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Título Original: Unidos Pela Lealdade - Livro 1 - Série Pétalas em Sangue

Copyright© 2020 - Harin Adna Gomes de Lima Andreo


Diretor-editorial: Peterson Magalhães
Editor-chefe: Silvio Alexandre
Publisher: Katarina Ferrer
Revisão: Mariana Rocha
Capa e Diagramação: Cris Spezzaferro
Todos os direitos reservados a autora e editora.
É proibida a reprodução de parte ou totalidade da obra sem a autorização prévia dos
autores e editora.
Todos os personagens desta obra são fictícios e qualquer semelhança com pessoas vivas
ou mortas terá sido mera coincidência.
Texto revisado conforme o Acordo Ortográfi co da Língua Portuguesa.
Sumário
Agradecimentos
ATENÇÃO
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Epílogo
Agradecimentos
Gratidão primeiramente a Deus, sempre.
Quero agradecer a minha família por sempre acreditar em mim,
desde o marido que é o meu primeiro fã (palavras dele), filhos que
me empurram com seus sorrisos a ser cada dia melhor, como
pessoa e profissional. Pai, mãe, padrasto, irmão, sogros,
avós,cunhados e cunhadas, tios e tias. É difícil nomear apenas um
quando todos tem o seu grau de importância. Em algum momento,
as nossas vivências serviram de inspiração. Minha mãe me
perguntou de onde vinha tanta imaginação, eu sei mãe, eu tenho a
mente um pouco louca, nunca foi segredo (risos).
Também quero agradecer em especial a duas pessoas que foram
as primeiras a me dizer que aqui tinha potencial: Ana Karolina, lá do
Espírito Santo, que disse: “Porque você não escreve sobre esse
tema? Você gosta! Tenta”. Obrigada, querida. Você me motivou,
muito.
Agradeço também a Iluska, que leu capítulo por capítulo, mesmo
longe me acompanhou em cada passo do caminho, enquanto tudo
ainda era um sonho. Em um dado momento ela me disse: “Estou
curiosa para saber o que acontece a seguir, está muito bom!“.
Aos meus amigos, os que leram trechos, os que leram tudo, que
validaram tudo. Até aqueles que não tinham o hábito de ler histórias
desse gênero se sentiram presos pelo enredo. Eu jamais poderia
nomeá-los. Vocês são os melhores! Obrigada, obrigada.
ATENÇÃO
Este livro é um romance da Máfia.
Contém descrição de violência física e conteúdo sexual.
Prólogo

Giulia, 10 anos

Os sons sussurrados que vinham do escritório de papai não foram


o que me chamou a atenção. Mamãe sempre dizia que escutar atrás
das portas era uma falta terrível de educação, mas ouvi mamãe
implorar, chorando em meu nome e de minhas irmãs.
— É castigo por não ter te dado um filho homem? — Minha mãe
disse engasgada com o choro. Pela porta entreaberta, vi meu pai
segurar o rosto de mamãe com as duas mãos.
— Não é nada disso, Alessandra. Trata-se de proteção. Ivan
Nikolai é o novo Pakhan. Em algum tempo, sua prole tão louca
quanto ele assumirá o poder. Eles não respeitam mulheres, crianças
ou qualquer um que mereça proteção, ele odeia os italianos.
Qualquer perspectiva de paz com o Bratva morreu hoje junto com a
Família Ivanov. Os inteligentes reconhecem o perigo quando o vê.
Minhas filhas têm que ser fortes, um dia eu não estarei aqui para
protegê-las, mas o que eu ensinar, a protegerão para sempre.
Minha mãe chorava e lamentava, negando com a cabeça.
— Você as colocará em perigo, Enrico. Elas têm que ser
protegidas e não jogadas ao perigo como se fossem homens. Isso
irá arruiná-las em nossa sociedade — Papai não a soltou,
encostando suas testas.
— Essa é a maneira de protegê-las, cara mia. A guerra está
vindo. Não é mais uma questão de se, e sim, de quando.
— Mas elas são crianças, Giulia tem apenas dez. Não faça isso,
Enrico. Por favor, não.
— Está decidido, mia bella. É o melhor para elas.
— E o menino Ivanov? Onde ele está? - Mamãe perguntou após
alguns segundos.
— Seguro. - Papai respondeu.
Afastei-me do escritório e meus olhos pararam em Milena e
Isabella, que brincavam no chão da sala. Ali, eu não tinha ideia do
que aconteceria, mas sabia, no meu íntimo, que brincar
despreocupadamente com bonecas no chão já não seria rotineiro.
Eu já entendia que vivíamos diferentes das outras crianças, que
éramos diferentes por sempre termos seguranças por perto e nem
sempre poder ir às festas de aniversário ou à praça brincar como
todos os outros. Eu sabia o conceito de Guerra. Eu só não tinha
entendido a magnitude de tudo e do impacto que isso teria em
nossas vidas até que vi o desespero nos olhos da minha mãe e a
determinação em meu pai. Ele nos prepararia para a guerra.
Capítulo 1

Dias Atuais

Era janeiro e estávamos em pleno inverno de Nova Iorque. Da


minha cobertura, observava as pessoas insistindo em suas
caminhadas matinais no Central Park. Eu detestava o inverno,
detestava o frio, pois ele me trazia lembranças que eu preferia
esquecer. Minha mãe morreu em um inverno rigoroso, há três anos.
Ela se suicidou e eu sei, no fundo, que foi de tristeza por tudo o que
suportou do meu pai.
Depois de um casamento de sofrimento com meu pai, o Don, da
Cosa Nostra, nos Estados Unidos, líder de uma das maiores
organizações criminosas do mundo, ela desistiu da vida. Muitas
vezes eu intervi, ainda criança, para defendê-la do monstro que meu
pai era. E paguei com meu sangue por cada uma dessas
intervenções. Se eu fechasse bem os olhos, ainda poderia sentir o
cheiro de sangue e sexo, e escutaria os lamentos da minha mãe.
Depois de homem, percebi a minha importância na Máfia. Eu
seria o futuro Don, a continuação do sangue do meu pai, seu
legado. Mudei minha maneira de enfrentá-lo, como seu único
herdeiro homem, passei a exigir a integridade física da minha mãe.
Maior que a arrogância do meu pai era sua sede de continuar no
poder, o valor de seu nome e, principalmente, seu sangue. Isso
funcionou por um tempo, até minha mãe adoecer e desistir de si
mesma.
Meu pai me criou a seu molde, queria um filho cruel como ele. Eu
sou o monstro que ele criou, frio e cruel, sou leal a nossa causa, o
respeito como Don, mas exigir a integridade da minha mãe também
deu controle e poder a ele sobre a minha vida, eu tinha que ser
exatamente uma cópia dele e eu fui em quase tudo. A voz da minha
mãe em seu leito retumbava em meus ouvidos quando a escuridão
me tomava e ameaçava me levar inteiramente.
— Você não é ele, meu filho, você um dia encontrará alguém que
o fará enxergar exatamente como você é. Um homem de bom
coração.
O que ela não sabia é que eu não possuía um coração. Parte do
que eu poderia ter de bom foi com ela, sua escolha em deixar a vida
só reforçou o que eu já sabia, em mim, não há nada que valha a
pena. O único vestígio do controle de meu pai em minha vida ainda
era Anita, minha irmã. Quando eu fosse Don, o que não iria demorar
agora, pois logo faria trinta anos, ela viria morar comigo e nada mais
me ligaria a ele.
Meu telefone tocou, não me surpreendendo por ser meu pai.
— Don.
— Venha tomar café em casa. Precisamos discutir o nosso futuro
na Cosa Nostra1.
1.Tradução livre da autora “nossa casa”
“Nosso futuro”. Solto um riso seco. É assim que ele vê essa
situação, como se ele fosse continuar no poder depois que eu
assumisse. Ledo engano.
— Certo.
Não espero resposta e desligo. Eu sabia que essa hora iria
chegar, logo eu assumiria o posto, então, essa conversa era
esperada.
Não muito tempo depois, eu estou entrando na mansão Santorelli
para tomar café com meu pai e Anita.
— Buongiorno2.
2.Tradução livre da autora: “Bom dia”
Cumprimento já sentando no lugar posto a mesa para mim. Olho
para minha irmã Anita, de dez anos, alheia a toda maldade do
mundo que vivemos. Anita é uma garota tranquila e alegre, apesar
de todas as regras e a distância do meu pai, sua integridade é o que
me mantém por perto. Ela era a única que ainda conseguia me
arrancar um sorriso com sua inocência. Eu vou mantê-la assim pelo
máximo de tempo possível. Eu estava sempre com um olhar nela,
seus guardas pessoais e a sua governanta eram leais a mim. Eles
me diriam se meu pai usasse a força ou a violência em sua
educação.
Meu pai sabe que não deve machucá-la. Ele também a usava
para me controlar, mas isso estava prestes a acabar.
— Buongiorno irmão — Anita sorri contida, porém vejo a alegria
dançar em seu olhar. Minha irmãzinha era bondosa como minha
mãe.
— Sente-se e tome seu café, precisamos discutir os negócios —
diz meu pai com impaciência. O clima sempre foi esse. Frio.
Tomamos café em silêncio e assim que terminamos, o segui para
o escritório.
— Logo você fará trinta anos e já sabe o que se espera de você.
Dei um aceno com a cabeça, indicando que estava escutando e
ele continuou:
— Faremos uma festa em comemoração. Você também entende
que terá que se casar, então já aproveitamos e chamaremos para
sua festa as filhas dos Sottocapos e Caporigemes que estejam em
idade de se casar.
Isso me alarma, mas mantenho a face impassível. Achei que teria
mais tempo para isso, que poderia avaliar a situação com calma.
Casamento? Eu ainda não tinha pensado nisso como algo concreto.
Eu sabia que iria acontecer, mas claro que meu pai iria querer
controlar tudo. É mais uma demonstração indireta de seu controle
sobre mim.
— Acho melhor primeiro assumir e só então procurar uma esposa
— digo mantendo a máscara da indiferença.
— Você vai fazer o que é esperado. A festa está planejada para
quinze dias, já enviei os convites para as famílias de Nova Jersey,
Nova Inglaterra e Filadélfia. E teremos também as famílias de Nova
Iorque. Espero que quando assumir o cargo, esteja noivo. Não se
esqueça, figlio3. Ela deve ser perfeita. Vou ser solidário e te dar a
oportunidade de escolher, caso não faça sua escolha, eu farei por
você.
3. Tradução livre da autora “filho”
Soltei um riso seco, sem humor.
Não me via tendo que ser responsável por alguém além da Cosa
Nostra e minha irmã. Seria mais alguém que teria minha proteção,
que estaria sob minha responsabilidade diretamente. Eu não queria
nada disso. Olhei para meu pai, internalizando no fundo da minha
mente que faltava pouco para que ele saísse de uma vez por todas
do meu caminho. Se eu tivesse que casar para que isso fosse
possível, para cuidar de Anita e sair de sua influência, que fosse. Eu
pagaria o preço necessário.
— Tudo bem — Selo meu destino.
Capítulo 2
“1,2,3...”
Meu pai me ensinou, desde muito nova que em nosso mundo não
haveria príncipe encantado. Que teríamos que ser suficientes para
salvar nossa própria pele.
“4,5,6...”
Isso moveu a mim e às minhas irmãs a procurar nos prepararmos
para o lado sombrio do mundo em que vivíamos. Aqui, as mulheres
foram condicionadas a não ver, não sentir, não falar, subjugadas e
vistas como incapazes de lidar com a nossa realidade. Isso também
era chamado de proteção.
“7, 8, 9...”
Meu pai nos forçou e reconhecer a nossa verdade. Ele disse que
essa era a melhor forma de nos proteger. Eu acredito nele.
“10, 11, 12...”
— Giulia, desse jeito não vai sobrar nada da coluna de boxe —
Escuto a voz de Milena atrás de mim, já vestida para o treino. Meu
pai construiu uma academia na parte de baixo da nossa mansão,
com piscina, espaço para boxe e artes marciais e tiro esportivo. Ela
continuou: — Mamãe está em êxtase lá em cima. Não sei o que
aconteceu, mas ela me pediu para chamá-la. Já estão todos no
escritório de papai.
Limpo o suor da minha testa e sigo para o escritório.
— Boa coisa não deve ser.
Isso tira uma pequena risada de Milena. Ela tem um humor leve,
mas é um furacão incontrolável quando provocada. Pai sempre diz
que ela deve aprender a controlar seu gênio ou isso ainda a
colocará em risco. Ele sempre disse que também seguia ordens e
que nem sempre poderia nos proteger de tudo. Nós também
tínhamos obrigações.
Entramos no escritório onde já estavam sentados papai e Isabella,
nossa irmã mais nova. Minha mãe estava em pé, com um papel nas
mãos, muito animada para nosso próprio bem. O maior desejo dela
era nos ver casadas com pessoas do alto escalão da Máfia, e a
maior tristeza era nos ver aprendendo “ofícios de homens”. Ela dizia
que as mulheres deveriam ser protegidas, que nossa
autossuficiência assustaria os homens e não conseguiríamos fazer
bons casamentos. Todas tivemos aulas de etiqueta, eu aprendi
piano e harpa, Isabella aprendeu ballet, tem desenvoltura social e é
a esperança da minha mãe por, aparentemente, ser uma flor
delicada. Com seus olhos azuis e cabelo claro, tem a face de um
anjo e um sorriso doce, até vê-la em ação com uma adaga. Milena é
misteriosa, sempre soube que ela mantinha segredos até mesmo de
mim, mas Isabella consegue ser ainda mais perigosa, porque as
pessoas tendem a subestimá-la. Eu tenho a reputação de ser a mais
complicada, mas é só a reputação. Comparada às minhas irmãs, eu
sou muito tolerante.
— Sentem-se, meninas, sentem-se. Temos uma notícia
maravilhosa para vocês — diz minha mãe delirante de felicidade.
— Por que estou com medo dessa felicidade toda... — murmuro
tirando algumas risadas das minhas irmãs e de meu pai.
— Hoje não, Giulia, hoje sua personalidade rabugenta não vai
dissolver meu bom humor. Estamos vivendo um período histórico.
Fomos oficialmente convidadas para o aniversário de trinta anos do
futuro Don da Cosa Nostra. Todo o alto escalão da Máfia estará
presente — Se minha mãe pudesse flutuar, ela flutuaria. – Nós
vamos passar alguns dias em Nova Iorque, meninas. Seu pai, como
Sottocapo4 aqui na Filadélfia, foi intimado a estar presente. Como se
fôssemos declinar a esse convite.
4.Tradução livre da autora “segundo no comando”
Encarei minha mãe alguns segundos. Ela sempre foi linda e fez
jus ao seu papel de esposa troféu, perfeita nos eventos, mas
também sempre foi uma companheira de vida do meu pai. Com seu
cabelo negro e olhos castanhos, ela sempre estava arrumada e
preparada para qualquer situação. Milena é uma cópia de mamãe,
as fotos são impressionantes em semelhança, mas é aí que elas
acabam. Enquanto Milena era parecida com mamãe com seu cabelo
longo e negro e olhos castanhos, eu tinha o cabelo preto da mamãe,
a altura dos ombros e os olhos verdes. Papai era loiro e tinha
heterocromia, sendo um olho azul e outro verde.
Mamãe nos ensinou a nos comportar como uma dama em
eventos sociais, mas aqui na Filadélfia já éramos famosas por
sermos diferentes das outras principesses5 da Máfia. As mulheres
nos criticavam, outras nos respeitavam. Os homens nos desejavam
e nos temiam. A nós foi dada mais liberdade que qualquer outra
família da Máfia e os mais conservadores não recebiam uma mulher
forte muito bem. Minha mãe continuou seu discurso acalorado:
5. Tradução livre da autora “princesas”
— Lá, será a oportunidade perfeita para que vocês possam
socializar com o alto escalão da Máfia e quem sabe conseguir um
bom casamento para vocês...
Ela continuava a falar, falar, falar o discurso sobre como era difícil,
mesmo sendo filhas de um Sottocapo, achar alguém que lidasse
com a gente... não contive um suspiro...
— Quantas vezes eu já disse que é falta de educação suspirar
assim quando estamos falando, Giulia! Eu espero que você não me
envergonhe, já basta Milena que não consegue segurar a língua
afiada.
— Hey, eu estou bem quietinha aqui — reclama Milena.
— Alessandra, dê um crédito às meninas, elas sempre se
comportaram bem nos eventos daqui — interviu meu pai.
— Eu preciso me lembrar do incidente no aniversário do Capitão
Conti? — diz minha mãe olhando para Milena.
Papai levantou as mãos como quem diz: eu tentei.
— Cazzo! Ele passou a mão no meu seio, mamma6, no meio do
salão de festa!
6.Tradução livre da autora “mamãe”
— Cuidado com essa boca, mocinha, e você não precisava ter
quebrado o nariz dele. Deveria reportar ao seu pai, ele resolveria a
situação. Ele é o Sottocapo. Foram meses para que esquecessem
esse incidente — diz minha mãe com voz de choro.
Milena soltou um bufo, enquanto eu e Isabella seguramos o riso.
O soldado não tinha reconhecido Milena como filha do Sottocapo,
pediu uma dança e foi a sua pior viagem.
— E você, Giulia, trate de melhorar esse mau humor. Homem não
gosta de mulher mal humorada, então, por favor, colabore. Tente
sorrir mais. Você já vai fazer vinte e dois, filha. Eu, na sua idade, já
era mãe.
Esforço-me para não revirar os olhos. Sei qual o meu papel na
Máfia, sei que se meu pai chegar a um acordo onde eu tenha que
me casar, vou me casar, independente de qualquer coisa. Não era
minha culpa que não apareceu alguém corajoso o suficiente.
— Mas me diga, mamãe, por que toda essa comoção para o
aniversário do futuro Don? Nunca fomos convidados para eventos
em Nova Iorque. Não somos íntimos, estamos a um Estado de
distância — questionou Isabella. Isso era verdade. Vimos a família
Santorelli a muitos anos atrás quando a esposa do Don ainda era
viva e sua filhinha, um bebê. Eles vieram, jantaram, mas nunca mais
vi o casal ou o filho deles.
— Essa é a melhor notícia, Bella. O boato é de que se trata de
uma desculpa para que o futuro Don conheça as meninas e escolha
a sua esposa. Afinal, ele será o Don, precisa se casar — Minha mãe
está saltitando de felicidade, mas de repente para e nos olha. —
Meninas, eu sei que quando querem, vocês são impecáveis. Esse
evento é muito importante para mim, vocês são, de longe, as mais
lindas da Cosa Nostra. Mostrem para mim que eu também fiz um
bom trabalho com vocês.
Meu coração se apertou. Minha mãe poderia ser um pouco
exagerada, mas ela era uma boa mãe. Comparada a outras muitas
famílias da Cosa Nostra, eu só tinha a agradecer pela vida e
liberdade que meus pais nos deram. Eu me encarregaria de fazer o
nosso melhor nesse evento, mesmo que não conseguíssemos um
casamento vantajoso, ela se orgulharia de nós.
— Não se preocupe, mamãe, estaremos em nosso melhor
comportamento — afirmei com segurança.
Assim que saímos do escritório, fui para a sala de música.
Deveria ser uma imagem hilariante. Eu, com roupa de treino,
sentada em um piano, mas a música sempre foi um bálsamo para
os meus dias mais aflitos. Enquanto eu dedilhava The Scientist, do
Coldplay, deixava meus pensamentos voarem. Eu e minhas irmãs
sempre participamos de eventos aqui em Philly. Eu sempre amei a
liberdade de poder fazer o que gosto. Aqui as pessoas me
conhecem, sabem das minhas particularidades. Os soldados nos
respeitam, sabem da nossa capacidade de ser letal quando
necessário. Eu me esforçaria por minha mãe, por lealdade a tudo o
que meu pai fez por mim e minhas irmãs, mas o meu maior medo
seria se um dia me casasse, se alguém realmente se interessar por
mim. Enquanto as meninas do nosso meio aperfeiçoaram como ser
uma princesa perfeita, eu e minhas irmãs lutávamos com homens
mais velhos e mais habilidosos que nós. Enquanto elas escolhiam
maquiagem e vestidos, nós aprendíamos sobre armas e adagas. Se
um homem se interessasse por mim, ele me aceitaria assim? Eu
poderia ser uma dama, mas eu preferia não ser a maior parte do
tempo. Meus dedos dançavam pelas teclas enquanto meus
pensamentos voavam…
Giulia 14 anos

Vendada, no alto da colina, em uma cabana longe da cidade.


Soco no estômago.
— A vulnerabilidade está em sua mente, Giulia.
Outro soco, agora no peito. Tentei defender, mas não alcancei a
mão de mestre Chang. O ar sumiu dos meus pulmões.
— Ser subestimada é seu maior trunfo.
Chute no joelho. Caí, mas me levantei logo, mesmo com dor.
— Escute, Giulia. Escute.
Soco no estômago novamente. Eu queria escutar, eu queria me
concentrar, mas a dor em meu joelho e no abdômen estava demais
Ele voltou a me golpear mais vezes e eu estava quase chorando.
Dessa vez eu não choraria. Eu não me entregaria. Passamos as
últimas duas semanas aqui, nessa cabana no meio do nada. Eu me
interessei pelas artes marciais e papai contratou o mestre Chang
para me treinar, ele era a minha sombra. Ele voltou e me deu um
golpe em ambas as pernas, caí no chão e fiquei. Tentei escutar
além do minha dor. Foi então que ouvi os passos, ouvi o farfalhar da
calça.
“Se comunique com a natureza, Giulia. Ela é sua aliada”. Senti
que seu pé se levantava do chão, ele iria me chutar. Sem pensar,
antes que me acertasse, eu defendi o golpe e abracei suas pernas
com as minhas, derrubando-o no chão. Sem perder tempo, me
coloquei em cima do mestre e tentei segurar suas mãos com minhas
pernas, mas ele foi mais rápido. Senti sua movimentação para
acertar meu rosto, foi uma sequência de cinco golpes que me
defendi apenas guiada pelo instinto. Com uma cabeçada, o
surpreendi e consegui segurar suas mãos com minhas pernas, o
asfixiando com as mãos. Alguns segundos, ele bateu a perna no
chão. Eu tirei a venda e ele me deu um quase sorriso.
— Muito bem, Giulia.
Fui tirada dos meus pensamentos pela entrada do meu pai na
sala de música.
— Você só toca assim quando está preocupada — Meu pai se
aproximou do piano. Ele me conhecia mais que eu mesma. Ele
sempre me pedia opinião sobre suas decisões e seus capitães
aprenderam a me respeitar também.
— Estou bem — disse para não preocupá-lo. Eu faria qualquer
coisa pelo meu pai, mesmo me casar com alguém que não
conhecia. Achava pouco provável que acontecesse, mas se
houvesse um acordo com alguém, eu o honraria.
—Você não me engana, figlia7. Você está com medo desse
evento?
7.Tradução livre da autora “filha”
— Tenho receio de alguém se interessar por mim, mas gostar de
apenas uma parte de mim. A principessa, a dama perfeita. Eu
morreria de tédio e acho que mataria o marido no processo.
Isso tirou uma pequena gargalhada do meu pai. Depois ele me
fitou:
— É pouco provável que aconteça. Você não deveria se
preocupar.
— Você está tão seguro — disse estreitando os olhos.
— Quando você se casar, Giulia, vai ser com alguém que te
respeitará como você é, porque eu te ensinei a se impor. Eu te dei
as armas. Lute — Ele saiu com uma piscadela.
Eu não costumava demonstrar minhas inseguranças, mas algo
sobre esse evento me deixava inquieta, quase angustiada. Eu tinha
a sensação de que tudo mudaria em breve, muito parecida com a
sensação que senti quando tinha 9 anos e escutei meu pai e minha
mãe no escritório. Depois daquele dia, meu pai passou a nos treinar
como qualquer outro soldado. Ele não nos poupou. Agora, a
sensação era a mesma.
Eu só não sabia dizer se isso era boa ou não.
Capítulo 3
Os dias que se seguiram foram, no mínimo, turbulentos. Mamãe
nos arrastou de loja em loja para vestidos e acessórios. Milena era,
de longe, a mais sofisticada entre nós. Eu sempre gostei de tons
mais escuros e Bella adotava estampas e flores. A rotina continuava
entre treinamento e os preparativos para o aniversário do futuro
Don.
Chegando o dia de embarcar, nos encaminhamos para o
aeroporto, sendo seguidos pela equipe de segurança. Nós
estávamos próximos ao território da Bratva, papai não nos deixavam
cegas quanto aos negócios, sabíamos que, ultimamente, a Cosa
Nostra estava sofrendo ameaças e ataques aos nossos laboratórios
e aos nossos carregamentos. Embarcamos no jatinho, mamãe
animada, como se estivéssemos indo visitar a realeza. Não era
muito diferente. O Don é o topo da nossa hierarquia.
Eu sabia muito pouco a respeito dos Santorellis. Dizem que o Don
é sádico, gosta de infringir dor em qualquer ser humano, inocente ou
não. Seu filho não deve ser muito diferente, se tudo o que dizem a
respeito do herdeiro for verdade. Sua fama também vai longe sobre
sua falta de misericórdia. Papai comenta que a futura Tríade de
poder será muito poderosa, a Tríade é composta pelo Chefe de
Frente, Consigliere e o Don, sendo este o topo do poder. Meu pai é
um excelente líder, nunca teve problemas com o Don, é muito
amado e respeitado pelos nossos soldados. O Don nunca teve que
ir ao nosso território para dar apoio em alguma situação ou mesmo
por desconfiança. Esse era um dos motivos pelo qual não fôssemos
muito próximos do Don.
O voo ocorreu sem problemas, desembarcamos e seguimos para
o apartamento que papai mantém em Nova Iorque. As duas vezes
que viemos foram rápidas e mal aproveitamos os pontos turísticos.
Enquanto seguíamos para o apartamento, Milena suspirou:
— Dessa vez eu vou dar uma volta no Central Park.
— Você sabe que pode ser perigoso — argumentou mamãe.
— Perigoso para quem? — responde Milena com um sorrisinho
que Bella e eu acompanhamos. Mamãe deu um suspiro derrotado.
Às vezes, eu tinha um pouco de pena dela.
— Seu pai deu liberdade demais a vocês.
Chegamos ao apartamento e eu estava inquieta guardando
minhas coisas no closet. Escutei uma batida na porta e minhas
irmãs entraram. Bella se dirigiu à janela e Milena se jogou em minha
cama.
— Você já viu alguma foto do Don ou de alguém vinculado a Máfia
aqui de Nova Iorque?
— Não. Nunca vi a necessidade — respondi guardando meus
sapatos, deixando meu mal-humor sair. Viajar me irritava, guardar
minhas coisas me irritava, ir nessa festa me irritava, mas eu
precisava ser a voz da razão
— Você sabe que sua rabugice não me atinge, Giulia. Sou imune
a ela — disse Milena.
— Infelizmente — disse em um sorriso falso.
— Mamãe o viu quando veio em Nova Iorque, ano passado. Disse
que ele é muito bonito e educado — disse Bella ainda olhando na
janela.
— Eu me sinto em um leilão, oferecida em uma bandeja. É
deplorável que ainda existam essas tradições tão antiquadas. Como
a gente se casa com alguém que não conhece? Eu nunca vou
passar por isso. Prefiro desertar.
Eu suspirei. É disso que eu falo, ser a voz da razão.
— Milena, ir nesse evento não quer dizer exatamente que
seremos obrigadas a nos casar. O fato de papai ter sido afável
conosco não quer dizer que estamos isentas das nossas obrigações
— Milena suspirou alto. Eu tinha a impressão que ela jamais se
casaria por conveniência.
— Você se casaria? – perguntou Bella virando-se para me
encarar com seus grandes olhos. — Se você fosse escolhida pelo
Don, você se casaria?
Pensei um pouco antes de responder:
— Se fosse para o melhor de todos, sim. Mas sabemos que é
pouco provável que ele escolha a mim. Provavelmente, ele procura
uma principessa8 afetada e submissa. Adjetivos esses que não nos
descrevem. Então, volto a dizer, por mamãe, vamos fazer o nosso
melhor. Logo tudo isso acaba e voltamos para Philly.
8.Tradução livre da autora “princesa”
Milena suspirou mais uma vez e saímos do quarto. Estava no fim
da tarde, então resolvemos ir ao Starbucks que tinha próximo ao
apartamento. Papai avisou aos fantasmas que estaríamos indo.
Éramos perfeitamente capazes de nos proteger, mas resolvemos
aceitar por insistência.
Entramos no café percebendo que tinham algumas pessoas para
serem atendidas, então aguardamos na fila. Milena e eu éramos de
estatura mediana, sendo Isabella mais baixa e magra, muitas vezes
era confundida facilmente com uma adolescente, apesar de seus
dezoito anos.
Notei que em nossa frente havia dois homens altos e fortes, mas
de onde eu estava, não conseguia ver os rostos e logo perdi o
interesse. Eu convivia com muitos homens, treinava com eles, mas
sendo filha do Chefe, eles nunca me davam uma segunda olhada.
Não que eu estivesse interessada, mas esses homens à nossa
frente exalavam uma aura de superioridade e chamaram minha
atenção.
Estávamos conversando animadamente sobre um filme que
entraria em cartaz enquanto aguardávamos nossa vez. Eu era a
maluca por café, experimentava os mais variados tipos. Um dos
homens grande se afastou, dando passagem para mim, e aguardou
ao lado, mas eu estava mais interessada no café que eu iria
experimentar.
Bella e Milena pediram um Latte9 tradicional, enquanto eu decidia
que iria pedir um indicado como novidade, chamado Tentação.
Enquanto o café das minhas irmãs era preparado, olhei para o
homem alto que estava ao lado, aguardando o outro atendente fazer
o seu. Seu amigo já estava sentado em uma mesa e ele aguardava
o dele. Por um momento me permiti olhar de verdade para o homem
que era uma visão. Tinha o corpo bem definido, cabelo cheio,
castanho, mandíbula quadrada e a boca lindamente contornada.
Também era banhado por um ar sombrio. Quando olhei em seus
olhos, eles estavam em mim também. Seu olhar era fixo, intenso e
sem desculpas, e eu me senti como uma criança pega em uma
travessura. Nessa hora, o atendente me perguntou qual seria o meu
café e eu respondi prontamente com os olhos no estranho, que me
mantinha cativa por sua intensidade.
9. Tradução livre da autora “leite”, mas no caso e um tipo de café
— Tentação.
O estranho continuou olhando fixamente e eu percebi em seu
olhar que ele estava se divertindo. Não que ele tenha sorrido, ele
não o fez, não parecia ser desses que sorriam facilmente.
Ao me dar conta do que tinha acabado de acontecer, desviei os
olhos e senti meu rosto arder. Eu o chamei de Tentação? Não, não,
eu pedi um café. Eu só queria um café e, acidentalmente, eu estava
olhando para ele.
Cazzo.10
10. Tradução livre da autora “Merda”
Eu não corava.
Nunca.
Firmemente olhando em frente, ignorei o estranho e mostrei-me
muito interessada no atendente preparando meu café. O pedido do
estranho ficou pronto e ele lentamente se aproximou de mim,
tornando impossível não olhar para ele. Virei-me de frente a ele com
o que restou da minha dignidade. Ele se aproximou, e se aproximou,
eu deveria pará-lo. O que ele ia fazer? Meu corpo não respondeu,
eu tentei preparar um golpe para pará-lo, mas estava hipnotizada.
Ele disse em meu ouvido:
— Realmente... uma tentação — Senti sua respiração quente,
enquanto ele se afastava lentamente, me olhando nos olhos mais
alguns segundos, até virar-se e ir para seu amigo. Eu sempre tinha
uma resposta espirituosa para todas as situações, mas, naquele
momento, não consegui pensar em nada que não fosse o perfume
masculino e embriagador e no estremecimento do meu corpo.
Quem era esse homem? E que sensação foi essa?
Mesmo com toda a liberdade que tivemos, sendo nascida e criada
na Máfia, havia princípios que eu valorizava. Eu sempre pensei em
sexo com alguém que eu me sentisse atraída e isso nunca tinha
acontecido, até hoje. Mas, calma, sexo? De onde veio isso? Eu nem
conhecia esse homem e ele exalava perigo, isso eu tinha certeza e
sentia na medula.
Virei-me para o atendente ainda perdido em pensamentos quando
o sino tocou e dois homens entraram. Avistei Bella e Milena a
alguns metros me aguardando e eu ainda estava distraída quando
um dos homens me empurrou para trás violentamente e anunciou
um assalto. Se eu não tivesse tão absorta em meus pensamentos,
teria notado o comportamento suspeito dos homens. Notei pelo
canto do olho o homem tentação e percebi que ele e o outro
estavam armados, a propósito, o homem Tentação já estava com a
arma na mão dele, se levantando do banco. O olhar era assassino.
Cazzo. Va fanculo. 11
11. Tradução livre da autora “Merda. Que caralho”
Isso poderia ficar muito feio. Com um olhar, notei que minhas
irmãs já largavam o café e, com um sinal, me aproximei do primeiro
assaltante, o que havia me empurrado, e bati em seu pulso de forma
que ele largou a arma. Chutei-a para longe e dei um golpe com a
mão aberta em seu nariz, ele uivou de dor, em seguida, dei uma
rasteira, o homem caiu, rapidamente dei um nocaute estratégico,
deixando-o desacordado.
O segundo homem estava mais distante, com a arma apontada
para mim. Fiquei parada quando notei que Bella se aproximava do
homem e dava-lhe um chute na parte de trás de seu joelho, fazendo
com que se dobrasse, dando-lhe um mata-leão. Ele atirou e quase
acertou Milena, que segurou sua mão e tirou-lhe a arma com uma
pressão no pulso. O homem caiu no chão, tentando recuperar o ar e
foi quando eu vi.
Bella estava sorrindo.
Bella iria matá-lo.
Não poderíamos chamar atenção assim, era só o que eu
conseguia pensar, olhei para seu rosto brilhando de excitação,
conhecia esse olhar, ele apontou uma arma para mim e, por pouco,
não acertou Milena, ela iria puxar uma adaga e mataria o infeliz. O
sangue gelou em minhas veias, mas estava muito longe para
impedir. Milena deve ter pensado o mesmo, pois, estando mais
próxima, com um só soco na cabeça do homem o desmaiou. Eu
cheguei em seguida e puxei Bella para longe.
— Por que vocês tem que acabar com a minha festa? — Ela disse
com uma falsa calma e uma voz doce. Ela só tinha dezoito anos,
mas poderia ser mais sanguinária que qualquer homem feito. Às
vezes, até mesmo eu me assustava.
— Não podemos chamar atenção — falei em seu ouvido.
Os fantasmas estavam assistindo da porta com suas armas no
punho, no lado de fora, e nos deram sinal para sairmos. A comoção
era total, mas, com o canto dos olhos, consegui enxergar o cara
tentação e seu amigo. Sem perder a adrenalina, soprei um beijo
debochado e me virei. Mas ainda consegui ver o brilho dos seus
olhos, que acelerou o meu pulso. Entramos no carro o mais rápido
possível. Um dos seguranças já estava ligando para meu pai e o
outro, para o cara que “limpa a bagunça”, para nos apagar da cena.
Mamãe ficaria furiosa. Adeus passeio no Central Park.
Capítulo 4
Ainda estava surpreso com o show que acabei de presenciar e
raramente as pessoas, ou situações, me surpreendiam. Observando
as três mulheres saírem em um carro, acompanhadas por alguns
seguranças, percebi que não eram civis comuns. Quem eram?
Nocautearam dois ladrões em menos de dois minutos como se
fossem profissionais. Uma delas parecia nem mesmo ter saído do
colegial.
— Va fanculo! O que foi tudo isso? — disse Giovanni com seus
olhos tão surpresos quanto os meus. — Cara, acho que me
apaixonei — anunciou falsamente com uma mão no peito e um
sorriso de merda.
Giovanni era um piadista. Tinha humor para tudo, mas era o
melhor estrategista da Cosa Nostra. Por isso e por sua confiança e
lealdade, ele seria o meu Consigliere12.
12. Tradução livre da autora “Conselheiro”
— Vamos embora, em pouco tempo aqui estará cheio de policiais
— Ele me acompanhou ainda comentando sobre a performance das
meninas, enquanto eu acenava indicando que escutava, mas meus
pensamentos ainda estavam na morena de olhos verdes.
Ela era linda, pensava enquanto entrava no carro e seguia para
casa.
Eu estava acostumado com mulheres bonitas, então, não
entendia esse fascínio instantâneo pela estranha. Talvez seja a
mistura de força e ingenuidade. Quando aquele homem a afastou
com violência, eu quase atirei nele ali mesmo, sem pensar nas
consequências. Minhas reações a essa desconhecida me assustou.
Não importava.
Meu foco deveria estar unicamente na importância do evento de
sábado onde deveria estar presente minha futura esposa.
Velho bastardo.
Essa era a última vez que ele iria interferir na minha vida.
Notei que, com meu devaneio, Giovanni se calou.
— Ter um prazo para arrumar uma esposa deve ser muito fodido
— diz Giovanni, de repente, reflexivo. Ele era uma das poucas
pessoas que realmente me conhecia, que permitia baixar alguns dos
meus escudos. Era um tom conhecedor. Ele sabia quão bastardo
meu pai era, diferente de seu pai, que foi firme sem ser cruel.
Giovanni tinha uma boa família, como poderia ser uma boa família
na Máfia.
Não respondo, mas sinto um aperto quase como um lamento.
Sim, era muito fodido, mas tentava ver de forma prática. Finalmente
digo:
— É necessário.
Porque era. Um preço para nos livrar definitivamente do velho e
tirar qualquer sombra de influência dele na vida de Anita. Quando eu
fosse Don, também seria o chefe da família e não permitiria que ele
a usasse como peão em seus jogos, como ele fazia com todos ao
seu redor.
Sem mais conversas, seguimos para casa.

Sábado chegou e eu estava cedo na mansão Santorelli, como


manda a etiqueta, para receber os convidados. O salão estava
iluminado, se estendendo ao jardim e a piscina impecavelmente. A
segurança havia sido redobrada devido a todos os chefes da Cosa
Nostra estarem presentes. Segundo meu pai, todos haviam
confirmado presença. Um a um, recebi os chefes do alto escalão da
Máfia com suas famílias. Entre os convidados, me inteirei de Sofia
DeLucca. Ela era filha de um dos Caporigemes de Nova Iorque e
sempre se mostrou interessada em mim.
Sei que nunca fui uma pessoa acessível. Como futuro Don, fui
modelado a ser distante e polido em público, e cruel com meus
inimigos. Nunca tive um relacionamento em longo prazo, nem
mesmo uma amante. Nunca tive uma conexão. Minhas
necessidades eram supridas em nossos clubes, sem qualquer
promessa, mas Sofia DeLucca foi a única pertencente à Máfia que
já troquei mais que algumas palavras, de modo que não pareceu se
intimidar com meu comportamento distante e impessoal. Talvez ela
fosse uma boa escolha, não queria uma mulher que me temesse ou
não fosse capaz de me olhar nos olhos. Sofia era respeitosa,
sofisticada e elegante, saberia o seu lugar e eu a protegeria.
Já próximo à hora marcada, notei Enrico Castelle entrando com
sua família. Eu estive pouco na Filadélfia, onde Enrico era
Sottocapo, pois o homem era implacável em seus negócios, nunca
precisou de reforços e os relatórios eram satisfatórios. O fato de eu
ainda não ser Don era outro motivo pelo qual nos encontrávamos
raramente. Ele tratava os assuntos da família com meu pai.
Enquanto o cumprimentava ele e sua esposa, me virei para o
restante de sua família logo atrás dele.
Senti meu sangue gelar ao ver as três garotas da cafeteria sendo
apresentadas como filhas do Sottocapo da Filadélfia.
Eu vi essas meninas, essas crianças, uma única vez e mal me
lembrava se eram duas ou três.
— Deixe que eu te apresente minhas filhas, acho que faz muito
tempo que as viu. Essa é Giulia, minha filha mais velha. — Ela
também estava paralisada, com a boca levemente aberta, enquanto
eu mantive o rosto impassível. Ela estava com um vestido preto que
se percebia ser frente única pelo caimento das laterais, longo, com
uma fenda até o alto da coxa no lado direito. O cabelo preto na
altura do pescoço, a pele pálida destacando seus lindos olhos
verdes.
Linda pra caralho.
Ela me estendeu a mão, hesitante, e eu dei um beijo casto ainda
olhando em seus olhos. Ela franziu levemente o cenho, mas logo
suavizou e sorriu. Era uma máscara. Eu saberia reconhecer uma
máscara em qualquer lugar, pois eu sempre usava uma também.
— Essas são Milena... — Eu me virei para a morena de olhos
negros e cabelo longo. Ela não sorriu e parecia estar se esforçando
para ser minimamente educada, como se estivesse ali por
obrigação. Se eu me importasse, poderia levar como uma afronta.
Beijei sua mão rapidamente e me virei para a loira colegial de olhos
azuis, que sorria docemente como se eu não tivesse visto o brilho
em seus olhos na perspectiva de matar aquele ladrão —... e
Isabella.
— Sejam bem-vindos, entrem e sintam-se a vontade.
Após os cumprimentos, eles adentraram ao salão. Recebi os
últimos convidados, mas meus pensamentos ainda estavam na
beleza de olhos penetrantes.
Ela pertencia a Cosa Nostra.
Uma ideia ia se formando em minha mente, mas antes de
qualquer decisão, eu deveria testar o terreno, ela não era nada
convencional. Pensar somente com meu pau não era um argumento
válido para a decisão de uma vida inteira, mas, depois de vê-la,
nada mais segurou minha atenção. Era a primeira vez que uma
mulher tinha a minha atenção.
Finalmente, me juntei a Giovanni e Nero, nosso Capitão-Mor.
Nero, com seus vinte e cinco anos, era o nosso melhor soldado, e,
junto com Giovanni, conseguia elaborar e executar os melhores
planos de ataques. Eu o manteria comigo, não só pela capacidade,
como também por causa da confiança. Ele tinha sido adotado pela
família Rossi quando tinha 13 anos. Segundo eles, ele era filho
único e seus pais morreram no acidente. Ele perdeu a memória e
não se lembrava de nada que aconteceu antes que fosse morar com
eles.
— Parece que descobrimos quem eram “As Panteras” de ontem
— diz Giovanni com seu tom debochado. — Filhas do Sottocapo da
Filadélfia, hein, quem diria.
— Parecem inofensivas, não entendi a referência — Nero diz com
neutralidade.
— Isso é porque você não as viu em ação, meu amigo. Não se
engane, e está vendo aquela loirinha com carinha de boneca? É a
pior.
Eu contive um suspiro, enquanto Nero olhava para onde as
meninas estavam junto com os pais, cumprimentando outras
pessoas. Olhando daqui, realmente pareciam inofensivas, tanto que
Nero continuava incrédulo.
— Ela parece que ainda nem terminou o colegial. Ela deve ter o
quê? Dezesseis?
Eu não disse nada, até porque eu pensava o mesmo. Olhando
novamente para o grupo, notei dois olhos verdes penetrantes em
mim e, como se pega em flagrante, desviou rapidamente. Essa
brincadeira de gato e rato era novidade para mim, nunca tive
dificuldade em conseguir o que eu queria. Se eu decidisse que eu a
queria, eu iria tê-la e nada iria me impedir.
— Essa música é ótima para dançar — A voz suave de Sofia me
arrancou da névoa de pensamentos. Ela era linda, alta para uma
mulher, cabelos castanhos e olhos da mesma tonalidade. Nunca nos
envolvemos, mas sempre tive a impressão de que ela esperava que
ficássemos juntos. Ela era a única principessa que não se acanhava
em me abordar nos eventos e flertar inocentemente comigo. Dei um
sorriso plácido para seu convite implícito e estendi a mão.
— Vamos dançar, então.
Seu sorriso se expandiu enquanto me deixava conduzi-la ao
centro do salão. Alguns casais dançavam ao redor e eu mantive
uma distância respeitosa de Sofia, como mandava a etiqueta. Meu
olhar desviou novamente para Giulia e ela estava conversando com
o filho do Sottocapo de Nova Inglaterra, Antônio Ferrari. Confesso
que vê-los conversando me incomodou e isso nunca aconteceu
antes. Devo ter deixado transparecer algo, pois ouvi Sofia dizendo.
— Segundo mamãe, a fachada é sofisticada, somente isso:
Fachada — Acompanhou meu olhar para as irmãs Castelle e
continuou. — A de cabelo preto longo quebrou o nariz de um
soldado a um tempo atrás na festa de aniversário do capitão Conti,
foi um escândalo.
Sua tentativa de dissuadir meu interesse me mostrou duas coisas:
eu deveria esconder melhor o que pensava, interesse óbvio, em
nosso mundo, poderia ser muito perigoso. E eu precisava conversar
com Giulia Castelle para testar essa conexão.
— Vi alguém que preciso cumprimentar, com licença.
Ouvi Sofia chamar meu nome, mas continuei meu caminho com
destino decidido. Percebi o momento em que Giulia se deu conta da
minha intenção. Outros poderiam não perceber seu sutil
estreitamento dos olhos, quase em desafio, porém eu era bom em
ler pessoas. Sem desviar os olhos, me aproximei.
— Dança comigo?
Ela olhou entre mim e Antônio, como se não soubesse o que
fazer. Antônio me fitou por alguns segundos, mas logo se afastou
com um sorriso forçado. Giulia me olhou firmemente nos olhos e
isso me surpreendeu e emocionou ao mesmo tempo. Não sei se
seria bom para uma esposa, mas que era emocionante, era. Por um
momento, achei que ela negaria, pois franziu o cenho quase
imperceptivelmente, contudo, mais uma vez ela vestiu a máscara
polida da informalidade e da educação e aceitou com um aceno. Ao
invés de me sentir afrontado, encontrei me divertindo como há muito
tempo não fazia.
Seguimos para o centro do salão e minha mão foi ao encontro de
suas costas nuas. Senti seu estremecimento, enquanto ela
levantava suas mãos aos meus ombros. Pelo pouco que conhecia
sobre essa garota, poderia afirmar que não era medo e segurei a
vontade de dizer que a atração era mútua.
A sua cabeça estava próxima ao meu queixo de forma que senti o
aroma do seu cabelo, um aroma floral e cítrico, único, que me
excitou instantaneamente.
— Rosas e frutas. Esse é um aroma que eu jamais associaria a
você — Ela se afastou alguns centímetros e me olhou nos olhos.
— Acho que não nos conhecemos em nada para associar
qualquer coisa um ao outro — disse com neutralidade controlada.
Ela era mal humorada. Estranho, eu me encontrava gostando disso
também.
— Você está certa. Mas isso está prestes a mudar — Seu passo
vacilou e ela parou. Ela entendeu, mas a pergunta estava ali em
seus olhos. Sim, principessa, há uma grande chance de que
teremos tempo para mais do que se conhecer.
— O que você quer dizer com isso? — Agora sua voz tinha uma
pitada de insegurança, incredulidade e até mesmo medo. Aproximei
nossos corpos e disse em seu ouvido:
— Que vamos nos conhecer muito bem, em todos os sentidos —
Me afastei para encarar seus olhos e vi uma tempestade se formar,
quase me senti ofendido. Ela esperava alguém melhor que o futuro
Don? Teria alguém esperando por ela em sua cidade? Isso não
importava. Eu sempre conseguia o que queria, ela aqui em meus
braços, e toda essa teimosia velada só me fazia ter mais certeza.
Ela seria minha. Estava decidido.
— Escutou isso? — Se eu não estivesse tão envolvido em meus
pensamentos, teria notado a mudança no ambiente. Jamais me
distraí assim.
Foi quando percebi o som de disparos, mulheres gritando,
correndo, um verdadeiro caos. Giovanni parou ao meu lado:
— Infiltrados, Enzo disse que conseguiram interceptar alguns
soldados no lado de fora. Tivemos baixas. Os tiros são de lá. Não
sabemos se há algum deles aqui — Ele me deu um olhar
conhecedor.
Traidores.
A única explicação para a falha na segurança é porque alguém de
dentro passou informações. No meio do caos nem percebi que
Giulia já não estava ao meu lado.
— Provavelmente a Bratva. Todos os líderes da Cosa Nostra em
um só lugar é um convite. Eu falei desde o início — disse Nero se
aproximando.
— Organize uma linha de defesa, Nero. E você, Giovanni, leve as
mulheres para a sala de pânico. — Anita. Minha irmãzinha deveria
estar na parte de cima em seu quarto dormindo. — Eu vou atrás de
Anita.
— Considere feito — Nero disse já se afastando.
Sem esperar respostas, subi as escadas enquanto meus homens
tomavam conta da situação. Esse era o primeiro ataque direto da
Bratva. Até hoje, o máximo de confronto que tivemos foram ataques
aos nossos carregamentos de drogas próximo ao seu território. Isso
era uma declaração de guerra aberta. Quando a família Ivanov
governava a Bratva, nós tivemos um período de paz. Eles eram
justos e íntegros, respeitavam o nosso território. Porém, Ivan Nikolai
massacrou a família Ivanov e, até onde sabemos, não houve
sobreviventes.
Chegando ao quarto da minha irmãzinha, encontrei a porta
aberta, a cama vazia e a cuidadora baleada no chão. Terror se
apossou de mim. Levaram minha irmã. Com minha arma nas mãos,
fui verificando os quartos e banheiros, tentando escutar mais do que
o caos e empurrando o terror. Disquei o número de Nero.
— Senhor.
— Minha irmã foi levada — Tentei manter a voz firme —, avisem a
todos para que ajudem nas buscas.
— Cazzo! Sim, senhor, a situação foi contornada. Conseguimos
pegar alguns russos, outros foram mortos ou conseguiram fugir. As
mulheres estão na sala de pânico. Vou convocar o restante para
procurar no complexo.
Ele não queria dizer, mas eu sabia. Corríamos um sério risco de
ela ter sido levada muito antes de termos ciência dos infiltrados.
Poucas pessoas importavam na minha vida e minha irmã estava
no topo dessa escala. Não deveriam ter saído do complexo e
mesmo os poucos soldados que não estavam de serviço hoje já
deveriam estar a caminho.
Próximo à escada, percebi que já não havia tanta movimentação,
mas antes que descesse, escutei vozes abafadas em um corredor
lateral. Aproximando-me com cautela para que não fosse visto ou
ouvido, vi na semiescuridão dois malditos russos caídos no chão,
uma das irmãs Castelle, a do meio, segurando uma arma apontando
para o que estava de pé.
Va fanculo, ele estava com minha irmã, uma arma apontada para
sua cabeça, enquanto Giulia tentava fazê-lo abaixar a arma. Já
estava preparado para atirar na cabeça do infeliz antes que me
visse quando percebi que a mão dele caiu ao seu lado e ele
desfalecia com os olhos arregalados e a boca sangrando. Foi
somente depois que ele caiu que entendi, atrás dele, a irmã mais
nova estava suspirando quase feliz.
— Odeio os russos — disse como se estivesse falando que
odiava chuva. Ela tinha lançado uma adaga na nuca do russo como
se fizesse isso todos os dias.
— O ballet teve alguma utilidade no fim das contas. Passos de
bailarina, silenciosos como a própria morte — disse a irmã do meio.
Giulia se aproximou da minha irmã e a trouxe para junto de si.
Minha irmã se agarrou a ela como se sua vida dependesse disso,
chorando.
— Acalme-se, querida, acabou.
Nesse momento, eu me pus à vista e aproximei-me do grupo.
Minha irmã me reconheceu e se soltando de Giulia, me abraçou
fortemente. Eu a levantei nos braços.
— Ed, eu tive tanto medo — disse chorando. — Eles disseram
que virão me pegar.
— Shii, principessa, acabou. Ninguém vai encostar em você, eu
prometo. — As irmãs Castelle assistiram à cena em silêncio. Eu não
deveria falar com minha irmã assim em público, deveriam estar
surpresas, mas, no momento, eu não conseguia me importar.
Respirando mais aliviado, liguei para Nero.
— Senhor — Ele atendeu prontamente. Quando estávamos
somente entre nós, formalidades não eram necessárias, mas, em
grupo, poderia ser considerado desrespeitoso.
— Encontrei-a. Corredor norte, ala de visitas.
— Viva?
— Sim — Ouvi o seu suspiro aliviado.
— Grazie Dio13. Estou a caminho com Giovanni — Desliguei o
telefone e olhei para as irmãs Castelle, dando um aceno agradecido.
No momento, era a única coisa que eu conseguiria fazer enquanto
segurava minha irmã junto a mim. Giulia segurou o meu olhar por
alguns instantes, percebendo a emoção dançando em seus olhos
por ver meu lado protetor e afável. Pela primeira vez na vida, não
tive vontade de esconder. Compartilhamos um olhar cúmplice de
quem faria qualquer coisa por seus irmãos e, pela primeira vez, não
vi a importância da minha irmã na minha vida como uma fraqueza.
Poderia ser por quase perdê-la ou mesmo pelo exemplo de força e
amabilidade a minha frente.
13.Tradução livre da autora “graças a Deus”
Ouvimos passos no corredor, já estava com minha arma no
punho, a irmã de cabelo longo e preto tirou duas armas do suporte
que estava em sua coxa, por baixo das saias esvoaçantes, sem
desviar o olhar do corredor. Eu não via, mas tinha certeza de que a
loirinha teria uma adaga escondida em algum lugar, e Giulia,
protetoramente, se colocou próxima a minha irmã, ficando entre mim
e ela.
— Opa, opa, olha o que temos aqui, alguém fez uma festa
sangrenta e não me esperou — É Giovanni, acompanhado de Nero,
com as mãos para cima enquanto avaliava o pequeno grupo, seu
olhar focou na irmã do meio com as armas nas mãos. — Uau, adoro
as selvagens!
Ela estreitou os olhos, enquanto Nero decidia que não havia
perigo e ligava as luzes do corredor.
— Eu detesto os babacas — A irmã do meio soltou com um bufo,
ainda com as armas apontadas para o meu futuro Consigliere. Ele
deu um sorriso de merda e chegou bem perto, encostando as armas
em seu peito, ela deu um sorriso que não chegou aos olhos. — Não
me tente, senhor.
Nero segurou o riso miseravelmente, disfarçando com uma tosse.
— Milena, chega. Não se esqueça da importância da hierarquia —
Giulia disse com autoridade, ela parecia exercer influência nas
ações da irmã, porque Milena suspirou mais uma vez, girou as duas
armas nas mãos e as colocou no suporte das coxas. Os olhos não
deixaram Giovanni, que arqueou as sobrancelhas e quase se
abaixou para dar uma boa olhada nas pernas da esquentada.
Quando voltou a olhar no rosto da moça, ela revirou os olhos.
— Fofa! — Giovanni provocou com um sorriso e a morena lhe
lançou um olhar assassino.
— Idiota!
Eu perdi a paciência.
— Chega dessa merda. Qual a situação? — Meu tom fez que com
que todos saltassem.
— Tivemos algumas baixas entre os soldados. Ninguém do alto
escalão foi ferido. As mulheres estão em segurança, mas estou com
a impressão de que ainda não terminou — Nero disse voltando ao
seu modo capitão. — De qualquer forma, os que conseguimos
capturar já estão no porão aguardando segunda ordem. Seu pai
disse que você está no comando hoje.
Percebendo que todas ouviam atentamente, afirmei.
— Vou deixar Anita com a governanta e nos encaminhamos para
o porão.
— Posso acompanhar? — disse a irmã mais nova com as duas
mãos juntas na frente do corpo adoravelmente, como se não
estivesse pedindo para presenciar uma sessão de tortura. Giovanni
soltou uma gargalhada e Nero a encarava como se houvesse
nascido outra na cabeça na jovem. Essa garota era estranha.
— Claro que não — disse Nero bruscamente. Os olhos dela
brilharam.
— Está com medo que eu tire as informações muito mais rápido
que você? — Essa menina estava desafiando o mais implacável dos
meus soldados com a voz tão doce. Sem mencionar que de altura,
ele dava, ao menos, dois dela. Nero era mais alto que eu e
Giovanni. Eu estava agradecido por terem salvado minha irmã,
então resolvi intervir antes que algo mais acontecesse.
— Prefiro que vá com suas irmãs e fique junto de sua família,
senhorita. Deixe que a gente cuide do trabalho — Ela assentiu
quase penalizada. Era a coisa mais estranha de incontáveis
maneiras.
— Mas eu prometo chamar quando precisarmos da sua ajuda,
Anabelle — diz Giovanni para a loirinha em tom de brincadeira.
Giulia tentou segurar o sorriso, Milena poderia, a qualquer momento,
sacar a arma e atirar em Giovanni, e Nero, curiosamente, não
gostou do apelido. A menina não moveu um músculo do rosto,
continuou sorrindo daquele jeito estranhamente doce e calculado.
— Vamos — disse já me movendo para evitar uma tragédia, logo
eu que prosperava no caos.
— Deixe-a conosco, senhor — Me surpreendi com a voz de Giulia
— Acredito que possa ter traidores infiltrados, de modo que não seja
seguro deixá-la aqui. Se houver, poderão tentar um novo ataque. Eu
dou minha palavra que conosco ela estará segura, até que vocês
considerem que o ambiente e a equipe confiáveis novamente —
Hesitei de início, mas sua linha de raciocínio fazia sentido. Eu não
tinha certeza de quem era confiável no momento e essas três
garotas salvaram a vida da minha irmã. Por hoje, talvez fosse o
correto. Ela deve ter percebido minha hesitação, pois se aproximou
e tocou meu antebraço, dizendo com firmeza. — Vamos cuidar dela.
Eu acreditei nela. Era inexplicável, pois tinha acabado de
conhecê-la e esperava não estar enganado, mas ela me inspirava
uma confiança que eu não costumava dar tão livremente. Eu tinha
uma lista muito curta de pessoas confiáveis e poderia dizer que,
inexplicavelmente, ela estava nesse grupo.
— Tudo bem — Abaixando-me, olhei para minha irmã. — Anita,
hoje você ficará na companhia dessas senhoritas, mas amanhã irei
buscá-la, certo? Seja uma boa menina.
— Tá bom, Ed — Ela me abraçou com força ainda muito abalada.
Eu gostaria de ficar com ela, porém, no momento, eu tinha que
exercer o meu papel. A Família precisava de mim.
— Vamos, querida — Ela puxou minha irmã e então virou-se para
mim — Não precisa ter pressa. Ela estará segura conosco, o tempo
que precisar.
Acenei com a cabeça.
— Giovanni, acompanhe-as ao seu destino. Certifique-se de que
cheguem seguras e depois volte, pois precisarei de você aqui.
Giovanni não questionou, mas eu ainda escutei o bufo de Milena
atrás de mim.
Enquanto eles seguiam, pude ouvir Giovanni:
— Gatinha selvagem, esse seu bufo é fofo, mas nada educado...
— Confia nelas? — Nero questionou.
— Elas salvaram minha irmã. Neste momento, não vejo ninguém
melhor para confiar.
— Fizeram um estrago — Ele disse movendo a arma do russo
que detinha minha irmã.
— A colegial acertou a nuca do infeliz. Na semiescuridão. Achei
que nessa vida nada mais me surpreenderia, mas estava enganado.
Elas são alguma coisa.
Nero não disse nada e seguimos para o porão. No caminho,
encontrei meu pai. A sala de pânico já tinha sido aberta e os
convidados estavam dispersando-se para seus locais.
— Anita? — perguntou como se realmente se importasse.
— Segura — respondi e continuei meu caminho.
— Onde ela está? Ela é minha responsabilidade — Meu pai
adorava, simplesmente adorava falar isso para mim. Ele sabia que
esse era o meu calcanhar de Aquiles. Me virei bruscamente para
ele, já sem paciência para o seu show de merda.
— Hoje ela é minha responsabilidade.
Inteligente, ele só concordou, mas o brilho de ódio do seu olhar
me acompanhou até o porão.
Descemos e já encontramos dois fodidos russos amarrados.
Ethore e Enzo eram nossos executores, eram gêmeos e a
satisfação que sentiam ao infringir dores era quase sexual. Os
russos já estavam muito espancados, mas conscientes.
— Quem mandou vocês? — perguntei para o que encarava com
um sorriso ensanguentado.
— Seu reino vai cair. E a queda vai começar de dentro — Eu só
conseguia definir que era Ethore o que fez mais um corte em seu
peito por causa da cicatriz no pescoço. Depois do corte e do grito do
russo, eu dei sinal para parar.
Eu me aproximei do maldito e russo e disse com calma:
— Eu vou te dar mais uma oportunidade de falar o que você sabe.
Ou, então, eu vou atrás da sua família, da mesma forma que você
veio atrás da minha. Eu vou matar seus pais, seus filhos, vou fazer
suas irmãs, mulheres e filhas serem nossas prostitutas. Você vai
morrer sabendo que sua família vai pagar pelo erro de você não ter
falado. Agora, se você soltar logo essa merda, quem vai morrer será
apenas você.
O homem perdeu um pouco do desdém quando falei sobre a sua
família.
— Você mexeu com quem não deveria. Vocês tocaram a minha
irmã — Eu tirei minha faca e atirei em sua perna, atirei em seu braço
amarrado, até sentir o osso O sangue escorreu, o russo gritou, mas
eu nem mesmo pisquei. — E não pense que eu não iria atrás da sua
família só para ter o prazer de você saber que eu o fiz.
O russo finalmente falou.
— Nós não sabemos quem, mas há uns informantes importantes
aqui. Só estávamos cumprindo ordens.
Informantes. No plural.
Tínhamos traidores. Olhei para Ethore e Enzo.
—Se livrem deles.
Saí, seguido de Nero. Antes de sairmos, ainda escutamos a
lamentação dos russos.
— Está longe de acabar. — Nero murmurou. Fiquei em silêncio,
mas concordei com ele. Essa era uma guerra que estava apenas
começando.
— Não preciso dizer para que nada do que foi falado deverá sair
daqui. Não sabemos em quem confiar.
— Sim, senhor.
Antes que chegássemos à sala da mansão, uma explosão
eclodiu. Cazzo, o que poderia ser dessa vez? Corremos para a
entrada da casa, os Sottocapos, Caporigemes, soldados, todos com
armas nas mãos olhavam chocados.
Um carro havia explodido.
O carro de Salvatore Maceratta, Consigliere e pai de Giovanni.
Salvatore estava morto.
Capítulo 5
Giovanni mal nos deixou em casa e voltou para a mansão
Santorelli. Conseguimos trazer mamãe conosco e alguns dos
nossos guardas mais confiáveis para nossa proteção. O que tinha
acontecido era inédito em muito tempo. Até agora, não houve
ataques diretos entre A Família e a Bratva. Esse era um novo nível
de guerra, mais pessoal, e tinha todo o potencial para ser sangrento.
Tínhamos traidores na Família, já não dava para ter certeza do
que era seguro. Entramos no apartamento, Milena e Isabella se
jogaram no sofá, enquanto eu trazia a pequena Anita para sentar ao
meu lado.
— Por Dios14, eu ainda vou ter um ataque cardíaco com vocês.
Por que é tão difícil seguir o protocolo? Vocês deveriam parar de se
arriscar desse jeito — lamentou nossa mãe. Ela viera lamentando
por todo o caminho. — Primeiro, o incidente da cafeteria, vocês têm
que parar com a síndrome das meninas super poderosas e começar
a se comportar como as outras garotas do nosso meio. Giulia, você,
daqui a pouco, faz vinte e dois, como eu vou ter netos se vocês
continuam se comportando como selvagens? Por Dios, preciso do
meu remédio.
14. Tradução livre da autora “Por Deus”
Eu e minhas irmãs trocamos um olhar conhecedor. Isso ainda ia
longe.
— Se bem que dessa vez não vou mentir, foi o melhor. Afinal,
vocês salvaram essa preciosidade de garotinha. Venha aqui,
querida, deixe que eu te console por um minuto.
Anita pareceu incerta, mas aceitou o abraço da minha mãe. Eu e
minhas irmãs tivemos muita sorte com nossos pais. Em nossa
sociedade, qualquer demonstração de emoção era sinal de
fraqueza. Geralmente, pais e filhos, esposos e esposas mantêm
uma distância dentro e fora de casa. Mamãe sempre foi amorosa.
Controladora, meio louca, mas amorosa. Abraços eram comuns em
nossa família.
— Meninas, até hoje vocês tiveram sorte. Tem pouco mais de
vinte e quatro horas que estamos aqui e vocês já estiveram
ativamente em dois ataques. Que mãe aguenta essa pressão?
— Mãe, não é sorte, é treinamento e habilidade. Tome um
remédio, vai descansar um pouco. Estamos seguras aqui — disse
Milena com impaciência. Ela ainda deveria estar chateada, pois
Giovanni veio a alfinetando o caminho todo, dando abertura para
que minha mãe reclamasse mais e mais de nós. Enquanto eu e
Isabella quase ríamos, Milena mandava olhares assassinos em sua
direção.
Nesse momento, o celular de mamãe toca.
— Querido. Por que não pode dizer a mim? Claro. Giulia, seu pai
quer falar com você — Ela nunca aceitou bem o papai falar sobre
negócios e situações comigo. Minha mãe é ótima, mas dramática.
Ela me passou o telefone.
— Papai.
— Filha, as coisas se complicaram — Ele fez uma pausa. —
Houve um atentado e o Consigliere está morto.
— Por Dios, Papa15! O que faremos? — Papai sempre admirou o
trabalho e a postura de Salvatore Maceratta.
15. Tradução livre da autora “Por Deus, papai”
— Ficaremos mais tempo que o previsto. Encontraram bombas
nos carros de vários membros — Meu sangue gelou nas veias.
— Papa, no seu também?
— Sim. Não podemos confiar em ninguém, Giulia. Ninguém.
Estamos em guerra — Senti a seriedade do meu pai. Ele confiava
em mim para manter as coisas em ordem.
— Sim, papai. Não se preocupe conosco, estaremos seguras.
Fique seguro também.
Minhas irmãs já estavam alarmadas, em pé atrás de mim.
— O que aconteceu, Giulia?
Olhei para Anita que estava quase dormindo no sofá. Falei em
tom baixo para que somente minhas irmãs escutassem,
considerando que minha mãe já havia se retirado, reclamando por
ninguém levá-la a sério.
— Salvatore Maceratta está morto. Bomba no carro. Depois que o
carro dele explodiu, todos os carros foram verificados. Encontraram
bombas instaladas na maioria dos veículos... inclusive no de papai.
— Papai está bem? — perguntou Bella. Ela sempre foi mais
contida em demonstrar as emoções, mas a família era seu ponto de
ruptura.
— Sim. Papai não tem horário para voltar. Precisaremos nos
cuidar por hora. Ficarei com o maior quarto, dividirei a cama com a
Anita. Vamos descansar por agora.
Minhas irmãs concordaram e seguiram para seus quartos.
Aproximei-me de Anita.
— Querida, vamos para o quarto — disse suavemente. Ela
acordou em sobressalto e quase chorando me segurou. — Se
acalme, querida, você está segura. Eu estou aqui com você.
— Me desculpe — disse ela sem me soltar, abraçando-me com
força. Isso tocou meu coração de uma forma que foi difícil explicar.
— Não se desculpe, Anita. Vamos para o quarto, ninguém vai
chegar perto de você, eu prometo.
Levantamos e a levei para o quarto. Ela olhou para a cama
assustada, mas eu conseguia ver que ela queria parecer forte.
Arrumei seu lado da cama e deitei-a. Tomei um banho rápido e me
deitei ao seu lado. Ela se virou para mim e eu me virei para ela.
— Posso segurar a sua mão?
Ela me perguntou timidamente. Sem responder, eu segurei suas
mãos no meio da cama. Ela suspirou aliviada.
— Obrigada.
Não muito tempo depois, adormecemos.

Era cinco da manhã quando acordei. Mesmo cansada, alguns


hábitos não mudavam. Olhei para Anita que dormia calmamente ao
meu lado. Levantei, fiz minha higiene e fiz um café. Fiquei na janela
por alguns minutos, olhando o nada, pensando em como toda essa
situação mudaria a dinâmica de nossas vidas. Escutei meu celular
tocando no quarto e corri, torcendo para que Anita não despertasse.
— Oi.
Eu sabia que tinha alguém do outro lado, porque escutava a
respiração. Olhei o visor e vi número que eu não conhecia. Um
alarme soou em minha mente. Poderiam rastrear meu telefone?
Tentar algum ataque por Anita? Eu ia desligar quando finalmente
obtive resposta.
— Como ela está?
Aquela voz. Eu a reconheceria em qualquer lugar e agora sabia
disso. Mil perguntas rondavam minha mente como, por exemplo,
quem tinha dado meu número. Mas me ouvi dizendo.
— Ela está dormindo. Considerando tudo, ela está bem — Mais
uma pausa, Ele parecia decidir exatamente o que dizer.
— Talvez eu demore mais tempo que o pretendido para buscá-la.
As coisas estão muito... complicadas — Ele parecia cansado. Não
deveria ter dormido.
— Papai me disse ontem. Não se preocupe, Anita está segura
conosco. Ficaremos por mais um tempo, se quiser deixá-la aqui até
que tudo se acalme, não será um problema — Mais silêncio. Será
que cruzei alguma linha? Argh, que besteira. Desde quando eu me
importava?
— Obrigada — Ele disse por fim. Não parecia estar familiarizado
com a palavra.
— Não se preocupe com Anita, Eduardo. E se possível, se cuide
também — Não deveria ser da minha conta, mas de repente me
senti preocupada com seu bem estar. Isso era estúpido de várias
maneiras, mas simplesmente não conseguia conter meus
pensamentos com ele.
— Eu preciso desligar. Salve esse número, é o meu pessoal.
Qualquer coisa que Anita precisar... ou você. Me ligue.
Ele desligou.
Voltei a deitar de repente me sentindo muito cansada.
Eu conhecia a índole de Lorenzo Santorelli. Papai sempre foi leal
à causa, leal à família, mas nunca escondeu que nosso Don era um
homem ruim, não da forma convencional, mas do tipo ruim que não
poupa a família e passa por cima de qualquer pessoa para
conseguir o que quer.
Não imaginei por um segundo que seu filho fosse diferente. Vê-lo
essa noite, depois do que aconteceu na cafeteria, foi um choque.
Quando me chamou para dançar, usando todo seu poder alfa para
dispensar Antonio e fazendo aqueles comentários, eu fiquei
envenenada, achando que era um idiota classe A. Mas vê-lo
cuidando de Anita, se preocupando, tocou uma parte do meu
coração. Confesso que julguei Eduardo por seu pai e posso ter sido
muito injusta em meu julgamento. Alguém que se preocupa com a
irmã como ele se preocupou não pode ser tão ruim assim. E,
confesso, seus olhar me faz ter borboletas do estômago.
Oh, Deus, esse caminho é perigoso!
Anita procurou inconscientemente a minha mão e eu a estendi, o
cenho que estava franzido se suavizou com o contato.
Exausta, deixei o sono me tomar.

Quando acordei novamente, já se passava das dez horas da


manhã. Levantei em um sobressalto, eu deveria realmente estar
muito cansada, pois não dormia assim em muito tempo. Olhei para
Anita que ainda dormia ao meu lado, ela também deveria estar
exausta. Levantei, fiz minha higiene, coloquei uma calça de lã
grossa e um suéter, pois, mesmo com aquecedor, estava muito frio.
Sentindo-me mais humana, fui para a cozinha, onde escutava a
conversa das minhas irmãs.
— Buongiorno — disse sentando-me à mesa.
— Bom dia — responderam Isabella e Milena.
— Mamãe está dormindo?
— Ela já tomou café. Estava pensando nas variadas formas de
matar papai por não ter dormido em casa quando avisamos sobre o
ocorrido.
— Droga, com tudo isso, acabei esquecendo-me de avisá-la.
— Não te culpo — disse Milena contendo o riso enquanto engolia
um croissant. — Mamãe, em modo drama, é quase impossível.
— Eu estou escutando sua insolência, Milena.
Não nos contivemos e caímos na risada. Nesse momento, Anita
apareceu na porta.
— Bom dia, querida, venha tomar café conosco. Você viu a
escova fechada que deixei no balcão do banheiro?
Ela acenou que sim e sentou-se ao meu lado.
— Não tenho roupas — disse se servindo de leite.
— Não se preocupe, minhas roupas servirão por hora em você.
Talvez não fique certinho, mas, de nós três, sou a menor — disse
Isabella.
— Ou podemos voltar para sua casa e buscar algumas roupas, o
que acha? — sugeri.
Anita empalideceu.
— Tudo bem, as roupas de Isabella irão servir por enquanto. Ela é
magra e não cresceu suficiente — Milena disse em um sorriso,
enquanto Bella lhe socava o ombro. Anita olhava encantada a
interação das minhas irmãs.
— Ora, por favor, deem um alívio a mamma de vocês e se
comportem a mesa. O que dirá Anita ao pai dela? Que são
bárbaras. Vocês não se preocupam com o que pensarão de mim,
que não soube educar vocês.
Anita soltou um risinho.
— Não se preocupe, senhora. Eu sempre quis irmãs. Eu acho que
elas são muito divertidas — A voz de Anita tinha uma nota de
melancolia. Ela de repente pareceu uma solitária. Era só uma
garotinha que não tinha uma presença feminina em sua vida que
não fossem as empregadas.
— Você não tem amiguinha? — perguntei.
— Sou educada em casa. E dificilmente posso sair, então não —
Muitas meninas eram educadas em casa. Era uma medida de
proteção que, embora houvesse perdido força, alguns
tradicionalistas mantinham. Seu pai, pelo jeito, era um desses.
— Então, a partir de agora, você será a nossa irmãzinha postiça,
Anita — disse Milena apertando a mão da garota por sobre a mesa.
— E agora você tem amigas — disse Isabella com o mesmo
humor sorridente.
— E eu quero que vocês me ensinem a lutar e me defender,
assim jamais serei levada por inimigos — Isso nos deixou sem
palavras. Talvez o seu pai tradicionalista não aprovasse a nossa
influência selvagem.
— Ora, por favor, querida, não as encoraje. Eu ainda vou parar
em um hospital por passar tanto susto. Se tivesse três filhos no
lugar delas, acho que seria menos pavoroso.
Eu e minhas irmãs trocamos um olhar e seguramos o riso. Dona
Alessandra, em modo drama, era realmente impossível.
— E como novas amigas, ao terminar o café, iremos todas assistir
a um filme, juntas — Milena disse e o sorriso que a pequena Anita
deu foi o mais iluminado que já a tinha visto dar.
— Eu adoraria, obrigada.
Uma vontade de proteger essa garotinha tomou conta do meu
coração. O que era cotidiano, para mim e minhas irmãs, para ela,
parecia a maior aventura do mundo. Ela não deveria ser sozinha e
exilada e, nesse momento, mais uma vez, mesmo com todo o
drama que envolvia minha mãe, eu agradeci internamente pelos
meus pais.
Capítulo 6
Era terça- feira desde o ataque e eu mal tinha dormido. Estava
exausto, todo o ocorrido tinha, literalmente, me tirado do eixo. Um
ataque dessa importância não poderia passar sem resposta.
Durante os três dias que seguiram, conseguimos informações
sobre alguns soldados traidores, Nero já tinha resolvido o problema,
mas ainda não estava convencido de que todos foram entregues,
ele tinha certeza que alguém do alto escalão estava envolvido, mas
os soldados russos e os da Família não entregaram, nem sob a
pressão.
Hoje seria o funeral de Salvatore Maceratta.
Salvatore foi um bom Consigliere, um homem leal que eu
admirava muito.
Anita ainda estava com as irmãs Castelle e eu não tinha
compartilhado essa informação com ninguém além de Nero,
Giovanni e a família Castelle. Mesmo meu pai, eu não dei essa
informação. Os russos queriam levá-la para usá-la contra a Cosa
Nostra. As coisas pareciam estar se normalizando lentamente.
Todo início da manhã, eu ligava a Giulia para saber de Anita e ela
parecia estar gostando do tempo com as Castelle. Eu me vi
ansiando por essa ligação mais do que o normal, para escutar sua
voz doce, sua respiração. Isso estava se transformando em uma
obsessão. Eu poderia falar com seu pai, mas não, eu precisava ligar
para ela toda manhã. Elas ficariam com minha irmã durante o
funeral e amanhã eu iria buscá-la.
O funeral aconteceu sem intercorrências, Giovanni tentava
parecer forte, mas eu o conhecia o suficiente para saber que ele
estava mal. Se eu perdesse o meu pai, provavelmente não sentiria
nada, mas Salvatore foi um bom pai na medida do possível.
Encontrando Enrico Castelle, eu o abordei na saída do cemitério.
Estávamos a caminho de uma reunião, aproveitando a presença de
todos os Sottocapos e demais homens, para a nomeação oficial de
Giovanni como Consigliere.
— Eu estou grato por terem acolhido minha irmã por esses dias. E
por seu silêncio — Agradecer não era comum para mim. Eu não
costumava dever nada a ninguém, mas, nos últimos dias, me via
mais e mais em dívida com a família Castelle. O homem, com olhos
de cores diferentes, me fitou.
— Não precisa agradecer, senhor. Eu tenho filhas e faria qualquer
coisa pela segurança delas — Eu não pensava que elas
necessitassem de cuidados, porém resolvi guardar esse comentário.
— Eu também gostaria de conversar particularmente com você
sobre sua filha Giulia. Como sabe, necessito de uma esposa. Até
onde sei, ela não está comprometida e gostaria que pudéssemos
entrar em um acordo.
O patriarca dos Castelle me encarou um pouco surpreso.
— Senhor, devo advertir que minhas filhas, especialmente Giulia
não foi criada como as moças tradicionais da Família. Ela tem
opinião forte, pode ser teimosa e não sei se seria uma opção para a
esposa de um Don. Ela é sensata e faria isso por mim, se eu
pedisse. Mas se for contra a vontade dela, digo, senhor, esse
casamento já começara condenado.
Isso quase me fez rir. Eu sabia, em primeira mão, que ela não era
convencional. Eu deveria me importar, sabia que deveria, mas eu
realmente não dava à mínima. Eu não quebraria a sua vontade,
porque foi essa vontade que me atraiu em primeiro lugar.
— Você sabe que eu poderia conseguir tudo sem o seu
consentimento. Isso é apenas uma questão de respeito, eu poderia
tê-la sem me importar com sua vontade ou a dela.
— Eu sei, senhor. E digo que não o impediria. Mas você é um
homem inteligente e eu conheço a minha filha. Se tentar moldá-la a
algo que não é, o resultado pode ser negativamente surpreendente.
Ele tentava proteger as filhas, poderia ter receio por meu pai ser
como era com minha mãe e suas concepções ultrapassadas, não
era exatamente um segredo o sadismo do meu pai, mas Enrico
poderia ficar tranquilo. Eu queria Giulia por quem ela era. Eu não a
quebraria e me vangloriaria entre os homens como muitos faziam. A
preocupação de Enrico de que eu fosse como meu pai não me
afrontou, pelo contrário, me fez respeitá-lo. Mantendo meu tom
neutro, disse:
— Por sua sinceridade, vou dizer abertamente que eu vou tratar
sua filha com respeito, não é minha intenção ser cruel com ela. Se
eu tivesse tempo, faria tudo isso com calma para que ela me
conhecesse até se acostumar com a ideia. Mas eu não tenho
tempo, preciso de uma esposa e tudo que posso dar é a minha
palavra de que ela estará segura comigo. Não pretendo fazer-lhe
mal.
Ele ainda hesitou por alguns segundos até que acenou.
— Claro. Com certeza, se você está decidido quanto a isso —
Outro pai entregaria a filha sem pensar duas vezes, mas ele se
preocupava mais com elas do que com o poder. — Aguardamos
você amanhã para o jantar e assim oficializamos o compromisso.
Com o acordo feito, seguimos para a reunião.

Se eu pudesse, poderia poupar Giovanni da cerimônia de


nomeação oficial. Ele tinha acabado de enterrar o pai, mas isso
seria um sinal de fraqueza, o que não era bom para o início do seu
legado.
No centro do círculo, com um punhal no centro da mão, rodeado
pelas principais famílias da Cosa Nostra, Giovanni reforçava o seu
juramento.
— Juro sobre este punhal de omertá, com a ponta molhada de
sangue, e na frente da honrada sociedade, de ser fiel aos meus
companheiros. Juro e nego tudo. Lo giuro e nego tutto.
E todos repetem:
— Lo giuro e nego tutto. Lo giuro e nego tutto. Lo giuro e nego
tutto16.
16. Tradução livre da autora “Juro e eu nego tudo”
A cerimônia de lealdade estava concluída.

— Já tenho uma escolhida.


Do seu lugar, no escritório, ele me avaliou. Ele não estava feliz
por eu esconder o paradeiro de Anita. A verdade é que eu ainda não
confiava em ninguém, pois ficou claro que ela era o alvo. E eu
nunca confiei em meu pai, apesar do mesmo nunca ter dado indício
de traição contra a Família.
— E quem seria? — Ele me olhou desconfiado.
— A mais velha de Enrico Castelle. Amanhã iremos oficializar o
compromisso.
— As pessoas falam muito delas. Não sei se seria uma boa
esposa... Se bem que é uma emoção quebrar a que se acham mais
fortes. Mas pensei em Sophia DeLucca.
Controlei-me para não fazer um buraco no meio dos seus olhos.
Nada jamais aconteceria a Giulia, eu jamais permitiria e o simples
fato dela ser machucada por mim ou qualquer outro despertava o
meu instinto assassino. Seria ela ou mais ninguém.
— Esteja lá amanhã às oito da noite.
Virei-me e saí do escritório.
Não queria ele perto de Giulia, mas era tradição que ele estivesse
presente. Nesse momento, agradeci a seu pai por ensiná-la a
defender-se.
Capítulo 7
Entrei no escritório de papai. Era bem menor que o da nossa casa
em Filadélfia, mas, por hora, serviria. Não era estranho que ele me
chamasse para conversar, papai era aberto quanto aos negócios,
principalmente comigo.
— Precisa de mim, Pappa?
Ele me olhou e seu comportamento estava diferente. Não estava
com o notebook na mesa, não vi papéis, somente um olhar de
quase pesar.
— Eduardo Santorelli pediu a sua mão em casamento. Entramos
em acordo, hoje à noite ele virá oficializar o compromisso.
Fiquei estática por alguns segundos.
Eu queria gritar, queria ter alguma voz para ser ouvida, que minha
opinião fosse validada. Mas eu sabia que um dia isso iria acontecer.
E papai nada poderia fazer para impedir, ele era o Don.
Eu só me fazia uma pergunta: Por que eu?
Eu não era a esposa ideal, ainda mais para um Don. Eu poderia
me sair bem em alguns eventos, mas, com certeza, preferia meu
saco de pancadas. O quanto da minha vida iria mudar?
— Por que eu?
Meu pai não respondeu. Certamente também não sabia.
Meu pai era um homem implacável e, pela primeira vez na vida, o
vi impotente. Meu pai sempre fez de tudo por nós e era chegada
minha hora de ser grata. Um casamento com o Don era
politicamente vantajoso, significava poder e influência. Eu não o
desapontaria. Eu não poderia.
— As armas, Giulia. Você tem as armas, use-as.
Estava difícil para engolir, um nó na garganta. Respirei fundo, eu
era forte, eu era prática, eu daria conta.
— Certo. Estarei pronta no horário.
Sem mais palavras, saí do escritório e fui direto para meu quarto.
Quanto minha vida mudaria? Não demorou muito e Milena e Isabella
entraram e fecharam a porta.
— É verdade? Papa te comprometeu com o Eduardo? —
perguntou Milena.
— Parece que sim — disse sem emoção.
— Como ele pôde! Giulia, o pai dele é um sádico maldito. Quem
garante que ele não será igual? — Ela estava histérica.
— Ele não me pareceu assim, Milena. Ele se preocupa
sinceramente com a irmã, não acredito que se preocuparia com ela
se fosse de todo ruim. Anita fala dele com carinho — ponderou
Isabella.
— Você está disposta a arriscar a integridade dela? — Milena
estava com sangue nos olhos.
— Meninas, por favor, parem. Não é como se papai pudesse fazer
algo. E eu sei cuidar de mim.
— Você poderia fugir! Nós vamos cobrir você Giulia.
— Para, Milena. Eu não sou uma covarde, não vou fugir. Vamos
ver como serão as coisas primeiro — Eu aparentava mais confiança
do que realmente tinha. Eu precisava conversar com ele primeiro.

A noite chegou mais rápida do que eu estava preparada. Mamãe


estava em êxtase, latindo ordens para todos os lados, alheia a toda
minha tensão. Coloquei um vestido vermelho, tomara que caia,
corpete justo, solto abaixo da cintura, que ia até a panturrilha. Meu
cabelo está solto, e maquiagem com destaque para os olhos, batom
e sapato nude.
Um vestido chegou para Anita, ela participaria do jantar. Parecia
mais real a cada segundo. Anita estava em êxtase e meu coração
doeu por ela. Segundo ela, finalmente seríamos irmãs e ela não
seria mais sozinha.
E Milena estava com humor terrível.
— Mi, por favor, eu vou te pedir que não torne tudo ainda mais
complicado do que já é. Eu gostaria que você não causasse
nenhuma confusão. Somente hoje, por favor. Eu jamais permitiria
que alguém me machucasse ou me fizesse de capacho. Você
deveria ser a primeira a saber disso.
Ela me olhou por alguns segundos, mas assentiu contrariada.
—Tudo bem — disse por fim. — Deixe que eu dê um jeito nesse
cabelo. Vamos deixá-la mais sofisticada para que você receba seu
adorável noivo.
Senti um frio no ventre, mas disfarcei o mal estar. Eu conversaria
com ele, somente isso me deixaria mais aliviada.
Não muito tempo depois, a campainha tocou. Eu estava nervosa,
mas não demonstraria fraqueza, eu não poderia. Eduardo se
aproximou, cumprimentando minha mãe e irmãs. Logo ele se
aproximou de mim e eu senti a minha pulsação na garganta. Ele
segurou minha mão e a levou aos lábios.
— Você está linda — Sua voz era quase sensual. Eu ainda estava
confusa por não saber o que esperar de toda essa situação.
— Eu agradeço.
Logo atrás estava Lorenzo Santorelli, seu pai. Eu o tinha visto
muito pouco e conversado quase nada. Ele segurou minha mão e
beijou-a, mas diferente de Eduardo, eu senti uma vontade gritante
de retirá-la. O olhar dele me deu calafrios, mas qualquer coisa que
não fosse um sorriso poderia ser considerada desrespeitoso.
— É um prazer vê-la novamente... filha.
Senti que o comportamento de Eduardo mudou, ele estava com o
maxilar trincado. Ele não confiava no pai, tampouco, eu. Se ele
estava com raiva do pai, talvez ele fosse diferente. Eu percebi que
até mesmo Anita mudou seu comportamento, estava mais contida.
Que família mais estranha.
Cazzo, eu precisava tirar isso do caminho. Olhei para Eduardo e
disse para que só ele ouvisse.
— Precisamos conversar.
Ele franziu o cenho levemente, mas concordou. Ninguém o
impediria de falar comigo, claro. Fomos para a sacada e, tirando o
olhar de Milena, todos fingiram não perceber. Estava frio, mas eu
nem me importei. Eu precisava saber o que me esperava e estar
sozinha com ele me diria que tipo de homem ele seria. Fizesse o
que fizesse, ninguém o impediria.
Encostei na grade e esperei. Ele parou casualmente ao meu lado,
mas não me tocou. Precisando esclarecer a situação de uma vez,
perguntei.
— Por que eu?
Ele me olhou, mas eu continuei focada no nada a frente. Ele olhou
para frente novamente e respondeu.
— Eu preciso de uma esposa. Foi me dado um prazo, e se não
fosse isso, eu tomaria meu tempo cortejando você, até se
acostumar comigo.
— Isso não responde a minha pergunta — Me virei para ele. —
Por que eu?
Ele também se virou e aproximou-se. Meu coração acelerou e
senti o aroma de seu perfume. Era uma mistura de medo e
antecipação. Eu só não sabia dizer antecipação exatamente do que.
— Porque desde que eu te vi, eu quis você.
Isso me desconcertou. Deixei minha máscara escorregar, mostrei
toda a minha insegurança.
— Você deve saber que não sou uma princesinha convencional.
Eu não acredito em príncipe encantado ou cavalheiro de armadura
brilhante. Eu tenho a minha própria armadura. Eu preciso saber o
que você espera de mim — Se aproximando mais ele respondeu.
— Eu espero respeito e sinceridade. Isso virá dos dois lados. Eu
te darei meu nome, minha proteção, mesmo que você diga
veementemente que não precise. Eu não quero te controlar ou te
fazer infeliz. Eu quero você de bom grado na minha cama, eu te
deixarei livre para fazer as coisas que você faz no dia a dia em sua
casa. Eu preciso que você me acompanhe nos eventos e seja uma
companhia para Anita. Eu espero que ela venha viver conosco
assim que eu assumir meu lugar. Talvez você não acredite agora
Giulia, mas eu não quero me casar com você para te fazer mal.
Eu estava paralisada, pois enquanto ele fazia seu discurso, sua
mão passeou nos meus ombros e na clavícula, contornando meu
pescoço até que estivesse a uma respiração de distância. Senti algo
quente em meu interior. Minhas mãos foram para seu peito e eu
fiquei na dúvida se o empurrava ou o aproximava.
Em um só suspiro, ele baixou suas mãos em minha cintura e me
puxou contra o seu peito, esmagando minha boca com a sua,
invadindo com a língua, sem pedir licença. Foi um beijo possessivo,
quase impossível de não responder com a minha própria paixão. Foi
desenfreado.
Libertador.
Eu já tinha beijado alguns garotos na escola e até tinha dado uns
amassos, mas era a primeira vez que sentia uma paixão tão
avassaladora.
Suas mãos apertaram minhas costas e eu senti uma vontade de
escalar o seu corpo. Era uma loucura, eu estava descontrolada. Ele
afastou o rosto do meu com um meio sorriso que deu vontade de
tirar do rosto dele com um murro.
— Você está com frio, vamos entrar — Ele disse tão casualmente
como se não tivesse acabado de me beijar com toda essa paixão.
Eu arrumei meu cabelo com o sangue fervendo, agora de raiva, e
entrei na frente dele, batendo os pés.
Ainda consegui ouvir uma risada baixa atrás de mim.
Stronzo17.
17.Tradução livre da autora “Idiota”
Ainda estava fervendo, evitando o olhar de Eduardo quando o
jantar foi servido. Como eu pude perder o controle assim? Ele
obviamente sabia o que estava fazendo. Eu, com medo de que ele
dominasse minha vida pela força, acabei percebendo que seu
método era outro. Sedução. Mas eu não seria dominada, não
mesmo.
— Você deve saber que é uma responsabilidade imensa ser a
esposa do Don, certo? — O velho Don me tirou do devaneio.
— Sim, claro — respondi tentando soar casual.
— Eu sei que lá, na Filadélfia, você ajudava bastante o seu pai,
nós compreendemos, pois sua mãe não deu um filho para seu pai.
Mas agora as coisas precisam ser diferentes, como esposa do Don,
seria inadmissível que você continuasse. Sua vida deve ser
dedicada a casa, aos filhos e ao seu marido.
Tudo que eu temia. Eu não tinha nascido para isso. Milena estava
vermelha de raiva e até mesmo Isabella fez uma careta. Milena
bateu a colher no prato com mais força que o necessário. Isso
chamou a atenção do Don, os olhos brilharam em minha irmã.
— Algum problema, bambina18? — Milena olhou
desafiadoramente e respondeu.
18.Tradução livre da autora “criança”
— Além dos seus conceitos ultrapassados e retrógrados?
Imagina, nenhum — O sorriso dela era gelado. O Don estreitou os
olhos. Minha mãe chiou, meu pai ficou tenso e ficamos em um
silêncio sepulcral.
— Acho que sua filha tem que aprender a respeitar a hierarquia,
Enrico. Alguém deve dar-lhe uma lição — A voz do Don era contida,
mas sua fúria era perceptível. Isabella também estreitou os olhos e
eu já estava quase em pânico. Milena, finalmente, encontrou meus
olhos e mirou Isabella. Ela deve ter visto o pânico em meus olhos,
pois, enfim, falou:
— Peço desculpas, Don. Eu me excedi. Certamente estamos
acostumadas a falar livremente com meu pai, mas não justifica
minha falta de respeito.
Os olhos do Don continuaram em Milena. Ele acenou, aceitando o
pedido de desculpas, mas aquele brilho nos olhos dizia que não
estava tudo bem. Ele era um sádico perigoso e eu não gostei
daquele olhar.
— Certo — disse por fim —, mas voltando a você, Giulia,
certamente...
— Don, quem decide as atividades de minha esposa sou eu.
Eu não sabia se me sentia humilhada ou agradecida. Humilhada
por não poder dizer o que penso abertamente e agradecida por
Eduardo ter me defendido.
Eu odiava ser a mocinha indefesa.
— Mas estou certo que você não irá permitir...
— Isso não é seu problema — A voz de Eduardo era baixa, mas
cortante. Ali, naquele olhar, eu vi o mafioso cruel que ele era. Eu só
esperava que essa ira jamais se estendesse a mim.
A tensão era palpável. Até minha mãe estava quieta. Os olhos do
Don brilharam em direção a Eduardo, mas ele assentiu. Logo, papai
trouxe outro assunto e, por hora, minhas atividades futuras estavam
esquecidas.
—Você precisa vê-la tocando piano e harpa, senhor. Nossa Giulia
é a musicista da família — disse minha mãe para Eduardo. Alguém
deveria avisá-la que não era mais necessário fazer propaganda mi
ha, eu já estava noiva. Ele olhou para mim e respondeu.
— Não vejo a hora — Pareceu genuinamente interessado.
O restante do jantar aconteceu sem mais intercorrências. Eu
ainda estava nervosa com minha nova situação, mas confesso que
também estava ansiosa. Olhando meu futuro marido do outro lado
da sala conversando com meu pai e o seu, me permito estudá-lo por
alguns segundos. Ele era lindo, isso eu não poderia negar.
Eu gostei do beijo, mesmo que ele tenha sido um pouco cretino
depois.
Seu cabelo castanho, cheio, barba sofisticada, olhos escuros,
dava um ar sombrio, quase sensual. E eu tinha tocado aquele peito
firme e quente. Sim, eu estava secando meu noivo. Eu estava
atraída por ele.
Confusa, nem notei que estava me encarando de volta. Seus
olhos se estreitaram e ele me deu um sorrisinho conhecedor. Acho
que ruborizei, droga! Eu nunca ruborizo, isso é coisa de menininha
afetada. Desviei e voltei à atenção ao monólogo de Milena sobre a
última tendência de algum lugar no mundo.
Capítulo 8
Quando acordei, no dia seguinte, após a oficialização do meu
compromisso, a primeira coisa que fiz foi ligar para Giulia. Era seis
da manhã. Ela sempre estava acordada nesse horário. Eu já estava
aprendendo alguns de seus hábitos. Eu estava me sentindo um
pouco bobo com essas ligações, mas eu simplesmente não poderia
me parar.
— Qual é a desculpa para me ligar agora? — Ela me atendeu mal
humorada e eu não contive o sorriso que se espalhou em meu rosto.
Cazzo, eu estava sorrindo mais nesses dias do que na minha vida
toda.
— Eu preciso de uma desculpa para ligar para minha noiva?
— A não ser que você ou Anita estejam em apuros, ou esteja
acontecendo um incêndio, ou alguém muito importante tenha
morrido, sim, você precisa de uma boa desculpa — Sua respiração
estava ofegante, o que me explicava que ela estava treinando.
— Bom, então aí vai mais um hábito o qual você terá que se
acostumar, Giulia. Eu vou te ligar sempre que eu quiser, com
incêndio ou sem incêndio, e você vai falar comigo — Eu poderia vê-
la revirar os olhos.
— Você é muito estranho, você sabe disso?
— Já me disseram.
— Bom, agora que já falamos, eu preciso continuar meu treino.
Até.
A pequena bruxa desligou.
Desligou.
Eu deveria estar afrontado? Deveria.
Eu estava? Não. Eu estava rindo igual um idiota. Se não tomasse
cuidado, logo ela me teria na palma de suas mãos.
Nosso casamento seria em três meses. Minha cerimônia seria na
próxima semana, para ocupar o lugar de Don. Giulia voltaria para
sua cidade hoje, para começar a preparar o casamento que
aconteceria em Nova Iorque. Faltando um mês exato para o
casamento, ela voltaria com sua mãe e suas irmãs e ficariam aqui.
Ela ir embora dava uma sensação estranha no peito. Esse tipo de
conexão era inédito para mim, as pessoas que me importavam
sempre foram a minha mãe e a minha irmã. Eu nunca pensei muito
em como seria com uma esposa, mas pareço estar fazendo um bom
progresso com Giulia. Eu, com certeza, me importava com ela, com
sua segurança e seu bem-estar.
Os dias se passaram assim. Eu ligava para Giulia todos os dias.
Inicialmente, ela mal falava comigo, eu também não era bom com as
palavras, mas apertar seus botões era divertido e natural. Ela estava
ficando mais confiante, mais falante comigo. Acho que o telefone
ajudava. Com o tempo, ela confiaria em mim, o que é um bom
começo para um casamento.
Na falta de oportunidade de fazer um cortejo digno, eu ia
conhecendo mais dela por telefone. Sei que o pai dela fez questão
que as filhas fossem treinadas como qualquer soldado. Sei que ela
ajuda com os negócios de seu pai e que sabe sobre os conflitos da
Família. Sei que é uma espécie de líder entre as irmãs. Percebi que,
quando fala sobre sua família, seu tom se aquece. Eu vi em
Giovanni uma família funcional de verdade, sua mãe protetora,
apaixonada pelo marido. Uma das raras famílias felizes na Máfia, e
as vezes que fiquei por perto, me senti incluído em todo aquele
cuidado.
O que era uma bobagem, mas eu era apenas um menino.
Com o tempo, a dura realidade bateu em meu rosto. Minha família
sempre foi infeliz e distorcida, todas as minhas vivências me fizeram
ser quem sou. Mas ainda assim toda vez que escutava a voz de
Giulia, sua adoração à família, sua inteligência aguçada, e a forma
como, aos poucos, ela estava se aquecendo para mim me faziam
ter um desejo, lá no fundo, de ser melhor por ela. De dar um lar
harmonioso, mesmo que eu não fosse capaz de dar amor, me
esforçaria para que ela se sentisse confortável ao meu redor.
Eu não era capaz de sonhar com mais.
Ninguém poderia amar a escuridão.
Minha cerimônia ocorreu quinze dias após o meu noivado. Após a
cerimônia, foi realizada uma comemoração pequena, somente entre
os membros de Nova Iorque. Ainda estávamos cautelosos após o
ataque passado, cada Sottocapo cuidaria de suas fronteiras.
Na recepção, após todos os cumprimentos, sentei com Nero e
Giovanni.
— Então, em menos de três meses, teremos uma nova senhora
Santorelli — Ouvi Nero dizer.
— É o que parece — disse com indiferença. A verdade é que eu
estava muito animado com essa perspectiva.
— Seu pai comentou que você está comprando uma casa —
provocou Giovanni.
Era uma mansão digna de uma rainha, porque ela merecia. Tudo
que eu pudesse fazer por ela, eu faria, sem limites.
— Sim — respondi ainda olhando o ambiente. Qualquer outro
entenderia que eu estava dando o assunto por encerrado. Mas,
bem, esse era Giovanni.
— Comprando uma mega casa.
— Cala a boca, Giovanni.
— Fiquei sabendo até que vai ter uma academia toda equipada,
espaço para a gatinha selvagem praticar seus tiros, e até mesmo
para Anabelle treinar com suas adagas.
Eu ia perder a paciência com essa merda. Estávamos em público
e por mais que eu confiasse em Nero e Giovanni, ainda não estava
seguro sobre em quem confiar. Qualquer indício de afeto sobre
Giulia poderia ser visto como uma fraqueza e eu não faria dela um
alvo. Olhei para ele para que entendesse que eu não falaria sobre
isso.
— Você só tem que estar ciente, vai ter que andar na linha. Sabe
que se tentar qualqu...
Eu vi vermelho. Segurei-o pelo colarinho e o empurrei na parede.
Nero tentou entrar no meio, mas não dei espaço, assustando os
outros membros presentes. O que ele estava pensando? Que eu
seria como meu pai, que eu a machucaria? Eu não era ele, porra.
— Cuidado com suas próximas palavras, Giovanni. Amigo ou não,
para tudo tem um limite.
Ele não tentou sair, levantou as duas mãos e disse:
— Me desculpe, Don. Era uma piada.
Praguejando, eu soltei Giovanni e fui para a área da frente.
Precisava respirar ar puro. Claramente, Giulia era um limite para
mim. Ouvi saltos e fechei os olhos. Eu já sabia quem era, só que
esse era o pior momento.
— Está tudo bem? — Sophia DeLucca estava perto, muito perto
de mim. Afastei-me alguns centímetros e respondi:
— Sim — Mesmo que tudo em mim apontasse para não.
Ela parou ao meu lado na varanda e se aproximou casualmente
novamente. Seu ombro roçando meu peito. Novamente me afastei.
— Fiquei sabendo do seu noivado. Talvez eu deva te dar os
parabéns? — Ela virou-se para mim. Os olhos estavam feridos. Eu
sentia muito por ela, mas não era o melhor momento para ser
amável.
— Seria bom — Ela estreitou os olhos e passou os braços em
meu pescoço. Eu fiquei surpreso por alguns segundos, ela jamais foi
deliberada assim sobre o seu interesse.
— Talvez eu tenha que te convencer que fez a escolha errada —
Ela estava aproximando seu rosto do meu, mas, ao sentir que
minhas mãos seguravam seus braços e ver o meu rosto, ela parou.
— Se afaste — Segurei seus braços a minha frente, com força, e
me afastei.
— Você está me machucando — Isso me parou.
Soltei seus braços como se me queimassem. Talvez eu não fosse
tão diferente do meu pai e isso me perturbou por alguns segundos.
— Me desculpe. Só... me deixe aqui — Meu vacilo a encorajou.
— Eu só acho que ainda vai se arrepender de sua escolha. As
Castelle não são preparadas para serem esposas, ainda mais do
Don. Quer uma influência daquela para sua irmã?
Aquilo me irritou. Sem tocá-la, cheguei perto e disse:
— E quem seria a esposa ideal para um Don? Você? É
exatamente por isso que ela é perfeita para ser a minha esposa,
porque ela não esperava — Com um riso seco, finalizei. — Não
tenha ambições. Agora, por favor, saia.
Ela me olhou com raiva, mas saiu. Eu puxei uma respiração
profunda.
Peguei meu telefone, precisava falar com Giulia.
— Você sabe, vou começar a cobrar por cada vez que você me
atrapalha assim. Eu estou aqui vendo uma infinidade de modelos de
vestidos — Ela estava sendo ácida, mas só o som da voz dela me
acalmou. Isso era uma merda, não gostaria de mulher nenhuma
com esse poder sobre mim.
— Você sabe, acho que vou ter que dar um jeito de colocar você
em seu lugar — Ela ficou em silêncio. Merda, droga! — Giulia, eu
estou sendo sarcástico, eu jamais faria mal a você.
— E você teria que ser dois para tentar qualquer coisa contra
mim. E nunca dormir ao meu lado — Eu não queria, mas dei risada.
Eu adorava irritá-la — O que você precisa? — Sua voz agora era
mais casual.
— Eu só queria falar… com você — Droga, eu parecia um tolo. O
que estava acontecendo comigo? — Me fala o que você está
fazendo, o que você fez, qualquer coisa.
Eu só queria ouvi-la. Ela falou sobre o dia dela, primeiro a
contragosto, mas logo tagarelou sobre vários tópicos. Por fim ela
perguntou:
— Está tudo bem?
— Sim, está tudo bem.
— Não. Não está. Algo te aflige — Eu não disse nada — Você
sabe, você pode falar sobre qualquer coisa comigo.
Eu não queria falar sobre as minhas merdas, então achei que já
era hora de terminar essa conversa.
— Estou bem, cara mia. Preciso desligar, mais tarde te ligo para
te dar um boa noite.
Eu estava me transformando em um stronzo por essa garota. Eu
precisava me controlar, eu precisava parar, mas, com ela, eu só
pensava depois. Sem esperar resposta, eu desliguei.

Naquela mesma noite na mansão de meu pai, fizemos uma


reunião com os Caporigemes, de Nova Iorque, Nero, Giovanni e
meu pai. Eu sentei na ponta e começamos a falar sobre todo o
sistema de segurança, sobre a possibilidade de mais traidores
infiltrados, sobre as possibilidades de novos ataques. Meu pai
comportava-se como se ainda estivesse no comando de tudo. Se
ele soubesse como eu estava sorrindo por dentro.
Minha trajetória inspirou respeito e confiança na Família. Alguns já
estavam cansados dos abusos de meu pai, então a troca veio em
um bom momento. No final, eu fiz o comunicado que esperei por
muito, muito tempo para fazer.
— Estão dispensados. Pai, eu gostaria que você ficasse junto
com meu Consigliere e meu Capitão-Mor.
Quando todos saíram da sala, finalmente eu fiz o meu discurso:
— Até hoje você foi o Don e você dominou a Cosa Nostra como
bem entendeu. Mas acho que não ficou claro que essa posição não
é mais sua, ou você não estaria aqui. Eu não quero mais a sua
participação nas nossas reuniões. Eu tenho a minha própria equipe
de apoio. Eu não preciso de você.
Meu pai era um homem robusto. Ele também era grande, e usava
disso para suas atividades sádicas. Após minhas palavras, consegui
ver todo o ódio em seu olhar. Ele só rivalizava com o meu próprio.
— Ora, seu...
— E, a partir de agora, Anita é minha responsabilidade.
— Nos seus sonhos, ela é minha responsabilidade.
— Não seja hipócrita, você nunca teve responsabilidade com
ninguém. Você só foi um bom Don e nada mais. Você foi leal e é só
por isso que eu não tiro a sua vida. Mas, a partir de agora, você vai
ficar longe do meu caminho e longe dos negócios da Cosa Nostra —
Com um riso seco, finalizei. — Considere uma aposentadoria.
Levantei da cadeira, seguido de Nero e Giovanni. Antes que
atravessasse a porta, escutei:
— Você acha que é melhor. Que terá mais, que merece mais.
Você é tão filho da puta quanto eu. Meu sangue corre em suas
veias, figlio. A minha escuridão é a sua. Não se iluda achando que
pode ter o que não merece. Você vai destruir tudo o que tocar, não
se engane.
Eu me virei, deixando transparecer todo o meu ódio.
— Eu não sou você. Eu nunca serei como você.
Ele deu um sorriso diabólico.
— Serão os seus sentimentos que destruirão tudo o que você
acha que merece.
Nessa hora, Nero sacou uma arma e apontou para o meu pai.
— Mais respeito com o Don — Sua voz era letal. Meu pai vacilou
por alguns segundos, ele sabia que Nero só precisava de uma
palavra. — Peça desculpas.
— Me desculpe, Don — Meu pai disse, mas, antes de baixar o
olhar, eu vi o ódio e a promessa de que não tinha terminado.
Capítulo 9
Faltava um mês.
Um mês para o meu casamento.
Durante todo esse tempo, Eduardo e eu mantemos um ritual.
Inicialmente, ele me ligava de manhã, muito cedo, o que me irritava,
mas, no fundo, me lisonjeava. Era bom saber que ele pensava em
mim quando acordava. Era estúpido também começar a ter
pensamentos de mocinha apaixonada, afinal, mal nos conhecíamos.
Eu tentei me manter impassível, mas algo sobre isso pareceu tão
natural que logo as conversas monossilábicas passaram a
monólogos extensos em que ele me escutava atentamente. A
impressão que eu tinha era de que ele queria saber tudo sobre mim.
Logo, começaram a surgir ligações noturnas, ou quando ele estava
chateado em algum momento do dia. Mesmo que ele não fosse
aberto sobre o que o chateava.
Ele falava pouco, quando perguntei de si mesmo, ele deu
respostas rasas. Agora eu estava indo para Nova Iorque e passaria
o mês organizando os últimos detalhes do casamento e, claro, a
minha nova casa.
Por telefone, as coisas tinham sido naturais, Eduardo tinha
mostrado um lado atencioso que eu jamais imaginava que ele teria.
Um dia ele disse que falar comigo o acalmava. Eu não me acho nem
um pouco “calma”, mas ele dizer isso me deixou com o coração
quentinho.
Milena ainda estava reticente quanto ao casamento, mas vendo
como estávamos nos aproximando, parou de falar sobre o assunto.
Isabella dizia que ele estava apaixonado e mamãe estava nas
nuvens com tudo.
Casamentos na Máfia raramente eram por amor. Eu não
alimentava expectativas quanto a isso, mas se ele continuasse
sendo tão atencioso assim, eu correria um sério risco de cair de
amores por ele.
Chegamos à Nova Iorque e eu estava estranhamente ansiosa.
Pessoalmente, seria o mesmo? Eu deveria recebê-lo como? Um
abraço?
Não, eu não daria um abraço nele, a menos que ele tomasse a
iniciativa.
Cazzo, eu estava igual uma dessas principessas afetadas.
Eu não sou assim.
Vesti-me casualmente, estava muito nervosa, mas de um jeito
diferente da última vez que o vi aqui. Calça jogger preta, branca nas
laterais, uma t-shirt preta lisa e um tênis Anabela.
— Filha, você vai receber seu noivo que, por acaso é o Don,
vestida assim? Cadê os seus vestidos? Você trouxe o Valentino?
— Mamãe, não vou usar um Valentino em um jantar informal em
casa. Não surta!
— Não existe ocasião para usar um Valentino — diz Milena
entrando na sala.
Minha angústia acaba quando finalmente a campainha toca. Não
sei como é possível, mas meu coração está disparado, as palmas
de minhas mãos estão suadas, estou pura mulherzinha e nem é
meu casamento ainda.
A porta se abriu e ele entrou com toda sua glória masculina. Seu
olhar não deixou o meu enquanto ele cumprimentava minha mãe e
minhas irmãs. Quando se aproximou de mim, tomou minha mão e
beijou-a como quando nos conhecemos. Eu queria mesmo era pular
nele. Aquela apreensão de como eu reagiria na frente dele
desapareceu. Ali, em seu olhar, eu senti segurança. Ainda éramos
nós.
— Olá, principessa — disse sem soltar minha mão.
— Oh, não, cara. Principessa, não. Eu não sou uma princesa,
pense mais antes de me colocar um apelido carinhoso.
Isso lhe arrancou uma pequena gargalhada e eu me vi sorrindo
junto. Percebi que estávamos sozinhos na sala e, reunindo minha
coragem, puxei seu pescoço e dei um beijo.
Eu tinha pensado no nosso beijo nos últimos dois meses. Sua
surpresa durou menos de um segundo, logo senti seus braços em
volta de mim, correspondendo ao meu beijo apaixonadamente.
— Alguém estava com saudade — Ele resmunga entre meus
lábios. Dei um soco em seu estômago, mas ele era simplesmente
uma rocha. Senti seu estremecimento, mas foi quase nada, ele
segurou minha mão rapidamente e tentou me aprisionar, fui mais
rápida, desviei e dei outro golpe, de leve. Ele riu e mais uma vez
segurou minhas mãos, me apertando de encontro ao seu peito. Era
quase como preliminares. — Mal humorada.
Ele me beijou novamente e eu me perdi em seu aroma masculino,
seu corpo quente e a sensação maravilhosa da intimidade. Sexo
com ele deveria ser maravilhoso, eu poderia sentir a antecipação
em minhas veias. Soltei um gemido com o pensamento e ele
aprofundou o beijo, soltando minhas mãos. Eu o trouxe para mais
perto, nossos corpos colados. Esse era um beijo mais carnal.
Para quem tinha uma fachada fria, esse homem poderia ser
quente. E ele seria meu. Todinho meu. Finalmente, nos afastamos,
afinal, eu estava a alguns metros de mamãe.
— Amanhã, eu quero sair com você. Reserve-me o dia — Ele
disse em um fôlego só. Sua respiração estava ofegante, assim
como a minha.
— É muita arrogância achar que pode vir e simplesmente me
mandar fazer alguma coisa, e se eu já tivesse compromisso? —
disse por provocação. Claro que eu queria ir com ele, mas ele não
mandava e desmandava em mim.
— Você teria que desmarcar. — Ah, esse cara!
— Você é tão irritante. Eu vou, mas só porque eu quero.
Ele ri novamente, o som do seu riso é simplesmente perfeito. Ele
deveria sorrir mais. Ele para aos poucos e me encara, eu ainda
amolecida em seus braços.
— Você é impossível.
— Espero que isso seja bom.
Ainda me olhando intensamente, responde.
— É.
— Vocês estão agindo como um casal super apaixonado —
Milena disse entrando no meu quarto sem bater. Eu estava
terminando de me arrumar, Eduardo me pegaria em alguns minutos
para, segundo ele, uma surpresa.
— Não estamos apaixonados, estamos tirando o melhor proveito
da situação.
— Confesso que não achei, sinceramente, que ele fosse capaz de
ser afável. Ele te trata bem, devo admitir. Não tirou os olhos de
você, o tempo todo te tocando. Acho que ele nem percebeu.
— Você está sendo exagerada — Eu também percebi isso e
contive um sorriso. Eu estava me transformando em uma tola perto
dele e nem sei mais se isso era ruim. Milena estava estranhamente
séria. — Você está bem?
— Sim, quer dizer... É só que as coisas não serão mais as
mesmas. Você sempre foi a responsável, nossa líder e agora você
vai morar aqui e... eu vou sentir a sua falta. E, no fundo, eu gostaria
que ele fosse um cara horrível, que você percebesse e não se
casasse. Mas, poxa, o cara é quase perfeito. Eu quase o odeio por
isso. Estou sendo egoísta?
As lágrimas não derramadas brilharam em seus olhos. Meu
coração se apertou, realmente, sempre fomos unidas em tudo,
mesmo com nossas diferenças. As coisas mudariam e eu estava um
pouco culpada.
— Eu também vou sentir muita falta de vocês. Mas um dia isso
aconteceria, você sabe...
— Eu não vou me casar, Giulia. Eu não sou corajosa como você,
me casar e contar com a sorte. Eu não sou assim. Papai sabe disso.
E você sabe que eu tenho minhas próprias aventuras.
Eu sabia. Milena sempre chamou muito a atenção, era um
verdadeiro furacão, nunca se importou muito com as regras, por isso
ela vivia intensamente. Enquanto eu não passei da segunda base,
ela já tinha mais experiências que eu. Papai não sabia, claro. Ou se
sabia, não comentava.
Ele não deveria ser totalmente cego às escapadas dela, com toda
a certeza que ele fazia vista grossa, ele também não era bobo.
— Você deve tomar cuidado, Milena. Por favor, só tome cuidado.
As coisas aqui em Nova Iorque são diferentes, não se envolva com
ninguém da Família. Essa é a regra básica.
— Não se preocupe comigo. Eu estou aqui para te ajudar no seu
calvário, relaxa.
Eu dei um sorriso e um abraço em Milena. Ela era segura de si,
sabia o que queria, mas nada me isentava de me preocupar.
— Seu príncipe mafioso chegou — Eu escutei a porta e dei uma
última olhada no espelho. — Você está linda, Giulia.
Olhei meu vestido preto, listrado de branco, e meu tênis Sneaker19
preto. Não estava ruim. Mais ansiosa do que pensava que estaria,
me encaminhei para a porta e me deparei com meu lindo noivo,
vestido com uma calça preta e camisa branca. Ele me deu um meio
sorriso, enquanto o meu era radiante. Mamãe ainda estava incerta
quanto a me deixar ir, porém ele era o Don, não tinha como falar
não a ele.
19.e um tipo de tenis muito usado
Despedi-me de minha família e assim que entramos no elevador,
Eduardo me pressionou na lateral com seu corpo e me beijou sem
mais explicações. Eu corri minhas mãos por seu peito, pela nuca,
pelo cabelo cheio enquanto sentia seu gosto. Senti mais pressão de
suas mãos em minhas costas, enquanto eu procurava o atrito do
seu corpo. Eu queria suas mãos por todo o meu corpo.
— O que você está fazendo comigo... — Era um questionamento
retórico. Queria dizer que comigo era o mesmo, mas não conseguia
me parar.
O elevador parou e nos afastamos quase com um lamento, ele
segurou minha mão e me guiou para o estacionamento. Os
seguranças nos seguiram e fomos sozinhos em seu carro.
— Onde está me levando?
— Surpresa — Ele respondeu sem tirar os olhos do trânsito.
— Não sou boa com surpresas. Diga-me de uma vez – pedi.
— Surpresa — Dessa vez, ele me olhou e deu uma piscadela.
Entramos em Carnegie Hill, famosa por suas mansões clássicas
luxuosas, até onde eu sabia, era um dos bairros mais caros de Nova
Iorque, frequentado pela alta burguesia. A casa que morávamos na
Filadélfia era maravilhosa, mas essas eram outro nível. Logo,
paramos em frente a uma mansão medonhamente grande. Um
grande portão de aço foi aberto e entramos em uma área gramada
que ia da lateral a um espaço gourmet com piscina. A casa parecia
um palacete, na entrada de ambos os lados, havia uma escadaria
que se encontrava na porta de entrada. Era toda branca, clássica,
de tirar o fôlego. Paramos na frente e descemos. Subindo a escada,
paramos na porta.
— De quem é essa casa? — perguntei.
— Nossa — Ele respondeu com um sorriso quase tímido. – Quer
entrar?
Eu ainda estava em choque, sem conseguir articular uma palavra,
então, simplesmente, o acompanhei. A sala de estar estava limpa,
organizada, e totalmente mobiliada. De onde eu estava, via parte da
sala de jantar, sala de TV. Adentramos e tinha uma cozinha toda
equipada com utilitários nunca usados. Ainda me segurando pela
mão, ele nos levou a uma sala mais afastada. Abriu a porta e tinha
um lindo piano de cauda e uma harpa ao lado. Na lateral, um divã,
alguns quadros que decoravam e um tapete felpudo no centro.
— Para você tocar pra mim — Eu ainda não conseguia falar.
Minha garganta se apertou.
Ele me levou para o andar de cima, onde eu simplesmente não fui
capaz de contar os quartos. Era maior, muito maior que a mansão
de seu pai. Mais moderna também. Um quarto estava todo decorado
e eu logo soube que seria o quarto de Anita. Não segurei o sorriso,
essa garotinha já tinha o meu coração.
Ele me levou para outro quarto, a suíte master que estava em um
terceiro andar e ocupava todo o espaço, o nosso quarto. O closet
era maior que o meu próprio quarto, a cama era gigante, a vista
maravilhosa, no banheiro, tinha uma banheira que beirava uma
minipiscina. Na Filadélfia, vivíamos no subúrbio da Pensilvânia,
longe da agitação.
— Eu imaginei que talvez você se sentisse melhor se
morássemos mais longe da agitação. Eu sei que deveria ter falado
com você antes de escolher tudo sozinho, mas, bem, eu queria
fazer uma surpresa. Caso você não goste, tem total liberdade para
mudar qualquer coisa, acima de tudo, quero que se sinta confortável
e...
Eu o silenciei com um beijo. Que homem era esse? Como eu
poderia não gostar da casa? Era tudo perfeito. Eu tinha medo do
tanto que tudo isso parecia perfeito.
— Eu amei tudo — Ele soltou uma respiração. — Não precisava
de tudo isso, na verdade. Mas obrigada.
— Um rei precisa de um palácio. — Ele colocou meus cabelos
longe do meu rosto. – E de uma rainha — Esse homem. Estava
tornando impossível não me apaixonar por ele. — Porque é isso que
você será, Giulia. A rainha da Família, a rainha dessa casa.
Eu queria ser a rainha da vida dele também, mas ele não disse
isso. No momento, eu estava grata demais para fazer qualquer
cobrança, acho que eu tinha muito mais do que imaginei que teria
se um dia me casasse por conveniência.
— Eu tenho mais uma surpresa.
Isso me arrancou mais um sorriso.
— Mais uma? Quem diria que o senhor Don, com toda aquela
seriedade e arrogância, seria tão amável com sua futura esposa.
Ele me deu um olhar divertido.
— Também estou surpreso. Venha.
Segurar minha mão estava se tornando um hábito. Ele me levou
escada abaixo, e logo na lateral, outra escada abaixo e quando
terminamos de descer o que parecia ser um subsolo, eu perdi
totalmente o fôlego.
Era uma academia, muito parecida com o centro de treinamento
que meu pai construiu para mim e minhas irmãs. Tinha um
treinamento de tiro esportivo, um tatame para luta, aparelhos de
musculação, uma piscina esportiva. Era completa e moderna.
Dessa vez, meus olhos arderam. Porque não era simplesmente
pela academia em si, mas pelo que ela significava. Eduardo não
queria que eu mudasse, não queria que eu me moldasse. Ele me
aceitava como eu era e com tudo o que vinha comigo e isso
significava mais do que essa casa e essa academia. Significava
aceitação incondicional. Vendo meu estado, Eduardo segurou meu
rosto.
— Eu quero que você saiba que sei o que dizem a meu respeito e
da minha família, mas eu jamais machucaria você intencionalmente.
— Já tem um tempo que eu sei disso. Eu confio em você Eduardo
— Algumas lágrimas desceram e eu queria me chutar por isso.
— E eu vou ter certeza de que você jamais perca essa confiança
em mim. Eu prometo.
Com Eduardo, eu me sentia única, especial, como se fosse o
centro de todo o seu mundo. Seus lábios baixaram para os meus,
pela primeira vez, com calma, sem pressa, quase calculadamente.
Eu senti esse beijo da minha cabeça aos dedos dos pés. De
repente, eu queria ficar mais próxima, eu me sentia quente em todos
os lugares. Suas mãos ficaram mais frenéticas, de modo que me
levantou pela minha bunda e me trouxe ao encontro de sua
protuberância. Bem no lugar onde eu precisava de atrito. Meu
cabelo estava selvagem, eu desabotoei sua camisa para pegar em
seu peito, sentir sua temperatura sem nada ao nosso redor. Os
olhos de Eduardo escureceram e só então eu percebi que ele me
levava ao tatame, me colocava aos meus pés e, em uma respiração,
tirava o meu vestido, me deixando de calcinha e sutiã de renda
preta. Ele caiu de joelhos e beijou minha barriga, acariciando
minhas pernas como se eu fosse uma deusa e ele, o meu súdito.
Eduardo alternava entre suavidade e selvageria, mordia e beijava
meu estômago, quadril, apertava minha bunda e eu não poderia
dizer que me importava. Ele levantou e acariciou os meus seios,
tirando meu sutiã e, sem muita cerimônia, levando meu mamilo à
boca enquanto acariciava o outro, puxando e beliscando. Eu me
sentia quente e consumida, era quase demais. Ele me deitou no
chão, e me olhou com adoração. Ele não me tocou e eu estava
começando a ficar consciente.
— Você é perfeita...
Eu sorri, eu o queria, queria ser dele completamente, queria tanto
que doía por dentro.
— Me faça sua, Eduardo.
Ele se levantou, tirou sua roupa e cobriu meu corpo com o dele.
Sentir o seu corpo muito maior que o meu me deu uma sensação de
vulnerabilidade enorme. Eu odiava me sentir vulnerável, era como
dar total poder a outra pessoa. Como se sentisse minha mudança,
Eduardo segurou meu rosto:
— Eu vou cuidar de você. Sempre.
Eu acreditava nele e isso me relaxou. Eu envolvi meus braços e o
beijei profundamente. Senti sua ereção na minha coxa, enquanto
Eduardo afastava minhas pernas e, com delicadeza, tocava meu
centro. Soltei um suspiro, eu já tinha me dado prazer, mas pelas
mãos enormes de Eduardo era outro nível de excitação. Ele inseriu
um dedo e eu arquejei. Eduardo continuou trabalhando com suas
mãos até que eu senti todo o meu corpo estremecer ao seu toque,
sendo arrebatada em um orgasmo que me fez flutuar.
Mal me recuperei do orgasmo e senti que a ponta de seu pau em
minha entrada. Ele foi avançando lentamente sem parar, mesmo
quando eu agarrei suas costas com minhas unhas pela pontada de
dor, ele fez o caminho até estar completamente dentro de mim.
Por algum tempo, ele me olhou nos olhos sem se mover. Tirou
meus cabelos do meu rosto que estava suado e me beijou. Eu me
sentia esticada quase ao limite, e ainda sentia uma ardência terrível,
mas ao ver seu olhar em mim, seu cuidado com o meu bem-estar,
eu tive certeza, eu esperei todo esse tempo para isso, para sentir
essa conexão. Eu sabia que jamais me arrependeria.
Passei minhas pernas ao redor de sua cintura em um
assentimento silencioso para que se movesse. Quase aliviado, ele
iniciou seus movimentos lentamente, mas logo ele se mexeu com
mais velocidade. A dor misturada com o atrito de nossos corpos deu
lugar a um indício de prazer, queria que ele soubesse que poderia
se soltar, era visível que ele estava se segurando comigo. Apertei
seu corpo junto ao meu e, com um gemido eu percebi qual foi o
exato momento em que Eduardo se perdeu. Seu olhar ficou
selvagem, sua respiração acelerada, ele se levantou pelos cotovelos
e se moveu sem piedade.
E eu amei cada investida. Eu o queria assim, entregue, como eu
tinha me entregado.
Com uma última investida, ele chegou ao clímax e soltou seu
peso em cima de mim. Foi deliciosamente maravilhoso. Eu beijei a
curva de seu pescoço, nossos corpos suados, banhados pelo
tumulto do meu interior e de nossa respiração.
Ficamos assim por um par de minutos até ele se levantar nos
braços.
— É sempre devastadoramente bom assim? — perguntei com um
sorriso. Ele segurou meus olhos e respondeu.
— Não. Nunca foi assim.
Isso aqueceu meu coração de maneira que eu não queria
entender agora. Saber a que pé estamos poderia levar a perguntas,
e as respostas poderiam não ser o que eu esperava. Eduardo, em
vários momentos, deu a entender que não era merecedor de nada.
Não que ele tenha falado claramente, talvez nem ele percebesse,
mas ele pensava muito pouco de si mesmo. Com o tempo, eu o faria
se ver como ele realmente é. Um Don justo, um bom irmão e um
bom noivo.
Eduardo levantou-se e o movimento me deu uma pontada de dor
quando ele saiu de mim. Ele deve ter percebido, pois foi ao banheiro
que tinha na lateral, trouxe uma toalha e cuidou das minhas partes
de menina. Foi constrangedor e doce ao mesmo tempo. Ele ficou
sério de repente.
— Pode ser meio tarde para dizer, mas eu estou tomando
contraceptivo.
Isso nos fez rir, mas logo seu rosto mudou junto com o seu tom.
— Eu não deveria ficar com você pela primeira vez em um
tatame, praticamente no chão.
Eu me sentei, me aproximei e lhe dei um beijo leve nos lábios.
— Foi perfeito.
— Você merece mais, Giulia.
— Eu quero você em qualquer lugar, em todos os lugares.
Seu olhar brilhou em mim e um sorriso lento puxou seu rosto. Ele
acariciou minha bochecha.
— Eu vou te dar o mundo.
“Eu só quero o seu coração”, eu queria dizer. Mas eu não
estragaria o momento com sentimentalismo. As coisas aconteceriam
no momento que tivessem que acontecer. Hoje eu estava muito
feliz, por enquanto, a sua dedicação a mim era o suficiente. Por
enquanto.
Porque eu queria tudo.
Capítulo 10
Eu e Giulia não tivemos tanto tempo para nos ver nos dias que
seguiram após levá-la para conhecer a casa. Ela estava envolvida
com tudo relacionado à festa de casamento, enquanto eu estava
trabalhando com Nero e Giovanni a respeito da segurança do
casamento. Faltava menos de quinze dias e eu queria ter certeza de
que seria seguro. Nero ainda não estava de acordo em fazer um
evento grandioso, mas era o casamento do Don. Qualquer coisa
além de grandioso poderia ser entendido como medo. Dessa vez,
estávamos preparados. Uma equipe de elite composta apenas pelos
homens de confiança de Nero faria a guarda do evento,
especificamente dos noivos e de Anita. Era uma equipe secreta, até
que pudéssemos confiar no restante dos soldados e Caporigemes.
Nero estava convencido de que alguém do alto escalão estava
envolvido e ainda não havia sido pego. Ele também tinha certeza de
que haveria outra tentativa, onde o alvo era a família Santorelli.
Pensar que Anita e Giulia poderiam estar em perigo, me deixava
muito nervoso.
— Você está certo de que ainda há conspiradores? — perguntei a
Nero, estávamos no escritório da minha cobertura.
— Tenho quase certeza. Também estou certo de que haverá outra
tentativa de ataque.
— Malditos russos! — cuspiu Giovanni.
— Os homens dessa equipe de Elite, tem certeza de que são
confiáveis?
— Sim. Eles são. Eles seguirão todo passo de ambas. E os seus.
Assenti. Eu não tinha medo por mim.
Continuamos nossos assuntos relacionados aos negócios quando
a campainha tocou. Olhei atentamente para ambos. Eu não estava
esperando ninguém. Tinha segurança lá fora, mas nunca se sabe.
As únicas pessoas que tinham passagem liberada eram Anita e
Giulia, e Anita estava por esses dias com a família Castelle e Giulia,
muito ocupada com o casamento. Ambos, Nero e Giovanni,
sacaram suas armas e chegamos à porta. Era fim da tarde, olhei
pelo olho-mágico e suspirei. Giulia. Abri a porta e ela me deu um
sorriso radiante.
— Surpresa!
Ela estava acompanhada de suas irmãs. Eu estava imensamente
feliz em vê-la, mas ao mesmo tempo estava preocupado por sua
segurança. Mas ela pareceu tão insegura sobre estar ali que a puxei
para meus braços.
— Olá, principessa — falei baixinho em seu ouvido e dei um beijo
em sua fonte.
— Já falei que não sou uma princesa — Ela revirou os olhos e
saiu do meu abraço. Ao perceber a presença de Nero e Giovanni,
ela deu um olá e entrou no meu apartamento. Suas irmãs
acompanharam com um olá coletivo, percebi que Milena não olhou
na direção de Giovanni. — Queria conhecer sua casa. Estávamos
dando uma volta no Central Park e lembrei que você morava aqui
próximo. Meu pai conseguiu o nome do seu edifício e resolvemos
fazer uma surpresa. Espero não ter atrapalhado.
— Venha comigo um instante — Levei-a para a varanda, não
dando a mínima para o olhar debochado de Giovanni. Eu precisava
ficar sozinho uns minutos com Giulia. Chegando à varanda, sem
mais palavras, a puxei para um beijo, levantando-a do chão sem
romper o contato de nossas bocas, sentei-a na mureta e fiquei entre
suas pernas.
— Alguém estava com saudades — Ela jogou minhas palavras de
volta. Ri em seus lábios. De repente, a possibilidade de algo
acontecer a ela me bateu como um tapa.
— O que foi? Aconteceu alguma coisa? — Ela deve ter percebido
a mudança.
— Não é nada que você tenha que se preocupar, principessa —
Seus braços caíram em seu colo. Isso me fez encara-la.
— Não faça isso. Por favor, não me trate como uma mulherzinha
burra. Se você não quer falar o que te aflige, tudo bem. Eu quero ser
sua parceira e quero que confie em mim, mas não vou implorar. Só
não me diga que não é nada.
Isso me surpreendeu. Giulia não era como as outras mulheres,
ela estava acostumada a comandar em seu pequeno mundo. Ela
não estava acostumada a ficar no escuro, seu pai compartilhava
informações com ela. Segurei seu rosto.
— Eu só não quero te preocupar.
— Eu não sou uma boneca de porcelana. Nem uma princesinha.
Ela estava irritada, eu não aguentei e sorri. Ela, claro, tentou me
golpear com um soco no estômago. Eu fui mais rápido e defendi o
golpe ainda sorrindo. Ela ficou ainda mais determinada a me acertar
e isso só me fazia rir mais e mais. A vida jamais seria morna com
Giulia. Em um único golpe, eu imobilizei seus braços e a beijei
ferozmente. Ela lutou um pouco, mas logo se entregou. Suas mãos
foram para meu cabelo e puxou a raiz. Eu mordi seu lábio inferior e
então soltei.
— Nero acredita que ainda há conspiradores. E tem certeza de
que tentarão algo em nosso casamento.
Ela me olhou por alguns segundos, com os braços em meu
ombro, e encostou nossas testas.
— Eu imagino que não deve estar sendo fácil. Mas você não está
sozinho, Eduardo. Nós estaremos juntos em tudo agora.
— Eu me preocupo com você, Giulia. Nero acha que você e Anita
podem ser os principais alvos.
— E eu me preocupo com você, Eduardo.
— Se preocupa? – perguntei levantando meus olhos para os
seus.
— Claro que me preocupo! Você é o meu noivo, eu me importo
com você. Como eu deveria não me preocupar? — Ela estava
quase indignada.
— Não é como se você tivesse alguma escolha a respeito desse
casamento. Eu praticamente me impus a você — Ela segurou meu
rosto com as mãos para que eu não desviasse os olhos.
— Acredite em mim quando digo que vou andar naquele corredor
e te dizer sim porque eu quero. Porque eu sou sua. Porque eu não
me imagino fazendo isso com qualquer outra pessoa.
— Você não preci...
— Sim, eu preciso — Ela disse com mais firmeza. — Você deve
entender de uma vez por todas que eu quero estar aqui, você não
precisa me convencer. Você tem que entender, Eduardo, que você é
maravilhoso para mim. Mais do que um dia eu imaginei que seria.
— Você merece tudo, Giulia.
— Você me dá tudo o que preciso. Você é tudo o que eu preciso.
Meu coração falhou uma batida. Eu não sei o que tinha feito para
merecer sua devoção, mas eu cuidaria de qualquer sentimento que
ela me desse com a minha vida. Eu jamais exigiria, eu só tomaria o
que ela estivesse disposta a dar, porque tudo o que tinha em mim
era dela e só dela.
Ela me beijou novamente, até que ouvimos vozes alteradas vindo
da sala.
— Vamos, antes que eles se matem.
Mal chegamos à sala e vimos uma Milena alterada e Giovanni
com cara de deboche, enquanto Nero estava no sofá e, na outra
extremidade, Isabella.
— Será que sai uma pipoca? Só estamos no segundo round —
sussurrou Isabella enquanto aproximávamos.
— Graças a Deus, você voltou.
— Você está ferindo meus sentimentos, gatinha selvagem.
— É srta. Castelle para você. Já disse para não me chamar
assim, você não é meu amigo ou nada próximo a isso para me
chamar de qualquer coisa que não seja Srta. Castelle.
— Acredite, amigo é a última coisa que eu quero ser para você.
— Eu deveria me preocupar com o que você quer? Giulia, vamos
embora ou vou cometer um assassinato.
Giulia suspirou.
— Só tentem não se matar no altar, por favor.
Milena já estava na porta, Giulia me deu um beijo no rosto e
Isabella se levantou.
— Depois eu que sou a sanguinária — Ela disse com um suspiro
seguindo suas irmãs.
— Não se preocupe, Annabelle, o posto ainda é seu — Nero
suspirou com o apelido — A gatinha só gosta de fazer barulho. Eu
amo as barulhentas.
— O único barulho que você vai escutar de mim vai ser o som do
tiro que darei em sua testa, senhor — Ele soltou uma gargalhada.
Ela revirou os olhos e saiu batendo o pé. Giulia deu um olhar de
desculpas e seguiu as irmãs.
— Qual é o seu problema com essa garota? — Eu perguntei
sentando no sofá. Giovanni suspirou e disse:
— É refrescante.
— Quase ser morto toda vez que encontra ela? — perguntou
Nero — Porque, pelo que já me contou, ela é perfeitamente capaz
de fazer isso.
— É refrescante ela não gostar de mim.
Giovanni era o homem das garotas, sempre foi assim. Ele tinha
beleza, poder, dinheiro e humor. Nunca teve que trabalhar para
conseguir alguém.
— Isso soa meio masoquista, você sabe — disse Nero.
— Eu sei, mas ela é fácil demais de provocar. É quase irresistível.
— Tenta segurar esse seu impulso suicida até o casamento, por
favor. Precisamos de vocês vivos para a cerimônia.
— Não prometo nada — ele disse com um sorriso de merda. Isso
ainda ia dar história.
Capítulo 11
Os convidados estavam começando a chegar e, para recebê-los,
alugamos um hotel próximo à igreja e no mesmo local que
aconteceria a cerimônia de casamento. Todos estávamos
ocupadíssimos, várias coisas para resolver de última hora. Anita
estava em nosso apartamento e se mudaria conosco para a
mansão.
Minha ligação com ela estava cada vez mais forte e isso me
deixava muito feliz. Anita era importante para Eduardo e me
importava que ela gostasse de mim. Ela levaria as alianças,
enquanto minhas irmãs seriam as damas de honra. Os padrinhos de
Eduardo eram Nero e Giovanni. Eu só esperava que Milena
controlasse o seu temperamento, seu ódio por ele era quase
irracional. Tentei conversar com ela sobre isso, mas ela foi
irredutível.
Eu reconhecia, ele gostava de provocá-la, mas só porque ele
sabia que ela iria reagir. Ele se deleitava com a irritação dela.
Enquanto Milena era dada a várias explosões emocionais, Isabella
poderia demonstrar total falta de emoções. Eu sabia que ela nos
amava, mas sua falta de reações era sua principal característica. Se
ela chegasse ao limite, alguém poderia morrer ou sair seriamente
ferido.
Estávamos nos arrumando para o jantar na casa do meu sogro.
Ele fez questão de os membros da Famiglia, segundo ele, em
homenagem aos noivos. Coloquei um vestido que era justo até a
cintura, saia rodada, acima do joelho, verde. Saltos dourados
acompanhados de uma bolsa de mão. Milena enrolou o meu cabelo,
o que me deu ondas, deixando um ar sofisticado.
Chegamos à mansão e a maioria dos convidados já estava
presentes. Eduardo se aproximou de mim, me levando de grupo em
grupo, me apresentando a algumas pessoas que ainda não
conhecia pessoalmente.
Após fazermos a social, eu já estava cansada.
— Você foi perfeita — Eduardo disse ao meu ouvido.
Arrepios percorreram meu pescoço. Eu o olhei e agradeci com um
assentimento. Tudo parecia caminhar perfeitamente até eu decidir ir
ao banheiro.
Como embaixo estava um pouco lotado, decidi ir ao banheiro da
parte de cima. Eu havia sido treinada, sabia que alguém estava me
seguindo descuidadamente, pois eu estava ouvindo perfeitamente.
Escondi-me em um dos quartos e continuei escutando. Saltos. Eram
saltos, provavelmente uma mulher.
Eu poderia estar sendo paranoica, mas uma coisa eu sabia,
deveria desconfiar de qualquer pessoa, independente do sexo. Os
saltos pararam próximos a mim. Se quisesse usar o banheiro, teria
continuado o caminho, mas ela parou próxima a mim. Ela estava
atrás de mim.
Reconheci sua silhueta como a de Sophia DeLucca. Encontramo-
nos em alguns eventos, mas nunca fomos formalmente
apresentadas. Saí de onde estava, no quarto e continuei o meu
caminho quando ela parou na minha frente. Parei e a encarei nos
olhos, esperando o que diria.
— Precisa de alguma coisa? — perguntei por fim. Seus olhos
brilharam e ela deu um riso de desdém. Eu não sabia qual era o
problema dessa garota, mas não estava com paciência para o que
quer que fosse. — Com licença.
Ao passar ao seu lado, ela teve a coragem de segurar o meu
braço. Com um impulso, tirei meu braço do dela e me virei
novamente para que ela me dissesse de vez o que queria.
— Qual é o seu problema?
— Eu queria ver de perto quem é a garota que tirou o que era
meu por direito.
— Não sei se entendi.
— Só saiba de uma coisa, antes que a coroa pouse em sua
cabeça, eu vou assistir a sua queda.
Veja, não sou uma pessoa dada ao drama, mas algo em seu tom
fez com que eu sentisse medo.
— Está me ameaçando?
Ela me deu um sorriso estranho, saiu sem aviso e eu fiquei ali,
parada no corredor. Logo, senti uma mão atrás de mim. Puxei o
braço de uma vez para minha frente, já preparada para dar um
golpe quando vi que era Eduardo.
— Ow, calma. Sou eu.
— Me desculpe — Eu ainda estava visivelmente abalada.
— Está tudo bem? — Ele estava preocupado.
— Sophia DeLucca. Já teve algo com ela? — Meu tom era
envenenado. Ela seria uma ex? Ela agiu como uma mulher traída.
Ele franziu o cenho.
— Não. Mas acho que ela esperava algo de mim.
Então era isso. Eram ciúmes. Uma onda de possessividade tomou
conta de mim, eu empurrei Eduardo para o quarto e fechei a porta
com o meu salto.
— Eu quero você. Agora — disse tirando seu terno pelos ombros
e o empurrando para a cama.
Ele não perdeu tempo. Suas mãos foram para minha cintura, me
virando na cama para ficar de costas e segurar a cabeceira da
cama.
— Mãos aí.
Sua voz foi dominante. Eu segurei a cabeceira, enquanto ele
lentamente acariciava minhas coxas, levantando a saia do vestido,
colocando a cara na minha bunda. Ele massageou as bochechas da
minha bunda e desceu a minha calcinha. Apertando minha bunda,
ele começou a beijar e morder, e eu fui a loucura. Logo, seus dedos
estavam em mim, sua boca e novamente eu estava quase
explodindo com as sensações.
Mas eu queria mais.
Eu precisava de mais.
— Eu quero você dentro de mim, Eduardo.
Ele desabotoou a calça e, sem demora, com impulso poderoso,
entrou em mim. Ele me manteve no lugar com suas grandes mãos e
me deu investidas rápidas e fortes. Eu estava consumida, possuída,
mas eu queria mais.
— Mais forte.
Ele me puxou pelo cabelo e trouxe meu corpo de encontro ao seu
peito, ainda investindo em mim. Eu coloquei minhas mãos em seu
cabelo e apertei seu couro cabeludo com minhas unhas. Ele saiu de
mim e me virou em um só movimento, como se eu fosse uma
boneca. Ele levantou meus joelhos enquanto me deitava de costas e
novamente entrou em mim. O som dos nossos corpos se chocando
fazia com que eu o sentisse em todos os lugares. Meu orgasmo foi
se construindo com cada batida.
Era poderoso.
Libertador.
Eu queria mais e mais disso.
Eu queria tudo dele.
Logo meu orgasmo me tomou e Eduardo segurou meu grito com
um beijo, derramando seu próprio prazer em mim.
Ficamos por alguns segundos assim, normalizando nossas
respirações e curtindo a intimidade. Eduardo se levantou beijando
minha testa, o que quase me fez rir, e foi para o banheiro do quarto.
Ele se limpou, me limpou no processo, se arrumou e me estendeu
as mãos para que eu também levantasse. Quando me levantei, ele
ajeitou o meu vestido e disse:
— Talvez você queira dar uma olhada no espelho antes de sair.
—Tenho certeza que se aparecer assim, vai parecer meio óbvio o
que fizemos.
Ele sorriu, enquanto eu entrava o banheiro. Ótimo.
Arrumei meu cabelo e retoquei a maquiagem. Eduardo estava me
aguardando quando finalmente terminei.
— Está bem? Acha foi demais? — A preocupação dele era fofa.
— Você é fofo — Ele fez uma careta.
— Eu não sou fofo.
— Sim, você é. Um fofo — disse enquanto apertava sua
bochecha como faria com uma criança. A careta dele se intensificou
e eu me segurei para não rir alto.
— Giulia, você não pode me chamar de fofo, principalmente, na
frente dos meus soldados.
Dessa vez, eu ri muito.
— Vamos descer, fofuxo — disse lhe dando as costas, mas ainda
escutei o seu resmungo frustrado.
— Pelo amor de Deus...
Naquela noite, minhas irmãs dormiram comigo. Nós três na cama,
quase me fez chorar. Não as ter comigo seria a pior parte de tudo,
mas eu estava feliz, Eduardo seria um marido maravilhoso e eu
estava ansiosa para começar minha vida com ele.
— Você está feliz, Giulia. Para mim, é tudo o que importa — Bella
disse agarrada a mim.
— Ele adora o chão que você pisa. Fica impossível odiá-lo —
Escutei de Milena do meu outro lado.
— E vocês se cuidem, se controlem. Ajudem o papai e, qualquer
coisa, estou a um telefonema de distância. Ainda sou irmã de vocês,
eu sempre vou estar aqui por vocês.
Um tempo depois senti a cama se afundar e mais dois corpos se
uniram nas duas extremidades da cama que, graças a Deus, era
enorme. De um lado, papai se aconchegou com Bella e, do outro,
mamãe, com Milena.
— E nós, por vocês — disse minha mãe com a voz embargada.
Meus olhos encheram de lágrimas. Eu ia sentir tanta falta de
todos.
O abraço conjunto se intensificou. Ficamos assim até dormir.
Capítulo 12
A igreja estava lotada. Ao mesmo tempo em que eu estava feliz,
eu também estava preocupado. Minha ansiedade se aplacou
quando a cerimônia começou com a entrada das damas de honra e
os padrinhos que se posicionaram nas laterais do altar. As irmãs
Castelle estavam deslumbrantes, Nero e Giovanni estavam ao meu
lado. Eu não perdi o olhar afiado que meu pai deu a Milena, isso me
preocupou, mas sabia que não era o momento.
Anita entrou em seguida com um vestido de princesa, toda
sorridente. Ela e Giulia se adoravam e isso só era a cereja do bolo.
A marcha nupcial se iniciou e eu vi Giulia entrar acompanhada de
seu pai, deslumbrante, com um lindo sorriso no rosto. Seu vestido
era clássico como ela, o cabelo estava preso, adornado por uma
tiara e um véu, o vestido era cinturado e solto sem ser
exageradamente rodado. As mangas iam até os punhos. Ela parecia
uma rainha e meu coração acelerou. Eu não imaginei que sentiria
tanta emoção em meu casamento, estava quase impossível não ser
aberto sobre como eu me sentia em relação a ela.
Ao me ver, seu sorriso se tornou ainda mais radiante e foi
impossível controlar o meu próprio, embora fosse mais contido.
Giulia brilhava. Certamente era uma novidade em nosso meio ver
uma noiva tão feliz.
Aproximei-me dela, ajudei a subir os degraus do altar e segurei
ambas as mãos. Ela estava tão segura, tão genuinamente feliz, que
me emocionou. Ela realmente estava aqui porque queria, não por se
sentir obrigada. Até aqui eu não sabia o quanto isso era importante.
Fizemos nossos votos e o padre nos declarou marido e mulher.
Sem qualquer hesitação, nos beijamos para selar a união. Fomos
cumprimentados por uma infindável fila de convidados e tudo
parecia perfeitamente calmo. Dirigimo-nos para o hotel onde
aconteceria a recepção dos convidados. Chegamos à festa, tiramos
algumas fotos e finalmente nos sentamos.
— Hora da dança dos noivos. — Milena nos arrastou para o
salão. Vi o brilho nos olhos de Giulia e o sorriso cúmplice
compartilhado com a irmã. Ray Lamontagne começou a cantar “You
Are The Best Thing”, enquanto eu e Giulia começamos a dançar.
Bem baixinho, Giulia cantava para que somente eu escutasse.
“E baby/A maneira como você me move,/É loucura/É como você
vê através de mim /e torna isso mais fácil /Acredite em mim, você
não precisa nem tentar/Baby/Percorremos um longo caminho/E
baby / Você sabe que eu espero e rezo/ para que você acredite em
mim/ quando digo que este amor nunca vai desaparecer/ Porque
você é a melhor coisa que já me aconteceu”.
A impressão que eu tinha era de que estávamos em uma bolha
somente nossa. Ela tinha escolhido essa música? Ela estava
dizendo que me amava? Foi necessária toda minha força de
vontade para segurar minha emoção. Quando acabou, ela
permaneceu em meus braços e se aproximou do meu ouvido.
— Eu te amo, Eduardo Santorelli. Você é a melhor coisa que já
me aconteceu.
No fim da festa, nos encaminhamos para o hotel que passaríamos
a noite. Até agora tudo tinha sido tranquilo, sem atividades
suspeitas. Eu ainda estava digerindo a declaração de amor da
Giulia. Nem nos meus sonhos mais profundos eu achei que isso
poderia ser possível. Eu estava apaixonado por ela? Muito. Eu
queria dizer muita coisa, mas ali, no meio da pista de dança, não era
o lugar. O mais incrível é que Giulia disse que me amava sem
esperar uma resposta. Ela disse da forma mais linda e emocionante,
o tipo de coisa que nunca achei que seria possível acontecer
comigo.
Entramos na suíte e seu sorriso era contagiante. Ela era tão
genuína.
Peguei-a em meus braços e a sentei na cama, agachando-me ao
seu lado. Não me preocupei em acender as luzes, o quarto estava
banhado pela luz da lua. Ela estava maravilhosa, adornada pelo
vestido e véu, sentada na cama.
— Durante toda a minha vida, eu achei que não era merecedor de
nenhum sentimento genuíno da parte de ninguém. Meu pai só nos
destruiu e minha mãe desistiu de tudo. Talvez ela me amasse, mas
seu amor por mim não foi o suficiente — Seus olhos estavam em
mim e ela me escutava atentamente. — Desde o momento em que
pus meus olhos em você, antes mesmo de saber quem você era, eu
me senti conectado. Eu nunca tive conexão ou intimidade com outra
pessoa. Tudo se tratava de suprir uma necessidade básica e pronto.
Mas com você... com você, eu passei a sentir tudo de uma só vez.
Uma necessidade de fazer com que você me visse mais que só uma
obrigação. Emoção com seu desafio e teimosia. Sua força e
coragem. Seu amor e dedicação com seus pais, com suas irmãs, e
com minha irmã. Eu não conseguiria jamais resistir a você. Eu
estava disposto a aceitar o que você me desse, qualquer coisa. Eu
te amo, Giulia. Te amo e vou cuidar do seu amor com tudo que há
em mim. Você nunca irá se arrepender de me amar.
Os olhos dela brilharam. Ela me beijou apaixonadamente e eu
não perdi tempo. Naquela noite, eu adorei o corpo de Giulia, tomei
meu tempo cobrindo todo o seu corpo com a minha atenção. Ao
final, estávamos ambos suados e satisfeitos, dessa vez seguros de
todo o amor pelo qual fomos abençoados.
Capítulo 13
Eduardo disse que me amava.
Mais que isso, Eduardo mostrou uma e outra vez o quanto ele
estava sendo sincero sobre me amar. Acordei muito cedo e admirei
a beleza do meu marido.
Meu marido.
Ainda soava estranho, mas eu estava disposta a dar o melhor de
mim. Porque ele merecia. Eduardo poderia ainda não saber, mas ele
merecia tudo. E eu passaria a vida mostrando isso a ele.
Olhei o meu celular e ainda era cinco da manhã. Ia soltar na
cômoda para voltar a dormir quando ele tocou. Número
desconhecido. Estava silencioso, então me levantei e fui para mais
próximo da janela, não queria perturbar Eduardo.
— Alô.
Escutei uma risada maníaca do outro lado e senti um arrepio dos
pés à cabeça.
— Giulia Castelle... ou eu deveria chamar de Giulia Santorelli?
— Quem está falando? — perguntei.
— Ah, essa é uma questão válida. Mas vou fazer melhor, querida.
Vamos nos encontrar pessoalmente para que eu me apresente
adequadamente. Eu tenho certeza que iremos nos dar muito bem.
— E por que eu iria me encontrar com um estranho?
— Porque você não terá muita escolha, meu bem. Eu tenho
alguém aqui comigo que é muito importante para você. Sem mais
delongas, eu quero fazer uma troca. Você pela sua irmãzinha. Que,
aliás, é uma boneca. Vou te mandar o endereço com o horário por
mensagem. Venha sozinha.
— Você está blefando — Tentei manter minha voz calma, mas já
estava pegando o celular de Eduardo para ligar a Milena. Mais um
sorriso maníaco.
— Aguarde a minha mensagem.
Ele desligou.
Eu fiquei parada absorvendo o que estava acontecendo enquanto
o celular de Milena tocava.
— Alô — A voz de Milena era de sono.
— Milena, onde está Bella? Me fala que ela está com você.
— Ow, calma aí, como assim? Bella deve estar com nossos pais
no apartamento.
— Onde você está?
— Você não deveria estar curtindo sua noite de núpcias? Nem
amanheceu, cazzo. Qual o seu problema, Eduardo não deu conta?
— Eu não tenho tempo para isso agora. Recebi uma ligação,
alguém dizendo que está com a Bella.
— Como assim? Mas que merda. Eu não dormi em casa, vi Bella,
pela última vez, na festa.
Nesse momento, meu celular toca. Uma mensagem e uma foto
anexa. A foto era de Bella desacordada e amarrada. Ainda estava
com o vestido de dama de honra. Que merda aconteceu?
— Venha para cá agora, Milena. Recebi uma foto. Levaram a
Bella. Ainda estou no hotel.
Milena desligou, suas escapadas era a menor das minhas
preocupações no momento.
Olhei para a cama novamente e Eduardo estava desperto. O
homem pediu silêncio, mas eu jamais poderia fazer isso sozinha. Eu
e minhas irmãs sempre fomos uma equipe e agora Eduardo faria
parte dela. Eu jamais me colocaria em risco sem o conhecimento
dele.
— Eduardo — disse gentilmente. — Me ligaram há poucos
minutos. Levaram a Bella. Eu recebi uma foto, me pediram para me
trocar por ela.
Ele se levantou em um só movimento. Colocou as calças e ligou
para Nero.
— Nero, venha para o hotel. Emergência — Ele desligou e virou-
se para mim. — Não se preocupe, principessa, vamos trazê-la de
volta.
Eu já estava ligando para meu pai para ter certeza de que ela não
estava em casa com ele. Mas sabia que as chances eram mínimas.
A garota da foto era Bella, mesmo que eu quisesse negar.
— Pappa, por favor, sem assustar a mamãe, veja se Isabella está
em casa.
— O que está acontecendo?
— Por favor, Pappa.
Ouvi o farfalhar dos lençóis, passos e um suspiro.
— Ela ficou para trás com Milena. Devem estar juntas.
— Pappa, ela não está com Milena, preciso que venha para o
hotel agora. Eu vou te explicar tudo.
Nesse momento, a campainha do quarto tocou. Eduardo abriu e
Milena entrou, seguida por Giovanni. Eu nem queria saber o que
isso significava.
Nero e papai chegaram não muito tempo depois. Contei a eles o
que aconteceu.
— Eu tive que sair, ela tinha ficado com um dos nossos
seguranças — Milena diz. — Ele ficou de acompanhá-la em casa.
— E por que a senhorita não estava com sua irmã? — Meu pai
estava bravo. Ele raramente ficava bravo. Milena empalideceu,
então, eu resolvi intervir.
— Isso não importa agora, Pappa. A única coisa que importa é ter
Isabella de volta.
Nero ainda não tinha dito uma palavra. Não que ele tenha sido
falante ao meu redor, mas ele apertava as mãos ansiosamente, com
uma raiva reprimida. Como se quisesse socar alguma coisa. Por
que eu tinha a sensação de que muito estava acontecendo e eu
estava no escuro?
Sem cabeça para pensar em tudo isso no momento, começamos
a traçar um plano. A mensagem dizia que eu deveria me encontrar
às oito da manhã, em uma estrada na saída da cidade. Ele deveria
pensar que eu era uma garotinha burra que teria complexo de Deus
e iria sozinha. Minha vida tinha sido inteiramente de risco. Ele não
sabe com quem se meteu.
Mais alguns minutos e escutamos a porta novamente.
Entreolhamo-nos, pois não esperávamos ninguém, mas Nero se
levantou e abriu a porta, pegando um homem que estava na porta,
sendo trazido por mais dois de seus soldados pelo colarinho, e o
jogou no chão. Sem dar tempo para que o homem se recuperasse,
ele começou a esmurrá-lo sem intervalos.
— Você vai nos dizer onde ela está, Alessio, e o porquê de você
estar com ela.
Nero iria matá-lo. Eduardo resolveu intervir, mas era impossível
tirá-lo de cima do homem. Era quase pessoal, o que era estranho,
pois, até onde eu sabia, Nero e Isabella não eram próximos.
— Chega, Nero. É uma ordem — Isso o parou. Ele ainda estava
muito alterado, então saiu de perto do homem com as mãos na
cabeça.
O homem que, por pouco não perdeu a consciência, finalmente
disse:
— Eu vou te dar apenas isso, senhor. Algumas pessoas não estão
muito felizes por você ser o Don. Eu tomaria cuidado se fosse você.
Com uma risada sinistra, o soldado começou a convulsionar, ter
espasmos, um líquido começou a sair de sua boca, até que
finalmente parou.
— Veneno. O filho da puta tomou veneno antes de vir aqui —
disse Nero enraivecido.
Que merda era essa? O cara tirou a própria vida a troco de quê?
Todos estávamos atônitos com o que presenciamos. As coisas
pareciam cada vez mais fora de controle. Existia um movimento que
esperava tirar Eduardo do poder. Eu me lembrei do que Sophia
DeLucca disse, que eu cairia. Era algo que eu não deveria me
esquecer de comentar com Eduardo.
— Deixe-me ver a foto, Giulia — disse de repente meu pai.
Eu mostrei a foto para ele e vi a dor brilhar em seu rosto.
— Esses brincos tem GPS. Eu dei um par para cada uma de
vocês, era uma forma de manter vocês seguras, caso algo
acontecesse.
Milena, de repente, preocupou-se, segurando seus próprios
brincos. Eram esmeraldas, papai comprou similares para nós três.
Eu só nunca soube sobre os rastreadores. Era, de longe, a joia mais
linda que tínhamos, então usávamos na maioria das recepções e
eventos. O olhar de horror de Milena teria me feito rir, se não fosse a
situação.
— Existe mais algum objeto que usa para nos rastrear? —
perguntou Milena.
— Essa é uma informação que não vou compartilhar, Milena —
Meu pai deu um olhar conhecedor à ela.
Sabendo a exata localização de Isabella, não foi difícil nos
antecipar ao que fosse que os russos estivessem planejando. A
mensagem dizia que eu deveria me encontrar com senhor sem
nome às treze horas. Era sete da manhã quando saímos.
Ao que tudo indicava, a localização era um prédio abandonado na
saída da cidade. Alguns dos soldados de Elite foram na frente para
fazer o reconhecimento do território. O bairro era abandonado, o
tempo que ficamos ali não vimos uma pessoa pelos arredores.
Paramos a algumas quadras de onde era o local, aguardando
informações. Tudo o que poderíamos fazer, por enquanto, era
esperar.
Capítulo 14
Após trinta minutos, já tínhamos atiradores alinhados em todos os
ângulos possíveis. Segundo Nero, não havia muitas pessoas
fazendo a guarda, o que foi um erro. Ele subestimou a minha
esposa e iria pagar com a vida. Nero deu o sinal que era hora de
invadir.
— Nem pense nisso.
— Giulia, por favor...
— Eu vou entrar aí, eu fui preparada para isso, Eduardo. Eu não
te contei para que você fizesse o trabalho por mim, eu te contei para
que fizéssemos juntos. Você também tem que confiar em mim.
Eu confiava. Eu só não queria perdê-la. Mesmo a contragosto,
concordei com ela.
— Mas você não saia da minha vista. Esse é o acordo — Minha
voz soou firme, ela estreitou os olhos, teimosa até a medula, mas
concordou.
Aproximamo-nos do prédio e os soldados foram abrindo caminho
o mais silenciosamente possível. Eram assassinos treinados. Na
entrada, vi dois corpos e, à medida entrávamos, mais corpos caídos
sem um só som de tiro. Giovanni e Milena entraram pelos fundos.
Ao virarmos em um corredor, dois russos estavam a postos,
deveria ser o lugar onde Isabella estaria. Antes que eu pudesse
pensar, Giulia se aproximou do primeiro, enquanto eu ia para o
segundo. Tiro, mesmo com silenciador, estava fora de questão,
então foi no corpo a corpo. Pelo canto do olho, vi que Giulia dava
conta do russo, claro que ela dava conta, eu já tinha a visto em
ação. Eu peguei o russo pelo pescoço e o bati na parede oposta por
três vezes. Foi o suficiente para ele ficar inconsciente. Julia tinha o
russo imobilizado no chão enquanto o asfixiava. Cheguei mais perto
e chutei a cara do infeliz.
Dentro da sala, pudemos ouvir vozes abafadas
— Depois que tudo isso acabar, você não voltará para sua família,
Shchenok. Você é o meu cachorrinho, minha, pra brincar. Eu só
gostaria de ter mais tempo agora. Mas logo teremos sua irmã e eu
deixarei você se despedir dela. Para que você saiba que eu não sou
tão malvado assim.
— Eu deveria sentir o quê? Medo? — Essa era a voz doce de
Isabella.
Eu tinha que saber sobre isso, a garota não tinha medo.
Escutamos o barulho de um golpe. O filho da puta estava batendo
na minha cunhada. Senti que Giulia ficou tensa ao meu lado e
segurei a sua mão firme, arrisquei uma olhada de onde eu estava.
Isabella sorria com o canto da boca escorrendo sangue. Ela não
movia um músculo. Ela estava amarrada em uma cadeira, enquanto
o russo estava a sua frente.
Mas o que me assustou mesmo foi o olhar do russo. Ele estava
entre frustrado e fascinado.
— Quanto você aguentaria, hein, Shchenok? Quanto eu poderia
fazer até que você gritasse para que eu parasse? Eu vou amar cada
segundo até quebrar você. Em todos os sentidos.
— Boa sorte com isso — Ela disse no mesmo tom.
Ele estava pronto para dar-lhe outro golpe quando o som de tiros
eclodiu. O russo se pôs de pé com os olhos assustados e deu sinal
para que o outro fosse verificar.
— Parece que temos companhia. Sua irmã, pelo jeito, não se
importa tanto com você ou não teria sido burra o suficiente de tentar
te resgatar. Eu a mato e levo você para mim. De todo o jeito, o
resultado é o mesmo, você comigo.
— Quer que eu te dê os parabéns?
Ele a puxou da cadeira com brutalidade, mas Isabella nem piscou.
Foi aí que percebi que Giulia também tinha visto. Em um impulso,
ela saiu de trás de mim e se jogou à frente, se pondo à vista.
Deveríamos esperar o sinal de Nero que tudo estava pronto, mas
Giulia não conseguiu segurar-se.
— Tire as mãos imundas da minha irmã, o único que vai morrer
hoje aqui é você — Giulia tinha uma arma nas mãos. O russo
colocou Isabella em sua frente e apontou a arma para ela, se
encaminhando para as escadas que dava para o telhado.
— Ora, ora. Se não é o casal do momento. Desculpe atrapalhar a
lua de mel de vocês, mas você sabe, né, negócios são negócios.
— Entregue Isabella — Minha voz era cortante.
— Sabe, eu vou fazer melhor, eu queria uma troca, mas acho que
vou ficar com essa belezinha aqui. Vai ser um prazer domesticá-la
— Seu sorriso era maníaco. — Giulia, Giulia, achei que a gente
tinha um combinado.
— Vá para o inferno — latiu Giulia.
Do lado de fora, ainda ouvia-se o som de disparos.
Nesse momento, apareceram Nero, Milena e Giovanni. Milena, de
longe, atirou no braço do russo, que já estava terminando de subir
as escadas. Ele jogou Isabella escada abaixo e Giulia correu para
segurar a irmã. Ele aproveitou para tentar escapar. Eu aproveitei a
comoção e o segui escada acima, ouvindo a troca de disparos que
acontecia na parte de baixo, o encontrei a caminho de um
helicóptero que se preparava para pousar no telhado do prédio. De
longe, fiz alguns disparos e acertei a sua perna. Aproveitando que
ele vacilou, eu corri mais. Chegando perto, eu mirei em sua cabeça.
— Quem está facilitando a sua entrada em meu território?
—Essa é a melhor parte. Eu vou deixar você descobrir sozinho —
Sua risada era maníaca, mas tudo que fez foi inflamar mais a minha
raiva. Atirei em sua outra perna e ele gritou, rindo mais.
— Quem está te ajudando? — disse entredentes.
— Vocês, italianos estúpidos, protegem quem não deveriam. Eu
vou encontrar o menino Ivanov, e eu vou matá-lo junto com todos
vocês.
Menino Ivanov? Do que ele estava falando? Eu ia atirar
novamente para ter mais informações, quando uma chuva de
disparos veio em minha direção e eu corri para me proteger atrás de
uma mureta. Os disparos vieram do helicóptero e alguns russos
vieram pegá-lo, enquanto os outros davam cobertura. Do outro lado,
Nero e Giovanni, com outros soldados, me davam cobertura. Antes
que ele se fosse, ainda escutei seu grito.
— Meu nome é Dimitri Nikolai, Eduardo Santorelli. Você ainda vai
ouvir falar muito sobre mim. Eu vou voltar para pegar o meu pet e
para acabar de vez com a semente maldita dos Ivanovs — Ele se foi
com sua risada insana.
Uma chuva de disparos veio em minha direção e eu corri para me
proteger atrás de uma mureta. Os disparos vieram do helicóptero e
alguns russos vieram pegá-lo, enquanto outros davam cobertura. Do
outro lado, Nero e Giovanni com outros soldados me davam
cobertura. Antes que ele se fosse, ainda escutei seu grito.
— Meu nome é Dimitri Nikolai, Eduardo Santorelli. Você ainda vai
ouvir falar muito sobre mim. Eu vou voltar para pegar o meu pet.
Seremos família — Ele se foi com sua risada insana.
Quando me levantei, senti algo molhado em minha camisa. Olhei
e ela estava vermelha. Tudo foi ficando escuro, eu lutava para
manter a consciência, mas estava difícil. Senti ser amparado por
Nero.
Senti o aroma de Giulia me banhar.
Escutei o seu choro e desespero.
Eu queria dizer a ela que estava tudo bem, que tudo ficaria bem.
Eu não queria que ela chorasse assim, mas tudo que eu vi foi
escuridão.
Capítulo 15
Bip Bip Bip.
Foi tudo o que escutei nos últimos três dias.
O aroma do antisséptico hospitalar também estava ali.
Uma constante.
Eu não deixei ninguém entrar.
Eu não deixei ninguém se aproximar do seu leito.
Nero disse que o hospital estava cercado, que nada aconteceria,
mas eu não sairia daqui. Minha arma estava comigo, eu não
hesitaria em atirar em quem fosse.
Traidores.
Eu caçaria cada um deles.
Dei a informação a Giovanni e Nero sobre a ameaça de Sophia
DeLucca. Giovanni prendeu Elano DeLucca e, por Isabella,
descobrimos que ela foi drogada ainda no casamento. Sophia tinha
drogado sua bebida e, por isso, ela não conseguiu reagir. Segundo
ele, Sophia não pagaria pelo que fez com minha irmã, praticamente
dando-lhe de bandeja para o russo. Elano ficaria preso até que
Eduardo acordasse.
Meu Eduardo.
A bala atingiu o baço. Segundo o médico, foi por muito pouco que
eles conseguiram conter a hemorragia. A sedação foi retirada e a
qualquer momento ele acordaria.
Que maravilhosa lua de mel.
Isabella e Milena entraram pela porta, Bella, com o punho
enfaixado. Com a queda, ela fraturou o pulso e seu rosto ainda
levava as marcas que aquele monstro fez. Aquele homem. Aquele
maldito marcou minha irmã a ferro. Ele a marcou, como se marca
um animal, a palavra filhote em russo, shchenok, nas costas dela.
Pelo menos, ele não a estuprou, acredito que não fez porque não
deu tempo. E isso só alimentava minha raiva de Sophia DeLucca.
Se não fosse ela, minha irmã jamais teria sido levada.
Giovanni conseguiu informações sobre Dimitri Nikolai, ele é um
louco que tem um harém de escravas sexuais, todas marcadas e
tratadas como sua propriedade. Ele matou o pai, Ivan Nikolai, antigo
Pakhan, para ficar no poder. Ele achava que minha irmã seria mais
uma escrava dele. Ele prometeu voltar por ela, todos escutaram.
Mas nós estaríamos esperando por ele.
— Você precisa descansar, Giulia. Ele está bem, vai ficar tudo
bem — disse Milena com suavidade.
— Não começa — Eu disse. Até minha voz estava cansada. Eu
deveria estar horrível, mas isso não me importava agora.
— Eu trouxe um café tentação, aquele que você provou e gostou
— disse Isabella.
Foi meu ponto de ruptura. Eu tampei meu rosto com as mãos e
chorei. Minhas irmãs se aproximaram e me abraçaram e eu chorei
mais. Chorei por quase ter perdido minha irmã, chorei por quase
perder o meu marido, chorei pelos dias e noites sem dormir, chorei
por estar nesse hospital quando tudo que eu queria era estar com
meu marido, curtindo a nossa casa, a nossa nova vida.
— Descobri que o que eu mais odeio nesse mundo é ver você
chorar.
Levantei a cabeça em um salto. Eu estava de calça legging e um
moletom enorme. Meu cabelo estava preso no alto da minha
cabeça, uma bagunça, e meu rosto estava inchado de chorar. Eu
não me importei e me aproximei de Eduardo. Ele ainda estava
pálido pela perda de sangue e sua voz tinha saído um pouco rouca.
Ao olhar seus olhos escuros focados nos meus, eu chorei mais
ainda. Embalei seu rosto com as minhas mãos e chorei ao seu lado.
Ouvi a porta se fechando, minhas irmãs tinham saído da sala.
— Não chore, principessa. Shii, não chore — Ele segurou minhas
mãos nas suas. — Eu não mereço suas lágrimas.
Eu explodi:
— Cala a sua boca. Você merece tudo, Eduardo. Eu não quero
mais ouvir isso saindo da sua boca, nunca mais. Cansei disso —
falei com a voz chorosa.
— Você está brigando comigo? — Ele parecia divertido. Eu revirei
os olhos, ainda fungando.
— Estou, você está me transformando em uma mulherzinha
chorona — Ele soltou uma risada e logo fez uma careta de dor.
Olhando para ele, me senti um pouco culpada por estar falando
nesse tom. — Como você está? — disse mais suavemente, me
inclinando sobre a cama.
— Eu estou bem.
— Tem certeza? Milena e Isabella foram chamar o médico.
— Eu tenho certeza, principessa.
— Você não deveria me chamar assim quando está em uma
cama, vulnerável — Eu disse em tom de brincadeira e comecei a
dar beijinhos em seu rosto. — Você sabe, eu posso começar a te
chamar de fofuxo na frente dos seus soldados.
— Aahh, isso de novo, não — Eduardo disse com uma careta,
agora de desgosto.
Enquanto eu ria, o médico entrou para fazer a avaliação. Eu me
levantei ainda segurando o riso. O médico fez a avaliação com os
olhos atentos em mim. Acho que eu o assustei não deixando
ninguém entrar no quarto além dele e da enfermagem. Eduardo
assinaria um termo para ficar em casa, segundo ele, era mais
seguro. Eu não concordei, mas devido a tudo o que estava
acontecendo, talvez fosse o melhor. Eu estava aliviada que Eduardo
estava bem, mas todo o ocorrido e o meu cansaço me impediram de
discutir. Quando o médico saiu, Eduardo me questionou.
— O que você fez para o médico? — perguntou Eduardo
desconfiado.
— Eu? Nada — respondi desentendida.
— Ela aterrorizou todo o hospital. Só isso — disse Giovanni
entrando no quarto. — Será que agora eu posso entrar? — Eu
revirei os olhos. Ele se virou para Eduardo. — Acho que você não
precisa de segurança, sua esposa não deixou ninguém entrar para
te visitar. Nem mesmo eu.
— Ficou aqui o tempo todo? — Eu não respondi, e ele estreitou
os olhos. Eduardo resmungou alguma coisa que eu não me esforcei
para entender, era certamente uma reprimenda e logo disse mais
alto. — Como estão as coisas? Isabella?
A única coisa que ouvimos foi o silêncio. Meus olhos voltaram a
ficar marejados com a lembrança do que minha irmã passou.
— Dimitri Nikolai é o novo Pakhan da Bratva. Ele matou o pai e
declarou guerra aberta contra a Cosa Nostra. Sabemos que os
DeLucca estão envolvidos de alguma forma. Elano está preso,
aguardando suas ordens. Sophia drogou a bebida de Isabella ainda
na festa de casamento. Ela, praticamente, a entregou de bandeja
para Dimitri. Ele é um sádico da pior espécie, tem um harém de
escravas sexuais e está muito envolvido com prostituição e tráfico
humano. Ele… marca as suas meninas…
— Ele marcou a minha irmã, Eduardo! Com. Ferro. Quente. Como
se marca um animal. Ele acha que minha irmã é dele. Ele voltou a
ameaçá-la, eu quero esse homem morto! — Minha voz transparecia
toda a minha raiva.
O olhar de Eduardo era letal.
— Eu deveria tê-lo matado quando tive a chance — Ele apertou
minha mão. — Escute, Giulia. Eu não vou deixá-lo chegar perto de
vocês. Quando ele voltar, eu estarei esperando.
— Isabella age como se não fosse nada. Ela não demonstra
nada, trata como se fosse qualquer ferida. Minha mãe está
transtornada, meu pai queria marchar com Milena para caçar e
matar o maldito. Enquanto ele viver, ele será uma ameaça.
— Nós vamos matá-lo. Não tenha dúvidas disso — Sua voz foi
firme e aplacou um pouco da minha fúria. — Também quero falar
sobre algo que Dimitri disse um pouco antes dos disparos, naquele
dia. Ele disse que estávamos protegendo um Ivanov. Eu não sei o
que ele quis dizer com isso.
— Ivanov? Da Família Ivanov, da Bratva? Não morreram todos,
anos atrás? — questionou Giovanni.
Eu fiquei pálida.
Esse nome.
Eu ouvi esse nome.
Meu Deus, meu pai estava envolvido no que quer que fosse essa
confusão. Eu me lembro, nitidamente, da minha mãe perguntando
do menino Ivanov e meu pai afirmando que ele estava seguro.
— Se há um Ivanov vivo, o reinado dos Nikolai está em risco. Por
que ele nos culparia disso? Se bem que, não seria ruim tirar aqueles
loucos do controle da Bratva. Talvez a gente procure esse Ivanov e
nos alie a ele, seria uma forma de vencer a Bratva.
Estavam alheios ao meu desespero. Eu tinha que ser leal, leal a
causa acima de tudo. Eu tinha que contar a Eduardo, talvez não
fosse nada, mas eu não queria pensar nas consequências que
poderia ter na vida do meu pai.
Enquanto Giovanni e Eduardo continuavam conversando, eu me
detive em silêncio. Eu precisava pensar sobre o que fazer.
Não muito tempo depois, estávamos indo para casa. Não foi como
imaginei passar minhas primeiras horas na casa nova, mas assim
eram os fatos. Acomodei Eduardo, dei os seus remédios e tomei um
banho. Por causa dos analgésicos, Eduardo dormiu e eu chamei
Giovanni.
— Você pode ficar com ele por algumas horas?
— Claro. Você precisa de alguma coisa?
— Só fique com ele, Giovanni. Logo estarei de volta.
Ele arqueou as sobrancelhas, mas não me questionou. Quando
desci, Isabella e Milena já me esperavam no carro.
— Prontas? — Eu disse.
— Mais que prontas — respondeu Milena.

— O que você está fazendo comigo? Eu sou a filha de um


Caporigeme. Eu mereço mais respeito, é contra a política da Cosa
Nostra torturar mulheres membros.
Ali, naquele barracão isolado da sociedade, nossos soldados
capturaram Sophia DeLucca com a ajuda de Nero. Antes, eu só
desconfiava, mas agora eu tinha certeza, ela sabia o que estava
prestes a acontecer, ela não só sabia como estava participando da
conspiração. Ela drogou minha irmã.
Ali, sentada naquela cadeira, amarrada e vendada, eu só
conseguia sentir raiva. Ela participou de uma conspiração que
machucou minha irmã e quase matou o meu marido. Ela mexeu
com a pessoa errada.
— Me tirem daqui! Agora!
Eu sorri. Aproximei-me dela e tirei a venda de seus olhos.
— Você — Seus olhos estavam arregalados, a voz era baixa e
saiu tremida.
— Quem você esperava, hein? Algum salvador? Quem vai poder
te salvar agora, Sophia? Os russos?
— Eu não sei do que você está falando — Ela respondeu rápido
demais.
— Ah, Sophia, se você não tivesse me abordado com todo aquele
desdém, eu jamais desconfiaria de você. Sabe por quê? Até aquele
dia, eu mal sabia da sua existência. Você e nada para mim eram a
mesma coisa. Mas, então, você decidiu machucar pessoas que eu
amo. E esse foi o seu pior erro.
Ela se encolheu levemente.
— O que você vai fazer comigo? Vocês não podem me machucar
sem a autorização do Don — Ela estava quase histérica.
— Pode deixar que com o meu marido eu me entendo.
— Você é uma louca. Eu não fiz nada, nada — Ela estava quase
chorando.
— Isabella. Faça as honras.
Ela olhou minha irmã se aproximar com um punho enfaixado,
miúda para dezoito anos, com seus cabelos claros e grandes olhos
azuis. Ela parecia inofensiva assim. Isabella parou a uma distância e
a encarou com um sorriso. Sophia a encarou com superioridade e
começou a falar:
— Queridinha, você está cometendo um er... — Ela parou com um
chiado. Isabella jogou uma adaga que lhe acertou o ombro, ficando
ali. — Filha da puta! — Ela gritou.
— Se não parar de falar, eu vou cortar a sua língua. Sua voz é tão
irritante! — A voz de Isabella não mudou em momento algum. —
Agora, vamos ver — Ela se aproximou e estancou uma adaga na
perna de Sophia, que gritou de dor. — Eu estava aqui pensando nas
coisas que o russo fez comigo, que, claro, ele conseguiu porque a
sua família colaborou para que ele conseguisse. Sem contar que
você drogou a minha bebida. Eu acho que isso vai contra o código
de garotas...
— Ele deveria ter te matado, sua louca.
— Você vai precisar ser mais criativa se quiser arrancar alguma
reação de mim — Isabella não alterava o tom e não tirava o sorriso
do rosto. — Um corte aqui, em homenagem aos golpes que recebi
no rosto — Quando ela começou a cortar seu rosto com uma faca e
Sophia gritou de dor, eu resolvi que, para mim, já era suficiente.
Virei-me e Milena me seguiu. Ao chegar à porta, percebi que Nero
observava a minha irmã. Dei mais uma olhada e agora Isabella
estava atrás de Sophia, de frente para nós e, mesmo com o punho
machucado, ela segurou os cabelos de Sophia para mantê-la no
lugar e com a outra mão cortava o contorno do rosto dela. — Eu
poderia marcar suas costas também, o que você acha? Com ferro
quente. Igual aquele russo fez comigo, assim poderíamos ser irmãs
de marcas, hum?
— Por favor, não faça isso comigo, me desculpa. — Sophia
implorava. Com a cabeça inclinada para trás, o sangue lavava seu
rosto.
— Ops, acho que vai doer um pouco — Isabella puxou o cabelo
com mais força e então soltou.
Quando ela pegou o ferro quente, eu me virei. Milena já estava na
minha frente, mas Nero continuou olhando firme.
Minha irmã poderia ser perturbadora até mesmo para mim, mas
Nero continuou com o olhar firme.
— Você pode esperar lá fora — Eu disse. Talvez ele se sentisse
na obrigação de estar ali.
— Eu vou ficar aqui com ela — Ele disse ainda olhando fixamente
para frente. — Ele a marcou? — Seu tom tinha ódio puro. Meu
coração também se apertou e eu empurrei as lágrimas. Nos fundos,
os gritos de Sophia ecoavam seguidos pela doce voz de Isabella,
que conversava casualmente.
— Não comente com ninguém, por favor. Já tem gente suficiente
sabendo disso.
Nero assentiu, mas não disse nada. Sua mandíbula estava
trincada e notei um tremor passar pelo seu corpo. Nero era enorme,
alguns centímetros maior que Giovanni e Eduardo. Raiva pura
passava por ele.
— Tem certeza que quer ficar aqui?
— Eu vou ficar com ela até o final.
— Ok. Vou aguardar vocês lá fora.
Poderia ser impressão minha, mas o grandalhão se importava
com a minha irmã. Eu só não sabia a real natureza desse
sentimento, se era admiração e amizade ou algo mais.
Eu poderia ver e até mesmo fazer crueldades com algumas
pessoas, dependendo das circunstâncias, fomos treinadas para
isso. Mas não vou mentir que era algo que eu sentia prazer e se eu
pudesse evitar, evitava. Mas com Isabella era outro nível. Sempre
foi assim, ela era feita a partir de um molde único, silenciosa e
mortal. Assim era a minha irmãzinha.
Capítulo 16
— Elas mataram Sophia DeLucca — Giovanni disse entrando no
meu quarto.
— Quem? — Eu ainda estava um pouco sonolento.
— Sua esposa e suas cunhadas.
Eu suspirei. A Cosa Nostra não usava tortura contra as mulheres.
— Mas, especificamente, quem matou foi a Isabella. Mas as
outras facilitaram e Nero também. Segundo ele, ela fez um estrago.
— Nero está ciente das regras. Mas, nesse caso, vou deixar
passar, se a menina queria uma vingança eu não ficarei no caminho
dela.
— Elano DeLucca está preso.
Eu suspirei novamente. Estava cansado, estava esgotado com
tudo o que tinha acontecido. Eu iria deixar as coisas um pouco na
responsabilidade de Giovanni e Nero, tiraria um tempo com Giulia.
Depois de todo esse inferno, não tivemos um só dia de paz. Eu
queria passar um tempo com ela, porque, de fato, merecíamos.
— Eu vou deixar isso em suas mãos e de Nero. Vou passar uma
semana na Itália junto com Giulia. Talvez não seja o melhor
momento, mas, depois de tudo, acredito que precisamos. Eu confio
em vocês para manter tudo em ordem.
Giovanni pareceu surpreso, mas não comentou nada, apenas
concordou.
Muito mais tarde nesse dia, Giulia entrou com uma bandeja, o
meu jantar, e se sentou ao meu lado. Ela se acomodou e agiu como
uma mãe galinha até me fazer comer tudo o que tinha no prato.
Quando terminei, esperei para ver se ela me contaria o que
aconteceu. Ao notar o meu olhar, ela desviou os seus.
— Você já sabe.
— Quero ouvir de você.
— Ok. Isabella matou aquela ordinária. Milena e eu ajudamos.
Mas a responsabilidade total é minha. Ninguém machuca minha
irmã e sai impune.
Eu queria rir do seu jeito protetor, mas provavelmente ela me
acertaria. Mantive a fachada séria.
— Você deveria ter me consultado antes.
— Se fosse sua irmã? Você pediria autorização a alguém?
— Não é essa a questão, Giulia. Eu não sou alguém. Eu sou o
seu marido e, por acaso, também sou o Don. Se você não me
respeita como tal, meus soldados vão achar que podem fazer o
mesmo.
Ela desviou o olhar, os olhos marejados. Eu não queria começar
uma briga, eu só queria que ela entendesse.
— Eu não quero que pareça fraco ou te prejudicar de alguma
forma. Só quero que entenda que estamos falando da minha irmã. E
quando se tratar das pessoas que eu amo, eu não vou hesitar em
fazer o que eu acho certo.
Suspirei.
— Venha aqui — Ela se aproximou com cautela, deitou-se ao meu
lado e eu a abracei. — Têm sido muito os últimos dias. Em alguns
dias, faremos uma viagem, eu e você. Passaremos alguns dias na
Itália, será a nossa lua de mel.
— Tem certeza que é um bom momento?
— Não teremos um bom momento tão cedo, principessa. Mas nós
merecemos. Depois vamos dar um jeito de lidar com tudo isso.
Passamos um bom tempo assim, abraçados.
— Tem algo que eu preciso falar com você — Meu corpo
tencionou.
— Diga — disse sem soltá-la. Ela pareceu querer sair do meu
abraço, mas não permiti. Depois de alguns segundo, ela finalmente
disse.
— Quando eu tinha por volta de dez anos, eu escutei uma
conversa entre meus pais. Eles estavam conversando sobre o meu
treinamento — Ela parou.
— Diga, principessa — Ela levantou com os olhos marejados e eu
estava muito confuso.
— Prometa-me. Prometa-me não prejudicar meu pai.
Isso me alarmou. Por que eu prejudicaria Enrico? Ele era um bom
Sottocapo.
— Não sei porque está me pedindo isso, Giulia, mas me diga de
uma vez.
Eu não poderia prometer algo que eu não fazia ideia do que era.
Por que ela me pediria isso?
— Diga, Giulia.
— Meu pai… meu pai falou sobre um menino Ivanov estar seguro.
Mamãe disse que ele morreria por isso, mas ele disse que salvaria
uma geração.
As peças estavam se encaixando. Então nós tínhamos um Ivanov
em nosso meio e meu sogro estava diretamente ligado a esse fato.
— Cara, preciso falar com o seu pai.
— Por favor, Eduardo, por favor, tenho certeza que meu pai teve
um bom motivo. Não machuque meu pai, eu jamais te perdoaria por
isso. Jamais.
Suas palavras machucaram meu coração, mas eu já estava
pegando meu telefone.
— Giovanni. Traga Enrico aqui. Agora.
— Eu não vou te perdoar, Eduardo, jamais — Ela se levantou e
me olhou duramente. — Eu te contei a verdade. Eu fui leal a você,
não me faça me arrepender.
Ela saiu do quarto. Eu queria garantir que tudo ficaria bem, mas
antes de qualquer coisa, eu era o Don.
Capítulo 17
Enrico entrou no quarto e eu estava acompanhado de Nero e
Giovanni. Enrico sempre foi leal e me custava ter que fazer o que
tinha que ser feito, caso ele houvesse traído a nossa causa.
— Sente-se — Eu indiquei a cadeira. Eu ainda estava na cama,
mas independentemente de qualquer coisa, não via Enrico como um
perigo. Ele tinha o meu respeito.
— Don. Espero que esteja se recuperando bem. Eu gostaria de
agradecer pelo que fez por Isabella.
— Isabella é da família — disse simplesmente. — Eu vou direto
ao ponto, Enrico. Qual é a sua ligação com o sobrevivente da
Família Ivanov?
Enrico levantou as sobrancelhas. Ele não negou o seu
envolvimento e também não afirmou. Nero levantou a arma e
apontou para meu sogro.
— O Don fez uma pergunta.
O olhar do meu sogro demorou-se em Nero. Não era um olhar de
raiva, ou de medo. Era um olhar de admiração. Finalmente, Enrico
olhou para mim.
— Eu sabia que esse dia chegaria, mas temo que não posso
revelar tudo, Don. E pela Cosa Nostra que faço isso. Principalmente,
por nossa causa. O que posso dizer é que sim, salvei o garoto
Ivanov e ele está seguro, mas ele ainda não está pronto para
enfrentar o que o espera.
— E quem decide isso, Enrico? Você? — perguntei com escárnio.
— Você poderá fazer o que quiser, Don. Eu omiti informações
importantes, sim. Eu não confiava em seu pai com essa informação.
— E pelo jeito, não confia em mim também. É um caminho
perigoso, Sottocapo.
— Pelo contrário. Acho que vocês três serão os responsáveis
para estabelecer a paz que um dia existiu, principalmente em meu
território. Mas não é o momento.
Nero olhou para mim e destravou a arma. Ele só precisava de um
aviso. Giovanni estava um pouco desconfortável. Todos tinham
admiração e apreço por Enrico, era difícil fazer esse papel.
— O que eu posso dizer é que, no tempo certo, a verdade virá à
luz. E eu vou ser o primeiro a compartilhar, eu só preciso que confie
em meu julgamento.
— E por que eu deveria, se claramente você não confia em mim?
— Não se trata de não confiar, Don. Eu sempre fui leal, e se fiz o
que fiz, foi porque estava pensando no futuro não só do garoto,
como no nosso próprio. Os Nikolai têm uma combinação perigosa:
Poder e Loucura. Um Ivanov terá todo o apoio dos anciões russos e
essa pode ser a nossa única chance.
— Ou isso colocou um alvo enorme em nossas costas — Eu
disse.
— Você acha, por um minuto, que estaríamos a salvo? Se não por
isso eles arrumariam outro motivo para nos atacar — Ele me olhou
exasperado. — Eu não vou implorar por minha vida, Don. Faça o
que tem que ser feito — Ele engoliu com dificuldade. — Só... cuide
de minha família, que agora é sua também.
Giulia.
Meu coração se apertou.
Se eu matasse o seu pai, ela jamais me perdoaria, eu estaria
condenando meu casamento ao fracasso, antes mesmo de
começar. Eu me levantei e parei em frente de seu pai.
Ele foi um bom pai, como poucos foram.
Ela é quem é graças a ele.
Por ela, somente por ela, eu faria o que estava prestes a fazer.
Parei em sua frente e disse.
— Por Giulia, Enrico. Eu vou te dar a oportunidade de conduzir
isso a sua maneira. Por ela, porque eu não vou condenar meu
casamento que nem teve a oportunidade de começar. Eu vou
confiar em você, mesmo que você não esteja confiando em mim.
Enrico não era um covarde, eu vi o alívio em seus olhos, mas ele
os manteve firme.
— Em algum momento, você terá que me dizer. Se essa situação
sair do controle, você terá que nos dizer. E se você me trair, nem
mesmo Giulia me impedirá de tirar a sua vida.
Ele assentiu e foi para a porta. Antes de sair, ele se virou:
— Me permita uma pergunta, Don. Como soube? — Ele sabia a
resposta. Ele só queria uma confirmação.
— Giulia.
Ele sorriu.
— Minha menina é leal, Don. Diga a ela que me orgulho por ela
ter te contado, por ter feito o certo acima de qualquer coisa — Ele foi
sincero. E era verdade. Giulia tinha lealdade até a medula. Eu
confiava nela a cada dia mais.
Ele saiu e eu olhei para Nero e Giovanni.
— Eu confio nele, Eduardo — disse Giovanni.
— Eu também.
Saí do quarto e olhei do alto da escada, Giulia estava abraçada
ao pai e chorava. Eu nunca vi Giulia chorar. Ali, eu entendi, eu
jamais faria Giulia chorar propositalmente.
Ela confiou em mim, mesmo sob o risco de perder o pai.
Quando se despediram, ela olhou para mim no alto da escada.
Subiu as escadas sem desviar os olhos dos meus e quando se
aproximou, disse com um soluço.
— Obrigada.
Eu segurei seu rosto em minhas mãos. Beijei seus lábios com
ternura.
— Obrigado, você, por confiar em mim.
— Eu sou sua esposa, Eduardo. Eu sempre serei leal a você.
— Eu sei, eu sei. Eu sou um sortudo filho da puta por ter você.
Entre lágrimas, ela disse:
— Sim, e teimoso também. Volta para a cama, fofuxo — disse me
empurrando para o quarto
— Ah, por favor…
Escutei a gargalhada de Giovanni e Nero.
Merda.
1 mês depois.

San Vito Lo Capo era uma comunidade Italiana na região da


Sicília, onde eu tinha uma propriedade, mas nunca tive tempo de
conhecer. Mas aqui estávamos, curtindo um pouco da nossa nova
vida. De longe, eu via Giulia, e ela procurava conchas. Para o que
exatamente eu não fazia a menor ideia, mas ela estava concentrada
e soltava um lindo sorriso toda vez que encontrava alguma, então
não me importei em perguntar a finalidade.
O sol banhava seu rosto e eu não me cansava de admirar a sua
beleza. Com uma saída de banho, os cabelos soltos, o reflexo do
mar deixava seus olhos ainda mais exóticos cada vez que me
olhava. Os dias aqui tinham sido calmos e tranquilos, mas logo
voltaremos a nossa realidade.
Milena inventou um curso de Moda em Nova Iorque, seu pai não
foi muito favorável, mas dei minha palavra de que cuidaria da
proteção dela. Logo, Isabella também ficaria, por mais que a garota
não demonstrasse, não seria bom ficar longe das irmãs. As meninas
acharam melhor ficar no apartamento dos pais, eu não via problema
em elas ficarem em casa, mas ambas acharam melhor dar
privacidade a mim e a Giulia.
Sem contar que Anita era apaixonada por todas, então
certamente estaria por lá também, sempre que fosse possível.
Giulia estava animadíssima com essa ideia, ter as irmãs por perto,
certamente, a deixava em êxtase. A minha sogra concordou com
Isabella ficar somente se ela se comprometesse a começar o
processo terapêutico. Honestamente, eu achava uma perda de
tempo. Aquela garota era o que era, terapia não a mudaria. Logo,
assim que voltássemos, meus sogros voltariam para Filadélfia.
Segundo eles, eu me casei com uma, mas ele perdeu as três. Era
uma brincadeira, mas eu pude ver que eles estavam sentidos. Em
uma conversa com meu sogro, ele me disse sobre a preocupação
de deixar Isabella em seu território, por fazer fronteira com a Bratva.
A verdade é que o que aconteceu com Isabella assustou toda a
família e o melhor lugar para ela ficar era em Nova Iorque. Eu
prometi cuidar de ambas.
Giulia se aproximou.
— Esse lugar é um paraíso na Terra.
— Que bom que você gostou, principessa — Ela me olhou por
alguns segundos, então suspirou. — Não vai brigar comigo? — Eu
me aproximei e beijei seu pescoço.
— Eu já desisti de brigar por isso. Se quiser que eu seja uma
princesa, eu posso me esforçar por você.
Não resisti e sorri com ela. Essa garota, ela me deixou sem
palavras no primeiro segundo, ela deu a minha vida um novo
significado e, com ela, eu tinha muito mais do que merecia.
Eu não falava mais isso em voz alta.
Ela me acertaria, e Deus sabe que ela tem capacidade para me
acertar. Mas eu tenho plena consciência, ela é muito mais do que eu
mereço, e eu sempre valorizaria o amor que ela me dava tão
livremente.
Em um movimento, eu a deitei na areia e cobri o seu corpo com o
meu, tendo o pôr do sol da Sicília e o mar como testemunha da
devoção que eu tenho por essa mulher.
Epílogo

8 meses depois

Olhei mais uma vez para ter certeza.


Duas listras.
Era o meu quinto teste em dois dias.
Hoje era o aniversário de Anita e faríamos uma festa para a
pequena. Os meses após o nosso casamento foram estranhamente
calmos, sem mais ameaças ou atentados. Após a retaliação da
família DeLucca e outros soldados envolvidos, tudo se acalmou.
Embora Nero não estivesse convencido de que tinha acabado, nada
suspeito voltou a acontecer. A segurança ainda estava acirrada.
Mas convenci Eduardo a colocar Anita em uma escola presencial.
No início, ele foi relutante, mas consegui convencê-lo ao fazer com
que ele assistisse a vários vídeos de psicopedagogos, ressaltando a
importância das crianças conviverem com outras crianças de sua
idade. Ele acabou por concordar comigo e a pequena não cabia em
si de felicidade.
Milena e Isabella estavam em Nova Iorque e eu estava amando
ter minhas irmãs comigo. Isabella estava fazendo terapia e entrou
em um projeto social de ballet para crianças carentes. Eu não acho
que ela estava fazendo por ela ou sentia a importância desse
trabalho. Um dia, ela veio jantar após a terapia e simplesmente
disse que a terapeuta indicou e ela aceitou. Não que ela fizesse de
mau gosto, ela só era indiferente a tudo que fazia. Sem emoção.
Nero virou sua sombra. Embora eu não visse tantos diálogos entre
os dois, ele sempre estava à frente da proteção da minha irmã. Ele
tinha o mesmo medo que o nosso, que algo poderia acontecer com
ela, que Dimitri poderia voltar e levá-la de nós, para ele, ficou
pessoal e eu, às vezes, me perguntava o porquê, embora fosse
muito agradecida por ele sempre saber onde ela estava e com
quem.
Milena estava envolvida no seu curso de Moda e em mais alguma
coisa. Ela estava sempre sumida, às vezes dormia fora do
apartamento, ela sempre me avisava quando isso acontecia para
que ficássemos mais atentas a Isabella. Ela, às vezes, ficava
pensativa, quase como se estivesse apaixonada, mas quando
brinquei com isso uma vez, e ela negou e negou. Pareceu
assustada com a possibilidade. Eu só pedia sempre para que ela
tomasse cuidado com o que quer que fosse que ela estivesse
fazendo e com quem.
Papai vinha a cada quinze dias para Nova Iorque, ele queria
Isabella com ele, mas até mesmo ele sabia que ela estava mais
protegida aqui, que nós três sempre nos protegemos bem e que a
Filadélfia fazia fronteira com o território da Bratva. Ele poderia não
concordar, mas ele sabia que era o melhor.
Com um sobressalto, senti o calor do corpo de Eduardo atrás de
mim. Tentei esconder os testes, mas ele já estava me virando para
ele. Merda, eu gostaria de fazer uma surpresa, como eu não o ouvi
se aproximando? Tentei esconder os testes mesmo assim quando vi
seu cenho franzido.
— O que você está escondendo? — Ele deu um sorriso leve.
Eu tentei soar impassível.
— Nada.
Nós tínhamos algumas disputas que terminavam em sexo, então
ele entendeu que eu queria brincar. Ele segurou minhas mãos e,
quando sentiu os pauzinhos, empalideceu. Eu soltei um pouco
incerta, um pouco nervosa, enquanto ele olhava os testes.
— Eu queria fazer uma surpresa — disse um pouco sem graça.
Ele olhou os testes, então olhou para mim, seu rosto era pura
emoção. Meus olhos marejaram. Ele estava um pouco em choque e
eu já estava ficando preocupada quando ele me puxou para um
beijo, não se importando que eu tivesse acabado de passar a
maquiagem e faltava pouco para a festa. Ele me absorveu em um
beijo que eu senti na minha alma. Ele me sentou na bancada e
olhou para o meu ventre ainda plano. Então ele se inclinou e o
beijou. Eu fechei os olhos em uma miríade de emoções. Ele
levantou meu vestido e ficou ali me olhando, como se pudesse ver
através de mim.
— Amor, ainda não dá para ver nada aí.
Ele olhou para cima, em meus olhos.
— Obrigado, Giulia. Você me fez completo quando eu não era
nada antes de você — Sua voz escorria emoção.
— Você sempre foi tudo para mim, meu amor. Desde o início.
Suas mãos esbarraram na minha calcinha e o ar em nossa volta
mudou. Seu olhar foi de maravilhado para turbulento. Ainda com os
olhos em mim, ele pressionou a mão em meu clitóris e eu soltei um
suspiro. Ele apertou mais uma vez e eu comecei a ficar molhada.
Em um movimento só, ele me pôs em pé e tirou a minha calcinha,
desabotoou a sua calça e começou a bombear o seu pau, minha
boca ficou seca com a visão. Ele me sentou no balcão novamente e
me pôs na borda, entrando em mim com uma estocada poderosa.
Ele parou ali, olhando em meus olhos, e não se mexeu por uns bons
segundos.
— Eu te amo… — Ele suspirou, e então começou a se mover.
Entre nós, sempre foi agridoce, entre o doce e o azedo. Eduardo
alternava entre uma estocada forte e uma mais lenta e isso estava
me matando. Eu puxei as lapelas do seu colete e falei em seu
ouvido:
— Mais forte.
Mordi o lóbulo da sua orelha e ele apertava as bochechas da
minha bunda, estocando com força. O movimento era cru, o som do
choque entre os nossos corpos e nossos gemidos inundava o
banheiro, meu orgasmo me desfez em uma poça, seguida pelo
rugido de Eduardo. Ficamos ali, suados e ofegantes, respirando o
mesmo ar, curtindo a sensação que eu sabia que só sentiria com
ele.
A festa foi maravilhosa. Chamamos alguns amiguinhos de Anita
da escola, apesar de Nero não ser muito de acordo, conseguimos
convencê-lo. Meus pais estavam presentes, Giovanni e minhas
irmãs, e claro, por pura educação, Lorenzo.
Eu já não gostava desse homem antes, mas depois de Eduardo
me contar os horrores que passou com ele e o que ela fazia com
sua esposa, eu senti mais raiva ainda.
Anita estava cada dia mais alegre e parecida com uma criança de,
agora, onze anos. Ainda sentia a diferença com a presença de seu
pai, mas saber que agora ela estava protegida lhe deu mais
confiança de rir com vontade do que tinha vontade.
Essa noite, apesar de toda a alegria com a festa, o clima estava
estranho. Lorenzo estava com um sorriso no rosto que estava me
irritando e Milena estava tensa. Ela e Giovanni viviam trocando
farpas, mas hoje ela ignorou todas as tentativas dele.
Quando todos os convidados, por fim, foram embora e só ficaram
meus pais, minhas irmãs, Giovanni, Nero e Lorenzo, resolvemos
que daríamos a notícia.
— Família, temos um comunicado a fazer. Seremos pais.
A comoção foi geral. Recebi abraços sinceros de todos, minha
mãe estava saltando de alegria, Milena sorriu pela primeira vez na
noite. Eduardo recebeu apertos de mão e Giovanni, sendo mais
corajoso, me envolveu em um abraço de parabéns e pegou uma
bebida para comemorar. Lorenzo tinha um brilho nos olhos, por
mim, eu nem o teria convidado, mas como algumas pessoas da
Família estariam presentes, não tivemos muita opção. Algumas
tradições não deveriam ser mudadas.
— Eu também gostaria de fazer um anúncio. E aproveitar que
estamos todos reunidos, afinal, somos família — Lorenzo se virou
para minha irmã Milena. — Venha aqui, querida.
Milena voltou a ficar tensa. Ela também estava apagada, um
pouco pálida. A mão que segurava a taça estava levemente
tremendo. Um pânico se apossou de mim, eu não fazia ideia do que
estava acontecendo, mas, com toda a certeza do mundo, eu não iria
gostar nenhum pouco. Milena respirou fundo e se aproximou de
Lorenzo. Ele a enlaçou pela cintura e disse:
— Milena e eu estamos noivos.
Eu escutei algo se quebrar, seguido de um rugido. Olhei e
Giovanni tinha quebrado a taça em sua mão e ela sangrava. Ele
olhou ferido para minha irmã, fez menção de dizer algo, mas, fosse
o que fosse, ele desistiu, virou-se e saiu batendo a porta. O que
diabos estava acontecendo entre esses dois? Minha irmã tinha os
olhos marejados, olhou para cima, como se estivesse tentando se
controlar para não cair no choro. Quando voltou seu rosto, era
impassível.
— Milena, você sabe que não precisa fazer nada que não queira,
certo? — Essa era a voz de Eduardo. Eu ainda estava muito
assustada. Minha mãe se sentou e Isabella a amparava. Meu pai
estava controlando uma tempestade.
— Filha?
Ela finalmente olhou para meu pai.
— É verdade. Estamos noivos.
Isso estava errado. Muito errado. Isso não era Milena, algo estava
acontecendo. Olhei para Eduardo, pedindo um socorro silencioso,
ele me pediu calma com seu olhar. Lorenzo, por fim, voltou a falar
com as mãos possessivamente na cintura de Milena.
— Ninguém vai nos parabenizar?

Fim
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e impressa em papel Avena 80g. [miolo]
e em papel Cartão Supremo 250g. [capa]
pela na gráfica Forma Certa
em agosto de 2020.

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