Você está na página 1de 2

Por muito tempo critiquei e desprezei os fariseus e suas condutas até chegar a um ponto

que eu entendi que em mim habita um fariseu, no sentido estrito da semântica da palavra,
como veremos ao longo do corpo deste texto. Todos nós os desprezamos e ficamos até
com raiva quando eles aparecem nas narrativas afim de perturbar Jesus, testá-lo e
desafiá-lo. Nós não temos muita paciência com ao fariseus, até descobrirmos que dentro de
nós pode habitar um.
Partimos ao mundo dos fariseus procurando entender a origem deles e de seu nome. O
nome fariseu vem do hebraico‫ פרושים‬prushim. Prushim, por sua vez vem da raiz da
palavra parash que basicamente quer dizer "separar", "afastar". Assim, o nome prushim
pode ser interpretado como "aqueles que se separaram" do resto do povo comum para se
consagrar ao estudo da Torah (Gênesis, Êxodo, Levítico e Números) e suas tradições
correspondente. Entretanto, sua separação não envolvia um afastamento espiritual
(ascetismo) id est, “a disciplina e o autocontrole estritos do corpo e do espírito, um caminho
imprescindível em direção a Deus, à verdade ou à virtude”, pois eles achavam
imprescindível o ensino à população das escrituras e das tradições dos pais.
“A origem mais provável dos prushim é que tenham surgido do grupo religioso judaico
chamado hassidim (os piedosos), que apoiaram a revolta dos Macabeus (168-142 a.C.)
contra Antíoco IV Epifânio, rei do Império Selêucida, que incentivou a eliminação de toda
cultura não-grega através da assimilação forçada e da proibição de qualquer fé particular.
Uma parte da aristocracia da época e dos círculos dos sacerdotes apoiaram as intenções
de Antíoco, mas o povo em geral, em baixo a liderança de Judas Macabeu e sua família. Os
hassidim que, geralmente, desiludidos com a política, voltaram-se para a vida religiosa e
estudo da Torá, esperando pela vinda do Messias e do reino de Deus, dando vida ao partido
dos fariseus posteriormente. Os prushim agrupavam-se em associações religiosas que
tinham os seus líderes e suas assembleias, e que tomavam juntos as suas refeições.
Segundo Flávio Josefo, historiador judeu do século I d.C., o número de prushim na época
era de pouco mais de seis mil pessoas. Eles estavam intimamente ligados à liderança das
sinagogas, ao seu culto e escolas. Eles também participavam como um grupo importante,
ainda que minoritário, do Sinédrio, a suprema corte religiosa e política do Judaísmo da
época. Muitos dentre este grupo tinham a profissão de sofer (escriba), ou seja, a pessoa
responsável pela transmissão escrita dos manuscritos e da interpretação dos mesmos.”
Os fariseus já nasceram radicais, acreditavam na observância estrita da Lei. Ao agir desta
forma, este grupo acreditava que agradaria a Deus pelo seu modus operandi exemplar aos
olhos de quem quer que fosse. É um erro chama-los de hipócritas, no sentido normal da
palavra que indica aquele que fala uma coisa, mas faz outra, não havia um grupo na
sociedade de sua época que seguiam cada milímetro da Lei estabelecida, pois assim
conseguiriam se justificar diante Deus, criando assim os arrotos de santidade. Quando
Jesus os chama de hipócritas (Mt 23), Jesus está atando que eles passaram a observar
tanto da Lei que diziam “Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens,
roubadores, injustos e adúlteros” (Lc 18.11), davam o dízimo contado de tudo o que tinham
(Mt 23), mas se esqueciam do principal, desconsideram “ o que há de mais importante na
lei, a saber, a justiça, a misericórdia e a fé; estas coisas, porém, deveriam fazer.” (Mt 23) Eis
a razão de serem chamados de hipócritas, pois ao ficarem cegos com todo o zelo que
possuíam com a Lei, eles esqueceram do principal, esqueceram que o coração da Lei é
justiça e misericórdia, isto eles não praticavam. Os fariseus segregavam, separavam,
expulsavam, humilhavam, não assentavam a mesa com os pecadores imundos, se
consideravam melhores, superiores, justificados, pois acreditavam que ao seguir a Lei, letra
por letra tinham direito de agir assim, acreditando estar agradando a Deus. Por esta razão,
eles se enfureciam com Jesus que se assumiu como Messias judaico. Era função dos
fariseus identificarem o messias quando ele chegasse, pois naquela época muitos líderes
que se proclamavam messias pululavam pela palestina. Os fariseus eram os protetores da
Torah, cumpridores fiéis, logo quando Jesus aparece reivindicando o título messiânico, eles
correm para testá-lo e observá-lo, pois o povo esperava que eles apontassem o messias, a
mente deles estavam no lugar certo, porém seus corações não. Cristo fez todos os sinais
que apontavam ele como messias, porém os fariseus não conseguiam aceitar aquele que
agia com misericórdia para com o pecador, comia com eles, e reinterpretava as leis da
pureza ritual com amor e compaixão.
Durante todo o corpo deste texto, me identifico com os fariseus. O meu fariseu interno grita
para segregar, apontar o erro, separar e etc. aqueles que não “seguem a Lei”, aqueles que
julgamos estar acima, pois não somos pecadores como eles, somos separados, nascemos
em berço santo, nossos pecados não são comparáveis, nossas atitudes são melhores,
cumprimos a Lei e queremos que os outros cumpram. Se eles não cumpriram a Lei em suas
vidas, não são dignos de nós, não são merecedores de nova chance, são execrados e
fadados a levarem seus rótulos de pecadores por toda a vida. Quantas vezes por nos
acharmos que não pecamos em algumas coisas, negamos a graça e a misericórdia aqueles
que pecaram? Quantas vezes, por cumprirmos a Lei e os outros não, nós os vigiamos,
colocamos “fardos pesados demais para serem carregados” pelas pessoas, porque, afinal,
nós cumprimos e nos achamos superiores a eles. Acaso nossa arrogância não é um pecado
maior? Acaso nosso coração farisaico não é duro suficiente que nos leva a cegueira quanto
ao não existir méritos próprios no reino de Deus? Precisamos urgentemente do antídoto, e
ele se chama Graça redentora e justificadora. Ah, essa Graça que foi dada por Deus, Pai e
reproduzida no Deus, o Filho para nos redimir, nos santificar e nos tirar do peso da Lei. E eu
como bom fariseu, não a entendo e às vezes, não a aceito.

Você também pode gostar