Você está na página 1de 5

Disciplina: Direito Civil

Prof.: Fernanda Barretto


Aula: 06
Monitor: Valber Alix

MATERIAL DE APOIO - MONITORIA

CONTRATOS

1. Noções Conceituais: o contrato foi visto historicamente como mero ajuste de interesses particulares,
individuais e patrimoniais. Estava, portanto, ligado firmemente ao pacta sunt servanda, fazendo lei entre
as partes, pois as vincula, as obriga. O contrato é negócio jurídico bilateral, sinônimo de acordo, ajuste,
pacto.

Obs.: Com o movimento de constitucionalização do Direito Civil, o contrato ganha uma nova percepção. A
CF/88 estabeleceu princípios que lhe servem também como fundamentos, sobretudo os da Dignidade da
Pessoa Humana e da Dignidade Coletiva. Não se admite que o contrato viole tais princípios. Ganha, também,
nova feição e novos contornos, oriundos da CF/88: continua representando o ajuste de interesses
particulares, mas esses interesses não são necessariamente, ou apenas, patrimoniais.

2. Direito Intertemporal: os contratos de trato sucessivo, assim como outras relações jurídicas
continuativas, podem estar submetidos, eventualmente, a diferentes normas jurídicas. Ex.: casamento,
locação de um apartamento – todas essas relações podem estar submetidas a variadas normas, já que se
protraem no tempo. Ex.: contrato assinado antes de janeiro de 2003 (antes da entrada em vigor do CC/02).

2.1. Qual das normas impera sobre esses contratos? Lembrar da escada ponteana (divisão do negócio
jurídico de acordo com os planos da existência, validade e eficácia).

 A existência e a validade de um contrato se submetem à norma jurídica vigente na data de sua


celebração; já a eficácia estará submetida à norma jurídica atual. Vale lembrar que nenhuma
convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, especialmente os que asseguram
a função social da propriedade e dos contratos - art. 2.035, CC/02. Ex.: mudança do regime de
bens no casamento para pessoas casadas antes do CC/02 (o CC/16 não admitia mudança) – STJ,
Resp 812.012/RS1.

 Art. 977 – contrato de sociedade entre pessoas casadas: se estiverem sob o regime de comunhão
universal ou da separação obrigatória, não podem firmar sociedade (no CC/16 era possível
contratar sociedade independentemente do regime de bens). Esse casal não precisará se adaptar
às regras do novo código, porque essa questão está no plano da validade – CJF, Enunciado
2042.

1
STJ, REsp 812.012/RS: CIVIL. CASAMENTO. CÓDIGO CIVIL DE 1916. COMUNHÃO PARCIAL DE BENS.
ALTERAÇÃO DE REGIME. COMUNHÃO UNIVERSAL. POSSIBILIDADE JURÍDICA. I. Ambas as Turmas de
Direito Privado desta Corte assentaram que o art. 2.039 do Código Civil não impede o pleito de autorização
judicial para mudança de regime de bens no casamento celebrado na vigência do Código de 1916, conforme
a previsão do art. 1.639, § 2º, do Código de 2002, respeitados os direitos de terceiros. II. Recurso especial
não conhecido.

2
CJF, ENUNCIADO 204: A proibição de sociedade entre pessoas casadas sob o regime da comunhão
universal ou da separação obrigatória só atinge as sociedades constituídas após a vigência do Código Civil
de 2002.

1
3. Garantias Legais Contratuais:

3.1. Conceito: eles protegem a relação contratual independente de previsão no contrato, pois se impõem
por força de lei. A garantia contra vícios protege o contrato contra defeitos no bem, na coisa; a garantia
contra a evicção protege o contrato contra defeitos não na coisa em si, mas na sua transmissão.

3.2. Vícios redibitórios: são defeitos ocultos que tornam a coisa imprópria para o uso ou subtraem valor
econômico.

a) Requisitos: para a incidência da garantia, exige-se:

i) Contrato oneroso. Exceções: doação remuneratória e doação contraprestativa para casamento


(art. 546, CC/02).

ii) Existência do vício no momento da tradição: se o vício for superveniente, não haverá
responsabilidade por vício redibitório.

iii) Descoberta do vício depois da tradição.

iv) A consequência do vício tem que ser:

 tornar a coisa imprópria para o uso (desnaturação);


 subtrair valor econômico (depreciação).

v) Inexistência de cláusula contratual excludente da responsabilidade pelos vícios redibitórios.

Obs.: Essa cláusula será nula nos contratos de consumo e nos contratos de adesão.

b) Ações edilícias:

i) Redibitórias, por rejeição da coisa;

ii) Estimatória ou quanti minoris, para abatimento no preço;

iii) Ex empto (art. 500, CC/02), buscando complementar a área entregue a menor.

Atenção¹: O §1º do art. 500 do CC/02 só permite pedido de complementação por caracterização
de vício redibitório se a diferença for superior a 1/20 (5%).

Atenção²: As ações edilícias, sobretudo a redibitória, tem natureza constitutiva negativa, pois
buscam desfazer o negócio e estabelecer nova base contatual.

b.1) Prazos para perdas e danos:

 5 anos pelo CDC;


 3 anos pelo art. 206, §3º, V do CC/02.

b.2) Prazos decadenciais para as ações edilícias – art. 445, CC/02:

 vício redibitório da fácil constatação: 30 dias se móvel, 1 ano se imóvel, contados da


tradição;

 vício redibitório de difícil constatação: 180 dias se móvel, 1 ano se imóvel, contados da
descoberta do vício;

2
 vícios sobre animais: prazos em lei especial (não existe), usos e costumes do lugar e, se
não existirem, §1º do art. 445 (180 dias para móveis).

Atenção: O caput do art. 445 estabelece que os prazos serão reduzidos à metade e se contarão
da data da alienação se o adquirente já estava na posse.

Obs¹: Os arts. 26 e 27 do CDC trazem prazos de 30 dias para a reclamação sobre os bens não
duráveis e de 90 dias para os duráveis.

Obs²: Pela Teoria do Diálogo das Fontes, é possível invocar a aplicação da lei geral no lugar da lei
especial, quando a lei geral for mais favorável.

3.3. Evicção: é a perda total ou parcial da coisa adquirida onerosamente, por força de uma decisão
judicial ou administrativa que conferiu posse ou propriedade a um terceiro.

Obs¹: O alienante pode ter agido de boa ou de má-fé. Isso é irrelevante para se reconhecer a garantia
contra a evicção. A má-fé, contudo, pode obriga-lo a ressarcir perdas e danos.

Obs²: Pode ocorrer evicção mesmo nas aquisições em hasta pública (novidade do CC/02).

Obs³: O art. 448 e ss. permitem ampliar, reduzir ou até mesmo excluir a garantia por evicção, desde
que por cláusula expressa.

Atenção: Atente para o fato de que o art. 449 do, CC/2 mitiga a cláusula excludente da
responsabilidade pela evicção, se o evicto não foi informado/expressamente advertido do risco, ou
não o assumiu. Isso significa dizer que a cláusula só será válida se o adquirente for expressamente
advertido/alertado do risco e assumi-lo.

a) Extensão da garantia pela evicção:

i) Ressarcimento dos valores pagos (restituição do preço): se total a evicção, preço integral; se
parcial, preço proporcional.

ii) Indenização pelos frutos e benefícios;

iii) Indenização pelas despesas contratuais;

iv) Honorários e custas;

v) Juros e correção.

Obs¹: Tudo isso será devido ao adquirente/evicto independente das perdas e danos
(responsabilidade objetiva).

Obs²: Se o alienante agiu de má-fé, ou seja, com culpa, poderá responder por perdas e danos.

Obs³: Não há evicção na coisa litigiosa (quem compra, nesse caso, assume a perda).

4. Resolução ou Revisão do Contrato com Base na Teoria da Imprevisão (Princ. do Equilíbrio Econômico e
Financeiro dos Contratos – arts. 317 e 478, CC/02).

4.1. Introdução: até 1918, prevaleceu no direito contratual, de modo quase irrestrito, o pacta sunt
servanda. A Lei Faillot resgatou do direito romano a cláusula rebus sic stantibus e, com essa cláusula,
implementou-se a Teoria da Imprevisão, permitindo-se a interferência judicial em contrato.

4.2. Requisitos:

3
a) Contrato de trato sucessivo (execução continuada);

b) Onerosidade excessiva (desequilíbrio entre prestação e contraprestação);

c) Álea extraordinária (evento imprevisível e extraordinário);

d) Inexistência de culpa da parte pela onerosidade excessiva.

Obs¹: Aroldo Medeiros de Fonseca, no livro “Teoria da Imprevisão e o Caso Fortuito” de 1950/60,
deixava claro que o pacta sunt servanda continuava sendo a regra. Entre os anos de 70/80, a
jurisprudência começa a se manifestar sobre o tema, afirmando que só poderia ocorrer modificação
ou resolução se frente a um evento não imaginado pelas partes.

Obs²: Em 1990, o CDC, nos arts. 4º e 6º, adotou a Teoria da Base Objetiva do Contrato, ou Teoria
da Onerosidade Excessiva Pura (ex.: Karl Larenz), que representa um aperfeiçoamento da Teoria da
Imprevisão, pois dispensa a imprevisibilidade (álea extraordinária) e admite resolução ou revisão com
base, tão somente, na onerosidade excessiva. O STJ, em 1999, confirmou que a Teoria da Base
Objetiva dispensava a imprevisibilidade.

4.3. No CC/02: o código trata da Teoria da Imprevisão nos arts. 317 e 478, onde traz os requisitos, quais
sejam:

a) Contrato de execução continuada ou diferida;


b) Onerosidade excessiva;
c) Área extraordinária;
d) Inexistência de culpa da parte pela onerosidade excessiva;
e) Correspondência entre onerosidade excessiva de uma parte e a vantagem obtida pela outra parte.

Obs.: O problema desse último requisito é que, nem sempre, a onerosidade excessiva de uma parte
gera vantagem para outra.

Obs²: Do ponto de vista processual, os efeitos da revisão/resolução retroagem à data da citação.

Obs³: Nas ações de revisão/resolução, permite-se ao réu (contratante que obteve a vantagem),
através de reconvenção ou exceção substancial, se predispor a cumprir o contrato sem a vantagem
correspondente (arts. 479 e 480, CC/02).

5. Extinção dos Contratos:

5.1. Introdução: a extinção ideal dos contratos se dá por cumprimento, por regular execução.

5.2. Invalidade: seja por nulidade (arts. 166 e 167, CC/02) ou por anulabilidade (art. 171, CC/02).

 No plano da validade, quando o contrato se extingue por um vício de validade, o defeito é


contemporâneo à sua formação, ou seja, ele se formou com aquele defeito.

Obs.: Vale lembrar que o defeito tem que estar previsto em lei (pas de nullité sans texte).

 Os vícios de validade são originários. Mas, se o contrato se formou validamente (não há vício
originário), ele se extinguirá por perda de eficácia (escada ponteana).

5.3. Ineficácia: pode se dar pela regular execução ou pela inexecução. A inexecução acontece por
diversos motivos:

a) por culpa: resolução culposa. Pode vir acompanhada das perdas e danos;

b) pelos fatos externos: caso fortuito/ força maior (resolução sem culpa). Ex.: onerosidade excessiva;

4
c) vontade das partes (resilição): se unilateral, chama-se denúncia; se bilateral, distrato.

Obs.: Na prática, se usa o termo “rescisão” como gênero do qual são espécies a resolução sem culpa
e a resilição.

Você também pode gostar