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MICHELANGELO BOVERO
Sociedade e
Estado na
Filosofia
Política
Moderna
MM i
_ J . . _ “ “
editora brasiliense
Norberto Bobbio, um dos mais
respeitados cientistas políticos d a
a tu a lid a d e , e M ichelangelo Bovero,
interlocutor que o a com panhou em seus
principais estudos, apresentam , d e uma
form a clara e sintética, os resultados d e
um longo e primoroso estudo sobre os
principais pensadores políticos d a
m odernidade.
O roteiro desses estudos, reconstituído
através d e cursos e publicações dos
autores nas últimas duas décadas,
percorre o pensam ento d e Hobbes,
Espinosa, Locke, Rousseau, Kant, Hegel e
Marx. Sem exagero algum , Sociedade e
Estado na Filosofia Política Moderna se
estabelece com o uma referência
indispensável p a ra todos os que pensam
a política.
ISBN 85-11-12036-X
P
</)
120363
SOCIEDADE E ESTADO
NA FILOSOFIA POLÍTICA
MODERNA
NORBEKIO BOBBIO
MICHELANGELO BOVERO
SOCIEDADE E ESTADO
NA FILOSOFIA POLÍTICA
MODERNA
tradução:
Carlos Nelson Coutinho
editora brasiliense
C o p y rig h t © b y il Saggiatore, M ilão, 1979
T ítu lo original: Società e S ta to nella Filosofia
Política M o d ern a
C o p y rig h t da tradução: E ditora B rasiliense S A
N e n h u m a parte desta publicação pode ser gravada,
arm azenada em sistem a s eletrônicos, fotocopiada,
reproduzida p o r m eios m ecânicos ou o u tro s quaisquer
sem autorização prévia da editora.
IS B N : 8 5 -1 1 -1 2 0 3 6 -X
P rim eira edição, 1986
4? edição, 1994
I ? reimpressão, 1996
E D IT O R A B R A SIL IE N SE S. A .
R . Barão de Itapetininga, 93 - 11? a.
01042-908 — São P aulo — S P
F one (OU) 258-7344 — F ax 258-7923
F ilia d a à A B D R
índice
PR IM E IR A PA RTE
O modelo jusnaturalisgà
Norberto Bobbio
SEGU ND A PA RTE
O modelo hegelo-marxiano
Michelangelo Bovero
(2 ) Ib id ., p . 7.
( 3 ) “II modello giusnaturalistico", in Rivista Internazionale di Filosofia dei
D iritto, 1973, p p . 603-22; e tam bém in La form azione storica dei d iritto m oderno in
E u ro p a (A tas do terceiro congresso internacional da Sociedade Italiana de História
do Direito), Florença, Olschki, 1977, p p . 73-93.
10 N O R B ER T O BOBBIO
N orberto Bobbio
P R IM E I R A P A R T E
O modelo jusnaturalista
N o rb e rto B o b b io
O caráter do jusnaturalismo
ce (alude à ciência m oral o u “science des m oeurs”, com o ele a ch am a] q u i devoit être
la grande affaire des hom m es, et 1'objet de toutes leurs recherches, se trouve de tous
tem ps extrém em ent negligée. Nessas poucas linhas, está contido o tem a fund am en tal
d a escola do direito n a tu ra l e o p ro g ram a que a caracterizou p o r dois séculos.
(5) Já em su a p rim eira o b ra , Elem entorum iurisprudentiae universalis
duo, de 1660, à qu al ele confiara a p rim eira tem erária m as im postergável ten tativ a de
expor a ciência do direito com o ciência dem onstrativa, P u fen d o rf — depois de ter
declarado que, até então, a ciência do direito “ não fo ra cultivada n a m edida exigida
pela sua necessidade e p ela sua dignidade” — expressa a su a p ró p ria divida de reco
nhecim ento a apenas dois autores, G rócio e H obbes. N um a o b ra p u b licad a m uitos
anos depois, Eris scandica, que adversos libros de iure naturali et gentium obiecta
diluuntur (1686), escrita p a ra esclarecer os seus críticos, Pufendorf reafirm a a con
vicção de que o direito n a tu ra l “ som ente nesse século com eçou a ser elaborado de
form a ap ro p ria d a ” , tendo sido, nos séculos passados, prim eiro desconhecido pelos
antigos filósofos, especialm ente p o r A ristóteles, cujo cam po de investigação re strin
gia-se à vida e aos costum es das cidades gregas, depois m esclado, ora aos preceitos
religiosos nas o bras dos teólogos, ora às regras de um direito histórico transm itido
nu m a com pilação a rb itrá ria e lacunosa, como era o direito rom ano, à o bra dos j u
ristas. M ais u m a vez, p o r sobre a tu rb a dos pedantes e litigiosos com entadores dos
textos sagrados ou de leis de u m povo rem oto, elevam-se os dois autores aos quais se
deve a prim eira tentativa de fazer do direito u m a ciência rigorosa: G rócio e H obbes.
De G rócio, P ufendorf diz que, an tes dele, “ não houve ninguém que distinguisse exa
tam ente os direitos n a tu ra is dos direitos positivos e tentasse dispô-los n um sistem a
unitário e com pleto (in p le n i system atis rotunditatem )". E ssa passagem se encontra
num esboço de história do direito n a tu ral, ao qual P u fen d o rf dedica o prim eiro cap í
tulo do escrito Specim en controversiarum circa ius naturae ipsi nuper m otarum , que
faz p a rte d a su p racitad a Eris scandica. O capítulo, in titu lad o D e origine et progressu
discipiinae iuris naturalis, foi p o r m im traduzido pela p rim eira vez em italiano num
pequeno volum e p a ra uso didático, Sam uele Pufendorf, Principi d i diritto naturale,
SO C IED A D E E E S TA D O NA F IL O S O F IA PO LÍTIC A M O D ERN A 19
(11) Refiro-m e, em p articu lar, aos estudos de D . M affei, Gli inizi delVu
nesimo giuridico, M ilão, G iuffré, 1956; V. P iano M ortari, Dialettica e giurispru-
denza. Studio sui trattati di dialettica legale dei sec. X V I, M ilão, G iuffré, 1955;
“ Considerazioni sugli scritti p ro gram m atici dei giu risti dei sec. X V I” , in Studia et
docum enta historiae et iuris, 1955, p p. 276-302; “ La sistem ática com e ideale um a-
nistico nell’opera di Francesco C onnano” , in S tu d i in onore de Gaetano Zingali, M i
lão, G iuffré, 1965, vol. III, p p . 559-71; A. M azzacane, Science, logica e ideologia
nella giurisproduzenza tedesca dei sec. X V I, M ilão, G iuffré, 1971. E , além do m ais,
C. Vasoli, La dialletica e la retórica deWumanesimo. “In ven tio " e "m éto d o ” nella
cultura dei X V e X V I secolo, M ilão, Feltrinelli, 1968. — E n tre os estudos estran g ei
ros, gostaria de recordar o de G . K irsh, Gestalten u n d Problem e aus H um anism us
u n d Jurisprudenz. Neue Studien u n d Texte, Berlim , de G ruyter, 1969, e a excelente
m onografia sobre um dos m aiores ju ristas e dialéticos da época, Claudius C antiun-
cula. E in Basler Jurist u n d H um anist des 16. Jahrhunderts , Basiléia, V erlag von
H elbing & L ichtenhanh, 1970.
22 N O R B ER T O B OBBIO
cialm ente se liberado dos estragos que nele in tro d u zira a com
pilação ju stin ia n a, com o afirm avam os h u m an istas, e ra n a d a
m ais e n a d a m enos que u m conjunto de textos a serem in te r
p retados co rretam ente.
O passo dado pela ju risp ru d ên cia cu lta além d a m era in
terp retação e com plem entação do texto foi aquele que a orien
tou p a ra a idéia do “ sistem a” : daí nasceram , com freqüência
c ad a vez m ais rá p id a a com eçar d a p rim eira m etad e do século
X VI, as várias tentativas de redigire in artem o direito, ou
seja, de p ro p o r critérios p a ra a ordenação d a im ensa m atéria
das leis ro m an as, em vez de com entá-las segundo a ordem em
que haviam sido tran sm itid as. M as tam b ém a sistem ática
usava, p a ra suas p ró p rias construções, m ateriais já dados, que
eram sem pre aqueles fornecidos pelo direito rom ano, ou seja,
p o r u m direito histórico: m ostrava, q u an d o m uito, a p ró p ria
preferência pelas Instituições, isto é, p o r u m texto m ais siste
m ático, e não pelo D igesto. Seria interessante, m as não é este
o local, m o strar que u m processo idêntico oco rrera no cam po
d a teologia, onde a d isp u ta sobre os textos e o m odo de in te r
pretá-los cederia p au latin am en te o terren o à teologia racional,
ao racionalism o teísta, à idéia de u m a religião n a tu ra l, que
está p a ra a religião positiva e p a ra a exegese dos textos, a tra
vés dos quais u m a religião positiva é a n u n ciad a e tran sm itid a,
do m esm o m odo com o o direito n a tu ra l está p a ra o direito ro
m ano e a com pilação ju stin ia n a.
Só se com preende a novidade do direito n a tu ra l se este
for com p arad o com a situação do estudo do direito antes da
virada, ou seja, se não for dado um m ínim o de atenção, como
dizíam os h á pouco, a tu d o isso de que ele é a negação. P ro
pondo a redução d a ciência do direito à ciência dem onstrativa,
os ju sn atu ralista s defendem , pela p rim eira vez com ta l ím peto
n a h istó ria d a ju risp ru d ê n c ia, a idéia de que a ta refa do ju rista
não é a de in te rp re ta r regras já dadas, que e n q u an to tais não
podem deixar de se ressentir das condições históricas n a qual
foram em itidas, m as é aquela — bem m ais nobre — de des
cobrir as regras universais d a conduta, através do estudo da
n a tu reza do hom em , não diversam ente do que faz o cientista
da n atu reza, que finalm ente deixou de ler A ristóteles e se pôs
a p e rsc ru tá r o céu. P a ra o ju sn atu ralista , a fonte do direito
não é o Corpus iuris, m as a “ n atu reza das coisas” . “ A razão
SO C IED A D E E E ST A D O NA F IL O S O F IA P O L lT IC A M O D E R N A 23
(12) Pufendorf, D e iure naturae et gen tiu m , L. II, cap. II, § 9; tra d . c it.,
p. 79. Cf. tam b ém L. II, cap . III, § 8: “ Sem dúvida, os preceitos d a re ta razão são
princíp ios verdadeiros, que concordam com a n atu reza das coisas, observada e exa
m in ad a aten tam en te” (tra d . c it., p . 107).
(13) Refiro-m e, com o o leitor já com preendeu, à o b ra de C h. P erelm an, tão
vasta que n ão pode ser a p resen tad a exaustivam ente n u m a n o ta, e de resto b asta n te
conhecida p a ra n ão carecer de m u itas citações. Lim ito-m e a assinalar p a ra os ju rista s
a coletânea de ensaios D iritto, morale e filosofia, N ápoles, G u id a, 1973, bem com o a
ú ltim a coletânea, L-'empire rhétorique. Rhétorique e t argum entation. P aris, V rin,
1977. M as n ão se deve esquecer, n a m esm a direção, o livro de T h . Viehw eg, T opik
u n d Jurisprudenz, M unique, C. H . Becksche V erlagsbuchhandlung, 1953 (tra d . it.,
M ilão, G iuffré, 1962, que, m esm o p artin d o de pressupostos diversos, chega a resul
tados análogos).
Razão e história
(5) Leibniz, Elem enta iuris naturalis, q u e cito d a edição de V. M ath ieu dos
S críttipolitici de Leibniz, T u rim , U tet, 1951, p . 86.
(6) Leibniz, M éditations sur la notion com m une de ju stice, ed. cit., p . 219.
(7) W olff, Jus naturalis m ethodo scientifica pertractatum , ed. cit., Prolegô-
m ena, § 2.
(8) A ristóteles, Ética a N icôm aco, 1134 b. T rata -se d a célebre passagem n a
qual A ristóteles distingue o ju sto n a tu ra l do ju sto legal. A firm ando que p o r ju s to
n atu ral se entende o que tem em to d a p arte a m esm a eficácia, pode deixar en ten d e r
que é possivel concluir que se podem inferir as prescrições observando o que é p ra ti
cado en tre os diversos povos, p recisam ente “ em to d a p a rte ” .
(9) C ícero, Tusculanae, I, 13-4. E ssa é a p rincipal passagem invocada pelos
defensores do fu n d am en to consensual d a lei n a tu ra l. O consenso de todos os povos,
en q u an to voz d a natu reza, é a prova — a única prova — de que existem leis n atu rais.
T an to é verdade que o argum ento p rincipal dos céticos é m o strar que não h á n e
nh u m a lei que seja acolhida p o r todos os povos, ou seja, que te n h a "em to d a p a rte ” a
m esm a eficácia. N a passagem j á citad a, M ontaig ne co m enta a d o u trin a dos qu e afir
m am a existência de leis n atu rais a p a rtir d a "u n iversalidade do consenso” com as
seguintes palavras: “ N ão h á n a d a em que o m u n d o seja tão diverso com o no que se
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refere aos costum es e às leis. U m a coisa aqui é abom inável e alhures é h o n rad a, com o a
habilidade de ro u b a r em E sp arta. O s casam entos entre p aren tes são pro ibidos entre
nós sob p en a de m orte, e alhures são honrados. (...) O infanticídio, o p arricídio,
a com unidade das m ulheres, o tráfico de objetos roubados, a licença dian te de q u al
quer voluptuosidade, em sum a, não h á n ad a de tão excessivo que n ão seja adm itido
nos usos de algum povo” (ed. cit., vol. I, p . 771).
(10) G rócio, De iure belli ac pacis, L. I, cap. I, § 12. H á nesse texto u m a
distinção en tre o consenso de todos os povos e consenso dos povos m ais civilizados. A
distinção é acolhida p o r H obbes, que critica a legitim idade de am bos com o fu n d a
m ento do direito n atu ral. Como autores d a p rim eira tese, G rócio cita H eráclito, A ris
tóteles, Cícero, Sêneca e Q uin tiliano; como defensores d a segunda, Porfírio, A ndrô-
nico de R odes, P lutarco e ain d a A ristóteles.
(11) H obbes, D e eive, II, I, ed. cit., p p . 94-7. T am bém em su a p rim eira o b ra
política, E lem ents o fL a w N atural a nd Politic, P arte I, cap. XV, § 1.
(12) P u/endorf, D ie iure naturae et gentium , L. II, cap . III, § 7 (n a antologia
de Pufendorf p o r m im trad u zid a e já citada, o texto se en co n tra nas p p . 98-9). E ssa
passagem de Pufendorf é invocada p o r B arbeyrac em seu com entário ao trecho de
S O C IED A D E E E STA D O NA FIL O SO FIA PO LÍTIC A M O D ER N A 29
(15) Ib id ., p . 161.
(16) Ib id ., p . 166.
(17) G . B. Vico, La scienza nuova prim a, ed. p o r F . Nicolini, Bári, Laterza,
1 9 3 1 ,p. 9.
(18) G . B. Vico, La scienza nuova (segundo a edição de 1744), ed. p o r F.
Nicolini, B ári, L aterza, 1928, vol. I, p. 131, p ar. 360. D esse diverso m odo de fu n d a r o
direito n a tu ra l, segue-se tam bém um diferente m odo de en ten d er as du as caracterís
ticas d a im utabilidade e d a universalidade. P a ra Vico, o direito n a tu ra l não é um d i
reito estaticam ente eterno, m as é um direito que “ corre no tem po” , o que significa
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D ER N A 31
(2) M . Isnardi P arente, Introduzione a J. Bodin, I sei libri dello stato, n a co
leção dos “ Classici politici” , dirigida p o r L. Firpo, T u rim , U tet, 1964, vol. I, p . 23.
(3) R etom o e desenvolvo o tem a tratad o no ensaio “ II m odello giusnaturalis-
tico” , in Rivista Internazionale diFilosofia dei D iritto, 1973, p p . 603-22.
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(4) Sobre esses três usos dos sistem as conceituais, detive-m e pela p rim eira
no artig o “ La g rande dicotom ia” , em S tu d i in m emória de Cario Esposito, P ád u a,
C edam , 1974, p p . 2187-2200 (e, depois, no volum e Dalla struttura alia fu n zio n e,
N uovi stu d i di teoria dei diritto, M ilão, C om unità, 1977, p p . 145-63). A “ gran d e d i
cotom ia” de que falo é a distinção entre direito privado e direito público. — V ali-m e
d a idéia tam bém n a análise da teoria clássica das form as de governo, ta n to no artigo
“ Vico e la teoria delle form e di governo” , in Bolettino dei Centro d i S tu d i Vichiani,
1978, p p . 5-27, q u an to no verbete “ D em o cra z ia /D itta tu ra ” d a Enciclopédia Ei-
naudi, vol. IV , p p . 535-58 (publicado em 1978).
SO CIED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O DERNA 39
(4) Ib id . , p . 172.
(5) J. A lthusius, Política metodice digesta, cap. V, 8, que cito da edição de C.
J. F riedrich, n a coleção “ H arv ard Political Classics” , C am bridge U niversity Press,
1932, p . 21.
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D ER N A 43
(6) R. F ilm er, Patriarcha or the Natural Power o f K ings (1680), que cito da
edição de L. Pareyson, publicada com o apêndice aos D ue tra tta ti dei governo civile,
de Locke, T u rim , U tet, 2? ed. revista, 1960, cap. 1, § 10, p . 462.
(7) C. L. von H aller, Restauration der Staats-W issenschaft (1816-1820), que
cito da edição de M . S ancipriano, n a coleção dos “ Classici politici” , T urim , U tet,
1963, vol. I, p . 154.
(8) Ib id ., p. 130. O grifo é nosso.
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(9) Ib id . , p. 472.
(10) Ib id ., p . 476.
O estado de natureza
(1) H obbes, Q uestions concerning liberty, necessity and chance (1656), que
cito das English W orks , ed. M oleshott, vol. V, p. 183.
(2) M ultaque p e r coelum solis volventia lustra / vulgivago vitam tractabant
more ferra ru m , versos 931-32. [N a tradução portuguesa de A gostinho da Silva (D a
N atureza, São Paulo, A bril C ultu ral, col. “ Os P ensadores” , vol. V, 1973, p . 116),
tem os: “ E, en q u an to m uitos lustros se desenrolavam pelo céu m arcados pelo Sol,
levavam eles um a vida e rra n te à m an eira dos anim ais bravios” .]
(3) S. Landucci, Ifilo so fi e le m acchine (1580-1780), B ári, L aterza, 1972, em
particu lar, no que se refere a H obbes, p p . 114-42.
(4) N ão sem u m a rem iniscência literária de T ucídides, que descrevera com
cores obscuras a g u erra civil, desencadeada em C orcira em 427 a.C .: “ A ta l p onto de
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA PO LlTIC A M O D ER N A 51
ferocidade chegou aqu ela g uerra civil, e pareceu ainda m ais trem en d a, p o rque foi a
prim eira: m ais ta rd e , tam bém to d a a G récia, pode-se dizer, foi p or ela a b ala d a e tc .”
(III, 82). Não é preciso esquecer que H obbes trad u zira, na p rim eira p a rte de sua vida, a
história da g u erra no Peloponeso, p u b licad a em Londres em 1629, interpreted — com o
se lê no frontispício — with fa ith and diligence im m ediately ou t o f the Greek by
Thomas H obbes. Sobre a centralidade do tem a d a g uerra civil em H obbes, cham ei
p articularm ente a atenção no ensaio dedicado ao au to r do Leviatã no vol. III d a Storia
delle idee politiche economiche e sociali, dirigida p o r L. F irpo, T urim , U tet, 1979.
G ostaria, p o rém , de c itar pelo m enos u m trecho que não se en co n tra nas obras políticas
e que, precisam ente p o r isso, é ain d a m ais decisivo. No prim eiro capítulo do De cor-
pore, tratan d o da utilidade da filosofia, H obbes escreve: “ M as [a utilidade da filosofia
m oral e civil] deve ser m ensurada não ta n to pelas vantagens que derivam do conhe
cim ento dela q u an to pelas calam idades em que incorrem os p o r ignorância da m esm a.
Além do m ais, todas as calam idades que podem ser evitadas com a intervenção ativa do
hom em nascem d a g uerra, em particular da guerra civil: dessa, com efeito, derivam
massacres, desolação, fa lta de todas as coisas" (I, 7). D e to d as as interpretações do
estado de n atu reza, a que tem m enor credibilidade é aquela que, nestes últim os anos,
incrivelm ente, teve m aior sucesso. Refiro-m e à o b ra de C. B. M acpherson, The Poli-
tical Theory ofPossessive Individualism , O xford, C larendon Press, 1962, n a qual se
afirm a — com fracas provas — que, descrevendo o estado de n atu reza, H obbes des
creve na realidade, ain d a que inconscientem ente, a sociedade de m ercado. D o m esm o
autor, cf. tam b ém a introdução à edição do Leviathan, Penguin Books, 1968, n a qu al a
tese é reafirm ada. H obbes teria usado "u m modelo m ental que, estivesse ele ou não
consciente disso, corresponde apenas à sociedade de m ercado b u rg u esa” (p. 38), com a
conseqüência de que “ os m odelos p o r ele construídos foram m odelos burgueses” e,
p ortanto, o núcleo p rincipal de su a ciência é “ um a ciência d a sociedade b u rg u esa” !
(p . 12).
(5) Pufendorf, De iure naturae et gen tiu m , L. II, cap. II, § 1, trad . it. cit.,
p. 63.
52 N O R B ER T O BO B B IO
(20) Sobre esse ponto fu ndam ental, lem os n a M etaphysik der Sitten a segu
passagem : “ A divisão do direito n atu ral não reside (...) n a distinção en tre direito
natural e direito social, m as naq u ela en tre direito n atu ral e direito civil, o prim eiro dos
quais é cham ado de direito privado e o segundo, de direito público. E, com efeito
o oposto do estado de natureza não é o estado social, m as o estado civil, pois pode m uito
SO CIED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O LlTIC A M O D ERN A 59
bem existir sociedade no estado de n atu reza, m as não um a sociedade civil, que garante
o m eu e o teu p o r meio de leis públicas” (ed. cit., p . 422). D essa passagem , na qual
K ant especifica qu e a contraposição fu ndam ental não é en tre direito individual e
direito social, m as entre direito n a tu ra l (aq u i incluído o direito das sociedades natu rais,
com o a fam ília e as associações contratuais) e direito civil (ou direito da sociedade civil,
que não deve ser confundida com as sociedades naturais), resu lta claram ente p or que
o direito n a tu ra l coincide com o direito privado, e o direito positivo nasce com o di
reito público.
(21) H obbes, Leviathan, cap . XV II.
(22) H obbes, D e eive, IX, 10; Leviathan, cap. XX.
(23) Locke, Two Treatisesonf Government, Segundo T rata d o , § 76.
60 N O R B ER T O B O B B IO
(24) Ib id . , § 107.
O contrato social
(1) I b i d ., § 2 .
62 N O R B ER T O BO BBIO
(6) Locke, Two Treatises, Segundo T rata d o , § 100 e ss. P a ra afirm ar a reali
dade histórica do co n trato originário, Locke se serve de dois argum entos: a) desses
contratos não se tem geralm ente notícia porque os povos não conservaram notícias de
suas origens; b) p a ra alguns E stados, como R om a e V eneza, de cuja origem se tem
notícia, a origem co n tratu al é certa.
(7) T rata-se d a célebre passagem n a qual R ousseau explica a origem do E stad o ,
ou m elhor, d a relação de sujeição política, no longo período histórico que está en tre o
fim do estado de natu reza e o início d a nova com unidade fu n d a d a sobre o co n trato
social, im aginando que os ricos conseguiram convencer os pobres a se subm eterem ao
poder dos prim eiros, m o stran d o os perigos d a desunião (ed. c it., p . 334). É nesse po n to
que R ousseau escreve: “ Todos co rreram ao encontro de suas cadeias, acreditando
SO C IED A D E E E ST A D O NA FIL O SO FIA PO L ÍT IC A M O D ER N A 65
(10) P . I . A . F eu erb ach , A nti-H obbes oder Ueber die Grenzen der höschten
Gewalt u n d das Zw angsrecht der Bürger gegen den O berherrn, E rfu rt, H enning,
1798; ed. italian a, M ilão, G iuffré, 1972, p p . 26 e 29. P a ra u m co m entário m ais p ro
fundo, cf. M . A. C attan eo , A nselm Feuerbach filosofo e giurista, M ilão, C om unità,
1970.
(11) Pufendorf, D e iure naturae e t g en tiu m , L. V II, cap . 2, §§ 7 e 8 , tra d , cit.,
pp. 164-65.
SO C IED A D E E E ST A D O NA F IL O S O F IA P O L ÍT IC A M O D ER N A 67
(17) Ib id . , p. 382.
(18) Ib id . , p. 382.
(19) Ib id . , p. 384.
(20) Ib id . , L. I, cap. 8, p . 735.
(21) R ousseau, D u contrat social, L. I, cap. 6.
70 N O R B ER TO BO BBIO
pessoal). Se essa é a finalidade, disso resu lta que não som ente
o direito à vida, com o em H obbes, não apenas o direito à liber
dade de opinião, como em Spinoza, m as tam bém e sobretudo
o direito de p ro p ried ad e é um direito irrenunciável: “ P or po
der político — diz Locke, precisam ente no início do Segundo
tratado — , entendo o direito de fazer leis com penalidade de
m orte e, p o r conseguinte, com toda p enalidade m enor, p a ra o
fim de reg u lam en tar e conservar a p ro p ried ad e” .28 Pode-se
dizer, em síntese, ain d a que com certa sim plificação: e n q u an
to os indivíduos de H obbes e de Spinoza renunciam a todos os
direitos, exceto um , os indivíduos de Locke renunciam a um
só direito, ou seja, conservam todos m enos u m .29
(16) Ib id ., cap. V, § 2 .
(17) Hob’bes, D e eive, V II, 3.
(18) H o b b es, Leviathan, cap. XXI.
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA PO LÍTIC A M O D ER N A 83
(1) Desenvolvi esse tem a no m eu artigo “ Hegel e il giu sn atu ralism o ” , in Rivi
di Filosofia, 1966, p p . 379-407.
S O C IED A D E E E S T A D O NA F IL O SO FIA P O L lT IC A M O D E R N A 97
(2) Sobre esse pon to , rem eto ao m eu artigo “ D iritto p rivato e d iritto p u b b lico
H egel” , in Rivista diF ilosofia, o u tu b ro de 1977, p p . 3-29.
98 N O R B ER T O BO BBIO
(3) F . Engels, A nti-D ühring, in W erke, D ietz V erlag, vol. XX, p. 23.
SO CIED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D ERN A 99
O modelo hegelo-marxiano
Michelangelo Bovero
Dois modelos dicotômicos
(4) C f., p o r exem plo, FD 262 Z e 273 Z. T am bém p a ra M arx, a afirm ação
e a universalização da in dependência pessoal assinala, em geral, a passagem p a ra o
tipo m oderno de organização social. Nos Grundrisse der K ritik der politischen O eko-
nom ie, Berlim , D ietz V erlag, 1953, citados doravante como Grundrisse, lê-se n a p. 75:
“ As relações de dependência pessoal (de inicio sobre u m a base in teiram ente n atu ral)
são as prim eiras form as sociais (...) . A independência pessoal fu n d ad a n a dependência
m aterial é a segunda form a im p o rtan te n a qual chega a se constituir u m sistem a de
intercâm bio social geral, um sistem a de relações universais” .
(5) N a verdade, as seções fundam entais do D e eive são três: m as n a últim a,
Religio, é indicado o problem a da com unidade religiosa, que — segundo o projeto
hobbesiano — deve confluir sob a Potestas civil.
0 “modelo hegelo-marxiano*’
(3) Não m e refiro aqui às categorias m ais pro p riam en te “ lógicas” , cuja d
vação da lógica hegeliana é evidente (p a ra d a r som ente u m exem plo, um pouco ex trín
seco porém clam oroso, b a sta ver o esquem a posto n a p . 186 dos Grundrisse, onde a
m atéria do assunto “ C ap ital” , certam ente não hegeliano, é o rd en ad a com base nos
m om entos hegelianos do conceito); refiro-m e às próprias categorias que M arx em prega
p a ra in te rp re ta r aspectos relevantes da estru tu ra econômico-social, da política e da
história: o concentrado de estudos e reflexões contido n as “ F orm as anteriores à p ro
dução cap italista” ( Grundrisse, p p . 375-413) está articulado segundo esquem as con
ceituais hegelianos.
110 M IC H ELA N G ELO B O V ERO
(8) F D 2 5 6 A .
114 M ICH ELA N G ELO B O V ER O
(10) Com efeito, a fam ília “ tem com o sua determ inação a sua u nidade que se
sente a si m esm a, o am o r” ( F D 158); q u an to à tarefa educativa, Hegel sublinha qu e a
sociedade civil “ tem o dever e o direito, diante do arbítrio e d a acidentalidade dos ge
nitores, de exercer vigilância e in fluência sobre a educação, n a m edida em que essa se
refira à aptidão p a ra to m ar-se com ponente d a sociedade” (F D 239).
(11) FD 238 e Z.
116 M ICH ELA N G ELO B O V ER O
(12) FD 33 Z.
(13) F D 3 2 Z .
(14) FD 141 Z.
Hegel, Marx
e o ponto de partida no abstrato
(2) É o que se diz n as L ezio n isulla filosofia delia storia, tra d . it., F lorença, La
Nuova Italia, 1967, vol. III, 2, p . 174.
(3) O local, de fato, é aquele onde é retom ado no sistem a, no in terior d a seção
sobre o Espírito-objetivo, o célebre capítulo d a Fenomenologia sobre a “ In d ep en
dência e dependência d a autoconsciência: senhoria e servidão” .
SO C IED A D E E E S TA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D ER N A 119
(6) Ibidem .
(7) E 433 A.
(8) É a definição que aparece em E 502 A. T am bém em FD 93, Hegel escreve:
“ (...) ein N aturzustand, Zusta n d der Gewalt üb erh a u p t".
(9) E 433 A.
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA PO L lT IC A M O D ER N A 121
(13) E 502 A.
(14) Lezioni sulla storia delia filosofia, cit., I, p. 372.
SO C IED A D E E E S TA D O NA FIL O SO FIA PO L lT IC A M O D ER N A 123
(16) FD 200 A; e cf. tam bém FD 289 A, onde se afirm a que a sociedade civil
“ é o cam po de b a ta lh a do interesse privado individual de todos contra todos” , com o
evidente referência ao bellum o m nium contra om nes do estado n a tu ra l n a trad ição
hobbesiana.
Qual Marx e quai Hegel?
(3) R. Bodei, n a resenha “ S tudi sul pensiero político ed econom ico di Hegel
neU’ultim o tren ten n io ” (in Rivista Critica di Storia delia Filosofia, 1972, p p. 435-66,
p . 465), afirm a que “ a fonte m ais im ediata da posterio r contraposição en tre socie
dade civil e E stad o ” deve ser b u scad a n a antítese entre bürgerliche O rdnung e staat-
liche O rdnung, d a qu al Hegel fala em seu escrito de 1817 sobre a D ieta de W ürttem -
berg (cf. tra d . i t . , in G . W . F. Hegel, Scrittipolitici, T urim , E in au d i, 1972).
(4) O p róprio Ilting reconhece que o valor prim eiro d a Filosofia do direito
consiste em sua arq u ite tu ra , que perm anece substancialm ente in alterad a tam bém
128 M ICH ELA N G ELO B O V ER O
nas Lições e que é depois rep etid a nas du as edições berlinenses d a Enciclopédia (1827
e 1830), am bas posteriores ao últim o curso com pleto de filosofia do direito (1824-
1825) (cf. Ilting, Hegel diverso , cit., p . 140, n. 11). D e resto, precisam ente Ilting é
au to r de um im portante estudo sobre “ La stru ttu ra delia Filosofia dei diritto di H e
gel” , de 1971 (agora inclído n a op. c it. , p p. 5-32). D e q u alq u er m odo, o recurso à
m onum ental edição de Ilting é agora obrigatório p a ra os estudiosos d a filosofia polí
tica e ju ríd ic a hegeliana. C ontudo, m esm o levando-a sem pre em conta e fazendo as
devidas com parações, preferim os neste local utilizar os adendos de G ans, aos quais se
referiu u m a longa trad ição de intérpretes; e o fizemos ta n to p o r cau sa dos lim ites
deste trab alh o , que não tem com o objetivo u m a reconstrução filológica exaustiva do
p ensam ento hegeliano com o tal, tan to porque os adendos de G ans se baseiam p reci
sam ente n as Lições hegelianas, e G ans — com o afirm a o p ró p rio Ilting (op. cit . ,
p p. 135 e ss.) — desem penhou com o editor u m trab alh o filológico rigoroso.
SO C IED A D E E ESTA D O NA FILO SO FIA P O LlTIC A M O D ER N A 129
(5) E n tre os escritos que poderiam ser indicados, gostaria de recordar ape
o prim eiro ensaio de redação de A guerra civil na França, escrito p or M arx em inglês
em 1871, onde reaparecem freqüentem ente as argum entações e até mesmo as fó rm u
las lingüísticas já em pregadas n a K ritik de 1843 e na contem porânea Judenfrage. Por
exem plo, falando da C om una, ele afirm a: “T ratou-se da reapropriação pelo povo e
p a ra o povo da sua p rópria vida social” ; e, pouco depois: “ A C om una é a form a
política d a su a [das m assas p o p u laresl em ancipação social, substituindo a form a a rti
ficial (...) da sociedade” (cito da tra d . i t ., K. M arx, Scritti sulla Comune d i Parigi,
R om a, S am onà e Savelli, 1971, p p . 120 e ss.). C o m p a r e - essa colocação,,não só do
ponto de vista lexical, com num erosas passagens quase id ênticas da K ritik de 1843,
m as tam bém do ponto de vista conceituai, com a fam osa conclusão da Judenfrage'.
“ Som ente q u ando o hom em reconhece e organiza as forces propres como forçás so
ciais e, p o rtan to , não m antém sep arad a de si m esmo a força social na form a de força
política, som ente então se com pleta a em ancipação h u m a n a ” (cf. Scritti politici gio-
vanili, ed. L. F irpo, T urim , E inaudi, 1950, p. 385).
130 M IC H ELA N G ELO B O V ERO
sim plesm ente como o aspecto geral form alm ente com um a
elas. E m o u tras palavras: o que será exposto nas páginas se
guintes não quer, nem poderia, ser considerado como u m a
tentativa de interp retação global da filosofia política de Hegel
ou de M arx, ain d a que só em suas linhas m ais essenciais. No
m áxim o, p o d erá ser u tilizad a em posteriores elaborações como
um início, quase com o u m a introdução geral a u m a leitura
que deverá d a r u m a atenção inteiram ente diversa aos m uitos
pontos problem áticos em que se articulam — diferenciando-se
— as constelações de u m a e de o u tra teoria.
Duas antíteses fundamentais
75-100 (agora, com outros escritos do mesm o autor, no opúsculo sob o título G ramsci
e la concezione delia società civile, M ilão, Feltrinelli, 1976 [ed. brasileira: O con
ceito de sociedade civil , Rio de Janeiro, G raal, 1982]); id ., “ Sulla nozione di società
civile” , in D e H om ine, 1968, n . 24-5; id ., Società civile” , no D izionario d ip o litica ,
ed. p or N. B obbio e N. M ateucci, T urim , U tet, 1976.
(2) Digo “ rem oção” , e não “ supressão” , p o rque vim os que em Hegel a no
de estado de n atu reza é recu p erad a no E spírito subjetivo, a fim de indicar “ o com eço
externo e fenom ênico dos E stad o s” (cf. supra). E a m esm a noção, de resto, é tam bém
reintroduzida no E spírito objetivo, p a ra além do E stado, a fim de indicar a n atu reza
das relações internacionais (cf. FD 333); sobre o assunto, cf. N. Bobbio, “ H egel e il
giusnaturalism o” , cit., p p . 400-1.
134 M ICH ELA N G ELO B O V ER O
(3) Cf. J.-J. R ousseau, Discurso sobre a desigualdade (ed. italian a, in Scritti
politici, ed. p or P. A latri, T u rim , U tet, 1970, p . 288).
(4) Cf. N. Bobbio, G ramsci e la concezione delia società civile, cit., p p . 17-27.
(5) Respectivam ente, Allgemeines Staatsrecht, 1793, e A ntihobbes, 1798. Cf.
N. Bobbio, “ Società civile” , n o Dizionario dipolítica, cit., § III.
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D ER N A 135
(6) F D 1 8 2 Z .
(7) “ Prefácio” de 1859 a Para a crítica da economia política , ed. brasileira, in
“ O s P ensadores” , São Paulo, A bril C ultu ral, vol. XXXV, 1974, p . 135.
136 M ICH ELA N G ELO B O V ERO
m esm o tem po, não é redutível a nenhum dos dois, nem é pos
sível indicar um vínculo privilegiado m ais com um do que com
outro. Com efeito, os conceitos referidos antes com o seus a n te
cedentes “ ilustres” — n a lin h a do pensam ento Locke-K ant, e
n aquela R ousseau-Ferguson — são form ulações particulares
não de um m esm o elem ento, m as dos dois elem entos opostos
do m odelo ju sn atu ralista; e, po r outro lado, o novo conceito
de bürgerliche Gesellschaft pode apresentar-se como síntese
de am bos à m edida que, de cada um deles, é retirad o o que
fazia do m esm o, n a perspectiva do m odelo ju sn atu ralista , a
antítese do outro, ou seja, a determ inação originária, a p ro
priedade essencial: à diferença da sociedade civil de Rous-
seau-Ferguson, o novo conceito de bürgerliche Gesellschaft
indica u m a condição social tão não-política q u an to a socie
dade n a tu ra l de Locke-K ant; e, à diferença dessa ú ltim a, in
dica u m a condição social não provisória ou an terio r à condi
ção civil, do mesm o m odo como a sociedade civil de R ousseau-
Ferguson. Em ou tras palavras: n a lógica do segundo m odelo,
a sociedade civil, p o r um lado, é não-E stado e não é sociedade
política, de m odo que a m atriz da noção de bürgerliche Ge
sellschaft não é encontrável unilateralm ente no conceito an á
logo “ dos ingleses e franceses do século X V III” ; p o r outro
lado, o não-E stado é sociedade civil e não é sociedade n a tu ra l,
de m odo que a m atriz d a noção de bürgerliche Gesellschaft
não é encontrável u n ilateralm ente naquele conceito de status
naturae que tin h a o m esm o valor de posição no interior do
modelo ju sn atu ralista . U m resultado em p a rte idêntico e em
p arte com plem entar pode ser alcançado se tom am os com o p ri
m eiro term o de com paração a noção pré-hegeliana de socie
dade civil e a cotejam os com os dois elem entos do m odelo pos
terior: en q u an to aq u ela indica u m a coletividade organizada
politicam ente e, p o rtan to , coincide com o m om ento do E s
tado, n a lógica desse últim o a sociedade civil é não-E stado, e
não é sociedade política, e, reciprocam ente, a sociedade polí
tica é Estado, e não é sociedade civil.
R esum indo de m odo esquem ático a com plexa posição da
sociedade civil, term o-chave p a ra com preender a lógica da
transform ação do m odelo ju sn atu ralista no m odelo hegelo-
m arxiano, en q u an to term o com um , pode-se dizer que: com o
prim eiro elem ento do segundo modelo, ela contém de certo
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA PO LÍTIC A M O D ER N A 137
(1) F D 3 0 3 A .
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D E R N A 141
(2) FD 183.
(3) FD 184.
(4) G rundrisse, p . 74.
142 M ICH ELA N G ELO B O V ERO
(5) Ib id ., p. 81.
(6) F D 187.
(7) Grundrisse, p . 101.
(8) Ib id ., p. 111.
(9) FD 187.
(10) F D 184"
(11) Grundrisse, p . 111.
SO C IED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA PO LÍTIC A M O D ER N A 143
acim a dos indivíduos — seja ela rep resen tad a com o força n a
tu ral, com o acaso ou em q u alq u er o u tra fo rm a — é um resul
tado necessário do fato de que o ponto de p a rtid a não é o in d i
víduo social livre” .12 Sob esse aspecto, p o rta n to , a bürgerliche
Gesellschaft resu lta oposta à societas naturalis tal com o essa
se ap resenta n a perspectiva ju sn atu ralista: a vontade livre, o
arbítrio dos m uitos indivíduos, quando esses são considerados
como sujeitos concretos, revela-se ela m esm a com o algo neces
sário, ain d a que se tra te de u m a necessidade que se constitui
p o r meio dos m uitos atos de liberdade form al.
Ju n tam en te com a “ visão atom ista e a b s tra ta ” (Hegel),
que não reconhece a força d a “ conexão objetiva” (M arx), tal
como essa se desenvolve n atu ralm en te a p a rtir do entrecruza-
m ento das relações intersubjetivas, desaparece necessaria
m ente — n a passagem do prim eiro p a ra o segundo m odelo —
aquela perspectiva subjetivista e voluntarista em cujo interior
a união social parece derivar apenas do livre concurso das von
tades individuais. Com base n a lógica do m odelo ju s n a tu ra
lista, a sociedade p ro p riam en te dita se configura como fruto
de um co n trato coletivo, p o r meio do qual c a d a indivíduo re
nuncia ao seu isolam ento “ n a tu ra l” , ao seu self-governm ent
ou p oder soberano e exclusivo sobre si, p a ra subm eter-se com
os outros a u m governm ent ou poder com um que, g aran tin d o
a coexistêcia dos direitos de cad a um com os direitos de todos,
assegura a p ró p ria form a d a sociabilidade. Vê-se aqui m ais de
de perto, que, no m odelo ju sn atu ralista , sociedade e E stado
coincidem , no sentido de se incluírem no m esm o “ espaço” ou
lugar lógico, ou seja, do lado do segundo m em bro d a dicoto
m ia fund am en tal: fora do E stad o , d a união política, não h á
propriam ente sociedade, ou seja, a sociedade do estado n a
tu ral só pode ser considerada sociedade de m odo im próprio.
Poder-se-ia objetar que a concepção p red o m in an te n a es
cola do direito n a tu ra l considera necessários à constituição do
civil, ou sociedade dos privados), a não ser p o r m eio do exercício dos direitos do
hom em e n q u a n to privado. P o r isso, a tu te la dos direitos individuais, o direito à pro-
pried ad e-lib erd ad e, e o direito à vida, é exigência interna d aq u ele m ecanism o social
— pró p rio d a sociedade civil com o sistem a d a vida priv ad a — que se fu n d a nos m es
mos e, ao m esm o tem po, em su a acidentalidade e “ necessidade inconsciente” , os
expõe sob m u ito s aspectos ao risco de n ã o serem tra ta d o s “ e n q u an to direito ” (F D
230). D esse m odo, os indivíduos em su a q u alid ad e de sujeitos privados (en ten d o p o r
isso o Bürger ais Bourgeois de F D 190 A) são conectados n a sociedade civil não
som ente através do sistem a dos carecim entos, m as tam b ém m ediante a ad m in istração
d a ju stiça (q u e tu te la a lib erd ad e ab stra ta ) e d a ad m in istração p ú b lica (q u e g a ra n te a
segurança d a vida). A ssim , a sociedade civil hegeliana é um sistem a n ão só econô
m ico, m as ta m b é m ju ríd ico e ad m inistrativo, e, p o r isso, é c h am a d a ta n to de Gesell-
schaft q u a n to de Sta a t. M as, n a m ed id a em que se refere ao dom ínio do p a rtic u la r,
ou sistem a d a vida p riv ad a, é E sta d o dos privados, cujo princípio e m eta é o indivíduo
privado definido p o r carecim entos e interesses exclusivos e, p o rta n to , p riv atista ele
pró p rio e, com o tal, co n trap o sto ao E stad o p ro p riam e n te d ito, ou E sta d o “ p ro p ria
m ente político” (F D 267), e n q u a n to sistem a d a vida p ública, único de onde procede
u m a vontade verd ad eiram en te universal.
T am bém p a ra M arx , o vínculo social se fu n d a n a base m aterial do carecim ento:
os hom ens tê m necessid ade de p ro d u zir socialm ente a su a existência, e to d a p ro d u ção
é n ecessariam ente p ro d u ção social. E , tam b ém p a ra M arx, a divisão do tra b a lh o é o
m odo m ais im ediato no qual a relação social n a época m o d ern a se m o stra com o
necessária: u m a época que ap arece com o a época do indivíduo, m as ao m esm o tem po
é a época d a ex p an são d as relações sociais e, com elas, dos carecim entos. M as a divi
são do tra b a lh o em M arx não ap resen ta sim plesm ente a sua face técnico-fundam en-
tal. E a relação necessária que especifica a sociedade m oderna com o tal é certam en te
tam b ém a relação de tro ca, m as n ão som ente n a q u e la form a d a “ tro ca sim ples” que
situa todos os sujeitos, p a ra além d a divisão em níveis hierárquicos, n u m único g rau
de d ignidade h u m a n a (o g ra u dos direitos do hom em ). Isso vale ap en as p a ra a “ su p e r
fície” d a sociedade civil, com o m ais de u m a vez se afirm a nos G rundrisse, p a ra a
“ ap arên cia re a l" segundo a q u al ela se m o stra com o sociedade d as tro cas e d a livre
concorrência (e, com o ta l, é sociedade “ b u rg u esa” n ão im ediatam ente no sentido de
classe, m as no sentido em que “ b u rg u ês” , bourgeois, é a fig u ra h istó rica em que
aparece, no in terio r d a form ação social m oderna, o sujeito com um e, p o rta n to , to do
hom em e n q u a n to pessoa privada definida pelos pró p rio s direitos individuais). So
m ente além dessa superfície é que se pode c a p ta r aq u ela relação de tro ca que consti
tu i, p a ra M arx, a diferença específica d a sociedade m oderna: u m a relação que p re s
supõe não sim plesm ente a lib erd ad e do hom em com o cidadão privado (ou civil-bur-
guês), m as a “ lib erd ad e” p ró p ria d a g ran d e m aio ria dos hom ens, a “ lib erd ad e” em
relação à p ro p ried ad e dos m eios de p rodução, e que divide os sujeitos em d u as classes
con trap o stas. D esse m odo, a sociedade civil m o d ern a se revela com o sociedade b u r
guesa no sentido do dom ínio de classe, ou com o sociedade cap italista, n a m ed id a em
que a necessidade específica d a relação de tro ca social m o d ern a é a d a relação de
tro ca en tre cap ital e trab alh o . P o r isso, a bürgerliche G esellschaft é certam en te o te r
reno de aplicação do direito p rivado, que vigora plen am en te e n q u a n to tal n a sua
SO C IE D A D E E E S T A D O NA F IL O S O F IA P O L lT IC A M O D E R N A 149
“ superfície” (onde ela se m o stra pro p riam e n te com o sociedade “ civil” ou dos priva
dos; o jovem M arx incluía n u m conceito ain d a apenas “ superficial” de sociedade civil
tam b ém a Polizei, tal com o H egel, e isso não no com entário ao texto hegeliano, m as
nas observações ao a rt. 8 d a C onstituição francesa “p ro g ressista” de 1793, referente à
súrété: cf. Judenfrage, ed. cit., p . 379). M as ela se co nstitui em su a necessidade espe
cífica no nível estru tu ral d a relação capitalista, e, p o rta n to , define-se com o sistem a
econôm ico, e não tam b ém , ao m odo de H egel, com o sistem a adm inistrativo e ju r í
dico. A ssim , a bürgerliche G esellschaft não é m ais d efinida tam b ém com o “ E sta d o ”
dos privados, co n trap o sto e n q u a n to ta l, p o r H egel, ao E sta d o "p ro p ria m e n te p o lí
tico” . E isso p o rq u e o E stad o , que tra z à realidade o direito (en q u an to “ condição
geral d a p ro d u ção ” : Grundrisse, p . 413) e m ediatiza os extrem os contrapostos e seus
conflitos, n ão vale m ais, p a ra M arx, realm ente com o universal. Se ele se a p resen ta
com o tal, essa é su a face ilusória (a vontade e a força gerais são “ com u n id ad e” so
m ente n a ap arência): a realid ad e efetiva do E stad o é oposta, é p a rtic u la r, n a m ed id a
em que ele põe as condições gerais de u m sistem a social (ou org anização d a produção)
não som ente privatista, m as fu n d ad o n o dom ínio de u m a classe e o rganizado de m odo
a rep ro d u zir ta l dom ínio. P o rta n to , a ação do E stad o n ão está n ecessariam ente, de
m odo direito, a serviço d a b urguesia; m as, de q u alq u er m odo, se põe a serviço do
sistem a no q u al e pelo q ual a b u rg u esia existe com o classe d o m in an te.
150 M ICH ELA N G ELO B O V ERO
(18) P a ra to d a essa pro blem ática, cf. M . Riedel, op. c it., sobretudo os ca
tulos “ T radição e revolução na Filosofia do direito de H egel” e “ O conceito de ‘socie
dade civil' e o p roblem a de sua origem histórica” .
Uma comparação entre os modelos
(3) Grundrisse, p . 6.
(4) FD 187.
(5) Grundrisse, p. 6.
156 M ICH ELA N G ELO BO V ERO
(6) Grundrisse, p . 74. T am bém nesse trecho h á u m a clara rem iniscência he-
geliana. Cf. as Lições sobre a filosofia da história: “ A liberdade é concebida só neg a
tivam ente quan d o é im ag in ad a com o se o sujeito lim itasse com relação a outros sua
liberdade, de m odo que essa lim itação coletiva, o fato de que todos obstaculizam uns
aos outros, deixasse a c ad a qu al o pequeno lu g ar no q u al se pode m over” (tra d . it.,
Florença, L a N uova Italia, 1977, vol. I, p . 104). Todavia, nesse local, Hegel se refere
à concepção kan tian o -fich tean a do E stado, e não à relação econôm ica en tre interesse
privado e interesse coletivo. Sobre isso, parece haver em FD u m a inclin ação inicial no
sentido d a visão o tim ista típ ica d a econom ia política clássica. M as, p a ra essa com o
p a ra ou tras questões, deve-se acolher a interpretação de R . Bodei: “ H egel, h a b itu a l
m ente, repete, rep ro d u z e situ a no sistem a pontos de vista alheios (...) . O u seja: não
fala p o r su a p ró p ria boca, n a perspectiva do fiir uns, m as deixa que ‘a coisa' fale e
que seja o desenvolvim ento subseqüente a criticar objetivam ente, a redim ensionar o
cará te r absoluto de c ad a degrau do desenvolvim ento do conjunto” . (C f. “ H egel e
1’econom ia p olitica” , in S. V eca, e d ., Hegel e Veconomia politica, M ilão, M azzotta,
1975, p p. 56-7. O volum e inclui tam bém dois in teressantes ensaios de R . R acinaro e
M. B ar ale.)
(7) Grundrisse, p . 74.
(8) FD 182 Z, 1 8 1 Z.
(9) A prim eira expressão é conhecida p ela Enciclopédia (cf. o § 523); m as ela
já se en co n tra, ju n ta m e n te com a segunda, n a D ifferenz des Fichte schen u n d Schel-
lingschen System s der Philosophie, tr. ital., em H egel, P rim i scritti critici, M ilão,
M ursia, 1971, p . 70. Nesse escrito juvenil (1801), aparecem tam b ém o u tras noções,
com o a de “ E stado de in telecto” , que o Hegel d a m atu rid ad e irá utilizar p a ra a bür-
gerliche G esellschaft. A analogia é surpreendente; m as, n a análise d a construção
fichteana (u m a d aquelas em que, p a ra recordar a expressão de FD 258 A, “ confun-
de-se a sociedade civil com o E stado”), o aspecto da desagregação é fo rtem ente acen
tu ad o e im ediatam ente contraposto, sem possibilidade de conciliação, à q u alidade
orgânica que a p a rtir de en tão Hegel sem pre a trib u iu ao E stado.
S O C IED A D E E E STA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D E R N A 157
(10) F D 1 8 2 Z .
(11) Cf. K an t, op. c it., p . 493. M as deve-se im ediatam ente observar que, com
o m esm o argum ento, K an t in tro d u z u m a distinção en tre a sociedade e o E stado:
“ porque e n tre quem tem o com ando, ou seja, o soberano (im perans), e o súdito
( subditus ), não h á nen h u m a com unidade: eles n ão são sócios, m as um é subordinado
ao ou tro , e n ão coordenado , e os que são coordenados en tre si devem se considerar
como iguais e precisam ente n a m edida em que são subm etidos a leis com uns” (ibid.).
N essa idéia d a diferença de e stru tu ra en tre a relação social e a relação política — que,
de resto, não é nova, pois já P ufendorf distinguia en tre a sociedade nascida do p ri
m eiro c o n trato e o E stad o nascido do segundo co n trato com o u m a societas aequalis
em contraposição a u m a societas inaequalis — , deve-se ver a figura potencial da dis
tinção entre bürgerliche G esellschaft e politischer Staat. M as seria errad o tom á-la
como u m a distinção em a to : p o rq u e, aq u i, a relação priv ad a não é já em si social, m as
— e n q u an to relação social — é precisam ente institu íd a, “ p ro d u zid a” pelo E stad o .
158 M IC H ELA N G ELO B O V ERO
(12) F D 261.
(13) Cf. acim a, o final d a n o ta 66. A qui, parece-m e ain d a in teressante obser
var apenas que, q uando M arx fala de po d er ou violência política (m as Gewált é ta m
bém cad a um dos poderes constitucionais do E stado em H egel), o E stado aparece
tendencialm ente n a figura do governo e, em tal figura, é sem pre considerado com o
negativo em si m esm o. Com efeito, essa parece ser p a ra M arx a realidade efetiva do
E stado: “ O direito do m ais fo rte” que, como ele critica nos econom istas burgueses,
“ continua a viver sob o u tra form a tam b ém no seu ‘E stad o de direito’ ” (Grundrisse,
p . 10). Ao contrário, q u ando M arx fa la do querer político ou d a com unidade política,
o E stad o aparece tendencialm ente n a figura do P arlam ento; e, em tal figura, ele é
considerado com o negativo som ente en q u an to universalidade ilusória (e, p o r isso,
e nquanto rem ete à sua figura real, o p oder de governo), e não p o r aqu ela q ualidade
m esm a de com unidade, que ele falsam ente assum e. P o r isso, se a realidade efetuai do
E stado reside no governo, e, p o rtan to , n a heteronom ia que ele expressa, sua verdade
é o não-E stado, ou, se preferirm os, o E stado "não-político” , que pode valer com o
universalidade efetuai com a reabsorção do E stado (as fam osas “ funções sociais ge
rais”) sob o p o d er d a sociedade. O c a ráter de com unidade “ verdadeira” que o E s
tado, em p a rtic u la r o hegeliano, reivindica p a ra si p ode p erten cer de m odo efetivo
tão-som ente a u m a com unidade sem governo, ou seja, autogovernada. M as — acres
centa M arx — não certam ente u m a com unidade n a form a d as com unidades p rim iti
vas, m as sim n a de u m a associação que, enquanto tal, pressupõe a livre individua
lidade.
Da gênese à estrutura
da sociedade moderna
(2) São as célebres palavras que Hegel dedica ao m ovim ento revolucioná
francês, e a R ousseau com o seu in sp irad o r ideal, em F D 258 A.
164 M ICH ELA N G ELO B O V ERO
1969; R. A schcraft, “ Locke’s state of n atu re. H istorical fact o r m oral fic
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u nd Politik bei John L ocke, F ran k fu rt, 1969 (B ári, 1976); G . Bedeschi,
“ Locke filosofo della società civüe” , in G iom ale Crítico della Filosofia I ta
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(1? ed ., 1950); W . von Leyden, “ La loi, la liberté e t la prerogative dans la
pensée politique de J. Locke” , in Revue Philosophique de la France e de
VÉtranger, 1973; K. Olivecrona, “ Locke on the O rigin of P roperty” , in
Journal o f History o f Ideas, 1974; “ Locke Theory of A ppropriation” , in
Philosophical Quarterly, 1974; “ T he T erm ‘P roperty’ in Locke’s Two T rea
tises of G overnm ent” , in A rchiv f ü r Rechts- u n d Sozialphilosophie, 1975;
M . Rostock, Die Lehre von der Gewaltenteilung in der politischen Theorie
von J. L ocke, M eisenheim am G lan, 1974; G . Z arone, J. Locke: Scienza e
form a della politico, B ári, 1975; R . A. Goldwin, “ Locke’s S tate of N ature
in Political Science” , in Western Political Quarterly, 1976; J. H . F ran k lin ,
J. L ocke an d the Theory o f Sovereignity, C am bridge, 1978.
G ottfried W ilhelm Leibniz (1646-1716) — As teorias filosófico-jurí-
dicas de Leibniz estão dispersas em escritos fragm entários e incom pletos;
os principais foram publicados p o r G . M ollat, Rechtsphilosophisches aus
Leibnizens ungedruckten Schriften, Leipzig, 1885 (2? ed. am pliada, M ittei
lungen aus Leibnizens ungedruckten Schriften, Leipzig, 1893); trad , ita
lian a de V. M athieu, T u rim , 1951. A inda útil a m onografia de E . R uck, Die
Leibnizsche Staatsidee aus den Quellen dargestellt, T übingen, 1909. F u n
dam entais, pela riqueza d a docum entação, os dois livros de G . G ru a, Juris
prudence universelle et théodicée selon Leibniz, P aris, 1953, e La justice
hum aine selon L eibniz, P aris, 1956. Sobre pontos singulares do seu p en sa
m ento ju rídico: G . Solari, “ M etafísica e diritto in Leibniz” , in Rivista di
Filosofia, 1947, e N. Bobbio, “ Leibniz e Pufendorf” , ibid. T am bém G .
Aceti, “ Sulla Nova M ethodus discendae docendaeque iurisprudentiae di
G offredo G uglielm o L eibniz” , in Jus, 1957, e “ Jakob T hom asius e il pen-
siero filosofico-giuridico di Leibniz” , in Jus, 1957. A dem ais, as duas m ais
recentes m onografias sobre o tem a: K. H erm ann, D as Staatsdenken bei
Leibniz, Bonn, 1958, e H . P. Schneider, Justitia universalis. Q uelenstudien
zu r Geschichte der cristilichen N aturrecht bei G. W . L eibniz, F ra n k fu rt,
1967.
Christian Thom asius (1655-1728) — O bras: Institutionesiurispruden
tiae divinae, F ra n k fu rt e Leipzig, 1688, e F undam enta iuris naturae et gen
tium ex sensu com m uni deducta in quibus secernuntur principia honesti,
iu stia c decori, H alle, 1705. Escritos bio- e bibliográficos: M . Fleischm ann,
Christian Thomasius, Leben u n d Lebenswaerk, H alle, 1931; R . Lieber-
W irth, Christian Thomasius, sein wissenschaftsliches Lebenswerk. E ine B i
bliographie, W eim ar, 1955; G . Sim son, Einer gegen Alle. Die Lebensbilder
von Christian Thom asius, M unique, 1960. Sobre o pensam ento filosófico-
jurídico, a única m onografia com pleta é a de F. B attaglia, Cristiano To-
masio, filosofo e giurista, R om a, 1936, à qual se segue a resenha crítica de
G . Solari, “ C ristiano T om asio” , in Rivista di Filosofia, 1939 (depois em
SO C IED A D E E E S TA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D ER N A 171
II
H egel-M arx. A relação en tre Hegel e M arx foi e stu d ad a dos m ais di
versos pontos de vista e em função dos m ais variados tem as. Indicarem os a
seguir, sem n en h u m a pretensão exaustiva e com m aior atenção às contribui
ções m ais recentes, apenas os trabalhos que, d ireta ou indiretam ente, refe-
rem -se aos problem as de filosofia política tratad o s no presente volume: P.
Vogel, Hegels G esellschaftsbegriff u nd seine geschichtliche Fortbildung
durch Lorenz von Stein, M arx, Engels un d Lassalle, B erlim , 1925; S. H ook,
From Hegel to M arx, Londres, 1936 (Florença, 1972); K. Löwith, Von H e
gel zu N ietsche, Z urique, 1941 (T urim , 1949); C. A ntoni, C onsiderazionisu
Hegel e M a rx, Nápoles, 1946; J. H yppolite, É tudes sur M arx et Hegel, P a
ris, 1955(M ilão, 1965, 2? ed ., 1973); I. Fetscher, “ D as V erhältnis des M a r
xism us zu H egel” , in M arxism usstudien, III, T übingen, 1960 [ed. b rasi
leira: “ Relação entre m arxism o e H egel” , trad . de H eidrun M . da Silva, in
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ris, 1963; J. H aberm as, Theorie u n d Praxis, N euwied-Berlim , 1963, 3? ed.,
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ria politico d i M arx, M ilão, 1970; R. M iliband, “ Stato e rivoluzione” ,
M onthly Review, ed. it., 1970; P. Naville, Le nouveau Leviathan. I: De
l'aliénation à la jouissance, P aris, 2? ed ., 1970; G . V acca, Scienza, Stato e
critica d i classe, B ári, 1970; U. C erroni, Teoria della crisi sociale in M arx,
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Socialismo, 1973; R. G uastini, “ Alcune tap p e del pensiero di M arx sullo
SO CIED A D E E ESTA D O NA FIL O SO FIA P O L lT IC A M O D ER N A 179