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“Síndrome da Gaiola”: o desafio do retorno às aulas presenciais

Isolamento vivenciado por jovens agrava medos e inseguranças e faz com que crianças e
adolescentes não queiram contato com o mundo exterior
Toda mudança de hábito acarreta ajustes significativos na vida das pessoas, principalmente em
questões emocionais. Mesmo os jovens, que possuem mais facilidade para se adaptarem
a outros cenários, sofrem com as diferenças e necessitam de ajuda para encarar o novo. É o
caso da pandemia, que transformou a rotina de estudos e trouxe mais um desafio com o
retorno às aulas presenciais: a “Síndrome da Gaiola”. 
Durante um ano e meio, a rotina escolar se dividiu entre o ensino presencial e
híbrido. Enquanto de um lado há jovens que tiveram dificuldades em se adaptarem às aulas
remotas e a perda de convivência escolar, no outro existe aqueles que se moldaram muito
bem a nova realidade e hoje possuem receio de voltar a rotina presencial. 
Tal apreensão em ter contato com o mundo exterior é chamada de Síndrome da Gaiola,
fenômeno que, segundo o psicólogo da Unimed VTRP, Luis Fernando da Veiga, pode mascarar
adoecimentos psicológicos ou provocar outros, se não assistido corretamente.
“A nomeação desse fenômeno dá-se em analogia as aves que crescem em cativeiros e quando
a gaiola é aberta permanecem dentro do espaço que, até o momento, estava
trancado” explica.  

O psicólogo afirma que esse comportamento está relacionado a um conjunto de pensamentos,


emoções e sentimentos os quais podem denunciar diferentes quadros clínicos como depressão
e ansiedade. “Também pode ser mais uma resposta desadaptativa aos eventos estressores que
os jovens foram expostos”. 
Mudança de comportamento 

A dificuldade de adaptação às aulas remotas e a perda de convivência escolar mexeram com o


emocional de crianças e adolescentes. “As novas demandas e formatos de aprendizagem e
socialização implicaram adaptações, reciclagens e ressignificações e devemos aproximar a
nossa ótica para os silenciamentos”, salienta Veiga. 

O grande desafio do momento, para os pais e comunidade escolar, é identificar o que são
respostas esperadas em um cenário inesperado e quais são as alterações que servem como
sinal de alerta.  

“Mudanças ocorrerão e são legítimas, contudo, devemos atentar para alterações significativas
de comportamentos que denunciam sofrimento. Nesses casos, deve-se acionar a rede de
apoio familiar e clínica para assistir e/ou prevenir transtornos psiquiátricos”.
Por isso é importante que os pais (e educadores) conheçam e acompanhem de perto os filhos,
afim de reconhecer a intensidade e frequência de sentimentos e comportamentos de cada
um. E claro, é preciso que os adultos também cuidem da sua saúde para que assim possam
proporcionar segurança aos pequenos.  
“Toda essa movimentação ocorreu em meio às incertezas e medos e todas as pessoas a volta
dos estudantes também vivenciaram muitas mudanças e acessaram as suas vulnerabilidades”,
completa Veiga. 
Então, como os jovens podem retornar as aulas presenciais? 

O que fará a diferença nesse processo de adaptação a realidade às aulas presenciais é o olhar
atento e a escuta sensível dos pais e educadores, em uma comunicação não agressiva e que
assegure o acolhimento. 
“Os adultos devem provocar o apego seguro, ou seja, fazer entender que o jovem tem direito a
falar sobre as suas questões, clarificar os recursos de enfrentamento, encorajar com
honestidade e respeito os seus sentimentos, assistindo os sinais e sintomas de sofrimento e
sempre aproximando a relação entre a família e a escola”, sugere o psicólogo. 
Já para as crianças e adolescentes o primeiro passo é entender que o medo é uma emoção
comum ao ser humano e que está relacionada a autoproteção e autopreservação. Em seguida,
é preciso assimilar os gatilhos temerosos e validar os pensamentos e aflições que os
acompanham. 

Para superar o medo de sair de casa, Veiga dá algumas dicas para os jovens: 

 Comece com saídas mais curtas e em lugares com menos dispositivos estressores 
 Siga os protocolos sanitários de cada local para se sentir mais seguro 
 Utilize técnicas de respiração para auxiliar no gerenciamento da ansiedade 
 Coloque pensamentos, ideias e preocupações no papel, isso ajudará a encontrar
resoluções de forma mais fácil e visível 
 Aposte no autoconhecimento 
 Em caso de muito sofrimento, não tenha medo de acionar a rede de apoio 

Outro movimento importante para conseguir conciliar a necessidade do isolamento e retorno


gradativo a realidade presencial, de acordo com o psicólogo, é manter o autocuidado com
momentos de lazer e relaxamento individual e com familiares, desconectando-se das redes
sociais. 
Realizar exercícios físicos é uma ótima pedida para melhorar o humor, o ciclo do sono, a
atenção, a concentração, o raciocínio, o pensamento e a memória. “Reserve momentos para
contatar amigos pela modalidade virtual, mas quando o encontro ocorrer presencialmente
com os colegas, compartilhe as suas questões internas e entenda que cada pessoa está
construindo a sua caminhada de retornos e com a sua própria bagagem pandêmica”.  
Realidade virtual X presencial 

Ainda que a tecnologia tenha desencadeado alguns desafios para as pessoas, é preciso
destacar que ela também foi fundamental para a continuação da relação dos seres. Afinal, sem
as redes sociais e o uso de ferramentas virtuais, boa parte da população estaria totalmente
isolada e propensa a desencadear maiores problemas sociais e psicológicos. 
O universo virtual é um lugar de encontro com regras, propósitos e políticas que podem
democratizar alguns acessos. Além disso, é também um ambiente que privilegia o acesso
a tarefas, assistências, conteúdos, entretenimento, fóruns e faz a palavra circular, escutar e ser
ouvida. 
“Passado um ano e meio de Pandemia entendemos ganhos importantes considerando o
universo virtual como a ampliação e refinamento das tele consultas, dos grupos de apoio on-
line, do trabalho Home Office e do ensino virtualizado”. Muito daquilo que criamos ou
potencializamos veio para ficar e, considerando a necessidade de isolamento, os recursos on-
line são canais de informação e pontes de socialização, validação e fortalecimento das redes
de apoio, afirma Veiga.  
A questão é saber utilizar a tecnologia de maneira correta e a nosso favor, afim de evitar que o
uso demasiado de telas, seja em tempo de uso ou a qualidade do conteúdo consumido,
implique em adoecimentos físicos e psíquicos. 
“O contato presencial é um ambiente fértil para fortalecimento das vinculações,
reconhecimento de si e do outro na construção identitária, treino de habilidades sociais e da
comunicação assertiva em campo. O ser humano também se constrói como sujeito a partir do
olhar e validação do outro, dessa maneira, as interações sociais são lubrificação existencial”. 

Especialistas em educação têm apontado que o longo período de afastamento das escolas traz
prejuízos socioemocionais e de aprendizagem às crianças e jovens, principalmente entre os
mais vulneráveis, que não possuem os mesmos acessos à tecnologia.
 
Já na área de saúde, os especialistas se dividem: parte destaca evidências científicas sobre a
segurança do retorno com protocolos sanitários e o baixo risco de infecção entre crianças,
enquanto outros apontam a chance de transmissão maior com o aumento da circulação da
comunidade escolar, incluindo professores, funcionários e famílias dos alunos. 
 
A Sociedade Brasileira de Pediatria ponderou todos os pontos e se mostrou a favor do retorno
presencial, visto que a faixa etária pediátrica não exerce papel fundamental na cadeia de
transmissão. Mas atenção, para que tudo corra bem é necessário que os cuidados na volta às
aulas sejam redobrados!
 
Cuidados redobrados na volta às aulas

As escolas que já reiniciaram as aulas presenciais tomaram diversas medidas para garantir a


segurança dos alunos e dos funcionários. No estado de São Paulo, a solução escolhida foi fazer
um rodízio dos alunos, o que torna necessária a adaptação das escolas para o ensino híbrido,
em que parte da sala assiste às aulas presencialmente e o restante por vídeo, revezando os
dias da semana.
 
Além do preparo tecnológico, são essenciais as medidas sanitárias. As carteiras devem estar
separadas a 2 metros uma da outra, e os alunos devem ter acesso a álcool gel para
higienização das mãos. É importante garantir a circulação do ar, mantendo as janelas
abertas mesmo com as temperaturas mais baixas.
 
No recreio, nada de aglomerações ou divisão de alimentos. As crianças devem ser orientadas a
manter o distanciamento, principalmente enquanto estiverem sem máscaras para comer o
lanche. Não deve ser permitido o compartilhamento de objetos e a dica é mandar para a
escola, pelo menos, 2 garrafinhas de água, para que as crianças não utilizem os bebedouros. 
 

O papel das famílias 

Para a segurança de todos na volta às aulas presenciais, é preciso que toda a comunidade
escolar esteja consciente dos cuidados necessários, e as famílias têm um grande papel na
orientação das crianças e adolescentes sobre isso. 
 
Mais de 1 ano após o início da pandemia de coronavírus, a maioria dos alunos já está
acostumada ao uso das máscaras e ao distanciamento social, mas é importante reforçar esses
cuidados com os filhos para que a animação ao rever os amigos não acabe fazendo com que se
esqueçam deles.
 
Na organização do material escolar, é uma boa ideia checar na noite anterior se todos os itens
necessários estão na mochila: 2 máscaras (uma para uso e outra para troca), saquinho para
armazenar a máscara usada, garrafinhas de água e demais materiais individuais.
 
Além de usar máscaras o tempo todo, é importante orientar as crianças sobre como tirá-las
sem se contaminar, e armazená-las de forma que não tenha contato com outros objetos.
Lembrando que nada disso dispensa a lavagem das mãos, esfregando com sabão e usando
álcool gel para higienizá-las com mais frequência.
 
Que tal um checklist? Assim, você não esquece de nenhum dos hábitos que deverão fazer
parte da rotina escolar e pode apoiar e reforçar com as crianças na volta às aulas presenciais.
Anote aí:
 

 Uso de máscara, levando máscara reserva e armazenando as máscaras sujas em um


lugar adequado;

 Higienização constante das mãos, lavando com sabão e passando álcool gel;

 Manter o distanciamento entre as carteiras e em outros espaços, inclusive no recreio;

 Não compartilhar materiais nem alimentos, levando sua própria garrafa de água e
lanche;

 Não ir à escola caso haja qualquer sintoma suspeito ou tenha tido contato com alguém
infectado.

 
Como cuidar da saúde física e mental na volta às aulas presenciais
Reunimos dicar para você continuar se cuidando da sua saúde física e
mental com a flexibilização do isolamento social

Muitos devem estar preocupados com a recuperação do conteúdo escolar. De acordo com a
pesquisa “Juventudes e a Pandemia do Coronavírus”, da Conjuve (Conselho Nacional da
Juventude),... oito em cada 10 jovens entre 15 e 29 anos realizaram alguma atividade via
ensino remoto. Mas pelo menos 48% deles sentiram dificuldade em organizar seus estudos em
casa .

Essa situação pode deixar a sensação de que o ensino ficou defasado e que há muito conteúdo
para recuperar.

Porém é preciso diminuir a cobrança sobre si mesmo e reconhecer que passamos por um
momento atípico. Diretora executiva e psicóloga do LIV, Joana London comenta que já é difícil
lidar com a autocobrança em um momento normal. “É preciso ter um olhar mais cuidadoso
agora que estamos socialmente vivendo um momento inesperado”. Apesar da ansiedade para
que tudo volte a ser como antes, é preciso reconhecer que estamos aprendendo a lidar com
esse “novo normal”. Praticar a “não-cobrança” vai ajudar controlar esse sentimento.

Tenha sua própria garrafa de água

De acordo com as recomendações do Ministério da Educação, as medidas individuais serão


uma parte importante no combate à transmissão do novo coronavírus.

Por isso, o Hospital Sírio Libanês, de São Paulo (SP), vem dando consultorias para escolas a fim
de garantir segurança na volta às aulas. A infectologista do hospital Maura Salaroli afirma que
os bebedouros devem ficar interditados.

Então, use somente a sua garrafa de água e tenha cuidado para não encostá-la no bebedouro
quando for enchê-la novamente. Lembre-se de que ainda não sabemos quem pode estar
infectado com o vírus e que ...

Normalize sua rotina de sono

Dormir é uma das partes mais importantes do aprendizado. Um estudo da Universidade de


Lübeck, na Alemanha, de 2017, mostrou que é durante o sono que a memória consolida novas
informações. Nesta pesquisa, comprovou-se que aqueles que têm uma boa noite de descanso
lembram muito mais das informações úteis. Organize seus dias e horários de estudo e
mantenha, pelo menos, 8 horas de diárias de sono.

Não abandone a máscara e o álcool em gel

Essa recomendação foi a mais repetida durante a pandemia, certo? Mas é importante
lembrarmos que, mesmo com a abertura dos espaços públicos, a máscara e o álcool em gel
serão os nossos companheiros. O Sírio Libanês aponta a importância de as escolas
disponibilizarem álcool em gel em todos os ambientes. Mas Maura afirma ser importante,
também, que cada aluno carregue a sua solução e higienize as mãos com frequência,
principalmente ao tocar superfícies de contato coletivo, como portas e corrimões, por
exemplo. E a higienização deve ser feita da maneira correta: o gel deve entrar em contato com
a mão inteira e deve-se esfregar por, pelo menos, 20 segundos.

á sobre a máscara, ela comenta que será importante ter uma ou duas reservas para uma
possível substituição. Não existe uma obrigatoriedade de trocar a máscara após refeições ou
um período específico de tempo, mas a troca deve ser feita caso a máscara usada fique úmida.
É sempre bom ter dois recipientes: um para guardar as máscaras limpas e outro para colocar
as que ficarem sujas.

Esteja atento ao que você sente…

A pandemia provoca um turbilhão de sentimentos. É normal que, nessa volta, estejamos


cheios de medos, preocupações e ansiedade. Estar atento a si mesmo inclui organiza seus
estudos e recuperar os conteúdos necessários, como comentamos antes, mas também aos
seus sentimentos.

“Todos nós somos atravessados pela ansiedade, mas é preciso reconhecer quando ela nos
impulsiona para realizar as coisas e quando ela nos paralisa”, diz Joana. Tentar perceber
quando você não está se sentindo motivado e ter uma rede de apoio, seja na escola, na
própria família ou com os colegas, é importante. “Pode parecer simples, mas, às vezes,
esquecemos de pedir ajuda”, afirma.

… E também aos seus colegas

Apesar de todos terem passado pela pandemia, cada um viveu experiências muito diferentes.
Algumas pessoas passaram por momentos difíceis, perderam pessoas próximas ou podem até
se sentir desmotivadas frente aos acontecimentos. Esteja atento aos seus colegas e tente
entender a vivência do outro. A psicóloga do LIV conta que vai ser um momento importante
para os adolescentes se fortalecerem como grupo, o que significa criar espaços seguros para
conversarem entre si e se apoiarem.

Distância no intervalo

Nesse momento, o recreio exigirá um cuidado maior dos alunos. Isso porque, para se
alimentar, os estudantes devem retirar as máscaras, sendo mais expostos, então, ao risco de
risco de contágio. O Sírio-Libanês pede que as escolas estabeleçam um período mais breve
para o intervalo, além de orientar que os alunos mantenham o distanciamento de 1,5 m (ou
dois braços de o distanciamento de 1,5 m (ou dois braços de distância) e evitem conversar.
Aliás, os estudantes não devem dividir o lanche trazido de casa.

Não compartilhe seu material

Outro ponto importante é evitar o compartilhamento dos materiais. Sabe quando você se dá
conta de que esqueceu a caneta em casa? Evite pedir para os colegas ou mesmo de emprestar
seus materiais – canetas, cadernos ou mesmo folhas de papel. Maura menciona que, “se o
compartilhamento for inevitável, o objeto deve ser higienizado ou você deve higienizar as
mãos antes e após tocar o material”.
Evite aglomerações

Seja na entrada e na saída da escola ou durante os intervalos, evite formar aglomerações com
seus colegas de classe. Mantenha-se atento ao distanciamento de dois braços (como
mencionado acima) e evite formar rodas de conversa com muitas pessoas e, também, praticar
brincadeiras coletivas. Esportes como futebol, basquete e qualquer outro que envolva contato
não devem acontecer mesmo nas aulas de Educação Física. Evite, também, ambientes
pequenos e fechados como os elevadores.

O olhar

Enquanto os sorrisos estão cobertos pela máscara e os abraços não são possíveis, é preciso
encontrar outras formas de demonstrarmos afeto. Para Joana, por um lado, “esse é um
convite interessante porque o olhar diz muito e a gente aproveita pouco”. Essa vai ser a
maneira, pelo menos por um tempo, para demonstrar afeto e para se comunicar.

Apareceu algum sintoma?

Não vá à escola! Maura afirma que, diferentemente do protocolo habitual, é importante que
as escolas incentivem os alunos a ficarem em casa caso algum sintoma, mesmo que pequeno,
apareça. “É importante que essa medida seja incentivada para os alunos e para os pais”, diz.
Nada de seguir aquela regra antiga de só anular a falta caso o aluno tenha um atestado
médico. Então, evite colocar seus colegas e a si mesmo em risco mesmo que ainda não tenha
certeza sobre a testagem positiva para a covid-19.

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