Algumas mulheres gostam de se maquiar para outras pessoas, e outras
para chamar a atenção dos homens. Eu gosto de me maquiar porque vaidade não faz mal a ninguém,
não quando ela não vem com a soberba.
Respiro fundo, engulo em seco para certificar minha respiração trêmula.
Estou pronta para jantar, olho-me no espelho e acho que está ótimo. Não tem nada e nem
ninguém que vá me olhar hoje mesmo. Acho que esse vestido branco sem graça e o meu cabelo preso
para o alto está bom. O outro motivo também dessa maquiagem é porque andei chorando esses dias e
não quero que ninguém veja minhas olheiras.
Eu me sinto perdida, sozinha. Meu pai morreu e mesmo assim aquele crápula era um nojento.
Minha mãe, não tem sinal dela ainda. Estou sendo perseguida pela mais sangrenta e sem limite
organização criminosa do mundo, dentro de outra organização criminosa, que me protege; e agora
com sentimentos não correspondidos pelo senhor desta casa. Travis não precisou fazer muito para me
ter em suas mãos, para me dominar. Sinto muito por mim mesma sentir qualquer coisa nesse momento
por ele ou por qualquer um.
Saio do quarto fechando a porta e desço as escadas, literalmente, correndo. Não estou com
pressa ou com fome, quero ver Marinne: a alegria desta mansão. Sinto por ela a mesma coisa que
Travis sente. Aquela menina me traz uma paz, um conforto, que ninguém nunca conseguiu, quer
dizer... Quando o irmão dela tocava piano para mim... Eu sinto o mesmo.
Estou ajeitando meu rabo de cavalo quando entro na sala de jantar e vejo Travis sentado na
cabeceira da mesa conversando com Marinne.
Dio mio!
Meu coração dispara enquanto meus pés estacam, congelando-me no lugar.
Eles param de falar e olham para mim. Meus olhos encontram os dele e abaixo minhas mãos
lentamente, toda sem graça.
Infelizmente eu não sou tão boa quanto ele para esconder minha reação, e por isso digo um
“boa noite” entredentes.
De cabeça baixa e neutra, vou me sentar na cadeira de frente para Marinne – onde tem um
prato exposto –, que é como se eu ficasse sentada ao lado dele.
— Boa noite, Madeleine — ele faz questão de falar comigo.
Conto até dez e pego a taça de cristal com água, tomando um grande gole. Recrimino-me
mentalmente por estar sendo uma idiota sem reação. Sem deixar em evidência meu nervosismo bobo,
respiro fundo e sorrio sem mostrar os dentes olhando para ele, cumprimentando-o diretamente.
— Boa noite, Travis. Que bom que se juntou a nós.
Ele fica um tempo me olhando daquele jeito que tenta enxergar dentro de mim. Porém, seu
interesse é interrompido quando Rosália e a menina que ajuda na cozinha chegam servindo o jantar
para nós, deixando as travessas com porções exageradas para três pessoas, que logo se justifica
quando Dario e Colen chegam.
— Boa noite, família — Colen cumprimenta com seu sorriso aberto, bem diferente do mais
novo.
Dario não é simpático. Tem as feições sempre sérias e sobrancelhas unidas como se estivesse
pensando sobre algo muito importante o tempo todo. Ao se sentar do lado de Marinne, olha para mim
com os olhos cerrados. Fico tentada a perguntar se tem algo errado, mas engulo a vontade e mesmo
assim, Colen puxando assunto com Marinne deixa a conversa na mesa leve e descontraída. Sendo
absolutamente sincera, a irmã para eles é o sopro de leveza em suas vidas de crimes e sangue.
Continuo ouvindo Marinne conversar o tempo todo com os irmãos. Travis está muito
interessado nas novidades da escola e na entrada de férias dela, em breve. Me arranca uma risada
baixa quando ele reclama que terá que arrumar um jeito de entendê-la para não enlouquecer.
— Mas a Madeleine vai ficar aqui comigo — ela diz, certa de que é isso que tem que ser
feito.
Arregalo os olhos, fitando-a e depois Travis. Colen ri baixo ao meu lado.
— Por você, tudo bem? — Travis pergunta e o olho de novo. — Quer ficar com ela?
— Pode ser — respondo e percebo que ela fica triste com a minha reação. Droga! Abro um
sorriso encarando-a. — É lógico que eu vou gostar de ficar com você. A gente pode inventar várias
coisas para fazer.
— Podemos ir à casa do vovô e da vovó — ela fala com o humor recuperado e volta a comer
sem notar as circunstâncias que me colocou.
Dio santo. Ela quer me levar na casa do Boss. Vincenzo Lozartan. Cazzo.
E pela forma que Travis reagiu, meneando negativamente a cabeça ao ouvir a ideia, acho que
ele estava com outros planos ou não gostou.

Acabamos de comer um pouco depois das oito horas, um pouco tarde e Marinne é a
primeira a se retirar da mesa. Correndo, ela vai para o seu quarto, para fazer coisas de meninas de
quatorze anos, falando aos quatro ventos que está louca pelas férias. Dario pede licença quando seu
telefone toca. Continuamos à mesa, Travis, Colen e eu. Forço-me a olhar contemplativamente o prato
de sobremesa com o mousse de morango intocado.
— Você não gosta de morango?
A voz de Colen faz meu estômago revirar, mas são os olhos azuis e intensos de Travis que faz
meu coração parecer que perdeu a funcionalidade normal.
— Madeleine, você está bem?
Continuo congelada no lugar. Esse olhar... parece que vou desmontar, então tento pelo menos
umas cinco vezes responder:
— Não — corrijo-me. — Quer dizer, sim. Eu gosto de morango, sim e estou bem sim.
Colen ri de novo e volta a comer, pegando mais um pedaço da torta.
— Se não gostasse seria bom. Sobra mais.
Travis morde a mandíbula demonstrando impaciência.
Hoje seria um ótimo dia para não ter ninguém em casa. Esse pensamento chega a ser
horrível, mas é minha vontade e parece ser a de Travis, que não tira os olhos de mim.
Um silêncio desconfortável se instala sobre nós e eu sei que depois que servem a sobremesa,
não interrompem mais. É a hora dos funcionários da casa jantarem e só depois recolhem a mesa,
quando nós já tivermos saído da sala de jantar. Então, depois que Colen sai dizendo que precisa
passar num tal de lugar chamado “Toca da Gazela” para resolver um “negócio”, literalmente estou
sozinha com Travis numa mesa para várias pessoas, numa sala enorme com duas únicas lâmpadas
acesas, deixando o ambiente carregado de intenções, com o silêncio fazendo companhia e minha torta
de morango me encarando ainda. Não consigo comer com ele tão perto de mim. Sinto-me estranha.
— Madeleine — ele me chama de novo, com a voz baixa. Pode ser loucura minha, mas
parece vacilante. — Aconteceu alguma coisa? Você não quer ficar com a Marinne?
Isso me chama atenção. Levanto o rosto e encontro seus olhos. Esse olhar...
— Não. Não é isso. Não tem nada a ver.
— Por que você está calada e encolhendo os ombros o tempo todo quando eu falo com você?
— Não estou fazendo isso — digo na defensiva.
— Acabou de fazer — afirma.
— Me desculpe — digo e tento me levantar, puxando a cadeira para trás, mas ele coloca a
mão sobre a minha, detendo-me.
— Não pedi para você ir embora. Não estou reclamando.
Eu juro que tento desviar meus olhos dos seus, mas... é muito difícil.
— Você ainda está com raiva de mim?
Meu corpo todo arrepia e faço um não com a cabeça, mexendo os ombros, meio esquisita.
Parece que estou tendo um espasmo.
— Isso foi um não?
Mordo o lábio de leve, prendendo o riso. Faço questão de assentir com a cabeça para ele ver
além de ouvir:
— Sim. Foi um não.
— Okay — diz dando um aceno. — Precisamos conversar.
Essa sentença acaba comigo.
— Sobre o quê? — pergunto e consigo me levantar quando ele solta minha mão, levantando-
se, e por isso preciso erguer o rosto para ver o seu. — O que você quer falar comigo?
— Podemos falar em outro lugar? Não quero que ninguém escute e você conhece Marinne.
De vez em quando ela fica bisbilhotando as conversas pela casa.
Acho que é por isso que ele está falando comigo tão baixo. Nem parece o grosseirão de
sempre.
— Tudo bem — concordo com um aceno de cabeça.
Sem esperar, ele repousa a mão na minha lombar e me guia para o seu escritório, fechando a
porta quando se afasta de mim. Parada, assisto-o ir até o bar e pegar whisky.
— Quer alguma coisa? — pergunta, enfiando a mão na vasilha com cubos de gelo e
colocando no seu copo.
— Não, obrigada.
Ele me oferece um olhar intrigado e logo vai se sentar na poltrona, que fica perto do sofá de
três lugares e mais outra poltrona. A mesa de centro vazia. Acho que dá para entender que é para eu
ir me sentar com ele. Escolho a poltrona que fica a quase um metro e meio de distância. A distância
do sofá é enorme. Sei que ele observa isso atentamente. Sempre tentando ler seus oponentes, embora
eu não seja nada. Não ofereço perigo a ele em nada.
— Você está com medo de mim?
— Não estou — respondo de cabeça baixa, mas logo levanto e recupero as minhas forças. —
Não é isso.
— Tem certeza?
— Tenho sim — digo fitando-o nos olhos.
— Está se sentindo bem?
— Já respondi que sim. — A distância me deixa mais confiante para falar com ele. Ainda
sinto sua força daqui, no entanto, não sinto seu cheiro que me deixa embriagada.
— Então por que está estranha?
Milhões de perguntas e respostas passam pela minha cabeça. Preciso fechar os olhos e contar
até meu eu estúpido ficar sob controle dentro de mim. Que nem ele faz muitas vezes com todo mundo.
Amansa a fera antes de dar bote.
— Eu estou ótima, Travis. Talvez você não tenha mais costume comigo, já que vive fora de
casa. — Não adianta muito não, eu presumo assim que as palavras escapam e observo suas
sobrancelhas se levantarem com surpresa e um sorriso cruzar seus lábios.
— É, realmente você não tem mais medo de mim, mas tem alguma coisa lhe incomodando.
Pisco rápido e assinto, para sua não pergunta e Travis parece aliviado. Contente. Não sei
quem fica mais satisfeito em perceber que não há mais medo entre nós, ele ou eu. Porém me pergunto:
O que há entre nós? Respeito? Compreensão? Desejo ou curiosidade?
— Alguém lhe fez alguma coisa?
Eu juro que tento não rir, mas rio e depois passo minhas mãos no rosto pouco me lixando
para a minha maquiagem e solto meus cabelos, jogando-os para o lado.
— É sério que está me perguntando isso?
Ele assente em silêncio.
— Você se esqueceu do que você me fez?
— O que eu fiz? — Ele se levanta todo-poderoso e intimidador para se sentar na ponta do
sofá, muito perto de mim.
Não! Ele é minha kriptonita e está MUITO perto.
— Pensei que a gente já estava de bem.
— Só porque você passou no meu quarto numa noite qualquer porque estava se sentindo... —
Seguro a respiração, procurando as palavras. — Eu não sei como você estava se sentindo. —
Levanto-me também e fico no meio da sala, girando em meus calcanhares, tenho ele próximo de mim,
agora mais ainda e extraio forças não sei de onde para manter a postura corajosa. — Você
simplesmente apareceu lá e...
— Você me recebeu — completa minha frase. — Você me convidou para ficar e até tentou
transar comigo. Como é que eu ia adivinhar que você ainda está com ódio de mim?
— Eu não disse que estou com ódio de você, Travis! — Coloco as mãos na cintura e puta por
ele pensar isso. — Só... estou tentando te entender também. Será que é pedir demais?
— Eu também não lhe entendo. — A rouquidão da sua voz fica forte quando ele fala mais
baixo. — Uma hora você quer subir em cima de mim, na outra me odeia e na outra não fala comigo.
Você acha que eu não percebo as coisas? — Ele me pega pela cintura, sem colocar força e fixa os
olhos nos meus, com a mandíbula rígida. — Você andou chorando. Eu não sou idiota.
— Está bancando um — consigo murmurar.
— Eu falei que ia tentar resolver o problema.
— Esse é o problema! — Empurro-o pelo peito para longe de mim. — Você está chamando a
minha primeira noite como mulher de problema. Está chamando o dia que a gente transou de erro. Um
problema a ser resolvido, como se fosse possível devolver minha virgindade ou recuperar aquele
dia.
Vejo a ira cruzar seus olhos. Dio mio. Eu não tenho juízo.
— E sendo bem sincera — sei que estou gritando, mas não me controlo —, se tivesse um
jeito de voltar no tempo eu não teria aceitado subir naquele quarto com você. Não se você estivesse
se comportando como está fazendo agora.
Ele dá um único passo e está sobre mim, agarrando-me pelos ombros e ruge entredentes:
— Não fale isso.
— Por que eu não posso falar isso, Travis? — Ergo a cabeça, impondo-me. — Eu sei que
você é o dono dessa casa e parece que é o meu dono também, porque todos os Capos dessas malditas
Famiglie acham que são donos de todo mundo, mas eu ainda tenho voz e posso falar. Eu vou falar.
— Não estou falando que você não pode dizer nada.
A calma dele me irrita.
— E eu nunca disse que sou seu dono. Tudo que eu fiz foi para te ajudar.
— É mesmo? — Abro um sorriso debochado e faço questão de mover os ombros, embora ele
não me largue. — É sério? Então você transou comigo para me ajudar?
— Não. Transei com você porque eu queria. — Ele chega seu rosto mais perto do meu. —
Transei com você porque nós queríamos. Será que eu vou ter que lembrar de novo que você pediu
para continuar?
Engulo em seco e desvio meus olhos da sua boca.
— Não precisa me lembrar desse erro.
Os olhos dele ficam negros quando falo isso.
— Não é assim que você está chamando? Um problema. Um erro.
Infelizmente, para a minha sorte, sua altura é conveniente para momentos como este. Travis
me pega pela nuca e fica um bom tempo encarando meus olhos antes de falar com tamanho esforço,
que parece que está lutando contra algo.
— Você não é um erro. Aquela noite não foi um erro. A verdade é que... — Ele procura as
palavras e seus olhos estão cada vez mais escuros. — Você nunca foi para mim uma finalidade para...
nunca quis te usar ou abusar de você. Nunca passou na minha cabeça que eu transaria com você.
— Nossa, obrigada.
— Ascoltami, cazzo — ele ruge como um animal. — O que estou querendo dizer é que eu me
sinto atraído por você e, sendo bem sincero, não queria que isso acontecesse. Ainda sou o Capo,
você ainda é uma protegida minha e o seu pai me trouxe grandes problemas, Madeleine. Eu não volto
para casa porque estou tentando achar sua mãe, estou tentando colocar as coisas em ordem. Também
estou tentando um acordo com outras Famiglie da Cosa Nostra para me ajudarem com a Bratva,
afinal de contas o seu pai foi um traidor por muitos anos dentro da Lawless e isso é um sinal de
fraqueza da minha família e agora minha também. Eu preciso arranjar um jeito de mostrar que sou
forte ainda.
Estou em choque, sem palavras.
— Eu não sabia — murmuro.
— Não. Você não sabia. Não porque eu não queria que você soubesse. Eu não quero que
ninguém saiba!
— Seus irmãos? — Duvido.
— Sim, meus irmãos e principalmente minha irmã. — Ele fica em silêncio de novo, me
encarando, e todos os sentimentos raivosos que há na face da Terra cruzam seu rosto. — O seu pai
está me forçando a pensar... me forçando a adiar acontecimentos, que eu não queria fazer agora. Tem
horas que eu acho que estou ficando igualzinho ao meu pai — ele diz isso com tanta raiva que seus
olhos lacrimejam. — E isso foi algo que eu estava determinado a nunca ser. Eu não sou um homem
nobre, Madeleine. Mas honra eu sempre tive, diferente do meu pai.
O sentimento que ele deixa transparecer agora me faz cometer a loucura de levantar a mão e
colocar em seu rosto. Ele tenta afastar, porém depois permite até que eu chegue mais perto e fecha os
olhos brevemente.
— Então não seja como ele. Resista.
Olhos ferozes me fitam antes das palavras secas saírem da sua boca.
— Vou ter que fazer. Vou abrir mão de certas coisas, Madeleine, e eu sempre soube que teria
momentos assim.
— Por que você está me dizendo isso?
Por que sinto que ele está dizendo algo que não vou gostar de ouvir?
— Há muito tempo — ele começa —, não foi apenas o seu acordo que meu pai selou com um
aperto de mão, mas com outros também e um deles, eu agora, novamente, estou sendo encurralado
para aceitar. Meu pai nunca pensou como um ser humano normal.
Ódio, apenas isso está entre nós e o faz se afastar, me soltar e ir até o bar.
— Ele só enxergava o poder — continua de costas para mim. — Por isso, ele fez vários
acordos para nunca enfraquecer, doa a quem quer que seja. E... — Faz uma pausa, entorna o líquido
de uma vez e vira-se para mim. — E eu estou lhe contando isso, porque o caldo entornou por causa
de você. Com a sua chegada a essa cassa.
— Por causa de mim?
— É! — responde e assente algumas vezes. — Você vir me procurar. Você procurar a
Lawless, mais uma vez, para salvar a todos nós das coisas que o seu pai fazia por dinheiro, está me
colocando com a corda no pescoço. Eu acho que assumi o cargo de Capo cedo demais.
— Jamais imaginei que você duvidasse de si mesmo — deixo escapar, mas ele nem liga, pois
concorda dizendo:
— Eu também.
Extraordinariamente ele caminha até a mim, me pega em seus braços, onde me deixo ser
levada. Sua mão, que está na minha lombar, desliza para cima, afagando minhas costas.
— Eu só queria que você não me desse tanta dor de cabeça.
Não tenho palavras para responder isso. Pisco encarando-o. Se ele precisa abrir mão de
alguma coisa, eu também posso. Eu não tenho futuro aqui e já queria muito ir para a Sicília, então.
— Você pode me mandar embora agora?
Isso o pega de surpresa.
— Você quer ir?
Meu coração se contorce. Sei que é por tristeza. Dio mio. Estou sendo uma boba. Na
verdade, acho que eu não sinto nada por ele, isto – essas sensações – é apenas porque ele foi meu
primeiro homem e é normal sentir alguma coisa. Ouvi as meninas da faculdade contar várias
histórias, é normal.
Fecho os olhos e passo a língua nos lábios, pois estão ressecados e fixo meus olhos nos seus
quando os abro novamente.
— Se você puder e isso te ajudar. — Balanço a cabeça que sim e dou de ombros. — Por
mim, tudo bem.
— Mas e a Marinne? — pergunta frio, distante. — Você não prometeu para ela que iria ficar?
— São quantos dias? — Engulo em seco. — Quero dizer, quantos dias ela fica de férias?
Isso o faz me soltar, se afastar. Ele enche seu copo mais uma vez e termina o líquido com um
gole.
— Um mês — responde de costas para mim.
Mais trinta dias perto dele. Dio mio.
— Então eu fico mais um mês — murmuro, olhando para suas costas e tentando entender tudo
isso.
— Se você quiser. — E novamente com mais uma golada, ele termina de beber e deixa o
copo vazio no bar com brutalidade, me assustando com o barulho. Se vira para mim e a máscara da
frieza está de volta. — Se quiser também, eu te mando embora hoje. Acho que agora com o cabelo
novo — faz uma pausa olhando para o meu rosto —, ninguém vai reconhecer você. Dá para disfarçar
com uma roupa diferente.
— É verdade — digo de cabeça baixa, assentindo.
— É — ele concorda e vai ficar atrás da sua mesa de madeira clássica e linda. Poderosa que
nem ele.
Ficamos em silêncio. Eu remoendo as últimas palavras e ele me ignorando deliberadamente,
pegando uns papéis na mesa.
— O que você acha que é melhor? — indago um tempo depois.
— Não importa o que eu acho, Madeleine. — Abre o paletó enquanto se senta e junta as
mãos na frente do corpo, apoiando os antebraços nos braços da cadeira. — Se você quer ir embora,
vá agora. Está tudo bem. Acredito que o caminho esteja livre. Não tem nada que impeça você de
ficar.
Não tem nada que me impeça de ficar?
— É verdade. Não tem nada — replico, deixando a tristeza passar e fazer seu efeito, logo
empertigo o corpo e olho para ele uma última vez antes de sair e voltar para o meu quarto. — Boa
noite, Travis.
— Boa noite — devolve o cumprimento.
Com um aceno de cabeça, abro a porta e vou embora. Subo as escadas correndo e me tranco
no meu quarto, jogando-me na cama e chorando porque talvez eu ame aquele maldito que não sente
nada por mim. Eu sou um erro. Eu sou uma mísera protegida dele, que é filha de um maldito
desgraçado que está fazendo da vida dele um inferno. Como ele pode sentir algo além de ódio
quando se trata de mim? Erro foi o meu de continuar aqui. Eu esqueci totalmente os meus
pensamentos de como toda essa droga é um nojo.

A imagem que vejo me dói profundamente. Nunca pensei que meus olhos fossem derramar
uma lágrima por um Madman, mas eu estou, e por um em particular, que me faz chorar na calada da
noite, que faz meu coração desejar não existir para não saber o que é sofrer.
Mais uma vez estou em claro, vendo as horas passarem até as estrelas sumirem e o céu ficar
claro. No entanto, dessa vez, saio da cama e desço porque ouço os acordes do piano, e preferia não
ter feito. Pegar Travis ensanguentado tocando em seu piano de cabeça baixa uma melodia tão triste,
tão obscura, me deixa ainda pior. Mas não vou embora, fico por trás da porta, dessa vez fechada.
Observo-o pela fresta e minha vontade é de ir até ele, pegá-lo nos meus braços. Parece tão
perdido. Um animal ferido. Talvez as Feras só precisem de carinho.
De repente, ele para de tocar, se levanta e vira o corpo para a porta. Cerra os olhos,
desconfiado, e não sou rápida o bastante para fugir.
Vem com passos ao meu encontro, abrindo a porta de uma vez. Seguro a respiração quando
nos encaramos e apenas espero ele dizer algo. Qualquer coisa.
Minhas mãos sujam o piano enquanto toco as teclas. O sangue em meus dedos, a prova
da minha brutalidade, do meu monstro, presente. Eu nunca cheguei em casa assim. Eu nunca me sentei
nesse piano como hoje faço. Sujo, imundo, coberto de sangue e pólvora. A melodia é tão carregada
quanto eu me sinto. O peso em meu peito me consome. Tudo me consome. As dúvidas nunca fizeram
parte de mim, mas agora sou cercado delas.
Hoje foi um dia pesado, terrível. Saí vivo porque lutei muito, por pouco quase morri. Vi
meus homens falharem, alguns perderem suas vidas, embora todas sejam indignas de serem
apreciadas. Somos criminosos, assassinos e violentos. E aqueles olhos azuis não me deixam
esquecer disso. Aquela voz meiga e vacilante, sempre me lembra o que sou e sempre vou ser: um
monstro.
Eu nunca me importei com isso, nasci para ser o que sou. Gosto de ser quem sou, às vezes até
sinto prazer em tirar vidas de quem cruzam o meu caminho indevidamente.
Ainda consigo ouvir meu cinistro falar para eu parar. Que já tinha terminado com aqueles
miseráveis dos Hechos. Eles querem por qualquer custo dominar por inteiro o Novo México. O
acordo não era esse. Eles podem ter seus negócios e viver lá, porém sob minhas envergaduras. No
fundo, não são donos de merda nenhuma, nem de suas vidas de merda. E nenhum de nós merece
misericórdia. Não merecemos recompensa, apenas uma morte dolorosa também.
Eu mais do que todos. Não tenho prazer em matar com uma bala, menos ainda quando é à
distância.
Essa noite me fez relembrar qual é o meu lugar no mundo. O que vim fazer e o que devo fazer.
Está tudo dando errado.
A maldita conversa com Madeleine não saiu como tinha previsto. Pensei que ela só estava me
evitando por ainda estar magoada por eu ter sido tão frio depois que transamos. Não entendo as
mulheres. Não aprendi a ter sentimentos quando fui treinado para ser um Madman. Sei que errei e eu
chamo aquele momento de erro por minha causa, não dela. Por querer mais e não poder ter. Não
mereço ter.
Entretanto, não pensei que ela queria fugir. Pensei que daria segurança suficiente para querer
ficar aqui por enquanto, por mais um tempo, mas ela quer ir embora. Ficar o mais longe de mim.
Bene, vou fazer o que quer. Não posso trancá-la aqui.
Meus dedos apertam com mais vigor as teclas do piano e sugo uma respiração profunda,
tentando colocar meus pensamentos em ordem e desvendar essa sensação esquisita no meu peito.
Eu já levei tiro, facada, socos e quase perdi alguns dentes. Sofri muito para virar quem sou
pelas mãos do meu pai. Apanhei com a fivela e com couro do cinto da minha mãe, que me deixou sem
comer uma vez o dia todo, apenas água. Fui preparado para a tortura sendo torturado. Amordaçado,
amarrado e estilhaçado. No entanto, não fui preparado para lidar com isso. Essa ardência no meio do
meu peito. A sensação de que vou errar. Essa merda de vulnerabilidade.
Santo Inferno! Eu sei que a minha irmã vai me odiar quando disser a minha decisão, porque
não importa, Madeleine querendo ficar ou não, estando aqui ou a quilômetros de distância, eu não
vou me casar com Valentina. Só o fato de ela ser algum tipo de limite para mim, a torna repulsiva.
Não posso aceitar isso nem com uma bala no meio da minha cabeça.
E preciso, de uma vez por todas, fazer Paolo entender que quem manda sou eu. São tantas
coisas que preciso decidir, resolver ou manipular para sair da forma certa. Odeio ter que abrir mão
de algo que eu quero, mas vou ter que fazer.
No piano, escolho uma canção que minha avó me ensinou e tocou no velório do meu pai. Eu
não estou alegre hoje, ou para comemorações. Minha alma sempre foi negra, mas hoje o dia está
nublado.
Uma das feridas debaixo do meu braço dói e o coldre fica bem em cima, fazendo pressão e
me causando dor. Sei que preciso ver essas feridas, mas dane-se, não quero agora. Não consigo me
mexer, preciso ficar um pouco aqui curtindo a minha solidão.
Abro os olhos mais uma vez e fito meus dedos sujos sob as teclas, agora manchadas de
sangue. Rosália vai ficar apavorada de manhã. Por mim ela pode queimar esse piano depois. Nada
importa. Eu não quero mais porra nenhuma. Só tenho que servir e tomar conta do território. E ainda
tem gente que inveja meu cargo, como se fosse maravilhoso todas as decisões que preciso tomar e
todas as coisas que preciso fazer. Claro, também, e todas as merdas das coisas que eu não posso
fazer.
Como um alerta, pressinto alguém me observando e noto quando o lado do meu rosto repulsa
em um sorriso impulsivo.
Mantenho-me em silêncio tocando mais um pouco e espero que ela vá embora. Que fuja de
mim como sempre faz, mas continua. Não entendo. Ela me odeia, quer estar o mais longe possível de
mim e da minha família. A merda da minha família.
Realmente, às vezes penso que foi um erro perseguir o desejo por ela. Eu nunca sou
impulsivo. Só que depois de tantas tentativas de esquecer a minha vontade de sentir sua pele, seu
cheiro mais de perto e beijá-la... Nem com Antonela dando o seu máximo, conseguiu me fazer
esquecer, e ela fez questão da última vez que a gente ficou de fazer uma stripper profissional para
mim. E o resultado foi a merda que fiz naquele baile. Fui um garoto mimado.
Fechando a tampa do piano com violência, levanto-me indo diretamente para a porta. Sei que
ela não tem tempo de fugir e, quando abro a porta, seus incríveis olhos expressivos me fitam com
espanto e com a bosta do medo. Eu cobiço, adoro e aprecio ver este olhar nos meus inimigos e
traidores, mas nela... não. A ira percorre meu corpo com violência.
Madeleine engole em seco e desvia seus olhos para o meu peito. Ela encara com os olhos
alarmados, pavor e outro sentimento que não sei identificar, meus machucados. As feridas sangrando
e manchando a camisa de linho cinza destruída. Minha camisa está rasgada no ombro direito onde
levei um golpe de uma facada, o sangue escapa por ali. Embaixo das costelas levei um tiro de raspão
e mais para o lado do corpo outra facada. Estou todo ferido nas costas também, porque traidores
apunhalam por trás. Ela pisca rápido vendo as armas no coldre e coloca a mão na boca em espanto
vendo meu pescoço machucado. Deve estar morrendo de nojo por saber que essas mesmas mãos
tocaram nela.
Ela respira fundo e tudo que eu penso sobre a vida cai por terra quando ela ergue os olhos
marejados para mim com os lábios tremendo, chorando na minha frente.
Não tenho reação. Não sei o que falar, mas sei exatamente o que ela está sentindo, afinal de
contas, Rose Marie sempre me olhava assim quando me limpava depois de apanhar da minha mãe e
do meu pai quando me tornei adolescente. Piedade.
— Não sinta pena de mim. — São minhas primeiras palavras entre nós e percebo agora que
estou rouco de tanto gritar com meus homens. — Eu mereço isso e você sabe que é verdade.
Ela não concorda ou discorda, mantém os olhos passando pelas minhas mãos, peito e depois
me encara. Abre a boca como se quisesse falar alguma coisa, mas não consegue. Só consigo ver uma
tristeza enorme que a faz cerrar os dentes e, quando tento tocar o seu rosto ela recua, se afastando de
mim. Odeio a sensação que eu sinto por isso.
— Eu nunca machucaria você — digo firme com ódio de mim.
— Eu sei — ela sussurra e fecha os olhos à espera do meu toque.
Devagar, como se pedisse permissão, toco seu rosto. Limpo uma lágrima que escorre e peço
com a voz calma.
— Não faça isso. Eu mereço isso e muito mais.
Ela assente concordando com a cabeça freneticamente, abre os olhos, agora frenéticos e
eletrizantes, e num rompante corre para longe, mas eu não a deixo se safar dessa vez. Chego até ela
rapidamente e a seguro pelos seus ombros, virando para mim. Eu queria saber as palavras certas
para não fazê-la fugir.
— Cazzo — resmungo antes de puxá-la para mim.
Deslizo minhas mãos em suas costas e subo para os ombros até segurar seu rosto para cima.
Seus olhos estão fechados apertados, como se ela tivesse medo de olhar para mim.
— Isso aqui é um erro — minha garganta dói enquanto murmuro.
Ela abre os olhos, ferozes e espantados. Mexe os lábios como se quisesse dizer algo, e por
fim morde lábio inferior.
— Eu sei que tudo o que represento causa ódio, nojo e repulsa em você. Sou tudo aquilo que
você abomina e eu queria poder deixar você ir embora livremente, mas tem algo em você que não sei
explicar, Madeleine. Não sei se consigo abrir mão.
Engole em seco, ficando em silêncio por alguns minutos e então sussurra, sem muita coragem:
— Do que você está falando?
— Essa situação entre nós é um erro e não pelo que você está pensando. Eu nunca fui um
homem nobre de qualquer forma, por isso eu não consigo abrir mão de querer você. De ter você, pelo
menos o seu corpo e a sua companhia.
— Travis, eu... — gagueja, mas eu a atropelo falando:
— Sei que você me odeia e fique feliz em saber que sinto o mesmo por mim, porém eu desejo
você.
Ela balança a cabeça, negando, mas não deixo que ela fale mais nada.
— Nós dois queremos a mesma coisa e para isso teremos que ficar juntos de verdade, pelo
matrimônio. Você pode me odiar e tudo o que eu faço pelo resto das nossas vidas, mas, sendo curto e
grosso, o leite já foi derramado, Madeleine. Não há nada na face da Terra que possa transformar
isso. O único erro daquela noite, sendo franco, foi ter a deixado lá e você precisa entender, as coisas
se transformaram em uma escala de urgência e importância muito rápido quando você me disse que
era virgem.
— Como não passou isso na sua cabeça?
— Você foi para a faculdade, apesar das regras da família e da sua mãe fazer parte da
Lawless, o seu pai a criou livre, fora dos laços da Cosa Nostra e sua mãe queria que você se
mantivesse nas regras. Você teve uma criação dupla e agora precisa escolher.
— Escolher?
— Sim. — Aceno com a cabeça. — Vai se casar comigo por que é assim que tem que ser
pelas leis da Cosa Nostra ou não. Nós podemos ter mais uma noite ou duas ou quantas quiser até
você ir embora para longe de mim e dessa casa, sem pretensões. Sem leis, que foi assim que você
agiu naquela noite e eu não.
— O que você quer dizer com isso?
— Eu nunca vi você como uma mulher fora da Cosa Nostra. Você é e, por isso, que eu disse
que precisávamos conversar, precisávamos resolver este problema. O fato de você não querer se
casar, sendo que é assim que agimos.
— Quando você falou... para a gente conversar naquela sala... era por causa... disso? — ela
pergunta e coloca as mãos nos meus pulsos, que ainda tenho minhas mãos em seu rosto.
— Não é como se tivesse outra saída, Madeleine. Embora para você seja terrível se casar
comigo, eu não vejo como algo tão terrível me casar com você.
Os olhos dela brilham quando digo isso. Ela encara como elogio e é mesmo. Ela é uma
mulher extraordinariamente linda, educada, inteligente e, se tivermos filhos, será uma excelente mãe
só pelo jeito que trata Marinne.
— Você tem certeza? Ou você só está me pedindo isso porque quer transar comigo de novo?
Curvo o canto da minha boca em um sorriso.
— Eu tenho certeza disso e não é só porque quero passar outra noite com você. É porque é
assim que tem que ser feito. Um Capo precisa de uma esposa e uma família. — Dou de ombros
tentando ser neutro e, pelo menos nessa discussão, barganhar com excelência. — Você é solteira e da
Cosa Nostra, está tudo nos conformes.
— Mas eu não tenho nada para lhe dar em troca.
— Como?
Ela se afasta de mim, tirando minhas mãos do seu rosto e suas feições são neutras.
— Homens como você, no seu posto, casam para ganhar alguma coisa e você apenas ganhará
problemas comigo. Você falou para mim e ainda não sei se é uma boa ideia. Eu posso me manter
como fora da CosaNostra. Não faz diferença para ninguém.
Que mulher teimosa!
— Então... você não quer se casar? Quer se manter aqui o quanto tempo quiser, mas sem se
casar comigo.
— É — responde assentindo com a cabeça.
Eu não gosto da resposta dela, porque realmente seria uma finalidade já ter encontrado uma
esposa. Uma que eu escolhi, que eu quero, porém ela não me quer. O que ela quer é o fácil e, sendo
bem sincero, não tem como eu lidar com a tensão entre nós. Precisa ter um fim e não sei se o que há
entre nós é apenas o orgulho, mas ele é o mais violento.
— Se a sua vontade é essa, que assim seja feita. Nós já estamos conversados. Você será... —
Procuro as palavras para um não compromisso de verdade, que ela não quer e não vou insistir. —
Você será minha namorada. — Dou de ombros e fico perto dela com alguns passos, seguro seu rosto
e raspo meus lábios nos seus. — Será minha até quando você quiser ir embora.
Seus olhos varrem meu rosto, procurando alguma coisa. Cerro a mandíbula e que se foda!
Agarro-a. Trago para os meus braços e abocanho sua boca em cheio, beijando-a até arrancar seu
juízo, porque o diabo do meu não existe mais.

Permanecemos nos beijando por longos minutos, perdidos no tempo. Minha ereção
dolorosa explode dentro da minha calça, a vontade de trepar me deixa com vertigem. Sinto uma sede
insana de entrar no seu calor desesperadamente. Fui criado para conquistar e ela pode dizer quantos
não quiser, mas eu não irei aceitar. Nem que seja a única coisa que farei com muita dificuldade, vou
dominá-la ao ponto de aceitar ficar e ser minha inteiramente.
Madeleine geme na minha boca e noto que vai perdendo a timidez quando percorre com as
mãos meus braços e pega meu rosto. Gosto da sensação do seu toque. O jeito que parece almejar
sentir minha barba crescente. Eu gosto mais ainda de ser mais alto que ela e ser mais forte para poder
levantá-la em meus braços, fazendo-a abraçar meu corpo com os braços e as pernas. Imprenso seu
corpo na parede de dentro da sala de piano e ondulo o corpo como se estivesse a fodendo. Rosno,
porque apenas sua boca não é o suficiente.
Apertando sua bunda, levo-a para o meu escritório. Fecho a porta com os pés e caminho até a
mesa, deixando-a em cima. Logo volto a devorar sua boca, sentindo a maciez dos seus lábios, a
língua quente e seus gemidos. Minhas mãos apressadas acariciam seus braços até os ombros,
enfiando os dedos nas mangas da camisola e puxando para deixar seu ombro nu. Mordo a carne
dando uma lambida depois, provocando-a. Ela geme e me agarra para não deixar o corpo cair para
trás na mesa. Acaricio seu pescoço com o nariz, sentindo seu perfume e espalmo uma das mãos em
suas costas, e a outra passo na frente do seu corpo, tirando a camisola da frente, escorregando em seu
corpo. Me afasto e vendo seus mamilos duros, passo a palma da mão nas pontas.
— Travis! — exclama apertando meus braços, enfiando as unhas de leve.
Minha boca alcança seu mamilo direito primeiro, chupando e mordiscando. Sinto seu corpo
se arrepiar e ela o mexer inquieta, pedindo mais.
Minha vontade é de foder, tirar esse tesão acumulado, essa ânsia de querê-la quase que
desesperado. No entanto, dessa vez não vou. Ela não precisa ter eu sendo um violento insensível. Vou
dar a chance de ela ter a sua segunda vez melhor do que a primeira, que ouvi com todas as letras que
arruinei. Lembrar-me disso deveria ser um freio para eu continuar, mas sou fraco. Eu a quero debaixo
de mim, chamando e gemendo meu nome.
Abrindo a boca, passo a língua do seio direito até o seu pescoço, forçando ela a pender a
cabeça para o lado. Ela é perfeita. Sua sensualidade é silenciosa, verdadeira, não ensaiada como das
mulheres que eu costumava ficar. E talvez é por isso que estou sem controle sobre a minha vontade
de tê-la.
Erguendo meu corpo, dou um beijo rápido na sua boca e abraço seu corpo, falando no seu
ouvido:
— Se segura em mim.
Madeleine suspira antes de fazer o que mando. Pego-a pelas coxas e a levo em direção ao
sofá, que, bendito seja, é enorme e vai caber nós dois.
Sem precisar pedir, deixo-a em pé na minha frente e vejo quando ela se encolhe. Ajo rápido,
não deixando-a pensar no segundo erro cometido se entregando para mim. Faço a roupa sair do seu
corpo e me abaixo. Dou beijos em seus ombros, nos seios nus, na barriga lisinha e Madeleine geme
enfiando as unhas nos meus cabelos quando a beijo sobre a seda da calcinha vermelha. Maldita cor
tentadora. Sem esforço, permito que a seda da camisola termine de deslizar por suas lindas e
torneadas pernas, livremente.
— Travis — geme e fito seu rosto a tempo de vê-la jogar a cabeça para trás.
Cazzo. Essa visão é uma tentação.
Aproximo minha cabeça de novo do seu corpo, sentindo seu cheiro e vagarosamente tiro sua
calcinha. Nunca uso da leveza para absolutamente nada. Não sou um homem com instintos delicados
na cama, nem de longe. Porém, confesso que me sinto bem em torturá-la secretamente com minha
lentidão.
Nua, linda e cheia de tesão, confirmo minhas suspeitas da sua excitação, ao deslizar dois
dedos, bem devagar, dentro dela.
— Que delícia — falo baixo. — Sua boceta está toda gulosinha para mim, vamos dar atenção
pra ela.
Ela faz um som baixo, não necessariamente um gemido, implorando, e remexe os quadris
enquanto a fodo com dois dedos. Aproximo minha boca, passo a língua na ponta do clitóris e dou
uma lambida antes de começar a chupar. Madeleine treme e agarra meus cabelos com força.
Mantenho a pressão nos dedos e a sucção até que a sinto gozar. Rápido, fico de pé a tempo de pegá-
la e a deposito em cima do sofá com calma. Afasto-me e removo meu coldre com as facas e as armas,
depois meu colete e a camisa. Seus olhos desviam dos meus para encarar meu peito, e faço o mesmo.
O corte perto do meu umbigo está seco, já que não é tão grande, porém o corte perto das
costelas está sangrando. Merda. Não foi tão profundo, por sorte, no entanto vou ter que dar pontos
depois. No momento, quero Madeleine.
Ergo a cabeça e vejo quando ela se senta, sem o mínimo pudor por estar nua, foca os olhos
nos ferimentos e passa seus dedos delicados. Observo os movimentos em silêncio, parado, à espera.
Ela parece... se importar, acho que preocupada.
— Está doendo?
Balanço a cabeça em negativa antes de responder:
— Já estou acostumado.
Isso a surpreende, provavelmente, e quando ergue o rosto em direção ao meu, vejo o
alarmismo e preocupação, um pouco de irritação. Talvez ela esteja pensando que não dou a mínima
para a minha vida, mas está errada. Se fosse assim, eu não teria lutado e matado tantos hoje. Eu
ficaria em paz por morrer. Mas, foda-se isso! Não quero pensar nisso agora.
Abro o cinto, a calça e puxo para baixo com a cueca, ficando pelado. Madeleine suspira alto
e a flagro mordendo a boca. É isso que não entendo nela. Foge de mim, me abomina, mas quando me
vê, seus olhos brilham e, com certeza, outras reações acontecem em seu corpo.
Que nós nos desejamos, não há sombra de dúvida.
Antes de fazer o que está em minha mente, vou até a gaveta que tem no armário atrás da minha
mesa e pego um preservativo. Nunca transei aqui, não trago as mulheres que fodo para casa,
geralmente fico pelos hotéis ou, como muitas vezes, com Antonela no escritório da boate. Essa
gaveta guarda as camisinhas para quando eu tenho um encontro. Não gosto de surpresas e um filho
bastardo é uma pedra no sapato de qualquer Madman, e de um Capo um verdadeiro inferno. E se for
para casar, tem que ser por outros motivos. Para Madeleine, eu quero que ela não resista a mim e
pense que a melhor escolha é estar comigo, ser assegurada por mim. De muitas formas somos
parecidos, talvez seja por isso que nos desentendemos às vezes.
Voltando para onde ela está, paro na sua frente e seguro a respiração. Seus lindos olhos azuis
estão arregalados encarando meu pau de tal forma que fico ainda mais duro.
— Quer tocar? — questiono baixo.
Despertando-a do que quer que estivesse passando em sua cabeça, ela pisca algumas vezes e
ergue os olhos para mim, encolhendo os ombros.
— Pega. Pode tocar. — Curvo o canto da boca em um quase sorriso. — Fique à vontade.
Seu corpo sacode quando solta a respiração trepidada e volta a olhar meu pau. Puta que
pariu! Eu vou explodir só de ela olhar para ele assim.
Com timidez, ela levanta as mãos e conto até dez antes de vê-la pegar meu membro. Seguro a
respiração quando seus dedos finos alisam todo o comprimento e faz questão passar a ponta do
indicador na cabeça. Minhas bolas estão latejando e doloridas, e cada vez que ela descobre mais
alguma coisa com seu polegar, fico mais na beira do abismo.
Ajeitando-se no sofá, Madeleine percorre a veia saltada embaixo do meu pau e vai até as
bolas. Puta que pariu!
— Eu vou gozar se você não for fazer nada além de descobrir cada detalhe do meu pau. É
melhor soltar.
Ela segura a respiração olhando para mim e posso adivinhar que se sente vitoriosa por
perceber que me tem nas mãos nesse momento. Não gostando muito do resultado quando a assisto
soltar e se afastar.
Caralho!
Com isso, eu me abaixo e forço seu corpo a deitar no sofá, pego-a pelas coxas, abrindo suas
pernas e desço minha cabeça, dando logo uma lambida no seu sexo quente e molhado. Parece que ela
está mais excitada agora do que antes quando a fodi com meus dois dedos. Chupo o seu clitóris,
sorvendo seu gosto e cheiro. Seu corpo responde, impulsionando para a frente, arqueando as costas.
Dou mais um pouco de atenção com a boca e adoraria continuar aqui, mas acho que ela já está pronta
o suficiente. E não aguento mais adiar o prazer de estar dentro dela.
Levanto-me e visto a camisinha de uma vez e, fazendo-a deitar reta no sofá, posiciono-me no
meio das suas pernas, abrindo-as mais um pouco quando me encaixo, deixando nossas coxas juntas, e
pego o meu pênis. Massageio seu núcleo e a ponta do clitóris antes de eu finalmente entrar nela.
Madeleine solta os sons baixinhos, quase um gemido, e ondula o corpo. A visão dela... A
boca aberta, a cabeça para trás, as mãos nas minhas coxas cravando as unhas na minha pele, me
excitam pra caralho.
Desço meu rosto e olho para onde nós dois estamos quase conectados e fico ainda mais duro,
ansiando loucamente para estar dentro do seu calor. Levanto o rosto e a encaro. Espero os seus olhos
encontrarem os meus e falo com a voz firme e baixa:
— A primeira vez pode ter sido horrível, mas essa será memorável.
Ela engole em seco.
— E você vai me prometer que, se doer ou você não estiver gostando, vai me dizer.
Ela concorda freneticamente, assentindo.
Sou um homem determinado e sei muito bem interpretar os gestos das pessoas. Deixo meu
corpo cair para a frente, apoiando nos cotovelos, ficando cara a cara com ela.
— Quero que você sinta prazer hoje — murmuro, passando a cabeça do meu pênis no seu
calor ao clitóris, e faço de novo e de novo.
Ela geme agarrando meus braços.
— Por favor... Por favor.
Levanto a cabeça e falo, com a boca raspando meus lábios nos seus.
— O quê? — Provoco-a ainda mais, chegando a posicionar-me mais. Só fico ali, sentindo a
sua umidade esquentar-me.
— Por favor...
— O quê? — Sorrio de lado, massageando-a com a ponta do meu membro. Eu gosto de vê-la
implorando por mim. Precisando de mim.
— Por favor, entra em mim — ela geme e suas pernas abraçam o meu corpo e força seu
quadril para frente, fazendo eu quase entrar dentro dela.
— Você está pronta? — Passo meus lábios na sua boca indo até a orelha. — Você está pronta
para mim? Está toda quentinha, molhada e lisinha para mim?
— Eeeuuu... estou — diz, soltando entre uma respiração ofegante.
Levanto o rosto, a vejo fechar os olhos apertados e a voz fraca chamar meu nome baixinho.
— Estou pronta!
— Uhum. — Beijo o centro da sua boca. — Tem certeza de que quer isso? Ainda dá para se
arrepender.
— Não! — Ela abre os olhos e segura meu rosto, olhando nos olhos. — Faça logo... por
favor.
Como ela pede, lentamente vou entrando em seu calor. É tão delirante que rosno e cerro os
dentes, sentindo a sua maciez. Como ela está molhada. Cazzo. Me arrependo de ter colocado a
camisinha, porque foi uma delícia e queria sentir o calor da sua boceta no meu pau de novo.
Enquanto invisto dentro dela, indo até o fim, ela responde jogando o corpo para frente e não
há um sinal de angústia em seu rosto, o que me dá garantia de que ela não está sentindo dor e sim um
prazer tão intenso que não há uma ruga de expressão. Apenas seus lábios abertos, os olhos fechados e
de vez em quando, ela morde a boca e seu interior me aperta.
Com a última investida, estou todo dentro dela e preciso fazer uma pausa para apreciar o
sabor do seu interior. Não me mexo por uns segundos e pergunto:
— Posso me mexer?
Respiro fundo e raspo minha, boca acariciando sua bochecha, seu rosto todo, dou uma
mordida na sua boca e depois no lóbulo da orelha. Madeleine agarra meus cabelos e passa as mãos
de leve pelas minhas costas e murmura um “Uhum”, confirmando com a garganta para mim.
E tiro devagar e meto lentamente. Ela geme e se possível, fica ainda mais maravilhosamente
molhada.
Puta que pariu!
Eu já comi muitas mulheres. Não tenho nem uma conta exata, mas todas eram profissionais e
sempre queriam me agradar. Essa daqui é normal e o fato de ser só minha, de nunca ter tido ninguém
aqui, onde eu estou dentro, me causa instintos egoístas. Eu quero ela só para mim. Cada parte dela,
cada pedacinho.
Acompanhando minha respiração, de novo tiro e entro. Tiro e entro bem devagar.
— Merda — ela balbucia, joga as mãos para o alto e agarra o braço do sofá, mordendo a
boca com força para não gritar um gemido muito alto.
Ela é doce e sexy até nesse momento.
Continuo com movimentos lentos, ondulando a minha pélvis para frente e para trás. Quando
acho que vou perder um pouco o controle, coloco meu corpo todo para ela, abraçando seu corpo com
força e capturo sua boca em um beijo que nós dois usamos para abafar nossos sons. Gememos
enquanto nossas línguas se enroscam. E se eu soubesse que seria assim, iria querer assim antes.
Devagar, lento, uma tortura prazerosa. Interrompo o beijo, encosto minha testa na sua e me esqueço
de qualquer coisa, menos de como é gostoso foder seu corpo vagarosamente. Essa tortura.
Com o tempo vou perdendo um pouco a luta de manter devagar e Madeleine parece que não
quer também, pois seu corpo se mexe com força, crava as unhas no meu braço, abre a boca
respirando cada vez mais ofegante. Deslizo minhas mãos, agarro suas coxas e meto violentamente
para dentro dela, procurando a nossa libertação.
Ela goza gemendo alto no meu ouvido e enfia os dentes no meu ombro, e faço o mesmo com o
dela. Estamos perdidos nesse coito. E urro como um animal, sentindo sua língua no meu ouvido e,
caralho, ela passa a língua no meu pescoço e eu sei que tem um corte ali. Ela está provando meu
sangue.
Meu coração acelera, meu corpo esquenta. Minha nossa! Eu nunca senti um prazer assim.
Sento-me no sofá, levando-a comigo e continuo a movimentar para dentro dela, querendo extrair mais
um pouco desse prazer e gozar. Sinto-me insaciavelmente louco de tesão.
Madeleine se afasta e olha dentro dos meus olhos. Esses malditos olhos azuis. Seus dedos
passam pelos meus braços e ela, delicada, segura meu rosto e cola a boca na minha, mas não me
beija, apenas respira. Respira com a boca aberta. Engulo com dificuldade, a garganta seca, desço
meus olhos e consigo ver os seus seios sacudirem um pouco enquanto ela também quer mais, mas a
gente já gozou. Não sei mais o que a gente quer.
Encosta a testa na minha, me abraça forte e faço o mesmo. Nossos corpos vão perdendo a
velocidade, mas sem nunca parar. Ela deita a cabeça no meu ombro e rebola bem devagar no meu pau
amolecendo – não total – dentro dela. Merda. Acho que vou ficar duro por uma semana.
Demora, eu acho, que uns cinco minutos até a gente ficar imóvel. Agarrados, suados,
ofegantes e com batimentos anormais. Ela não me solta. Fecho os olhos e tento relaxar. Um sorriso,
algo muito estranho, surge em minha face, sentindo as pontas dos seus dedos se mexerem devagar nas
minhas costas.
Não sei o que fazer agora. Sinceramente, eu nunca fiquei assim e sentir a sua pele macia e
quente na minha, os seios pressionados no meu peito, os braços jogados nos meus, as mãos nas
minhas costas, as pernas abraçando meu quadril. Eu poderia ficar aqui para sempre.
Se eu soubesse tinha feito assim.
Madeleine respira fundo e parece que também não sabe o que fazer. Ela se afasta, fazendo
questão de passar as mãos em cada pedaço de pele que consegue parando-as no meu peitoral. Nos
encaramos e algum reconhecimento surge.
Caralho, que porra é essa?
Eu desvio os olhos dos dela bem rápido, e tentando não ser tão insensível, dou um beijo
rápido na sua testa.
— Precisamos sair daqui. Não quero que os empregados nos vejam aqui de manhã.
Ela concorda com a cabeça e, quando sai de cima de mim, murmuro um puta que pariu. Eu a
quero de novo.
Acompanho seus passos até a camisola e sua calcinha, que ela veste na minha frente, de
costas para mim. Rápido, levanto recobrando os sentidos, e pego minha calça, a cueca e visto.
Depois recolho meu coldre com as armas e a camisa manchada e rasgada. Madeleine segura meu
colete. Paro na sua frente e ela levanta o rosto. Eu adoro quando ela levanta o pescoço desse jeito.
— Você quer que eu... — pausa, receosa, e solta a respiração concluindo o pensamento: —
Você quer eu cuide dos seus ferimentos?
Parado, não sei o que responder de início e fico olhando para ela. Até que percebo que estou
bancando um babaca.
— Pode ser — digo de uma vez.
Ela concorda com a cabeça e, como sempre, me surpreende esticando a mão para mim, que
eu olho, respiro fundo e, por fim, entrelaço os dedos com os seus escutando quando ela arfa alto.
Subimos para o seu quarto em silêncio e ela pede para que eu me sente em sua cama.
Desaparece indo até o banheiro e volta trazendo uma toalha molhada com água quente.
— Eu acho que por enquanto serve — ela diz.
— Está ótimo.
Desviando seus olhos do ferimento, encara-me mordendo o lábio. Como sempre nervosa.
Rápido, ela termina de limpar e volta para o banheiro levando a toalha, agora em vez de
branca está rosa por causa do meu sangue; quando volta, olha para mim esperando não sei o quê.
Olho-a da cabeça aos pés e dou de ombros.
— Tem problema se eu ficar?
Ela engole em seco, seus olhos se arregalam em total surpresa.
— Não, claro que não. Pode ficar — responde já pegando as coisas das minhas mãos e eu
deixo que leve minhas armas, a camisa, e deixar tudo numa poltrona no canto. Aproximando-se de
volta, ajeita os travesseiros, as cobertas e abre espaço pra si, sem ainda deitar.
— Você vai dormir de calça?
Olho para ela franzindo a testa. A pergunta dela não tem malícia, chego a rir. Levantando-me
da cama e digo:
— Sabe, a calça está suja... e...
Calo a sua boca botando o dedo no meio de seus lábios.
— Relaxa. Está tudo bem, angele.
Ela sorri e demoro a perceber que a chamei de anjo em italiano. Da outra vez tomei cuidado
para ser em húngaro.
Porra, Travis!
Tranquilo, tiro minha calça dando para ela, que coloca junto com as minhas outras coisas.
Logo me deito e a observo ir até o interruptor e apagar as luzes, voltar e se deitar do meu lado. Ela
fica um tempinho sentada na cama, olhando para a frente e tenho aquela sensação esquisita de querer
tocá-la, mas não faço. Madeleine respira fundo e se deita.
Nós dois ficamos engessados na cama, de barriga para cima e olhando para o teto. Meu
coração parece que congelou junto. Preparado, viro o rosto para ela e a espero fazer o mesmo, para
procurar em seus olhos o que quer que esteja passando na sua mente.
Repito para mim que está tudo bem algumas vezes antes de ceder à tentação e chegar até ela
como um flash.
Enfio minhas mãos por trás dos seus cabelos e guio sua boca até a minha. Devoro-a com um
beijo barulhento e molhado. Seu corpo todo se arrepia e ela joga uma perna sobre a minha. Fecho os
olhos e nos encaixamos. Nossos corpos se mexem devagar pedindo por mais. Ela passa o nariz no
meu e vou passando a ponta da minha língua, contornando a sua e depois mordo o lábio inferior,
fazendo-a gemer.
— Você quer mais?
— Quero — sussurra me beijando.
Voltamos a trocar mais um beijo indecente, daqueles que não perdoa nem o nariz. É como se
estivéssemos nas preliminares nos beijando. Meu Deus, essa mulher vai me enlouquecer!
— Eu quero! — repete, esfregando-se em mim. — Eu quero, mas eu quero rápido — diz
perto do meu ouvido e, caralho, eu não tenho forças para dizer não.
E bem rápido, eu me separo dela e removo minha cueca, ajudo-a a tirar a camisola e sua
calcinha, e estou no meio das suas pernas. Encaixo-me e lentamente entro no seu calor molhado e
quente. Madeleine passa as pernas pelos meus quadris e remete para frente enquanto eu a invado até
o fim. Como ela pediu, dessa vez é rápido, violento, sujo... dos beijos aos movimentos, os barulhos e
até quando gozamos é alucinante, sem fim.
E de novo sinto seu núcleo lisinho e molhado.
Assim é tão gostoso.
Assim ela é tão minha.
Ela me morde, lambe e arranha. Totalmente entregue. Eu só quero que ela pare de lutar para
ficar aqui comigo. Porque é tão difícil? Eu tenho que arrumar um jeito, porque se for para casar, só
se for com ela.
Eu a conheço. Eu a possuo. Não pode ser diferente.
Remexo na cama, sentindo o algodão macio dos lençóis, que afagam meu corpo nu, desperto.
Sinto-me confortavelmente bem e acho que a palavra certa é feliz. Volto a ficar quieta e foco na
respiração quente em minha nuca, que prova que não foi apenas um sonho alucinante e delicioso, e
sim a realidade. Ele realmente fez aquilo comigo na noite passada – ou melhor, na madrugada de
hoje.
Dio mio! Só de me lembrar tenho vontade de mais. O meio das minhas pernas está sensível
por causa do atrito, mas não me importo. E o desconforto que senti da primeira vez, agora não é
igual.
Acho que, se fosse assim daquela vez, eu hoje não me sentiria bem. A delicadeza e lentidão
da noite passada foram como uma massagem dentro de mim, uma carícia quente e molhada. A
primeira vez ele não teve carinho e assim, de forma suja, me “abriu” e preparou para as próximas.
Porque, sendo franca, não senti nada além de prazer nessa madrugada. Foi a coisa mais gostosa,
incrível e maravilhosa que já fiz. Como Travis vive falando o seu palavrão favorito: “Cazzo!”.
Soltando-se de mim, sinto seu corpo se afastar, o colchão afundar e ele se levantar.
Sorrateira, abro os olhos e confiro as horas no relógio digital em cima da mesa de cabeceira.
Estranho que são apenas seis da manhã e Travis já está se levantando. Sendo honesta, já fiquei feliz
por ele ter ficado pelo menos umas três horas na cama comigo e, de toda forma, tem vezes que nem o
vejo de manhã por sair tão cedo que o céu nem está claro.
Conformada, suspiro e espero segundos suficientes para me virar e o ver fechando a porta
saindo do meu quarto.
— Dio mio — murmuro jogando um travesseiro na minha cara.
Sinto-me feliz, emocionada. E como não ficar? Ele foi delicado comigo, me fez querer me
grudar a ele e nunca mais soltar. Depois subiu, deixou-me cuidar dele e pediu para ficar. E depois me
beijou, abraçou e transou comigo a segunda vez e chegou a dormir. Talvez dentro daquele peito forte
e musculoso, guarda um coração.
Tirando o travesseiro de cima do meu rosto, fito o teto e tento manter minhas emoções em
ordem. Ficar com ele seria incrível. Eu aprendi a admirá-lo, embora seu cargo seja obscuro, ele não
é um homem cruel a troco de nada. Nós nascemos nesse mundo e eu deveria aprender a lidar com
essa verdade e não ficar julgando como se fosse melhor que eles. Eu também adoro passar meus dias
com Marinne – pensando nisso, ela chega hoje do colégio interno – e podia estar aqui até ela crescer
e casar. Sei que, como membro da família matriarca de uma das cinco organizações da Cosa Nostra
nos Estados Unidos, ela vai se casar cedo e com alguém importante para fortalecer. Tenho vinte e
cinco anos e já vi isso acontecer mais vezes do que casamentos comuns. Nem sempre é um dia feliz,
mas as noivas não deixam transparecer.
Eu nunca tive essa preocupação, já que não sou ninguém nesse mundo. Sou apenas uma ítalo-
americana. Filha de uma italiana, que se casou para formar uma aliança entre nosso mundo e os de
fora com propósito estrategista. Casar mamãe com o xerife de Las Vegas era uma boa ideia. Ele iria
fazer vista grossa para alguns atos da Lawless e fazer a “ponte” para outros policiais. O que fez, mas
no meio do caminho conheceu o chefe da Bratva. Uma pena que meu pai era um corrupto antes disso,
e com o casamento e a máfia, ele ficou com mais sede de poder.
Por pensar em tudo isso, não compreendo o porquê de Travis querer se casar comigo. Porra!
Ele só irá arrumar um grande problema. Vitorio Malvez ainda não desistiu de mim por culpa do meu
pai. Eu sei que um líder da Cosa Nostra não faz aliança com a Bratva. Não até agora. Mas, talvez,
Vitorio possa tentar uma aliança com Ivon Avilov para me capturar e punir por conta do meu pai e
pegar Travis. A “cartinha” com um pedaço do meu pai era nítida. Eles querem a parte que pertence a
Lawless, que é a maior e mais poderosa de todos os territórios que cada Famiglia conquistou.
Os Lozartan têm muito poder, riqueza e domínio, e claro que todos querem destruí-los e
pegar cada um, sua parte. Ele precisa se fortalecer e não se casar com uma ninguém.
Por enquanto, eu quero curtir o tempo que tenho aqui. Ficar com Marinne e aproveitar todas
as oportunidades que tiver para ser beijada por Travis. Beijar, transar, abraçar e sentir seu corpo tão
perto do meu.

Desço as escadas ouvindo Marinne falando e sorrio quando paro no lobby da casa,
ganhando um abraço apertado dela. Ela acabou de chegar da escola interna e parece feliz. Mais feliz
do que o comum.
— Senti sua falta — comenta se afastando um pouco de mim e ajeita a franjinha.
Meu coração fica aquecido com sua declaração. É ao mesmo tempo de alegria e tristeza. Ela
vai ficar arrasada se eu for embora mesmo, mas fico contente por ter conquistado seu carinho e
respeito.
— Foi apenas uma semana. Não exagere — brinco.
— É! Eu sei, mas...
— O jantar está na mesa — Rosália comunica, nos interrompendo.
Piscando o olho e sorrindo, junto meu braço com o seu, caminhando para a sala de jantar.
Paolo, que está atrás com sua mochila, nos acompanha e entrega as coisas dela para Rose Marie.
Acho estranho Travis não estar aqui com ela. É sempre ele que a busca.
Sento-me de frente para ela e fito a cadeira na cabeceira da mesa vazia.
— Ele está vindo.
— O quê? — Viro meu rosto para ela.
— Travis — explica. — Ele está resolvendo um problema com Luca, mas já está vindo.
— Então ele que te buscou?
— Como sempre — responde confiante e franze a testa para mim.
Meus pensamentos ficam em inércia, assimilando a informação. E fito Marinne pegar a taça
com água e beber um gole. Paolo fala ao telefone e me direciona um olhar frio, quase que ordenando
para eu ficar fora dos seus assuntos. Mau ele sabe que não estou ouvindo ou compreendendo nada.
Não sei qual o problema, mas sei que tem a ver com ele.
Rosália, junto com mais dois empregados, serve o jantar. Vejo Marinne e Paolo começarem a
se servir do macarrão à bolonhesa e faço o mesmo, mas meus movimentos param quando vejo Travis
se juntar a nós com Luca e Colen. Ele me direciona um olhar interrogativo, que faz com que eu
terminar logo de me servir.
— Pensei que você ia comer tudo — comenta Colen com seu humor leve.
Rio sem controle e olhando de soslaio para Travis, vejo que ele achou graça, mas não abre
um sorriso, porém tem um semblante tranquilo. Seus olhos encontram os meus e paro de ouvir
Marinne falar sobre o campeonato na escola. Meu coração acelera e minha vontade é de beijá-lo e
fazer outras coisas.
Nesses últimos três dias, nós transamos todos os dias. Parece que seu corpo é meu imã
particular. Quero-o o tempo todo. Estou viciada nele. Quero que me beije, me abrace e tire minhas
roupas para fazer sexo lento ou violento. Sinceramente, todos os modos são maravilhosos.

Enquanto passo a esponja no corpo, num banho quente e relaxante, mesmo que eu não esteja
desfrutando da banheira, me acalmo. Meus pensamentos são sobre Travis, de novo. Não sei se ele
vai vir para o meu quarto hoje com a Marinne em casa, na verdade, todos estão em casa.
Depois de sair do banho, me secar e colocar meu pijama de shortinho rosa e super
confortável, escuto a porta do meu quarto se abrir e o único que entra aqui sem bater e a fechando
logo em seguida, é ele.
Seguro a respiração e meu corpo se prepara para o impacto.
Assim que eu o vejo, abro um sorriso difícil de conter e ele quase – quase mesmo – sorri
para mim. Abaixando-se, me agarra. Travis enfia os dedos entre meus cabelos, sua língua encontra a
minha, quente e molhada, rapidamente. Devagar, vou me levantando para ter mais acesso, e abraço o
seu pescoço. Meu corpo implora pelo seu toque e fico nas nuvens tendo o beijo que eu queria ganhar
quando nos encontramos na mesa do jantar.
Travis me beija com ardor, sua língua dança com a minha. Ele geme respirando pelo nariz
com dificuldade, mas sem parar o contato de jeito nenhum. Levo minha perna até sua cintura e ele
agarra minha coxa. Ergue-me, gira nossos corpos e estou tendo meu corpo pressionado na parede,
fazendo seu corpo se apertar junto ao meu. Sinto sua ereção no meio das minhas pernas e, sem o
mínimo pudor, me esfrego nele. Estou me viciando em tudo que ele faz comigo. É tão bom ser
desejada desse jeito.
Viro minha cabeça para o lado oposto da dele, e ele inclina a minha cabeça para saborear a
minha boca com firmeza, pondo a pressão certa. Seus lábios exercem com destreza e uma
agressividade excitante que me deixa louca de tesão.
Começo a ficar sem fôlego e o deixo ir até o limite me beijando, gemendo e provocando com
movimentos que, se não fosse nossas roupas, eu já estaria sendo levada à loucura com seu poder
sobre mim, na cama ou fora dela. Travis é o tipo de homem que não precisa amarrar, amordaçar ou
submeter a nada mais do que suas habilidades sexuais. No caso, corpo, músculos, suas mãos fortes e
seu pênis fantástico. Francamente, ele foi feito para liderar em todos os setores.
Com um último beijo duro, um pouco bruto em meus lábios, ele se afasta e passa o rosto no
meu como um felino. O nariz toca o meu e, enfim, sua testa encosta na minha, enquanto recuperamos o
fôlego.
Suspiro com força, maravilhando-me com seu cheiro. Dio mio! Esse homem me fascina.
Travis Lozartan é o meu pecado e eu adoro estar aqui.
Corro minhas mãos dos seus braços até o seu rosto, sinto sua barba, que cresceu desde terça-
feira, pinicar a palma da minha mão e fixo meus olhos nos seus.
— Como foi o seu dia?
Sua sobrancelha se ergue. A surpresa cruzando seu olhar.
— Hoje foi bom. Ocupado, mas bom.
— Pelo menos, não tem sangue — digo isso sentindo uma dor no meio do meu peito. Acho
que eu nunca vou me esquecer daquela cena na sala do piano, e é muito recente, apenas três dias.
— Nem sempre é assim, Madeleine. — Ele afasta o rosto do meu e me dá um beijo surpresa
nos lábios.
Concordo com um aceno de cabeça e faço carinho no seu rosto, que ele permite, diferente das
outras vezes. Ficamos nos olhando por alguns segundos e fico sem palavras olhando dentro dos seus
olhos tão azuis e cada vez mais escuros, famintos e sedentos. Respirando pelo nariz, ele aperta meu
corpo num abraço forte. Envolvo meus braços no seu pescoço enquanto beijo seu rosto, orelha e
pescoço.
Sou colocada na cama devagar e ele não precisa de muito esforço para tirar a blusa do meu
pijama por cima da minha cabeça. Vejo seus olhos ficarem negros e cheios de desejo. Ele leva seu
tempo admirando minha seminudez. Aproximando-se, faz eu me deitar na cama de um jeito que
consegue arrancar minha calcinha e o shortinho. E, meu Deus, estou pronta para ele.
Quando volto a me sentar na cama, sem ligar por estar com as pernas abertas, o puxo pelo
coldre pouco me importando com as armas e as facas. Um sorriso cruza seus lábios antes de ele me
dar um beijo feroz. Com uma das mãos ao lado do meu corpo, com a outra afaga o meio dos meus
seios e vai descendo até o meu sexo. Acaricia o meu clitóris com dois dedos, espalhando a umidade
que já me deixa prontíssima. E sei o quanto ele aprecia eu estar molhada assim para que ele, que não
vai entrar com tanta dificuldade.
Meu corpo já responde ao seu instantaneamente, desejando, querendo o seu calor, seu contato
e a sua invasão.
Travis brinca com a ponta do meu clitóris com os dedos e depois o escorrega até a minha
entrada e desliza lentamente, massageando meu interior. Meu corpo cai para trás e arqueio com um
gemido enquanto agarro as colchas. Travis me penetra com um único dedo – uma tortura – e não
demora muito para mais um entrar no jogo e acelerar o movimento.
— Travis! — digo com a voz carente e sem fôlego.
Com mais alguns estímulos, um beijo em minha barriga seguida de uma mordida, ele me faz
gozar provocando lágrimas nos cantos dos meus olhos de puro prazer.
Ganho um beijo rápido na boca e abro os olhos quando ele se afasta. Vejo-o começar a
desabotoar a camisa. E antes que ele acabe a tarefa tão incrível, sento-me na cama, ficando de
joelhos e afasto suas mãos devagar para que as minhas comecem a desabotoar sua camisa. Tiro o
coldre com sua ajuda deixando cair no chão junto com a camisa.
As palavras de Luca no café da manhã de hoje explodem em minha mente quando vejo o
corpo de Travis sem suas armas e proteção. Tudo bem que ele não precisa delas se quiser matar
alguém, mas, segundo o seu cinistro, ele nunca está desarmado e é estritamente desconfiado. Pode ser
que sim, pode ser que não, entretanto o que ele me dá como resposta é que confia em mim e por isso
me sinto confiante.
Abro o seu cinto e sua calça enquanto ele tira os sapatos com a ajuda dos próprios pés.
Travis puxa a calça junto com a cueca para baixo e fica espetacularmente nu na minha frente.
Demoro cinco segundos admirando e logo acaricio cada parte do seu corpo com as mãos, ele
permite em silêncio. Sinto seus músculos, seu calor, a força que ele emana, seu porte atlético. Dá
vontade de ficar a noite toda olhando e passando as mãos. Pressiono minhas pernas uma na outra por
causa da dor e ansiedade que fico pelo tesão que estou sentindo. Mordo o lábio inferior, sentindo os
músculos do seu peitoral e vou descendo sentindo sua pélvis e, olhando seus olhos, peço permissão.
Sendo concedida, seguro o seu pau entre minhas mãos. Sinto o peso, o calor, a dureza e aperto
bombeando para cima e para baixo. Sinto uma vontade, uma curiosidade, me corroer e volto a
encará-lo.
Dio mio! Nunca fiz isso antes, mas nesse momento eu quero.
— Naquele dia... você perguntou se eu queria pegar... — digo olhando seus olhos, atarefada
em deixá-lo mais duro.
— Você quer hoje? — ele completa meus pensamentos.
Tomo fôlego, na verdade coragem, e assinto.
— Eu quero isso — murmuro antes de me sentar na cama e ter altura suficiente para enfiar o
seu pênis na minha boca.
Meus lábios envolvem todo o seu comprimento e ouvi-lo respirar com dificuldade me deixa
ainda mais confiante no sexo. Esse é aquele momento que as habilidades de sedução falam por si só
e dar prazer para alguém é tão gostoso e sexy quanto receber.
Travis coloca a mão atrás de minha cabeça, os dedos no meu pescoço, e movimenta os dedos
agitados, num carinho bruto. Ele não me força a levá-lo mais fundo, sua mão serve apenas como guia,
talvez para ele ter contato.
Fecho os olhos, seguro-o com as duas mãos, tiro um pouco e, em seguida, abocanho a ponta,
saboreando e chupando de leve. Não pensei que fazer sexo oral fosse tão... fascinante. Sua pele é
deliciosa, macia e irresistível. Sinto perfeitamente minha excitação e gemo quando ele toca meu
queixo fazendo eu erguer um pouco o rosto.
— Chupa gostoso, angele — ordena com sua voz rouca verberando em seu peito. — Deixa ir
mais fundo. Me saboreia.
Puta merda! Estou entregue. Completamente entregue nesse momento. E faço o que me pede
de olhos fechados, gemendo e sentindo seu gosto ainda mais forte.
— Cazzo!
Sorrio internamente por ouvi-lo dizer seu palavrão favorito. E sim, mil vezes porra! Fazer
isso aqui é delicioso.
Sendo mais ousada, deslizo minha mão mais para baixo e sinto o peso das suas bolas, a
maciez e a quentura. Aperto sem força, acariciando e minha boca ainda está chupando, o masturbando
agora na mesma velocidade, lenta e torturante como ele fez comigo. Estou tão excitada que não ligo
quando ele passa a segurar minha cabeça e foder minha boca, nunca indo até o fim.
— Madeleine, eu vou gozar. Porra! — geme.
Sinto a pressão no meio das minhas pernas ficar mais forte. A ideia de deixá-lo mais duro me
enlouquece. Senhor...
Sinto-o mais pesado e quente. E adoraria ficar ainda mais tempo, aproveitando esse deleite
de deixar um homem como ele, entregue, mas Travis me afasta, me pega pelos braços e me joga na
cama.
Mal registro quando tenho seu corpo sobre o meu. Suas pernas abrem mais as minhas, se
encaixando. Travis pega seu pau, acomoda na minha entrada e lentamente me penetra. Reviro os
olhos, jogando a cabeça para trás com a melhor sensação do universo. Ele afasta, saindo e entra
novamente, arremetendo mais fundo. E eu nem percebo quando gira nossos corpos na cama e me
deixa por cima.
— Oh... Dio mio! — gemo e me agarro a ele.
Ficar por cima é uma nova invasão e meu interior precisa se adaptar em segundos com essa
sensação de alargamento. A penetração é mais profunda e ele parece maior. Reviro os olhos,
mordendo a boca para não gemer alto e me agarro a ele. Fico tão grudada ao seu corpo, que as
batidas do seu coração se confundem com as minhas. As mãos dele sobem e descem por meu corpo,
afagando minhas costas, pegando em meus cabelos e apertando minha cintura.
— Se mexe. Isso!
Ele dá uma estocada para cima, atingindo um ponto sensível e nunca tocado dentro de mim.
Grito e jogo a cabeça para trás.
— Você é uma delícia, angele — murmura no meu ouvido e depois dá uma lambida no meu
pescoço e morde de leve.
— Ah... Travis! — Agora me jogo para os seus braços e ganho velocidade.
Deixo meu corpo percorrer livre e intensamente ao desejo enlouquecido e furioso. Ele se
senta, acomodando-me em seus braços, permitindo-me mover com mais furor. Nossos corpos estão
quentes, escorregadios e suados. Enfio as unhas nas suas costas, dou uma mordida no seu ombro
fazendo Travis gritar um palavrão.
Reviro os olhos, enlouquecida, e passo a língua na sua pele, sentindo o gosto salgado. Minha
nossa! Apenas esse gosto me dá vontade de mais, e eu me afasto e uno nossas bocas num beijo
enfurecido enquanto aceleramos sedentos um no outro. Nada passa em minha cabeça a não ser o
quanto quero que ele continue me fodendo desse jeito. Gemo em seus lábios, aperto seus cabelos,
sentindo o prelúdio do meu orgasmo.
— Cazzo! Merda! Dannazione! — ele xinga, dando uma mordidinha na minha boca e
parando de me beijar.
E quando seus olhos encontram os meus, gozo com os batimentos do meu coração
aceleradíssimo. Travis estoca para dentro de mim, para cima, com ainda mais força e se libera. Ele
bate os quadris nos meus me puxando de encontro ao seu corpo. Sentindo-me perdida, exaurida e
excitada. Ainda excitada. Agarro-me ao seu corpo enorme, quente e aconchegante, como se fosse meu
bote salva-vidas.
— Puta merda — balbucio.
Ele me envolve também em seus braços e eu fecho os olhos soltando um suspiro. Essa foi
melhor do que da última e, nesse exato segundo, penso que a próxima será também. Dio mio! Estou
tão absorta no pós-coito, que não percebo quando ele nos deita na cama, gira nossos corpos ficando
por cima, assim como tínhamos começado, e inicia uma massagem dentro de mim lentamente com sua
ereção endurecendo de novo.
— Não me canso de sentir você — Travis sussurra com a boca próxima da minha.
Eu não consigo pensar em nada a não ser nele dentro de mim, sobre mim, colado a mim. Tudo
se resume ao que fazemos nesse quarto, pois eu também não me canso dele. Travis é o melhor erro da
minha vida e, no fundo, quero que ele se transforme em acerto de alguma forma. Por Deus! Quero um
milagre. Estou louca! Ele está me enlouquecendo por cima, por baixo, dentro e fora.
Tiro meus óculos quando entramos na outra parte da vila de lojas de grife, conhecida e
chamada mundialmente de Via Bellagio Shops, que óbvio fica dentro do Hotel Bellagio. Eu e
Marinne saímos bem cedo de casa para aproveitar o dia. No caminho para as compras, ou tarde das
meninas, não podíamos deixar de passar na casa de Bárbara para a pegarmos e completar o time das
meninas.
Sorrio vendo as duas conversando e respiro fundo. O dia hoje está lindo. O céu limpo e cheio
de nuvens branquinhas como algodão-doce. O clima está fresco para Las Vegas, sempre quente; o sol
brilhando em sua glória ao meio-dia acompanhado de uma brisa fresca, que dentro da vila fica ainda
mais fresco.
Marinne carrega Bárbara para dentro de uma loja de itens de cabelo e perfume. Já fizemos
muitas compras, mas essa menininha é compulsiva. E depois de perceber isso, acho que ter
considerado vir para cá não está sendo bom apenas por ser mais seguro, mas também porque
literalmente podemos ficar livres para gastar. Pelo que entendi, Travis dá carta branca para a irmã
comprar o que quiser aqui e, segundo ela, para mim também, e abriu cortesia para Bárbara. E mesmo
que eu não tenha comprado muita coisa, adorei ser paparicada assim.
Com nossas compras, que foi uma luta mantê-las em nossas mãos porque por Paolo quem
seguraria seria os seguranças, e paro na porta da loja com os soldados de Travis que nos escoltam.
São quatro homens e mais o Paolo, que pode ser um idiota e falar algumas coisas para mim que não
gosto nem de lembrar, mas ele cuida de nós. Na verdade, ele cuida de Marinne como uma águia ou
mamãe urso e faz todos, a todo o momento, tentar agradá-la. Cheguei a pegá-lo sorrir perto dela hoje.
O que é, realmente, uma raridade.
Escutei que, depois de Travis, Paolo é o pior de todos os homens da Lawless. Ele não é
apenas o consigliere, mas o segundo executor do Capo, apesar dessa função ficar para Luca. Mesmo
assim, eles viram dois seres humanos decentes perto da caçula e princesa da Famiglia Lawless.
Balanço a cabeça, dando de ombro, abrindo um sorriso enorme quando elas saem da loja e
Marinne vem ficar ao meu lado, passando o braço no meu e andando para o caminho do restaurante
que ela adora comer aqui.
— Comprei um presente para você.
Franzo a testa e olho para ela.
— Não seria esse presente uma surpresa?
Ela ri e enruga o nariz.
— Acho que sim.
— Não tem problema, vou fingir que não sei.
Marinne tem os olhos brilhantes e alegres quando me encara.
— O que foi?
— Nada... é só... — Faz uma pausa.
— Diz, querida.
Ela suspira e tenta esconder o sorrisinho.
— Eu gosto de você de verdade e queria que você ficasse. — Abaixa os olhos,
envergonhada. — Que nunca fosse embora. Nunca tive o que estou tendo hoje.
— Compras de meninas?
— Não. Ter tipo uma... mãe.
Engulo em seco com sua declaração.
— Nossa! — Respiro. — Você me pegou de surpresa.
Ela para de andar e fica na minha frente.
— Desculpe por isso, mas é verdade. Desde que você chegou e eu deixei se aproximar, é a
melhor pessoa da minha vida depois dos meus irmãos. Quero que fique e... talvez você seja feliz com
a gente e não quero que seja minha babá. Quero que fique porque gosta de mim também, não porque é
paga e... preciso te dizer uma coisa.
— O quê?
— Não existe férias... elas já passaram e eu fiquei na casa do vovô e da vovó. Eu só queria
você lá em casa.
Rio e dou-lhe um abraço.
— Marinne, por que você não disse logo, querida?
— Porque eu fui criada para não ter fraquezas e saber lidar com as crises.
— Eu ir embora é uma crise? — indago com um sorriso, mas quando seu semblante fica
ainda mais fechado e sério, perco o humor.
— Estar sozinha de novo naquela casa é uma crise. Ter apenas os empregados dando atenção
quando chego em casa, sim e... depois que você chegou, voltou na verdade.
— Voltei? — interrompo-a.
— Sabe quando você foi embora e voltou?
— Sim, claro.
Na verdade, fui capturada de novo de uma quase morte. Pensando rapidamente, Travis já me
salvou mais vezes do que meu próprio pai.
— Então, depois daquela vez e da festa do cassino, algo aconteceu, mudou, lá em casa.
Travis ficou diferente e tenho quase certeza de que Paolo falou com ele. Meu irmão está mais
próximo.
Sinto meus olhos se abrirem em surpresa. Não sei o que responder.
— Marinne... Eu não tenho nada a ver com isso.
— Acho que você está errada. — Dá de ombros com um sorrisinho. — Você chegar foi bom
e por isso não quero que vá embora.
Tocada com sua declaração, trago-a para os meus braços de novo e beijo seus cabelos.
Travis pode ter idade para ser o pai dela, tratá-la e criá-la como tal – não tem como não perceber
isso –, mas eu não, embora sinta uma afeição a ela como se fosse parte da minha família. Ela é
inteligente e doce demais para o nosso mundo, no entanto, sei que Marinne Lozartan será uma mulher
forte, de fibra dentro dos negócios da Famiglia.
Afastamo-nos e, sorrindo para ela, tiro uma mecha de cabelo da frente do seu rosto e digo
com todo meu coração:
— Vou fazer todo o possível para não lhe desapontar.
Ela abaixa a cabeça e sei muito bem o que está pensando. Não desapontar não significa não
partir.
— Vamos! — Bárbara nos chama em alto e bom som. — Estou faminta e vocês podem
conversar no restaurante.
Sorrio e nos aproximamos da minha amiga. Marinne fica perto dela, sorrindo e falando, nós
caminhamos até o restaurante para almoçarmos.
De longe observo como Bárbara e Marinne se dão bem, muito bem, juntas e não param de
falar o tempo todo. Confesso que tenho meus pensamentos de vez em quando interrompidos pelas
lembranças de Travis. A noite passada foi incrível e cada vez mais eu me sinto viciada nele e em
sexo. É como se nós fôssemos imãs e nos atraímos o tempo inteiro. Quando não é ele que me procura
sou eu que estou correndo atrás. Talvez por isso nós fazemos sexo em outros lugares da casa que não
seja apenas no quarto.
— Olha isso!
Abro um sorriso e fito Marinne, que aponta para a última loja da vila. E tinha que ser de
sapatos, que ela adora e são italianos. Se existe alguém que nasceu com sua nacionalidade certa, foi
essa menina. Ela é italiana dos pés à cabeça. E quando ela se vira para mim e fica ao meu lado de
novo, vejo em seus olhos, tão únicos, intensos e vibrantes, Travis. Eu já pensei isso e ainda tenho a
mesma opinião. Se ninguém me dissesse que ela é irmã dele, juraria que é filha. São idênticos até no
comportamento e sei que, de uma forma delicada, ela está me seduzindo a ficar por aqui. Meu Deus!
É fácil amar essa pentelha, por isso os seguranças e o chato do Paolo se curvam para ela.
— Que cara foi essa?
Franzo a testa e a fito sorrindo.
— Que cara?
— Quando você olhou para o Paolo? — explica cerrando os olhos, desconfiada.
— Ah... É que ele não vai muito com a minha cara.
— Sobre isso... — Ri baixinho. — Na verdade, ele não vai com a cara de ninguém. É o
trabalho dele.
— Ser insuportável e irritante? Ficar olhando para as pessoas parecendo que quer eliminá-
las?
Marinne solta uma gargalhada e tenho que esperar ela entrar primeiro que eu no restaurante
para ter sua resposta:
— Não. O trabalho dele é ser desconfiado e cuidar da retaguarda do Capo. O que o torna
insuportável, às vezes.
— Mas Travis não está aqui?
— Bene, agora está e antes tinha eu. Sou extremamente valiosa e por isso ele cuida de mim
como um cão de caça.
Registro o que ela fala, mas me atenho às primeiras palavras. E quando levo meus olhos para
a mesa que está reservada, vejo o homem que me deixa tão mole quanto sorvete fora da geladeira.
Sim, eu me derreto e fico fraca perto dele. Maldito seja Travis Lozartan, meu lindo e irresistível
Capo.
Hoje, eu posso dizer com todas as letras que ele é insuperável e o jeito que seus olhos
encontram os meus, me domina sem o mínimo esforço.
Que injusto! Que injusto!
O suspiro alto de Madeleine captura minha atenção e eu abro os olhos me virando para o
lado onde ela está deitada. Acabamos de transar e fizemos o barulho que não pudemos com Marinne
em casa. Amo aquela pentelha, mas hoje ela me limita dentro de casa. Nunca tinha passado por isso
porque nenhuma mulher entrou aqui comigo para os fins que nesta noite usufruí. Todavia, hoje eu sei
como é complicado ter uma criança na mesma casa que eu.
— No que você está pensando?
— Em um monte de coisa — respondo e ela ri alto.
— Adoro seu jeito evasivo.
Balanço a cabeça e a viro para cima, voltando a fechar os olhos. Madeleine ergue o corpo e
se apoia sob meu peitoral. Uma das mãos toca meu rosto lentamente.
— Algum problema?
— Tirando os gastos que Marinne fez esse fim de semana, só o de sempre.
Ela ri de novo e beija meu queixo.
— Eu não queria ter ido ontem lá de novo, mas sua irmã é muito boa de lábia.
Assinto e sei que o sorriso orgulhoso no meu rosto é errado. Eu não deveria deixar minha
irmã ser tão astuta e esperta. A Famiglia não gosta disso e seu futuro marido tentará tirar isso dela.
Espero que não seja à força, pois não vou me importar de fazê-lo engolir suas ordens se machucar
minha irmã. Pode se tornar a esposa de alguém, mas nunca deixará de ser minha irmã. Uma Lozartan.
O suspiro de Madeleine me tira dos pensamentos de novo e, dessa vez, a surpresa é maior
quando ela deita a cabeça no meu peito e deixa a mão passando para cima e para baixo em meu
braço. Respiro fundo e uso minha mão que está atrás dela, para afagar suas costas. Ela parece
apreciar e relaxa em cima de mim.
Ficamos em um silêncio confortável, nos acariciando e confesso, secretamente, que gosto
disso, mas tem um sinal de alerta sobre essa aproximação e o risco de dormir aqui.
Só passei a noite com ela uma única vez e nem foram tantas horas de sono. Mas hoje não são
nem dez horas e estamos aqui. A verdade é que o jantar foi deixado de lado quando cheguei em casa
depois de um dia cheio e a vi caminhando para a sala de jantar. Ela estava espetacular com um
vestido vermelho colado ao corpo, descalça e com os cabelos castanhos presos desgrenhados. Ela
fica maravilhosa de vermelho e parece que sabe que eu gosto.
Quando a vi e ela sorriu para mim timidamente, com a respiração ofegante – deixando clara
sua excitação em me ver – e os olhos iluminados, a agarrei e a trouxe para o seu quarto. Maldição!
Essa mulher é magnética.
Nós transamos como dois animais e hoje fiz o que estava querendo há um tempo. Amarrei-a
no dossel da cama e a comi de pé na beira da cama. Sei que limitar o toque e os movimentos é uma
tortura, no entanto, estou devolvendo a ela a tortura que me fez passar as três primeiras vezes que
transamos, que precisei ir devagar. Hoje não preciso mais. Madeleine está acostumada comigo, com
meu pau e a velocidade. Ela me surpreende na verdade. Ontem não transamos, mas nos masturbamos
e ela... Puta merda!
Sentindo sua respiração no meu peito, deslizo minha mão por sua cintura e a puxo mais para
junto de mim. Ela fica mais para cima e salpica beijos em meu pescoço.
— Eu estava pensando — começo e isso a faz levantar o rosto e me encarar. — Sabe uma
coisa que eu não consigo parar de pensar.
— O quê? — Um vinco surge no meio dos seus olhos.
— Se você nunca tinha dormido com um homem e era inexperiente, como é que foi tão bem
naquela noite?
— Não acho que tenha sido tão bem.
Ergo a sobrancelha e curvo o canto da boca em um sorriso cínico.
— Não foi bem o sexo em si e a dor, mas sua coragem. O jeito que me seduziu e deixou-me
chegar mais perto. Você encarou muito bem a situação. Não se assustou por ver, pela primeira vez,
um homem nu na sua frente e, apesar de ter sentido dor, pediu para continuar.
— Você queria que eu fizesse o quê?
Limpo a garganta e coloco uma mecha do seu cabelo atrás da sua orelha.
— Eu esperava um pouco mais de inocência, afinal de contas você...
— Uma mulher virgem não necessariamente é inocente, Travis — interrompe-me. — E não é
porque eu nunca tinha dormido ou tido relações com um homem, que eu nunca tenha tido... nenhum
tipo de experiência sexual.
— O que você quer dizer com isso?
Ela passa os dentes nos lábios, não necessariamente mordendo, e dá uma risada nervosa
antes de responder:
— Bem... eu ficava de noite sozinha e acho que tanto para os homens quanto para as
mulheres, o desejo da prática sexual é algo silencioso e incontrolável algumas vezes; e quando chega
uma certa idade, é quase que impossível não desejar esse contato.
— Então você teve experiência com algum namorado seu? — Tento, mas em vão, ser menos
possessivamente irritado ao dizer isso.
— Não. Eu estou querendo dizer que eu mesma me dava prazer. — Ela tampa o rosto e
murmura: — Não acredito que disse essa frase em voz alta pra você.
— Então, você nunca...
— Sim — conclui. — Eu nunca tive experiências com ninguém. Homem, mulher, macaco ou
cachorro — ri. — E é uma brincadeira. Eu jamais faria sexo com animais. Deus me livre! Que
horror! Que nojo uma coisa dessas!
— Está tudo bem. Já entendi e ainda bem que você já se conhecia. Eu acho que foi menos um
problema.
Elevo minha sobrancelha e projeto meu corpo para ficar por cima e ela se deitar na cama.
Deslizo minha mão pelo meio dos seus seios até o seu sexo. Aprecio quando ela fecha os olhos.
Enfio lentamente meus dedos entre os lábios genitais e pressiono fazendo-a logo se contorcer na
cama.
— De qualquer forma... — digo com a boca raspando a sua bochecha e indo até o seu ouvido
— com o tempo, a gente iria trabalhar a sua experiência e você ficaria formidável.
Madeleine geme, crava as unhas nos meus ombros e tenciona o corpo para cima, para meus
dedos irem onde deseja.
— É assim que você me vê agora? — Sua voz é abafada e fraca no meu pescoço.
Afasto-me um pouco, fecho de leve os olhos e a fito sério. Prefiro não dizer nada, mas dar-
lhe prazer. Escorrego meus dedos para dentro do seu calor e faço círculos no seu clitóris com a ponta
do polegar.
— Menos papo, mais ação.

Minha cabeça está explodindo por conta dos estouros, os disparados pelas armas e os
gritos, tanto do meu comando quanto de Luca alertando minha retaguarda e chamando atenção dos
soldados. Hoje não foi algo que estávamos preparados, e quando é assim, requer um esforço maior.
Estou esgotado e sei que o monstro está à solta. Sinto-me fora de mim e é bom ninguém entrar
no meu caminho. Por sorte – se posso ousar me utilizar dessa palavra – Marinne está no internato e
não precisará me ver assim ou eu fugir dela. Sei que não sou um homem decente ou amoroso, mas me
preocupo da minha irmã mais nova ver o meu lado mais sombrio.
Olho atravessado para Luca, parado como um idiota, apoiado na parede do clube, onde, com
toda certeza, precisamos sair logo daqui porque os cope vão chegar e não gosto de responder,
principalmente quando as perguntas são idiotas e tão óbvias.
“O que houve?”
“Acabei com uns dez caras da Hechos e se tivesse mais os levaria também a sete palmos
abaixo da terra.”
Policiais geralmente gostam de mostrar serviço e são loucos para me pegarem. Eu não dou
mole e jamais darei esse gostinho aos que querem minha cabeça por despeito por eu ter negado
algum favor. Não sou padrinho de policial para ficar dando presente.
— Está esperando o quê? — questiono Luca.
Ele pega a faca no cinto de acessório e brinca com ela girando entre os dedos se
aproximando de mim.
— Colen voltar. Ele disse que precisou ver uma coisa antes de irmos.
Tento reprimir a vontade de revirar os olhos porque não sou criança e, apesar de estar
irritado com a situação, não posso demonstrar tudo que sinto para os meus soldados. Confiança é
algo que não dou para nenhum deles e demonstrar que estou furioso com eles depois de uma guerra, é
negativo.
— Espere por ele. Já estou indo com Enzo e Sandro.
Luca dá um aceno de cabeça devagar e pega um cigarro.
— E não se esqueça de falar sobre Enrico. — Minha voz fica ainda mais grave e puta. — É
bom você encontrá-lo porque, se eu fizer, não vou me controlar.
— Como se eu fosse seu homem mais controlado.
— Não me interessa. Ache-o e o traga para mim.
Antes de me virar e seguir meu caminho, vejo Luca fazer uma cara de pouco amigos. Sei que
a traição de Enrico o deixa puto, mas é melhor me trazer o homem vivo. Antes de matá-lo, precisa
passar por uma leve tortura que me traga nomes e planos. Já basta não ter dado por minhas mãos o
que Edgar Beluzzo merecia, meu próprio soldado não. Esse eu preciso acertar as contas.
Quando saí de casa essa manhã, com uma enxaqueca filha da puta, que apenas um banho
gelado e um anestésico foram capazes de aliviar a pressão, não imaginava que tudo ficaria muito pior
ao chegar no escritório. A notícia inesperada de que um dos meus homens estava me traindo com a
organização mexicana, acertou em cheio meus botões. Foi como acertar um prego na minha cabeça.
Só vi sangue e vingança quando saímos do escritório para esse hotel de quinta categoria, onde a
Hechos se escondia para um ataque a Lawless em algum momento dessa semana. Eles nitidamente
ainda estavam se preparando. Filhos da puta!
Bato a porta do carro com força e ordeno:
— Vamos logo porque estou faminto!
Enzo faz um som com a garganta sentado no banco do carona na frente e dá um soco de leve
no ombro de Sandro. Me desligo disso porque não me importa que estejam, de alguma forma,
tentando me irritar e pego meu celular para ver se tem alguma informação de Paolo. Ele ficou de
mandar notícias.
— Pra casa?
— Não. Paolo está esperando no Bellagio. Vamos logo.
E dessa vez seguimos em silêncio, pelo menos nas aparências. Por dentro, estou pensando em
Madeleine. Não quero chegar em casa hoje assim. Não é apenas Marinne que precisa manter
distância do monstro que habita em mim nos dias sombrios.
— Antes de você descarregar sua raiva sobre o que ocorreu essa noite, preciso lhe falar algo
urgente.
— Mais urgente do que ter um traidor entre meus soldados?
— Se você considera seu irmão mais novo mais importante que isso.
Franzo a testa cerrando os dentes e vou até o bar me servir de uísque. Até a merda do lanche
que pedi para Enzo buscar no restaurante, preciso molhar a garganta.
— O que Dario fez agora?
Paolo abre o paletó e senta-se na poltrona grande.
— Sandro o pegou na saída de Corn Creek, naquela espelunca que chamam de Hotel
Fazenda. Estava com uns meninos, que ele disse que são da escola dele, fumando e cheirando. Se
fosse apenas fumando, eu não teria pegado ele e enfiado dentro do carro e colocado sob vigia em
casa.
— Você deixou aquele viciado em casa apenas? — Sento-me no sofá perto dele. — Era para
tê-lo colocado nesse escritório até eu chegar pra poder cuidar da irresponsabilidade dele. Não
aguento mais vê-lo fazer isso. — Deixo o copo na mesa de centro. — Esse menino precisa tomar
jeito.
Quando Paolo vai falar com sua cara fechada, a porta se abre e deixo o assunto sobre Dario
para quando chegar em casa. Amo meu irmão e preciso cuidar dele, mas o assunto de Enrico e a
Hechos é mais importante.
— Deixa na minha mesa, vou trocar de roupa — comunico.
Entro no banheiro pegando uma camisa limpa e uma calça social preta. Dentro do carro,
cheguei a trocar a camisa, mas não me limpei. Ainda me sinto sujo e me troco logo para chegar em
casa.

Estou deitado, relaxado, o corpo pesado depois de transar como um animal com Madeleine.
Após chegar em casa ontem, dar um esporo daqueles em Dario, encontrei-a saindo do seu quarto com
seu robe de seda vermelho. Foi difícil me controlar, e como a fera dentro de mim já estava sob
controle, não temi que fosse assustá-la e, na verdade, tem algo de especial nela que me faz ficar
calmo.
Fizemos sexo selvagemente. Rápido, barulhento e exigente. Eu quis tanto dela quanto ela
parecia querer extrair até meu ar. Fomos animalescos. Foi um dos sexos mais loucos que já fiz, e sou
um homem que já transou cheio de raiva com Antonela para extravasar. No entanto, com Madeleine
foi para me conectar, não me afastar da realidade.
Meu celular apita e o pego na mesa de cabeceira. É uma mensagem de Paolo dizendo que
preciso comparecer ao nosso “balcão” urgente. Digo que chego em vinte minutos e devolvo o
aparelho em cima da mesa. Nesse momento, Madeleine se espreguiça e se senta na cama. Tento, em
vão, não olhar sua nudez e desvio os olhos para seu rosto rapidamente ao dizer:
— Preciso ir.
Ela assente e noto como controla a vontade de bocejar. Se não fosse por mim ela estaria
dormindo, eu também estaria, merda, mas parece que nós dois ficamos descontrolados nessa
madrugada.
— Tudo bem. Eu vou voltar a dormir com certeza.
Sorrio para ela e sou retribuído. Ela se levanta da cama e se espreguiça toda agora. Engulo
em seco e meus olhos deslizam pelo seu corpo como um imã. Mesmo que eu tente deter esta vontade,
é instintivo sentir-me atraído por ela.
E então, a sensação que parece querer me sufocar me atinge quando os olhos dela encontram
os meus novamente e, mesmo que seu rosto esteja neutro, o brilho em seus olhos é como um sorriso e
é uma porra de um pé no saco. Um murro no meio do meu peito.
Maledizione.
Essa mulher traz instintos dominadores à tona dentro de mim. Quero pegá-la, jogar na cama e
dominá-la de todas as formas. Mas... não. Não posso fazer essa merda.
Odeio admitir que Madeleine me traz essa sensação, que não sei bem o que é, ou no fundo da
minha consciência eu sei sim, mas me nego a pensar nesta possibilidade. Afinal, nunca fui adepto a
sentimentos de nenhuma forma em minha vida. Eu não saberia como retribuir, e nem aceitar. É
preciso confiança para isso e não sei confiar em ninguém a não ser em meus irmãos.
No fundo preciso me lembrar de que ela está aqui primeiramente por conveniência. Se fosse
por escolha, já tinha se mandado há muito tempo. Ela me odeia por tê-la trazido para cá de novo e
por obrigá-la a ficar até tudo ficar bem. Ela não nutre nada por mim a não ser uma inclinação por
gratidão e nojo. Nem sequer pensou na proposta de casamento. Transar comigo é desejo apenas.
Foda-se! Ninguém mandou o pai dela pedir ajuda ao desgraçado do meu pai. Agora ela está
sob meu domínio e, enquanto eu conseguir, ela estará aqui e todas as vezes que sentir vontade e ela
querer também, vou foder com ela. Pois é só isso. Tesão. Luxúria.
Madeleine puxa o ar com força e o prende, enquanto seus olhos estão aprisionados nos meus.
Ergo o queixo e acabamos entrando em um duelo, e nem sei bem o que estamos tentando ganhar.
Mas seus olhos não suportam mais, ela engole em seco e deixa de me encarar. Seu instinto
protetor fica em alerta. Ela abraça o próprio corpo quando volta a erguer o rosto e fala:
— Acho que preciso... de um banho antes de voltar a dormir.
— Eu também — digo e saio da cama, pegando minha cueca no recamier. — Vou deixar você
à vontade.
Dou as costas e saio do seu quarto fechando a porta, não deixando aquela sensação ganhar
forças e eu a derrubar em sua cama.
Puta que pariu! Estou fodido!
A interação entre Travis e eu estava indo muito bem, até dois dias atrás quando ele
chegou de madrugada, quase de manhã, e o encontrei subindo as escadas. Nós nos entreolhamos por
longos minutos até nos atacarmos em um beijo alucinante.
Senti como se ele estivesse devorando minha alma com aquele beijo.
Dio mio. Este homem me deixa... entregue.
Contudo, depois de uma noite de sexo quase violento entre nós, ele se afastou. Talvez fosse
pelo que eu descobri de manhã, depois que desci, assim que soube que ele tinha saído, que tem um
grupo de máfia atrás dele e que na noite anterior ele viveu uma guerra.
Faço ideia de como foi, pois além dos novos hematomas pelo corpo e uma ferida contida
com um curativo improvisado no ombro direito, os olhos dele, embora estivem focados em mim,
enquanto transávamos, possuíam uma enorme aura negra. Uma sombra cruel e impiedosa do homem
que foi criado para ser com seus inimigos, mas, na cama comigo, estava contido e focado em me
foder como se fosse a saída para a sua tensão e ira. Algo que ele pudesse realmente dominar, pois é
isso. Ele me domina.
E pelo que ouvi de Luca, enquanto estava tomando café da manhã com Colen, esquecendo de
mim à mesa também – os dois não são muito bons em fazer sigilo –, é que estão querendo invadir Las
Vegas e derrubar Travis com a ajuda da Famiglia rival da Lawless, a Diabolos. O grupo organizado
mais sanguinário de todos da Cosa Nostra. O que ouvi sobre eles me deixou arrepiada de medo.
A coisa não está nada boa.
Mesmo Travis, no caso a Lawless, detendo a maior parte do território americano há mais de
cinco gerações, e a Darkness sendo a mais temida pelas “leis” deles, afinal o coração da Cosa
Nostra se concentra em Nova York, sede da Famiglia Darkness e seu clã chefe, os D’Ângelo. A
organização ítalo-americana mais temida é a Diabolos, que tem pouco território e, pelo que entendi,
odeiam o fato da Lawless e a Darkness serem “maiores” em domínio. Todavia, a Diabolos compensa
pelo pavor, são mais temidos por não perdoarem nem mesmo animais de estimação se for preciso.
Colen comentou brevemente, depois que se deu conta de mim, que Travis está sob uma forte
pressão vinda de Paolo. Seu consigliere precisa que ele tome uma decisão urgente que o ajudará,
mas que Travis está relutante. Não sei o que é, mas se fosse ele aceitava logo.
Além disso, Dario está fazendo merda com uns meninos estranhos. Eu o vi chegar ontem
pelas mãos de Paolo, que foi legal comigo. Lembro da cena direitinho na minha cabeça:

“Sei que é pedir muito, mas fique de olho nele”, Paolo me pediu depois que
Dario correu para os jardins da casa, provavelmente para a pequena casa, que eu
nunca posso ir.
“Algum problema?”
“Encontrei-o usando drogas e Travis não gosta disso.”
Respirei fundo pela informação. Engolindo em seco, assenti ao dizer:
“Pode deixar que cuido dele.”
“É até o Travis voltar.”
“Ele está bem?”
“Dario?”, Paolo perguntou franzindo o cenho.
“Travis”, corrigi.
Seus olhos ganharam um tom surpreso antes de me responder.
“Na medida do possível.”
Novamente engoli em seco e assenti. E com um aceno de cabeça, Paolo foi
embora deixando Pietro como guarda da porta.
“A senhorita pode ficar tranquila.”
“Eu sei”, murmurei e sabia que estava mentindo.

E foi por isso que nas próximas horas fui me deitar, mas não dormi direito. Queria saber
como ele estava e se chegaria em casa. Tive dois pesadelos horríveis e, na terceira vez que levantei
para tomar um copo de água, encontrei Travis no corredor dos quartos, terminando as escadas.
E por isso deixei-o me dominar.
Por isso me entreguei loucamente a ele.
Estava preocupada e fiquei preocupada por estar pensando nele. No seu bem-estar. Tudo está
de ponta cabeça com Las Vegas e se o irmão voltou a usar drogas, ele deve estar uma pilha de
nervos.
Saber por Colen quem é o irmão dele... mesmo sendo cômico um contraventor de drogas
como Travis, não usar e não querer que seus irmãos usem também, é surpreendente. Realmente é
engraçado como o homem que divido a cama, às vezes, se contradiz sobre seu caráter. Ele é
imprevisível para mim e uma surpresa boa.
Estou almoçando quando sinto a presença dele. Sorrio de cabeça baixa e o espero dizer
alguma coisa, ele sempre tem algo a dizer. Mas depois de um longo silêncio, levanto a cabeça e o
encaro. Engulo em seco, pois não parece bem.
— O que foi, Travis? — pergunto me pondo de pé. — Que cara é essa?
Dio mio! Perdi o juízo falando assim com ele.
— Sua mãe está morta.
— O quê? — grito chegando até ele e dando um soco com as mãos viradas de lado em seu
peito. — Repete o que disse.
Sem esforço, ele segura meus punhos detendo mais um golpe e me encara fixamente.
— Me escute porque não sou de repetir — diz com a voz rouca e grave, repleta de ira. —
Não matei sua mãe. A encontrei como prometi a você e, infelizmente, morta.
— Quem foi? Eu vou acabar com eles.
— Mia cara, você não tem esse poder.
— Você tem.
Travis prende o ar na garganta e seus olhos ficam azuis tão escuros que parecem negros.
— Não tomarei essa guerra com a Bratva por sua mãe ou seu pai, é pela Famiglia e a minha
família. — Faz uma pausa. — E por você. Pelo seu bem, não porque me importo com os seus pais e
sua dor em perdê-los.
— Insensível.
— Acho que precisa rever sua vida e ver que os insensíveis foram eles — diz entredentes. —
Faço mais por você do que seus pais um dia tentaram. Eles tiveram da Bratva o que procuraram. Eu
odeio aqueles russos, mas não acho que seus pais tiveram nada do que não mereciam.
Suas palavras fincaram em meu peito, em meu coração como uma lâmina afiada. A verdade
machuca e, quando se trata dos meus pais, a verdade é feia. É terrível e esse homem, que mata seus
inimigos sem titubear, realmente me trata melhor do que minha mãe já fez um dia. Ela não se
importava comigo, apenas em manter as aparências e ter dinheiro para sustentar seus vícios.
Contudo, é inevitável meus olhos ficarem marejados. Tento segurar o soluço e falho
ridiculamente.
— Eu não deveria me sentir assim — falo com a voz embargada.
Travis nega com um balanço de cabeça raso. Sem dizer nada, ele passa um dos braços por
meus ombros e me leva para o seu escritório.
Entro e fico parada no meio. Ouço a porta se fechar devagar e meus olhos se fecham quando
sinto suas mãos em meus ombros, deslizando lentamente. Beija minha bochecha e murmura no meu
ouvido em seguida:
— Pode chorar. Não se reprima.
O bolo na minha garganta se aperta.
— Você chorou?
Afinal ele também perdeu seus pais. Sei que não tinha o pai em alta estima, mas talvez pela
mãe chorou. Talvez lamentou.
— Eu não choro.
— É... eu sei. — Assinto dizendo.
Em um movimento gentil, vira-me de frente pra ele.
— E jamais choraria por eles. Não mereceram nem meus pensamentos, nem mesmo minha
raiva. Os seus não foram tão monstros como os meus, Madeleine, por isso você chorar é normal. Não
reprima, angele.
Ai... Meu Deus. Como uma comporta se abrindo, derramo meu pranto em seus braços.
Despejo a tristeza de não ter tido a chance de falar com minha mãe uma última vez. De ela ter sido
mais minha amiga e pelo fato irrefutável de ter sofrido antes de ter seu fim. Esse mundo é tão
sangrento.

O velório da minha mãe está cheio de pessoas hipócritas. Pessoas que nunca conheci de
verdade, não porque não quis, mas por ter sido afastada da vida deles por nunca aceitar onde nasci.
Engraçado é que agora vivo sob o teto do chefe da organização que cuida, dá suporte e é o nosso
líder, sem reivindicar mais suas ações.
Ainda não gosto, porém, parei de me martirizar com isso. Eu me entreguei a ele, ao desejo, a
parte carnal que grita quando estou tão perto dele. Travis deixou de ser alguém que abomino para
alguém que eu desejo.
Pensar nisso faz eu me sentir mais hipócrita do que os que vêm me desejar pêsames sendo e
que só sabem quem sou porque falam por aí.
Meus pais nunca se orgulharam da única filha que tiveram. Ridículos.
Eram para serem felizes por eu ser esforçada, inteligente e forte. Por não tolerar atrocidades
como alguns homens da Famiglia fazem – estupram as esposas, têm amantes quando as esposas estão
grávidas –, por querer cursar uma faculdade para ser alguém além da esposa de alguém. Por querer
minha liberdade e não aceitar o mundo obscuro que meu pai vivia muito antes de se meter com a
Lawless. Puta que pariu! Tudo isso, absolutamente tudo isso é uma grande hipocrisia!
— Você está bem? — A voz doce e quase angelical de Marinne me desperta do devaneio
cheio de ódio.
Sorrio virando o rosto para ela, que está ao meu lado desde que saiu de casa para vir até o
cemitério. Preferimos que o velório fosse logo onde deixaria o corpo de Luma.
E Marinne não merece esse mundo. Ela é formidável, uma menina de ouro. Quando chegou
do internato ontem à tarde, mesmo sendo quarta-feira e soube por ela que Travis a quis por perto por
causa de mim. Ela disse que ele sabe o quão bem sua presença me faz. Ela foi imediatamente ficar
comigo e disse que cuidaria de mim. Céus. Ela tem quatorze anos e tem mais senso de espírito e
carinho por mim do que minha mãe morta teve.
— Estou sim, querida.
— Humpf! — resmunga e aperta seu braço no meu como um alerta.
Abro mais o sorriso para ela e seus olhos brilham de entusiasmo. Ah... esses olhos tão iguais
aos do homem que se aproxima de nós.
Travis e eu mantemos as aparências para todos. Não damos a entender que somos mais que
amigos, se é que somos “amigos”. Não demonstramos que dormimos juntos e que temos intimidade
quando estamos a sós. Ninguém além de Rosália sabe.
Inclusive, ela só sabe por que limpa meu quarto e encontrou a roupa dele lá mais de uma vez
e, como troca a roupa de cama, vê o óbvio. Mas com ela não me preocupo e acredito que nem a
Travis. Ela não seria louca de bater com a língua nos dentes para ninguém, que potencialmente pode
arrumar problemas.
Eu sou da Famiglia, e como tal deveria guardar minha honra para o meu esposo, pelo menos
o primeiro. E Travis como Capo detentor de poderes na Famiglia, sabia e sabe dos apuros.
Ele sabe! Me pediu em casamento e recusei. Sou tão tola.
— O que foi? — ele pergunta chegando mais perto de mim e fazendo-me erguer o rosto para
ver o seu. — Qual o problema?
Engulo a amargura e a sensação estranha no meu peito, e respondo:
— Nada, Travis. Nada.
Vejo-o cerrar a mandíbula e em seus olhos a descrença, mas como estamos em público e ele
precisa mostrar que é um grande líder, não faz uma cena me perguntando o que foi até eu dizer,
mesmo que isso demande muita força dele. Sabemos que não gosta de segredos que o envolva. E
pensar em nós dois, as atividades que fazemos entre quatro paredes e o pedido de casamento, é muita
coisa sobre ele.
— Conversamos em casa — digo para acalmá-lo.
Ele meneia a cabeça assentindo e se afasta ficando com Paolo e Colen, que estão de olho em
Dario. Antes, quase não via o caçula dos Lozartan, agora ele é presença marcante entre nós.
— Você está mesmo bem ou só disse isso para ele não insistir?
Meu humor se recupera rápido com a indagação de Marinne.
— Um pouco dos dois.
Ela balança a cabeça e olha para frente com seus olhos escuros combinando com o vestido
preto. Estamos todos de preto. Tudo bem que Travis não usar preto é raridade.
— Acho que isso aqui já pode terminar.
— Concordo — digo baixo.
Estou deitada na minha cama, sonolenta, mas não dormindo ainda, quando sinto o colchão
afundar e um calor que conheço muito bem abrandar meu corpo. Com extraordinária lentidão, sinto-o
puxar o lençol para revelar o meu corpo apenas de lingerie e a camisola transparente curta. Escuto
quando toma uma respiração profunda com apreciação e prazer antes de, por fim, seus dedos
trilharem um caminho da minha perna até minha cintura.
Gemo baixinho maravilhada. Adoro o jeito que ele me toca. É como se fosse a sensação mais
deliciosa que pudesse ter. Eu sou sua obsessão e sei muito bem que ele é a minha.
Depois de um dia cansativo com o velório, tê-lo aqui é tudo que preciso. E me odeio por ter
ficado tanto tempo me martirizando por hoje gostar tanto do errado. Gostar de estar na mesma cama
que Travis. De desejar estar com um assassino cruel, que tem um apelido mais ridículo do mundo,
porém verdadeiro. O homem que mata rindo. Esses pensamentos subjugam os ruins que já tive sobre
ele, que mata os homens maus. Mata seus inimigos. Mata os homens que querem fazer mal a Famiglia
e os seus homens. Ele não mata qualquer um. Não mata bons homens. E por isso meus pais morreram.
Não eram bons. Sendo mortos ou não pela Lawless, foram por uma das Famiglie.
Mas o mundo da máfia é contraditório. Como podemos pesar na balança quem é mal ou quem
é bom? Todos são assassinos cruéis e impiedosos. É a verdade e não posso negar. No entanto,
também não consigo fugir do desejo que sinto por Travis. O homem conhecido por não ter coração.
E... como é gostoso sentir suas mãos, sua boca e o seu corpo no meu.
Espero pacientemente ele me virar para poder ficar de frente, então seu corpo cobre o meu,
no percurso beijando cada pedaço que sua boca vai descobrindo até seus lábios estarem no meu
queixo, no meu pescoço, na minha orelha e ele sussurra:
— Eu adoro o fato de você me querer tanto quanto eu quero você.
Meu Deus... Essa sensação de ser pega, capturada, dominada por ele... vai acabar me
sufocando. Eu sabia que seria perigoso ficar com ele, mas fiquei e agora não sei o que faço para
parar de querer.
— Travis — gemo seu nome e anseio pelo seu beijo.
Recebo com ardor seus lábios tocarem os meus, delicados e quentes. Sinto um gosto fresco
de limão e vodca. Ele devia estar bebendo na boate. Precisou ir para resolver problemas por lá, e eu
vim para casa.
Travis me beija calmo, lento e tão diferente do normal. Jogo meus braços em seus ombros e
coloco intensidade no beijo, mordendo seu lábio e dando uma lambida. Minha língua é capturada por
sua boca e logo a sua língua está raspando a minha furtivamente em um beijo quente. Ele respira
audível pelo nariz, quase sem fôlego, enquanto nos beijamos e logo seus dentes raspam meus lábios.
Suas mãos não param de passar pelo meu corpo e ele grunhe quando começo a fazer o
mesmo. Percorro com as pontas dos dedos seus ombros, braços e, quando vou deslizar por suas
costas indo até suas nádegas, noto que ele já está nu.
Delirando de tesão, gemo ao sentir seu pênis livre, quente e duro entre minhas coxas. Isso me
faz abrir as pernas e abraçar seu corpo, querendo que ele rasgue minha camisola.
Enquanto estou louca para que ele me possua animalescamente, como da última vez que a
gente ficou, ele está calmo, tranquilo e quase carinhoso.
Ainda me beijando, oras parando para respirar, passa seus braços por baixo do meu corpo,
abraçando-me e nos encaixa como um só, e continua beijando e lambendo meus lábios, dá um selinho
no meu nariz, na maçã do meu rosto e lambe o lóbulo da minha orelha.
Seu corpo ondula como se estivesse dentro de mim, excitando-me sobre minha calcinha. Dio
mio! Desavergonhadamente, gemo no seu ouvido pedindo:
— Travis... Tira a minha roupa.
Escuto-o arfar e dizer com sua voz cálida de sexo:
— Você está muito impaciente hoje.
Franzo a testa e seguro seu rosto, flexiono meu corpo para que seu pau aproxime de mim e
sussurro:
— Eu quero você... Dentro de mim... Agora.
Solta um som como se fosse um rosnado, me dá um beijo rápido e seco, e se afasta olhando-
me nos olhos.
Ele senta-se no meio das minhas pernas, os olhos nunca desviando-se de mim e confesso que
não consigo também parar de olhá-lo. Essa beleza bruta, crua e nua na minha frente. Esse deus grego.
Esse homem é tão lindo e gostoso. Uma máquina de matar e foder perfeita. É quase um sonho ir para
a cama com um homem como esse.
Reviro os olhos fechando-os em seguida, sentindo suas mãos nos meus tornozelos. Ele ergue
uma perna, beija cada centímetro, depois a outra, me puxa até ficar quase em cima das suas coxas.
Sem precisar pedir, me ergo e sento no seu colo. Ele lambe meu pescoço, mordisca minha
orelha e, devagar, puxa minha camisola para cima até poder passar pelos meus braços. Agora, apenas
com a calcinha, aproveito estar pelada para sentir sua pele na minha. Abraço-o bem forte e sinto seu
calor se misturando ao meu, seu cheiro, seus beijos nos meus ombros, as mãos nas minhas costas.
— Isso é tão bom — gemo baixinho no seu ouvido.
— Uhum — concorda. — Sua pele é uma delícia.
Sorrio e fico toda arrepiada quando ele pega meus cabelos e os coloca para a frente, para
sair do caminho e suas mãos acariciam minhas costas. Abraço-o mais forte e meu gemido é de puro
prazer. Não tenho palavras para descrever como é gostoso.
Seu carinho é rápido, pois dando um beijo com os lábios entreabertos, molhando meu ombro,
coloca as mãos na minha lombar e faz eu descer meu corpo até estar deitada na cama, mas “sentada”
em suas pernas.
Curvo meu corpo pra frente quando sua mão desliza pelo meio do meu corpo. Ele encosta a
palma no meio dos meus seios, os dedos brincando com meus mamilos. Não paro de fazer sons que
não sei exatamente se seriam gemidos.
Geralmente. Melhor, ele nunca foi assim. Carinhoso comigo. E é... incrível.
Aprecio suas mãos passando por meu corpo, calmas e quentes. Sinto quando vai descendo e,
por fim, segura minha calcinha. Continuo de olhos fechados e apenas espero quando ele a segura nas
mãos e começa a deslizar para sair do meu corpo, e puxa com lentidão. Ergo minha pélvis para sair
do caminho e passando das coxas, faço-as encostarem no meu peito para ele remover a peça de mim.
Abro olhos bem a tempo de pegá-lo jogando a calcinha para longe. Engulo em seco por causa
do seu olhar faminto. Seguro a respiração e me arrepiando com suas mãos nos meus tornozelos,
suspiro quando ele abre minhas pernas.
— Ah... Travis!
Não tenho tempo de me preparar para o contato da sua boca na minha boceta. Ele foi tão
rápido me fazendo ficar mais para cima até estar no ângulo certo para poder me chupar, que... Porra!
Ele abocanha meu sexo com a boca aberta, enfiando a língua no meu calor. Seu nariz
raspando no meu clitóris de propósito. Envergo meu corpo, jogo meus braços para cima e pego meus
cabelos, quase alucinando com sua boca em mim, beijando-me como se fosse minha boca.
— Travis — gemo baixinho, em um chiado.
Ele dá mais alguns estímulos com sua boca e, quando percebe que estou quase gozando, se
afasta e mete dois dedos dentro de mim e faz círculos na ponta do meu clitóris com o polegar.
— Ah... Porra!
— Vamos, angele.
E mesmo que suas habilidades na cama sejam incríveis, quando ele diz o meu apelido, me
chamando de anjo, faz com que eu atinja o clímax feito uma descida de montanha-russa. Gozo
chamando seu nome e pegando seus cabelos, puxando sem dar a mínima.
Ele vai me matar... de prazer.
Sinto-o limpar a boca em minhas coxas, o colchão afundar quando se mexe. Ele me segura
pela cintura e me puxa. Estou sentada em seu colo de novo e agora é perfeito.
Não dizemos nada. Olho no olho, a mesma respiração e a batida do coração em compasso,
nos unindo como um só. Pego seu pau, coloco na minha entrada e respiro fundo.
— Devagar — ele pede com sua voz de barítono.
Dio mio.
Um sorriso frenético de puro contentamento, uma plenitude, se abre em minha face e já que
ele me segura... Me solto. Fecho os olhos, deixo minhas mãos no seu peito e desço sentindo-o
deslizar – finalmente – para dentro de mim. Me abrindo, me... possuindo.
Um rosnado escapa da sua garganta e seus braços me puxam.
— Travis... — Jogo a cabeça para trás.
Quase uivo ao sentir sua pele na minha de novo. Esse contato... os bicos dos meus peitos
sentindo a dureza do seu peitoral malhado. As mãos duras, com calos e fortes, afagando minhas
costas, que começam a suar. Minha bunda, que ele aperta. Meus braços, que o rodeiam como se ele
fosse meu. Sua boca no meu pescoço, que é mordido, lambido, beijado...
Sinto-me em frenesi. Afoita. Eufórica. Melhor que isso... Não sei o que seria.
— Madeleine — ele murmura meu nome.
Abro os olhos, encaro-o e perco o fôlego.
— Travis! — digo antes de estar tão... mas tão próxima a ele, que chega a ser sufocante, e o
beijo.
E nos mexemos, fodendo no mesmo ritmo. Gememos, suamos e chamamos nossos nomes.
Exigimos mais e mais. E nem sei mais o que seria esse mais.
O jeito que me envolve em seus braços, possessivo. Como me chama, beija minha boca e diz
coisas como:
— Me cavalga, angele. Me tome. Se solte.
E respondo subindo e descendo em seu comprimento. Ondulo meu corpo, faço-o friccionar
onde quero e remexo meus quadris com ele. Travis bate seu corpo no meu vindo para cima. Estamos
suando, ofegantes, sedentos.
Solto um soluço quando esse ato parece ser demais, que não é simples. Não parece ser só
sexo. E ele me deita na cama, lentamente, sem nunca nos separar e finaliza batendo os quadris em
mim, indo mais fundo e perigosamente me deixando louca de desejo.
Gozo perdida nele e nos pensamentos. Ouvindo sua voz no meu ouvido, seus beijos no meu
ombro, pescoço e no rosto. Fecho os olhos e afago suas costas quando se deita sobre mim e relaxa
com uma respiração que é como se saísse de dentro dele.
Fecho bem os olhos, puxo o ar e solto devagar.
Acho que... acabamos de fazer amor.
Pego o relógio no meu armário e o coloco saindo do closet, voltando para o meu quarto. Abro
um sorriso de leve vendo Madeleine deitada na minha cama como se fosse sua. Ela, por algum
motivo, veio me ver pela manhã.
Tem algo de estranho com ela hoje.
— Sabe de uma coisa que eu sempre pensei e, talvez, você possa me tirar essa dúvida?
— O quê? — indago colocando meu paletó e terminando de abotoá-lo, levanto o rosto para
encarar os olhos questionadores de Madeleine. — Diga o que você está pensando. O que é que ronda
essa sua cabecinha maldosa?
— Dessa vez, eu não creio que seja maldosa.
— Sempre é — falo com sarcasmo e sinto o canto dos meus lábios curvarem-se levemente.
— Só queria saber. — Pula na cama, sentando-se de frente para mim. — Na verdade, eu
queria entender por que você tem que ficar todo arrumado e bonito e cheiroso?
Franzo a testa sem entender onde ela quer chegar.
— Você está com uma camisa branquíssima e seu terno passado. E vamos combinar, um terno
de três botões feito sob medida. O cabelo todo arrumadinho e isso tudo só para você sair e matar
pessoas.
Eu me aproximo dela com passos suaves e precisos, o jeito que eu costumo andar quando
quero intimidar as pessoas e sei que isso funciona com ela perfeitamente bem. Ela se levanta e ergue
o queixo para mim. Cara a cara com ela, fito seus olhos azuis intensos e respondo com meu sorriso
sinistro:
— Primeiramente que, quando eu saio para alguma missão, podemos dizer assim, não vou
pensando em matar todo mundo. Mas obviamente que eu levo minhas armas e os meus homens como
retaguarda, porque, às vezes, a maldade não está em quem vai, no caso eu, e sim em quem está me
esperando. Eu vou arrumado porque preciso manter a pose. Isso se chama postura, minha posição,
poder. E quanto maior parece a minha riqueza, meu poder, mais meus inimigos me temem, pois veem
o quão longe precisarão ir para me alcançar... — dou um passo, cortando nossa distância — em tudo.
Noto-a engolindo em seco.
— E... só estou dizendo isso para você, porque me divirto com a sua vontade em querer
saber tudo sobre o mundo que você mesma gosta de dizer que odeia, mas é muito engraçado que você
odeia tanto e esteja tão curiosa o tempo todo.
Pisca rápido, demonstrando seu nervosismo e diz baixo:
— Talvez eu esteja curiosa porque pertenço a ele. Sempre pertenci e com a morte do meu pai,
não tive escolha entrando mais ainda nessa escuridão.
Como sempre gosta de alfinetar o fato de eu a ter mantido em minha casa. Até parece que a
mantenho em cárcere. Cazzo. As portas sempre estão abertas e ela pode ir quando quiser, mesmo que
eu vá atrás depois e não queira que ela vá.
E os problemas não são as paredes que circulam o território da minha casa e os passos que
ela deixa marcados no chão. A perseguirei porque ela está sob meu domínio. Ela é minha.
Estico minha mão e seguro seu queixo, acariciando suavemente sua mandíbula, e falo com a
voz baixa:
— Querendo ou não, você adora me ver arrumado. Você acha que eu não percebo como fica
perto de mim quando estou cheiroso e como adorou me ver de smoking.
Madeleine tenta não rir, mas perde lindamente o controle que acha que tem por si mesma
quando está perto de mim. Se até os meus inimigos, que são da mesma laia que eu, perdem as forças,
imagina uma linda donzela como ela.
— Eu não... — ela gagueja e tenta se recompor, respirando suavemente. — Sinceramente, não
posso dizer que acho você feio ou que não aprove suas vestimentas... suas escolhas de roupas. Mas...
isso não vem ao caso. Ainda é bizarro que você fique todo bonito para ir matar seus inimigos.
— Você sabe que não faço só isso. — Cerro os olhos.
— Uhum.
— Bene, se você vê assim, mia cara, não posso fazer nada por você.
Dou um beijo na sua boca com força, roubando seu ar e me afasto.
— Tenho hora, vamos.
Mesmo que tenha me virado para a porta, vi-a morder a boca sorrindo. Ela, no fundo, gosta
mesmo é de provocar, porra.
Saímos do meu quarto e sou obrigado a esperá-la pegar o robe, depois que insisto para
colocar. Não vou deixá-la passeando com sua camisola de seda pela casa como se fosse normal.
— Prontinho, chefe.
Resmungo e pego sua mão. Descemos as escadas, mas antes de terminá-la, me viro e a beijo
de novo.
— Não precisa me levar na porta.
— Eu quero — diz baixinho.
— Okay. — Aceito com um aceno.
Solto sua mão e dou-lhe as costas, caminhando para as portas que são abertas como se
alguém estivesse prestando atenção na conversa e percebesse que acabei de dar fim e estou pronto
para sair e matar como Madeleine gosta de dizer.
É por isso que gosto de ficar perto dela, apesar dos pesares. Ela faz a minha profissão ser
mais instigante do que verdadeiramente é.
Enzo me oferece um aceno de cabeça e eu faço o mesmo. Virando-me, olho para Madeleine.
— Vá se deitar — digo vendo as horas. — Está muito cedo e na hora de criança dormir,
senão o bicho-papão te pega.
Ela solta uma risada antes de falar:
— Por incrível que pareça, o bicho-papão vai sair agora e vai voltar quando eu estiver no
meu décimo sono. Ele dorme a alguns passos da minha porta, não tenho mais medo dele.
Olho para ela a tempo de vê-la fazendo um biquinho de deboche e abrir seu sorriso cínico.
— Cuidado que, às vezes, o bicho-papão se aproveita da vulnerabilidade de você acreditar
que não tem mais medo e bate na sua porta.
Ela dá de ombros e corre para as escadas. Esse jogo é perigoso e posso ouvir meu avô
reclamando comigo, mas o que posso fazer? Eu gosto dela aqui.

Entro na boate e de imediato tenho Antonela me bombardeando com informações.


— Boa tarde para você também — digo sarcástico.
Antonela ri e revira os olhos.
— Me desculpe se preciso que você compareça mais aqui, Travis.
Passo por ela e subo as escadas para o escritório. Geralmente dou uma olhada primeiro no
local, bebo um pouco no bar e depois vou para o escritório. E hoje é diferente não apenas por ter
várias coisas para resolver. Não tenho mais vontade de gastar meu tempo com baboseira e sei que é
um passo para transar com Antonela, e não quero mais isso.
Acabo de ter uma conversa tensa com Dario e Colen, que tem como obrigação cuidar dele.
Eles moram na mesma casa e Colen precisa cuidar dele. Tudo bem que, na mesma noite, aconteceu
aquela emboscada com a Hechos.
Está tudo um inferno no momento. A Bratva está apertando o cerco, a Hechos está se
aproximando de uma aliança com a Diabolos. E eu não tenho nada em troca para dar a um deles para
não ter que sofrer um golpe, mas tem a carta na manga. A aliança com a Darkness me assegura, nos
assegura, de força e poder.
— Vou tentar vir mais. Só que no momento tenho muitas coisas para resolver. Coisas mais
importantes do que bebidas, novas dançarinas, uma nova banda, que você pode muito bem eliminar
rápido. — Entro no meu escritório e vou direto a minha mesa. — Então, me dá o que preciso saber e
você não pode resolver, apenas.
Ela ergue as sobrancelhas em surpresa e dá a volta na mesa.
— Você parece muito nervoso — diz com a voz mansa.
Encaro-a quando giro a cadeira para poder vê-la se aproximar.
— Posso cuidar disso para você?
Baixa um pouco o corpo e toca na minha gravata. Estou estático e quando tenho reação é para
afastar minha cadeira, que ainda bem que essa merda tem rodinhas.
— Está tudo bem, Travis?
— Sim, mas não estou com cabeça.
Ela assente e se afasta também.
— Tudo bem e...
— Travis, não aguento mais esperar você. — Paolo invade minha sala falando e atrapalhando
a fala de Antonela.
— Eu já estava saindo mesmo — minha gerente informa saindo da minha sala.
Balanço a cabeça indignado e olho para Paolo.
— Você podia esperar eu chegar de verdade no lugar antes de ficar me bombardeando com
coisas, que você acha que eu preciso me importar.
— Você acha que não é interessante a sua aliança com a Darkness?
Levanto-me e dou um soco na mesa.
— Eu quero uma aliança com a Darkness, mas não me casando com a filha do consigliere de
Giovanni D’Ângelo.
— Falando nele, ligue para ele agora e marque uma reunião. Pelo menos mostre respeito para
seu futuro aliado.
Cerro o maxilar e preciso concordar. Quando Paolo me dá esses ultimatos, entendo o porquê
meu pai gostava dele e meu avô me aconselhou a ficar com ele depois. Ele é um ótimo conselheiro.
Sem chance para tentar me adular ou passar a mão nos meus erros, ou quase erros. O odeio, às vezes,
mas por ser bom no que faz.

Desde pequeno via as transações que meu pai fazia com outros grupos e seus Underboss
para se fortalecer ainda mais. Meu avô também me deu grandes ensinamentos para ser um bom líder,
mas, embora eu saiba como funciona, não quero esse acordo com a Darkness.
Eu pretendia futuramente criar um laço com uma das organizações ou os Underboss. Era
inevitável. Todo Capo já fez acordos de sangue, como chamamos, em algum momento do seu
mandato. É ruim porque ambos os lados têm a perder ou um segredo. Alguma sujeira demais nas
mãos de quem não gostaríamos.
No meu caso, eu tenho a Bratva, a Hechos e a Diabolos querendo invadir meu território e
nitidamente pareço mais fraco com outra traição. Depois que o filho da puta do Edgar Beluzzo fez o
que fez, tudo se transformou num caos e eu sabia que uma hora o caldo ia entornar.
— Cazzo — resmungo sentado no banco de trás do carro.
Estou indo para o Bellagio. Tenho que ver umas coisas no cassino e dar uma olhada na boate
de lá, que Antonela passará a cuidar no mês que vem. Ela é muito boa em lidar com as crises e
preciso que resolva coisas que, se eu pedir a Paolo, terei que enviar uma carta para os pais do
gerente com pêsames.
— Algum problema? — Antonela pergunta, sentada ao meu lado no Hummer.
Depois das ameaças e a morte de Luma Beluzzo, que pareceu que fiz pouco caso, mas a
verdade é que fiquei puto e preocupado com a situação. Ando para cima e para baixo na cidade em
um tanque.
Minha raiva é tamanha e a morte de Luma... cazzo.
Eu pedi para Paolo e Luca conseguirem capturar a mãe de Madeleine viva, mas Ivon Avilov
não quis conversa e mandou um vídeo da hora que Luma morreu no cativeiro e, por cortesia, o corpo
dela foi entregue para nós enterrarmos.
As coisas andam enfurecidas por aqui e Paolo tem razão. Eu preciso falar com Giovanni
D’Ângelo.
— Nada. Preciso fazer uma ligação.
— Se quiser, eu finjo que não estou aqui.
Dou um olhar de impaciência para ela e pego meu telefone dizendo:
— Não seja engraçada. Você sempre é discreta.
Antonela assente e se vira para a janela, colocando os fones de ouvido. E como o carro foi
preparado para me dar privacidade, o vidro que separa Enzo – que está substituindo meu motorista,
pois é mil vezes melhor que ele – e Luca, que está ainda mais na minha cola. Parece que Paolo está
extremamente preocupado comigo e meus irmãos. Todos nós estamos com escolta redobrada. Estou
pensando em deixar Marinne em casa com aulas particulares. Ela ir para o internato está me tirando a
paz.
Pego meu celular e faço a ligação para o Capo da Darkness. Em Nova York está bem tarde,
mas ele que se contente. Tive um dia cheio.
— Alô.
— É Travis Lozartan.
— Sabia que você iria me ligar em algum momento — Giovanni D’Ângelo diz sem muito
entusiasmo.
— É, você está certo, mas não é o que está pensando. Precisamos de uma reunião.
— Posso ir aí no final do mês.
Ótimo. Terei um mês para convencer Paolo que meu plano é ainda melhor.
— Por mim tudo bem, mas antes quero que você prometa não fazer nada que possa se
arrepender depois.
— E nem você, Travis.
Estou com a cabeça cheia e isso não é novidade para ninguém. Desde cedo não parei. Se fiquei
em algum dos lugares que fui hoje mais do que uma hora, foi por pura necessidade.
Deveria ir para casa quando acabasse tudo que tinha que pôr em ordem hoje, mas não estou.
Minha última parada foi no Bellagio de novo e resolvi ficar por aqui depois que pedi a Enzo para
passar na minha casa e ver como estava tudo com seus próprios olhos. Não sei se vou ficar para
dormir, mas com certeza quero uma distração hoje.
Há algum tempo não tento me divertir pelas minhas boates e hoje tive que visitar três além de
meus cassinos. Minha cabeça está explodindo de problemas e, procurando distração, parei na boate
do Bellagio, a mais cotada do hotel. Hoje tem um show de uma banda local que está tentando chamar
atenção, e Antonela achou uma boa ideia convidá-los. Ela sempre ajudava o gerente daqui, então
tomar o lugar dele não é nada de mais. A incompetência fez isso com Gerard.
Pego minha bebida em cima da mesa de centro, que fica em frente ao sofá preso na parede e
tomo um gole até finalizar. Meus olhos não se desgrudam da multidão que dança, bebe e se esfrega
pela boate.
O camarote da família, é igual ao da boate que Antonela comanda, a Pandora, que fica em
Las Vegas. Essa é a The Bellagio Nightclub, a mais famosa e procurada de Las Vegas – que se tornou
o nome local para tudo, embora todos saibam que os grandes cassinos, inclusive os meus e onde
estou fica em Paradise.
Estou esperando uma mensagem de Luca, informando se Enrico apareceu. Esse desgraçado
vai me pagar pelas informações que vazou. Não tem desculpas pelo que fez. Ele traiu a Famiglia.
De repente, alguém entra pela porta falsa e perco o ar com o que vejo. Olho-a dos pés à
cabeça sem pressa, apreciando sua presença. Seu corpo curvilíneo com um vestido preto colado ao
corpo tomara que caia e uma gargantilha tão brilhante que parece sair luzes de dentro. As sandálias
de salto alto também brilham tanto quanto a gargantilha, e os lábios estão pintados de vermelho
sangue.
Ela está linda, sexy e gostosa demais. Irresistível.
É inevitável ficar excitado vendo Madeleine parada na minha frente, e seu sorriso mal
contido me dá vontade de pegá-la.
Quero jogar seu corpo nesse sofá e foder como um animal. Sei que nenhum filho da puta
invadiria esse camarote se eu desse a ordem de não fazer. Quando peço para ter privacidade, eles
sabem muito bem o que eu quero aqui dentro. Só que dessa vez não é Antonela que me deixa louco ao
ponto de transar no camarote com meus soldados cientes disso.
— O que você está fazendo aqui?
— Procurando me divertir — responde chegando mais perto.
— E como é que eu não estava sabendo disso?
— Eu pedi para Enzo não falar e ele é muito bom em guardar segredos.
Ela caminha para mim vagarosamente, movendo as pernas com lentidão e sei que está me
seduzindo. Cerro os punhos com a vontade de agarrá-la. Ela para na minha frente, entre minhas
pernas abertas e coloca a mão nos meus ombros. Como sou grande, alto, e o sofá também, e
Madeleine é baixinha, é a altura perfeita para as minhas mãos agarrarem seus quadris.
— Eu disse pra ele que queria te surpreender e fazer um agrado.
Sinto meus lábios curvarem-se de lado, sem mostrar os dentes.
— Nem mesmo quando sou eu que quero algo assim, eles deixam de me informar. — Agarro-
a, fazendo-a se sentar no meu colo e coloco a mão no seu queixo, segurando seu rosto em minha
direção. — Talvez eu realmente a subestime demais e você tenha uma forte persuasão com meus
soldados e até meus irmãos.
Ela dá um sorrisinho sem mostrar os dentes e balança a cabeça, quando o solta da minha mão.
Suas mãos vão para o meu peito, os dedos enfiam-se entre o meu colete e o coldre com as
armas, que ela nem parece mais ter resistência.
— Eu acho... — cochicha — que a convivência nos transforma e — pisca os olhos para mim
com doçura —, se eu sou tão confiante assim agora, é por sua causa.
Meu ego silencioso adora saber disso.
Cazzo!
— Foi só sua confiança que mudou?
Madeleine fica pensativa por um momento e, por fim, responde:
— Muitas coisas mudaram, Travis. Uma delas é a força que eu tenho dentro de mim agora. —
Sua voz é tão profunda, confiante. É sexy vê-la tão forte. — Eu realmente... Não sou a mesma mulher
que você resgatou naquela boate.
Minha reação ao ouvir essa declaração é a segurar com força. Faço-a se levantar e depois se
sentar no meu colo com as pernas abertas, uma de cada lado das minhas pernas. Deslizo minhas mãos
em suas coxas e depois em sua bunda e subo para as costas, até que eu a faço encostar o seu peito no
meu.
Ela não recua e suas mãos fazem a mesma coisa, explorando meu corpo onde alcança.
Suas mãos passam em meu peitoral, seus dedos resvalam em minhas armas, que ela não
demonstra mais nenhuma repulsa. Abre três botões da minha camisa e toca minha pele. Arrepio-me e
solto uma lufada de ar pelo nariz. Fecho os olhos e sinto seus dedos tamborilando meu pescoço até
subirem para as maçãs do meu rosto.
Encaramo-nos fixamente antes de nos beijar. Eu a beijo com violência, com sede dela,
sentindo seu sabor e tomando seus gemidos.
Cazzo!
Talvez, para alguns, um beijo é um simples beijo, mas com ela chega a suprir a necessidade
de uma forte excitação. Com essa mulher, os beijos são tão bons quanto se eu estivesse dentro dela.
Tão bons quanto se estivesse fazendo o que pensei quando a vi na porta. Madeleine tira meu juízo e é
meu afrodisíaco. Morro de tesão e é fácil demais ficar de pau duro por ela. Antes eu lutava um pouco
para ter metade do que sinto com ela, por um simples beijo.
Odeio a possibilidade dela querer ir embora e é por isso que, em meio a luxúria, sinto a ira.
Beijo-a com aptidão e raiva, como se estivesse tentando colocar na cabeça dela que seu lugar é
comigo. Que ela é minha.
Aqui ela vai estar segura, em todos os sentidos. Protegida de todo o perigo que a rondar, pois
eu protejo quem é importante para mim. Já se passou muito tempo desde que a vi a primeira vez, que
a quis a primeira vez. Hoje, quero-a na minha casa não pelo acordo que meu pai fez com ela há muito
tempo. Quero porque ela me pertence, porra!
Contrariado, afasto-me dela e seguro seu rosto quando digo:
— Por mais que fosse uma delícia te foder nesse sofá, prefiro ir para o quarto. Lá podemos
ter a noite toda.
Madeleine cerra os olhos, cheios de malícia e assente, mordendo o lábio inferior.
Faz uma hora que levantei, sozinha no quarto, mas pela hora nem posso culpar Travis por me
deixar lá. Ele disse que tinha muitas coisas para fazer no hotel que passamos a noite.
Não deveria ficar tão emocionada com isso, mas dormir, no caso passar a noite e pegar no
sono ao lado dele, foi perfeito. Maravilhoso. Amei dormir sentindo sua respiração, seu calor perto
de mim e seus braços, que me puxaram durante a noite para dormirmos juntinhos.
Dio mio. Não sei o que estamos fazendo. Essa aproximação me dá um medo tremendo.
Nossas noites de sexo que ficam cada vez mais intensas.
Agora, depois de tomar café e um banho refrescante, me arrumei e desci para o salão do
hotel. Vejo um dos soldados perto de uma porta dupla e me aproximo.
— Sabe onde fica o escritório do Travis?
— Quem é você?
— Ah... eu sou... — Faço uma pausa constrangedora e vendo Enzo saindo pelas portas,
sorrio. — Enzo, pode deixar eu entrar?
— Travis está muito ocupado.
— Mas eu... eu preciso falar com ele também.
Dando um sorriso sem muita vontade para Enzo, ele assente e faz um sinal para eu o seguir. E
confesso, sem vergonha, que fiz uma cara de nojinho para o soldado que não quis me deixar entrar.
Só faltou dar a língua. Sim, eu sou infantil às vezes.
Andamos quase até o final do corredor. Enzo vira-se para mim quando chegamos a uma porta
dourada e muito imponente, é claro.
— Espere aqui. Vou falar com ele.
Franzo a testa e assinto.
Ele entra no escritório e enquanto isso, fico desconfortável com os olhares dos outros
homens. Olho minhas unhas e conto até dez.
— Ele disse que tudo bem — Enzo fala de repente saindo.
Assinto e dando um sorriso sem vontade, entro no escritório de Travis.
Encontro-o sentado falando ao telefone e preciso parar, segurar a respiração e contar até dez
para controlar a minha enorme vontade de suspirar. Claro que isso o deixará satisfeito em saber
como o desejo.
Ontem à noite foi... alucinante.
Ele deixa de me encarar e concentra-se na ligação, que não parece estar sendo muito
amistosa. Assim, à sua mesa, falando de negócios, dá para acreditar que ele é apenas um magnata
cuidando do seu cassino, mas não é apenas isso que faz.
Entediada, vou até o bar e faço um Martini para mim e, por educação, encho um copo de
uísque e levo até ele. Aproveito para pegar o copo vazio na sua mesa.
Ele parece surpreso e pegando a bebida da minha mão, segura meu pulso e seus olhos,
cerrados e firmes, prendem os meus por alguns segundos antes de deixar eu me afastar.
Com os batimentos acelerados, caminho com as pernas bambas até o bar e deixo o copo sujo
na pequena pia e tomo muitas respirações. Estou sendo uma boba. Não me entendo, afinal não há
motivos para eu me sentir neurótica na presença dele mais.
— Algum problema aí? — indaga com sua voz rouca e baixa.
Viro-me, pisco rápido e o vejo de pé, parado em frente à sua mesa. Está na sua postura
poderosa e magnética. As mãos nos bolsos, o maxilar cerrado e os olhos compenetrados.
— Não — respondo e balanço a cabeça.
O canto da sua boca curva-se de leve. Encarando-me, olho no olho, vem até a mim com
passos calmos e seguros. O dono do mundo. Para na minha frente e preciso erguer a cabeça para
continuar mantendo contato entre nossos olhos. O frio na minha barriga piora quando sua mão chega
até meu rosto e desliza por minha bochecha devagar, em um afago, que chego a fechar os olhos e
finalmente solto o tão inevitável suspiro.
— Gostei do vestido.
Sorrio por dentro porque não é do seu feitio fazer elogios. Nunca! E meu vestido é simples.
De verão simples, branco com flores rosa. Bem menininha, que encontrei em uma das sacolas que
estavam no sofá do quarto onde passamos a noite.
— Obrigada — falo abrindo os olhos. — Gostei da gravata.
Travis meneia a cabeça com desdém e seu sorriso vem acompanhado dos olhos ficando ainda
mais cerrados. E me pegando de surpresa, agarra-me por trás da cabeça, segurando um bom tufo dos
meus cabelos (sem colocar força para machucar) e sua boca está na minha dando um beijo feroz, que
eu não só permito como peço mais ao agarrar-me a ele jogando os braços sobre seus ombros e
colando nossos corpos. Sem o mínimo esforço, me segura como não pesasse nada e me arrasta até
conseguir imprensar meu corpo na parede.
Gemo sentindo suas mãos deslizarem por minhas curvas e sua língua na minha. Seus lábios
passam nos meus, molhados e sedentos. Ele chupa minha língua, mordisca minha boca e quase grito
quando suas mãos puxam meu vestido (que já é curto) para cima com brutalidade.
— Travis — tento falar, mas ele não deixa.
Continua me beijando, na verdade, devorando minha boca e sem fazer muita cerimônia, rasga
minha calcinha, agarra minha coxa direita e coloca em cima do seu quadril.
— Ei... espera! — Espalmo minhas mãos no seu peito e falo arfando: — A porta.
— Ninguém vai entrar aqui — diz e abocanha meu pescoço, dando um chupão, que óbvio que
vai ficar a marca.
— Co-como você sabe?
— Cazzo, angele. — Finalmente ele se afasta um pouco, mas suas mãos apertam minha
cintura. — Acha que eu deixaria alguém ver você assim? Ver eu de calça arriada?
Solto um riso. Não deu para controlar. E em seus olhos vejo o riso também.
— Agora, cale a boca e me deixa fazer você se sentir bem.
— Mm... — Mordo a boca e sou eu a agarrá-lo pela gravata e unir nossas bocas.
Ele literalmente rosna enquanto nos devoramos e aprofundo o beijo. Levanto mais a cabeça
para dar mais acesso a minha boca. Travis respira fundo pelo nariz e imprensa meu corpo na parede,
fazendo eu enroscar a perna nele e, quando se afasta, desce a mão até meu sexo. Respiro fundo, mas
logo solto um gemido alto quando seus dedos entram em mim, empurrando a calcinha para o lado. Eu
não percebi como estava tão molhada, entretanto noto nitidamente como estou. Fecho os olhos
jogando a cabeça para trás e chamo seu nome como uma louca.
— Oh... Dio mio. Sei meraviglioso — murmuro e o escuto trincar os dentes e logo em
seguida lamber meu pescoço até encontrar minha boca.
Dio mio... Este homem é viciante. Ele é realmente maravilhoso. Todo maravilhoso. Mãos,
boca, olhos, voz, corpo e, claro, seu pau fantástico que me deixa enlouquecida.
— Shhh... — pede porque estou fazendo barulho demais, mas fica difícil me controlar quando
ele gira os dedos dentro de mim, fazendo tudo se contorcer.
Travis acelera os movimentos dos seus dedos. Dois massageiam meu interior e o polegar a
ponta do meu clitóris. Não demoro para gozar perdida na ânsia de tê-lo por completo.
Sou solta, os pés sentindo o chão de novo e o observo abrir a calça, abaixar só o suficiente e
me pegar de cheio, prendendo meu corpo na parede de novo. Dessa vez, ele não precisa pedir,
envolvo minhas pernas em volta dos seus quadris e ele segura-me pelo meu traseiro. Acha a posição
perfeita e me penetra de uma vez só.
— Oh... — Arregalo os olhos e abro a boca.
Ele parece inabalável e apenas força para dentro mim, dando estocadas fortes, profundas e
indo num ponto mágico do meu âmago. Travis não para. Inabalável, sedento e violento. Me fode
contra a parede, deixando-me muito molhada, enlouquecida e me beija dando mordidas em meus
lábios.
— Travis — sussurro rouca, abraçando seu pescoço.
Sua mão abaixa para o meu decote, e sua boca está no meu seio direito. Lambendo e
chupando. Depois vai para o outro seio, provocando todos os tipos de sensação de prazer. Eu só
desejo mais. Mais forte, mais fundo, mais tempo. Porém, não acho que vou aguentar mais. Cravo
minhas unhas em seu ombro e peço mais forte. Ele atende e chega a jogar meu corpo para cima
enquanto estoca profundo dentro de mim.
— Maledire! — ele xinga no meu ouvido.

Chegamos do hotel hoje de tarde, depois que buscamos Marinne no internato. Por alguma
razão, aquela menina ficou tão feliz de nos ver juntos, que fiquei comovida.
Jantamos, conversamos e na hora de dormir, nos separamos, no entanto depois de três horas,
e contando agora – há vinte minutos – nos encontramos no meu quarto e transamos silenciosamente.
E diferente das outras noites quando acabamos e pegamos no sono – como aconteceu ontem
no hotel – sem perceber, hoje ficamos agarrados um no outro.
Meu polegar vagueia em seu peito indo até o rosto e, quando passo nos seus lábios, ele
morde, abrindo um sorriso quando eu reclamo. Céus! Esse simples gesto já me deixa tão confusa,
mas feliz de um jeito estranho.
Fecho meus olhos aproveitando o seu calor e escondendo que estou em alerta. Sinto quando
ele se move, desgrudando-se de mim. Parada no meio da cama, observo-o se sentar e fico
surpreendida com ele puxando as cobertas para nos cobrir. Voltando a se deitar, puxa-me para os
seus braços soltando uma respiração forte.
— Vai dormir aqui? — murmuro depois que tomo coragem.
Travis respira vagarosamente no meu ouvido e responde:
— Não quer que eu durma?
Franzo a testa e viro-me em seus braços.
— Claro que não — digo encarando o seu rosto, que está para cima, o maxilar rígido. —
Eu... só pensei que com a Marinne em casa... você não fosse querer dormir aqui.
Ele respira fundo, pensativo, então se ajeita na cama de uma forma que possa olhar o meu
rosto e fala:
— Não vejo problema nenhum nisso. Sei que a única mulher que deveria estar aqui teria que
ser minha esposa, mas... — faz uma pausa — ela vai entender.
Meu coração acelera quando fala essas coisas. Insiste nisso. Sinto como se meus dedos
estivessem escorregando enquanto tento me segurar num precipício.
— Ainda pensa nisso?
Sinto como o coração dele fica acelerado e o seu abraço afrouxa em minha volta.
— Às vezes sim. Seria viável.
Ele não me incomoda quando fala tão friamente, porque, às vezes, sinto que não é só isso.
Mas não quero me iludir. Eu não aceito o pedido, não porque eu não goste da forma como ele me
pede, mas é porque só irei arrumar problemas para ele. Mais problemas.
Ficamos em silêncio. Nada legal, que ele quebra falando:
— E você ainda pensa na resposta?
— Travis... — Fecho os olhos com força e, dando um abraço nele, me afasto para o centro da
cama, ficando de costas para ele. Fico um bom tempo assim, e só acordo do meu devaneio quando a
mão dele afaga minhas costas.
— Volte a dormir. Vem cá. Está tudo bem — ele diz com calma. — Não vamos falar disso.
Eu não queria te pressionar. Sei que a resposta é não e eu não posso te obrigar.
Meu coração parece que bate no meio do meu peito e chega a doer. Eu queria poder dar
resposta que ele quer. Ai, como eu queria!
Inspirando profundamente, esperando me acalmar, tomo coragem para voltar a me deitar junto
ao seu corpo. Deito minha cabeça em seu peito. Sinto como ele me abraça mais forte agora. Tem uma
emoção camuflada entre nós. Eu não sei o que estamos fazendo.
— Acho que seria melhor parar — sussurro com um bolo na garganta.
— O quê? — pergunta rápido.
Apertando os olhos com força, tentando fazer meu coração voltar ao normal, respondo:
— Deixar de fazer isso daqui.
Demora muito tempo antes dele dizer alguma coisa. Acho até que não ia dizer nada. Mas
quando faz, está distante de mim, em pé ao lado da cama vestindo sua cueca e pegando a blusa, a
calça e coldre.
— Então a gente não faz mais. — Consigo vê-lo, pela luz fraca do corredor do banheiro,
morder o maxilar. — Pensei que estava sendo legal e gostoso. Eu lembro que você queria.
Sento-me na cama e o encaro segurando a respiração. Não tenho palavras. Eu odeio o jeito
que olha para mim agora.
— Boa noite, Madeleine.
Ele se vira e sem dizer mais nada, pois é óbvio que disse tudo, sai fechando a porta do meu
quarto silenciosamente.
— Travis... — murmuro.
Pego o travesseiro que ele estava deitado, abraço bem forte, sentindo as malditas lágrimas
escorrerem, demonstrando minha fraqueza.
Sei que estou sendo covarde e talvez seria ele que me machucaria, mas sei que não é... eu
mesma estou fazendo isso. Afastando-me dele porque, se eu continuar, não vou conseguir... nunca
mais vou me soltar dele. Agora, nesse minuto, sei o que eu sinto e não é seguro. Não posso fazer e,
de qualquer forma, acho que ele não volta mais.
— Idiota, era só dizer sim — balbucio chorando, agarrada ao cheiro dele nos travesseiros,
nos lençóis, em mim.
Poucas coisas realmente podem me tirar do sério, e há algumas semanas eu estou com um
temperamento dos infernos. Por motivos óbvios, e de eu ser o líder, descontar em todo mundo minha
frustração e sentimento de derrota, foi minha saída.
Não importa a colocação, se é ou não um homem de poder, ser dispensado é sempre uma
derrota e ridículo. Sei que não era justo sacrificar os meus homens com o meu rancor. E sei muito
bem que Colen está olhando para mim desde a hora que entrei no balcão que a gente se reúne às
vezes, bem perto do Clube de Stripper, que usei por muitos anos. Agora não penso de jeito nenhum
em comer nenhuma dessas mulheres. Não estou no clima de ir para cama com ninguém.
— Vou ter que aturar você desse jeito por mais quanto tempo? — reclama Colen.
Antes de dizer algo, coloco uma carranca nítida para ele.
— Se você quiser pode ir. Fique bem longe. Não precisa ficar perto de mim.
— Para quê?! — ele esbraveja. — Para você matar mais dez homens com suas mãos e as
facas em menos de vinte minutos como se fosse a coisa mais natural do mundo?
— Em nosso mundo é.
— Travis!
— Colen. — Encaro seus olhos. — Você está falando como se eu nunca tivesse matado tantos
homens assim antes.
Meu irmão me direciona um olhar bravo e joga o cigarro terminado dentro do copo de uísque
que ele bebia.
— Talvez por motivos reais e importantes, eu entendo você, mas o seu humor não tem
nenhuma explicação, Travis. Você se tornou um monstro essa última semana, porra!
— E desde quando eu sou outra coisa? Todo mundo sabe que a única coisa que pode ter de
mim são sombras, morte e sangue. Por favor, pare de agir como se o que estou fazendo não é o meu
natural.
— Caralho! Tudo bem, então.
Meu irmão respira fundo e se concentra em tomar sua bebida, que a mulher que ele mandou
vir para cá fazer companhia a nós junto com mais quatro, traz.
Colen sabe muito bem me fazer enxergar quando estou sendo um babaca, mas ele não pode
me ajudar em tudo. Não agora.
Sei que, em algum canto de pura clareza e sabedoria, sei perfeitamente que o que estou
fazendo é ridículo e sem motivos. A verdade é que eu deveria ter parado e procurar Madeleine antes
mesmo de ela dar essa ideia. Sabia que ela estava se tornando muito mais do que eu conseguia
admitir, e agora eu vejo perfeitamente o que é. Ela se tornou minha fraqueza.
Eu odeio isso.
Nunca em toda minha vida fui fraco ou deixei alguém dominar meus sentimentos ou me
manipular. Ela fez isso comigo e eu odeio toda essa situação. Odeio como precisei estar com ela
como se fosse tão importante para a minha existência. Merda. Ela era apenas uma boceta que eu
comia e adorava.
Levanto-me e vou pegar outra garrafa de cerveja e é neste minuto que Paolo resolve se juntar
a nós. O que é extremamente estranho, pois ele nunca está aqui. Não gosta de ficar no balcão porque
sabe dos absurdos que acontece. Afinal, a conveniência da boate stripper ser aqui ao lado, é
utilizada com “prazer”. Por muitas vezes, nós pegamos as mulheres e ficamos por aqui mesmo. No
nosso território.
Mas que merda eu estou falando! Nevada inteira é minha! Essa porra é minha! Todos esses
malditos territórios que eu comando, tudo é meu. Por isso, apenas por isso, a consciência do meu
poder e saber que seria extremamente errada, que não ateei fogo em tudo.
Essa raiva não iria me fazer crescer. Eu sinto que depois de uma semana, a fúria que sinto
pela última noite que passei com ela, vai amenizar. Em algum momento vai simplesmente sumir.
— Cazzo. Que lugar fedorento. Como vocês conseguem ficar por aqui? — Paolo reclama
abrindo o paletó e colocando as mãos nos quadris com sua carranca de sempre.
— Se você acha tão desagradável, o que está fazendo aqui?
Ele ergue a sobrancelha para mim num aviso nítido que eu vou acabar apertando os botões
dele e isso nunca é bom. Não é porque eu sou o Capo e ele meu consigliere que nós nunca brigamos
de faca. Nunca indo na intenção de matar, mas de machucar com força, com certeza.
— Eu precisava falar com você.
— O que é dessa vez?
— A sua chacina há três dias nos trouxe muitos problemas, Travis. Embora você tenha
eliminado aqueles filhos da puta da Bratva, sabe muito bem que os russos não ficarão quietos e
procurarão retaliação. Nós já não estávamos tão bem assim.
— Bem, ele tinha que pensar antes de fazer um grupo dos seus animais virem para Nevada
sem me dizer. Nós não somos aliados, nem amigos, Ivon sabe muito bem dessa condição. Nunca
proibi ninguém de entrar em Las Vegas já que é bom para o meu bolso ficar cheio, mas não quando
dez russos tentam entrar na minha boate de stripper para abusar das mulheres.
— Travis, você matou todos eles com a sua faca. Eu tive que mandar pedacinhos de todos
eles para o consigliere de Ivon.
— É sério mesmo que agora vou ter que justificar o jeito que eu mato meus inimigos?
— Não estou pedindo justificativa, mas um pouco de discrepância. Aquelas mulheres ficaram
assustadas com você. Todos nós estamos assustados com você e com medo de que, se falarmos
alguma coisa errada, você vai enfiar a faca em nossos corações. Você perdeu a cabeça há uma
semana e nem sabemos o motivo. Então, se concentra em voltar ao normal. Nós temos problemas
muito sérios para eu ter que ficar cuidando do seu humor e dos seus passos.
— Do que você está falando? A Darkness?
— Sim, Travis. Enquanto ainda dá tempo é bom nós cuidarmos deles e dar uma lição em
nossos traidores.
Assinto e sigo para fora do balcão, atrás de Paolo. Se tem alguém que vai me fazer voltar aos
eixos é ele.

Encaro minhas mãos com o sangue de Enrico e vejo a faca no chão perto dos meus pés.
Paolo tentou recuperar meu temperamento, mas quando vi esse filho da puta traidor, não resisti. Tive
que matar. Ele invadiu minha casa e tentou pegar Dario, que correu para longe.
— Oh, meu Deus! Você é um monstro!
Escuto atrás de mim e me viro. Encontro olhos arregalados e sobrancelhas erguidas sob uma
expressão de terror de Madeleine olhando para o chão. Para a faca com sangue e minhas digitais.
Santo Inferno. Eu acabei de matar um homem na frente dela, de novo. Talvez, se eu tivesse
atirado nele, eu poderia provocar um choque menor, mas eu o esfaqueei. Cravei uma faca em seu
peito e cortei sua garganta.
— Olhe para mim — falo com o gosto de metal na boca e sinto o sangue escorrer no canto do
meu rosto.
Ela faz recuando um passo e abraçando a si mesma. Seus olhos trazem à tona o julgamento
que ela já fez várias vezes para mim e virei às costas para que, quando me olhasse no espelho, não
enxergasse o que ela vê e na cama, quando parecia não existir o monstro.
— Você é um monstro. Tão implacavelmente cruel... — sua voz sai baixa e tremida. — Tão
mau.
— Isso não tem nada a ver com você. — Dou um passo, mas paro quando ela recua mais uma
vez.
— Como não?! — esbraveja, incrédula. Mexe os ombros nervosa. — Ninguém tem o direito
e o poder de tirar a vida de ninguém. Principalmente assim tão brutalmente.
Cerro o maxilar e fecho as mãos.
Nunca parei para ouvir nenhum julgamento sobre minhas atitudes e agora me vejo aqui,
parado no meio da sala da minha casa com Madeleine e seu senso de humanidade. Ela não sabe como
esse mundo é terrível e morrer muitas vezes não é a pior coisa que pode acontecer a alguém.
Não devo a porra de um pedido de desculpas para ela. Não tenho que justificar meus atos.
Ela sempre soube quem eu sou. Por que o espanto?
Balanço a cabeça e solto a respiração com força.
— Ele invadiu minha casa e tentou atacar meu irmão. Mesmo que não fosse o caso, Enrico é
um traidor fugitivo. Se não fosse eu agora, garanto que um dos meus homens ou eu estaria aqui.
— Ele era seu soldado.
— Então não entrasse pela janela e tentasse forçar meu irmão a fazer o que não queria.
— Está dizendo que...
— Estou apenas esclarecendo os fatos — digo ríspido. — Agora vou me lavar e desço para
o jantar. — Passo por ela, mesmo vendo que se empertiga, e caminho para as escadas.
No entanto, escuto-a dizer:
— Você acha que vou me sentar à mesa com você? Que eu vou conseguir comer depois do
que vi? — Respira e sinto que está mais próxima. — Do que eu vi você fazer.
Com uma paciência que nunca tive, viro sutilmente meu corpo e encaro seu rosto, que agora
mostra raiva. Ótimo. Pelo menos temos algo em comum agora. Porque eu também estou morrendo de
ódio dela. Que mulher irritante com essa merda de Direitos Humanos.
— Faça da sua vida o que bem entender. Se quiser, coma com os empregados na cozinha —
cuspo e me viro, voltando a subir.
E ela não desiste; quando percebo, está atrás de mim no corredor. Me xinga, pragueja e,
quando estou quase abrindo a porta do meu quarto, ela diz algo que tenho vontade de fazê-la engolir
cada palavra.
— Você é um miserável sem coração.
Meu punho está apertando pra caralho a maçaneta da porta. Viro meu rosto lentamente e a
olho de cima a baixo. Juro que, se ela não tivesse essa coisa que me deixa puto por não resistir e se
também não fosse bonita, já teria jogado ela porta afora.
— O monstro sem coração vai tomar banho. Se caso você não quiser compartilhar a ducha
comigo, saia do meu caminho.
Ela fecha mais a cara e cerra os olhos. Ódio. Ela fica ainda mais irresistível com raiva.
Tenho uma súbita vontade de rir, mas apenas fixo meus olhos nos dela e mantenho o olhar até
que ela pisca e engole em seco. Com isso, sorrio de lado e entro no meu quarto. Essa mulher me
provoca e depois foge. Mas ela se esquece de que até a Chapeuzinho Vermelho se rendeu ao Lobo
Mau.
Sempre pensei que não sentiria remorso pelo que escolhi ser – ou foi imposto-me como
chefa da Famiglia – contudo, agora me vejo subir as escadas quase que correndo, indo atrás de
Madeleine. Meu coração está disparado e não sei o que fazer com uma crise iminente.
Não pode ser coincidência mais um homem invadir minha casa na mesma noite. Que caralho!
Onde estão meus homens?
— Madeleine — chamo-a empurrando a porta do seu quarto que está aberta.
O cômodo em um breu de abandono me deixa em alerta. A primeira reação é colocar a mão
na minha arma sobre meu coldre, e dobrar minha atenção. Eu sei que não tem chance dela me atacar
ou coisa parecida. Não há riscos nesse quarto, mas esse é o instinto de um animal sempre em defesa
e selvagem.
Há uma iluminação amarelada e fraca, aproximando-me vejo que vem do banheiro e entrando
vejo que a luz do espelho está acesa. Vejo o tapete branco manchado de sangue, uma pegada de um pé
descalço e a toalha de rosto também tem vestígios de sangue. A marca de uma mão que a segurou com
força.
Quando penso que nada mais nesse cenário poderia me surpreender, escuto um soluço, um
miado e me viro. Cerro meus olhos, encarando a imagem de Madeleine sentada no chão do box do
banheiro toda molhada, de roupa. Analiso a cena e sinto-me em catarse vendo uma arma jogada do
seu lado. A mulher chora de cabeça baixa e tremendo, e não é da água. A fumaça da água aquecida da
ducha deixa o ambiente muito mais carregado.
— Madeleine? — chamo seu nome como se ela fosse um animal acuado, ferido. E não sei se
está, física ou mentalmente.
Ela não responde, mas minha presença não passa despercebida. Um tremor passa por seu
corpo e ela se encolhe, abraçando as pernas com mais força.
— O que houve?
Merda! Que pergunta foi essa?! Eu sei o que houve. Meus homens me contaram e, se eu não
tivesse que ver como ela está, com certeza estaria eu mesmo fazendo seu primo – aquele bastardo
egoísta e traidor – pagar o que fez essa noite com minhas próprias mãos. Por ora, meus homens
cuidam apenas do corpo dele, mas não ficará assim. Vou descobrir os outros que estão por trás
desses ataques.
Notando que ela não vai se mexer, entro na casa de banho e me aproximo. Madeleine levanta
a cabeça e, quando nossos olhos se encontram, meu instinto protetor grita. Aquela sensação que
apenas sinto com meus irmãos e por ela. Mas minhas sombras ainda estão expostas. Tenho que tomar
cuidado.
Ajoelho-me e pego suas mãos frias e trêmulas.
— Made?
Ela solta um som horripilante, se agitando e tremendo por medo.
— Eu matei Lorenzo, Travis — diz com dificuldade, como se sentisse dor. E repete uma,
duas, três vezes, tremendo cada vez mais. — Eu matei aquele homem. Eu matei ele. Matei meu
próprio primo.
— Eu sei, Madeleine.
O líquido que escorre por seu rosto não é da água do chuveiro. Meu peito queima ao ver isso.
Não sei como proceder. O que fazer.
— Eu matei ele... — murmura e encara seus dedos, eu também e vejo o sangue seco, as
marcas da prova de suas palavras. — Tem sangue nas minhas mãos agora. Sou uma assassina.
Sem pensar, pego suas mãos e seguro firme, dando uma leve sacudida para ela me encarar.
— Isso não é verdade.
— É-é... — soluça — sim.
— Não. Você não é — falo e reafirmo com a cabeça que não.
Colocando-me para o lado, deixo meu corpo cair ao seu lado, sento no chão, a trago para os
meus braços e aperto. Entrelaçando meus dedos com os seus, levo-os até minha boca e beijo cada um
antes de lamber o sangue, tirando-o todo.
— Eu matei... ele — Madeleine volta a repetir o que parece ser seu inferno na Terra, e deve
ser mesmo. Ela odeia tudo que tem a ver com a Famiglia, com a porra da máfia, e matar tem tudo a
ver em ser um homem como eu, mas ela não é uma assassina.
— Foi preciso.
— Tenho sangue em minhas mãos... — murmura mais uma vez. — Sou uma assassina.
— Você apenas se defendeu. Não é como eu.
Nossos olhos estão grudados um no outro. Sinto algo estalar dentro de mim. Algo que estava
morto desde muito antes de eu me tornar um monstro. O filho do Capo. Algo que lutei nos últimos dez
dias para esquecer.
Suas mãos se soltam de mim e agarra minha camisa com desespero.
— Shhh... — tento consolá-la.
Merda! Eu nunca tive que fazer isso. Não sei fazer isso.
— Sou como você agora. Sou um monstro!
Eu nunca me importei muito de como as pessoas me viam, porém toda vez que escuto-a me
chamar de monstro, me desperta uma raiva tão grande que sinto até minhas mãos tremerem. Sendo
verdade ou não, é foda ouvir isso. É porque sou quem sou que devemos parar. Que ela não aceitou
casar comigo. Porque sou um monstro.
Dou um beijo nos seus cabelos e fecho os olhos com o pensamento de como eu senti falta de
sentir ela assim. Essa merda de fraqueza. O que foi que ela fez comigo. Cazzo. Preciso ser forte.
Tenho que fugir disso.
Sinto falta de Travis, terrivelmente. Não durmo ou como direito, e depois do que aconteceu,
preciso dele na minha cama me abraçando para eu não ter pesadelos.
Mas no dia seguinte de eu ter matado meu primo, não vejo Travis em casa e no outro dia
também, e não durante mais uma semana. Eu fiz ele se afastar de mim e a saudade que sinto chega a
doer em meu corpo. Eu sou uma idiota
Estou vagando pelo jardim quando escuto passos atrás de mim e me viro. É Colen brincando
com os cachorros, os Dobermann gigantescos, um de cada cor. Branco, caramelo, bege e preto. São
lindos. Ele para assim que me vê, aprumando a postura, enfia as mãos nos bolsos e se aproxima de
mim.
— Está tudo bem com você?
— Está.
Ele meneia a cabeça e a desconfiança em seus olhos é gritante.
— Você não mente muito bem.
— Eu estou bem, Colen.
Novamente ele não parece acreditar em mim e se aproxima me encarando quase sem piscar.
Ele é um Madman e, assim como o irmão, sabe ler as pessoas. Eu espero que ele não consiga
descobrir todos os meus segredos.
— Eu não sei por que você está fazendo isso.
— Fazendo o quê? — A confusão cruza meus pensamentos.
Ele dá mais dois passos e, se eu esticar um pouco minha mão, posso tocá-lo. Mas não faço,
apenas escuto sua voz baixa e firme.
— Eu não sei de tudo, mas conheço o Travis muito bem e você fez alguma coisa com ele.
— Eu não fiz nada com ele.
— Calma, não precisa ficar nervosa. — Ele sorri de lado fazendo a cicatriz que tem
deformar o seu rosto. — Não deveria te dar mais munição, mas eu queria que você entendesse que o
homem que você divide esta casa aqui, o homem que provavelmente você abomina e acha que é um
monstro, uma fera horrenda, ele é muito mais do que isso. Nós sabemos quem somos, Madeleine. Por
muitas vezes não respeitamos limites e quem dirá a lei, mas tem coisas que não estão em nossos
poderes e eu acho que você chegou nesse lugar com meu irmão. Então só vou te pedir uma coisa: se
for para não corresponder, se você não consegue aceitar quem é ele, é melhor ir embora. Eu posso
fazer você ir embora amanhã e nunca mais voltar. Eu te dou todas as informações que quiser e o que
você precisar. Mas não quero ver meu irmão matar meio mundo para tentar aplacar a raiva que sente.
Sei muito bem o que ouvi, contudo, a única coisa que eu escuto é a última frase.
— Ele está ferido?
Colen respira pelo nariz e seus olhos me olham incrédulos.
— Acho que não da forma como você está pensando. Eu não sei se ele já te contou, mas ele
nunca deixou nenhum dos irmãos apanhar. Sempre levou todas as surras da minha mãe enquanto pôde.
Não deixou nem eu e nem Dário apanhar de papai, isso só foi possível no momento que a gente
começou a ser treinado para ser um Madman. Todos nós somos torturados para possíveis torturas, e
como aprendemos a lidar com o futuro próximo. Mas ele sempre foi um homem íntegro e de palavra.
Não queira que ele te dê a última palavra, pois ele não vai voltar atrás nunca mais.
Concordo com a cabeça em silêncio.
— Boa noite.
— Boa noite — devolvo e o vejo me dar as costas e sair do jardim.
Fico um tempo assimilando suas palavras e sentindo uma dor terrível no meu peito. Ele não
disse com todas as letras o que eu acho que ele disse, porém sei o que tentou dizer.
Travis quer ficar comigo e eu estou dizendo não o tempo todo. Ele deve se sentir rejeitado e
está com raiva. Eu subestimei quem ele é. Ele não é só o matador. É um homem também, um irmão e
quer ser mais do que um amante nas horas vagas comigo. Não sei por que estou lutando tanto para
dizer que quero o mesmo.
Se eu for pela orientação do Colen, eu digo sim. Mil vezes sim. Mas se eu for pela a
orientação do Paolo e pensar sobre o que Travis disse; como o meu pai arrumou problemas para ele
com a Bratva e a Hechos, vou dizer não. Eu nunca gostei de criar problemas e esses podem ser
fatais.
Puxando o fôlego, corro para dentro de casa e procuro Colen para falar mais um pouco com
ele, talvez ele me ajude.
Quando estou passando pela sala de piano, indo para a sala principal, meus pés estacam
vendo Travis entrar em casa. Ele está todo sujo de lama e a camisa com sangue, o coldre só tem uma
arma de um lado e o seu colete está aberto, rasgado. Os olhos selvagens se levantam para mim e me
avaliam.
Engulo em seco com a intensidade que ele me olha e quase morro do coração quando ele cai
de joelhos no chão ao tentar dar um passo.
Eu grito seu nome e corro até ele, abraçando-o. Tentando ajudar e passando a mão no seu
rosto.
— Traz Vito para mim?
— O que é isso? — indago sentindo meu coração sangrar como suas feridas.
Ele murmura algo e esticando a mão, passa os dedos suavemente na minha maçã do rosto.
— Está com pena de mim hoje? Não precisa! Eu sou bem grandinho.
— Por mil diabos — escuto Colen atrás de mim.
— Me ajude a levantá-lo — imploro olhando para ele.
— Calma, ele é pesado. Luca! Enzo! — Franzo a testa e Colen explica: — Eles estão em
casa.
— Não precisa — digo. — Eu te ajudo.
— Eu não quero sua ajuda — Travis balbucia.
Perco a fala e as lágrimas se soltam rapidamente. Eu não consigo soltar ele. Não consigo.
— Vai! — ele grita e tenta me empurrar para hoje. — Me deixa.
— Travis, eu...
— Me deixa! — ele insiste e consegue se soltar de mim, mas cai no chão, e eu o seguro com
uma força que nem sabia que tinha.
— Que merda é essa? — Luca vem correndo até nós chamando Enzo e logo estão ajudando
Travis. — Vamos levá-lo para o quarto dos fundos e chamar o doutor. — Luca coordena e Enzo já
saca o celular fazendo o que pediu.
Enquanto isso eu ainda estou ajoelhada no chão, chorando e vendo ele ser elevado.
Não sei quanto tempo fico assim e meus pensamentos vão para Marinne, ainda bem que não
está em casa.
— O que você está fazendo?
Levanto a cabeça e encaro Paolo.
— Sai dessa porra de chão! — ele ruge, vem até a mim e me coloca de pé sem nunca botar
força.
Eu pensava que ele era mau, mas ele não é. Eu pensei tanta coisa.
— Qual o seu problema? Está machucada?
Nego com a cabeça e cambaleio para trás, afastando-me dele.
— O que aconteceu com Travis?
Paolo leva um tempo me encarando antes de franzir a testa.
— Eu não deveria te dar satisfação, mas o Travis anda ainda mais impossível e estressado.
Alguns mexicanos estão dando trabalho e mataram o Underboss da Califórnia. Ele é um imbecil e em
vez do Travis trabalhar conscientemente, simplesmente resolveu fazer uma carnificina em Pasadena.
Eu nunca o vi sem controle assim e quer saber — Paolo dá um passo que nem Colen no jardim e olha
dentro dos meus olhos fixamente —, você acha que eu não gosto de você, mas a verdade é que eu
respeito e prezo o meu Capo, e desde que você chegou, arrumou problemas. Mas essas lágrimas que
você está derramando, demonstra que você é fraca e nem para tomar uma decisão é capaz. De algum
jeito, você está infernizando a cabeça daquele homem. Então, vou te pedir uma última vez. Ou você
vai embora e esquece que já teve contato com todos nós. Ou fica e assume qual é o seu lugar. Já têm
muitas merdas para resolvermos para você ser mais uma, que no caso implica diretamente a mim.
Porque você está afetando o Capo, e eu sou seu conselheiro. Nesse caso, se algo é um risco para o
chefe, o seu consigliere pode tomar a atitude que quiser.
Engulo em seco, assentindo.
— Agora, eu recomendo muito que você vá para o seu quarto.
— Mas ele...
— Garota, aquele homem é difícil de matar. Ele já vai ficar bom. O que você pode fazer é ir
para o seu quarto e ficar quieta.
Meu peito dói. Ele tem razão de tudo. Preciso saber qual o meu lugar, o que eu quero, e eu sei
a verdade. Sei por que parece que vou morrer se algo acontecer a Travis. Mas... eu nunca amei
ninguém.
Respiro fundo, me viro e subo para o meu quarto até poder vê-lo.

Foi muito difícil seguir as ordens de Paolo por tanto tempo. Foram mais de um dia
esperando algum sinal de que Travis já tinha acordado e pudesse falar. A verdade é que ele chegou a
ficar acordado, mas como sentia muita dor, ficou no efeito da morfina.
Agora são três da manhã e sabendo que Travis está um pouco melhor, desço as escadas na
ponta dos pés e, saindo da casa, atravesso o jardim indo para a casinha que eu nunca fui. Na porta
tem dois soldados e reunindo toda a coragem que tenho, digo:
— Eles disseram que eu já podia vir para ver o Capo.
Eles se entreolham e depois assentem.
Sentindo-me tão nervosa quanto a primeira vez que entrei no território dos Lozartan,
atravesso um corredor com três portas e vou até um que a luz está acesa. Às vezes, eu escuto meus
instintos e eles falam que a porta é essa.
Engulo em seco, preparo meu coração para o impacto e abro a porta. Adoro o fato de não
estar errada, mas meus olhos enchem d’água quando vejo Travis todo enfaixado de gazes e seminu,
deitado numa cama grande de casal. Tem várias coisas de hospital aqui e o cheiro é muito forte de
antisséptico, álcool e morfina. Tenho minhas suspeitas que aqui seria o hospital particular deles.
Fecho a porta com todo cuidado possível para não o acordar e me aproximo lentamente de
sua cama.
Meu coração dispara vendo seu rosto tão sereno e tranquilo enquanto dorme, tão diferente da
expressão de mágoa que me deu a última vez. Pensar que o magoei, me machuca. Nunca foi minha
intenção.
Aproximo-me mais e afago seu rosto com as costas da mão, bem devagar. Ele não se mexe e,
confiante de que está dormindo profundo, sento na beira da cama e faço um carinho nele.
— Me perdoa, por favor.
— Por favor, me desculpa — ela repete.
Eu queria muito abrir os olhos e falar com ela, mas não vou. Prometi para mim que ia acabar
com isso e foda-se ela. Eu não vou deixá-la ficar brincando de casinha comigo uma hora, querer ir
para a cama e na outra hora não querer me ver, depois me chamar de monstro. Estou de saco cheio
desses joguinhos.
— Eu não sei o que faço. Se for embora vou me arrepender. Se eu ficar vou também, mas eu
nunca vou saber se... me perdoa.
Ela beija as minhas feridas, pega meus dedos de leve e, apesar da raiva que ela me dá, eu
quero poder abraçá-la.
— Travis... me perdoa.
Chorando baixinho, ela se afasta e segurando minha mão, se move voltando a se sentar na
beira da cama.
— Por favor, acorda. — Ela respira fundo com força.
Não me surpreende quando ajeita meus pés e abre meus braços para ela mesma se deitar.
Encolhida ela não me toca, mas sinto o seu calor, as pernas nas minhas.
Eu deixo passar muito tempo e, quando não consigo ouvir sua respiração por estar tão serena,
abro os olhos e inclino um pouco meu corpo para frente pra poder vê-la.
Eu não a vejo há dez dias, e ela parece mais magra, triste e cansada, sei lá. Às vezes, eu fico
pensando que ela vai ser minha ruína e talvez seja mesmo, tem algo nela que é magnético. Me odeio
por não conseguir parar de pensar nela e desejá-la. No entanto, ela é um risco. Meu risco.
Quando acordo de novo, vejo Colen pairando sobre minha cama e, em vez de estar olhando para
mim, olha para os meus pés, melhor, olha para Madeleine.
— Então quer dizer que você vai para a cama com ela? — ele pergunta olhando para mim. —
Você sabe que ela está apaixonada, não sabe?
Rio com essa afirmação dele e me arrependo porque tudo dói.
— Claro que está. Você está falando, hum.
— Travis — fala friamente. — Ela pode não saber, mas está apaixonada por você.
— E daí?
— E daí que você também está.
— Eu não estou. Não sei fazer isso, Colen. Eu não me apaixono.
— Talvez nunca tenha acontecido porque você nunca teve alguém como ela.
— Alguém como ela?
Meu irmão respira devagar, como se contasse até dez e diz:
— Ela não é só uma mulher que você vai para a cama. Vocês dividem um monte de coisas...
— Só a casa.
— Dividem a casa, o cuidado com Marinne, jantam e tomam café da manhã à mesma mesa. E
eu sei que você toca piano para ela porque já vi vocês dois lá.
— Está me espionando?
— Não, mas, às vezes, eu venho para cá de madrugada e já vi mais de uma vez, você tocando
piano para ela, jogando dama e cartas. E até mesmo, assistindo televisão. — Faz uma pausa
franzindo a testa e, como não quer chamar a atenção de Madeleine, fala como se fosse gritar em um
murmúrio: — Você nunca fez isso.
— E daí, Colen? Vai se foder e para de me amolar, porra!
— Travis! — quase grita de novo. — Eu sei o que você quer.
— É mesmo?
— Sim. — Ele faz uma cara de irritação e chega mais perto de mim. — Você tem que se
casar, Travis. Construir a sua família, multiplicar nossa linhagem. Ter um herdeiro menino para
manter nossa liderança.
— Vai dar uma de Paolo agora?
— Não. O que estou querendo dizer é que podia ser ela.
Prendo a vontade de rir e resumo as últimas vezes que falei de casamento perto dela.
— Ah, porra! Você tem que entender que ela também se sente um lixo. Sabe que ela não tem
ninguém e não tem nada para trocar com você. Ela sabe como é que funciona o casamento muitas
vezes entre um Capo, mas gosta de você.
Nego, balançando a cabeça.
— Você não viu como ela ficou essas semanas que vocês parecem que não estão se falando.
— Como você sabe disso?
— Eu já disse que não sou idiota e você resolveu bater em todo mundo, deu tiros, cortou
dedos e mãos, além de arrumar problemas. Ela não comeu, só ficou dentro do quarto, às vezes vinha
ficar com a Marinne e constantemente a peguei chorando sentada ao piano, na sala e dentro do seu
escritório.
Eu só a deixei sofrer e foi bom. Foi bom! Talvez botou juízo na cabeça dela. Cazzo. Nem sei
o que estou pensando.
— E se ela está aqui dormindo aos seus pés, é porque deve ter alguma coisa para te falar
— Ela não tem nada para falar pra mim — digo isso, pouco me lixando pelo que ouvi
enquanto ela achava que eu estava dormindo.
— Eu sei que é complicado. Gostar de alguém é complicado e casamento com sentimento
quase não existe no nosso mundo e é um risco, mas eu sou seu irmão e cuido de você. Eu quero você
bem e ela faz isso por você; se não voltarem, eu lutarei para ficarem juntos.
— Você está vendo muito filme, Colen.
— Não. Eu sou observador e posso saber dos seus segredos, pois eu morreria por você e ela
não tem um pingo de medo de nenhum de nós, o que é bom e ruim. E só para você saber, o Paolo sabe
que ela gosta de você e que você gosta dela.
Fecho os olhos já irritado em saber disso.
— Se você não fizer alguma coisa, ele vai fazer ou eu vou fazer.
— Acho que você entendeu quando disse que já tentei. Merda! Você fala como se eu não
tivesse nunca tentado.
— Pede de outro jeito, Travis. Fale de outro jeito com ela.
— Quer que eu me declare? Que eu diga que a amo se isso não é verdade. — Tomo uma
respiração profunda.
Colen assente concordando e franze a testa, anda até a porta do quarto.
— Só pense nisso e não vou deixar ninguém vir para cá, pelo menos pelas próximas vinte e
quatro horas.
— E o meu remédio?
— Pede para ela te dar. — Colen dá tchau e fecha a porta com força.
O corpo de Madeleine pula na cama, assustada. Murmura um resmungo, esfregando os olhos
e se levanta, ficando sentada na cama. Fecho os olhos e fico quieto para ver o que ela vai fazer. Eu
não quero falar com ela depois da conversa com Colen. Talvez eu apenas não queira admitir que ele
tenha razão.
Sinto a cama perder o peso do seu corpo, então um toque suave passa no meu rosto.
— Oi. Acho que eu tive um pesadelo — confessa baixinho. — Por que você não acordou
ainda, hein? Está tirando um cochilo muito longo.
Eu não preciso abrir os olhos para saber que ela está nervosa e emotiva. Mulheres!
— Eu acho que eu vou lá na casa, tomar um banho e depois eu volto. — Ela deixa de fazer
carinho no meu rosto.
Escolho esse momento para acordar, melhor abrir os olhos, e soltar um som como se tivesse
acabado de despertar.
— Madeleine?
Ela arregala os olhos, se afasta um pouco de mim e quase sorri. Ela é tão linda. Senti falta
disso.
— Oi — diz nervosa.
— Oi. Está tudo bem? — pergunto.
— Sim, está tudo bem.
— O que você está fazendo aqui?
Seus olhos se arregalam, assustados. Vejo seus lábios tremerem. Ela fica com os olhos
molhados até que uma lágrima escorre.
— Eu... Eu já vou embora.
— Não. — Seguro sua mão. — Não foi isso que eu quis dizer, porra!
A menção dela ir embora me desarma. Ela me encara e tenta controlar sua respiração.
— Se quiser, eu vou embora. Não tem problema.
Abro a boca, mas não sei o que falar enquanto vejo a dor nos seus olhos. Ela está tremendo e
isso faz eu soltar sua mão.
— Pode ajeitar os travesseiros para mim? — peço com a voz baixa.
Ela assente, abre um sorriso e se aproxima. Ajeita os travesseiros até meu corpo ficar mais
em cima e, assim que termina, olha para o meu peito, para as minhas mãos e para o meu braço, tudo
com curativo.
— Ah... Você está muito machucado.
— É que eu queria morrer. — O pensamento vem baixinho e me apavora.
— Pensei que era um homem que não preferia a morte por circunstância alguma. Que queria
viver para ser quem é.
— Eu sei, mas agora estou melhorando.
Ela enruga a testa e segura a respiração.
— Por que queria... morrer?
— Porque eu quero. — Com um movimento rápido, pego sua mão, a puxo e dou um beijo.
Surpreendendo-me, se afasta colocando as mãos na boca.
— Está com medo de mim? — pergunto.
— Não, claro que não.
— Então vem cá. Ou você está com nojo?
Pisca rápido, engolindo em seco.
— Vem. Prova toda essa coragem para mim.
Seu rosto fica eufórico, os olhos brilham. Aprumando a postura, vai até a porta do quarto,
tranca-a e volta até mim. Tira sua camisa e o sutiã. Fico perdido vendo essa cena e a ajudo quando
está subindo na cama, colocando as pernas ao lado do meu corpo, e me abraça sem colocar força.
Ela beija o meu pescoço, o maxilar e morde minha orelha de leve.
— Quero essa noite com você. — Se afasta para me encarar. — Eu quero sentir o seu corpo.
Suas feridas. Tocá-lo com o meu.
— Eu quero mais. — Abraço-a bem forte e fecho os olhos.
Sinto aquela coisa estranha que surge sempre que estamos perto.
— Eu senti sua falta — sussurra em meu ouvido. — Eu senti muito a sua falta. Você me
desculpa?
— Pelo quê? — Dou um beijo nos seus cabelos.
Madeleine suspira, retribui o beijo no meu ombro e volta a me olhar.
— Pelo que eu disse naquela noite.
A raiva me consome e tentei todos esses dias esquecer.
— Eu nunca mais vou falar sobre aquilo com você. Eu sei que você não quer. Eu aceito.
Quero o que você quiser me dar.
O corpo dela fica quente, quase febril e ela não me escuta. Beija meu pescoço, meu rosto e
para em meu rosto. Seus olhos azuis, incríveis, estão nos meus quando fala:
— Eu quero tudo que você quiser me dar eu... Eu sou sua.
— Minha?
— Eu sou sua e não porque nós transamos tantas vezes, que eu já perdi as contas, mas por
que...
Meu coração acelera esperando as palavras que eu nunca achei que iria ouvir.
— Porque eu te amo.
— Você não sabe.
Ela ri de nervoso e segura meu rosto em suas pequenas mãos.
— Eu não sei? Não sei se eu te amo? É isso que você acha?
— Você tem certeza?
Ela respira fundo e dá de ombros levemente antes de dizer:
— Olha, eu não ligo para o que você é. O que você faz. O que você acredita ou não, eu só me
importo... Se você está vivo. Se chega em casa para mim. Se me abraça e me protege. Isso é tudo que
eu quero de você, Travis. Nada além disso — funga, chorando e continua: — Eu sei que... acabei
magoando você dizendo todos aqueles nãos, mas... É que eu estava com medo. Eu ainda estou com
medo.
— Medo de ficar comigo?
Balança a cabeça negando veementemente.
— Medo do que eu posso arrumar para você. Os problemas e guerras que trago junto comigo.
Tenho medo que me tirem você — me abraça novamente — e eu te amo tanto.
Ela chora, me abraça forte e suplica baixinho no meu ouvido:
— Por favor, me abraça. Por favor! Me aceita de volta.
Porra! Ela nem precisa pedir mais de uma vez. Eu a agarro bem forte. Maldito seja. Talvez...
eu a ame também. Não sei. Só sei que eu a quero para mim. Toda para mim, mas já conversamos
tantas vezes, porém agora ela parece estar resolvida, e eu tenho que aproveitar.
— A gente vai se casar esse final de semana, está bem?
Madeleine suspira, dessa vez mais alto, e me encara.
— Sim, a gente se casa. Eu não vou mudar de ideia.
— Sei que já pedi mais de uma vez, mas eu não vou repetir.
— Não vai precisar, Travis. Eu preciso de você.
— E meu mundo?
— Eu faço parte dele e se for permitido, serei uma de seus homens e matarei e morrerei para
defender o que é nosso. O que é seu e a sua vida.
— Não vai ser para tanto e quem vai proteger você, sou eu.
Ela assente e me abraça de novo, e tão logo a puxo para trás e encosto minha boca na sua
lentamente, e vamos nos devorando em um beijo excitado e repleto de sentimentos contidos.

Outra pessoa que tivesse ficado como eu, todo quebrado e machucado, teria precisado de
mais repouso. Um pouco mais do que dez dias. Contudo, no meu caso, não aconteceu e estou sentado
em frente ao Giovanni D’Ângelo, na nossa reunião imediata. Agora mais do que nunca, pois não
volto atrás sobre Madeleine.
— Sendo bem sincero com você, para ver se eu entendi perfeitamente, o fato de você não
querer fazer uma aliança com a Darkness como o planejado, é favorável para nós dois. — Giovanni
bufa com sarcasmo. — Você tem que entender que o seu pai tinha prometido essa aliança há muito
tempo.
— Eu sei, mas a gente pode fazer de outra forma.
— Existe uma outra forma, sim.
— E qual seria?
Ele se afasta da mesa e coloca as mãos nos braços da cadeira, a barriga saliente de muito
macarrão ainda mais protuberante.
— Eu tenho um filho, meu primogênito que está com dezenove anos agora e lógico que um dia
ele irá suceder ao meu cargo, sendo o Capo da Darkness.
— Sim?
— E você tem uma irmã.
— E?
— Travis, você é um homem inteligente. — Ele deixa aquele jeito arrogante que eu tenho
vontade de quebrar os dentes dele, ser o terceiro membro da conversa. — Meu filho precisa se casar,
a sua irmã também, obviamente, e nós precisamos de um acordo.
— Você quer casar minha irmã com o seu filho? — Tento ser calmo, mas sei que estou quase
quebrando o copo na minha mão.
Se não fosse essa mesa entre nós...
— Eu acho que seria uma ótima aliança. Como você disse, muito favorável para ambos.
Melhor do que isso, apenas você se casando com Valentina, como sempre foi o acordo.
— Cazzo! — Bato na mesa. — A minha irmã tem quatorze anos. Eu não vou casar minha irmã
enquanto ela ainda é uma criança.
— Eu não estou dizendo que eles precisam se casar agora. Podemos fazer esse acordo e
esperar ela completar dezoito anos. Meu filho até lá vai ter vinte e três anos. Não é tanta distância
assim de idade.
Esse era aquele momento que eu nunca quis viver. Eu sabia que acordos assim viviam
acontecendo o tempo todo, mas não pensei que chegaria tão rápido para mim.
— Vamos, Travis. Eu estou te dando uma oferta de paz e uma aliança que melhor do que isso,
não tem. Ou isso ou você terá que cumprir o acordo. Estou sendo até legal. Poderia simplesmente
virar as costas e declarar guerra à Lawless, mas não quero.
— E não pode.
— Se eu quiser, eu caso meu filho agora mesmo com a filha de Anthony De Basso, Boss do
território da Diabolos. Acha mesmo que eu não tenho poderes agora, Travis?
A minha frieza precisa estar bem marcada e não demonstrar a minha ira, e fica bem difícil.
Sei que ele consegue perceber. Marinne não vai me perdoar tão cedo, mas eu preciso dessa aliança.
Paolo está certo e, de vez em quando, a gente precisa derrubar um peão no jogo para, lá na frente,
poder dar um novo passo em direção ao xeque-mate.
— Tudo bem — aceito erguendo o queixo. — Mas o acordo é o que você disse, minha irmã
só se casará quando completar dezoito anos e ela precisa conhecer um pouco o seu filho, aos poucos.
O casamento será quando ela terminar os estudos, no caso quando completar mesmo seus dezoito
anos, daqui a quatro anos. Se não for isso, eu não aceito.
— Eu acho mais do que justo. Ninguém quer uma esposa burra e inútil. A Darkness também
preza muito a inteligência de uma mulher, não só sua beleza.
Faço um aceno de apreciação.
— Sei que nem todas as organizações prezam por isso, mas fico feliz que nisso nós estamos
em sintonia. — Ele se levanta e estende a mão para mim. — É um prazer fazer essa aliança com a
Lawless. É até melhor do que você se casar com uma simples filha do meu conselho.
Ele só está falando isso porque nós estamos em quatro paredes bem longe de Mário Ferrari.
Aquele homem é tão filho da puta, que é capaz de mandar matar o próprio Capo. Quero-o muito perto
de mim. Os inimigos precisam estar perto e ele odeia profundamente Ivon Avilov. E o inimigo do
meu inimigo é meu amigo.

Eu quase nunca tenho o hábito de revirar os olhos porque é bem irritante e infantil, mas é
claro que Paolo desperta certas ações em mim que eu mesmo odeio.
— Você decidiu o que vai fazer sem mim. Não aceitou o casamento e deu outra alternativa,
que, embora eu não saiba, foi muito melhor. Assim espero.
— Sim, mas a outra alternativa foi tão ruim quanto a outra — respondo sem dizer o que
resolvi com Giovanni.
— Quem é você para falar de crueldade? É apenas um casamento, Travis. Você não está
arrancando um pedaço do braço.
Dou um olhar direcionado para ele com toda minha fúria e isso pelo menos faz ele calar a
boca.
— Paolo, eu gostaria muito de me submeter ao acordo inicial, de verdade. Acho que como
um chefe, um Capo, é de extrema importante mostrar minha liderança e quando tenho que abrir mão,
mas não posso me casar com ela.
— Porque que você não pode se casar com ela? Ela é bonita, educada, de uma família
respeitosa e você ia ganhar poderes com essa união.
— Eu não posso me casar com ela... porque dormi com Madeleine.
Ele fica sem falar pela primeira vez na minha vida. Eu o conheço desde que sou criança. Esse
cretino foi cinistro do meu avô e consigliere do meu pai. São anos convivendo com ele.
— E a Madeleine era virgem. Eu tirei a virgindade dela.
— E daí?
— Você disse mesmo a palavra: e daí?
— Sim, eu disse, Travis. Quem vai reivindicar o casamento por você ter tirado a virgindade
dela? Ela não tem ninguém.
— Bene, você está certo — escutamos a voz doce de Madeleine.
Levanto-me da cadeira rápido, encarando-a, mas antes dou um olhar bravo para Paolo.
— Madeleine, deixa que eu resolvo isso.
— Não precisa se preocupar. O Paolo está certo — ela diz olhando para ele. — Eu não tenho
ninguém para me reivindicar e nem questionar um casamento por eu ter perdido a virgindade sem
estar casada com você.
— Você tem sim, Madeleine — afirmo.
Os dois olham para mim e eu caminho até ela, ignorando totalmente o idiota que é meu
conselheiro.
— Você tem a mim. Eu vou reivindicar sua virgindade. Sei que fiz errado naquela noite e nós
já conversamos.
Ela balança a cabeça de leve, negando, mas eu não deixo que fale nada.
— Eu posso não ser um homem nobre, mas sou um homem de honra e, portanto, irei honrar
minha palavra. Irei honrar as leis da Famiglia.
Paolo não precisa saber, também, da conversa que tive com ela e nem dos nossos sentimentos
um pelo outro.
— Travis, o Paolo está certo e...
— Eu vou me casar com você e já tínhamos conversado sobre isso. — Dou um olhar firme
para que ela relembre a conversa onde disse que me amava. — Está decidido e eu não vou mudar de
ideia. — Viro-me para Paolo. — Já conversei com Giovanni também e a decisão já foi tomada. E, a
partir de agora, eu não sou mais um Capo solteiro, Paolo. Sem contar que me casar com Madeleine é
uma ótima forma de fortalecer nossas alianças com o grupo da Sicília.
Não tinha me ocorrido isso, mas é verdade. Preciso admitir.
Ele parece que está tendo um derrame, no entanto, acena com a cabeça concordando.
— Eu quero o seu bem e mais tarde conversamos sobre o que decidiu com D’Ângelo.
— Sim, precisamos conversar.
Ele assente e me deixa sozinho com Madeleine. Eu me viro para ela, que está de cabeça
baixa, remoendo alguma coisa em sua mente.
— Sei que você nunca quis estar nessa posição. Nunca foi seu sonho casar com um Madman,
e quem dirá com o Capo, mas nós sabemos que não temos outra saída. Nos envolvemos e essa é a
melhor decisão que já tomei.
Ela assente devagar e levanta o rosto para mim.
— Eu sei que é, Travis, e eu estou em uma luta interna entre te agradecer ou te odiar. O que
você disse para o Paolo...
Aproximo-me dela, tomo seu rosto em minhas mãos e deixo meu polegar na sua bochecha,
acariciando.
— Quero que saiba que dormi com você antes de te pedir em casamento, te beijei bem antes
disso. Quis você antes de pensar em qualquer circunstância. Eu era um homem livre e sem amarras
quando decidi ficar com você, não trate como se eu pedir a sua mão em casamento, fosse para te
dominar. Foi ao contrário. E é verdade, eu não sou um homem nobre, não sei identificar qualquer
sentimento e carinho, pois nunca precisei disso, mas eu sou um homem de palavra. Sei que você não
tem mais seus pais, mas você tem a mim, e eu estou reivindicando você. Acho que isso basta.
Ela treme quando toma um fôlego, morde os lábios, chega mais perto de mim e puxa meu
rosto para ela. Nos beijamos como loucos.
— Pelo menos, uma pessoa vai ficar muito feliz com isto — comenta quando nos afastamos.
— Quem?
— Marinne — apenas diz isso e abre um sorriso.
— Todos gostam de você aqui.
— Menos Paolo. Sei lá, fico me perguntando se ele é um problema, Travis?
— Não. Ele não é. O Paolo tem que entender que quem manda sou eu. — Coloco minha outra
mão em seu rosto, deslizando para a nuca. — E eu quero você. Não tem mais o que discutir sobre
isso.
— Mas e... o seu casamento com a outra mulher?
— Que casamento?
Ela revira os olhos, sorrindo de lado.
— Você se esqueceu de que acabou de rejeitar a filha do consigliere do Capo da Darkness?
Você precisa fazer alguma coisa, não é?!
— Eu já tomei a minha decisão. Não me agrada, mas terei que fazer.
— Eu vou querer saber sobre isso agora. — Eu entendo o que ela quer dizer.
— Não, você não precisa saber. Eu já conversei com Giovanni e o antigo acordo acabou.
Nós dois somos os Capos de nossas Famiglie, e isso é o que importa. Nós temos nossos
conselheiros para nos orientar e dar ideias, esclarecer as coisas que não podemos ver e dar
informações que não podemos ter. Nada além disso. Ele não mandam em nós e eu espero que, de uma
vez por todas, o Paolo entenda que eu não sou mais o filho do Capo, eu sou o Capo.
Madeleine se arrepia, assentindo e dá um sorriso nervoso.
— Agora o importante é o nosso casamento.
Ela abre um sorriso tímido, feliz e me abraça.
Não quero que ela se preocupe, nem ninguém. Ainda é cedo para atear fogo neste assunto.
Marinne sempre ouviu histórias de casamentos arranjados e eu não a estou forçando a se casar agora.
Faltam quatro anos. Muita coisa pode acontecer nesse tempo e ela estará pronta. Farei o que estiver
ao meu alcance para que Amândio e ela se conheçam, e ele possa honrá-la, não usá-la. Será uma
excelente esposa para um Capo. Quem a criou fui eu. Coloco minha mão no fogo.
Agora o que eu preciso resolver com urgência é o meu casamento com Madeleine e os
desgraçados dos mexicanos. Quero exterminar a Hechos do território e a Bratva. Se Ivon continuar a
me irritar, ele também será apagado do mapa.
PARTE II
— Agora o importante é o nosso casamento — Travis diz com a voz calma e cheia de
confiança.
Abro um sorriso porque vou tê-lo para mim. Parece ainda surreal, mas eu o amo e tê-lo todo
para mim, pelo menos seu corpo e proteção me deixa feliz. Sei que não posso esperar ouvir dele as
mesmas três palavras que disse. Um Capo não pode ter esse luxo. Ou talvez consiga. Meu avô me
disse isso uma vez. Contudo, eu aceitei que ele me quer.
Eu ainda tenho minhas ressalvas sobre as decisões e ações que são praticadas na máfia, que
estou fazendo um grande esforço para aceitar. Não há outra forma. Não tem mais como eu escapar
desse mundo agora, e nem quero. A decisão de ser a esposa de Travis me algemou ao mundo de
morte e sangue. Posso ainda odiar tudo sobre a Famiglia, afinal não existe a possibilidade de uma
pessoa mudar suas convicções da água para o vinho. Quando isso acontece pode ter certeza de que os
ideais nunca foram reais.
Tenho medo, raiva e nojo de muitas coisas ainda, acredito que sempre terei, porém depois de
tudo que aconteceu nos últimos dias, seria impossível eu não mudar o que penso, quem sou e como
enxergo tudo o que me cerca.
Eu vi Travis matar de forma brutal Enrico, seu soldado que o traiu e ele estava à procura.
Onde aquele imbecil estava com a cabeça em entrar na casa do Capo e tentar pegar o irmão dele. Ele
ia fazer o quê?! Miserável. Ele teve o que mereceu e não me arrependo de ter este pensamento, nem
matar meu primo.
Lorenzo era meu primo de terceiro grau. Filho da filha do meu tio-primo, Valéria. Nós nunca
fomos próximos e isso não importou quando ele fez o que fez. Fiquei desapontada e com muita raiva.
Eu o mataria de novo.
O susto que levei quando ele surgiu com uma arma apontada para mim, me ameaçando, foi
igual a noite onde minha mãe foi pega e os capangas da Bratva tentaram me capturar também. Senti
tanto ódio. Aquele mentiroso filho de uma figa! Lorenzo entrou com o pretexto de que precisava falar
com Travis, afinal ele era cotado para ser um dos homens mais próximo do Capo e tinha tudo para no
futuro, talvez, ser um Capitão, líder de um dos grupos de soldados, mas era uma armadilha. Ele
queria me levar e acredito que Travis está procurando saber o verdadeiro motivo.
Mas o pior daquela noite foi ter que precisar matar alguém. Talvez por não sermos tão
próximos, não foi tão difícil. Consegui pegar a arma que ficava presa embaixo da mesa de centro da
sala e por pura sorte o acertei no meio do peito antes que ele fizesse o mesmo em minha cabeça, onde
o cano da sua pistola com silenciador estava. Aquele desgraçado, traidor e mentiroso.
Eu levei um tempo para aceitar tudo o que aconteceu, o que fiz e que eu sou uma assassina
também. Passei três noites em claro e na esperança de ter a visita de Travis ao meu quarto. Ele foi
tão gentil comigo quando me encontrou no box do banheiro, mas ele não foi. Só o vi depois naquela
noite.
A noite que vi o homem que dominou meu coração cair na minha frente, todo ensanguentado e
machucado. Parecia que ele estava partido ao meio como meu coração ficou ao vê-lo daquele jeito.
Saber que eu tinha uma parcela de culpa, me deixou sem chão.
Nunca fui muito religiosa ou ir à missa, porém rezei muito durante os dias que ele ficou
sedado para não sentir tanta dor. Ele não pode ir ao hospital como qualquer pessoa porque fazem
muitas perguntas, então o tratamento foi fraco e com mais doses de morfina que o recomendado para
ele se recuperar logo.
Dio mio. Foram longos três dias, onde rezei muito para que ele ficasse bom logo. Eu
precisava dizer a ele que sentia muito, que estava arrependida pelas últimas palavras que disse a ele
na última vez que transamos. Por fazê-lo se afastar, tudo porque estava com medo da profundidade
dos meus sentimentos por um homem que eu deveria apenas odiar e lá no fundo, respeitar por ser o
Capo. Foi uma verdadeira tormenta esperar, mesmo assim, valeu a pena.
Ele pode não me amar, mas disse com atitudes que sou dele e não tem escapatória. Bene, eu
não quero mais fugir. Quero correr com ele, ir atrás dele, ser dele e da sua família. Usando de uma
frase boba: “Quero vestir a camisa”.
E estou feliz, pelo menos acho que é isso que sinto quando ouço suas palavras agora, mesmo
não deixando de ter a estranha sensação de que o que ele fez para nós ficarmos juntos não irá me
agradar. Não sei por que penso isso, mas é uma sensação.
— Tem certeza?
Travis cerra os olhos, intensos e firmes, e baixa o rosto.
— Que o mais importante é você se casar comigo? — murmura sério.
— Não é isso. — Franzo a testa, sentindo-me preocupada e mordo o lábio inferior. — Eu
quero saber o que você fez... para nós podermos nos casar.
— Madeleine... — ele solta entre uma respiração profunda. — Fiz o que qualquer Capo teria
feito e eu posso fazer, quem manda aqui sou eu.
— Mas...
— Shu... — Ele me cala segurando meu rosto e beija meus lábios de leve. — Na hora certa,
você saberá, eu prometo e se quiser ficar zangada comigo pode. Estou pronto para qualquer coisa.
Sei que irei escutar de alguns por tomar essa decisão, mas agora eu não quero. — Me beija de novo e
esfrega o rosto no meu aproximando sua boca do meu ouvido. — Acabei de resolver uma crise e o
que mais desejo é estar dentro de você de novo. — Ele dá uma lambida no meu pescoço e eu gemo
baixinho. — Já faz muito tempo.
Meu corpo todo se arrepia e massageio seus ombros, empinando meus peitos para tocar seu
peitoral. Faz muito tempo mesmo. Dio mio. Deve ter um mês.
— Sim... Faz muito... tempo.
Fecho os olhos quando ele consegue me pegar pela cintura. Me levanta e imprensa meu corpo
na parede do escritório. Sorrio por dentro ao lembrar da nossa noite aqui. Dio mio, foi um dos
melhores momentos que tive na vida. E a imagem de quando lambi seu sangue, porra. Acho que já
estava totalmente entregue a ele.
— Meu pau está louco pra entrar no seu calor quente. — Suas mãos apertam minha bunda e
sua boca está na minha de novo. — Ter você toda apertadinha. Quero te foder bem forte.
Ele está fazendo eu sofrer falando essas coisas no meu ouvido. Porra.
— Hum... Para de falar. Arranca logo minha roupa — digo puxando sua camisa para sentir
sua pele quente.
— Bem aqui mesmo?
Fecho os olhos e ofereço meu pescoço para ele beijar e dar uma mordidinha.
— Sim. Aqui! — gemo e tento me esfregar nele.
— Na parede do escritório?
— É... — Seguro a lapela da sua camisa e abro os dois primeiros botões. — Não me torture.
— Nunca faria isso, angele.
Mordo minha boca para não abrir muito o sorriso e pego seu rosto em minhas mãos.
— Adoro quando me chama assim, mesmo não sendo, nem de longe, um anjo.
Ele meneia a cabeça e sorri de lado.
— Será que nós só discordamos um do outro?
Rio e me sinto tão bem. Meu coração está calmo de um jeito que nunca senti. Ficamos nos
olhando por longos minutos e respiro fundo porque queria tanto que ele aceitasse meu amor,
acreditasse. Sei que ele não faz, porque acha que não pode ser amado. Ele está tão errado. Eu me
apaixonei por sua força, o jeito que trata sua família e, por mais que seja controverso, por ele ser
justo.
Travis pune quem precisa ser castigado. Todos nós precisamos, eu sei disso, mas há piores.
Hoje eu vejo isso pelo que meu primo fez e o soldado que o traiu. O mundo obscuro consegue ser
muito pior por causa de homens como estes e sei que Travis é muito diferente de muitos Capos do
passado e das outras Famiglie.
Quebrando meus pensamentos, Travis me dá um beijo forte, intenso e barulhento que me
deixa ainda mais excitada. Eu o desejo loucamente.
De repente, ele me solta. Franzo a testa e só me dou conta do porquê quando ouço a voz
inconfundível de Luca.
Travis solta a respiração e diz:
— Já estou indo. — Vira o rosto para mim de volta, me dá um beijo e me solta para os meus
pés tocarem o chão. — Me espera mais tarde? — É um pedido com tom de ordem.
Sorrio, mordo o lábio e assinto fazendo minhas mãos fecharem os botões que abri da sua
camisa.
— Claro que sim, meu Capo.
Ele quase sorri e me dá um último beijo antes de sair do escritório me deixando quase que
estirada no canto.
— É... Meu Capo — digo assentindo com um sorriso besta.
Pisco tentando recobrar meus sentidos e antes que ele saia da casa, saio correndo do
escritório e vou até as portas duplas. Ele está quase saindo quando grito e ele para. Me dá um olhar
interrogativo antes de pedir para Luca ir na frente e com alguns passos chega até a mim no mesmo
momento que vou até ele.
— O que foi?
— Posso convidar Bárbara pra vir aqui?
— Você sabe que estamos tentando não chamar atenção. Estou procurando outros supostos
traidores.
— Eu sei — murmuro e olhando para os soldados na porta, me aproximo mais de Travis e
digo baixo: — Mas ela é minha única amiga e eu... sabe, eu preciso dela.
— Por quê?
Prendo a vontade de rir. Não importa se é um Madman ou um homem normal, nenhum deles
entende certas coisas tão óbvias. E o óbvio precisa ser dito, explicado também às vezes.
— Eu preciso conversar, confessar coisas e trocar ideias. Aliviar minha tensão e como vou
me casar... — mordo o lábio sorrindo e ele cerra os olhos com o humor apenas brilhando em seus
olhos — ...preciso de ajuda para os preparativos.
— Sim.
Nos encaramos e, por fim, termino:
— Ela pode vir?
— Está bem. Vou deixar porque ela não representa perigo e como vou passar na casa de
Orazio...
— Por quê? — Não consigo me controlar. O pai de Bárbara é um dos capitães de Travis.
— Porque vou promovê-lo a Underboss de, Los Angeles — responde conciso. Ele não me
deve satisfação e só respondeu porque foi no automático.
— Ah! — Abro a boca surpresa. — Parece legal.
— Sim, é. — Travis respira fundo, cerra a mandíbula e se afasta. — Vou pedir para o Luca
trazer Bárbara.
Assinto e sorrio agradecida.
Com um último olhar, Travis pisca o olho direito, se vira e vai embora. Ele nunca se
aproxima ou demonstra afeto em público. Precisa mostrar poder, frieza e medo. Tudo bem, eu
entendo e preciso me acostumar.
Me virando, sigo o caminho para o meu quarto. Vou direto para o banheiro e coloco a
banheira para encher.
Eu preciso mesmo conversar com alguém e distrair minha mente também. Caramba, a minha
vida mudou da água para o vinho desde o início de outubro. Minha mãe morreu, percebi que estava
me apaixonando e afastei Travis por isso, meu primo tentou me matar, mas eu acabei o matando e
para completar, depois vi o homem que amo quase morrer e quando caí na real, tomei a decisão da
minha vida. Ficar noiva de Travis Lozartan.
— Você está encrencada, Madeleine Beluzzo — digo em voz alta e saindo do banheiro, vou
até a cama e me sento.
Eu sinto um frio na barriga com tudo que pode acontecer de ruim em ser a Sra. Lozartan.
Porém, abrir mão dele, me afastar ou ir embora, não é mais uma opção. O que preciso fazer é ter
sangue frio e ser forte.
Apesar de acharem que eu não tenho maturidade, estômago e força para estar onde estou, eu
tenho sim. Em minhas veias tem sangue de uma viciada sem escrúpulos, de um traidor sem alma e do
meu avô, um soldado muito leal. Francamente, eu posso ser tão pior quanto Travis ou qualquer
Madman, e não deixarei ninguém tocar em Travis ou Marinne. É um pensamento ridículo, mas eu só
me importo com eles dois e comigo. Não tenho contato ou simpatia pelos outros. Embora goste muito
de Colen, ainda não o conheço tão bem.
Balanço a cabeça incomodada com esse pensamento. Eu não quero que nada aconteça com
nenhum deles, nem mesmo Paolo, mas se vier a acontecer, dou minha vida por apenas Travis e
Marinne.
Respiro fundo e me levanto da cama para fechar a porta do quarto. Fecho os olhos quando me
sinto segura para desmoronar. Tenho um momento para inspirar e expirar fundo.
Mais calma, pego meu celular para mandar uma mensagem para Bárbara. Caminho para o
banheiro, f echo a torneira assim que vejo o nível da água da banheira chegar no limite, deixo o
celular na pia e coloco os sais de banhos cantarolando. Estou ansiosa para entrar e me banhar em
uma água quentinha e perfumada. Estou me sentindo cansada devido ao estresse da conversa com
Travis.
Eu sei que Paolo tem suas preocupações sobre a segurança de Travis e a ordem sobre a
Lawless, mas não deveria me tratar mal porque acha que é assim que deve falar com quem ele acha
que está atrapalhando os negócios.
Eu queria dizer para ele o quão babaca foi comigo, mas engoli para não piorar a situação.
Sendo franca, naquele momento só consegui visualizar como será a minha vida sendo a Sra. Lozartan.
Várias pessoas se metendo em meu casamento. Mas o meu amor por Travis irá vencer. Eu amo esse
maldito Capo. E se eu consegui engolir meu orgulho depois que papai me forçou a me silenciar, eu
posso fazer isso para o meu casamento sobreviver.
Nesses um ano e três meses que me tornei Capo, pelo menos umas dez vezes trabalhei de
casa, e Paolo no cassino e Colen no balcão, fazendo o trabalho deles e sendo meus olhos. Hoje
poderia ser assim, mas tudo está cooperando para eu precisar sair. Eu nunca reclamo por isso. Nunca
deixei de cumprir com meus deveres desde que sou um Madman e o filho do Capo na época. Não
sou de sentir dor ou reclamar das minhas feridas, mas minhas costelas e meu ombro quando levanto
rápido o braço doem as vezes e os cortes queimam.
Acho que meu corpo não está cem por cento recuperado. De qualquer forma, estou engolindo
essa dor a cego e os analgésicos estão ajudando. Não posso demonstrar fraqueza, principalmente
quando a missão de alguns é esta. Paolo está desconfiado sobre minha recuperação, mas ninguém
sabe das minhas dores. Eu jamais deixaria alguém saber que estou assim.
O encontro com o Capo de Nova York, teria sido bom se fosse em casa, demonstrar
confiança entre nós. Mesmo que tudo seja fingimento. A reunião com Giovanni D’Ângelo foi
necessária e tudo bem, mas, porra, o meu corpo não está totalmente curado. Trabalhar em casa seria
bom, o escritório serve para isso.
E, embora eu sinta essas dores, não significa que estou fraco. De jeito nenhum. A raiva que
estou no momento é suficiente para eu matar quem estiver na minha frente. Adrenalina acorda até
defunto.
Porém, este problema precisa da minha atenção pessoalmente. Contei meia-verdade para a
Madeleine sobre ter que ir à casa do pai de Bárbara. Orazio precisa me dar satisfação sobre o
porquê o homem que indicou para entrar na minha linha de frente, entrou em minha casa e quase
matou Madeleine, que até o momento não era para ninguém saber que estava lá, e não era minha
noiva.
Sei que, a partir do momento que essa notícia explodir, as coisas ficarão ainda piores. E
podem vir. Estou preparado para todos. Ninguém vai ousar falar além do que deve ser dito. É a
merda da minha Famiglia. As regras são minhas. Contra traições não há perdão e nem saída em
minhas mãos. São minhas leis.
Eu os faço implorar.
Faço-os sangrar.
Saindo de casa, pego o celular e mando uma mensagem para Fabrício, Consigliere de Los
Angeles. Com a morte do Underboss, ele teve que tomar conta e o filho de Rossi é muito novo para
suceder o pai, e de qualquer forma eu já queria mexer nesses Underboss agora que sou o chefe.
Completei um ano e nem percebi por estar tão empilhado em problemas. E os malditos mexicanos
vão pagar por fazerem meus homens sangrarem.
— Travis.
Viro-me antes de entrar no carro e encaro Luca. Cerro os olhos para sua expressão fechada.
Saber enxergar um homem feito leva um esforço. Nós sempre estamos fechados em permitir
que vejam nossas emoções. As melhores chances de enxergar um madman, é quando o ódio
ultrapassa a máscara da superfície civil. A carranca mais dissimulada, como a do meu Cinistro
agora.
— Sim — digo esperando-o se aproximar.
— Seria melhor falarmos onde ninguém mais pode ouvir.
— Por quê?
— Pode confiar em mim?
Não. Eu não confio em ninguém e ele sabe disso. Fico mais desconfiado e com isso ele fala:
— Você vai apreciar eu pedir isso quando ouvir o que preciso falar.
Por Luca ser meu executor e nunca me trazer problemas irrelevantes, peço para me
acompanhar para dentro de casa novamente e para Pietro esperar enquanto isso no carro.
— Agora pode falar! — ordeno fechando a porta do escritório.
— Eu sei o que você vai falar com o Orazio e antes de você fazer qualquer tipo de
movimento para transformá-lo em seu Underboss, preciso te dizer que, desde que você trouxe
Madeleine para dentro da sua casa, algumas pessoas estão... — Faz uma longa pausa.
— Dá para você falar de uma vez? Você sabe que eu não gosto de rodeios.
— Algumas pessoas estão criticando... rudemente.
— Algumas pessoas ou soldados? — interrompo-o.
— Eles e suas esposas e quem interessa — diz conciso.
— E o que eles estão falando?
— Travis. — Ele faz uma pausa engolindo em seco, irritado, e continua: — Eu confio em
você totalmente. Você está sendo um grande Capo nesse pouco tempo que assumiu. Está sendo muito
melhor do que muitos que já estiveram no seu lugar e... estão no seu lugar, mas desde que você trouxe
Madeleine para sua casa, as pessoas estão comentando que você trouxe uma traidora para o seu
vínculo.
— Uma traidora? — Cerro a mandíbula e preciso me controlar com a força que brota dentro
de mim. Pura ira. E nem sei de onde vem isso. — Desde quando nós julgamos os filhos por causa dos
pecados dos seus pais?
— Não é isso.
Meneio a cabeça querendo que ele prossiga, fechando ainda mais a minha cara.
— Estou falando no sentido de que ela dedurou o pai quando foi preciso. Quando era
favorável para ela. Então alguns acham que ela pode fazer o mesmo, só que agora contra nós, contra
você. Se um dia você fizer algo que ela não goste, ela... pode simplesmente...
— Ela jamais faria isso — digo firme.
— Você não pode...
— Você por acaso, em algum momento, viu eu falhar em meu julgamento? — interrompo-o.
— Não, senhor. Nunca, mas...
— Então eu estou dizendo que a Madeleine nunca fará isso.
É uma frase nada convencional. Na máfia, na vida para ser específico, não se deve pensar
assim. Não podemos dar o luxo de dizer nunca. Pois nunca se diz nunca. Tudo é possível. Sei disso e
mesmo assim acredito que Madeleine não me trairá.
— E por que ela nunca vai fazer? — Ele não parece duvidoso, apenas curioso da minha
certeza.
— Porque não!
— Isso é um ultimato? Você tem total certeza de que não vai acontecer? — Ele move os pés
desconfortável. — Não quero desrespeitar você, Travis. Eu nunca fiz e farei isso, e espero que, um
dia, você confie em mim para continuar sendo o seu Cinistro, embora eu saiba que ainda está
procurando seus próprios homens para liderar Las Vegas com você.
— Até o momento você está sendo útil. Está se saindo bem e se veio falar comigo
abertamente sobre esse assunto é porque ouviu de alguém que é importante e pode favorecer seu lado
mostrando sua lealdade. Então diga.
— Ninguém que será uma dor de cabeça para você. E um dos soldados que ousou criticar a
sua decisão de trazer a Madeleine, Paolo o silenciou.
— Bom, se era só isso que você tinha para falar comigo... — falo friamente não quero mais
ouvir essa ladainha.
Meu Consigliere precisará me esclarecer essa situação.
— Não — afirma.
Solto a respiração com força.
— Então continua — peço indo me sentar em minha mesa porque não vou ficar em pé
ouvindo-o falar. No meio do caminho resolvo ficar no sofá mesmo. — Luca, sente-se também. —
Meus homens nunca desacatam uma ordem minha e ele imediatamente senta-se no sofá mais distante
de mim. — Agora fala o que mais você precisa me contar.
— É sobre o comportamento de Madeleine.
— É sério que você vai tocar nesse assunto na minha frente? Eu acho que você sabe que a
pedi em casamento e com isso ela se tornará minha esposa. A esposa do seu Capo.
— Sim, eu sei e esse é justamente o problema.
— Por quê? — indago entredentes, me esforçando para não puxar minha faca e cortar sua
língua.
Luca nota a atmosfera e muda o tom da voz para o mais próximo de amistosa.
— Aquela vez no baile, em comemoração ao Bellagio, muitas pessoas viram o jeito que ela
falou com você, que não fez nada. E você sabe das regras, sabe do comportamento esperado perante
nós e algumas pessoas importantes. E por isso alguns estão... Bene, criticando o fato de você deixá-
la falar do jeito que falou com você e agora ser sua esposa.
Faço um som com a garganta concordando e muito irritado com essa conversa. Estou ciente
de tudo isso que estou ouvindo e que também estão corretos, embora me aborreça ter que ouvir o
óbvio. Minha doce futura esposa terá que ficar mais contida fora de casa.
— E como sua futura esposa, Madeleine, da mesma forma que você mostra o seu poder e
força perante a todos, a esposa do Capo terá que ser um exemplo para as meninas também. As mães e
pais querem isso, portanto a reclamação. Quero que saiba que compreendo os dois lados.
— Compreende? — Minha voz é seca, sem brecha para enrolação.
— Olha, as meninas da Lawless foram criadas com honras, normas e regras para obedecer, e
o problema é que Madeleine foi criada do lado de fora também, mesmo seguindo algumas regras do
lado de dentro da Famiglia. O que eu estou querendo dizer é que ela precisa ser um exemplo, Travis,
assim como você é o nosso. Assim como uma rainha é o espelho dos bons modos do rei e para a
sociedade. Os clãs precisam desse posicionamento dela assim como a Famiglia precisa da sua
ordem, força e poder.
Assinto mantendo a minha cara neutra. Por dentro estou odiando tudo por saber que ele está
certo. O jeito que Madeleine se comporta de vez em quando é totalmente fora das nossas regras e o
pior é que Bárbara segue pelo mesmo caminho e um dia eu ainda vou ter que ouvir o pai dela
reclamar como minha noiva fosse culpada.
— Se você está me pedindo para puni-la, sabe que não faço isso. Nós não punimos mulheres
e crianças — digo veementemente.
— Não é isso que eu estou pedindo — Luca emenda imediatamente. — Eu quero pelo menos
que você converse com ela. Tente colocar na cabeça dela que ela vai ser um exemplo para as
meninas e você não pode demonstrar esse tipo de fraqueza. Uma esposa sem freios. Mesmo você
escolhendo a sua esposa, você precisa mostrar que a escolha foi feita não só porque ela é bonita, mas
porque é obediente, educada, polida e forte. Porque ela é certa e confiável para estar ao lado do
Capo. E a lealdade... realmente é uma coisa que ela vai ter de conquistar e não só das pessoas que
estão falando, como a minha também.
Eu ouvi direito?! Que porra de audácia, mas não digo nada apenas escuto-o.
— Fico receoso de um dia ela souber de algo, que nós estamos planejando em fazer e ela não
goste e acabe procurando seus avós. — Pausa ponderando as palavras. — Só estou falando isso para
você porque eu fui o único que teve a coragem. Muitos estão apenas cochichando ao invés de vir
falar com você.
Como parece que ele terminou seu monólogo, impulsiono meu corpo para a frente e apoio
meus cotovelos nos joelhos, com meus olhos fixos nos seus.
— Eu agradeço de verdade a sua lealdade. — Embora tenha ciência de que ele só está
falando comigo apenas porque quer manter o cargo, não posso ser leviano e não ficar agradecido por
isso: — E gostaria que você demonstrasse a sua lealdade com uma prova de que realmente você
merece estar onde estar. De ficar onde estar.
— Sim, senhor.
— Eu quero que faça todas as pessoas se calarem. Madeleine é muito boa e generosa. Me
mostrou confiança e força. Não vou me casar com ela apenas porque é bonita, mas também porque é
muito parecida comigo e eu preciso de uma mulher tão forte quanto eu ao meu lado e é isso que você
precisa informar a todos que estão julgando a minha escolha, mesmo que nenhum tenha esse direito.
E fala que, se eu ouvir com meus próprios ouvidos, eles vão se arrepender.
Luca concorda com a cabeça e seu olhar sabe como eu puno os linguarudos.
— Isso é uma ordem e você sabe tão bem que, quando eu decreto uma ordem, é pra fazer. Eu
quero que todos sejam informados de que Madeleine será a minha esposa. Sei que a Bratva vai
querer se aproximar e tentar talvez retaliar. Sabemos daquele acordo agora e precisamos cortar a
cabeça dessa ideia. — Só em lembrar tenho vontade de ressuscitar Edgar e cortá-lo em picadinho.
Morrer é fácil demais para um crápula como ele foi. Edgar precisava era de uma tortura bem
duradoura.
— Por mim, você já tinha exterminado todos eles, Travis, e se você fizer isso por causa da
sua esposa, eu a defenderei com a minha vida assim como defenderei a sua vida. Sem contar que um
pai trocar a filha por poder da forma que Edgar tinha planejado é inescrupuloso até para os nossos
padrões.
— É bom ouvir isso — afirmo. — Agora nós precisamos encontrar Orazio, se você já
terminou.
— Sobre isso...
Eu paro, voltando a me acomodar no sofá.
— O que você tem sobre Orazio.
— Ele não fez nada do que realmente nós devemos crucificá-lo ou julgá-lo, mas as suas
últimas escolhas não foram boas. Precisamos fazê-lo entender que com a nova posição, que é uma
ideia ainda, que ele precisa também provar sua lealdade. Você está dando a ele uma das suas cidades
e o homem que quase matou Madeleine era de Orazio. Nós não sabemos até onde o Lorenzo poderia
ter ido se ele não tivesse morrido com aquela bala no peito. Você sabe tão bem quanto eu que foi
pura sorte de Madeleine.
— Você nunca vai falar para ninguém que foi ela que atirou nele. Está me ouvindo.
Luca assente rápido e faz o sinal que fizemos quando falamos as palavras de juramento ao
nos tornarmos Madmam.
— É claro que não e fico feliz por ter chegado na hora certa e ter dado o outro tiro. Só queria
ter sido mais rápido para ela não ter que precisar sujar as mãos.
— Esse assunto já morreu — sentencio-o. — O importante é que ela está viva. Agora vamos.
— Levantamo-nos e saímos do escritório. — E Luca...
Ele se vira para mim quando estamos no corredor.
— Evite falar na reunião com Orazio. Ele gosta muito de apontar o dedo e não está tão feliz
quanto aparenta com a minha posse.
— Mas todo mundo diz que ele só sabe elogiar você.
— Dizer que eu seria um bom Capo e que era melhor escolha do meu pai, é diferente de estar
feliz. Afinal de contas, ele passaria a ser o novo Testa do meu pai, juntamente comigo, mas como meu
pai morreu as coisas mudaram e é por isso que, de vez em quando, ele solta umas frases de duplo
sentido. Embora no meio delas há um elogio porque ele sabe que, se passar da linha, eu sou um ótimo
julgador.
Luca abre um sorriso sombrio e assente.
— Sim, senhor. Eu sei que você vai fazer a escolha certa. Sempre faz.
Com um aceno de cabeça, saímos da casa. Chegando ao lobby, peço para Luca me esperar.
Preciso ter uma palavrinha com Madeleine antes de sair. Ele assente e espera nas escadas, satisfeito.
A questão não é eu ser mais poderoso e nunca ouvir quem está para me ajudar, nunca mostrar
falha quando há uma ponta solta em meus assuntos. Luca me alertou sobre um fato que já me
preocupava, e não acho ruim. Antes ele falar comigo do que pelas minhas costas.
Entro no quarto de Madeleine sem bater. Fecho a porta e não a encontro no cômodo. Vou
direto para o banheiro e a vejo tomando banho na banheira, cantarolando. Esse tipo de visão me
deixa excitado e animado, mas preciso focar no problema.
Assusta-se quando abre os olhos e me vê, ela engole em seco antes de dizer:
— Travis! O que você está fazendo aqui? — Senta-se na banheira, um pouco desconfortável,
e me encara.
— Precisamos conversar.
— O que houve? Pensei que você estava na casa do pai da Bárbara.
— Antes de ir, eu preciso falar com você. — Me aproximo sentando-me em meus
calcanhares, pego a toalha que estava na cadeira perto da banheira, seco a borda e apoio meus
braços olhando no fundo dos seus olhos azuis, sempre atentos.
— O que foi? — Ela deixa o corpo mais virado para mim, e tento não olhar o volume dos
seus seios imergindo na água com espuma.
— Eu preciso que você escute atentamente o que vou te falar.
Ela assente e morde o lábio.
— E já vou te pedir para não ficar tão indignada, afinal de contas você sabe das regras da
Famiglia; e, como você aceitou ser minha esposa, assim como eu sigo as tradições, você precisa
também.
— Do que você está falando? — indaga com a voz baixa, neutra e não na defensiva. Ainda
bem.
— Algumas pessoas estão me julgando porque você, às vezes, é malcriada e fala as coisas
que está na sua cabeça e, Madeleine, eu sou o Capo. O comando mais alto dessa Famiglia e preciso
mostrar força. Todo mundo me conhece pela minha impiedosa forma de julgar e condenar. Traição ou
mentiras não são coisas que eu tolero.
— Eu sei disso, Travis — fala sendo mais rápida do que eu.
Deixo para saber o que está pensando sobre o assunto. Preciso ouvi-la também.
— Por que você está falando isso para mim? Eu jamais trairia você, Travis! — Fica
ajoelhada na banheira, toda de frente para mim e toca minhas mãos com as suas. — Juro pela minha
vida que jamais vou trair você. Sei que talvez você não entenda ou não aceite, mas eu disse que eu te
amo. E é a verdade. Se eu aceitei ficar ao seu lado, é porque quero. Eu poderia ir embora. Disse
tantas vezes “não”, que na hora que eu disse sim, foi com tudo de mim.
Estico minha mão e afago seu rosto com meu polegar.
— Sei disso e espero mesmo que você nunca faça nada para se arrepender, mas preciso que
você faça outras coisas também.
— O que for preciso — fala solenemente.
— Você é forte, destemida e leal com as suas convicções. E sei que ainda odeia tudo o que a
Lawless representa, mas você vai precisar deixar muitas coisas de lado. E uma delas é a sua
desenfreada falta de respeito comigo na frente dos outros.
Seus olhos se arregalam quando falo isso. Sabia que teria essa reação.
— A sua falta de postura comigo e com os homens da Famiglia. Você precisa entender que
nós vivemos perante tradições antigas e as mulheres não podem falar tudo que passa na cabeça delas.
Eu gosto disso em você. — Acaricio seu rosto para amenizar as palavras. — É uma das coisas que
me fez querer ficar com você, mas nem todos vão gostar e tampouco vão aceitar um Capo ter uma
esposa que o responde ou faz coisas que dá na cabeça dela porque simplesmente ela quer fazer. Não
pode ser assim, Madeleine. As mães estão reclamando e a sua amiga...
— O que tem a Bárbara?
— Ela tem um pouco do seu temperamento e isso quem resolve é o pai dela, da forma que ele
quiser. Mas você sendo a minha esposa e ela continuando com a postura rebelde, vai acabar
explodindo na minha mão e eu não quero ter que punir você porque outra menina se espelha nas suas
atitudes. Porque, um dia, alguém ousará falar que a esposa do Capo também é assim. Eu não quero
chegar a isso.
Madeleine assente em silêncio, seus olhos passam do meu queixo para os meus ombros e
depois encontram meus olhos de novo.
— Eu vou tentar me controlar; e, se você quiser, converso com a Bárbara. Às vezes, eu
mesma me assusto com ela. Nem tudo que ela faz é por causa de mim. Ficamos um bom tempo
afastadas e isso não mudou quem ela é para melhor. Se é que você me entende.
— Eu sei, querida. — Passo meu polegar sobre os seus lábios. — Sei que não é só por causa
de você que ela é do jeito que é, porém você pode ganhar a culpa. E as minhas costas já são quentes
e talvez me peçam para fazer algo sobre isso e eu não quero chegar a esse ponto.
— Tudo bem — murmura. — Eu não... Não foi minha intenção e... Sei que preciso ser um
exemplo para Marinne também. Me desculpe.
— Está tudo bem — falo baixo fazendo um esforço para demonstrar que não estou zangado,
porque não estou mesmo, porra. Com ela não. — Eu nem tinha achado que seria necessário essa
conversa. Com o tempo você iria se adaptando. Assim como se adaptou a algumas coisas na minha
casa, porém estão reclamando e já não basta toda a confusão com a Bratva. Realmente não preciso
ter que lidar com o seu comportamento porque as pessoas julgam você, porque, como eu disse, você
teve a educação dupla. Algumas regras você seguiu da Famiglia, mas você foi mandada para longe,
foi permitida fazer faculdade, saía sem segurança e aonde queria. Teve convívio com o pessoal de
fora, mas nem todas as meninas é permitido isso e o meu pai talvez nunca tenha feito nada sobre isso
porque tinha realmente apreciação por você.
Algo de bom aquele desgraçado fez na vida.
— Mas ele está morto e você voltou e aceitou ser minha esposa. Agora você precisa estar
aqui e se controlar. — Para aliviar um pouco a bronca, curvo o canto da minha boca e murmuro: —
Pelo menos, quando a gente estiver na presença de outras pessoas. Comigo você ainda pode falar o
que quiser, dar suas ideias e tagarelar. Eu não quero que você seja uma esposa troféu ou que apenas
me obedeça e não tenha voz. Quero que você continue sendo quem sempre foi, mas que entenda as
regras e as siga, principalmente e sempre, na presença do meu Consigliere, meus soldados e de todos
que podem me afetar. Você não é só a esposa do Capo. É o alvo do Capo também.
Ela concorda com a cabeça e deixa o corpo mais em pé. Espero-a fazer o próximo
movimento, e assim que solto seu rosto, ela projeta o corpo para a frente e segura o meu rosto,
beijando meus lábios. Sua boca está fria e doce. Eu fecho os olhos e coloco as mãos em suas costas,
tentando não molhar minha roupa. Respiramos fundo quando nos afastamos, Madeleine fixa os olhos
nos meus com um sorriso confiante e secreto.
— Eu prometo que vou orgulhar muito você e no que depender de mim, no que for preciso e
permitido, quero que Marinne continue sendo incrível e que no dia que ela se casar, só receba
elogios. Mas também quero que ela continue sendo quem é.
— Eu também e não gosto da ideia das mulheres se curvarem aos homens, mas obediência é
uma coisa que é esperada em nosso mundo e nem é tão ruim assim. Obediência não é ruim, apenas
submissão. E não é isso que eu estou te pedindo. Você entendeu?
— Claro que sim, meu Capo — ela sussurra.
Sorrio sem mostrar os dentes, beijo-a fervorosamente e depois encosto minha testa na sua.
— Eu gostaria muito de tirar minha roupa e te comer lentamente nessa banheira, porém eu não
posso agora.
— Mais tarde... — diz com um toque de promessa e eu sei que mais tarde realmente eu a
farei minha.
Merda, já faz um mês que a tive toda para mim. A raiva dos mexicanos só aumenta conforme
o dia.
Sentindo-me revigorada, após um banho relaxante e uma conversa nada esperada com
Travis, sobre algo que sempre ouvi negativamente, mas que hoje foi não apenas aceita como apoiada.
Travis não brigou comigo por ser como sou. Não pediu para eu mudar. Ele apenas me
informou as consequências do meu modo de ser e que eu pondere perto das outras pessoas, e fora de
casa, pois com ele tudo bem. Eu posso ser como sou. Ele me aceita mais do que eu o aceito. E
caramba, isso faz eu me sentir terrível e com uma enorme vontade de me esforçar mais por ele e pelo
que ele precisa.
Descendo as escadas, dou de cara com Luigi e sorrio. Desde o episódio com Lorenzo, ele
vive de olho em mim. Virou meu guarda-costas particular e essa decisão foi tomada bem antes de eu
e Travis fazermos as pazes.
Acho que meu Capo malvado e terrível estava preocupado comigo, mas preferiu fingir que
não me queria por perto quando precisou. Ele estava com o orgulho ferido. Sorrio por dentro porque,
no fundo, nós somos parecidos demais. Embora eu não tenha tanto orgulho quanto Travis, também não
gosto de ceder tão fácil. Porra! E eu quase o perdi por conta disso.
Entro na cozinha faminta e vejo Rosália mexendo em algo no fogão cantarolando alegremente.
— Boa tarde — a saúdo.
Ela para de cantar na hora e vira-se para mim. Tento ler seu semblante e acho que detecto um
pingo de alegria em seus olhos, e surpresa?
— Boa tarde, senhora.
Senhora? Ela não me chama assim.
— Está com fome? Estou fazendo almôndegas para acompanhar a macarronada que o Sr.
Lozartan adora. Ele pediu para fazer para a senhora comer no almoço. — Vira o corpo todo para
mim, mexendo no pano de prato. — E desculpe a demora.
— Não tem problema, Rosália. Eu não estava com fome mesmo na hora do almoço.
— E agora está?
Abro um sorriso envergonhado.
— Na verdade, estou faminta.
— Que bom — diz animada e volta a mexer na comida.
Caminho para a geladeira, pego uma garrafa de água gelada, limões persa para fazer uma
limonada para mim e Bárbara. Parando no balcão da pia, perto de Rosália, aviso:
— Minha amiga vem comer comigo.
Ela me olha e sorri.
— Que bom. A senhora deve se sentir solitária quando a senhorita Marinne está na escola.
— Uhum — concordo. — A casa fica tão sem vida com a ausência dela — comento com
carinho na voz. Às vezes fico surpresa do quanto eu a adoro de verdade, como se fosse minha
irmãzinha.
— É verdade. Ainda bem que as férias das festas de fim de ano estão chegando. Teremos ela
por perto pelo menos uns quinze dias.
— Sim, é verdade. E tem também Ação de Graças.
— É...
— O quê? Ela não vem para casa na Ação de Graças?
Rosália desliga o fogo e me dá toda sua atenção.
— Os Lozartan não comemoram esse dia.
— Por que não?
— Porque é uma tradição americana e eles nunca foram ensinados a comemorá-la. O falecido
Sr. Lozartan não gostava e, para ser franca, ele nem ligava para o Natal. Se não fosse o senhor Travis
ser tão bom com Marinne, ela nunca saberia da existência do Papai Noel. — Sua expressão é de
lamento. — Eu não sei o que seria dela se não tivesse o senhor Travis. Os avós também não são
muito afetuosos, porém menos que o falecido Sr. Lozartan. Eles sempre vêm para as festas de fim de
ano ou fazem uma ceia para receber os netos, porque Travis é bem convincente quando quer e ele
adora fazer a irmã feliz. — Abre um sorriso convencido. — E é por isso que disse aquela vez para a
senhora que ele é um bom homem.
Assinto veementemente e sei que estou sorrindo.
— Hoje eu sei disso, Rosália, e sinto por tê-lo julgado tão mal.
— Tudo bem. — Coloca a mão sobre a minha. — Fico realmente feliz que veja isso e queira
ficar.
— Queira ficar? — Franzo a testa.
— Ah — solta envergonhada. — Eu sei que o senhor Travis pediu a sua mão em casamento e
você aceitou. Parabéns, aliás.
— Oh, sim. — Rio nervosa. — Ele pediu sim e eu aceitei. — Balanço a cabeça, espantando
a alegria boba. — E obrigada, de verdade.
Ela fica me olhando por uns segundos, um pouco constrangedores e chega mais perto, pega
minhas mãos nas suas e aperta de leve, com seu jeito maternal.
— Se me permite dizer, você era tudo que essa casa precisava. Pode não parecer, mas mudou
Marinne. Ela agora tem uma visão materna para se espelhar e...
— Dio mio, no. — Suspiro sentindo minhas bochechas esquentarem. — Ela sempre teve
você e Marie Rose
— Não, senhora. Nós somos funcionárias da casa. Sei que demos tudo que pudemos para
apoiar a menina e fazer companhia a ela quando está aqui, mas não é como desde que você está aqui.
Sei que no começo foi difícil a interação entre vocês, mas depois que se deram bem, foi incrível. Ela
ficou mais feliz, mais animada e feminina. Ela vê em você um novo porto seguro.
— Ah, Rosália. — Me desprendo dela e vou me sentar na banqueta. — Isso é muita
obrigação para mim. Marinne já havia me dito sobre isso, mas... — engulo em seco — ouvir você
dizer é grandioso demais.
— E a senhora sabe também que o senhor Travis pensa assim, não é?
— O quê?! — Viro-me para ela rapidamente. — Como assim?
Rosália fica nervosa e confessa após uns segundos:
— Ele também vê em você uma substituta para ele.
— Por que ele precisa que alguém o substituía? — Praticamente pulo da cadeira e sinto meu
coração acelerar. — Sei com tudo de mim que ele nunca a deixará sem proteção. Ele não precisa
substituir nada, muito menos a si mesmo.
Ela sorri com carinho e vejo pesar em seus olhos.
— Espero que esteja certa e que nunca precise acontecer, mas nós sabemos quão perigoso o
mundo é. O nosso mundo é.
Involuntariamente solto um suspiro trêmulo e coloco a mão no peito, sentindo minha pulsação
acelerada.
— Calma, Madeleine. Está tudo bem. — Aproxima-se. — Está me ouvindo?
Assinto olhando para a frente sem de fato estar focando em nada. Guiando-me, sento-me em
uma das cadeiras da mesa da cozinha e depois pego um copo de água que Rosália me serve.
— Vai ficar tudo bem. Beba a água e se acalme.
Concordo freneticamente.
Isso! Vai ficar tudo bem. Eu não vou perdê-lo. Não posso perdê-lo. Dio! Nem hoje e nem
nunca.
Saio do carro assim que Pietro para em frente à casa de Orazio, e o vejo parado na porta,
esperando-me com a expressão preocupada e ansiosa. Todo homem feito é criado, na teoria, para não
transparecer sua expressão, feliz ou triste, mas duvido muito que muitos homens consigam se
esconder por trás de suas máscaras perto de mim. Ninguém consegue fingir ser ou não sentir algo
para mim; e, quando acontece, sempre descubro.
— Travis.
— Orazio — devolvo apertando sua mão.
— Entre, vamos até o meu escritório.
Aceno de cabeça e o acompanho com Pietro, Paolo (que está com a cara fechada e ainda
vamos conversar sobre meu noivado) e Enzo. Eu me garanto sozinho. Eles estão comigo porque o
assunto lhe diz respeito.
A casa está silenciosa e logo que nos vê a empregada procura seu caminho rapidamente para
fora do nosso. Sei que Orazio não é um sádico com sua família e funcionários, os soldados o
respeitam por ser rigoroso e astucioso, não perverso. Ele respeita a regra de não maltratar mulheres
e crianças, mas pelo que vejo todos o respeitam dentro de sua casa tanto quanto os de fora de casa, e
ele deve ter avisado que eu viria.
Procuro brevemente seu filho mais novo, Gabriel. Ele tem apenas dezesseis anos e logo será
iniciado. Me disseram que está muito ansioso, diferente de Dario quando foi iniciado há dois anos, e
é assim até hoje. Meu irmão não parece ter a vocação que Colen e eu trazemos dentro de nós. Isso me
preocupa. Ele não tem alternativa. Não há saída para ele não querer ser um Madman. No entanto, não
encontro o garoto. O pai deve ter pedido a ele para ficar fora dos assuntos por enquanto, assim como
meu pai tentou me dissuadir até os meus doze. Quem insistiu para eu saber de tudo muito cedo foi
vovô.
Chegando ao escritório, espero Orazio abrir e fechar a porta para me colocar perto da
mesma. Nunca relaxo fora de casa ou dos meus cassinos. Confiar não é meu ponto forte. Ele deve
sentir o mesmo, pois não se senta, fica na minha frente.
— Antes de falar sobre o que realmente me trouxe aqui, preciso esclarecer algo de extrema
importância.
Orazio dá um aceno.
— Madeleine Beluzzo será minha esposa e eu fiquei sabendo de uns boatos que não quero
realmente ouvir, pois não vai ficar legal.
— Eu não...
— Me poupe de ouvir suas mentiras — o interrompo. — Meus homens são leais e eu soube o
que você pensa sobre ela. — Dou um passo, ficando mais perto e o encaro seriamente. — Mas seus
pensamentos morrerão a partir de agora se você leva a sério sua vida e sua posição como meu
general.
— Claro que sim, Travis.
— Esse não é apenas um aviso, é um alerta. Não quero mais ninguém dando um pio sobre
Madeleine, a não ser sobre suas virtudes e que é a esposa do Capo. Meu pai não ligava com o
desrespeito que faziam com minha mãe ou até mesmo com outras mulheres entre ele e seus homens,
mas comigo não vou permitir. Se você trata sua esposa com desrespeito e não liga que alguém fale o
que quer, problema seu. Eu não posso me meter no casamento dos meus homens, assim como nenhum
de vocês tem esse direito e, pela honra e juramento com a Lawless, espero que se lembrem disso.
Minha irmã e minha esposa não estão abertas para serem alvos de nenhuma boca. Entendido?
— Sim, Travis. Eu tomarei conta de ninguém falar nada.
— Isso inclui você e sua esposa. — Dou um olhar certeiro para que ele saiba que eu sei
sobre como sua esposa gosta de falar. — Boca aberta para mim apenas de defunto, porque entra
mosca. Espero não ter que ver as suas assim para enfim ter o silêncio de vocês. Nós não retaliamos
as mulheres e crianças, mas eu não tolero desrespeito e traição. Falar da minha família por trás é
traição. Então, é melhor não abusar da minha paciência.
Vejo o medo cintilar nos olhos azuis de Orazio antes de ele concordar com a cabeça.
— Juro que não acontecerá mais e quem fizer algo parecido, pagará com sua língua.
Dou um simples aceno e mudo minha postura ao falar:
— Agora, antes de falarmos de negócios, minha futura esposa deseja a companhia da sua
filha para o almoço.
— Sim. Bárbara é muito amiga da Madeleine desde pequena.
— Eu sei — digo com firmeza. — E por isso seria bom você também olhar para o seu teto,
antes de jogar pedra nos dos outros. Sua filha é tão... intensa quanto Madeleine. Porém, eu não me
importo, a menos que ela seja desrespeitosa comigo ou minha família.
Orazio engole em seco.
— Ela não fará isso e eu aprecio a amizade delas. Acredito que foi minha esposa que fez
alguns comentários e pode ficar seguro de que não acontecerá novamente. Dou minha palavra. Além
do mais, Bárbara em breve se casará e, com certeza, terá que mudar seu jeito. Nem todos aceitam
quem fala demais.
— Orazio — dou um passo me aproximando dele —, eu não me importo em como cada
homem meu governa suas casas e suas famílias, a única coisa que quero é lealdade e respeito a
minha família e em como eu governo a Lawless. E é apenas por isso que estou trazendo esse assunto
desnecessário para essa reunião. Meus assuntos com você são muito mais sérios e importantes do
que a forma como minha futura esposa e sua filha se portam, e como algumas mulheres da Famiglia
falam mais do que devem. Eu tenho tias e sei como é. — Faço uma pausa. — Agora, se permitir,
Pietro levará Bárbara até minha casa, que é onde Madeleine está há duas semanas.
Poucos, muitos poucos, homens, sabem que ela está lá desde que o pai fora morto. Esse
segredo foi mantido por conta das más-línguas.
— Sim, eu permito.
Sem mais, aceno para Pietro e ele sai com Orazio fazendo companhia, provavelmente para
avisar a filha, que duvido muito já não sabe do encontro. O mundo moderno não tem muito esforço
para manter segredos ou esperar o tempo necessário.
Finalmente, sentando-me em uma das poltronas, sinto o olhar de Paolo em mim e cerro a
mandíbula.
— Nós vamos conversar mais tarde.
Ele acena e desvia o olhar. Estou dando um desconto a ele porque soube que a esposa está
grávida. Seu primeiro herdeiro está a caminho e não sei como deve ser para ele, só que o
conhecendo bem, desde pequeno, Paolo não deve estar tranquilo.
Eu estava bem animada depois de conversar com Travis, de me acertar com ele de verdade.
Acho que colocamos as cartas na mesa de vez, mesmo diante de um assunto que particularmente me
emputeceu. Mas eu sabia que aceitar o pedido de casamento dele era aceitar tudo que vinha com isso.
Então tudo bem, até ter a conversa com Rosália e, sinceramente, fazer meu dia azedar.
Quando finalmente a campainha tocou e Bárbara apareceu, eu pensei que ia ficar feliz com
sua presença. Ela sempre me alegrou com seu bom humor e sagacidade.
No entanto, estou sentada à mesa da sala de jantar com Bárbara, comendo nosso almoço
tardio, e cheia de pensamentos que não param de rondar minha mente. A última conversa que tive
com alguém dentro dessa casa foi terrível, francamente. Será que vai ser sempre assim? Eu vou
viver em altos e baixos, entre felicidade e desespero, e entre alegria e medo. Sinceramente, não sei
se vou aguentar sem enlouquecer no percurso. Agora entendo as regras da Famiglia, em não nos
permitir sair. Viver a vida como uma pessoa de fora.
— Eu pensei que você me chamou para vir almoçar com você para a gente conversar —
Bárbara fala de mansinho, o que não é o jeito típico dela.
— Eu só estou pensando muito.
— Pensando muito sobre o quê? — Ela definitivamente me dá toda sua atenção quando deixa
o copo de vinho na mesa. — Até agora você não me falou nada a não ser: “Bem-vinda, temos um
almoço esperando a gente. Vamos nos sentar”. Tão robótica e cheia de classe que não lhe reconheci.
— Travis me pediu em casamento — solto de uma vez.
— O quê? E desde quando vocês estão juntos? É... vocês estão e desde quando... — Ela ri,
nervosa. — Meu Deus! Eu estou passada.
— E eu aceitei me casar com ele, mas...
— Qual o problema, amiga? — Ela para de rir e fica séria, esticando a mão para segurar a
minha.
A raiva passa por mim. Eu não sei por que diabos todo mundo está fazendo isso hoje.
— Eu sou apaixonada por ele. Eu amo, de verdade, mas e se alguma coisa acontecer com
ele? — Desvio meus olhos focando no meu prato, a comida quase intocada. — Se me tirarem ele? Eu
não consigo nem pensar nisso. Viver minha vida sem ele agora que eu o tenho.
— Por que está pensando nisso? Era para você estar feliz, vai se casar com o homem que
ama e nós duas sabemos que amor em nosso mundo é algo muito raro, principalmente se casar por
amor.
Olho para ela e sorrio com gratidão.
— Você podia não querer ter essa vida, estar em Las Vegas. Só que escolheu ficar e teve a
sorte de se apaixonar, e agora vai se casar por quem se apaixonou. É estranho dizer isso, mas você
deu sorte.
Concordo com um aceno de cabeça, bebo um gole do vinho antes de contar a breve conversa
com Rosália.
— Entende agora por que estou nervosa? Eu não quero que ele pense que eu posso substituí-
lo, Bárbara. Quero que ele pense que nós somos um time e vamos... nós dois vamos cuidar da
Marinne e dos nossos filhos quando nascerem. Essa coisa de eu ser sua substituta se algo lhe
acontecer me mata por dentro.
— Amiga, é normal ele pensar assim e eu posso estar enganada, mas tenho certeza de que ele
não quer morrer tão cedo. O poder é uma coisa que está enraizada em seu corpo e Travis é como
todos os homens em nosso círculo, muito orgulhoso. Talvez ele pense em você como substituta na
questão da sua ausência. Agora você vai estar em casa, com Marinne, enquanto ele trabalha e resolve
os negócios sujos das organizações criminosas.
Rio baixinho pelo seu comentário.
— Espero mesmo que seja isso porque eu não quero pensar na morte dele. Não quero pensar
na morte de quem eu amo. — Suspiro e desvio os olhos rapidamente. — Eu já tive muitas perdas em
um curto período e a Marinne já tinha falado sobre isso comigo. Deus! É tão novo essa coisa. O jeito
que ela gosta de mim e ouvi-la dizer que me vê como uma visão materna. Dio mio. Sabe, isso eu
posso aceitar e lidar, mesmo que seja bem grandioso essa responsabilidade, mas não quero substituir
Travis em nada. Eu quero tê-lo ao meu lado, porque eu também preciso dele.
Bárbara toca minha mão e sorri com carinho.
— Ele também precisa de você e é disso que se trata. Acho que você precisa falar com ele
sobre isso.
— Sim, eu tenho.
Ela suspira, como se girasse uma chave dentro dela e fala:
— Mas fora isso, me diga as novidades e... você está feliz? Como você está se sentindo
sendo a noiva do Capo?
— Para falar a verdade, eu me sinto bem. Um pouco aterrorizada e estranhamente surpresa
por estar onde estou, mesmo ainda não achando nada legal as ações da Lawless. Mas acho que estou
confortável.
— Isso nunca vai mudar, Madeleine. Eu, você e muitas mulheres não gostamos, mas
precisamos “aceitar” para o nosso bem e de nossos irmãos, pais, esposos e filhos.
Assinto com veemência, pois ela está correta.
— Eu sei e, como disse, eu amo Travis e ele confia em mim. Isso não vai mudar e eu tive
“sorte” — faço aspas — de ficar com ele e agora vou me casar. Então, me sinto feliz. — Deixo uma
risada sair. — Seria muita sacanagem eu não me sentir assim. Eu seria uma filha da puta.
— Eita! Eu nunca vi você falar assim.
— Hum... Falando nisso, preciso conversar com você sobre isso.
— Como assim? O que você quer dizer com isso?
Respiro fundo para a emitente irritação da parte dela. E eu posso culpá-la?
— Parece que algumas pessoas têm andado falando mal de mim. Sobre meu comportamento e
acham que eu não sou uma “futura primeira-dama” ideal para Travis — debocho porque, apesar de
eu ter aceitado, não gostei.
— Está falando sério? — Bárbara parece ofendida e confusa.
— Sim e uma dessas pessoas é a sua mãe e o seu pai. — Pauso para ver sua reação, ela não
parece nem um pouco surpresa. Os filhos sempre sabem os pais que têm, e vice-versa. — Travis,
quando me contou, deixou a entender que algumas pessoas acham que eu sou uma péssima influência.
No caso, que você é do jeito que é, por minha culpa. — Faço uma carreta. — E nós duas sabemos
que você é do jeito que é, porque é assim. É sua personalidade. Eu não tenho nada a ver. Nós
podemos conversar sempre, e enquanto eu estava longe não perdemos o contato, mas nossa amizade
não era igual. E o tempo passou e você se transformou nessa pessoa cheia de “personalidade” —
faço aspas — que eu adoro, mas nem todo mundo gosta. Você sabe disso.
— Eu sei disso e nem estou surpresa de uma dessas pessoas serem meus pais. — Ela desvia
os olhos e mexe na macarronada em seu prato, quase vazio. — Talvez papai apenas fique
constrangido e não goste, mas quem mais tenta me policiar é minha mãe. — Me encara de volta. —
Ela não suporta meu jeito e diz que nenhum homem vai querer se casar com uma garota que fala pelos
cotovelos, é debochada e fala palavrão.
— Bárbara, não se sinta mal por ser como é. Jamais faça isso, entendeu? — Pego sua mão e
aperto. — Eu particularmente não tenho nada contra. Adoro que você seja desse seu jeitinho e
sempre me surpreenda com suas frases e conselhos. Porém... convenhamos que, de vez em quando,
você passa dos limites e a gente já falou sobre isso...
— Sim! Você já falou — me interrompe. — Só que você é minha amiga e eu aceito seus
conselhos. E tipo, eu não pensei que iria atingir você. — Faz um som raivoso, o que me faz sorrir. —
O que essas pessoas idiotas falaram de você é ridículo. Elas não te conhecem de verdade. Não
sabem que tem um grande coração e é humana demais, por isso não suporta nosso mundo. Você é
lúcida, Madeleine, e é por isso que amo você, amiga.
Abro um sorriso de gratidão e assinto antes de falar:
— Eu acho que as pessoas me veem até pior do que falam e afinal de contas, alguns falam
que eu inspiro você a ser assim e posso fazer o mesmo para outras meninas quando for o lado
feminino a se seguir como esposa do Capo.
— Argh! Que raiva disso! — resmunga. — Tenho certeza de que esse comentário é da minha
mãe. Ela deve sentir muita vergonha do meu jeito e para abafar o fato de que foi a minha criação,
meu DNA, que me tornou ser assim. Ela coloca a culpa em você ou em qualquer outra coisa. De vez
em quando, quando ela briga comigo, ela fala que a culpa é do gênio da família do meu pai. Nunca
dela. Nunca dela.
— Você acredita nisso?
Ela torce o nariz em descrença.
— Não! Não mesmo. Minha mãe parece ser uma dama da sociedade, mas de vez em quando é
muito atrevida, e o que eu sou é apenas ser falante e desbocada, Madeleine. Eu não sou atrevida e
rompo as regras. Eu as respeito, mesmo que debochando de tudo por dentro.
— E é muito sincera — comento com humor.
— Com certeza. É um charme em mim. — Mexe nos cabelos com graça fingida.
Sorrio assentindo e dou de ombros com bom humor.
— Eu gosto de você e por mim a gente nunca mudaria quem nós somos, mas eu já estava
pensando que preciso moderar um pouco os meus pensamentos e o que eu falo.
— Sim, você será a esposa do Chefe. Do nosso Capo.
— Uhum, e é como ser a esposa de um governador ou presidente, um rei. Eu preciso estar à
altura dele e acho que ser a esposa de um Capo é muito maior do que qualquer outra coisa. Céus! Ele
é um assassino. Um matador cruel e não gosta de traição e nem de mentiras. Ele não pode ter uma
esposa engraçada e que fala o que pensa. — Suspiro e bebo um grande gole do vinho. — Eu sei que
preciso ser tão fria, emanar respeito e poder. Ser calculista como ele é. Preciso ser forte e que me
respeitem. E para isso, eu não posso ser aberta demais e muito menos aberta a comentários
maldosos. Eu quero orgulhar Travis e a mim mesma.
— Você pode mudar, mas promete que, quando a gente conversar, você vai ser a minha amiga
de sempre? — Seu pedido vem com olhos meigos. — Não se transforme nessas esposas troféu.
Meu riso é genuíno e involuntário.
— Eu jamais vou ser uma esposa troféu e duvido muito que Travis queira isso de mim. Ele
sabe quem eu sou, Bárbara. O que estou querendo é ser mais concisa, ponderada e honrar o
sobrenome que vou carregar, e por mim mesma. Meus pais foram pessoas terríveis. Desleais,
desonestos e gananciosos. Não quero isso me perseguindo e nem aos meus filhos. Sendo a esposa de
Travis, quero carregar o que seu sobrenome tem: poder, medo e autoridade. Isso vai ser
automaticamente necessário, eu já sabia que precisaria de uma postura mais firme no momento que
soube que estava apaixonada por ele e aceitei ser sua por completo.
— Eu acho que você vai se sair muito bem, futura senhora Travis Lozartan.
Ouvi-la pronunciar essa frase causa um frio na minha barriga. Uma alegria misturada com
preocupação. Não vai ser fácil ser a Sra. Lozartan, mas eu nunca fugi de um desafio na vida. Não sou
de ter medo do que assusta muitas pessoas.
Eu sei que secretamente meu talento é amar o perigo. Sei que, desde o dia que encontrei
Travis naquela boate, senti meu corpo clamar por ele. O único medo que tenho agora, de verdade, é
de perdê-lo.
Acordo saltando no meio da cama com o coração acelerado. Eu peguei no sono depois que
desisti de ler o livro que me distraía. Tinha me cansado de esperar por Travis na sala e subi.
Recuperando o controle da minha respiração, fito o relógio na cabeceira da cama e vejo que
é um pouco mais da meia-noite. Não sei se Travis voltou para casa ainda. Ele não dorme comigo
geralmente e, mesmo com nosso compromisso, não sei como será agora. Nós não conversamos sobre
isso. Os dias depois que ele acordou foi para se recuperar.
Depois daquele dia que ele desmaiou na minha frente e ficou de cama na casa adjacente, eu
passei a dormir lá, assim como ele. E nós não tínhamos voltado para os nossos quartos até então. Nós
mal conversamos de verdade. Hoje foi um dia extremo para ele, pois tinha um compromisso
inadiável. Ouvi Paolo falar sobre isso e, pelo visto, era algo muito sério. Ainda não tive
oportunidade de me esbarrar com Paolo depois do seu comentário. Afinal, depois que ele e Travis
saíram fiquei sozinha nessa casa com os empregados e seguranças.
E eu só estou no meu quarto agora porque passei o dia na mansão e, quando tomei banho e
troquei de roupa, fiquei por aqui esperando-o.
Jogando as cobertas longe, pego um casaco no guarda-roupa e saio à procura de algum sinal
dele ou de comida. Hoje não senti muita fome. Não quero admitir, mas a conversa com Rosália me
atingiu de verdade, e ainda está me incomodando. Me incomodou a tarde e noite toda. Depois que
Bárbara se foi, só pensei em conversar com Travis.
Nas escadas não vejo ninguém. Pela hora, não tem mais ninguém dentro da casa. Os
seguranças ficam do lado de fora e os empregados em seus aposentos, para dar a liberdade que
Travis tem em sua casa.
Atravesso o grande salão e vou direto para a cozinha pegar uma maçã pequena, que como
rapidamente e deixo o resto no lixo. Pego um pouco de água e me sentindo mais calma, vou para a
sala do piano.
Sorrio com todas as lembranças que esse lugar me traz, mesmo a melhor de todas sendo a
pior. Ver Travis ensanguentado aquela vez me deixou uma pilha de nervos, embora também excitada.
Custei a entender meu corpo reagir daquela forma. Não queria aceitar que sua escuridão também me
afetava de outras formas. De uma forma que não deveria.
Hesito em me sentar na cadeira quando vejo a luz do escritório acesa. Curiosa, caminho com
passos lentos até lá e bato devagar na porta.
— Entre.
Meu coração quase pula para fora quando vejo Travis sentado atrás de sua mesa, que está
cheia de papéis espalhados. Fito seu paletó jogado na cadeira, em frente à mesa, junto com a gravata.
Nele ainda restam o colete, desabotoado, e o coldre com as duas armas de cada lado. Seus cabelos
estão uma bagunça demonstrando sua exasperação e cansaço. Por mais forte e poderoso que ele seja
nesse momento, em qualquer momento, eu consigo ver seu esgotamento. E meu desejo de abraçá-lo e
acariciar seus cabelos é quase doloroso.
Franzo a testa e um ruído esquisito sai de dentro de mim. Eu ando até ele tão estranhamente
calma. Como se estivesse em inércia. Como se minha vida real fosse um sonho e se eu tropeçar, fosse
acordar dentro de uma verdade terrível.
— O que houve? — ele pergunta, como sempre, tão controlado. — Aconteceu alguma coisa?
Balanço a cabeça em negativa e ainda sem me mexer.
— Nada.
Travis franze a testa e tenta me ler, mas não vai conseguir ver nada, pois eu não pareço estar
sentindo nada. Por dentro, sou uma folha em branco.
Lentamente, muito lentamente, caminho até ele e paro na sua frente quando gira a cadeira para
ficar cara a cara comigo.
— Madeleine, o que houve? — pergunta de novo.
Suspiro e estico minha mão até seu rosto e afago sua bochecha, que ele deixa embora seus
olhos estejam desconfiados, confusos.
— Você demorou.
— É — responde sem emoção. — Eu tive mais trabalho do que imaginei. Eu precisava
resolver algumas crises.
Assinto sem me importar de verdade com o que ele disse. Nem sei se ouvi.
— Acha estranho eu não me questionar?
— O quê? — O vinco entre suas sobrancelhas se aperta mais, mostrando sua confusão
comigo. Ele se levanta e pega meu rosto entre suas mãos. — Aconteceu alguma coisa?
— Você quer que eu te substitua?
— Do que você está falando?
Em minha mente confusa, sentindo-me perdida e nem sei descrever o outro sentimento dentro
de mim.
— O que eu sou para você, Travis?
Ele fica em silêncio por longos minutos me encarando e consigo ver as engrenagens dentro da
sua cabeça funcionando. Sua compreensão sobre o assunto: sentimentos.
O que ela é para mim? Cazzo. Ela deve querer ouvir o que eu nunca cogitei na vida. As
mulheres sempre querem emoções, declarações e redenção, e eu não sei se sou capaz da redenção.
De devolver seus sentimentos tão claros em seus olhos.
Aprendi desde cedo que sentimentos são uma fraqueza. Eu amo a dor e a morte, amo ser mau
e temido. Nunca cogitei sentir além disso. Esse tipo de emoção, essas fraquezas, foram arrancadas de
mim quando pequeno. Proteção e domínio vêm da minha natureza. Querer proteger ela e meus irmãos,
é totalmente diferente de sentir, ou amar.
Não sei qual a resposta certa que ela quer ouvir. Não sei as palavras certas para dizer a
mulher linda, sexy e compassiva na minha frente, que possa expressar o que ela é para mim, sem ser
insensível. Sem ferir seus sentimentos, porque eu sei que não será à altura das suas palavras. Da sua
declaração de que me ama.
Eu a desejo ardentemente o tempo todo. Penso nela até quando não deveria focar nas
lembranças de nós dois juntos. Sempre fui sério nos negócios, meus pensamentos nunca se desviaram
do que eu precisava fazer, e agora acontece mais do que eu posso tolerar.
Quero Madeleine por inteiro e isso me irritou no início. A fome por seu corpo, sua voz, sua
mente e até mesmo sua ousadia. Chego a adorar seu temperamento. Esse é o maior nível de aceitação,
apreciação, por outro ser humano que já fui capaz de sentir. Aceitar seu lado mais distante dos meus
padrões, do meu eu e comportamento. Nada nela me afastou, exceto quando ela pediu para fazer
justamente isso.
Odiei aquele momento mais do que odiava quando minha mãe escolhia a fivela do cinto para
bater em minhas costas. É duro um homem como eu admitir, mas sua recusa me rasgou ao meio.
Tocou bem fundo em meu orgulho. Deixou-me vendo vermelho. Embora não tivesse aceitado o
término, por um tempo só quis quebrar, mutilar, bater e matar tudo que estivesse na minha frente.
Algo que eu tinha total domínio. Eu queria tirar aquela sensação de perda do meu sistema. Arrancar
aquela fraqueza de mim.
Uma que não vou tolerar sentir novamente.
Eu poderia falar tudo isso para ela, para descrever o quanto eu a quero e preciso dela. Mas
não quero entregar a realidade da minha única fraqueza para ela. Que ela e meus irmãos são as
coisas mais importantes da minha vida. Eles são os únicos capazes de arrancar meu sangue e me
fazer queimar. Porém, não meus sentimentos. Nada além do controlável.
Seus olhos esperam por mim, me imploram por resposta. Vejo a tristeza dentro deles por eu
estar demorando tanto.
Arfando como se tivesse corrido quilômetros, pego seu rosto em minhas mãos, beijo de leve
seus lábios e falo prendendo seus olhos nos meus:
— Eu não sei o que você quer que eu diga, mas posso lhe assegurar que você é muito, muito
importante pra mim. Tanto que você me fez quebrar minhas próprias regras quando fui atrás de você.
Mais de uma vez. Posso não devolver as mesmas palavras que você me deu, que por sinal fico
preocupado com esse sentimento que está aí dentro de você. Não quero que isso te machuque, porque
pode. Mas eu gosto de você. Eu quero você. — Merda! Isso é mais do que eu sou capaz de oferecer.
Que posso dar a ela.
Madeleine engole em seco e seus olhos azuis são um mar profundo e denso.
Porra, ela me deixa nervoso. Não quis deixá-la partir, não aceitei o fim e agora, por alguns
segundos, não quero que ela deposite tanta fé em mim. Eu não sou digno desse tipo de sentimento. Já
não basta Marinne.
A realidade me atinge com brutalidade. Eu tenho dois pontos fracos, e se meus inimigos
descobrirem, vão bater forte. Eles sempre batem onde mais dói.
— Você não pode mandar no meu coração, Travis — diz solene, meiga. — Isso, esse
sentimento, não vai mudar. — Seus olhos brilham. — Eu só tenho medo que me tirem você e... que
você queira, de algum jeito, eu aqui para ficar no seu lugar se algo acontecer.
Não compreendo o que ela fala, mas ignoro dizendo:
— Eu quero você no seu lugar, que é ao meu lado, nada além disso, Madeleine. — Beijo sua
boca, porque não consigo não fazer. — Não sei o que você escutou ou está pensando. O que eu quero
de você é o que você já está me dando tem um tempo: a sua companhia, vitalidade, força e confiança.
Você será a minha mulher. Eu escolhi você.
Ela abre um sorriso lentamente e concorda com um aceno de cabeça.
— Eu quero te dar tudo de mim. Eu já dei tudo de mim pra você — diz com total e
assustadora certeza.
Eu nunca pensei na mulher em potencial para me casar, embora soubesse que teria que fazer
para manter minha linhagem e que, provavelmente, teria que ser por funções táticas. O fato de
Madeleine ter sido minha escolha, por eu ter tido um relacionamento com ela e não uma intimação
para o nosso desfecho, a torna muito mais do que se fosse por apenas razões estratégias. Só negócios.
Ela já é uma preocupação para mim. Não sei direito o que é a queimação no meu peito quando eu a
vejo. Mas, porra, eu gosto as vezes. É uma dor desenfreada. Desejosa. Ansiosa.
E quando eu a vi entrar no meu escritório com sua camisola de seda branca e os pés
descalços tocando o chão de tabaco escuro, contrastando com sua pele alva, quis me levantar e tomá-
la para mim. Puxar seu corpo para os meus braços e acabar com a distância de todo esse dia longo.
As preocupações da Lawless e os conflitos. Eu apenas a queria, e é isso que faço agora. Reclamo sua
boca e sons só para mim.
Não perco tempo em mais um pensamento. Agarro-a, tomando sua boca furiosamente.
Respiro com força para sentir seu aroma, seu doce perfume que me enfeitiça. Sinto o gosto dos seus
lábios macios e molhados com fúria desenfreada. Com anseio para além desse toque. Quero mais.
— Tem muito tempo — ela geme entre meus lábios, roubando meus pensamentos sombrios.
Puta merda! Essa mulher sempre me pega de jeito e tem muito tempo que não sinto sua doce
boceta envolver meu pau naquele aperto macio. Muito tempo que minha língua não prova sua doçura.
Caralho! Eu sinto falta de estar com ela mais do que sua companhia. Sinto falta de não ter nada nos
separando.
Forço minha boca na sua com a lembrança da nossa última vez assombrando meus
pensamentos. Aquela noite, a recusa, me irritou. Acordou meu monstro controlado com força.
Colocou-o para fora. A sensação de perdê-la, fez as correntes que prendo meu monstro com vigor se
arrebentarem, porque eu não quero não tê-la depois de possuí-la. Depois dela me forçar a ser o que
nunca fui com nenhuma outra mulher. Depois dela quebrar algumas paredes que ergui para os meus
homens, meus inimigos e estranhos. Ela também me invadiu. Ela é minha.
Minhas mãos firmam em seu rosto, aprisionando sua boca na minha. Madeleine chupa minha
língua, como sempre, parecendo estar se deleitando com um doce. Ela joga os braços nos meus
ombros, pressionando seu corpo no meu. Seus seios apertam no meu peitoral deliciosamente.
Rosno como a fera que sou, agora louco pela mulher em meus braços. A minha mulher. Desço
minhas mãos por seus braços, chegando na curva da cintura fina. Sugo o ar com força ao sentir o peso
dos seus seios, o calor que vem deles e passo a ponta dos polegares nos bicos inchados e duros.
— Travis — ela geme.
Começamos a nos tornar selvagens. Iço Madeleine pelos braços, minhas mãos em sua cintura,
e assim ela envolve minha pélvis. Levo-a para fora do escritório e deposito seu corpo em cima do
piano de cauda longa preto. Seus olhos me prendem.
— Estou com saudades — sussurra passando as mãos no meu peito. — Dio mio, que falta eu
senti de você.
Eu entendo o que ela quer dizer. Também sinto uma fome insana por ela. Uma ânsia enérgica
nos meus nervos, na minha pele, para sentir seu toque. Para lamber seu corpo todo e ter o seu gosto
na minha boca. Porra! Que vontade de ouvi-la gritar meu nome e foder como um louco a noite toda.
Sem tirar meus olhos dos seus, deixo um beijo na sua boca e me afasto. Bem devagar, pego
seus pés, levanto-os e dou beijos em seus tornozelos. E ao deixar o corpo cair e se deitar no piano,
abro suas pernas para beijar dos seus joelhos e até as coxas macias.
Ela respira fundo e abre mais as pernas. Fico satisfeito com o que vejo: a renda azul-escura
da sua calcinha molhada por causa da sua excitação. Puxo o pequeno pedaço de pano para fora,
tirando do seu corpo sem pressa.
Agora vejo com perfeição sua linda boceta molhada e carente por atenção. Fecho os olhos
por breves segundos ao me lembrar de que sou o único homem que já viu e sempre será apenas eu. A
possessividade grita em mim por ser seu único homem. Ela também é minha primeira. A primeira que
quis mais e não usei preservativo. Que dormi na mesma cama. Que chegou tão perto. Ela só não sabe
o quanto é especial para mim, e nem irá saber.
Aproximo minha boca da sua boceta e beijo os lábios molhados. Olho para o seu rosto
passando dois dedos e depois os escorrego para dentro do seu calor, bem devagar. Com minha outra
mão, separo os grandes lábios e deixo um beijo no clitóris.
— Oh... Travis — ela geme e a assisto quando arqueia o corpo.
— Tão molhada e deliciosa — murmuro e lambo seu clitóris. Ela está irresistível.
Ajeito meus cotovelos, apoiando-os no piano, abrindo-a mais e enfio minha língua na
brincadeira, meus dedos servindo para deixá-la aberta. Escuto-a resmungar, com as mãos nos meus
cabelos. Minha língua provoca seu clitóris, chupando e dando mordidas. Ela fica cada vez mais
molhada e aberta para mim.
Madeleine geme mais alto e suas mãos apertam mais forte meus cabelos.
— Eu... Porra! Travis... Ah... sua boca.
Chupo mais forte não deixando de dar atenção a sua boceta com minha língua. Meto dois
dedos dentro dela e vou intensificando cada vez mais a sucção e os movimentos dentro dela, até que
ela goza chamando o meu nome ficando ainda mais escorregadia.
Louco de tesão, retiro meus dedos de dentro dela vagarosamente e dou um beijo na sua
virilha. Pego-a pela sua cintura, colocando a mão na parte inferior das suas costas e a forçando a
erguer o corpo. Nos encaramos e dou um beijo rápido na sua boca.
Puxo seu corpo para mim e ela envolve suas pernas no meu corpo, se esfregando na minha
ereção dura. Agarro-a pela bunda e ela me abraça dando beijos no meu rosto, enquanto a levo para
fora da sala do piano.
— O que você está fazendo?
— Estou levando você para a cama — murmuro já subindo as escadas.
Madeleine franze a testa, mas relaxa no meu colo, deitando a cabeça no meu ombro e
respirando profundamente. Ela beija a pele do meu pescoço e afaga minhas costas. Eu gostaria muito
de já estar nu, porra, para sentir suas mãos quentes de verdade.
Chegando no andar dos quartos, fico relutante antes de ir decidido para o meu. Para o quarto
principal da casa. Madeleine parece ficar tão surpresa quanto eu e ergue a cabeça quando entramos
no cômodo. Fecho a porta com o pé e a levo até a cama.
Beijando seu corpo, permito que ela me solte lentamente e nossos olhos se prendem um no
outro de novo. Eu seguro seu rosto, beijo sua boca, chupando sua língua e ela se esfrega em mim, no
meu pau duro dentro das merdas das minhas calças, que eu não aguento mais.
Dando um selinho nos seus lábios, afasto-me. E parece que ela me quer nu tanto quanto eu
quero me livrar dessas roupas. Rapidamente ela me ajuda a tirar, desabotoando minha camisa, meu
coldre, o colete e a camisa. Ela abre a fivela do meu cinto e o botão da calça, enquanto eu tiro os
sapatos com a ajuda dos próprios pés.
Quase na velocidade da luz, eu fico pelado; e arrancando as meias, abaixo-me, ficando de
joelhos na sua frente, e minhas mãos ficam uma de cada lado do seu corpo. Madeleine ri, colocando
as mãos nos meus ombros e eu sinto vontade de rir contagiado por ela. Que coisa estranha.
Aperto suas coxas, sinto seu cheiro e ela geme, abrindo-se para mim e deixando o corpo cair
na cama.
— Vem, por favor... — pede com a voz manhosa.
Porra!
Coloco os joelhos na cama, e me aproximo. Vou subindo e ela se ajeitando, abrindo as pernas
e, quando estamos cara a cara, ela toca meu peito, meus braços, meus ombros e seus dedos caminham
pelo meu pescoço até que ela segura meu rosto.
— Senti tanta falta de sentir você. — Afaga meu peito. — Como eu posso ter me negado isso
aqui?!
— Negado? — pergunto franzindo a testa.
— Quando eu disse que eu não queria mais. — Seus olhos ficam distantes e tristes. — Eu fui
tão tola. — Me beija. — Nunca vou me cansar... de te dizer o quanto eu te amo. O quanto sou louca
por você e como meu corpo fica ansioso para sentir o seu. Como me sinto vazia sem você dentro de
mim, Travis — ela sussurra meu nome e faz suas pernas puxarem meu corpo para cima, roçando a
minha ereção aonde ela deseja. — Por favor, não me tortura mais. Me fode, amor.
Meus batimentos aceleram e inspiro com força. O que eu mais quero é estar dentro dela, e
por mais que eu adoraria chupá-la de novo, sentir o seu gosto, encaixo meu corpo entre suas pernas,
fazendo-a se abrir e nossas coxas estão acariciando-se uma na outra. Apoio minha mão na cama,
esticando o braço, pego meu pau com a mão livre e guio na sua entrada.
Lentamente assisto o momento em que meu pênis entra no seu calor e a ouço gemer baixinho.
Pego-a no flagra jogando a cabeça para trás com os olhos fechados e abrindo a boca. Ela geme como
se estivesse sentindo dor e prazer.
Um pouco enfurecido, tiro tudo e meto com força até sentir ela me envolver por inteiro e
abaixo meu corpo até poder abraçar o dela. Seus seios estão colados no meu peito e as pernas
envolvendo minha cintura. Madeleine abraça meus ombros, ficando mais perto, e as mãos se movem
nas minhas costas, afagando minha pele. Sua boca aberta no meu ouvido, merda! Como é linda e sexy.
Ela geme beijando meu rosto com os lábios abertos, lambendo minha carne e eu me
movimento em um vaivém, tirando devagar e metendo com força. Chupo seu pescoço e sinto como se
estivesse exorcizando os dias que pensei que a tinha perdido.
Ela parece fazer o mesmo.
Aumento a pressão, querendo ficar cada vez mais perto e ouvindo-a falar no meu ouvido,
beijando-me. Deixo meu corpo ficar mais em cima dela, estendo meus braços e pego sua bunda,
achando um jeito que eu consigo meter com força. Ela está tão molhada, que fico desenfreado.
— Está me sentindo dentro de você?
— Sim!
— De quem você é?
— Sua! — balbucia. — Ah... eu sou sua... Só sua. Ah... Amor — ela geme no meu ouvido se
abrindo mais para mim.
— Sente como você está me engolindo? Como está molhada. — Estoco indo mais fundo, ela
morde meu ombro e eu o meu lábio. Puta que pariu! Sinto o gosto de metal do sangue.
— Ah... Sinto muito — ela diz.
Balanço a cabeça e dou um chupão no seu pescoço, marcando-a e digo:
— Não precisa e agora você é minha.
— Sim! — ela grita porque foi fundo. — Eu sou... para sempre, amor.
Cazzo. Toda vez que ela me chama de amor, fico louco. Faminto por ela.
Meu peito parece que comprime. Não consegue suportar meus batimentos. Não acho que um
dia vou me fartar dessa mulher.
Acelero, percorrendo meu orgasmo, sentindo-a mais apertada. Loucamente nós gememos e
mexemos juntos. Ganho um arranhão nas costas e rosno quando vejo seu pescoço. Ela grita,
inclinando a cabeça para trás e implorando por mais.
— Estou duro pra caralho!
Ela chega no seu segundo orgasmo, comigo apenas dentro dela, e eu não paro agora. Também
quero gozar. Continuo estocando e batendo bem forte até que gozo violentamente, despejando a minha
porra dentro dela. Marcando essa mulher.
Como pode ela me levar do inferno ao céu?
Como ela consegue ser meu anjo e meu demônio?
Ao mesmo tempo que gememos juntos, soltando a respiração falha, suados e sem fôlego,
lentamente vamos diminuindo os movimentos. Nos abraçamos com mais força. Madeleine não parece
querer se desgrudar, como se estivesse com medo de nos soltar.
E paramos, congelados no meio da cama, agarrados um no outro e fazendo nossos corações
acelerados se acalmarem. Seus lábios tocam suavemente a minha pele e arfo com força, concordando
com um aceno de cabeça murmuro:
— Não vou te soltar. — Sinto que precisava falar para ela saber.
Madeleine suspira e vai afrouxando o abraço, mas nunca se desgrudando totalmente de mim.
Portanto, abraço-a mais um pouco e sinto seus dedos fazendo um movimento de vai e vem nas minhas
costas, acariciando-me.
— Dorme assim comigo hoje?
— Assim? — Indago sem entender.
— É — responde e move o corpo de um jeito que sinto que estou dentro dela ainda.
Afasto minha cabeça do seu ombro e franzo a testa encarando-a. Deixo um beijo no seu nariz.
— Eu sou muito pesado para dormir em cima de você.
— Então só cai um pouquinho para o lado — sugere.
E eu faço o que me pede, permanecendo conectado a ela, mas só um pouco para o lado.
Porém, não me sinto confortável.
— Por que você quer isso?
— Eu quero você perto de mim — responde olhando-me nos olhos.
Sorrio achando graça da sua resposta.
— Eu estou sempre perto de você.
— Não — replica. — Eu quero dormir com você dentro de mim.
Respiro fundo, dou um beijo na sua testa e saio de dentro de dela.
— Não... Travis... — reclama e tenta me agarrar.
— Calma — digo e faço a gente se ajeitar na cama.
Pego as cobertas nos pés da cama, apago as luzes pelo sensor do controle remoto e ligo o ar-
condicionado no baixo. Por fim, nos cubro e me ajeito com ela de costas para mim. Então, como
estou um pouco ereto ainda, lentamente meto dentro dela, fazendo-a gemer baixinho. Dou um chupão
no seu pescoço e relaxo.
— Está bom assim? — pergunto no seu ouvido, dando um beijo no final no lóbulo da sua
orelha.
— Está perfeito.
— Okay, agora durma.
Ela resmunga um sim e não abre os olhos quando sorri.
— Você vai dormir comigo a noite toda?
— Vou, prometo.
— Vai ser a primeira vez — comenta distraída e sua voz está receosa.
— A primeira de muitas, porque agora você é a minha mulher. Pode deixar que vou dormir
com você todos os dias.
— Travis... — Seu sorriso vem misturado com meu nome, que morre quando ela suspira
sonolenta. — Como eu posso amar tanto você quando já te odiei? Bem... isso foi antes de conhecer
você.
— O que eu fui e sou com você é apenas entre nós.
Ela abre um sorriso frouxo e concorda assentindo.
— Eu sei e por isso prezo tanto. — Vira o rosto para mim, ficando um pouco de lado e me
encara. — Prometo não quebrar essa confiança, amor. Prometo estar a sua altura.
Sinto um orgulho por ouvir isso porque eu sei que ela vai ser incrível e muitos vão temê-la
tanto quanto a mim. É sua teimosia que a torna única e maravilhosa para ser minha esposa. E não tem
problema nenhum saber que ela me odiou muito antes de aprender a me amar. Porra! Ela ter
sentimentos por mim é inacreditável de todas as formas. Eu também a prezo, e muito.
Madeleine se aconchega em mim e rebola, fazendo meu pau massagear seu núcleo. Olho para
ela com advertência e murmuro:
— Você disse que era para dormir.
— Mm... mas por que não posso aproveitar, hein? — Ela safada é doce de uma forma
tentadora. — Você é tão gostoso e olha como estou molhadinha.
— Cazzo, lo so. Lo sento, angele. — E como estou sentindo.
— Segunda rodada?
Como resposta, permito que ela se mexa e aperto seu quadril, fazendo lentamente meu pau ir
mais dentro dela e sair.
Mesmo quando acabamos, fico conectado a ela porque também preciso senti-la a noite toda.
Não queria, mas preciso admitir que preciso realmente dela.
Suspiro antes de abrir os olhos, sentindo um calor gostoso me envolver por trás. Um sorriso
bobo brota em meus lábios percebendo que Travis está me abraçando. Que ele me abraçou durante a
noite toda. Ele ficou.
Para quem não gosta e nunca dormiu com ninguém, ele está se saindo incrível comigo. Está
sendo maravilhoso enquanto estamos juntinhos na sua cama.
Porra! Eu estou no quarto dele, na cama dele e com ele às... olho para o relógio em cima da
cabeceira e confirmo as horas: são seis e quinze da manhã.
Sendo irresistível ficar parada, remexo meu corpo esfregando-me no seu e ele resmunga.
Sorrio internamente e me viro devagar. Fico surpresa de ele ainda estar dormindo. Suas feições estão
relaxadas como nunca vi antes. Estico minha mão e faço um carinho no seu rosto, meus dedos tocam
suavemente as maçãs e depois seu nariz, que infelizmente o faz despertar.
Dessa vez, ele resmunga mais alto e a mão do braço que está em cima de mim, desce até a
minha coxa dando um aperto. Rio baixinho, deixando meu sorriso bobo mais aberto, e dando um
beijo rápido na sua boca, me afasto para poder voltar meu olhar no seu rosto, o flagrando no minuto
em que abre os olhos e me encara.
Meu coração quase para. Dio mio. Acho que é a primeira vez que vejo tanta suavidade em
seus olhos.
— Bom dia — ele me cumprimenta baixo, com a voz ainda mais rouca do que o habitual.
— Bom dia, querido — saúdo-o animada. — Você dormiu comigo de verdade?
— Sim, eu dormi — responde neutro e com a testa franzida.
Para ele pode ter sido algo bobo, mas para mim foi especial tê-lo aqui quando acordei.
— O que você achou de dormir comigo? — Mordo o lábio sentindo-me envergonhada de
repente.
— Bom. Eu gostei — ele responde e sua mão sobe até minhas costas e desce até minha
bunda, e repete o movimento uma... Duas... Três vezes.
Travis parece adorar passar a mão no meu corpo. Eu, com certeza, amo. Ele continua fazendo
como se percebesse meus pensamentos ou nem nota que está fazendo o carinho.
— Mm... e eu estou no seu quarto.
— Nosso quarto — me corrige rapidamente.
— Nosso? — Franzo a testa.
— Sim, nosso quarto. — Deixa a mão na minha cintura, brincando com os dedos em minhas
costelas. — A partir de agora, ele é seu também. Se você quiser pode trazer suas coisas para cá ou
pode deixar no outro quarto para ter mais espaço e um lugar só para você.
— Você vai ter um lugar só para você?
— Não, angele. Eu já tenho o escritório e não preciso de muita coisa.
Concordo com a cabeça. Pensando bem, ele tem a casa adjacente, que sei muito bem agora o
que acontece por lá. Negócios.
— Eu vou pensar sobre isso, mas adorei ficar com você essa noite.
Ele franze a testa, mas logo fica lívido.
— Pode ficar todos os dias. Não acho que tenha mais necessidade de fingirmos que não
estamos juntos.
— Você vai querer que a Marinne já saiba? Antes do nosso casamento? Antes você tomava
tanto cuidado.
— Ainda vou tomar cuidado e antes era porque... — Pausa e muda de foco. — Você acha que
ela já não sabe que a gente está junto? — Detecto o humor oculto em sua voz.
Deixo uma risada escapar e concordo com a cabeça, porque é verdade. Aquela menina é
muito esperta e sempre sabe de tudo. Sempre sabe o que falar.
— Falando no casamento... — murmuro mexendo minhas pernas enroladas nas suas, sentindo
sua ereção ficando dura. — Quando é que a gente vai poder se casar?
— O quanto antes — responde rápido. — Por mim, a gente já teria se casado, mas alguém é
muito teimosa — brinca comigo e, quando dá um peteleco no meu nariz, sorrio olhando-o nos olhos.
— Eu já passei dessa fase. Superei isso.
— Que bom que você recobrou a inteligência.
Dou uma gargalhada e bato no seu peito brincando com ele também.
— Não seja convencido demais.
— De maneira nenhuma — responde e me pega de surpresa abraçando meu corpo. Ficando
em cima de mim no colchão, encaixa-se no meio das minhas pernas e massageia meu sexo com seu
pênis endurecido e quente. — Que tal acordarmos bem hoje?
Dio mio. Era para eu me sentir tão bem assim?! Tão feliz.
— Todo dia vai ser assim? — pergunto com a voz fraca. Minhas mãos passam nos seus
ombros e braços enquanto ele provoca o meu clitóris com a ponta do seu pau.
— Eu acho que pode ser todo dia assim sim, angele.
Derreto-me toda quando escuto isso. Quando ele é afetuoso comigo fico boba.
— Adoro ouvir isso. — Fecho os olhos e solto um gemido. — Eu sou seu, anjo... Por que eu
sou seu anjo?
Travis fica pensativo encarando-me, então solta a respiração com força e toca gentilmente
meu rosto.
— É porque... Eu não sei. Você me traz algo de tranquilo dentro de mim como um telhado
surgindo de repente em uma tempestade.
Sorrio. Ele sempre gosta de falar por enigmas. E quem sente algo de tranquilo, de bom, agora
sou eu. Ganho um beijo no centro dos meus lábios e ele se afasta um pouco, sorrindo sombriamente
quase zombeteiro.
— É um telhado muito pequeno, porque a tempestade é forte demais, mas eu adoro.
Caramba! Isso me leva na borda das emoções. Eu sei que não sou o suficiente para abafar sua
escuridão, mas ele também não é sombrio demais para apagar minha luz. Um dia talvez sejamos
metade de cada um. Mesmo que apenas para dentro de casa, porque para todos sempre seremos
respeitados e temidos. Um dia eu alcançarei seu nível. Almejo isso tanto quanto o seu amor.
Provavelmente estou sendo inocente sobre o mundo e costumes da Famiglia, que não
enaltece demais as mulheres. Estou sendo uma completa idiota. Sim, talvez sim, mas eu já vou me
casar com ele, que admitiu que sou importante. Posso não ter aquilo que quero agora. Posso não ter o
que mereço em troca pelos meus sentimentos por Travis. Mas eu o tenho. Eu sou dele.
— Eu sou sua completamente — digo em voz alta porque preciso que ele saiba. Abraço seu
corpo todo com meus braços e pernas, e suspiro sentindo-o apontar seu membro na minha entrada,
que está pronta, encharcada para recebê-lo. — E amo que você me chame de anjo — murmuro.
Travis me fita em silêncio e, por fim, arfa cerrando a mandíbula e mete devagarinho em mim,
cuidando para não me machucar. Fecho os olhos enquanto minhas unhas cravam seus ombros. Ainda
bem que as minhas unhas não estão tão grandes. Não quero machucá-lo.
— Por que você? — comenta de repente. Parece confuso.
— Por que eu?
— Porque você... — Ele estoca em um movimento profundo. — Você me dá... paz. Um
sentimento estranho.
— Paz? — Rio baixo e me controlo para não gemer. — Como eu posso lhe trazer paz se sou
tão complicada?
— Mas é sério — afirma sem abertura para duelo.
Embora eu queira ouvir tudo que ele tem para me dizer, e essa conversa parece tão pessoal e
nos aproximar, quando ele mete até o fim, perco o fôlego e fecho os olhos abrindo a boca. A
penetração é tão profunda que fica difícil até de respirar. Porra, como ele é magnífico!
— Mesmo com todos os aborrecimentos, você é isso para mim — comenta como se não
estivesse abalado por esse sexo matinal excitante. — A vida não é fácil, angele.
Sua voz captura minha atenção e abro os olhos enquanto escuto nossos corpos se mover à
procura da libertação de um tesão dolorido. Entre nós sempre é tão intenso. Essa química perfeita.
— Travis — balbucio e puxo-o para beijar sua boca.
Ele chupa meus lábios, minha língua e ondula o corpo, massageando-me por dentro de um
jeito alucinante. Que divino.
— A vida não é fácil para ninguém, para nós menos ainda. E você me faz bem, querida. Você
é o meu anjo e o meu demônio. Meu céu e meu inferno. E que bom que você é assim, perfeita para
mim.
Perco o ar, o sentido e só sei que quero mais dele. Jogo meus braços nele.
— Deixa eu ficar por cima? — Faço meu núcleo o apertar e peço fazendo minha voz
sedutora. — Só um pouquinho.
Travis sorri, me dá um beijo na boca tirando meu fôlego e gira nós dois na cama, me
deixando ficar em cima. Eu nem tenho tempo direito para aguentar a sua invasão até o fundo.
— Oh! — grito jogando a cabeça para trás e, quando começo a cavalgar em cima dele,
respiro fundo de boca aberta e gemendo.
— É por isso que você é meu anjo — sua voz vem acompanhada da sua mão afagando o meio
do meu corpo, meus seios e minha barriga. — É linda, suave e meiga. Tão sexy e gostosa. Perfeita!
Ouvir sua voz e ter sua força em mim é tão bom. Fixo meus olhos nos seus ficando sem ar,
abro a boca e meu cabelo fica entre nós, é uma imagem sexy de nós dois. Ele segura meu rosto,
flexiona as pernas e bate para cima, para dentro de mim enquanto eu deixo meu corpo subir e descer
até que deixo-me cair em seus braços. Sinto-me fervendo, enlouquecendo.
— Eu nunca quis tanto alguém como você. Como eu gosto de foder com você, mi angele.
Solto a respiração gemendo e remexendo. E quando ele se senta, fica quase dolorosa a
invasão do seu corpo no meu.
— Você é meu inferno — ele diz a última palavra e une nossas bocas.
É um beijo eufórico e louco, tal como nossos corpos procurando o orgasmo, que chega
alucinante. Deixo minha cabeça cair para a frente e encosto no seu ombro, minha boca passando no
seu rosto. Dou beijos em seu pescoço e sorrio pensando que voltar para Las Vegas foi a melhor coisa
da minha vida, só demorei para entender. Para ver isso e que Travis me salvou.
Caio para a frente quando ele deixa o corpo se deitar na cama de novo me levando junto,
abraçando-me bem forte. Eu suspiro totalmente sem fôlego e ele relaxa.
— Se for assim todos os dias ao acordar do seu lado, acho que fui uma idiota por ter
demorado tanto para te dizer sim.
Travis me surpreende soltando uma gargalhada e me dando um beijo surpresa no ombro
enquanto suas mãos afagam minhas costas.
— Eu já sabia disso.
Rio e me remexo em cima do seu corpo espetacular.
— A gente pode se casar antes do Natal, hum? — sugiro.
— A gente já tinha falado sobre isso — ele fala confuso.
— Eu sei. — Levanto a cabeça para enxergar seu rosto. — Sim e por mim pode ser quando
você quiser, mas, já que o Natal está chegando, acho que vai ser bem legal, só falta os detalhes.
— Eu já falei com seus avós.
— O quê? — Levanto mais meu corpo encarando-o.
Ele faz uma cara de culpado antes falar:
— Eu tinha muitas coisas para resolver e mandei uma mensagem dizendo que precisava falar
com eles e no fim da tarde consegui falar com seu avô.
— E?
— E eles ficaram muito surpresos, mas aceitaram.
Reviro os olhos e me deito em cima dele de novo.
— É claro que eles aceitaram me casar com o Capo de uma das Famiglie mais poderosas
dos Estados Unidos. Quem em sã consciência recusaria?
Travis não diz nada sobre meu comentário.
— Eles falaram que virão para o casamento e que, já que estamos namorando, o casamento
tem que ser rápido. Eles não querem um escândalo maior na família deles do que já tiveram com o
marido da sua mãe e a traição do seu primo. A Camorra não precisa de outro motivo para querer
expulsar sua família da Itália.
Suspiro alto. Tinha tanto tempo que não ouvia falar da Camorra, a Famiglia de origem do
clã da minha mãe: os Beluzzo. Ela foi uma idiota traindo-os quando deixou seus vícios serem
maiores. Ser dada ao meu pai deveria tê-la deixado ciente de que precisava ser leal. Ela foi usada
como peça do xadrez da máfia. Casar uma filha da Famiglia com um homem de fora. Porém, mamãe
só fez escolhas ruins e preferiu fingir que se casar com papai foi a forma de “sair” da ligação com a
Camorra e a Cosa Nostra, origem dos dois maiores clãs que já comandou a Lawless. Os Lozartan
estão no poder há cinco gerações.
A avó de Travis, Giulia Caputo, é da Camorra, e o avô, o temido Vincenzo Lozartan, da Cosa
Nostra. A família Lozartan precisou pedir ajuda a Camorra quando muitos homens da Famiglia
foram pegos e muitas alianças rompidas com o mundo corporativo e político, tudo porque um filme
foi feito e muitos segredos do submundo das organizações criminosas revelados por um ex-Capitão –
preso e usado para delações. Imediatamente esse homem com certeza não fora mais um Homem de
Honra, como todos os Madman são. Muitos já foram pegos, mas guardaram os segredos. A Omertà é
o código de honra mais forte do nosso mundo. Rompê-la é uma sentença de morte sem escapatória.
O resumo da história, é que o mundo moderno precisou ser estabelecido entre as Famiglie,
que aprendeu a duras penas a crescer ainda mais sob as sombras. Manipulando, chantageando e
organizando cada canto que comanda, e não só na América, como na própria Itália e no mundo. A
Cosa Nostra precisou se reinventar para não ser derrotada pela política moderna e a quarta
Famiglia, que surgiu diante do caos. A Sacra Corona Unita, que também está infiltrada em uma das
Famiglie dos Estados Unidos. Não sei qual, mas não é a Lawless.
Odiar esse mundo é bem diferente de não se interessar e saber das coisas. Eu fui mandada
para longe por saber de mais, não de menos. Os homens não gostam que as mulheres saibam dos seus
assuntos. Meu pai não fazia questão de esconder os detalhes, porém se deu mal se abrindo demais.
Acho que por isso tentou me calar.
Ora, ora, olha onde estou agora. Nos braços do Capo. Saber ainda mais sobre as ações da
Famiglia será inevitável.
— Está perdida em pensamentos? — Travis pergunta beijando meu ombro e suas mãos
descem até poderem apertar minha bunda.
Rio e deixo um beijo no seu peito.
— Não... eu só... — Solto a respiração. — Você já resolveu o problema de Lorenzo?
Descobriu o motivo dele fazer aquilo?
— Não e eu vou precisar ir para Denver falar com o Underboss de lá.
— Vai tentar descobrir o que de fato aconteceu?
— Orazio deu algumas informações.
— Hum... e resolveu as coisas com ele pelo menos?
— Eu posso dizer que sim. — Travis sorri sombrio. — Mas você conhece Orazio.
— Muito bem — comento sem vontade e fico calada. Penso um pouco antes de perguntar: —
Acha que o pai da Bárbara está traindo você?
— Não acho que chega a ser tanto, mas ele é muito ambicioso e não sei até que ponto. E eu
não gosto como a família dele é. Inclusive a esposa.
— Ela foi uma das pessoas que falou de mim, por isso que você está zangado?
— Não tem nada a ver só com isso, embora eles estejam proibidos de falar da minha esposa.
— Da sua esposa? — pergunto rindo.
Ele aperta minha bunda e seus olhos brilham em um sorriso contido.
— Só eu posso falar e brigar com ela quando fizer besteira.
— Eu não faço besteira — digo na defensiva.
— Tem certeza?
Dou uma risadinha e encosto a minha testa na dele, sentindo-me tão bem.
— Eu te amo, Travis Lozartan.
Seus braços me apertam mais forte e eu ganho um beijo no rosto, então suspiro porque adoro
quando ele está assim. Eu sei, dentro de mim, que ele sente alguma coisa por mim. E pelo que eu
sinto por ele, irei respeitar o tempo que levar para ele entender e aceitar o que somos: amantes. Não
é apenas tática essa relação. Eu sei, ele sabe, porém não fala. Entendo-o, pois a verdade é que ele
não sabe o que é o amor, por isso somos tão parecidos. Ele não recebeu amor e eu tive tão pouco na
vida. Agora fomos apresentados a este sentimento e ficarmos confusos, é natural. Até para quem teve
uma vida normal, estar apaixonado assusta.
E não importa nada disso. Travis é muito bom para quem precisa dele, precisa dos seus
cuidados. Sinto-me feliz de ser uma dessas pessoas e, quando tivermos nossos filhos, sei que será um
pai tão incrível quanto foi para Mari. Dio mio. É tão estranho eu amar tanto e sentir ciúme dele. E eu
quero tanto que ele seja feliz, na medida do possível, e que a Fera se apaixone pela Bela. Pois é
basicamente isso. Eu me apaixonei perdidamente pela Fera, que tem um coração muito bom, mas
muito mau também, que desejo preencher esse pedaço da sua vida. Embora a verdade indulgente de
que ele é um monstro e merece sofrer os seus pecados, não me interessa. Eu quero que ele seja feliz,
e eu farei isso.
Deixar aquela mulher linda na cama, foi bem difícil, mas eu precisava fazer. Há muitas
coisas para resolver e não posso deixar para depois. Inclusive o nosso casamento que tem certa
urgência, porque sei que, de alguma forma, o que Lorenzo fez tem a ver com Madeleine. Tudo tem a
ver com a Bratva. Só não sei o que ainda, mas vou descobrir.
Terminando de colocar o meu paletó, saio do quarto deixando a porta aberta como faço todas
as vezes para uma das meninas da casa limpar. Passando pela porta do quarto de Madeleine, dou uma
batida de leve e ela grita:
— Já vou!
Sorrio e eu nem sei o porquê. Eu apenas me sinto estranho e errado. Um pecador por estar
feliz. O diabo não deveria ser abençoado, ser feliz.
Eu nunca fui, em nenhum momento, inteiramente satisfeito, feliz, tranquilo. Aprecio a vida
sempre e principalmente as coisas que o dinheiro pode pagar, e que eu posso ter, porém nunca fui
feliz e nunca procurei aliás. Não estava no meu repertório, e agora me sinto assim. Tenho quase
certeza de que é por causa dessa mulher do outro lado da porta, que surge na minha frente com um
vestido vermelho escuro, minha cor favorita. Cazzo.
Ela sorri e coloca as mãos na cintura olhando para mim. Eu apenas digitalizo seu corpo dos
pés à cabeça. As sandálias claras, pernas nuas porque a saia do vestido pregado é curta e um decote
V muito lindo com as mangas três quartos preta. Os cabelos castanhos soltos e uma leve maquiagem.
Vestida assim, ela parece muito mais nova do que é, e tentadora.
Chego mais perto, coloco minhas mãos na sua cintura e puxando-a dou um beijo na sua boca
rápido e meu corpo volta a querê-la jogando sangue para a cabeça de baixo e não para a de cima.
Merda, esse não é o momento para pensar nisso e eu já era para estar satisfeito de ontem e hoje.
Caralho! Já transamos cinco vezes desde que reatamos e não sei por que ainda estou tão faminto por
ela. E o sorrisinho que ela dá para mim, me diz que também me quer de novo.
— Agora — murmuro afagando suas bochechas com os polegares, descansando meus outros
dedos no seu pescoço —, eu preciso resolver um monte de coisas, mas quando chegar em casa a
gente faz o que você quiser.
Ela morde o lábio inferior, prendendo o riso e concorda com a cabeça antes de dizer em voz
baixa:
— A gente tem que aproveitar porque a Marinne vai chegar mais cedo essa semana.
— Por que ela vai chegar mais cedo?
— Ah! Eu esqueci de te dizer — comenta, fecha a porta do seu quarto, pega minha mão e me
puxa para as escadas, para o andar de baixo.
Dou uma olhada em Enzo aos pés da escada e ele parece que está vendo um dragão com duas
cabeças na frente dele ao fazer uma careta curiosa. Então percebo que Madeleine está de mãos dadas
comigo, o que realmente é inusitado, mas eu não vou me afastar. Não quero! Essa é a verdade.
— Essa quinta-feira é Ação de Graças e eu sei que vocês não comemoram, mas eu acharia
legal. — Ela para no meio do caminho e se vira para mim com os olhos ansiosos. — Se você topar, é
claro. A casa é sua.
Pego seu rosto entre minhas mãos e balanço a cabeça negando.
— Não, a casa é nossa e você pode fazer o que quiser. E eu nunca comemorei Ação de
Graças porque...
— Eu sei. O seu pai não gostava e vocês não foram acostumados, só que agora a gente podia
comemorar. — Sorrio sem jeito. — Vai ser uma coisa nova que eu vou trazer para a casa. Por vocês.
— Tudo bem e não precisa ficar tentando me convencer. A casa é sua e você pode fazer o que
quiser.
— Amor... — Então ela para e engole em seco.
Viro o rosto e vejo Enzo, e acho que é por isso que Madeleine parou. Ela percebeu aonde
estamos. Respira fundo, endireita a postura e se afasta um pouco de mim, o que eu não gosto.
— Travis, eu sei e não custa nada perguntar. Embora eu me case com você e essa casa
também virá a ser minha, não posso chegar e simplesmente mudar tudo de repente.
— Eu sei e está tudo bem. Acredite em mim.
Ela abre um sorriso, assente concordando e sem dizer mais nenhuma palavra vem para o meu
lado. Entrelaça seu braço no meu e voltamos a caminhar até a sala de jantar para tomarmos nosso
café da manhã, que já está na mesa e Rosália me dá um olhar conhecido de muitos anos da minha
vida: afeto e cuidado.
Porra, por que que eu estou sendo tão mulherzinha?
Solto o ar com força e me junto a Madeleine tão abruptamente, que me odeio por ter feito
isso e ver o olhar no seu rosto de confusão. Quando ela se senta na cadeira ao meu lado, percebendo
que estamos sozinhos, pego sua mão em cima da mesa e dou um aperto. Ela parece que simplesmente
me entende no olhar e me dá um sorriso meneando a cabeça que sim. Eu sabia que ela seria perfeita.
Minha esposa.
— A gente pode se casar no dia de Ação de Graça. Não acha uma boa ideia?
Esta porra realmente saiu da minha boca?
— Travis... — Ela dá uma gargalhada. — Eu acho que não. Você é o Capo e precisa ter um
casamento grande e... — Baixa o rosto parando de falar.
— Você quer um casamento grande?
Dando de ombros, ela volta a olhar para mim.
— Eu nunca pensei em me casar, não de fato, e muito menos com alguém tão importante, mas
já que vai acontecer... Por que que eu não posso ter um casamento aonde vou ter um vestido bonito,
uma festa bonita e grande? Eu já não tenho muita gente para comemorar esse dia, meus pais estão
mortos e meus avós só virão por pose. Então, pensei que poderia ser pra você, sua família e a
Marinne. Eu sei que ela vai gostar. — Respira fundo e parece que ganha confiança quando muda o
tom da voz. — As pessoas têm que saber com quem você vai se casar e eu já disse; quero estar à
altura. Você não pode simplesmente ter um casamento tão simples e rápido. Acho que no Natal é um
ótimo plano. É basicamente daqui a um mês.
— Está bom. No Natal, a gente se casa. Eu estava brincando.
Ela ri e engole o comentário, pois Rosália volta colocando as frutas cortadas no prato dela.
— Obrigada.
— Não há de que, senhora — Rosália diz e volta para a cozinha.
— Quando você vai viajar?
Tomo um gole no meu café e coloco a xícara de volta na mesa e pego o jornal, que eu sempre
dou uma olhada apenas no que é muito interessante para os meus negócios: o mundo imobiliário,
economia e como a política anda. Eu tenho que ficar de olho neles. Quem cai, quem sobe, quem fala
merda e, de vez em quando, quando os meus “amiguinhos” aparecem nos jornais e revistas. Vitorio
Malvez sumiu do radar e eu quero saber o porquê.
— Agora com a festa, na quinta-feira de Ação de Graças, irei na tarde de sexta.
— Então você ia antes?
— Ia, mas não tem problema.
— Se quiser...
— Madeleine — eu a paro antes que ela comece a fazer um discurso. Realmente eu não quero
que seja esse tipo de mulher. — Eu posso muito bem adiar algumas coisas. Não tem problema
nenhum e eu não quero que você fique me obedecendo vinte e quatro horas por dia. Eu não quero que
seja assim.
Ela fica sem fala e baixa o rosto pegando um pedaço do morango.
— Foi mal.
— Olha para mim — peço e ela faz, então volto a pegar sua mão. — Eu não quero que você
me obedeça e que não tenha voz, ou que não me peça alguma coisa. Algumas vezes vou dizer não,
pois algumas situações não vou poder, mas essa é uma exceção e não tem problema nenhum. Você vai
ser a minha esposa e já se considere assim, por favor. Eu não quero que você me tema. Não quero
isso.
— Eu sei, desculpa. Eu ainda estou me acostumando com tudo isso — ri baixinho, nervosa.
— Se acostumando comigo ou se acostumando que também vai ser a senhora dessa casa?
Não sei por que, mas isso faz ela abrir um sorriso gigante. Ela se levanta, tira o jornal da
minha mão, colocando-o na mesa, e se senta no meu colo devagar, tendo cuidado para não amassar a
minha roupa.
— Eu prometo que vou parar de fazer isso e vou cuidar muito bem da casa — murmura
passando as mãos suavemente nos meus ombros. — Vou cuidar muito bem do meu maridinho e se
você quiser...
— O quê?
— Eu queria também ajudar você em outras coisas. Não quero ficar dentro de casa sem fazer
nada e só sair para fazer compras.
— Eu tenho ideias para você, mas me diga o que você gostaria de fazer?
— Talvez eu possa ajudar no cassino. Se você não sabe, agora vai ficar sabendo. — Abre um
sorriso aberto, que a deixa com cara de menininha. — Eu fiz faculdade de Contabilidade e gosto de
números, de fazer contas. E... Se você não tiver um contador... eu posso ser a sua. — Ergue as
sobrancelhas mostrando insegurança, dando de ombros. — É tão fácil fazer isso. É quase uma
bobagem. E, quando você precisar viajar, eu... Fico de olho nas finanças e no que precisar. A casa,
Marinne e no Dario.
Solto uma risada e aperto sua bunda fazendo-a pular no meu colo.
— Ai!
Beijo sua boca para desculpar-me e digo:
— Eu não sei se é bom você estar perto de mim no trabalho, mas a gente pode pensar nisso.
Obrigado pela oferta.
— Vai pensar com carinho?
— Vou sim. — Beijo-a de novo. — Eu prometo e queria falar com você sobre algumas coisas
que a esposa do Capo pode fazer para me ajudar.
— Diga-me! — Madeleine pede toda entusiasmada.
— A Lawless contribui com algumas ONGs e lares carentes, e por enquanto, como até o
momento eu não tinha me casado, as duas que ficam em Las Vegas e Reno, quem cuida é Mia Calvin,
já que em Carson City meus avós residem e cuidam de lá, claro que com a ajuda de Lucian. O
Consigliere do meu avô, seus braços e pernas quando é preciso. Enfim, a esposa de Paolo cuida de
visitar e ir às festas e...
— Paolo é casado? — pergunta arregalando os olhos.
Rio e assinto dizendo:
— Sim e a esposa dele, Mia Calvin, ajuda nessa parte, mas agora que eu tenho você — deixo
a frase morrer.
Madeleine sorri abertamente.
— Eu vou adorar te representar, amor. — Dá de ombros. — Então está combinado e depois
falamos sobre outras coisas.
Me dá um beijo e sai do meu colo voltando a se sentar na cadeira. Ainda bem. Já basta de
fazer cenas na frente dos empregados.
— Está rindo por quê?
— Nada.
Ela balança a cabeça, ignorando-me e come seu café da manhã.
Não é uma má ideia Madeleine ajudar em alguma coisa em um dos cassinos ou nos hotéis. Eu
vou ficar um pouco preocupado, mas acho que Luca pode resolver esse problema para mim e me
tranquilizar. Talvez terei uma grande discussão com Paolo sobre isso e estou preparado. Ele tem que
aceitar minhas ordens, não ao contrário. Fora que sinto que Madeleine e ele, em algum momento, vão
se dar muito bem. Ainda não sei quando, mas vai acontecer.
Olhando de canto de olho, vejo Enzo no batente da porta. Ele espera nós nos concentrarmos
em comer e finalmente se aproxima. Pede licença dando um bom-dia e se senta em frente à cadeira
em frente a Madeleine, e bem perto de mim também. Dou uma boa olhada nele tentando ver se
precisa falar comigo, mas pelo visto não.
Desde que descobrirmos que Orazio não tinha muito conhecimento sobre Lorenzo e seus
interesses, Enzo parece bem irritado. E ele vai ficar em Las Vegas enquanto eu vou para o Colorado.
Quero que ele fique de olho em Orazio. Ele pode ser mais novo, onde há um conflito muito maior
entre meu General e meu Capitão, mas é quase maníaco por controle e verdades “absolutas”. Enzo
não tolera histórias contadas pela metade e meias-verdades. Por isso é meu Capitão. Ele sabe como
extrair, na dosagem certa, informações dos soldados mais próximos de mim, por isso ficou muito
puto com Orazio por não saber quem era Lorenzo, um soldado sob sua supervisão. De fato, é
revoltante, mas tenho planos para aquele linguarudo.
Fora que Enzo ser o mais novo Capitão que já existiu na Lawless, me traz muitos olhares
desgostosos pela Famiglia. Ele foi o primeiro homem que nomeei assim que assumi o posto de
Capo, e a primeira vez que Paolo teve certeza de que eu faria uma boa liderança.
Enzo foi filho do melhor Capitão da Famiglia e vem de uma família com gerações honrosas.
Lealdade e dever são duas coisas que descrevem os Colombo. Ele é um bom homem e todos sabem
que algumas cidades terão novos Underboss e ele é um dos nomes que penso para assumir uma
delas. O que faz Orazio não gostar dele e sempre ter a ousadia de me repreender sobre o que mando
Enzo cuidar.
Na reunião que tive com Orazio deixei claro que penso nele também para ser meu
Underboss. Merda. Essa decisão é quase que com urgência depois de morrer o subchefe da
Califórnia. Porém, ele sabe o que penso dele. Um velho desprezível e linguarudo.
Puta que pariu, imaginar ele como meu Underboss me tira do sério porque ele sabe que
comando meus homens com pulsos de aço e irei colocar apenas homens que confio para governar
minhas cidades e meus negócios. A maioria já são velhos e nojentos que seguiam ordens do meu pai,
que era outro velho asqueroso, mas eu vou esperar dar tempo ao tempo. Os que estão subestimando
meu poder vão cair como jogos de dominó em uma pilha triangular.
De qualquer forma não posso ficar matando todo mundo que vejo na minha frente. Não quero
parecer um descontrolado ou um Capo sanguinário. Quase um psicopata como meu avô é na Itália no
comando da Camorra. O pai da minha mãe é um Boss doentio e maníaco. Todos falam que puxei ele
no temperamento e desconfiança. Meu pai era mais tático e visava dinheiro, não poder que no fim se
resumia a isso.
Contudo, confesso que tenho vontade de exterminar uns e outros. Uma vontade que não passa
e, apesar do meu pai não ter um irmão vivo, a minha mãe teve sete irmãs e três irmãos. Meu avô se
casou três vezes e teve filhos com todas. E como manda a tradição, suas filhas e seus filhos se
casaram, e cinco deles vieram para a América quando foi feita a aliança. Alguns até se casaram com
mulheres nascidas na Lawless e, para não ficarem por baixa, os homens tiveram cargos importantes.
Portanto, tenho hoje quatro tios como meus subchefes, dois casados com minhas tias; uma
ficou viúva e não se casou, mas tenho três primos. E só um deles eu confio. Não o suficiente para
ficar muito próximo, apenas o necessário. Meu tio Nero não me inspira boa coisa e ficarei feliz
quando morrer.
Terminando de tomar meu café, dou um olhar para Enzo e ele entende, pedindo licença e
levantando-se da mesa antes de mim.
— Foi um prazer, Enzo — Madeleine fala polida e sorri cordial para ele.
Meu Capitão faz um meneio com a cabeça e sai da sala de jantar, deixando-nos sozinhos.
— Eu preciso ir agora — aviso e me levanto.
Fico surpreso vendo-a fazer o mesmo e chegar perto de mim. Ela ajeita meu paletó e a
gravata. Toca meu rosto como sempre faz e eu me inclino para dar um beijo na sua boca. Estou
ficando estragado com esta afeição. Já me sinto acostumado com isso. Com o fato de ter alguém me
esperando em casa.
— Tenha cuidado, está bem? E coloca medo em todo mundo.
Rio, balançando a cabeça e dou um beijo nela de novo.
— E você também coloca medo em tudo.
— É claro que sim! — ela zomba e, quando pensa em me acompanhar, me viro e coloco a
mão nos seus ombros.
— Não, por favor, fique e tome o seu café da manhã. E se você quiser fazer ou precisar de
alguma coisa, Luigi chega daqui a pouco. Não saia sem ele.
— Está bem e eu estava pensando em ir à loja de noivas.
Sinto uma estranha explosão dentro do meu peito quando ela fala isso, que extermino
rapidamente.
— Okay. Me diz quando você for e se precisar de alguma coisa.
— Eu só vou precisar do seu dinheiro. — Dá de ombros.
Cerro os olhos e a corrijo, mais uma vez:
— Nosso dinheiro, repete para mim.
Madeleine morde os lábios rindo e, em seguida, repete o que pedi:
— Nosso dinheiro.
— Mas você acredita nisso?
— Mmm...
— Não! — Paro seus pensamentos. — É o nosso dinheiro, não meu dinheiro. Para de pensar
assim.
— Está brigando comigo?
Vejo em seus olhos que foi um comentário engraçadinho. Rebelde como sempre.
— Não, não estou brigando com você. Eu quero que você entenda, angele.
— Tudo bem — assente resignada. — É o nosso dinheiro. A nossa casa. A nossa Las Vegas?
Fico dois segundos pensativo e digo baixo, fitando fixamente seus lindos olhos azuis. Eu sei
que ela falou brincando, mas gostei disso.
— Sim — afirmo. — A nossa Las Vegas. — Beijo sua boca com fome, mas me afasto antes
de cometer a loucura de fodê-la na mesa do jantar. — Preciso ir agora e você pode começar a
preparar o nosso casamento.
Ela assente e morde o lábio inferior. E um alarme explode na minha cabeça.
Cazzo. A aliança.

O trajeto até o hotel foi longo demais para os meus pensamentos, mesmo com Enzo
passando algumas notas sobre os novos iniciados que começarão na próxima semana. Eu só espero
que eles não me enchem tanto o saco quanto meu irmão mais novo, que já tem dois anos como um
homem feito e não fez nada de útil. Dario tira a pouca paciência que me resta com suas aventuras e
rebeldia. Todo dia penso em uma forma de ele mudar sua visão do seu dever para com a Famiglia.
Não quero precisar resolver esse assunto com medidas trágicas.
Assim que piso no lobby do Bellagio, avisto Luca ao lado de Paolo. Aproximo-me deles, dou
um aceno de cabeça e seguimos o caminho para o escritório. Escuto Paolo falar sobre os assuntos do
cassino, mas confesso estar distraído.
— Você está me ouvindo?
— Estou, mas preciso fazer uma coisa importante agora.
— Mais importante do que resolver o problema da fileira de máquina com defeito do cassino
e a procura de um novo Dealer?
Fecho ainda mais minha cara e continuo meu caminho para o destino que eu acho mais
importante.
— Eu sei que é indispensável resolver todas essas coisas, mas de qualquer forma não vou
sair do hotel. Eu apenas irei desviar meu caminho por breves minutos. De qualquer forma, Paolo,
você pode ir na frente e ajeitando tudo. Você está aqui para justamente me aconselhar e muitas vezes
mastigar os problemas para mim ou já resolvê-los — respondo trocando a rota do caminho.
Luca, que surge ao meu lado, me dá um olhar estranho antes de perguntar:
— Quando é que nós vamos para Denver? Sei que precisamos resolver o problema com
urgência, então se você quiser já preparo o voo para hoje à noite.
— Nós vamos na sexta-feira cedo. Tenho compromisso na quinta-feira. Você vai chegar antes,
na quinta de noite.
Ele franze a testa e nos olhos vejo o entendimento do porquê preciso que chegue antes. Como
falei ontem, preciso dos serviços dele em Denver. Paolo e Enzo ficarão para cuidar de tudo.
— Você tem algo mais importante do que acatar as ordens do seu Capo?
— É claro que não, senhor. Só fiquei surpreso. Pensei que você só iria conversar... —
corrige rapidamente. — Falar sugestivamente com o Costa.
Paro e me viro para ele.
— Sim, nós vamos conversar com ele, mas não só isso. Eu não tenho muitas dúvidas sobre
o que eu quero fazer com ele — falo em italiano para ninguém entender a não ser meus homens e
volto a caminhar, agora mais devagar.
— Eu sei que você odeia quase todos os Underboss, porque todos vieram de nomeações
antigas e do seu pai. Essas hierarquias precisam mudar, você sabe o que penso.
— Concordo — Paolo fala e eu olho para ele. — Porém, você tem que parar com essa
vingança desenfreada. Essa vontade de querer aniquilar todos eles. Nem todos são filhos da puta.
— Eu sei que nem todos são miseráveis como meu pai foi, mas Costa é um desses e eu não
quero mais que ele trabalhe para mim. Você já pode procurar nomes para substitui-lo.
— Você não vai interrogá-lo? Já irá rebaixá-lo? O que vai fazer com a família dele?
Respiro fundo e engulo a saliva de tanto cerrar os dentes.
— Eu não sei. Quando chegar lá vou ver a cara dele e vou fazer algumas perguntas,
dependendo de como ele reagir, permanece vivo ou... Não. A família dele, você sabe muito bem
como trabalho. Não se preocupe com eles. — Deixo claro minha intenção.
Paolo não vai me obrigar a fazer o que eu não quero.
— Entendido. Você está sendo bem claro. Eu apenas perguntei porque me preocupo quando
as pessoas começam a falar e você nunca gosta de certos comentários.
— Obrigado, Paolo. — Sou sincero sobre isso. Não é do seu feitio ser atencioso e muito
menos falar na frente de outros.
— É o meu dever, Travis. — Ele meneia a cabeça e me encara fixamente.
Demoro para compreendê-lo até que ele olha para a loja que estamos na frente, onde eu
parei: na Harry Winston.
— Por que a gente está aqui?
Ergo a sobrancelha e respondo em inglês, não é um segredo mais. Para ninguém dentro ou
fora do meu mundo.
— Porque preciso comprar uma aliança para a minha noiva. Madeleine merece um belo anel.
Não tem como oficializar um pedido de casamento se a mulher não tem uma aliança.
— Você vai continuar com isso?
— E você vai continuar teimando comigo sobre a esposa que eu escolhi? Pare, pelo amor de
Deus, homem! Não me irrite. Esse assunto já morreu. Eu vou me casar com Madeleine Beluzzo e
você vai calar sua boca, porque não tem que aceitar ou deixar de aceitar minha decisão sobre isso.
Ela é uma mulher da Famiglia, honrada e quem eu quero.
— Pensei que você só iria ficar com ela, pelo namorico que vocês tiveram.
— Não, não é só por causa disso. — Meu tom é sério e mortal. — Ela vai ser boa para mim,
para a Lawless e não quero mais falar sobre isso, apenas aceite. Respeite minha decisão, porra! E
como tal, esse recado é para todo mundo, não só para a família de Orazio, que falou demais, ou
qualquer soldado que andou com a língua solta. O que não deve jamais se repetir. Falar mal dela terá
a mesma penalidade das consequências da Omertà.
Ele arregala os olhos. Sabe muito bem o que significa e o quão longe estou.
— Se precisar falar algo sobre Madeleine, fale comigo.
— Eu não a acho uma escolha ruim, mas não é uma escolha tática.
— Tudo bem. Já entendi seu ponto. O importante é que ela é minha escolha e não vou mudar
— digo firme e entro na loja de joias.
Escuto Luca falar baixo com Paolo em italiano mais uma vez:
— Eu acho que uma hora você vai se arrepender de estar renegando tanto Madeleine.
— Espero que você esteja certo.
— A sua preocupação é plausível, Paolo — murmura Luca e me segue até o balcão.

Não me demoro muito na loja, e depois de escolher e pagar a aliança, finalmente saio e sigo
para o meu escritório e dou de cara com Colen sentado no sofá de três lugares, os pés apoiados na
mesa de centro.
Peço para Luca sair dando as ordens:
— Espere aqui fora e, Paolo — meu Consigliere vira-se para mim. —, coloque Renan na
sala de interrogatório e prepare logo tudo.
Sala de interrogatório é o local onde “conversamos”, ou punimos, os funcionários que nos
roubaram ou fizeram merda no cassino ou no hotel. Nem sempre sumo com eles, mas dou um bom
castigo para se lembrarem. No fim, eles somem, vão para outro estado. Muitas vezes sob meu
domínio, somente longe das minhas mãos. Renan não deveria ter manipulado as cartas e sacaneado os
jogadores na mesa de pôquer. Sou um criminoso, porém respeito muito meus clientes.
A sorte e o azar de quem entra nos meus cassinos, é determinada por seus passos. Se
escolheram um bom dia para apostar ou uma das máquinas “vencedoras”. Dizer que tudo em um
cassino é limpo, é uma piada de mau gosto. Tudo é manipulado e os vencedores saem quando os
donos determinam. Eu cuido dos jogos desde que meu pai permitiu – já que seu foco era chantagem e
transações de lavagem de dinheiro – e gosto desta parte do meu trabalho. Sujo as mãos de forma
clássica e sem sujar meu paletó.
Paolo acena que sim e se afasta junto com Luca. Entro no meu escritório de vez e caminho até
a minha mesa.
— Que bom que você apareceu — falo para Colen.
— Que exagero, só tem dois dias que você não me vê e fico feliz que está recuperado.
Agradeço com um aceno.
— Sim, mas você deveria estar por perto. Você sabe que a situação está complicada. Não
importa que tenha apenas dois dias que sumiu, me deixou nervoso.
— Tudo bem, Travis. Mas é melhor se acostumar a não me ver. Estou indo para Boston.
— Por que você não espera o dia de Ação de Graças?
Ele franze a testa, sem entender.
— A gente não comemora Ação de Graças.
— Esse ano vamos.
— Por causa da sua mulher?! — Ri no final.
— Não entendi o seu deboche.
— Ah! Deixa de onda, Travis! — fala confortável e tranquilo. — Estou brincando. Porque
você vai se casar e é bem estranho. — Mexe a sobrancelha.
Concordo com ele e olho para mim mesmo colocando na mesa a sacola do anel.
— Comprou um presente para ela?
— Comprei a aliança.
— Caralho! — Colen se levanta. — Agora, é sério mesmo. — Solta a respiração, chega
perto da minha mesa, me encara e fala: — Enfim, espero que tudo dê certo para você e para ela. E eu
volto para o casamento.
— Você vai estar aqui.
— O quê?
— Vai ser antes do Natal, no dia vinte e três.
— Já escolheram? — indaga sério.
— Sim, já escolhemos. O quanto mais cedo, melhor.
— Ela está grávida?
— Não! — Minha pulsação até acelera. Caralho! E tento me controlar para não demonstrar
meu nervosismo na frente do meu irmão. Engulo em seco, e continuo: — Não é por isso, mas ela já
está morando na minha casa.
— E vocês já transaram.
— Sim, e isso tudo já é um escândalo de qualquer forma. Nós estamos tentando diminuir os
danos e... Sobre uma gravidez. Não sou um completo leigo. Pode sim acontecer a qualquer momento
e eu não quero que as pessoas falem que o bebê é um bastardo, e que vamos nos casar por causa
disso, porque não é.
— Concordo com você, irmão. Agora — enfia as mãos nos bolsos —, se você me permite, eu
tenho que ir e, por favor, não faça disso um problema. Você sabia que eu ia voltar para Boston para
terminar a faculdade. Só falta mais um período, me formo em junho e acaba.
— Que ótimo que falta tão pouco.
— Sim e vai passar rápido.
Concordo com um aceno e dou a volta na mesa para apertamos as mãos.
— Fica de olho no Dario. Coloca ele dentro da sua casa, não confio nele sozinho.
— Eu sei. Ele precisa tomar jeito senão vai acabar tomando por mal. A gente só sente a
realidade do nosso mundo durante os anos. Eu não queria fazê-lo sofrer as consequências das suas
escolhas, mas talvez tem que ser necessário. Na próxima será a última.
Colen respira fundo nitidamente nervoso.
— Tudo bem, vou mandá-lo ir para a sua casa ficar com vocês.
— Okay. Agora eu tenho que ir, meu voo é daqui a meia hora.
— Você é rápido. Nunca me dá brecha.
Ele sorri e bate uma continência para mim. Balanço a cabeça indo e o vejo sair da minha
sala, e logo aparece Paolo.
— Preciso que você verifique o pedido com o novo Dealer. E já reservei duas passagens de
avião para sexta-feira.
— Okay, Paolo. — Sento-me na minha cadeira e mexo no mouse para ligar a tela do
computador. — Preciso que você ligue para Boston. — Direciono meu olhar para ele. — Pede para
Solo ficar de olho em Colen, mas que ele seja tão imperceptível quanto possível. Não quero que
Colen fique revoltado de novo porque eu mandei alguém segui-lo, embora ele saiba que vou fazer, é
bom evitar esses conflitos com meu irmão.
— Sim, Travis — Paolo diz e sai imediatamente.
Sozinho, relaxo meu corpo fazendo a cadeira reclinar e pego a sacola. Tiro a caixa do anel de
dentro e abro. Fixo o anel, o diamante. Está tudo certo, e não sei o porquê, mas estou ansioso para
entregar para ela. Para vê-la usar.
É perigoso os sentimentos que ela faz eu ter e pensar. Perigoso para todo mundo. Para mim,
para ela e para qualquer um que tente se aproximar dela. Ela é minha.
Sei que o Travis me falou que eu sou a dona da casa também. Basicamente, como sua esposa,
sou como a primeira dama e tenho todos os direitos de tudo que ele possui, mas ainda é muito
estranho pensar que todos me devem obediência e têm que acatar minhas ordens. É domínio demais
para quem não tinha nenhum.
Mesmo eu já sabendo que teria tanto poder nas mãos sendo a Sra. Lozartan, não deixa de me
assustar. Agora posso fazer o que eu quiser nessa casa e a primeira coisa que penso é que preciso
colocar um pouco de cor no quarto dele, é tudo tão cinza e sem graça, sem vida. Posso colocar uns
quadros nas paredes da casa, porta-retratos, mudar as cortinas. É tudo muito escuro na mansão,
menos as paredes brancas com toques clássicos. Eu adoro a casa do jeito que é, só acho que precisa
de cor apenas.
— A senhora deseja mais alguma coisa? — Viro-me para Rosália, que aparece na sala de
estar.
Sorrio e coloco a xícara vazia na mesinha. Eu estava tomando meu chá e lendo meu livro
tranquilamente, até meus pensamentos irem na direção da conversa com Travis. Sinceramente, não
prestei atenção na história.
A noite passada foi incrível. Ele me levando para o seu quarto e dizendo que era nosso. E
hoje no café, que a casa também é minha, não só dele. Estou muito feliz. Tê-lo desabrochando para
mim cada vez mais, sendo por vezes tão suave comigo. Tudo é tão grandioso e eu vou me casar mês
que vem.
— A senhora está bem?
Pisco rápido e sorrio.
— Sim, Rosália. Estou bem e não quero nada não. — Quando ela quase sai da sala, levanto-
me e a chamo.
— Sim, senhora?
— Na verdade, eu gostaria que você me ajudasse a mexer no quarto de Travis. — Dou de
ombros. — Sabe, colocar um pouco de cor. É tão triste e ele disse... Que agora é o nosso quarto.
Os olhos dela ficam vidrados, fixos em mim. Escolho ignorar, focando no assunto que é
importante.
— Se você souber de algum telefone de Designer de Interior... Ou se tiver alguma coisa na
casa que eu mesma possa usar, eu troco. Só pedirei ajuda se realmente precisar. — Com certeza, eu
vou explorar meu segurança.
Luigi chegou cinco minutos depois que Travis partiu e ficou ao meu lado o tempo todo,
embora eu esteja dentro de casa, mas ele me deu um pouco de espaço uns minutos atrás, porque viu
que eu estava lendo quieta na sala.
Sinto-me estranhamente em paz hoje e fazer algo não corriqueiro, normal e que sempre gostei
de fazer em Los Angeles, deu-me uma sensação de liberdade. Como se de fato estivesse em minha
casa, não de visita. Hoje tenho a sensação de pertencer.
— Eu posso ajudar a senhora sem problema e é bom um pouco de cor naquele quarto e na
casa também. A senhora pode fazer o que quiser agora.
— Eu sei, mas por hoje só quero mexer no quarto. Me sinto um pouco deprimida em dormir
lá daquele jeito. Estava pensando em pegar algumas coisas do meu quarto e colocar lá e comprar
flores. Rosas vermelhas.
— O senhor Travis adora a cor vinho.
Sorrio lembrando-me de todas as vezes que vejo seus olhos em mim quando visto vermelho,
ou vinho. Ele fica vidrado.
— Eu sei — digo com ar de conhecimento. — Enfim, hoje vou trocar aquelas cortinas cinzas
por brancas, as colchas pretas por vermelho escuro, e o tapete preto... Vou deixar. Não quero mudar
muito. Acho bonito o quarto dele, mas muito escuro. Ah! — Lembro-me com entusiasmo. — Com
certeza vou abrir as portas da varanda. Luz é algo essencial, e não apenas para o quarto. Já pode
abrir as janelas e portas dessa casa — falo virando-me para as janelas enormes da sala, que raras
vezes vi abertas no tempo que estive aqui. — E com certeza vamos enfeitar para o natal.
— Está bem, senhora. — Escuto-a atrás de mim porque estou abrindo a janela. — Podemos
começar agora, se estiver tudo bem.
Assinto e sorrio vendo o céu bem azul e com nuvens branquinhas e fofas. Respiro fundo e
giro meu corpo para Rosália.
— Podemos sim, só me espere rapidinho. Vou tomar um banho e dar um telefonema.
A governanta concorda com a cabeça e vai para a cozinha. Pego meu celular em cima da
mesinha da sala, disco o número que desejo e subo as escadas correndo. Assim que entro no meu
quarto, Bárbara atende com sua saudosa alegria.
— Olá, amiga. Tudo bem?
— Tudo sim. Eu queria saber se você pode ir à loja de noivas comigo.
— É claro que sim! — responde gritando, toda animada. — Eu nem acredito que você vai se
casar e com o nosso Capo.
— Eu também não acredito nisso — digo sorrindo e sentando-me na beira da cama.
— Vai que horas?
— Daqui a pouco.
— Quando vai ser o dia feliz?
Reviro os olhos pelo sarcasmo.
— O casamento vai ser dia vinte e três de dezembro.
— Mês que vem?
— Sim, um dia antes da véspera do Natal.
— Por que tanta pressa? Que loucura!
— Porque nós queremos e já é um pouco escandaloso morar na casa dele. Sei que nem todo
mundo sabe. Para quase todos, eu voltei agora, mas o quanto antes a gente se casar, melhor. Não tem
motivo para esperar.
— É verdade, vocês têm razão. E eu presumo que sua família venha da Itália para ver você
se casar, hum. Seus avós e tios virão, não é?
— Sim, eles vão vir. Travis já falou com o meu avô, o que me deixou nervosa. Mas deu tudo
certo e acredito que ele ligue de novo para falar sobre a data.
— Espero que dê tudo certo.
— Acho que vovô vai gostar. Ele está com pressa sobre o dia.
— Você merece ser feliz e, por mais que talvez você não tenha o amor retribuído, que você
tenha respeito. Você é uma das melhores pessoas que eu já conheci na vida. É guerreira,
determinada e teimosa quando quer ou acredita em algo.
— Ah, eu sei, amiga, e por que que você está falando meio melancólica?
— Então... Talvez o seu futuro marido não te falou que ele está pensando em tornar meu
pai um Underboss, só que em Los Angeles.
— Pensei que isso fosse uma coisa boa.
— Isso quer dizer que vou ter que me mudar! — diz em uma respiração só, que libera
agitada. — Se isso acontecer vou ter que me mudar para a Califórnia.
— Não é tão longe.
— Como você pode falar isso quando foi mandada pra lá?
— A situação foi diferente. Eu fui banida para Los Angeles para ficar longe dos assuntos do
meu pai, você está indo com a sua família, Bárbara. É uma honra para o seu pai ser um Underboss de
Travis.
— Eu sei... e eu não deveria ficar reclamando como uma boba, mas vou ficar longe de você
e... Do Enzo.
Sabia que ela iria falar dele!
— Eu sei que não tenho nada com ele e a gente não pode... Namorar ou algo parecido. Só
que eu gosto dele e... Sabe... Queria ter uma chance de...
— Já entendi e, tipo, o Enzo é o melhor Capitão do Travis e se o seu pai falar com ele sobre
querer casar você com o Enzo... — Fito a porta parando de falar e refletindo sobre a ideia. Não é
loucura. Isso acontece demais em nosso mundo.
— Não sei se o papai pensa sobre isso.
— Eu posso te ajudar.
— Sério?
— É claro — afirmo feliz porque sinto a alegria na voz dela. — Eu posso fazer o Travis
pensar sobre o assunto e falar com o seu pai. Como um futuro Underboss e já General da Lawless,
Orazio casar a filha dele com o Capitão, que é muito importante para o Capo, é uma ótima opção.
— Hum... é verdade. Obrigada, amiga, pela ajuda.
— Não há de quê. É uma troca afinal de contas — mudo minha voz para brincalhona — você
vai ter que me aturar na loja de noivas. — Rio. — E você sabe que eu não sou uma pessoa fácil para
escolher nada na vida.
— Ai, meu Deus! Não me fale sobre isso. Já prevejo a tortura.
Nós duas temos um ataque de gargalhadas e começamos a falar sobre coisas aleatórias. Meu
coração batendo forte e as borboletas na minha barriga se acalmando sobre o casamento e meu futuro
marido.
Talvez tudo esteja muito calmo e feliz demais. Em nosso mundo, momentos de calma são
presságios do caos. Como um dia ensolarado é o prelúdio da tempestade. Será que, em algum
momento, vou deixar de ficar apreensiva com a minha nova vida?!

Há duas horas recebi uma mensagem de Travis pedindo para eu me arrumar, ficar bem
bonita e descer porque tinha uma surpresa para mim. Escolhi um vestido branco de gala, que comprei
para ir àquele baile do Bellagio, que acabei não usando. Ele é comprido de seda e tem uma fenda na
frente, que deixa basicamente minha perna toda de fora. Minhas sandálias são de salto vermelho
como meu batom e deixei meus cabelos soltos. Estou sexy, ousada e digna da mulher de um Capo.
Inatingível. Proibida. Perigosa!
Respiro fundo para controlar meus passos ao descer as escadas, mas quase tropeço em meu
coração porque ele está pulando para “fora”. Ouço os acordes vindos do piano e prendo a
respiração.
Passo direto pelo lobby da casa e... Uau!
Olho para a sala de jantar e meus olhos ficam cheios de lágrimas. Coloco minha mão na
boca, sentindo meus lábios tremerem de leve pela forte emoção. Na sala de jantar têm dois pratos
tampados por bandejas de prata, velas e um vaso de flores com rosas vermelhas, fora um buquê
gigante na cadeira, que deve ser para mim. É tudo lindo, porém sigo o caminho para a sala do piano
que vem o suave som que persigo emocionada.
— Ah... Dio mio — murmuro e limpo meus olhos com cuidado para não borrar a maquiagem.
Travis está tocando piano, a melodia que eu o ouvi tocar a primeira vez que o vi aqui. Está
todo de preto, impecável e polido como sempre sai para trabalhar e, quando ergue a cabeça e olha
para mim, meu coração volta a disparar. Não posso me controlar quando começo a chorar na sua
frente.
— Made... — diz com sua voz profunda e chega até a mim em um passe de mágica,
embalando-me em seus braços. — Por que o choro?
Levanto a cabeça, sem desgrudar meu corpo um milímetro do seu, e respondo:
— Porque... — engulo em seco — você faz essas coisas... e eu.... — Seguro seu rosto,
puxando para mim e beijo sua boca antes dos nossos olhos se encontrarem de novo. — Como eu
posso não te amar?
Ele puxa o ar pelo nariz, quase como se fosse doloroso, cerra a mandíbula e seu aperto em
minha cintura fica mais forte.
— Tenho uma coisa pra você — diz com sua voz de barítono.
Assinto mordendo meu lábio inferior, prendendo meu sorriso bobo e sou obrigada a me
afastar, não muito. Travis me dá um beijo na testa, que literalmente quase me leva ao chão porque
perco o controle das minhas pernas, e pega de dentro do paletó uma daquelas caixinhas de anéis
pretas de couro. Olha nos meus olhos e abre a caixinha da Harry Winston, mostrando um anel lindo.
Um diamante perolado, muito brilhante, enorme e cortado em quadrado em um anel de ouro branco.
Minha respiração vibra olhando para a imagem na minha frente. Um homem tão poderoso,
elegante, temido e... Atencioso, meu noivo. Meu Travis. Sorrio enquanto lágrimas escorrem por
minhas bochechas e o espero falar.
— Não vou perguntar de novo porque... Vai que você desistiu — comenta brincando comigo,
mas vejo nos seus olhos que ele me quer.
Eu também o quero. O quero desesperadamente.
Rio, mesmo chorando, e deixo que ele pegue minha mão, dê um beijo nas costas e finalmente,
quando tira o anel da caixinha, encaixe no meu dedo anelar da mão direita. Agora sou oficialmente a
noiva dele.
— Sabe, eu não sou chorona. — Limpo embaixo dos meus olhos. — Não sou assim. Mas
você é tão atencioso e bom para mim. — Respiro fundo e seguro suas mãos. — A cada minuto que
passa e estou com você, que sei que sou sua, fico mais confiante, sabe. Não sei o que é, só sei que
estou mudando e...
— E? — Entrelaça seus dedos nos meus.
— Eu te amo — Balanço a cabeça e seguro a respiração. — É como se eu sempre tivesse...
Que estar aqui.
Travis meneia a cabeça, concordando.
— Também penso isso — diz encarando-me sem piscar, seus olhos perfuram-me, a voz rouca
que amo. — Desde a primeira vez que eu a tive, penso isso. Por isso quis que você ficasse, que fosse
minha, que entendesse meus motivos e o que eu falava. — Ele para e segura meu rosto, erguendo-o e
quase tocando meus lábios com os seus. — Foi por isso que eu a pedi em casamento. Mesmo você
me irritando às vezes, não consegui deixar você partir.
— Que bom, porque eu nunca fui tão feliz. — Meus olhos enchem d’água, mais uma vez. — E
eu quero que você também seja. Que seja feliz comigo.
— Quando eu estiver me sentindo assim, prometo te dizer — diz firme. — E não é que eu
não esteja agora, mas não sei diferenciar os meus dias. Todos são iguais. Cheios de trabalho,
preocupação e muitas vezes sombrios demais para você ficar perto de mim.
— Não me importo mais. Eu vou ficar feliz de cuidar de você. De tentar... Iluminar sua
escuridão.
Travis assente e beija meus lábios bem de leve.
— Eu sei e você já mudou meus dias. É tudo igual ainda, a única diferença é que agora fico
aliviado de voltar para casa. Voltar para você.
As lágrimas escorrem descontroladamente.
— Sempre volte para mim.
— Sempre vou.
E finalmente ele me beija como gosto, tirando meu fôlego e agarrados um no outro. Eu amo
seus beijos. São tão intensos, molhados, barulhentos e quentes. Fico doidinha quando ele devora
minha boca dessa maneira e adoraria ser levada para o nosso quarto. Ou pode ser no sofá do
escritório mesmo, que é mais perto.
— Dança comigo? — pergunta parando de me beijar e apertando em um lugar da minha
cintura que sinto cócegas.
Rio alto e entrelaço meus dedos na sua nuca.
— Claro que sim, mas não tem música.
— Não seja por isso.
Afasta-se, vai até o rádio no canto da sala do piano e liga. Sorrio como uma boba apaixonada
quando ele volta para mim e, em um passo de valsa, me conduz em uma melodia doce.
Não consigo tirar meus olhos dos seus e... Ele é ele, não desvia. As borboletas no meu
estômago estão eufóricas e fazendo festa alegremente. O jeito que me sinto perto dele até me
preocupa. É possessivo e nada a ver com a Madeleine que voltou para Las Vegas meses atrás. Ela
mudou.
Eu odeio a mim mesma por ter demorado tanto tempo para enxergar nele um homem, não um
inimigo. Um monstro. Alguém capaz de ser atencioso e gentil. Alguém possível de ser amado. De eu
amar.
Porque, sendo honesta, hoje eu sou mais consciente da vida que levamos, até sou cruel sobre
a quebra de lealdade e dos segredos do nosso mundo serem revelados.
O mundo onde nasci, cresci (não completamente) é composto de regras. Agora sou parte e
posso mudá-las através do meu comportamento e das ações futuras do jogo de tabuleiro da Famiglia.
Sou uma peça fundamental. A rainha, porque todo reino precisa de uma rainha.
Não há uma alma livre de julgamento ou penitência dentro da Famiglia. Não há inocentes
aqui dentro. Não existem santos. Somos todos condenados, com ou sem sangue nas mãos. Não falar,
não fazer nada contra todos esses crimes, te torna tão imundo quanto qualquer outro aqui dentro. Uma
vez salvei a Lawless e os Lozartan de um conflito, apenas por amor-próprio e não para o fim dos
pecados.
Analisando bem, eu nunca estive interessada em acabar ou perder a confortável segurança de
estar dentro de uma das Famiglie mais poderosas das organizações criminosas da Itália nos Estados
Unidos.
Antes meus pés estavam só na beira da lama, agora estou mergulhada no pecado sangrento do
submundo. E vou precisar ir mais vezes à igreja e rezar, porque eu sinto em minhas entranhas como
nasci para estar aqui, nos braços do meu Capo.
Enquanto dançamos pela sala de piano, enxergo nos olhos de Madeleine as engrenagens
funcionando em seu cérebro. Ela fica muito linda pensativa e que não esteja pensando em fugir de
mim, está tudo bem.
— O que você está pensando?
Ela puxa e solta o ar com força pelo nariz e volta a relaxar.
— Muitas coisas.
— Me conte uma delas — peço, deixando minha voz calma para não parecer uma ordem.
— Ah... — Ela passa a ponta da língua nos lábios e murmura: — Estava analisando minhas
ações.
— Sobre?
A música no aparelho de som muda e continuamos dançando, um pouco mais lentos.
— Daquela vez que eu dedurei meu pai. Acho que não estava preocupada com ninguém além
de mim.
— Você já falou isso.
— É, eu sei. — Engole em seco e desvia os olhos, ficando perdida nas lembranças. — Mas,
no fundo, acho que, quando a gente se acostuma a ter um tipo de segurança tão forte e eficaz como a
Famiglia nos traz, abrir mão... é complicado. Eu sei que é uma segurança, falo em todos os aspectos
do perigo e no financeiro, baseada no medo, chantagem e distorção, que colocamos nos outros. E ela
nos permite fazer muitas coisas. — Olha para mim quando conclui: — Algumas delas muito erradas,
porém somos livres dentro das nossas amarras, de certa forma.
— Você fala muitas coisas que as mulheres do nosso mundo não analisam assim. Talvez nem
pensem sobre. — Tiro o cabelo da frente do seu rosto, colocando atrás da orelha. — São assuntos
que não é permitido e você sabe disso tudo porque foi além das barreiras que imputamos para os que
não são Madman, é muito esperta e porque saiu das nossas restrições. Você pode saber demais. Viu o
mundo do lado de fora sem algemas, por isso analisa nosso mundo assim, angele. Não se cobre por
saber o que é o egoísmo. Por enxergar que o poder que temos é também uma segurança.
Ela franze a testa.
— Será que é por isso que não nos permitem sair e conviver com os de fora?
Demoro um tempo para acenar com a cabeça e respondo em voz baixa, porém firme:
— Nós somos forçados a não sair porque do lado de fora não há uma regra real para nos
parar. Somos monstros e as regras são as únicas coisas que nos impedem de nos tornarmos animais.
As regras nos dão alguma civilidade. É claro que isso se aplica mais aos homens feitos do que às
mulheres da Famiglia.
Baixo minha cabeça e beijo seus lábios de leve.
— Às vezes, eu gosto de você ter sido enviada para o mundo de fora.
Madeleine tomba a cabeça para o lado e sorri com ar de curiosidade.
— Você quer dizer isso por que fui para outro estado, morei sozinha e fiz faculdade?
— É. Você não foi criada totalmente dentro das normas da Famiglia e assim não lidou com
os limites. Por isso é teimosa e inquieta sobre sua função como mulher na Famiglia. Você sabe de
muita coisa, mas também não sabe, Madeleine.
Ela ri alto, balançando a cabeça.
— Acha que porque eu não estava aqui não sei como funciona?! Travis, eu dedurei meu pai
antes de sair, antes de completar a maioridade, antes de conhecer o mundo de fora. Não sei como ele
não me matou na época.
— Alguns homens carregam um pingo de decência — digo entredentes. — Seu pai deve ter
tido alguma.
— Não acho que foi isso. — Seus olhos ficam enevoados e ela os desvia dos meus, sabe que
vou enxergar neles o que quer que tente esconder em sua voz. — Ele chegou a me dar umas
bofetadas, mas mamãe o impediu de continuar.
Preciso me controlar seriamente com essa declaração. Aquele miserável! Sorte a dele que já
está morto!
Madeleine respira fundo, capturando minha atenção e continua:
— Por fim, ele apenas exclamou que eu iria para longe. Fiquei apavorada com isso. Pensei
que ele iria me mandar para a Sicília, para a casa dos meus avós.
Eu serei bem idiota se disser que preferia essa ideia do que mandá-la para outro estado sem
segurança ou proteção. Edgar a mandou embora como se estivesse a exilando. Foi um castigo.
Desgraçado barato! Meu pai nunca deveria tê-lo aceitado como associado e tampouco ter permitido
o casamento dele com uma mulher nossa.
Mesmo com a possibilidade de Madeleine não vir ao mundo e eu nunca a ter conhecido, não
me agradou nem um pouco. Não tinha que ter acontecido essa união, que só foi possível porque o
Consigliere do meu avô insistiu muito para fazer o acordo, e na época a Camorra gostou da ideia.
Eles tiveram que se envolver porque os Beluzzo pertencem originalmente ao território da Camorra,
não da Cosa Nostra.
Mesmo a Lawless sendo composta pelas duas Famiglie, alguns assuntos são tratados
separadamente quando é preciso. Por sinal, meu casamento com Madeleine nos levou a uma segunda
aliança. Sem fins lucrativos, porém nossa união teve aos olhos dos Boss da Cosa Nostra e da
Camorra, uma boa aceitação.
Olhando para a minha mulher, beijo sua boca e a puxo para mim.
— Não vamos pensar mais nisso. Vamos dançar, comer o nosso jantar... — Inclino-me e
encosto minha boca perto do seu ouvido: — Porque depois eu vou comer você em cima desse piano
lentamente. — Fito seus olhos azuis e mordo seu lábio inferior fazendo-a gemer.
— Mm.... Não podemos trocar a ordem?
Dou meu sorriso sombrio antes de assentir.
— Podemos sim.
Deixando sua alegria transbordar, ela me agarra subindo no meu colo. Graças a fenda no seu
vestido, ela consegue envolver meu corpo com as pernas e joga os braços nos meus ombros. Falando
no vestido...
— Você está linda demais hoje.
— Mm... — geme fazendo charme e me dá um beijo no nariz. — A ordem do meu Capo era
para ficar bem bonita para o meu homem.
Rio, concordando, fazendo um som com a garganta e a coloco em cima do piano.
— Seu Capo apreciou a escolha. — Deslizo minhas mãos por suas pernas macias.
— Ele tem bom gosto. — Mexe as sobrancelhas e puxa minha gravata. — Sem contar que é
de tirar o fôlego também. — Suas mãos seguram meu rosto e dá um beijo na minha boca.
Sentindo-me ferver, subo minhas mãos, puxo seu corpo para mim e aprofundo o beijo.
Saboreio suas curvas com minhas mãos, seu gosto com minha língua e seus sons são os combustíveis
exatos para me excitar.
Cazzo, essa mulher...
Nós nos beijamos por longos minutos, nos provocando, atiçando. Eu teria continuado se não
estivesse com fome. Não tive tempo de comer hoje. Por isso nos afasto e a convido para a sala de
jantar.
Comemos escutando música clássica, à luz de velas e com toque de vinho. Nunca me esforcei
ou tive um encontro com uma mulher. É a primeira vez. E é também a primeira vez que converso
sobre coisas banais na mesa do jantar. Trocamos pequenos detalhes sobre nós dois, nos conhecendo e
aprendendo um sobre o outro.
Depois nos sentamos no banquinho do piano e eu a ensino a tocar. Orgulhoso por ela
aprender tão rápido algumas notas, puxo seu corpo para o meu colo e a beijo até arrancar seu fôlego.
Uma provocação e tensão que nos leva a transar sobre o tapete da sala.
— Ah... — Madeleine solta o ar com a boca aberta e joga a cabeça para trás parecendo feliz.
Agora ela está deitada ao meu lado, lânguida e satisfeita, meu braço servindo de travesseiro,
uma das pernas jogadas em cima das minhas. Quando vira o rosto para mim, beija meu peito e vira o
corpo, erguendo-se o suficiente para apoiar os braços no meu peito. Sorrio, afago suas costas e a
deixo prender meus olhos nos seus. Não há palavras entre nós e o silêncio que recai é pesado.
Intenso.
Então ela sorri para mim, desliza o indicador lentamente em meu rosto e inclina a cabeça. Ela
me dá um beijo terno na boca, suspira e deita a cabeça bem em cima do meu coração, que está
descongelando aos poucos. É tão arriscado deixá-la ficar tão perto.
Hoje eu estou vestindo minha máscara civil, moral, mas... e quando meu monstro, meu
verdadeiro eu, estiver na superfície. Como vou conseguir protegê-la dessa parte de mim?

Minha consciência desperta quando a luz forte do sol atinge meu rosto. Levanto meu braço e
confiro as horas no relógio.
— Merda! — resmungo e esfrego meus olhos aproveitando para pentear meus cabelos para
trás com os dedos.
Olhando para o lado, vejo Madeleine deitada do mesmo jeito que estava antes de pegarmos
no sono. Ela parece tão relaxada e serena. Estamos deitados sob o tapete embaixo do piano, nus e
cobertos apenas por meu paletó e seu vestido. Rio, porque nunca fiz algo do tipo. Os lugares mais
incomuns que tinha fodido antes dela foi na boate e com Antonela; antes eu ia para o puteiro no fim
de Paradise, longe dos olhos curiosos que perseguem meus passos.
Erguendo meu braço, confiro as horas no meu relógio – quase seis da manhã – e está na hora
de sairmos daqui antes que alguém veja o que não deve. Daqui a pouco com certeza aparecerá algum
funcionário.
Com cuidado, viro meu corpo, deitando-me de lado e puxo o corpo dela de encontro ao meu.
Madeleine suspira baixinho, aconchegando-se em meu peito e passa a perna de cima sobre meu
corpo. Puta merda! Minha ereção matinal fica encaixada no seu calor.
— Precisamos sair daqui.
— Ah... Não... — reclama e abraça meu corpo como se fosse um bote salva-vidas e ela
estivesse em alto-mar. Seus braços e pernas me agarram fortemente agora.
Sem entender, deixo um beijo na sua testa e coloco seus cabelos para trás da orelha para
poder enxergar seu rosto. Ela resmunga mais uma vez, mas não faz um movimento de que vai
levantar. Porra! Ela é teimosa demais.
— Vamos para a cama. Volte a dormir lá, Madeleine.
— Está tão bom aqui. Deixa...
Eu duvido que ela esteja confortável dormindo no chão e o clima está gelado; mesmo que
nossos corpos se aqueçam abraçados, ela está com frio. Tanto que a puxo mais para mim, esfregando
suas costas de leve na tentativa de esquentá-la. Dou uma olhada para o seu corpo nu junto ao meu,
apenas coberto com meu paletó, e aprecio. É uma visão sexy que me deixa faminto.
— Vamos subir para o quarto. Lá vai estar mais quentinho — digo no seu ouvido, dando um
beijo no seu pescoço no final para ver se a convenço.
— Não. Se subirmos você vai embora. Vamos ficar aqui... Só mais um pouquinho.
— Eu não vou sair agora.
Isso a faz se afastar, abrir os olhos e me encarar.
— Mas você está todo atolado. Você me disse isso.
— Sim, eu disse. — Assinto. — Eu estou muito ocupado, mas não vou sair agora.
— Por quê? Algum problema?
— Não. — Acaricio seu ombro. — Está tudo bem. Não vou sair agora porque o que preciso
fazer pela manhã posso fazer no escritório de casa e vai ser bom. Estou sentindo dor embaixo das
costelas.
A informação parece clarear seus pensamentos e ela se senta.
— Por que não me disse antes? — reclama e agarra meu paletó, que veste com pressa. —
Que coisa, homem!
Rio com seu jeito de falar irritado e, quando se levanta, ela tenta não mostrar sua nudez para
mim, mas falha. Eu vejo absolutamente tudo e só não puxei seu corpo para mim antes de levantar
porque realmente não acho uma boa ideia se demorar ainda mais aqui. Rosália vai surgir a qualquer
momento.
— Espere, Madeleine. — Vejo-a pegar os sapatos e seu vestido. Só me resta colocar minha
cueca e a calça.
— Não dá para esperar. Rosália acorda cedo.
— Agora que você se deu conta?
— É! — afirma fazendo cara feia para mim e praticamente sai correndo da sala.
Eu vou atrás, não com tanta pressa, e subo as escadas com a visão maravilhosa da sua bunda.
— Meu Deus, Travis! São quase sete horas da manhã! — exclama quando entro no quarto.
Balanço a cabeça fechando a porta e vou para o banheiro. Como não fecho a porta,
Madeleine entra, tira meu paletó e a calcinha, se enrola em uma toalha e vai escovar os dentes.
Franzo a testa olhando-a pelo espelho.
— Vai tomar banho?
Apenas acena com a cabeça que sim, já que a boca está ocupada. Tiro minha calça, a cueca e
entro logo no banho. O jato de água quente atinge meu corpo causando um alívio muito bem vindo nos
meus músculos. Molho meus cabelos e pego o sabão para passar no corpo; e, quando estou me
ensaboando, Madeleine entra me surpreendendo.
— Vai tomar banho comigo?
— Vou — responde franzindo a testa. — Por quê? Algum problema?
Nós nunca tomamos banho juntos, eu nunca tomei banho com ninguém em toda minha vida.
Mas não tem nada de mais e acho que gosto principalmente quando abraço seu corpo macio e
molhado. Ela geme e ergue a cabeça para nos beijarmos. Passo as mãos em suas curvas, lentamente;
e com a esponja, limpo seu corpo.
O que se segue depois deixa o banho ainda melhor. Madeleine me chupa ajoelhada e toda
molhada no meio do boxe, sem tirar os olhos dos meus em momento algum. Sem dúvida é uma das
coisas mais sexies da minha vida. Essa mulher me deixa maluco.
Preciso retribuir. Agarrando seu corpo, pressiono nos azulejos e a fodo contra a parede como
se não tivesse amanhã. Amo trepar com essa mulher. Só minha.

— Meu Deus! Eu só queria tomar banho! — murmura jogada no meio da cama, que é aonde
paramos molhados e sem fôlego.
— Você que começou — digo e sorrio para ela.
Madeleine solta uma risada, levanta o corpo e apoia as mãos em cima do meu peito.
— Eu sei. Não tem como resistir a você, amor. — Dá um beijo na minha boca e passa a mão
no meu rosto. — Ainda está doendo as costelas?
Franzo a testa antes de responder:
— Mais ou menos. O banho aliviou, mesmo com tanto esforço e o analgésico que você me
deu também.
Ela cerra os olhos e eu a provoco passando a mão na sua bunda.
Essa conversa é boa para descontrair. Me dei conta ontem, quando chegava em casa, que
ainda não contei para ela sobre o casamento de Marinne, e que convidei D’Ângelo para o jantar de
amanhã. É uma puta piada sem graça convidar alguém que é meu rival para vir a um jantar de Ação
de Graças, que representa paz e gratidão. Meu pai nunca comemorou essa merda de feriado, porque
nós não temos o que agradecer. Somos imundos. Não merecemos graças e nem absolvição,
principalmente por não termos remorso pelo o que fazemos.
Madeleine suspira e deita a cabeça no meu peito, como está se acostumando a fazer sempre
que pode.
— Eu preciso te dizer uma coisa e não quero que fique brava.
— Por que eu ficaria brava com você? — pergunta baixo e ergue o corpo. — O que houve?
Não sei por que preciso pensar antes de falar. Por que estou preocupado em escolher as
palavras certas para informar a ela uma decisão minha. Geralmente eu não estou nem aí pra ninguém.
Mas, por algum motivo, a opinião dela importa.
— Eu convidei os meus avós para o jantar amanhã — começo pela parte fácil.
— Você convidou o seu avô?
— Por que você está com tanto medo? Ele não vai fazer nada com você.
Essa é uma afirmação que eu garanto, pois ninguém nunca vai tocar nela. Madeleine é minha
e jamais alguém vai machucá-la, magoá-la ou tocá-la indevidamente. Farei qualquer um sangrar se
fizer merda. É uma promessa e eu nunca quebro uma palavra dita.
— Não é isso, Travis — murmura. — É só... Eu ouvi coisas sobre o seu avô um pouco
assustadoras demais.
— Você também ouviu coisas horríveis sobre mim. Ainda pensa tudo aquilo a meu respeito?
Madeleine desvia o olhar e acaba sentando-se no meio da cama, cruzando as pernas e
protegendo seu corpo com a coberta. Não é frio. É outro sentimento.
— Não, eu não penso mais aquilo de você, mas eu convivi com você. Você me deixou te
conhecer, o seu avô não. E se ele não gostar de mim? Dizem que ele é muito frio e calculista. Por
favor, não venha me falar que todos os homens da Famiglia são iguais, que eu posso acreditar e
confiar que seu avô vai ser amável comigo. Você confiaria em mim sozinha com seu pai, por
exemplo?
Ela tem razão e isso me incomoda. Eu não duvido que, de alguma forma, meu pai tentaria
fazer algo com ela. Ele era um sádico perturbado e gostava de maltratar minha mãe. Quebrar os
fracos.
Balanço a cabeça e me sento, encostando meu corpo na cabeceira da cama.
— Entendo o que você está falando, mas posso garantir que o meu avô não é igual ao meu
pai. E se, acontecer de ele não gostar de você, no máximo ele vai me criticar entre quatro paredes.
Não na sua frente. Uma coisa que meu avô tem é compostura.
— E a sua avó?
— A minha avó vai gostar você, tenho certeza. Você é descendente da Famiglia original dela,
a Camorra. Naturalmente ela vai te aceitar.
Madeleine puxa o ar com força, prendendo-o.
— Você fala: vai aceitar. — Franze a testa. — Você ainda não disse para eles que vai se
casar comigo? — pergunta pausadamente e vejo sua expressão de nervosismo.
Molho os lábios, passando a língua, e engulo em seco antes de responder:
— Eu não disse ainda para eles que vou me casar e não foi por nenhum motivo específico ou
isolado. Só tive muitas coisas para fazer e a decisão foi realmente tomada na segunda-feira, hoje
ainda é quarta. Parece que não, mas os dias estão passando bem devagar.
— Para mim parece que tem uma semana que me tornei sua noiva.
Pego suas mãos e a trago para ficar mais perto de mim.
— O pedido de casamento oficial e o qual você aceitou, tem duas semanas hoje.
Quando acordei da sedação que o médico deu para me recuperar mais rápido. Não é sempre
que podemos ter esse luxo, mas foi inevitável. Eu fiquei muito ferido do combate com a Hechos.
Estava cego pelo ódio e revoltado com a recusa de Madeleine.
— E foi na segunda-feira que todo mundo, que interessa, ficou sabendo. E o anel eu te dei
ontem, então ainda é prematuro. Não fica pensando ou criando teorias sobre os motivos de eu ainda
não ter falado com meus avós. Não comuniquei ainda a eles porque tive muito trabalho essa semana
e, de todo modo, ambos virão jantar conosco amanhã na ceia de Ação de Graças.
— Mas você nem ia comemorar.
— Eu já ia convidá-los para virem aqui. Não há motivos para você ficar nervosa com isso,
Madeleine. — Eu não me reconheço falando com ela assim tão polido e calmo.
Desde a nossa primeira vez, a noite do baile no Bellagio, percebo que fico calmo em volta
dela.
— Tudo bem. Eu só perguntei, de verdade, por curiosidade e não posso mandar em você.
Não quero isso.
— Mas eu quero que você fale. Não quero que você não tenha a voz.
— Geralmente os Madman não pensam assim.
— Eu sei disso, porém não sou. Gosto quando você fala as coisas. Gosto quando Marinne
tem algo a dizer também. Até já aceitei conselhos da minha irmã. Ela é muito inteligente, como você.
Nunca quis me casar com uma mulher amedrontada. Não há honra em quebrar e maltratar mulheres,
crianças ou elos mais frágeis. Não sou assim.
Seus olhos brilham de realização e ela morde o lábio para não rir.
— É sério que você ouve conselhos de Marinne?
— Sim, às vezes sim. Eu criei minha irmã para ser tão destemida e forte como eu e meus
irmãos. Não é porque ela é menina, que tem que ser fraca. As mulheres são sensíveis, é verdade, mas
não incapazes de serem valentes e violentas. Algumas são tão ou mais fortes que homens ao ser
torturados. Menosprezar ou quebrar as mulheres são duas coisas que não podem me acusar.
— Você tem prostitutas nos bordéis.
— Madeleine, é o trabalho delas. — Franzo a testa sem entender seu argumento. — Eu não
forcei nenhuma delas a ser puta e posso lhe garantir que não tolero maus-tratos. Eu sei que
antigamente, e ainda em outros locais, as putas são feitas de lixo, mas nos meus domínios não.
— Parece um sinal de respeito as mulheres.
Faço uma cara de desdém ao dizer:
— Faço o que posso. Não me pinte como um santo. Estou mais para o diabo.
— Aposto que seu avô não concorda.
— Ele concorda sim — afirmo concordando com a cabeça.
— O que você quer dizer com isso?
— Quando eu decidi que iria sair de casa e cursar minha faculdade perto da casa dos meus
avós, convivi com eles durante muito tempo e posso dizer, com toda certeza, que minha avó e meu
avô se respeitam como se fossem dois soldados. Ela sempre tomou decisões e deu suas opiniões
sobre assuntos que eram de interesse dela e sua Famiglia, e meu avô a mesma coisa. Naquela casa
sempre existiu, e ainda existe, duas origens. Duas Famiglie, a Camorra, que é representada no
território da Lawless pela minha avó; e a Cosa Nostra, pelo meu avô. Então, quando algumas
decisões deveriam ser tomadas, a minha avó falava e muitas vezes meu avô ouvia, e fazia.
— Nossa! Não sabia que era assim.
— Poucos sabem e, quando disse que ela vai gostar de você, é porque até hoje ela é muito
leal a sua Famiglia de origem. A Camorra nos comanda e observa por ela, e eu duvido muito que
irei suceder o lugar do meu avô como Boss quando ele morrer.
— Acredita mesmo nisso?
— Fielmente. A Camorra espera por isso desde o sim dado na igreja há cinquenta anos. Eles
querem inteiramente representar e dominar um espaço; e se for o nosso, melhor ainda. A Lawless tem
boa parte do território americano e a Camorra é a única Famiglia italiana que não tem realmente um
território como comando. O único é o nosso, mas pela metade e literalmente simbólico. Não preciso
de muito para adivinhar que eles esperam a morte do meu avô para pegarem o que já é deles. Para
pegarem a outra metade.
— Você representa a Camorra. Você é neto de uma filha deles.
— Mas não sou um Caputo, Madeleine. Eles querem a cadeira.
Ela franze a testa e balança a cabeça.
— Esse mundo é tão arcaico.
— É sim e por isso quebro algumas tradições. Por isso teimei em me casar com você. Com
uma mulher que eu escolhi, não a que escolheram para mim. Por isso que deixo Marinne ser do jeito
que é. Eu não quero que você, minha irmã, e se tivermos filhas, se cale. Não tenha direito de falar. Eu
quero que você fale, se estiver com vontade.
Madeleine abre um sorriso enorme e vem me abraçar.
— Não se preocupe com o meu avô. Ele não vai fazer nada. Eu acho muito difícil ele não
gostar de você.
— Ah... Tomara que você esteja certo. — Se afasta e me dá um pequeno sorriso. — Agora
estou curiosa para conhecê-los.
— Você vai gostar dos meus avós. Vai ver que o casamento deles realmente é uma aliança de
sangue. Não existe nada além disso. No casamento deles existe respeito, duelo, rivalidade e, acima
de tudo, sangue. É um verdadeiro casamento estratégico.
— Que loucura! Então eles não se amam?
— O amor é uma coisa muito abstrata em nosso mundo.
— Mas acontece — ela afirma e olha dentro dos meus olhos, talvez querendo achar alguma
coisa.
Respiro fundo e engulo em seco. Eu não quero desapontá-la sobre isso. Sentimento é uma
merda e já basta a possessão que sinto por ela. Não precisa complicar mais.
— Eu não disse que não acontece — prossigo, porém sem emoção ao falar. — Apenas que
em alguns casos, na maioria das vezes, amor é algo superestimado e nenhum pouco cobiçado em
nosso mundo. Se o amor fosse poder, com certeza todos os homens iam querer experimentar.
— Não posso discordar — comenta pensativa e, quando se recompõe, olha para mim. — E
qual era a outra coisa que tinha para falar?
Cazzo. Ela não deixa escapar nada.
Eu até poderia deixar para depois essa conversa, mas a merda do jantar de Ação de Graças é
amanhã e eu ainda não contei para a minha futura esposa o que fiz para nós estarmos juntos. Ela me
fez a pergunta e omiti a verdade. Não respondi antes, porém agora vou ter que contar. Espero que ela
entenda e não tenha um ataque. Luca disse que eu já deveria ter lhe contado. Às vezes, aquele imbecil
está certo.
— Vamos tomar café primeiro.
Madeleine respira fundo baixinho e desliza as mãos pelo meu corpo ávida e tendenciosa
enquanto vem se sentar em cima das minhas pernas. Ela é tão sexy e fogosa. Eu adoro isso nela.
— E se eu... — ela encaixa o rosto entre o meu pescoço e meu peito esfregando a ponta do
nariz na minha pele — comprar essa informação?
Ela já sentiu que não quero falar. Safada! Rio e deslizo minhas mãos por suas costas.
— Você é terrível!
— Tem um preço essa informação? — murmura antes de beijar meu peito várias vezes. —
Qual é o preço para você me contar?
Solto um gemido quando se esfrega em mim. Caralho! Ela me deixa com vontade de comê-la
rápido e selvagem. Desço minhas mãos até sua bunda e apertando digo no seu ouvido:
— Eu também sei brincar de provocar.
— É... — sussurra com a boca na minha, os olhos azuis bem abertos. — O que meu Capo
quer? Eu dou para receber.
Cerro os olhos e empurro meu pau no seu calor, que está quente e escorregadio. Maledetta.
Ela nunca se sacia de mim e eu também não.
— Eu quero te comer bem rápido e fundo.
— É? — Deixa a voz rouca. — Me conta o que ia me falar que depois eu deixo você fazer o
que quiser comigo.
— Você vai ganhar duas vezes.
— Eu sei — responde batendo os cílios para mim.
Dou uma risada. Ela é uma ótima negociadora.
Em um movimento rápido, agarro seu corpo e a derrubo na cama. Deixo meu corpo por cima,
relaxado e acomodado ao me encaixar no seu, onde ela envolve meus quadris com suas pernas e os
braços agarram meu pescoço. Nossas peles estão se tocando e eu seguro seu rosto para lhe dar um
beijo de língua barulhento, molhado e afoito. Madeleine geme embaixo de mim e pede com seus
murmúrios mais proximidade, e eu daria se não tivesse que falar algo sério. Corro o risco de ficar
“na mão”.
— Você fica tão lindo de manhã. — Sua voz está um pouco sonhadora. — Fica tão gostoso
com meu cheiro em você. — Ela lambe meus lábios. — Você ainda está com meu cheiro, sabia?
— E você com o meu.
— Uhum... — murmura dengosa.
Merda! Sou viciado nela. Dou um chupão no seu pescoço, deixando marcado e ondulo minhas
pélvis provocando seu calor com a ponta do meu pau duro como pedra.
— Minha demônia.
Isso a faz rir e me beijar.
— Meu malvado favorito.
Agora eu rio, beijo sua boca e me afasto para poder fitar seus olhos. Respiro fundo, soltando
o ar pelo nariz com força.
— Eu ia adorar te comer bem agora, mas o que preciso te contar é sério, Madeleine.
Ela franze a testa, preocupada.
— O que foi? Eu não gosto quando você fala assim. A última vez você disse que a minha mãe
morreu.
— Não é nada de grave.
— Então conta logo.
Deixo um beijo nos seus lábios e me afasto para me sentar na beira da cama, porque eu
realmente não sei qual vai ser a reação dela.
— Travis?
— É melhor assim.
Espero que ela fique do meu lado e pego sua mão dando um aperto de leve.
— Diz — pede baixinho.
— Você tinha me perguntado o que eu fiz para nós podermos ficar juntos.
— Sim... Eu perguntei e você disse que não me interessaria. Que não era importante.
— Para o nosso casamento não é importante. — Olho para ela. — O que importa é nós dois.
Mas, como você ouviu do Paolo, eu teria que me casar com a filha do Consigliere da Darkness,
porém não aceitei porque eu queria você.
— Sim. Eu ouvi e não perguntei porque não queria parecer enxerida.
Assinto demonstrando que aprecio sua conduta.
— O meu pai fez um acordo há muitos anos com a Darkness. Ele fazia vários tipos de
acordos. Assim como o que fez com você, de que nós sempre a protegeríamos pessoalmente. E
acontece que eu aceitei essa aliança com Giovanni D’Ângelo.
— Como você fez? — Madeleine engole em seco e seus olhos se arregalam. — Você... Não
aceitou se casar com a menina da Darkness, aceitou? O que somos?
— Ei, calma. — Pego suas mãos. — Eu não aceitei me casar com Valentina.
— Então?
— Eu aceitei um casamento entre a Darkness e a Lawless, sim. No caso, Amândio e Marinne.
Os olhos de Madeleine ficam ainda mais arregalados e ela se levanta, afastando-se de mim.
— Você o quê? Ela é... Só uma criança, Travis. — Põe as mãos no peito. — Como você
pôde?
— Calma.
Eu me levanto também e tento me aproximar dela, pegar em seus ombros, mas ela foge de
mim entrando no closet.
— Me escuta antes de você tirar conclusões precipitadas.
Madeleine solta uma risada e veste um roupão.
— Então me fala tudo de uma vez. E veste isso. — Joga uma cueca para mim.
Irritado, coloco a peça e me aproximo dela.
— Amândio vai ser Capo da Darkness assim que suceder o cargo do seu pai.
— Não me interessa essas hierarquias. Elas chegam ao ponto de Marinne ter quatorze anos e
ficar noiva. Ela é uma criança.
— Você acha que eu casaria minha irmã com essa idade? Eu a criei como se fosse minha
filha. Eu a protejo desde que ela era um bebê indefeso sem a proteção da minha mãe, sem atenção do
meu pai e desde que ela veio ao mundo eu sou tudo que ela tem. Jamais machucaria ela dessa forma,
então não fale assim comigo. — Sou rude no final, mas não dou a mínima.
Madeleine baixa o rosto, não antes de deixar que eu veja seus olhos marejados. Ela encara o
chão, respira fundo, controlando-se e chega perto de mim. Olhando nos meus olhos, pega minhas
mãos e pede:
— Me desculpe, Travis.
Assinto em forma de aceitação das suas desculpas.
— Eu sei que ela é alguém muito importante pra você. Me desculpa por falar assim. É que...
Me pegou de surpresa.
— Tudo bem.
Ela fica mais emocionada e uma lágrima escorre pelo canto da sua face.
— Eu também sou protetora dela, Travis. No pouco tempo que eu a conheço, a amo como se
fosse parte da minha família. Quer dizer, ela faz parte da minha família e eu nunca, jamais, vou
querer que ela se machuque.
— Eu sei disso e agradeço por querer defendê-la. — Coloco seu cabelo atrás da orelha e
deixo minha mão no lugar, afagando sua bochecha com o polegar. — Ela vai se casar com Amândio
quando completar a maioridade. Seis meses depois de fazer dezoito anos. Este foi o acordo que eu só
aceitei dessa forma como também o fato de eu querer que eles tenham algum convívio. Não quero que
ela se case com um completo desconhecido como muitas mulheres do nosso círculo acabam tendo
que fazer. Não quero que ela se sinta desconfortável com o marido. Quero que eles se conheçam.
Pode não surgir algum sentimento, mas pelo menos não serão completos estranhos.
— Isso é algo muito legal que você vai fazer Travis e... Me desculpa por ter perdido a
cabeça. — Apoia sua mão sobre a minha, que ainda está no seu rosto, e dá um beijo rapidamente na
palma antes de falar: — Você está falando isso hoje porque os D’Ângelo vão vir amanhã, não é?!
E ela sempre me lembra o porquê a escolha para ser minha. Sempre sagaz e atenta.
— Sim. Ele virá e finalmente vou vê-lo pela primeira vez. Eu ainda não o conheço
pessoalmente, mas todos dizem que é um bom garoto.
Um homem feito destemido, temperamental e brutal. Luca me fez um dossiê sobre Amândio e
o garoto será um Capo no mesmo nível que eu. Somos bem parecidos, e espero que em tudo,
inclusive em proteger a família. Tê-lo como aliado tem a promessa de ser bom. Talvez melhor do que
meu convívio com o pai dele. Giovanni D’Ângelo não está em alta estima comigo.
— Quantos anos ele tem? — Sua pergunta vem com peso. Ela é feroz quando quer proteger.
Adoro isso nela.
— Dezenove.
Madeleine faz uma careta esquisita, pensativa e fala:
— Pelo menos não tem tanta diferença de idade entre eles.
— Eu não casaria minha irmã com um homem velho. Acho estranho.
É esquisito e geralmente os homens mais velhos da Famiglia já foram casados, tem filhos e
são escrotos. Precisam se casar de novo porque suas esposas morreram de tristeza ou desgosto como
minha mãe.
Parecendo mais relaxada, Madeleine fica mais perto e joga os braços nos meus ombros.
— Espero que ela se dê bem com ele e que não fique tão chateada.
— Também não quero que ela fique chateada. Eu gosto muito da minha irmã para querer que
ela fique zangada comigo.
— Travis... — sussurra com os olhos brilhando.
— O quê? — Franzo a testa sem entender a emoção em seus olhos.
— Você ama sua irmã. É o único pai que ela sempre teve. — Acaricia meu rosto de leve. —
Eu sei que está fazendo uma boa coisa pelo futuro dela e a gente só pode esperar o que há de melhor.
Torcer para que tudo dê certo, porque se não der... — Baixa o tom de voz e desliza as mãos pelo meu
peito até a borda da minha cueca, séria, mas maliciosa. — Eu não quero nem saber o que pode
acontecer com esse menino aí que vai se casar com Marinne se ele tentar machucar nossa garotinha.
Porra! Essa última palavra... Derrubou um grande pedaço do muro criado ao longo dos anos
feito entre torturas, sangue e morte.
Agarro minha mulher, jogo-a na cama e a fodo com força, quase rasgando os lençóis. O que
ela faz eu sentir, pensar é... Desconhecido. Animalesco.
Antes eu pensava apenas nas caras dos meus inimigos quando me encaravam com pavor,
agora eu sei que eles terão que lidar com minha esposa. Duvido que ela deixe barato se alguém tentar
encostar em nossa família. Não preciso me preocupar com meus filhos em relação a ela. Eles terão
uma mãe de verdade. Terão uma mãe e um pai que queimarão e sangrarão para protegê-los.
Também sei que ela defenderá a nossa Famiglia se for preciso. Muitos irão se arrepender de
duvidar do potencial de Madeleine. Não posso dizer que sempre enxerguei essa força nela, mas
também seria hipocrisia dizer que não sabia que ela é teimosa e destemida. E corajosa, pois fazer o
que fez anos atrás, dedurar o plano do pai, não foi algo simples.
Meu medo em relação a Madeleine é suas emoções, seja qual for: medo, raiva, paixão. Se ela
se sentir ameaçada, vai defender e lutar bravamente. Um risco em nosso mundo sem escrúpulos.
A maior força de uma mulher é também sua maior fraqueza; o que o submundo gosta de usar a
seu favor e contra elas: a sensibilidade. Por isso que protejo Marinne, e agora Madeleine. Não é
porque acho elas fracas, pelo contrário. Eu as protejo porque elas não foram instruídas a absolver
seus sentimentos se for preciso, assim como facilmente os homens se tornam ocos. Se permitem
sangrar almejando seus pecados. Um Madman vive seu purgatório e a morte é apenas a sentença para
o inferno.
Saio da cozinha satisfeita com o banquete que será servido amanhã, que teve algumas
modificações.
Sigo para o escritório de Travis. Ele cumpriu com o que disse, que ficaria em casa hoje. Dou
um toque de leve e espero ele dizer que posso entrar. Sorrio fechando a porta de volta e caminho até
ele, que parou o que estava fazendo para me dar atenção. Está todo lindo e poderoso na sua cadeira
em sua mesa. Eu adoro ver ele com pinta de magnata. É menos assustadora do que o ar de chefe da
maior organização criminosa dos Estados Unidos.
— O que você está tramando? — pergunta me puxando para sentar-se no seu colo.
— O jantar e estava pensando, você não reparou que mexi na casa e nem no seu quarto.
Travis olha para os cantos do escritório. A única coisa que fiz aqui foi a troca das cortinas,
na verdade todos os cômodos da casa ganharam cortinas brancas novinhas e pedi para Rosália deixar
todas as janelas abertas durante o dia, principalmente. Fora que coloquei uma árvore gigante de natal
na sala de estar e algumas luzinhas nas janelas. No quarto de Marinne que pude abusar na decoração
de natal.
Ele volta a me encarar e sorri.
— Acho impossível não ver a decoração de natal — diz com sarcasmo. — Eu reparei sim,
em tudo e não disse antes, pois estava muito ocupado mais cedo.
Dou uma risada por lembrar das nossas sessões de sexo. Estamos insaciáveis, fracamente.
— Mas você gostou?
— Gostei. — Ele dá de ombros e sorri. — A casa parece maior.
— Está mais iluminada. O único cômodo que já era alegre antes e iluminado, era o quarto da
Marinne. Tipo, eu sei que você é o Capo malvado, mas não precisava viver em uma casa com cara
de casa mal-assombrada, amor.
Isso o faz rir alto e me apertar em seus braços.
— Você não perde uma oportunidade de fazer piada.
Balanço a cabeça, ignorando-o.
— É porque eu gosto de ver você sorrindo. Quero ser o seu telhado. Quero ser a sua luz na
escuridão. A sua paz.
Travis respira fundo e me beija de leve.
— Você já é.
Assinto e deito minha cabeça no seu peito suspirando com um sorriso bobo. Quanto mais o
tempo passa, mais eu o amo. Mais eu o entendo. Mais eu quero cuidar dele. Sua vida sempre se
resumiu apenas a Lawless. Ele pode continuar sendo quem é, mas não só isso.
— Você viu o Dario ontem? — Travis pergunta, acabando com o clima, mas eu o perdoo.
Levanto-me do seu colo e coloco as mãos na cintura encarando-o.
— Aqui em casa? Que horas? Eu fiquei o dia inteiro aqui e andando pela casa, afinal
acompanhei as mudanças. Só saí quando fui à loja de noiva por volta das seis horas e, por incrível
que pareça, não demorei mesmo passando em uma loja para comprar luzes de natal.
— Por que não demorou na loja?
Dou de ombros e vou ajeitar um livro na estante que fica atrás da sua mesa. É um livro
chamado Estratégias milionárias. Rio por dentro.
Alguns devem até pensar que um Capo, um homem da máfia, lê sobre mentes psicopatas,
planos de guerra e histórias antigas de dominação. E não é como se não tivesse livros sobre isso,
mas a verdade é que a mente de um líder de uma organização criminosa é muito mais voltada a
finanças, empresas, corporações, táticas políticas e de guerra. Táticas inteligente de chantagem e
acordos. Estou encarando um livro sobre o tema neste instante.
Um grande líder precisa se equipar de palavras, de livros, que o aprofundam em seus
negócios e na história, para saber os caminhos que levam a vitória ou a derrota. Dois caminhos
distintos. Eu derrotei meu pai, mas não venci no final.
Suspirando para esvaziar minha mente, giro-me nos calcanhares e o vejo me observando bem
sério.
— Preferi agendar uma visita para sábado na hora do almoço. A mulher da loja falou que ia
preparar um dia todo só pra mim e escolheria os melhores modelos para o meu corpo.
Travis levanta e pega minha cintura com as duas mãos.
— Você pode ter o que você quiser. Não se segure.
Sorrio sem mostrar os dentes e assinto. Eu sei disso. O comportamento e a recepção das
mulheres da loja de noiva, deixou claro que receberam ordens de cima para “cuidar” de mim como
uma rainha.
Não posso dizer que não gostei.
— Eu sei, Travis, e não escolhi nada ainda por causa que a mulher agendou um dia só para
mim. E vai até ser legal. Marinne vai estar comigo.
Ele coloca meu cabelo atrás da orelha e seu olhar é terno. O olhar raro que, às vezes, vejo
direcionado para mim e sua irmã.
— Obrigado por pensar nela. Marinne precisava ter uma figura feminina para cuidar dela.
— Agora ela tem — afirmo com um sorriso, e volto para o assunto inicial. — E eu realmente
não vi seu irmão. Ele ia vir pra cá?
Acho que o maior tempo que passei na companhia de Dario Lozartan foi início do mês
passado, desde que minha mãe morreu. Ele estava o tempo todo por perto e no velório quase colado
aos irmãos. No entanto, não o vejo desde a noite que Lorenzo e Enrico invadiram a casa, que foi na
mesma noite. O soldado de Travis foi morto por ele, principalmente porque tentou machucar seu
irmão. Talvez foi por isso que Dario sumiu. Dio mio. Parece que tem muito tempo aquela noite, mas
tem apenas três semanas.
— Colen disse que mandou ele vir ficar aqui depois que fosse para Harvard. Nós queremos
ficar de olho nele e a melhor opção é ele ficar aqui em casa.
— Mas o que o Dario disse? Ele está bem depois do que aconteceu?
Não preciso entrar em detalhes sobre o que estou falando. Travis nega com um aceno de
cabeça.
— Não nos falamos ainda. Fiquei muito ocupado desde que melhorei e acabei focando nos
assuntos de negócios. O único contato que tive com Dario foi uma mensagem de texto que recebi
ontem, por volta de oito da noite, dizendo que estava vindo.
— Mas ele não apareceu. — Franzo a testa. — Essa hora eu já estava em casa há muito
tempo. Será que aconteceu alguma coisa?
Travis cerra a mandíbula e balança a cabeça em negativa.
— Não. Se tivesse acontecido, eu saberia.
Com certeza, ele mandou um soldado ficar na cola do irmão.
— Dario está testando minha paciência. — Captura minha atenção. — Eu preciso dar um
jeito no seu comportamento — fala distraído e se afasta de mim. Volta a se sentar em sua cadeira e
pega o celular.
— Qual o verdadeiro problema dele?
Travis respira fundo e me olha por baixo dos cílios, permitindo que eu veja sua impaciência
sobre o assunto. Deve ser exaustivo cuidar dos irmãos como se fosse pai deles, e não é de agora com
o falecimento de Vincenzo Segundo. Ele sempre protegeu os irmãos.
— Não sei. Ele apenas se recusa a fazer o papel que precisa desempenhar para ser um
legítimo Lozartan. Ser um homem feito. Antes mesmo de fazer o juramento, Dario se recusava a
cumprir as ordens. Eu já conversei com ele, mas não adiantou.
— Ele... Não quer ser... Um Madman? — indago em dúvida.
— Dario não apoia nossas ações. Ele odeia o que somos, mas não tem saída. Todos os
homens nascidos em nosso mundo não têm saída e por isso fico irritado.
Na verdade, ele está mais para preocupado. Aproximo-me e me sento na beira da mesa.
Estico minha mão e, quando ele permite, afago seu rosto de leve.
— Se eu puder ajudar, vou ficar feliz, mas acredito que é um assunto que apenas você pode
ter com seu irmão. Não acho que sou capacitada para isso agora. — enfatizo o momento presente
porque, quando tivermos nosso filho, sei que farei das tripas coração para criá-lo forte e impetuoso
como seu pai.
Travis concorda com um aceno e pegando minha mão levanta-se para segurar meu rosto e
beijar minha boca.
— Não se preocupe. Eu vou dar um jeito.
Sinto que o jeito que ele vai dar não será fácil para Dario. Faço um aceno de cabeça
aceitando o inevitável que é essa situação, e me pegando de surpresa, Travis se senta e me puxa para
o seu colo de novo.
Abro um sorrisinho e sentindo-me plena, passo meus braços por seus ombros, encaixando-me
em seu corpo e me delicio quando ele beija minha boca demoradamente do jeito que eu gosto.
E é a batida na porta que nos impede de continuar.
— A gente continua depois — ele diz e, para aliviar o nosso afastamento, dá um beijo de
leve nos meus lábios.
Como não queremos comentários, me afasto e vou para uma das cadeiras que fica em frente a
sua mesa, ao mesmo tempo que Travis autoriza entrar quem bateu na porta.
Logo surge um homem de feições fortes, cabelos grisalhos e um sorriso em sua face nem um
pouco amigável. Como todos os homens da Famiglia está vestido todo de preto e o seu sobretudo lhe
dá um ar ainda mais poderoso. Eu não preciso de apresentação para saber que é Vincenzo Lozartan, o
Boss da Lawless.
Sinto Travis levantar-se atrás de mim, já que meus olhos não conseguem desviar a atenção da
porta e faço o mesmo. Espero-o passar por mim para segui-lo até o avô.
— Eu não sabia que vocês iriam chegar hoje — Travis comenta e é nesse instante que vejo
uma linda senhora atrás de Vincenzo.
Ela é muito bonita. Tem os cabelos loiros pintados com algumas mechas grisalhas, as rugas
de expressão lhe dão um ar de experiência e elegância. Veste uma calça social preta, blusa de manga
comprida de seda vermelha, como os sapatos, e um sobretudo também preto. É a estimada Giulia
Caputo. Ela me olha dos pés à cabeça e não diz nada antes de focar em Travis.
— Nós queríamos fazer uma surpresa para você, querido.
Observo nitidamente Travis desconfiado. Ele respira fundo e me pega de surpresa quando se
aproxima de mim, colocando a mão em minhas costas, bem em cima da minha lombar. Protetor e
dominante.
— Está é Madeleine Beluzzo, minha noiva.
— Sua noiva? — Giulia pergunta com um ar penetrante. — Desde quando você tem noiva?
Nós não ficamos sabendo disso.
Travis cerra a mandíbula e acho que, sem perceber, aperta demais a mão em minha cintura.
Engulo o chiado porque estou mais preocupada com os olhos de Giulia e Vincenzo sobre mim.
Eles são sempre intimidadores assim?
— Eu ia comunicar a vocês amanhã. Mas que bom que chegaram mais cedo. — Seu braço me
puxa mais para perto. — Melhor assim.
Vincenzo meneia a cabeça, como se tentasse entender, e me fita nos olhos com interesse.
— Quem são seus pais?
Ah, merda!
— Por que o interesse? — Travis indaga com a voz superior.
— Porque nós somos como a realeza, temos responsabilidades em cada ação que escolhemos
e um casamento só é bom quando dois lados se beneficiam.
— Meu casamento não é tático — Travis afirma.
— Está apaixonado por ela? — Vincenzo questiona seco e irônico. — Vai se casar com ela
porque não consegue viver sem ela?
Tenho muita vontade de olhar para o rosto de Travis e saber o que está sentindo, ou
pensando, mas acabo baixando a cabeça e fitando o chão envergonhada.
— Não interessa os meus motivos — responde o avô projetando o corpo para ficar na minha
frente. — Eu vou me casar com Madeleine e esse assunto está encerrado. E pensei que você fosse
gostar de saber que a família da mãe dela vem da Camorra. Sua Famiglia.
— Então ela é uma italiana? — Giulia pergunta e abre um sorrisinho olhando para mim.
— Sim, ela é italiana.
Sei que eu mesma poderia responder essa pergunta, mas acho que perdi a voz. E a Sra.
Lozartan chega mais perto de mim, quando seu neto fica um pouco para o lado, e me examina.
— Beluzzo... Madeleine Beluzzo? Esse nome... — ela murmura. — Não é a menina que
dedurou o próprio pai para a Lawless, porque ele estava conspirando com o inimigo? A menina que o
seu pai — se dirige para Travis — jurou proteger pessoalmente depois, como uma dívida?
É claro que ela sabe quem eu sou e a minha lenda. É isso que eu me transformei depois que
dedurei meu pai. Uma lenda como também um perigo. Muitos pensaram durante anos que eu, na
verdade, era uma traidora. Posso não ter traído a Famiglia, mas traí meu pai. O meu sangue.
Para os Lozartan, isso significou que eu dei mais importância a Famiglia, sendo que eu só
estava preocupada comigo mesma e minha mãe. Na época eu ainda não nutria uma mágoa por ela, não
até me esquecer assim que fui banida de Las Vegas.
— Sim, sou eu mesma. — Recuperando a voz e aprumando a postura, levanto o queixo e
digo: — A história é bem longa de como vim parar aqui, mas quero que saiba que eu sou leal a
Travis, a sua família e a Lawless. Dou a minha palavra.
Eles se entreolham, Vincenzo ergue a sobrancelha e logo os dois me encaram parecendo
convencidos. Eu sei que não totalmente, porém Travis vai fazê-los me aceitarem. Sei que o meu
homem é muito convincente.

A minha ideia para o dia de Ação de Graças era uma coisa mais singela. Uma reunião de
família. Um jantar entre nós para agradecer, pelo menos, por estarmos vivos ou alguma graça que
Deus deu particular.
Eu sei que tenho o que agradecer. Fui acolhida no momento de maior desespero da minha
vida, conheci uma menininha que amo como se fosse do meu sangue e vou me casar com um homem
que amo. Então eu tenho o que agradecer.
Também o que lamentar, infelizmente. Meus pais morreram, quase fui morta pelo filho da puta
do meu primo e a única família que me resta mora muito longe... Não. Isso não é verdade, porque a
família que eu tenho é a do meu futuro marido e a que eu irei construir com ele. Nunca cobicei ter
filhos, mas espero ansiosamente por este momento.
E o jantar de hoje também seria em família, até ver os avós de Travis e como eles me
trataram. Meu Deus! E saber que os D’Ângelo chegarão hoje também, levou meu ânimo pelo ralo.
Estou com o pressentimento de que talvez amanhã será oficializado o noivado de Marinne. Acho que
Travis está falando sobre isso com os avós.
Dio mio! Eu não sei como a minha pequena vai reagir. Ela é muito inteligente e astuta, no
entanto ainda uma criança. Eu estou louca para vê-la. Para ela chegar, e não vai demorar muito mais.
Luca saiu deve ter uns quinze minutos para buscá-la.
Respiro fundo e volto para a cozinha, onde vejo as meninas trabalharem e onde passei a
maior parte do tempo hoje.
Rosália vira-se para mim com sorriso.
— Está tudo bem, senhora?
— Sim, eu estou bem, mas vou precisar da sua ajuda agora.
— Estou às suas ordens. O que a senhora gostaria?
— O quarto para os Lozartan já está pronto?
— Sim, senhora. Fiz pela manhã logo que o senhor Travis me disse que eles virão amanhã.
— Okay, menos mal. Eles acabaram de chegar.
Vejo o receio nos seus olhos, a postura se elevar e, quando meneia a cabeça, noto o
nervosismo. Acho que é natural ficar assim. Ainda bem que não sou a única.
— Enfim, quero que você foque no jantar de hoje à noite. Além deles, nós vamos receber
uma visita daqui a pouco. Precisa aumentar o jantar, assim como o de amanhã e ajeitar a sala dos
fundos.
Creio que ela entendeu que a visita é uma reunião de negócios, porque um casamento por
tática nada mais é do que negócios.
— Sim, senhora. Já vou providenciar tudo.
— Obrigada. Prepara um jantar grande e Marinne vai chegar daqui a pouco. Já deve estar
chegando. Então seria melhor fazer um jantar legal para ela. Prepare o prato que ela mais gosta e uma
sobremesa. Faça... Seja lá o que for. Pensa que hoje é aniversário dela ou um dia antes do
aniversário dela. — Fico um pouco eufórica falando e preciso me acalmar. Respiro fundo. — Faça
de hoje à noite um dia especial para ela, por favor.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não, Rosália. Eu... Só gosto de mimar a Marinne. Só isso.
Eu não vou ficar falando coisas comprometedoras que não diz respeito aos funcionários.
Travis não gostaria e eu aprendi com a minha mãe que certos assuntos não devem ser falados na
frente dos empregados. Precisa-se dividir a vida pessoal do trabalho, e em nosso mundo essa regra é
levada ainda mais a sério.
— É só isso. Agora vou subir. Preciso dar um telefonema e já volto. Travis ainda está no
escritório e pediu para não o interromper de forma alguma. Ele está em reunião com os avós.
Giulia e Vincenzo chegaram mais cedo do que imaginei. Eles ficarão aqui até sexta de manhã.
Eu pensei que ficaria extremamente nervosa na presença deles, mas na verdade não. Apenas me senti
intimidada e o momento que mais fiquei nervosa foi quando perguntaram quem sou e quando pediram
para deixá-los a sós com o Travis. Confesso que eu quase corri para longe daquele escritório.
— Sim, senhora. Pode ficar despreocupada. Vou preparar tudo.
— Certo. — Meneio a cabeça e saio da cozinha.
Sei que só estou me esforçando dessa forma, quase maníaca por todos os detalhes, porque
quero que os Lozartan gostem de mim. Quero que eles aprovem meu casamento com o seu neto.
Quando estou virando o corredor, seguindo para as escadas, vejo a porta de casa se abrir e
uma Marinne vestida com o uniforme do internato aparece. Ela está linda com as franjinhas
penteadas, os cabelos soltos e vestida com a saia xadrez pregada, a camisa social branca, o laço
vinho amarrado no pescoço e o blazer azul. Abrindo um sorriso enorme, ela corre para os meus
braços abertos.
— Madeleine! — exclama me abraçando forte.
— Oi, querida. — Dou um beijo nos seus cabelos e me afasto para fitar o seu rosto. — Como
você está?
— Eu estou bem. Estava com muita saudade de vocês. Travis está em casa?
— Está, mas ocupado no escritório com seus avós. Ele não foi pro Bellagio hoje.
— Só você para fazê-lo se comprometer em ficar em casa.
— Sobre isso. Tenho uma coisa para te dizer.
— O que é? — pergunta arregalando seus imensos olhos azuis tão idênticos aos do irmão. Eu
amo o fato dela se parecer com Travis, e secretamente imagino como serão meus filhos. Com certeza,
eles vão se parecer com ela.
— Eu e Travis vamos nos casar. Amanhã ele vai oficializar o pedido. Na verdade... —
Levanto minha mão mostrando o anel.
— Ai, meu Deus! — grita. — Estou tão feliz. Eu gosto tanto de você e... Já disse. Você é...
Como a figura materna que eu não tive. Sei que a gente se conhece tem muito pouco tempo e não
sabemos muita coisa uma da outra, mas... O pouco que já convivi com você. Aprendi a te amar.
— Querida — puxo-a para os meus braços, emocionada com suas palavras. Logo me afasto e
sorrio dizendo: —, eu também amo você, Marinne. Amo como se fosse do meu sangue.
Ela me dá um beijo no rosto e segura minha mão, puxando-me para o andar de cima.
— Vamos! Eu preciso te contar uma coisa também e quero que seja lá em cima. Não quero
que ninguém saiba.
Desconfiada, sigo atrás dela, até porque não solta minha mão e me leva para dentro do seu
quarto. Ela faz eu me sentar na cadeira da escrivaninha, fecha a porta e, quando se aproxima, me olha
ansiosa.
— O que é? Fala logo. Está me deixando nervosa.
— Eu... — engole em seco. — Eu fiquei mocinha. Fiquei menstruada pela primeira vez e isso
é horrível.
Meus olhos e minha boca se abrem em total surpresa.
— O quê? — Eu me levanto e vou até ela. — Você pediu a alguém para te ajudar na escola?
Caramba! Eu não estou preparada para ser mãe depois dessa bomba jogada nos meus braços.
— Na verdade, não. Eu... Não soube o que fazer. Estou usando três calcinhas porque fica
sujando e... Fica escorrendo. Botei papel higiênico também — sussurra cheia de vergonha. — E as
três calcinhas. Sabe, eu até tenho noção do que deve ser feito, uma prima minha me falou como foi
para ela. Mas eu fiquei com vergonha de pedir na escola.
— Marinne, você estuda em um internato de meninas. Elas iriam te ajudar, querida.
— É. — Dá de ombros. — Eu sei, mas é estranho e preferi falar com você.
Fico sem reação pela confiança dela em mim e sorrio com carinho pegando sua mão.
— Tudo bem. Eu vou te dar um absorvente, preparar um banho para você e é isso. Se você
sentir cólica, fala comigo. Cólica é... Uma dor aguda ou não, muito chata. Você entende um pouco
como funciona, não é?
— Sim — responde com um sorriso. — Eu sei como é que funciona. Aprendi na escola,
porém... Nunca tive orientação. Travis pode ter sido um pai para mim muito bom. Sempre atencioso e
cuidando de mim, mas ele não era muito...
— Eu sei, já entendi. — Dou uma risada. — É compreensível os homens serem um pouco
avessos nessa parte, por isso que uma mulher é fundamental na criação dos filhos, mais ainda das
filhas. Mesmo que alguns homens se esforcem bastante, algumas lacunas apenas uma mulher pode
ocupar. Mas está tudo bem. Eu estou aqui agora.
— É, você está aqui agora — ela diz com os olhos enchendo d'água e me abraça bem forte.
Faço o mesmo, fechando os olhos e escuto:
— Obrigada por ficar. Espero que você seja muito feliz com meu irmão.
Agradeço com um aceno de cabeça e a encaro.
— Eu já sou feliz, querida.
Essa afirmação é do fundo do meu coração e espero que a minha felicidade não mingue
quando ela souber que vai ficar noiva amanhã. Embora o casamento acontecerá apenas daqui a quatro
anos, os laços já estão ligados e a morte é a única forma de romper.
— Não temos o que discutir. Não vou mudar minha decisão — digo aos meus avós sobre me
casar com Madeleine.
— Você sabe que eu só não estou reclamando mais porque a família dela é da Camorra,
certo? — Vovó comenta se levantando do sofá. — Mas esse casamento foi a coisa mais burra que
você já fez, Travis Lozartan.
— Por quê? — esbravejo. — Por que eu não fiquei com quem meu pai escolheu? Desde
quando ele fazia as melhores escolhas? Foi tão esperto, que acabou morto pelo seu inimigo em uma
armadilha ridícula.
Vincenzo bate o copo do uísque na mesinha, que fica ao lado da poltrona, onde está sentado
confortavelmente com sua postura poderosa e uma das pernas jogadas sobre a outra, o pé sacudindo
demonstrando sua irritação. Ele não é meu avô nesse momento e estou lhe tratando assim. Foda-se!
Se ele quer bancar meu Boss que seja.
— Não menospreze seu pai dessa forma.
— Então não menospreze a minha escolha também. Eu sou bem crescidinho para saber
quando tomar esse tipo de decisão. Eu sei que um casamento em nosso mundo só termina com um
último suspiro. Vocês não precisam me lembrar.
— Travis Vincenzo Caputo Lozartan, não seja rebelde! — Giulia esbraveja.
— Sua avó tem razão e eu espero que você não esteja nutrindo sentimentos por sua noiva.
Cerro os olhos fitando meu avô, meu Boss.
— Sabe muito bem que, quando eles vêm, acertam em quem amamos.
— Como você sabe?
Ele fecha a cara e, se não fôssemos família, ele me acertava com uma faca no peito.
— Nós não estamos reivindicando seu casamento ou sua escolha de noiva — Giulia
intervém. Eles são um ótimo time, e Vincenzo prossegue:
— Nós estamos querendo saber o que vai fazer com as ameaças? Tudo indica que é por causa
de Madeleine, no caso Edgar. Você precisa encerrar seja lá o que ele acordou com a Bratva. Um
conflito pessoal com esses russos, filhos da puta, não é algo que queremos no momento. Nosso foco é
expulsar a Hechos de Nevada e abrir as estradas com a aliança feita com a Darkness. A Diabolos
está dificultando nossas mercadorias a chegarem em Montreal e eles atacaram um dos armazéns de
Colorado.
Cerro os dentes soltando a respiração.
— O assunto de Colorado vou tratar na sexta-feira. Vou fazer uma visita ao Underboss de
Denver. Tenho informações de que Costa está nos traindo.
— Com que interesse? — Vincenzo pergunta.
— Ainda vou descobrir, mas não acho que seja com a Diabolos. Anthony De Basso não está
forte no momento para comprar briga conosco. Ele já tem um grande conflito com a Darkness,
mesmo entrando em contato com Giovanni para uma aliança. Vocês podem ter odiado minha decisão,
mas ficar com Madeleine e concordar com a união do filho mais velho de Giovanni com Marinne, foi
a melhor situação para nós na guerra de território deles. Deixe que eles briguem entre si enquanto nós
crescemos.
Eles assentem e, mais calmos, voltamos a nos sentar no sofá.
— Soubemos que você atacou uns soldados da Hechos. Com que finalidade, Travis?
— Um Capo não pode se dar ao luxo de brigar desenfreadamente quando der vontade —
vovó completa o pensamento.
Eu não posso contar para eles que, no dia que fiz aquilo, eu estava puto com Madeleine. É um
sinal de fraqueza que eles irão arrumar um jeito de me ensinar a não repetir e extrair de mim. Prefiro
omitir.
— Eles tiveram o que mereciam. Estavam prestes a atacar um dos cassinos pequenos de
Paradise.
Vovó assente, embora seus olhos deixam claro que não acreditou.
— Quando você vai falar com Marinne sobre o noivado?
Ótima tática de mudar de foco. Giulia Caputo é de fato nossa Boss.
— O quanto antes. Giovanni e Amândio estão chegando.
— Por que estão vindo tão cedo? O acordo foi na segunda-feira — reclama como uma rainha
pedante que é.
Ergo a sobrancelha e me levanto, incomodado com a conversa.
— Não me importo e fui eu que os convidei para o jantar de amanhã. Quanto mais cedo
souberem que a Lawless e a Darkness estão se unindo pelo laço de sangue, melhor.
Eles concordam com um aceno e se levantam também.
— Agora nós temos todas as Famiglie da Itália na retaguarda — vovô diz abrindo um sorriso
maquiavélico de lado.
— Como se a ‘Ndrangheta desse a mínima para isso — minha avó ironiza. — Eles são
capazes de matar o próprio Boss se não estiverem satisfeitos e mesmo Vitorio Malvez sendo Capo da
Blood Hands, e representando-os nos Estados Unidos, se o Cassio decidir substituí-lo, ele fará. A
‘Ndrangheta é a Famiglia mais brutal e para nós será bom porque o pai de Giovanni é o Boss.
Espero que Cassio se apaixone por Marinne como todos, que sempre ficam encantados por ela. Se
acontecer, ele vai querer protegê-la, como se fosse sua neta de sangue.
As alianças e afiliações das Famiglie que nos transformam de inimigos a aliados, ou não.
Embora Cassio D’Ângelo seja o chefe da ‘Ndrangheta, a herança da Famiglia nos Estados
Unidos é a Blood Hands, comandada por Vitorio Malvez. Seu filho, Giovanni D’Ângelo, quando se
casou com a filha do antigo Capo da Darkness, ficou com seu posto quando o sogro morreu. Foi uma
bela jogada de poder.
Assim como a Lawless tem a Camorra e a Cosa Nostra, a Darkness tem mais de uma
origem, no caso são três, pois a Sacra Corona Unita se envolveu quando a irmã de Giovanni se
casou com o filho do Boss deles. A Darkness é a mais poderosa das Famiglie sem dúvida. Só faltava
a Camorra para eles, que agora terão quando Marinne se casar com Amândio. Para a Lawless é o
mesmo. Eu e Giovanni teremos as quatro Famiglie, mas isso não impede nada como minha avó
deixou claro. Os negócios da máfia são uma faca de dois gumes.
Minha cabeça está dando voltas com tanta informação. Ficar menstruada não me pegou tão de
surpresa quanto isso. Tentando me animar, pego meu iPod e coloco na última música da Taylor Swift,
que estou viciada. Ainda estou vestida com o uniforme do internato, apenas troquei minhas partes
debaixo e coloquei o absorvente, que é muito desconfortável. Vou comer primeiro e depois tomar
banho. Antes tivesse feito isso do que ir atrás do meu irmão.
Vendo uma sombra que a luz do salão principal da casa reflete, corro animada pensando que
é Travis saindo do escritório. Estou fingindo que não me interessa a conversa dele com vovô e vovó.
— Irmão! — exclamo assim que meus pés pisam na sala, mas me calo ao vê-lo.
Ele é alto, bonito, muito bonito. Deve ter uns vinte anos. Os olhos azuis inexplicavelmente
lindos e árduos. O gelo e a frieza emanam deles tanto quanto a beleza. A cor da sua pele me lembra a
do vampiro do meu livro favorito, Crepúsculo. Muito clara e aparentemente sem nenhuma marca pelo
rosto como meu irmão Colen, que tem uma cicatriz na lateral do rosto, fora suas tatuagens.
Suas sobrancelhas escuras estão unidas, o vinco no meio da testa, enquanto me encara em
silêncio. Seus cabelos são de um castanho-escuro com alguns reflexos capturados das luzes do
ambiente. São mechas naturais que não permitem seu cabelo chegar ao tom do preto e faz seus olhos
serem mais azuis do que o cinza frio.
Ele está vestido com um terno sob medida, como meu irmão usa – alta costura –, cinza
escuro, que combina demais com os olhos e o cabelo. A camisa por dentro é preta, o colete preto
também e a lapela possui uma tira vermelha escura, quase vermelho sangue, que lembra meu
uniforme.
O fato é que estou congelada na frente dele e não sei explicar o porquê que sua presença me
dá a impressão de posse.
Então... O estalo na minha mente acontece!
É ele!
O próprio.
Amândio D’Ângelo.
Meu coração bate tão forte que fico preocupada.
Os olhos dele são de uma profunda impassibilidade e distância.
Tento negar a mim mesma que não estou com medo, mas de nada vale, pois eu sei, com toda
certeza, que ele consegue sentir de longe. Ele foi treinado para ser o Capo no futuro. Um futuro não
tão distante. Um futuro que o transformará em meu marido também.
Engulo em seco com essa realização.
— Oi — ele faz o primeiro contato. Sua voz é baixa, rouca e, como presumi em tudo sobre
ele, intensa. Vigorosa.
Eu deveria respondê-lo. Fui educada perfeitamente, mas aqui, parada, não encontro minha
voz.
— Você é muda? — pergunta com um tom curioso. Se essa notícia for verdadeira, ele
morrerá. Não saberá como lidar.
Posso confessar que tenho vontade de rir. Primeiro porque ele não me ouviu falar o “irmão”
toda animada. E segundo, porque um Madman também se sente perdido às vezes. Eu sei disso mais
do que gostaria com três irmãos iniciados na Famiglia.
— Não sou não — esclareço negando com a cabeça.
Ele assente satisfeito, me olha dos pés à cabeça e é a primeira vez que sinto vergonha do meu
uniforme que tanto amo. A saia pregada em xadrez azul-escura com listras vinho e branco
combinando com o blazer azul royal que carrega o brasão da escola, a camisa de linho branca e o
lenço vinho amarrado no lugar da gravata. Eu sempre amei meu uniforme e agora estou envergonhada
por estar assim na sua frente.
Seus olhos me analisam e, quando volta a encontrar os meus, vejo algo passar por eles que
não sei identificar, mas tenho certeza de uma coisa: ele me acha uma criança. E eu sou mesmo uma.
Sou a sua futura noiva criança.
— Sabem que você está aqui? — indago aprumando a postura.
— Sim.
— Você está sozinho?
Ele franze mais a testa e dá um olhar rápido para trás de mim. Faço o mesmo e vejo um
homem de terno, camisa e gravata pretas, e um rosto mal-encarado, parado na soleira da porta de
casa.
— Buon pomeriggio, senhorita.
Reviro os olhos porque não entendo esse fascínio dos soldados de falarem comigo em
italiano e como se eu fosse uma princesa que precisasse de toda etiqueta. “Faltou a reverência”,
penso com sarcasmo.
— Eu sei falar em inglês perfeitamente, não precisa se esforçar falando comigo em italiano.
— Deixo clara essa informação porque, para início de conversa, só falamos em italiano quando
estamos perto de estranhos. — E boa tarde.
Pegando-me de surpresa ouço um riso atrás de mim e me viro para ver Amândio forçando-se
a ficar sério novamente.
— Bem, esperem aqui. Vou chamar meu irmão.
— Não precisa — Travis diz vindo do escritório com vovô e vovó.
Eles sorriem para mim enquanto andam até a mim. Meu irmão se aproxima, beija a minha
testa e murmura apenas para os meus ouvidos:
— Não era para você estar aqui sozinha.
Magoada, eu me afasto dele, franzo a testa e tombo minha cabeça para o lado, olhando-o com
um nítido ponto de interrogação na testa.
— Madeleine está lhe esperando na cozinha. Tem uma surpresa para você.
Eu sei o que ele está fazendo. O problema é que não sabe que eu sei do noivado. Que eu
suspeito que, provavelmente, ele vai me informar da sua decisão hoje ou amanhã. Acho que o anel
chega no jantar. Ou depois da sobremesa?
— Eu prometo falar com você depois, Marinne. Agora vá.
— Venha, querida. Vamos lá ficar com a noiva do seu irmão. — Vovó deixa escapar essa
informação com um tom severo.
Ela não parece ter gostado da decisão do meu irmão em se casar com Madeleine; na verdade,
ela quer deixar claro essa notícia para as nossas visitas. Que não tenho como saber a reação, pois
não volto a encarar Amândio.
Assinto para vovó e me afasto deles.
Enquanto ando pelo corredor morro de vontade de olhar para trás, confesso. Eu quero saber
mais sobre ele. Tudo o que sei são informações que estive ouvindo a conversa atrás da porta de
Travis e meus avós agora há pouco. O que eu sei não é muito bom. Amândio é tão perverso e mau
quanto Travis, e meu irmão não confia no seu temperamento, o que fez vovô reclamar sobre sua
decisão.
Ouvir aquela conversa me deixou nervosa. Saí correndo para o meu quarto de novo e prometi
que Travis não saberá que descobri antes de ele me falar. Vou fingir que não sei porque quero que
meu irmão continue confiando em mim. Que mantenha o laço entre nós forte para sempre. Forte até
eu... Ir embora.
Entro de cabeça baixa na cozinha e logo escuto Madeleine questionar:
— O que houve, querida?
Afasto-me de vovó, que me segura pelos ombros em uma tentativa de deter meus passos de
volta ao meu irmão e os visitantes, e praticamente me escondo nos braços da minha cunhada. Como
de costume, Madeleine beija meus cabelos e me protege, envolvendo-me com carinho.
Eu nunca vou conseguir agradecer ao meu irmão por ter escolhido ela para ser sua. Sei do
fundo do coração que meus sobrinhos terão uma mãe incrível. Uma que eu não tive e talvez por isso
me agarrei à noiva do meu irmão dessa forma. Ela era a peça que faltava no nosso tabuleiro.
É horrível quando me sinto perdido ou confuso, o que não acontece com frequência, ou
quase nunca. Mas ver aquela menina descer as escadas, deixou-me assim.
Eu me controlei ao máximo para não me aproximar mais do que os nossos padrões permitem.
A curiosidade foi grande para conhecer minha futura pequena noiva. A informação indulgente de que
ela é uma criança me atingiu horrivelmente.
Marinne Lozartan é tão jovem quanto a minha irmã Lianne. É muito bonita, e não me resta
dúvidas de que será uma linda mulher quando crescer, quando se tornar minha. Ela pareceu ser uma
doce menina, esperta e curiosa.
Será que terei problemas com a intensidade que vi refletir em seus lindos olhos azuis
escuros?
Não importa muito. Honrar meu sobrenome não é nada de mais. Eu serei o Capo e terei que
honrar meu lugar, honrar minha Famiglia. Dar meu sangue para a Darkness. Casar-me por
conveniência é apenas um acordo selado com sangue. Esse acordo que entrelaçará a Darkness na
Lawless.
Um bom negócio, eu não posso negar a evidência sobre o assunto. Papai é ótimo em fazer
acordos, e nesse eu sou sua carta na manga. Seu “Ás”, e a menina é a carta de Travis Lozartan, Capo
da Famiglia da Costa Leste. A questão é: ela se tornará uma “Rainha” ou apenas um “Ás” na manga
para mim.
Apresso meus passos quando vejo Marinne conversando com alguém, e minha paciência, que
já não é meu forte, some quando vejo com quem ela está falando. Eu posso nunca ter estado no
mesmo ambiente que Amândio, mas seu rosto não era desconhecido para mim. Eu não ia aceitar casar
minha irmã com alguém que eu nunca tinha colocado meus olhos.
Espero Marinne se afastar com Giulia para direcionar minha atenção para Amândio. Não
gostei nem um pouco de vê-lo com minha irmã sem a minha presença. Eu sabia que evitar o encontro
deles hoje à noite era inevitável, mas eu queria ser o único responsável por esse encontro. Queria
estar junto e ver como ele se comportou, o que falou.
Malditos sejam meus avós por terem me prendido no escritório. Por culpa deles não consegui
ver a reação de Marinne, no entanto, de Amândio, ele parece curioso. Seus olhos não se desviaram
ainda do corredor onde minha irmã desapareceu na companhia da minha avó. Queria saber o que está
pensando.
Como os nossos protocolos pedem, Vincenzo dá um passo à frente, aproximando-se de
Amândio e estende a mão.
— Você deve ser o filho do Giovanni.
— Sim. O próprio: Amândio D’Ângelo — ele fala com muito orgulho seu nome e nitidamente
não é nem um pouco condescendente.
É óbvio que ele não se sente confortável. Age como estivesse em território inimigo. Podemos
ter um acordo de paz, mas nosso comportamento sempre será de cautela e ataque. Fomos criados
para sermos assim, porra. Embora, sendo franco, meu avô e meu pai, e eu no momento, nunca tivemos
cobiça pelos territórios da Darkness. Talvez nós ficamos de olho nos territórios da Diabolos e da
Bratva, mas a Darkness fica do outro lado do país e não representa perigo para nós.
A aliança que fizemos com os D’Ângelo é para fortalecimento de nossas estradas, alianças
políticas, vendas de armas e uma força maior no sindicato dos taxistas e operários. As Famiglie
sempre estiveram envolvidas em empreiteiras e muitas ruas realmente são nossas.
Ter Nova York como uma cidade aliada é muito bom. Melhor ainda porque necessariamente
encurralamos a Blood Hands. Chicago agora fica entre nós. E com Cassio D’Ângelo sendo sogro da
minha irmã e Boss da ‘Ndrangheta, acho muito difícil Vitorio Malvez tentar alguma coisa contra nós.
Antes ele não pensava em tocar na Darkness, e com Giovanni do meu lado, Vitorio ficará mais calmo
e a raiva que ele nutre pela Lawless crescerá um pouco mais agora.
Contudo, a Diabolos e a Blood Hands ficaram ainda no meu radar. Eles sempre foram e
provavelmente sempre serão meus inimigos.
— Seu pai não veio — pronuncio finalmente quando acabo de analisar a situação.
Amândio direciona o olhar frio para mim, as pálpebras tremem com desgosto aparente e
responde:
— Algum problema ele não vir?
Respiro fundo, segurando o ar e sentindo um aperto na garganta pela minha tentativa de
controlar meu aborrecimento.
— Não — devolvo. — A pergunta foi porque seu pai confirmou presença.
Ele é petulante, seus olhos brilham com um aviso nítido de que o pai pode não estar presente,
mas que ele dá conta de mim.
É bom saber que minha irmã vai se casar com alguém parecido comigo. Espero que dentro de
casa ele também seja igual e é isso que vou descobrir esta noite. E se ele não for, antes de pensar em
quebrar minha irmã, eu o quebro primeiro.
— Meu pai não pôde vir, então eu vim, apenas. Tem algum problema nisso?
— Claro que não. É bom que assim você já conhece a família e conheço você.
Ele exala e, por sua postura, se irrita. Balançando a cabeça, diz:
— Acho que é uma boa oportunidade.
Um silêncio recai sobre nós. Espero alguma pergunta sobre Marinne, mas, pelos nossos
costumes e o protocolo em mantermos as aparências civilizada, ele dispensa uma pergunta. Aprecio
seu sinal de respeito em minha casa.
— Vamos ao meu escritório. Temos alguns assuntos de negócios para falar.
Ele concorda com um aceno, me segue e seu segurança vem atrás. Meu avô me direciona o
olhar. Sua expressão está sombria e eu prefiro ignorar. Tem algo passando em sua mente, que eu nem
quero saber. A minha preocupação é como minha irmã vai reagir e quero lhe dar a notícia antes do
jantar.
Hoje Amândio apenas vai conhecê-la, como eu também estou fazendo. O noivado vai
acontecer quando ela fizer quinze anos, daqui a dois meses.

Minha irmã está na minha frente. Em silêncio, apática e neutra. Acabei de lhe dizer minha
decisão. Ela não me interrompeu uma vez sequer. Ficou quieta e agora eu não consigo enxergar o que
está passando em sua mente.
Mascarar suas emoções foi algo que ela aperfeiçoou sozinha. Eu nunca a ensinei a esconder
nada de mim. Principalmente o que está sentindo.
— Marinne? — chamo-a baixo.
Ela pisca os olhos e olha para Madeleine antes de ir para os braços dela. Eu sempre soube
que lhe faltava carinho de mãe, de uma mulher por perto. Minha avó nunca se esforçou para estar
conosco, com a neta que perdeu a mãe tão jovem. Agora minha mulher faz o papel de mãe e lhe
agradeço com um olhar.
— Querida, não vai ser agora — Madeleine cochicha no seu ouvido, afagando suas costas.
— Você ainda ficará muito tempo conosco. Está triste?
Marinne respira fundo, se afasta e responde:
— Não. Não estou triste e nem surpresa. — Olha para mim. — Eu já esperava isso. Nasci em
uma família de peso, seria hipocrisia imaginar não esperar por isso. Não estou com raiva de você,
irmão. — Caminha até a mim e eu pego suas mãos. — Não precisa me olhar assim. Eu nunca vou te
odiar — murmura e seus olhos ficam marejados.
Porra! Ela foi meu primeiro ponto fraco. A primeira pessoa que precisei mascarar o que sinto
para os meus inimigos próximos. Não sabemos em quem confiar. A única que sabe o quanto prezo
minha irmã é a mulher que também tem os olhos brilhando pelas lágrimas não derramadas.
Meus passos levam até ela, assim como os seus. Abraço-a bem forte e beijo seus cabelos.
— Você é meu orgulho. Lembre-se sempre disso. Você sempre terá uma parte de mim onde
quer que vá. Sempre será meu orgulho, bambina mia.
Ela concorda com um aceno e suas lágrimas deslizam livre por seus olhos, que vejo uma
fortaleza.
Hoje eu acordei animada. Sei que o tempo todo meu sorriso estava estampado em meu rosto,
acompanhando-me em todos os cantos da casa enquanto eu ajudava as meninas a deixar o jantar todo
preparado e perfeito.
Desde o café da manhã já pensava no jantar que preparei ao ar livre, em frente à piscina da
casa e o imenso jardim. Mandei prender os cachorros para não atrapalhar e não ter nenhum acidente.
Roxy e Belfort são muito violentos. Dos Rottweilers, eles são os mais perigosos. Nem os
Dobermanns são tão maus.
Não sei explicar direito. Sinto-me obrigada a fazer um jantar bonito, uma reunião entre a
família e amigos organizada e perfeita.
Estou fazendo um grande esforço por causa dos avós de Travis. Não estou nem aí com os
outros convidados, quero é agradar quem, para todos os sentidos, são meus sogros. Acho que, na
verdade, eles são até mais do que a representatividade dos pais de Travis. Giulia e Vincenzo
Lozartan são os verdadeiros rei e rainha de Las Vegas. Eles só estão aposentados, mas não deixam de
mandar. Sei que Vincenzo é o único capaz de parar ou de deter uma ação de Travis. E por isso que
quero que eles apreciem minha presença como nova membro do clã Lozartan.
O que não pareceu ter acontecido ontem. Eu não sou um Madman, mas consigo enxergar
quando está tão evidente na expressão de alguém, que eu não sou bem-vinda. E não estou fazendo um
grande esforço porque gosto deles, é por causa de Travis. Eu não quero que ele se aborreça com os
avós também, já não basta Paolo no seu pé.
Consigo entender os dois lados. Casar comigo teve seus problemas e não tem nenhum
benefício tático, não por agora, talvez no futuro. A Famiglia é muito boa em encontrar saídas quando
estão encurraladas.
Meus pensamentos são interrompidos quando vejo uma sombra se aproximar de mim na
varanda do terraço da casa, onde ajeito os lugares na mesa. Vamos comer aqui fora e aproveitar o
clima gostoso que está essa noite, sem contar que na sala de jantar não caberia todo mundo. A
pequena reunião virou uma verdadeira festa.
— Você hoje não parou.
O comentário me faz rir e eu me viro para encarar Travis. Ele não tenta me abraçar ou tocar,
muito menos me dar um beijo. Estamos fingindo que somos os típicos noivos da Famiglia. Os
protocolos pedem uma postura mais elegante. Uma gigantesca hipocrisia são as “morais” e bons
costumes da Famiglia.
Sorrio e me aproximo, não demais.
— Espero que você não esteja me dando esporro por estar cuidando da casa.
— É claro que não estou brigando com você por estar cuidando do jantar e da casa. — Ele
coloca as mãos nos meus ombros. — Só não quero que você se esforce tanto e fique com esse olhar
de preocupação. Está tudo bem.
— Não está tudo bem, Travis. — Afasto-me dele. — Eu sei que os seus avós não gostaram
tanto assim de mim.
— Eu não me importo. — Ele fica perto de novo e toca meus ombros. — Você já é minha
mulher, eles apenas têm que ouvir e calar. Não tem que aceitar ou reivindicar. — Seus olhos ficam
escuros, severos. — Esse assunto morreu.
Oh, como ele é maravilhoso e intenso! Eu o beijaria agora. Mas quando olho para as portas
francesas, que dão para onde estamos, sou obrigada a me afastar.
Abro um sorriso simpático vendo Paolo chegando até nós, conversando com uma mulher
muito bonita. Extremamente bonita.
— É a esposa dele — Travis informa como se lesse meus pensamentos.
Uau! Ela é encantadora, tem a pele alva quase da cor do seu vestido branco e ainda bem que
ela usa um casaco vermelho sangue, senão ia pensar que estava vendo um anjo de cabelos loiros
cacheados e olhos amigáveis. E acho que ela está tão bonita por estar grávida. É inevitável não
perceber. Sua barriga está enorme. Provavelmente está perto do nascimento.
— Então ele gostou — o comentário de Paolo faz Travis resmungar.
Pisco sem entender e ele direciona um olhar frio ao seu Consigliere. Paolo deve estar
falando do avô de Travis. O que indica que ele ouviu algo quando chegou na casa. Eu gostaria de
falar para ele que todos irão me aprovar. Irão engolir suas palavras ruins sobre mim. Você vai ver,
seu idiota! Mas eu só o encaro em silêncio.
— Boa noite. — A voz doce me rouba atenção. — Eu sou a Mia e você deve ser a estimada
Madeleine.
Estimada? Sorrio para ela, por educação, embora esteja sem jeito pelo elogio e me aproximo
para trocarmos um beijo no rosto uma da outra.
— Sou eu mesma. É um prazer conhecê-la.
Mia contempla meu rosto por longos e esquisitos segundos, e sorri.
— Parece que daqui a pouco alguém chegará ao mundo — comento para quebrar o clima
estranho.
Ela pisca os olhos, ainda amáveis e alegres, e assente para o marido quando fica ao seu lado.
Paolo a olha com tanto carinho, que nem disfarça. Eu sabia que ele tinha um coração. Vi naquela vez
que estava fazendo compras com Marinne.
— Sim. Ela está eufórica para chegar.
Paolo balança a cabeça em um aceno e seus olhos afáveis mudam quando me encontra. Okay,
já aceitei que ele precisa ser terrível para todos menos para a esposa. Eu posso lidar com isso.
Travis não é diferente.
— Como ela vai se chamar? — pergunto olhando para a Mia, porque não sou obrigada a
aturar a carranca desse homem.
— Sophia. Era o nome da minha mãe.
— É lindo. Parabéns pelo bebê. — Espero que Paolo esteja de verdade feliz por ser uma
menina. Eu sei como os homens da Famiglia são aficionados em meninos.
Mia sorri com carinho e Paolo agradece com um aceno. Travis coloca a mão na minha
lombar e pede licença. Orazio e a família chegaram. Bárbara está com um sorriso gigante estampado
no rosto, fora a expressão de contentamento bêbado. Ela sempre fica assim na presença de Enzo.
— Boa noite, Travis. Madeleine — Orazio cumprimenta primeiro e depois sua esposa nos
cumprimenta com um aceno e o filho também.
Bárbara quebra a etiqueta, passando por todos, cumprimenta rapidamente o Capo com um
“até loguinho”, e chegando até a mim me abraça. Internamente, estou dando uma gargalhada. Travis
cerra a mandíbula olhando, mas não parece zangado como Orazio, que teria puxado a filha o mais
longe possível se estivesse a sós.
Limpo a garganta e recuo um passo, assim como todos. Travis aperta a mão de Orazio e o
chama para conversar a sós. Eles vão se juntar a Paolo e Vincenzo, que passa por nós sem ser
notado. A mãe de Bárbara vai até Mia e Giulia, do outro lado da piscina com Marinne entretida com
a conversa. Sorrio pelo simples fato de ela parecer estar se divertindo.
— Que cara é essa?
Franzo a testa e olho minha amiga.
— Que cara? — ironizo.
— De... Mãe? — Ela fica mais perto e cochicha: — Você está grávida, Madeleine futura
Lozartan?
— Porra! — abafo o máximo minha voz e puxo-a para o canto longe de Dario e Gabriel,
irmão dela. — Você quer uma guerra nesse jantar? Não fala besteira!
Bárbara ri como se não pudesse causar um grande problema com suas brincadeiras. Eu não
vou ficar policiando-a. Já é bem grandinha e se, nem depois da conversa que tivemos, não consegue
se controlar nos eventos onde membros da Famiglia estão presentes, eu lavo minhas mãos.
— Calma. Desculpa, Made — pede porque deve estar nítido em minha expressão que não
gostei.
— Eu sei que você é assim, mas não faça brincadeiras como esta e eu... Só estou feliz por
Marinne.
Ela franze a testa e olha para a minha cunhada.
— A menina está fofa e linda como sempre. Marinne nem parece ter sido criada pelo homem
que tem um apelido tão fofo como “Cruel” ou “Mata rindo”. Ela é a princesa de Las Vegas.
— Sim, ela é uma princesa. — E torço para que se torne uma rainha em Nova York. Ela não
merece menos do que isso.
— E você, está feliz? Vi que fez um belo trabalhando na decoração nova da casa e de natal,
diga-se de passagem.
Suspiro e encaro minha amiga.
— Obrigada e sim. Eu estou feliz e curiosa para saber o porquê você estava dando aquele
sorrisinho quando chegou.
— Ah... — Cruza o braço com o meu. — É porque você e Travis formam um casal lindo.
Sério, vocês são “O casal”.
Reviro os olhos e um burburinho chama nossa atenção. Viro-me e vejo Travis embaralhar
cartas de baralho na mesa com os homens com toda sua maestria. Ele é o dono do cassino mais
aclamado de Las Vegas. Seus talentos para jogos são invejados, e os jogos mentais detestáveis. Ele
mexe com as emoções dos seus inimigos com o mesmo ímpeto que faz com as cartas.
— Para ele ser perfeito só precisava não ser um assassino, fora isso... — Bárbara cochicha
no meu ouvido: — Você é uma sortuda.
Eu, com certeza, concordaria com ela ontem. No tempo onde eu realmente odiava tudo que
me cerca. Mas acho que as minhas crenças estão cada vez mais falidas. Não quero mais apertar essa
tecla. Não quero mais reivindicar bondade em um mundo de pecados. É tolice demais.
— Você não vai concordar comigo?
Deixo de encarar meu noivo e olho para Bárbara.
— Ele é perfeito — afirmo com toda certeza. — Não tem nada nele que eu tire ou não goste.
Eu o amo do jeito que é.
— O amor é cego ou você agora gosta do que somos?
— Do que vai me valer ficar falando isso o tempo todo? — Elevo minha sobrancelha direita.
— Chega! Eu não quero mais ficar sendo uma pessoa do contra, reclamando sem parar sobre algo
que não vai mudar. Tudo ainda é errado, tudo ainda é um pecado e todos nós vamos para o inferno,
mas é isso. — Dou de ombros. — Eu decidi que, a partir de hoje, eu não vou mais ficar pensando
nos pecados do nosso mundo. Tudo o que eu quero é viver em paz, viver todos os dias que estão no
meu destino.
Acho que minha amiga perde a fala pela primeira vez na vida. Mas como sempre não dura
muito e logo ela abre um sorriso como um gato que vê um canário dando mole.
— Uau! Quem é aquele ali?
Viro-me para onde seus olhos contemplam alguém e vejo Amândio parado com o segurança,
que não sai de perto, na outra porta que traz para o terraço. Ainda não trocamos nenhuma palavra. Eu
só o vi ontem antes de ir embora e muito rápido. Trocamos um simples boa noite e até amanhã.
Colocando meu sorriso cordial, vou ao seu encontro. Acho que é uma boa oportunidade de me
apresentar de verdade.
— O que você está fazendo? — Bárbara pergunta puxando meu braço, mas eu o puxo de volta
e a ignoro.
Eu sei o que ela está fazendo. Me deter de ir até o convidado antes de Travis, mas o próprio
disse que eu sou dona da casa também.
Aprumando a postura, paro na frente de Amândio. Ele me olha de cima a baixo, analisando
do mesmo jeito que Travis faz, tentando enxergar meus pensamentos através dos meus olhos.
— Eu sou Madeleine Beluzzo. É um prazer conhecê-lo.
— O prazer é todo meu, futura Sra. Lozartan.
Agora eu abro o sorriso de gatinho que pescou o canário. Ele é perspicaz e espero que
Marinne saiba ser forte e lhe dê trabalho, pois ele vai fazer o mesmo. E preciso concordar com
Bárbara, ele é muito bonito e muito parecido com Travis, que comentou comigo que o apelido de
Amândio é “Wolf”. Imagine a Chapeuzinho Vermelho encantada pelo Lobo mau, que se disfarça de
vovozinha para dar o bote de surpresa. Nesses olhos cinza, eu consigo ver esse lobo solitário que
gosta de atacar. No entanto, ele não me causa medo, o que é bom. Espero de verdade que Marinne
seja com ele o que foi criada para ser: uma mulher destemida.
De repente, sua postura muda e eu nem preciso me virar para saber que Travis está atrás de
mim
— Que bom que se juntou a nós.
— Eu estava dando boas-vindas a ele — digo para meu noivo.
Amândio olha para Travis, depois para mim e Bárbara, que está quase babando pelo noivo
de Marinne, que ninguém vai ficar sabendo até ela fazer quinze anos. Esta noite ele é apenas um
convidado da nossa mais nova Famiglia aliada.
— O jantar já será servido. Sinta-se à vontade. — Viro meu rosto para Travis. — Eu vou lá
dentro.
Assentindo, ele se afasta de nós. Bárbara sorri e faz o mesmo. E Travis faz questão de me
levar até a porta.
— Por que você chegou até ele antes de mim?
— Eu também tenho direito de conhecê-lo e saber quem ele é. Fora que você disse que a casa
é minha também.
Seus olhos brilham e ele sorri sombriamente. Ele gosta que eu seja assim.
— O que você achou?
Suspiro antes de responder:
— Ele é muito parecido com você e... Parece que o apelido cai muito bem.
Travis move as sobrancelhas sugestivamente.
— Eu não sinto medo dele ou arrepio, como o resto dois homens que estão presentes essa
noite. Embora não tenha sido de fato algo genuíno, foi uma ótima escolha para Marinne.
Ele assente, concordando e não aperto sua mão, porque alguns olhares estão em nós. Dou um
passo atrás, movendo-me para não ficar tão perto.
— Conversamos melhor depois — ele avisa, pois deve estar vendo meu desejo de ficar
perto. De falar com ele como homem e mulher, sem essa etiqueta toda.
Quando todos estão na mesa, tenho a sensação estranha de que uma tempestade se aproxima.
Olho para cima e apenas vejo estrelas em um céu limpo. Pisco e baixo a cabeça encontrando os olhos
atentos de Travis em mim, sentado à cabeceira da mesa como seu avô do lado oposto. Os dois
líderes, os dois reis em seus lugares. Abro um sorriso para ele lhe informando que está tudo bem.
Está tudo bem, Madeleine.
Suspiro e volto a comer. Enquanto mastigo fito todos à mesa tão polidos, até Luca. Ele
sempre é uma figura engraçada na mesa e em silêncio. É tão grande e bruto com suas diversas
tatuagens espalhadas pelo corpo. Umas delas são aterrorizantes, como a que fica nas costas da mão
direita. É um sorriso macabro e toda vez que ele coloca a mão na direção da boca, é ao mesmo
tempo assustador e engraçado.
Luca sente que estou olhando para ele e cerra os olhos para mim. Sou obrigada a desviar o
olhar e flagro o exato momento que Amândio tem o rosto virado para Marinne, e ela para ele com um
pedaço de peru preso pelo garfo em seus lábios. Ela está tão imersa nele, que não nota a comida
caindo no prato de volta. Limpo a garganta, chamando sua atenção e ela finalmente olha para a frente,
para onde estou sentada. Bem na sua frente. Eu coloquei Amândio duas cadeiras depois de mim para
ficar perto de mim e Travis, não para ela. Como eu não pensei nisso?
Marinne engole em seco, visivelmente, e pega o pano de prato para limpar a boca. Está
envergonhada e não acho que estava olhando para o garoto com maus pensamentos, e nem ele. Na
verdade, existe curiosidade e não é para menos.
Por precaução direciono meu olhar para Travis, mas graças a Deus ele está comendo em paz.
Duvido que sua mente esteja vazia, mas pelo menos ele não estava focado em Amândio. Sorrio para
ele quando franze a testa para mim.
Ai, Dio mio! Acaba logo com esse jantar!

Depois de um jantar um pouco atípico e constrangedor, estou deitada na cama e, pela


segunda vez, em meu quarto. Por causa de Vincenzo e Giulia, estou sem meu amado. É a segunda
noite sem ele e estou morrendo de saudade de sentir seus braços me envolverem durante a noite e,
claro, o sexo.
Estou tentando ler um livro, no entanto estou dispersa demais quando a porta do quarto é
aberta. Meu coração bate mais forte vendo Travis ainda vestido com a roupa que escolheu para o
jantar: calça e camisa social, colete e paletó, tudo preto e sem gravata. Está de arrancar o fôlego.
— Pensei que estaria dormindo.
— Então por que veio? — zombo e solto uma risada.
Ele apenas mexe as sobrancelhas e o vejo tirar o paletó, o coldre (é claro que ele estaria
armado com tantos homens dentro de casa). Enquanto abre o cinto desabotoa a camisa com o colete e
tira os sapatos sem tirar os olhos de mim. Mordo meus lábios, escondendo meu sorriso e o vejo ficar
lindamente nu.
Caminhando até a cama, coloca o celular na cabeceira – faço o mesmo com meu livro – e
torço a boca vendo-o colocar junto do aparelho uma arma. Geralmente ele não faz questão de deixar
uma por perto, mas hoje é realmente uma noite incomum.
Sinto o frio na barriga quando levanta a coberta e puxa meu corpo para junto do seu.
— Mm... Amor... — gemo baixinho e seguro seu rosto.
— O que foi? — Como sempre, ele enxerga muito bem minhas emoções.
— Estava pensando em você. — Envolvo sua cintura com minhas pernas e arranho seus
ombros. — Estava zangada porque não ia dormir com você de novo.
— Mas não vai — sentencia.
— E seus avós? Eles vão reclamar depois.
— Foda-se! É a minha casa, são as minhas regras. E você é toda minha essa noite. Eu não ia
viajar, provavelmente, ficar mais de uma noite longe de você sem antes deixar uma marca minha
dentro... e fora de você. — Assim que as palavras deixam sua boca sinto uma mordida no meu
pescoço.
Jogo a cabeça para trás e imploro em silêncio para que tire minha roupa. Mas, para o meu
azar, ele se afasta um pouco e me encara acomodando o corpo sobre o meu.
— O quê? — Franzo a testa.
— O que você achou de Amândio? De verdade.
Respiro fundo e preferia que ele não tivesse terminado a frase pedindo minha sinceridade.
— Ele parece... Bom. E reparei que Marinne não chegou perto dele.
Pode ter sido assim, contudo seus olhos não fizeram o mesmo.
— Sim, eu falei para ela não tentar nada.
— Por quê?
— Agora não. Hoje não era o momento para eles interagirem.
— Tudo bem. Eu imaginei que você tinha falado com ela e... Talvez com ele?
Travis cerra a mandíbula.
— Falei para ele esperar. Que não queria assustar Marinne porque ela é muito nova.
— Acho que você está com ciúme — sussurro e rio.
Ele resmunga e sai de cima de mim, deitando-se do meu lado jogando o braço em cima do
rosto.
— Pode ser.
Não controlo minha gargalhada e vou ficar em cima do seu corpo. Tiro a mão do seu rosto e o
beijo.
— Vai ficar tudo bem. Eu acho que ele não está com más intenções, ou é um daqueles homens
que tem reputação de maltratar as mulheres?
— Não, ele não é e eu já tinha me certificado disso. Jamais deixaria ela se casar com um
homem assim. — Sério, ele fita meu rosto. — Pensei que você confiaria em mim ao ponto de saber
que eu não faria isso.
— Sim! É claro. — Coloco minhas mãos sobre seu peito. — Eu só fiquei surpresa. Ele
parece que vai ser um bom marido, pelos nossos meios, é claro. A gente não pode esperar
relacionamentos amorosos, mas, pelo menos, que haja respeito.
Ele concorda com a cabeça em silêncio. Talvez ele não queira ferir meus sentimentos.
— Ah... Tenho uma coisa pra falar. Não deu para a gente conversar ontem, hum...
— O que foi?
— Marinne hoje ficou mocinha. Sabe... Se tornou uma mulher.
Como um flash vejo o pânico em seus olhos. É fofo e engraçado.
— Mas está tudo bem, Travis. Ela só está passando por um pouco de dificuldade sobre as
mudanças, o medo... e a novidade. De resto, tudo okay.
— Obrigado por cuidar dela. — Afaga minhas costas. — Você chegou em uma hora muito
boa nessa casa.
— Acho que sim — murmuro e pisco o olho direito. Jogo-me nos seus braços, que ele logo
envolve meu corpo. — E estou tranquila com Amândio. Não acho que vai ser como Orazio, que pode
não bater na esposa e na filha, mas é aquele tipo de homem que não dá valor a mulheres. Ele é um
babaca e não gosto dele por isso. Meu pai era assim e eu sofri.
— Também não gosto dele, e por outros motivos também, afinal de contas a minha mulher é
muito inteligente para ser desprezada.
Abra um sorriso como uma boba pelo elogio e dou um beijo na sua boca.
— O meu homem também é muito inteligente e eu gosto de te chamar assim — murmuro
fazendo charme com os olhos.
— Também gosto que me chame assim e eu quero pedir um favor a você.
— Um Capo me pedindo um favor? Dio mio! Como estou importante.
Pegando-me de surpresa, Travis gira nossos corpos, deitando no meio da cama e me cobre
com seu calor; antes de falar, me dá um beijinho.
— Talvez ele peça vários favores, mas esse vou pedir porque, se Marinne fosse minha filha,
e você, no caso, a mãe, eu acho que você tinha que estar junto.
— Então, quando a gente tiver filhos, você vai querer que eu fique quando falar com eles? —
Meu coração dispara em tocar nesse assunto, só que porque vamos fingir que nunca vai acontecer.
— Eu quero. Dependendo do assunto, quero você presente. Principalmente quando for uma
menina. Acho importante você estar junto.
— Então, quando for os meninos, eu não vou poder me meter?
— Não vamos brigar por uma hipótese que ainda está um pouco distante de acontecer.
— Mm.... Está bom, eu vou deixar passar, mas eu vou querer me envolver tanto para os
nossos filhos como para as nossas filhas. Saiba disso.
— Tudo bem. — Ele me dá aquele meio sorriso convencido e assente. — Enfim, amanhã
quando eu for para Denver, quero que fique de olho em Dario. Consegui finalmente tê-lo de volta em
casa e preciso que alguém, sem ser os homens, vigie e cuide dele. — Faz uma pausa. — Ele também
não teve muita atenção da minha mãe. Ela já não andava bem desde que ele tinha três anos.
— Quantos anos ele tinha quando ela morreu?
— Ia fazer seis.
A resposta é fria e por isso não aprofundo o tema. Sorrio e continuo ouvindo.
— Sinto que Dario precisa de atenção feminina. — Me olha nos olhos com uma sugestão
clara.
— Acha que ele pode ficar com ciúmes de eu ser tão chegada a Marinne e não a ele? Se for,
eu não tenho culpa. Não tivemos muitas oportunidades de conviver nesses longos seis meses que
estou aqui.
— Eu sei. — Solta a respiração pelo nariz. — Se você não quiser...
— Não disse isso — interrompo-o. — Eu vou ficar feliz de me aproximar dele e, quem sabe,
ajudar. Ele parece ser um bom garoto. Acho que apenas está solitário, talvez confuso.
— É, deve ser isso e eu pensei que como você é atenciosa com Marinne e, sem perceber,
ajudou com sua presença quando falei do noivado. Ter você comigo foi bom. Tudo porque ela gosta
de você e confia em você, tanto que falou sobre a menstruação. Creio que você é muito importante
para ela, assim como eu também. Então, pensei que pode funcionar com Dario. Ele não é mais um
menino, tem dezenove anos, porém nem parece. Você vai ver e acredito que será muito boa a sua
aproximação dele. Vai me ajudar a entendê-lo.
Fico emocionada por ele me ver dessa forma e seguro o seu rosto.
— Eu vou estar com você e quero que ele fique bem. Seja forte, focado e lhe dê orgulho
como Marinne.
— Ele já faz. Todos os meus irmãos.
Passo o polegar por cima da sua sobrancelha.
— Amo isso em você. Esse cuidado com seus irmãos. A fera que habita em você se acalma,
se transforma de perigosa para protetora, e não estou dizendo que é menos brutal.
Suas pupilas dilatam e as mãos apertam meu corpo, relembrando-me sua nudez e meu desejo.
— Não só por eles — Travis balbucia, com a voz rouca e deliciosa.
Gemo excitada com esse lado protetor, dominador e que é meu também.
— Essa parte sua é a que mais amo. É a que eu quero conquistar inteiramente.
O brilho no seu olhar, o jeito que aperta a mandíbula e se afasta para arrancar minha
camisola, rasgar minha calcinha e, por fim, entrar em mim, é a resposta que preciso. Não é ilusão
minha.
Sua boca encontra a minha sedenta, desejosa e beija meus lábios de leve antes de aprofundar
e sua língua tocar a minha, causando estímulos elétricos em meu sistema nervoso.
Eu me farto da sua boca.
Mergulho no prazer do seu pau dentro de mim.
Em suas mãos em cada parte do meu corpo.
Amo seus sons, suas investidas, sua posse sobre mim. Não ligo mais. Abri mão porque eu me
encontrei nele. Na sua escuridão, me afoguei. No seu pecado, me rendi. No seu poder, me apaixonei e
reacendi. Aprendi a ser mais eu, a ser mais luz para iluminá-lo. Eu sou dele. Ele é meu.
O avião aterrissa em Denver e eu saio logo que as escadas descem. Avisto de longe o
Consigliere, Amauri Rugerri. É nítido sua ansiedade. Ele já sabe para que eu estou aqui e espero que
não seja um dos traidores, porque vai me dar muito trabalho ter que conseguir um Subchefe e um
Consigliere com urgência.
— Talvez nós precisamos ir até Aspen e pedir para Andrea Santoro comandar Colorado com
seu Consigliere. Não posso deixar a cidade sem supervisão e nem os clubes e hotéis — comento
para Luca, que me espera nos pés da escada.
Ele pega minha maleta enquanto visto o sobretudo. Saí com tanta pressa que não coloquei e
essa merda de estado é sempre mais fria que a maioria, sem contar que, às cinco da manhã, o sol
ainda não atingiu o chão.
— Você acha que vai ter necessidade? Ele pode parecer que está calmo, mas tem muito medo
dentro desse italiano loiro.
Luca sempre tira sarro dos homens loiros, principalmente os que parecem impecavelmente
limpos e passados. Não existe uma dobra em sua roupa. Amauri parece um modelo, alto, magro e
todo certinho.
Se o que o meu Cinistro está falando for verdade, fica melhor a nossa “reunião”. O único que
preciso castigar será Costa e, claro, todos os outros que se renderem ou morrerem.
— Travis — Amauri me cumprimenta baixando a cabeça de forma respeitosa e depois com
um aperto de mão. — Fez boa viagem?
Sempre começa com papo furado. Seja descontraído. É um dos ensinamentos.
— Fiz sim e o que eu quero agora é um bom Bourbon com gelo e falar de negócios.
— Claro. Vamos até o clube.
Colorado não é um bom lugar para investir em cassinos. Claro que há muitos lugares com
jogos, prostitutas e jogatina, mas o forte de Denver e Aspen são os hotéis e clubes, melhor ainda
quando se tem um grande Hotel Club. Amauri comanda o maior de todos e mais procurado da cidade.
Ele é o braço direito de Costa, meu infeliz Underboss, e obviamente sabe de tudo que acontece nesse
território.
Entro no carro vendo que Luca não permitiu ninguém ser responsável por meu transporte, a
não ser ele mesmo. Está fazendo seu dever e querendo mostrar serviço. São meus homens, mesmo
assim não confio ao ponto de acreditar que eles não poderiam colocar uma bomba no motor. Isso já
aconteceu. Basta falar, ter a proposta e quantia certa.
Espero o carro se movimentar para analisar o humor de Amauri. É fato que ele está nervoso e
ansioso com a minha visita. O chefe geralmente vem a outro estado quando tem problemas de roubo,
trocar seus homens de posto, funeral ou para festas. Não posso dizer que estou feliz em estar aqui
pelos motivos que me trouxeram.
— Como estão as coisas no clube? No último relatório pareceu estar com um bom aumento
de clientes.
— Sim, teve um aumento por conta do salão de beleza e eu já queria falar com você sobre
aumentar o espaço da área de lazer. Talvez uma academia seria uma boa ideia também.
— E por que que você não falou isso diretamente com Costa? Ele é o seu primeiro chefe.
Ele fica pensativo, pontuando a melhor resposta e me controlo para não lhe dar um soco.
— Fala logo de uma vez. Você sabe para que eu estou aqui. Ele não vai sobreviver de
qualquer forma mesmo. Qual é a reclamação?
Amauri pode tentar se esforçar ao máximo para fingir que está tranquilo e que dedurar o seu
chefe é fácil, porém percebo que não.
— Costa não estava se interessando muito mais pelo La Mama Hotel. Ele queria saber
mesmo era das vendas de drogas e, como você já sabe, ganhando dinheiro por fora. Eu não preciso
esconder os fatos. Ele estava negligenciando a Lawless e, com o dinheiro extra, pouco importava os
negócios de Denver.
— Ok. Agora me responde se eu posso confiar em você. — Abro o paletó deixando que ele
veja as armas presas no meu coldre. — Você trabalhava para ele. Era seu braço direito, será mesmo
que não sabia de tudo? Por que não me falou antes?
— Não tem muito tempo que eu descobri e ele não sabia. E se você sabe da informação, da
suposta traição dele, foi por minha causa. Nós temos olhos em todos os lugares, ouvidos e bocas
também, e uma delas foi a minha informante para chegar até você sem o meu nome. Eu não preciso
que você me faça alvo e nem minha família. O homem que lhe traiu foi Costa.
— E mais quem? Ou você espera que eu acredite que era apenas ele envolvido nisso?
— Você sabe que Pietro Jr. De Simone e Lorenzo Beluzzo estavam envolvidos.
— E mais quem? — Minha voz demonstra minha impaciência.
— Eu não tenho todos os nomes, Travis, mas posso conseguir. — Sua voz está tremendo.
— Eu vou te dar até amanhã. Vou lhe oferecer exatamente 24 horas. Esse é o tempo que vou
iniciar a minha “reunião” com Costa, e você terá para conseguir todos os nomes que estão
envolvidos nessa conspiração. Os motivos eu vou saber do próprio Costa.
— Sim, senhor.
— Amanhã nós conversamos.
E como se fosse para ser, o carro para e olhando para o lado de fora vejo que chegamos no
La Mama Hotel. Saímos e seguimos um do lado do outro com o Luca em meu encalço o tempo todo.
— Vá na frente. Vou falar com Luca.
— Okay, enquanto isso vou verificar sua acomodação.
— Ótimo — digo secamente e espero Amauri se afastar.
Luca para na minha frente e espero que baixe o cigarro.
— Acho que você está certo, ele não sabia de tudo e nem consegue me informar nada além do
défice de comprometimento de Costa com a Famiglia. Preciso que você me consiga os nomes.
— Mas... e ele?
— Eu não vou confiar inteiramente em Amauri com sua palavra. Quero que você me consiga
os nomes e depois farei a prova dos noves. E saiba quem foi que sussurrou sobre os problemas de
Denver.
— Fui eu.
— Você?
— Sim, Travis. Concordo com ele, temos olhos, ouvidos e bocas em todos os cantos do
nosso território, e é preciso um remetente e um destinatário para uma informação acontecer. Quem
falou para mim foi Ugo Venturana.
— O filho de Donatello?
Donatello Venturana foi um grande soldado do meu pai. Durante muitos anos foi apontado
para ser General de Denver, mas ele caiu doente e morreu.
— Ele mesmo. Parece que o menino carrega a força do pai dentro dele e talvez você
concretize o propósito dos Venturana. — Dá de ombros. — É só uma ideia.
É uma boa ideia, só não vou falar em voz alta porque Luca já é muito convencido.
— Okay, e agora você pode relaxar, Luca. Pare de babar o meu ovo. Eu não vou dispensar
você, mas saiba que, se me trair, eu vou começar pelos seus olhos.
O canto da sua boca curva-se em um sorriso sinistro enquanto assente veementemente. Eu sei
que ele é um homem de confiança. Ele me provou que tem honra para estar ao meu lado.

Luca preparou tudo para eu chegar até o porão onde está meu futuro ex-Underboss. Desço as
escadas e, enquanto meus passos soam pelo corredor estreito e pouco iluminado, um pensamento que
nunca me ocorreu, me atinge de forma agressiva.
Quem vai entrar nesse quarto é um monstro. O monstro que Madeleine me acusou durante o
início do nosso convívio. Até mesmo quando nós já éramos homem e mulher, que se deitaram e
trocaram intimidades. Quando eu já tinha decidido que ela seria minha.
Madeleine me chamou de monstro na noite que matei Enrico. Eu não me arrependo, não há
espaço para arrependimento dentro de um homem como eu, muito menos quando executo um
desgraçado como Enrico. Arrependo-me sim, de ela ter visto, de ter visto a faca na minha mão
ensanguentada com o veneno daquele verme e minha blusa suja, minhas mãos segurando o cabo da
lâmina com força.
Eu estava distante naquele momento, tão distante quanto estou agora ao abrir a porta e
encarar Costa ajoelhado no meio do quarto que mantemos algumas pessoas aprisionadas para
arrancar informações ou chantagear. Esse não vai ser o fim dele. Sem chantagem. Sem saída. Apenas
seu fim iminente. Ele não me dará tudo que preciso e Luca conseguiu algumas informações dele e de
um soldado que estava no esquema.
Ainda estou perplexo como Lorenzo conseguiu trair tantas pessoas, tantas vezes da forma que
traiu e não somente a Lawless. Ele traiu sua família, seus pais, seu nome, porque Edgar descobriu um
segredo dele. Que ele roubava pacotes de drogas do balcão de Las Vegas e um dos clientes, amigo do
senador, morreu de overdose. Ele com certeza ficou desesperado e Edgar, ao descobrir, o chantageou
em troca de esconder a ligação das drogas com Lorenzo. Por consequência, eu não ouvi nada sobre o
assunto. Edgar foi escolhido para ser o Afiliado que entraria na Famiglia por motivos como este.
Edgar deve ter feito um bom trabalho escondendo a morte do garoto e Lorenzo devia estar
com medo de morrer quando meu pai soubesse, então preferiu fazer uma aliança com aquele filho da
puta. Ele mentiu para o Capo, roubou da Famiglia, acobertou a entrada do assassino do meu pai em
Las Vegas e sabia os planos de Edgar e, para fechar com chave de ouro, quase pegou minha mulher.
Eu não sou idiota. Ela deu muita sorte naquela noite. Não apenas pelo tiro ser certeiro como por um
dos homens ter aparecido em seguida.
O jogo sujo e prática de Edgar passa até mesmo dos meus limites. Como eu presumia, eles
queriam Madeleine porque ela foi a moeda de troca de Edgar. Sua aposta mais alta. Sua riqueza
inestimável; o corpo da sua filha dado para os homens que ele fez aliança para me derrubar.
Aquele filho da puta desgraçado realmente não tinha nenhum centímetro de honra e dignidade
em seu maldito ser. Como ele pôde ofertar a filha dessa forma? Ele tem sorte de estar morto, porém,
por tudo que fez a Madeleine, se o inferno existe, eu vou para lá, espero que a gente se encontre. Pois
eu preciso fazê-lo pagar pelo que fez com a filha. Com a minha mulher.
Luca se aproxima de Costa e o empurra com o joelho, fazendo o infeliz cair. Ele tosse sangue
e, quando abre os olhos e nota meus pés, ri com a garganta arranhada de tanto gritar. Meu Cinistro já
fez um bom trabalho.
Vejo que tem vários hematomas, um corte em uma das costelas, do lado esquerdo, cortes nos
braços. Uma facada no mamilo e um pedaço da sua orelha arrebatada. Luca é bom na tortura
duradoura, por isso que ele é o meu executor. Se fosse para matar de uma vez, com certeza ele já
teria arrancado os dedos porque ratos como Costa têm que ir para o inferno sem mão, para não correr
o risco de roubar o diabo. Apesar de que ele me roubou, me traiu e eu estou mais para ser o diabo.
— Okay, você me pegou — Costa balbucia, fraco e observo prender a vontade de gemer. —
Mas você... Irá perder, Travis. A sua sentença... Já está... Com as horas marcadas e o seu purgatório
será doloroso — ele faz questão de falar enfrentando meu olhar.
— Você tem certeza? Não sou eu que estou amarrado no porão e todo fodido.
Solta um riso cansado, misturado com uma tosse.
— A morte para mim não significa nada. Eu quero seu declínio. Infelizmente, não vou poder
assistir a sua queda. Mas no inferno a gente se encontra e você me diz como é que foi.
Ele quer fazer joguinhos, tentar me manipular, como se eu fosse me render. Alguns homens
ficam calados enquanto são torturados, esses são os mais fortes e irritantes; outros precisam falar,
xingar ou fazer juramentos de que iremos pagar quando descermos ao inferno. O problema é que eu já
estou no inferno, só vou descer mais um andar, e de elevador.
— Eu já tenho tudo que preciso de você. Chegou o momento de morrer. Apenas cale a porra
da boca! Você não tem honra e pagará por isso.
— Não tem como ter honra em um reino de um líder fraco, que se deixou encantar por uma
cobra.
Cazzo. Figlio di una puttana. Bastardo!
Sou ira e impulso. A energia do meu corpo é tudo que eu sou e lhe acerto com toda a força na
boca do estômago, no ombro, no meio do peito, no queixo e consigo escutar quando desloca, e o
derrubo no chão para chutar até que eu o assista cuspir sangue.
— Nunca mais você vai falar dela assim. Nem pensar. Você é um ser impuro para abrigar
algum traço de Madeleine. Até mesmo nos seus pensamentos. — Dou-lhe outro chute nas costelas. —
Antes de morrer, seu rato, você vai me dizer tudo que eu preciso saber. Enquanto isso, eu vou
arrancar cada dedo, começando pelas unhas e lhe arrancar cada dente e fazer sua morte ser a mais
lenta ao ponto de você implorar por um tiro no meio da porra da sua testa.
— Eu não me importo — quase não o escuto. — Eu sei o que você quer saber e você vai
perder, Travis. Você perdeu no momento que escolheu ficar com aquela puta italiana.
Enxergo tudo vermelho e vou para cima dele de novo como animal liberto da sua jaula.
Minhas mãos envolvem seu pescoço com firmeza, mas não ao ponto de matá-lo.
— Eu quis comer aquela vadia desde que era pequena. Aquelas coxas pequenas. Como é que
é? Ela é apertadinha ou frouxa?
— Cale a boca! — Soco seu estômago, segurando com uma mão em seu pescoço.
— Muitos caras devem ter passado naquela boceta quando ela estava sozinha em Los
Angeles — ele cospe as próximas palavras com mais sangue que mancham seus dentes.
Tento me deter. Eu sei que sou capaz de esmagar a garganta dele com mais um simples aperto.
— Se você falar dela mais uma vez, eu vou arrancar os seus olhos.
— Você pode me matar. — Fixa os olhos nos meus. — Pode caçar todos que estão te traindo,
mas você vai perder no fim. Vai perdê-la. Madeleine Beluzzo nunca te pertenceu.
Mordo a mandíbula tentando me controlar, eu não posso demonstrar que ela é tão importante
para mim. Que, por dentro, quero fazê-lo se afogar com seu próprio sangue.
— Ela é minha! Eu a possuo. E ninguém vai tirá-la de mim.
— Ela não te pertence, ela é da Bratva, de Ivon. O pai dela a vendeu e recebeu o dinheiro.
Foi morto porque tinha que te entregar também, mas você, por sua teimosia, como sempre, não
compareceu à reunião com ele.
Como um flash lembro-me do convite de Edgar. Ele tentou me contatar e foi uma semana
depois que meu pai morreu. Ele queria falar alguma coisa sobre alianças novas, um novo tratado com
algum policial. Tinha alguma coisa a ver com os motoqueiros também. Eu não quis ouvir, não
pareceu confiável. Jamais gostei daquele traidor.
— Está lembrando agora, não está? Ele tentou... Falar com você, te fazer ir até eles.
Sacudo a cabeça que não, vibrando de ódio.
— Eles... Iam te matar... — Engole com dificuldade seu próprio sangue. — Te matar e pegar
seu lugar, dominar seu território. E nós teríamos a filha de Edgar como prêmio de consolação. Isso
tudo para aquele imbecil poder fugir dos Estados Unidos com os bolsos cheios. — Respira. — Mas
nada aconteceu... Como o previsto e ele pagou com sua vida. Agora... Você vai pagar com a sua... Por
ter aceitado a filha dele na sua casa. — Dá um sorriso crápula. — O que você viu naquela mulher...
Para ela virar... Sua esposa? A única coisa que vai agregar em sua vida é sua morte.
Afrouxo a pressão no maxilar para não quebrar o caralho dos meus dentes.
— Eles não me pegaram antes. Não vão pegar agora. E você não tem nada a ver com as
minhas escolhas.
Ele ri alto.
— Você vai morrer, Travis... Ou ela. Se você não se entregar por bem, eles vão pegar por
mal e vão matá-la. — Segura com as duas mãos meus pulsos, ainda tenho sua garganta em minhas
mãos. — Eu vejo nos seus olhos que ela é sua fraqueza. Parece que o cheiro de boceta usada te deixa
mais excitado, Capo.
A monstruosidade que reside em mim floresce diante das suas palavras e tento me conter para
extrair tudo que preciso desse maldito antes de lhe dar seu fim. Mas simplesmente não aguento e
aperto com mais força sua garganta, vendo sua cabeça, que parece que vai explodir. Quando tenho o
vislumbre da escuridão da morte em seus olhos, eu me afasto soltando e o deixando cair no chão
sobre a poça do seu veneno, seu sangue.
— Você não pode morrer agora. Tem muita coisa ainda para me falar. — Chuto-o no meio da
sua barriga e me viro. — Faça-o se recompor. Eu volto em cinco minutos.
A sentença da sua morte está em minha voz e por diversas vezes na minha vida, eu senti toda
a escuridão do inferno por onde eu passava. Há tanta brutalidade e morte sobre mim agora, que nem
tenho mais sombra. Ela se apagou e poucas vezes me vi com tanto ódio.
Tudo está se encaixando.
A máfia italiana nutre um ódio pela Bratva, que entre os Homens de Honra é ensinado, isso
nunca vai mudar. Odiar os mexicanos foi natural quando tentaram ser consagrar ocupando nossos
territórios. A rixa acirrada com os motoqueiros e odiar todos os políticos imundos que nos pedem
suborno, dinheiro e chantagem por baixo dos panos, tudo isso natural.
O ódio que estou sentindo agora é porque simplesmente a mulher que eu escolhi para ser
minha teve um pai que não posso punir. Eu não pude presenciar a sombra da morte passar por seus
olhos. Eu não pude empunhar minha faca no seu coração. Não fui o autor da sua cabeça dentro de
uma caixa.
Esse ódio. Esse ódio é cego, agudo e incoercível. Minha vingança agora só me resta para os
homens que concordaram com Edgar. Eu não sou santo, não sou nobre, mas as regras da minha
Famiglia não aceitam esse tipo de acordo. Nós não fazemos e não aceitamos crueldade contra
mulheres, crianças ou quando são indefesos. Aquele imundo vendeu a porra da filha dele. A minha
mulher e ele teve ajuda e eu vou descobrir cada filho da puta que estiver envolvido com essa sujeira
toda.
— Travis — Luca me chama e me viro para olhar para ele —, você sabe que ele não está
sozinho. Tem alguém muito influente dentro da Famiglia que sabe disso tudo e está ajudando.
— Eu sei — falo entredentes.
— Você tem alguém em mente?
Tenho, mas não vou falar. Como posso confiar depois disso tudo.
— Eu sei que você não confia em mim, já falou isso tantas vezes. Você não confia em
ninguém, mas, acredite, você é um ótimo leitor de caráter. Esperava que você visse em meus olhos
que eu jamais faria algo contra você. Quem quer que seja essa pessoa é alguém que tem um cargo
muito importante na Famiglia. Isso não é um acordo simples, a pessoa ganha alguma coisa com a
morte do futuro Capo e ganhou com a morte do seu pai.
Não fico pensando em quem pode ser e nos seus olhos consigo enxergar a sua certeza.
— Por um tempo, eu pensei que era o Paolo, de verdade eu pensava que poderia ser ele —
Luca diz, aproximando-se de mim e baixando mais o tom da voz. — Mas agora tem alguém que é
mais perigoso ainda para a sua vida se for ele. Para ser sincero, o motivo tem que ser muito bom
para ele ter traído a Famiglia dessa forma.
Concordo com um aceno e aperto os punhos das mãos, o ódio correndo solto em meu corpo.
— Faça o seu trabalho, mas deixa que eu termine.
— Você sabe que sim — Luca garante e volta para dentro da sala onde Vito, o executor de
Los Angeles, entrou.
Ele pediu para ter uma chance no meu exército particular. Algum motivo que desconheço o
fez desertar de Los Angeles.

Como prometido, estou no La Mama Hotel falando com Amauri e lhe dando a proposta da sua
vida, literalmente.
— Você quer o lugar de Costa? Eu deixo você ficar com o lugar dele, ser meu novo
Underboss, mas o seu juramento de honra será este. — Mostro uma faca afiada, a lâmina brilha
quando mexo minha mão.
Amauri imediatamente estende a palma da mão esperando que o corte. É o juramento normal
dos homens da Famiglia. Eu balanço a cabeça negando e tenho que segurar meu sorriso sombrio.
— O que você quer que eu faça? —questiona sem medo, sem ser dúbio.
— Para você ficar com o lugar dele, imagine que você o pegou traindo, ele fez, mas para
mim. Quero que o imagine te traindo. E o que nós fazemos com os traidores?
— Nós exterminamos.
— Isso mesmo. Nós eliminamos o mal pela raiz.
— Você quer que eu mate Costa?
— Eu quero que você o queime vivo e depois... Como uma sentença misericordiosa, enfie
essa lâmina em seu coração para que ele sinta o fim. Que arda no inferno sentindo seu peito abrir em
dois. Porque homem sem honra, merece queimar. E você fará isso na frente de todos os soldados.
— Travis, para quê tanto?
Infelizmente, quando matei Enrico eu estava dentro da minha casa, ninguém me viu
esfaqueando-o. Ele machucou meu irmão, mandou alguém entrar na minha casa e pegar a minha
mulher. Eles estão tentando me enfraquecer. Já matei três homens desde que Edgar morreu e agora
descubro suas alianças e os envolvidos.
— Você quer que eu confie em você? Faça o que eu mando. Faça minha ordem prevalecer e
me mostre que você é digno de viver, de comandar Colorado e ganhar muito dinheiro com isso. Do
contrário, você vai morrer, a sua família vai viver na miséria e sob minha influência. Nem sua
mulher, nem seus filhos deixarão de estar sob minha vigilância e irei impor limites. Eu não machuco
mulheres e crianças, você sabe disso. Não machuco e não tolero quem faça isso dentro da minha
Famiglia, mas eu não vou fingir que eles não são seus filhos se você não cumprir com a minha
ordem. É a sua escolha, sua rendição. A mão vazia ou a faca?
Amauri balança a cabeça repetidas vezes que sim, seus olhos estão distraídos, distantes,
aposto que está pensando em como sua família vai ficar se optar pela morte. E mesmo que não exista
amor em muitos casamentos, alguns o respeito e a confiança são muito fortes. Muitos casamentos são
grandes elos. Espero que ele considere isso.
E ele faz, quando pega a faca da minha mão e seus olhos encontram os meus, decididos.
— Entro com meu sangue, juro por meu nome, morro por minha honra. Entro servindo, morro
pecando. — Ele faz o juramento cortando a palma da mão e depois a fecha, apertando até a gota do
seu sangue cair no meu sapato. — Eu sirvo ao meu Capo, a Famiglia e ao meu Clã. Estou dando
minha palavra de que em Colorado nunca mais, enquanto eu for vivo e comandar, haverá outra
traição.
— Que assim seja. Eu ainda não mostrei de verdade quem eu realmente sou com quem me
trai. Todos sabem que eu não gosto e mato todos que me traem, porém nenhum dos que já matei me
traíram, e sim ao meu pai. Nenhum dos homens que estão em meus limites até agora e eu quero que
todos saibam que no meu reino não existem ratos. As regras são minhas. Traição não há perdão, nem
saída e eu os farei implorar, sangrar e pedir perdão antes de morrer.
— Hoje, todos vocês estão aqui porque eu preciso fazer um comunicado e pedi a presença do
meu digníssimo e ex-futuro Underboss de vocês, para comparecer.
Quando eu falo isso, como se fosse um show, Luca vem de trás de mim arrastando Costa pelo
chão e deixa no meio dos homens. Estamos na garagem do galpão onde se trabalha as mercadorias
sem licença, armas e drogas que é repassada para todo o estado de Colorado. Denver é o coração
dessa merda e não deveria ter acontecido tudo o que aconteceu. Estamos no mesmo maldito lugar que
foi invadido há alguns dias.
Observo os soldados vendo a atuação e muitos dos homens se sobressaltam. Ficam eufóricos
e estupefatos. Alguns olhares não são de surpresa e sim preocupação. Minha lista mental começa a
trabalhar para gravar seus rostos e lembrar seus nomes.
— Eu sempre fui conhecido como aquele que não tolera mentiras de forma nenhuma e depois
que me tornei Capo, reza a lenda que não aceito traições. — Dou um passo à frente, firmando mais a
voz. — Portanto, preciso lhes mostrar o que isso quer dizer, e temos um voluntário. Costa Viola está
aqui especialmente para isso e temos uma surpresa. — Tem um leve entusiasmo na minha voz quando
falo isso, mas de um jeito macabro não engraçadinho como meu irmão faria. — Eu nomeio
imediatamente Amauri Rugerri como o novo Underboss de Denver; e, para ficar ao seu lado, ser o
seu braço direito e ajudá-lo a cuidar da cidade, Ugo Venturana será o seu Consigliere.
Não há palmas ou sorrisos de “bem-vindo”. Todos estão atentos querendo saber o desfecho
do teatro, e eles terão.
— Como todos sabemos, quando ganhamos um cargo novo precisamos renovar nossos
juramentos a Famiglia. Desta forma, peço que o Ugo faça primeiro.
Antes dele dar um passo à frente, ele me oferece um aceno de cabeça respeitosamente. Na
frente de todos, pega sua faca e corta a mão e diz o juramento em voz alta. Depois, recua ficando ao
lado de Luca, que está o tempo todo com um sorriso sinistro.
Ele está se divertindo. Eu o deixei brincar bastante com a carne de Costa, e restou pouco
para esse verme levar para o inferno. Não tem unhas, não tem falanges, só ficou os cotocos das mãos.
Raspamos sua cabeça, com muito entusiasmo, e ele está calado agora porque não consegue mais
falar, já que eu cortei sua língua e é por pura satisfação que dei a Amauri a tarefa de finalizar a
execução.
— Agora o juramento do novo Underboss de vocês — comunico. — Que irá prometer não só
para mim, como também para vocês — me dirijo a cada um dos homens, fazendo questão de olhar
cada um nos olhos; um por um — , que enquanto Amauri estiver vivo e comandando esta cidade,
enquanto eu for o Capo de vocês, traidores não prevalecerão. Ratos não são bem-vindos e espero
que vocês comuniquem a todos, que a minha lei vigora de forma rigorosa e a minha confiança é
limitada.
Com isso, Amauri dá um passo à frente. Luca arrasta Costa até ficar ao seu lado, na frente
dos homens que olham com curiosidade. Amauri pega a faca que lhe dei, corta a mão direita, cita o
juramento e finaliza:
— Eu sirvo ao meu Capo. — E corta a garganta fora a fora de Costa.
O sangue esguicha, sujando alguns dos homens mais próximos. Certos olhares são de pavor;
outros com respeito e aquele sadismo, como alguns homens feitos espelham. Os que realmente
adoram ver a cor do sangue esguichar, ainda mais se for de inimigos. E um traidor da Famiglia é um
inimigo.
Por fim, o show acaba. Costa está morto e os homens apavorados com tudo e muito mais com
a promessa das minhas palavras. Eu sei que o ato de hoje vai propagar em cada canto deste mundo.
Não apenas na Lawless, como nas outras Famiglie que governam os Estados Unidos e nas italianas.
Mas o que acabo de fazer é até moralmente civil perto do que a ‘Ndrangheta costuma fazer.
Escalpelar os ratos é o padrão deles.
Virando-me, sem falar mais nada, toco no ombro de Amauri, que parece abalado e espero que
ele seja forte o suficiente para saber lidar com uma tortura desse nível. Pelo amor de Deus! Nós não
fomos criados para sermos suaves.
— Está tudo bem, homem?
— Sim, senhor. — Ele engole em seco como se tivesse acabado de correr uma maratona.
Com certeza é a adrenalina de torturar alguém. A euforia corre em nossas veias por longos minutos,
às vezes nem passa. Eu sei que o único jeito de expulsar essa cena da minha mente é Madeleine.
— Ótimo. Amanhã nós nos falamos melhor.
Ele assente e dou um sinal para Luca, que já está ao meu lado entrando no corredor das salas.
— Eu vou me limpar e depois vamos para o hotel.
Como estamos em um local de trabalho e vigília, muitos homens dormem para supervisionar,
e claro que temos quartos. Como também um ou dois preparados para tomarmos banho e trocarmos
de roupa antes de sair para o mundo de fora. Estou coberto de sangue e não posso sair na rua desse
jeito e nem entrar no hotel que tem bastante movimento.
— Enquanto estiver no banho, ligue para Las Vegas para saber se está tudo bem.
— Se não estivesse, já teríamos algum sinal. — Luca sempre com os comentários
inapropriados e fora de hora.
Cerro os olhos para ele e viro a maçaneta, antes de empurrar e entrar, falo:
— Você seria o melhor se falasse um pouco menos.
Ele dá uma gargalhada, não ligando nem um pouco para o que eu falei e eu lhe viro as costas.
Vou direto para o banheiro e a imagem que reflete no espelho é a minha real face. Estou muito
distante daquilo que Madeleine diz que ama e o que eu mais queria nesse momento era poder ter seu
corpo, sentir seu cheiro, lamber o seu calor até que sua luz conseguisse fazer a magia de iluminar um
pouco minha escuridão, mas terei que esperar até segunda-feira.
Luigi abre a porta e saio da loja de noiva com a sacola que tem minha tiara e o sapato para o
meu casamento. Ainda não acredito que vou me casar mês que vem.
— Nos vemos em breve.
— Sim. — Abro um sorriso. — Obrigada por tudo — despeço-me de Manoelli.
— Imagina, Madeleine. Não foi nada e espero que tudo dê certo. Vou ligar quando o vestido
estiver pronto para a prova final.
“Prova final em tempo recorde, porque eu vou me casar com o dono da cidade”, penso
ironicamente e abro um sorriso para ela.
— Certo, vou ficar aguardando ansiosamente.
Ela assente e eu caminho até Marinne, que está rindo de algo que Bárbara está falando. Dario
está ao lado, sério e atento ao redor. Ele estava em casa sem fazer nada e me pareceu a oportunidade
certa para tentar uma aproximação. Então, achei melhor convidá-lo, embora não pareça muito feliz
em ter vindo.
Como Travis mencionou, ele não parece ter dezenove anos. Eu tenho somente seis anos a
mais do que ele e não sei no que posso lhe ajudar. Não é tanta diferença assim, mas provavelmente
tenho experiências que podem ser úteis e posso ser a pessoa mais velha, sem ser seus irmãos, Paolo
ou algum soldado, que vai conseguir descascar essa camada grossa que fica sobre seus olhos
esverdeados. Dos quatro irmãos, ele é o único que não tem o olho azul. Dario tem a beleza mais
bruta, cabelos mais escuros, olhos verdes e aparenta ser menos musculoso. É magro, alto, seus
músculos são suaves e não tem tatuagem visível com roupa, assim como Travis. Bene, ele é muito
bonito também e não parece com Travis tanto quanto Marinne e Colen.
Ele sente que estou olhando e vira o rosto franzindo a testa para mim. Sorrio sem graça e
desvio o olhar.
Nossa! Eu acabei de experimentar uma dúzia de vestidos. Sinto-me exausta. Meus ombros
estão doendo de tanto que mudei de roupa, mas, pelo menos, consegui encontrar o vestido para usar.
Ele é lindo. É branco perolado, longo, as mangas são compridas em um tecido quase transparente
com renda até o antebraço, a cintura é colada no meu corpo e a bainha solta, é o que chamam de corte
de sereia. Em vez de ficar na minha cabeça, o véu é preso por botões forrados de seda dos lados
como se fosse uma saia aberta na frente. As costa é nua e o decote da frente marca bem meus seios. É
simplesmente perfeito e, mesmo eu sendo um pouco baixinha, caiu perfeitamente no meu corpo. Não
vejo a hora de usá-lo e, claro, de Travis ver. Acho que ele vai ficar satisfeito.
Agora, para o passeio não ser só sobre mim e aliviar o fato de demorarmos três horas na loja
de noiva estamos dando uma volta pela rua de lojas que fica no Bellagio. É claro que eu escolheria
vir aqui. Muito mais seguro e todos sabem quem somos, sem contar que senti a urgência de Paolo
falando com os seguranças depois que Travis foi para Denver. Ele está lá em casa e pediu para ter
atenção redobrada conosco enquanto Travis não estivesse na cidade.
Por isso escolhi virmos para cá, desde o primeiro momento que vim procurar um vestido na
terça-feira. Eu não quero arrumar mais problemas do que já têm.
Suspirando, olho para Dario. Acho que, quando Travis me pediu para se aproximar do irmão,
não era para fazê-lo ficar entediado. Mesmo que ele tenha a companhia de Marco (segurança de
Marinne), Luigi e Enzo para trocar ideias, até agora foi um passeio muito chato. Eu quero ajudá-lo,
embora esteja preocupada com Marinne, que até agora não falou nada sobre o noivado.
Ela se divertiu hoje, riu, conversou e me ajudou a escolher o vestido, sempre feliz. E agora
está a alguns passos depois de nós. Está distante e não só fisicamente como mentalmente. Quero
saber o que está pensando e ao mesmo tempo tenho medo de ir e pressionar, ser chata. Quero que ela
me procure e fale. É uma coisa que Marinne faria. Espero que faça.
Bárbara para ao meu lado e larga o celular, jogando na bolsa. Bate o ombro no meu abrindo
um sorriso e pergunta:
— O que você está pensando?
— Muitas coisas — respondo rápido.
— Fale uma delas. Você não é uma “vaga”, Madeleine, e hoje está muito calada.
Ela tem razão.
Respiro fundo e digo uma meia-verdade. Não é porque Bárbara é minha melhor amiga que eu
vou contar informações que ninguém deve saber.
— Estou ansiosa e preocupada com Travis.
— Por que você está preocupada com ele?
— Porque ele foi fazer uma visita a Denver.
— Aposto que nada vai acontecer com ele — diz cheia de convicção. — Você sabe alguma
coisa sobre o motivo dele ir para lá?
— É claro que não. Eu não sei nada sobre os negócios da Famiglia. Travis não conta para
mim e não me interessa. Minha preocupação é normal. — Dou de ombros. — Tem muita gente atrás
dele agora.
— É verdade, mas talvez ele foi lá para descobrir. Escutei meu pai falando com dois
soldados que roubaram o balcão de mercadoria de Denver. Provavelmente Travis foi verificar os
prejuízos e descobrir se foi a Bratva ou os mexicanos, talvez os Motoqueiros. São sempre esses três
grupos que arrumam problema.
— Sim, eu sei.
— Okay, você deve estar certa.
Bárbara me olha desconfiada.
— Você acabou de me dizer que era só isso que estava fazendo-a ficar com essa cara de
preocupada, mas tem mais coisa. Está nítido.
Respiro fundo, faço a minha cara mais cínica para ela.
— É porque... Travis pediu para falar com o irmão dele, Dario — comento isso baixo. —
Perguntou se eu poderia me aproximar dele, tentar ser legal assim como sou com Marinne.
— Ah, entendi. Talvez ele quer que você se aproxime do irmão porque ele é um pouco
rebelde, causa dor de cabeça em todos os homens. Caramba, ele tem um soldado que fica vinte e
quatro horas atrás dele e não só por precaução, mas para ele não fazer merda.
— Acho que ele é assim porque não teve uma mãe. Você sabe, quem realmente criou os
irmãos foi Travis, principalmente Dario e Marinne.
— Eu sei, Made. Todo mundo sabe.
— Uhum. Ele é muito protetor dos irmãos desde que tem onze anos.
— E todo mundo respeita muito Travis por causa disso. Sabe que os irmãos e ele são carne e
unha. Embora alguns irmãos não se amem, não se respeitem e tampouco se toleram, eles quatro são
uma verdadeira família. Nada nunca vai separá-los e é legal ele confiar em você para tentar falar
com Dario. Acredito que saiba que isso representa uma grande confiança em você — fala tão meiga,
que nem a reconheço.
Sorrio pegando na sua mão e apertando em agradecimento.
— Eu sei e isso me apavora um pouco.
Sinto-me bem aonde estou. Sinto-me em casa e tem apenas seis meses que estou na casa dos
Lozartan de verdade.
— Minha vida mudou da água para o vinho desde aquele dia na boate.
— É verdade. — Ela dá uma risada. — E você não queria ir comigo.
— Eu não queria ir porque sabia que ia acontecer alguma coisa, mas, como dizem os antigos,
há males que vêm para o bem. Agora, só espero que tudo se resolva. — Ao dizer isso, sinto um
arrepio.
Eu sei que ainda não terminou. Não adiantou matar meu pai, nem minha mãe, eles me querem
e não sei se é por vingança ou porque eu fugi deles. Isso é um insulto. Sem contar que agora me matar
atinge diretamente ao Capo, ao seu inimigo direto, já que sou sua quase esposa.
— Faz um favor para mim?
— Claro — ela responde imediatamente.
— Vá ficar com Marinne. Eu vou tentar me aproximar do Dario agora. A gente vai almoçar e
talvez eu consiga conversar com ele até o restaurante.
— Claro e seja suave. Provavelmente Travis é mais rigoroso e ele está realmente colocando
o papel de mãe em você. Então, seja legal. Uma mãe gentil.
— Ah, Dio mio. Não fale isso. Não me sinto pronta para ser mãe ainda.
— Mas você está se saindo muito bem — diz com carinho. — E ser mãe é um instinto
protetor e selvagem. É querer o bem das pessoas e se preocupar. É dar bronca e passar pano. Isso a
maioria das mulheres tem, e não precisa ser necessariamente mãe. Tia, madrinha, avó, irmã mais
velha. Todos esses postos são importantes e você pode ser tipo a irmã mais velha. Assim como
Travis foi um superirmão mais velho, você agora é a irmã mais velha de todos eles, mesmo que
Colen tenha quase a sua idade.
— É, eu sei, mas Colen não dá dor de cabeça. Ele é muito legal e é mais fácil ele me
aconselhar, do que eu a ele. A nossa diferença de idade é um ano apenas.
— Okay, agora vou ficar com a Marinne. Vamos falar de sapatos e maquiagem.
Solto uma gargalhada balançando a cabeça.
— Ah... Você é incorrigível.
Ela empina o nariz, ignorando-me e a espero se afastar. Dou um olhar para Enzo e Luigi.
Entendendo, eles se afastam e vou ficar perto de Dario, Marco vai para a frente ficar perto de
Marinne e Bárbara. Ele deveria estar tão distante dela antes.
— Oi — murmuro quando Dario está do meu lado.
Ele olha para mim, sem expressão. Os olhos atentos e as sobrancelhas retas, sem um pingo de
curiosidade. Nada de testa franzida.
— Oi.
Merda! Essa aproximação vai ser mais difícil do que pensei.
— Eh... Eu sei que o passeio está sendo chato — digo meio sem jeito, porque é isso que
estou procurando; um jeito de falar com ele. — Mas... Se você quiser a gente pode ir em algum lugar
que você goste. Eu ainda não andei pela cidade desde que voltei.
— Você andava pela cidade antes de ir embora? — Essa pergunta me pega desprevenida. É a
primeira vez que ele me faz uma pergunta. Que fala mais do que três palavras comigo. E o timbre da
sua voz é mais rouca do que o de Travis, é mais rouco e seco.
— Às vezes sim, mas sempre com meus pais e era uma coisa muito rápida. Acho que não
conheço Las Vegas tanto ou mais que um visitante quando vem para cá. Eu era muito presa quando
criança e... Adolescente também. — Sorrio sem graça. Acabei de me abrir com ele e espero que
surja algum efeito.
— É normal as meninas serem tratadas assim.
Assinto, concordando.
— Você passeia muito por aqui, não é?
— Eu gosto de andar de moto pela cidade — comenta olhando para a frente.
Fito seu perfil e não sei por que sorrio, que esmorece quando ele vira-se para mim.
— Que legal você andar de moto. — Penso rápido. — Eu tenho medo. — Dio mio! É a
conversa mais constrangedora e idiota da minha vida. — Você já caiu alguma vez? Nossa! Uma vez,
eu vi um vídeo de um homem caindo de uma moto, aquelas grandonas e robustas, que doeu em mim.
O ombro dele ficou em carne viva.
Um sorriso suave cruza seu rosto.
— Eu já caí muito feio, uma única vez. Eu estava indo para a casa dos meus avós, em Reno.
Eu precisei convencer Colen de que foi um acidente, mas Travis não adiantou. Ele tirou a moto de
mim por uma semana. O problema nem foi o tombo, foi porque ele não sabia que eu estava indo até
lá. Ele pensou que eu estava fugindo. — Dá um riso e move os ombros de leve. — O legal é que o
tombo me rendeu uma tatuagem. Minha primeira tatuagem.
— E o que é? — indago curiosa.
— Um jogo de damas com o cavalo caído. Ele espatifado em milhares de partes.
— O que doeu mais, a tatuagem ou o tombo? — Pisco o olho soltando uma risada. — Dizem
que queima muito a queimadura que a moto faz.
Ele fica pensativo e, por fim, responde:
— Com certeza, a queimadura. Sua pele arrastar no asfalto em alta velocidade dói muito
mais do que uma agulhazinha pintando a sua pele.
Faço uma careta e dou de ombros.
— Realmente não tenho como comparar.
— Espero que sinta apenas uma delas.
Fico surpresa com seu comentário. Ele parece atencioso.
E assim nós ficamos conversando coisas banais até chegar ao carro que nos leva ao
restaurante. Não vou dizer que nos tornamos mais próximos, ou até amigos, contudo é um começo. Eu
estou tentando.

Por mim, nós tínhamos ido comer em um dos restaurantes do Bellagio. Ainda não tive a
oportunidade de conhecer todos e muita gente diz que são os melhores restaurantes da cidade. Porém,
como eu estou sendo a pessoa legal desse passeio, responsável e a mais velha que tem que cuidar
deles, deixei que Dario – que conhece muito bem a cidade – escolhesse o restaurante.
Para minha surpresa, ele nos trouxe a um restaurante italiano que fica muito perto da boate
Pandora. A mesma boate onde tudo começou, onde reencontrei Travis Lozartan e meu destino foi
fadado para sempre.
Bene, o restaurante é contagiante e a especiaria são pratos italianos legítimos, afinal o dono é
um italiano, que é afiliado a Lawless.
Marinne e Bárbara escolheram lasanha com molho especial da casa. Dario, os soldados e eu
comemos Fettuccine Alfredo, um típico prato italiano que foi recomendado pelo dono, que fez
questão de nos atender e escolher o vinho para acompanhar o prato. E é um vinho espetacular.
Eu estou quase tendo um orgasmo com o sabor desse macarrão e corro o risco de virar
diabética porque vou querer comer todo dia. Se Travis ainda não comeu aqui, preciso trazê-lo.
Pegando mais outra garfada do macarrão, enfio na boca e levanto o rosto, flagrando quase
todos olhando para mim, menos o filho mais novo dos Lozartan. Engulo e sorrio sem graça.
— Acho que você gostou de vir aqui — Marinne comenta.
— Esse molho é dos deuses.
Enzo, Marco e Luigi concordam com um aceno e viro-me para Dario. Infelizmente essa
atenção toda e graça, não mudou muito o humor dele. Ele continua quieto e silencioso. Dio mio! Acho
que vai ser um longo caminho até eu conseguir ter a confiança dele. Ficar íntima e nos tornarmos uma
família. Não importa. Não vou desistir. Eu não sou de desistir fácil.
Apesar de Dario estar do mesmo jeito de quando saímos de casa, minha doce Marinne parece
mais alegre, e Bárbara está mais tagarela e animada. É lógico, ela está querendo chamar a atenção de
Enzo, que, em uma olhada rápida, não parece estar notando. Na verdade, ele está distante.

Um pouco depois, estamos finalizando nosso almoço com uma sobremesa. Giulio, o dono, nos
indicou o torrone italiano. Um pedaço retangular preciso de mix de nozes, castanhas e
marshmallow. É muito diferente do que compramos no mercado. Giulio fez questão de contar como é
feito e, sinceramente, eu prefiro comprar aqui a tentar fazer. Até porque não sou forte na cozinha.
— Grazie per la vostra attenzione. È stato il miglior pranzo che abbia mai mangiato in
vita mia[4].
Faço questão de agradecê-lo em italiano. Eu não aprofundei minha língua materna na
faculdade para não usar.
— Ah, mia cara. Il piacere è stato tutto mio e sono contento che ti sia piaciuto. Spero di
vederti altre volte da queste parti. Porta il signor Lozartan[5].
Pelo visto, Travis já veio aqui, e não apenas para cobrar.
— Io dico di si e grazie mille[6].
— Al prossimo[7].
Fecho os olhos sorrindo quando ele beija minha mão. Depois ele se afasta, indo para a
cozinha, e eu continuo a comer a sobremesa vigiando Bárbara que não para de tentar fazer Enzo
reparar nela.
— Acho melhor nós irmos logo — digo para fazer todos me olharem. — Está ficando tarde.
São quase três horas da tarde, então não é mentira.
— Você está certa. — Enzo se levanta fazendo Marco e Luigi o seguirem. — Vamos.
Assinto e me levanto, Marinne e Bárbara segue e pegando nossas bolsas e casacos, seguimos
para a saída. Giulio aparece para se despedir.
— Ciao. — Dou até logo saindo do restaurante.
— Arrivederci. — Ele retribui dizendo até mais com sua voz fofa. Não sei por que, mas as
pessoas mais velhas são muito fofas falando em italiano.
Virando-me sigo atrás de Marinne e Bárbara até o carro. Luigi já está no banco do motorista,
Enzo segura a porta para entrarmos. Dario está perto de Marco, que está olhando para os lados.
Sorrio para eles e abro minha bolsa para pegar o meu celular. Preciso saber de Travis.
— Madeleine! — Escuto um grito e ergo a cabeça.
Não tenho tempo para reagir. Sou derrubada no chão com Dario jogando-se na minha frente.
Então, ouço barulhos de pneus cantando e tiros. Minha cabeça dói por conta da pancada e tento me
mexer, mas Dario está em cima de mim. Olho para Marco correndo atrás de alguém e Luigi
protegendo o carro onde está as meninas. Enzo surge na minha frente. Ele toca em Dario e me
pergunta:
— Você está bem? Dario?
Não respondo porque espero o irmão do meu noivo responder, mas ele está imóvel.
— Merda! — Enzo esbraveja enquanto mexe em Dario. — Luigi abre a porta. Dario está
ferido.
Pisco, sentando-me e levanto, mesmo com dor, e toco no rosto de Dario. Ele está apagado.
Ai, meu Deus!
Minha cabeça está uma pilha de nervos. Fazer aquela cena de tortura com o Costa me
rendeu mais homens leais ao meu lado por respeito e medo, mas também algumas delações de
negligência.
— Estou ficando cansado da falta de respeito que parece que alguns homens têm por mim.
— Geralmente é assim mesmo que alguns soldados tendem a prosseguir quando ganham um
novo líder — comenta Paolo, que apareceu do nada na minha frente ontem de noite. Ele precisou ver
por contra própria que não matei todos que estavam na minha frente.
Dou uma cruzada de olhar em sua direção, que é bom ele calar a boca. Não estou com ânimo.
Acordei um pouco fora do ar hoje. Tem alguma coisa me incomodando e não sei o que é, e toda vez
que me sinto assim nada de bom acontece. Quando minha mãe se matou foi assim, quando meu pai
morreu e quando Madeleine surgiu na boate. Todas essas vezes eu acordei com o pé esquerdo.
— Eu sei que você tem muitos problemas com a Lawless para resolver, mas precisamos falar
sobre os mexicanos. O gerente do grupo que fica dentro de Nevada não pareceu muito feliz quando
deixou um dos nossos bares destruído. Ele fez questão de ir pessoalmente mandar um recado pra nós.
Esfrego meus olhos, jogando o cabelo para trás e me levanto da poltrona. Estamos na saleta
que tem dentro do meu quarto.
— Estou indo para casa essa tarde. Quando chegar lá vamos fazer um contra-ataque. Não vou
deixar que eles fiquem achando que são melhores.
Paolo não parece gostar do que ouviu. Balança a cabeça e se ajeita na poltrona, onde parece
muito confortável.
— Embora eles tenham começado quando invadiu nosso território, o que eles estão fazendo
agora é o troco pelo que você fez mês passado. Devem estar putos.
Cerro a mandíbula pouco me fodendo pelo que fiz para esses malditos mexicanos. Eu vou
enfiar taquitos com pimenta no cu deles. Arranco um copo, pego o Bourbon e sirvo-me
generosamente.
— Travis, eu sei que você não gosta de ser contrariado e não estou fazendo isso. Você está
certo em fazê-los entender que existe um novo chefe, mas não da forma que fez naquela noite e sim
com novas alianças.
— É, você está certo. — Concordo com a cabeça. — Agora eu preciso falar com Maurício e
acho que podemos ir.
— Antes preciso dizer que o Capo da ‘Ndrangheta entrou em contato.
Franzo a testa.
— Cassio D’Ângelo ligou?
— Sim e disse que precisa falar com você urgente. Parece que seu casamento e o noivado de
Marinne o interessa bastante.
Hum... Isso soa bem.
Estou me virando para pedir que Paolo retorne a ligação de Cassio, quando alguém bate na
porta. Caminho até a mesma e abro.
— Teve um ataque em Las Vegas — Luca informa afoito.
— Explique-se melhor. Sabe que odeio quando fala dessa forma.
— Seus irmãos e Madeleine estavam saindo do restaurante de Giulio quando atacaram eles.
Seguro o ar com força e deixo que entre.
— E como é que eles estão? Quem foi?
— Luigi conseguiu pegar os caras — explica parado no meio do quarto. — E todos estão
bem, mas eles acertaram Dario e parece que ele ficou desacordado.
Eu jogo o copo com uísque longe e ele espatifa em milhares de pedaços pela parede, com a
fúria percorrendo meu corpo.
— Eu vou retornar agora — comunico a Paolo, que já está no telefone, e olho para Luca. —
Diz para Enzo que estou chegando e, enquanto isso, que ele já pode começar o interrogatório.
— Pensei que você ia querer que eu fizesse.
— E você vai — afirmo. — Quando chegarmos lá, você vai finalizar aquele desgraçado que
machucou minha família.
Entro no meu quarto e fecho a porta com raiva. Respiro fundo antes de pegar minhas armas,
colocar no coldre e vestir meu paletó e o sobretudo. Antes de sair, fecho os olhos e me concentro em
chegar até o aeroporto. Eu vou matar quem quer que esteja organizando esses ataques. Não há espaço
para perdão com minhas regras. Custei a deixar que me descontrolassem e mostrasse meu lado ruim.
Meu verdadeiro monstro. Agora o problema é de quem soltou a fera.

Eu não espero as escadas terminaram de descer, saio do avião correndo em direção ao carro
onde Fabrício me espera. Ele é o nosso melhor homem no volante e eu sei que participa de rachas.
Por culpa dele, meu irmão tem fascínio por corridas. Olhar para ele agora não me dá uma sensação
boa.
Pensar em meu irmão, e nas possibilidades de como ele está, me causa desconforto. Ninguém
quis me dar informação do seu ferimento. Enzo não falou nenhuma palavra.
Espero Paolo e Luca entrarem no carro. Os outros homens vão em outro mais atrás. Nós
seguimos para casa para ver como todos estão. E se não levaram Dario para o hospital é porque não
é tão grave. Nós recorremos ao hospital quando nosso médico não pode fazer muita coisa e se ele foi
para casa, é porque não é tão grave. Estou preocupado com Marinne e Madeleine também. Não
consegui falar com elas.
Tudo que sou agora é fúria e vingança. Eles não deveriam ter atingido minha família. Eu não
ligo que me atinjam, mas meus irmãos sempre foram meu foco de proteção e agora minha mulher.
Quando meus pais eram vivos, eu não ligava muito, no entanto odiava quando eram alvos e o jeito
que meu pai morreu. Ser atingido demonstra fraqueza.
Paolo baixa o celular e me olha concentrado antes de falar:
— Enzo me mandou uma mensagem. Quem atacou foi a Bratva, como suspeitávamos, e o alvo
foi Madeleine.
— Pelo visto, tudo indica que as informações que conseguimos de Costa estavam corretas —
Luca comenta.
— Eles querem pegá-la e com esse ataque responde a dúvida se viva ou morta. — A voz de
Paolo deixa nítida sua irritação. — Custando ou não uma guerra com nossos homens, eles estão nos
atacando.
— Eles estão putos. Com certeza, Edgar recebeu o dinheiro da proposta e agora eles só estão
querendo o prêmio — Luca fala de novo.
Permaneço calado. A única coisa que quero agora é acabar com todos. Odeio ter que ouvir
isso e a animosidade é tudo que sou agora.
Por sorte, chegamos e novamente nem deixo o automóvel parar. Saio do carro e vou em
direção da casa adjacente. Meus soldados baixam a cabeça em sinal de respeito quando entro e vejo
Enzo parado na porta, provavelmente do quarto de Dario. Ele me olha e imediatamente se aproxima.
— Ainda bem que você chegou rápido.
— Não tinha como perder tempo. O que você conseguiu?
Ele assente antes de responder:
— Conseguimos capturar dois homens e um deles não resistiu muita à tortura. Foi somente
depois de arrancar algumas unhas que ele disse que o alvo era Madeleine e ele teria atingido o peito
dela em cheio se Dario não tivesse se jogado na sua frente e a derrubado no chão.
Engulo a cólera borbulhante dentro de mim.
— Ele tentou fazer mais alguém de alvo?
— Não. Ele é um rebelde que aceitou uma proposta da Bratva para atacar com
consequências.
— Explique-se melhor.
— Como um terrorista, Travis. Ele veio para matar e morrer. Fiquei surpreso de não ter uma
pílula entre os dentes que ele pudesse mastigar e se suicidar. — Enzo respira fundo, pausando. — A
missão dele era clara. Matar Madeleine e, se desse pra correr, tudo bem; se não, aceitar a morte. Sem
querer menosprezar as habilidades de Marco, o cara nem tentou correr de verdade.
Por fora estou fechado, concentrado para o ataque. Por dentro, estou em chamas. Eu vou
acabar com esses joguinhos da Bratva.
— Que desgraçado! — Meneio a cabeça e pego na maçaneta para entrar no quarto.
— Antes de ver Dario preciso te dizer outra coisa.
Viro-me para Enzo.
— O quê? Me disseram que todos estavam bem.
— Bem, todos estão todos bem, inclusive Bárbara. Ela estava junto.
Claro que estava.
— Os únicos que foram atingidos foram Dario e Marco.
— Não me falaram que o segurança da minha irmã tinha sido baleado.
— Ele foi e está um pouco pior do que Dario. No confronto, ele ficou um pouco exaltado e
simplesmente saiu atirando e o do cara atirou e acertou o pescoço dele.
— Que merda! Depois eu vou vê-lo. Agora eu preciso falar com meu irmão. Enquanto isso
fale com Paolo e Luca já tem autorização para finalizar o cara.
Enzo dá um aceno afirmativo e passando por ele, entro no quarto. Porra! Vejo meu irmão
deitado no meio da cama hospitalar.
Temos três quartos todo equipados como se fosse de um hospital e tem tudo que precisamos,
até mesmo a enfermeira e o médico particular. Enzo deve ter dispensado eles antes de eu chegar e
poder falar em particular com meu irmão. Todos sabem que, quando se trata dos meus irmãos, eu não
poupo ninguém e que eles são meus alicerces.
Aproximo-me da cama e Dario abre os olhos, quando me enxerga e ergue a mão, fechando o
punho e trocando um soquinho comigo, como fazíamos quando ele era criança. Sou quatorze anos
mais velho do que ele e foi de grande importância essa distância de idade, assim como entre mim e
Marinne.
Todos sempre comentam como sou protetor e basicamente criei minha irmã, mas Dario
também foi minha responsabilidade, até o dia que saí de casa. Durante anos cuidei dele e de Colen,
assim como Marinne. Eu cuidei para eles serem fortes, para não apanharam da mãe e serem
torturados pelo nosso pai. Cuidei para não deixarem se consumirem apenas de sombras.
Eu vivi mesmo com meus avós pouco tempo, porque sabia que Dario precisava de mim. Os
dois anos que morei em Carson City precisei inúmeras vezes correr para Las Vegas ver meus irmãos,
além dos meus deveres como primogênito do Capo.
Com dezessete voltei para a cidade, mas não para morar com meus pais, muito menos na casa
deles. Quando voltei a morar perto dos meus pais e fiz meu juramento como um Madman, Dario tinha
acabado de completar três anos.
Lembro-me como fosse ontem, era quinze de dezembro e minha mãe estava com uma
aparência pálida e sem vida. Ela já não era capaz de lidar com nada além da sua consternação e a
sede de morrer. Foi pura sorte aguentar a gravidez de Marinne. Todos pensaram que ela ia provocar
um aborto, e se não fosse por mim ia conseguir de novo. Eu a encontrei com os pulsos cortados
naquela tarde quando descobriu que estava grávida de novo e que estava com quatro meses. Ela não
queria mais procurar nenhum filho do meu pai. Não queria lhe dar outro herdeiro. E poucos sabem
que eu deveria ter uns dez irmãos, na verdade. Ela me venceu por sete vezes e a odiei por anos por
isso. Eles eram minha carne e sangue.
Fugindo desses pensamentos que não irão acrescentar em nada para cuidar do meu irmão,
comento sentindo uma brasa queimar em meu peito ao vê-lo ferido. Ninguém deveria se atrever a
tocar em minha família.
— Você não para de arrumar encrenca, não é, garoto?
— Eu não paro de arrumar encrenca? — repete com humor, com a voz grogue da morfina. —
Juro que, dessa vez, a culpa não foi minha.
Rio fazendo uma careta e sento-me na beira da cama.
— Como é que você está se sentindo?
— Como se tivesse tomado um tiro. — Solta uma risada. — Essa porra queima e é muito
pior do que cair de moto e fazer uma tatuagem.
— Por que você fez isso?
— Eu precisava te mostrar que não sou um completo inútil.
— Porra! — resmungo. — Eu não quero ser sentimental. Não é o meu forte e eu não acho
você um inútil. Nunca disse isso.
— Não disse com palavras, mas sei que você se irrita com as coisas que eu faço. O que eu
não faço. E... — desvia o olhar — eu queria tentar mudar. Talvez, a partir de hoje, eu vou.
— Por que está falando isso?
— Porque nós só estávamos saindo de um restaurante — diz com bravata. — Nós não
estávamos fazendo nada e Madeleine é uma boa mulher. Não merece receber isso. Eu gosto dela.
Você fez uma boa escolha.
— Você percebeu que ele queria atingi-la?
— Sim e quando vi aquele homem apontando a arma para ela, que estava distraída mexendo
no celular, eu não pensei. Só quis protegê-la como eu protegeria você, Colen ou Madeleine. Queria
que nada a atingisse.
— Fico feliz de saber que você gosta de Madeleine. Ela também gosta de você.
Dario dá um sorriso atravessado.
— Acho que percebi.
— Por que diz isso?
— Ela parece ser uma boa mulher. Na verdade tão gentil quanto Marinne é e espero que você
não a maltrate. Não a quebre como nosso pai fez com nossa mãe. Eu não a conheci como você, mas
não sou idiota. Sei o que aconteceu com nossa mãe.
Eu nunca conversei francamente com meu irmão sobre nossa mãe. Nunca quis lhe contar o
jeito que ela decidiu morrer, pois foi terrível e ela não quis lutar por mim, por Colen ou Dario, e
muito menos por sua filha, que não tinha nem um ano de idade. Ela podia sofrer, mas não amava os
seus filhos. Quem se abre aos sentimentos, quem ama faz sacrifícios, e eu sei que meu irmão fez o
que fez hoje, porque, embora seja difícil admitir emoções, nós quatro somos um laço forte, carne e
unha, e ele defendeu Madeleine por minha causa. Por honrar nosso juramento de irmãos, por respeito
e sangue.
— Pode ficar tranquilo que eu jamais vou machucar Madeleine. Eu não sou esse tipo de
homem.
— Sim, eu sei, mas, às vezes, sem querer, o nosso mundo quebra as mulheres. — Desvia seus
olhos de novo. — Eu queria que Marinne continuasse sendo a doce menina que é. Ela é forte, porém
também muito emotiva.
— Quero que ela cresça forte e em seu casamento tenha voz. E que também continue do jeito
que é para sempre. Que nada a faça deixar de ver o mundo colorido, não apenas preto e branco e
vermelho, como nós fazemos.
— Acho difícil.
— É por conta disso que não aceita nosso mundo.
— A questão não é esta, irmão. Eu estou tentando fugir dele porque sei que é muito violento.
Muito mais do que já experimentei e eu quero ainda me segurar um pouco. — Engole em seco e me
encara. — No entanto, creio que essa bala no meu ombro não é nada comparado ao ódio que estou.
Eu vou me vingar de quem fez isso comigo e do susto.
Pela primeira vez vejo que o meu irmão é tão forte quanto eu. E suas palavras têm muita
significância. Quando nós deixamos que nossos monstros ganhem forma, nunca mais conseguimos
contê-los e criamos nossa máscara para podermos conviver com outras pessoas que não precisam
ver quem realmente somos.

Depois que finalmente acabei de conversar com Dario, e ele me contou tanta coisa, ele fez
questão de dizer como se sente sobre tudo, percebi que fui um babaca com ele, às vezes. Logo
depois, falei com o rebelde da Bratva e assisti Luca torturando-o, mesmo ele não tendo muito mais
para revelar do porquê quis matar Madeleine. Eu queria estar reagindo de outra forma que não fosse
minha brutalmente fome de sangue. Cego de ódio.
Eu entro em casa e vou direto para o andar de cima. Passo no quarto de Marinne e dou um
toque na porta antes de abrir. Vejo-a dormindo em sua cama rosa e cheia de bonecas. Sinto uma
emoção que não sei descrever. Caminho até sua cama e me sento na beira. Coloco uma mecha do seu
cabelo para trás da orelha e ela resmunga, mas permanece dormindo como se estivesse no mundo dos
sonhos. Eu queria que a minha irmã não precisasse crescer. Dario tem razão. Ela é muito doce, gentil
e carinhosa, não merecia fazer parte de nós. Ainda bem que ela é forte.
Por fim, eu me levanto e deixo um beijo no seu rosto. Saio do seu quarto fechando a porta
devagar e, mais à frente, está a porta do quarto de Madeleine, que bato e sem resposta entro de uma
vez, encontrando-o vazio. Com isso, vou determinado até o meu quarto.
Eu a avisto deitada no meio da cama, encolhida e abraçada ao travesseiro. O lenço em sua
mão comprova que ela estava chorando. Fecho a porta do quarto e, antes de chegar até ela, tiro o meu
sapato, o cinto e o paletó junto com colete e o coldre. E esta noite deixo mais perto da cama.
Tomo um banho rápido porque me sinto além da sujeira física. Foi muito sangue e gritos nas
últimas quarenta horas. Tenho muitas trevas dentro de mim.
Voltando do banheiro, apenas de cueca, vou para o lado da cama que vejo o rosto de
Madeleine. Vejo seu rosto abatido e sereno. Absurdamente linda. Levanto as cobertas, deito-me sem
fazer um movimento brusco, nos cubro, deixando-nos confortável e a puxo para os meus braços. Toco
em seu rosto de leve e ela resmunga, mexendo o nariz engraçado. Faço de novo e ela toca a bochecha
pensando que meu toque é uma cócega.
— Madeleine — chamo-a baixinho suavemente.
Ela solta outro resmungo e abre os olhos. Quando finalmente a ficha parece cair, que ela me
vê na sua frente, em um movimento rápido se senta e se joga nos meus braços. Meus olhos se fecham
sentindo o alívio, a calmaria me envolve mesmo sentindo seu pulso bater forte. Ela está bem. Ela está
bem aqui.
— Fiquei com muito medo — diz no meu ouvido.
— Está tudo bem agora.
— É! — exclama e se afasta, ficando sentada no meio da cama, nossos olhos se encontram.
— Mas Dario... Tudo aconteceu muito rápido e, quando dei por mim seu irmão pulou em cima de
mim e me salvou. E... Você me pediu para cuidar dele. — Uma lágrima solitária escapa pelo canto do
seu rosto.
Sento-me, apoiando as costas na cabeceira e estico meu braço. Acaricio sua bochecha com as
costas da mão e digo:
— Você não tinha obrigação de cuidar dele e nem como prever o que aconteceu. De toda
forma, agora está tudo bem.
Madeleine afasta o rosto do meu toque e abraça o próprio corpo.
— Não está. Foi por pouco e... Quando cheguei em casa só queria estar com você — fala
com cuidado e, como se não resistisse, vem se sentar no meu colo.
Deixo meu corpo cair um pouco no colchão e ela deita a cabeça no meu peito, entrelaçando
os dedos com os meus.
— Agora estou aqui, querida.
— Sim, está — sussurra. — Mas... Não estava e eu precisava te ter por perto. Você se tornou
tudo para mim... Em tão pouco tempo.
Beijo seus cabelos, envolvendo-a com mais firmeza. Merda! Ela não sabe o quanto eu
também preciso dela, o tempo todo. Agora fico com medo, um sentimento que nunca passou por mim,
de perdê-la e talvez eu a ame. Quantos vezes penso isso, o tempo todo para falar a verdade, contudo
não posso admitir.
Ela se ajeita nos meus braços e levanta o rosto até que seus lábios estão na altura certa para
beijar meu queixo, meu pescoço, então sussurra perto do meu ouvido:
— Como foram as coisas lá?
— Foi tudo bem. Não precisa se esquentar com nada. Não é importante agora. — É mentira.
Tudo o que eu soube em Denver é muito importante e tem a ver com o que aconteceu com ela. Eu
apenas não quero dizer para ela. Não quero que se preocupe e fique paranoica.
— Tudo bem então, meu amor — fala baixinho e a assisto sair do meu colo.
Ela tira o vestido e o sutiã, que presumi que foi a roupa que saiu e não se trocou antes de se
deitar. Ela está olhando nos meus olhos, sorri e depois se aproxima de mim. Entendendo o que ela
quer, nos ajeito na cama trazendo para mim, abraçando-a bem forte. Nossos corpos se arrepiam
quando nossas peles se tocam. Madeleine geme baixinho.
— Isso é a melhor coisa do mundo. É tudo o que eu precisava.
Tenho que concordar com ela. Seguro o seu rosto, beijo sua boca e seus olhos encontram os
meus.
— Eu te amo — ela assente quando diz, confirmando suas palavras e os olhos brilham de um
jeito que faz doer meu peito.
Merda! Eu não digo nada, só aperto seu corpo em meus braços muito forte. E deixo escapar
baixinho:
— Minha.
Sim, ela é minha. Só minha. Ninguém vai me tirar ela. A merda do meu coração seco e sem
vida, cada vez mais deseja ter o que não pode. Para abafar a sensação que faz minha pulsação
acelerar, tiro sua calcinha, depois minha cueca. E olho no olho, penetro sua boceta doce lentamente,
ouvindo seu gemido de puro prazer.
Eu sei que agora, com nossos corpos conectados, eu dentro dela, minhas mãos tocam cada
parte sua, seus lábios procuram os meus em um beijo brutal e erótico. Quando suas pernas envolvem
meus quadris, querendo que eu vá mais fundo, mais perto, nós estamos fazendo amor.
Acelero meus movimentos, apreciando a eletricidade percorrendo por meu corpo, a sensação
de fodê-la, seus sons, suas unhas na minha pele e forço. Fechando os olhos, gozo dentro dela. Puta
que pariu! Eu realmente acabei de fazer amor com ela, e é muito mais do que posso dividir. Ela é
muito mais do que eu deveria ter.
Nossas bocas fazem um barulho quando paramos de nos beijar e vejo em seu rosto um misto
de mágoa e força.
— Está tudo bem — ela diz para mim. — Eu fico com você... Independente de qualquer
coisa. Eu sou inteiramente sua.
Ela deixa a mão sobre meu peito, na direção do coração. Uma noite ela disse que gosta de
ouvi-lo bater e talvez ele só exista agora por causa dela. Talvez ela conseguiu desenterrá-lo do
deserto de Nevada para cuidar e ser dela. Talvez, ela é a única que foi capaz disso. Se ele for capaz
de bater por alguém, tem que ser por ela.
A metamorfose humana é imperceptível. O que a vida lhe dá, muda seus sentimentos,
emoções, pensamentos e acaba que não nos reconhecemos mais como a mesma pessoa depois de um
certo tempo. Eu não sou mais a mulher do início desse ano. As coisas que foram jogadas sobre mim
me transformaram com brutalidade, violência e imensurável. Embora passasse por tudo isso, sinto-
me como se sempre pertencesse aqui.
Tem três semanas que aconteceu o ataque no restaurante e durante esses dias tentei distrair
minha mente e agradecer pelas coisas boas da minha vida. Mesmo que seja muito difícil. Eu não
posso simplesmente esquecer de tudo e agir como se nada tivesse acontecido. Que esteja
acontecendo. Merda! Meu coração está pesado e, às vezes, me pego pensando em coisas ruins,
coisas que podem acontecer. Eu estou cansada de ficar assim.
Respirando fundo, seco minhas mãos, fito meu reflexo no espelho e saio do banheiro. Encaro
a cama vazia com desgosto. Travis está tão atarefado que eu quase não o vi essa semana. Ele está à
caça. Está na missão desenfreada de pegar Ivon Avilov. Eu não sei dos detalhes, mas algo me diz que
tem a ver com o meu pai, ou comigo, e todo dia deito minha cabeça no travesseiro com culpa, mesmo
com Travis me dizendo que a guerra com a Bratva já existe há anos. As máfias italiana e russa nunca
foram chegadas, eu sei, mas, às vezes, um deles provoca, precisa haver um motivo para novas
disputas e retaliações. Algo foi necessário para começar essa nova guerra.
Ando com insônia, cansada e preocupada. E depois daquela noite, onde eu clamei pelo amor
de Travis em silêncio, declarando-me de uma forma que ainda não tinha feito, ele mudou. Me procura
todas as noites, e não é para sexo. Segura minha mão quando ninguém percebe, às vezes eu o pego
olhando meu rosto. Durante a noite, ele sempre me abraça, até mesmo quando já estou dormindo. Está
o tempo todo certificando-se de que eu estou bem, que estou em segurança. Eu já perdi as contas de
quantas vezes me perguntou se estou feliz desde que tudo aconteceu.
Eu sou horrível em ler as pessoas, mas algo me diz que, quando ele me pergunta se sou feliz,
está querendo saber se estou no lugar certo, com a pessoa certa. Se não vou mudar de ideia, se não
vou embora. E posso afirmar; eu nunca vou deixá-lo. Ele é o amor da minha vida, embora meus
pecados sejam terríveis e reais, rezo toda noite para que a gente fique bem. Para que as coisas
voltem a ser o mais normal possível para um clã da Famiglia.
Ele sempre vai ter muito poder, muitos inimigos, muita vingança, ódio e sangue no seu
caminho. Mas não é apenas isso que uma organização criminosa tem.

À noite, visto um vestido vermelho sangue, porque ele ama a cor, e desço para o jantar.
— Travis já chegou? — pergunto a Luigi parado no lobby da casa.
— Sim, senhora. Está no escritório.
Assinto em agradecimento e sigo para a cozinha. Pego um pouco de suco de laranja para
mim, não ando com fome, e sigo o caminho do corredor. Mordo o lábio ansiosa se bato ou não na
porta. Quando percebo, já fiz.
— Entre — ele diz.
Abro a porta e sorrio para ele. Está, como sempre, perfeito em sua cadeira de couro atrás da
mesa.
— Por que não mandou me chamar?
Faz um aceno neutro com a cabeça, negando e gira a cadeira quando vou até ele. Sorrindo
coloca minhas mãos nos seus ombros. Ele guia sua mão até minhas costas, desce em minha bunda e
puxa meu vestido. Gemo jogando a cabeça para trás e deixo que ele suba o tecido do vestido.
Apertando minha carne, me puxa para o seu colo e vou, deixando minhas pernas de cada lado das
suas. Agarro seu pescoço e encosto minha boca na sua.
— Gostei do vestido — murmura antes de me beijar.
Precisando do seu contato, aprofundo o beijo e paro dando uma mordida no seu lábio
inferior.
— Coloquei para você.
Travis ri rouco e respira no meu pescoço. Relaxada, deito minha cabeça no seu ombro e
aproveito suas carícias. Eu estava precisando disso o dia todo. Ele força os nós dos meus músculos,
provocando-me um gemido. Meu Deus... Quando ele faz isso, eu me sinto no céu. Respiro fundo,
fazendo questão de sorver seu cheiro.
— Você está tão quentinha.
— Uhum — gemo e lambo sua pele. Eu amo seu gosto, seu cheiro, sua força e como tira o
meu vestido lentamente como se fosse uma carta na manga.
— Como é que foi hoje?
— Foi tudo bem, angele — responde e me beija. — Não se preocupe.
— Não me preocupar é uma tarefa impossível, amor — respondo me afastando para enxergar
seus olhos, e perco o fôlego com esse azul tão lindo. Esse rosto tão marcado, esses cabelos negros e
levemente ondulados. Meu coração acelera.
— O que foi? — indaga arqueando as sobrancelhas.
— Nada. Só estava te admirando.
— Me admirando? — Ri zombeteiro e segura meu queixo antes de passar a língua nos meus
lábios.
— Você é muito lindo pra ser tão malvado.
— Eu não sou malvado — diz com humor, apertando minha bunda.
— Não é para mim e para as outras pessoas... Que você protege.
Ele fica em silêncio, pensativo e talvez eu não devesse tocar no assunto.
— Você já pensou em ser outra coisa? — Afago seu rosto, a barba por fazer arranhando a
palma da minha mão. — Teve vontade de ser outra coisa?
— Como assim?
— Sem ser o Capo, um homem da Famiglia. Um matador assassino. Alguma vez lhe ocorreu
ser outra coisa?
Ele demora um tempo para responder:
— Na verdade, não. Eu nunca pensei e não penso, nem mesmo por você. — Seus olhos fixam
nos meus, firmes e rigorosos. — Na verdade, por você... — Faz uma longa pausa, e o jeito que me
olha faz eu me sentir muito especial. — Acredito que por você eu me tornaria um assassino de
qualquer jeito. Eu nunca permitiria que ninguém a machucasse.
Mordo meu lábio inferior e seguro o seu rosto suavemente, e ele não recua.
— Eu acho que por você também. Eu mato e morro por você — sussurro o final.
— A gente não vai precisar — diz com convicção.
Seus olhos estão grudados nos meus, mas quase não piscamos e, embora exista tanta
violência nesses olhos tão azuis quanto um mar revolto, consigo ver outro sentimento tão ou mais
violento quanto as ondas de cinco metros. O sentimento que eu acho que ele nunca vai conseguir me
dizer. Antes eu não me atrevi a ter esperanças. Agora está mais do que claro o que eu sou para ele,
mesmo que nunca admita.
— Também espero que nunca precise — digo com um bolo na garganta. — Eu não sei o que
eu faria se perdesse você.
— Você não precisa pensar isso. — Ele alisa a minha face gentilmente. — Eu vou cuidar de
você e sou ruim de matar, mi angele. E até tudo ficar mais calmo, quero que você fique em casa. Sei
que você odeia isso e eu ficaria feliz de deixar você trabalhar no Bellagio, que é onde tenho mais
controle, mas é um risco desnecessário no momento, Madeleine.
— Acredita que vamos ter sossego em algum momento?
— Sim — ele se limita a responder e tem tanta certeza de que fico toda arrepiada. — Eu vou
dar um jeito. Não fique pensando nisso.
— Espero que seja em algum momento muito próximo. Espero que você se vingue de todos
eles.
— Tem certeza de que está falando isso? — Existe um orgulho disfarçado de humor em sua
voz.
— Sim, estou.
Ele concorda, não diz mais nada, e eu também não. Continuamos nos encarando. Passo a mão
nos seus ombros, no peito e ele acaricia minhas costas, minha bunda.
Não queremos admitir um para o outro os nossos medos e as nossas inseguranças, e ele não
quer admitir que me ama. Essa declaração vai me dar muita força sobre ele. Para um homem da
Famiglia, suas obrigações vêm em primeiro lugar. E por mim tudo bem. Não preciso ouvir, apenas
sentir.

Minha pulsação está acelerada, minhas mãos tremendo e, embora meu reflexo no espelho de
corpo inteiro esteja impecável e lindo, por dentro estou um caco. Meu cabelo parece que foi
penteado por fadas, minha maquiagem está impecável e meu vestido é como imaginei que ficaria.
Hoje finalmente é o dia que me tornarei a Sra. Lozartan. É hoje, vinte e três de dezembro, o dia do
meu casamento e eu não poderia estar mais nervosa. Na verdade, estou em um misto de alegria,
nervosismo e medo.
— Está pronta? — Bárbara pergunta entrando no meu quarto. — Nossa, você está linda!
— Está divina! — Marinne surge atrás dela com o vestido branco com as mangas iguais às
do meu vestido. Ela é a minha dama de honra. E quem está honrada sou eu.
— Oh, Dio mio! Você está linda!
Ela me agradece me abraçando e dou um beijo nos seus cabelos, penteados com leves cachos
nas pontas, a franjinha aparada. Eu amo essa garota de verdade.
— Você já está pronta? — pergunta se afastando, mexendo na franjinha.
— Acho que sim — respondo rindo. — Fisicamente estou pronta.
— Está nervosa?
— Um pouquinho.
— Ah, não precisa. — Marinne segura minha mão. — Vai dar tudo certo e você está perfeita.
É a noiva mais linda que já vi.
Sorrio por suas palavras e, por incrível que pareça, me acalmo. Fito-me uma última vez no
espelho e ajeito a saia do vestido, meus cabelos e passo o batom finalmente. Escolhi vermelho
sangue. Eu precisava colocar a cor dele em mim. Tudo bem que a decoração do casamento é de natal,
dourado e vermelho. Meu buquê é de rosas vermelhas e brancas.
— Agora Travis vai enfartar — comenta Bárbara.
Dou um olhar atravessado para ela calar a boca. Não gosto de falar assim perto de Marinne,
mas ela está distraída olhando para o seu pulso. Encarando a pulseira que deve ter algum significado.
Deixo quieto porque eu gosto que ela venha me procurar. Que precise conversar comigo.

Meu corpo todo treme, e não é de frio. O dia está claro e quente em Las Vegas. Sinto-me à beira
de um colapso de tão agitada que estou. Me casar nunca foi um sonho para mim. Eu só queria ser
independente e razoavelmente feliz. Mas aqui estou eu, em frente à igreja, a passos de me encontrar
com Travis Lozartan, meu futuro marido.
Engulo em seco e olho para o meu avô quando ele estende o braço.
— Você está bem? Parece muito nervosa.
— Eu estou muito nervosa, mas estou bem. Acho que é normal, não é?
— Ficar nervosa no casamento? — Ele dá de ombros. — Eu acredito que sim, mas vai dar
tudo certo. Tente relaxar e chegar até o altar.
Ele já ia andar, me levar para dentro da igreja, quando seguro seu braço chamando sua
atenção.
— O que foi, querida?
— O senhor se sente obrigado a estar aqui ou está fazendo porque eu sou sua família?
— Por que está perguntando isso? O que está passando nessa sua cabeça tão fértil,
Madeleine?
— Nós nunca fomos próximos e, quando você foi para a Itália, eu era muito pequena. Você é
meu avô, a minha única família junto com a vovó, mas não sei se realmente posso dizer que somos
uma família.
— Se eu não ligasse pra você, não estaria aqui. Não precisava dar meu consentimento para
você se casar com Travis. Ele é um homem muito poderoso e consegue tudo o que quer, até mesmo se
eu dissesse que não, ele iria ter você. Eu estou aqui porque me sinto na obrigação de como sua
família, seu avô, estar do seu lado. Nós podemos não ter convivido muito tempo juntos e próximos,
porém isso não significa que eu não ligo para você. Não fica pensando essas coisas e erga essa
cabeça, entre nessa igreja e seja a senhora de toda a Lawless. Você sabe que tem muito poder agora
também, não é? Agora precisa se comportar como tal.
— Sim, eu sei e já faço. — Sorrio agradecida. — Obrigada pelas suas palavras. Todo mundo
pensa que eu sou muito forte e que tudo bem ter perdido meus pais do jeito que perdi. Que tudo bem
eu nunca, na verdade, ter tido o amor deles. Mas... Doeu a minha vida inteira e eu espero que agora,
como essa nova vida, com esse novo lar e esse homem, eu encontre tudo aquilo que mereço.
Vovô sorri e bate nas costas da minha mão com carinho.
— Eu espero também e tenho certeza de que você vai conquistar muito além do que qualquer
mulher no seu posto conquistaria. E não é porque você carrega meu sobrenome, não é porque você é
filha da sua mãe ou do seu pai, você vai conquistar o mundo em sua própria força, porque veio para
vencer. Nunca mais diga que não é forte, pois você está aqui agora e chegou muito mais longe do que
qualquer menina já tentou em nosso mundo. E eu não estou falando desse casamento, é além de ser a
esposa do Capo. Estou falando de tudo que já fez pelas suas convicções, pela força que tem dentro
de você, que nasceu com você. Você é a Madeleine acima de Beluzzo ou Lozartan. Você é você, e eu
sinto muito orgulho de ser minha neta.
Tento controlar minhas lágrimas o mais forte que consigo, mas uma delas escapa e
rapidamente seguro para ela não manchar minha maquiagem.
— Obrigada por dizer isso. Foi muito importante e vou guardar para sempre essas palavras.
— Lembre-se de que você tem a mim e a sua avó. Longe ou perto, o que você precisar, nós
estaremos dispostos para você. Nos desculpe por não ter feito nada antes.
Assinto e finalmente, sem mais delongas, deixo que ele me guie para dentro da igreja.
Respiro fundo e, quando ouço a marcha nupcial, logo toco com meus pés o tapete vermelho e
mesmo com toda a coragem que acabei de ouvir que tenho, não consigo olhar para cima. De cabeça
erguida, deixo meus olhos focados à frente, sem olhar para ninguém. Não posso olhar para Travis
antes de chegar ao altar.
Dio mio! Eu vou ter um treco. Meu estômago está revirando. Acho que... Caramba! Estou
quase vomitando. Ai, meu Deus! Eu não posso vomitar no meio da igreja, na frente dessas pessoas
todas. As pessoas mais importantes do nosso círculo: mafiosos, políticos, milionários.
Eu sei que pareço uma mal-educada, mas as pessoas vão interpretar como nervosismo, que
não deixa de ser.
Chegando ao altar, finalmente solto a respiração erguendo a cabeça e quase morro vendo
Travis na minha frente. Dizem que o amor é cego, exagerado, um pouco louco, mas esse homem me
tira o fôlego. Está perfeito de smoking e gravata borboleta.
Ele caminha até mim. Troca um aperto de mão com meu avô e então segura minha mão, e
claro que sente que estou tremendo, principalmente quando coloca dois dedos sobre o meu pulso,
sentindo as batidas desenfreadas do meu coração.
— Oi — diz para mim, e com tanto carinho. Acho que não percebe, porém logo a máscara
poderosa e inibidora está no lugar.
Balanço a cabeça sem conseguir falar nada.
— Está tudo bem? — pergunta parecendo muito preocupado.
Meus lábios tremem, meus olhos enchem d’água. Eu não acredito que vou me casar com esse
homem.
— Ei! — ele chama minha atenção. — Está tudo bem. Se concentra em mim só um
pouquinho.
Concordo com a cabeça e eu quero dizer o quanto o amo. Eu amo a cada dia, a cada noite
mais e mais. Não sei nem mensurar o quanto. Minhas lágrimas deslizam por meu rosto e vejo o padre
me olhar com simpatia. E fito o chão aceitando o lenço que Travis me dá para secar o rosto.
— Obrigada — agradeço baixinho para ele.
— Ao seu dispor — diz segurando minha mão de novo. — Podemos?
Assinto e, enfim, a cerimônia começa.
E eu só saio do transe quando chega a hora dos votos, tão únicos e tradicionais da Famiglia.
Os vestidos de casamento da máfia deveriam ser vermelhos para não correr o risco de, na
hora do juramento, estragar a cerimônia. Nos casamos pelos mesmos padrões dos juramentos dos
homens quando se iniciam: cortando a mão. A verdadeira aliança de um homem e uma mulher em um
matrimônio é o corte nas mãos. O sangue compartilhado.
O pingo vermelho escuro derramado na fogueira dos homens iniciados representa nosso
sangue, nossa honra, aliança e juramento com as sombras dos ancestrais que criaram as organizações.
Marca nosso pacto com o pecado. Sela um acordo de honra com o submundo.
Por isso, todos os homens são Homens de Honra. Eles entram sangrando. Entram dando uma
parte de si, mesmo que ela sempre já pertencera a máfia desde o nosso nascimento. Nós nascemos
jurados por nossas leis, jurados no sangue. Não há outra saída a não ser a morte. E como tal, não
haveria outras palavras para jurarmos nossos votos do que:
“Entro com meu sangue, juro por meu nome, morro por minha honra. Entro servindo,
morro pecando.”
A diferença dos votos no casamento é o final: “Nós entramos vivos e saímos mortos”. A
única separação em nosso mundo é a morte. Como soldado, como marido ou mulher.
A morte é a única forma de sair desse mundo. Eu mais do que ninguém sei disso. Mesmo
quando fui mandada para longe, sempre tive as sombras da máfia. Talvez não tão fortes, mas estavam
presentes em cada passo que dei longe de casa. Eu sabia que, mais cedo ou mais tarde, reencontraria
a escuridão. Mas não esperava chegar aqui, no meu casamento com o Capo del cape. Com um homem
que pensei em odiar para sempre sendo o amor da minha vida.
O padre nos oficializa, declarando-nos marido e mulher para todos os interessados no
assunto: Cosa Nostra, Camorra, ‘Ndrangheta e nossos parentes, e finaliza:
— Pode beijar a noiva.
Fecho os olhos quando Travis pega meu rosto em suas mãos grandes e, com gentileza, dá um
beijo rápido demais em meus lábios. Engulo em seco, respirando fundo e sorrio encarando-o.
— Se não fosse você, eu não sei o que seria de mim. Ainda não gosto da máfia, porém hoje
me tornei ainda mais parte dela — falo baixo só para ele ouvir. — Sei que não gosta de ouvir isso,
mas você me faz feliz e, embora não seja perfeito, e eu nunca disse que é ou precisava ser, eu prefiro
mil vezes viver com você na minha vida. Eu te amo, Travis Lozartan. Essa é a verdade.
Ele inspira fortemente, soltando o ar pelo nariz e seus olhos ficam escuros, quase sombrios.
— Eu nunca sei o que dizer quando fala isso para mim. Mas sei, com toda certeza, que não
sou digno desse amor, mas não abro mão, Madeleine Lozartan.
Sorrio sentindo-me febril e meneio a cabeça em concordância.
Ele me guia para fora da igreja. Nós paramos e cumprimentamos algumas pessoas antes de ir
para uma parte bonita da igreja. É um casamento normal e quero muitas fotos.
— Fique atrás dela e a abrace — a fotógrafa pede e não perde tempo registrando a foto. —
Agora vamos ali.
— Para que precisa disso tudo? — Travis resmunga.
Viro-me para ele, beijo seu rosto e peço para a mulher:
— Só mais algumas, não queremos nos demorar aqui.
— Sim, senhora.
E vamos até onde ela pede. Sorrimos, fazemos pose e, por algum motivo, sinto-me nostálgica.
Eu sei que ele não entende o porquê de eu amá-lo. Acho que até eu fico assim às vezes, sem entender,
mas não importa. Esse homem com sangue e morte nas mãos é o amor e o pecado da minha vida.
Travis vira o rosto para mim e curva de leve o canto da boca encarando-me.
— O que houve?
Balanço a cabeça e olho para ver se tem alguém por perto, puxo-o para o canto, e nos
sentamos em um banco. Com um pouco de dificuldade por conta da cauda do vestido, fico bem perto
dele. Surpreso, ele segura minhas mãos e ergue as sobrancelhas.
— Fala — pede com o jeitinho mandão que é só dele.
— Apenas... Deixe-me te amar. Não vai arrancar pedaço. Vejo em seus olhos, todos os dias,
o duelo em ceder as minhas palavras. Acreditar nelas.
— Eu não duvido — fala firme sem demonstrar reação, pois estamos expostos.
— Eu sei, mas... Eu o sinto recuar, se afastar de mim as vezes quando fico muito perto do seu
monstro. — Sugo uma respiração, pausando. — Eu poderia ter me apaixonado por qualquer um, mas
foi justamente por quem não pode dar seu amor que escolhi. Eu não sonhei com proteção, Travis.
Não só́ proteção. Isso não basta.
Ele parece nervoso ao cerrar a mandíbula.
— Madeleine...
— Mas — interrompo-o colocando as mãos sobre seu peito —, por enquanto, eu aceito. Eu
recebo tudo que você quiser, e puder, me dar. Um dia, você vai entender. — Assinto repetidas vezes.
— Você vai conseguir enxergar que os sentimentos não nos tornam fracos. Vai por mim. Eu sou muito
mais forte agora que tenho você. — Sinto meus olhos faiscarem pela intensidade das minhas
palavras. — Eu juro para você que meu amor me torna perigosa, Travis. Não fraca.
Ele concorda com um aceno sucinto, beija minha boca com força, com paixão, para logo se
afastar, pegar minha mão e sairmos do local.
— Chega de fotos — sentencia para a fotógrafa e me leva para fora da igreja.
Nas escadas, entrelaça seus dedos nos meus e vira-se dizendo de repente:
— Eu... — Engole com força. — Você é importante pra mim. Está me entendendo? Você. É.
Importante. Para. Mim. Você é... — ele pausa e solta uma lufada de ar com força.
Meus olhos aquecem com o prelúdio das lágrimas não derramadas e meu coração acelera.
— Eu sei. — E sei também que ele sente a emoção em minha voz.
Com um aceno, voltamos a descer as escadas. Sorrio para Marinne chegando perto de mim.
Paolo, sua esposa, Colen e Dario vêm também. Enzo está por perto, mas atento.
— Foi um casamento lindo — comenta Marinne e eu a abraço.
Estou dando uma risada quando vejo um vulto correndo atrás de nós e na rua três carros se
aproximando em alta velocidade. As portas se abrem e, quando vejo, todos em volta estão correndo.
Travis me abraça e joga no chão.
— Saiam daqui! — Luca grita e o vejo atirando.
Minha cabeça dói. Fecho os olhos e sinto um líquido quente em meu peito e tento ver o que é,
mas parece que perdi a capacidade de me mover.
— Madeleine — Travis me chama e com dificuldade me pega no colo. Corre para longe,
escuto vozes, gritos e disparos.
Ah, não! De novo não!
A fúria está misturada com a culpa. Como eu não presumi que eles fossem atacar hoje?
Esses russos não ligam em se expor e causar um ataque durante o dia.
Respiro fundo e corro pelo corredor da igreja, seguindo para o local seguro que tem nos
fundos. Meus olhos estão em Marinne, Colen e Dario à frente, Madeleine ainda está nos meus braços.
Ela está desacordada e o vestido imaculado branco agora está banhado de sangue.
— Vem por aqui! — exclama Luigi abrindo uma pequena porta de madeira.
Entro e noto que chegamos ao esconderijo. A igreja e a Famiglia têm uma ótima harmonia.
Eles são um dos associados mais rentáveis. A igreja católica faz de tudo para manter as aparências e
sossego. Embora algumas não querem apenas isso.
Vendo um sofá, vou direto para ele e coloco Madeleine deitada.
— Esse sangue é dela? — Marinne pergunta atrás de mim.
Eu não respondo, pois não sei. E rasgando o vestido com minha faca no decote, procuro um
ferido, mas nada encontro.
— Não é — esclareço sentindo o aperto no peito aliviar.
— Então é de quem?
Franzo a testa tentando me lembrar de quem estava tão perto dela na hora do ataque. Passo
meus olhos por todos os presentes.
— Onde está Paolo?
— Ele ficou lá — responde Enzo na porta, a arma em riste. — Por quê?
Fico de pé e cerro a mandíbula. Toda minha fúria está chegando.
— Ele estava bem?
— Até o momento que me virei para correr para cá, sim. Acha que ele está ferido?
— Não sei — respondo secamente. Volto-me para Madeleine, sentando-me na beirada do
sofá e toco seu rosto. — Acorda, vamos.
Demora mais alguns segundos antes de ela soltar um resmungo, as pálpebras tremerem e,
enfim, abrir os olhos. Ela arfa como se estivesse tomando ar depois de se afogar e me encara.
— Travis — choraminga e me abraça. — Travis!
— Está a salvo, fique tranquila — digo no seu ouvido.
Ela balança a cabeça freneticamente que sim e se afasta.
— O que aconteceu?
O que aconteceu? Merda! Nós estávamos tirando fotos e, de repente, fomos atacados. Puta
que pariu! Como é que eu permiti que isso acontecesse? E agora não sei onde foi parar os outros
convidados, os que ainda estavam esperando a gente sair. Paolo e Luca não estão aqui também. Eles
devem ter ficado para contra-atacar.
— Eu ainda não sei direito — respondo.
— Onde está Marinne? Você se machucou? — Madeleine pergunta sentando-se no sofá.
— Eu estou bem — Marinne responde e fica do lado da minha esposa.
Cazzo. Como ela vai conseguir sobreviver a tudo isso? Por que querer repetir tantas vezes
que me ama, se a vida que eu a condenei sendo minha esposa traz como primeiro cenário seu vestido
de noiva ensanguentado?
Relutante, levanto-me e vou até Enzo.
— Eu preciso que você cuide da minha esposa e dos meus irmãos. Preciso ver o que está
acontecendo.
— Travis, você não vai sair e nos deixar aqui sozinhos. — Madeleine fica de pé e se
aproxima de mim.
— Você não vai ficar sozinha. — Pego suas mãos. — Enzo e Colen vão ficar com vocês.
— Eu não quero que você vá. Por favor. — Madeleine é uma mulher forte e sempre
perspicaz, mas nesse momento é apenas minha esposa assustada.
— Eu sou o Capo e preciso ver o que está acontecendo. Como estão meus homens. E você
precisa ficar aqui e cuidar dos meus irmãos.
— Fala como se todos nós fôssemos crianças — comenta Colen, mesmo sabendo que eu não
o inclui.
— Não força, Colen.
— Eu deveria estar com você.
— Não — rebato com firmeza. — Você tem que ficar aqui com Dario, Marinne e Madeleine.
Você é um dos melhores e preciso disso agora.
Colen cerra a mandíbula e como previsto, embora insatisfeito, aceita minha ordem. Não
porque deve obediência a mim, mas porque sabe que precisa estar aqui.
— Então vai logo e, quando for seguro, saímos daqui.
— Travis — Madeleine sussurra e a fito.
Ela não tenta me tocar, mas vejo a enorme vontade em seus olhos. Não esboço reação, pega
sua mão como qualquer pessoa faria e digo:
— Fique aqui. Não vou demorar.
Seus olhos ficam cheios d’água e o que refletem é bem diferente da hora que subiu no altar.
Há poucos minutos, ela estava sorrindo, celebrando que enfim estávamos casados, agora seu rosto
tenta mascarar o medo e a tristeza.
Seus lábios tremem, porém ela engole o choro e assente.
— Vai ficar tudo bem. Estarei esperando.
— Okay. — Beijo seu rosto antes de virar-me.
Saio do esconderijo fechando a porta e mando Luigi vir junto. Enzo e Colen darão conta.
Confio neles.
— O senhor está com colete?
— Estou com o colete certo. — Levanto o blazer para lhe mostrar o colete com as armas e
pego uma.
Luigi vai na minha frente e seguimos para fora da igreja pelos fundos. Logo estamos na frente,
onde aconteceu e está silencioso. Logo o Luca vem correndo em nossa direção.
— Onde estão todos?
— Seus avós já tinham ido para o Bellagio com seus seguranças e o Consigliere dele com
sua família. Sarino e Rossi correram atrás dos carros com alguns soldados. Não conseguimos muita
coisa.
Assinto e olho o sangue nos degraus.
— Quem se feriu?
— Além de Eterro... Mia.
Não sou de ficar sem fala, ou em choque, mas ouvir que Mia se machucou causa algo dentro
de mim. Porra!
— Cadê Paolo?
— Entrou na igreja com ela.
Cerro a mandíbula e ordeno que Luca e Luigi se certifiquem de tudo, e vou encontrar Paolo.
Eu sempre ouço meus instintos e acordei hoje com uma sensação estranha assim como no dia
que Madeleine surgiu na minha vida. Pressenti que algo de ruim estava por vir, mas não esperava por
isso. Meu Consigliere conquistou seu posto porque é um homem de fibra, forte como aço e brutal.
Nevada é meu território e eu confio nele sem sombra de dúvidas depois de um ano ao meu lado. Eu
não o vi ser derrotado ou fraco.
Fico em silêncio e espero que ele se mova. Então, sinto meu celular vibrar e pego-o no bolso
de dentro do blazer.
“Nós queremos você, Travis”.
Torço minha boca, furioso, e reconheço o número. É como um código entre todos nós, saber
ou não mudar de número e este é de Ivon Avilov.
Vejo os carros, os movimentos e logo percebo que não sou capaz de evitar o ataque. Os tiros
começam e tento proteger todos por perto. Sem garantia de nada, corro para tentar evitar mais danos
do que acontecerá. É inevitável agora.
Porra! Eu deveria saber que eles iriam atacar quando nós menos esperássemos. Embora eu
tenha falado para Travis que existia uma possibilidade de eles usarem um casamento, e à vista do
público, para um escândalo. Eu não preciso saber quem são os carros. As roupas são dos malditos
russos e reconheço um dos soldados de Ivon.
Ordeno que os homens ataquem rapidamente, e os soldados se colocam em movimento. Como
já tinha presumido, falado com o Capo, existe um traidor entre nós e ele que entregou o casamento, e
esperou um momento que só restou Travis e sua família. Ainda bem que os membros das outras
Famiglie já tinham ido e seu avô com seu Consigliere. Algo martela minha cabeça agora e é pelo
código de honra, que só vou poder fazer algum tipo de acusação quando tiver provas.
Dou graças a Deus que minha filha não está. Como se eu tivesse pressentido, pedi para que
ficasse com os meus pais. Travis está bem e perto dos irmãos, agachados para não serem atingidos,
mas Luigi logo fala para eles correrem para os fundos e os homens vão cada um para o seu canto,
protegendo a família do Capo e Luca fica atrás de mim, porque vou direto para a minha esposa. Ela
estava em frente à Madeleine, segurando o buquê.
— Querida — chamo-a nervoso. Ela não deveria estar de pé no meio dessa loucura.
Lentamente Mia se vira para mim e meu mundo desaba quando vejo uma mancha vermelha no
meio do seu peito, que se alastra e mancha o seu vestido rosa claro.
— Paolo. — Ela sorri e então cai no chão.
Vou até ela imediatamente na tentativa de deter que bata a cabeça.
— Mia! Olha para mim — peço e me sinto desesperado como nunca me senti na minha vida.
Ela abre os olhos claros que tanto adoro. Me fita e sinto profundamente que estou a perdendo.
E como nunca senti na minha vida, sinto meus olhos queimarem e arderem com a presença da dor que
me dilacera.
— Mia, olha para mim. Você vai ficar bem — minto porque eu mesmo não acredito.
— Paolo... Está tudo bem? Se machucou? — Não respondo. Nada me interessa nesse
momento.
Vejo minha esposa levantar a mão e tocar meu rosto tão gentilmente. Ela sempre foi gentil. A
única luz de alegria e pureza na minha vida. As lágrimas escorrem pelos cantos do seu lindo rosto e,
quando ela pronuncia outra palavra, tosse. Ela tosse a porra do sangue.
Merda!
— Eu sempre... — pausa pegando fôlego. — Eu sempre soube que você me amava.
Concordo com a cabeça, mas não digo nada. Ela derrama mais algumas lágrimas, mesmo com
sorriso doce nos lábios.
— Eu também te amo — sussurra bem baixinho. — Eu sempre vou te amar.
— Mia, por favor. Fica quieta.
— Você precisa... — Faz outra pausa, tossindo. — Você precisa cuidar da Sophia. — Em
seus olhos há apenas dor. — Ela precisa de você forte, cruel e protetor. Eu confio em você para
cuidar da nossa menininha.
— Por favor — peço baixo.
Ela sorri um pouco grogue.
— Você precisa encontrar uma mãe para ela — os lábios tremem — e eu quero que você...
Seja feliz.
— Eu nunca mais vou ser. Sem você não.
Ela fecha os olhos, apertando-os com força e vejo em seu rosto um misto de tristeza e dor.
Talvez saudades. E, quando ela volta a fazê-los encontrar com os meus, eu me preparo para a ruína
da minha vida: a despedida.
— Obrigada... Pela vida... Que você me deu. Pela nossa filha. — Tenta sorrir. — Diz para
ela.... — Tosse e engole em seco. — Diz para Soph que eu a amava. Que ela foi o presente mais
incrível que eu ganhei. Eu... Adoraria viver... Até ela ficar mocinha... Linda com os lindos olhos do
pai dela. Esses olhos chocolates que eu amo. Eu te amo! — Há um desespero no fim da sua frase.
— Eu também. Por favor... Mia, por favor. Fica comigo.
Ela abre um sorriso tão doce, que me joga direto no limbo. A minha doce redenção se foi.
Com um último suspiro, ela toca meu peito e descansa. Fecho os olhos controlando o grito
que está no meio da minha garganta. E a sanidade mortal que sempre faz parte de mim, precisa estar
viva.
Eu a abraço beijando sua testa. Ela foi a única que conseguiu, que tinha alguma parte boa de
mim. Isso sempre pertencerá a ela. Sempre a ela.
Os passos atrás de mim me colocam em alerta e vejo Luca. Encontro seus olhos e vejo
piedade. Sem falar nada, pego minha esposa nos braços e a levo para dentro da igreja.
Paro aos pés do altar, onde ela jurou sua lealdade, fidelidade e seu corpo. Eu não sabia na
época que ela seria tanto para mim. Ajoelho-me, deitando seu corpo no chão frio do mármore e
fecho os olhos.
— Ciao, mia bella![8] — E como não aguento mais, grito abafando minha voz no seu pescoço.
Só paro quando sinto a dor diminuir e minha voz falhar. Afasto o corpo de Mia dos meus
braços e, quando respiro fundo, olhando para a frente percebo que o padre está me encarando. Em
seus olhos há lamentação e pena.
Eu também sinto pena. Todos sempre falam e têm uma pressuposição de quem eu sou. Um
homem frio, sem sentimentos, mas eles não sabem da verdade, que eu reservava a única parte humana
que tinha para a única pessoa que merecia. E sinto pena do dono da mão que puxou o gatilho que
matou a minha mulher.
— Os anjos têm lugar reservado no céu — o padre comenta.
Concordo com um aceno de cabeça e me coloco de pé. Ele sabe quem nós somos. O que
fazemos e sabe que as mulheres geralmente são usadas, algumas uma válvula de escape para as horas
pesadas do nosso mundo. Para ele, a morte da minha esposa foi um alívio. Foi a forma de Deus
encontrar sua absolvição na vida de sombras que ela tinha ao meu lado. Mas Mia nunca sofreu.
Eu sempre a tratei com respeito, antes mesmo de me apaixonar por ela. Nunca abusei das
mulheres. Sempre cuidei e a protegi, até hoje. Dessa vez, eu falhei miseravelmente assim como lhe
confessei que a amava antes de me despedir. Eu nunca tive coragem de dizer que ela era a única parte
boa da minha vida. Que eu não consegui quebrá-la, porque sua luz era forte demais. Se for possível
um ser como eu ter algo do tipo, ela que me curou.
— Talvez o senhor tem razão em suas palavras. Mas um homem como eu, não vai para o céu.
Então, assim como no céu e na terra, anjos e demônios não deveriam conviver no mesmo lar.
— Às vezes, é necessário um pouco de bondade onde só há trevas. Não se sinta como se não
merecesse a felicidade.
— Minha esposa não era minha felicidade, ela era minha redenção. Ela era tudo que me
restava de bom. — Mordo o maxilar com ódio. — Eu tinha reservado para ela a única parte humana
dentro de mim.
— E agora que ela morreu... — Ele deixa no ar o fim da frase.
Olho para o corpo dela e digo, com meu corpo todo trêmulo pelo furor:
— Quando eu me casei, ela foi o meu começo. O começo da minha redenção. Com a sua
morte — encaro o padre — é o fim. Talvez eu me segure pela minha filha, mas de resto não tenho
mais o porquê de lutar contra minha fúria brutal e cega, que sempre foi meu verdadeiro eu. Hoje
marca o fim do jogo. Xeque-mate.
Nunca estive nessa posição. Não sei exatamente o que fazer, no entanto vou falar com ele. Já
lhe dei o maior tempo possível e até o vi conversar com o padre. Os cinco minutos que esperei
acabou. Minutos que vi um grande homem desabar, desabafar e gritar. Minutos que encarei suas
costas enquanto contemplava o corpo da esposa no chão. Depois que ficou de pé, ele não tentou se
aproximar de novo ou tocá-la.
Decidido, vou até ele guardando minha arma no coldre. Não precisa agora. Paro ao seu lado,
fito seu perfil em silêncio e sei que ele quer me dizer muitas coisas. Não vai se segurar para sempre.
Apenas tenho que esperar.
— Paolo? — chamo e seus olhos encontram os meus, vazios.
Homens como nós ter os olhos vazios é tão destrutivo quanto um lobo faminto perto de um
servo. Um pedaço de carne suculento.
— Você precisa conversar?
— Não.
— Paolo?
— O que é, Travis... — Ele treme nitidamente raivoso. — Eu a perdi. Fim da história.
— Eu sei e queria ter podido evitar.
Ele balança a cabeça parecendo exasperado.
— Todos nós falhamos para ela. — Me encara. — Não foi culpa sua. Estamos em guerra e
não esperávamos que seríamos atingido dessa forma. Quer dizer, eu seria atingido.
— Você acha que eu não me importo? Eu gostava da sua esposa, a respeitava e todos da
minha família sempre a trataram bem.
— Obrigado. — Ele fecha os olhos meio atordoado. — Não vamos falar disso, por favor.
— Tudo bem.
— Vamos focar na retaliação desses filhos da puta. E já adianto — vira o corpo para mim,
com a postura intacta —, eu não vou jogar limpo. Vou atingi-los onde mais pode doer. Quero que
sintam o mesmo que eu e peço a sua permissão para usar qualquer tipo de estratégia nessa guerra.
Não vou me conter, Travis.
— Você acha que eu quero? Pode ordenar os homens da forma mais brutal. Pode fazer o que
quiser nesse jogo. Queime esses malditos. Eu não queria essa guerra, mas já que eles pediram,
iremos fazer virar lenda no sentido de vingança.
Estou dando autorização para que, com seu ódio, ele possa coordenar meus homens. Mesmo
que custe a raiva da minha esposa, a ira da minha irmã e receba o desgosto dos meus avós. Mas não
vou parar enquanto não matar todos os homens de Ivon, o próprio Ivon e seu filho. E no fim, dar o
recado certo para o chefe da Bratva.
— Travis! — Escuto o grito e me viro.
Madeleine vem correndo das portas da igreja com seu lindo vestido de noiva. Mesmo
manchado de sangue, ainda é lindo e ela pareceu um anjo caminhando até a mim no altar. E por focar
na sua beleza, não estou preparado quando me abraça.
Ela está tremendo violentamente. Os olhos banhados em lágrimas e sofrimento. Os lábios
entreabertos escapam sua respiração ofegante. Seguro seu rosto entre minhas mãos e dou tudo de mim
para ficar calmo e poder cuidar das suas emoções agora.
— Vai ficar tudo bem.
Ela soluça e assente.
— Eu estou aqui e nada vai te atingir.
Madeleine suspira e se afasta, mas não é uma boa ideia, pois vê o corpo de Mia.
— Oh... Não. — Chora e seu corpo sacode quando um soluço é muito forte e alto.
Fecho os olhos e tento encontrar algum vislumbre de sanidade ainda dentro de mim para
poder manter a compostura, porque, no fundo, estou ficando distante. As sombras estão chegando e
tenho até medo do que posso fazer para fazê-los pagarem por tanto sofrimento e desespero. Eles
podem não tê-la atingido fisicamente, mas em sua pulsação sinto a dor interna e quero matar Ivon da
forma mais brutal possível. Talvez eu desça ao seu nível.
— Sei que preciso fazer muita coisa, mas primeiro vou levar minha família para casa —
Travis avisa Luca.
Seu Consigliere não parece estar “disponível” no momento. Saio do aperto forte dos braços
do meu marido, que me dá um olhar neutro. Sorrio e indico Paolo afastado de nós.
— Tudo bem — Travis diz baixo.
Com um aceno, afasto-me dele, Luca, Colen e Enzo. Eles talvez até prefiram que eu não fique
por perto nesse momento. Caminho até o braço direito do homem mais temido e respeitado de Las
Vegas, que está em silêncio contemplando o corpo da sua esposa, que agora jaz no chão da igreja
coberta por um lençol branco que o padre providenciou. É por respeito, pois os únicos que viram
Mia dessa forma foram Travis, Paolo, eu e o próprio padre, mais ninguém. Marinne foi proibida de
se aproximar. Dario está fazendo o trabalho de vigiá-la perto das portas.
E agora tudo está calmo. Como uma forte tempestade que vem para destruir e logo depois
resta a garoa.
Minha nossa! Ainda não consigo acreditar. Sinto uma dor terrível no peito pela morte dela e
um alívio na mesma proporção pela filha deles ter nascido há duas semanas, e não ter vindo.
Engolindo em seco, fico a dois passos de Paolo e baixo a cabeça.
— Oi.
Ele vira o rosto para mim. A testa franzida, os olhos ocos e nada parecido com o homem que
é frio comigo. Ele está sim frio, mas como um todo.
— Eu... Queria dizer que sinto muito — digo baixo e controlando-me para não chorar na sua
frente de novo. — Sinto muito mesmo. Ela... estava na minha frente e eu... — pauso segurando o
soluço.
— Não se culpe. — Vira-se para mim por completo. — Não foi você que apertou o gatilho.
— Mas ela morreu no meu lugar.
— Ela morreu porque era uma boa pessoa. Tenho certeza de que, se acontecesse de novo, ela
não mudaria o que fez. Mia era assim.
— Um anjo — murmuro e lágrimas sutis escorrem em meu rosto. — Eu não a conhecia há
muito tempo, mas o pouco que estive em sua presença, me encantei e... Não consigo me conformar.
Não está certo — soluço como uma boba. Ah, foda-se. Estou um caco emocional.
— Madeleine — diz meu nome com vigor. — Eu sei que as mulheres são emotivas e
agradeço seu carinho por Mia, porém você precisa ser forte. Essa guerra não está no fim.
Arfo com força e assinto, acalmando-me.
— Travis não pode lidar com seus sentimentos agora e, na verdade, ele vai precisar de você
em algum momento. Está apenas no começo e vingança sempre leva algo de nós. Não quero que seja
sua determinação, que, convenhamos, foi muito boa e irritante também.
— Pensei que você tinha apenas reclamações sobre mim.
— Não — responde seco. — Mas entenda — dá um passo intimidador —, é meu dever testar
os limites. Ver as falhas, enxergar o perigoso e os inimigos. Não podia ficar sorrindo para você e não
espere que eu faça agora. O que estou lhe dizendo é para o bem da Famiglia. Nenhum de nós pode
ficar neutro agora. É preciso muita garra para saber lidar com uma vingança.
Concordo com um aceno silencioso. Serei forte, pois quero essa vingança tanto quanto ele e
Travis.
E não sei se acontece frequentemente com outras pessoas, mas geralmente sou obrigada a
lidar com o fato de um pensamento meu parecer ser realizado. Bom ou ruim.
Sinto-me arrasada por ter pensado, quando falava meus votos, sobre o risco de manchar meu
vestido com sangue, porque agora meu vestido de noiva está manchado de vermelho. Vermelho
sangue de uma mulher gentil e inocente.
Minha cabeça está fervilhando de tanta coisa. Estresse e raiva me sugando, e eu preciso
aparentar equilíbrio para lidar com o que virá pela frente, perto dos soldados, dos meus cunhados e
de Travis, tudo porque é isso que esperam de mim.
Estou congelada no lugar, ainda digerindo o que Paolo falou. Ele está certo e antes de virar-
me para ir até o meu marido, encaro-o e penso na ameaça silenciosa e imediata que jurou para quem
está por trás dessa guerra.
— Seja cruel e continue cuidando do meu marido. Sei que não tenho direito de pedir nada,
mas preciso que prometa que irá fazer de tudo e proteger a retaguarda de Travis.
— Farei tudo o que estiver ao meu alcance, Sra. Lozartan.
Assinto! É isso. Sou a Sra. Lozartan e acima de tudo, como meu avô disse, Madeleine.

Estou sentada na mesa de cabeceira do meu quarto lembrando-me das últimas quatro horas.
Lembrando-me do meu casamento sangrento, que é óbvio que será uma memória eterna. Ainda estou
com o vestido e eu queria muito poder guardá-lo. Olhar para ele e visitar o dia tão especial da minha
vida. Só que com esse sangue não tem como. Não dá para tê-lo em um baú ensanguentado.
— Como não tem jeito — murmuro.
Levanto-me e de frente para o espelho de corpo inteiro, baixo o zíper com um pouco de
dificuldade e retiro meus braços primeiro. Termino de tirar a peça e, por fim, fico apenas de cinta-
liga. Meus olhos ardem porque eu realmente queria fazer algo especial para esta noite, e aqui estou.
Pegando meu vestido e colocando em um saco preto de lixo. Foi o primeiro pedido que fiz ao chegar
em casa; o segundo, um analgésico porque minha cabeça estava – ainda está para falar a verdade –
doendo muito.
Nesse momento era para eu estar no salão de festa, tirando foto e sorrindo. Tentando me
divertir ao lado Travis, pelo menos um pouco. Não foi só depois de Paolo dizer que estamos em
guerra que fiquei ciente do fato. Eu sei disso desde que meu primo tentou me matar, e a ida de Travis
para Denver apenas concretizou os fatos. O fato de não ouvir com todas as letras não me impediu de
saber que estávamos.
Hoje era para ser um dia feliz e não eu precisando tomar um banho no intuito de limpar o
sangue de alguém de mim, colocar uma roupa bonita e, como primeira missão da esposa do Capo,
acalmar da melhor forma tudo que eu puder.
Vou ligar para todos os convidados, para o buffet e as organizadoras do casamento e da festa
de natal. Ficar perto de Marinne e Dario. Ele não é mais um garotinho e não precisa de mim para
segurar sua mão. Ele estará por perto porque quis ficar conosco e eu só posso agradecer.
Eu sei que todos esperam uma falha minha. Existe mais gente torcendo contra ao meu
casamento do que a favor, e a minha primeira missão é bem complicada e vou fazer muita gente calar
a boca.
Não demoro muito no banho. O que mais gostaria de limpar, um banho não consegue. As
lembranças ruins sempre ficarão. Mesmo assim esfreguei tanto minha pele que está vermelha, como
se a água pudesse lavar todo o terror e essa vingança. Sou obrigada a escolher um vestido preto que
tem mangas. Eu poderia não conhecer a Mia há muito tempo, quase nada para ser franca, mas ela era
aquele tipo de pessoa que faz você se encantar, portanto estou de luto por sua morte, principalmente
porque ela estava na minha frente. Ela morreu no meu lugar e não é culpa que estou sentindo remorso.
Nada parecido com que eu deveria sentir. Dentro de mim só resta a vingança e a raiva.
Agora não sou apenas Madeleine, sou uma Lozartan. Dio mio. Sou a Sra. Lozartan, a esposa
do Capo e preciso declarar isso ao mundo, as Famiglie e aos nossos inimigos. Para ser esposa de
Travis, sei que preciso ser tão intensa e poderosa quanto ele. Preciso ser resistente e vestir a camisa
da Famiglia.
Termino de me vestir, respiro fundo e encaro meu reflexo no espelho de corpo inteiro do
closet tendo a certeza de que estou à altura do meu marido.
— Estou pronta — digo para mim.
Ergo a cabeça, a postura aprumada e segura. Ao sair do meu quarto, saio como uma mulher
mais forte. Não apenas uma simples mulher, esposa ou mãe. Nunca mais poderei ser apenas uma
mulher. Tenho que ser mais.
— Marinne. — Bato na porta do seu quarto.
— Pode entrar.
Abro a porta e vou até o banheiro, onde ela está penteando os cabelos. Já tirou o vestido de
dama de honra e agora veste uma confortável calça jeans e uma camisa de manga longa preta também.
— Está tudo bem?
Ela dá de ombros e vira-se para mim. Sorrio vendo seu lindo rosto jovem e doce.
— Estou sim — responde abrindo um sorrisinho.
— Está mesmo? — Aproximo-me e coloco uma mecha de cabelo atrás da sua orelha.
— Estou bem sim.
— Meu amor — puxo-a para um abraço —, não precisa ficar assim. Estamos seguras agora.
— Estamos mesmo?
Afasto-a para ver seu rosto.
— Estamos sim e agora vamos descer para comer algo.
Ela aceita e finalmente descemos para a sala de jantar, onde Dario e Colen estão comendo.
Rosália deve ter preparado a macarronada famosa dela porque eles estão devorando.
— Vamos, senhorita, senão não vai sobrar muito.
Fico contente com a brincadeira de Colen. O que ela precisa no momento é distração.
Sento-me na cadeira perto da cabeceira e olho com pesar para o espaço vazio que pertence a
Travis. Faço uma prece mentalmente para que ele volte para casa logo e bem. Toda hora escuto que
ele é ruim de matar, como se fosse me confortar. Meu coração continua pesado com medo dessa
guerra me tirá-lo.
A voz de Paolo ecoa em minha mente a mil por hora. Sei que dei permissão para ele agir como
Ivon merece, sem pesar nossas tradições. Ele foi longe demais e deve pagar por isso da mesma
forma, mesmo que ultrapassemos nossas regras.
E o que nós precisamos como contra-ataque é precisão e inteligência, não apenas atirar nos
seus homens ou na sua casa. Preciso ser frio e calculista. Precisamos colocar fogo de dentro para
fora.
— Se agirmos com imprudência e falta de tática, isso servirá de munição para Ivon.
Precisamos dar a ele um gosto do que fez essa tarde.
Paolo revira os olhos e range os dentes.
— O que seria isso?
— Vamos atacar o balcão onde eles ficam ao mesmo tempo que outros homens vão até sua
casa. Precisamos de informações e isca. Se tivermos seus passos, saberemos onde enfraquecê-lo.
— Se realmente quisesse isso não tinha matado todos os seus soldados que estavam
trabalhando para ele.
— Você queria que eu os perdoasse? — Dou um riso sombrio e fico um passo mais perto de
Luca. — Se foi isso que passou na sua cabeça, saiba que eu não sou Deus para perdoar, mas talvez o
Diabo para punir. Matei e matarei todos que ousarem me trair.
Luca me dá um aceno afirmativo e se afasta. Paolo continua com a cara fechada.
— Deixe meu Consigliere a sós comigo — peço a Enzo e Luca.
Espero a porta fechar e encaro Paolo, que devolve meu olhar severamente.
— Diga.
— Como você não quer que nós matemos todos eles?
— Eu não disse isso.
— Você quer esperar não sei o quê.
— Não quero esperar, merda! Quero pegá-los de surpresa e agora não será. Quero devolver
a eles em uma tocaia.
— Então, para isso você não pode deixar muitos saberem — ele diz cerrando os olhos e
finalmente entendendo meu raciocínio.
— Agora você me entendeu.
Ele assente e não muda muito o humor. Se fosse Madeleine morta, eu também estaria fora de
mim. Não o culpo por estar agindo dessa forma. E até mesmo eu estou com sede de sangue pela morte
de Mia.
— Travis. — Enzo aparece de repente.
— O quê? — Viro-me para ele.
— Pegamos dois homens de Ivon.
Assinto e vou logo atrás dele para ver os homens. Eles parecem dispostos a morrer por seu
chefe. Que bom, eu irei matar um deles, pois a primeira mensagem um único homem pode dar.
Com meu sinal de permissão, Luca começa a torturá-lo e puxa o mais alto pelos cabelos. Ele
com certeza acabou de se arrepender por deixar os cabelos crescerem tanto. Solo distribui alguns
socos e enfia a faca no abdômen do outro, mas não para matar ainda.
Solo, Vito e Luca sabem muito bem os melhores lugares para torturas duradouras. Eles foram
alguns dos soldados que precisaram ter algum estudo, principalmente a anatomia humana. Eu também
sei e uso agora quando cravo minha faca no homem cabeludo.
— Deve ser uma delícia acordar com uma faca no ombro — murmuro olhando-o nos olhos.
— Isso não me afeta.
— Veremos.

Depois de um bom tempo torturando o homem de cabelos curtos, o finalizamos e mandamos o de


cabelo comprido meio vivo para a Bratva. O que eu quero é deixá-los com muita raiva. Eles
perderão a lógica bem em breve e serei o único a aproveitar dessa fraqueza.
Despeço-me de Luca e Enzo. Paolo se foi mais cedo. Precisava arrumar o funeral de Mia e
ver sua filha recém-nascida.
Filhos, porra! Eu não penso em ter um tão cedo em uma situação que vivemos agora. Não sei
quando terá tranquilidade entre a Bratva e nós. Depois do último recado que dei, os mexicanos
pararam, mas ainda estão no meu radar. Enfim, ter um filho agora não está na lista e acredito que para
Madeleine também. Nós acabamos de nos casar. Eu posso ter trinta e quatro anos, mas ela ainda tem
vinte e cinco. Muito jovem para ser mãe. Não precisa de pressa.
Vou até um dos quartos, tomar um banho rápido e trocar de roupa. Como todos estão em casa
não quero assustá-los, principalmente Madeleine e Marinne, com todo esse sangue em mim. Antes de
ter uma mulher em casa, não ligava de chegar assim e tomar banho no meu quarto, a não ser que fosse
os dias que minha irmã estivesse em casa.
Limpo, para os aspectos morais da civilização, saio do banho com uma toalha enrolada na
cintura, bem a tempo de pegar o primeiro toque do meu celular.
— Lozartan — atendo de uma vez.
— Colen chegou — comunica Luca. — Está esperando você.
— Estou descendo — digo e desligo.
Sem demora, visto a roupa. Cueca, calça de linho, colete fino à prova de balas por baixo da
camisa social, meias e sapatos, tudo preto e coloco meu coldre para vestir o paletó. Pondo meu
aparelho celular no bolso de dentro do casaco, sigo em direção das portas do balcão.
— O que você quer de mim? — Meu irmão fala assim que me vê.
— Vou para casa e você será meus olhos, ouvidos e boca enquanto estiver longe. Paolo está
ocupado e com isso você fica no meu lugar.
— Por que tanta orientação e diplomacia?
Respiro fundo e chego mais perto dele.
— Eu acabei de me casar e nem vi minha esposa direito, preciso ver como ela está.
Tocar nesse assunto traz minha preocupação inicial de volta, de como ela está lidando com os
últimos acontecimentos. Fechando mais meu semblante, finjo para o meu irmão, e meus homens que
estão por perto, que apenas quero ir para casa e ver minha mulher como um homem que precisa
reivindicar sua esposa. Não deixa de ser. Eu sinto uma fome por Madeleine desde o momento que se
tornou minha esposa muito maior do que antes. E nunca foi pouco meu desejo por ela.
Durante todo o tempo da tortura dos homens de Ivon e até agora falando com meu irmão, meu
cérebro não se desliga sobre como ela está.
— Eu simplesmente preciso ir para casa. Quero ver minha mulher, saber como ela está e só
posso confiar em você para ficar aqui enquanto me ausento. Não vou demorar.
— Tudo bem, Travis. — Ele aceita com um aceno. — Não precisava dar explicações. Você
pode ir e não precisa ter pressa. Vou ficar aqui o tempo que precisar e até depois. E também acho que
você deve dormir um pouco.
— Não estou cansado.
— É porque não tem noção das horas. Sabe que dia é hoje?
— Que porra de pergunta idiota é essa?
Colen ri balançando a cabeça.
— Você já está aqui há mais de um dia. Lembra quando Paolo foi embora?
— Não tem muito tempo.
— Tem seis horas — responde Enzo de cabeça baixa.
— Porra! Eu perdi a noção do tempo.
— Sim, hoje é domingo e seu casamento foi sexta. Você tem que dormir, irmão.
— Certo — digo assumindo a postura decidida. — Estou indo e vou tentar dormir. E, antes
que eu me esqueça, não arrume problemas com suas regras de moralidade.
Colen faz uma cara de nojo antes de fechar o rosto em sua máscara de frieza. Não somos
diferentes quando estamos com ódio.
— Não se preocupe com isso. Nosso pai pode não ter ensinado sobre orgulho e vingança,
mas você me ensinou. E Ivon fez um de nós sangrar e vai pagar por isso. Eu só fiz faculdade para
aprender a lidar com os de fora melhor e ter contato com eles. Não podemos nos excluir como antes.
O mundo está cada vez mais moderno e interligado.
— Eu sei, Colen, e fico satisfeito de saber que você pensa assim.
Trocamos um aceno de cumplicidade. Irmãos como nós geralmente se odeiam por lutarem
pelo posto de Capo, porém Colen e eu somos leais e amigos. Mesmo não acreditando em sorte, não
posso deixar de admitir que tive com meus irmãos.

Como esperava, não encontro ninguém acordado pela casa, afinal são três da manhã. Subo as
escadas rápido e chego em meu quarto. Entro e noto as luzes do abajur acesas, a cama vazia. Volto a
fechar a porta e ando para o banheiro, e me deparo com a visão de Madeleine de roupão em frente a
pia. Assim que percebe minha presença, ela vira-se para mim e segura a respiração.
— Oi — cumprimento-a.
— Oi — ela murmura.
— Você ainda está acordada.
Em vez dela responder, corre para os meus braços e eu a envolvo com força beijando seus
cabelos.
— Ei, está tudo bem.
— Não consegui dormir sem você.
Sua confissão me deixa surpreso e a aperto mais em meus braços. Então, sinto seu coração,
que parece bater desesperadamente. Batimentos fortes e eufóricos.
— Madeleine, você está bem?
Ela dá de ombros e se afasta para poder me ver.
— Não sei o que é... — Dá de ombros. — Eu só sei que estou me sentindo sensível e fiquei
pensando esse tempo que você ficou longe que acabei de me casar com você e que eu quase morri.
Uma mulher morreu no meu lugar. Eu não quero te deixar. Não quero ficar sem você.
Seguro seu rosto em minhas mãos e falo:
— Você não vai ficar sem mim.
— Mas...
— Eu não quero que você fique se culpando pela morte da Mia. Não foi sua culpa e de
ninguém, apenas daquele filho da puta e ele vai pagar por isso.
— Eu vou tentar, Travis, e... — Ela se afasta totalmente de mim e me surpreende abrindo o
roupão e jogando-o no chão, fica nua. — Mata minha vontade de você. Tira essa sensação ruim de
dentro de mim.
Respiro fundo e a pego, agarrando seu corpo. Minha boca encontra a dela molhada e sedenta.
Ela geme enquanto a beijo, minhas mãos deslizam pela sua pele quente e macia. Suas mãos agarram
meu corpo e eu sei que precisamos desse contato mais do que qualquer outra coisa. Eu preciso não
apenas porque a desejo, mas como também para expulsar um pouco de toda brutalidade que fica em
mim depois de torturar aquele homem.
— Agora eu sou só sua — sussurra na minha boca.
Solto um rosnado, seguro-a pelas coxas, fazendo com que envolva meus quadris e levo para o
quarto, minha boca na sua o tempo todo. Chupo sua língua e ela faz o mesmo com a minha.
Quando a pouso na cama, fito seus intensos olhos azuis.
— Você sempre foi só minha. — Essa merda é a única verdade. Nenhum homem nunca teve o
que é só meu e me sinto ainda mais faminto para reivindicar essa mulher que sempre será apenas
minha.
Levo um tempo beijando sua boca, saboreando seu gosto, roubando seus sons e depois me
demorando nos mamilos, deixando duros. Depois baixo meu corpo até que abro suas pernas e chupo
sua boceta bem devagar. Ela puxa meu cabelo chamando meu nome e levo um bom tempo saboreando
essa mulher.

Estou além do tesão nesse momento e fechando os olhos com força, gozo forte dentro de
Madeleine e solto a respiração. Meu coração demora para voltar ao normal e, quando abro os olhos
e fito a mulher embaixo de mim contorcida em prazer e luxúria, algo perturbador estala dentro de
mim. Algo que não sei nomear, mas incomoda como uma porra.
Pairo em cima dela, dou um beijo de leve em seus lábios e me afasto de novo, para
contemplar seu lindo rosto, que reflete apenas paixão pelo que acabamos de fazer. Sem pedir
permissão, o pensamento estranho me ocorre. As lembranças da minha mãe.
Ela foi uma mulher que nunca soube o que é sentir prazer e ser desejada sem ter um pingo de
raiva. Meu pai foi um psicopata que abusou dela durante muitos anos. Escutei-a gritar enquanto ele a
estuprava diversas vezes. Eu escutava a tortura por meio do sexo, até que fugi para a casa dos meus
avós.
Era verdade que eu queria estudar na escola, que era perto deles, mas também não suportava
mais escutar minha mãe sofrer sem poder fazer nada. Na verdade, fazia sim. Recebi toda sua raiva,
violência acumulada de quando meu pai a maltratava toda vez que ela me via. Por alguma razão, eu o
lembrava e assim sempre apanhei no seu lugar.
Eu não sou o filho mais parecido com meu pai. Dario é cuspido e escarrado ele. Até para
mim é difícil olhar para o meu irmão mais novo, mas eu não sou um ignorante como minha mãe a
ponto de comparar Dario com o desgraçado do nosso pai. Agora ele está morto, não importa mais.
Eu queria que minha mãe tivesse a oportunidade de ser uma pessoa diferente, mas com meu
pai sendo quem era, foi muito difícil ela não ser quebrada em todas as partes com a crueldade dele.
Meu pai se sentia poderoso machucando quem deveria proteger. Ele se sentia mais homem quando
batia na minha mãe e nos meus irmãos. Por sorte, Marinne nasceu quando eu já tinha vinte anos e ele
nunca levantou a mão para ela. Tomei conta da minha irmã desde o primeiro momento que a vi e
prometi que ela nunca seria tratada como um martírio. Ela seria adorada como deveria ser, uma
princesa.
Sabia que o espírito protetor que guardava Marinne desde pequena, era quase paternal,
embora eu não tivesse ainda maturidade para tal sentimento. Mas ela despertou em mim e até hoje
cuido dela como se fosse um pai. Um pai decente, coisa que o nosso nunca foi.
Esses pensamentos estão explodindo na minha mente porque a mulher embaixo de mim nunca
vai ter que se preocupar com o meu monstro dentro de casa, não na nossa cama. Eu sei do que sou
capaz e sei que serei cuidadoso com ela, e com os seus sentimentos.
— Qual o problema? — Madeleine pergunta e sua mão toca meu rosto, acariciando devagar a
maçã dele.
— Só estava me lembrando da minha mãe. Ela foi infeliz com meu pai. — Pauso, e beijo seu
rosto. — Posso te garantir que você nunca passará pelo que ela passou. Nunca vai ter o mesmo fim
que ela teve.
Sua mão move-se lentamente em uma carícia suave em meu rosto.
— Eu sei, Travis. Não me preocupo com isso. Sempre soube quem você é, mas nunca tive
medo de você nesse aspecto.
— Mas deveria ter. Eu não fui criado capaz de ser gentil com ninguém, a não ser com
Marinne.
— Você não foi gentil na nossa primeira noite não — comenta com um sorrisinho e sei que é
só para me provocar.
— Eu dei o meu máximo e a culpa foi sua. Mas o importante é que deu certo.
— É, podemos dizer que deu certo. — Ela sorri de leve e ficamos em um silêncio
confortável, até que pergunta: — Você sente falta da sua mãe? Você tentou ajudá-la?
Respiro fundo e resolvo sair de dentro de Madeleine e me deito na cama puxando-a para os
meus braços. Deixando meu corpo um pouco de lado, digo:
— Eu só me lembro de uma vez que tentei consolar minha mãe depois que meu pai a
estuprou. E ela pediu para eu tirar minha blusa, pegou o cinto de couro do papai e começou a me
bater. Desde aquele dia, toda vez que o meu pai abusava dela, ela me chamava para me bater com
toda sua raiva — paro de falar devido a raiva que me dá lembrar daqueles dias.
Madeleine escorrega sua mão nas minhas costas parando de vez em quando e me pergunto se
ela sente as marcas do meu castigo, sem ser culpado.
— Ela não deveria ter feito isso com você. A culpa não era sua.
Fecho os olhos e brinco com seu cabelo.
— Tentei aceitar que tinha que apanhar, que a culpa era minha e que era o único jeito de
ajudá-la. Durante muitos anos, eu a escutei gritando, implorando, para que meu pai parasse... Até que
fui para a casa dos meus avós, mas antes disso ela tentou se matar.
— Meu Deus!
— Ela cortou os pulsos, mas provavelmente não estava com tanta coragem assim, pois não
deu certo. E meu pai, depois que ela melhorou, piorou as visitas e o jeito que abusava dela. Então,
fui para a casa dos meus avós, estudar na escola que fica por lá, que é muito boa por sinal. Dois anos
depois, minha mãe engravidou da Marinne e eu vim para casa no Natal, ela tentou se matar de novo e
por pouco não abortou Marinne, com seis meses já. Meu pai resolveu então deixá-la em supervisão
amarrada na cama até minha irmã nascer. Mas nenhum de nós sabíamos que era uma menina, porque,
depois que ela nasceu e a minha mãe passou do resguardo, meu pai conseguiu superar o monstro.
Minha irmã nunca teve chance.
Paro quando escuto um chiado e olho para baixo vendo Madeleine chorar. Limpo suas
lágrimas e seguro sua mão. Eu sei que, para qualquer um, a história é triste, para mim foi meu
pesadelo. Meu inferno é real.
— Quando sua mãe morreu?
— Antes de Marinne fazer um ano de idade. E como as duas últimas tentativas de cortar os
pulsos não deram certo, minha mãe foi até o hotel que temos no fim de Paradise. Subiu até o vigésimo
andar e se jogou. Dessa vez, o azar não teve chance. Recebi a notícia quando estava no Bellagio
vigiando o cassino.
— Caramba, eu sinto muito! — ela diz parecendo sofrer e soluça. Envolve seus braços no
meu pescoço, apertando-me bem forte. — Eu sinto muito. Sinto tanto, Travis.
— Está tudo bem. Agora sou um homem crescido e, de qualquer forma, tudo que aconteceu
me deixou forte.
Sinto quando ela concorda lentamente com um aceno e, depois que recupera o fôlego, se
afasta e beija o meu rosto. Seus olhos encontram os meus com ternura.
— Eu sei que você é um homem grande, mau e seus inimigos temem você. Mas não estou
falando sobre isso. Eu... Quero viver ao seu lado e te amar, apenas isso. — Engole em seco e volta a
falar: — Você não tem só o lado ruim. Hoje eu sei que não é verdade e prometo nunca contar para
ninguém que você é um cara legal.
— Eu não sou legal.
— É sim. É para as pessoas que você tem que ser e é pior também. Você é terrível, cruel, tão
bom em ser mau com quem merece sua ira. Eu já vi os seus dois lados e consigo amar ambos, ainda
mais agora nesse momento, Travis.
— Espero que você não se esqueça dessas palavras.
— Prometo que não vou e que estou ao seu lado, não importa suas decisões e o quanto os
nossos caminhos sejam escuros.
— Nossos caminhos?
— Sim, nossos. Eu sou sua esposa e vou com você não importa sua brutalidade. Não importa
a escuridão. Estarei com você para sempre.
O tempo só serve para esclarecer quem nós somos e para conhecer as pessoas com quem
convivemos. Mesmo que não tenha muito tempo com Travis, cada vez mais eu sei quem ele é. Toda
oportunidade que ele me dá para conhecer de verdade o homem e sua história, deixa-me mais feliz e
apaixonada.
O que me contou sobre sua mãe e o que passou com ela e o seu pai, foi terrível. Agora eu
entendo cada vez mais sobre os cuidados como marido e o jeito protetor comigo. Ele pode não
admitir que me ama, mas eu sei que sente algo além de dever me manter segura e feliz.
Agora nós estamos passando por algo delicado e perigoso, não é momento para nada além de
foco, no entanto eu não posso ignorar meus sentimentos e acordar ao seu lado sem fingir que amo
sentir seus braços me envolverem desse jeito, sua respiração no meu pescoço e sua ereção matinal
perto da minha bunda. Amo esse poder silencioso sobre mim.
— Bom dia — ele murmura com sua voz rouca e sonolento.
Solto um gemido quando puxa meu corpo para a prisão que são seus braços e me dá um beijo
no pescoço me fazendo gemer.
— Bom dia — replico e me viro para ver o seu rosto. — Pensei que ia dormir mais um
pouco. — Estico meu pescoço para que ele consiga beijar meus lábios.
— Eu adoraria dormir mais um pouco com você, mas já tenho que ir.
— Mm... Amor. — Faço minha voz dengosa e esfrego meus peitos nele.
Travis ri e desliza as mãos pelo meu corpo até apertar minha bunda. Fecho os olhos
apreciando seu contato e admirando seu lindo rosto. Ele me deixa maravilhada quando beija meu
rosto e afaga minhas costas.
— Vamos ficar mais um pouquinho aqui, por favor.
— Eu adoraria ficar, mas não posso. — Se afasta e senta-se de costas para mim. — Já estou
tempo demais longe e mesmo que Colen possa dar conta, eu não quero perder tempo com isso.
Mesmo que estejamos no início dessa merda, não quero que dure tanto tempo. — Olha para mim
segurando minha mão.
Assinto em silêncio e recebo o carinho no meu rosto com um sorriso.
— Não dá pra ficar e esperar. Não posso deixar você nessa guerra por muito tempo. Isso tem
que acabar e logo.
— Eu sei, querido. — Sento-me também e o abraço bem forte. — Está tudo bem.
Travis segura meu rosto e beija minha boca.
— Eu vou fazer tudo ser seguro de novo.
— Confio em você — afirmo e vou ficar no seu colo. Pego seu rosto em minhas mãos e toco
sua boca com a minha de leve.
— E, quando tudo estiver bem, podemos ter nossa lua de mel.
— Não esquente com isso agora. Só pega eles, amor.
Como resposta ganho um beijo que deixaria qualquer um mole. Caralho! Eu amo meu marido
malvado.

Depois daquele dia que nós dois conversamos, fizemos amor e ele me prometeu que as coisas
melhorariam, sinto que na verdade nada mudou para melhor. Bene, eu sabia que ele ficaria muito
tempo fora. Todos só sabem dizer que Travis é o melhor chefe que a Lawless já teve e, nesse
momento, é preciso dar tudo de si para que seus homens continuem fortes, cruéis e focados. Contudo,
não sabia que ia ficar tanto tempo sem ver meu marido em casa.
Suspiro e continuo andando pela casa vazia. É o que vivo fazendo e, às vezes, Marinne está
por aqui, mas geralmente está enfurnada no seu quarto como eu, porém procuro ter mais o que fazer
enquanto não posso sair.
Esse isolamento total está me deixando estressada e além de preocupada comigo. A coisa não
parece ter melhorado, tanto que Travis e Colen não permitem que Dario saia se não for com eles. O
que é bom. Ele me dá um pouco mais de segurança e mesmo que Travis não vá aprovar, ele me
ensinou a atirar e alguns golpes de MMA.
Então, quando não estou vendo filme, dormindo – o que ando fazendo demais –, cozinhando e
comendo, lendo livro ou curtindo um tempo com os cachorros, aprendo a lutar e a atirar. Eu já tinha
alguma noção e agora estou mais ágil e esperta. Não fico mais tremendo com uma arma na mão. Sinto
uma estranha necessidade de defesa dentro de mim. Uma superproteção.
Entro na cozinha, vejo as meninas e sorrio para elas.
— Boa noite.
— Boa noite, senhora. O jantar já estará pronto.
— Okay — digo e saio em direção das escadas. Cumprimento os seguranças na porta e
passando por eles, corro os degraus.
É, tudo mudou drasticamente de um mês para cá. Já estamos em fevereiro e se eu dormi
quatro vezes com meu marido foi muito. Sou a senhora dessa casa, vivemos em uma tensão e, apesar
da falta que sinto de Travis, o que fiquei sabendo sobre suas táticas, sei que está dando certo.
Bato na porta de Marinne e entro quando ela autoriza. Vejo-a sentada de perna de chinês no
meio da sua cama rosa de casal cheia de almofadas, mexendo no seu iPad e a tevê ligada em um
filme com tiros e gritaria. E eu pensando que ela gostava de coisas fofas de meninas descobri que, na
verdade, ela adora filmes de violência e 007. Minha menina sempre me surpreende.
— Oi, querida — cumprimento-a com carinho, cantarolando. — Não quer jantar? Pedi para a
Rosália fazer o macarrão que você gosta.
— Eu não estou com fome — responde baixo.
Acho estranho o comportamento dela, que geralmente está sorrindo e de bom humor. Com
calma, vou até ela e sento-me na beira da sua cama e espero largar o iPad.
— Está jogando?
— Não. Lendo — responde em automático.
— Hum... — balbucio e toco no seu joelho. — O que está acontecendo? Fala comigo.
Ela fica um bom tempo me ignorando, até que suspira e murmura:
— Meu aniversário está chegando.
— Eu sei, querida — digo feliz demais, eu acho. — E isso é bom, não é?
— Não, isso significa também que... Você sabe.
O noivado dela. É claro que eu sei.
— Eu fico me perguntando se está tudo bem com o evento... Diante dessa guerra toda. Não
sei. — Dá de ombros. — Travis está tão ocupado. Ele quase não vem para cá.
— Sim, eu sei, mas acredito que seu irmão vai manter essa aliança e no tempo certo. É muito
importante até mesmo nesse momento.
— Você acha?
— Sim, eu acho que é importante.
Ela assente devagar, desanimada.
— Olha para mim, Marinne. — Espero ela fazer e continuo: — Eu sei que não é a melhor
coisa do mundo um casamento arranjado, mas.. Nesse momento, é a melhor coisa para fortalecer Las
Vegas. Os D’Ângelo selando esse compromisso irão trazer homens para nos ajudar.
— Meu irmão não gosta dessas conversas perto de mim ou comigo.
Dio mio! Acabei de ficar sem reação.
— Me desculpa. Eu não deveria estar falando mesmo sobre o assunto. Eu nem era para saber.
Me desculpe.
— Está tudo bem, Madeleine.
— Okay, mas não vou mais falar sobre isso. — Sorrio e balanço a cabeça para espairecer. —
Enfim, vamos falar sobre outra coisa. O que você quer de aniversário?
— É sério que você está me fazendo uma pergunta dessas? — Solta o iPad e pula para fora
da cama. — O que eu quero de aniversário é paz, mesmo que paz seja uma coisa que nunca tivemos.
— Mexe nos livros, na estante que fica no canto, inquieta. — Eu só... Quero a minha vida de antes.
Não dá para ficar para sempre assim.
Um pouco desanimada, levanto-me e vou até ela.
— Mia cara. — Afago seu rosto e coloco seu cabelo atrás da sua orelhinha com um brinco
fofo de borboleta. — Vamos fazer o seguinte.
Ela concorda.
— Vamos confiar no seu irmão.
— Eu confio nele.
— Então tudo bem. — Abro um sorriso. — Agora vamos descer para me fazer companhia no
jantar.
Embora eu não esteja com fome, não quero que ela não coma ou fique sozinha hoje de novo.
Indico minha mão e ela aceita. Nós duas descemos e vamos para a sala de jantar.
— Onde está Dario? — pergunto a Rosália quando estou me sentando e ela aparece.
— Ele saiu tem alguns minutos, senhora.
— O quê? — Ai, meu Deus! Coloco minha mão no coração porque ele acaba de acelerar
como se quisesse sair de dentro de mim. — Como é que o deixaram sair? Por acaso, ele saiu com
segurança? — Assim que pergunto, me levanto e vou até a saída. Vendo Luigi indago: — Dario saiu
sozinho?
— Dario saiu? — ele repete parecendo muito surpreso.
— Merda! — deixo escapar. Foda-se!
Vejo Luigi e outros dois soldados o seguirem para as portas dos fundos da casa, da garagem,
e vou atrás.
— Isso não era pra ter acontecido — falo meus pensamentos em voz alta. — Como você
permitiu?
— Senhora, eu não saí do meu posto. Aí está! — ele exclama e eu olho a garagem sem
entender. — Ele saiu com a moto do Travis.
— O que isso quer dizer?
Luigi me encara.
— Que conseguiremos rastreá-lo, mas que provavelmente o Sr. Lozartan vai ficar uma fera.
Ele não podia sair em nenhum momento e agora menos ainda.
— Por quê?
Ele baixa os olhos, desviando-os.
— Anda, fala! — obrigo-o, teimosa.
— Acabamos de pegar o filho de Ivon como moeda de chantagem. Reze para que Dario seja
esperto e volte para casa logo.
— Você acha...
— Não quero falar o que penso. — Ele ergue a cabeça e pega o celular no bolso da jaqueta
de couro que sempre usa. — Nesse momento preciso falar com o Capo.
— Não pode esperar um pouco?
— Antes tarde do que nunca.
Assinto e fico parada sozinha na garagem quando ele vai embora. Fecho os olhos e me sinto
franca. Tanto que me sento nos degraus que tem na entrada. Puxo o tecido do meu vestido com raiva e
peço mentalmente para que Dario volte são e salvo para casa. Merda! Falhar de novo com ele não
dá.
Eu gostaria de ter cumprido com a minha palavra. Sempre fui determinado a não quebrar além
do possível as regras que impus ao me tornar um Homem de Honra, mas quando se apanha tão forte,
você se esquece dos limites que um dia colocou, mesmo o mundo não sendo moral ou ético. Todavia,
que, por algum tipo de civilidade, eu não queria ultrapassar. Agora já era. Uma guerra sempre tem
resultado colateral.
Mas eu prometi. Jurei que iria até as últimas consequências para poder me vingar de Ivon.
Ele me atacou primeiro. Foi ele que começou com a caçada cega à Madeleine sem medir as
consequências. Ele poderia ter aberto uma negociação comigo pelo acordo nojento de Edgar e
resolver da melhor maneira. Eu nunca iria entregá-la, nem mesmo quando ela era apenas a garota que
meu pai prometeu proteger.
Mas o filho da puta não quis e atacou, fez meu irmão sangrar, fez meu Consigliere – um
homem que conheço basicamente a vida toda – se redimir naquela igreja ao arrependimento e, por
breves segundos, a sua fraqueza, mesmo que agora nutra a mesma vingança que eu pela morte de Mia.
Tudo isso me fez raptar Yuri Avilov.
Pegar seu filho era a melhor tática para vencer a primeira jogada de contra-ataque. Ivon
precisa saber que não estou brincando ou blefando quando disse que o faria pagar.
Meus olhos ficam distantes, desviando do copo de uísque na mesa e meu dedo na boca quase
serve como apoio. Eu confesso. Internamente, estou cansado, com raiva e louco para ter o sangue de
Ivon como se fosse um animal. Só eu sei o quanto estou cansado, como queria ficar com Madeleine,
principalmente agora que acabamos de nos casar. Merda! Eu queria ir para casa ver como minha
irmã está. É quase aniversário dela e eu sei o que isso implica: no seu noivado.
Tem uma semana que falei com Amândio e seu pai. Acredito que eles estão ansiosos para
finalmente essa aliança ser concreta, mesmo que seja apenas um noivado é muito mais do que a
promessa do noivado e casamento. Depois que ele der a aliança a Marinne, nada pode ser feito para
romper nosso acordo.
Escuto a voz de Colen se aproximando e esfrego meu rosto espantando o cansaço quando meu
irmão adentra o que uso como escritório no balcão.
Vou ao Bellagio resolver algumas coisas. Passo nos outros cassinos, hotéis, boates e
inspeciono o laboratório de drogas e também passo em dois bordéis subterrâneos, mas é coisa de
momento.
O que mais fiz no último mês foram movimentos táticos contra Ivon. Fiquei gritando ordens
para os meus homens atacarem, fazerem tocaia e uma das vezes eu fui junto, porém estou evitando me
arriscar no momento. Sou mais valioso aonde estou no momento e nosso confronto final tem prazo,
disso eu tenho certeza.
E agora com Yuri capturado há três dias, eu só torturo esse filho da puta mimado. Seu
casamento com Tamara, filha do chefe da Bratva, lhe deu bastante poder e ele ficou mais
insuportável do que o normal.
— Que cara é essa?
Devolvo a meu irmão um olhar retorcido e solto a respiração pelo nariz.
— Cara nenhuma.
— Você não pode parecer tão entediado para os soldados.
— Não estou entediado — respondo e, por fim, o encaro. — Estou pensando...
— Em quê?
— Que eu poderia arrebentar você em um ringue de boxe só por diversão.
Ele ri alto e senta na outra cadeira, acomodando-se, apoia os pés em cima da minha mesa.
— Você é muito chato quando está puto. Podia ir pra casa.
— Não — respondo rápido.
É verdade que ir para casa seria bom. Ter um tempo com Madeleine, foder sempre me trouxe
alívio quando estava em missão ou depois de algumas horas de torturas, e ter o conforto da minha
casa é ótimo, eu sei. Porém, ir para casa também pode me tirar a determinação de que preciso para
ser frio. O que fui treinado para ser.
Sempre fui um homem prático, que não se deixa levar ou é impulsivo, muito menos por
fraquezas na hora de agir. Infelizmente desde que Madeleine pediu aquele tempo, sei que ela é uma
fraqueza minha. Uma que não posso ter agora. Não posso arriscar qualquer chance de perceberem
que ela é uma fraqueza, além de ser minha esposa, que a transforma em alvo.
Merda! Eu fiz o que fiz em Denver porque estava tão longe dela, longe da sua energia, que
parece ser mágica, que não pode me impedir de ser quem sou, mesmo assim me faz pensar. Naquele
dia, quando acabei com Costa, fui para o quarto e, com a ausência dela, minhas ações foram
analisadas, coisa que ninguém foi capaz de alcançar dentro de mim dessa forma, nem mesmo minha
irmã, que parecia ser a voz da minha razão. Se é que eu tenho algum tipo de razão ou coração.
— O que eu preciso agora é de sangue — digo e me levanto pegando meu celular da mesa.
— Porra, Travis! — Colen vem atrás reclamando. — Lembre-se de que não é para acabar
com ele ainda. Precisamos dele.
Caminho pelo corredor a passos largos e chegando na sala onde Yuri está, eu me viro e dou
uma olhada atravessada para o meu irmão.
— Eu dei a ordem. Acha que me esqueceria?
Ele nega com um aceno e em silêncio. Ótimo. Não sou impulsivo. Sei o que estou fazendo.
— Ora, ora... Finalmente o ar da graça do chefinho — comenta Yuri com a voz fraca.
Esse filho da puta está todo arrebentado e ainda arruma energia para me provocar. Russo
nojento. Mantenho minha máscara raivosa para ele e dou mais dois passos, conseguindo ver melhor
seu rosto e o lábio arrebentado do lado de esquerdo.
— Acho que você ainda não sofreu o suficiente. — Olho para Luca, que faz uma careta de
repulsa. Eu não duvido das suas habilidades, estou entrando na onda desse babaca para arrancar
informações e poder atingi-lo aonde dói.
— Me solta logo. Eu não posso fazer nada por você.
Chuto-o no meio do estômago e me agacho, apoiando os cotovelos nos joelhos para ver bem
seu maldito rosto.
— Eu vou te soltar quando o seu pai se render. Ele fez meus homens sangrarem e eu vou fazê-
lo sangrar... — pego minha faca e enfio a lâmina no braço lentamente enquanto falo: — só um
pouquinho.
— Seu italiano filho da puta! — grita.
— Pelo insulto — aviso antes de pegá-lo pelos cabelos e arrastar até a parede, onde
impulsiono seu corpo com raiva.
E a tortura se prolonga por algumas horas. Meu autocontrole precisa ser alertado a cada
minuto porque não posso perder a “mão” e matá-lo antes do tempo. Cazzo. Eu me cobro essa regra a
cada chute, soco, facada e, quando arranco seu dedo mindinho e quebro a primeira costela, é só o
começo.

— Está melhor agora? — Solo pergunta irônico sentado ao lado de Luca bebendo sua bebida
açucarada que ele gosta depois de uma sessão de tortura.
De fato, são todos loucos com uma faca na mão.
— Não sei por que vocês sempre acham que estou estressado quando torturo alguém. — Jogo
longe o cigarro. Só fumo quando estou ansioso. — Eu também gosto de me divertir. — Solto uma
risada macabra, que faz Pietro tossir, rindo. Sempre quieto e ouvindo. Por isso o apelido de Espião.
— Mas você não é um psicopata como Solo e eu somos.
— Não fode. Eu sou um assassino. — Tiro minha luva de couro, não gosto do sangue entre
minhas unhas. — Não fiquem abobalhados porque gosto de sangue também. Parece que é a primeira
vez que faço isso, então parem com essas merdas.
A única coisa que me deixa frustrado no momento é não poder matar Yuri e o silêncio do seu
pai. Eu sei que ele vai ligar e, enquanto torturamos seu filho arrancando sangue, Ivon tortura do outro
lado ficando calado.
— Não acredito que o pai não liga para a existência dele. O filho da puta não ligou uma
única vez e já tem um bom tempo — Solo fala parecendo que leu meus pensamentos.
— Talvez nós precisamos de uma caçada rápida — comento e me levanto dando um soco na
mesa de metal, fazendo um estrondo alto. — Luca, venha comigo.
Pego o casaco de couro que uso quando ando de moto e as chaves. Nós seguimos para onde
as motos estão estacionadas e eu subo na minha Kawasaki, e Luca na sua Harley. Posso me garantir
saindo sozinho, mas preciso de algum sinal, alguma inspiração e fico aéreo quando estou assim. Eu
não vou para casa, como já decidi.
Saímos do balcão e damos a volta pela rua para pegarmos a estrada. O balcão fica longe da
cidade movimentada. Dos hotéis, cassinos e todo o glamour de Las Vegas. Fica em um local deserto,
em uma antiga fábrica que foi comprada por mim após sofrer uma grande explosão e ninguém querer
mais saber do terreno. Não tem risco tóxico ou radioativo, mas todos negaram o local.
O balcão, como costumamos chamar, é onde fica a maioria das armas que chegam para nós
usarmos e revendermos. Onde fica a maior quantia de dinheiro enterrado no subsolo da antiga
fábrica. Usamos aqui também para separar e transportar as drogas para os estados de Nevada,
Califórnia e Oregon.
E, claro, aqui é o local para manter os cativos, e tem muito espaço. Eu posso sequestrar todos
os soldados de Ivon até ele decidir se render.
Porra! Não consigo acreditar que ele não vai fazer nada pelo seu filho. Nem meu pai seria
assim. Ele ia querer arrancar os ossos por baixo da pele de quem tentasse pegar eu ou um dos meus
irmãos. Não porque nos amava, mas por honra e vingança.
E agora são quase sete horas da noite e posso imaginar Madeleine e Marinne jantando com
Dario e Luigi. Eu falei para aquele imbecil ser a sombra deles e espero que esteja fazendo um bom
trabalho.
Meus olhos estão focados na estrada e, assim que avistamos as luzes de Las Vegas, acelero e
sigo para a Pandora pela parte de trás da boate, onde tem um beco cheio de lixo e a porta de aço que
geralmente eu não uso. Estaciono e saio de cima da moto.
— Eu vou lá dentro rapidinho. Se você quiser pode ficar aqui fora. Não vou demorar.
— Tudo bem, pode ir — diz desligando o motor da Harley e se acomodando nela. — Eu vou
ficar aqui.
Com um aceno, entro na boate e sigo direto para o bar onde vejo Paolo. Ele tinha me passado
uma mensagem dizendo que estaria aqui pela noite. Comigo focado em torturar Yuri e pegar outros
comparsas de Ivon, ele precisa ficar de olho nos cassinos e nas boates. Estou sendo um ditador em
guerra nesses tempos.
— Finalmente você chegou — meu Consigliere comenta me olhando atravessado. — Pensei
que não viria mais.
Ele parece com a sua autoconfiança e violência restaurada. É assim que tem que ser e manter.
Não posso me comparar a ele e nem o que ele sofreu. Na verdade, não sei como me comportaria se
alguém matasse Madeleine. Acho que é mais perigoso alguém fazer algo com ela do que comigo.
— Eu estava me divertindo um pouco com aquele imbecil e esperando algum sinal de Ivon,
mas ele não parece ligar para a vida do filho.
— Ele está te provocando — diz sem ânimo. — Você sabe que não existe amor. É algo
imaginário em nosso mundo pais terem algum tipo de sentimento, principalmente vindo da Bratva. —
Bebe um pouco seu uísque. — E precisamos levar em conta que Ivon sempre foi interesseiro. Ele
tentou barganhar a filha de alguém em uma negociação para nos ferrar.
— Nossa, você sabe como melhorar meu humor me lembrando do que aquele verme fez! —
resmungo ainda mais irritado e batendo no bar, rosno para o garçom: — Traz a porra de uma bebida
forte para mim.
— Travis, eu não sabia que você viria hoje — Antonela vem falando alto como uma
verdadeira italiana que é.
— Deve ser porque eu não viria.
— Que bom que você apareceu, então — ela diz dando uma olhada para Paolo.
Eu não tenho tempo para ficar tentando decifrar os olhares de Antonela e Paolo. Eles sempre
faziam isso como se estivessem compartilhando algum segredo sobre mim. E é nesse momento que
meu telefone toca e tenho que agradecer por ser um número que conheço muito bem.
— Eu pensei que você não dava a mínima para o seu filho.
— Talvez você vá se importar mais ainda com o que eu tenho.
— Do que você está falando? — Levanto-me da banqueta e sinto meus músculos contraírem
de ódio. — Que porra você está falando?!
— Eu tenho uma surpresa para você e é bom você olhar o visor do seu celular, Travis. —
Dá um riso que me causa repulsa. — Espero que seu aparelho esteja intacto para enxergar muito
bem.
Meu coração acelera. Eu não gosto de sentir esse tipo de sensação. Meu estômago está
apertado de ansiedade e assim que vejo a foto, por pouco não esmago o aparelho na minha mão. É
uma foto do meu irmão ajoelhado e amarrado em um canto escuro de algum lugar que esse filho da
puta o colocou preso.
Fecho os olhos com força, enxergando tudo vermelho e consigo me recompor violentamente
rápido, para rosnar para ele:
— O que é isso?
— Isso é o que nós chamamos de “Dente por dente” ou “Olho por olho”. Você escolhe.
— Seu...
— Você pegou o meu filho — interrompe-me. — Eu peguei o seu irmão.
— Você vai se arrepender por ter feito isso. E não me venha dizer que é olho por olho. Você
começou essa guerra!
Ele ri como se estivesse em vantagem.
— Pelo visto, eu vou terminar.
— Eu vou matar o seu filho — murmuro entredentes — bem lentamente e ainda vou te mandar
alguns pedacinhos.
— Como se eu não pudesse matar seu irmão. A pena que é eu só tenho um filho e você pelo
menos tem mais um irmão e aquela sua doce irmã fofinha. Ela ainda está indo para a escola
interna?
Desligo o telefone porque tenho medo das minhas próximas palavras.
— O que que houve, Travis? — Paolo pergunta ao meu lado. — O que esse imbecil falou?
Não respondo, apenas pego meu aparelho e ligo para Madeleine. Fico satisfeito que ela
atende rápido.
— Você está segura?
— O quê?
— Responde! Você está segura? Você está em casa?
— Sim, estou em casa, Travis. O que houve?
— Eu só quero saber se você e Marinne estão em casa com Luigi.
— Sim, estamos, ma-mas...
— Eu já sei que Dario não está.
— Como assim? — Percebo o nervosismo em sua voz.
— Eu vou chegar em casa daqui a pouco e a gente se fala. Mas não saia de jeito nenhum daí.
Eu juro que você vai se arrepender.
— Não vou sair daqui. Eu prometo. Ninguém vai.
— Ótimo!
— O que houve com Dario? — Antonela pergunta parando na minha frente assim que desligo
o telefone.
— Ivon capturou ele.
— Ah, não!
— Merda! — Só escuto o barulho do copo estilhaçando atrás de mim quando Paolo o joga
longe. — Ele está passando dos limites! — brada enraivecido.
— E eu também vou — digo.
Não consigo focar em nada na minha frente. Eu vou até as últimas consequências para
capturar o meu irmão e matar todos esses filhos da puta!
Se antes eu já estava nervosa com o sumiço de Dario, porque não era para ele ter saído sem
dizer nada e sem segurança, me vem esse telefonema estranho de Travis no momento que Luigi me
fala que ia esperar mais um pouco. Pedi para ele fazer uma busca rápida e não preocupar ninguém,
mas... Dio mio. A situação só piora!
Olho para os cantos da casa, estou parada no meio do corredor entre a cozinha e as salas, e
por instinto e o sentimento bom que sempre me traz, entro na sala de piano.
Preciso me sentar porque não estou sentindo as minhas pernas de novo. Engulo em seco e vou
para o sofá de dois lugares no canto. Solto a respiração e tento parar de tremer assim que Marinne
chega perto olhando-me ansiosamente.
— O que que houve? Que cara é essa?
— Seu irmão ligou.
— Qual irmão, Made? — Toca no meu ombro. — Respira e se explique, por favor.
Sorrio grata por sua preocupação e assinto sugando uma respiração profunda, falo:
— Travis ligou e pediu para a gente não sair de casa. O que já estamos fazendo. — Dou de
ombros meio abobalhada.
Dio mio. Que tortura fingir neutralidade em um momento desses.
— Travis não pediria para a gente não sair de casa se não tivesse motivo — conclui o óbvio.
Sempre astuta com tudo. — Aconteceu alguma coisa. Ou você não sabe ou não quer me contar.
— Eu não sei — respondo rápido e escolho dizer a verdade.
Marinne fica com os olhos perdidos e se senta ao meu lado.
— Se ele não quis dizer...
Olho para o seu perfil, vejo-a soltar a respiração e então me encarar com seus olhos
idênticos aos do meu marido, mas esses estão marejados. Por instinto, puxo-a para mim e a abraço,
ninando-a.
— Vai ficar tudo bem, meu amor. Ele já está chegando e vai falar o que houve. Vai ficar tudo
bem.
— Você não sabe — sussurra.
— Não pensa assim, por favor. — Afasto-a para ver seu rosto. — Marinne... eu já estou
nervosa por mim mesma, seja minha amiga também agora, está bom. Fica calma e confiante — peço
baixinho afagando seus cabelos.
Ela assente e se levanta olhando com tanta franqueza que fico sem ar.
— Vou tentar, mas... estou com medo.
Merda! Suas palavras me deixam mais perturbada agora.
Levanto-me e a pego nos braços mais uma vez.
— Então nós duas vamos ser fortes e esperar o seu irmão.
Marinne concorda com alguns acenos e me deixa levá-la para a cozinha e pegar um pouco de
água. Depois vamos para a sala de estar esperar, o que não é muito, pois uns cinco minutos após sua
ligação, Travis adentra a mansão pelas portas duplas sendo abertas por seus soldados e Luca atrás
dele.
Levanto-me rápido do sofá, dou a volta e encontro eles no meio do caminho, um pouco
surpresa pelas roupas de Travis. Nunca o vi de casaco de couro e ele parecendo tão... Rebelde,
malvado. Talvez não são as roupas, totalmente pretas e um pouco informais, mas os olhos e o rosto...
Mascarado por sua face violenta.
Distante, absolutamente distante é o que ele está agora. Sei que há algumas semanas anda
assim, mas, porra, agora é um pouco insuportável ver. Amedrontador.
Ele não esboça tranquilidade ou tenta se aproximar de nós como faz as vezes. Nada de
cumprimento ou afeto, simplesmente fala:
— Primeiro a regra é uma só, não quero que vocês saiam para nada, nunca e de jeito nenhum,
a não ser que estejam comigo e, mesmo assim, sairemos escoltados.
— Nós já não estamos saindo, Travis — Marinne murmura.
— Não sei quando você vai poder voltar à escola, Marinne — diz friamente para a irmã e ela
acata com um aceno.
— Tudo bem... Agora fala o que houve. Cadê o Colen e o Dario?
Se a expressão dele já não estava boa antes dessa pergunta, prefiro nem nomear como ele
aparenta. Estou vendo o famoso Travis Lozartan, O cruel. Frio, impetuoso e raivoso. O senhor de
todos os estados do ocidente dos Estados Unidos. O Capo del capi.
— Pegaram Dario, porque aquele idiota saiu de casa quando não era para ter feito. Ele foi
capturado por sua teimosia.
Não temos tempo, apenas olhamos Marinne cair no chão, sentando-se e começando a chorar.
Travis com movimentos engessados, pega-a nos braços e a leva para o sofá. De pé assisto-o tentando
consolar a irmã afagando suas costas e falando baixo só para ela:
— Eu vou recuperar ele, não fica assim.
— Você sabe... — Ela soluça e tenta de novo. — Você sabe o que acontece...
— Eu sei. Eu sei — interrompe-a. — Mas o nosso irmão é forte. Não fica com medo por algo
que posso dar um jeito.
Ela se afasta dele, saindo do seu colo, e se levanta ficando ao meu lado. Passo a mão nas
suas costas tentando confortá-la e ouço sua voz chorosa quando fala:
— Travis, você pode. Eu sei que pode, mas... Não é uma certeza.
— Eu sei. — Ele se põe de pé também. — Porém, eu dou minha palavra de que vou trazê-lo
de volta para casa. — E de novo dá sua certeza.
Qualquer pessoa que promete algo para mim ou alguém, eu posso duvidar, mas ele não.
Realmente acredito que pode resgatar Dario vivo. Se ele prometer que vai fazer, pode confiar apenas
no dia do resultado.
Travis troca um olhar comigo quando abraça a irmã. Suspiro encarando-o e, nesse momento,
eu sei que tenho que ficar quieta e vou me sentar na poltrona.
— Agora — diz afastando-a e fitando seus olhos —, eu quero que você vá para o seu quarto.
Preciso falar com Madeleine rápido antes de sair para retornar as tarefas.
“Tarefa é um jeito um tanto delicado demais para chamar o que anda fazendo contra a
Bratva”, penso com ironia.
— Eu vou rezar — Marinne diz antes de ir. — Não custa nada, não é. — Ela é tão meiga
como sempre.
Travis fica em silêncio por tempo demais encarando-a e eu me levanto para salvar o
momento. Dou um abraço rápido nela e digo:
— Não, mia cara. Não custa nada.
Ela assente, beija meu rosto rápido e sai correndo para as escadas, para o seu quarto.
Eu me viro e fito Travis, que fica um bom tempo parecendo longe, distraído. Ele está
diferente e toda a verdade da sua crueldade, que eu sei que ele tem dentro de si, está agora sob a
superfície como nunca esteve. Não tem como ser diferente nesse momento.
Ele arfa, pisca os olhos rápido e vira-se para mim. Surpreendendo-me, pega minha mão e
voltamos a nos sentar. Aliso sua roupa, o casaco de couro preto, que para mim é uma novidade doída
demais. E quando ele parece que relaxa, eu fico próxima o suficiente para tocar seu rosto.
Porém, ele é mais decidido e passo o polegar sobre meus lábios antes de deslizar sua mão
até minha nuca e aproximar nossos rostos, fazendo seus lábios tocarem nos meus quase como um
beijo. Eu sei que tremo por medo, nervoso e angústia, mas ele... Não faço ideia do porquê parece
pulsar.
— Eu sei que você vai conseguir. — Acredito que ele precisa ouvir eu dizer isso. — Só
respira agora, amor.
Solta a respiração com força pelo nariz e encosta a testa na minha. Fecha os olhos e põe
minhas mãos no seu peitoral. Uau! Seu coração bate como um motor de Fórmula 1.
— Você vai conseguir.
— Ele pegou o meu irmão. — Tem tanta raiva nessa frase.
— Eu sei — digo em um misto de raiva e medo. Meus olhos ficam marejados. — Você vai
trazê-lo de volta. Custe o que custar.
Ficamos mais um tempo na posição. Ele ergue meu rosto, beija minha boca de leve e me
encara fixamente.
— Eu preciso que você cuide da Marinne. Ela parece estar forte, mas foi um baque do
caralho.
— Eu sei, amor. Tudo bem, vou cuidar dela. Não se preocupe com isso e desculpa por não
ter visto quando Dario saiu. Fiquei muito preocupada na hora.
— A culpa não foi sua. — Então reforça dizendo como se lesse meus pensamentos e sabendo
que eu relembrei o tiro que Dario levou por mim e a morte de Mia. — De novo, a culpa não foi sua.
Soluço chorando e assinto freneticamente.
— Eu sei, mas... eu tinha que cuidar dele.
Travis esfrega meus braços como se meus tremores fossem de frio e não de medo.
— Você já tinha que cuidar de você mesma e ele tinha que ter me obedecido. Eu não vou ficar
remoendo o leite que já foi derramado. Agora preciso pegar o meu irmão antes que seja tarde
demais.
— O que você vai fazer?
— Tudo que for preciso.
Assinto e me acalmo para conseguir falar:
— Ficará em casa agora?
— Não posso.
— É, eu sei. — Dou de ombros me desculpando por fazer uma pergunta idiota dessas.
— Eu tenho que coordenar os soldados e dar as ordens aos capitães pessoalmente e agora
para que Dario seja capturado o quanto antes. Não podemos perder tempo, deixá-lo passar muito
tempo nas mãos da Bratva. Não posso permitir. E sem contar que irei falar com Orazio antes de ele
partir.
— Partir? — Franzo a testa, confusa.
— Orazio vai para a Califórnia na segunda ou terça-feira.
— Pensei que você fosse repensar sobre a ida dele. Pelo menos, por enquanto, com tudo isso
acontecendo.
— Não — afirma convicto. — Agora mesmo que preciso que ele vá. Não tem como deixar
mais minha cidade sozinha sem um Underboss. Los Angeles precisa de supervisão. Os Burn Roads
dão muito trabalho.
Eu já tinha ouvido falar do clube de motoqueiros de Los Angeles quando morava lá. Minha
mãe era uma desnaturada e etc., porém me avisava dos perigos da Califórnia e esses motoqueiros
eram umas pestes para a máfia italiana.
— Sim, eu entendi e queria saber... Você pensou sobre a proposta da Bárbara? Falou com o
pai dela?
— Falei e Orazio aceitou a ideia — responde sem a mínima emoção. — Provavelmente
teremos um pedido o quanto antes. Mas não vai ser nada glamouroso e o casamento deve acontecer
bem rápido. Orazio não irá adiar sua partida e Bárbara terá que ir com ele, pois ainda é solteira e
responsabilidade dele.
— Mas...
— Madeleine, você sabe de todas as regras e essa funcionalidade em qualquer círculo
familiar é comum. Ela não pode ficar sozinha. — Afaga meus ombros. — Não se preocupe. Assim
que o casamento acontecer, ela volta para Las Vegas, eu garanto.
— Sim, tudo bem. — Concordo com um aceno e sorrio, sem muita vontade. — Eu a quero
por perto porque é minha única amiga e não quero ficar sozinha aqui. Tenho Marinne para cuidar e
tudo mais, mas ter uma amiga é algo diferente.
Sem contar que fico muito feliz de ela se casar com alguém que goste, mesmo que até então o
que se prova é que ele não gosta dela. Bem, só que, se ele aceitou, indica que tem algum interesse.
Isso já é um bom caminho para o relacionamento deles darem certo.
— Não precisa se explicar e não se preocupe. Ela logo estará de volta.
Assinto e o abraço agradecida.
Pareço desanimada, só que, na verdade, estou muito feliz. Minha amiga se casar com alguém
de Las Vegas me dá a oportunidade perfeita de tê-la por perto. Eu estava bastante triste por pensar
que ela ia embora. Los Angeles não é tão longe. Eu sei, não é o fim do mundo, mas eu quero sua
companhia por perto quando eu precisar. Quero que tenhamos filhos e eles sejam amigos.

Estou deitada na cama olhando para a frente sem focar em nada há tanto tempo que já perdi a
noção. Só sei que o colchão já ganhou o formato do meu corpo, o que significa que tem muito tempo.
Não estou me sentindo bem e o aperto no meu coração só aumenta.
Marinne não saiu do quarto desde que subiu. Eu vim para o meu assim que Travis se foi. Eu
pedi, quase implorei, para ele se cuidar. Não sei como vou lidar se algo acontecer com ele.
Eu queria de verdade poder ajudar. Sentir-me inútil nunca foi algo que experimentei na vida.
Cuidar da Marinne é uma tarefa fácil. Ela não é mais uma criança indefesa que precisa de total
atenção. Ela é uma adolescente muito bem resolvida, esperta e madura, até demais para a sua idade.
É como esperado, mente vazia só serve para pânico e pensar merda. E como eu não tenho
muita informação, a única coisa que eu tenho que fazer são sugestões do tipo: Será que, se Travis
não tivesse pego o Yuri, Ivon não raptaria Dario? Nunca saberemos porque já está feito e talvez os
planos de Ivon sempre foi pegar um de nós.
— Ah... Estou muito entediada — resmungo virando na cama e, como uma descarga elétrica
para o meu corpo, resolvo sair dela.
No banheiro, tiro minha camisola e tomo um banho quente. Estou sentindo um calor anormal e
um frio, ao mesmo tempo, e estou com tesão. Talvez eu tenha que me virar sozinha. Quer dizer, já tem
três noites que me viro sozinha e hoje provavelmente não será diferente. Travis não virá para casa.
Ele não pode me dar atenção agora e eu sinto uma necessidade dele loucamente dentro de mim.
Terminando o banho, vejo o que posso fazer para saciar minha vontade. Volto para o quarto e
certifico-me de que a porta está fechada, mas sem necessidade de trancar. Ninguém aqui entra em
nenhum quarto ou no escritório, sem antes bater e ter permissão. As trancas são figurativas. O
respeito é levado muito a sério, e a única pessoa que entraria neste quarto seria meu marido.
Indo em direção da cama, solto a toalha no recamier, e subo na mesma ficando no meio dela.
Como a meta única é sentir prazer, abro minhas pernas e massageio o meu clitóris.
Não faço muito esforço para me sentir sensível. Meu desejo está aflorado e meus dedos não
são o suficiente, mas é gostoso. Sinto um gemido se propagar no meio da minha garganta quando a
porta do quarto é escancarada de repente.
“O quê?”, penso rápido e tento controlar minha respiração e em uma tentativa falha me cubro
com o travesseiro olhando para a figura alta, musculosa e grande na porta.
— Estava me esperando? — pergunta Travis encarando-me ainda no lugar, com a mão na
maçaneta.
Sua voz, seus olhos e toda sua energia magnética e possessiva, abraça-me e eu jogo o
travesseiro para o lado, mostrando-me para ele enquanto sussurro:
— Sempre.
E a porta se fecha com uma pancada, e eu sei que, dessa vez, ela estará trancada. Talvez meu
inconsciente queira isso e pelo menos algumas preces são atendidas nesses tempos sombrios.
Sinto meus seios mais pesados, quentes e meus músculos retesarem. Meu coração acelera e o
calor e o vazio no meio das minhas pernas chega a ser doloroso.
Parada e ansiosa, admiro-o tirar o casaco, o coldre, a blusa, o cinto, abrir a calça e abaixar
junto com a cueca, já tirando os sapatos com a ajuda dos próprios pés, as meias no final, ficando
deliciosamente nu na minha frente. Seus olhos nunca deixando os meus.
Ele nem precisa me tocar para me deixar mais excitada. Puta que pariu!
— Eu quero você dentro de mim... Agora!
Mesmo com a expressão séria, noto o canto da sua boca curvar-se no sorriso mais sombrio e
erótico que já vi na minha vida. Ele não vai parar de me surpreender, disso tenho total certeza.
Sem esperar, ele me puxa pelos tornozelos, me coloca no meio da cama, e abre minhas
pernas. Sem aviso, sua boca está na minha boceta e ele começa a me chupar. Abocanha como se eu
fosse um sorvete derretendo, circula com a ponta da língua o meu clitóris e deixa a língua ali,
deixando-me mais úmida e eu vou sentindo o meu corpo se preparando para ele.
Ele me chupa como se estivesse beijando minha boca, devorando-me, abrindo-me. Meus
músculos chegam a doer conforme faço força para não me mexer demais. Sinto-o abrir mais minhas
pernas e apertar minhas coxas. Meu corpo parece que incendeia e abafo um grito, prendendo no meio
da garganta. Eu não quero que ninguém escute, mas ele está fazendo essa tarefa ser bem difícil.
— Dio mio... Travis! Amor... Ah... — Solto um grito abafado. — Caralho! — grito de novo,
só que dessa vez gozando.
Mal tenho tempo de curtir esse orgasmo porque ele me puxa, aperta minha cintura e desliza a
mão até o meio das minhas costas, levanta meu corpo e segura meu rosto. Beija-me com a mesma
fome que me chupou. Nós fazemos barulhos nos beijando e eu seguro o seu pau, apertando e
punhetando.
— Eu não vou ser gentil — avisa passando a língua na minha boca aberta, à procura de ar e
da sua língua.
— Não tem problema. Eu também quero.
Seus olhos estão negros, frios, intensos e cruéis. Eu quero que a sua sombra me cubra. Eu
também me apaixonei por ela. Eu sei o quanto ele precisa de mim agora para se libertar, se soltar.
Me possuir na cama é muito mais do que apenas por prazer agora.
— Me devore! Eu sou — balbucio na sua boca — sua.
Ele me dá outro beijo forte, chegando a machucar meus lábios antes de empurrar o meu corpo
para a cama.
— Me dá as suas mãos — pede com sua voz rouca.
Respiro fundo, engulo em seco e estico meus braços, oferecendo o que pede. Vejo-o pegar um
lenço na gaveta da mesa de cabeceira do lado que dorme e sou obrigada a respirar fundo, ansiosa.
Ele já me amarrou uma vez, só que eu acho que, dessa vez, será um pouco mais intenso. Meu corpo
pede isso. Clama por ele.
Quando tem minhas mãos amarradas, me segura e gira meu corpo sem nenhuma dificuldade.
Faz eu deitar a parte da frente, encostando minha bochecha no colchão e as mãos amarradas ficando
para trás das costas, ajudando a apoiar-me. Ele abre bastante minhas pernas e sinto quando passa a
ponta da sua ereção dura e quente nas minhas nádegas. Parece que... Vai acontecer, mas...
— Hoje eu não vou ter a sua bunda, mas muito em breve, mi angele.
Apenas sua promessa me faz gemer e ansiar por isso. Eu nunca pensei que o sexo pudesse
propor tanto prazer na vida. Que fosse tão maravilhoso assim. Que eu fosse querer coisas como anal,
mas com ele tudo se torna incrível e gostoso. Talvez seja porque eu sou louca por ele.
— Merda! — exclamo sendo preenchida de uma vez.
Ele puxa meu corpo para trás e empurra o dele para a frente. Estoca com força e eu grito
dentro do colchão para Marinne não ouvir.
Ai, caramba. Isso não...
— Porra!
Meus olhos enchem d’água quando ele força de novo para dentro, e sai devagar e mete de
novo com toda sua força. Então um tapa atinge minha bunda. Ele pega uma velocidade certeira,
entrando e saindo, fodendo-me com toda a expressão da palavra.
Eu não poder me mexer, não poder fazer nada, apenas me abrir, aguentá-lo me possuir da
forma mais deliciosa e possessiva que já fez sexo comigo é surreal.
Gentileza nunca foi o seu forte, mas dessa vez... Santo Deus. Acho que eu vou...
Eu gozo gostoso sentindo meu corpo quase desfalecer. Meus músculos doem, fico até tonta,
mas ele continua e bate de novo na minha bunda e segura minhas coxas. Puxa-me, empurra de volta e
puxa, na cama, penetrando fundo a minha boceta.
Agora não tem palavra de carinho, conversa ou sua voz, só há sua força, poder... Dentro, fora,
do lado, do outro. Em cima e em baixo nesse quarto inteiro, dele sob mim.
— Travis... Ai, meu Deus! — choramingo e não estou reclamando. É demais.
— Está gostando de ser fodida desse jeito? — pergunta pela primeira vez, enquanto estoca
para dentro de mim ferozmente.
Sinceramente, não tenho como responder, estou sem fôlego.
Honestamente... Acho que vou desmaiar.
Então... Gozo a terceira vez em um tempo recorde.
Estou dolorida, sem ar e sinto-o deslizar uma das mãos em meu corpo, apertar minha barriga;
e segura minha garganta com os dedos da outra, segurando meu pescoço, não para machucar e estou
de joelhos no meio da cama enquanto ele está de pé ainda, empurrando para dentro de mim e somos
sensação e gemidos. Recebo seu beijo luxurioso quando guia minha boca para a sua e fico mole em
suas mãos.
— De quem você é? — sussurra no meu ouvido antes de dar uma mordida no meu pescoço.
— Eu sou sua, Travis. Sua! Completamente sua. — Ai, meu Deus! Acho que dá para morrer
de excitação.
Travis me dá um beijo seco e rápido na boca, sai de dentro de mim, me afasta e vira meu
corpo no meio da cama, jogando-me no colchão. Então me abre, sobe até cobrir meu corpo com o seu
e, quando mete em mim, me fode ainda com mais força.
— Ai... Amor — reclamo, mas na verdade não reclamo. Eu gosto.
Fecho os olhos, deixo a boca aberta e enfio as unhas nos seus ombros enquanto ele aperta
minha coxa e me preenche até o fundo. Arfo e fito seus olhos, que estão famintos como nunca.
— Quero que goze de novo — ele insiste e desce sua mão até o meu clitóris e seu polegar
massageia a ponta, que está muito sensível.
— Não sei... Se eu consigo.
— Consegue sim! — Empurra e continua até que eu grito jogando a cabeça para trás gozando
de novo e ele vem junto comigo, liberando-se dentro de mim.
Ele não está imune a essa foda, porque o corpo todo treme como se estivesse tendo
hipotermia e então desaba em cima de mim, passando a língua no meu pescoço até a orelha, sentindo
o gosto do meu suor. Eu o rodeio com meus braços e pernas – porque em algum momento deixo de
ficar imobilizada – e relaxo. Ou, melhor dizendo, desmaio.

Acordo com um beijo terno deixado no meu ombro, nas minhas costas, no meu braço e então
sinto um cheiro no meu ouvido.
— Bom dia — Travis murmura com sua voz deliciosa de barítono.
Sorrio engolindo em seco porque minha garganta está absolutamente seca. Estou acabada.
Meu corpo dói, meus músculos parecem gelatina e quando viro meu rosto para poder vê-lo, quase
não consigo abrir os olhos.
— Tô com dor de cabeça — falo um pouco grogue. — Com certeza, não vou me levantar
agora.
— Tudo bem. — Afaga meu braço. — Desculpa por ontem. Acho que me excedi.
— Tudo bem, amor — digo girando meu corpo até ficar de frente para ele e afago seu rosto.
— Eu gostei e você não sabe o quanto eu queria.
— Mas eu fui bruto. Você está toda cheia de marcas.
Rio baixinho, sacudindo os ombros.
— Mas foi uma delícia, te garanto. — Abro um sorriso fraco fechando os olhos.
Ganho um beijinho no nariz.
— Eu não tô... Dormindo, só cansada. Você acabou... Comigo.
Escuto seu riso, que acho que só eu conheço, e ganho um beijo onde estou precisando, na
mordida que ele me deu no ombro também. Céus! Foi tão bom.
— Tudo bem, se realmente gostou.
— Sim, amei, só que... Vamos esperar pelo menos um mês para repetir.
Isso faz ele rir alto e me dá outro beijo. Beijos, beijos e beijos. Adoro o modo beijoqueiro
de Travis.
— Tudo bem, daqui a um mês a gente faz de novo.
— Por mim tudo bem — sussurro cinicamente e abro os olhos.
Ele assente e recebo um carinho gostoso nas costas e seu polegar passa lentamente no meu
pescoço.
— Deixei uma marca em você.
— Há muito tempo.
Ele fica em silêncio e franzo a testa, fitando seu rosto, com o olhar estranho.
— O que foi?
— Nada — responde rápido. — Você me surpreende às vezes falando essas coisas.
Dou um sorrisinho para ele e me aconchego no seu calor. Beijo seu peito, em cima de uma
das milhares de cicatrizes que possui.
— É porque eu sou sua, apenas isso.
— E sempre será — ele afirma.

Faz uma semana que levaram Dario e, se as coisas já estavam difíceis antes, agora piorou tudo
para mim e Marinne. Para todos, pelo que sei, pois Travis e Colen estão impossíveis caçando o
irmão.
Para nós mulheres, a segurança redobrou, mesmo que não saímos de casa para nada. Travis
faz questão que os seus soldados tragam tudo que nós pedimos, mas não podemos colocar o pé para
fora de jeito nenhum. Por sorte é inverno e não dá aquela vontade de pular na piscina.
E hoje para completar é o aniversário de Marinne e, pela promessa feita aos D’Ângelo, seria
o noivado, quando Amândio daria finalmente a aliança de compromisso.
Todavia, devido as circunstâncias, a guerra e a captura de Dario, não terá festa. Não tinha
como a gente fazer algum tipo de comemoração para celebrar o dia dela, e Marinne não quer.
Sobre o noivado, tivemos que adiar a entrega da aliança sob um banquete. Com certeza era
para ter uma festa ou uma recepção para alguns soldados, capitães, Underboss e os Capos das duas
Famiglie. Porém, não tinha como fazer isso. O foco de Travis é recuperar o irmão e sua vingança
contra Ivon. Ele não deixaria de fazer um fazendo outro.
— Está tudo pronto? — pergunto para Marie Rose levando uma bandeja para a sala de jantar.
— Sim, senhora.
— Ótimo. — Assinto e um vulto do lado de fora no terraço me chama atenção. — Querida?
— chamo Marinne, sentada em silêncio no banco no canto.
Bene, eu queria que pudéssemos fazer uma festa grande, como ela merece. Eu precisava fazer
algo, mesmo que simples, para não passar o seu dia em branco, então planejei um jantar para nós, e
como Travis me disse que Amândio não liga para a nossa guerra, ele vinha.
Ela não me responde deixando-me ainda mais preocupada.
— Senhora, o convidado chegou — Luigi fala aparecendo nas portas francesas.
Seguro a respiração e lhe dou um aceno. Ele volta para dentro e eu vou até Marinne. Sento-
me ao seu lado e espero pacientemente olhar para mim, mas não faz.
— Escute, eu sei como você deve estar se sentindo, mas eu estou aqui, do seu lado, e nada e
nem ninguém irá fazer algo de ruim para você.
Ela acena que sim, de cabeça baixa. Estico minha mão e coloco em cima das suas.
— Você está ouvindo o que estou falando? Eu estou ao seu lado e ninguém vai te fazer nada
de ruim ou sequer pensar.
— Eu sei... Só estou pensativa.
— Está pensando em quê? Conta para mim.
Ela continua não olhando nos meus olhos e parece filtrar o que dizer para mim. Qual dos
pensamentos ela pode compartilhar.
— Eu sempre soube que teria que me casar com alguém que fosse escolhido para mim, ou
melhor, eu escolhida para ele e, quando Travis falou comigo, eu já sabia. — Faz uma pausa e dá de
ombros. — Eu o ouvi conversando com a vovó e com o vovô, só não quis que ele soubesse que eu já
sabia. — Levanta os olhos finalmente para mim. — Você sabe como ele detesta que escutem a
conversa atrás da porta.
— Sim, eu sei, mas você não obedece muito — brinco batendo no seu nariz. — Você é a
pessoa que mais tem informação nessa casa.
Marinne acha graça e dá de ombros, mas logo fica séria.
— Aquela conversa foi a única que detestei ouvir, mas está tudo bem. Eu... Já aceitei e...
estou ansiosa.
— Por que, meu amor?
— Hoje vai começar a nossa interação, de verdade. Travis quer que nos conhecemos e...
Daqui a algum tempo... Eu vou embora — ela chora e cai nos meus braços.
Eu a aperto bem forte.
— Eu vou sentir falta do meu irmão e de você... Vou ter que ir para Nova York. É tão longe.
— Você sempre vai estar perto do meu coração — digo baixinho, afagando seus cabelos. —
Eu vou ligar para você todo dia, mia cara. Nunca vou te deixar e tenho certeza de que o Travis
também não vai. É normal se sentir nervosa com o novo, mas algo dentro de mim diz que vai ficar
tudo bem. E sabe por quê?
— Não — responde em um murmúrio.
Afasto-a para ver os olhos azuis que eu adoro e digo com confiança:
— Porque você é uma menina muito inteligente, esperta e doce. Tão generosa e altruísta. Eu
amo tudo em você e sempre estarei ao seu lado. Está me ouvindo?
Ela concorda balançando a cabeça que sim e abre um sorriso lindo.
— Obrigada por ser assim comigo. Obrigada por ser a... Minha mãe. — Dá de ombros
fazendo um biquinho emocionado. — Eu tive Travis a minha vida toda e Colen também cuidou de
mim. O Dario... — sorri com pesar. — Ele realmente foi um irmão, sabe.
Assinto e limpo suas lágrimas.
— Mas uma mamãe... Eu não tive. Que dizer, só agora com você e terei por mais alguns anos.
— Não! — corrijo-a. — Eu vou ser a mãe que você precisa para sempre, não até você fazer
dezoito anos e se casar. Eu serei sua mãe até o meu último suspiro, se é isso que você quer. — Fico
emocionada também e engulo em seco. — Cuidar de você me trouxe uma maturidade incrível. Você é
um presente lindo que o seu irmão me deu, de verdade.
— Eu amo você, Madeleine.
— Mia cara... — sussurro. — Também amo muito você e agora, vamos limpar esses
olhinhos — passo os polegares embaixo dos seus olhos — e abrir um sorriso e entrar para
cumprimentar Amândio. Confie em mim, ele sabe que Travis é perigoso como também já percebeu
quem eu sou, e que vou protegê-la com unhas e dentes. Ele não é louco de fazer nada contra você.
— Obrigada — replica baixinho.
— E você me prometa, que sempre vai ser forte. Vai se colocar em primeiro lugar, se dar
valor e mostrar para ele que tem que ser tratada com respeito acima de tudo. Então a união de vocês
vai ser boa. Está bom?
— Está bom. Eu prometo.
— Então, vamos.
De mãos dadas, nós entramos e seguimos para o lobby da casa aonde Amândio está
esperando com um buquê de flores; tulipas rosas claras, e um presente com um embrulho da mesma
cor das flores com uma fita branca de cetim.
Ele dá um passo à frente e Marinne se aproxima, os ombros se encolhem, acanhada.
— Feliz aniversário, Marinne. — Ele entrega o presente e as flores.
Escuto, mesmo não tão perto, ela suspirar baixinho quando aceita.
— Obrigada e-e-e... Obrigada por vir hoje — murmura.
— Eu não perderia por nada — diz e tem muita confiança na sua voz.
Posso me enganar, entretanto acredito que não, que ele vai ser um excelente marido para ela.
Seus olhos refletem uma profundidade impressionante. Sua beleza misturada com sua frieza o torna
quase inacessível, só que eu acredito que Marinne tem um peso de quebrar barreiras. Eu vejo isso
com seu irmão, que, ao pensar nele, o próprio adentra a casa.
Seguro a respiração e vou recebê-lo.
— Pensei que não viria — comento apenas para Travis.
E minha resposta é o seu olhar marcante e predatório.
Ele não veio porque se importa com o aniversário, não que ele não faça tudo para Marinne,
só que não é sentimental. Ele veio porque tem um estranho, um inimigo – todos os Homens de Honra
tratam outros homens como inimigos— em seu território. Confiança é um fio de cabelo em nosso
mundo. Travis está aqui para cuidar e impor seu domínio dentro de seus domínios.
Assinto e me afasto, aproveitando para cumprimentar Paolo.
— Oi. Como está?
— Bem e você?
— Bem também. — Abro um sorriso idiota, igual essa interação engessada. — Como está
sua filha?
— Bem.
Movo meus ombros sem jeito e peço licença com um gesto. Ele não quer conversar e será
bom eu ver como está tudo. Passando por todos vou direto para a cozinha, olho as meninas e volto
para a sala de jantar assim que ouço as vozes de todos. Travis se aproxima de mim e coloca a mão
em meu braço gentil e possessivamente.
— Qual o problema?
— Nenhum — respondo balançando a cabeça. — E você?
Ele me encara em silêncio, nitidamente tentando ler meus pensamentos e responde sem
emoção:
— Não posso demorar, você sabe.
Assinto e sorrio.
— É uma mera formalidade, eu sei, mas não seja tão insensível com Marinne. Fale com ela,
abrace-a e... Você comprou um presente?
— Ah... Eu...
— Tudo bem — interrompo-o. — Comprei para você. Está lá no nosso quarto. Depois você
pega e lhe entrega.
Ele aperta um pouco sua mão no meu braço e quase sorri.
— Obrigado.
— Não há de que. Agora, vamos nos sentar e comer.
Ele concorda e vamos para os nossos lugares.
O jantar é tranquilo, monossilábico e gélido como o reino de Frozen depois que a Elsa congela
tudo. Dio mio. Nunca me senti tão desconfortável na vida e respiro aliviada quando as visitas vão
embora.
Eu entendo todos os motivos de ter sido assim, mesmo assim não deixo de lamentar por
Marinne. Calada a maior parte do tempo. Nossa verdadeira alegria seria Dario voltar logo e por isso
não tem o que lamentar do jantar. Formalidade, foi apenas isso.
Eu realmente cheguei a cogitar adiar o noivado hoje com Marinne Lozartan, mas meu pai não
quis. Foi irredutível. Disse que era necessário ter essa aliança o quanto antes divulgada para todos,
mesmo que, no momento, nós não seremos beneficiados em porra nenhuma. E sim, Travis Lozartan,
pois neste momento darei a garantia de que enviarei meus homens se precisar, mesmo ele não
querendo alegando que é um “problema” pessoal. Uma guerra pessoal e não diretamente com a
Bratva, embora isso não garanta que o chefe desses filhos da puta russos tente alguma coisa.
O motorista que foi me buscar no aeroporto para o carro nas portas da mansão e saio seguido
de Matteo. Eu pretendia transformá-lo em meu Consigliere quando me tornar chefe, mas ele é muito
bom com as facas não com o cérebro e todo mundo meio que já espera o fato de ele ser um Executor.
Tal pai, tal filho. Nós sempre acabamos nos tornando uma cópia dos nossos pais.
Sou recepcionado por uma mulher sorridente. Uma senhora que eu já conheci na outra vez
que vim aqui. Ela pede para eu esperar no lobby da casa. Assinto e vejo-o sumir pelos corredores da
casa.
Ficar parado aqui não é nada de mais, não me importo. Não importo nem um pouco nem com
os soldados que estão dentro da residência me vigiando. Espero que não tentem nada. Vão morrer
num piscar de olhos.
Alguns minutos depois, Madeleine, agora finalmente a esposa de Travis, surge com Marinne
ao seu lado. A menina aparenta mais acanhada do que no nosso último encontro. Os ombros estão
caídos, o semblante triste, os olhos sombreados de lágrimas derramadas e é óbvio que tem a ver com
o irmão, Dario Lozartan.
Acredito que não estaria diferente se tivessem levado um dos meus irmãos, principalmente se
fosse uma das meninas. E por isso disse que essa merda de noivado deveria ter sido adiado até o
garoto voltar, mesmo que fosse apenas o corpo. Todavia, na Famiglia, o show tem que continuar. Até
mesmo se ele morrer estaríamos nos casando no dia seguinte. Estratégia e negócios, somos movidos
pelo controle e poder.
Madeleine abre um sorriso para mim, cordial sem muito entusiasmo também, juntamente com
um aceno de cabeça.
— Boa noite, Amândio.
— Boa noite — replico e então espero Marinne erguer os olhos.
Puta que pariu!
Uma perturbação me atinge quando seus olhos azuis, tão azuis, parecem perfurar algo em mim
quando me encara. Novamente enxergo a profundidade, a intensidade neles. E aquela vontade
estranha de querer me aproximar. Sentir seu cheiro. Tocar sua pele. Descobrir algo que eu acredito
firmemente que há nela. Um mistério sob seus olhos. É enlouquecedor não ter controle sobre isso.
Contendo-me, dou um passo e estendo minha mão, oferecendo as flores e o presente. Espero
que ela goste de joias. Comprei um colar com diamantes com um pingente, significativamente grande,
de rubi em formato de coração. É lindo, elegante e mesmo que ainda tenha uma aparência tão jovem,
quando ela se tornar uma mulher – a minha mulher – vai ficar lindo em seu pescoço elegante. Não
tenho dúvidas de que se tornará uma mulher linda.
E fui um filho da puta egoísta e sádico em dar um presente que me beneficiará no futuro, pois
agora eu não quero ficar imaginando Marinne como minha esposa... Nem nas minhas mãos, na minha
cama. Agora só vejo que ela tem a idade da minha irmãzinha Lianne e eu cortaria meu pau se tivesse
qualquer tipo de pensamento sexual. Uma maldita ereção. Sou um assassino bastardo, mas não um
pedófilo sádico para imaginar uma menina de quinze anos sendo fodida por mim.
Ela é minha. Não tenho dúvidas e não abro mão, porém não quero vê-la como além de uma
menina. Tenho meu domínio sob ela e uma porra de inquietação para o tempo passar logo.
— Feliz aniversário, Marinne — digo finalmente.
Ela respira baixo, como um suspiro, e levanta mais um pouco o rosto murmurando:
— Obrigada. — Faz uma pausa. — E obrigada por vir hoje.
— Eu não perderia por nada. — Sou sincero e espero que ela perceba.
Ela me encara, realmente deixando seu rosto no mesmo nível que o meu, e eu quase não
consigo piscar olhando seus olhos. Mesmo de longe percebo que sua pulsação acelera e seus lábios
estão levemente separados porque talvez precise respirar um pouco mais profundo. Então ela morde
o lábio inferior quando, provavelmente, se dá conta de que eu consigo ver sua reação a mim.
Nós dois estamos curiosos e temos que esperar longos anos ainda, mesmo que uma das
exigências de Travis é de que nós nos conheçamos durante esse tempo.
Cortando o clima, escuto uma explosão atrás de mim seguida de passos e eu me viro para ver
Travis Lozartan caminhando. Seu andar firme, a postura enérgica e o olhar compenetrado em mim, é
nítido que está armado em sua armadura de chefe. Maldito seja!
Ele é muito diferente do meu pai. Se porta como um chefe, não como um babaca sádico como
meu pai de vez em quando é. No entanto, Travis lembra mais o meu avô Cássio; frio, calculista,
dominador e esperto, que provoca meu lado assassino e sanguinário. Não sei como será nosso
convívio no futuro. Não querer arrancar seu olhar convencido será foda.
Sua esposa o recepciona, indo até ele rápido e, mesmo que não demonstre nenhum afeto a ela,
percebo que eles parecem ter uma relação boa e até pode ter um sentimento entre eles,
principalmente por ele tê-la escolhido e não ter sido um casamento totalmente tático.
Travis estende a mão e eu a aperto e me afasto primeiro, ficando de olho no homem atrás, seu
Consigliere, Paolo Dal Moli.
Os dois têm o mesmo olhar distante e ameaçador, devem estar a mil por hora por conta do
garoto que a Bratva pegou. E o estado de espírito de Paolo é compreensivo. Acabou de perder a
esposa pelas mãos dos filhos da puta dos russos. Ele me dá um aceno de cabeça rápido, me
cumprimentando e eu devolvo.
— Seu pai não veio novamente — Travis diz secamente.
— O compromisso é meu, então preferiu não vir junto. Nova York não pode ficar sem ele no
momento. — E a verdade é que meu pai é um perigo em Las Vegas. Meu avô prefere que ele se
mantenha em casa.
— Está tudo em ordem?
— São apenas negócios que não podem ser adiados. E acho que sou mais do que o suficiente
para esta noite.
— Justamente — replica entredentes e seu rosto fica neutro, um pouco da sua armadura se
abaixa quando encara a irmã.
— Você veio! — Marinne fala abraçando-o pela cintura, chegando a fechar os olhos.
Isso não me surpreende. Todo mundo diz que ele foi o pai que ela não teve. Na verdade,
Vincenzo Segundo foi um escroto com seus filhos, mas rejeitou Marinne.
Quando ela se afasta, seus olhos chegam a brilhar e estão bem abertos e felizes, vejo o
sentimento neles expostos sem medo. Porém, ela logo se protege, freando essa informação. Só que
ainda tem uma leve faísca que some dos olhos, que vejo nas bochechas dela que ficam vermelhas.
Ela suspira e baixa o rosto, envergonhada. Eu tenho vontade de rir por sua tentativa de se esconder.
E, porra, meus dedos coçam com a necessidade de tocar seu rosto. Passar as costas da minha mão
nas bochechas rosadas e sentir seus lábios com meu polegar, para tirar a merda da dúvida se são
realmente macios.
Caralho! Que pensamento infeliz, Amândio.
— Vamos jantar — Travis comunica e agradeço mentalmente, pois estou prestes a cometer
minha morte prematura e foder com tudo.

Ficamos civilizados cada um no seu lugar marcado e, dessa vez, escolheram meu lugar não na
frente de Marinne, mas na porra da cadeira ao lado. Mil vezes merda! Tenho mil palavrões na cabeça
agora e estou gritando em italiano. E eu só uso da minha língua ancestral quando estou por um fio.
Fingindo estar tranquilo, como sempre faço em situações fora do meu controle, mantenho meu
foco na comida e no balançar dos pés de Marinne embaixo da mesa. Ela está nervosa e engole em
seco o tempo todo. Sinto quando fica batendo nos pés mais perto da minha perna e começa a bater na
minha cadeira.
Olho-a de canto de olho e vejo suas mãos tremendo enquanto parte a carne e enrola o
macarrão quinhentas vezes para tentar subir até seus lábios.
Como tranquilamente como se nada estivesse me afetando e, de vez em quando, vigio a mesa
e Matteo, sentado perto de Paolo. Ele é mais volátil do que eu. Estamos em alerta e aposto que
Travis quer que acabe logo. Está contando os minutos para sair para voltar a batalha, mas disfarça
muito bem. Paolo nem toca a comida direito e o jantar se seque silencioso tirando apenas o momento
em que Marinne solta uma gargalhada, no entanto apenas isso.
Logo, todos esperam cantar o parabéns e Marinne assopra as velas tão rápido que presumo
qual é o seu pedido. Ter seu irmão de volta. E Madeleine a abraça em seguida e assim vejo seus
olhos marejados quando olha para mim de relance. Porra! Algo dentro de mim se revira e quero
apagar a dor que vejo neles.
Cerro o maxilar e consigo fazer a minha melhor cara de sinto muito, o que a faz morder os
lábios antes de perguntar toda educada:
— Você come bolo?
— Aceito — respondo. Ela não precisa saber que não gosto de comer doce.
Observo-a pegar um dos pratos que tem pedaços cortados do bolo e entregar para mim e, de
propósito, encosto nossas mãos. Pele na pele. Ela não parece ter ficado afetada.
De longe, vejo Travis e Madeleine abraçar a menina, dar um beijo na sua testa e a Sra.
Lozartan lhe dá um sorriso carinhoso como se fosse a mãe dela. Isso sim me surpreende pra caralho,
mas deixo para lá.
Tirando-me a atenção, Travis me chama:
— Amândio.
Vou para o canto e ele fala:
— Você sabe que não tem condição de ter uma festa, uma que minha irmã merece, mas espero
que você tenha trazido uma aliança, certo?
— Eu sei que ela merecia e todos esperavam uma festa de noivado, mas as circunstâncias não
significam que voltei atrás ou que não teremos nosso compromisso desta noite. A aliança está
comigo.
— Ótimo e não vai fazer muita diferença. Todos irão saber do mesmo jeito.
— Sim.
— Certo.
— Eu gostaria de entregar a aliança para ela a sós, se possível.
Seus olhos refletem uma fúria histérica e preciso ignorar para não acertar sua cabeça com
uma bala. Puta merda! Ele me dá a irmã, mas não quer que eu fique sozinho com ela. Que idiota
desgraçado!
— Você quer ficar sozinha com ela?
— Dois minutos — respondo seco e lembro suas palavras apenas para irritá-lo. — Você
falou que queria que nós nos conhecêssemos. E quero que me responda: como, se você fica sempre
impedindo isso? Eu nem lembrava direito da voz dela, para ser sincero. Ela não fala nada comigo e é
óbvio que está com medo de mim.
— Ela não conhece você.
— Você disse que não era isso que queria. Dois estranhos se casando. — Jogo na sua cara
sua promessa para ver se ele vai reclamar.
Ele respira, fazendo suas narinas se alargarem, mas assente concordando.
— Tudo bem. Vocês podem ir para a sala de piano. Eu vou até o meu escritório rapidamente
e a minha esposa ficará de porta aberta.
— Parece ótimo — aceito assentindo.
Ele não diz nada, dá-me as costas e chega até Marinne.
— Você está provocando-o — Matteo fala ao meu lado.
Viro meu rosto para ele, lembrando-me agora de que está comigo aqui e tão perto, e franzo a
testa.
— É meu direito ter um momento a sós com minha noiva.
— Ela não é ainda.
Cravo minha fúria através dos meus olhos nele e digo baixo:
— Ela já é minha desde o momento que ele selou esse acordo com uma merda de aperto de
mão com o meu maldito pai.
Matteo engole qualquer comentário e vira-se para a frente, sigo o olhar e vejo Travis falar
com ela e percebo quando a realização do meu pedido lhe atinge através da sua respiração profunda
de ansiedade e seus olhos que me encaram com curiosidade antes de assentir.
Quando Travis a guia até a sala do piano, eu mando Matteo ficar perto, mas não tanto.
Lozartan abre a porta de correr, fica perto da menina, pergunta algo e lhe dá um beijo na testa. Ele
vira-se para mim, me dá um aviso silencioso por seus olhos e se afasta, indo até o seu escritório.
Entro na sala e, antes de encostar a porta, vejo Madeleine com seus olhos de águia em mim. Não digo
nada, mas deixo uma fresta.
Finalmente a sós com Marinne, me viro e a encaro. Ela caminha mais para dentro, mexe
inquieta no tecido do seu vestido azul.
— Você quer se sentar?
— Quero — respondo.
Ela mexe a boca como se fosse falar algo e no fim não diz nada. Respira fundo e caminhamos
para um sofá sem encosto no canto. Sentamo-nos distantes e observo, novamente, seus olhos
incrivelmente marejados. Com um sentimento diferente de preocupação, me apresso em dizer:
— Eu não quero assustar você.
De cabeça baixa, murmura:
— Você só queria ficar a sós para entregar a aliança.
— Tem algum problema nisso?
— Você está com ela aí? — rebate com outra pergunta.
Isso me lembra demais minha irmã Bella.
— Sim, estou com ela. Algum problema?
— Não é por você. — Ergue o rosto para mim. — Não tem nada a ver com você.
— É sobre seu irmão Dario?
Seguro sua mão, tentando ser cauteloso. Merda. Eu não sei direito como fazer isso, mas tento
lhe passar tranquilidade.
— Eu acredito de verdade que Travis irá conseguir trazê-lo de volta.
— Eu não sei — fala dando de ombros. — Tem uma semana agora e...
— Essas situações não são tão rápidas, porém vejo que estão determinados em resgatá-lo.
Fica silenciosa de repente e suspira.
— Dario foi teimoso.
Deixo que fale, pois ela parece que quer desabafar com alguém que não esteja o tempo todo
com ela.
— E você, está bem? — pergunto e agora quem parece tão longe é ela que demora um pouco
mais para responder.
— Acho que sim. — Me encara com seus olhos tão azuis. — Eu estava ansiosa para hoje,
mas agora... — Chega o corpo mais perto, para falar ainda mais baixo. — Sabe quando tem um bolo
no meio do nosso peito, pressionando nosso pulmão e o nosso coração, e a gente tenta respirar ao
mesmo tempo que precisa fazer o coração bater. Que precisa entender tudo.
— Isso é angústia — digo a ela.
— Eu acho que é isso — murmura.
Aperto sua mão mais forte e parte de mim sente quase que uma obrigação de tirar esse medo
dela, dessa angústia e agitação que visivelmente está deixando-a muito triste. E me sinto um fracasso
porque ela acaba chorando, soltando algumas lágrimas. Porra.
— Tudo vai ficar bem, Marinne. Daqui a pouco, ele está aqui com você.
— Você não sabe. — Sua resposta me dá um sinal da braveza dela.
— É verdade, eu não tenho certeza, mas não tenho dúvida de que todos vão fazer todos os
meios possíveis para resolver esse problema. Não é a primeira vez que uma Famiglia é atacada
assim.
Ela cerra os olhos e comenta:
— Pensei que você não gostasse do meu irmão Travis.
É claro que noventa e nove por cento dos homens da máfia não gostam dele, na verdade não
há um homem goste de outro da Famiglia. Somos desconfiados. Somos como leões que convivem
juntos e, às vezes, sentimos vontade de aniquilar o outro para mostrar poder.
— Posso não ser um fã do seu irmão e, mesmo assim, acreditar na sua competência; e ele
disse que tudo está sob controle. Na medida do possível está e é isso que você tem que acreditar.
— Uhum.
Assinto e finalizo essa conversa, ela parece mais tranquila e aliviada entorno de mim. Agora
chegou a hora de pedi-la formalmente em casamento. Coloco a mão no bolso para tirar a caixinha
com a aliança e ela prende a respiração arregalando os olhos. Suavizo meus movimentos e estico
minha mão abrindo a caixinha para ela ver o anel de diamante em corte quadrado de ouro branco.
— Marinne Lozartan, com esse anel eu me comprometo com a nossa união, você aceita?
Soltando a respiração, ela abre um pequeno sorriso e olha para mim.
— É muito bonito.
— É sim. — E não é do anel que estou falando.
— Eh... Eu aceito. — Solta uma risadinha.
Balanço a cabeça que sim e tento pegar sua mão, mas ela puxa de volta.
— Eu posso não usar agora?
— Por quê?
— Porque eu acho que vai ficar grande no meu dedo e também... Eu não queria usar isso na
minha mão agora. Eu não me vejo sendo uma mulher. Muito menos uma esposa — explica e se
apressa para completar: — Não estou fazendo desfeita. É lindo. É extremamente lindo. Eu só não me
sinto confortável. Me desculpa.
— Não precisa pedir desculpa. Está tudo bem. — Ofereço o anel de novo, de uma forma
agora que ela possa pegar a caixinha. — Mas você vai aceitar?
Ela pega e fica olhando um bom tempo. Tira o anel de dentro.
— É lindo e parece ter sido caro.
Pronto, me fez rir. Ela não tem filtro e é engraçada. Deve ser a idade.
— Eu vou botar no colar — diz e puxa o cordão de dentro do decote do seu vestido.
Santo inferno! Essa franjinha, esse cabelo, suas mãos e ela se mexe tão atrapalhada tentando
ser adulta e elegante. É óbvio que é tão menina. Eu sei que não somos tão distantes de idade, mas
comecei a ser tratado como adulto desde os onze anos, então é difícil, é terrível, olhar para ela e não
conseguir ver nada além de um pré-adolescente. Minha jovem e inocente noiva. Muito doce e pura
para mim.
Calmamente, ela deixa a aliança no cordão e depois fecha. O anel fica na altura do seu peito
brilhando. Me causando uma reação irreconhecível. Um domínio feroz sobre ela.
— Pronto — solta a respiração e me encara. — Agora eu sou oficialmente sua.
Puta que pariu!
Levanto-me como se tivesse recebido um choque. Engulo em seco e estico minha mão para
ela não se sentir mal. Marinne pega e, graças a Deus, ela não é tão baixa, o que ameniza sua
juventude descarada. Limpo a garganta e nem percebo quando a minha mão tira o cabelo da frente do
seu rosto e deixando-a congelada. Maledizione! Nos encaramos por alguns minutos até que ela pisca
e eu reafirmo o que disse com toda certeza que posso dar:
— Sim, você é minha.
Cerro a mandíbula e ignoro Paolo. Ele não está satisfeito com minhas últimas ordens e
mesmo não sendo a melhor, não temos outra escolha. Ivon não está facilitando e não posso
demonstrar fraqueza a esses russos filhos da puta.
— Vai ter consequências, Travis.
— Sempre tem. Qual o espanto? — indago e me levanto da cadeira.
Estou no Bellagio depois de tanto tempo. Não posso mais ignorar que ele, sendo meu maior
cassino, precisa de um pouco da minha atenção. Não vou demorar, não tem a mínima possibilidade
disto. Passo aqui para ajeitar tudo para o plano que estou colocando em prática dar certo.
— Você me chamou? — Vito aparece na porta com Enzo e Pietro atrás dele.
— Na verdade, eram os três e que bom que vieram. Vocês vão sair comigo para uma missão.
— Onde?
— Vamos atacar a casa de Ivon. Ele não está indo para casa, mas sua família sim.
Vito fica lívido e, apesar de acenar que sim, parece em dúvida.
— Enquanto isso, Marinne e Madeleine estarão em segurança em Carson City com os meus
avós.
— Você confia nos homens do seu avô? — Vito pergunta.
— Como?
— Desculpe, senhor. Mas não confio em nenhum deles por estarem a serviço de Lucian.
Franzo a testa e me aproximo dele.
— Ainda não entendi.
— O que ele está querendo dizer é o que eu falei e você não deu ouvidos — Paolo se
pronuncia ficando ao meu lado e encarando-me. — O ataque não é minha reinvindicação, Travis, mas
você confiar sua esposa e sua irmã tão perto de Lucian. Você tinha dito que só iria confiar nos seus
homens mais próximos. — Seus olhos querem dizer muito mais. Sabemos que existe um traidor entre
nós e não podemos nos descuidar.
— Eu não posso atacar a casa de Ivon e deixar minha esposa e minha irmã na casa que todos
sabem que existe. Preciso escondê-las.
— Você confia em mim?
A porra do meu irmão mais novo foi levado e eu nunca fui um homem de sentimentos,
principalmente culpa. E essa merda agora está me consumindo como lava em minhas veias. Talvez eu
não esteja pensando com clareza, mas preciso cuidar de Madeleine, Marinne e ficar de olho em
Colen. Não tem como deixar acontecer mais nada com nenhum deles. O rapto de Dario sempre será
um lembrete da minha falha, e mais. É o combustível para querer matar todos esses russos.
Não lhe dou uma resposta com palavras. Meneio a cabeça que sim e Paolo apruma a postura
falando:
— Pode ir e deixe elas comigo.
Assinto e viro-me para os meus soldados e meu capitão. Nós estamos sozinhos nessa guerra.
Nenhuma das outras Famiglie querem se envolver nessa guerra contra a Bratva.
Ontem Amândio selou definitivamente os laços entre a Lawless e a Darkness, mas, como
Giovanni caiu doente, ele não pôde ajudar muito no momento, fora que completou seus vinte anos e
assumiu o lugar do pai. Porém, ele jurou sob seu sangue, que, se precisasse de algo para Marinne, ele
faria. Eu podia usar sua oferta para o meu plano, enviando as duas para Nova York ontem e
garantindo suas seguranças. Não fiz porque não confio fácil. Agora tenho que lidar com essa escolha
e deixar nas mãos do meu Consigliere. Sei que ele fará o que for necessário para cuidar delas.
Colen entra no escritório, passando pelos homens e para na minha frente.
— Vamos ou não?
— Agora — afirmo.

O plano é meu e sei que preciso ser certeiro no ataque, por isso deixo que Luca e Vito vão na
frente e invadam a casa. Os dois são executores e mais habilidosos em ações como esta. A noite está
gelada e úmida, a chuva da tarde deixou tudo ainda mais sombrio.
Luca mata dois dos soldados da Bratva enquanto Vito empurra a porta da casa com o pé. Era
óbvio que teríamos companhia e todas elas vão morrendo pelas mãos dos meus homens. Geralmente,
esses soldados que cuidam da casa são uns merdas. Pegar Yuri foi fácil demais e invadir a casa de
Ivon parece seguir o mesmo caminho.
Pietro, Osmar e Enzo entram na casa atirando. Espero mais alguns minutos e os sigo com
Colen atrás de mim. Vejo dois russos no chão mortos, um deles com um buraco na cabeça. Fico
distraído por alguns segundos, que não escuto a tempo Pietro gritar e levo um tiro no ombro.
— Caralho! — reclamo e me escoro na parede de um corredor estreito. A casa é moderna e
cheia de espelhos. Deve ser estratégico, porque dá para ver todos os cantos e as escadas.
— Como está? — Colen indaga agachado ao meu lado, protegendo-se também.
— Foi de raspão.
Ele faz um aceno e, de repente, levanta-se e dispara alguns tiros.
Escuto Enzo dar ordens para subir, e vejo Vito correr escada acima com Pietro atrás dele.
Mais tiros, vidros estilhaçando e eu me desencosto para ir atrás deles para os fundos da casa. E tem
mais dois corpos e Luca surge do nada com uma arma apontada para mim.
— Foi mal — desculpa-se.
Passo por ele e tudo está calmo, até demais. Voltamos para a sala e sigo para o andar de
cima. Encontro um corpo de uma mulher segurando uma arma. Levanto a cabeça quando uma sombra
se aproxima.
— Você? — pergunto a Vito.
— Claro. Ela ia me matar.
Engulo com força e sentindo uma presença, giro meu corpo para ver quem vem atrás de mim:
meu irmão com uma menina nos braços.
— Que merda é essa?
— É a filha de Ivon — responde Colen.
— Está morta também?
— Não. Ela desmaiou quando a mãe levou um tiro.
— Que maravilha! — ironizo. — Vamos embora.
— E ela?
— Traga — respondo dando as costas.

Nunca pensei em entrar em uma guerra como essa e muito menos ter uma mulher presa nos
meus domínios. Há uma semana eu estava determinado a manter a compostura, pelo menos a regra de
não tocar em mulheres e crianças, e essa noite tudo foi por água abaixo assim que Vito matou a
esposa de Ivon e Colen pegar a filha dele.
Não sei o que se passou na cabeça do meu irmão em resgatar a garota. Ele tem algumas
regras que não consegue mudar, e apenas por isso deixei trazê-la como também porque vai ser bom.
Ivon me ameaçou com Dario, bem, agora ele tem os dois filhos nas minhas mãos e vai precisar ceder
pelo menos para a nossa conversa.
Eu quero muito ir para casa, descansar e ver minha esposa e minha irmã. Quase não dei
atenção para ela ontem no seu aniversário. Entreguei o presente às pressas, sem me prolongar e
houve brevemente o contato com ela depois do seu noivado, mas não sei mais nada além disso.
Merda! Não posso me culpar por meu foco ser o resgate de Dario.
O noivado, o aniversário ou qualquer acontecimento nessa proporção são coisas bobas,
fáceis de resolver. Agora meu irmão não e, para ela, minha energia estar em recuperá-lo é
fundamental. Marinne sempre foi compreensível e inteligente. Não indaga, não questiona, mas sempre
é astuta.
Se dependesse de mim, eu estaria no lugar de Dario. Eu fui torturado tanto tempo pelo nosso
pai quanto pela nossa mãe, desde muito cedo. Já passei por tanta coisa, muito além do que Dario já
tenha passado, que eu aguento. Aguento mais do que ele e me sinto terrível em não poder fazer nada.
Na verdade, eu posso e estou quase botando em prática o plano que está martelando na minha cabeça.
Preciso pensar mais um pouco sobre falar com Colen e Paolo. Se eu me decidir, será feito.
— Eu ainda não sei por que está com essa cara fechada? Queria que eu tivesse matado a
garota também? Sabe que eu não faço isso — Colen fala surgindo na minha frente no quarto que estou
no balcão.
Precisei tomar ponto no meu ombro, o médico já estava me esperando assim que entrei no
carro em frente à casa de Ivon. E tomei um banho e troquei de roupa antes de ir ver Yuri e sua irmã.
Não posso demonstrar fraqueza.
— Eu não falei nada.
— A sua cara já diz muito — Colen murmura e deixa eu passar na sua frente. — Como está o
ombro?
— Bem. Foi de raspão como disse — respondo descendo as escadas.
Mesmo que não tenha sido profundo, não consegui dar um tiro sequer para devolver.
Vejo Pietro sentado no fim do corredor onde estão os dois cativos. O quarto de Yuri está
escuro, sujo do seu próprio sangue e, diferente da irmã, está algemado. Eu aceitei a garota, mas não
para torturar.
— Como eles estão?
— Se comportando — responde Pietro. — Yuri está desmaiado. O doutor deu morfina para
ele depois da última e a menina estava encolhida no colchão chorando.
Respiro fundo e assinto. Eu não gostaria que minha esposa, irmã ou filha passasse pelo que
ela está passando, de jeito nenhum.
Adentrando o quarto onde a menina está a fito como Pietro descreveu.
Descobrimos poucas coisas sobre ela. A mais importante é que a mulher que morreu não era
a sua mãe, e sim sua madrasta: a terceira esposa de Ivon. A mãe morreu muitos anos atrás nas mãos
de Ivon. Ela tem dezoito anos e seu nome é Kira. Não poderia ser mais russo.
Dou um toque na porta para chamar sua atenção. Vejo seu corpo tremer em um sobressalto e,
quando toma coragem, vira-se para onde estou e fica sentada. Ainda encolhida e de cabeça baixa, os
cabelos loiros claros ajudam a esconder seu rosto, mas então a luz do corredor a atinge, mostrando a
pele pálida e os olhos, verdes vivos e expressivos, que refletem um pavor incomum. Geralmente vejo
esse tipo de sentimento em meus inimigos, no seu irmão, e gosto, nela me sinto mal. Eu gosto que me
temam, almejo os maiores medos dos meus inimigos ou traidores quando estão em minhas mãos.
Jamais pensei em ver isto nos olhos de uma mulher, até então inocente.
— Olá — falo baixo e dou mais um passo. — Eu não vou machucar você.
— Você já me machucou — diz cuspindo as palavras.
— Você quer dizer que eu te machuquei. — Aproximo-me dela, agachando-me para ficar à
sua altura, colocando um dos meus joelhos no chão e vejo-a engolir com dificuldade. — Você quer
falar pra mim... Que eu te machuquei quando tem o rosto cheio de hematomas, quando está óbvio que
seu pai espanca você.
A menina engole em seco de novo. Eu não preciso de uma réplica das minhas palavras.
— Saiba que eu não vou machucar você. Não vou te bater e nenhum dos meus homens. A
única coisa que eu quero é que você fique aqui e quieta. — Não bato, mas não deixo de disciplinar.
— Eu dou minha palavra, minha palavra de honra, que eu não irei machucar você. — Espero que ela
saiba que o que eu acabei de jurar é lei no meu território.
Enxergo em seus olhos que sabe o significado de Homem de honra ou algo que não sei
descrever, antes de baixar a cabeça em um consentimento silencioso. Eu posso estar enganado, mas
terá mais de um lado danificado nessa guerra e não é para ele que estou encarando. Espero que ela
não me cause problemas.
Sinto uma presença no quarto e me viro. Encaro Solo fitando a menina com sua expressão
pensativa e, ao mesmo tempo, neutra. Ele é um dos homens mais cruéis que tenho, mas na hora de
executar a ordem de nunca machucar uma mulher, ele atende sem reivindicar. E é por este motivo que
vai cuidar dela enquanto estiver nas minhas mãos.
Levanto-me e saio do quarto. Solo me acompanha e encosta a porta. Alguns homens são
inteligentes e sabem o que quero sem precisar pedir.
— Não permita que ninguém se aproxime dela — falo quando estamos distantes dela e dos
outros, menos Colen ao meu lado, apoiado na parede. — Ela é apenas um pião no meu jogo, não
quero que ninguém machuque ou a aterrorize, além do necessário.
Jogos mentais são necessários. Não vamos tratá-la mal, todavia, não como uma convidada
amigável. Isso é mostrar cordialidade e Ivon não merece isso de mim.
— Sim, senhor. Já entendi — pronuncia baixo.
— Os únicos que estão autorizados a entrar aqui sou eu e Colen, mais ninguém. Se certifique
de que ela coma e beba água. Não é para tratá-la como uma princesa, mas também não como um
verme igual ao seu irmão.
Solo meneia a cabeça em afirmação. Finalizando a conversa, passo por ele, saindo do
corredor do cativeiro sem olhar para trás.
Algumas táticas da Famiglia são realmente necessárias em um jogo de poder e quando
estamos em guerra, mas nem por isso eu concordo com tudo. Aceitei a menina porque preciso que
Ivon devolva o meu irmão.
Ontem Madeleine falou algo que tem razão, já estamos passando dos limites e eu não quero
que ela se aborreça ou saiba sobre Kira. Eu preciso ir para casa com boas notícias, principalmente
com meu irmão de volta. Ela e Marinne esperam por isso.
A única forma de eu ganhar essa guerra é que todos permaneçam vivos, disso tenho plena
consciência. Qualquer um que eu perca vou me sentir derrotado. E aquele russo já me fez perder
quando matou Mia. Ela pode não pertencer a minha família de sangue.
Mesmo assim, ela era a esposa do meu braço direito e Paolo está aguentando firme, em
silêncio, é o que ele quer mostrar para todos. Mas não sou bobo, às vezes, quando olha para mim,
vejo o ressentimento, o ódio e a tristeza. E fico me perguntando qual será a emoção que ganhará no
final. Estou torcendo para que seja o ódio, e que não seja de mim. Preciso dele com as armas em
punho. Precisamos vencer.
Saio da fábrica e vou até a garagem onde estão alguns soldados de prontidão. Assisto-os
jogando cartas e paro de frente para o meu Cinistro.
— Paolo ligou — Luca informa e ergue um papel para mim, que pego e leio:

Paolo tinha prometido que iria me dar o sinal de que Marinne e Madeleine estavam seguras e
a forma que escreve mostraria onde elas estariam. E agora eu sei.
— Volto mais tarde — informa aos soldados e dou um olhar para Enzo. — São seus soldados
e você já sabe. Qualquer imprevisto, me ligue.
— Pode ir.
Dado o recado, eu me viro e vou para o meu carro com Colen e Vito. Eu preciso que ele
venha para cobrir a retaguarda junto com os outros três soldados que vão no carro com ele, o
Escalade. Precisa ser grande para comportar as armas, qualquer ataque, estamos preparados. Eu
entro no meu Porsche Cayenne, que tem lugar para quatro pessoas, rápido, espaçoso e à prova de
balas.
— Vamos buscar as meninas? — Colen pergunta presumindo a escolha do carro quando se
senta no carona.
— Sim.
— Okay — murmura e coloca-se em alerta logo que passamos pelos portões enferrujados da
antiga fábrica.
Tudo ficou como estava, abandonado, para não levantar suspeita do nosso uso e, por sorte, o
prédio bom fica mais no fundo do terreno, na frente do que estava quase terminando, que não será
finalizado porque dá o aspecto que preciso.
Por longos trinta minutos, em uma estrada cercada pelo deserto que é Nevada, pensei nas
últimas escolhas e como contar para Madeleine. Eu poderia optar em não contar. Ela não tem que
saber de tudo que faço, não mesmo. E isso funcionaria se ela não fosse esperta e a mulher que é.
Colen vai na minha frente e, quando pensa em tocar a campainha, a porta é aberta pelo meu
Consigliere.
— Pelo visto foi rápido.
— Tem quanto tempo que mandou o recado? — questiono parando na sua frente.
— Uma hora mais ou menos. Não foi quando elas chegaram e sim quando achei o melhor
momento.
— Ótimo, foi uma boa tática.
Ele concorda e deixa que eu entre na sua casa. Não lembro de ter vindo aqui no último ano,
mas percebo que muitas coisas mudaram na sala de estar. O sofá, que era vermelho, agora é branco e
a tevê aumentou. Novas cortinas e um aparador com fotos e um vaso de flores – vazio no momento.
Em um dos porta-retratos, a imagem martela meu peito: Mia vestida de branco com as mãos na
barriga de grávida.
Merda! Baixo a cabeça e foco nos seus passos que me levam para os fundos, onde escuto
vozes e sei que fica na outra sala. Entrando no cômodo tenho uma surpresa. Sentada no sofá com a
bebê de Paolo e Mia nos braços, minha linda esposa é uma linda visão. Está com um vestido azul-
claro com as mangas ¾ e os cabelos soltos jogados para trás, que a bebê de três meses tenta agarrar
com as pequenas mãozinhas.
— Não, Soph. Machuca a titia — Madeleine murmura e afaga as costas da criança.
Porra! Eu não estou muito à vontade com essa visão.
— Irmão! — Marinne exclama quando me vê e vem me abraçar.
Envolvo-a, beijo seus cabelos e afasto assistindo Madeleine se levantar e caminhar para
mim, com a bebê ainda nos seus braços parecendo tão confortável. Não nos tocamos, mesmo que eu
esteja louco para beijá-la nesse momento e seus olhos digam o mesmo.
— Tudo bem?
— Está sim.
— Já podemos ir? — indaga curiosa e não ansiosa. Acho que gostou de ficar aqui.
— Sim — respondo assentindo.
— Ah, não! Eu quero ficar mais um tempo com a Sophia. — Marinne faz beicinho.
— Vocês são bem-vindas quando quiserem visitá-la.
Paolo dá um sinal para uma jovem de cabelos negros, que pede licença e pega a criança dos
braços de Madeleine, que entrega dando um beijinho na sua testa e depois vem ficar ao meu lado.
Passo o braço atrás dela, puxando-a e sinto seu calor.
— Obrigada por nos acolher, Paolo, e se precisar de mim, é só chamar — Madeleine fala e
abre um sorriso.
Meu Consigliere lhe dá um aceno e calmamente nós vamos para a porta da casa. Ele faz
questão de nos acompanhar até o carro, e eu espero que elas e Colen entrem, para falar com Paolo.
— Obrigado mesmo.
— Não foi nada. Eu disse que poderia confiar em mim.
— É.
— Uhum — murmura. — E agora vai me dizer o que ganhou com o ataque à casa de Ivon.
— A filha dele.
— O quê? Por que você fez isso?
Sacudo a cabeça soltando a respiração.
— Não foi de propósito. — Dou uma olhada para dentro do carro e vejo que Marinne está
prestando atenção em nós, então olho para Paolo, que já percebeu também, e digo: — Conversamos
depois. Vou levá-las para casa e pôr em segurança para poder ir para o balcão. Vão conseguir ir para
lá?
— Já estarei lá quando chegar.
Isso eu posso apostar. Ele não descansa nunca. Sempre foi assim, agora não tem para quem
voltar, o que o torna impassível nas transações e sob essa vingança.
Eu estou sentindo que algo está errado, que alguma coisa está acontecendo de muito grave (o
quê, eu não sei) há muito tempo e desde que Travis e seu Consigliere vieram mais cedo, e Paolo me
informou que teria que ir com ele para um lugar mais seguro junto com Marinne, soube que estava
certa. Tem algo de muito ruim acontecendo.
E como assim, a casa onde eu moro não é segura?! A casa do homem mais temido da Costa
Leste. Do Capo de uma das organizações mais fortes e maiores. Não é segura?!
Essas dúvidas e perguntas rondaram minha mente, preocupando-me e fazendo-me questionar
o que Travis anda fazendo para trazer seu irmão de volta e ter sucesso contra Ivon.
Travis tinha dito – eu tinha pedido – que ele fosse até as últimas consequências. Mas será
que eu vou aguentar se elas nos levarem para uma espiral de medo e perigo. Se elas forem como as
escolhas do meu pai no fim, com muitos fragmentos de erros e nos causando uma crise jamais vista.
Eu tinha salvado Las Vegas uma vez, e sei que farei de novo, se restar algo que eu possa fazer. Para
ser salvo e eu sobreviver.
Entramos em casa e Marinne sai correndo para a cozinha comer seu bolo. Eu passei o dia
inteiro também me questionando como ela está lidando com tudo, como sua cabecinha está aceitando
nossa nova rotina. Ela anda calada demais e, embora tenha ficado preocupada de que nós
precisávamos ir para um refúgio, foi bom vê-la sorrir e se distrair com a bebê de Paolo.
E pensar em Sophia faz meu coração se apertar. Ela está tão sozinha, assim como seu pai. No
entanto, ela é apenas um bebê e é normal ser dependente de alguém, esperar que alguém cuide dela.
Paolo é um homem adulto, um homem temido. Um Madman e no momento um soldado em plena
guerra, cheio de vingança e remorso. Eu vi em seus olhos quando peguei sua filha a primeira vez em
meus braços o quanto ele gostaria que Mia estivesse entre eles. Que fosse ela a ninar sua pequenina.
Segurar minhas lágrimas na sua presença foi complicado.
— Precisamos conversar — digo a Travis quando dispensa Luigi (meu fiel cão de guarda) e
Colen vai atrás da irmã.
Travis me encara com a testa franzida antes de assentir e falar:
— Vamos no escritório.
A contragosto, sigo-o e espero que feche a porta para falar:
— Você vai me explicar agora o porquê de eu ter me escondido na casa do Paolo. — Cruzo
os braços. — Acho que você nos mandaria até para o Brasil, do outro lado da América, se quisesse e
só depois me contaria o motivo.
Ele inspira com força, chegando a fechar os olhos, e solta o ar com calma. Parece a
quilômetros de distância, e mesmo assim presta atenção em mim.
— Eu sei como você se sente e sei que sabe que eu não sou um homem de pedir desculpas,
mas peço.
Sinto meus olhos se arregalarem. Estou estupefata.
— E?
— E que eu fiz o melhor para vocês. — Com altivez fita dentro dos meus olhos. — Faria de
novo. Você tem que entender que algumas ações que escolho tem consequências.
— Eu sei! — Dou dois passos e franzo a testa, colocando as mãos na cintura. — Não disse
ao contrário em momento algum, só quero saber o que está acontecendo e por que precisamos nos
esconder.
Apoiando-se na beira da sua mesa, me conta sobre os motivos de Ivon, um acordo do meu pai
com a Bratva e que hoje atacou a casa de Avilov. Agora a sua filha está com ele também.
— O quê?! — exclamo irritada. — Chega! Isso não. Para de sequestrar essas pessoas,
Travis. Agora uma menina? Não!
— Não fale assim comigo. Eu não pude evitar isso.
— Como não? É difícil não fazer algo. Foi difícil simplesmente deixar a menina na sua casa?
— Com todos mortos, inclusive a madrasta?
— O quê? — Ponho as mãos no coração e sinto os olhos arderem. — Você matou uma
mulher? Por essa guerra. Você me jurou que não era assim.
— Eu não sou — afirma e pega minhas mãos, colocando sobre seu peito. — Eu jamais fiz ou
farei mal a uma mulher ou criança. O que aconteceu com Kira foi mais para um resgate do que
sequestro.
— Então por que ela precisa ficar onde está Yuri?
— Embora eu não vá machucá-la, não vou tratá-la como visita, Madeleine.
Suspiro assentindo.
— Tudo bem, mas... Me prometa que não vai mais acontecer. Traga Dario sem ferir ninguém
no caminho. Já temos a morte de Mia, uma mulher inocente, nesse meio e agora eu posso afirmar que
foi minha culpa.
— Culpa do seu pai.
— É... — murmuro. — Culpa dele por ter me trocado por poder e não entregado. — Baixo a
cabeça, dou outro suspiro e fito meu marido nos olhos. — Eu vou me deitar agora, está bem — tento
me controlar. — Não aguento isso.
— Madeleine, não fica pensando nisso.
— Não dá para ignorar. — Dou outro suspiro e me afasto. — Eu preciso... De espaço agora.
Ele assente e eu saio do escritório. É muita coisa ao mesmo tempo. Meu coração está pesado
por tudo. Preciso pensar e descansar.

Estou com aquela sensação de que muitas pessoas, às vezes, preferem sentir do que serem
pegas de surpresa, mas no meu caso estar certa de que tudo tem uma parcela de culpa minha, não
ajuda em nada.
Passei o dia tentando achar pistas, indagando ou prestando atenção nas conversas de Paolo
em sua casa, dos motivos dessa raiva agora da Bratva contra a Lawless. E de fato eu teorizei que
poderia ter a ver com o meu pai. Eu já sabia que ele tinha feito algo só que nenhuma das minhas
teorias era o fato dele ter me vendido em troca de reforço. Em troca da sua aliança com os russos
para tentar derrubar Travis.
Eu sei que ele nunca me deu valor, nunca me amou ou fez questão, mas me trocar, me vender
como se eu fosse uma mercadoria barata, não deixa de magoar. Mesmo que eu já nutrisse um ódio por
ele desde a minha infância, saber a verdade me deixa além de exausta e irritada. Às vezes, pego-me
tendo pensamentos raivosos sobre meu pai, e até mesmo minha mãe. Eles foram pessoas terríveis.
Tudo está tão confuso e ruim. Eu me sinto na beira de um colapso nervoso, principalmente
sem poder fazer nada e depois de saber dos prisioneiros da Lawless.
Saber de Yuri não me afetou nem um pouco. Aquele imundo queria me pegar na Pandora
aquela vez, quando Travis me salvou. Nosso reencontro. Porém, saber da sua irmã me abalou, me
machucou e eu nunca tinha brigado com Travis como hoje. Não depois de nos entender e eu me
declarar. Não depois de nos casar.
Sinto-me péssima com tudo e por tudo. Nós quase não nos vemos depois que ele voltou de
Denver, de eu quase levar um tiro e depois que pegaram Dario nem se fala. Sua presença nessa casa
é rápida ou ausente. Eu entendo os motivos e peço a Deus que o traga bem e vivo quando tudo isso
terminar. Que ele cumpra sua promessa de voltar para mim sempre.
Agora com essa discussão, tenho até medo do seu aroma sumir entre os lençóis, o jeito que
encontrei para dormir sem ele. Sentir seu cheiro entre os travesseiros ou sua camisa de dormir. Estou
sendo ridícula, eu sei, às vezes esborrifo seu perfumo no ar, pelo quarto, para senti-lo por aqui.
Suspiro de olhos fechados e abraço com força o travesseiro. Eu preciso descansar, dormir
por longas horas e entrar no limbo dos sonhos. Esquecer dos medos, dos prisioneiros, da saudade e
da dor. No momento, não tenho sentimentos bons em meu coração e todos estão pesando-o como se
fossem chumbos.
Acordo com um sobressalto e abro os olhos no breu. Fico quieta e, de repente, sinto a cama
afundar. Um alívio me conforta por ele estar aqui, principalmente depois da nossa briga, talvez é por
causa dela que está aqui, para falar a verdade.
Travis se deita na cama e me abraça bem forte, aconchegando-me no seu corpo. Ele sabe que
estou desperta. Sua percepção das coisas chega a me assustar. Parece que ele tem superpoderes como
um vampiro.
Estou sonolenta e mole, nem um pouco disposta a acordar. Fecho os olhos virando-me na
cama e suspiro quando seus braços me circulam. E não entendo porque fico tonta. Só eu estou
deitada.
Ele faz carinho no meu corpo e relaxo mais um pouco. Ficamos um bom tempo assim:
abraçados, em silêncio e fazendo carícias um no outro.
— Está com raiva de mim? — murmura em meu ouvido.
— Não — respondo baixo e inclino minha cabeça para poder enxergá-lo, mesmo que a pouca
luz do banheiro não ilumine nada. — Por que eu estaria?
Travis respira fundo pelo nariz, daquele jeito exasperado.
— Porque decepcionei você.
— Isso não é verdade, Travis. — Nego com a cabeça. — Só fiquei surpresa e se há alguém
que merece a minha raiva é o meu pai. E não você.
Concorda com um aceno e me puxa para os seus braços, escondendo-me neles.
— Estou com tanto sono — comento aleatória.
— Então dorme, querida. Está tarde mesmo.
— Eu sei, mas... Também queria ter um tempinho com você. — Afasto-me um pouco para
ficarmos cara a cara, espero seus olhos encontrarem os meus antes de falar: — Tem mais de um mês
que a gente se casou e teve tantos problemas desde então. Quase um pesadelo. Você anda tão
ocupado. Eu sinto sua falta, por isso queria que a gente curtisse o momento. Não quero desperdiçar
um minuto quando estou com você.
— Eu sei, mas se você está com sono — beija minha testa e coloca o cabelo atrás da minha
orelha — pode dormir. Quando a gente acordar, nos encontramos aqui.
Sorrio achando meigo o que ele diz e meus olhos se fecham lentamente, mais uma vez.
— Por que você está tão cansada?
— Hum?
— O que você fez hoje para estar tão cansada? Será que cuidar da bebê do Paolo te cansou?
— Tem humor na sua voz, mas eu não me sinto alegre.
— Eu... Eu não fiz nada. — E uma coisa vem na minha cabeça e sento-me na cama. Arregalo
os olhos, sem enxergar nada e paraliso, pensativa. — Ah, Dio Mio!
— O que foi, Madeleine?
Sacudo a cabeça e jogando as cobertas para longe, pulo para fora da cama e corro para o
banheiro. Procuro desesperadamente a minha cartela de anticoncepcional na minha nécessaire e a
encontro cheia, assim como o pacote de absorventes completo...
— Porque eu não usei — murmuro para mim mesma.
— Qual o problema? — Travis surge atrás de mim.
Engulo com dificuldade e me viro. Levo um choque e tenho meus pensamentos distraídos por
alguns segundos vendo-o só de calça de flanela preta e lindo de morrer, mas não me aproximo.
— Eu...
— O quê? — indaga ríspido, aparentemente nervoso.
— Eu acho que... Estou grávida.
Travis abre a boca e nenhum som escapa dela. É a primeira vez que o vejo sem fala. Seus
olhos se arregalam e ele engole em seco. Respira, se aproxima, segura meus ombros e pergunta
baixo:
— Você tem certeza?
— Na verdade eu não tenho certeza não — respondo me sentindo inerte. — Não fiz o teste...
Mas pelas minhas contas e o fato de eu não usar o pacote de absorvente desde... — Abro a boca e a
tampo com a mão.
Eu nem lembro a última vez que menstruei.
— Porra! O que foi, Madeleine?
Pisco e o encaro.
— Não lembro quando menstruei a última vez.
Ele assente e libera sua respiração com força.
— Tá. Okay! — Meneia a cabeça e pega minha mão, apertando-a. — Você está bem?
Franzo a testa confusa. Absurdamente confusa.
— Você está dizendo que... Está tudo bem... Se eu... — Meus olhos se enchem d'água e eu
nem sei o porquê.
— Claro — ele replica simplesmente e segura meu rosto entre suas mãos. — A gente é
casado. Você é minha esposa. Não tem por que eu ficar nervoso ou não... Gostar. A não ser que você
não queira, que não se sinta preparada agora.
Pisco balançando a cabeça e arfo.
— A questão não é essa. Eu já tenho vinte e cinco, quase vinte e seis anos. E é verdade!
Somos casados e... Eu te amo e... — minha voz fica tremida e meus olhos úmidos. — Acho que só
estou surpresa e com medo. — Derramo algumas lágrimas.
— Por quê? — indaga afagando meu rosto.
— Por tudo que está acontecendo. Com essa guerra.
Ele concorda, fica perdido em pensamentos e, quando seus olhos me fitam, me desmonta
totalmente. Sinto meu coração ser apertado pela emoção.
— Eu entendo e, se pudesse escolher, não colocaria um filho no mundo nesse momento, não
estava esperando por isso, mas se você estiver grávida, tudo bem. — Faz uma pausa. Uma longa
pausa olhando-me nos olhos. — Posso te contar um segredo.
Aceito com um aceno e fungo.
— Claro que pode.
Travis afaga meus cabelos e eu choro ansiosa para ouvir o que ele tem a dizer:
— Eu penso em você o dia inteiro. Todos os dias. O tempo todo e, às vezes, eu posso fechar
os olhos e ver você sorrindo.
Isso faz eu chorar tão forte. Estou tremendo.
— Às vezes, é irritante ter você o tempo todo nos meus pensamentos. — Passa o polegar nos
meus lábios. — Eu também sinto sua falta e escolho não vir para casa, às vezes, porque me sinto sujo
demais. O monstro que você já me chamou várias vezes e que é real. Eu sou um monstro, Madeleine.
— Não! — balbucio e toco seu peito, seu coração. — Não é para mim.
— É, não para você e nem para os nossos filhos. — Nega com a cabeça. — Nunca
conseguirei ser, dou a minha palavra. Não consigo ser o monstro para você, só por você. — Ele faz
uma pausa de novo, com os olhos fixos nos meus. — Eu não posso morrer agora — afirma.
— Não pode mesmo! — digo com minha voz fanha de choro e sentindo a pressão no meio do
peito ainda mais dolorosa.
— Não — me corrige. — Você não entende.
— Então explica o que você quer dizer.
Travis respira fundo e beija meus lábios de leve antes de se afastar e murmurar:
— Se o céu e o inferno existem e nós vamos para eles pelo que a gente faz aqui na Terra, nas
nossas vidas. Bem, eu não posso morrer agora.
Não tenho voz para falar, apenas choro e o escuto.
— Porque eu nunca mais vou te ver — continua. — Você é um anjo, é pura e boa. Eu não sou
nada disso. Você vai para o céu e eu para o inferno. Lá é o meu lugar. Se eu morrer agora... — Ele me
olha de um jeito... — Eu vou para lá e nunca mais vou te ver e não estou pronto para me despedir
ainda.
Choro copiosamente, agarrada a ele e sentindo meu coração dilacerado.
— Eu te amo tanto — declaro em seus braços. — Fica vivo para mim. Seja forte para mim.
Sempre volte para mim.
— Eu vou! Eu prometo que vou voltar para você sempre. — Pega meu rosto e beija minha
boca, com a presença do gosto salgado das minhas lágrimas. — Eu preciso morrer velhinho ao seu
lado.
Assinto, concordando, e descarrego todo o medo, toda a angústia em minhas lágrimas, nos
seus braços.
A gente não precisa mesmo ouvir aquelas palavras para saber que alguém nos ama. Não
precisa-se das palavras iguais que todo mundo usa. Travis acaba de me dizer da forma mais forte e
única que me ama. De confirmar minha suspeita.
No fundo, ele é aquele garotinho que apanhava de cinto da mãe e era torturado pelo pai. Ele
nunca teve amor. Eu sou o amor dele, o único e primeiro amor dele. Mesmo que ele ame os irmãos
há muito tempo, não é a mesma coisa. E me sinto grata por ser o amor dele. Ele também é o meu
amor. O mais profundo e verdadeiro e único amor da minha vida.
Me acalmo, parando de chorar e limpo meus olhos. Travis pega um pouco de papel higiênico
e me entrega.
— Estou chorona — comento secando meu rosto e rio sem graça.
Ele mexe as sobrancelhas como se não soubesse o que falar. É fofo ele perdido. Jogo o papel
na lixeira e fico perto dele de novo.
— Sobre o bebê, tudo bem mesmo?
— Sim, está.
— Jura? — Sorrio e mordo o lábio tentando esconder.
— Se confirmar, estou bem com isso e se você estiver pronta melhor ainda.
Solto um riso achando graça e pergunto:
— Acha que não está preparado para ser pai?
— Não sei.
— Posso dar minha opinião?
— Claro que pode, querida.
Pego suas mãos, e sou eu que o conforto.
— Você está mais do que pronto. Foi um pai incrível para Marinne. Mesmo que seja o irmão
dela, nunca foi apenas isso.
Ele fica pensativo, desvia o olhar e acaba concordando com a cabeça.
— Eu sei, mas é um filho meu — diz me encarando. — Não é o mesmo que ajudar a criar os
meus irmãos.
— Você sabe que foi uma presença importante para eles, não sabe? Que foi de extrema
importância sua influência sobre eles enquanto cresciam.
— Sim, eu sei, porém é mais complicado.
— É, eu sei, mas acredito que você será um pai muito bom, disciplinador e forte.
— E ninguém nunca tocará neles — ele diz e depois me abraça apertando seus braços bem
forte em mim.
Deixo o ar escapar bem devagar pela minha boca, apreciando o seu contato e sorrio de olhos
fechados pensando o quanto amo esse homem.
— Tem algum teste de gravidez em mãos? — pergunta.
Dou uma gargalhada me afastando, fico na ponta dos pés para beijar sua boca, ele ajuda
quando se inclina e respondo:
— Então... Pode parecer estranho, mas eu tenho.
— Sério? — Arregala os olhos e depois franze a testa. — Sério mesmo? Eu estava brincando
com você.
Sinto minhas bochechas queimarem.
— A Bárbara me deu de presente de casamento. Foi também de brincadeira. Eu ia jogar fora,
mas então pensei melhor e... Guardei. — Dou de ombros. — Eu sabia que uma hora ia ter que te dar
um filho...
— Você não tem que me dar um filho — me interrompe.
— É... Eu sei. É... Tipo. Você já tem trinta e quatro anos e acredito que todos esperam um
herdeiro seu.
— É, mas nunca quis que se sentisse obrigada.
— Eu não me sinto obrigada a engravidar. O que estou querendo dizer é que em algum
momento ia acontecer e... Talvez já aconteceu.
— Okay.
— Okay — repito e reprimo a vontade de rir. — Espera um pouco.
Volto para o quarto e procuro no armário a caixa onde deixei o teste. Meu coração está uma
pilha de nervos quando entro no banheiro. Vejo Travis no mesmo lugar, agora de braços cruzados e
parecendo ansioso.
No lavabo, abro a caixinha e pego o teste, encaro por longos minutos até que me sento no
vaso e me preparo para essa verdade. Eu nem acredito que estou fazendo isso. É tudo tão surreal.
Eu não olho para Travis enquanto faço xixi no palitinho. Terminando, pego com o papel
higiênico, deixo no canto e me limpo. Depois me levanto e coloco o teste em cima da pia. Prendo a
respiração, pego o manual e falo:
— Tem que esperar quinze minutinhos.
Travis assente e o vejo sair do banheiro e logo voltar com o celular na mão.
Enquanto os minutos passam, eu rezo para que tudo dê certo. Eu posso estar carregando o
herdeiro de Las Vegas dentro de mim. Se for um menino... Dio mio. Posso estar grávida do Capo da
próxima geração da Lawless.
E quando vejo os dois pauzinhos que significa sim, meu coração acelera.
— Eu preciso me sentar. — E faço.
Desabo no chão, pois perdi a resistência das pernas. Travis corre até a mim e segura meu
rosto se ajoelhando na minha frente.
— Ei, você está bem? O que houve? Está se sentindo mal?
— Não. — Balanço a cabeça e procuro o ar para conseguir falar. — Eu.... Nós... — Pego
suas mãos, aperto e beijo cada uma delas. — É sim, Travis. Eu estou grávida sim. Eu estou grávida
— repito soltando o ar.
Espero o surto ou ele falar algo. Porém, ele fica congelado, olhando para mim, mas logo me
surpreende – como todas as vezes – passando os braços embaixo das minhas pernas e depois atrás do
meu corpo. Erguendo-me do chão e levando para o nosso quarto, ele me deposita na cama. Vai
apagar as luzes e vem se juntar a mim.
— Relaxa agora. Vai dar tudo certo — murmura no meu ouvido. — Depois o médico vem
aqui e vê como você está.
— Sério? Você está sendo tão robótico — comento no breu.
— Eu não estou.
Viro-me para ele e seus olhos me aprisionam.
— Está tudo bem, Travis?
— Está tudo bem — responde e não me garante nada. Ainda está perdido. — Vocês vão ficar
bem.
Não sei se eu quero rir ou chorar por ele estar assim. Mas quando eu sinto seu coração
batendo tão forte em minhas mãos, meus olhos ficam cheios d’água mais uma vez e me agarro a ele.
— Eu amo você e estou um pouco nervosa, mas tudo bem. — Afasto-me e contemplo seus
olhos azuis. — Meu Deus! Nós vamos ter um bebê! — Sorrio emocionada. — Nós vamos ter um
filho.
— Madeleine — sussurra meu nome e eu não preciso ouvir mais nada. — Mi angele.
Sou uma boba chorona agora e faço biquinho vendo-o reprimir seu sentimento. Acaricio seu
rosto e abro um sorriso comovida por ele.
— Eu não mereço isso — comenta. — Não mereço ser feliz. Não mereço ter você ao meu
lado.
Fico tão triste por ele achar isso. Eu odeio profundamente que ele pense isso.
— Você merece sim.
— Não mereço e eu estou esperando o dia que vai acabar.
— Acha que vai acabar?
— Eu não sei — responde conciso e quase pesaroso.
Agora é a minha vez de apertar meus braços bem fortes em volta dele. E aqui está o garotinho
perdido e machucado dentro de um homem grande e cruel. Tão mau, tão violento, mas tão leal a mim
e seus irmãos.
Não digo nada, apenas o abraço forte. Ficamos um bom tempo bem agarrados um no outro.
Travis beija meu ombro e não para de repetir meu nome baixinho no meu ouvido. Seus batimentos se
confundem com os meus, desenfreados. Ele me afasta, dá um beijo na minha boca, que termina de
tirar o meu fôlego e promete:
— Eu vou cuidar de vocês.
— Eu sei que vai.
Ganho um beijo na testa e fecho os olhos aconchegando-me no seu calor e carinho.
— Vamos dormir agora. A gente conversa depois — murmura.
Suspiro, concordando e, como um passe de mágica, vou caindo no sono e posso jurar que o
escuto falar algo, porém o meu cansaço não permite entender.
— Durma bem, mi angele — murmuro para ela quando fecha os olhos e adormece. — Estarei
aqui cuidando de você.
Fico segundos, minutos e horas sem conseguir pregar os olhos. O cérebro trabalhando a mil,
mas acho que tento dormir. Não sei. Não paro de pensar. Porra, eu vou ser pai. Madeleine está
grávida de um filho meu e, mesmo que eu ainda a enxergue do mesmo jeito – linda, atrevida, sexy e
corajosa –, agora não dá para ignorar que é frágil, doce e que precisa de proteção e cuidado. Eu não
sei nomear o que sinto agora. É uma confusão perturbadora.
Abro os olhos e encaro o teto do quarto por um tempo antes virar a cabeça e olhar para
Madeleine deitada. Está aconchegada entre as cobertas e meu corpo. A mão no meu peito e a cabeça
em cima do meu braço, que serve de travesseiro. Sua respiração faz cócegas às vezes, mas não me
afasto. É delicioso senti-la assim e, com a ausência, quero aproveitar o contato dessa noite.
Ela suspira profundamente e parece tranquila. Tão bonita dormindo. Com certeza consegue
ter bons sonhos mesmo com todo o caos acontecendo e o nosso mundo sombrio. Ela é uma mulher
boa e com certeza, se existe um Deus, Ele concede sonhos que lhe dão esperanças quando fecha os
olhos.
Quando eu fecho os olhos ou está tudo em branco ou tenho lembranças da minha infância,
algum ataque ou sendo torturado pelo meu pai. Algumas vezes são flashes dos últimos dias, mas eu
mal tenho dormido.
Só penso em resgatar Dario e proteger o resto da minha família, e no plano que não para de
martelar a minha cabeça. É tanta coisa e agora com a gravidez de Madeleine, não sei se vou manter
apenas como ideia alguns pensamentos.
Tenho pressa para que tudo fique no seu devido lugar. Tenho pressa em resgatar Dario e fazer
a Bratva entender que nenhum deles pode comigo. Ivon vai pagar tudo que está fazendo contra nós.
Viro o meu corpo para Madeleine, abraçando-a por trás e estico minha mão até pousá-la em
cima da sua barriga, e percebo que ela está com a mão também na barriga, mas por baixo da coberta.
Seu instinto protetor está em modo turbo.
Afago sua barriga devagar e a imagem de uma garotinha de cabelos castanho-escuros e olhos
tão azuis quanto o mar do Mediterrâneo vem em minha mente. Com certeza, se for uma menina vai se
parecer com Marinne e ser linda. Eu não tenho dúvidas como também de que vou protegê-la de todo
mal e de todo olhar indireto para ela.
Se for um menino deve se parecer comigo quando criança ou Colen. Vou precisar discipliná-
lo a ser um Homem de Honra forte, cruel com seus inimigos e traidores, porém justo. Quero que ele
seja minha extensão quando me suceder.
Cazzo. Apenas em ter esses pensamentos fico nervoso.
Ter um filho agora não estava nos meus planos, mas aconteceu e tenho que aceitar e esperar
que seja forte, saudável. Menina ou não. Merda. Não sei.
Não sei se estou preparado para uma menina tanto quanto para um menino, pois uma menina
não quer dizer que vai ser mais fácil. Porém, é mais suave e ela vai precisar demais dos cuidados da
mãe do que de mim. Não vai precisar tanto de mim. Isso me deixa nervoso.
Madeleine se mexe na cama, aconchegando-se. Admiro-a em silêncio e não adianta. Não vou
conseguir dormir hoje.
Inclino-me para dar um beijo no seu rosto e devagar saio da cama. Antes de me afastar, puxo
as cobertas até esconder os seus ombros e vejo-a resmungar e esfregar o rosto no travesseiro
virando-se na cama para o meu lado. Sua meiguice desperta em mim uma superproteção feroz por ela
e nosso bebê.
Respiro fundo, jogando os cabelos para trás com os dedos. Eu preciso ficar longe para
organizar minha cabeça. Depois que troco minha calça de flanela por um short, no closet, desço e
saio em direção à academia que tem na casa adjacente.
Ligo as luzes e vou para a esteira correr. Estou tentando deixar minha mente em branco para
achar uma solução.

Quase duas horas depois, a porta da academia se abre e tenho a visão de Madeleine com um
vestido branco, solto, até a altura dos joelhos e um casaco vinho por cima. Os cabelos soltos e nos
pés uma pantufa de cachorrinho. Não sei como, mas ela conseguiu ser sexy e fofa ao mesmo tempo.
Encara-me, nitidamente tentando me enxergar através dos meus olhos e se aproxima
lentamente.
— Perdeu o sono, é? — murmura.
— Não — respondo o que é uma quase verdade. Eu teria perdido se tivesse tentado pelo
menos.
Desligo a esteira e saio de cima. Caminho até o armário que fica no canto e pego uma toalha
para secar meu rosto e peito, abandonando depois em cima do banco ao lado do bebedouro. Essa
academia foi feita logo que comprei a casa. Pensei nela para distrair minha mente quando estivesse
estressado, entediado em casa, ou não quisesse sair. Meus irmãos usam quando estão aqui. Mesmo
que geralmente eles optem em ir à academia da Famiglia. Aqui não tem o rinque de luta para se
divertir e, mesmo que tivesse, eles não gostam de lutar comigo.
Pelos olhos curiosos de Madeleine, ela nunca pisou aqui. Mas tem algo a mais em seu olhar
que não consigo identificar.
— Tudo bem? — pergunto chegando perto dela.
— Sim. Por que está perguntando?
— Por nada. Você nunca veio aqui.
— Também nunca vi você por aqui nesse tempo que moro nessa casa.
— Eu precisava pensar.
Ela fica pensativa e abraça a si mesma.
— Sobre o bebê?
— Sobre você. — Coloco uma das mãos no seu ombro e a outra no seu rosto. — Sobre a sua
segurança e o que eu preciso fazer por Dario.
— E?
— Já tomei minha decisão. Quando sair pelas portas de casa, nada e ninguém me fará mudar
de ideia.
— Eu preciso ficar com medo? — Ela apoia as duas mãos em meu peito.
— Não se preocupe comigo.
— É impossível não me preocupar com você — solta a respiração e vai se sentar no banco.
— Madeleine... — Fico ao seu lado e pego seu rosto entre as mãos. — Não fica assim.
— Não dá, Travis. Eu estou preocupada com Dario, mas também muito preocupada com
você. Com todos nós. — Surpreendendo-me, vem se sentar no meu colo e eu a envolvo com meus
braços. — Jure para mim que eu não vou ter que salvar você e Las Vegas como fiz anos atrás.
— Nunca mais repita isso — falo rigorosamente. — Eu quero que você me prometa, que vai
colocar você e esse bebê em primeiro lugar.
— Acha que vou ignorar se você estiver correndo risco de morte?
Respiro e a beijo com força.
— Não é bem isso que eu quero dizer.
— Mas...
— Você precisa entender que tem que cuidar de você e desse bebê. Eu sou capaz de cuidar de
mim. Confia nisso.
— Eu confio e na sua promessa. Você confia?
Fecho os olhos, a droga da minha ideia novamente explode na minha cabeça.
— Quero você a salvo.
— E eu quero você de volta para mim — diz com tanta braveza, que fico excitado.
Cazzo!
— Você terá — prometo, mesmo com meu plano correndo o risco de quebrar, não quero
pensar nisso. Seguro o seu rosto e beijo sua boca fazendo questão de sugar sua língua provocante e
macia. — Vamos esquecer isso agora e focar em algo mais importante.
— O que é mais importante que isso?
Em um movimento rápido, faço com que ela abrace meu corpo com as pernas e os braços e
me levanto.
— É que eu vou te comer lentamente na nossa cama.
Madeleine inspira pelo nariz com força e faz questão de se esfregar em mim.
— Acho que, se eu não estivesse tão excitada o tempo todo, eu recusaria, mas... Não consigo.
Rio pelo que ela fala para mim. Sinto-me além de excitado agora e a sensação no meio do
meu peito é avassaladora. Dolorida como estivessem cravando uma faca em mim.
Tenho vontade de dizer para ela o que significa. O que eu sei é o que ela é para mim. O que
eu realmente sinto por ela. E as palavras se estrangulam em minha garganta. Se perdem quando foco
apenas no seu corpo embaixo de mim, quente, macio e apertado. Sua boca gemendo e clamando por
mim. Seu desejo todo meu. No entanto, sobra força para dizer que ela é minha e repito de forma
contínua enquanto a fodo lentamente.

Seguro a mão de Madeleine enquanto o médico se prepara para fazer o exame nela. Estamos
em um dos quartos que fica na casa do lado de fora, por coincidência onde fiquei depois do encontro
com os mexicanos. Não gosto de estranhos no meu quarto e aqui está preparado para esses
procedimentos.
Se fosse outras circunstâncias, nós poderíamos ir em uma clínica fazer o exame para
confirmar a gravidez. No momento essa possibilidade é correr um risco de ela sair e sofrer um
ataque. Não sei o que Ivon está tramando contra mim. Feliz com certeza ele não está após eu matar
seus homens, a esposa e pegar sua filha.
— Estou nervosa — comenta Madeleine e volto para o momento presente.
— Por quê?
Ela respira fundo e desvia o olhar.
— É... Eu já amo esse bebê e nem foi confirmado.
Franzo a testa e sento-me na beira da cama para segurar sua mão enquanto fito seu rosto.
— Acha que pode ter sido falso o resultado?
Balançando a cabeça, seus lábios tremem.
Dizem que as mulheres grávidas ficam sensíveis e emotivas. Pelo que conheço dessa mulher
aqui, ela não fica chorando à toa. Acho que ela está esperando nosso filho sim.
— Não vamos nos preocupar antes do tempo — digo apertando sua mão.
Ela sorri com gratidão, porém logo fica séria quando o médico volta para o quarto. Eu me
afasto, ficando ao lado dela e observo Leonel mexer em algo na mesinha de ferro ao lado da cama.
O Dr. Leonel Donati é clínico geral e da Famiglia. Foi liberado anos atrás para cursar
medicina, assim como outros soldados que se formaram em medicina, contabilidade, Direito e
enfermagem. Temos uma única dentista, filha de um General em Carson City. O pai garantiu a
obediência dela e sua proteção para o meu avô. Tudo deu certo no final.
Vincenzo Lozartan tem uma visão de mudo moderno e sendo cauteloso, optou para, em caso
de emergência, nós termos nossos próprios profissionais de prontidão. Em tempos de guerra é
sempre útil e muitas vezes não podemos recorrer aos hospitais para cuidar dos nossos ferimentos.
Eles fazem muitas perguntas e não temos todos os policiais na folha de pagamento.
— Como o protocolo pede, irei fazer um ultrassom transvaginal, pois, se estiver grávida, é
de pouco tempo e apenas assim para ver.
— Uhum... — Madeleine assente e morde o lábio inferior.
— Então, peço que a senhora fique preparada adequadamente.
— Como?
— Trouxe uma roupa hospitalar para colocar e precisa retirar a calcinha.
Madeleine engole em seco e eu tento não dar um tiro em Leonel.
— Oh, sim. — Ela pula para fora da cama. — Vou me trocar, espere um pouco.
Entrando no banheiro do quarto, fecha a porta e eu encaro firme o doutor, mas não digo nada.
Não sou um babaca nesse nível.
Logo, minha esposa volta vestida apropriadamente e deita-se na cama. Ela parece adorável e
eu não tenho dúvidas. E não sei por que, vê-la assim: pernas abertas, sabendo que está sem calcinha
e um simples lençol esconde o que não é para ninguém ver a não ser eu, na posição para fazer o
exame, me dá a impressão certa de que sim.
Leonel coloca as luvas e senta-se na cadeira de rodinhas baixa, puxando junto o monitor
pequeno para a frente das pernas da minha esposa.
— Deve ser um pouco incômodo — ele avisa antes de colocar uma camisinha no instrumento
que parece um pau estranho e branco para enfiar na boceta de Madeleine.
Incômodo? Deve ser terrível.
Meu lado violento retrai dentro de mim e foco em Madeleine para não pular em cima de
Leonel e estrangulá-lo. Limpo a garganta e viro-me para ela. Seus olhos estão sem foco e queria
poder beijar sua testa ou dizer que ficará tudo bem, mas não dá. Não estamos a sós. Mas parece que
ela sente e seus olhos encontram os meus.
— Sra. Lozartan.
Viramos para Leonel e esperamos.
— Bem, pelo que posso ver, você está grávida sim.
— Você tem certeza?
— Sim, olhe aqui. — Ele aponta para a pequena tela do aparelho de ultrassom. — Eu posso
dizer que de umas dez semanas. Daqui a pouco, já poderá saber o sexo e a consulta pode ser pelo
ultrassom abdominal.
Isso quer dizer que ela engravidou na semana anterior do nosso casamento. Não importa.
Ninguém vai pensar sobre isso porque eu não ligo e quando fito o seu rosto, virado para a imagem
capturada do nosso bebê, ela sente e seus olhos encontram os meus, molhados e suaves. Ela abre um
sorriso de um jeito tão doce e sonhador que me faz sentir emoções estranhas.
O médico tira o negócio dela, mas congela a tela e se afasta. Quando volta a se aproximar,
sorri com simpatia para nós.
— A senhora precisará fazer uma consulta com um obstetra e de preferência em uma clínica
para começar o acompanhamento do pré-natal.
— Sim, eu sei — Madeleine responde se recompondo ainda na cama, agora mais levantada
porque Leonel ajuda erguendo a cama.
Ele olha para mim e fala:
— O ideal era o senhor levá-la a um hospital, mas eu não me incomodo por ora.
— Pode ficar tranquilo, Leonel. Nós iremos procurar um médico especialista e uma clínica.
— Se não quiserem um parto em casa, uma maternidade também.
— Parto em casa?! — Madeleine arregala os olhos para o doutor.
— É só uma ideia.
— Ah... Okay. — Ela ri sem jeito e mordo o canto da boca. — Acho que vou preferir uma
maternidade mesmo, a não ser que aconteça algum imprevisto.
Lhe dou um olhar de que vou manter tudo sob controle e ela dá um sorrisinho rápido para
mim.
— Claro, senhora. — Ele pega sua maleta e vira-se para nós antes de sair. — Parabéns aos
dois! — E pede licença.
Viro-me para Madeleine quando a porta se fecha. Encontro-a de olhos fechados, o rosto
suave e as mãos afagando a barriga. Fico bem perto dela e lhe dou um beijo na testa. Ela pisca os
olhos lentamente e os abre junto com um sorriso.
— É real. Nosso bebê é real.
— Sim, é real — assinto concordando com ela.
Ficando sentada na cama, ela me abraça e me dá um beijo na boca.
— Fiquei grávida antes de nos casar — sussurra com seu sorrisinho.
— Ninguém precisa saber. — Balanço a cabeça. — E é só uma semana.
— Que sorte a nossa.
Um riso lhe escapa parecendo tranquila.
— Pode ser, mas ninguém iria falar nada, foi alguns dias antes.
— Uhum — murmura com o sorriso que some quando morde o lábio inferior. — Já vamos
contar para todo mundo? — Vira-se para mim, colocando as pernas para fora da cama e toca meu
peito.
— Eu não sei. Estava pensando em esperar um pouco.
— Esperar você terminar com Ivon e seus homens?
— De preferência sim — afirmo secamente. Sem abertura a discussões sobre isso.
— E quando você terminar com eles, nós vamos ter um pouquinho de sossego?
— Garanto que a gente vai viver melhor. Não gosto de viver em guerra. Brigar e vigiar meu
território, reivindicar os meus poderes e corrigir os traidores, é algo que eu sempre vou ter no meu
caminho, mas não entrar em guerras e viver sob ataque o tempo todo. Assim que eu mostrar o meu
poder e o meu domínio como Capo da Lawless sobre Las Vegas, acabando com o grupo de Ivon, com
certeza vou parar com os ataques.
— Torço por isso.
Acaricio seu rosto.
— Confia em mim. Tenho certeza de que Nikolai não vai querer estar no meu radar. Se ele for
um bom chefe para a Bratva, eles deveriam focar em estender os seus negócios, que não tem nada a
ver com os nossos. Fora que a briga dele é muito maior com os mexicanos no Texas. — Pauso e tiro
o cabelo da frente do seu rosto. — Esse conflito agora com Ivon é pessoal, não é entre a Famiglia e
a Bratva. Foi um problema que o seu pai arrumou e porque Ivon sempre esperou uma oportunidade
de enfraquecer meu pai.
— Eu sei — comenta sarcástica e eu assinto.
— Sim, e mesmo que meu pai já esteja morto, Ivon não se sente satisfeito.
— Porque não foi ele que matou.
— Sim e sem contar que espera o seu prêmio — sinto gosto de ferro ao dizer essas palavras.
Madeleine brevemente fecha com os olhos, escondendo a mágoa pelo que o seu pai fez, mas
deixa que eu veja o ódio quando levanta o rosto para mim de novo.
— Eu queria poder eu mesma dar um corretivo nele, enfiar uma estaca no seu coração por ele
ousar imaginar que poderia me comprar. Por ter feito esse acordo com meu pai, mas agora com o
nosso bebê... — Suspira alto. — Eu só vou cuidar de mim, de você – porque eu não posso te perder
–, da Marinne, é claro, e do nosso reino. — Sorri e toca meu rosto com reverência. — Você é o meu
rei, sabia?
Seguro seu rosto, dou um beijo na sua boca de leve e também venerando-a digo olhando em
seus olhos:
— Você não sabe o quanto é minha rainha.
Madeleine respira fundo e abre mais o sorriso.
— Eu sei sim e sei que você vai cuidar de mim e do nosso príncipe ou da nossa princesa.
— Eu vou com certeza — garanto.
Ela me beija de novo e passa o seu nariz no meu como uma carícia antes de me abraçar bem
forte.

Depois de nos despedir formalmente de Leonel, voltamos para o nosso quarto. Tomo um banho e
visto minha roupa para ir. Terminando de colocar meu relógio, saio do closet e vejo que Madeleine
pegou no sono. Agacho-me, afago seu rosto e dou um beijinho na sua boca.
— Até mais, meu anjo lindo. — Quando estou me levantando para ir, sinto-a esticar o braço
e segurar-me pelos dedos. Franzo a testa virando para a cama e ela se senta.
— Eu não quero que vá.
Balanço a cabeça e me sento na cama.
— Queria poder não ir.
Ela assente e me abraça bem forte.
— Não fica assim — falo baixo afagando suas costas. — Eu já prometi que vou me cuidar,
que vou voltar para vocês.
— Mesmo assim, não deixo de ficar apreensiva. — Afasta-se e fito meus olhos. — Tem algo
que você não quer me contar.
— É impressão sua. Não tenho nada para te contar.
— Mesmo?
— Sobre minha ida, não e nem tudo eu posso contar para você. Você sabe disso.
— Sim, eu sei disso, mas é só um pressentimento.
Balanço a cabeça e fixo nosso olhar.
— Escuta, não quero que você fique pensando essas coisas. Você sabe que eu preciso agir
extremamente violentos, às vezes, e não quero que você saiba.
— Acha que não vou conseguir lidar com isso?
— Não, não é essa a questão. — Respiro fundo, foco em suas mãos mexendo na ponta da
minha gravata antes de prosseguir olhando em seus olhos. — Quando eu olho para você, quando eu te
beijo e, quando estou com você, não quero lembrar de como eu sou mau e posso ser tão violento e
cruel. Quero que toda essa parte de mim fique distante de você, pois é boa demais para ficar tão
perto dessa sujeira toda.
— Mas eu sei que ela existe e mesmo assim te amo. Eu sou forte, Travis.
— Nunca disse ao contrário.
— Não sou uma menininha boba. Já matei um homem para sobreviver. Não sou tão pura
quanto você fica falando.
— Mi angele, eu sei disso — concordo com um aceno. — Você é uma fortaleza e, quando
disse que você é uma rainha, é mesmo e agora eu preciso que a minha rainha fique em casa e me
espere, tudo bem?
— Hum... — resmunga, mas assente que sim.
— Nesse momento, eu quero que você cuide de tudo, está me ouvindo?
— Tudo?
— Enquanto eu for nessa missão para resgatar o Dario, você é dona de tudo.
— E o Colen?
— Ele vai junto comigo e o Paolo também. Então, eu só confio em você para cuidar de tudo.
— Você não está se despedindo? — Sua voz ganha um tom desesperado e choroso.
— Não mesmo, querida. — E beijo sua boca vigorosamente. — Eu apenas estou lhe dizendo
que é a dona da porra toda e que precisa estar firme. Eu vou voltar para você e, enquanto isso, seja
uma rainha sábia.
— Eu prometo que vou.
E nós nos agarramos em um beijo eufórico e alucinante. Não era para levar mais tempo aqui,
contudo, quando ela me derruba na cama, não tem jeito. Nós transamos com um toque de desespero e
promessas. Beijo cada centímetro do seu corpo, principalmente sua barriguinha ainda reta. Deixo
minha marca no seu ombro de novo e quando gozo quase lhe digo as palavras que sei que ela precisa
ouvir de mim.
Eu com certeza irei sempre voltar para ela. Se monstros recebem redenção em alguma altura
da vida, Madeleine Lozartan é a minha.
Acho que em um primeiro momento descobrir sobre a gravidez foi um susto e logo depois
veio o medo. E nem é a questão do mundo que vivo e da guerra que estamos. Sei que ela está por um
fio.
O medo é de ser mãe de primeira viagem. De não saber como criar e cuidar de um bebê. De
toda a preocupação da maternidade. Tenho medo das coisas normais e que qualquer mulher sente.
Receio da saúde do bebê, de ele nascer com alguma doença. Medo de não ser capaz.
Depois de toda essa fusão de sentimentos, tem minha preocupação de ser um menino. Eu sei
que ele vai passar por tortura, ter a carga da responsabilidade que é ser o sucessor do seu pai. Dio
mio. Embora, se for uma menina, ela terá força e poder de qualquer forma. Ela será a filha de Travis
Lozartan. Capo del capi da Lawless.
O meu coração fica pequenininho em pensar em todos os meus filhos. Coloco a mão em cima
da minha barriga, ainda plana e sem nenhuma prova de que tem alguém aqui crescendo, alguém que
eu já amo.
— Não importa, bebê. A mamãe vai cuidar de você enquanto eu puder — murmuro fazendo
carinho na minha barriga.
Erga a cabeça, respiro fundo e me viro para dentro de casa. Luigi me olha de cima a baixo de
um jeito estranho.
— O que houve? — Franzo a testa.
— Nada, senhora.
— Você mente muito mal para um soldado. Fala logo o que é — digo, senão ele ficará
remoendo olhando para mim de um jeito estranho e... — Ah... Já sei. Travis falou com você.
— Sobre?
— Sobre eu estar grávida. Para de dar voltas. Não me trate como imbecil porque eu não
gosto.
— Eu jamais farei isso com a senhora. — Engole em seco. — Me desculpe.
— Tudo bem. Me ignora. — Rio sem jeito e dou de ombros. — Eu não sou de falar assim.
Ando um pouco estressada.
— Imagina, senhora. Sem problemas, e parabéns.
— Uhum. — Cruzo os braços. — Agora me diz o que o Travis falou com você.
Luigi tenta fugir de mim, tentando disfarçar.
— Que preciso ficar de olho em você. Na senhora — ele se corrige rápido.
Respiro fundo e abro um sorriso condescendente.
— E por acaso você já não faz isso?
— É, mas agora eu vou ficar de olho em dobro.
— Então na hora de eu tomar banho e dormir também?
— Jamais, senhora.
— Ai, por favor, para de me chamar assim. — Dou quase um grito no final. — E desculpa de
eu ser grossa, mas é que estou estressada e você vai ficar me chamando de senhora a cada cinco
sílabas. Qual o seu problema hoje, Luigi?
— Me desculpa. Não queria aborrecê-la.
— Para que essa formalidade toda? Me sinto a rainha da Inglaterra. — Faço careta.
Ele tenta não rir, mas não consegue e acabo voltando a gargalhar.
— Desculpa, senhora. Não foi minha intenção.
— Tudo bem, Luigi. Você é sempre muito educado. Sou que estou nervosa.
— Está assim por causa do senhor Travis? Ele vai ficar bem.
— Sei disso, mesmo assim só vou ficar feliz quando ele estiver em casa e Dario. Quando
essa guerra toda acabar e ele matar o Ivon e todos os homens dele. E não estou nem aí se isso me põe
como um potencial candidata ao inferno.
Ele dá um riso irônico e ergue as sobrancelhas.
— Acho meio difícil alguém no nosso mundo não ir para o inferno. Com todo respeito.
— Não precisa falar assim e você tem razão. Eu sempre pensei isso. Todos nós, por mais que
não façamos parte diretamente, estamos envolvidos e somos cúmplices. Você faz parte, mesmo que
necessariamente não aperte o gatilho.
— Preciso concordar.
— Enfim, vou na cozinha agora. Se você quiser pode vir — brinco. — Vou tentar fazer
rosquinhas coloridas.
Não conto para ele que estou com muita vontade de comer rosquinhas e acho que é o meu
primeiro desejo de grávida.
— Marinne já está acordada? — pergunto quando entro na cozinha.
— Sim, senhora, mas ela preferiu ficar no quarto.
Esse não é o seu normal. Para os meus passos e viro-me para ele.
— Eu vou lá ver como ela está. Enquanto isso, você pede para Marie Rose pegar os
ingredientes para o bolo. Ela está no jardim.
— Sim, senhora.
Abro um sorriso e troco meu caminho. Subindo as escadas vou para o quarto Marinne. Dou
dois toques na sua porta antes de abrir.
— Olá... — Tento ser engraçada para animá-la.
— Oi — responde e ela está de um jeito tão tristinho, que fico chateada.
— Ei, meu amor. O que houve, Marinne? — pergunto chegando perto e sentando-me na sua
cama. Tiro o cabelo dos seus olhos. — Você precisa cortar essa franjinha, hein. Já está batendo nos
seus olhos.
— Eu sei — murmura.
— Por que está desanimada?
— Porque Travis precisou ir de novo.
Dou um suspiro e preciso concordar. Ter que vê-lo partindo de novo doeu profundamente e
ouvir Marinne falar agora, aperta meu coração.
— Eu realmente entendo, querida, mas ele precisava ir. Você não quer que o Dario volte?
Seus olhos se arregalam.
— É claro que quero! — responde de cara feia olhando para mim e eu acho graça. Ela é
muito fofa para fazer cara feia.
— Então a gente precisa aceitar que Travis teve que ir para poder trazer o Dario de volta. Eu
também não queria que ele fosse.
— Não?
— Vai por mim, eu preciso muito de seu irmão por perto agora.
— Por quê? — Ela se mexe na cama, projetando o corpo todo para mim, dando total atenção.
— Aconteceu alguma coisa?
— Eu tenho uma coisa para te contar.
— O que é? — Seus olhos se arregalam.
— Eu estou grávida.
— É sério?! — Instantaneamente o humor dela muda para felicidade.
— Sim, é verdade.
— Oh... Que legal! — exclama ajoelhando-se na cama. — Quando vocês souberam? Foi
hoje? Por isso que o médico veio aqui?
— Sim, foi hoje e por isso que o médico veio. — Quando eu digo que ela é a pessoa que tem
mais informação nessa casa, não estou brincando. Minha monstrinha.
— Já sabe quanto tempo e o sexo?
— Só sei que são dez semanas. Não dá para saber ainda.
— Dez semanas? Você é casada com meu irmão quase isso. É normal?
— Eu sei, querida. — Prendo a vontade de rir. Ainda não é o momento de explicar a ela
como os bebês são feitos e, por incrível que pareça, eu lembro perfeitamente a noite que fizemos
esse bebê.
— O bebê foi feito antes do casamento?
Agora eu me arrependo. Com certeza deveria ter mentido para ela o período.
— Eu acho que a conta está errada. Eu nem me senti mal antes disso e falta apenas quatro
dias para completar dez semanas de casamento. Acho que a conta do médico está errada.
— Talvez seja isso.
— É — afirmo pondo fim nessa conversa.
— Estou muito feliz! — Me abraça bem forte. — Eu vou ser titia.
— Você está mais para irmã, mas tudo bem.
— Você acha? — pergunta com a vozinha tão doce.
— Eu sei que no papel de parentesco, no sangue, você é tia dele ou dela... — Suspiro. —
Mas o jeito que Travis criou você e até mesmo o jeito que eu cuido de você, é muito mais para irmã
do que qualquer outra coisa. Então... Você pode ser uma tia-irmã postiça.
— Eu vou. — Ela me abraça de novo e parece que está se aconchegando em meus braços.
Faço carinho nela e fecho os olhos.
Travis vir para casa, fazer uma sessão de sexo comigo foi bom e até terapêutico, mas sua
irmã continua sentindo saudade, aflita e carente. Eu preciso ser muito atenciosa com ela e, nesse
momento, percebo que preciso fazer mais carinho nela. Minha doce menina.
Acho que não estou tão nervosa para ser mãe por causa dela e sei que Travis vai se sair
muito bem. Ele conseguiu criar uma menininha incrível que eu amo tanto. Eu não tenho como ter
medo se ele estiver ao meu lado.
Afastando-me, beijo seu rosto e digo toda animada:
— Estou pensando em fazer rosquinhas coloridas iguais as da padaria.
—Ainda tem bolo do meu aniversário.
Eu rio assentindo.
— Menina esperta.
— Não fala comigo como se eu tivesse cinco anos! — reclama me olhando nos olhos e
franzindo a testa. Tão parecida com Travis de cara feia. — Eu não tenho mais cinco anos.
— Não, não tem. Já é uma mocinha de quinze anos, que é muito mimada, às vezes.
— Não sou não.
— É sim, senhorita.
Ela respira exasperada, mas é brincadeira. Levantamo-nos da cama e saímos do quarto,
fechando a porta falo:
— Eu quero fazer rosquinhas para a gente tomar café. O seu bolo está cheio de recheio e
glacê. Não dá para tomar café com aquilo.
De repente vira-se para mim na escada.
— Será que você está com desejo?
Dou uma risada feliz e assinto.
— Provavelmente.
— Ah! É o seu primeiro desejo. — Ela sorri.
— Provavelmente.
— Então vamos correr, senão o neném vai nascer com cara de rosquinha.
Dou uma gargalhada e me sinto leve, feliz e acho que vou aguentar dois ou três dias, talvez
uma semana sem Travis de novo.
— Você já falou com a Bárbara? — Marinne pergunta quando a gente está comendo nosso
café da manhã: as rosquinhas que acabam de sair do forno com o café que a Marie Rose fez.
— Eu ainda não tive tempo de ligar para ela.
— Eu acho que ela vai ficar muito feliz.
Concordo e bebo um pouco do café com leite e gelo. Luigi mandou trazerem da cafeteria
esse. Estava morrendo de vontade de beber isso. Estou intercalando entre o café preto da casa.
— Sabe quando ela vai voltar?
— Não tem previsão ainda de quando vai voltar, mas acredito que em breve, pois terá o
casamento dela.
— Ela vai se casar com o Enzo?
— Como é que você sabe disso?
Fica envergonhada e baixa os olhos, não querendo se entregar.
— Ouviu atrás da porta de novo?
— Dessa vez, eu juro que foi sem querer. Eu ouvi você falando com ela e, sendo bem sincera,
o jeito que ela olha para Enzo não dá para disfarçar. Ela gosta dele.
— Como sabe disso?
— Ela olha para ele igual você olha para o meu irmão.
Rio balançando a cabeça.
— É verdade. Ela gosta do Enzo.
— Ele gosta dela também?
— Acredito que.... Pode haver um interesse, senão ele não teria aceitado a proposta.
— Como assim?
Respiro fundo porque sempre falo além do que deveria com ela.
— Foi Travis que convenceu o pai da Bárbara a fazer a sugestão de Enzo pedi-la em
casamento. E como seu irmão acabou de dar o posto de General para Enzo, e talvez ele se torne um
subchefe, é quase que esperado ele casar e ter sua família.
— Travis que deu a ideia?
— Não, eu fui a pessoa que ajudou. Dei um empurrãozinho para o seu irmão falar com Orazio
e assim eles falarem com Enzo para propor o pedido.
— Foi como o meu noivado? Estratégico?
— Sim e não. Eu fiz isso porque sei que a minha amiga gosta muito dele e que Enzo é um bom
rapaz. Foi uma coisa boa para os dois. Assim eu espero.
— Tomara que no final ele goste dela também.
— Com certeza.
— Assim como meu irmão gosta de você — seu comentário causa borbulhas no meu
estômago, como se eu fosse uma adolescente boba.
— Você não acha que Travis está apaixonado por você?
— Não é isso.
— Eu sei que ele não é de falar de sentimentos, mas o conheço a vida toda e sei que ele gosta
de verdade de você.
— Acho que você está certa, mas vamos esperar que ele fale. Não quero colocar essa
pressão nele. Homens feitos geralmente não são nem um pouco sentimentais. Então, eu só vou
continuar amando o seu irmão e procurar fazê-lo feliz como ele me faz.
Isso não há problema em falar com ela, principalmente porque sinto que ela almeja afeição
de todos e não sei se Amândio será capaz de se apaixonar por ela. Mesmo que Marinne seja
maravilhosa, não é garantia de absolutamente nada.
Ela sorri de um jeito fofo e assente.
— Fico feliz que ele encontrou alguém como você. Não consigo imaginar outra pessoa ao
lado de Travis — comenta como uma jovem adulta.
Ah... Eu não gosto de vê-la adulta demais.
— Muito menos eu. — Recupero o humor entre nós.
Soltamos uma gargalhada juntas e voltamos a comer. Escutando alguém limpar a garganta,
viro-me para ver Luigi.
— Senhora, seu telefone.
Levanto-me, pego o aparelho das suas mãos ouvindo-o comunicar:
— É a senhorita Bárbara.
— Obrigada, Luigi. Vou falar com ela e, enquanto isso, faça companhia a Marinne.
— Vem comer bolo.
Ele faz um aceno cordial com a cabeça e passa por mim, entrando na cozinha enquanto saio.
— Sim, senhorita.
Afastando-me escuto Marie Rose soltar uma risadinha. Dando de ombros sigo para cima.
— Oi. Como você está?
— Morrendo de saudade do calor insuportável de Las Vegas — responde Bárbara e fecho a
porta do quarto.
— Você sempre reclamou do calor abafado daqui — debocho porque é divertido zoar com a
cara dela.
— Eu não estou reclamando.
— Se ficar falando essas coisas, vou desligar.
— Você não tem coragem de desistir de mim.
— Eu acho impossível desistir de você. É bonita demais com esses cabelos de fogo rebeldes
e o sorriso sacana. Você vai enlouquecer Enzo. — Em todos os sentidos.
Sento-me na ponta da cama.
— Madeleine Lozartan. Por que essa felicidade toda?
Respiro fundo e respondo sorrindo mesmo que ela não possa ver:
— Eu tenho uma coisa para te contar.
— Você está grávida?
— O quê? Como? — murmuro espantada. — Como é que você sabe?
— É porque sou vidente. Vi mais cedo na minha bola de cristal.
Dou uma risada alta, balançando a cabeça e me levanto indo até a varanda do quarto.
— Você não tem jeito, sabia. — Sinto-me leve em conversar com minha amiga. — Sim, eu
estou grávida e muito feliz.
— Ah, eu não acredito! Parabéns, amiga!
— Obrigada.
— Com certeza vai ser o bebê mais bonito de Las Vegas. Eu já disse que vocês têm genes
parecidos? Vocês poderiam ser irmãos. Mesmo tom de pele, da mesma cor dos cabelos e os olhos
são azuis penetrantes e intensos. Os de Travis são mais escuros. Esse bebê vai ser lindo.
— O seu também. Principalmente se puxar a cor dos seus olhos e a cor do pai. Será difícil
resistir.
— Ah! Se eu tiver uma filha e você um menino, ou vice-versa, eles podem namorar e se
casar.
— Eu não irei me opor. — Rio com essa ideia.
— Isso se não tiver planos para ela igual ao noivado da Marinne.
— Ah... — Suspiro alto. — Eu não quero pensar sobre isso agora. Ainda nem tive esse filho,
que não sei se é uma menina, e você já quer casar minha filha e criar um compromisso com outra
Famiglia? Sinceramente, eu não quero pensar sobre isso tão cedo. Mal estou preparada para o
casamento de Marinne.
— Eu sei. Foi mal. Enfim, parabéns pelo bebê. Posso ser a madrinha?
— É claro e o Enzo, o padrinho.
— Nossa! Ele vai se casar comigo, em um quase pedido de Travis e agora será o padrinho
do bebê do Capo dele. Eu acho que ele vai enfartar.
Preciso concordar com ela e completo:
— Já sabe que Travis o promoveu a General?
— Ai, meu Deus! É sério?
— É sério e eu acho que, em breve, ele vai ser um subchefe.
Escuto-a suspirar parecendo feliz e ansiosa.
— Isso seria bom, não é?!
— Seria formidável.
— Eu não irei mais me casar com um simples soldado. Sim, com um homem com um cargo
importante na Lawless. — Faz uma longa pausa. — Isso quer dizer que eu também serei
importante... — Suspira alto. — Você sabe o que isso significa?
— Que você vai ter que ficar mais sofisticada e com certeza policiar as coisas que pensa em
voz alta. Não vai poder fazer tudo que dá vontade.
Ela fica alguns minutos em total silêncio e eu em uma espera ansiosa.
— Escuta, você vai se sair bem, Bárbara. Sem contar que já deveria ter pensado assim.
— Eu sei — diz muxoxa.
— Enzo é muito importante para Travis. Sempre foi e eu quero que você entenda. Ele, seu
futuro marido, tem que gostar de você do jeito que é e te respeitar, mas, às vezes, não há mal algum
em ser uma boa garota.
— Tudo bem. Eu já estava pensando em ser mais comedida... De vez em quando.
— Você tentou isso a vida toda e não conseguiu.
— É, mas agora preciso me esforçar. Não sou mais criança também. Preciso crescer e ser
uma mulher exemplar.
— Que gosto tem essas palavras para você?
— Amargo.
Dou uma risada tão forte, que preciso me sentar na poltrona que tem no canto do quarto e
respiro fundo para me acalmar.
— Você é demais, sabia.
— É... Eu sei. Eu sei. — Ela ri e eu também. — Okay, agora me fala sobre o bebê. Como
você está se sentindo?
— Feliz, animada e... Muito nervosa também.
— Acho que você vai ser uma mãe maravilhosa.
E a conversa segue por aí além de coisas simples. Precisamos distrair a mente nessa guerra e
Bárbara de estar enlouquecendo em um lugar que não queria ir. Dio mio. Lembrei-me do que Marinne
falou sobre minha amiga em Los Angeles e o casamento e Enzo. Essa menina é a caixa preta dessa
casa.
— Acha que meu objetivo é FALHAR?! — grito com Colen.
— O seu plano é uma merda!
Jogo longe o copo que eu bebia uísque. Puta que pariu! Eu não suporto mais. Não posso mais
aguentar essa pressão de Colen.
Eu precisava mesmo do tempo que passei com Madeleine, mesmo com o resultado da
gravidez me pegando completamente de surpresa e toda a preocupação, foi bom. Eu já não estava me
aguentando de tanto tempo longe dela e ver esse balcão infeliz.
— É o único jeito de trazer Dario.
— E se você morrer? — Ele ri alto. — Acha que estou pronto para suceder você?
— É uma merda você apenas pensar que irei fracassar.
— Não consigo fingir que seu plano é formidável. Desculpe, irmão — ele ironiza e sai do
recinto.
— Sabe que ele não está totalmente errado, não é? — Paolo diz.
Cansado do assunto, levanto-me e encaro meu Consigliere antes de sair também.
— Me dê soluções.
Sigo para o andar de cima e entro no quarto que usei nos outros dias. Minhas coisas ainda
estão aqui. Fechando a porta, pego meu celular e percebo que já está chegando o momento, e decido
ligar para Madeleine. E mal toca duas vezes e ela atende:
— Oi, amor — ela fala toda animada.
— Oi. O que você está fazendo?
— Agora estou falando com você, mas dois minutos atrás com a Bárbara.
— Claro que você já contou para ela.
— Sim, ela é minha melhor amiga e contei também para a sua irmã, que é a minha outra
melhor amiga. Minha pequena melhor amiga.
— E o que ela disse?
— Ela ficou muito feliz e já faz planos com o sobrinho.
Concordo com um aceno de cabeça mesmo que ela não possa ver.
— E com você. Está tudo bem por aí?
— Está sim e com você?
— Está tudo bem. Normal, amor. — Solta uma risada. — Não faz nem quatro horas que
você saiu.
— Sim, eu sei.
— Uhum... — pausa. — Você me ligou por algum motivo específico?
— Só queria ver como é que você está.
— Bem... estou bem e acho o cérebro humano incrível, porque agora que eu sei que estou
grávida, sinto uma fome desenfreada e acho que a preguiça veio para ficar. — Ela solta uma
gargalhada.
— Você precisa descansar.
— Eu sei e vou daqui a pouco, depois que desligar o telefone. Vou tomar um banho e
dormir.
— Isso é bom.
— Uhum... é. — Pausa suspirando e pergunta: — Quando é que você vai voltar?
— Eu não sei. Daqui a dois dias ou três — respondo não querendo pensar no que pode dar de
errado, porque nada vai dar errado.
— Tudo bem. Eu vou esperar você — assim que a ouço falar isso, alguém bate na porta e
entra.
Paolo me encara bem sério. Merda!
— Não espera acordada não.
— Pode deixar, amor.
— Cuida de tudo, está bom. Você é a senhora deles todos.
— Uhum.
— Okay, tenho que desligar.
— Tudo bem. Eu te amo, está bem. Lembre-se disso.
Eu nunca esqueço, ela não tem ideia. Eu sinto vontade de dizer para ela aquelas palavras,
mas como sempre elas se estrangulam em minha garganta.
— Se cuida. Tchau.
Tentando não destruir o aparelho, largo em cima da cabeceira e sento-me na cama colocando
as mãos na cabeça, apoiando os cotovelos nos joelhos
— Por que você não diz para ela o que sente? — Escuto a voz de Paolo e levanta a cabeça.
Tinha até esquecido dele aqui.
— O quê?
Ele ri com sarcasmo sombrio.
— Você me entendeu — responde e fica mais perto, colocando as mãos nos bolsos e me
encara. — Por experiência própria, se eu fosse você, diria para ela que a ama. Se algo acontecer
com você nessa sua missão impossível... e você não disser para Madeleine o que sente vai se
arrepender.
— Que papo mais meloso é esse?
— Não vem com essa não. Não faz o bad boy revoltado porque eu falei isso. Não faz seu
estilo.
Arfo com força e me levanto, indo até as janelas. Observo a chuva torrencial que está caindo
ouvindo Paolo atrás de mim.
— Você sempre assumiu tudo que faz e sente. Você assumiu seus irmãos quando era muito
novo e sem ter motivos para isso. Ninguém te obrigou a cuidar deles — fala calmo. — Foi
simplesmente o seu instinto de querer cuidar deles. E você sabe que ama seus irmãos, mesmo que
talvez nunca tenha dito para nenhum deles. E eles sabem a mesma coisa e sentem o mesmo.
— O que é todo esse sentimentalismo? — pergunto virando-me para ele.
— Eu perdi a minha esposa sem nunca dizer para ela o que ela era na minha vida e agora eu
vou ver você fazer algo que é além da sua vingança pela sua esposa.
— Agora você está falando baboseira. Eu vou encontrar Ivon porque quero meu irmão de
volta.
— Não é apenas isso. Sei que está fazendo de tudo para resgatar Dario, mas você está
fazendo isso tudo pela Madeleine, só não enxerga isso porque não quer. Acho que você sente algo
por ela desde o início.
Fecho a cara e passo por ele, ignorando-o.
— Não sei por que, mas desde o início você quis resgatá-la, insistiu em mantê-la a salvo e
levar para dentro da sua casa. Se fosse com outra pessoa, você colocaria em qualquer lugar. Talvez
em um hotel, em outra cidade e bem longe. Você poderia ter feito isso ou mandado ela para a Sicília
sem pensar duas vezes. Porém, sua primeira opção foi levar para dentro da sua casa e perto da sua
irmã, que você tem um cuidado redobrado. Por algum motivo, desde o início vocês estavam
entrelaçados. Você lutou por ela, para ficar e se casar com ela. Brigou comigo e matou dez homens
sozinho em uma noite porque estava deprimido. Eu nunca soube o que houve naquele período, mas
sei que teve alguma coisa a ver com ela.
— Para de falar.
— Não vou, Travis. Se eu tenho uma coisa da qual me arrependo profundamente nessa vida, é
de não ter dito para a Mia que eu a amava. Eu a vi morrer de um jeito brutal nessa guerra, que não
tinha nada a ver com ela. Esse é o nosso mundo e estou te falando isso como um amigo e te
aconselhando. Eu te conheço desde pequeno. Sou quase dez anos mais velho que você e tenho muita
experiência, então fala para ela o que você sente antes de entrar naquele carro e colocar tudo a
perder.
— Eu não vou morrer, merda! Não posso. Não agora.
Paolo ergue a sobrancelha, questionando-me. Solto a respiração e cerro a mandíbula.
— Madeleine está grávida.
Os olhos dele se arregalam.
— Essa é uma informação que você já deveria ter falado para mim.
— Soubemos ontem. — Não o encaro. — Ela está de dez semanas e, se eu contar tudo o que
você está dizendo que sinto para ela agora, com certeza vai deixá-la ainda mais apreensiva.
Madeleine vai achar que tem algo errado. Tive muitas chances para conversar sobre sentimentos e
não fiz.
— Tem certeza de que prefere ignorar e ir nessa missão sem falar com ela?
— Sim, eu tenho. — Sento-me na beira da cama e foco no chão. — A situação já é
complicada e vai por mim — o encaro —, uma hora ela vai saber o que estou fazendo e não quero
que corra nenhum risco. Nem meu filho. Deixa do jeito que está.
Ele fica um bom tempo me olhando em silêncio e eu perco a paciência. Levanto-me e saio do
quarto deixando-o para trás.
— Você acha que ela não vai sentir nada quando souber? — Ele vem atrás de mim no
corredor. — Acha que ela vai pensar que é da boca pra fora se falar agora?
Paro meus passos e me viro.
— Paolo, chega.
— Você sabe que é mentira. É inteligente demais para acreditar até mesmo na sua teoria. —
Chega mais perto. — Aquela mulher é muito inteligente para pensar isso, assim como você.
Madeleine já deve ter percebido e por educação, e pelo amor que nutre por você, visivelmente, é que
ela não fala nada.
— Está bem, já chega. — Volto a andar no corredor. — Para com esse assunto.
— E você trate de não se arrepender depois. — Quando ele fala isso, paro os meus
movimentos e o encaro. — Eu me arrependo todo dia de nunca ter dito para a Mia que eu me
apaixonei por ela e não quero isso para você. Eu estou te dizendo uma coisa que nunca contei para
ninguém, nem para a pessoa que merecia isso. Será que você não entende?
— Paolo, eu...
— Travis, você é capaz de amar. Você ama seus irmãos e você tem compaixão quando é
preciso. Você é quase um ser humano, muitas vezes, e eu sou mais frio e calculista, e mesmo assim
abri mão de muitas coisas pela Mia. É apenas um conselho. Se não quiser segui-lo, é o seu critério.
— Não me coloque nessa posição, Paolo. Eu sinto muito pela sua perda. Talvez eu não tenha
falado o quanto eu sinto muito, mas essa história toda, essa conversa, é desnecessária. Não estou
dizendo que não sinto nada pela Madeleine e que ela é insignificante. Na verdade, é muito importante
e eu quero que todos a respeitem. Mas essa coisa de sentimentos, se um dia eu ousar cobiçar, pode
ter certeza de que a única pessoa que saberá vai ser ela. Eu não sou desumano e nem uma casca oca.
Essa coisa de sentimentalismo, francamente, eu não preciso disso agora. Mas eu te agradeço por se
abrir comigo.
— Confio no seu caráter de julgar as coisas e estou ao seu lado, como um apoio, muito mais
do que para te aconselhar. Você sempre sabe o que fazer e geralmente acerta. Se você quer assim,
tudo bem. Mas saiba se conhecer por dentro e ver as oportunidades. E essa conversa nunca existiu —
afirma com vigor.
— Com certeza nunca existiu — repito e o vejo pegar o caminho oposto, entrando no seu
quarto e eu viro seguindo para baixo.
Ele está certo. Eu deveria ter falado para Madeleine há muito tempo o que sinto, mas no
momento não posso pensar nisso. Não dá. Eu sei o que ela é para mim e como me transforma, e
preciso ser brutal agora. Ela é minha fraqueza e nesse momento tenho que ser o Travis Capo e cruel.
Garantir que eu volte para ela como prometi.

Antes de ir, eu preciso fazer duas coisas. Uma delas é falar com a filha de Ivon. Entro no
quarto onde ela está e a vejo de cabeça baixa puxando um fio solto do lençol que cobre suas pernas.
A menina levanta a cabeça e seus olhos me encaram, frios e temerosos. Por mais destemida
que ela tenta parecer, existe o medo mortal em suas írises verdes. Aproximo-me dela, agachando e
ficando na altura do seu rosto. Ela recua e se encosta na parede.
— Não precisa ter medo de mim. Já lhe disse isso.
Ela assente, mas não diz nada.
— Estou indo me encontrar com seu pai.
— Para quê? Vai me soltar? — O jeito que pergunta isso não parece ansiosa para reencontrá-
lo. Com certeza, ela quer sua liberdade de volta, mas não cobiça voltar para o vínculo do seu pai.
— Hoje vou trocar seu irmão pelo meu.
— Acredita mesmo que ele vai fazer isso?
— Se ele não cooperar matamos seu irmão e não soltamos você nunca mais. — Solto as
palavras duramente. Para que mentir?
Kira encara-me com desdém. Como se não desse a mínima.
— A morte do seu maldito e desprezível pai está por vir, criança.
— Foda-se! — ela solta.
Eu engulo em seco, reprimindo minha surpresa.
— Foda-se a sua vida também?
— Que vida? — cospe fazendo uma expressão de puro nojo.
— Então eu posso te matar agora? — Puxo seu braço e minha faca dentro da bota, os
movimentos sincronizados e rápidos.
Ela prende a respiração e os olhos nos meus, criando um duelo. Coitadinha. Pensa que é
capaz de fazer eu voltar atrás. Se eu realmente quisesse matá-la, se fosse benéfico, faria.
— Posso? — Toco sua pele com a lâmina. O ódio percorre meu corpo como oxigênio e
preciso me controlar.
— Acha que dou a mínima? — Ela respira fundo. — Acha que ele dá a mínima para mim?
Não valho nada para ele.
— Se é assim — digo e levemente cravo a lâmina em seu pulso e, quando o vermelho sangue
mancha a cor alva, paro e me afasto em uma velocidade sobre-humana. Inspiro e expiro com força
pelo nariz.
A compreensão reflete em seus olhos verdes, que ficam marejados rapidamente.
— Conversaremos depois — falo e me viro para sair.
Não antes de ouvi-la dizer em russo: Se puder corte a cabeça. Que graças ao meu avô
entendo muito bem.
— Yesli mozhno golovu otrubit'.
Apenas dou-lhe um aceno e saio fechando a porta.
— Não permita que mais ninguém a veja antes de eu voltar.
— Se voltar — Colen murmura e eu perco a paciência total.
Avanço no meu irmão até arrastá-lo para dentro do quarto ao lado, que tinha a porta aberta, e
lhe acerto um soco no estômago. Apenas uma punição.
— Porra! — ele tosse se desvencilhando de mim.
— Não fode, Colen!
— Não fode você, Travis! — Dá um empurrão no meu peito. — Está fazendo isso por nada.
— Acha que eu não tenho necessidade de fazer de tudo para trazer nosso irmão de volta?
— Você sabe que não é só por causa disso que está colocando a sua vida em risco.
Encaro-o em silêncio.
— Está fazendo isso porque o Ivon disse que Madeleine era uma puta e que seria de todos,
que ela é dele. Está fazendo isso por vingança, por Edgar. Porque não conseguiu matar aquele filho
da puta. Você está colocando tudo a perder. Será que vale a pena?
— Eu te respondo depois.
Meu irmão solta a respiração balançando a cabeça, colocando a mão na testa, parece
exasperado com a minha decisão. Eu o entendo e, se tivesse outra opção, com certeza eu faria; e, no
fundo, o que ele disse é verdade. Eu não pude matar Edgar por essa guerra, pelas atrocidades que ele
cometeu, pelo que ele iria fazer com Madeleine. E, quando eu estiver lá, vou cortar a cabeça de Ivon
pensando que é Edgar e todos os homens que me traíram por causa de alguma aposta que ele fez.
— Eu sou o rei dessa porra, Colen, e alguns momentos é preciso se colocar em xeque, para
vencer esse jogo.
— Isso não é apenas um jogo de tabuleiro! É a sua vida! Eu não estou pronto para ficar no
seu lugar.
— Você não ficará no meu lugar — nego com um aceno. — O meu filho vai ficar.
Ele franze a testa sem entender. A expressão no seu rosto muda de raivosa para conflitante.
— Madeleine está grávida. E o meu sucessor está dentro dela e você vai cuidar para que,
enquanto eu estiver longe, tudo fique bem. Você ficará no meu lugar sim, talvez alguns dias ou horas.
— Você está sendo muito otimista.
— Eu confio na minha raiva. Você deveria também.
— Nunca duvidei de você — diz entredentes e chegando até a mim, ficando cara a cara. —
Jamais ouse dizer que eu não confio em você. Sou o que sou por sua causa. Talvez é por isso que eu
temo te perder para essa guerra. Las Vegas não vai ser mais o que é se você morrer. Até mesmo
quando o pai estava vivo, você já fazia parte da grandeza que é o nosso território.
— E vai continuar sendo assim. Eu vou voltar. Eu preciso voltar.
Algo parece restabelecer dentro de Colen e ele assente e estende a mão para mim, que eu
aperto firme.
— Você nunca quebrou uma promessa.
— Essa não vai ser a primeira.
— Tudo bem — murmura. — Vamos acabar com esses desgraçados.

O esperto do Ivon acha que está armando uma tocaia para mim. Eu conheço Nevada como a
palma da minha mão.
Ele marcou o encontro no lugar mais deserto possível. Não existem fábricas ou nenhum posto
de gasolina. Não conseguimos nem ver o potinho de luz de Las Vegas. Estamos muito longe de casa e
mesmo assim eu sei onde estamos. Como um forasteiro que conhece o mapa pelas estrelas, eu
reconheço minha cidade de qualquer lugar.
O carro para nas areias do deserto de Nevada e eu sou o primeiro a sair, seguido de Paolo,
Solo, Luca e o outro soldado. Colen não veio. Minha carta na manga não podia vir. Ivon não queria
muitos homens, mas eu não viria sozinho. Muito menos ia aturar Yuri dentro do carro. Não ia dar
certo.
Vindo em alta velocidade, dois carros grandes param fazendo bastante poeira a uns dez
metros de distância de nós. Ele podia estar em Seattle que eu iria acertar uma bala na testa dele. O
pensamento brota quando o vejo sair do carro de trás.
Dou os primeiros passos, ficando mais perto e ele também. Não o suficiente para que eu
possa estrangulá-lo.
— Pensei que você ia desistir do trato.
— Diferente de você, sou um homem de palavra.
— Está parecendo essas mulherzinhas que falam algumas coisas para ver se a gente fica
sensível. Estou pouco me fodendo se você acha ou não que eu tenho palavra.
Apenas ergo a sobrancelha, não querendo assunto.
— Cadê o meu irmão?
— Cadê o meu filho?
Olho para trás dele e vejo três dos seus homens com armas apontadas para mim e meus
soldados. Bene, eu não queria botar em prova quem é melhor agora. O plano não é esse.
Levanto a mão e faço o sinal para Paolo e mantenho a expressão raivosa e os olhos
compenetrados quando escuto a porta do carro abrir e uma reclamação. Ivon muda a postura vendo o
filho e eu espero que seus homens tragam o meu irmão.
— Cadê o meu irmão?!
— Calma, Travis — diz com seu sorriso debochado de ouro.
Queria poder arrancar a pele das mãos desse filho da puta.
Escutando o barulho ao meu lado, eu vejo, pela visão periférica, Solo e outro soldado
arrastarem Yuri. Eu os acompanho levarem o verme até os pés do pai. Ivon espera meus soldados se
afastarem para ordenar que seus capangas peguem o filho do chão e leve para dentro do carro. Solo
não dá as costas e, passando por mim, toca meu ombro e balbucia baixo:
— Ele não está com Dario. Plano B.
Faço um mínimo movimento com a cabeça e espero Ivon se concentrar em mim para falar:
— Meu irmão. Onde está? A parte que eu prometi do trato está feito. Cadê o meu irmão?
Ele dá uma gargalhada forte e enfia as mãos nos bolsos.
— Mudei de planos.
Se eu pudesse me encarar agora, tenho certeza de que meus olhos estão flamejantes.
— Eu quero a minha filha — ele solta rapidamente.
— Você não dá a mínima para aquela menina.
— Ela é minha filha! Eu quero minha filha — ele insiste. — E eu também quero a minha
recompensa.
— Você quer o quê? — Dou um passo à frente e paro só porque me lembro de que preciso
voltar para Madeleine e para o meu filho. Se eu entrar em duelo com ele agora, todos morrem por
aqui mesmo.
— Se você não me der a minha filha e Madeleine, eu quero você. Hoje, no caso. — Abre um
sorriso. — Então, quando eu tiver os dois, solto seu irmão e você.
Ele é muito ruim mentindo. Era mais fácil falar que depois ele me mata. Está querendo isso
há tanto tempo.
O plano B era justamente se não conseguíssemos pegar Dario, era me deixar ser levado. Ir
para dentro do seu tabuleiro e então eu descobriria todas as suas peças e o destruiria de dentro para
fora. O bispo, a torre, o cavalo e o rei.
Ponho a minha mão para trás e faço o sinal que combinei com Paolo caso o plano fosse o que
eles acham que é o meu suicídio. Posso sentir a decepção e revolta de Paolo, mas ele acata
imediatamente entrando nos carros. Observo Ivon aprumar a postura, principalmente quando dou
alguns passos e chego até ele.
— Tudo bem, você me queria, você me tem, mas não se arrependa depois. Eu não sou um
cara muito fácil.
— Não preciso que você seja fácil. Às vezes, a gente captura um tigre não para ser de
estimação, mas porque a gente adora comer a carne.
Ah, seu desgraçado!
Escuto o barulho dos portões se abrindo, já que fiz questão de ficar na parte da frente do
balcão, e saio apressado. Espero que pare para eu me aproximar. Solo e Luca saem primeiro. Eles
passam por mim e os ignoro, meu foco é meu irmão. Porém, Paolo sai e nada do idiota.
— Cadê Travis?
Ele nega com a cabeça.
— E Dario?
— Plano B, Colen.
— Porra! — exclamo jogando as mãos para cima e depois colocando na nuca. Me agacho,
sentando nos calcanhares e sinto minha pulsação acelerar. — Merda! Merda! Merda!
Está tudo errado, desde o momento que Travis me falou desse plano ridículo. É suicídio e
espero que dê certo. Tem que dar certo. Eu não estou pronto para assumir seu lugar. Puta que pariu!
Eu vou matá-lo, se já não estiver morto.
— Colen, presta atenção. Eu estou falando com você! — Paolo grita e eu me levanto,
virando-me para ele.
— Diga, então, caralho! — Cerro a mandíbula. Estou por um fio.
— Você precisa liderar. Você é o segundo na linha de frente dessa Famiglia. Você tem que
ser focado.
— Você acha que eu estou fazendo o quê?
— No momento surtando.
— Vai à merda! — Bato no seu ombro enquanto passo por ele e sigo para o salão principal
do prédio onde ficamos. Essa fábrica falida e fedorenta. Olho para os caras jogando cartas e Solo
pegando uma bebida e grito: — Saem. Vão matar algum filho da puta da Bratva ou aqueles
mexicanos.
Eles se levantam e saem imediatamente. Paolo aparece e o vejo fazendo um sinal para Luca
quando pensa em entrar também. Esperto, ele desiste e o idiota do Consigliere vem até a mim.
— Esse é a melhor postura? Surtar?
— Não! Eu não estou surtando.
— Tudo bem, se você não está surtando, me escute. Tem algo que precisa saber, uma única
coisa antes de você pensar em agir na ausência do seu irmão.
— Okay, você pode falar. Não tem problema, mas não fale do Travis como ele foi alguma
coisa porque ele é. — Dou meu olhar penetrante a Paolo. — Ele é o Capo de todos nós. O chefe, o
mestre, o Manda-Chuva de Las Vegas.
— Colen...
— Travis é meu irmão, mas eu o respeito como o meu chefe, meu superior e, para mim, ele
está apenas – como ele mesmo gosta de falar em enigmas – sendo o cavalo de Tróia dentro no casulo
de Ivon. A gente não pode dizer que aquele filho de uma puta tem algum tipo de território. Ele não
tem nada e morrer com as mãos vazias. Como a Bíblia diz: “Do pó viemos, do pó voltaremos.” —
Contraio a mandíbula, concentrando-me no ódio.
— Eu entendi, Colen. Na ausência de Travis é você que fica no lugar, por enquanto e preciso
te dar uma informação muito importante.
— E qual é?
— A sua cunhada está grávida.
— Madeleine está grávida? — Ajo com surpresa, porque caralho.
— Sim, e eu pude confirmar depois que seu irmão se encontou com o médico. Ela está com
três meses. Umas dez semanas, o que é um pouco avançado e precisamos ter um cuidado redobrado
com ela.
Dez semanas?! Faço mentalmente um cálculo rápido e isso quer dizer que ela engravidou um
pouco antes do casamento. Tudo bem que eu já sabia que ela e Travis estavam juntos. Conhecendo
meu irmão como eu conheço, ele não ia perder tempo e fazer todo o protocolo de noivo bonzinho e
esperar certo dia para consumar o casamento. Pensando bem, ele é um sortudo, pois ainda bem que a
gravidez não é tão longa para ninguém suspeitar.
— Tudo bem — respondo Paolo. — E por que que eu tenho que saber disso em primeiro
lugar?
— Porque você será o responsável a contar para ela o plano mirabolante do seu irmão —
diz. — E ele me pediu para que cuidasse dela e do filho dele, ou filha. Então seria bom você ser
gentil.
— Você quer que eu conte para Madeleine? — Enfio as mãos nos bolsos.
— Sim. Você é o cunhado e o sucessor de Travis nesse momento. Não sou eu que tenho que
falar.
— Por acaso, você tem medo da Madeleine?
— De forma alguma — ele fala com superioridade. O que me irrita.
Eu não suporto isso em Paolo, mesmo ele sendo incrível sem precisar de uma arma na mão e
um ótimo conselheiro e matador. E entendo o porquê em seus olhos agora reflete uma fúria violenta e
sede de vingança.
Com certeza, se eu tivesse uma mulher que acaba de me dar uma filha morta sendo inocente,
eu estaria muito puto e iria matar todos os responsáveis. Por isso que ele não se opôs ao plano de
Travis. É o plano perfeito para ele colocar as mãos no cara que atirou em sua mulher.
— Está bom, eu falo com ela. Não tem problema e não se preocupe. Eu sei ser gentil quando
é necessário.
— Você quer dizer que sabe ser gentil quando fala com a sua irmã — corrige e senta-se na
cadeira, pegando um cigarro e acendendo.
— Você entendeu e eu sei lidar com o mundo de fora. As pessoas que não fazem parte do
nosso círculo, então sou obrigado a ser humano. Sei esconder minha brutalidade numa máscara firme.
— Eu sei que sim. Você é capaz de muita coisa, Colen. — Traga um fumo forte e me encara
sem piscar. — Eu não quero que você substitua Travis, mas quero que saiba que seria um ótimo
Capo, se precisássemos.
— Obrigado, Paolo, e eu me contento se meu irmão me deixar uma das cidades para cuidar.
Eu realmente não quero ser Capo. Tenho outros planos para mim.
— Eu entendo.
Trocamos um aceno de entendimento e vou me sentar também.
— Agora que falamos sobre o assunto do bebê, acho que podemos começar a rever o plano.
— De imediato, porque sabemos que Ivon não vai poupar Travis, quando ele pegou Yuri.
— Não esqueça a garota.
Ainda não acredito que a trouxe para ficar aqui. Foi uma das piores escolhas que fiz, mas
quando a vi jogada no chão com tanto medo, não sei o que me deu. Eu quis tirá-la de lá. Só não
pensei aonde colocar. A garota tem sorte do meu irmão ter ainda decência dentro dele.
Pode não estar num hotel cinco estrelas, mas ninguém tocou em fio de cabelo dela. As
torturas psicológicas de nada serviram. Acho que o pai já fazia seu trabalho antes e a garota não tem
muito o que ser ferido. Merda! Não gosto de ficar perto dela. Seu olhar me incomoda.
— Sim, Kira. A filha dele.
Dou um aceno. Eu sempre ignoro o nome dela. Não quero saber nada sobre ela além do
óbvio. Que precisa ir embora o quanto antes.
Meu coração está pesado de preocupação. Não consigo dormir de jeito nenhum. Tem algo
acontecendo ou aconteceu algo de ruim. Eu nunca falho quando sinto essas coisas e, no momento que
estamos, não quero estar certa.
Escuto um movimento na porta e me levanto com a xícara que está meu chá frio e sem graça,
do sofá onde cochilei. Não consegui dormir na minha cama. Tinha algo faltando e eu sei muito bem o
que é.
Indo para o lobby da casa, paro vendo Colen chegando com dois homens atrás dele.
— Ainda está acordada? — ele me pergunta chegando perto e dispensa os soldados com um
sinal. Sua postura está diferente, na verdade sua aura.
É estranho dizer, mas conviver com todos esses homens, tão de perto, me fez aprender a
observar melhor as pessoas, os gestos e até o andar. Um homem feito é bastante treinado para saber
cada movimento no corpo do seu oponente, ou de qualquer um. O corpo sempre fala o que a boca não
quer deixar passar. A gente sempre demonstra se tem algo de errado ou certo.
Espero os soldados saírem da casa para responder:
— Eu não consegui dormir. Estou com insônia.
— Tudo bem. — Ele para na minha frente e me olha dos pés à cabeça.
Hum...
— Você já sabe, não é. — Abro um sorriso de lado.
— Que você está grávida, sim, eu sei. Paolo me contou.
— Paolo? — Franzo a testa e dou um passo sentindo meu coração querer pular para fora de
mim. — Por que foi o Paolo que te contou e não Travis?
Colen não responde e seu silêncio me incomoda profundamente.
— Me responde porque que não foi o Travis que te contou? Porque na minha cabeça, vocês
são irmãos e muito unidos e ele que devia te contar.
— Eu sei, mas não foi. Ele não pôde.
— Por quê? E me fala a verdade, não gosto que fiquem me enrolando.
Colen me dá um aceno de cabeça quase imperceptível e estende a mão.
— Você pode me acompanhar até a sala. Vem, sente-se comigo rapidinho. Estou com as
pernas cansadas.
Ele deve estar cansado mesmo. São uma e meia da madrugada e é nítido que não dormiu.
Esse condicionamento que os homens aprendem para não dormir, aguentar até dois ou três dias sem
pregar os olhos, é uma doença. Uma loucura e pensar que meu filho vai ter que fazer isso dá uma dor
no coração, mas é isso.
Nós vamos para a sala e eu volto a me sentar onde estava e Colen reluta em ficar ao meu
lado, mas é vencido por meu olhar paciente. Não sou convincente como um Madman, só que sou
teimosa como uma italiana.
— Pode falar agora.
Ele sorri de lado balançando a cabeça.
— É por isso que meu irmão gosta de você. Seu temperamento é forte como de um Homem de
honra.
Sorrio agradecida e dou um suspiro forte para ele falar logo, e parece que entende, pois
começa:
— O que eu vou te falar, vai deixar você um pouco apreensiva, mas eu tenho tudo sob
controle.
— Tem?
— Tenho — afirma com vigor. — E eu vim aqui conversar com você antes de prosseguir com
o plano.
— Que plano?
Com parcimônia, Colen me conta todo o plano de resgatar Dario e destruir Ivon. Não vou
dizer que é ruim, pois é péssimo para o meu coração saber que tem Travis nas mãos. Levanto-me
rápido e deixo a xícara cair, por sorte vazia.
— Madeleine? — Colen segura meus ombros.
Estou fraca, não fisicamente. Eu me sinto inerte por não poder fazer nada. Não sei se choro
ou grito ou bato em Colen por deixar o meu marido fazer uma merda tão grande.
— Ele está correndo perigo de morte — murmuro com as vistas sem foco. — Não posso
acreditar nisso. Meu Deus! Eu não acredito que ele fez isso sabendo que carrego em minha barriga o
nosso bebê a caminho. — Encaro Colen. — Ele não pode ter feito isso. É uma loucura.
— Eu realmente entendo, Madeleine, mas está tudo sob controle. Estou indo pegá-lo. Juro
que vou trazê-lo ainda hoje de volta para casa.
— Está de brincadeira, não é? — indago sentindo como se tivesse uma bola de demolição
atingindo meu coração a cada respiração.
— Por quê?
— Porque vocês demoraram esse tempo todo para encontrar Dario e agora você está me
dizendo que “simplesmente” vai encontrar Travis e trazê-lo ainda hoje para casa. Porra! É uma
piada!
— Madeleine — ele tenta argumentar.
— Não! — interrompo-o. — Eu ainda não cheguei na parte que parece que você acha que
nada vai acontecer com ele. — Engulo com dificuldade, respiro fundo e preciso de força para
terminar: — Que não vão arrancar um dedo, esfolar, queimar, enfiar uma faca e arrebentar com a cara
dele. — Meus lábios tremem e sento-me para não desmaiar. — Dio mio. Parece que... Não existe a
possibilidade de mataram o meu marido.
Colen senta-se ao meu lado e coloca a mão sobre as minhas.
— Eu sei que está nervosa, mas vai ficar tudo bem.
Ergo a cabeça e fito seus olhos. Esses malditos olhos dos Lozartan.
— Se você não correr a tempo, não vai sobrar nada. — Choro baixo. — Você sabe o que que
eles fizeram com meu pai.
Fecho os olhos e relaxo meu corpo no sofá. Toco minha barriga.
— Entendo você, Madeleine, mas preciso que se cuide por causa do bebê. Não quero que o
Travis brigue comigo se algo acontecer com você.
Viro o rosto para ele e o encaro.
— Você realmente acha que consegue resgatar ele?
— Eu não tenho outra opção, pois não é apenas você que não consegue viver nesse mundo
sem Travis. Ele é meu irmão, o meu Capo e eu morreria por ele, e o fato de ele estar lá sangrando
por nós, com certeza o torna uma pessoa que preciso resgatar porque, quando um de nós sangra,
todos nós também sangramos. O problema é que Ivon é um mal que precisa ser cortado pela raiz. O
plano de Travis é arriscado, eu sei, mas é o único que nos dá a garantia de acabar com aqueles
vermes.
Balanço a cabeça freneticamente em afirmação.
— Tudo bem. Tudo bem, então, só para reformular, você disse que Travis tem um chip de
rastreamento e não tem como saber?
— O chip está implantado na pele, não tem como descobrir e tem tanto tempo que está lá, que
já está cicatrizado. Porra! Travis tem milhares de marcas e mesmo que tivesse a do chip, eles iriam
achar que foi só uma marca de luta.
— Okay. Certo. — Pisco com força. — Você já sabe onde ele está e já vão atrás dele?
— Se o queremos vivo, vamos o mais rápido possível.
Abraço a mim mesma e começo a chorar, e me surpreendo com Colen me envolvendo em
seus braços.
— Sei que você deve estar com medo, mas tudo vai passar e depois só teremos lembranças e
ensinamentos, fora uma bela vingança. Não é sempre assim que nós vivemos, em guerra.
— Eu sei, o Travis falou para mim.
Ele ergue as sobrancelhas como se estivesse surpreendido.
— Você quer saber quando? — Levanto a sobrancelha, sentindo-me mais relaxada e
confiante. E retomo, dizendo: — Eu sei tanta coisa, ele sempre conversa comigo e me ouve. E... —
Sorrio com a lembrança dele zangado. — Eu acho que sou o diário do seu irmão. — Respiro fundo e
fecho os olhos. — E não posso perdê-lo. Eu o amo tanto. — Toco minha barriga. — Eu quero ter uma
família com ele e sei que ele será um pai incrível só pela maneira como criou você e seus irmãos.
Por favor, não demore muito.
Colen assente, com o rosto neutro, porém os olhos intensos.
— Eu não vou e só vim aqui falar com você mesmo.
Assinto, sorrindo e toco seu peito.
— Obrigada por me contar, por me preparar pelo que eu posso ver... Quando ele chegar. —
Fungo chorando. — Você me disse que ele é ruim de morrer, espero que esteja absolutamente certo
disso.
— Eu estou e, se quiser, espere acordada — diz e dá uma piscadela.
Solto um soluço, sorrio e concordo com a cabeça. Nos levantamos e eu o sigo até a porta,
pedindo ao universo que tudo ocorra bem.
— Traga meu rei de volta — sussurro apenas para mim vendo o carro passar os portões de
ferro enormes.

Caralho! É o meu pesadelo do momento porque estou cansada de ouvir que preciso ficar calma
e cuidar de mim por causa do meu bebê. MAS, MEU DEUS, não tem como eu ficar tranquila e tentar
dormir com meu marido nas mãos do inimigo!
— Você podia tentar dormir um pouco — Rosália fala enquanto coloca uma bandeja com chá
e biscoitinhos para mim.
Agora são quase três da manhã e com isso faz algumas horas que Colen se foi e eu não tive
notícias. Isso está literalmente me levando ao surto total e vou enlouquecer se não receber nada nas
próximas horas.
— Não consigo dormir. Não consigo fazer nada, mas, com certeza, se tivesse oportunidade
correria por aí procurando em cada centímetro na escuridão dessa cidade... O meu marido.
Talvez eu realmente tivesse medo de pertencer a esse mundo pelo medo, pelos inimigos, a
nutrição pelo ódio cego e sede de vingança, que não tem justificativa muitas vezes.
— Não se preocupe com Travis, Madeleine — escuto Luigi.
— Como você pode ter tanta certeza?
Ele arfa pelo nariz e fica impassível.
— Nós não estamos mais na era medieval e o carro que foi atrás dele tem um rastreador
implantado. Eles irão resgatá-lo e aniquilar todos aqueles russos.
Concordo e não me importo de chorar na frente deles. De repente, Marinne vem correndo das
escadas e me abraça com força, eu a aconchego me meus braços e cochicho baixinho que vai ficar
tudo bem. Ser forte não apenas para mim é o mais difícil agora.
— Meus irmãos...
— Eu sei, minha querida, e confia em mim. Vai ficar tudo bem.
Uma sombra surge do lado direito e vejo Paolo entrar. Franzo a testa sem entender ele aqui e
levanto.
— Espere aqui. Vou falar com Paolo rápido e já volto. — Coloco o cabelo atrás de sua
orelha.
— Tudo bem — ela sussurra, com os olhos molhados.
Controlando meu nervosismo vou até Paolo.
— Por que você não está com Colen?
— Ele preferiu que eu fosse quando tivesse que atacar.
— Quer dizer que não... — Engulo o choro e fico bem perto dele, ouso colocar as mãos no
seu peito. — Por favor, Paolo! Eu não sei o que é perder alguém que... eu realmente amo. Já perdi
muito na minha vida e depois que me permiti estar onde estou, e amar esse homem, eu me encontrei.
Eu não quero perdê-lo. Você precisa me trazer Travis de volta, senhor. Eu... Aguentei tanto seu ódio e
agora preciso que você os dê a quem mereça.
— Madeleine — tenta falar.
— Eu sinto muito — digo engasgada e derramando meu choro. — Eu nunca vou ser capaz de
pôr em palavras o que a sua perda fez comigo e eu mal a conhecia, mas eu senti a sua morte. Então,
por favor, não me deixa sentir o que você sentiu.
Ele me surpreende limpando meu rosto do choro.
— Por favor, me devolva ele. Eu... Queria poder ajudar, mas não posso agora. Não posso
colocar a vida do nosso bebê em risco, então, por favor, faça tudo o que puder. Tudo que estiver ao
seu alcance e até o que não estiver. Traz o meu marido de volta. Traz o seu Capo de volta. Traz o pai
do meu... bebê de volta para casa.
Paolo fica em silêncio, olhando-me e é um muro em branco, não consigo enxergar nada em
sua expressão. Então, ele coloca as mãos sobre as minhas, aperta e faz uma expressão que não sei
distinguir antes de falar:
— Travis é ruim de matar e violento, cruel e feroz quando está em campo. Embora as
circunstâncias tenham mudado um pouco, eu sei disso. Ele ainda é o mesmo homem, no entanto agora
está mais forte por sua causa.
Minhas lágrimas escapam em ouvir isso.
— Ele está mais motivado. Tem por quem lutar, não só pelo que lutar. Eu sei que você sabe
que ele a adora e vai lutar bravamente para voltar para você e para o filho dele.
— Uhum... — resmungo chorando.
— Ele estava muito feliz e orgulhoso. Saiba que você é o grande motivo de ele lutar. Homens
como nós, no fundo, precisamos de um objetivo maior do que a Famiglia, porque por ela nós
morremos, mas por nossas esposas e nossos filhos escolhemos lutar e sairmos vivos, mesmo que em
pedaços. — Aperta minha mão de novo. — Eu vou trazer ele para nós, para você. Dou a minha
palavra.
Como estou tão emocionada e emotiva, choro copiosamente e ele me envolve em seus braços.
Sinto uma dor no meu peito tão grande. Eu queria o meu malvado favorito em casa comigo agora.
Paolo se afasta, calmamente, para não ferir meus sentimentos. E solto a respiração
encarando-o.
— Ele vai voltar, mas até lá você precisa ser forte. Esteja aqui para ser forte, para comandar
o exército dele enquanto Travis estiver longe. É isso que ele quer de você.
— Não sei fazer isso.
— Não estou falando do exército dos nossos homens, é de todos nós, Madeleine.
Franzo a testa.
— Você é a Sra. Lozartan. A nossa senhora e carrega o futuro chefe da Famiglia. Você
precisa ser forte para isso, para nós, para Travis e para o seu filho. Eu não ligo que chore, mas me
importo que você enfraqueça, entendeu?
— Entendi e vou me recompor.
— Isso! Se recompõe, ergue essa cabeça e ande com uma arma para onde quer que vá. Não
confie em ninguém. Sei que você andou treinando e não foi para brincar.
Assinto, concordando e aprumo minha postura. Enquanto ele não estiver, eu estou. Foi isso
que ele pediu e que Paolo reforçou agora. Apenas preciso esperar Travis chegar, porque ele vai. Ele
prometeu voltar para mim para sempre. Ele é meu marido, meu Capo e desejo que sua força e
crueldade o devolva para mim. Se o amor não for grande demais, que sua ira seja.
Aqueles desgraçados me colocaram em um cubículo fedorento e apertado demais, sem contar
que não consigo enxergar absolutamente nada. E, desde que me jogaram aqui, não tive o desprazer de
ver mais nenhum deles.
Ivon deve estar cuidando do imundo do filho antes de querer fazer algo comigo. Isso é bom,
tenho tempo para analisar o território, mesmo apenas ouvindo. Meus treinamentos táticos foram muito
além e, nesse momento, tento desvendar os ruídos fora do cubículo.
Passos ficam mais fortes e próximos até que uma sombra some com a luz que invade por
baixo da porta, que se abre.
— Vamos dar um passeio, mocinha.
Quando o idiota chega perto demais de mim, dou um golpe com a cabeça nele, que o faz
cambalear; e o outro capanga não pensa duas vezes para acertar meu queixo.
— Você ainda vai se arrepender de fazer isso! — rosna o que golpeei.
Abro um sorriso de lado e rio baixo. Aposto que eles vão morrer ainda em minhas mãos.
— Não fala o que você não pode dar como garantia.
— Foda-se! — Ele me soca no estômago. — Nem mais um pio, seu italiano de merda!
Sim, eu me curvo para eles e os deixo me arrastarem até onde querem. Finjo estar muito mal
pelos primeiros golpes dados no carro, quando fui colocado naquele lugar e agora, mas no fundo
precisa de muito mais para me nocautear. Meu pai me levou muito mais ao limite do que isso.
Chegando no espaço amplo, que deve ter sido uma área de serviço, eles me jogam no meio de
uma poça de água suja e dão gargalhada. É necessário tão pouco para eles pensarem que estão me
torturando. Pensei que a Bratva fosse melhor que isso.
— Acho que nosso amigo está sujo. Vamos lhe dar um banho.
Três homens me pegam do chão e levam até um tanque enorme cheio de água gelada. Fecho
os olhos e espero o choque, o frio e prendo a respiração enquanto eles empurram minha cabeça.
A imagem de Madeleine e seu sorriso é tudo que vêm em minha mente enquanto controlo meu
ódio e a agonia dentro de mim.
Eles não terão um grito meu. Uma súplica. Um pedido de misericórdia de mim. Eles serão os
únicos a me pedirem piedade e para parar.
A imagem dela é nítida. Seus cabelos castanho-claros, os olhos azuis e o sorriso sempre
aparente, nunca escondido assim como sua coragem e ousadia. Poderia ser algo que eu supostamente
odiaria, mas amo isso nela. Sua coragem, inteligência e astúcia. Encontrei sem querer a mulher ideal
para ficar ao meu lado.
Cazzo. Eu não sei como ela está lidando comigo aqui preso e sendo torturado. Porra! Sei as
consequências que esse plano pode me levar, porém não tem uma forma melhor para conseguir pegar
Dario de volta e cortar a cabeça de Ivon. Assim como sua filha mesmo disse.
Eu estou aqui agora por Madeleine e o nosso filho. Não quis admitir antes, mesmo sabendo
que é a verdade.
Desperto quando puxam minha cabeça pelo cabelo e derrubam-me no chão. Ganho um chute
na altura do rosto e depois mais um na boca do estômago. Sou içado pelos cabelos para longe e
acabo batendo forte a cabeça na parede.
Merda!
— Não trate nosso amigo assim.
Rosno ao escutar a voz irônica de Ivon. Cerrando a mandíbula, ergo apenas os olhos para ele,
pois, francamente, no momento não tenho muitas forças.
Espero que Colen esteja vindo. Que meta o pé na porta!
Ivon se aproxima de mim, agacha-se apoiando os cotovelos nos joelhos.
— Acho que está na hora de você pagar por tudo que fez.
— Eu fiz? — debocho e cuspo sangue em cima dele.
Com meus reflexos falhos, não prevejo quando ele me golpeia em cima do olho. Essa merda
dói pra caralho! Aperto os olhos para voltar a enxergar quando os abro e encaro com extremo ódio o
desgraçado russo.
— Isso fez você lembrar?
— Que eu quebrei seu filho — cuspo literalmente as palavras junto com o sangue do corte
da minha boca. — Que eu torturei com a minha faca, com meus punhos e ele agora tem membros
faltando.
Ivon se ergue, puxa-me pelos cabelos e distribui socos no meu rosto disparadamente, sem
nem respirar. Eu aguento calado e quieto, contraindo todos os meus músculos para não doer tanto e,
sendo honesto, sobrar energia para quando eu me erguer arrebentar com a cara dele. Não vai sobrar
nem sua sombra para reconhecer quem foi esse bastardo.
Por fim ele me solta e caio no chão, na poça da porra do meu sangue. Puxo uma respiração
profunda e aperto os olhos antes de abri-los. Encaro os sapatos polidos dele, agora manchados de
lama e sangue, se afastar antes de receber uma única pancada forte na cabeça e a escuridão é tudo o
que me sobra antes de desmaiar.
Um balde de água fria me desperta de um sonho turvo e confuso. Piscando, foco em meus pés e
mãos, que foram amarrados para trás na cadeira que me colocaram. Minha boca dói tanto quanto
todos os ossos do meu corpo. O gosto de metal é forte e sinto uma dor filha da puta nas costelas. Com
certeza, ele deve ter quebrado.
Escuto a porta ranger quando é aberta e levanto o rosto para ver o babaca entrar e parar na
minha frente.
— Trouxe uma coisinha para você — diz e uma foto cai em minhas pernas.
Forço minhas vistas para a imagem e a figura de Madeleine na porta da igreja quando
estávamos nos casando. Ela estava linda de noiva e sorrindo ao sair do carro antes de entrar na
igreja. Porra! E pensar que ela já estava grávida nesse momento toma todas as fibras de proteção
dentro de mim.
— Você pegou o que era meu — Ivon solta as palavras e pega a foto de volta e rasga dando
um riso sombrio para mim.
— Eu peguei? — Minha voz sai terrivelmente cansada e rouca, e odeio esse sinal de
fraqueza. Caralho! — Que porra você está falando, seu bastardo?
Ivon aperta os olhos me olhando com escrutínio.
— Você matou um dos seus homens por isso. Não se faça de idiota! — cospe as palavras. —
Você ficou com o que é meu. Tem que pagar agora. Ou devolver, mesmo que já está usada.
Ergo a cabeça e fito seus olhos tremendo de ódio, e ele ri.
— Sim, estou falando da sua esposa. Aquela italiana usada que deita na sua cama. Eu paguei
por ela! O que você vai me dar em troca por já ter fodido sua boceta? Esse prêmio era meu.
Cuspo sangue, com minha boca arrebentada e cerro a mandíbula, olhando-o com toda a minha
raiva.
— Eu vou arrebentar a sua cara.
— Acho um pouco difícil — declara ironicamente e não estou esperando quando um choque
atinge meu corpo.
— MERDA! — reclamo em voz alta.
— Gostou do choquinho?
Fecho a cara para ele e murmuro entredentes:
— Você vai precisar correr muito quando eu me soltar daqui.
Ivon ri alto e chega perto.
— Você não está nem se aguentando sentado, italiano.
— Garanto que você não vai aguentar metade do que seu filho suportou.
Recebo uma facada no ombro, que ele faz questão de puxar lentamente e saindo do ângulo
para me cortar mais um pouco. Ele limpa o sangue no meu pescoço, tirando mais sangue de mim.
Penso que posso respirar um pouco, no entanto, não estou preparado para ser atingido com socos
disparadamente pelo corpo todo.
Eu não consigo mais travar meu corpo, meus músculos e consciência da dor para os socos e
chutes, então as aceito em silêncio. Tudo se resume a dor, sangue e minha iminente morte se ninguém
chegar logo. O gosto de ferro está muito forte agora, os golpes durando cerca de dez minutos e o
líquido quente que faz cócegas conforme escorre por meu rosto, me dá a ideia certa de que estou
ferido na cabeça.
Inesperadamente ouço um estrondoso barulho de explosão e o clarão vem em seguida com
destroços fragmentando-se pelo ar. Sou derrubado no chão, minha cabeça batendo no concreto com
força. O zumbido da bomba aguça em meus ouvidos e por longos segundos fico aturdido e sem
equilíbrio.
Engulo com dificuldade a merda do meu sangue misturado com minha saliva e tento erguer
pelo menos a cabeça quando aperto os olhos antes de abri-los. Vejo os filhos da puta que estavam me
batendo caídos no chão e Ivon ao longe, que cambaleia para fora, tentando ficar de pé. Escuto-o
falarem russo com braveza com alguém antes de cair de joelhos e ser arrastado de volta para onde
estou. E entrando correndo, empurrando Enzo – que finalmente reconheço puxando Ivon pelo
colarinho – Colen vem em minha direção.
— Travis!
Sendo honesto, não tenho forças para replicá-lo.
— Vamos, seu idiota. Levante-se! — Colen insiste. — Lute! Você não quer ver seu filho
nascer, não?!
— Porra! — reclamo por suas palavras e porque ele puxa minha cadeira até que ela está
normal em pé.
— Aquela mulher linda está te esperando em casa. Vamos! Levante-se.
— Colen — digo entredentes sentindo dor e o vejo pegar uma seringa, enquanto isso ouço os
tiros ao longe.
— É adrenalina.
Meneio a cabeça e vejo-o injetar a adrenalina, e tão logo meu corpo reage acordando como
se eu tivesse recebido um choque. Abro os olhos com força e os estímulos do antídoto correm em
minhas veias fazendo meu corpo queimar e parecer se acender. Respiro fundo e encaro meu irmão.
— E aí, o quanto machucado você está?
— Aceitável para levantar e acabar com a raça de Ivon com minhas mãos.
Colen sorri sombriamente e me ajuda a levantar. Não tinha percebido que tinha me
desamarrado da cadeira. Ele segura com firmeza meu braço.
— O que você está fazendo? — Franzo a testa para ele.
— Garantindo que você não caia, porra.
Puxo meu braço da sua mão e caminho até Enzo, que tem Ivon preso com algemas. Colen quer
me ajudar e cuidar para que eu chegue em casa vivo ainda, mas ele sabe quem sou e que preciso –
com minhas mãos – fazer a luz abandonar os olhos desse russo filho da puta. Ele vai engolir tudo que
falou de mim e de Madeleine. Vai morrer chamando a minha esposa de rainha, pois é o que ela
nasceu para ser e é.
Quando paro na sua frente, seus olhos registram minha presença e o vejo como engole em
seco. O medo é tudo que lhe resta. E as lembranças do meu passado, minha infância e tudo que passei
nas mãos da minha mãe quando me batia e eu chorava. Aquilo me tornou o que sou hoje e quem bate
agora sou eu.
Embora a dor reverberando em minhas costelas – que já não estavam tão bem depois do
ataque que fiz aos mexicanos há quatro meses –, no meu quadril e ombro dos golpes atuais, eu faço
questão de baixar o corpo o suficiente para fixar meus olhos nos seus, apertar seu colarinho até
deixá-lo sem ar e digo:
— Agora é o momento que vou te fazer pagar todos os insultos, tortura e, acima de tudo,
pagar por sua língua miserável em ter feito uma negociação contra mim, por ter pensado em tocar na
minha esposa, pois te garanto, isso nunca iria acontecer.
— Se você gosta de restos.
E o primeiro soco eu lhe dou com o braço curvado, um jab perfeito de Muay Thai, que o
derruba de volta no chão. O segundo é mais forte e não paro até vê-lo cuspir sangue. Não vou parar
até saber que está morto por minhas mãos.
— Vai.
— Travis?
— VAI! — berro com Colen e Enzo. — Vão acabar com todos esses russos. Não quero
informação de nenhum deles. — Paro de socar a cara de Ivon para encará-los. — Eu quero os seus
corpos.
— É um péssimo líder — Ivon murmura.
Chuto-o com toda a força que ainda tenho e curtindo o feito da adrenalina.
— Bem menos que você que os levou à morte por algo que nunca teria. Você morrerá e seus
homens também e o líder da Bratva ainda irá me agradecer por eliminar um verme como você. —
Para finalizar minha ira, dou dois chutes em suas costelas.
— Eu tentarei terminar rápido tudo, irmão. Enquanto isso se divirta e deixa que eu cuido de
Dario.
Olho de relance Colen e ele assente me dando a informação que preciso. Dario está bem.
Ótimo. Ivon não morrerá pela morte de um irmão meu, mas com certeza pela tortura feita com ele. No
fim, ele só irá perecer sobre sua ambição e o erro de tentar derrubar a Lawless.
Sem olhar para eles, aceno com a cabeça para que vão fazer o que ordenei e pego Ivon,
arrasto-o até a cadeira que ele mandou me amarrar e olhando em seus olhos lhe dou o que merece.
— Eu apenas quero saber quem.
— O quê? — Cospe sangue, pendendo a cabeça caída para a frente.
— Quem passava as informações. Quem está me traindo.
Ivon solta uma gargalhada fraca e rouca.
— Não brinque, Capo.
— Não me chame assim! — Acerto-o com três golpes no queixo, mas sei que ele conseguirá
falar o que quero. — O nome do traidor. Se falar rápido, morre rápido. Se não colaborar, eu vou te
picar em pedacinhos e fazê-lo sentir absolutamente tudo.
A forma como ele me encara diz muito mais do que palavras e sei que irei saber quem é o
traidor da Famiglia. Melhor, vou confirmar quem é e... Vou fazê-lo pagar da forma mais cruel.

O terror está marcado em seus olhos. Não lhe resta muito para aguentar sequer mais um deslizar
da minha lâmina. Sei que está por um fio e nesse momento apenas curto o prazer de ver a vida lhe
abandonar. Ele não merece estar no mundo que Madeleine está. Nunca deveria ter cogitado a ideia de
tocar em meu irmão.
Estou limpando minha faca quando Luca aparece. Ele para, me encara e cerra os olhos,
questionáveis.
— Você está bem, senhor?
— Sim. E Dario?
— Ele está no carro. Estamos esperando por você.
Franzo a testa e espero que continue:
— Já terminamos e até conseguimos algumas informações por barganha, mas agora estamos
esperando você acabar aqui.
— Já terminou, irmão? — Colen surge atrás de Luca.
— Acredito que sim — respondo secamente e viro-me para Ivon.
Seus olhos abrem-se esbugalhados e consigo enxergar com nitidez o corpo tremer, só não sei
se é por causa dos ferimentos ou do banho de água gelada que fiz questão de retribuir. Vingança é
para poucos, pois sabemos que iremos carregar uma dosagem do que fazemos a outra pessoa para
sempre. Nesse caso estarei livre, é apenas retribuição e não já tenho meu pé no inferno, porra. Não é
agora que irei questionar o que faço e muito menos por Ivon Avilov.
Eu estico meu braço e, sem precisar questionar, Luca coloca uma arma na palma da minha
mão e com uma calma proposital, estico o cano da pistola na testa de Ivon.
— Sua filha falou para eu cortar sua cabeça, acho que vou fazer quase isso. — Destravo a
arma. — Tenha uma boa morte, bastardo — falo em russo e aperto o gatilho.
Fecho os olhos quando o sangue se espalha e abro para registrar a cabeça furada de Ivon
pender para a frente para nunca mais se erguer. Perco a noção do tempo encarando esse porco
sangrando. Como se fosse para ser, vejo Paolo entrar e chegar até a mim. Seus olhos fixam nos meus
e nossa escuridão é uma só. Sentimos o mesmo agora, no entanto não posso ser hipócrita. Eu não
perdi nenhum membro da minha família e ele perdeu sua esposa da forma mais brutal. E eu deixo que
ele passe por mim, pegue sua arma e dispare no russo.
Minha respiração falha quando dou um passo, indo até Luca. Ele me segura e Colen também.
— Está na hora de ir para casa.
— Eu vou desmaiar e já vou te ordenar, não deixe Madeleine me ver antes de fazer alguns
curativos. — Ponho a mão no ombro de Colen. — Caralho. Eu não estou bem e não quero
impressioná-la com isso.
— Seu pedido é uma ordem.
Caralho! Daqui a pouco, eu vou conseguir tatuar meus passos no tapete da sala. Paolo falou para eu
ficar tranquila e descansar enquanto foi pegar meu marido. Mas não deu! O sono não veio e meu
coração bate na velocidade da minha preocupação.
Agora são quase cinco da manhã e já se passou tanto tempo desde que eles se foram.
Dio mio. Onde está Travis?
Mais uma vez caminho até a cozinha e bebo um copo d'água. Vou no banheiro fazer xixi,
porque, mesmo que não tenha tanto tempo de gravidez, minha bexiga não resiste muito tudo que bebo,
e depois que termino vou direto para o quintal. O céu está tão lindo e estrelado. Fecho os olhos
suspirando.
— Só o traga de volta — peço baixinho. — Por favor, o traga para mim.
Abro os olhos, aprumo a postura e afago minha barriga. Sinto um frescor gostoso do vento
que passa pelo jardim. Tenho vontade de correr pelo gramado e talvez mergulhar na piscina. Arfo
com força porque meu coração parece que vai explodir e viro-me para voltar para dentro bem a
tempo de flagrar uma movimentação pela estradinha da garagem dos fundos, que geralmente os
soldados usam para entrar na casa adjacente. Onde alguns homens literalmente moram, Travis faz
reunião e... Tem a enfermagem.
— Meu Deus!
Saio correndo para os carros e vejo Luca sair com Colen logo atrás, então vejo que Pietro
ajuda a segurar Travis.
— Travis! — digo e corro até ele.
Eles me olham alarmados e Paolo chega até a mim o mais rápido que pode.
— Madeleine, devagar.
— Não! Preciso vê-lo — digo e paro na frente do meu marido, ele está tão fraco e apenas de
pé porque o seguram. — Travis! — O abraço bem forte.
— Devagar — ele reclama.
— Desculpa. — Solto-o e choro olhando em seus olhos. — Nossa. Olha o que fizeram com
seu rosto.
Travis contorce o rosto com desgosto e dor. É tão grande que não liga em demonstrar para
mim e para Luca e Pietro, que estão ainda o segurando.
— Me leve para dentro.
Engulo minha emoção para não chorar tanto na frente dele e olho para Colen.
— Vamos colocá-lo numa cama agora! Vamos, seus idiotas.
Assinto e me afasto para eles fazerem seu trabalho de levar meu marido. Meu coração não se
acalmou em vê-lo. Deixo-os passarem com ele, viro-me para Paolo e sigo para a casa.
— Como está Dario? — pergunto ao Consigliere.
— Parecido com Travis.
— Está vivo? — Toco no meu peito como se pudesse tranquilizar a pressão dos batimentos.
É consolo e sofreguidão.
— Sim — responde Paolo com tom de exclamação.
— Onde está?
— Você estava concentrada demais em Travis quando passaram com Dario para dentro.
— Uhum... — murmuro e dou de ombros. Não posso sentir culpa por estar preocupada e
tocando no assunto. — Como Travis está?
— Pior do que parece, mas Colen lhe deu uma dose de adrenalina. Por isso resistiu até aqui.
— Então... — Paro virando-me para ele.
— Sim, ele morreria se não tivéssemos chegado naquele momento.
Meus olhos enchem-se de lágrimas mais uma vez e Paolo segura meus ombros.
— Mas agora vamos cuidar dele. Não se preocupe.
— Acho que não consigo não me preocupar.
— Então seja forte e útil.
— Com o quê?
— Seja a mulher forte que é. Travis está em boas mãos e vão cuidar dele e de Dario.
Engulo em seco assentindo e entro na casa adjacente. Paro perto de Colen, que está na frente
da porta de um dos quartos.
— É Dario?
— Sim.
— E como ele está?
— Mal e... — Colen baixa a cabeça parecendo contar antes de completar: — tatuaram uma
Temhota.
Arregalo os olhos e olho para dentro do quarto quando pergunto:
— O símbolo dos prisioneiros da Bratva?
— Sim — Colen responde com repulsa e raiva.
Seguro a respiração voltando a encará-lo.
— Não tem como tirar?
— Eles queimaram a pele dele como se fosse um porco marcado. Poderíamos fazer uma
plástica, mas não aqui. O médico não tem recursos para isso aqui, apenas para tratamento.
— Mas... En-Então... — gaguejo e sinto muito ódio nesse momento.
— Sim, ele terá que conviver com ela até poder fazer uma tatuagem em cima da marca, que
não garantirá que suma. Está bem carimbada na pele dele.
Assinto e volto a olhar Dario na cama recebendo os tratamentos. Dio mio. Ele já é tão
complicado, avesso as leis e a ser um Homem de Honra. Tão turrão e fechado, imagina quando
souber disso. Quando ver que está marcado pela Bratva.
Colen se vira e com os passos brutos, pega o caminho de fora, deve ir para casa ver Marinne.
Queria impedi-lo, pois está sujo e coberto de sangue, porém ele precisa ver a pureza dela para
aliviar seu monstro, aliviar seu ódio contra a Bratva.
Olho para Paolo e ele cerra a mandíbula sem focar em mim ao falar:
— Sei o que está pensando sobre Dario. — Meneia a cabeça em concordância consigo
mesmo. — Ele precisará de tempo para saber o que essa marca o tornará. Temos que apenas esperar.
— Travis viu a marca?
— Não teve tempo.
— Dio mio — balbucio baixinho e vou para o quarto onde meu marido está sendo cuidado.
Sinto Paolo atrás de mim e digo em alto e bom som para ele: — O controle quando sentir que for
demais.
— Não posso prometer e você não viu o que ele fez hoje.
Franzo a testa e encaro-o.
— Ele estava com dor e mesmo assim fez Ivon pagar. O machucou na mesma moeda e deixou
que eu tivesse um gostinho. O que posso lhe prometer é que, dessa vez, quando eu pegar o traidor da
Famiglia, eu vá primeiro.
Meus olhos faíscam e concordo com um aceno.
— Não acha que eu não mereço um pouco também?
— Quer fazer isso agora? — Ele olha para a minha barriga.
— Muito mais agora.
Paolo meneia a cabeça de acordo e sem mais delongas, vira-se e vai embora.
Respiro fundo e entro no quarto, paro ao lado de Travis e aproveito quando o médico se
afasta para afagar os cabelos castanhos do meu rei negro. Meu Capo, meu cavaleiro das trevas.
— Erga-se, meu amor. Ainda temos um para visitar — sussurro em italiano, quase
inaudível, no seu ouvido. — Te amo.

Quando Travis está estável e quase recuperado, passo para ver Dario. Fico horrorizada com a
marca que fizeram nele. É quase do tamanho da palma da minha mão, bem na parte da frente do seu
antebraço. Sinto calafrios e um ódio mortal. Meus pensamentos são abomináveis. Ivon merecia uma
marca da Famiglia na sua cara a ferro quente também.
Converso um pouco com o médico para saber como eles estão e fico satisfeita por estarem
bem e recebendo tratamento com doses agressivas, pois é o jeito que precisa se lidar com tudo,
principalmente feridas. Rápido e eficaz. Não dá para perder tempo. Eu volto para a casa principal.
— Como estão meus irmãos?! — Assusto-me com a abordagem afoita de Marinne correndo
em minha direção vindo das escadas. — Me fala. Eu não posso ir lá.
Olho para ela vestida ainda com seu pijama rosa com margaridas e descalça, os cabelos lisos
soltos e bagunçados. Coitadinha. Ela tem olheiras e está abatida.
— Eu sei, querida. — Acaricio seu rosto. — Fique calma.
— Diga.
— Eles estão bem. Travis e Dario estão recebendo o tratamento e logo...
— E Colen?
Franzo a testa sem entender.
— Colen? O quê? Eu pensei que ele estivesse aqui.
— Eu não o vejo desde ontem. — Ela parece em choque. — Onde ele está? Cadê ele?
— Está seguro.
Giro meu corpo e encaro Luigi.
— Não se preocupe com Colen. Ele está seguro. Pediu para falar para não se preocuparem
com ele.
Assinto e viro-me para Marinne de volta. Toco seus ombros com carinho.
— Não fique nervosa. Todos estão bem agora.
— Não acredito. Nós nunca estamos bem.
— Garanto que estamos agora.
Seus lábios tremem com o prelúdio de seu choro e seus braços me rodeiam com força. Ela
deita a cabeça no meu colo e eu a acalmo afagando suas costas e beijando seus cabelos.
— Fique calma, mia cara.
Ela concorda baixinho e com toda paciência eu a levo para cima. Entramos no seu quarto e a
deito.
— Fica comigo.
— Tudo bem, mas depois preciso ir lá ver seus irmãos.
— Não te impediria nunca de fazer isso.
Sorrio com gratidão e deito-me do seu lado. Ela é apenas uma doce menina assustada que
precisa de colo e carinho. Parece ser tão esperta e forte às vezes, que se esquecem de que é uma
garotinha de quinze anos ainda. A minha cara menina dos olhos de oceano. Não consigo não ser para
ela o que gostaria de ter recebido e que ela merecia ter em toda sua vida. Dane-se! Eu estou aqui
agora para isso: lhe dar amor e carinho.
Acordo com um sobressalto e arregalo os olhos. Fito o teto do quarto, viro o rosto e vejo
Marinne em seu sono tranquilo. Suspirando, mexo-me com leveza e saio da cama.
— Uau! — Coloco a mão na boca sentindo um forte enjoo. — Minha nossa! — Saio correndo
do quarto dela e entro no meu indo direto para o banheiro vomitar.
Os enjoos estão me deixando esgotada. É a pior coisa de ficar grávida.
Engulo em seco, me levanto e lavo a boca antes de escovar os dentes. Passo uma água no
rosto, seco e finalmente dou descarga antes de sair do banheiro. No quarto vou até o closet e me
troco de roupa; coloco algo mais confortável e escolho um vestido solto e uma caxemira. A calça
jeans e a camisa estavam bem ruins.
Pronta, saio e desço as escadas com cuidado, mas com pressa. Vou direto para as portas do
quintal. Na porta da casa adjacente, respiro fundo. Vejo os dois médicos da Famiglia e a enfermeira
conversando, e vou falar com eles.
— Tudo bem?
— Oi, senhora. Como está?
— Não importa. Como estão Travis e Dario?
— Eles estão bem e o senhor Travis acordou.
Meu coração acelera de alegria e deixo-os para trás e corro para o quarto do meu marido.
Fecho a porta e, sem querer, isso o desperta. Ele abre os olhos e me encara.
— Oi — sussurro e fico ao lado da sua cama.
— Oi — diz rouco e cansado.
— Como está se sentindo?
— Não conta para ninguém.
Sorrio e pego sua mão ouvindo-o.
— Muito dolorido e cansado.
— Oh, amor. — Afago seu rosto e, quando penso em me afastar, ele agarra minha mão.
— Não. Fique mais perto.
— Travis...
— Vamos! Suba na cama.
Mordo o lábio inferior para prender o sorriso e mesmo achando errado, deito-me ao seu lado
tomado cuidado para não tocar suas feridas e machucá-lo mais ainda. E solto o sorriso quando seu
braço atrás de mim me puxa para ficar colada ao seu corpo e deito minha cabeça no seu ombro sem
curativo, o outro o ferimento deve ter sido grande. Passo de leve os dedos no seu peito e suspiro.
— Nunca mais faça isso — murmuro e fecho os olhos.
— O quê?
— Se fazer de isca! Quase cometer um suicídio.
— O objetivo não era morrer.
Inclino a cabeça e abro os olhos para fitar seu rosto.
— Você não podia ter tanta garantia assim, Travis. Foi um risco do caralho o seu plano.
Poderia ter morrido sim.
Ele engole com dificuldade e seus olhos encontram os meus.
— Eu sei e... Me desculpe.
— Está falando de coração ou são só apenas palavras?
— O fato de eu não querer fazer de novo é de coração ou da boca pra fora?
Rio baixinho e me aconchego nele.
— De coração. — Volto a fechar os olhos.
— Ótimo — diz parecendo calmo.
Eu respiro seu cheiro, sinto seu calor, ouço os batimentos do seu coração e estou
incrivelmente agradecida por ele estar aqui de volta. Solto um suspiro relaxante, porque é muito
gostoso a mão dele subindo e descendo nas minhas costas, mesmo que muito devagar.
— Você parece em paz — falo com um sorriso.
— O que significa paz em um mundo de sombras?
— Eu não sei. — Dou de ombros. — Mas eu sei que me sinto diferente.
— Diferente?
— Não sei dizer o quê exatamente.
— Talvez seja porque você está ficando poderosa. Você é a esposa do Capo.
Isso me desperta uma gargalhada e lhe dou mil beijos no peito. Quando paro de rir, digo
baixinho:
— Acho que tem mais a ver com o fato de eu amar demais um homem e estar prestes a ser
mãe. Isso me mudou muito.
Travis faz que sim com a garganta e sinto-o balançar a cabeça. Ficamos em silêncio e
aproveito seu carinho apenas. Sua pulsação está lenta e suave igual seus dedos passando em minhas
curvas. Estou com meus olhos fechados e curtindo ele.
— Sabe... — ele começa, murmurando — estava pensando que você sempre foi minha
mulher.
— Em que sentido?
— No sentido de que, de algum jeito, eu sempre tivesse a noção de que você era minha toda.
Minha só.
Sorrio, abro olhos e fito seu rosto, na verdade apenas o queixo. Ele parece distraído ao falar.
— Sim, eu sou só sua.
Travis assente e baixa os olhos para mim.
— Sim e quero que saiba que sinto muito pelo que fiz com você.
— O quê?
— Quando eu tirei sua virgindade, não fui muito delicado.
— Ah, Travis, já passou. Parece que tem muito tempo.
— Uns sete meses.
— É — digo rindo — e provavelmente a gente já fez tanto sexo que eu não tenho problema
mais com isso. Esquece, e sabe, não doeu tanto. Acredite em mim, eu lembro perfeitamente e o pior
foi me acostumar com seu tamanho todo.
— Assim você me deixa muito orgulhoso.
Solto uma gargalhada e... Minha nossa, eu gosto tanto da gente assim: descontraídos,
aconchegados e parecendo apaixonados. Eu sei que eu estou!
Ergo meu corpo com a ajuda dos cotovelos e dou um beijo na sua boca de leve.
— Eu te amo muito e... Sei lá essa conversa, você fazendo carinho, a gente nessa cama aqui
aliviados... é maravilhoso. Quase um Paraíso.
Travis fita-me no fundo dos olhos, afaga minhas costas e a forma que seus olhos brilham faz
meu peito inflar de pura ternura.
— Madeleine, eu tenho uma coisa para te falar. Na verdade, algumas coisas...
— Tudo bem — falo me sentindo ansiosa e infelizmente sonolenta também.
— Dorme, a gente conversa depois.
— Tudo bem, amor.
— Tudo bem — ele repete e faz carinho em mim.
— Meu Deus, eu amo tanto ficar aqui nos seus braços.
— Eu também aprecio demais estar aqui de volta, com você nos meus braços.
Rio baixinho e abro os olhos para ver o seu rosto. Ele parece distante em seus pensamentos.
— Teve um momento, quando eu estava lá, que — começa do nada a falar — eles estavam
demorando muito, então pensei que tinha errado no meu plano. Meu corpo não estava mais
aguentando, eu não conseguia mais suprir as pancadas.
Engulo em seco e acaricio seu peito protetoramente.
— Eu sentia a morte chegando. Estava muito ruim e sabia disso.
Meus olhos se enchem de lágrimas escutando-o.
— Num momento eu fechei os olhos, pensei em você e lembrei que não disse o quanto é
importante para mim. Não com as palavras certas. Que fui lá porque não posso suportar a ideia de
alguém pôr as mãos em você, que alguém tenha pensamentos de que pode comprar e fazer coisas
ruins contra a minha mulher. — A força que faz para dizer isso faz seu corpo tremer. — Fui lá para
defender a mulher que você é. — Respira fundo. — Mas então eu estava quase morrendo e me
lembrei de que nunca disse que te amava. Foi uma merda.
Mexo-me na cama e fico sentada de um jeito que posso encará-lo e finalmente meus olhos
derramam as lágrimas. Travis segura minhas mãos.
— Está falando sério isso? — pergunto trêmula de emoção.
— Que eu te amo?
Assinto engolindo as lágrimas.
— Sim. É a mais pura verdade e acho que desde o momento que você disse que não queria
mais nada comigo. Que tudo tinha acabado. — Respira fazendo um esforço hercúleo. — E quando
matei aqueles mexicanos... Estava com raiva de admitir que alguém tinha domínio sobre mim, tanto
que meu poder não significava nada. Eu não podia admitir que você tinha domínio sobre mim, não
quando nunca aconteceu em toda a minha vida. Nem meu pai teve qualquer influência sobre mim.
— Travis...
Ele se senta, mas eu ajudo porque vejo como está fraco e sentindo dores. Então, ele pega meu
rosto entre suas mãos e recebo um beijo suave nos lábios.
— E agora eu precisava voltar para você e dizer o que realmente significa para mim.
Precisava voltar para a minha família. Pra você e para ele ou ela. — Toca a minha barriga e, como
um milagre, nosso bebê se mexe dentro de mim pela primeira vez, Travis sorri com os olhos
brilhando. — Você é minha maior e mais arriscada aposta nessa vida. Eu fui para salvá-la e, no fim,
fui salvo também. Salvo de viver uma vida apenas nas trevas, Madeleine. Porque, com você, eu tenho
um pouco de luz.
Engulo em seco e estou sem palavras. A única coisa que faço é abraçá-lo com tudo de mim e
chorar, desabafar a angústia de quase ter perdido o amor da minha vida. O primeiro e único amor da
minha vida. O homem que me ensinou a ser forte, responsável, a crescer como mulher, como mãe e
ser sua esposa. Travis não me subjugou apenas como uma mulher, como a esposa de um homem
poderoso, ele me deu poderes também e por tudo isso, eu o idolatro com todo meu coração.
— Eu vou te amar por toda a minha vida, Travis Lozartan — digo no seu ouvido e afasto-me
para fitar seus olhos, esses olhos azuis que me capturam todas as vezes. — Vou ser fiel, leal e sua
fortaleza. Obrigada por lutar por mim. — Meus lábios tremem. — Por ser meu, por me escolher e me
proteger. E eu não te domino... e hoje vejo que você também não me domina. Nós nos completamos e
somos dominadores de tudo e de todos que nos pertencem, até o nosso amor.
Ele suga a respiração com força e cerra a mandíbula. Vejo toda sua vitalidade refletir em seu
rosto.
— Você nasceu pra ser minha, Madeleine Lozartan. Nasceu para ser uma Lozartan e sim, nós
dominamos tudo e todos através do ódio e do amor. Hoje, eu sei que os sentimentos não me deixaram
fraco, mas ainda mais perigoso. Eu vou queimar, quebrar, destruir e torturar qualquer um que tentar
chegar perto de você e do nosso filho.
Concordo com um aceno e selo nosso compromisso e devoção com um beijo profundo. Eu sei
que estou protegida entre as sombras dos pecados da Famiglia, mas também pela força de um homem
que cresceu sem aprender a amar e, mesmo assim, se dedicou aos irmãos e agora aprendeu a se abrir
e me amar. Eu tenho tudo que preciso para estar e viver onde estou. Entre eles e ser a rainha de Las
Vegas ao lado do meu rei cruel.
O nosso beijo fica mais cruel e eufórico, quase animalesco. E preciso me afastar para não
perder a cabeça.
— Não podemos — digo recuando da sua mão forte que me puxa para ele.
— Você não quer?
— É claro que sim, mas você não está se aguentando nem deitado, amor. Imagina transar?
Travis me presenteia com seu sorriso de lado.
— Pode apostar que estou imaginando.
Rio e faço carinho no seu rosto.
— Não seja teimoso. Deita, se recupere e depois nós podemos fazer quanto sexo puder.
— Eu sou um homem que gosto de cobrar, e com juros.
Mordo a boca sorrindo e lhe dou um beijo rápido.
— Pode cobrar que eu lembro também das minhas dívidas.
Como se fosse um bom ouvinte, ele volta a se acomodar deitado na cama, mas me pega de
surpresa puxando de encontro ao seu corpo e enfiando a mão dentro do meu vestido, assim que o
levanta.
— Travis... — advirto-o.
— Calma. Eu só estou sentindo seu corpo. — Olha nos meus olhos e ergue a sobrancelha. —
Não vou avançar o sinal, mas os pneus estão na faixa.
Solto uma gargalhada alta, pego sua mão e beijo todos os seus dedos.
— Amo o seu jeito de falar por enigmas.
— É bom para despistar os bisbilhoteiros que escutam a conversa dos outros ou não pode
entender o que falo.
— Uma boa tática.
Ele assente antes de dizer:
— Eu sei um ou dois truques básicos de pôquer.
— E ainda não me ensinou.
— Não quero que fique mais malandra do que é, mi angele. Você já sabe muita coisa.
— Eu gosto de saber de tudo.
— E eu adoro que seja assim. Se pudesse seria minha conselheira.
— Mas eu sou — afirmo veementemente.
Travis assente em silêncio e fecha os olhos.
— Certo. Agora vamos descansar. A minha Consigliere mandou eu me curar rápido para eu
transar com minha esposa.
Rio alto e, caramba, eu amo tanto ele assim, assim como a minha vida. É tudo bom demais.
— Você tem certeza de que já está recuperado? Que consegue fazer isso?
Respiro fundo e dou uma olhada atravessada ao meu Consigliere. Eu sei que Paolo está
apenas fazendo seu trabalho de cuidar da minha retaguarda. E depois de quase dois anos fazendo o
papel de meu braço direito, hoje eu confio nele. Não absolutamente. Nunca se deve confiar em
ninguém inteiramente.
O ser humano é falho no quesito honestidade e confiança. Por pouco ou por muito, se vendem,
se corrompem. Quem não faz – sinceramente – são pessoas que nunca cruzaram meu caminho, até
Madeleine é claro. Minha esposa é uma raridade e eu sei disso. As pessoas falham, erram, mas
poucas reconhecem e se absolvem.
— Todos já estão avisados e meu avô sabe que meu prazo nunca é longo. — Levanto-me da
minha cadeira no escritório de casa e ando até a janela. Olho para Madeleine brincando com os
cachorros e pegando sol. — Não posso deixar que ele pense que pode escapar ou até mesmo fugir.
— Viro-me para Paolo. — Sabemos que sempre há lugares de refúgio na Sicília e eu não quero dar a
mínima noção de que ele possa fazer. Senão eu vou entrar em guerra diretamente com o Boss da Cosa
Nostra, e não vou vencer. Sabemos disso.
— Sei disso tudo, porém também sei que você ficou muito machucado. Não finja que, quando
se levantou agora, não sentiu dor.
— A dor física pode ser alterada e relaxada com remédios. Se algo acontecer a minha
esposa, meu filho e meus irmãos, nada irá fazer melhorar. — Faço uma pausa. — Você sabe disso
como eu.
— E por isso que estou pedindo permissão para ir até ele, não você. — Ele levanta e se
aproxima com a postura ríspida. — Você pode acompanhar, mas não quero que faça esforço. Ainda
não está cem por cento.
— Não estou o caralho! — esbravejo perdendo a paciência. — Você e Madeleine me
deixaram de molho naquela cama por mais de dois meses e dentro desse escritório há um mês. Que
porra! Já se passaram quase quatro meses desde que matei Ivon. O que acha que aquele filho da puta
está pensando? Que eu não sei? Que eu o perdoei?
— Claro que não.
— Pois bem. Com certeza ele está armando uma para mim e, merda, eu não posso deixar
nada acontecer a nenhum de nós agora. Nunca com a minha família.
— E eu não posso deixar que nada aconteça com todos nós e exclusivamente com você.
— Paolo — fico cara a cara com ele —, quer me ajudar?
— Claro que sim.
— Então me prepare os melhores homens, arme a melhor estratégia e continue de olho no
desgraçado. Eu não vou mudar de planos sobre ir até ele nesse fim de semana.
— Eu nem ousaria em lhe dar esse conselho.
Coloco a mão no seu ombro.
— Não se preocupe. Eu vou deixar você apertar o gatilho. Você dar fim a ele, mas não deixar
de ir. De fazê-lo ver a minha cara como a última coisa que viu antes de ir para o inferno. Iremos
comemorar o 4 de Julho com sangue ao invés de fogos.
Nos olhos do meu Consigliere vejo a mesma mancha de sangue. Do pecado. Da vingança. Ele
me dá um aceno, se vira e sai do escritório deixando-me com meus pensamentos.
Não estou apenas preocupado em aniquilar a última cabeça dessa armadilha. Também estou
tentando ver os danos do que aconteceu com Dario. Meu irmão está quebrado de alguma forma e
jamais pensei que iria dizer isso, ver isto. Sempre tive que ter mais paciência e cuidado com ele, até
mais do que Marinne. Ela tem a força Lozartan em todo o seu ser, mas Dario nasceu com falhas que
não sei reconhecer. Piedade em nosso mundo é uma rachadura em nossa brutalidade. Agora, além
dela, preciso lidar com uma marca.
Preciso lidar também com as escolhas de Luca e Solo. Suas ações assustam algumas famílias
entre nós. Nem todos entendem que precisamos de executores.
Paolo tem a sede de vingança em suas entranhas e permitir que ele finalize tudo não é apenas
para ele tentar exorcizar essa sede como também ganhar por completo sua lealdade e honra. Eu
preciso que ele entenda que podemos trabalhar um com o outro para fazer da Lawless colossal como
nunca.
Para completar tem Colen, que libertou a filha de Ivon (que descobri que está perambulando
pela cidade sem paradeiro ainda e trabalhando como dá), e em seguida foi para Nova York sem dizer
nada para ninguém. Não que ele não saiba que eu sempre sei onde todos estão.
Pegando a bengala que me dá apoio para andar, saio do escritório e vou na direção das
portas francesas que dão para o jardim. Indo pelo caminho de pedras vejo Madeleine afagando a
barriga de grávida, sorrindo e distraída, olhando para o nada. Algo dentro de mim se acalma, meu
monstro se contém em ver sua beleza pura. Ela suspira e, quando estou a alguns passos dela, se vira e
abre um sorriso para mim.
— Oi — murmura ficando do meu lado, enlaçando nossos braços. — Como está se sentindo?
— Eu que sempre pergunto isso — digo olhando em seus olhos.
Ela ri e deita a cabeça no meu ombro. Começamos a caminhar para o gramado enquanto
conversamos.
— Me responde primeiro que eu respondo depois.
— Certo — falo vencido por sua tenacidade. — Eu estou bem e você?
— Nós estamos ótimos.
Sinto o riso e a alegria em sua voz. Olho para ela ao meu lado, tão calma e delicada, e paro
de andar. Viro-me para ela e coloco a mão na sua barriga.
— Já está tão grande.
— É — diz cheia de amor pondo a mão sobre a minha, e nosso bebê se mexe. — Uau! —
Arregala os olhos para mim toda feliz.
— Se mexe tanto.
— Mais quando estou perto de você.
Fico surpreso em ouvir isso, levanto sua mão e dou um beijo.
Não tenho certezas sobre nosso filho. Como será, se vai ser forte e impiedoso, se irá me
respeitar ou temer. Sei que precisarei como meu herdeiro. Mas minha única certeza é de que será
muito bem criado por sua mãe que o amará muito e com certeza ele a ela. Mas se irá sentir o mesmo
por mim... Duvido.
— Ele vai gostar de você — Madeleine comenta e ergo meus olhos para os seus. — Vai amá-
lo e idolatrá-lo como eu e seus irmãos.
— Como sabe que estou pensando isso?
— Eu te conheço, Travis. Mais do que você possa imaginar e sei que duvida que será um
bom pai e que nosso filho tenha além de temor e respeito por você. — Pega minha mão e deixa no
seu rosto, deitando a cabeça de leve. — Ele irá amá-lo, pois saberá que a mãe dele é bem cuidada,
adorada e respeitada por um homem que todos temem. Que dentro de casa nós somos uma família
comum.
— Não temos nada de comum.
Ela sorri e assente.
— Seremos o mais normal possível diante do que somos. Eu quero que dentro de casa
sejamos uma família unida e que tenhamos amor e respeito. Todos os nossos filhos aprenderão a
sentir e que emoções não nos tornam fracos e sim mais sensíveis uns aos outros. Não quero que
nossos meninos tenham misericórdia com nossos inimigos, mas com os inocentes. Que respeite a
hierarquia e as mulheres. Que dê valor e honra à família e ao sangue.
— Não poderia pensar palavras diferentes.
Ela balança a cabeça com um sorriso tranquilo e beijo sua testa. Afastando-me, franzo a testa
e pergunto:
— Filhos? Meninos? Tem mais de um aí e eu não estou sabendo?
Madeleine dá uma gargalhada.
— Não. Aqui só tem um, mas eu não quero apenas ele ou ela.
— Tudo bem — digo assentindo. — Mas eu acho que é um menino.
— Veremos... — cantarola.
Voltamos a caminhar pelo gramado indo até a quadra de tênis, paramos para ver o pôr do sol
porque minha esposa é toda sentimental e depois vamos para dentro de casa.
— Estou com fome.
Rio e a levo para a sala de jantar.
— Fique aqui. Vou pedir algo para nós comermos.
Ela assente e eu vou rápido na cozinha pedir a Rosália que prepare um lanche para nós, que
prefere servir logo o jantar. Com uma bandeja com suco de limão e dois copos com gelo, volto para
a minha esposa faminta. Ela está extremamente linda grávida e mesmo sendo difícil caminhar sem a
bengala, gosto de mimá-la.
— Travis! Você não pode andar sem apoio, amor. — Ela se levanta e corre para tirar a
bandeja da minha mão e deixar na mesa. — Senta. Vou pegar sua bengala.
— Não precisa, senhora. Eu trouxe — diz Marie Rose.
— Obrigada.
— Não há de que. — E logo ela volta para a cozinha. Volto minha atenção para minha esposa
e é a minha vez de repreender. — Você não pode correr assim.
— Não me estressa com isso.
Tenho vontade de rir porque ela falou isso nos meses que estou de repouso em casa. Acredito
que dei uns cabelos brancos para ela e Paolo. Rosália também ficou no meu pé.
Colocando as mãos nas costas, Madeleine senta-se na cadeira ao meu lado. Ela já está de
sete meses e mesmo assim são poucas vezes que a vejo tão desconfortável. Ela parece ter nascido
para ser mãe. Digo isso também pela forma que trata Marinne. Pensando nela...
— Onde está Marinne?
— Está no quarto dela.
— Ela está bem?
— Sim — responde de cabeça baixa e bebe um pouco do suco.
— Tem certeza?
— Sim, Travis. Sua irmã está ótima, porém com cólica e quer ficar deitada.
— Ah... — murmuro. Às vezes, me esqueço de que minha pequena não é mais tão pequena.
— Quando você pretende visitar seu avô? — Madeleine pergunta do nada.
Franzo a testa.
— Podemos falar disso depois?
— O depois é agora, porque quando acordamos hoje e ontem no jantar, você disse que
falaria depois. Resolvi que o depois é agora.
Arfo com força e conto o que falei com Paolo para ela.
— E você não pretendia me falar que vai viajar esse fim de semana com sua esposa grávida e
você recém-saído de um quase coma?!
— Não exagere.
— Eu não estou exagerando! — Levanta-se da cadeira e bate no vidro da mesa. — No
terceiro dia, você acabou piorando e precisou ser sedado e eu tive que velar sua cama por quinze
dias com você desacordado. Não fala que estou exagerando, Travis! Só eu sei o que passei.
Embora eu não seja assim, puxo-a para o meu colo e tento acalmá-la. Afago suas costas e
seguro sua mão.
— Eu sei disso, me desculpe, mas já me sinto bem e preciso ir até Carson City.
— Sei disso, Travis — fala mais calma. — Mas queria que você tivesse me falado antes,
conversado comigo, porque eu preciso me preparar.
— O quê? — Franzo a testa e depois fico bem sério. — O que você está dizendo?
— Que eu vou junto.
— Nem por cima do meu cadáver.
— Não precisa tanto e eu jamais iria querer que fosse assim. — Sua resposta afiada vem
cheia de ironia.
Dou um aperto na sua bunda e cerro os olhos fingindo estar puto, mas ela apenas ri.
— Eu nunca reclamei por você ser essa força da natureza bruta e determinada. Eu nunca fiz
nada que fosse ao contrário do que apoiar esse seu lado, mas dessa vez eu tenho preocupações sobre
você ir junto.
— Por que estou grávida?
— Porque nós iremos entrar na casa dele com armas até os dentes. Porque ele tem bons
soldados e a filha dele é uma atiradora nata. Ele a treinou para ser sua franco-atiradora e proteger
sua retaguarda como um cão feroz.
— Não deveria ser ao contrário?
Respiro fundo e penso na melhor forma de dizer o que preciso.
— Seus pais foram negligentes, os meus carrascos, mas existe o terceiro tipo de pais filhos
da puta na Famiglia. O que usa sua “criação” como benfeitoria. Como algo a ser usado para ele, já
que foi feito por ele. Um filho como prêmio a ser usado. Posso dizer que meu pai e muitos Capos
pensam nos filhos como apenas sangue e linhagem. Um poder a ser possuído para sempre.
Madeleine fica lívida e desvia o olhar, e no reflexo acaricia sua barriga.
— Eu preciso ir, Travis — diz baixinho e me encara. — Deixa o caminho limpo para mim e
só me coloque onde eu quero ir quando for seguro para nós. — Afaga a barriga indicando nosso filho
também. — Mas não me faça ficar aqui e esperar a cabeça dele numa bandeja. Eu não pude fazer
nada contra Ivon e Yuri. Tive que ficar em casa e, ainda por cima, esperar que você não morresse. —
Engole em seco e sai de cima do meu colo. Respira profundamente e vira o corpo para mim, o rosto
marcado pela preocupação, proteção e raiva. — Me leve. Apenas me leve.
Levanto-me, ando até ela e ponho os dedos em seu queixo, erguendo sua cabeça. Fixo meus
olhos nos dela e, que merda, não consigo negar esse pedido a ela. Eu ficaria muito puto se fizessem
comigo.
— Me prometa que irá obedecer e esperar minha ordem...
Nem consigo terminar, ela se agarra a mim e dá vários beijos no meu rosto.
— Você é o melhor marido do mundo.
Deslizo minhas mãos por sua cintura, agora larga, e lhe dou um beijo na boca. Quando foi que
eu pensei que iria ceder a alguém. Que alguém teria a capacidade de me persuadir a fazer algo,
mesmo eu não querendo.
Meus olhos estão vidrados na cabeça de Luca, que dirige. Depois do último plano que quase
deu errado, fica difícil não estar nervoso principalmente quando trouxe minha mulher junto.
A chuva cai sobre Carson City torrencial e deixa o clima mais pesado, e as atenções
redobradas. O céu está muito escuro para as dez da noite e num bairro de classe alta, não deveria ter
um aspecto tão tenebroso.
Os três carros param em frente aos portões da casa e checo meu celular. Meu avô já está
informado do meu paradeiro (desde a hora que pisei na cidade) e espero que seguro, pois aquele
filho da puta não irá medir suas ações. Provavelmente ele espera minha visita mais do que as
crianças o Papai Noel na noite de Natal.
Saio do carro em seguida de Luca e Paolo. Deixei Enzo em Las Vegas tomando conta. Sabia
que não podia deixar meu Consigliere, pois ele precisa estar aqui, assim como Madeleine. Olho
para dentro do carro e a vejo ajeitando o sobretudo com a gola parecendo que tem um urso de
pelúcia. Ela parece confortável e tranquila, não detecto medo em seus olhos azuis agora tão acesos
me encarando.
— Me espere aqui com Pietro. Não saia sem que eu possa garantir sua segurança.
Ela assente antes de dizer:
— Libere o caminho para mim que eu entro.
Aceno com a cabeça, dou um olhar penetrante para Pietro, agora no banco do motorista, e
fecho a porta. Já começando a ficar encharcado, viro-me para onde está Paolo e Luca conversando
com os soldados. Somos treze, quatorze com Madeleine.
— Paolo irá na frente e depois eu. Vocês seguem — digo quando paro entre eles. — As regras
são minhas. Traição não há perdão, nem saída. Faço-os implorar. Faço-os sangrar.
Todos acenam que sim e espero meu braço direito passar por mim e vou atrás. A água da
chuva atrapalha um pouco a visão e fico totalmente ligado aos lados da casa. Luca, como sempre,
passa à frente e abre os portões. Paolo entra e golpeia um soldado de prontidão, vejo mais um e faço
o mesmo.
— Não façam barulho — advirto.
Paolo vira a guarita de vigília e corre para a varanda da casa. Meus olhos seguem para onde
estão indo dois dos meus soldados e observo-os pegando dois do inimigo. Eles os matam à facada e
repousam no chão. Deixá-los cair não seria uma boa estratégia.
Volto minha atenção para a porta principal quando ela se abre. Uma morena de cabelos
compridos e vestido preto até os pés, com uma fenda na perna, aparece. Ela encara todo o cenário,
torce a feição para Paolo e sorri para mim nitidamente furiosa.
— Sabia que não ia demorar você aparecer aqui.
Baixo minha arma, apenas figurativamente, pois não irei dar mole para ela.
— Luciana, que prazer em vê-la — falo sarcasticamente.
— Para mim é nenhum — responde com a voz rouca. — Embora eu vá divertir com certeza.
Como esperado de uma traidora, ela ergue suas pistolas e dispara sem alvo certo. Abaixo-
me, escorando na parede e dou alguns disparos revezando com Álvaro.
— Ela é muito boa.
— Uma franco — comento.
— O que vamos fazer?
— Deixar que ela acabe com suas balas.
— E depois?
Sorrio de lado e olho nos olhos dele ao falar:
— Luca ataca.
— Hum... é claro.
Luca é sempre minha carta na manga quando duelamos com um calibre como Luciana. Ele é
ótimo com armas, uma fera com as facas, mas com os punhos um monstro indomável. Com certeza,
ela vai ser enterrada desfigurada e ao lado do pai.
Álvaro levanta e avança no homem que vem correndo em nossa direção. Eu me levanto e dou
dois tiros no outro e, como estou ocupado assim, dou um golpe de Jiu-jitsu, dando uma chave de
perna nele e quatro balas na cabeça quando caímos no chão. Esquivo-me na pilastra e corro até a
porta da casa. Luciana está atirando em Paolo quando suas balas acabam. Ela faz um som de braveza
jogando as armas no chão e vem para me atacar.
O plano muda completamente sobre Luca lutar com ela, pois no momento que atinge meu
rosto e depois minhas costelas, ainda doloridas, a raiva é tudo que resta e avanço nela. Mesmo sendo
uma mulher e eu não sou de atacar mulheres, ela é um soldado e por isso não meço meus socos.
Luciana é forte e foi bem treinada em artes marciais, sei todo seu histórico. Ela era uma lenda
entre as meninas da Famiglia, mesmo assim não é páreo para mim. Eu sou muito mais forte, maior e
pesado. Segurando-a pelo vestido, arrasto-a para a parede e começo a dar socos no estômago, rosto
e braços. Ela me chuta, nem sempre com eficácia, e me arranha.
Duelamos por alguns minutos. Vamos parar no chão e partimos para o MMA. Dou uma
tesoura, prendendo seus braços e pernas, enquanto soco sua cara. Vejo o sangue explodir em seu
nariz e o olho arroxeado. Suas forças estão acabando e eu tenho mais um pouco para finalizar
enforcando-a com uma chave de braço.
— O papai já vai te ver no inferno — falo minhas últimas palavras antes dela suspirar e ficar
mole sob meu domínio.
Respiro fundo, olho em volta e me levanto chutando seu corpo morto para longe dos meus
pés.
— Paolo? — indago para Evandro.
— Lá dentro, senhor.
Dou um aceno e entro na casa, que está silenciosa demais. Sigo as pisadas manchadas de
lama e sangue. Encontro Paolo com a arma na mão apontada para a testa de Lucian Cardozo. O
Consigliere do meu avô. Esse era o alto comando que nos traía e sabia de tudo. Bene, não de tudo.
Ele pode sim ter nos manipulado por anos, tentando vender a cabeça do meu avô,
encomendado a morte do meu pai com a Diabolos, se aliado a Bratva e acobertado Edgar, mas ele
não esperava por mim e meus homens. Sua ganância pelo lugar de Boss o levou para esta noite. Uma
morte lenta e dolorosa.
— Olá, Lucian.
— Travis — diz e cospe o sangue.
Os lábios dele estão arrebentados e sangrando, mas o sangue deve ser uma hemorragia
interna de tanto soco. Os olhos de Luca me dizem que, enquanto eu acabava com Luciana, ele estava
aqui se divertindo com o papai dela.
— Parece que estava esperando minha visita.
— Na verdade, eu estava esperando o comunicado do velório, mas não tem como confiar
nesses russos idiotas.
— E por acaso você está em vantagem agora? Parece que você também é um idiota.
Lucian solta uma gargalhada alta, no entanto fraca e tosse parando.
— Eu consegui muita coisa antes de você descobrir que fui eu.
Tirando uma faca de trás do coldre preso em meu peito, pego sua mão e enfio a lâmina em
seus dedos. Vejo o indicador e o anelar caírem no chão. Ele solta um grito estridente e sacode os pés.
— Seu filho da puta lunático.
Rio e cerro os olhos.
— É apenas a prova da sua morte. — Recuo, me afastando, e viro-me para Paolo.
Meu conselheiro, um verdadeiro braço direito, vai até o merda do ex-conselheiro do meu avô
e com as mãos enfaixadas com fita vermelha de boxe para acomodar o soco inglês de aço entre os
dedos. Paolo acerta um golpe duro e seco no queixo de Lucian, que faz a cabeça dele ir para trás e
Luca segura a cadeira para ele não cair.
Paolo é muito bom em bloquear seu lado civilizado quando está em combate. Ele sabe como
achar os lugares mais dolorosos e saciar sua sede de gritos, sofrimentos e sangue. Sabe levar o
torturado até as últimas antes do golpe final. E ele sabe que essa tarefa está entregue para Madeleine.
Dessa vez, ela será a faca vagarosa que levará um traidor ao inferno.
Espero que nunca mais seja ela. Não por achar que não deve, que não pode, ou é fraca ou é
menos digna desse poder, mas porque ela apenas está fazendo isso porque é pessoal. Eu não quero
ela entre minhas lutas e sendo alvo. Minha obrigação é cuidar e defendê-la das trevas do submundo
da Famiglia. Dar a ela noites de sono tranquilas e sonhos quando fecha os olhos. Não quero que ela
se torne oca como eu preciso ser.
Desligo a ligação e enfio o aparelho no bolso do casaco. Precisava falar com Enzo para saber
como tudo está em Las Vegas.
Saindo da casa, ando até os carros e vou até o que está minha mulher. Pietro sai, dá a volta no
veículo e para na minha frente.
— Ela está muito ansiosa, mas chegou a dormir.
Meu peito incha de preocupação. Ela está de sete meses e se queixa muito com desconforto
para andar, dormir e se sentar. Eu vou furar meus olhos se acontecer algo com ela, porra.
— Ela está acordada?
— Não.
Respiro fundo, exasperado, e abro a porta do carro. Ela nem se mexe quando me sento no
banco e tiro o cabelo da frente do seu rosto.
— Mi angele — sussurro.
Madeleine suspira, o peito sobe e desce, e encolhe-se abrindo os olhos lentamente.
— Ah... Você já acabou — reclama.
Sem conseguir controlar, rio e nego com a cabeça. Dou um beijo na sua boca.
— Não, eu vim de buscar, minha rainha.
Ela abre um sorriso satisfeito e ajeita minha gola sem necessidade.
— Por isso que eu te amo.
— Por eu deixar você matar alguém?
— Não, seu bobo — diz me beijando. — Por você me respeitar dessa forma. Por fazer
minhas vontades.
— Que seja a primeira.
Ela inspira com força e concorda.
— Eu prometo não te pedir mais para fazer algo assim. Dessa vez é porque ele mexeu
diretamente comigo e quase matou o amor da minha vida. Ele tem que pagar.
Seguro seu rosto e beijo-a de língua, saboreando seu gosto e sons. Merda. Ela me tem
aprisionado em seus olhos. Maledetta.
— Vamos lá.
Saio do carro e a ajudo a sair. Meu corpo se arrepia vendo-a de cima a baixo e a barriga
enorme. Tento esconder com o sobretudo e faço-a ir na frente, entre mim e Pietro. Ergo minha arma e
caminho em alerta total. Chegamos no pátio e vejo Álvaro parado na porta. Ele chega até nós e ajuda
a proteger Madeleine.
Finalmente entramos na casa e posso ficar mais tranquilo. Deixo que ela passe na frente.
— Onde eles estão? — pergunto quando vejo a cadeira vazia e nada de Paolo.
— Estão na piscina.
Franzo a testa, mas sigo o caminho das portas duplas de vidro. Ergo a sobrancelha com a
imagem de Paolo de pé e Lucian amarrado com uma corrente de ferro, chegando mais perto vejo a
bola de aço no final da corrente.
Madeleine para perto de Paolo e encara o traidor. Lucian está todo ensanguentado, quase
irreconhecível. As mãos e pés amarrados para trás juntos. Ele geme baixo em completa agonia.
Poderíamos prolongar mais essa noite, eu adoraria, e não farei porque preciso colocar minha esposa
em segurança dentro da nossa casa. Ou do avião, que é para onde vamos quando sair daqui.
Viro-me para Madeleine, que respira fundo vendo todo o conjunto de detalhes da ação de
Paolo. Nem precisa explicar o que tem que fazer como golpe final.
— Quer ajuda? — pergunto ficando ao lado dela.
— Não — responde sem desviar o foco de Lucian, que ergue a cabeça e sorri para ela.
— Ele vai mesmo deixar você fazer o serviço sujo?
Sem esperar vejo-a chutá-lo nas bolas e na boca do estômago.
Ele tosse sangue e fala com muita dificuldade:
— Sua vadia.
Com a fúria percorrendo, vou para cima, mas sua mão voa para o meu peito me detendo ao
mesmo tempo que fala raivosa:
— Deve estar me confundindo com as suas putas.
— Você é abusada.
— E você é um homem morto. — Assim que a sentença sai da sua boca, ela ajeita o salto da
sua bota vermelha na bola de ferro e com maestria chuta para a piscina funda.
A bola afunda imediatamente, livre e pesada. A corrente que tem Lucian aprisionado corre
solta até que o puxa com um movimento único. Vejo-o afundar e começar a se afogar.
Viro-me para a minha esposa e seu rosto está neutro, sem expressão. Não está pesarosa ou
arrependida. Não parece ter um pensamento de estar fazendo algo extremamente errado.
Orgulhoso e aliviado por não precisar cuidar do seu sono também, entrelaço meus dedos com
os seus e encaro nosso inimigo tomar seu último fôlego.
Eu não esperava encontrar uma esposa à minha altura. Não contava que a garota que anos
atrás salvou a minha Famiglia fosse se tornar parte da minha família, que me daria uma família. Não
estava nos planos me apaixonar por minha esposa e muito menos fazer dela minha aliada. E eu sei
com toda certeza que Las Vegas, enquanto nós vivermos, será temida não apenas por mim.
Quero que todos saibam que minha esposa pode ser a Capo, pode sentar onde me sento e
tomar a decisão que precisar se for necessário. Ela é meus braços, olhos e boca. Não porque eu sou
um cego apaixonado, mas porque conheço Madeleine Lozartan.
Agosto de 2012

Posso dizer que depois de tudo que aconteceu, todo o drama, preocupação e vingança, os dias se
acalmaram como se fosse uma forte tempestade. Eu mesma não sinto como se tivesse feito algo
pessoalmente. Na verdade, não ligo pelo que fiz. Agora o céu está aberto e com um lindo arco-íris.
Hoje faz um mês desde que visitamos Carson City e eliminamos o Consigliere de Vincenzo.
Faz trinta dias que a Lawless tem dias de tranquilidade e o seu Capo, meu marido, tem como a maior
preocupação quando vou dar à luz. Ele não consegue relaxar.
Bene, ele tem outras preocupações, mas colocou as cartas na mesa ontem numa reunião com
todos os soldados, capitães, Underboss e seu Consigliere. Todos estão cientes de que agora Travis
detém o seu poder na altura do seu avô. Após tamanha traição, Vincenzo pediu para o neto cuidar de
tudo e só tê-lo como conselheiro. Ele ainda é o Boss, mas não manda mais em nada.
Os mexicanos deram trégua depois que a Bratva se envolveu com os motoqueiros do sul e
pegaram seu território em Nevada. O chefe dos russos entrou em trégua (uma farsa, eu sei) com a
morte de Ivon e seus homens. Fora que eles tomaram domínio do Texas e a briga agora se concentra
com os mexicanos e a Diabolos. Nós nunca seremos amigos, mas de vez em quando rola um conflito
de interesses que a melhor estratégia é não cruzar a linha dos limites. Eles sabem que Travis pode ser
tão maquiavélico e cruel quanto eles.
Em casa, nós temos a ausência de Colen, que não está falando com ninguém. Sei que está
envolvido com algumas transações em Nova York. Dario está mais calado e pediu ao irmão que
desse algum dever para ele fazer na Famiglia. Todos estão de olho nele e Travis anda preocupado
com seu novo temperamento introvertido. Mora conosco desde que teve alta do médico, após a
tortura, mesmo que seja uma sombra em casa. Marinne voltou para a escola e vive como se nada
tivesse acontecido. Eu sinto que ela precisa desabafar e talvez esbravejar sobre tudo que aconteceu,
e fico apenas esperando o dia.
Eu estou no penúltimo mês de gestação do nosso pequeno e ainda não consigo acreditar que
terei um bebê nos braços em pouco menos de um mês. Ainda é surpresa se é menina ou menino.
Mesmo eu sabendo que não fará diferença. Ele será o primogênito de Travis Lozartan e tem tanto
poder e inimigos quanto o pai.
Ah... Falando no meu marido. Ele é o meu sonho acordado e nosso acordo de que dentro de
casa seríamos apenas uma família comum está funcionando. Não falamos de trabalho em casa, talvez
no escritório ele faça e, quando rola, eu estou lá me metendo na conversa com Paolo. Ele está mais
próximo, mais carinhoso. Toda noite eu sinto ele me abraçar por trás e acariciar minha barriga. E eu
amo quando ele faz isso, chego a revirar os olhos de prazer.
Sorrindo para o espelho, ajeito meu vestido azul de seda que é bem justo ao meu corpo de
grávida. Ah, eu amo estar grávida! Sem ser esnobe, eu fiquei linda e essa barriga é meu orgulho.
Faço carinho no meu bebê e acabo rindo alto quando o sinto chutar.
— Qual é o motivo da risada? — Travis indaga atrás de mim.
Eu me viro para poder encará-lo vindo em minha direção no nosso closet e respondo:
— É o seu filho que está chutando.
— Ele é muito pequeno e impossível.
— Acho que puxou a você — cochicho brincando com ele.
Travis me dá um beijo de leve na boca.
— Está querendo dizer que eu sou pequeno? — retruca chegando perto e colocando as mãos
na minha barriga enquanto eu coloco a mão no seu rosto.
— Não. Estou querendo dizer que ele é impossível e pequeno você não é em nada, meu amor.
Travis dá uma gargalhada e um beijo na minha boca fazendo questão de inspirar meu cheiro.
— A mãe dele também não tem nada de tranquila.
Sorrio e, suspirando, me viro para o espelho de novo, agora para ver uma imagem da minha
barriga grande sendo acariciada por Travis.
— É uma imagem linda — ele comenta olhando-me nos olhos pelo reflexo do espelho.
— Uma imagem perfeita que eu nunca imaginei que iria ter.
Ele me abraça e beija minha bochecha. E me sinto tranquila.

Alguns dias depois...

Meu Deus, eu nunca fiz tanta força assim e, cada vez que empurro, sinto como se minhas
entranhas fossem sair junto, mas não posso parar. A médica pede mais uma vez para eu fazer força.
Eu estou suando, cansada, meu coração está batendo tão forte que chega a doer.
Olho para o lado e vejo Travis todo concentrado e nos seus olhos um pouquinho de
preocupação, mas também determinação; e ela é que me ajuda a empurrar mais uma vez.
— Vamos, querida! Faz força. Vai! Mais uma vez.
Empurro com tudo de mim soltando um grito bem alto agarrada à mesa da cadeira de parto,
onde estou com minhas pernas arreganhadas há uns quinze minutos já. Fora as oito horas de
contração.
— Vamos, Madeleine, continua. Ele está vindo! — a médica avisa e isso me dá mais energia.
Com mais um empurrão, escuto o choro estridente de bebê. Solto a respiração e deixo meu corpo cair
na cadeira totalmente esgotada, ao mesmo tempo que a médica informa: — É um menino. Um lindo
menino.
Eu achei que teria vontade de chorar, mas a realização de ter dado à luz cai sobre mim,
eufórica, que o meu filho nasceu! Estranhamente me sinto poderosa por ter dado à luz a ele. Por ele já
ter Nevada toda para comandar.
Olho para Travis e ele está com os olhos concentrados nas enfermeiras que limpam o nosso
bebê e apenas relaxa quando uma delas se aproxima de nós e, bem devagar, passa ele para os meus
braços.
Engulo em seco fitando seu rostinho. Ele é um bebê grande e lindo. Tem muitos cabelos e são
pretos. A pele pálida como a minha e de Travis. Ele é como imaginei. Sabia que o nosso filho seria
uma versão miniatura de nós dois e só mais para a frente que vamos ver se as feições puxarão mais
para mim ou as do pai.
— Ele é lindo — comento apaixonada e com uma vontade louca de apertar o meu bebê nos
meus braços. Suspiro e me controlo porque senão eu posso machucá-lo. — Ele é uma versão de nós
dois em miniatura.
Isso arranca um riso rouco de Travis e ele estica a mão para tocar no narizinho do nosso
filho.
— Será aquele nome mesmo?
Nós conversamos muito sobre nomes e como seria o quarto do bebê, mesmo com a decisão
de não descobrir o sexo antes do tempo.
Assinto para ele e viro-me para o nosso filho.
— Dante Lozartan. — Quando falo seu nome, ele abre os olhos e me fita de uma forma, que
parece que entende quem ele é, que nasceu para ser importante. Ser o príncipe da Lawless.
Estico meu indicador para ele, que o aperta e não desvia seus olhos dos meus. Ele não chora,
não mais desde que está nos meus braços e eu amo o pai dele, mas ele revirou meu mundo
completamente.
— Oi. Eu sou a mamãe — sussurro para ele.
Dante pisca seus imensos olhos azuis para mim e desvia sua atenção para o pai quando
Travis toca nele. Eu faço o mesmo e pergunto:
— Quer pegar ele?
— Não, ele está bem onde está — diz isso de uma forma doce e delicada.
Entendo perfeitamente o que ele quer dizer. Ele está certo. Dante está bem onde está e todos
os nossos filhos sempre ficarão muito bem nos meus braços, sob os meus cuidados até crescerem e se
tornarem ferozes e dominadores como precisam ser. Como está em seu sangue.
Dou um beijinho na testa do meu filho e o encaixo no meu pescoço, que parece que foi
perfeito para ele deitar a cabecinha.
Dio mio. Percebo agora que em dois anos a minha vida se transformou. Eu me transformei e
nunca estive tão feliz. A garota que foi silenciada uma vez, agora está ao lado de um dos homens mais
poderosos da máfia italiana e que também tem sua força, pois com Travis eu não me tornei dominada
ou frágil, me tornei feroz e determinada. Deixei claro para todos que também posso tanto quanto ele
pode e esse é um dos maiores presentes que Travis já me deu. O respeito como mulher, mãe e sua
parceira. Eu sei que somos dominados por nossa paixão e ela que protege nosso território. Pode vir
quem quiser, nós iremos dar conta de todos.
PARTE III
Enquanto encaro a cena que nunca cobicei na vida continuo ainda sem acreditar que é real. Eu
tenho uma esposa, uma mulher que não é apenas um troféu para exibir. Sua determinação e seus
ideais, a torna perfeita para estar ao meu lado. Não foi amor à primeira vista. Porra, eu nem sabia o
que era amor antes dela. No entanto, agora é amor o que sinto quando meu coração esquenta quando
a vejo.
Madeleine nina nosso filho com todo carinho em seus braços protetores e mesmo sendo tão
certa da nossa sorte, meus pensamentos vêm estragar o momento, pois criar um menino em nosso
mundo é impor regras, brutalidade e mesmo eu tentando ser menos filho da puta que meu pai foi
comigo e com meus irmãos, terei que infringir algumas sessões de torturas para ele aprender a
aguentar. Eu ensinarei Dante a ser o meu reflexo. Focado, cruel e temido. Ele é o meu filho. O
herdeiro da Lawless.
Um toque na porta corta meus pensamentos e me virando, abro e Marinne entra toda animada
e feliz. Ela me abraça, envolvendo seus braços magros em meu quadril.
— Parabéns, irmão! — diz afastando-se.
— Obrigado.
— Hum... — Faz com tom de deboche e passa por mim, indo até Madeleine e o bebê. — Oh,
ele é tãoooo lindo.
Minha esposa abre um sorriso ainda maior e troca um beijo no rosto com Marinne, que logo
se propõe a pegar Dante.
— Tenha cuidado. Coloque a mão na cabecinha dele.
— Eu sei. Eu sei!
Olhando-os de longe, ela segurando o bebê nos braços não deixo de pensar que está
segurando o seu irmão. Demorei a aceitar que na verdade eu fui o pai da minha irmã. Madeleine me
fez enxergar claramente isto e agora eu vejo ela segurar meu segundo filho. Não tenho garantias de
que vou acertar com ele como fiz com Marinne. Ela é tudo o que eu mais prezo e espero que meus
filhos também sejam. Madeleine está ao meu lado dessa vez e ajudará. E será uma grande alívio.
Meus olhos desfocam de Marinne e Dante para minha esposa, pois sinto que ela está me
olhando. Sorrindo, ela me chama com uma mexidinha de cabeça e vou até ela.
— Mais perto — murmura.
Assinto concordando e me sento na beira da cama. Dou um beijo na sua testa e me afasto.
Madeleine me dá um sorrisinho e se joga pra frente.
— Quero ir pra casa.
Afago suas costas de leve e detesto estar de costas para a porta. Embora isso não me impeça
de porra nenhuma.
— Acho que amanhã você vai.
Ela resmunga se levantando e olha dentro dos meus olhos implorando por mais aproximação.
— Aqui não.
— Mas só tem a Marinne — cochicha e seus ombros murcham quando tira suas próprias
conclusões: — É, ela tem que entender cedo. Que saco.
Para diminuir a recusa, dou um beijo na sua testa. Madeleine sempre foi esperta e
observadora para entender que, mesmo com Marinne no quarto, precisamos não ficar esboçando
emoções e intimidade na frente dela, afinal ela precisa aprender logo essa regra de extrema
importância.
Não sei se terá um casamento como o meu, que em nosso mundo sou obrigado a dizer que é
sorte, e mesmo que seja apenas por convívio, espero que tenha respeito. De toda forma, ela precisará
não demonstrar intimidade com Amândio em público, principalmente por ele ser o chefe da
Darkness.
— Ele é tão perfeito — Marinne comenta sonhadora.
Eu e Madeleine olhamos para ela. Observo minha esposa limpar os olhos e então eles
encontram os meus.
— Você fará um bom trabalho de novo — refere-se à forma como criei Marinne.
— Espero que sim.
Ela acena que sim, confiante, e segura minha mão, mas não tem tempo de fazer nada – acho
que ia beijar – porque Marinne volta para perto da cama e fita-me ao dizer:
— Não quer pegá-lo no colo?
Respiro com um pouco mais de força e, quando Madeleine solta minha mão, olho para ela.
Cazzo. Ela está quase implorando para eu fazer isso desde que Dante nasceu.
Porra. Não sei qual é o meu problema em segurar meu filho nos braços. A droga dos meus
pensamentos perturbados não estão permitindo que eu faça algo que é de direito meu, tudo porque me
sinto impuro, sujo, pecador demais para pegar um ser humano tão puro quanto um bebê de dois dias
nos braços. Foda-se tudo! Ele é meu filho. Minha carne e meu sangue e os olhos da mãe dele
marejados, pedindo para eu pegá-lo, é apelativo demais para mim.
Dando a volta na cama, fico de frente para Marinne e pego Dante em meus braços. Ele não é
muito pesado, nem muito grande. É quente e tem um cheiro de limpeza com um aroma doce. Baixo a
cabeça e olho bem para o seu rosto. Droga, ele é muito parecido com Dario quando criança e a
preocupação de que eu erre com ele, como errei com meu irmão, piora toda a preocupação do futuro
que virá.
Mas então ele pisca os olhos e me encara. Como se visse o medo de torná-lo fraco ou
quebrado como Dario, Dante mostra que seus olhos refletem sua mãe e aquela mulher não tem nada
que possa quebrá-la. Eu não estarei sozinho criando um garoto de novo e sei que com ela ao meu
lado acertarei. Eu o ensinarei a ser um pouco frio e determinado, fazê-lo meu reflexo, e com ela,
Dante terá apoio e orientação, o que faltou para o meu irmão.
— Ele não é o bebê mais lindo que você já viu?! — Marinne exclama e olho para ela. —
Claro que estou falando dos meninos, porque eu sou a menina mais linda da sua vida.
— Não posso discordar — falo fingindo frieza, o que sei muito bem que essa espertinha
detecta e ri alto vindo ficar ao meu lado.
Ela tem razão. Marinne é a minha menina e sempre será.

Madeleine está com dor desde ontem e, quando saímos do hospital logo que recebeu alta, ela só
reclamou no carro. Ainda está reclamando enquanto chegamos à porta de casa. Infelizmente ocorreu
complicações no parto e ela teve uma pré-eclâmpsia e suas dores estão refletindo em seu rosto,
marcando bem suas feições, embora agora se alegra quando olha nosso filho e foge dos meus olhos.
Esticando a mão, tiro o cabelo do seu rosto e digo só para ela:
— Não tem como esconder de mim o que está sentindo.
Ela suspira e ergue o rosto.
— Só me ajuda a entrar que já irei me sentir melhor.
Assinto e espero o carro parar. Logo Luigi abre a porta e passo a bolsa grande do bebê para
ele e ajudo Madeleine a sair para depois pegar a cadeirinha com Dante nela. Entro em casa ajudando
minha esposa, que caminha lentamente, e com Marinne em nosso encalço falando sem parar. Nas
escadas paro e viro-me para a minha irmã.
— Fica com ele rapidinho enquanto ajudo Madeleine a subir as escadas.
— Claro! — exclama feliz. Espero que continue prestativa quando ele acordar de madrugada.
— É doce você querer ajudar, mas eu consigo — Madeleine retruca-me.
— Não, você não consegue — digo e, quando entrego Dante a Marinne, pego Madeleine no
colo e subo as escadas. Não antes de dar uma olhada e um aviso para minha irmã: — Não se atreva a
subir as escadas com o bebê.
Eu sei que ela não é mais criança, mas está tudo tão complicado e, depois do susto do parto,
não quero levar mais nenhum.
Rapidamente, chego no quarto e abro a porta. Com calma deixo-a no chão e ajudo a se deitar.
Escuto-a gemendo e arrumo os travesseiros no alto da cama para ajeitar sua cabeça e cubro o seu
corpo até a cintura.
— Vou lá buscar ele. Espera um pouquinho.
— Está bem —ela concorda.
E rápido como fui, vou buscar nosso filho descendo as escadas de dois em dois e encontro
Rosália, Marie Rose falando com Marinne e o bebê.
— Parabéns, senhor. Ele é lindo e se parece muito com você.
Abro um sorriso orgulhoso e dou um aceno de cabeça fraco para elas. Então, se afastam para
eu poder pegar meu filho e o seguro com muito cuidado levando para cima.
No quarto pego Madeleine gemendo de olhos fechados quase chorando e meu coração quase
se parte ao meio por vê-la sofrendo tanto. Ela sente a minha presença e abre os olhos com um sorriso
porque coloco o bebê no seus braços. Pegando-o com todo amor e carinho que sempre distribui para
todos, murmura baixinho algo para ele.
Respirando fundo, sento na beira da cama e coloco a mão em cima da sua perna. E olhando
para ela e para tudo que somos agora, nem reconheço a garota rebelde que encontrei naquele
banheiro da boate. Ela se transformou nessa esposa que é fundamental para estar ao meu lado, na
cunhada e quase mãe de Marinne, na dona dessa casa, minha conselheira e a mãe do meu filho. Ela é
tão doce, gentil, firme, astuta e todos a admiram e a temem, na mesma proporção, em Las Vegas e eu
sei que ela vai ser uma mãe espetacular. Já está sendo.
Madeleine envolve mais o bebê nos braços e beija sua testa. Escuto Dante resmungar dentro
da manta e ficando mais perto vejo-o abrir os olhos lentamente e a boquinha também.
— Você precisa descansar — falo para ela quando percebo que a intensão dela não é fazer o
que o médico recomendou.
— Leonel está na casa?
— Ficará de prontidão se você precisar dele.
É óbvio que ordenei ao médico da família vir e ficar aqui.
Ela sorri fracamente e assente.
— Acredito que vou. Não estou me sentindo cem por cento.
— Então descanse agora.
Ela suspira e olha para Dante.
— Quando ele adormecer, eu prometo que vou também. — Olha para mim. — E você vai
ficar em casa?
— Por hoje e amanhã. Vou trabalhar do escritório, mas não mais do que isso. Preciso
resolver alguns problemas pessoalmente.
— Uhum... Eu sei.
— Mas prometo voltar pra casa cedo e você não estará sozinha.
— Amor, eu sei disso. — Abre um sorriso sem mostrar os dentes. — Só perguntei por
curiosidade e porque preciso de carinho.
Abro um sorriso para ela, levanto e me ajeito ao seu lado, ficando quase atrás do seu corpo,
encostando na cabeceira da cama, abraço seus ombros. Beijo seu rosto e afago Dante nos seus
braços.
— Assim está bom?
— Maravilhoso — responde e nina o bebê falando baixinho. — Dorme, meu querido. Dorme,
meu amor.
— Ele não estava sonolento no hospital?
— Estava, mas parece que chegar na sua casa deixou ele eufórico. — Ela se desencosta de
mim e vira-se. — Pega ele um pouco.
— O que você vai fazer?
— Preciso ir ao banheiro.
— Vai sozinha? Consegue?
Ela para com o bebê entre nossas mãos e faz uma careta para mim.
— Não sei — choraminga.
Coloco a mão no seu rosto.
— Vamos colocar ele na cama e depois te levo no banheiro.
Madeleine suspira e aceita. Com cuidado coloco o bebê no meio da cama e ela ajeita os
travesseiros em volta dele. Depois me levanto e a ajudo a ir até o banheiro e a levantar o vestido.
— Não precisa tanto, Travis.
Assinto e me afasto.
— Vou ver como ele está e já volto.
Ela concordar.
No quarto vejo Dante quietinho e ainda é muito surreal ser pai dele. Ter a minha família. Puta
que pariu!
— Ele é lindo demais.
Viro-me e vejo Madeleine andando bem devagar.
— Por que não me chamou?
— Ah — resmunga e estica a mão para mim, que pego quando fico perto e lhe dou apoio
pondo as mãos nas suas costas. — Obrigada pela forcinha.
— Ao seu dispor.
Ela solta um gemido, vira-se para mim, pega meu rosto e me dá um beijo na boca.
— Você é um marido incrível, sabia?
Ergo a sobrancelha com desdém segurando sua cintura.
— Deve ser porque você facilita.
Ela ri alto, mas para quando Dante resmunga. Afastando-se de mim, ela pega o bebê no colo,
tão devagar que fico nervoso e tento ajudar, porém não precisa e só a assisto encaixá-lo nos braços e
erguer a postura. Virando-se para mim abre um sorriso.
— Por que você não toma um banho e coloca uma roupa confortável para ficar conosco na
cama?
— Acha que estou fedendo?
— Não, amor. Mas você está com essa roupa há dois dias e não dorme há três. Seria muito
bom ver você descansar também. — Pisca os olhos para mim fazendo charme. — Só por hoje?
— Está bem, eu vou e você me promete ficar deitada enquanto eu estou longe.
— Não estou invalida, Travis.
— Mas está com dor e vejo como seu rosto se contrai enquanto tenta esconder a dor de mim.
Então fica quieta nessa cama enquanto tomo banho.
Dando uma gargalhada baixa, ela assente e estica o rosto para eu beijar sua boca, e eu faço e
colocando a mão no seu queixo digo:
— Agora cama.
Ela concorda e pede para eu ajudar pegando Dante. Eu o levanto na altura do meu rosto e fito
seus olhos. Sinto algo estranho no meio do peito vendo-o assim. É um sentimento mais poderoso que
o que senti por meus irmãos pequenos, no caso Dario e Marinne, quando os peguei no colo. É tão
forte quanto o que sinto por Madeleine. Não posso negar que amo meu filho e o quanto torço para
saber lidar com ele e o endurecer para se tornar o chefe da Lawless sem passar dos limites.
— Pode passar ele agora para mim — Madeleine fala me despertando do devaneio e com os
braços prontos para amparar e proteger Dante.
Eu entrego nosso filho para ela e com um quê simbólico, pois enquanto ele for tão pequenino
assim, não vou precisar estar presente para discipliná-lo, apenas educar como qualquer pai. Por
enquanto ele é todo dela.

À noite estamos deitados na cama vendo tevê para relaxar enquanto o sono não chega e porque
Dante acorda o tempo todo. Estamos assistindo um filme sobre máfia e acho muito incoerente certas
coisas.
— Engraçado esses italianos feios, o meu é lindo — Madeleine comenta e esfrega o rosto,
que já estava apoiado em mim, no meu ombro.
— A minha italiana também é muito mais bonita.
Ela ri e beija meu pescoço.
— Eu amo você — ela diz isso de um jeito como se fosse um elogio e, por mais que na
primeira vez que ouvi não achei nada comum, hoje é natural, mesmo que meu coração acelere em
ouvi-la dizer isso.
Deslizo minha mão por suas costas e paro na altura da sua bunda. Porra! Que saudade de
transar com ela e o jeito que seu corpo fica mais aconchegado a mim percebo que quer também.
— Quanto tempo dura um resguardo?
Ela cai na gargalhada e beija minha garganta erguendo o tronco para poder ver meu rosto.
— Uns quarenta dias.
— Puta que pariu! — resmungo fechando os olhos e jogando o braço na minha cara.
— Ah, amor. Não fica assim.
— Difícil — comento e viro meu corpo para ela pegando-a de cheio. — Não transamos há
um mês.
Madeleine joga a perna em cima de mim.
— Eu sei — diz afagando meu rosto e deixa o seu mais próximo para cochichar enquanto
esfrega sua perna na minha. — Também tenho vontade, Travis, mas não consigo e nem posso.
— Porra, eu sei. Não vou forçar. Está tudo bem.
Ela suspira e me beija.
— Você vai esperar?
— Que pergunta é essa?! — digo me afastando e encarando-a, fecho o semblante. — Acha
que sou capaz de trair você só porque quero foder e você não pode? Puta que pariu, Madeleine. Eu
não sou esse tipo de homem!
Tento me levantar da cama, mas ela não permite colocando a mão no meu peito.
— Desculpe. Não foi isso que quis dizer.
— Então foi o quê?
Ela respira fundo e senta-se como eu faço na cama ainda.
— Eu... — Baixa a cabeça. — Não sei o que estava pensando. Pra ser sincera, eu fiquei com
medo de...
— De eu te trair por isso? Por estar com tesão? — E como ela não levanta o rosto, eu
obrigo-a a encarar meus olhos. — Diga.
— De perder você.
— Porra — rosno baixo.
— Travis, você não pode dizer que isso não acontece entre os homens e mulheres do nosso
círculo. Muitos traem as esposas quando estão grávidas ou no resguardo.
— É verdade, não nego, mas eu não. Quando foi que dei a entender que sou capaz disso?
Cazzo. Eu disse que te amo e você me pergunta se vou te trair?
— Travis...
— Muitos homens batem nas mulheres e as maltratam, eu nunca fiz isso com minha irmã, com
nenhuma amante que tive e, principalmente, com você. Por que presumiu que eu comeria outra mulher
enquanto não posso ter você?
Balança a cabeça e dá de ombros.
— Não sei.
Soltando a respiração com força, chego mais próximo e beijo sua boca.
— Eu disse que amo você. Não foi da boca pra fora e sem contar... Acima de tudo, que eu
quase vi você morrer na mesa de parto para me fazer uma pergunta ou sugestão dessas. Posso não ser
um homem bom, porém sou leal. Sou leal a você, a nossa família. Nunca mais pense que o que sinto
são meras palavras.
— Nunca pensei isso. Você já me provou seus sentimentos e antes mesmo de dizer com
palavras.
— Então pronto, porra. Não deveria nem cogitar que eu trairia você. — Beijo sua boca mais
uma vez. — Eu quero você, estou ardendo de tesão por você, sempre estou, mas não é apenas por
sexo. É por você e eu não sou um animal no cio. Posso esperar e compreender as circunstâncias.
Madeleine sorri desmontando sua careta emocionada e segura meu rosto.
— É recíproco e desculpe — sussurra. — Desculpe por, sem querer, duvidar dos seus
sentimentos, principalmente porque demorou tanto para se abrir. — Oferece um sorriso simples. — E
quero que saiba que é difícil pra mim também. Muito mais e mais ainda porque sinto um incômodo
por desejar você. Pelo meu corpo responder quando viu você sair do banho de toalha e sentir tudo se
revirar aqui dentro. — Respira dramaticamente e me beija. — Vou ficar o maior tempo de repouso
agora para depois aproveitar.
Acho graça do seu comentário, rio e tiro o cabelo da frente do seu rosto.
— E eu vou ter que usar a imaginação.
Madeleine morde a boca e passa a mão em cima do meu peitoral e vai descendo até entrar
dentro da minha cueca. Resmungo e seguro seu pulso.
— Não provoque.
Ela pisca os olhos, fazendo charme e me dá um sorriso sem mostrar os dentes.
— Só quero que você durma bem.
— Eu tô bem. — Afasto sua mão e viro meu corpo a fim de ficar cara a cara com ela. —
Relaxa e dorme. No momento precisamos descansar e se prepara porque não vai durar muito ele
dormindo.
— É verdade — murmura rindo e esfrega o rosto no meu. — Mas eu prometo que vou fazer o
que você quiser quando pudermos.
Faço um som com a garganta e aperto sua bunda murmurando no seu ouvido:
— Não se arrependa de dizer isso.
— O quê? — Inclina o rosto para trás e me olha nos olhos.
— Espere e verá.
— Travis...
— Shhh... — Coloco o dedo na sua boca. — Não antecipe a situação, angele.
— Está beeem — balbucia desconfiada e finge relaxar.
Dando um beijo na sua boca, trago-a para os meus braços e nos ajeito para voltarmos a dar
atenção ao filme e esperar Dante acordar, porque vai acontecer. Embora na minha cabeça apenas fico
imaginando minha esposa sedutora em todas as posições e sendo safada só para mim.
Dezembro de 2012

Depois de quase quatro meses sem dividir uma cama de verdade com meu marido, a espera para o
relógio chegar a hora marcada do encontro de hoje que ele nos reservou, quase me levou a loucura o
dia todo.
Talvez Travis pense que eu não sinto falta de sexo, pois diferente dele não vivo reclamando
ou aparentando tanta fome, mas a verdade é que estou morrendo de saudade de senti-lo dentro de
mim. De sentir sua pele quente e suada junta a minha. Do seu corpo sobre o meu. Mesmo a gente
praticamente como nunca o oral, depois do primeiro mês do resguardo que foi quando voltei a me
sentir melhor e meu corpo também parecia ter entendido que o bebê não estava mais dentro de mim,
chegou um momento que para mim não funcionava mais tão bem.
Não contei para ele esse pensamento porque todas as vezes que fomos para cama e eu quis
chupá-lo, ele fez questão de devolver e sei que gosta tanto quanto receber. E por Deus, eu não ia
pedir para ele parar de me dar prazer, mesmo num nível inferior de um foda caprichada que gostamos
de realmente compartilhar.
Saio do carro e Luigi vem atrás de mim. Pegando meu celular na bolsa, mando uma
mensagem para Rosália que está cuidado de Dante com Marinne. Ela está mais para ser vigiada
também, mas gosto de como o protege e zela. Parece mesmo que são irmãos e isso enche meu
coração do mais puro sentimento.
Guardo o celular na bolsa de volta e meu coração acelera ao entrar no elevador lembrando
de Travis falar desse prédio onde fica um apartamento seu. Ele me contou que veio para cá depois da
nossa primeira vez, quando ficou pensando no erro que cometeu em tirar minha virgindade.
Confessou que ficou fora de si, pois nunca tinha sentido o que sentiu naquela noite. Isso lhe rendeu
um beijo mais profundo e um boquete caprichado semana passada.
Piscando, deixo meus pensamentos neutros e só não estou mais tranquila porque Luigi ainda
está ao meu lado e tento encontrar a melhor forma de dizer que ele não precisa. Na verdade, ele tem
que sumir. Hoje eu e Travis vamos tirar o atraso de quatro meses sem sexo. E porra, eu não preciso
do meu segurança para nada.
— Luigi — chamo sua atenção e ele me encara. — Você... Já pode ir. Travis pode cuidar de
mim.
Seus olhos desviam das portas de aço e me encaram sem emoção.
— Só irei levá-la até o andar, depois voltarei para a recepção.
Franzo a testa e cruzo os braços sem entender virando meu corpo para o seu.
— Travis ordenou que eu ficasse ao seu lado até o elevador, depois sumisse do radar.
Pisco algumas vezes tentando não ficar constrangida de ele ​– de certa forma – saber o que
nós iremos fazer, e assinto deixando de encará-lo. Homens e sua forma de demonstrar domínio.
Reviro os olhos e respiro de verdade quando o elevador para no andar da cobertura. E mal
espero as portas se abrirem para sair correndo dele. Sem olhar para trás, adentro o apartamento à
procura do meu marido possessivo maníaco e controlador. Sei que poderia ser pior como outros
homens da Famiglia como: cruel, sádico e violento. Então não posso reclamar dele nunca.
O apartamento tem uma decoração escura e bem masculina. A personalidade de Travis
quando não está em casa. Consigo vislumbrar como ele é por dentro, ou era antes de mim. Paredes
cinzas, sofás pretos, um tapete grande vermelho sangue logo na entrada entre a sala de estar com
móveis mogno envernizado e a cozinha americana. É arejado e grande. Para alguém que vinha para
cá ficar sozinho às vezes é demais. Tem até uma mesa de vidro com quatro cadeiras um pouco a
frente da cozinha de aço inox bem equipada.
Parando na sala moderna com uma mega televisão, sinto que aqui era o esconderijo dele das
obrigações como responsável não apenas por Las Vegas como seus irmãos. Não sei porque ele não
escondeu eu e Marinne naquela vez que mandou ficarmos com Paolo. Acredito que aqui é um ótimo
local para ser nosso esconderijo eventualmente, mesmo no momento querendo cobiçar paz.
— Travis?
Assim que o chamo escuto passos vindo e sigo até vê-lo saindo de um corredor todo
lindamente impecável com seu traje de trabalho. Vestido de preto dos pés a cabeça. Meus passos
estacam quando encontro seus olhos e vejo tanta fome e poder. Desejo lascivo puro e cru.
— Gostei do... — tento falar, mas ele agarra meu rosto com suas mãos fortes e enormes.
Então ele me beija num movimento rápido deixando-me totalmente inquieta e sem pressa para
me esquivar. Sua boca tem um gosto de álcool que sei identificar muito bem, Bourbun Whisky, e está
gelada, sinal de que tomou com gelo. É um gosto delicioso. Seu sabor misturado ao gosto amargo da
bebida enquanto sua boca devora a minha.
Solto sons de prazer ouvindo seus gemidos. Um turbilhão de sentimentos atravessa meu corpo
com a ânsia e saudade que senti-lo. De ter o seu corpo só para mim. Isso faz as paredes do meu sexo
se apertar sentindo um vazia furioso.
Travis chupa minha língua e força meu rosto à ficar mais para cima, para ele, e eu agarro seus
cabelos e desço minhas mãos até arranhar e apertar seus ombros, sentindo o tecido do seu paletó sem
enrugar por causa das minhas unhas cravadas na vontade de sentir a sua pele quente.
Recuperando-me, solto um pouco da pressão no meio do meu peito e recuo para tomar ar.
Travis me segue ansioso e passa o nariz pela lateral do meu rosto, os lábios roçando minha
pele, meu pescoço e beijando o meu colo até que sua boca está perto do meu ouvido direito.
— Eu preciso estar dentro de você — mordisca o lóbulo da minha orelha e suas mãos
apertam os lados do meu corpo. — Estou louco de vontade de te foder a noite toda — murmura.
Gemo fechando os olhos e me agarro a ele agora porque não confio na força das minhas
pernas.
— Eu não tenho nada que reivindicar, também o quero loucamente. — Enfio as mãos dentro
do seu paletó. — Na verdade estou contando as horas.
Sem que eu perceba, ele me pega no colo e jogando em cima dos seus ombros, caminha pelo
corredor que estava. Então entramos num quarto.
Tenho poucos minutos para reparar que é tão parecido com o resto do apartamento. Todo
escuro. Móveis de mogno, roupas de cama cinzas e pretas e um quadro de uma mulher nua sem rosto
em preto e branco na parede da porta. É grande e cheia bem. Ele deve ter preparado até as luzes para
hoje, que estão baixas. Sinto-me ansiosa.
Travis desliza as mãos em meu corpo conforme me deixa em pé. Sua boca encontra a minha
sedenta e molhada. Gemendo puxo seu paletó para fora do seu corpo, que ele ajuda a retirar. Minhas
mãos agora passam livremente pelas armas presas no coldre e a sensação de poder por ele baixar
totalmente sua guarda comigo, me atinge de forma enérgica. Sua confiança é maior que o amor que
me deu.
Se afastando, ele começa a remover minha roupa vagarosamente, torturando meu psicológico.
Ainda bem que escolhi um sobretudo para proteger-me do frio que meu vestido de seda vermelho não
ajuda em nada. Pelo seu olhar sei que adorou a peça, nossa cor. Sangue!
Baixando sua boca até meu ombro, deixa um beijo depois que escorrega a fina alça e depois
a outra, e assim o vestido se junto aos meus pés revelando minha lingerie. Um conjunto de renda
vermelha; bojo sem alça, a calcinha na frente mostrar meu sexo e a cinta-liga é presa no corpete em
minha cintura. Me dediquei muito na academia e na alimentação para poder usar algo assim e não me
sentir tímida. Na verdade, sinto-me completamente ousada.
— Você é a mulher mais linda que já pus as mãos.
— E a última — murmuro apertando seu cinto.
Ele me dá um beijo na boca bruto e rápido.
— Sem sombra de duvidas, mi angele.
Meu corpo se aquece com suas palavras. Esse homem me deixa com as pernas fracas e
pensar que é meu. Todo meu e para sempre. Meu mafioso favorito. O pesadelo de muitos homens e o
meu sonho. Meu cavaleiro das trevas. O pai do meu filho e o protetor feroz. Eu sei que sempre
estarei segura, pois Travis tem um determinação invejável quando quer algo, e o seu objetivo na vida
é cuidar da nossa família e do seu império. Ele prometeu-me que sangrará e queimará por nós, e eu
confio nisso fielmente.
Induzindo-me a deitar na cama, faço de bom grado e quando estou no meio dela, ele tirar o
coldre e a camisa revelando seu peitoral forte coberto de cicatrizes e marcas, e a tatuagem que fez
quando voltou daquele cativeiro da Bratva, no meio do peito. Asas de anjo queimadas e o símbolo
da Lawless no meio junto com um círculo que o tatuador não sabe, mas representa nosso casamento.
Ninguém nunca saberá do seu fascínio por mim. Dante e eu somos as únicas reais fraquezas
de Travis agora. Colen sabe se defender, Marinne já tem seu destino traçado com a Darkness e
Dario, não me preocupo. Os olhos dele me deram a certeza de que as sombras estão cravadas muito
além da maldita marca da Bratva em sua pele, que não quis remover.
Travis coloca os joelhos na cama e abre minhas pernas com seu corpo pedindo espaço.
Ainda está vestido da cintura para baixo, e eu sei o que deseja. Isso me deixa toda excitada e carente.
O oral é algo que gosta de fazer em mim antes porque ele sabe que sou pequena para o seu tamanho
avantajado, e como não quer me machucar.
Abro-me para ele e jogo a cabeça para trás sentindo sua boca beijar minhas coxas e depois
meu sexo sob a calcinha. Seguro a respiração esperando que tire a calcinha, mas não faz. Ergo a
cabeça e o fito de joelhos no meu das minhas pernas lindo e gostoso. Ele desliza as mãos em minhas
pernas, aperta minha coxa e a cintura. Com suas mãos afoitas, puxa o bojo do sutiã para baixo e
começa a massagear meus seios, dando atenção aos mamilos.
— Travis — gemo carente.
E antes que eu perceba, sua boca está chupando meus seios. Agarro seus cabelos e arqueio o
corpo me oferecendo. Ele umedece e provoca um seio, depois passa para o outro e logo vai
descendo, dando beijos e mordidas na minha barriga. E não demora muito para sua cabeça estar no
meio das minhas pernas. Minha respiração fica afeita quando ele rasga a calcinha no meio como
fosse papel e então sua língua está na minha boceta movendo-se tão devagar e sedutoramente.
Estou toda excitada e almejando mais. Tudo! Febril e arrepiada, aprecio o toque aveludado
da sua língua no meu clitóris que cada vez mais fica sensível ao toque. Uma pressão, que há muito
tempo não sinto, forma um nó no meu útero e grito arqueando as costas quando seu dedo me invade.
— TRAVIS!
Ofegante, aperto meus olhos e sinto seu dedo entrar e sair suavemente. Mordo meu lábio
inferior e agarro as colchas da cama reprimindo e tentando aguentar o suficiente para me lubrificar e
recebê-lo dentro de mim logo.
Suas habilidades no oral melhoraram ainda mais por conta das inúmeras práticas feitas no
resguardo, e somando as mãos talentosas dele, fico na borda de um orgasmo louco muito rápido. E
quando ele tiro o dedo e volta com dois, perco as forças e gozo chamando-o.
— Isso! Quero ver você gozar — diz enquanto continua a fazer movimento com os dedos
dentro de mim exigindo extraviar mais de mim.
Sua boca volta a dar atenção ao meu clitóris e fico perto de explodir de novo. O ritmo
constante e suave dos seus dedos e língua, vagarosamente, me fazem respirar com tanta dificuldade
que meus pulmões queimam.
— Goza de novo, Madeleine. — É uma ordem e como meu corpo é seu escravo, chego ao
segundo orgasmo soltando um gemido alto e abafado.
Agarro as colchas da cama sentindo meus batimentos acelerados, o suar grudando na minha
pele, meus quadris movendo-se pedindo por mais. Abrindo os olhos, encaro seu rosto, seus olhos
famintos e perigosos e fico pressa neles.
Travis tira os dedos e vem como um leão que capturou sua presa. Sua boca encontra a minha
com tamanha intensidade que a vontade ascende dentro de mim. Envolvo seu corpo com minhas
pernas e agarro seus ombros. Me deleito sentindo sua pele quente e amo quando seu peito toca meus
seios, as postas dos meus bicos, e meu corpo remexe involuntário.
— Me come, por favor, me come! — digo entre nossas respirações ofegantes durante o beijo.
Ganho uma mordidinha no lábio e ele se afasta, sai da cama. Apoiando-me nos cotovelos
observo ir até o armário. Quando volta para mim vejo que segura uma algema e todo meu corpo fica
em alerta.
Ele já me amarrou com uma fita, mas algemas?
— Não fique com medo. Jamais machucaria você. — Para nos pés da cama e estica a mão,
que aceito e fico sentada. — Se ajoelhe no meio da cama.
Engulo em seco e com sua ajuda, faço o que mandou.
— Estique as mãos.
Novamente faço e assisti-o colocar as algemas e apertas quase no limite. Pegando minha
cintura com as mãos cheias, abre o sutiã e o tira de mim. Fitando meus olhos percorre minhas curvas
lentamente com as pontas dos dedos.
— Você está uma delícia.
Solto uma risada ansiosa e vejo-o recuar uns passos para então remover os sapatos com
ajuda dos pés, o cinto bem... Lentamente e as calças e a cueca junto. Quando apruma a postura e
admiro seu corpo dos pés a cabeça, seu pau avantajado e enorme apontando para cima, minha boca
enche d'água.
— Você também — sussurro sem nem perceber meus lábios se moverem.
— O quê? — indaga com a testa franzida.
— É uma delícia.
O sorriso predador cruza seu rosto e ele volta a se aproximar. Puxa meu corpo e sua mão
correr em minhas costas até estar na minha nuca, apertando meu pescoço por trás e levando minha
boca a sua.
Me sinto mole com o encontro dos nossos lábios. Um beijo que tira minha resistência e
entregue, deixo-me levar para as sensações de puro prazer. Seus dedos encontram meu sexo inchado
e sensível, dedilhando meu clitóris me provoca novos estímulos. Ele faz isso por alguns estantes
enquanto nos beijamos, então se afasta. Eu o agarraria se pudesse.
— Deite-se e deixe as mãos no alto da cabeça.
Mordo meu lábio e faço o que pede com sua ajuda.
Tendo-me como quer, acaricia minhas pernas e puxa-as deixando fora da cama, sinto a borda
do colchão perto do meu bumbum. Olho para seu rosto e fico hipnotizada assistindo se aproximar e
segurando seu pau, me provoca com a ponta e lentamente mete dentro de mim. Gemo completamente
incendiada.
Com as mãos prendendo minhas pernas em volta da sua cintura, Travis impulsiona o corpo
contra o meu, indo até o fundo firme e forte. Ser impedida de tocar seu corpo é uma tortura o que me
deixa mais excitada. Movo meus quadris ao encontro do dele, gemendo por me sentir alargada. Um
prazer indescritível que faz meus olhos lagrimejarem porque a velocidade, o tamanho e seu olhar é
demais.
Ele solta lufadas de ar, procurando maniacamente sua libertação e eu também quero. Me abro
o quanto consigo e me entrego totalmente. Fecho os olhos sentindo-o tão fundo.
— Goza — ordena ofegante e animalesco.
Com mais alguns impulsos e a massagem dentro de mim, meu orgasmo vem e fica mais forte
quando ele também goza explosivamente.

Dou um sorrisinho de pura satisfação e me remexo gemendo, fazendo questão de passar as mãos
e me aconchegar ainda mais no corpo nu e quente de Travis. Ele libertou minhas mãos, massageou
meus pulsos e nos aconchegou no meio da cama depois da segunda rodada onde ele me comeu de
quatro. Nós gostamos de lento, porém hoje parece que a opção é levar a loucura.
— Eu gostei desse... — faço uma pausa analisando. — Gostei desse apartamento.
Seus olhos me fitam e ele diz tranquilo, como não tivesse acabado de me foder como um leão
num cio.
— Eu sempre tive ele — comenta distraído e deixa de me encarar como lembrasse de algo.
— Desde que saí da casa dos meus pais. Antes de comprar a casa que nós moramos agora, eu ficava
aqui.
— Por que você nunca me trouxe aqui?
— A gente está junto quase há dois anos.
— E você nunca me trouxe aqui.
Ele desliza a mão pelas minhas costas e deixa em cima da minha bunda. Dá um aperto me
distraindo. Levanto meu corpo para enxergar seu rosto tentando analisar sua expressão e isso o faz
me encarar.
— Eu não tinha nada de interessante para fazer aqui durante esse tempo.
Franzo a testa sem entender.
— Como assim?
— Eu usava esse lugar antes de você.
— Antes de mim?
— A única vez que eu vim aqui com você na minha vida, vamos dizer assim, foi quando a
gente transou a primeira vez.
As lembranças vem em minha memória aquela semana. Ele desapareceu, acho que uma
semana, depois daquela festa do Bellagio. Minha primeira vez.
— Então foi aqui que você veio parar naqueles dias que ficou sumido?
— Foi e Paolo veio me buscar quase que pelas bolas dizendo que eu estava negligenciando
Marinne. Ele percebeu que eu estava estranho, mas não sabia o motivo.
— Por que você fugiu? — Bato os cílios fazendo uma cara de inocente. — Se você quiser me
contar.
Sei que nem tudo ele pode me contar, ou quer. É muito poder sobre uma pessoa. Muito poder
dado a mim.
— Eu me senti culpado, um sentimento incomum para mim, pelo fato de você ser virgem.
Porra, você não me contou e eu fui um pouco áspero para sua primeira vez. Fiquei fodido, tentando
reorganizar minha mente e pensando no casamento.
— Você sempre pensou nisso?
— Como uma saída para o problema, sim. — Ele respira fundo e me encara com tanta
intensidade que perco o fôlego. — Madeleine, você não quer que eu diga que fiquei apaixonado
desde o primeiro momento que a vi e pedi você em casamento porque não saberia viver sem você.
Eu estaria mentindo.
— Eu sei disso.
— Então quando te propus o casamento foi para impedir eventuais problemas no futuro e
assumindo minha responsabilidade de tirar sua virgindade. Nós não somos como as pessoas de fora e
tivemos essa conversa mil vezes. No mundo moderno sem regras e sem tradições, onde casamentos
obrigatórios às vezes é por causa de uma gravidez, mas no nosso basta um toque, um beijo que já nos
obrigam a assumir um compromisso. Eu não pedi você em casamento, naquele momento, por outro
motivo além de manter a tradição. O dever de honrar a sua virgindade.
Faço uma careta engraçada e concordo. Abro um sorriso, para ele não pensar que estou brava
com isso.
— Acho essas coisas ao mesmo tempo legais, por conservar as tradições, e um tanto
hipócritas. Nós ultrapassamos tantos limites e regras sobre a civilidade humana. Empatia, amor ao
próximo e mesmo assim nossas tradições nos prendem a coisas tão malucas às vezes.
Ao dizer isso me sinto aliviada por ter transado antes do casamento e Travis ser tão
determinado a assuntos que lhes desrespeita. O assunto dos lençóis de sangue nem foi tocado.
Mesmo que exigissem essa tradição, não teria como fazer, e não porque eu não era mais virgem, mas
porque depois da cerimônia tudo se desenrolou naquela guerra.
Travis fica calado, mas assente concordando.
— Mesmo assim — me apoio em cima do seu peito — eu não quero fugir. Vou viver para
sempre ao seu lado.
— Odiando tudo.
— Mas amando você.
Com um movimento rápido, ele me abraça e gira o corpo ficando em cima de mim.
— E fazendo com que eu quebre regras.
Dou uma risada.
— Nasci para isso.
— Acredito fielmente que sim, Sra. Lozartan.
Ele me dá um beijo na boca rápido e firme.
— A primeira regra que eu quebrei foi ser maleável com a minha irmã, até mesmo um pouco
antes quando era dedicado a proteger Dario, não queria que nada o atingisse, e depois veio Marinne.
Assumi ela como uma filha, como minha total responsabilidade desde o momento que percebi que ela
estaria sozinha e abandonada. Minha mãe morreu e meu pai sempre a menosprezou, mas eu acho que
a maior regra que quebrei foi com você. Te salvar, levar para minha casa e confiar em você. E
inesperadamente não resistindo. — Sua voz fica mais baixa. — Mesmo que o seu corpo seja uma
delícia e toda sua beleza, eu não deveria ter feito.
— Arrependido? — pergunto engolindo em seco.
— Claro que não — afirma. — Nunca vou me arrepender de ficar com você.
Sorrio para ele e acaricio seus ombros.
— E você, está arrependida de ficar comigo?
Minha resposta é me esfregar na sua ereção crescente, sentindo aponta do seu pênis acariciar
meu clitóris.
— É óbvio que não. Acho que eu sempre nasci para ser sua. Ser sua mulher, sua esposa,
companheira e a mãe dos seus filhos.
— E a minha conselheira rabugenta.
Dou uma gargalhada e beijo sua boca.
— Você gosta dos meus conselhos.
— É claro que eu gosto, por isso que escuto.
— E... — me esfrego com mais ímpeto — a diferença entre eu e Paolo, é que eu te dou
conselho na cama.
Travis me penetra, roubando meu ar e murmura no meu ouvido:
— E peladinha e chupando meu pau no escritório. — Sai um pouco e entra lentamente. —
Fodendo em cima da mesa e deixa eu te tocar... — Ele aperta meus seios, encontraram meu mamilo e
acariciando até ficar duro.
— Hmm...
— É Paolo não deixa isso não.
— Porra, Madeleine — rugi e mordisca meu queixo. — Não pensar no Paolo agora.
Perco o riso abrindo a boca e gemo quando ele mete mais fundo e rápido.
— Ah... Travis. Senti tanta falta disso — murmuro no seu ouvido dando uma mordida na sua
orelha de leve.
— Também senti. — Afasta o rosto e encara meus olhos. — Amo nosso filho, amo você, mas
sinceramente ficar sem trepar com você, foi difícil.
Resmungo um sim, pois ele ondula a pélvis.
— Acho que... podemos pensar no próximo daqui a quatro anos.
— Quatro anos é uma boa disposição de tempo.
Rio meio gemendo, e seguro seu rosto.
— Amor, você é incrivelmente cruel — digo e jogo a cabeça para trás quando ele remete
para dentro de mim com um impulso.
— A verdade é que sou louco por você e amo foder seu corpo... — desacelera segurando
minhas coxas, os olhos fixos onde nos conectamos — de todas as formas, devagar e... — Se afasta
saindo de dentro de mim e nos muda de posição girando meu corpo, colocando-me de quatro na cama
e com uma estocada me preenche por inteira. — E selvagem.
Dou um grito agarrando os colchas da cama. Adorando como ele me alarga e massageia meu
interior deliciosamente. Acho que nós não iremos sair daqui tão cedo e se não tomar cuidado, vou
ficar grávida antes do combinado.
Fevereiro de 2015

Abrindo um sorriso, saúdo algumas pessoas no salão do hotel e continuo meu caminho para o
cassino. Hoje não sou apenas mãe e dona de casa, mesmo que ela me dê muito trabalho e Dante não
seja um menininho muito quieto, também sou um dos olhos e ouvidos para a Lawless, principalmente
dentro do Bellagio. E isso não menospreza meus serviços. Daqui tiro muitas informações, negócios e
assuntos favoráveis para nós. Também ajudo na contabilidade, me deixando muito satisfeita em usar
os anos e dinheiro que gastei na faculdade para algo realmente útil com meu diploma.
Travis cumpriu sua promessa e me fez ser algo importante dentro da Famiglia, para a máfia e
para ele. O mundo se modernizou e a máfia precisou se equiparar a elas, isso inclui colocar as
mulheres para serem mais do que apenas uma boceta e incubadora para seus descendentes. Ainda não
chegamos aonde desejo, aonde, se eu tiver uma filha, aspiro que ela usufrua dos proveitos de ser
filha do Capo assim como Dante terá tudo em suas mãos.
O tempo passou e me tornou alguém importante, e transformou Travis também. São quatro
anos como Capo, o chefe de toda a Lawless, e ele é impiedoso, determinado, com uma força de
vontade de exterminar os inimigos e problemas. Preocupante para quem o está devendo.
Travis está mais estrategista e controlado. Acredito que nosso filho foi um dos fatores, mas a
verdade é que depois da traição de Lucian e a tortura que passou nas mãos da Bratva na tentativa de
resgatar Dario, o deixou disposto a derramar sangue sem precedente. Traí-lo nunca foi algo bom a se
fazer, hoje é eminente sua retaliação. Como ele gosta de dizer: “Sou mais demônio do que homem
quando puno meus traidores”. Errado ele não está.
No ano seguinte que matou Lucian, ele fez questão de exterminar, essa é a palavra mais do
que correta, todos os antigos Underboss escolhidos por seu pai. Ele não conseguia confiar nesses
homens e diferente de uma simples cerimônia de iniciação como um subchefe, ele fez todos os atuais
caçar e matar os antigos. Não posso esquecer que começou com essa forma de “tratar os ratos” desde
Colorado com Costa, que foi o primeiro traidor dos Underboss que morreu sob juramento de Travis.
E apenas sei dessa informação porque é comentada por toda a Lawless como Travis foi monstruoso.
E nos últimos anos podemos dizer que estamos mais tranquilos sobre os traidores ou futuros,
porque os atuais homens de confiança não excitaram em demonstrar lealdade a Travis.
Chego no salão do cassino e cumprimento com aceno de cabeça os soldados e Antonio, o
gerente. Pelo nome é óbvio que faz parte da Famiglia. Com passos largos chego a porta e abrindo,
caminho pelo corredor que dá ao escritório e salas de contagem, e a famosa sala de interrogatório.
Eu nunca preciso entrar nela, essa tarefa fica para Paolo ou Travis, e é fim de jogo quando Luca se
envolve.
— Pensei que não viria para esse lado hoje — comenta Paolo saindo do escritório de Travis.
— Precisei resolver um problema com as fichas das maquinas novas.
— E?
Como sempre ele sabe que tem mais.
— Um babaca estava contando as cartas e Roberto preferiu liberá-lo para o hotel, me
entregando de bandeja.
— Quer que eu resolva?
Pondero sua oferta e me aproximo para os soldados e Luigi, atrás de mim, não ouvirem.
— Isso vai depender da “agenda” do meu marido.
Paolo curva os lábios de lado, seu sorriso macabro, e enfia as mãos nos bolsos me
oferecendo sua postura decidida.
— Ele não vai se importar.
— Certeza?
— Sim — responde assentindo. — Ele está organizando tudo para o aniversário de dezoito
anos de Marinne.
Sorrio pelo tópico da sua preocupação, mesmo sabendo que isso levará ao Bellagio ter uma
quantidade insana de soldados por toda volta, em todas as entradas e saídas. Em cada andar e
ambiente, para proteger nossa família. Ela pediu uma festa, e ele aceitou dar-lhe a melhor de todas. É
nossa despedida. Os últimos meses com ela por aqui.
— Se é assim, faça bom uso — digo com ironia e fúria. Eu não gosto desses espertos
tentando roubar meu cassino.
Ele acena e passa por mim. Viro-me para vê-lo caminhar pelo corredor e aprumo a postura
inspirando. Paolo também teve suas mudanças, principalmente depois do casamento com Nina, e
segundo os olhos dela, parece que dentro de casa temos um pai e um marido bom. Isso me conforta.
Odeio ficar sabendo de maus tratos nos casamentos.
Dou um toque na porta antes de abri-la e sorrio quando Travis ergue as sobrancelhas me
fitando atrás da sua pomposa mesa.
— O que está fazendo aqui? Não deveria estar cuidando dos preparativos com Marinne?
— Eu já estou indo — respondo caminhando até ele, e por estar só, fico à vontade. Paro na
sua frente, me inclino e lhe dou um beijo. — Mas antes vim dar um beijo no meu Capo.
Seu olhar fica penetrante e quando dou por mim, estou no seu colo.
— Se é assim — diz e agarra minha nuca.
Guiando minha boca a sua. Seus lábios furiosos e quentes acariciam os meus, então sua
língua invade minha boca impacientemente. Soluço um gemido e o beijo tão forte quanto. Apoio
minhas mãos em seu peitoral, tomando cuidado para não amarrotá-lo. Precisamos ser discretos.
O beijo não é tão duradouro quanto intenso, e mesmo assim fico sem fôlego.
— Agora você pode ir para casa — Travis fala com sua voz rouca na minha boca e dá um
aperto na minha bunda.
Solto uma gargalhada e dou-lhe um selinho antes de sair do seu colo.
— Sim, senhor, meu Capo.
Vejo-o abrir seu sorriso discreto que apenas eu conheço. Nesses momentos eu esqueço o que
somos, o que cometemos, porque a maior sensação que tenho é sobre o amor. As vezes acho surreal
que em agosto, quando é a festa do Bellagio, iremos fazer quatro anos juntos. Mesmo que para todos
os quatro anos só constam em dezembro quando casamos.
Mais um pedacinho do livro Escolhida Para ele

Eu nem acredito que estou fazendo dezoito anos. Okay, basicamente já tenho. Hoje é apenas a
festa do meu aniversário e me dá um frio na barriga porque daqui a seis meses eu vou para Nova
York.
Tentando acabar um pouco com a minha ansiedade, pego meu celular de novo e procuro o
nome dele. Encontro logo de cara uma reportagem feita por uma revista famosa. E fico alguns
minutos admirando sua fotografia todo de preto e o rosto marcado pela mandíbula rígida. Não parece
relaxado por ser fotografado. Okay. Os Homens Feitos nunca gostam de ser expostos e em público
são extremamente cautelosos para não dizer desconfiados.
Fitando melhor seu rosto tenho a clareza de que nunca tinha percebido, quando era mais nova,
o quanto Amândio é bonito. Agora que eu tenho um pouco mais de noção e não sou mais criança,
percebo como ele realmente é lindo... e atraente. Não o vejo mais com os olhos de que ele é um
estranho, um homem mais velho do que eu. Talvez ele se torne um marido cruel como muitos ou me
surpreenda sendo como o meu irmão é para a sua esposa e filho.
O que sinto agora passa de uma ansiedade enorme para uma curiosidade tentadora. E por isso
fiquei tão chateada por ele não ter vindo me ver nos últimos dois anos. Ele fez questão de dar os
presentes nos dias comemorativos, mas nunca com uma palavra sua. Para mim, eu não tive nada. Não
sou ligada a bens materiais. Isso Travis sempre me deu, até demais.
Ele sumiu desde o meu aniversário de dezesseis anos e não me lembro se falei ou fiz algo. Se
aconteceu alguma coisa que o chateou. Droga! Homens como Amândio não ficam chateados.
E depois de tanto tempo sem vê-lo, eu estaria mentindo se não quisesse ele aqui hoje. Queria
que viesse pelo menos neste aniversário, que será o meu último em Las Vegas, mesmo estando bem
zangada por ele ter desaparecido como se eu não fosse nada, absolutamente nada, apenas um
casamento estratégico. Como se ele não tivesse honrado o acordo com Travis de me conhecer nesses
três anos de noivado.
Meu irmão só não ligou, ou reparou sua ausência, porque talvez eu não me senti mal
“visivelmente”, não reivindiquei, não reclamei e foram tantas coisas que ele teve que enfrentar
nesses últimos anos que tudo bem mesmo Amândio não vir.
Respirando fundo, fecho o aplicativo de fofocas, coloco meu celular em repouso e largo em
cima da escrivaninha do quarto.
No espelho ajeito os meus cabelos, que cortei para ter um visual novo de dezoito anos.
Estava muito grande. Agora eles estão um pouco abaixo da altura dos meus seios. Gostei da minha
nova aparência. Pareço mais adulta e as aulas de yoga e bike na academia deixaram meu corpo seco
e a professora (Travis não deixa que eu fique perto de outros homens, só Mario meu guarda-costas)
disse que ganhei massa magra, e levando em conta que minha calça jeans mais justa não dá mais, sei
que é verdade. Meu bumbum está maior e durinho. Eu gosto de me cuidar, distrai minha cabeça. Isso
quando não estou lendo, vendo séries ou aprendendo a desenhar no iPad ou no papel mesmo. Toda
menina da máfia é prendada, tem seus dons. O meu é os desenhos.
Sorrio lembrando-me dos comentários que não tenho mais carinha de criança e que eu
poderia ser modelo. Sempre rio disso porque nunca vai acontecer. Eu me expor desse jeito? Talvez
em outra vida.
Ajeitando o decote, para não aparecer demais, do meu vestido e colocando uma jaqueta de
couro que ganhei de Dario, passo o gloss de morango de novo na minha boca, coloco meu celular na
bolsa e saio do meu quarto.
Descendo as escadas correndo, vou direto para a cozinha escutando Dante gritar.
— Ei, garoto, o que que você está fazendo aí?
— Irmã! — Ele vem me abraçar e eu abro um sorrisão.
Adoro o fato de ele achar que eu sou sua irmã e não tia. Bem, eu também não gosto de me
sentir tão velha ao ponto de ser tia e o amo como se fosse o meu irmão. Eu o amo demais e já sinto
muito sua falta.
Pegando-o no colo, beijo seu rosto e ganho um beijo também. Nosso príncipe não é mais um
neném pequenino com seus dois anos e meio, mas ainda meu bebê elegante. Madeleine gosta de
vesti-lo como Travis. Um mini Capo como todos falam.
— O que você está aprontando?
— Quero bolo.
Solto uma gargalhada.
— Bolo só mais tarde, agora não.
— Bolo!
— Escuta, hoje é meu aniversário e terá bolo.
Ele toca meu peito com o seu dedinho e concorda com um aceno. Dante está lindo com uma
calça e blusa social preta. Já está se habituando a vestir preto.
— Que tal a gente brincar no quintal e depois a gente come bolo?
— Mas já está quase de noite.
— Eu sei, Dante, mas agora não.
— Dante! — Escutando alguém chamá-lo, viro-me.
— Mamãe. — Ele estica os braços e Madeleine o pega no colo.
— O que que você quer?
— Ele quer bolo, mas já disse que só mais tarde.
Ela vem para mim, me abraça de novo e fica conosco nos braços, embora esteja só me
abraçando e ele no colo.
— Hoje tem festa — Madeleine fala como se fosse um segredo, nos fazendo rir.
— Senhora Lozartan.
Vemos Luigi aparecer, roubando nossa atenção.
— O que é?
— Já está na hora.
— Oh sim, sim. Eu sei — ela fala e vira-se para mim. — Você deixou sua bolsa pronta?
— Larguei na sala antes de vir para cá encontrar esse monstrinho.
Dante segura minha mão antes de eu conseguir apertar suas dobrinhas. Enquanto ele for
criança, será tratado como tal.
— Então vamos. Travis já está nos esperando — Madeleine comunica e vira-se para Luigi
colocando-se em movimento. — Ligue para Dario e o mande ir para lá logo. Não quero que se atrase
e não aceito que não vá.
Luigi assente e some pelas portas da casa. Eu viro-me para Madeleine e beijo seu rosto.
— Sou tão feliz por você existir.
Ela me dá um sorriso neutro e pega minha mão apertando.
— Eu também sou feliz por estar aqui.

Hoje como será meu aniversário de dezoito anos, um dia histórico, e acho que Travis está
tentando se despedir de uma forma escandalosamente glamorosa sendo a última festa de aniversário
que ele poderá me dar, que realmente estarei em casa. Minha festa será no salão clássico do
Bellagio.
No quarto do hotel, eu subo para o quarto de luxo que Travis reservou para mim. Não é o
máster, porém é um dos melhores e não estou no top dos top porque não quis. Eu pedi a ele para ser
uma garota normal hoje. Ele riu e disse: “Você não é normal, mas te darei o que pede”.
Depois de umas horas na banheira, relaxando e esfoliando minha pele. Saio para começar a
me preparar. Uma cabeleireira vem fazer meu cabelo. Só escovei e ondulei as pontas. Logo que estou
a sós de novo, eu me apronto.
Parada em frente ao espelho de corpo inteiro do quarto, me olho e mordo o lábio por estar
tão “não eu”. Hoje não sou a doce menininha de Travis que todos temem encostar desde que ele me
assumiu.
Uso um vestido vermelho colado ao meu corpo até o alto das minhas coxas e solto pra baixo.
Ele tem uma fenda da altura da minha coxa direita até o chão. É lindo e sexy. Segura bem meus
peitos, que graças a muitos exercícios, genética e alimentação são firmes e não muito grandes.
Minhas sandálias prateadas com diamantes cravados. Na minha boca escolho um batom nude com o
gloss de morango para combinar com a maquiagem leve, apenas o delineador de gatinho que adoro.
Estou um escândalo, mas Travis não poderá falar nada contra. O vestido é até comportado e
Madeleine que escolheu comigo, e como ela é minha mãe, ele não tem que falar nada.
Botando perfume de novo, estou prestes a sair quando paro encarando a porta. Respiro fundo
lembrando do colar.
Então eu volto vou até minha mala e acho o presente. O primeiro presente que ele me deu. O
colar de coração de rubi. Eu nunca usei. Achei que era demais para mim naquela época, mas hoje...
Por fim, pego e me encarando no espelho coloco ele sobre o meu colo. Analiso se uso ou não
hoje. Tiro de cima de mim, coloco de volta e com toda a coragem do mundo o coloco de uma vez. O
frio dos diamantes na minha pele me deixa arrepiada e o peso do rubi é até confortável sob meu
pescoço. Sorrio satisfeita porque combinou.
— Perfeito — digo em voz alta.
Saio do quarto e chegando na sala, alguém bate na porta e eu saio do meu devaneio de me
fingir ser outra garota hoje. Nossa, já deve estar na hora de descer.
— Eu já vou — grito e pego meu celular na mesa. Ajeitando meu cabelo abro a porta e meu
coração parece que cai nos meus pés. — Amândio.
— Oi, Marinne — ele me cumprimenta.
Acho que parei de respirar.
Ele realmente está na minha frente depois de dois anos e se eu estava achando ele bonito nas
fotos, pessoalmente ele arrancou meu fôlego. Meu Deus!
Ele parece mais maduro, seguro e firme. Está todo de preto e o seu cabelo agora está mais
baixa e escuro. Não lembrava que era tão castanho. Seu rosto tem uma barba por fazer cultivada e a
parada, parece que arranha. Seus olhos cinza profundos e intensos como eu me lembrava.
Consigo perceber debaixo do paletó seus músculos tão aparentes e na mão direita tem um
anel no dedo mindinho e não sei se é, mas parece uma tatuagem saindo por debaixo do colarinho da
camiseta. Ele não está de camisa social. Dá para perceber também o couro do coldre por baixo do
paletó. Calça, camisa, paletó e sapatos preto. Perfeitamente pretos e polido.
Engulo em seco com toda a parcimônia que consigo para ele não enxergar meu nervosismo e
volto meu rosto para o dele.
Madre del cielo!
Ele é tão... É extraordinariamente bonito.
— Posso entrar? — Ele pergunta.
— Não acho que é apropriado. — Olho para Mario, meu segurança do outro lado do
corredor olhando para mim.
—Eu já pedi e me falaram que não tem problema. Só quero — ergue a mão mostrando o
embrulho de presente — entregar isso para você.
Tem uma musiquinha boba na minha cabeça nesse momento.
Sorrio e dou de ombros. Ele e essa mania de me entregar presente sozinho.
— Tudo bem, se deixaram.
— Cinco minutos — Mario fala alto.
Amândio não olha para ele quando diz:
— Não se preocupe. Cinco minutos.
Segurando a respiração, deixo que ele passe por mim e feche a porta. Observando ele indo
mais para sala parando quase no limite das portas do meu quarto, solto o ar lentamente e caminho até
ele.
Amândio se vira e me encara com tanta intensidade. Porra! Eu juro que estou tentando
respirar normal, mas meus pulmões falham. Acho que preciso de um balão de oxigênio.
— Eu trouxe isso para você da Itália. Espero que goste.
— Era lá que você estava? — digo sem me mexer para aceitar o presente.
— Como? — ele franze a testa e chega mais perto, diminuindo nossa distância e sinto seu
perfume. O cheiro almiscarado de perfume masculino seco e não enjoativo. Na verdade, é viciante.
— Esse tempo todo que você me ignorou estava na Itália?
Eu cheguei a ler sobre ele estar na Itália, mas nada confirmado pela Darkness.
— Na verdade — ele dá outro passo e agora dá para observar melhor os traços do seu rosto
— eu precisei ir.
— Podia ter ligado. Dado um sinal de alerta, qualquer coisa. Achei que não o veria hoje só
no casamento. Quebrou o acordo de Travis de nos conhecermos.
— Marinne — range os dentes e coloca a mão livre dentro do bolso. — Saiba que não foi
minha intensão sumir por tanto tempo.
— Tudo bem, mas perdemos a oportunidade de nos conhecer. — Eu não deveria me sentir tão
abalada por isso, mas fiquei porque no fim ele é um estranho. Não sei nada sobre ele além do óbvio
e vou precisa dormir na mesma cama. Morar na mesma casa e numa cidade nova da noite pro dia.
— Vou tentar compensar.
— Como exatamente? — De onde está vindo tanta coragem?!
Então ele está perto de mim, bem perto de mim, tão perto de mim que eu quase perco ar e
seja o que tiver dentro do embrulho, ele deixa cair no chão e sua mão desliza pela minha cintura,
puxando-me ao seu encontro e a mão que estava no bolso chega no meu rosto.
Congelo e apenas sinto seus dedos correndo pela minha nuca e ele toca sua boca nos meus
lábios. Em choque me dou conta de que: Ele Ac a bou D e Me Be ija r! Rápido como uma promessa. E me
surpreende novamente deixando um beijo na minha testa antes de encarar-me nos olhos.
— A gente tem a vida toda para nos conhecermos. Não liguei porque não podia, estava a
negócios na Itália e não foi minha intensão deixá-la chateada.
Sinto como fosse um pedido de desculpas sem as próprias palavras. Um Homem Feito não
pede desculpas, não lamenta, não diz: sinto muito.
— Eu não cumprir minha palavra, sei disso, mas quero que saiba que honro meus
compromissos e que não fiz porque realmente não foi possível, Marinne.
— Está com medo do meu irmão?
— Se eu tivesse não tinha acabado de te beijar.
Isso faz eu abrir um sorriso e assentir. Seus olhos ficam escuros, o azul sumindo, ficando
totalmente cinza.
— Já tinha sido beijada? — ele pergunta.
— É claro que não — falo rápido. — Eu sou sua desde os quinze anos. Nunca cheguei nem
perto de outro homem e...
Sou interrompida por sua boca afoita beijando-me de novo. Suas mãos seguram meu rosto e
mesmo que não coloque força, o jeito que seu corpo projeta-se, o jeito como domina até o ar em
nossa volta. Seus lábios amassam os meus e curiosa abro os meus. Sinto a umidade da sua língua
tentando contato e permito.
Meu corpo todo se arrepia, meu coração parece que quer parar ao mesmo tempo que acelera
como um motor de um carro subindo uma ladeira. Seu jeito de lamber minha boca parece que sou um
aperitivo, que está me dando uma mostra e fico agitada. Fecho minhas mãos soltas ao lado do meu
corpo. Não sei o que fazer. Se retribuo, agarro ou empurro ele. Não sei de nada porque ele me beijar
é bom. É incrível.
Respirando fundo, ele dá um beijo rápido e seco no meus lábios, se afasta acariciando meu
rosto, colocando o cabelo atrás da minha orelha, seus olhos focam no meu pescoço e algo primitivo
reflete neles.
— Você está usando.
Olho para o mesmo local e entendo que está falando do colocar de rubi. Levanto a cabeça e
fito-o.
— É claro.
— Quando eu te dei imaginei você assim; uma mulher linda, não uma menina doce demais
usando.
— Era assim que você me via? Uma menina? Uma criança?
— Eu via você da mesma forma que olhava para minha irmã mais nova. Para mim era
inaceitável ter qualquer tipo de pensamento além deste com você.
— Você tem moral — solto e me arrependo.
— Sobre isso sim.
Como dou de ombros, ele se afasta de uma vez, não antes de acariciar meu lábio inferior com
seu polegar.
— Ainda me vê como criança?
— Acha que sim depois de beijar você?
— Não — murmuro.
Recuperado, se agacha com toda elegância e pega o embrulho. Levanta-se e me entrega.
— Espero que goste.
Sorrio com educação e desembrulho. Vejo que é uma caixa de veludo como a do colar de rui
e pergunto a ele.
— Outro cordão?
— Esse é um colar de família, por isso espero que você goste.
— Está bom — digo com um sorriso e olho para a caixinha, abrindo-a vejo um colar
totalmente diferentes do outro. Esse é de ouro, cordão simples com um pingente pequeno, um
crucifixo adornado de ouro de 3 cm.
— E esse é do meu avô.
Franzo a testa e pego uma nova caixinha, abro e encontro um relógio de ouro fino, simples da
Ralph Lauren.
— Adorei. Muito obrigada e estou em choque com o presente dele.
— Eu estava por lá e ele quis lhe dar boas-vindas a nossa família.
Isso significa muito em nosso círculo. Alguns podem até nutri uma raiva de mim por inveja.
Não é todos que tem essa honra de Cassio D’Ângelo. É notória sua frieza.
— Espero ter a oportunidade de agradecer pessoalmente a ele.
— Você terá em nosso casamento.
Assinto e voou colocar os presentes sobre a mesa. Voltando, Amândio me olha dos pés a
cabeça e de novo o olhar primitivo, quase perigoso quando nossos olhos se encontram de novo.
Limpo a garganta e ele olha o relógio.
— Acho que os cinco minutos já acabaram e se você não quer que Mario entre e tente lhe dar
um tiro, é melhor sair.
Dando dois passos, acaba com nossa distância e murmura com a voz perigosa.
— Ele nem teria chance — o sorriso perverso cruza seu rosto e se afasta. — Mas é melhor ir.
— Sim — dou de ombros. — Eu também já estou indo.
Concorda com um simples aceno.
— Antes limpe sua boca e retoque o batom.
Um frio na minha barriga quase faz eu vomitar de nervoso e corro para dentro do quarto.
Escovo os dentes, coloco spray bocal, retoco a maquiagem perto da boca e coloco o batom com
muito gloss. Merda se Travis souber. Nós apenas nos beijamos, eu sei, mas é contra as regras de
etiqueta.
Encaro-me no espelho, vejo um sorriso de vergonha misturado com nervosismo e coloco
mais perfume.
Inspiro e sentindo-me pronta, vou ao seu encontro, que permaneceu parado no lugar e quando
me vê, se aproxima e põe a mão em minhas costas. A sensação. Aquele calor de novo volta e
percorre todo meu corpo e parece explodir no meu coração.
Nós saímos do quarto e ele se afasta imediatamente vendo a cara de Mario que não está mais
do outro lado do corredor. Está ao meu lado e gentilmente sem me tocar me direciona a ficar do lado
oposto de Amândio.
— Temos um trato, não temos?
— Pelo fato de você ter cumprido os cinco minutos, não vou falar — Mario fala bem sério.
— E não acredito que tenha acontecido nada.
Acontecido nada?
— A senhorita Marinne pode confirmar — Amândio fala olhando em meus olhos.
Engulo em seco e fito Mario.
— Ele só me deu meu presente.
— Então tudo bem e ela é seu noiva, o que é que eu posso fazer.
Prefiro manter essa conversa em sigilo, Travis o mataria. Na verdade as tradições pedem que
a gente não fique sozinho antes de estar oficialmente casados para não correr o risco de quebrar a
nojenta tradição do lençol da virgindade. Essa droga é tão antiga e cruel com as mulheres. Acho que
a Cosa Nostra não deveria ter se inspirado nos ancestrais sobre isso. É repugnante. Espero que um
dia seja abolida de uma vez por todas.
Quando vi o lençol da nova esposa de Paolo corri para vomitar. Quando Madeleine e Travis
casaram eu não tinha noção disso, era proibido para mim porque era muito jovem, e eles nem se
preocuparam em honrar essa droga porque o noivado e relacionamento deles quebrou inúmeras
tradições. Sem contar que mesmo que tivesse que fazê-la não teria como pelo ocorrido pós
cerimônia.
Assentindo olho meu noivo, que estava me olhando e sussurro:
— Está tudo bem.
— Certo, agora vamos senhorita.
Sem dar mais nenhuma palavra, dou um aceno para Amândio, viro-me com Mario e o outro
soldado, e caminho pelo corredor com o pensamento no meu primeiro beijo. Errado ou não, foi o
melhor presente deste dia porque matou uma enorme curiosidade. Acho que gosto de beijar.
Outubro de 2017

A situação da Lawless andou muito bem durante os quatro últimos anos. Não tenho o que reclamar
sobre a lealdade de Paolo e Luca, que são os meus braços e estão dispostos a defender nossa
Famiglia com suas vidas, embora para Paolo ficou mais estreito esse tipo de decisão. Ele pode
esconder o quanto for e de quem quiser, mas sei que seu casamento não é mais para agradar nossas
tradições e ter uma mãe para sua filha.
Por sorte, Luca continuou sendo um baderneiro sanguinário, não se casou e se tem um filho é
porque não consegue segurar o pau – até hoje – nas calças. O garoto foi um problema a ser resolvido
com urgência e tendo minha interferência.
Filhos bastardos recebem muitos olhares de repudio e Remo foi descoberto quando já estava
para completar quatro anos, e justamente em dois mil e treze. O ano quando todos já estavam de olho
em mim por conta das decisões de Colen.
Ah, Colen. Meu irmão. Sempre pensei que ele seria meus braços, ouvidos e se acontecesse
algo, meu sucessor até um filho meu poder tronar minha cadeira. Então fez sua escolha de mulher e
gerou um conflito direto com a Bratva. Que interferiu nossa aliança com a Darkness, e nós mesmos.
Muitos soldados questionaram-me e depois de anos, meu avô voltou a Las Vegas. Foi uma merda das
grandes e por pouco não gerou uma guerra generalizada que teria que vir interferência da própria
Cosa Nostra e a Camorra. Quis de verdade matá-lo. Eu tinha uma merda de corda no pescoço: ele
ou eu.
No fim tudo se ajeitou, mesmo eu sabendo que alguns soldados não aceitaram o ultimato dado
entre eu e meu avô sobre o assunto.
Amândio ponderou, mas tocou o foda-se e saiu de cena, rápido até demais. Tive a sensação
de que Marinne teve tudo a ver com sua decisão final, e Cassio não apoiaria o neto entrar em guerra
conosco por tão pouco.
A Bratva recuou com o rabo entre as pernas assim que a Camorra mando-lhes um aviso no
estilo dos filhos da puta russos. Atualmente estamos “civilizados”. Nós não nos tornamos amigos,
isso jamais, nunca, acontecerá, mas por enquanto estamos nos ignorando. Silêncios e esperando o
passo errado do outro para atacar. Sei tanto disso que duro com um olho no Texas e Chicago, onde
eles estão mais fixos nos conflitos.
E no final de dois e quinze tive algo a comemorar com direito a promoção nos cassinos e
bônus para os meus soldados. Vitorio Malvez morreu.
Enfim, Malvez saiu de vez do meu radar da forma que eu adoraria ter feito com minhas
próprias mãos. Ele mereceu e espero que agora a Blood Hands tenha um líder mais firme, mesmo
sabendo da juventude de Santino D’Antônio. Entretanto, com Cassio D’Ângelo supervisionando-o de
perto, não terá erro.
Antonio Basso está cada ano mais fraco e não vejo uma melhora para sua retaguarda, a não
ser um acordo com uma das Famiglia, e isso só faz Amândio querer com mais ímpeto o território
daquele gordo imundo. Se ele for pra guerra, acredito que Santino não interferirá e eu com certeza
ajudo. Eu não amava meu pai, nunca amei, porém ainda quero vingança contra Antonio por
compactuar com Vitorio.
Enquanto os outros territórios têm seus próprios problemas, o meu foco é a preocupação de
proteger meu filho e esposa. Estou puto e aflito com as invasões aos estabelecimentos da Famiglia
em Reno. Os malditos dos MCs não querem me ouvir quando devolvo os corpos cortados dos
invasores. Eles continuam causando tumulto as luzes do dia pela cidade, deixando a polícia em
alerta. Alguns eu tive que mandar matar porque não aceitaram dinheiro para ficarem quietos. E agora
eles partiram para Las Vegas. Não sei quanto tempo vou manter minha forma blasé de exterminar os
“problemas”.
Estou mantendo meu monstro recuado porque se ele sair não conseguirei voltar para casa e
abraçar minha esposa e filho. Dante é pequeno demais para lidar com esse meu lado ainda.
Paolo anda me pressionando sobre o assunto e com minha conduta. Brigamos ontem por ele
me acusar de estar amolecendo por culpa de Madeleine. O desgraçado disse que estou com medo.
Cazzo. Eu não tenho medo de mostrar minha verdadeira natureza, tenho medo do depois. Invés de me
acusar de tal coisa deveria me perguntar como enjaular meu lado sádico de volta na masmorra.
O foda é que não tenho apenas sua voz na minha cabeça.
Meu avô, depois que a avó morreu ano passado, quer meu lado furioso de volta. Enzo e Luca
me dão olhares questionáveis quando os ordeno a cuidar dos MCs ou abater soldados inimigos.
Antes eu ia junto.
Sei que preciso voltar a sujar minhas mãos de sangue. Eu nasci para isso, não sou a merda de
um empresário milionário dono de cassinos e hotéis, como as revistas falam. Eu sou um assassino.
Um demônio em carcaça de humano. Estão me provocando para ser mau. Bene, eu serei o pior, mas
com a minha mulher não.
Manter meu lado civil demorou muito para aprimorar, mesmo que em casa por Marinne eu
sempre tivesse cuidado, era apenas nos fins de semana. Então Madeleine veio e eu precisei guardar a
fera todos os dias, falhando algumas vezes.
Respirando fundo, ajeito a arma no coldre debaixo do paletó e saio do carro. Encaro a
faixada da minha casa e passo rápido pelos degraus.
Depois de uma manhã cheia e uma reunião com meu avô que voltou a morar na antiga casa em
Paradise, chegar em casa era tudo que eu precisava.
Na porta, sinto meu celular vibrar e atendo.
— Por que é tão difícil falar com você?
— Estava ocupado. Por que tanta urgência? — Ruge do outro lado da linha Colen.
Esse envolvimento demais com as pessoas de fora o deixaram literalmente fora dos
negócios e eixo. Eu gosto de Ethan Brown, o cara é um excelente homem e também guarda dentro de
si uma fera. Reservada a cuidar da sua esposa e filhos. Ele foi uma aliança que gostei de fazer,
mesmo meu avô odiando a ideia.
Merda. Nós nossos parceiros e ele me paga para cuidar da segurança da sua família como
nenhum outro afiliado a Famiglia faz. Ethan e eu temos algo absolutamente em comum. Eu não
descanso quando o assunto é a segurança da minha família também.
— Os Brown tiveram problemas de novo?
— Não. Está tudo tranquilo em Malibu e Vito me contatou para dizer que o Underboss de
São Francisco anda irritado com o Consigliere. Vou precisar cuidar disso.
— Você está aonde? — Pergunto já sabendo da resposta.
Eu não sei o que Colen viu em Los Angeles, mas nunca mais foi o mesmo, principalmente
depois que a esposa de Ethan foi sequestrada e quase morreu. Algo me diz que ela lhe deu gatilhos
profundos sobre Kira.
Colen preferiu migrar para Califórnia, levar nosso executor mais brando com mulheres, Vito
para ser seu Testa, virar o Underboss e mandar Orazio cuidar de San Diego.
O estado é grande para precisar de três subchefes, e todos sabem que Colen optou ficar por
lá por dois motivos. Os Brown e os olhos enojados para sua esposa. Fez isso por si mesmo e por
mim. Quase um exílio para proteger-me das más línguas dos Clãs tradicionais demais que nunca vão
aceitar uma mulher da Bratva entre nós, principalmente na família do Capo.
— Na estrada. Rocco está no comando e Vito está comigo.
— Certo. Quando chegar em São Francisco me ligue e fala o que está acontecendo.
— Claro — responde e desliga.
Colocando o celular no bolso, entro em casa com a sensação apaziguadora. Vou direto para o
quintal ouvindo os gritos de Dante, os latidos dos cachorros e Maria, a babá.
Nas portas duplas vejo Maria sentada no gramado, um pouco ao longe da área da piscina,
batendo as mãos para Dante. Ele grita e corre em sua direção, mas quando me vê alarga seu sorriso e
vem para mim.
— Pai! — Grita com sua voz infantil de cinco anos.
Deixo escapar um riso fraco e me preparo para o seu ataque em minhas pernas.
— Ciao, mio piccolo capo — falo em italiano, porque ele gosta e quero que saiba a língua
de origem da nossa família. Nós falamos em inglês e italiano em casa.
Pego-o no colo e ajeito sua camisa social. Adoro que ele já goste de vestir preto e quer me
imitar. Sinto falta da Marinne rindo disso e falando que Madeleine é tão apaixonada por mim que
quer fazer do nosso filho minha cópia.
— Onde está a mamãe?
— No trabalho. Vou lá busca-la daqui a pouco — respondo e observo-o mexer na gola do
meu paletó.
Amo esse garoto. Minha carne e sangue. Eu sangrarei por ele e matarei. Estão todos errados
pensando que enfraqueci por conta da superproteção com minha mulher e filho. Eu vou mostrar que
não e aí todos se arrependerão.
— Posso ir com você?
Antes que eu responda, meu celular vibra de novo. Beijando sua testa, coloco-o no chão e
atendo Paolo. Não é coisa boa. Ele não me liga à toa.
— O que houve?
— Achamos Gabriel.
Assinto em automático sentindo a cólera passar por mim. Pelo visto o monstro voltará a
superfície antes do esperado.
Com uma afobação incomum, me guiam para fora do Bellagio e eu vou acompanhando seus
passos largos e olhares sabidos. Quem sabe sobre nós, não disfarça a curiosidade, os alheios deve
pensar que sou alguém importante. E, a verdade, é que sou mesmo.
— Por que tanta pressa pra me fazem ir embora? — pergunto para o motorista.
— Foram ordens do senhor Travis.
Se não fosse nada grave, ele não mandaria eu ir pra casa, não é comum. E quando Luca entra
no carro com Luigi ao telefone na parte da frente, meu sangue gela.
— Me fala o que que houve — peço a Luca.
— Não tem nada.
— É claro que tem alguma coisa errada. Travis não me manda pra casa desse jeito. — Ele
não me trata assim. Está nitidamente me dando um ultimato. — Então me fala o que que foi, Luca.
Ele respira, pensativo e acaba cedendo.
— Encontramos Gabriel.
— Filho de Orazio?
— É.
Meu coração para um batida e penso em Bárbara. O irmão dela tinha fugido do território da
Lawless depois de matar dois soldados. não se sabe a razão e pelo que tono no timbre da voz da
Luca, saberão esta noite.
— Para onde o levaram?
— Para o lugar de sempre. A balcão. Faremos uma reunião com Vincenzo, Orazio e Travis.
Balcão seria melhor dizer; lugar de sacrifício. E reunião é uma forma muito singela de dizer
o que eles fazem lá. Mesmo que de vez em quando se reúnem para falar sobre distribuição de drogas
e armas, e alguns planos de retaliação contra os motoqueiros, os mexicanos e a maldita Bratva.
— Então você vai me levar pra lá.
Há algum tempo Travis anda pensativo e com o olhar frio. Tenho receio do que possa fazer.
Independente da sua causa, Gabriel irá morrer.
— Sabe que não é pra você ficar se envolvendo nesses negócios. Só deixaram você
participar uma vez, Madeleine. Por favor, não peça isso.
— Está me pedindo por favor, então tenho boas chances de você aceitar. — Mudo minha
postura, largando minha bolsa pro lado e me inclinando para encarar seus olhos azulados. — Então
em vez de fazer eu gastar minha saliva, me poupe mandando o motorista ir pra onde está o meu
marido.
— Travis não deveria te dar tanta ousadia.
Dou um suspiro irritado, sentindo minhas narinas alargar e fixo meus olhos nos seus,
apertando e intimidando.
— Nunca mais você vai repetir isso para mim, Luca Bracy — digo entredentes e sentindo
meu rosto repuxar de ódio. — Eu sou o que preciso ser. Meu marido não reclama, então quem é você
pra falar alguma coisa.
— Madeleine...
— Pode ser — interrompo-o — que você esteja preocupado do que Travis vai pensar de eu
ter te persuadido tão bem pra me levar aonde eu quero, quando eu quero. Talvez ele queira arrancar
um dedo seu. — aprumo a postara. — Resolvo com ele depois. Você não está fazendo nada demais e
tudo que eu for ver lá, não vai ser grandes coisas pelo que eu já passei. Mas nunca mais pense em
falar comigo como falou.
Engolindo a saliva visivelmente puto, acena que sim.
— Tudo bem, Madeleine. — Ele bate na parte que divide o espaço do motorista e ordena: —
Vamos para o balcão.

Respiro fundo e caminho pelo corredor escuro do prédio maior do balcão. Luca vem atrás de mim
falando sem parar com Luigi. Os dois as vezes fazem minha segurança. Bem, a verdade, é que Luigi e
Luca só ficam atrás de mim quando Travis não está. Eu não acho isso uma coisa ruim, mesmo muito
puta com Luca no momento, eles são mais treinados e capazes do que eu em um eventual ataque a
mim.
Chego no andar e corredor onde fica os quartos dos cativos e tortura, e respiro fundo de
novo. Apreensiva, lembro de Travis sendo um prisioneiro e meu estômago embrulha.
O corredor tem uma mancha de sangue enorme e o cheiro de ferro é terrivelmente nojento e
enjoativo. Quando viro para o quarto que Luca entrou antes de mim, arregalo os olhos vendo Travis
apertar sem vacilar com as duas mãos o pescoço de Gabriel coberto de sangue e cortes no abdômen
feito por facas e umas parecem unhas.
Engulo em seco percebendo que Travis não está de luva e ele sempre fala que odeia sangue
nas unhas. Mio Dio.
Vislumbro a fera que todos ainda tem muito pavor de provocar. Muitos dos homens de Travis
tem receio de dizer algo e deixá-lo desenfreado.
Inicialmente fico um momento em silêncio porque não quero que ele perceba que estou aqui.
Ele continua estrangulando Gabriel com os olhos admiradores de Paolo e Luca.
Mio Dio. Ele não vai parar.
Assim vai matar Gabriel sufocado em seu próprio sangue assim que conseguir quebrar seu
pescoço, e não demorará muito pois escuto daqui um dos ossos instalarem no pescoço de Gabriel e
ele segurar com toda força, os mãos entrelaçadas em volta do seu pescoço.
— Travis?
Ele nem me ouve, focado em sua vingança.
— Travis? — chamo de novo e de novo.
Finalmente ele respira. Pisca os olhos como tivesse em transe e vira o rosto lentamente pra
mim. Eu não preciso perguntar a ele que está desapontado e enfurecido por me ver aqui. Engolindo
em seco, respira profundamente e como se fosse um pedaço de pano velho, joga o homem no chão
que está banhado de sangue e caminha até a mim com passos largos, que parece que vão quebrar o
chão.
— O que você está fazendo aqui? — diz com sua voz gélida. — Eu mandei Luca te levar pra
casa.
— Você não me manda, Travis.
Seus olhos ganham um brilho perigoso, mas sei que nunca me machucaria.
— E por que que você está tentando matar aquele homem com a suas próprias mãos? Você ia
esmagar o pescoço dele. — Arregalo os olhos pois é terrível demais.
— Não se meta em como faço meus serviços, Madeleine.
Eu não consigo enxergar o meu marido agora, mesmo assim dou dois passos, um palmo nos
separando, e fito dentro dos seus olhos tentando enxergar o real motivo desse ato.
— O que que está acontecendo?
— Nada! — Ele responde seco.
Balanço a cabeça me recusando a aceitar sua resposta.
— Me fala. Apenas me fala o que que é.
Eu consigo não apenas ver como ouvir ele cerrar a mandíbula. Ouvir os dentes batendo um no
outro e quando sua mão segura o meu antebraço tem uma força, um toque e um peso brutal.
Ele me leva para fora do quarto. Seguimos por uma escada e quando dou por mim estamos
num quarto. Bate a porta com toda força e me solta no meio de um quarto até visualmente decente
para onde estamos.
— Não se meta nos meus negócios.
Sinto meu queixo tremer e fico irritada por parecer fraca assim.
Mio Dio! Acho que sei o que é. Porra. Eu realmente não sei o que fazer se for o que eu acho
que é.
— Qual o motivo disso.
— Madeleine — me avisa, porém não recuo. Não tenho medo.
— Me diga.
Após uma longa pausa, inspirando e expirando como tivesse correndo uma maratona,
murmura raivoso:
— Eles estão duvidando de mim.
Franzo a testa e meu coração parece que faz o mesmo, se esmaga porque odeio toda essa
animosidade que representa todos nós.
— Eles estão achando que estou fraco, que estou mole, que perdi a minha garra de antes.
— Estão querendo dizer que você ficou bonzinho?
— Não leva na brincadeira — fala áspero.
— Eu não estou — digo afirmando. — Só acho um absurdo. Nós estamos casados há cinco
anos e quantas vezes você saiu e fez o que tinha que fazer?! Matou, torturou e sacrificou quem tinha
que receber seu ódio. Você cortou em pedaços, sem remorso o cara do Beauty. E ainda chegou em
casa e transou comigo como um selvagem e conseguiu dormir tranquilamente. Você ainda é o
mesmo... — pauso pra respirar. — Quer que eu fale alto?
Seu semblante fica mais fechado, raivoso e o brilho nos seus olhos é de puro ódio. Odeio de
si mesmo.
— Você ainda é um monstro — as palavras me ferem. — Ainda é o bicho papão que todos
eles têm que temer, mas não é com sua esposa, seu filho e nem com seus irmãos. É assim que tem que
ser um homem de honra. Então, se você está me dizendo que acham que você ficou mole por causa
de mim e de Dante, lamento informar que vai piorar.
— Por quê? — Franze a testa e vislumbro meu marido agora.
— Eu estou grávida, Travis.
Seu rosto mostrar a batalha interna e mesmo sabendo que estou lhe colocando mais pressão,
continuo.
— A forma como você quer matar Gabriel porque traiu a Lawless, se for da sua vontade,
faça. Ele merece que você o mate e parta em pedaços, taque fogo, afogue, mas se não for por você,
liberte-o.
— Você não me dar ordens. — Segura meus braços firmemente.
— Não. Eu não te dou ordens, mas você sempre escuta meus conselhos e sinceramente se
Paolo pudesse falar com você, aconselharia a mesmice coisa.
— Como se ele me pressiona também.
— Então foda-se, Travis. Você não precisa provar nada pra nenhum desses filhos da puta.
Você é ainda o mesmo carrasco para os que roubam, traem e causam desordem para sua cidade e a
Famiglia. Você não precisa sacrificar suas convicções pra provar nada. — Seguro seu rosto e inclino
para mim. — Foda-se que você gosta da sua esposa e a trata bem. Isso te torna um homem honrado.
Eles deveriam seguir o seu conselho, não ficar falando merdas.
Estou muito tranquila e ele percebe. Minha pulsação não se altera. É tanto minha verdade
esse sentimento, que ele afrouxa o aperto em meus braços. E mesmo sabendo que suas mãos estão
com sangue, deixo que segure meu rosto. Seus lábios tocam os meus com fúria.
— Você me amar não lhe torna fraco — digo fixando nosso olhar.
— Eu sei disso.
— Sim, você sabe disso. — Beijo sua boca. — Pelo amor de Deus, são seis anos juntos e só
porque você agora não sai matando que nem antes, significa que a culpa é do seu casamento? Isso
demonstra que está mais estrategista e cauteloso. Querem que você seja um psicopata? Matar por
diversão. — Balanço a cabeça. — Não foi com esse homem que eu casei. Você é cruel, frio e sim um
assassino, mas não um maníaco. Aceitei casar com você porque sempre achei você era justo e um
ótimo julgador de caráter. Por favor não se transforma no seu pai.
As palavras o acertam e suas mãos apertam-se em meu rosto.
— Eu sempre fui um ótimo julgador de caráter e não é como se eu precisasse matar as
pessoas à toa, mas de vez em quando eu preciso que as pessoas entendam.
— Eu sei.
— E o que Gabriel fez não posso tolerar ou puni-lo como um simples roubo nos cassinos.
Sua punição precisar doer em todos que o ajudaram, nos que pensam igual e nos seus pais.
— O que ele fez? — Engulo em seco.
— Ele foi pego se agarrando com dois homens pelos soldados da Famiglia. Invés de tentar
conversar ou mesmo fugir antes, embora já fosse uma traição. Gabriel matou os soldados e fugiu
levando uma mala de dinheiro de Orazio dando a entender que o pai acobertou sua fuga. São muitos
erros numa única situação.
Assinto me afastando dele e sento na cama. Travis caminha até a mim e eu levanto o rosto
para enxergá-lo.
— Ele já iria morrer por ser gay, não negue.
— Não fiz as regras, Madeleine, mas lhe garanto que até desertaria ele para o Canada ou pra
puta que pariu, mas ele matou dois homens meus e incriminou o pai. Se não tivessem descoberto
tudo, agora eu estaria procurando um novo Underboss para San Diego.
E fazendo Bárbara chorar pelo pai e pelo irmão. Iria manchar ainda mais os Mancini.
— Hipocrisia de tradições — resmungo.
Travis respira com força e senta ao meu lado.
— Sabe que concordo com você sobre isso e se pudesse mudar algumas coisas eu mudaria.
Mas o fato não é ele beijar homens, e sim estar na rua, colocando-se em risco e matar soldados da
Famiglia. Ele traiu a ele mesmo.
— Então vai lá e... — perco a voz e começo a chorar.
— Ei — ele me coloca no seu colo e abraça. — Por que isso?
— Tenho medo do nosso filho...
— Shu... — Ele me silencia com o dedo na minha boca. — Não pense isso.
Fungo, escondo meu rosto no seu peito e permito-me aliviar meus medos e a imagem dele
enforcando Gabriel. Mais calma, me afasto e levanto do seu colo, e não vou longe. Suas mãos
seguram minha cintura e olha da minha barriga para meu rosto.
— É verdade mesmo?
Sorrio fracamente e assinto.
— Descobriu quando?
— Hoje de manhã e agora... estou com medo dos nossos filhos ultrapassarem algum limite da
Famiglia.
Travis não diz nada e seu olhar muda fitando minha barriga. Posso imaginá-lo pedindo a
Deus essa misericórdia. Ele não conseguirá punir nem Dante e nem esse bebê em meu ventre. Só que
nós somos tão pecadores que não podemos pedir nada aos céus.
Fecho os olhos e abraço sua cabeça quando descansa na minha barriga.
— Vai ficar tudo bem. Nossos filhos nos orgulharão.
E do fundo do coração, Travis não merece um desgosto assim. Um filho traidor.
Julho de 2020

Sentada na espreguiçadeira da piscina, tomando um sol gostoso do verão, cada vez mais forte
em Nevada, escuto leves passos em minha direção e imediatamente abro um sorriso porque sei quem
é. Espero ansiosamente.
— Mamãe! — Giulia exclama batendo de leve nos meus ombros como fosse fazer algum
estrago.
— Oi, querida — digo quando ela para na minha frente.
— Você não levou um susto? — pergunta com a sua vozinha tão fofa e um pouco atrapalhada
ainda.
Minha pequena e doce Giulia acabou de fazer dois anos, mas é mais inteligente do que uma
criança de dez.
— É claro que a mamãe levou um susto. Só não foi muito grande porque ela está dormindo
— digo afagando minha barriga de oito meses.
Ela faz uma cara desesperada, franzindo a testa e fita meu corpo inteiro antes de falar:
— Você vive cansada porque sua barriga está enorme?
Solto uma risada e respondo:
— É, meu amor. A mamãe está cansada porque está carregando a sua nova irmãozinha.
— Você fica cansada de me carregar?
— Não do jeito que a mamãe está carregando ela.
— Como?
É óbvio que faria uma pergunta dessas. Dante e Giulia são muito inteligentes e gostam de
saber de tudo. Amo o jeito deles serem assim, principalmente porque é uma mistura minha com
Travis perfeitamente. E preciso confessar que Dante com seus oito anos é a coisa mais linda que eu
já, assim como Giulia. Eles têm os cabelos negros, a pele branquinho e olhos azuis enormes. Ainda
não sabemos se os olhos são meus ou de Travis. Como eu já presumia, nossos filhos parecem muito
com Marinne.
Desfocando do rostinho de Giulia, vejo Dante se aproximar. Suspiro com seu jeitinho polido
de andar. Meu homenzinho.
— Mãe.
— Sim, querido.
— Quer ajuda?
Sorrio e assinto.
— Com certeza. — Estico a mão. — Ajuda a mamãe a levantar.
Ele ajuda com seu jeitinho independente e bruto, é óbvio que ele ainda é um pouco delicado
pelo fato de ser criança, mas já tem vigor em suas mãozinhas e braços. Ele ama correr como Colen.
Não que Travis não seja um bom corredor, mas o temperamento é o tio totalmente. Dante adora
Colen.
— Quando o papai vai chegar? — Indaga enquanto ainda me ajuda.
— Agora — uma voz profunda faz meu corpo todo se arrepiar e sorrio mordendo os lábios.
Vindo pelas portas da varanda da casa e levanto o rosto para ver meu lindo e irresistível
marido. Sua máscara de Capo está do lado de fora.
Desde que descobriu a gravidez de Giulia e tivemos a conversa sobre ele não precisar ser o
que querem, Travis se fortaleceu perante seus homens e aprendeu a deixar sua máscara de monstro ​–
a todo vapor – fora de casa totalmente.
Embora não esteja sorrindo agora, parece tranquilo. Chega até nós, pegando Giulia no colo,
afaga e beija a cabeça do filho e segura minha mão para ajudar-me a levantar de uma vez.
— Eu ia fazer isso — Dante exclama.
— Eu sei, mas você ficou distraído. — Sorrio para Dante. — Está tudo bem, querido.
— Ele está certo — Travis diz. — Ele tem que cuidar da mamãe.
Meu coração quase transporta quando escuto Travis falar assim.
Uma coisa que Travis dá prioridade desde o primeiro momento do nascimento do nosso filho,
é que Dante me trate com muito carinho, respeito e amor.
Eu sei que Dante tem que ser forte e que já nasceu com uma coroa de chefe da máfia na
cabeça. Um posto de crueldade e brutalidade que exigirá que ele tenha trevas dentro de si para saber
lidar com as situações. No entanto, enquanto ele for criança e não começar a ser iniciado como
Madman, daqui a seis anos, meu filho será tratado com o maior carinho do mundo. Ele vai saber que
o amor existe e que nos torna mais fortes, não ao contrário.
— Vamos entrar. Papai está com fome — Travis diz.
E da mesma forma que nosso filho é criado para me respeitar e amar, é também para venerar
seu pai. Travis foi criado de uma forma terrível, nunca teve atenção da mãe e muito menos do pai.
Tudo que sua vida na infância o marcou, foi o transformando em frieza. Ele não quer isso
para os nossos filhos, muito menos para o seu primogênito. O seu sucessor.
Sorrio acariciando minha barriga vendo meu pequeno Dante correr para dentro de casa
chamando Rosália. Outra que adora meus filhos imensamente. Quando olho para Travis que percebo
que ele estava me encarando. Olhando de um jeito que me deixa louca. As pernas fracas.
— O que foi?
— Nada — ele retruca e chegando mais perto, toca meu rosto com um beijo terno nos lábios.
— Eu só estava admirando.
Sorrio como uma boba e engulo em seco. Eu nunca me senti tão feliz.
A gente conseguiu encontrar um equilíbrio em uma vida marcada de terror e uma luta
constante. Nunca teremos uma paz eterna, isso não existe no nosso mundo, porém com certeza temos
equilíbrio e procuramos em nossos lares a felicidade que nos cabe.
Eu estou repleta de amor e felicidade. E por isso que eu sou tão forte. Meu coração está
cheio de sentimentos bons e vê-lo com nossa menina nos braços, me deixa boba.
— Chão! — Giulia pede e ele a satisfaz.
— Não saia daqui.
Ela assente atenta e obediente e vai brincar na grama. Quando estamos à sós, porém atentos
em Giulia, jogo meus braços sobre os ombros de Travis e deixo que ele me beije de verdade. Chego
a ficar excitada.
— Eu sempre acho incrível o gosto de morango no seus lábios.
Dou uma risadinha pelo seu comentário e um selinho no sua boca.
— Você sempre vê uma coisa erótica aonde não tem.
Faz um gesto de desdém com a cabeça e alisa meu vestido de grávida. Ele é salmão claro,
preso apenas nos meus seios e o resto todo solto fazendo minha barriga ficar ainda maior.
Falta só um mês para a nossa filha nascer e eu não veja a hora de assistir Travis com a nossa
nova menininha no colo. Eu sei que ele vai continuar sendo um pai incrível para ela.
— Está ansioso? — pergunto baixinho.
— Um pouco — fala fazendo uma expressão pensativa. — Eu vou ter que cuidar de você e
delas agora. — Pousa as mãos na minha barriga.
— Você já cuida de mim, querido. Você só vai ficar mais possessivo e ciumento.
— Isso você pode ter certeza.
Rio do seu comentário e coloco a minha mão sobre a sua quando a nossa bebê chuta.
— Eu acho que ela não gostou desse comentário e nem vem falar de novo que ela só vai se
casar com trinta anos.
— Até lá a gente conversa, tenho Giulia primeiro pra vigiar.
Sorrio de novo porque é a única coisa que faço agora.
— Me sinto tão feliz.
— Isso é bom.
Rio e assinto.
— Você é o amor da minha vida, sabia? Eu tenho uma grande necessidade de dizer o quanto
eu amo você todos os dias.
Ele bate a sua boca na minha e depois aproxima do meu ouvido, dá um beijo no local e
sussurra:
— Você é e sempre será o único amor da minha vida, Madeleine. — Se afasta para fixar seus
olhos nos meus. — Eu sempre vou proteger você e nossos filhos. Quantos tivermos. Vocês são
minhas maiores riquezas. Fico motivado todo dia a ser um bom líder para Lawless e um bom marido
e pai par nossa família.
Sinto o gosto salgado das lágrimas e noto a quentura em meus olhos. Travis fazer declarações
é algo raro.
— Sabe o que eu queria.
— O quê? — ele pergunta, já de pronto com a mente decidida a fazer tudo por mim.
— Queria renovar nossos votos, mas só para mim e você.
Ergue as sobrancelhas interessado.
— Dessa vez a gente vai poder dizer que se ama, sem se importar com quem estiver por perto
e vou poder ter um vestido para guardar para mim como uma boa lembrança.
Ele limpa o canto do meu rosto a lágrima, que eu nem percebi e dá um aceno concordando.
— Isso parece um bom plano. Vou providenciar e a gente pode fazer isso na Itália, em uma
daquelas igrejas pequenas. O que você acha?
— Parece que você já tinha pensado nisso.
Ele tenta esconder o sorriso antes de falar:
— Não é que eu tenha pensado, ou não, no entanto eu sempre gosto de ver você sorrindo e a
última imagem do nosso casamento é terrível. Já se passaram quase nove anos e mesmo assim aquele
sangue em você... — Faz uma pausa soltando a respiração. — Eu queria que não tivesse sido assim.
— Aquilo não foi a pior coisa da minha vida — respondo tocando a cicatriz que ficou no seu
rosto. Hoje está bem mais leve, quase não dá para ver, mas eu quase o perdi pelo plano mirabolante
de se entregar a Ivon.
— Eu sei, querida e mesmo assim faz muito tempo. Não tem mais porque ficar pensando
nisso. — Beija minha testa. — E está combinado. A gente pode fazer esse casamento depois que a
nossa filha nascer. Não dá para correr o risco de você viajar assim.
— Acho ótimo. Podemos ir quando ela fizer uns três meses.
— Isso é bom — murmura maliciosamente na minha boca. — Assim você já vai poder
transar.
Dou uma risada tão forte que quase faço xixi.
— Você é terrível, amor —digo ainda rindo.
— Eu não sou terrível. Eu quero casar e consumar o casamento — responde apertando minha
bunda de leve.
Inspiro mordendo o lábio para parar de sorrir.
— Nós vamos poder sim fazer muito sexo. Com um bebê de meses, uma menina de quase três
anos e Dante, muito curioso, atrás de nós.
— Mamãe! Papai!
E como mágica, o Dante chama.
— Eu não disse?!
Meu marido da sua risada forte, e rara, e vira-se para pegar no ar nosso filho que corria para
nós. Essa imagem faz o meu coração transbordar. Eu tenho absolutamente tudo. Sou completamente
dominada por toda essa alegria e vou defendê-la até meu último suspiro.
— Nunca pensei que seria tão feliz nesse mundo — sussurro.
Travis escuta e vira o rosto para mim.
— Eu também. — Ele beija meu rosto e sussurra em italiano: — Ti amo, angele.
Dezembro de 2024

— Está pensativo, querido.


Tiro meu foco das crianças brincando na piscina e olho para minha esposa, de novo grávida e
especialmente linda. Combinamos que é o último filho e nós tivemos sorte, é um menino. Estou feliz
desde que soube, mas com os conflitos entres as Famiglie, ando muito preocupado com a segurança
deles.
— Estou pensando num jeito de cuidar de você e das crianças e a Famiglia.
Madeleine suspira e senta no meu colo. Minha mão vai direto para cima da sua barriga de
sete meses. Nosso Nestor. Ela escolheu esse nome por causa do seu bisavó por parte de mãe. Nestor
Beluzzo foi um grande Capitão na Camorra.
— Eu sei que você está preocupado há algum tempo e fico me perguntando porque esconde
de mim.
— Não sei.
Fixo meus olhos em Dante, hoje com doze anos. Madeleine está me implorando para ele ser
iniciado apenas ano que vem, mas não sei se conseguirei lhe dar isto. Ele precisa se fortalecer e
entrar na academia. Já tem alguns treinamentos táticos e de luta, mas é pouco. Ainda não passou nem
pela metade da iniciação. Minha querida e esperta Giulia com seis e Aria com quatro, ainda inocente
demais.
Realmente não sei porque escondo, ou tento, a situação da minha mulher. Madeleine sabe que
não está nada bem o conviveu entre as Famiglie no momento. Cazzo. Quando esteve? É tudo um jeito
de olhar para nossos conflitos e problemas. A Diabolos estar forte e atacando não era para tirar meu
sono.
— Não quero trazer esse assunto para casa.
— Eu sei — murmura.
Cerro a mandíbula e a encaro.
— Eu não deveria ter deixado acontecer tudo isso. Ter deixado as coisas correr um pouco
solto. Relaxei acreditando que a Darkness iria nos dar mais domínio.
— Travis, — ela afaga meu rosto, — nada do que aconteceu foi culpa sua e você sabe disso.
— Não importa agora. Eu apenas preciso cuidar de você e das crianças.
— Você já cuida — fala e me dá um beijo. Então vira-se para Dante e Giulia saindo da
piscina, ele sempre protegendo-a.
Eu queria ter outro filho. Madeleine e eu conversamos sobre isso, mas nas circunstâncias não
achei que seria bom. Como que eu iria protegeria três crianças e uma mulher grávida. Bene, os
planos mudaram e a surpresa veio. Afagando sua barriga lembrando da conversa quatro meses atrás:

— Queria outro filho — falei depois que gozei e joguei meu corpo para o lado.
Madeleine suspirou e veio se apoiar em meu peito.
— Estava pensando o mesmo.
— É. — Afaguei seu rosto. — Seria bom, mas como cuidar das meninas e um
novo bebê. Minha cabeça já fica fervendo com Dante já ter onze anos e precisar
iniciar como um Madman.
Ela não disse nada, apenas baixou a cabeça.
— É complicado, mas nós podíamos tentar outro — falei para aliviar sua
tensão.
Madeleine abriu um sorriso enorme e mordeu o lábio do jeito ansioso que
fazia.
— Está falando sério?
— Claro que sim. Se você quer, a gente dá um jeito.
— Então... já que você falou isso, fico aliviada porque estou grávida de três
meses.
Coloquei-me sentado na cama, apoiando as costas na cabeceira.
— E não me contou?
— Estava tentando não enlouquecer e eu não sabia descobri tem muito tempo.
Foi semana retrasada.
Pegando seu rosto, beijei sua boca demoradamente.
— Ficou com medo da minha reação?
— Não — murmura com o rosto bem perto do meu ainda. — Talvez apreensiva
com a situação, só isso.
— Não fique, eu vou fazer funcionar.

E eu estou fazendo funcionar. Redobrei a segurança deles todos e a vigília na casa inteira 24
por 7. Luca, por mais que seja útil na linha de frente para os combates, entendeu que cuidar da minha
família é ainda mais importante neste momento. Luigi se manteve fiel a Madeleine todos esses anos e
é um alivio não ter casado. Ele entregou sua vida para protegê-los. Casou-se com a morte em meu
nome. Sua lealdade é o alívio para eu conseguir sair de casa.
Fitando seu perfil sorridente, para os filhos, sinto uma grande gratidão por Madeleine. Ela é
a parte iluminada da minha vida. Ela e nossos filhos.
— Giulia está crescendo muito rápido — comenta distraída.
Olho para nossa filha e parece que foi ontem que quase cabia em minhas mãos. Madeleine
quer mantê-la na escola interna, que Marinne estudou. Não quer que nossa filha não tenha amigas e
conviveu com outras crianças, e agora quer Aria também estudando lá. Eu estou muito receoso em
tirá-las de casa.
— Preciso arrumar alguém para vigiá-la mais de perto.
Madeleine suspira e vira o rosto para mim.
— Mais?
— Preciso encontrar alguém para ser a sombra dela como Luigi é a sua. Por enquanto apenas
Giulia precisa, Aria ainda é muito dependente de nós, mas Giulia já dá os traços da juventude e com
ou sem guerra, ela não vai querer ficar enjaulada dentro de casa.
— E nem eu quero isso para ela. Para nenhuma delas. — Sua voz é decidida. — Mesmo
sabendo que Nestor terá as mãos manchadas de sangue, me causa um conforto ele não precisar dessa
superproteção.
Dante e Nestor que terão respeito e colocarão proteção sobre as irmãs e um dia a Lawless.
— Eu entendo essa necessidade de protegê-la, mas não quero um homem velho cuidando de
Giulia tão de perto. Acho esquisito.
— Como assim?
— Poderia ser alguém que ela possa confiar e até faz uma aliança.
— Para manobrar e chantagear como você faz com Luigi?
— Não. ​— Madeleine ri alto e me beija. — Para não ser tão sufocante. — Fica séria e
continua. — Se eu não me desse bem ou detestasse Luigi, lhe garanto que seria horrível ter sua
presença vinte e quatro horas no meu pé. Fique satisfeito de eu me dar bem com ele.
— Eu fico, pode apostar.
Ela assente sorrindo e mordo o canto da boca.
— Existe algum soldado jovem em mente que possa cuidar dela?
— Na verdade eu pensei em um e por enquanto vai continuar com Mario cuidando da sua
segurança. Ele deve se aposentar daqui a alguns anos e será uma idade considerável para quem eu
pensei tomar seu lugar.
— Quem?
— Remo Bracy.
Madeleine ergue as sobrancelhas surpresa. É claro que está. Diferente de outros Capos, eu
não menosprezei um filho bastardo de um soldado. Luca me deu sua palavra que o filho iria morrer
em nome da Lawless pela chance que eu estava lhe dando colocando para ser um dos homens de
frente.
Remo completa dezesseis anos daqui a alguns meses e eu irei vigiar suas ações até completar
dezoito anos e Mario preparar-se para se aposentar. Ele cuidou de Marinne depois que o antigo
guarda-costas dela morreu e foi muito útil, por isso deixei vigiar Giulia.
Remo não vai ser tão mais velho que Giulia. Ela não ficará tão assustada com a ideia de um
novo soldado vigiando-a. Por enquanto ele recebe toda o ensinamento do próprio pai. Luca é um
babaca com o garoto. Remo é tortura como eu fui um dia e espero que isso o fortaleza. Ele será o
segurança da minha filha e terá que dar sua vida por ela se for preciso.
Madeleine continua em silêncio olhando para Giulia e Dante.
— O que foi? Fala logo.
— Só estou pensando que se ele seguir os passos do pai, será frio e maníaco como Luca. —
Vira o rosto para mim e sai do meu colo. — Eu sei que você está tentando fazer o melhor para ela,
mas me preocupa.
Levanto também e toco o seu ombro.
— Quem melhor para proteger minha filha do que um filho de Executor?
— Você está querendo colocar um leão para cuidar da sua filha.
Cerro a mandíbula e mantenho a voz baixa.
— Todos somos animais ferozes e sanguinários. Não temos piedade nenhuma. Você acha que
eu tenho?
— É diferente, Travis. Você não é só um assassina como Luca. É o chefe dessas cidade. —
Toca meu peito. — Eu fico feliz de você considerar o garoto, de verdade, mas me preocupa ser ele.
Por que não pode ser um soldado qualquer?
— Ele é um soldado ainda.
Ela baixa a cabeça e vira as costas para mim. Não deixo ir longe e pego-a pelo braço e faço
virar para mim. Nunca sou bruto com ela, jamais, e gravida tomo mais cuidado ainda. Fitando seus
olhos pergunto:
— Qual o verdadeiro problema?
— De Reme se transformar em uma cópia de Luca. Eu gosto dele e mesmo assim sei como
Luca é volátil. Porra! Você usa ele para as piores barbaridades e pega Vito para cuidar das meninas.
Como quer que eu fique tranquila com o filho dela cuidando da minha menininha?! Não consigo
acreditar que você está pensando em confiar a vida da sua filha nele.
— Eu entendo — falo com sinceridade. — E pensei nisso. Não ia escolher qualquer um para
cuidar de Giulia, assim como não escolhi para cuidar de você. Remo é a melhor solução.
— Um monstro vai cuidar dela.
— Eu sou um também — afirmo.
Sua reação me pega de surpresa. Vendo as lágrimas encher seu olhar, abraço-a.
— Não vai acontecer nada, Madeleine. O garoto lambe o chão que eu piso e só irá ser o
guarda-costas dela se mostrar sua lealdade.
Inclina a cabeça para trás encarando-me.
— Você fará um grande evento seu juramento, não vai.
Mesmo não sendo uma pergunta, assinto.
— Preciso que seja assim. Ele precisará sangrar antes de me dar sua vida para cuidar de
alguém tão precioso para mim.
— Se você confiar nele, como poderei discordar.
— Sendo a mãe dela. — Tiro o cabelo do seu rosto. — Você está aqui para lhe dar amor e
proteção. Sei que a pessoa que mais poderia proteger nossos filhos é você, mas você precisa de
ajuda.
Madeleine sorri e me abraça forte.
— Obrigada por me ouvir.
Curvo o canto da boca em um quase sorriso, beijo sua testa e afasto seu rosto.
— Eu que agradeço por me proporcionar sensações que nunca almejei. Uma vida que não
mereço, mas luto diariamente para ter. — Beijo sua boca de leve. — Te amo, mi angele. — Sussurro
para ela.
— Eu também e muito. Hun? — Faz assustada e olha para baixo. — Oi, querida.
Aria está agarrada a perna da mãe.
— Colo.
Meu peito se enche de sentimentos bons e me abaixo e pego-a no colo.
— Mamãe — Aria reclama.
Madeleine sorri e estica os braços. Como não adianta falar, deixo que coloque nossa filha no
colo, mas fico perto para distribuir o peso. Ela não deveria pegar peso no seu estado.
— Quero sorvete!
Minha esposa sorri e beija o rosto da nossa caçula, por enquanto.
— Você quer sorvete?
— Quero!
— Tudo bem. Vamos entrar para pegar.
Pedindo com os olhos, entrega Aria para mim, que não reclama ainda bem.
Caminhamos para a cozinha. Dante se junta a mãe abraçando sua cintura com um braço,
Madeleine pousa a cabeça no topo de sua cabeça. Ele é muito alto. E Giulia fica perto de mim.
Estico a mão para ela. Minha garotinha é mais apegada a mim e Dante visivelmente a Madeleine.
— Quero aprender a atirar.
Franzo a testa e olho para baixo, para a cabeça de Giulia. seus cabelos idênticos ao de
Marinne. Ela a lembra demais.
— Atirar?
— Sim. Como Dante — responde no momento que chegamos na cozinha e ele escuta.
Cerro a mandíbula dando um olhar severo para ele e deixo Aria na banqueta do balcão e me
concentro em Giulia.
— O que seu irmão andou falando para você?
— Eu não disse nada.
Giulia lhe direciona um olhar penetrante, me orgulhando internamente, e vira-se para mim
erguendo o queixo.
— Que vai fazer como você, papai. Vai atirar e mutilar os traidores.
Bene, isso não é mentira.
— Mas que eu não posso porque sou menina. Sou fraca. — Ela finaliza e cruza os braços.
Vendo da minha visão periférica, acompanho Madeleine se aproximar. Aprumo a postura, dou
uma boa olhada no seu corpo lindo e rechonchudo, sua barriga de grávida. Fico louco em vê-la assim
e ela sabe porque me dá um olhar de aviso antes de parar na frente da nossa filha.
— Giulia, querida, escuta o que a mamãe vai falar.
— O pai pensa o mesmo — me adianto.
É verdade, sobre nossos filhos eu sempre penso igual a ela. Não merecia essa sorte. Casar
com alguém perfeito para estar ao meu lado.
Madeleine revisa os olhos e fica séria de novo.
— Você não é fraca, mas é a nossa menininha. Você e Aria, e seu pai irá sempre protegê-las,
assim como seu irmão e eu. Se depender de mim, você nunca tocaria numa arma, mas se precisar, irá.
No entanto, esse não é o assunto para termos agora.
— Quando?
— Quando você for maior.
— Como Dante?
— Não, mais velha — me meto e Madeleine reafirma:
— Isso, mais velha porque agora precisa apenas brincar e estudar.
— Por que o Dante não?
— Eu estudo sim. — Ele vem ficar do meu lado olhando a irmã. — E não precisa mexer em
armar porque eu vou cuidar de você.
Orgulhoso espalho seu cabelo no topo da cabeça. Ele resmunga, mas não se afasta. A mãe
olha para ele e o faz ficar na perto de Giulia.
— Fala que você não queria dizer que ela é fraca.
Ele reluta um pouco encarando Madeleine e fala num tom de voz risível.
— Você não é fraca.
— Mas? — emendo fazendo-o me encarar. — Diz o que você está pensando. — Eu jamais
vou errar sobre pensamentos ocultos como fiz com Dario. Por afrouxar meu irmão que ele acabou
sendo uma das minhas falhas.
Dante respira fundo e olha a irmã de novo, ficando mais perto.
— Mas eu sou mais forte. Disse que você é fraca para poder me sentir maior.
— Você é um bobo.
— Não sou.
— Crianças não comecem, está bem. — Madeleine ajeita a postura e afaga a barriga. — Não
existe mais ou menos forte. E, na verdade, ninguém vai mexer em armas agora.
Dante cruza os braços e eu me aproximo. Vendo que todas estão distraídas, graças a minha
esposa brincalhona, levo meu filho para a sala do piano.
— O senhor vai brigar comigo?
Fecho as portas de correr e viro-me para ele.
— Eu deveria. Você esqueceu o que aprendeu?
— Não, pai.
— Você não deve tentar pôr medo ou diminuir sua irmã. Não é isso que eu lhe ensino.
Baixando a cabeça, assente.
— Não farei mais.
— Sua mãe está certo.
Olha para mim de novo.
— Você não irá tocar nas armas agora. Ainda é cedo.
— Tio Colen tocou com dez anos.
E vou contar a língua dele por isso.
— Ninguém é como outra pessoa. Cada um é um. E não é porque Colen tocou com dez anos
que você fará o mesmo. Não é questão de porque, e sim merecer.
— Eu não mereço? — Seus olhos ganham um brilho misterioso.
— Por enquanto eu quero seus punhos fortes e a mente ágil. Não se antecipe.
— Quero ajudar o senhor.
Aceno que sim e toco seu ombro.
— Você será meus braços, olhos e coração um dia, Dante. Mas agora é meu filho e um
soldado. Precisa respeitar o tempo. — Contemplo seus olhos tão azuis quanto os meus. — Você é
meu legado, filho. Quero você o mais forte para proteger seus irmãos e a Famiglia. Não se preocupe
que tudo chegará no seu devido tempo.
Dante assente respirando fundo e eleva a postura. Ele leva meu sangue, minha carne e quero
que seja meu coração.
— Lembre-se: honrar seus pais, seus irmãos e a Famiglia. Isso inclui cuidar e respeitar sua
irmã. Nunca mais repita o que fez com Giulia.
— Juro que não irei.
— Ótimo. Vamos voltar para cozinha.
Em silêncio voltamos e pegamos as meninas sorrindo e comendo sorvete com bolo.
Madeleine está de pé na ponta do balcão ajudando Aria. Vou até ela, porém paro para observar Dante
ir até Giulia e beijar sua testa. Ela sorri timidamente e o abraça. Escuto um som estranho e pego
Madeleine choramingando.
— São os hormônios — se desculpa e limpa os olhos.
Sorrio e beijo sua têmpora. Ela pousa a cabeça no meu peito e afaga sua barriga. Minha mão
encontra a dela e contemplo meus filhos. Sinto-me um desgraçado sortudo por essa vida. Irei morrer
e matar por eles. Em nosso juramento damos a palavra de honrar, proteger e respeitar a Famiglia e as
regras. Quando casei com Madeleine tudo mudou. Minha causa é ela. Meus esforços são para nossa
família.
Fecho os olhos relembrando minha infância e como estava errado.
O amor é resistente.
A dor é meu combustível.
O ódio, minha força.
Eu era um homem forte, agora sou imbatível.
Jurei proteger os meus.
No meu mundo os sentimentos ainda são um alto risco, porque quando eles veem cria-se uma
besta que talvez uma bomba atômica consiga aniquilar.
Las Vegas traz meu coração, mas é Madeleine que o faz bater. Precisarão remover pedra sob
pedra para me alcançarem.
SURPRESA!!!!
Não é novidade para ninguém que AMO o mundo da máfia da Cora Reilly, e por motivos de
medo dela não fazer o que mais quero com Ana e Santino, eu criei os meus próprios Ana e Santino :D
Meu Deus! É um plot fantástico para não ser escrito por ninguém, sem contar que o temperamento de
Travis é mais intenso do que de Dante hahaha... Vamos ver no que dará essa treta.
Esse aqui só virá depois do livro do Dario.
No Instagram está tudo mais explicado e qualquer coisa pergunta no direct que tiro qualquer
dúvida.

Ah, só irei revelar a capa (antes do tempo como todas as outras dos livros de máfia) no
Instagram.
Meu pai me ensinou a respeitar, a honrar e ser a filha perfeita. Temo que minhas escolhas
tenham jogado fora sua dedicação. Temo por sua condenação quando souber do meu maior pecado.
Quebrei o juramento da máfia, o seu juramento de nunca desobedecer e desonrar nossa
família. Não respeitei suas regras, a tradição da Famiglia. E ainda posso levar a morte de um homem
que não é inocente, nem de longe, mas sobre mim, ele sempre foi tudo que meu pai queria que fosse.
Leal e honrado, isso até me beijar.
Ou eu beijá-lo.
Remo Bracy e eu não deveríamos ser nada um para o outro. Ele foi escolhido para ser minha
sombra, o homem que não mediria suas atitudes para me deixar sã e salva. Ele era um executor, o
filho de um homem tão impiedoso quanto ele se transformou. No entanto nós nos aproximamos
demais. Ficamos muito ligados. Tenho sua presença ao meu lado desde os meus doze anos e mesmo
sabendo que era errado, sabia que a forma que meu coração batia por ele era diferente.
Eu sou Giulia Lozartan, carrego o nome da minha avó, uma mulher que significou tanto para a
Lawless. Sou a filha do chefe de Las Vegas, o Capo del capi de uma das organizações criminosas
mais temida dos Estados Unidos e até mesmo na Itália o nome Travis Lozartan causa arrepio.
Eu não deveria levar a queda da minha virtude.
Tinha que ascender meu sobrenome.
Ser honrada.
Ter tudo...
...menos ele.
Alessa Ablle já sabia o que queria desde criança: deixar um pedacinho dela no mundo.
Sempre sonhadora pensou até em ser astronauta (risos), mas aprofundou-se na dramaturgia e suas
infinitas possibilidades. O teatro foi sua primeira paixão e logo depois vieram os livros, que se
tornaram seu escape da realidade após conseguir superar sua depressão. Escrever não é apenas sua
terapia favorita como também a sua melhor forma de superar sua dislexia, dando exemplo para
muitas pessoas de que não será uma deficiência que irá pará-la.
Seu primeiro lançamento na Amazon, Ensina-me o prazer, alcançou o ranking em primeiro
lugar e teve mais de um milhão e meio de leituras on-line nas duas primeiras cenas. Tem mais de 3
mil e-books e 2 mil exemplares vendidos em todo o Brasil. Seu segundo lançamento também
alcançou o ranking no top 5, Profundamente Apaixonado, e hoje a Saga Profundamente já bateu
mais de 27 milhões páginas lidas pelo Kindle Unlimited. Hoje Alessa já tem mais de 4 mil
exemplares vendidos, dos livros publicados em físicos, e mais de 40 milhões em páginas lidas na
Amazon.
É uma legítima geminiana, carioca, que vive ainda na Cidade Maravilhosa com sua família e
seus amados cachorros. Falante, animada, adora fazer LIVEs em suas redes sociais. Aberta ao
público e humorada. Conhecida por sua sinceridade e palhaçadas.
Para conhecer mais dessa autora regada a humor, siga-a em suas redes sociais.

Instagram: ALESSA ABLLE


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Conheça Seus Outros Livros

Alice está prestes a realizar o seu maior sonho, se casar. E seu noivo é maravilhoso, o sonho de qualquer mulher... Até ela
viajar para Las Vegas uns meses antes do seu casamento e conhecer um irresistível americano.
No final ela terá que decidir...
Aceita ou não?

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Linda, falante, teimosa e tentando achar seu lugar no mundo, Amber Vasconcelos estava
vivendo um grande dilema na sua vida depois que um moreno tentador aparece no seu caminho e a
deixou completamente viciada. Jordan Saldañas é o famoso: “o cara”. Lindo, olhos intensos, fala
macia e tão sincero que chega a ofender, também não parava de pensar na “sereia”.
Era para ser apenas algo casual, para matar o desejo, mas não foi isso que acabou
acontecendo e Jordan em pouco tempo notou que Amber tinha se tornado sua. Porém, o maior dos
problemas não era ter que lidar com uma garota meio desmiolada e ser seu próximo “desamor”, e
sim com todos as outras pessoas que tinham saído dos esgotos decididas a acabar com a sua paz e
seu relacionamento com Amber.
Será que ele vai conseguir ficar com a garota no final?

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Tudo que foi quebrado, um dia esteve perfeito. E talvez para Adam Stella é exatamente assim que ele se sente. Após uma
terrível tragédia ter abatido sua família e principalmente a ele, Adam sente-se imperfeito. Há seis anos sua vida sofreu uma reviravolta e
o garoto mais querido e cheio de amigos, o neto mais amado, o filho mais aclamado por seus dotes e inteligência nos próximos segundos
depois do acidente deixou de existir. Se ruiu por entre as chamas. Ele deixou tudo para trás em cacos. Adam se tornou um homem
estilhaçado, quebrado. Vivendo cada dia após o acidente com culpa.
Sua família não suporta mais vê-lo viver desta forma, então sua mãe em uma nova tentativa encontra uma nova forma de
salvá-lo de si mesmo. Colocando a menina curiosa de olhos azuis em sua vida. Tão quebrada quanto ele, mas cheia de vontade de viver,
Belinda o fará ver o lado ruim de ter deixado a vida pra depois.
Será que Adam vai conseguir aproveitar essa nova chance e colar as partes que ele deixou-se perder pelos anos de culpa?

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Nascida em berço de ouro, Victoria Colton carregava em seu coração muito mais que sonhos. A “pobre menina rica” rodeada
por holofotes, inseguranças e uma vingança gerada por um segredo guardado há muitos anos, contava os dias para se livrar do medo e
dos traumas de sua infância.
Ethan Brown nunca pode reclamar de sua boa vida. Nada nunca lhe faltou e aprendeu cedo demais que o dinheiro tinha seus
prós e contra. Após anos longe de casa, retorna com ambições para com sua carreira, mas logo de cara algo entra em seu caminho e ele
precisará saber o que é mais importante.
Totalmente opostos um do outro, deixam as diferenças de lado, quando após um reencontro – nada convencional –, não
conseguem mais ficar separados. Mas eles precisarão de muito mais do que sentimentos para ficarem juntos.

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Eles não esperavam que fossem se apaixonar tão profundamente. Victoria e Ethan se tornaram inseparáveis, e ficar longe um
do outro é um desejo que não almejam. O intenso e profundo amor que construíram, sofrerá altos e baixos, e sustos que colocará em
prova seu futuro juntos e o desejo de viver o “felizes para sempre”.
Victoria vem determinada a lutar com Ethan, que está ainda mais apaixonado e profundamente envolvido por sua princesa,
focado em destruir o inimigo, na continuando da história de amor épica, que ficará para sempre na sua cabeça.
Um reencontro que marcou a vida dos dois.
Uma aventura que se transformou em amor verdadeiro.
Um amor que durará a vida toda?
QUEM SABE?!

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No terceiro volume da Saga Profundamente, Victoria viverá seu pior pesadelo e verá seu mudo sofrer grandes perdas e um
grande choque.
Ethan enfrentará todos os demônios para viver ao lado da mulher que ama. E terá que fazer coisas que apenas esteve em
seus piores pensamentos e precisará descobrir um jeito de trazer Victoria de volta para ele.
Agora o inimigo é o tempo e a mente, onde ninguém pode corromper.
E mesmo um homem profundamente apaixonado, terá seus momentos de desespero e arrependimento enquanto sua amada
não sabe o que é real ou fantasia.
Novamente o mais forte salvará os dois de cair no mais profundo abismo.
Um amor tão profundo que ultrapassa todas as barreiras. Que enfrenta o medo.
Uma promessa de amor eterno.
Mas será que depois de tudo, ainda restará algo além de estilhaços?

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Agora parece que todos os problemas já estão resolvidos, que os traumas foram deixados para trás e só lhes restam viver e
serem felizes.
Victoria ultrapassou todos os obstáculos que apareceram em sua vida. Foi forte, confiante e corajosa, mas claro que nada
seria a mesma coisa sem seu príncipe “encantado”. A sua vida é um verdadeiro milagre e ela quer mais do que nunca viver intensamente
a segunda chance que teve.
Ethan deixou totalmente seu passado para trás e se transformou em um homem de sucesso e maduro. A felicidade está
batendo em sua porta, finalmente. E só resta aproveitar essa jornada com sua princesa.
Mas será mesmo que todos os espinhos foram retirados de suas vidas?
Não perca o desfecho desta história linda e profundamente apaixonante.

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“Muito mais do que sobre um romance. Uma história de almas. De amor eterno.”

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Travis Lozartan é o mais novo Capo da máfia da Costa Leste dos Estados Unidos, herdando o cargo de seu pai. Com a fama
de “O Cruel”. Mau, impiedoso, frio e calculista, não mede esforços para derramar sangue de seus inimigos e defender a Lawless. Desde
muito novo sabia que seria o próximo a liderar Nevada e os negócios; e, quando seu pai morreu, ele ganhou poderes e inimigos. Porém,
não esperava ter que honrar um acordo de anos atrás, que salvou a todos.
Madeleine Beluzzo também foi nascida nesse mundo cruel e insano, mas quando seu pai, um policial “duvidoso”, decide fazer
um acordo com a máfia rival, é introduzida no lado ainda mais obscuro e perigoso, tornando sua vida um terror; quando ela começou a
atrapalhar os negócios com suas opiniões, foi mandada para longe. Agora está de volta e terá que se aprofundar nesse caos e na vida do
homem que a dominará muito além do que era o acordo.

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Madeleine Beluzzo lutou o quanto pôde para não se render à encantadora e magnética beleza e poder do Capo da Lawless,
mas em vão. Em pouco tempo se viu rendida e o desejando o tempo todo. Agora, ela assumiu o quanto está dominada por ele e o quanto
de sacrifício será capaz de suportar e fazer para tê-lo em sua vida e ficar na dele.
Travis Lozartan quer o domínio do seu território, do seu nome, seu poder e da mulher que escolheu para ser sua esposa. Ele
ainda não se deu por vencido de que, na verdade, ela é muito mais do que quer admitir, porém seus inimigos o farão enxergar não só que
sentimentos o tornam mais forte, como ainda mais perigoso.
Em “Dominado Por Ela” teremos a redenção das crenças de Madeleine e os sentimentos de Travis. Iremos presenciar o
retorno desse casal, agora unidos, focados e ainda mais fortes.
E, se separados eles faziam todos temerem e se armarem, juntos eles forçarão todos a ficarem de joelhos e pedirem arrego.

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Cecillia Romanoff é uma jovem nerd, conhecida por ser muito curiosa. Uma de suas maiores curiosidades é, justamente, sobre
algo que nunca fez: sexo.
Henry Frinsheens tem uma vida agitada, porém responsável. É um jovem que possui um currículo ótimo, é estudioso e amigável.
Diferente do típico cara babaca de faculdade. Em uma aula de Biologia, por força do destino, os dois se esbarram. Dois jovens
diferentes, mas iguais em um sentido: são solitários e buscam algo que os complete.
Quebram a velha (e ultrapassada) rixa entre nerd e playboy e viram amigos de verdade. Vencidos pela forte química que existia
entre eles, os dois se rendem a uma noite que os envolvem ainda mais e poderia mudar tudo. Talvez tenha sido um tremendo erro e a
amizade tão sólida correria perigo. Eles sabem que seus sentimentos estão indo além de carinho e, no meio dessa relação vão perceber
que um precisa do outro muito mais do que podem admitir.
No final qual será a escolha certa a se tomar?

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Um relacionamento que começou sem pretensão de ser alto mais do que amizade e realmente os transformaram em grandes
amigos, mas os sentimentos mudaram e cresceram. Henry e Cecillia aprenderam a não saber viver um sem o outro. De uma amizade
nasceu um amor verdadeiro.
Os anos se passaram, a vida seguiu sem curso perfeitamente e eles estão à passos de dizer o sim mais importante da vida deles
e começar sua própria família. Até que uma farpa do passado volta e dá um choque de realidade em suas vidas.

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Finalmente reunidos em um único livro a história de amor de Henry & Cecillia. Os amigos que se apaixonaram.
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Mais 2.000 e-books.
Primeiro lugar de mais vendido da AMAZON.
O Clichê que todos amam.
Dois corações solitários, que se tornam melhores amigos e depois de tanto lutarem para ficarem juntos, se rendem a paixão.

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Amanda Frinsheens, ou Mandy para os íntimos, é uma garota determinada, sonhadora e uma Frinsheens. O que a torna sensível.
Assim como seu irmão Henry, foi cursar sua faculdade de Medicina em Massachusetts, na aclamada Cambridge. Ela ama sua rotina,
que intercala em estudar e curtir sua juventude.
Maximus Smith é um médico dedicado e, mesmo com trinta e três anos, é um molecão que vive apenas para o trabalho. Talvez o
que lhe ocorreu anos atrás tenha deixado cicatrizes maiores do que possa admitir.
Logo de cara, Mandy e Max sentem uma forte atração, que agora terá que ser enfrentada no mesmo ambiente de trabalho, já
que por destino ela fará residência no hospital em que ele é cirurgião.
Será que Mandy vai conseguir manter o profissionalismo perto dele?
E Max, será que vai conseguir ficar longe da irmã do seu melhor amigo, agora sua aluna também?

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Se puder ou quiser, deixe sua avaliação aqui mesmo na Amazon ou no Skoob. O feedback é
muito importante para eu continuar a amadurecer, melhorar ou saber o quanto vocês amaram (tenho
que ser otimista, né) o livro.
Fique à vontade também para falar comigo via Facebook ou Instagram ;)
Ou se quiser, manda e-mail para alessaablle@gmail.com e até ganhe mimos se mandar a
avaliação ou leitura ou compra do livro. Eu adoro gradar meus leitores.

[1]Bem, mas no meu reino ninguém vai fazer isso não.


[2]
Que babaca.
[3]Voc ê te m a a ud á c ia e a te im os ia ita lia na d a s ua m ã e . Q ue p or r a!
[4]
Muito obr ig a d a p or s ua a te nç ã o. Foi o m e lhor a lm oç o q ue já c om i na v id a .
[5]
Ah, q ue r id a . O p r a z e r foi tod o m e u e fic o fe liz q ue te nha g os ta d o. Es p e r o v ê -la m a is v e z e s p or
a q ui. Tr a g a o Sr. Loz a r ta n.
[6]
Eu v ou d iz e r s im e m uito obr ig a d a .
[7]
Até a p r óx im a .
[8] Tchau, minha linda.

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