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ESCOLA BILÍNGUE X ESCOLA INCLUSIVA:

Quem está interessada em uma educação equitativa?

Filipe de Cristo Almeida Pena1


Ana Rita Santiago2

RESUMO

O presente trabalho, “Escola Bilíngue x Escola Inclusiva: Quem está interessada em


uma educação equitativa?”, advém da pesquisa de Mestrado (Pós-Crítica, UNEB), em
andamento, “Tecnologias Assistivas e o Ensino Inclusivo: um estudo sobre
acessibilidade nas escolas municipais de Alagoinhas”. A luta de estudantes com
deficiências para adquirir direitos e serem atendidos de forma equitativa em diversos
aspectos, resulta em variadas leis e decretos a fim de suprir as suas reivindicações. No
âmbito educacional, recorte deste ensaio, essas conquistas iniciaram em 1961, chegando
até a Lei 14.191, sancionada em 2021. Diante do exposto, este texto tem como objetivo
apresentar discussões sobre a Escola Bilíngue, a Escola Inclusiva e a educação
equitativa no contexto da nova lei. Para tanto, a partir de uma análise bibliográfica, o
texto se apoia nos estudos de autores como Miranda (2009), Scotti (2007) e Sposatti
(2010). Espera-se, com este trabalho, a apresentação de alguns conceitos pertinentes à
Educação Bilíngue relacionados à inclusão escolar no que tange aos(às) estudantes com
deficiência visual, bem como às leis e diretrizes referentes aos dois formatos
educacionais, tendo o ponto de vista da comunidade surda apresentado.

PALAVRAS-CHAVE: Escola Bilíngue. Escola Inclusiva. Educação equitativa.

1
Mestrando do programa de Pós-Graduação em Crítica Cultural. DLLARTES/UNEB, Campus II,
Alagoinhas – BA. filipecapena@gmail.com
2
Doutora em Letras e Linguistica (UFBA), Salvador – BA. anaritasantiago16@gmail.com
DE ONDE PARTIMOS
O presente trabalho parte do pressuposto de que uma educação de qualidade
subentende a existência de escolas eficazes e que estejam direcionadas a equidade. De
acordo com o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra equidade significa
“apreciação, julgamento justo; respeito à igualdade de direito de cada um, que
independe da lei positiva, mas de um sentimento do que se considera justo, tendo em
vista as causas e as intenções”, enquanto igualdade significa “qualidade daquilo que é
igual ou que não apresenta diferenças; identidade”. Desse modo, notamos que a
equidade está relacionada com o ato de levar-se em conta as peculiaridades de cada
caso, com as particularidades das partes para se chegar em uma solução
verdadeiramente justa. Neste sentido, não se trata de considerar os indivíduos como
iguais em todos os aspectos, mas de se reconhecer que, mesmo frente à suas diferenças,
estes são iguais em direitos e dignidade.
Em geral, a premissa da igualdade é que todos são iguais perante a lei. Para
Miranda (2009, p.29), “a sociedade que se firma no princípio formal da igualdade é, por
excelência, uma sociedade caracterizada pelas desigualdades sociais que ela promove”.
E isso acontece porque a ideia de igualdade presente nas legislações não atende às
especificidades encontradas em todos os âmbitos da sociedade.
Em artigo que aborda o tema da equidade, analisando as desigualdades na
educação, Scotti argumenta que
A ideia de equidade se refere a uma concepção de distribuição justa, que
respeita a igualdade de direitos. Desta forma, a distribuição dos bens em
questão deve respeitar uma proporção relativa ao direito de cada um.
Distribuição equitativa não é equivalente à ideia de distribuição igualitária.
(SCOTTI, 2007 p.2)

O autor complementa defendendo que a “ideia de igualdade de acesso não pode


ser confundida com igualdade de chances” (SCOTTI, 2007, p. 5). Sposati (2010), em
sentindo semelhante, argumenta que a ausência de equidade provoca a iniquidade, isto
é, a inexistência de acesso justo e igual para que todos superem suas necessidades e
tenham igualdade distributiva ou redistributiva na qualidade de atenção a essas
necessidades e acesso a oportunidades construídas pela sociedade. A autora enfatiza que
o conceito de equidade como parte do princípio da justiça social supõe o respeito às
diferenças como condição para se adquirir a igualdade (SPOSATI, 2010, p.2). Mas,
afinal, quem está interessada em uma educação equitativa?
A EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Para nos aprofundarmos no debate, precisamos compreender o que de fato se
entende por educação inclusiva. No Brasil, ela surge em contextos e momentos
diferentes, ganhando estrutura, principalmente, após a Declaração de Salamandra ser
proclamada em 1994, na qual “define políticas, princípios e práticas da Educação
Especial e influi nas Políticas Públicas da Educação” (UNESCO, 1994). Nesta
Declaração fica reafirmado o compromisso com a educação para todos, reconhecendo a
necessidade e urgência de uma educação para as crianças, jovens e adultos com
necessidades educacionais especiais dentro do sistema regular de ensino. Nesse mesmo
documento, o conceito de educação inclusiva começava a ganhar formato. Hoje, de
acordo com o MEC (2004), entendemos como escola inclusiva
Aquela que garante a qualidade de ensino educacional a cada um de seus
alunos, reconhecendo e respeitando a diversidade e respondendo a cada um
de acordo com suas potencialidades e necessidades. Assim, uma escola
somente poderá ser considerada inclusiva quando estiver organizada para
favorecer a cada aluno, independentemente de etnia, sexo, idade, deficiência,
condição social ou qualquer outra situação. (BRASIL, p.7, 2004)

Com isso, a inclusão de estudantes com deficiências em espaços sociais bem


como em salas de aulas regulares passou a ser legitimada, tendo esse método como um
modo mais avançado de democratização das oportunidades educacionais e como um
meio mais eficaz para superar a discriminação.
Contudo, na prática, conseguimos ainda perceber a inexperiência dos sistemas
de ensino para com estes estudantes. E podemos atribuir isso a diversos fatores,
sobretudo as faltas de investimentos nas salas de recursos, na formação continuada dos
professores, sobrepondo, desta forma, o problema para o estudante.
O sistema de ensino não consegue suprir a necessidade dos surdos nas salas de
aula, e mesmo que haja professores preparados, que conheçam a cultura surda e a língua
de sinais, que haja equipamentos específicos nas salas de recursos, ainda assim não é o
suficiente, pois existe o fator língua, e ela não estará sendo compartilhada, circulando na
sala de aula e na escola, condição indispensável para que os surdos se tornem letrados.

A EDUCAÇÃO BILÍGUE
Derivada de decretos como a de nº 10.502 e projetos de lei como o 4.909/20, a
Lei 14.191, sancionada em 2021, altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), determinando o tratamento da Educação Bilíngue de Surdos como
uma modalidade de ensino independente, onde antes, estava inserida como parte da
Educação Especial. Segundo o art. 60-A, da LDB,
Entende-se por educação bilíngue de surdos, para os efeitos desta Lei, a
modalidade de educação escolar oferecida em Língua Brasileira de Sinais
(Libras), como primeira língua, e em português escrito, como segunda língua,
em escolas bilíngues de surdos, classes bilíngues de surdos, escolas comuns
ou em polos de educação bilíngue de surdos, para educandos surdos, surdo-
cegos, com deficiência auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou
superdotação ou com outras deficiências associadas, optantes pela
modalidade de educação bilíngue de surdos.

Neste sentido, a educação bilíngue pressupõe a utilização da língua de sinais


para o ensino de todas as disciplinas, o que implica a sua utilização como disciplina
curricular nos vários níveis escolares. Desta forma, a língua portuguesa na modalidade
escrita é ensinada como segunda língua, sendo dependente da aquisição da língua de
sinais.
Compreendemos, assim, que o objetivo da educação bilíngue em seu aspecto
linguístico é conceber ao estudante surdo a possibilidade de desenvolver habilidades em
sua primeira língua – a LIBRAS e, na secunda língua - a Língua Portuguesa na
modalidade escrita, isto é, pressupõe que os alunos surdos desenvolvam a competência
e o desempenho em duas línguas.

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS
Estamos diante de duas frentes quando se trata da educação para surdos: uma
que está voltada ao movimento de inclusão e que busca incluir todos os alunos,
independente das diferenças ou dificuldades específicas e outra que se apresenta de
forma independente, buscando superar a desigualdade através de escolas bilíngues.
Diante disso, é apresentada a ideia de inclusão aquela em que todos frequentam
o mesmo ambiente, a aprendizagem sucede de forma natural, bem como aquela que
prepara a comunidade escolar para a convivência, respeito e tolerância às diferenças. No
entanto, conseguimos identificar algumas deturpações em relação ao conceito de
inclusão no que tange ao ensino regular. Para Damázio e Alves (2010, p.40.)
Muitos têm tratado da inserção de alunos com surdez na escola comum como
sendo inclusão, mas o que ocorre, na maioria das vezes, ainda é a integração
escolar, entendida como uma forma de inserção parcial, condicionada à
capacidade de os alunos com surdez acompanharem os demais colegas
ouvintes e atenderem às exigências da escola. A integração escolar tem cunho
adaptativo e continua desrespeitando as especificidades desses alunos.

Ainda de acordo com Damázio e Alves (2010, p. 39), “a inclusão escolar implica
mudança paradigmática, ou seja, uma nova concepção de homem, de mundo, de
conhecimento, de sociedade, de educação e de escola, pautada na heterogeneidade, na
não dualidade, na não fragmentação”.
A partir do que apresentamos e discutimos, podemos chegar a compreensão de
que apenas estimular a inclusão não traz uma colaboração efetiva de combate, pelo
contrário, ela pode estar reforçando com as desigualdades entre as pessoas, uma vez que
elas devem ser superadas. Então, retornamos a questão sobre qual sistema está, de fato,
interessado em uma educação equitativa.
Para responder essa pergunta, precisaríamos que outras questões fossem
respondidas, no entanto, conseguimos compreender até aqui que determinar um tipo de
escola para um grupo, ou determinar o aprendizado de uma língua não natural para
quem tem a possibilidade de adquirir uma língua natural, significa de igual modo
oprimir, não incluir.
Por conta disso, comunidades surdas juntamente com pesquisadores e
educadores precisam reavaliar a forma em que estes estudantes estão compondo os
espaços, pois são inegáveis as diversas possibilidades de desenvolvimento para
estudantes surdos dentro das escolas bilíngues, bem como seus benefícios e vantagens.
REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa Do Brasil. Brasília, DF: Presidência da


República (2022). Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em: 20 de
maio 2022.

BRASIL. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas


especiais. Brasília: UNESCO, 1994.

BRASIL. LEI Nº 14.191, de 3 de agosto de 2021. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de


dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), para dispor sobre
a modalidade de Educação Bilíngue de Surdos. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/Lei/L14191.htm Acesso em:
20 de maio de 2022.

BRASIL. Ministério da Educação. Educação inclusiva: A escola. Secretaria de


Educação Especial/Ministério da Educação. Inclusão: Revista da Educação Especial,
v.4, n.1. Brasília, MEC/SEESP, 2004

HOUAISS, Antônio. Instituto Antônio Houaiss. Dicionário Houaiss da língua


portuguesa, p. 1183.

MIRANDA, Marília Gouvea de. A organização escolar em ciclos e a questão da


igualdade substantiva. Revista Brasileira de Educação. v.14, n. 40, jan./abr. 2009.
Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v14n40/v14n40a03.pdf>. Acesso em:
29 de abril de 2022

SCOTTI, P. A. Igualdade de chances entre grupos como critério de equidade em


educação. XIII Congresso Brasileiro de Sociologia. 29 de maio a 1 de junho de 2007,
UFPE, Recife/PE.

SPOSATI, A. Equidade. In: OLIVEIRA, D.A.; DUARTE, A.M.C.; VIEIRA, L.M.F.


DICIONÁRIO: trabalho, profissão e condição docente. Belo Horizonte:
UFMG/Faculdade de Educação, 2010.

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