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I.E.D.

Ponto 03
Professor: Hélio Capel Fº 1

3. O DIREITO COMO VALOR – AXIOLOGIA JURÍDICA

Se o direito é essencialmente uma ciência “normativa” e a estrutura lógica de toda proposição


jurídica é um dever-ser, coloca-se naturalmente a pergunta: qual a direção ou o ideal visado
pela norma? Qual o valor fundamental que orienta esse dever-ser?

Basicamente, a sentença deve ser “justa”, a lei deve ser “justa” a obrigação e a indenização
devem ser “justas”, o salário e o preço devem ser “justos”. Com razão escreveu Del Vecchio:
“a noção de justo é a pedra angular de todo o edifício jurídico”.

Além disso, a noção de “princípios gerais do direito”- a que devem, a cada momento, recorrer
o juiz e os demais aplicadores da lei- corresponde fundamentalmente aos princípios de
“justiça”. Mas, que é justiça? Quais as suas características, sua natureza, suas espécies, seu
fundamento? E os demais valores jurídicos - a segurança, o interesse social, a ordem, o bem
comum?

É esse um antigo e complexo tema. Seu estudo recebe modernamente os nomes de axiologia
jurídica, teoria dos valores jurídicos, deontologia jurídica, estimativa jurídica, etc.

3.1. Noções de Valor

Compulsando dicionários, vemos diversos significados para a expressão:


• qualidade de quem tem força, coragem, audácia; (o valor dos bandeirantes que
desbravavam nossas terras...)
• qualidade pela qual determinada pessoa ou coisa é estimável em maior ou menor grau;
(fulano é profissional de alto valor)
• importância de determinada coisa; (o valor do ‘Sete Copas’ no truco)
• o equivalente justo em dinheiro, mercadoria, etc.; (preço)
• apreços morais – valores intrínsecos – juízo que se faz de uma coisa, pessoa ou evento.

Apenas este último nos interessa para os estudos da disciplina IED.

O tema valor é extremamente complexo. Há uma dicotomia entre o saber e o fazer. O dito
popular “faça o que digo, não o que faço”, apresenta de um lado a humildade (que é um valor
em si) em não se colocar como referencial de valor, mas denuncia a dificuldade de coerência
entre o que se pensa e o que se quer.
Os valores são fundamentais para a vida humana e social. São anteriores a qualquer
observação, são intuitivos e evidentes.

Faz-se necessária uma distinção entre leis, princípios e valores. Ambos intrinsecamente
ligados à natureza humana e racional.

3.2. Os Valores e o Direito

Os Valores

Juízo é o ato mental pelo qual atribuímos, com caráter de necessidade, certa qualidade a um
ente. Liga-se o sujeito a um predicado. Esta ligação pode ser imperativa (é) ou indicativa
(deve ser).
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Fazemos juízos de realidade e juízos de valor sobre tudo e sobre todos que nos cercam e que,
para cada um de nós, tem algum interesse, ou seja, todas as coisas e pessoas frente às quais
não nos mantemos indiferentes.

Esses processos mentais são naturais da raça humana e automáticos em nossas mentes e
podem expressar:

uma realidade (“Esta caneta existe. Ela é azul”; “o fogo queima”; “a água é líquida”; “a
advocacia é uma profissão”; “existem regras para a conduta profissional”;

ou um valor (“esta moça é linda”; “dias chuvosos são ótimos para se ficar na cama”; “você
agiu mal ao negar ajuda àquela senhora”; “este vestido é muito curto”; “aquele advogado é
honesto”.

No juízo de realidade o Sujeito é o predicado; No juízo de valor o Sujeito deve ser o


predicado.

O juízo de realidade é aquele que se faz sobre a natureza real da coisa (a prata é um metal). Já
o juízo de valor é o processo pelo qual imprimimos mentalmente ao objeto adjetivos e apreços
relativos ao nosso estado de atração ou de repulsa (este colar de prata é maravilhoso), sob
parâmetros positivos ou negativos de utilidade/inutilidade, bondade/maldade, beleza/fealdade,
justiça/injustiça, etc.

Mas o que são valores? Embora a preocupação com os valores seja tão antiga como a
humanidade, só no século XIX surge uma disciplina específica, a teoria dos valores ou
axiologia. A axiologia não se ocupa dos seres, mas das relações que se estabelecem entre os
seres e o sujeito que os aprecia.

Diante dos seres (sejam eles coisas inertes, seres vivos, ou ideias etc.) somos mobilizados pela
afetividade, somos afetados de alguma forma por eles, porque nos atraem ou provocam nossa
repulsa. Portanto, algo possui valor quando não permite que permaneçamos indiferentes.

Valores são, num primeiro momento, herdados por nós O mundo cultural é um sistema de
significados já estabelecidos por outros, de tal modo que aprendemos desde cedo como nos
comportar à mesa, na rua, diante de estranhos, como, quando e quanto falar em determinadas
circunstâncias; como andar, correr, brincar; como cobrir o corpo e quando desnudá-lo; qual o
padrão de beleza; que direitos e deveres temos. Conforme atendemos ou transgredimos os
padrões, os comportamentos são avaliados como bons ou maus. Segundo nossa cultura,
respeito aos mais velhos é uma boa conduta.

A partir da valoração, as pessoas nos recriminam por não termos seguido as formas da boa
educação ao não ter cedido lugar à pessoa mais velha; ou nos elogiam por sabermos escolher
as cores mais bonitas para a decoração de um ambiente; ou nos admoestam por termos faltado
com a verdade.
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Nós próprios nos alegramos ou nos arrependemos ou até sentimos remorsos dependendo da
ação praticada. Isso quer dizer que o resultado de nossos atos está sujeito à sanção, ou seja, ao
elogio ou à reprimenda, à recompensa ou à punição, nas mais diversas intensidades, desde
"aquele" olhar da mãe, a crítica de um amigo, a indignação ou até a coerção física (isto é, a
repressão pelo uso da força).

O “VALOR” é o elemento Moral do Direito, toda obra humana é impregnada de sentido ou


valor. O Direito protege e procura realizar valores ou bens fundamentais da vida social,
notadamente a Vida, a Integridade, a Solidariedade, a Liberdade, a Honra, a Dignidade, a
Ordem, a Segurança, a Paz, a Justiça. São esses valores que informam à consciência do
indivíduo o que é bom (valioso) e o que é mau (desvalioso).

AXIOLOGIA – vem do grego axiós que significa apreciação estimativa. É a parte da filosofia
que se ocupa dos valores tais como: o bem, o belo, o verdadeiro, o justo. Também conhecida
como Teoria dos Valores. Axiologia Jurídica, então, é o estudo dos valores jurídicos, que têm
na base a JUSTIÇA.

Com base nos valores e tendo como referencial a ideia do ‘justo’ (do valor ‘justiça’), o
homem passa a reconhecer ‘Princípios Gerais do Direito’ para fundamentar as técnicas
jurídicas (criação, estudo e aplicação da norma jurídica).

Adiante veremos com mais acuidade a natureza e utilidade dos princípios jurídicos, mas, por
hora, é válido informar que o Direito se pauta em princípios gerais, erigidos sobre a noção dos
valores que orientam a consciência social. São orientações fundamentais e essenciais de
comportamento através dos quais o homem tende a realizar o valor do bem.

São Princípios Gerais do Direito: "dar a cada um o que é seu", "respeitar a dignidade pessoal
do homem", "manter a vida social", "contribuição de todos para o bem comum" e muitos
outros decorrentes do conceito do valor ‘justiça’.

Por isso é tão respeitada a Teoria Tridimensional de Miguel Reale, já vista em sala de aula.
Note que o Direito se inicia com um fato, vive da valoração do mesmo (fatos sociais), com
base no que é valioso ao ser humano, de onde nascem os princípios jurídicos e, por fim, é
criada a norma jurídica, que tem por finalidade resolver os fatos que ocorrem na sociedade.

3.3. O Direito e a Moral - MUNDO ÉTICO

Moral vem do Latim (mos, mores), onde originariamente significava ‘hábitos’. Portanto,
designa ‘modos de agir determinados pelo uso’. É um conjunto de valores gerais adotados,
aceitos pela sociedade.

A moral, como arcabouço de valores, cria as normas no plano da consciência individual, para
posteriormente, pelo uso e contaminação dos demais indivíduos da coletividade, passar a
reger toda a sociedade, limitando e ditando as condutas moralmente aceitas (aceitas no plano
da consciência como válidas). Atua internamente, no plano da consciência.

A reiteração de certos hábitos nos faz virtuosos ou viciados aos olhos da sociedade, por isso
nos pautamos, antes da Lei, nas normas morais.
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As normas morais nos guiam pela consciência. A pena por seu descumprimento será aplicada
internamente, no plano da consciência individual, com o arrependimento, o constrangimento,
o remorso, etc..

Já as normas jurídicas nos guiam pela força. Pela coerção do Estado. A sanção pelo
descumprimento é aplicada de fora para dentro, é externa, vem do Poder Público representado
na figura estatal.

Mas toda norma é regra de conduta que postula um dever. Há, portanto, uma conexão
indissolúvel entre o dever e o valioso. Quando se pergunta “__ O que devemos fazer?”, só se
poderá responder depois de saber a resposta à pergunta “__ O que é valioso neste caso?”.

Fica a pergunta: se o Direito e a Moral têm como ponto comum a ação humana, quais são os
limites que separam essas duas forças normativas?

Nesta matéria, devemos lembrar que a compreensão da mesma está em distinguir as duas
coisas sem separá-las.

Muitas são as teorias sobre as relações entre o Direito e a Moral. No passado, devido às
necessidades sociais de cada tempo, esses limites já foram colocados em separado. Hoje
temos que a moral e o direito têm pontos coincidentes. Vamos conhecer as principais dessas
teorias:

TEORIA DE THOMASIUS (Séc. XVII até XVIII) - O Jurista alemão criou uma
diferenciação prática:

Direito – só cuida da ação humana depois de exteriorizada, sua área fica limitada ao “foro
externo”.

Moral – dizia respeito àquilo que está no plano da consciência, ação que se desenrola no “foro
íntimo”, sem a interferência de ninguém. Ações Íntimas.

Não havendo a possibilidade de invasão recíproca nos seus campos:

D M
Mundo do Direito Mundo da Moral

Dois Mundos desvinculados

Crítica: Esta teoria correspondia a uma aspiração da época, ou seja, a liberdade de


pensamento e de consciência recebia desta teoria a tutela desejada. Demonstrando um
radicalismo muito grande, porque em muitas situações o “foro íntimo” não pode ser
desprezado pelo Direito, por exemplo, no Direito Penal, onde para a configuração de um
crime doloso ou culposo examina-se a intenção do agente. No Direito Civil, a anulabilidade
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dos atos jurídicos está ligada ao exame das intenções – dolo, erro, coação ou fraude. Como
pode, então, não interessar ao direito aquilo que se passa na consciência?

TEORIA DO MÍNIMO ÉTICO (1851 A 1911) - Desenvolvida pelo jurista alemão George
Jellinek cujo precursor foi “Benthan”.

Direito não é algo de diverso da Moral, mas é uma parte desta.

M
D

Haveria um campo de ação comum a ambos, sendo o Direito envolvido pela Moral. “Tudo o
que é jurídico é moral, mas nem tudo o que é moral é jurídico”.

Crítica: Segundo esta teoria o Direito é implantado por inteiro na moral ou seja, todas as
normas jurídicas se contêm no plano moral. Contudo, sabe-se que nem tudo que é jurídico é
moral. Exemplos: Sociedade Comercial onde apenas um sócio trabalha e ambos recebem o
mesmo quinhão. É moral? Não, mas é direito. Ou, ainda: regras de Ordem Técnica. Em geral
tais normas nada tem com a moral, como a exigência de os condutores de veículos
obedecerem a mão direita. Isso não poderá influir no campo moral. E mais: prazos do
processo, como o de 15 dias para a parte demandada contestar a ação - não influem na moral.

TEORIA DOS CÍRCULOS SECANTES (Claude Du Pasquier) Direito e Moral possuem um


campo de competência comum e, ao mesmo tempo uma área particular independente.

D M

Direito e Moral atuam num mesmo campo

Pasquier distinguiu sem separar. Não se devem confundir os conceitos de Direito e Moral.
Contudo, apesar de serem conceitos que se distinguem, eles não se separam.

Distinguem-se, pois existem problemas jurídicos estranhos à moral, como normas técnicas e
prazo para contestação.

Não se separam, pois há um campo comum em que o Direito e a Moral coexistem, onde há
regras com qualidade jurídica e que têm caráter moral. Ex.: Assistência obrigatória aos
ascendentes ou descendentes (alimentos).
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Na sociedade as regras sociais são cumpridas espontaneamente ou obrigatoriamente. No


Mundo da Moral, a conduta é espontânea, o comportamento encontra em si próprio a razão de
existir. Não podemos conceber o ato moral forçado, fruto da força ou da coação.

Ninguém pode ser bom pela violência. A moral é incompatível com a força, violência, ou
seja, com a coação – força juridicamente organizada.

No Mundo de Direito, a conduta é obrigatória. As regras são cumpridas obrigatoriamente,


porque o homem que vive em sociedade é coagido ou forçado a se comportar de determinada
maneira.

O Código Civil Brasileiro, como os de todas as nações civilizadas, consagram o princípio da


solidariedade econômica entre cônjuges e parentes. Neste sentido os descendentes não podem
faltar à assistência devida aos pais e avós, sempre que estes se encontrem em dificuldades
econômicas por motivos que não possam ser superados. É evidentemente um preceito de
ordem jurídica e, ao mesmo tempo, de ordem moral.

3.4. A Justiça

ACEPÇÕES SUBJETIVA E OBJETIVA DA JUSTIÇA

Uma característica, ligada a todas as noções fundamentais, dá ao conceito de justiça certa


variedade de significações. Entre as múltiplas significações de justiça, podemos assinalar duas
fundamentais: uma subjetiva e outra objetiva.

Muitas vezes falamos da justiça como uma qualidade da pessoa, como virtude ou perfeição
subjetiva. Fulano é um homem justo. O senso de justiça é fundamental no magistrado. É nesse
sentido que nos referimos à justiça, à prudência, à temperança e à coragem, como virtudes
humanas, subjetivamente.

Outras vezes empregamos a palavra justiça para designar objetivamente uma qualidade da
ordem social. Nesse sentido, falamos da justiça de uma lei ou de uma instituição.

A circunstância de ser o conceito de justiça utilizado por juristas e moralistas explica essa
diferença.

Ocupando-se da atividade pessoal do homem, o moralista vê na justiça uma qualidade


subjetiva do indivíduo, o exercício de sua vontade, uma virtude.

O jurista tem outras preocupações. Interessa-lhe fundamentalmente a ordem social objetiva.


Por isso, ele vê na justiça, em primeiro lugar, uma exigência da vida social. Radbruch chega a
afirmar que ao jurista só interessa a justiça, considerada em sentido objetivo. Considerado
sobre este aspecto, a justiça é um princípio superior da ordem social.

Por extensão a palavra justiça é também empregada para designar o Poder Judiciário e seus
órgãos, incumbidos de dar solução justa aos casos que lhe são submetidos. É esse o sentido do
vocábulo quando falamos em recorrer à “Justiça” ou quando nos referimos ao Diário da
Justiça. Palácio da Justiça. Tribunal de Justiça, etc.
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Justiça, em sentido próprio, significa “a virtude” ou a vontade constante de dar a cada um o


seu direito. A rigor só podem ser “justas” ou “injustas” as ações humanas.

O sentido fundamental é o de virtude. E a razão é importante: a justiça, como o direito, não é


uma simples técnica da igualdade, da utilidade ou de ordem social. Muito mais do que isso,
ela é virtude da convivência humana. E significa, fundamentalmente, uma atitude subjetiva de
respeito à dignidade de todos os homens.

Nas relações com outros homens, podemos ter uma atitude de “dominação”, como fazemos
com os animais e demais seres inferiores, ou de “respeito”, como se impõe entre pessoas
humanas. Esta última é a que caracteriza a justiça. O elemento subjetivo nas definições de
justiça, de tão extraordinária importância, nem sempre tem recebido a atenção que merece.

Definida como vontade ou disposição do espírito, a justiça requer a libertação dos impulsos
exclusivamente egoísticos. O egoísta reivindica direitos sobre os bens do mundo, sem
considerar as razoáveis reivindicações dos outros. A justiça se opõe a essa tendência, exigindo
que se respeitem os direitos e as pretensões dos demais.

Sem uma atitude pessoal de preocupação com os outros e sem a vontade de ser equânime, os
fins da justiça não podem ser normalmente atingidos.

É esse um aspecto fundamental do problema. A justiça não é o sentimento que cada um tem
de seu próprio bem-estar ou felicidade, como pretendem alguns. Mas, pelo contrário, é o
reconhecimento de que cada um tem de seu próprio bem-estar ou felicidade. É o
reconhecimento de que cada um deve respeitar o bem e a dignidade dos outros. E esse
reconhecimento implica, sem dúvida, uma metafísica: a do valor absoluto da pessoa humana.

Metafísica - "o que está para além da física". É uma doutrina que busca o conhecimento da
essência das coisas

CONCEITO DE JUSTIÇA

O conceito de Justiça continua sendo tema de vivo debate entre aqueles que cultuam o estudo
do Direito.

Na Grécia, o ilustre pensador Aristóteles estudava o conceito de Justiça, no Livro V, de sua


obra Ética à Nicômaco. O ilustre filósofo, após perscrutar o sentido da palavra justiça,
correlacionando-a com sua antítese: a injustiça, chega a elaborar o que seja equidade.

Para Aristóteles, a equidade é a melhor espécie de Justiça: “A justiça e a equidade são,


portanto a mesma coisa, embora a equidade seja melhor. O que cria o problema é o fato de o
equitativo ser justo, mas não o justo segundo a lei, e sim um corretivo da justiça legal...”

Vemos na lição de Aristóteles que a equidade, por nós entendida como o conceito subjetivo
da justiça, seria mais valorizado que a igualdade (conceito objetivo). Afinal, aquele filósofo
afirma que o justo equitativo é melhor que o justo segundo a lei, sendo assim um corretivo da
justiça legal.

A referida lição foi por nós recebida, embora com menos força da adotada pelo sistema inglês,
sendo uma variante da Common Law.
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O Código de Processo Civil (arts. 126 e 127) é expresso na referência à equidade, como
instrumental para resolução de conflitos. Prevista também a sua aplicação pelo art. 5º da Lei
de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

No CPC:

“Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou


obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as
havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
Art. 127. O juiz só decidirá por eqüidade nos casos previstos em lei.”

Na LINDB:

“Art. 5o  Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às
exigências do bem comum.”

CLASSIFICAÇÃO
 
Maria Helena Diniz ensina que há duas modalidades de justiça.

1) A justiça particular, cujo objeto é o bem do particular e que se desdobra em;

a) Comutativa – ocorre se um particular dá a outro particular o bem que lhe é devido, segundo
uma igualdade simples ou absoluta. Na justiça comutativa, o devido é rigoroso, por dizer
respeito a um direito próprio da pessoa (p. ex., os direitos da personalidade, isto é, à vida, à
integridade física, à dignidade, às obras etc; e o direito ao cumprimento de obrigações
positivas, como prestação de um serviço, entrega de mercadoria, pagamento de certa quantia
em objetos, sem levar em conta a condição das pessoas.

É o que ocorre nas relações contratuais, dentre elas a compra e venda, em que “A”, ao
comprar um carro que vale R$ 20.000,00, deve efetuar a “B” (vendedor) um pagamento de
igual valor (carro de R$ 20.000,00 = R$ 20.000,00 em dinheiro), isto é, o comprador deve
pagar ao vendedor o preço correspondente ao valor da mercadoria. Também assim na
indenização por perdas e danos, quando o lesante é obrigado a reparar o dano na medida do
prejuízo que causou ao lesado. Da mesma forma, no dever de prestar assistência entre
parentes, nas promessas de recompensa, etc.

b) Distributiva – quando a sociedade dá a cada particular o bem que lhe é devido segundo
uma igualdade proporcional ou relativa. O grupo social (Estado, sociedade internacional,
empresa, família etc.) reparte aos particulares aquilo que pertence a todos, assegurando-lhes
uma proporcional participação no bem comum, conforme a necessidade, o mérito e a
importância de cada indivíduo. Infere-se daí que o sujeito passivo (devedor) da relação
jurídica é a comunidade, e o ativo (credor), um de seus membros.

A igualdade proporcional é a que se realiza na distribuição dos benefícios e dos encargos


entre os membros de uma comunidade, considerando-se a situação das pessoas. Assim, pela
justiça distributiva, a sociedade visa assegurar ao particular sua parcela no bem comum,
distribuída conforme a posição que ele ocupa como membro do grupo social, tendo em vista o
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seu mérito, a natureza do serviço prestado, a sua condição econômica ou capacidade


contributiva, o seu tempo de serviço, dentre outros parâmetros.

Se “A” contribui com R$ 50.000,00, recebe 5%, se “B” entra com R$ 30.000,00, recebe 3%,
se “C ”entra com R$ 20.000,00, recebe 2%.

Disciplina a aplicação dos recursos da sociedade aos diversos setores da vida social, a fixação
dos impostos, as deduções fiscais para efeito de pagamento do Imposto de Renda
proporcionalmente aos encargos de família, a participação dos sócios nos lucros e nas perdas
da empresa, o voto plural nas sociedades anônimas, a aplicação do salário-família pago ao
trabalhador de acordo com o número de filhos menores, as medidas destinadas a promover a
execução de planos de urbanismo e habitação, a nomeação de funcionário, a assistência
social, a distribuição de prêmios etc.

Assim, embora a justiça distributiva vise o interesse do particular, corresponde a uma função
social, pois a sociedade, ao impor restrições aos seus membros, torna-se depositária de
riquezas, de utilidades que deve redistribuir, proporcionalmente, aos indivíduos que a
compõem. Repartem-se os bens de acordo com a necessidade de cada um, e os encargos,
proporcionalmente à capacidade de seus membros.

2) A justiça social

Ocorre quando as partes da sociedade, isto é, governantes e governados, indivíduos e grupos


sociais, dão à comunidade o bem que lhe é devido, observando uma igualdade proporcional.

Os particulares ou membros da comunidade social são, portanto, os devedores, e a sociedade,


a credora. Essa justiça está presente na elaboração das normas, porque estas têm por escopo
promover o bem comum, na prestação de serviço público, no pagamento de impostos, na
obediência às normas, na promoção do bem comum pelas sociedades de bairro, pelas
cooperativas, pelos sindicatos, pelos órgãos representativos da comunidade no seio da
empresa, das categorias profissionais, dos alunos, do pessoal docente nos conselhos escolares,
enfim, do particular para a coletividade.

A justiça social, portanto, é a que tende diretamente ao bem comum da sociedade,


subordinando a esse fim os interesses dos seus membros componentes, ordenando sua conduta
em relação ao todo. Assim sendo, cada membro da sociedade deve a esta o necessário para
sua conservação e prosperidade. Para tanto, fixam-se os deveres de cada um com relação à
sociedade em que vive ou pertence.
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A JUSTIÇA NO DIREITO

Vimos que a justiça caracteriza-se pela idéia de retribuição. “A justiça é a constante e


perpetua vontade de dar a cada um o que é seu”.

Ora, se o Direito persegue e objetiva a justiça, torna-se fundamental conhecer os elementos


pelos quais se processa essa retribuição para os fins da justiça no Direito. Vale dizer, devemos
definir os elementos informadores da norma jurídica, que irão caracterizar a justa aplicação do
direito e estudar como eles se figuram em cada espécie de justiça:

Esses elementos são:

Alteritas – (ou Alteridade) é a relação de interação e dependência das pessoas, umas em


relação às outras. É a pluralidade de pessoas numa relação jurídica, umas nas condições de
credoras e outras na condição de devedoras.

Debitum – o devido, aquilo que alguém deve a outrem.

Aequalitas – igualdade – é equivalência de grandezas na relação que une o credor ao devedor


e vice-versa, tendo por objeto a coisa devida.

Importante observar que a igualdade é uma relação de identidade que pode ser alcançada
tomando por base a semelhança quanto à qualidade ou quantidade. Teremos igualdade
simples (produto vale R$ 10,00, então na compra paga-se R$ 10,00 por ele) ou proporcional
(tenho mais renda, logo, pagarei mais Imposto de Renda).

Existe ainda a igualdade fundamental dos homens, todos os homens têm a mesma natureza e
dignidade fundamentais. O Princípio da igualdade, assim definida, tem fundamento positivo
na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789 França) "Todos os cidadãos são
igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos segundo sua
capacidade e sem outra distinção que de suas virtudes e de seus talentos. Os encargos segundo
a capacidade e os bens segundo a necessidade de cada um".

Segundo Rui Barbosa, Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria
desigualdade flagrante, e não igualdade real. Portanto, no Direito, a igualdade significa tratar
com desigualdade situações desiguais.

NA JUSTIÇA COMUTATIVA- aquela segundo a qual um particular dá a outro particular o


que lhe é rigorosamente devido, observando uma igualdade absoluta, simples ou real, os
elementos da justiça se caracterizam da seguinte forma:

Alteridade – de ambos os lados da relação jurídica, teremos particulares figurando como


sujeito ativo e sujeito passivo da obrigação. Trata-se então de bilateralidade entre particulares.

Devido - versa sobre direitos próprios dos particulares nessa relação, como o respeito à
personalidade do próximo, à dignidade moral, à integridade física, moral e patrimonial. (ver
responsabilidade civil). Na justiça comutativa O devido é de natureza estrita, rigorosa, legal. É
um bem próprio do indivíduo. É marcado pela exigibilidade. O devido dessa justiça vai desde
o respeito à personalidade física e moral do homem até as obrigações positivas, como por
exemplo, o pagamento de uma dívida, a prestação de um serviço, etc.
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A igualdade – A igualdade da justiça comutativa é simples, absoluta ou real. Simples porque


consiste numa relação entre dois termos, estabelecendo uma equivalência entre ambos (se
compro um objeto que vale 20 reais, devo pagar 20 reais por ele). A igualdade, aqui, deve ser
absoluta, havendo compensações mútuas e equivalentes, para que seja garantido a cada um o
que lhe é de direito. A igualdade na justiça comutativa é também chamada real porque se trata
de igualar simplesmente uma coisa a outra, não levando em conta a condição das pessoas.
Esta justiça é também chamada de corretiva, pois o trabalho dos juizes é conferir a igualdade
absoluta quando esta não está sendo seguida.

NA JUSTIÇA DISTRIBUTIVA – em que a comunidade dá a cada um dos seus membros uma


participação no bem comum ou um encargo, segundo uma igualdade relativa e proporcional:

Alteridade – de um lado a comunidade na condição de devedora de outro, os membros da


comunidade na condição de credores. Impõe a quem reparte os encargos e bens comuns, a
obrigação de fazê-lo proporcionalmente à dignidade, méritos e capacidade de cada um.

O Devido – direitos de participação no bem comum ou encargos justos, proporcionalmente


distribuídos. Participação nos benefícios sociais, dar a cada um sua parte no bem comum -
assegurara condições sociais que lhes permitam uma vida plenamente humana. Cobrar de
cada um conforme sua capacidade contributiva.

A igualdade – é relativa ou proporcional, com base na necessidade, capacidade e dignidade de


cada um dos sujeitos ativos. A igualdade deve ser proporcional à condição de cada um. Por
exemplo numa família de flagelados com 4 filhos recebeu 40 KG de alimentos e uma com2
filhos recebeu 2 0 KG, em termos absolutos são desiguais, mas proporcionalmente receberam
a mesma quantidade.

NA JUSTIÇA SOCIAL - em que os membros dão à comunidade uma contribuição para o


bem comum de acordo com uma igualdade basicamente proporcional. A higiene no ambiente
de trabalho; o pagamento de impostos, o terceiro setor, etc..

Alteridade – os membros da comunidade como sujeitos passivos e a própria comunidade


como sujeito ativo. É o esforço do particular em prol da coletividade.

O Devido – a contribuição de cada um para o bem comum de toda a sociedade. Discutiu-se


na ciência se o dever (devido) dessa justiça não seria somente um dever moral, mas sabemos
que a justiça social possui um dever rigoroso em que a comunidade pode exigir de todos os
membros a contribuição de cada um para o bem comum. O bem comum é a finalidade de toda
lei.

A igualdade: assim como na justiça distributiva, a igualdade que se processa na Justiça Social
é relativa ou proporcional à capacidade de cada um dos sujeitos passivos.

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