Os princípios contratuais clássicos e a função social do contrato
Os contratos geram obrigações para as partes que se vinculam por este
sua manifestação de vontade. Cumpre ressaltar que esta relação jurídica é regida por princípios contratuais, que são indispensáveis a interpretação e aplicação dessa espécie de negócio. A função dos princípios é estabelecer o equilíbrio nos contratos, de forma a constituir o negócio para que não haja abuso de poderes, vantagens indevidas, enriquecimento ilícito, dentre outros. Vale ressaltar que embora os princípios sempre estivessem presentes nos contratos, de forma a regular a relação daqueles se vinculam e assumem obrigações de maneira justa, a maioria dos princípios são relativos e admitem exceções. Nesse cenário, é importante destacar que no direito contratual, os princípios são fundamentais norteadores da relação jurídica advinda deste negócio, e são divididos em princípios clássicos e princípios modernos. Em síntese, são considerados princípios contratuais clássicos, aqueles que possuem aspecto patrimonialista e individualista, os quais ressaltam a essência tradicional do contrato. Assim, os princípios clássicos são: autonomia de vontade, obrigatoriedade dos contratos, revisão dos contratos, consensualismo e a relatividade dos efeitos. Sob esse prisma, o princípio clássico considerado basilar que regula os interesses econômicos e as relações jurídico-contratuais, é o princípio da autonomia de vontade, também chamado de liberdade contratual. Este fundamento se consagra como pressuposto de existência do contrato, onde se determina que sem manifestação de vontade não exista acordo. A autonomia de vontade garante ao individuo a liberdade escolha de contratar ou não, de escolher quem vai contratar e também de escolher os termos que do acordo. Neste sentido, ARAUJO (2022, p.1) comenta: “O princípio da autonomia da vontade [...] o poder dos contratantes de disciplinar os seus interesses mediante acordo de vontades, suscitando efeitos tutelados. ...possibilita a celebração dos contratos atípicos, isto é, daqueles que não estão regulamentados pelo ordenamento jurídico, mas que são gerados pelas necessidades e interesses das partes. Conforme Silvio de Salvo Venosa (2011, pag. 383): “A liberdade contratual permite que as partes se valham dos modelos contratuais constantes do ordenamento jurídico (contratos típicos), ou criem uma modalidade de contrato de acordo com suas necessidades (contratos atípicos).” Com base na concepção clássica do liberalismo econômico e político, a liberdade contratar e a liberdade contratual instituem a faculdade que as partes têm de se vincularem a um contrato, contraindo direito e obrigações acordadas. As partes podem, com base nesse princípio, estabelecer as cláusulas contratuais e as regras que fundamentarão a relação constituída. Recentemente, a Lei 13.874/2019 chamada de Lei da Liberdade Econômica com intuito de valorizar a liberdade contratual, estabeleceu a mínima intervenção do Estado nas relações contratuais, de maneira fortalecer a autonomia de vontade. Apesar disso, o princípio ao longo da história vem sofrendo limitações, isso se deve as alterações legislativas e a inserção da função social do contrato. Decorrente do princípio da autonomia privada vem o princípio da força obrigatória dos contratos. A obrigatoriedade dos contratos conhecida como força vinculante dos contratos, Pacta Sunt Servanda, determina que estes constituam lei entres as partes, ou seja, as determinações convencionadas tem força de lei. Desta forma, em regra, os contratos são considerados obrigações justamente pela força obrigatória que lhe é atribuída. Com relação a este princípio TONELLI (2015) faz algumas considerações, vejamos: “Quando os contraentes celebram um contrato, estão adstritos a este, de modo que deverão cumprir com os compromissos assumidos. O contrato, deste modo, é lei entre as partes. Este princípio é extremamente relevante para os contratos porque, se as partes pudessem não cumprir aquilo que prometeram fazer, estaria estabelecido o caos. Fornece, assim, segurança jurídica nos negócios. A obrigatoriedade dos contratos força as partes a cumprirem suas obrigações, de forma que, ao mesmo tempo, fornece subsídios jurídicos para que possa ser cobrada a obrigação daquele que não a fez. A força obrigatória dos contratos é, contudo, relativa. Em virtude do desenvolvimento da sociedade e da vida como a conhecemos, pode ocorrer que, feito um contrato, este possa oferecer certos desequilíbrios sobre as obrigações assumidas.A fim de evitar esse desequilíbrio e, consequentemente, um proveito injustificado, tem-se admitido a intervenção do Estado nos contratos, a fim de modificá-lo ou apenas liberar a parte prejudicada.”
Há também o princípio da revisão contratual, rebus sic stantibus, que se
trata de um fundamento para que o contrato possa garantir a equidade da relação em caso de modificações da realidade com relação ao momento da celebração do contrato que venha a impactar diretamente as obrigações pactuadas. Pois, existem situações que não há como prever e estas podem atingir diretamente o contrato, nesse cenário admite-se a revisão de determinadas clausulas para que o contrato possa ser adaptado a novas realidades impostas. O princípio da relatividade dos efeitos, também fruto da concepção individualista do contrato, estabelece que somente as partes que manifestaram vontade no sentido de contratar, devem ser atingidas pelo efeito do contrato. Apesar disso, admitem-se exceções a esse princípio no que tange as relações privadas que podem afetar outros interesses fora dos diretamente envolvidos. Dentre os clássicos, há também o princípio do consensualismo que o acordo se aperfeiçoa com a vontade das partes, ou seja, contrato exige consenso. Em contrapartida, devido às transformações sociais no contexto do século XX e a Constituição Federal de 1988, surgem os princípios chamados princípios contratuais modernos, ou princípios sociais que são: função social do contrato, boa-fé e equilíbrio contratual. Diante das novas demandas sociais, o princípio que traz impacto direto as relações contratuais contemporâneas é o da função social do contrato, que guarda a ideia que o contrato precisa cumprir uma demanda social. Assim, os contratos devem servir para regulamentar, fomentar e dar segurança as relações. Este princípio alterou a compreensão do direito contratual. A função social do contrato alterou toda a estrutura da teoria geral dos contratos, pois a partir dela a concepção deixa de ser apenas individualista e passa a considerar a visão da coletividade. Logo, o contrato sob este aspecto deve atender a finalidade social, e não apenas interesses privados. Muitos dos princípios contratuais vêm sendo adotado desde o Império Romano, e tiveram contornos e finalidades modificadas com o passar do tempo e com as novas tendências do direito contratual moderno. Nesse sentido, com as alterações legislativas, fez-se necessário renovar a compreensão dos princípios de forma a harmonizar com a nova concepção de contrato. O estudo dos princípios ganhou papel tão relevante nos contratos contemporâneos, ao passo que não é possível realizar uma análise contratual efetiva sem se atentar para a dinâmica da aplicação dos princípios contratuais clássicos e modernos. Referências
ARAÚJO, Quezia de Jesus. A importância dos princípios contratuais na
PORTO, Igor; DA GAMA, Beatriz Monteiro da; Do clássico ao
contemporâneo: entenda o que são os Princípios Contratuais. Destro Conjur, 2021. Disponível em: < https://www.destroconjur.com.br/post/do-cl %C3%A1ssico-ao-contempor%C3%A2neo-entenda-o-que-s%C3%A3o-os-princ %C3%ADpios-contratuais> Acesso em: 21/02/2022.
TISSOTI, Rodrigo. Aspectos da teoria geral dos contratos, princípios e