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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

CAPITULO 1- Princípios contratuais

1.1- Autonomia da vontade

1.2- Boa fé

1.3- Função Social

1.4- Equilíbrio contratual

CAPITULO 2- Resoluções dos contratos.

2.1- Por onerosidade excessiva

2.2- Teoria da imprevisão

CAPITULO 3- Impacto da pandemia nos contratos

3.1- Caso fortuito ou forca maior e a sua incidência nos contratos durante a
pandemia

3.2-A teoria da onerosidade excessiva e a aplicação nos contratos na durante a


pandemia

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO

A pandemia do COVID 19, ocasionada pelo coronavirus, infecção respiratória,


através do decreto nº 6/2020, que reconheceu a pandemia, declarando Estado de
calamidade. Esse vírus trouxe como conseqüência grandes mudanças no cenário Social,
econômico, político e jurídico.

No que tange aos impactos jurídicos, o que mais afetou diretamente são as
relações jurídicas privadas, nas quais eram regidas por um contrato celebrado antes da
pandemia e que não previa em suas clausulas ou formas para extinção ou modificação
do objeto contratado.

No entanto, diante deste impacto diretamente nas relações jurídicas, sobretudo


contratuais, surge para as partes a chamada “insegurança Jurídica”, pois esse contexto
trouxe para as partes, a depender do contrato, uma impossibilidade de adimplir a
obrigação pactuada.

A doutrina, uma das fontes do direito, buscando uma posição acerca das diversas
demandas jurídicas que surge em decorrência deste fato imprevisível, acerca do
adimplemento nas obrigações contratuais durante a pandemia, resgatam os princípios e
teorias contratuais que pode ser argüidas para fins de solução dos conflitos pertinentes a
contratos que foram diretamente atingidos em decorrência da pandemia.

Tendo em vista a relevância do tema, por se tratar de um problema jurídico


atípico, e da sua importância tanto no arcabouço jurídico quanto doutrinário, o projeto
de pesquisa se faz necessário para apresentar as posturas doutrinárias, leis e possíveis
resoluções dos contratos trazidos pela doutrina frente a esse período de crise econômica,
financeira e sanitária.

Sendo assim, justifica apresente pesquisa, diante da sua repercussão sobre a


temática no âmbito teórico e constitucional, que prevê possíveis formas de resoluções
de conflitos contratuais, frente à problemática. Trazendo ainda, as teorias já existentes
na doutrina e os princípios que foram elencados com a Constituição Federal de 1988 e
por fim, as leis esparsas criadas para dirimir abusos contratuais e possibilitar as partes
soluções legais que pode ser aplicadas nesse novo cenário de crise mundial.
CAPITULO 1- PRINCIPIOS CONTRATUAIS

A relação contratual se faz presente desde as primeiras relações sociais


existentes no mundo, iniciando uma construção dos direitos obrigacionais. O instituto
contratual sofre grande influencia social, política e econômica, e com o passar dos
tempos vai se desenvolvendo para atender as demandas e formalidades das partes
contratantes.

Para Carlos Roberto Gonçalves (2011) “o contrato é a mais comum e a mais


importante fonte de obrigação, devido às suas múltiplas formas e inúmeras repercussões
no mundo jurídico. Fonte de obrigação é o fato que lhe dá origem’’ (GONÇALVES,
2011 p. 19) Gonçalves (2020), ressalta que:

“a negociação contratual está presente em toda a relação humana,


abrangendo desde as fases das tratativas, confecção do negócio
jurídico, cumprimento do acordo e ainda quando há excesso de
descumprimento do contrato, fazendo o Direito intervir em todas essas
as modalidades.” (GONÇALVES, 2020, p. 2).

Tendo em vista que a relação contratual esta presente dentro do cotidiano da


sociedade desde ao inicio das relações humanas e sendo um instrumento particular onde
as partes definem as regras do contrato e o objeto contratado, ressalta a importância
desta obrigação para a esfera Estatal em casos de conflitos, descumprimento ou
impossibilidade, por caso fortuito, do adimplemento contratual.

Aquino (2021) faz a seguinte observação, sobre os contratos contemporâneos:

“(...) análise contemporânea do contrato inicia-se com a mudança do


paradigma do contrato como elemento abstrato e estático, observado
na visão clássica ou liberal para uma realidade viva, dinâmica e
vinculada ao processo de satisfação socioeconômico e digno da
pessoa, dentro da qual se insere a concepção contemporânea (moderna
ou social). E, dentro da perspectiva criada pela denominada ‘crise do
contrato’, o ‘dirigismo contratual’ é o fator fundamental de
observação.” (Aquino, 2021, p.24/25)

Aquino (2021) define:

“o contrato é um mecanismo jurídico de relacionamentos


interpessoais, trazendo no seu bojo as declarações negociais comuns
das partes que o integram e além do adimplemento das prestações,
observando as normas cogentes, bem como os contextos situacionais
em que a relação contratual se estabelece e se desenrola.” (Aquino
2021, p.28)

Por tanto, o contrato regulamenta juridicamente as relações socialmente


estabelecidas na esfera particular para atender os interesses e objetivos das partes,
devido sua utilização corriqueira, as partes irão dispor sobre a forma negocial, visando o
adimplemento das obrigações pactuadas.

Tartuce (2019) conceitua:

“O contrato é um ato jurídico bilateral, dependente de pelo menos


duas declarações de vontade, cujo objetivo é a criação, a alteração ou
até mesmo a extinção de direitos e deveres de conteúdo patrimonial.
Os contratos são, em suma, todos os tipos de convenções ou
estipulações que possam ser criadas pelo acordo de vontades e por
outros fatores acessórios.” (Tartuce 2019, p.26 )

O direito contratual, assim como qualquer outro direito, goza da regência de


princípios que vão nortear o contrato ajustado pelas partes, de forma a torna lo,
constitucional e valido, dentro do regime jurídico brasileiro.

Para Tartuce (2019), “princípios são abstraídos das normas, dos costumes, da
doutrina, da jurisprudência e de aspectos políticos, econômicos e sociais.” (Tartuce
2019, p.90)

O direito civil constitucional elenca alguns princípios fundamentais para a


relação contratual: Dignidade da pessoa humana, previsto no art 1º , III, C.R.F./88,
solidariedade social, previsto no art 3º, I, C.R.F./88 e da isonomia, previsto no art 5º,
caput, C.R.F./88, esses princípios foram ressaltados no CPC/2015, art 1º, ressaltando a
importância dos princípios elencados na constituição 1988.

Para Tepedino, Konder e Bandeira (2021):

“A dignidade da pessoa humana constitui cláusula geral,


remodeladora da dogmática do direito civil brasileiro, e principal
elemento normativo para a promoção dos valores existenciais. Opera-
se, segundo a axiologia constitucional, a funcionalização das situações
jurídicas patrimoniais às existenciais, ou seja, a atividade econômica
privada é protegida não como fim em si mesma, mas como
instrumento que visa à realização plena da pessoa humana, a
promover, assim, processo de inclusão social, com a ascensão à
realidade normativa de interesses coletivos e de renovadas situações
jurídicas existenciais desprovidas de titularidades patrimoniais,
tuteladas independentemente (ou mesmo em detrimento) destas.”
(Tepedino, konder e Bandeira 2021 p. 92)

O direito constitucional, trás para o Direito Civil, uma visão humanitária e


impõe certos limites que deverão conter na relação contratual, prezando sempre para um
interesse social dentro do contexto particular. Dentre os princípios enaltecidos pelo
direito civil para a relação contratual, destaca se: principio da autonomia da vontade,
boa fé, função social do contrato e equilíbrio contratual.

1.1- AUTONOMIA DA VONTADE:

O principio da autonomia da vontade, ressalta a manifestação da autonomia das


partes para dispor sobre o objeto contratual que atenda o interesse de ambas as partes
contratantes, no limite da Constituição Federal. Rosenvald e Farias (2017), destaca:

“A autonomia da vontade é centrada em três principios: (a) liberdade


contratual, como livre estipulação do conteúdo do contrato, sendo
suficiente à sua perfectibilidade a inexistência dos vícios subjetivos do
consentimento; (b) intangibilidade do pactuado - o pacto sunt
servanda exprimia a ideia da obrigatoriedade dos efeitos contratuais
pelo fato de o contrato ser justo pela mera razão de emanar do
consenso entre pessoas livres; (c) relatividade contratual, pautada pela
noção da vinculatividade do pacto, restrita às partes, sem afetar
terceiros, cuja vontade é um elemento estranho à formação do negócio
jurídico.” (Rosenvald e Farias 2017, p. 150)

Para Rosenvald e Farias (2017), a autonomia da vontade subdivide em três


princípios: liberdade contratual, intangibilidade do pacto, o contrato possui força
obrigatória e relatividade contratual, que se limita entre as partes.

No que tange a liberdade de contratar trazida através da autonomia da vontade,


Venosa (2020) ressalta:

A “liberdade de contratar pode ser vista sob dois aspectos. Pelo prisma
da liberdade propriamente dita de contratar ou não, estabelecendo se o
conteúdo do contrato, ou pelo prisma da escolha da modalidade do
contrato. A liberdade contratual permite que as partes se valham dos
modelos contratuais constantes do ordenamento jurídico (contratos
típicos), ou criem uma modalidade de contrato de acordo com suas
necessidades (contratos atípicos). Em tese, a vontade contratual
somente sofre limitação perante uma norma de ordem pública.”
(Venosa, 2020, p. 51)

A liberdade inserida no principio da autonomia da vontade, segundo Venosa


(2020), é o que chamamos de “liberdade restrita” ou “liberdade limitada”, que sofre
limitação legal para o “uso” desta liberdade, limitação essa de interesse constitucional
em resguardar direitos das partes, para que não extrapolam na relação contratual,
Venosa (2020, p.53) destaca que “O controle judicial não se manifestará apenas no
exame das cláusulas contratuais, mas desde a raiz do negócio jurídico.”

A autonomia da vontade advém da autonomia privada que é uma característica


do estado liberal, em que o Estado transfere ao particular a autonomia para pactuar entre
eles da melhor forma e maneira em que ficar melhor, possuindo o contrato força de lei
entre as partes. Porém com o avanço social houve a necessidade de o Estado intervir nas
relações privadas, estabelecendo limites e mitigando a força obrigatória dos contratos.

A autonomia da vontade é um principio em que sofre limitação dos outros


princípios como da dignidade da pessoa humana, boa fé, função social, e o interesse
estatal em intervir é justamente para cumprir e assegurar o papel de garantidor da
constituição Federal. É fundamental em uma relação contratual que as partes possuam
autonomia para dispor do objeto contratual, com tudo, também é de extrema
importância esta autonomia ser objeto de tutela estatal.

Dentro desta dicotomia pela qual se faz presente neste principio entre “liberdade
de contratar” e intervenção estatal limitando esta liberdade, neste sentido Pereira (2003):

“O contrato, que reflete por um lado a autonomia da vontade, e por


outro submete-se à ordem pública, há de ser conseguintemente a
resultante deste paralelogramo de forças, em que atuam ambas estas
freqüências. Como os conceitos de ordem pública e bons costumes
variam, e os conteúdos das respectivas normas por via de
conseqüência, certo será então enunciar que em todo tempo o contrato
é momento de equilíbrio destas duas forças, reduzindo-se o campo da
liberdade de contratar na medida em que o legislador entenda
conveniente alargar a extensão das normas de ordem pública, e vice-
versa.” (Pereira, 2003, p.27)

Destaca se em qualquer relação contratual, a respeito da autonomia da vontade,


neste sentido o TRT-1, reforça a autonomia dentro da relação de trabalho:

CORREIOS. AUXÍLIO CRECHE. NORMA COLETIVA QUE SE


APLICA ÀS EMPREGADAS, EXCLUSIVAMENTE.
IMPOSSIBILIDADE DE EXTENSÃO AO GÊNERO
MASCULINO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA AUTONOMIA
DA VONTADE. A cláusula do instrumento normativo que prevê
reembolso de auxílio creche para empregadas mulheres e apenas aos
empregados homens separados judicialmente ou pais solteiros não
viola o princípio da isonomia, devendo ser interpretada
restritivamente. Relevante destacar que tais pactuações são fruto
da negociação coletiva, sendo assim, deve-se privilegiar o
princípio da autonomia da vontade. Recurso da ré a que se dá
provimento.
(TRT-1 - RO: 01012461920175010025 RJ, Relator: GLAUCIA
ZUCCARI FERNANDES BRAGA, Data de Julgamento:
25/07/2018, Segunda Turma, Data de Publicação: 22/08/2018)
(grifei)

1.2- BOA- FÉ

A boa-fé é um principio bastante antigo e que é considerado basilar em qualquer


relação, inclusive juridicamente, sua importância se da pela avaliação de
comportamento e intenções relevantes para a configuração do contrato. A boa fé pode
ser subjetiva, quando não há uma intenção do sujeito, ou pode ser objetiva, quando o
seu comportamento não é esperado ou não é considerado “correto” ligado a uma
questão moral ou ética.

Farias e Rosenvald (2017), conceitua a boa fé subjetiva como sendo:

“um estado psicológico em que a pessoa possui a crença de ser titular


de um direito que em verdade só existe na aparência. O indivíduo se
encontra em escusável situação de ignorância sobre a realidade dos
fatos e da lesão a direito alheio.” (Rosenvald e Farias 2017, p. 173)

Para Venosa (2020) a boa fé subjetiva:

“O manifestante de vontade crê que sua conduta é correta, tendo em


vista o grau de conhecimento que possui de um negócio. Para ele há
um estado de consciência ou aspecto psicológico que deve ser
considerado.” (Venosa, 2020, p. 57)
A boa fé objetiva esta atrelada na autonomia da vontade, segundo Farias e
Rosenvald (2017) trata-se da "confiança adjetivada", ou seja, “uma crença efetiva no
comportamento alheio” (Rosenvald e Farias 2017, p. 174), este principio esta muito
direcionado ao comportamento eticamente esperado das partes. Neste sentido, Farias e
Rosenvald, destaca:

“A boa-fé objetiva pressupõe: (a) uma relação jurídica que Ligue duas
pessoas, impondo-Lhes especiais deveres mútuos de conduta; (b)
padrões de comportamento exigíveis do profissional competente,
naquilo que se traduz como bonus pater famiLias; (c) reunião de
condições suficiente para ensejar na outra parte um estado de
confiança no negócio celebrado.” (Rosenvald e Farias 2017, p. 174)

A boa fé objetiva esta ligada na conduta humana, ou seja, em uma ação positiva
esperada pela outra parte. A boa fé subjetiva esta muito ligada a condutas éticas e
morais previamente estabelecidas, como por exemplo, se um sujeito assume a obrigação
X, é esperado que ele cumpra com esta obrigação. Venosa (2020) elucida que na boa fé
objetiva:

“O intérprete parte de um padrão de conduta comum, do homem


médio, naquele caso concreto, levando em consideração os aspectos
sociais envolvidos. Desse modo, a boa-fé objetiva se traduz de forma
mais perceptível como uma regra de conduta, um dever de agir de
acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e
reconhecidos” (Venosa, 2020, p. 57)

Por tanto, a boa fé objetiva e subjetiva, possui uma importância fundamental na


relação contratual, haja vista que um esperado comportamento dentro da relação
contratual é que as partes psicologicamente ou conscientemente tenham intenção de
cumprir o contrato e assumem posturas e condutas que visem este fim, conforme dispõe
o art. 422 do Código Civil de 2002: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim
na conclusão do contrato, como em sua execução, os principias da probidade e boa fé.”

Para dar ênfase a importância contratual do principio da boa fé objetiva, se faz


necessário a referencia de jurisprudência que cita o principio da boa fé.

DIREITO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE


Consultoria e Defesa Administrativa e Tributária. contratada.
envolvimento em operação da polícia federal. esquema de tráfico de
influência e corrupção. âmbito recursal administrativo. rescisão
unilateral do contrato. justa causa. presença. boa-fé e deveres
correlatos. infringência. violação positiva do contrato. honorários ad
exitum. verba não devida.  execução. extinção. I. O princípio da boa-
fé objetiva é a mais imediata tradução do princípio da confiança e
impõe aos contratantes a atuação de acordo com determinados
padrões de lisura, retidão e honestidade, de modo a não frustrar a
legítima expectativa e confiança despertada em outrem. II. Os
deveres de conduta impõem que, para se alcançar o interesse
perseguido no contrato, as partes sejam blindadas- de intromissões
danosas na sua esfera de vida pessoal e patrimonial que possam atingir
a relação obrigacional. III. A lesão aos deveres anexos à boa-fé
objetiva, como ocorre com o rompimento da relação de confiança
que existe entre as partes, constitui a chamada violação positiva
do contrato e configura inadimplemento contratual a autorizar a
resolução do vínculo contratual, mesmo quando cumprida
parcialmente a obrigação principal. IV. Verifica-se a existência de
justa causa para rescisão unilateral do contrato, quando a conduta
esperada e desejada de lisura e honestidade da contratada foi maculada
em razão de seu envolvimento em operação policial, ocorrendo quebra
da confiança no êxito da sua atuação, ou no modo em que este seria
alcançado, e, portanto, há inadimplemento em razão da violação dos
deveres anexos à boa-fé objetiva.(...) (Classe do Processo:
07113605220198070001 - Res. 65 CNJ, Registro do Acórdão
Número: 1290939 Data de Julgamento:14/10/2020 Órgão Julgador: 6ª
Turma Cível Relator:JOSÉ DIVINO Data da Intimação ou da
Publicação: Publicado no DJE : 03/11/2020 . Pág.: Sem Página
Cadastrada.) (grifei)

Diante do julgamento trazido pelo TJ DF e os fundamentos pelo qual se norteou


o julgado, destaca se mais uma vez que a boa fé contratual é fundamental para compor a
relação jurídica, uma vez que se traduz em um vinculo de confiança e lealdade entre as
partes conforme dispõe o art. 422 C.C./02. O STJ, afirma a vigência da boa fé objetiva
contratual:

CIVIL E EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE


RESOLUÇÃO CONTRATUAL. FRANQUIA. BOA-FÉ OBJETIVA.
ART. 422 DO CC/02. DEVERES ANEXOS. LEALDADE.
INFORMAÇÃO. DESCUMPRIMENTO. FASE PRÉ-
CONTRATUAL. EXPECTATIVA LEGÍTIMA. PROTEÇÃO.
PADRÕES DE COMPORTAMENTO (STANDARDS). DEVER DE
DILIGÊNCIA (DUE DILIGENCE). HARMONIA.
INADIMPLEMENTO. CONFIGURAÇÃO. PROVIMENTO. (...) 4.
Segundo a boa-fé objetiva, prevista de forma expressa no art. 422
do CC/02, as partes devem comportar-se de acordo com um
padrão ético de confiança e de lealdade, de modo a permitir a
concretização das legítimas expectativas que justificaram a
celebração do pacto. 5. Os deveres anexos, decorrentes da função
integrativa da boa-fé objetiva, resguardam as expectativas
legítimas de ambas as partes na relação contratual, por
intermédio do cumprimento de um dever genérico de lealdade,
que se manifesta especificamente, entre outros, no dever de
informação, que impõe que o contratante seja alertado sobre fatos
que a sua diligência ordinária não alcançaria isoladamente.
Documento: 1996490 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado -
DJe: 18/12/2020 Página 1de 6 Superior Tribunal de Justiça 9. O
princípio da boa-fé objetiva já incide desde a fase de formação do
vínculo obrigacional, antes mesmo de ser celebrado o negócio
jurídico pretendido pelas partes. Precedentes. (...) 12. Na resolução
do contrato por inadimplemento, em decorrência da
inobservância do dever anexo de informação, não se trata de
anular o negócio jurídico, mas sim de assegurar a vigência da boa-
fé objetiva e da comutatividade (equivalência) e sinalagmaticidade
(correspondência) próprias da função social do contrato
entabulado entre as partes. (...)11. Recurso especial provido.
(RECURSO ESPECIAL Nº 1.862.508 - SP (2020/0038674-8)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRA NANCY ANDRIGHI RECORRENTE
: TMI TRATAMENTO TEXTIL LTDA ADVOGADOS : ROBERTO
CORRÊA DE MELLO - SP050679 MARIANA RODRIGUES DE
CARVALHO MELLO - SP229571 THIAGO JABUR CARNEIRO -
SP255663 CARLOS FERNANDO MATHIAS DE SOUZA -
DF000530 RECORRIDO : 5 A SEC DO BRASIL FRANCHISING
LTDA ADVOGADO : RAFAEL BERTACHINI MOREIRA
JACINTO - SP235654 ADVOGADOS : RENATA MOQUILLAZA
DA ROCHA MARTINS - SP291997 LUCAS DE ALMEIDA
CORREA - SP285717) (grifei)

Com objetivo de reforçar a relevância do principio da Boa fé para compor


qualquer negocio jurídico contratual, trouxe Julgados que menciona o principio em
epigrafe, neste sentido também, ressalta que a boa fé esta ligada a aspectos subjetivos e
objetivos do negocio jurídico, sendo atrelado a normas éticas e morais da sociedade.

1.2- FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

A função social dos contratos estende o interesse contratual, para uma visão
ampla, na qual deverá atender esse limite contratual, conforme dispõe art 421 C.C./2002
“A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do
contrato” (Código civil brasileiro 2002), nesse sentido, Tartuce (2019) “o, a função
social dos contratos visa à proteção da parte vulnerável da relação contratual.” (Tartuce
2019, p.102).

Com o avanço da figura do Estado Democrático de Direito sobre as relações


particulares entende a necessidade deste principio como fundamental para a relação
contratual, uma vez que institui que a autonomia privada atenda aos moldes da função
social como um todo, conforme dispõe a C.F. no art 1º, IV “valor social da livre
iniciativa”
Conforme dispõe o art 421 do C.C.: "A liberdade de contratar será exercida em
razão e nos limites da função social do contrato." Se depreende que a liberdade de
contratar, possui limites impostos sobre as partes que é atender as funções sociais do
contrato, neste ponto Farias e Rosenvald (2017), chama a atenção:

“O contrato não "é" função social. Ele é dotado de função social. Não
existe uma hierarquia que submeta a autonomia privada aos desígnios
de uma coletividade, como se os contratantes fossem zeladores a
serviço da sociedade. Ao inverso, a coletividade pode ser
materializada no conjunto de pessoas que integram um mercado de
bens e serviços e aspiram pela conciliação entre uma eficiente
circulação de créditos e uma justa, previsível e segura regulamentação
dos dinâmicos interesses que alicerçam esse mercado. Pelo contrário,
a função social pode exercitar importante papel de fortalecimento da
ordem do mercado, tutelando instituições, princípios e regras que
promovam um saudável ambiente econômico concorrencial. Caberá à
doutrina, ao legislador e aos tribunais o mister de aclarar a função
social dos diversos modelos jurídicos negociais, elencando-se aí as
situações patrimoniais do contrato, a propriedade, o direito de , família
e as sucessões, bem como os negócios jurídicos não patrimoniais
ligados aos direitos da personalidade.”

Por tanto, a função social, esta muito mais ligada a uma limitação interna, pelas
partes, do que uma limitação externa, haja vista que o contrato cumpre a sua função
social quando visto de uma maneira ampla e social que não infrinja efeitos negativos a
terceiros e nem a coletividade, prezando o contrato em atender primordialmente a
dignidade da pessoa humana na relação privada, Pereira (2020) ressalta a finalidade
deste principio:

“A função social do contrato serve para limitar a autonomia da


vontade quando tal autonomia esteja em confronto com o interesse
social e este deva prevalecer, ainda que essa limitação possa atingir a
própria liberdade de não contratar, como ocorre nas hipóteses de
contrato obrigatório.” (Pereira, 2020, p. 18)

O TJ DF, destaca a importância deste principio em seu julgamento:

CIVIL. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. COBRANÇA.


CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE
CONTABILIDADE. GESTÃO CONDOMINIAL. PRESTAÇÃO
DEFEITUOSA PELA CONTRATADA. ADIMPLEMENTO
IMPERFEITO. PRINCÍPIOS DA PROBIDADE E DA BOA-FÉ
CONTRATUAIS. ART. 422 DO CC/02. PRINCÍPIO DA FUNÇÃO
SOCIAL DO CONTRATO. ART. 421 DO CC/02. VIOLAÇÃO DA
CONFIANÇA. DIREITO POTESTATIVO DE RESCISÃO DO
CONTRATO. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. COBRANÇA
DE VERBAS RESCISÓRIAS. IMPOSSIBILIDADE.
HONORÁRIOS PROFISSIONAIS ATINENTES AO MÊS DA
RESCISÃO. VERBAS DEVIDAS. RECURSO CONHECIDO E
PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM
PARTE. 1. (...) 3. O princípio da função social do contrato disposto
no art. 421 do Código Civil prestigia a relação de cooperação
entre os contratantes durante todo o tempo em que o negócio
jurídico viger, tendo como uma de suas finalidades a
contemplação da equidade contratual a fim de manutenção do
contrato e seu adimplemento, evitando-se abusos dos quais
decorram prejuízo contra os que se encontrarem em situação de
inferioridade nas relações contratuais. 4. Ensejando a contratada o
inadimplemento contratual por não ter dado fiel cumprimento às
obrigações às quais se vinculara nas estipulações contratuais,
seguramente violou a confiança nela depositada pelo contratante,
infringindo os princípios da probidade e da boa-fé (art. 422 do CC),
sendo, portanto, legítima a conduta da parte contratante em utilizar seu
consequente direito protestativo de rescisão do contrato no fito de pôr
fim à avença (art. 475 do CC). 4.1. Assim, não tendo a prestação sido
adimplida da forma contratada (adimplemento imperfeito), resta
configurada espécie de inadimplemento pela parte autora, não lhe
sendo facultada a cobrança dos valores apontados e inicial oriundos da
resolução contratual.(...). (TJ-DF - APC: 20140710351750, Relator:
ALFEU MACHADO, Data de Julgamento: 17/03/2016, 1ª Turma
Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 05/04/2016 . Pág.: 238)
(grifei)

Neste julgado ressalta o principio da função social na relação jurídica em analise


como um ato de cooperação entre as partes durante a regência do negocio jurídico,
destacando também no fundamento, o interesse social através da busca por uma
paridade entre as partes.

1.3- EQUILIBRIO CONTRATUAL


O equilíbrio contratual é um principio fundamental para compor a relação contratual,
trazendo para o negocio jurídico uma proporcionalidade na relação e dos direitos e
deveres dela advindos, resultando em uma igualdade contratual, vedando a
excessividade de direitos e deveres, para Tepedino, konder e Bandeira (2021):

“O princípio de equilíbrio contratual no direito contratual, garante a


correspectividade entre as prestações, manifesta-se principalmente,
embora não exclusivamente, por meio de institutos como a lesão e a
onerosidade excessiva. Enquanto a lesão coíbe contratos celebrados de
forma desproporcional, com vício de origem, a onerosidade excessiva
atinge os contratos que, embora celebrados de forma proporcional,
tornaram-se desequilibrados por fato superveniente ao longo de sua
execução.” (Tepedino, konder e Bandeira, 2021, p.224)

A extinção contratual por fatos supervenientes pressupõe que o contrato existe e


é valido, no entanto não produz os efeitos por fato externos que atinge a relação
contratual, especificamente, uma das partes, tornando sem efeito o contrato, por falta de
um requisito para a sua eficácia.

Para Farias e Rosenvald (2017), a ineficácia contratual pode se dar de forma


simples, quando faltar um requisito, pode ser também relativa, quando for sobre um
contrato não eficaz a um tipo especifico de pessoa, permanecendo eficaz as demais ou
pode ser superveniente, com previsão na teoria geral dos contratos, para eles:

“Fatos supervenientes à relação obrigacional podem conduzi-la à


extinção, concedendo eficácia ou ineficácia ao negócio jurídico. O
cumprimento do contrato é fator de eficácia. O pagamento se traduz
em prestação satisfativa por parte do devedor em prol do credor”
(Farias e Rosenvald, 2017, p. 572)

Sobre o fato superveniente, as partes podem através de clausula resolutiva prevê


a extinção contratual, com previsão legal no art. 474 do Código Civil que dispõe: "A
cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação
judicial", ou seja, expressamente prevista no instrumento contratual ou implícita no
contrato, podendo a parte lesada requerer perdas e danos sobre o inadimplemento e seus
efeitos.

De acordo com Farias e Rosenvald (2017) :


“A vantagem da inserção de tal cláusula reside na prévia estipulação
do alcance da resolução quanto às prestações pretéritas, como no
desfazimento automático do contrato diante do inadimplemento, sem
que necessite o credor interpelar o devedor, pois, vencida a dívida,
sobeja este constituído em mora. Conforme ressai do Enunciado n'
435 do Conselho de Justiça Federal: ‘A cláusula resolutiva expressa
produz efeitos extintivos independentemente de pronunciamento
judicial’ ”( Farias e Rosenvald, 2017, p. 573)

No entanto, a possibilidade de uma clausula resolutiva, se traduz em uma


possibilidade do contrato particular prever hipóteses que ocorrendo, extinguirão o
contrato. Desta forma, as partes se utilizam da aplicação dessas clausulas que pode ou
não prevê penalidades (multa) quando houver fatos que não possibilita o cumprimento
obrigacional.

Outra possibilidade de previsão contratual e estipulação de clausula que, de certa


forma, soluciona imprevisão contratual é a Clausula de arrependimento que possui
regulamento no código civil/02 no art 420:

“Se no contrato for estipulado o direito de arrependimento para


qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente
indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da
outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em
ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar.”
(Codigo civil, 2002, art 420)

As arras ou sinal são os valores que visa garantir a solução obrigacional, este
valor ensejará na clausula de arrependimento para fins de indenização, caso ocorra o
adimplemento da clausula de arrependimento, possibilitando uma rescisão unilateral do
contrato por qualquer uma das partes.

Segundo explica Farias e Rosenvald, (2017)

“O valor das arras penitenciais não pode ser extrapolado em sequer


um centavo, pois ele é tudo aquilo que as partes ajustaram para o caso
de uma delas futuramente deliberar por não celebrar o contrato com a
outra, reavendo sua liberdade. Enfim, o sinal é o preço adiantado
para o contratante se exonerar de um vinculo, nada mais dele ser
exigido pela parte inocente.” ( Farias e Rosenvald, 2017, p. 577)
A resilição contratual é uma forma de por fim ao vinculo contratual de forma
unilateral ou não, podendo ser expressamente desfeita a obrigação contratual com um
distrato, por exemplo, na qual se extingue o contrato celebrado pelas partes. O distrato
possui previsão no código civil art 472: “O distrato faz-se pela mesma forma exigida
para o contrato.”

Para Farias e Rosenvald, (2017):

“O distrato possui natureza de negócio juridico bilateral


destinado à extinção contratual. Por mútuo consenso as partes
deliberam pelo término das relações obrigacionais.” ( Farias e
Rosenvald, 2017, p. 578/579)

Por fim, resta falar da resolução contratual, que se traduz em uma extinção
contratual por fato superveniente, motivada por uma disparidade contratual, por força
deste evento, o que trás ao contrato um desequilíbrio entre as partes e impossibilita o
cumprimento de forma estipulada.

O Código Civil, 2002, em seu art. 475, prevê que: "A parte lesada pelo
inadimplemento pedir a resolução do contrato. Se não preferir exigir-lhe cumprimento,
cabendo qualquer dos casos, indenização por perdas e danos". (código civil/2002, art
475). Farias e Rosenvald, (2017), cita três elementos que podem dar causa a esta
resolução:

“O remédio resolutório é, portanto, fruto de um fato superveniente. O


contrato nasce perfeitamente equilibrado- há o sinalagma genético ao
tempo de sua formação, mas um evento ulterior introduz um
desequilíbrio que gera a perda da situação equivalência originária.
Cuida-se do inadimplemento absoluto, hipótese em que a ,prestação
não foi cumprida nem poderá sê-Lo. Três são as circunstâncias que
conduzem ele: (a) a prestação que não é mais capaz de realizar os
interesses objetivos do (art. 475, CC); (b) a prestação que se tornou
objetivamente impossível (arts. 235, 238 e 256, CC); (c) a prestação
que se tornou inexigível pela alteração superveniente das
circunstâncias (art. 478, CC)” ( Farias e Rosenvald, 2017, p.590)

A hipótese de resolução tem como finalidade estabelecer as partes o equilíbrio


contratual que foi comprometido com o fato atípico, resolvendo de forma a estabelecer
as partes a voltar ao estagio originário, sem a exigibilidade do contrato, tendo em vista
os princípios contratuais que regem os contratos e veda o desequilíbrio contratual, neste
sentido a jurisprudência:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO
DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL
OU EQUILIBRIO
CONRATUAL - SOBRESTAMENTO - MATÉRIA
DIVERSA - PROSSEGUIMENTO DO FEITO.O tema 958 do STJ
representado pelos processos REsp 1578526/SP, REsp
1578553/SP e REsp 1578490/SP, discutem a validade da cobrança,
em contratos bancários, de despesas com serviços prestados por
terceiros, registro do contrato e/ou avaliação do bem. Todavia, o
presente processo não discute a validade da cobrança da tarifa
denominada serviços de terceiros, mas, sim,
o equilíbrio contratual e análise de juros e capitalização. Tratando
os autos de revisão de clausulas atinentes aos juros e capitalização,
não há que se falar em seu sobrestamento.( Processo AI
10000180755936001 MG Publicação 28/02/2019 Julgamento 27 de
Fevereiro de 2019 Relator Marcos Henrique Caldeira Brant)

Os princípios contratuais servem para nortear a relação privada e também como


fundamento e podendo ser uma regra para os juristas se pautarem, cumprindo o objetivo
de um Estado Democrático de Direito, garantindo desta forma uma materialização do
seu fundamento prezando pelos direitos individuais e, sobretudo protegendo a dignidade
da pessoa humana.
CAPITULO 2- RESOLUÇOES DO CONTRATO

Toda relação contratual, inicia com uma intenção positiva para o fim do
contrato, qual seja: o adimplemento contratual e as obrigações cumpridas conforme o
acordo pactuado. No entanto, há hipóteses em que o contrato se torna impossível
adimplir, seja decorrentes de situação superveniente do contrato.

O contrato, uma vez pactuado, ira possui efeito entre as partes, que não pode
deixar de cumpri a obrigação, uma vez que o brocardo diz: “o contrato faz lei entre as
partes”, por tanto, uma vez pactuado e assumido a obrigação mutua entre as partes, não
se admite desfazer clausulas presentes no instrumento contratual para atender a um
interesse particular.

Segundo Aquino (2021):

“o contrato somente poderá ser desfeito pelo consenso mútuo ou por


força legal, aqui se aprende as formas de cancelamento do contrato
por distrato, rescisão, resolução, resilição ou morte dos contratantes
em caso de contrato personalismo” (Aquino 2021, p. 387).

Neste sentido, a resolução contratual com o cumprimento assumido pelas partes


se torna a regra, por tanto, a proposta do trabalho visa salientar sobre a exceção do não
cumprimento contratual e seus efeitos cabíveis, seja por força de lei ou por fato
superveniente ao contrato que torna impossível a cumprir a obrigação contratual.

A possibilidade de revisão contratual se torna admissível quando se trata de caso


fortuito ou força maior que impacta no cumprimento contratual, uma vez que
comprovada a situação, uma das partes deixará de adimplir a sua obrigação por um
motivo externo a sua vontade.

2.1- ONEROSIDADE EXCESSIVA

A onerosidade excessiva torna uma causa justa para a extinção contratual, uma
vez que o contrato deve atender ao principio do equilíbrio contratual, conforme já
exposto anteriormente, e a onerosidade coloca uma das partes sobre vantagem em
relação à outra, o código civil no art 478, dispõe:

“Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de


uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema
vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os
efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.”
(Codigo Civil brasileiro, 2002, art.478)

A redação do código civil estabelece alguns requisitos para a incidência em


onerosidade excessiva, dos quais: o contrato devera ser de execução continuada, aquele
em que o contrato se finda com o adimplemento mediato, este contrato deverá ter o
elemento de vantagem de uma parte sobre a outra, ocorrendo através de um fato
extraordinário e imprevisível.

No sec. XIX, a clausula “rebus sic stantibus”, permitia que os contratantes,


quando estivesse em condições econômica desfavorável para alguma das partes,
extinguir os efeitos do contrato e retomar ao estatos quo, esta clausula mitigava o
principio: “pacta sunt servanda”, na qual definia em que o contrato possui força
obrigatória, devendo ser cumprido pelas partes, por essa razão e pela época imperar a
autonomia da vontade a clausula não era muito utilizada pela sociedade a época.

Com a chegada do sec XX, resgatou a clausula “rebus sic stantibus” na teoria
da imprevisão, a qual as partes poderiam alegar a impossibilidade de adimplir a
obrigação, desde que houvesse algum acontecimento imprevisível para a incidência
desta teoria.

A respeito de quando o contrato se torna excessivamente oneroso, Mello (2017),


diz:

“O contrato será considerado excessivamente oneroso a partir do


momento em que causar um desequilíbrio economicamente
insuportável para um dos contraentes. É uma espécie de cláusula
aberta. Neste caso, o magistrado deverá utilizar a discricionariedade
para decidir o caso concreto decidindo. Mais uma vez lembramos que
discricionariedade não significa arbitrariedade. No caso concreto
decidindo o juiz deverá analisar a possibilidade de ocorrência de um
prejuízo patrimonial sofrido por uma das partes contratantes que
venha a modificar o equilíbrio econômico da avença.” (Mello, 2017,
p. 197)

Mello (2017), diz que o contrato excessivamente oneroso ocorre quando há um


desequilíbrio contratual, na qual uma da parte esta em vantagem economicamente, sobre
a outra, ficando a cargo do juiz fazer uma analise bastante detalhada e cuidadosa para
analisar se de fato, o fato era imprevisível e coloca a outra parte em uma vantagem
sobre a outra parte.

O contrato excessivamente oneroso poderá ensejar em uma resolução ou


modificação contratual conforme dispõe o art 478 do C.C./02, já citado acima, a
resolução contratual trás a possibilidade de poder restabelecer o equilíbrio contratual
que foi de forma eventual e imprevisível. Sobre esse tema dispôs no conselho da justiça
Federal, nas III e IV Jornadas de Direito Civil:

Conselho da Justiça Federal - III Jornada de Direito Civil

• CJF - Enunciado 175 - Art. 478: A menção à imprevisibilidade e à


extraordinariedade, insertas no art. 478 do Código Civil, deve ser
interpretada não somente em relação ao fato que gere o desequilíbrio,
mas também em relação às consequências que ele produz.

Ressalta- se que o fato imprevisível, alegado por uma das partes, deve haver uma
interpretação ampla em relação ao fato imprevisível abarcando também as suas
conseqüências jurídicas para o efeito do inadimplemento contratual acerca deste fato.

• CJF - Enunciado 176 - Art. 478: Em atenção ao princípio da


conservação dos negócios jurídicos, o art. 478 do Código Civil de
2002 deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial dos
contratos e não à resolução contratual.

Neste enunciado evidencia a conservação do negocio jurídico ou possibilidade


de revisão contratual, devendo ser feita de forma a conservar o negocio pactuado, uma
vez que a autonomia da vontade é enaltecida nas relações jurídicas contratuais, evitando
a resolução contratual, ou seja a interferência Jurídica do Estado na esfera particular

Conselho da Justiça Federal - IV Jornada de Direito Civil

• CJF - Enunciado 365 - Art. 478. A extrema vantagem do art. 478


deve ser interpretada como elemento acidental da alteração de
circunstâncias, que comporta a incidência da resolução ou revisão do
negócio por onerosidade excessiva, independentemente de sua
demonstração plena.

O presente enunciado do CJF, destaca em relação a “extrema vantagem” que trás


o art 478 do C.C. deve ser entendida como um elemento acidental da alteração de
circunstancias, ou seja, um fato imprevisível por ambas as partes e que configure uma
onerosidade excessiva dentro da relação contratual incidindo nestes aspectos a resolução
ou revisão contratual.

• CJF - Enunciado 366 - Art. 478. O fato extraordinário e imprevisível


causador de onerosidade excessiva é aquele que não está coberto
objetivamente pelos riscos próprios da contratação. Conselho da
Justiça Federal - V Jornada de Direito Civil

O fato imprevissivel não pode esta implicitamente nos “riscos negociais” em que
as partes assume caso aconteça, mas deve estar além da vontade de ambas as partes,
sendo um fato externo a obrigação pactuada que torna a onerosidade excessiva e
possibilita um desequilíbrio contratual.

• CJF - Enunciado 439 Art. 478: A revisão do contrato por


onerosidade excessiva fundada no Código Civil deve levar em conta a
natureza do objeto do contrato. Nas relações empresariais, observar-
se-á a sofisticação dos contratantes e a alocação de riscos por eles
assumidas com o contrato.

A partir deste enunciado, 439, se conclui que para revisão contratual deve
também observar a natureza do objeto contratado, ou seja, uma analise se o objeto
contratual através do fato imprevisível cooperou para a caracterização da onerosidade
excessiva dentro do negocio jurídico

Por fim, ressalta que os enunciados visam esclarecer o art 478 C.C./02, trazendo
o entendimento que o referido artigo pode propiciar a parte prejudicada
economicamente a buscar uma paridade contratual, através da resolução ou revisão do
contrato, atendendo ao principio da conservação dos negócios jurídicos, e sendo o
evento imprevisível aquele que não e assumido pelos riscos do contrato, devendo
observar a natureza do objeto contratual, sendo possível o evento ocorrer nos contratos
aleatórios.

Diante dos critérios analisados para a incidência da teoria da onerosidade


excessiva através de um fato imprevisível dentro da relação contratual, é importante a
observância do de cada caso especificamente se houve a subsunção, neste sentido a
jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE ALUGUEL.
PANDEMIA. COVID-19. DESPROPORÇÃO DE
CONTRAPRESTAÇÕES. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE.
TEORIA DA ONEROSIDADE EXCESSIVA. TEORIA DA
IMPREVISÃO. 1. A pandemia de COVID-19, com as consequentes
medidas governamentais implantadas a fim de conter sua
disseminação, impactou de forma negativa os setores econômicos;
no entanto, deve-se ter cautela na análise de demandas que requerem
a revisão judicial de contratos, em especial quanto à capacidade
econômica de ambos os contratantes. 2. Em sede de ação revisional
de aluguel, devem ser ponderadas as condições expostas por
ambas as partes durante a crise gerada pela pandemia,
comprovando-se eventual desproporção de contraprestações
para interferência judicial no conteúdo do ajuste anteriormente
firmado. 3. A revisão contratual, em que se aplica a Teoria da
Onerosidade Excessiva, ocorre nos casos em que houver
alteração das circunstâncias gerando enorme vantagem para
uma parte e imenso prejuízo para a outra. 4. O Código Civil
positivou a Teoria da Imprevisão em seu art. 317, que autoriza a
revisão judicial do contrato, sem execução imediata, para
manter o equilíbrio entre o valor da prestação devida e o do
momento de sua execução, quando um fato imprevisível e
superveniente demonstrar, comprovadamente, desproporção de
contraprestações. (...) (TJ-DF 07186581620208070016 DF
0718658-16.2020.8.07.0016, Relator: ANA CANTARINO, Data de
Julgamento: 02/12/2020, 5ª Turma Cível, Data de Publicação:
Publicado no DJE : 15/12/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Neste julgado, devido ao fato imprevisível de uma pandemia, afetou


onerosamente o contrato de aluguel, teoria que foi argüida por uma das partes, que
culminou em um pedido revisional do contrato de aluguel. Sendo assim destaca-se que a
Teoria em analise possui uma importância bastante robusta dentro do arcabouço
doutrinário na relação jurídica.

2.2- TEORIA DA IMPREVISÃO

A teoria da imprevisão, conforme já exposto brevemente, surge no sec


XVII/XIX, com a clausula “rebus sic stantibus” , prevendo para os contratos, uma
hipótese que enseja o desequilíbrio econômico, através de um fato imprevisível, o
código de Hammurabi, nº48, dispunha:
“Se alguém tem um débito a juros e uma tempestade devasta o campo
ou destrói a colheita, ou por falta d’água não cresce o trigo no campo,
ele não deverá nesse ano dar trigo ao credor, deverá modificar sua
tábua de contrato e não pagar juros por esse ano” (código de
hammurabi, nº48)

Desta forma a legislação a época, permitia aos contratantes que em decorrência


de fato natural imprevisível, pudesse se desfazer a relação contratual, sem ao menos
falar em pagamentos de indenização a outra parte, por outro lado, no império Romano
na lei das XII tabuas, exigia a obrigatoriedade do cumprimento do que foi pactuado,
haja vista que na época a autonomia privada fazia força de lei, podendo inclusive ser
responsabilizado com a própria vida.

Com a chegada do sec XX, a teoria da imprevisão, espelhada na clausula “rebus


sic stantibus”, procurou estabelecer um parâmetro na qual fatos imprevisíveis
ocorrendo a qualquer momento contratual em virtude de fato extraordinário segundo
Mello(2017):

“na primeira metade do século XX, a Teoria da Imprevisão procurou


reviver de certa forma a cláusula rebus sic stantibusy já que seria
possível resolver o contrato ou rever o conteúdo de suas cláusulas, a
partir da ocorrência de acontecimentos novos e imprevisíveis, não
imputáveis aos contraentes.” (Mello, 2017, p. 214)

A pandemia da COVID-19, tem requisitado a teoria da imprevisão para resolver


a relação jurídica prejudicada no âmbito particular, como locação, contrato de trabalho,
compra e venda, enfim, as modalidades contratuais que em uma medida ficou
prejudicado adimplir a contraprestação devido ao fato da drástica conseqüência na
saúde publica e nos riscos que este vírus causou a sociedade, em especial, o Brasil.

O vírus que ensejou na pandemia em 2019, conoravirus, devido ao alto índice de


letalidade com a contaminação deste vírus, levou aos Estados- nação, estados e
municípios a adotarem medidas concisas para conter a contaminação e frear a
propagação deste vírus, desta forma, a lei 13979/2020, dispõe em seu texto normativo
medidas de enfrentamento a pandemia.

A pandemia de fato, foi um acontecimento imprevisível que atingiu a saúde,


educação e financeiramente, tendo impacto diretamente ou indiretamente no
cumprimento contratual, colocando uma das partes prejudicada, seja porque adotou
como medida para contenção o isolamento, gerando menos circulação de pessoas e
assim afetando o comercio local e impactando na prestação de alugueis e outras
despesas, tendo como conseqüência uma alta na demanda processual para a resolução
contratual.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO REVISIONAL


DE ALUGUEL - PANDEMIA DE COVID 19 - TEORIA DA
IMPREVISÃO - ALTERAÇÃO DE ÍNDICE- NECESSIDADE
DE DEMONSTRAÇÃO DE EFEITOS CONCRETOS. EMENTA:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO REVISIONAL DE
ALUGUEL - PANDEMIA DE COVID 19 - TEORIA DA
IMPREVISÃO - ALTERAÇÃO DE ÍNDICE- NECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO DE EFEITOS CONCRETOS EMENTA:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO REVISIONAL DE
ALUGUEL - PANDEMIA DE COVID 19 - TEORIA DA
IMPREVISÃO - ALTERAÇÃO DE ÍNDICE- NECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO DE EFEITOS CONCRETOS. EMENTA:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO REVISIONAL DE
ALUGUEL - PANDEMIA DE COVID 19 - TEORIA DA
IMPREVISÃO -- ALTERAÇÃO DE ÍNDICE- NECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO DE EFEITOS CONCRETOS - Os pedidos
relacionados à revisão dos contratos, fundada na dificuldade
financeira decorrente da pandemia, devem ser analisados
individualmente de forma a verificar o efetivo reflexo da
pandemia sobre o equilíbrio do contrato no caso concreto - Não
deve ser alterado o índice de reajuste livremente pactuado quando
não demonstrada sua inadequação.

(TJ-MG - AI: 10000212779888001 MG, Relator: Cavalcante Motta,


Data de Julgamento: 29/03/2022, Câmaras Cíveis / 10ª CÂMARA
CÍVEL, Data de Publicação: 04/04/2022) (grifei)

O julgado trazido demonstra a arguição da teoria da imprevisão na relação


contratual, ressaltando a necessidade de uma analise detalhada em relação ao caso
concreto para uma verificação minuciosa sobre as consequências da pandemia para a
relação contratual, minimizando a interferência estatal na esfera particular em
observância aos princípios contratuais.
CAPITULO 3- O IMPACTO DA PANDEMIA NOS CONTRATOS:

Embora haja artigos que possibilitam a revisão contratual baseada na alegação


de caso fortuito ou força maior no Código Civil, como o art. 393, ou e onerosidade
excessiva, art. 478, Andrade (2020), alega que a pandemia da COVID-19, trouxe para o
direito civil, diversos problemas para a resolução contratual em período de emergência.
No Brasil, não havia lei que se tratava em período de emergência e com a pandemia
houve grandes discussões na doutrina a cerca do estado de emergência e a sua
importância para o direito contratual. Em especial, ele chama atenção para a
importância dos princípios contratuais bem como teorias, para a resolução do contrato
nesse período atípico.

Embora no código Civil, há artigos presentes que possibilita a alegação de caso


fortuito ou forca maior, como por exemplo, o art. 393 ou alegações de onerosidade
excessiva, através da revisão contratual. Andrade (2020) apresenta uma grande
preocupação com as conseqüências contratuais para o devedor em mora e a carência
jurídica em resguardar os direitos deste, que em decorrência da pandemia teve redução
em seu salário ou perca de emprego. O autor destaca para a necessidade de um
“solidarismo” contratual, onde as partes cooperam uma com a outra.

Filho (2020) sugere com base na legislação, a apreciação do caso, segundo uma
analise especifica do contrato e das partes para possíveis alternativas de resolução
contratual, observando os requisitos para cabimento de caso fortuito ou força maior
segundo o dispositivo do código civil, para ele, o julgador do caso contratual deve se
atentar a outras formas de resolução contratual, como por exemplo, mudar a forma do
cumprimento da obrigação pela parte devedora, atentando para não haver prejuízo para
as partes e a possibilidade desse cumprimento.

É certo que a pandemia trouxe a necessidade do arcabouço jurídico criar varias


regulamentações a fim de tentar solucionar os problemas contratuais, no entanto,
segundo Filho (2020), o excesso de demanda processual que buscam tentar dirimir
conflitos contratuais, segundo o autor os julgadores muitas vezes deve priorizar por
soluções previstas no contrato e aplicações do principio da boa-fé e artigos
constitucionais que prezam para uma resolução pacifica e sem prejuízo para ambas as
partes, caso seja configurado uma hipótese de cabimento de caso fortuito ou força maior
deve ser feita uma analise bem especifica ao caso para a revisão contratual prezando
pela incidência por uma revisão igualitária e justa.

Miragem (2020) também posiciona sobre a possibilidade de resolução contratual


no período de pandemia, para o autor aplica se nos contratos, a hipótese de caso fortuito
ou força maior, surgindo como efeito à ausência de responsabilidade do devedor no
contrato pactuado, ou a hipótese de revisão contratual, em que as partes voltam ao
“status quo” e extingue os efeitos contratuais. O autor defende aplicação do principio da
boa fé contratual como sendo uma forma também para a resolução contratual, haja vista
que diante do cenário de insegurança jurídica contratual nesse período de pandemia este
principio é fundamental dentro do âmbito contratual e constitucional.

Diante do não cumprimento contratual pelas partes, Miragem (2020) ainda


ressalta que a impossibilidade do adimplemento de determinadas obrigações surge para
as partes um novo cenário que muitas vezes a finalidade daquele contrato não será mais
útil ou relevante, o autor propõe uma aplicação conforme dispõe o art 477 do código
civil, sendo possível sua aplicação através de analogia estendendo o seu conceito sobre
a redução do patrimônio do devedor, podendo também ser aplicado nas repercussões da
pandemia podendo também ser uma forma para solucionar através de uma resolução
contratual.

Gonçalves (2020) sugere as possíveis formas de solucionar os contratos que de


alguma forma se tornaram impossível o seu cumprimento total ou parcial, segundo a
autora, o código civil e a doutrina trás possíveis instituições para solucionar alem dos
princípios elencados pela constituição federal e o código civil, em especial os Princípios
da boa Fe objetiva e da função Social, a instituição de caso fortuito ou força maior,
previsto no P.U. art 393 do C.C., a teoria da onerosidade excessiva e teoria da
imprevisão. Para tanto, os efeitos poderão ser a extinção de responsabilidade ou a
revisão contratual devido a impossibilidade para o cumprimento da obrigação.

Gonçalves (2020) ainda ressalta que para haver uma incidência dessas possíveis
formas de soluções contratuais, o julgador deve fazer uma analise especifica em cada
contrato, para avaliar se a pandemia realmente trouxe efeito que impossibilite o
cumprimento contratual da prestação obrigacional, objetivando em evitar o
descumprimento contratual em situações que a pandemia não interferiu de uma forma a
causar prejuízo. Expondo a autora de forma a coibir que todos os contratos serão
impedidos o seu cumprimento em razão da pandemia do COVID-19, por isso se faz
necessário uma analise detalhada para averiguar a real impossibilidade objetiva no
cumprimento obrigacional, se há de fato uma onerosidade excessiva que gerou um
desequilíbrio contratual em cada caso.

Diante destes argumentos conclui que a doutrina tenta avaliar nos institutos
jurídicos existentes, princípios ou teorias que possam ajudar na fundamentação para a
revisão ou resolução contratual dentro do arcabouço jurídico, para tanto é necessário
discorrer sobre as circunstancias de força maior e caso fortuito.

Durante a pandemia, como forma de assegurar o direito a moradia, que está


prevista no art 6º da constituição Federal, suspendendo a hipótese de despejo durante a
pandemia e criou a lei 14.216/2021, em que prevê logo no primeiro art.:

“art. 1º- Estabelece medidas excepcionais em razão da Emergência em


Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) decorrente da infecção
humana pelo coronavírus SARS-CoV-2, para suspender o
cumprimento de medida judicial, extrajudicial ou administrativa que
resulte em desocupação ou remoção forçada coletiva em imóvel
privado ou público, urbano ou rural, e a concessão de liminar em ação
de despejo de que trata a Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, e
para estimular a celebração de acordos nas relações locatícias.” (Lei
14.216/2021, art. 1º)

A referida lei, trás em seu corpo normativo, diversas regulamentação que visa,
sobretudo, impedir qualquer modalidade de despejo no momento de pandemia, haja
vista que neste momento atípico, a falta de pagamento de aluguel pode ser devido a
redução de salário ou desemprego, alem de outros fatores (saúde ou alimentação) que
possam incidir a fim de prejudicar o cumprimento contratual.

O art. 6º desta lei dispõe:

“Art. 6º As tentativas de acordo para desconto, suspensão ou


adiamento de pagamento de aluguel, ou que estabeleçam condições
para garantir o reequilíbrio contratual dos contratos de locação de
imóveis durante a Espin decorrente da infecção humana pelo
coronavírus SARS-CoV-2, poderão ser realizadas por meio de
correspondências eletrônicas ou de aplicativos de mensagens, e o
conteúdo deles extraído terá valor de aditivo contratual, com efeito de
título executivo extrajudicial, bem como provará a não celebração do
acordo para fins do disposto no art. 5º desta Lei.” (lei 14.216, 2021,
art. 6º)

Neste artigo da lei, dispõe sobre a possibilidade de celebração de acordo entre as


partes contratantes, para adequar o negocio jurídico ajustando de acordo com a
capacidade financeira e com o período atípico, podendo esta ser realizada de diversas
formas conforme dispoe no art, possuindo eficassia de titulo executivo, prezando pelo
principio do equilíbrio econômico e boa fé contratual.

3.1- CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR E A SUA INCIDENCIA NOS


CONTRATOS DURANTE A PANDEMIA:

As circunstancias de caso fortuito ou força maior significa que o fato ocorrido


esta além da suportabilidade esperada dentro de uma relação obrigacional. Falar em
caso fortuito ou força maior é retomar a teoria da imprevisão, como já exposta no
capitulo anterior, essa teoria diz que um fato não esperado e fora do controle das partes
resulta em situação de onerosidade excessiva para um dos contratantes, ferindo o
principio do equilíbrio contratual.

Conforme dispõe o Código civil 2002:

“Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso


fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles
responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior
verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou
impedir.” (Código Civil, 2002, art. 393 ) (grifei)

Neste caso, conforme ressalta o artigo do código civil supra mencionado, é


fundamental fazer uma breve avaliação a certa da responsabilidade civil em caso
fortuito ou força maior, conforme destacado, para a incidência de caso fortuito ou força
maior não pode ser por responsabilidade do devedor, ou seja, por atos de
irresponsabilidade da parte, deve ter como efeito um fato imprevisível e impossível de
evitar o seu acontecimento.

O legislador não faz distinção de caso fortuito ou força maior, neste sentido,
Andrade (2020), aponta as diferenças entre esses institutos:
“Caso fortuito abrange circunstancias naturais, estranhas a ação do
homem, enquanto força maior é identificada ao fato de terceiro, pelo
qual o devedor não pode ser considerado responsável.” (Andrade,
2020, p.428)

Os pressupostos fundamentais para incidência deste instituto na visão de Farias e


Rosenvald:

“Os requisitos para a configuração de caso fortuito ou força maior são


os seguintes: o fato deve ser necessário e não determinado por culpa
do devedor; o fato deve ser superveniente e inevitável, o fato deve ser
irresistível, fora do alcance humano." (Farias e Rosenvald, 2017,
p.595)

Os autores tratam de requisitos para a ocorrência de caso fortuito ou força maior,


destaca- se que o fato não deve ocorrer por culpa do devedor, o fato deve ser
superveniente e imprevisível, esta idéia foi no sentido do julgado no TJ RS, conforme se
extrai da jurisprudência:

“APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS AGRÁRIOS. AÇÃO DE


RESCISÃO DE CONTRATO. CASO FORTUITO E FORÇA
MAIOR. seca. INEXISTÊNCIA de fato IMPREVISÍVEL.
Inviável o afastamento do pedido de rescisão do contrato de
arrendamento rural em razão da quebra de safra. Hipótese em que não
se insere no contexto de caso fortuito ou força maior, de cujo conceito
se insere apenas a idéia de superveniência de acontecimentos
extraordinários e imprevisíveis.” (TJ- RS Nº 70074658501 -Nº CNJ:
0229965-39.2017.8.21.7000- Décima Oitava Câmara Cível- ILARIO
MALDANER) (grifei)

Neste sentido também o TJ-MG avalia também a necessidade de comprovação


dos requisitos:
APELAÇÃO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS
MATERIAIS E MORAIS - QUEDA DE PLACA E PAINEL
LUMINOSO EM VEÍCULO - DEVER DE INDENIZAR - DANOS
MATERIAIS - REQUISITOS PRENCHIDOS - CASO FORTUITO
OU FORÇA MAIOR - NÃO COMPROVAÇÃO - DANOS MORAIS
- VIOLAÇÃO A DIREITOS DA PERSONALIDADE - AUSÊNCIA
DE PROVA - MERO ABORRECIMENTO.
(TJ-MG - AC: 10479130000702001 MG, Relator: Octávio de
Almeida Neves, Data de Julgamento: 01/02/2018, Data de Publicação:
09/02/2018)

O enunciado nº 443 da V Jornada de Direito civil: “O caso fortuito e a força


maior somente serão considerados como excludentes da responsabilidade civil quando o
fato gerador do dano não for conexo à atividade desenvolvida.” O presente enunciado,
elucida a respeito da responsabilidade civil em caso fortuito ou força maior, ressaltando
a importância do nexo de causalidade entre o fato ocorrido de forma imprevisível e a
interferência que este fato gerou no contrato.

A pandemia do COVID 19, foi um fato atípico para o mundo inteiro, o vírus
requer muito cuidado e medidas preventivas tiveram que ser tomadas para a contenção
do vírus, que ocasionou grandes perdas na sociedade, dentre as medidas para a
contenção do vírus, foi instaurada o isolamento social, em que as pessoas não podiam
aglomerar, desencadeando em um enfraquecimento de diversos setores que geram a
economia local, estadual ou federal, por tanto para Tepedino (2020),:

“identificam- se três cenários possíveis, a serem analisados com base


nas categorias fundamentais do Direito Civil: i) a pandemia como
evento de força maior ou caso fortuito, a acarretar a impossibilidade
objetiva no cumprimento da prestação; ii) a pandemia como evento
que desequilibra (por vezes dramaticamente) a situação patrimonial do
contratante, sem repercussão direta na economia interna do contrato.”
(Tepedino, Dias, 2020, p.13)

Por tanto, a depender da comprovação de afetação em que a os efeitos do


coronavirus impediu o adimplemento da obrigação, durante o período em que a
pandemia não tornou possível o adimplemento por qualquer das partes, o instituto de
caso fortuito ou força maior serviram como respaldo para revisões ou resoluções de
contratos. Kroetz (2020), salienta que:

“Cada caso é único e requer uma análise dos critérios de configuração


do caso fortuito ou de força maior e sua aptidão para afastar o nexo
causal. Requer-se uma análise dos fatos e circunstâncias, mas também
da atitude e do comportamento adotados pelas pessoas para justificar
suas ações ou omissões em razão da pandemia.” (Kroetz, 2020, p.
578)
Neste sentido a autora chama atenção para a contextualização e uma analise de
cada caso para a verificação da incidência de caso fortuito ou força maior na obrigação
assumida pelas partes.

A 14º câmera de direito privado do TJ SP, em uma decisão sobre a configuração


ou não de caso fortuito ou força maior para a incidência de cobrança de energia elétrica
nos shoppings, para o entendimento do desembargador Carlos Abraão, a pandemia
COVID 19 é situação de caso fortuito ou força maior, pois ela provocou mudanças no
cenário do negocio jurídico, devendo haver uma justa adequação dentre deste período
sobre o contrato de fornecimento de energia elétrica.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RESCISÃO


CONTRATUAL COM PEDIDO DE TUTELA LIMINAR DE
REINTEGRAÇÃO DE POSSE E PERDAS E DANOS EM FASE DE
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ACORDO FIRMADO ENTRE
AS PARTES. ATRASO NO PAGAMENTO DA ÚLTIMA
PARCELA. PEDIDO DE PRAZO PARA PAGAMENTO.
AUSÊNCIA DE RESPOSTA. MULTA POR ATRASO. NÃO
INCIDÊNCIA. QUITAÇÃO INTEGRAL. RAZOABILIDADE E
PROPORCIONALIDADE. BOA-FÉ
OBJETIVA. CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. PANDEMI
A. DECISÃO REFORMADA 1. O Superior Tribunal de Justiça
posiciona no sentido de que o caso fortuito e força maior conduzem
ao afastamento de responsabilidade, desde que existam dois
elementos necessários (fato necessário e impossibilidade de evitar
ou impedir os efeitos do fato, do que redundou tornar-se
impossível o cumprimento da obrigação), razão pela qual
a pandemia se amolda às hipóteses referendadas pela
jurisprudência. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E
PROVIDO.

(Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, AGRAVO DE


INSTRUMENTO Nº 5609971.48.2020.8.09.0000 COMARCA DE
GOIÂNIA RELATOR: DESEMBARGADOR WILSON SAFATLE
FAIAD)

Conforme se depreende da decisão proferida pelo tribunal do Estado de Goias,


entende se que a pandemia pode ser entendida como caso fortuito ou força maior,
podendo ser afastado a responsabilidade, atendendo aos requisitos: fato necessário e
impossibilidade de evitar ou impedir os efeitos da impossibilidade de cumprimento com
a obrigação.

3.2- A TEORIA DA ONEROSIDADE EXCESSIVA E TEORIA DA


IMPREVISÃO E A APLICAÇÃO NOS CONTRATOS DURANTE A PANDEMIA:

A teoria da onerosidade excessiva e a teoria da imprevisão também foram base


para fundamentação da parte, por conta do evento imprevisível: pandemia, haja vista
que foram adotados diversas medidas governamentais que trouxe a impossibilidade
contratual de adimplir com o acordo que foi firmado antes da pandemia. No entanto
percebe se que dentro do âmbito contratual os efeitos colocaram em cheque toda a
relação contratual existente, trazendo um desequilíbrio contratual e resultando em uma
onerosidade excessiva.

Para Gonçalves (2020), a Teoria da imprevisão também seria uma previsão


existente no ordenamento jurídico, art 317 C.C. que poderia ser arguida, de acordo com
o caso concreto, durante a pandemia, uma vez que esta teoria, diz que um fato
imprevisível que altere a realidade fática e torne extremamente difícil o cumprimento do
contrato.

Gonçalves (2020), diz que:

“a onerosidade excessiva, também pautada no princípio da revisão


contratual, na qual sempre que houver uma manifesta
desproporcionalidade entre as prestações, fazendo com que uma fique
extremamente onerosa, pode o contratante lesado solicitar ao juiz a
revisão do contrato, para manter o equilíbrio contratual.” (Gonçalves
2020, p. 7)

De acordo com o entendimento de Gonçalves (2020) a Teoria da onerosidade


excessiva, poderá também ser um fundamento para que os contratantes ou a parte
requeira em juízo uma revisão contratual, em busca do principio do equilíbrio
contratual.

Percebemos que a doutrina traz teorias que podem ser fundamentos importantes
para a parte revisar ou extinguir os efeitos do contrato, a depender das circunstâncias
fáticas. Porém conforme já demonstrado no capitulo 1, os princípios devem ser
analisados também dentro deste contexto, uma vez que o Estado possibilita para as
partes a autonomia da vontade, e esta deve ser zelada desde que não fira um principio
que descaracteriza o equilíbrio contratual e a boa Fe contratual.

Andrade (2020):

...”Solução legislativa é empregada para fundamentar o direito à


revisão contratual: cuida-se do art. 317 do Código Civil, que prevê,
diante de motivos imprevisíveis, a ocorrência de desproporção
manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua
execução, a possibilidade de o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de
modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.”
(Andrade, 2020, p.434)

O TJ- MG, diante da pandemia, entende que:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REVISÃO


CONTRATUAL - TUTELA DE URGÊNCIA - SUSPENSÃO DA
EXIGIBILIDADE DAS PARCELAS - TEORIA DA IMPREVISÃO -
PANDEMIA - APLICABILIDADE - MOIFICAÇÃO DAS BASES
OBJETIVAS. Mais do que construir uma solução abstrata a ser
replicada em todos os casos que versem sobre a pandemia como
fato superveniente extraordinário e imprevisível a autorizar a
revisão contratual, incumbe ao Judiciário analisar
pormenorizadamente as particularidades de cada relação jurídica
controvertida, alcançando, assim, a tutela mais adequada a cada
caso concreto. (...) (TJ-MG - AI: 10000204820021001 MG, Relator:
Mônica Libânio, Data de Julgamento: 10/12/2020, Câmaras Cíveis /
11ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 10/12/2020) (grifei)

Neste entendimento, se extrai que a pandemia pode ser considerada como um


fato imprevisível, superveniente, extraordinário que possibilita a revisão contratual,
porem deve o magistrado analisa estritamente o caso concreto se incide nas hipóteses
que foi requerido a revisão, haja vista que o simples fato da pandemia, apesar de ser
imprevisível, não se aplica em todos os contratos.
4- CONCLUSÃO:

Conclui se por tanto que a pandemia, que ocasionou em algumas relações


contratuais um abalo no cumprimento obrigacional no sentido em que trouxe as partes
uma insegurança jurídica para o cumprimento obrigacional tendo em vista que o aspecto
social e financeiro que foi alterado repentinamente através das medidas governamentais
adotadas para a contenção do vírus.

A insegurança jurídica que permeou a relação contratual resumia muita das


vezes em “cumprir a obrigação” ou “atender ao interesse pessoal”, como exemplo os
contratos de locações na qual o locador teve uma redução do seu salário ou foi
encerrado o seu contrato de trabalho, pois a empresa em que trabalhava não era
considerada serviços essenciais para manter seu funcionamento normal e com isso
gerou a despensa deste funcionário (a) da empresa.

Neste caso percebemos claramente que surge para a parte uma dicotomia na
relação contratual entre o cumprimento da obrigação pactuada ou, por motivos de
redução ou sem a remuneração trabalhista, através do encerramento da relação de
emprego, impossibilita o pagamento do aluguel sem que isso afete o sustento próprio ou
de seus dependentes.

No entanto conforme demonstrado para as relações contratuais existentes que o


coronavirus afetou o adimplemento contratual deve a parte afetada requerer a rescisão
ou revisão contratual com base na teoria da imprevisão ou da onerosidade excessiva
para restabelecer a vigência do principio do equilíbrio contratual.

A pandemia com todos os efeitos em que trouxe para o cenário jurídico, social,
político e econômico, por si só, não incide o direito de requerer em juízo uma revisão ou
rescisão contratual, haja vista que uma vez requerida as partes deverão comprovar em
juízo o fato alegado e o nexo de causalidade com o contrato que foi atingido.

Por fim, destaca se também que o juiz deve estritamente analisar o caso concreto
para verificar se houve a incidência de caso fortuito ou força maior e com base nas
teorias apresentadas, que tornou o negocio jurídico impossível de concretizar da forma e
modo contratado, uma vez que as partes possuem autonomia da vontade. Porém caso
seja identificado alguma hipótese em que firam os princípios enaltecidos pelo código
civil, em especial: boa Fe, função social, equilíbrio contratual, deve o magistrado coibir
de forma incisiva para que não prevaleça à vontade pactuada, ou possibilitar através da
revisão ou rescisão contratual, analisando de forma cautelosa, sem que prejudique a
relação contratual e as partes.

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