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23 DE agosto 2023

Direito Tributário e Comercial

Noções básicas de Direito Comercial


Unidade I
Profª. Adriana Reis - logística

Contratos mercantis – Por Fabio ulhoa

1. INTRÓITO

Com a evolução das relações mercantis, surgiu a necessidade de se realizar contratos, como via de garantir, se não a
efetivação de suas disposições de modo direto, ao menos a possibilidade de sua cobrança.

Fábio Ulhoa Coelho leciona que na “exploração da atividade empresarial, a que se dedica, o empresário individual ou a
sociedade empresária celebram vários contratos. Pode-se dizer que combinar os fatores de produção é contrair e
executar obrigações nascidas principalmente de contratos”.

Partindo dessa análise, pode-se perceber que os contratos, de certo modo, viabilizam as relações empresariais, uma vez
que, através de um negócio jurídico estabelecido entre sujeitos capazes, ter-se-á elementos básicos para a produção de
bens e serviços, desenvolvendo-se, por conseguinte, o que os economistas chamam de recursos ou fatores de produção.

Assim, pode-se traçar linhas perpendiculares, em que relações mercantis e fatores de produção (capital, trabalho,
insumos e tecnologia) se unem no ponto em que são desenvolvidos seus contratos, por exemplo:

“(...) o capital pressupõe a celebração de contrato bancário, pelo menos o de depósito. Para obter insumos, é necessário
contratar a aquisição de matéria-prima, eletricidade ou mercadorias para revender. Articular na empresa o trabalho
significa contratar empregados (CLT), prestadores de serviços autônomos ou empresa de fornecimento de mão-de-obra
(terceirizada). A aquisição ou criação de tecnologia faz-se por contratos. Além desses, para organizar o estabelecimento,
por vezes o empresário loca o imóvel, faz leasing de veículos e equipamentos, acautela-se com seguro. Ao oferecer os
bens ou serviços que produz ou circula, ele igualmente celebra contratos com consumidores ou outros empresários. Ao
conceder crédito, normalmente negocia-o com bancos, mediante descontos ”.

2. CONTRATOS MERCANTIS

Dependendo dos sujeitos que celebrarem o negócio jurídico, estes podem assumir contornos de natureza jurídica
administrativa, trabalhista, consumerista ou cível, assim:

“Se o empresário contrata com o Poder Público ou concessionária de serviço público, o contrato é administrativo (por
exemplo, se o fabricante de móveis vence licitação promovida por Prefeitura, para substituir o mobiliário de uma
repartição, o contrato que vier a assinar será desta espécie). Se o outro contratante é empregado, na acepção legal do
termo (CLT, art. 3º.), o contrato é do trabalho. Se consumidor (ou empresário em situação análoga à de consumidor), a
relação contratual está sujeita ao Código de Defesa do Consumidor. Nas demais hipóteses, o contrato é cível, e está
regido pelo Código Civil ou por legislação especial.”

Quanto aos contratos mercantis, os sujeitos serão empresários, atingindo uma natureza hibrida entre os contratos cíveis
e os provenientes das relações de consumo, que é distinguida por Ulhoa Coelho da seguinte forma:
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“Se os empresários são iguais, sob o ponto de vista de sua condição econômica (quer dizer, ambos podem contratar
advogados e outros profissionais antes de assinarem o instrumento contratual, de forma que, ao fazê-lo, estão
plenamente informados sobre a extensão dos direitos e obrigações contratados), o contrato é cível; se desiguais (ou
seja, um deles está em situação de vulnerabilidade econômica frente ao outro), o contrato será regido pelo CDC.

Quando o banco contrata com a construtora a edificação de sua sede, o contrato é mercantil cível, porque ambos os
empresários negociam em pé de igualdade. Mas, quando o mesmo banco concede empréstimo a microempresário, o
contrato mercantil está sujeito à legislação consumerista, já que este último se encontra em situação análoga à de
consumidor.

O mais adequado seria uma reforma legislativa que disciplinasse especificamente os contratos mercantis (entre
empresários), classificando-os de acordo com as condições dos contratantes (iguais e desiguais) e reservando a cada
tipo disciplina compatível com a tutela dos interesses objeto de contrato.

Enquanto esta reforma não se realiza, aplica-se o Código Civil (ou legislação especial) aos contratos mercantis cíveis e o
Código de Defesa do Consumidor aos mercantis sujeitos a este regime.”

Desse modo, a natureza jurídica dos contratos mercantis se delimitará face as condições de seus contratantes, no que
tange a (des)igualdade material entre os mesmos.

2.1. Contratos e Obrigações

Para se entender a relação proveniente dos contratos e suas obrigações, há quem diga que aqueles são fontes dessas,
entretanto, pode-se perceber que o “contrato é uma das modalidades de obrigação, ou seja, uma espécie de vínculo
entre as pessoas, em virtude do qual são exigíveis prestações”, entretanto a “obrigação é a consequência que o direito
posto atribui a um determinado fato”.

Assim, os atos jurídicos podem advir de um dispositivo legal a ser observado, previamente definido pela mens
legislatores, ou do exercício do direito de autonomia da vontade, pelos sujeitos da relação jurídica, configurando-se um
negócio jurídico, onde se visualizam as relações contratuais.

2.2. Constituição do Vínculo Contratual

A doutrina identifica dois princípios que regem as relações contratuais, em seu momento de constituição de vínculo,
quais sejam, o do consensualismo, imortalizado pela máxima pacta sunt servanda, e o da relatividade, ou rebus sic
stantibus.

No que tange ao princípio do consensualismo, a constituição do vínculo contratual se estabelece no instante em que,
consensualmente, as partes expressam sua vontade, salvo nos casos em que apenas tal manifestação não é suficiente,
como naqueles em que a lei exige que o negócio jurídico, para produzir seus efeitos, se revista de determinadas
formalidades, o que não acontece, em regra, com os contratos mercantis. Nesse sentido, insta observar a lição de Ulhoa
Coelho:

“Pelo princípio do consensualismo, um contrato se constitui, via de regra, pelo encontro das vontades manifestadas
pelas partes, não sendo necessária mais nenhuma outra condição. Há, no entanto, algumas exceções a este primado,
isto é, determinados tipos de contrato que exigem, para a sua formação, além da convergência da vontade das partes,
também algum outro elemento. [...]

Os contratos mercantis, em suma, podem ser consensuais ou reais. Assim, em termos gerais os contratos entre
empresários estão constituídos (perfeitos e acabados) assim que se verifica o encontro de vontade das pessoas
participantes do vínculo.”

E quanto a relatividade, o ilustre autor continua:


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“Pelo princípio da relatividade, o contrato gera efeitos apenas entre as partes por ele vinculadas, não criando, em regra,
direitos ou deveres para pessoas estranhas à relação. Aqui também há algumas exceções, como o seguro de vida ou a
estipulação em favor de terceiro, que são contratos constitutivos de crédito em benefício de pessoa não participante do
acordo. [...]

É o que propõe a teoria da aparência, segundo a qual uma situação aparente pode gerar obrigações para terceiros
quando o contratante, de boa-fé, tinha razões efetivas para tomá-la por real. Esta teoria é mais comumente aplicada nas
hipóteses de excesso de mandato, continuação de fato de mandato findo, inobservância de diretrizes do representado
pelo representante etc. Orlando Gomes admite, até, a responsabilização do empresário por atos praticados por falso
representante, quando a aparência de direito poderia enganar um contratante médio.

Quando o contrato se insere no âmbito da tutela do consumidor, o princípio da relatividade também tem a sua
pertinência ressalvada em alguns casos, pois se admite a reclamação contra o fabricante do produto viciado, embora a
relação contratual de compra e venda tenha se estabelecido na verdade entre o consumidor e um comerciante.”

Uma vez estabelecido tal vínculo entre as partes contratantes, verifica-se a assunção das obrigações ali materializadas,
trazendo-se à tutela do mundo jurídico, eventual descumprimento, já que se encontra configurada a imperatividade do
brocardo latino pacta sunt servanda, o qual enfatiza que as cláusulas e pactos contidos nessa manifestação da
autonomia da vontade, que são os contratos, se configuram num direito entre as partes, e o não-cumprimento das
respectivas obrigações implica a quebra do que foi pactuado.

Entrementes, a despeito da natureza dos contratos ser de um instrumento de direitos e obrigações, as quais, uma vez
assumidas, devem ser cumpridas pelas partes, não podendo ser, em regra, alterado ou extinto unilateralmente, existem
situações que irão relativizar tal máxima, em virtude de outra cláusula geral que envolve os contratos atualmente, id
est, a cláusula rebus sic stantibus. Por essa, é possível a revisão das disposições pactuadas, quando se observar situações
imprevisíveis, alterando as condições contratuais de sobremaneira, independente da vontade das partes, que o
cumprimento se transformaria em algo impossível e excessivamente oneroso pelo contratante obrigado, e, em
contrapartida, num enriquecimento ilícito da parte beneficiada pelas alterações no cenário econômico.

Por fim, no tocante à obrigatoriedade no cumprimento dos contratos, ensejando a possibilidade de se acionar a
intervenção jurisdicional, é necessário mencionar “que os contratos bilaterais contêm, implícita, a cláusula da exceptio
non adimpleti contractas (exceção de contrato não cumprido), pela qual uma parte não pode exigir o cumprimento do
contrato pela outra, se estiver em mora em relação à sua própria prestação”. Assim, pode-se exigir, por meio da
exceção do contrato não cumprido, que a tutela jurisdicional reverta-se no sentido de garantir a prestação inicial, para
aí se realizar o cumprimento da contraprestação avençada.

2.3. Desconstituição do Vínculo Contratual

O vínculo contratual pode ser desfeito pelas formas normais que ocasionam o fim da obrigação assumida, i.e., com o
adimplemento direto daquela, assim como pela prescrição, em que pela inércia da parte beneficiada e o decurso do
tempo, se infere a renúncia tácita do direito relacionado, como também pela confusão, em que credor e devedor
findam por confundir numa mesma pessoa. Entretanto, a extinção do vínculo contratual pode se manifestar por meio da
invalidação ou pela sua dissolução.

A invalidação está relacionada a circunstâncias que, desde o começo, ocasionaram a nulidade ou anulabilidade de um
negócio jurídico, ou seja, na verificação de vícios contratuais, tais como, a incapacidade das partes, a ilicitude do objeto,
a forma defesa em lei, erro, dolo, simulação, etc. Aqui os efeitos se operam ex tunc.

Enquanto isso, a dissolução refere-se às circunstâncias verificáveis a posteriori, no que tange ao marco da constituição
do vínculo contratual, ou seja, “a inexecução e a vontade das partes. Na primeira hipótese, tem-se resolução, e, na
segunda, resilição do contrato”. Nesses termos, ensina Lyra Duque:
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“(...) a extinção por resilição poderá ser bilateral ou unilateral e depende unicamente da vontade dos contratantes. A
resolução refere-se à inexecução culposa ou involuntária do acordado. A resolução opera a finalização do contrato por
descumprimento das obrigações por uma das partes ou de ambas, seja por culpa sua, seja por ato estranho à sua
vontade (caso fortuito, força maior e onerosidade excessiva)”.

A resolução, assim como a invalidação, produz efeitos ex tunc, voltando as partes a situação anterior a constituição do
contrato, desse modo, pode-se pleitear indenização, ou até executar cláusula penal, se houver.

Quanto a resilição, há uma dissolução do vínculo pela vontade das partes, que em regra é bilateral, mas pode se
apresentar de modo unilateral, através da denúncia, como no caso da procuração, mandato ad juducia (agir em juízo ou
fora dele. Ressalte-se, ainda, o que Coelho traz a lume, no que tange às consequências e aos efeitos desse tipo de
dissolução contratual:

“Na resilição bilateral, as consequências serão as contratadas pelas partes, que têm ampla liberdade para dispor sobre
como se dará a composição dos interesses. Já a resilição unilateral, quando admitida, não opera efeitos retroativos. Às
partes cabe apenas solucionar as eventuais pendências (por exemplo: o mandante deve pagar as comissões devidas ao
mandatário), e, se previsto na cláusula de arrependimento, pagar a multa.”

Insta, por fim, mencionar que, a despeito de se utilizar o termo rescisão como sinônimo de dissolução, há doutrinadores
que verificam naquela uma terceira espécie dessa, observando no art.157 do Código Civil de 2002, um modo de rescisão
contratual por meio de lesão, “quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a
prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta”.

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