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A covid-19 e a cláusula de tolerância nos


contratos de incorporação ...- Migalhas
Fábio Medina Osório ⋮ 7-8 minutes

Diante do cenário de pandemia (covid-19) que a sociedade brasileira está


vivenciando, muitos são os fatores a serem analisados a curto, médio e longo
prazo, o acesso ao deslocamento entre países facilitado, trouxe um inimigo
invisível, que se apresentou em magnitude mundial, fazendo com que as
autoridades passem a intervir na rotina da sociedade, bem como, nas relações
comerciais.

No estado da Bahia e no Munícipio de Salvador, como exemplo, desde 16 de


março de 2020, são publicados decretos com determinações a serem seguidas
de forma compulsória em diversos setores, incluindo o veto a atividades
exercidas pela sociedade, impedindo o ir e vir, lazer, entre outros, que vem
interferindo no cotidiano, indo além, vetos que influenciam o funcionamento de
estabelecimentos e de atividades praticadas em diversas áreas que atingem o
setores da indústria e comércio.

Dentre os decretos publicados pela prefeitura de Salvador estão os de


332.256/20, o  32.268/20, o 32.272/20 e o publicados pelo Governo do Estado
da Bahia estão os 19.528/20, o 19.550/20 e o 19.553/20, entre outros.

No contexto geral, os decretos possuem determinações, seguindo o quanto


previsto da Constituição Federal em seu art. 196, que indica que é dever do
Estado, garantir medidas que visem à redução do risco de doença, fazendo
com que não só a população tenha privações em seus afazeres ( trabalho e
lazer), bem como, as empresas de pequeno e grande porte, tenham suas
atividades completamente afetadas.

A toda evidência das referidas medidas, foi proibido também, por decreto
municipal, buscando conter a disseminação do coronavírus, a obra civil, com
exceção as de caráter emergencial, nos prédios já habitados. 

Deste modo, se faz necessário, trazer à baila um dos fatores que fizeram as
construtoras sofrerem com diversas ações nos últimos tempos, envolvendo um
grande aporte financeiro, qual seja, as oriundas de atraso da entrega da
unidade, pelo atraso na conclusão das obras.
Cumpre destacar que os contratos de compromisso de compra e venda,
preveem, a chamada cláusula de tolerância de 180 dias, com a sua validade já
pacificada no Egrégio Superior Tribunal de Justiça ("STJ"), desde que
obedecendo os critérios e observâncias de sua demonstração de clareza e
devida informação ao adquirente, ora consumidor, contudo de fato uma
cláusula reconhecida pelo Poder Judiciário.

Além disso, há, cláusula que indicam, a tolerância no atraso em função de


fatores extraordinários, denominados como caso fortuito e/ou de força maior,
nos últimos anos, mesmo com a referida cláusula, dificilmente as construtoras
conseguiam enquadrar esses requisitos para afastar sua responsabilidade no
atraso das obras. Isto porque, sempre esbarram no princípio do caso fortuito
interno, risco do negócio, ou seja, há uma previsibilidade mínima dos
imprevistos na elaboração ou execução do serviço, que mantém a
responsabilidade do fornecedor, que deveria tomar as devidas precauções para
minimizar os riscos.

Recentemente, em 25 de junho de 2019, tivemos o julgamento do IRDR -


Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas dos temas 970 e 971, que
afetam estritamente as construtoras e tratam, respectivamente, da
possibilidade de cumulação de lucros cessantes com a cláusula penal e
possibilidade de inversão da cláusula penal, nos casos de inadimplência das
construtoras em face do consumidor. 

Restando pacificado o entendimento pelo STJ, fazendo com que as


construtoras, de certo modo, aliviadas pela impossibilidade da cumulação de
pedidos, que em julgados recentes, vêm afastando, inclusive, a cumulação da
multa contratual indenização por perdas e danos (danos emergentes ou lucros
cessantes), na forma de aluguéis. 

JUÍZO DE RETRATAÇÃO. INCISO II DO ART. 1.030 DO CPC. APELAÇÃO


CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DE COBRANÇA.
CUMULAÇÃO DE CLÁUSULA PENAL. COM ALUGUÉIS (NA FORMA DE
LUCROS CESSANTES OU DANOS EMERGENTES). IMPOSSIBILIDADE.
QUESTÃO SEDIMENTADA NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL Nº.
1.498.484 - DF, PROFERIDO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS.
TEMA N.º 970. EM JUÍZO DE RETRATAÇÃO, DERAM PARCIAL
PROVIMENTO AO APELO DA PARTE RÉ EM MAIOR EXTENSÃO.
UNÂNIME DES. PEDRO CELSO DAL PRÁ - Presidente - Apelação Cível nº
70075272914, Comarca de Porto Alegre: "EM JUÍZO DE RETRATAÇÃO,
DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE RÉ EM MAIOR
EXTENSÃO. UNÂNIME."
Contudo, de outro modo, as construtoras se viram obrigadas a buscar meios
para se resguardar, quanto a qualquer potencial percalço que desaguasse em
atraso na entrega da unidade, visto que, a cláusula penal em seu desfavor
resta agora pacificada.

E como se comportar diante do cenário mundial em que se vive, com pandemia


declarada pela OMS - Organização Mundial de Saúde, a União, Estados e
Munícipios adotando medidas para evitar a propagação do vírus, que antes
desconhecido, tem ceifado vidas em todo mundo. 

Certamente, o Poder Judiciário, mesmo que analisando caso a caso, estará


encarando a situação de forma excepcional e ao que parece, os princípios
norteadores do Caso Fortuito e/ou de Força Maior, o Caso Fortuito Externo,
será bastante explorado mediante as características do fato imprevisível,
inesperado e impossível de se evitar, em virtude da obediência aos decretos
estabelecidos pelo poder público, ficando as construtoras sem a previsibilidade,
inclusive, sem prever o lapso temporal em que estará sendo afetada pela
impossibilidade de manterem suas atividades ativas. 

Indubitavelmente, portanto, durante o período de vigência (i) do Estado de


Calamidade Pública, e/ou (ii) de Decretos Municipais e/ou Estaduais que
restrinjam a atividade de construção civil, é imperioso o reconhecimento de que
tal período (no qual as atividades foram suspensas) seja amortizado ao final do
período de carência, para que a distribuição dinâmica, superveniente, do ônus
oriundo o desequilíbrio contratual, seja equitativamente distribuído, evitando-se,
de um lado, enriquecimento ilícito, e, doutro giro, prejuízo sem causa. 

Destacando ainda, que, as atividades também englobam os trâmites


administrativos e legais, envolvendo atividades cartorárias e licenças a serem
obtidas em face dos órgãos de fiscalização, que estão com suas atividades
reduzidas e focadas nas emergenciais, fazendo com que, as solicitações se
acumulem e, após todo o lapso devastador da pandemia se esvair, restará
ainda o período de dissipação do que se reteve durante o período de
isolamento social.

Assim, com escólio na Teoria da Imprevisão, tem-se que o período de vigência


do Ato Administrativo que impede o exercício da atividade econômica - Fato do
Príncipe - é causa para prorrogação do prazo, em igual período, para entrega
das unidades imobiliárias compromissadas.

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*Marcus Renato Souza Caribé é advogado do Escritório MoselloLima


Advocacia. 

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