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LICITAÇÃO E

CONTRATOS

Eduardo Zaffari
Dispensa e inexigibilidade
de licitação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer a validade e eficácia da contratação direta pela Admi-


nistração Pública.
 Definir os casos de dispensa de licitação.
 Identificar a inexigibilidade e a impossibilidade de licitar.

Introdução
A Administração Pública necessita garantir as condições mais vantajosas
para a compra de bens e serviços para o Estado, conforme art. 37 da
Constituição Federal. O contrato público se diferencia do contrato civil
porque os caracteres da posição estatal dão ao Estado e ao interesse
público supremacia sobre o particular.
Neste capítulo, você vai ler sobre a distinção entre contrato público
e contrato civil, bem como sobre as condições de possibilidade para a
sua validade e eficácia. Você também verá que a regra da licitação será
excepcionada quando condições diferenciadas obrigarem o administra-
dor público a contratar diretamente no caso de haver a inexigibilidade
de licitação ou a sua dispensa.

Validade e eficácia da contratação direta


pela Administração Pública
Ao tratar sobre os conceitos basilares dos contratos, Flávio Tartuce recorda
que o conceito de contrato é tão antigo quanto o próprio relacionamento social,
visto que a sociedade advém de uma ideia de contrato (aqui o civilista se refere
à ideia de contrato social de Thomas Hobbes, Jean-Jacques Rousseau, entre
outros contratualistas) (TARTUCE, 2017).
2 Dispensa e inexigibilidade de licitação

A concepção de contrato tem se alterado ao longo da história, posto que


tem se adaptado à evolução social e às constantes inovações legislativas. O
conceito clássico de contrato dado por Tartuce vale ser transcrito ante sua
didática (TARTUCE, 2017, p. 18):

O contrato é um ato jurídico bilateral, dependente de pelo menos duas de-


clarações de vontade, cujo objetivo é a criação, a alteração ou até mesmo a
extinção de direitos e deveres de conteúdo patrimonial. Os contratos são, em
suma, todos os tipos de convenções ou estipulações que possam ser criadas
pelo acordo de vontades e por outros fatores acessórios.

Na visão moderna de contrato, o mesmo doutrinador o conceitua como um


“[...] negócio jurídico bilateral ou pluribilateral que visa à criação, modificação
ou extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial” (TARTUCE, 2017,
p. 18). A conceituação clássica se apresenta ainda como mais completa, sob o
ponto de vista de seus caracteres. Maria Sylvia Zanella di Pietro refere que os
contratos da Administração Pública designam todos os contratos celebrados
pela Administração, seja sob o regime de direito público, seja sob o regime
de direito privado.
No regime de direito público, a Administração se nivela ao particular em
uma horizontalidade entre ambos; no regime de direito privado, há verticali-
dade decorrente do poder de império da Administração (DI PIETRO, 2017).
Existem basicamente três correntes sobre a existência dos contratos admi-
nistrativos. A primeira delas nega a existência dos contratos administrativos.
Isso porque essa corrente afirma que, na contratação pelo ente público, há a
posição de supremacia da Administração sobre o particular; não existiria a
autonomia de vontade pela Administração ou pelo particular e não haveria
sequer negociação quanto às cláusulas contratuais. Também não haveria
a força dos contratos, pois não pode a Administração Pública se sujeitar a
cláusulas inalteráveis em razão da indisponibilidade do interesse público (DI
PIETRO, 2017).
Uma segunda vertente doutrinária entende que não haveria contratação
efetuada pelo Poder Público de natureza privada, visto que, sempre que a
Administração Pública contratasse, incidiriam tão somente as regras de Di-
reito Administrativo. Todos os caracteres contratuais seriam prescritos pelo
Direito Público, pois não se terá autonomia pública para se fazer diferente do
que consta na lei (DI PIETRO, 2017).
Dispensa e inexigibilidade de licitação 3

O poder de império é aquele que deriva dos atos de império e que permite à Ad-
ministração Pública exercer prerrogativas e privilégios, impondo ao particular sua
vontade de forma unilateral e coercitiva, independentemente de autorização ou
força executiva judicial.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro explica que a maioria da doutrina adota a


terceira e última corrente, em que existem os contratos administrativos com
caracteres próprios e diferenciados dos contratos de direito privado. Afirmam-
-se os seguintes critérios para distinguir o contrato administrativo e o contrato
de direito privado (DI PIETRO, 2017):

 há um critério orgânico que distingue o contrato público e os contratos


privados, pois a Administração Pública age com poder de império
na contratação. Não se adotando o poder de império na contratação,
trata-se de um contrato de direito privado que tem a Administração
Pública como parte;
 o contrato de direito público terá sempre por objeto um bem ou ser-
viço destinado à organização dos serviços públicos. Se o conteúdo do
contrato se destinar a uma atividade privada, será um contrato civil
como qualquer outro;
 há quem sustente que a Administração Pública, mesmo quando age em
uma atividade privada, deverá atender a uma finalidade pública para
a contratação, sob pena de desvio de poder;
 destacamos o caractere da forma de contratação do contrato público, em
que este adota certos procedimentos e formas que se destinam a preser-
var a relação, considerando ser a Administração Pública a contratante;
 um último caractere que diferenciaria o contrato administrativo e o
contrato de direito privado: são as chamadas cláusulas exorbitantes,
que são aquelas que permitem que a Administração Pública exerça a
supremacia contratual, impondo penalidades, alteração unilateral do
contrato e até mesmo a rescisão do instrumento firmado.

Espécie diferenciada dos contratos civis, os contratos públicos se revestem


da imperatividade, que permite ao Estado impor cláusulas exorbitantes que
dão ao Poder Público a condição de possibilidade de alterar unilateralmente os
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direitos e as obrigações contratuais, independentemente da concordância do


particular. Poderá, ainda, executar as cláusulas contratuais sem a interferência
do Judiciário, por si próprio, característica de autoexecutoriedade dos atos pú-
blicos. Não há, ao contrário do que normalmente ocorre na contratação privada,
qualquer ilegalidade pelo exercício da supremacia de uma parte sobre a outra.
Na contratação pública, há o aperfeiçoamento do contrato administrativo
quando o particular adere ao contrato e dá a sua anuência ao instrumento, ou
seja, assina o contrato público e assume direitos e obrigações que passam a
lhe ser impostos pelas condições constantes no contrato (DI PIETRO, 2017).

O art. 60, parágrafo único, da Lei de Licitações prescreve ser nulo o contrato admi-
nistrativo verbal, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento. Entretanto, a
jurisprudência tem admitido o contrato verbal em contratos de valores maiores quando
da hipótese do art. 24, IV, da referida lei, ou seja, casos de emergência ou calamidade
pública (BRASIL, Lei 8.666, 1993, art. 60, pú; art. 24, IV) (BRASIL, 1993).

Justen Filho (2009) ao comentar o art. 61 da Lei nº. 8.666, de 21 de junho


de 1993 —, refere que a contratação pública deve ser formalizada para que se
garanta a publicidade e para que os mecanismos de controle interno e externo
dos atos públicos possam aferir a veracidade do procedimento licitatório.
Afirma o doutrinador que o contrato público deverá adotar a forma escrita e
deverão constar os requisitos do art. 61 da lei (JUSTEN FILHO, 2009):

 nomes das partes e de seus representantes;


 finalidade;
 ato que autorizou a sua lavratura;
 número do processo da licitação, da dispensa ou da inexigibilidade;
 sujeição dos contratantes às normas dessa lei e às cláusulas contratuais.

O contrato será válido quando atender aos requisitos impostos pela Lei
de Licitações, mas poderá eventualmente ser considerado válido se for
possível a comprovação por outros meios de sua validade e existência. Para
Justen Filho (2009, p. 728), “[...] se for possível comprovar a existência e
validade da contratação, o descumprimento ao disposto a essas regras será
Dispensa e inexigibilidade de licitação 5

superável. A contratação será válida e apenas será obstaculizada a eficácia


do contrato”. Será válido o contrato administrativo que preencha os requisitos
legais prescritos nos arts. 60 e 61 da Lei de Licitações (BRASIL 1993) ou
quando, por outros meios, puder ser comprovada a sua validade e existência.
A eficácia, segundo Justen Filho (2009, p. 730), é a “[...] potencialidade de
produção de feitos do contrato”, ou seja, preenchidos os requisitos de validade
do contrato administrativo, é necessária a publicação de um resumo do contrato
e seus aditivos para que tenha a potencialidade de ser eficaz. Não se deve
confundir, entretanto, com a vigência, que é o prazo do contrato obrigatório
entre as partes contratantes. Por exemplo, o contrato administrativo pode ser
publicado na imprensa oficial, prescrevendo que a vigência contratual será a
partir do trigésimo dia de sua publicação. Nessa hipótese, o contrato adminis-
trativo terá eficácia a partir de sua publicação, mas será vigente 30 dias após.
A regra para a contratação de bens e serviços pelo Estado é a realização de
prévia licitação. Nesse caso, a Constituição Federal (BRASIL, 1988) permite
a presunção de que, dessa maneira, será feita na forma mais vantajosa para
o Estado. Entretanto, há hipóteses em que a contratação direta (sem prévia
licitação) será possível nos casos expressamente previstos em lei, pois o pro-
cedimento licitatório dificultaria a realização dos fins do Estado.
Nas hipóteses de contratação direta, não há a necessidade do procedimento
licitatório, mas há um outro procedimento previsto em lei, em que o adminis-
trador público deverá seguir para que se faça a melhor contratação possível para
o Estado. Embora haja a dispensa do procedimento de licitação, ainda assim, o
agente público deverá se orientar e seguir para que se atendam aos princípios
básicos administrativos, como da impessoalidade e da moralidade pública.

Dispensa de licitação
A ausência de licitação prevista no art. 24 da Lei nº. 8.666/1993 (BRASIL, 1993)
não significa que o administrador público não deve observar qualquer procedi-
mento e poderá contratar bens e serviços públicos sem qualquer formalidade.
Nas hipóteses expressamente elencadas em lei para a dispensa de licitação, o
administrador deverá seguir um procedimento mínimo expresso em lei para que
se garanta a melhor contratação possível dentro das circunstâncias apresentadas.
Em outras palavras, a desnecessidade de licitação dispensa apenas o proce-
dimento expressamente previsto para cada uma das modalidades de licitação
que eventualmente seriam aplicáveis, mas não significa a falta de um proce-
dimento a ser atendido. Como refere Justen Filho (2009, p. 283):
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[...] somente em hipóteses-limite é que a Administração estaria autorizada


a contratar sem o cumprimento dessas formalidades. Seriam aqueles casos
de emergência tão grave que a demora, embora mínima, pusesse em risco a
satisfação dos valores a cuja realização se orienta a atividade administrativa.

Antes da contratação, a Administração Pública definirá a necessidade a ser


atendida e a melhor forma de fazê-lo, verificando a possibilidade orçamentária
e documentando todos os passos em procedimento administrativo. Quando da
contratação, em vez da abertura de procedimento licitatório, deverá motivar
a inaplicabilidade das regras de licitação, em qualquer de suas modalidades,
estabelecendo que a contratação se dará na forma direta.
Mesmo nessa hipótese, deverá pesquisar a melhor solução entre as opções
existentes, em observância aos princípios da isonomia, da supremacia e da
indisponibilidade estatal, contratando na forma mais vantajosa para a Admi-
nistração Pública nas condições vigentes (JUSTEN FILHO, 2009). A dispensa
de licitação vem prescrita nas hipóteses do art. 24, da Lei nº. 8.666/1993
(BRASIL, 1993), e se divide conforme a seguir.

Custo econômico da licitação


Haverá a dispensa da licitação quando o custo para a sua realização for supe-
rior ao bem ou serviço que se pretenda contratar. Os incisos I e II do art. 24
prescrevem que será dispensada a licitação para obras e serviços de engenharia
de valor até 10% do limite previsto em lei (atualmente entre R$ 330.000,00
e R$ 3.300.000,00); ou para outros serviços e compras de valor até 10% (dez
por cento) do limite previsto em lei (atualmente entre R$ 176.000,00 e R$
1.430.000,00); assim como para alienações nesses valores.

Custo temporal da licitação


Haverá a dispensa da licitação quando a demora do processo licitatório puder
resultar na própria ineficácia da licitação. A lei prescreve as seguintes possi-
bilidades (BRASIL, 1993):

 nos casos de guerra ou grave perturbação da ordem;


 nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada
urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou
comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e
outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários
ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas
Dispensa e inexigibilidade de licitação 7

de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180


dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência
ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos;
 nas compras de hortifrutigranjeiros, pão e outros gêneros perecíveis,
no tempo necessário para a realização dos processos licitatórios cor-
respondentes, realizadas diretamente com base no preço do dia;
 nas compras ou contratações de serviços para o abastecimento de navios,
embarcações, unidades aéreas ou tropas e seus meios de deslocamento
quando em estada eventual de curta duração em portos, aeroportos
ou localidades diferentes de suas sedes, por motivo de movimentação
operacional ou de adestramento, quando a exiguidade dos prazos legais
puder comprometer a normalidade e os propósitos das operações e desde
que seu valor não exceda o limite previsto em lei (atualmente entre R$
176.000,00 e R$ 1.430.000,00);
 para a construção, a ampliação, a reforma e o aprimoramento de estabe-
lecimentos penais, desde que configurada situação de grave e iminente
risco à segurança pública.

Ausência de potencialidade de benefício


Na hipótese de ausência de potencialidade de benefício, estará dispensada
a licitação quando esta apresenta potencial de não trazer benefício à Admi-
nistração Pública. A Lei de Licitações prescreve diversos casos em que o
procedimento se mostrará desvantajoso (BRASIL, 1993):

 quando não acudirem interessados à licitação anterior e esta justifica-


damente não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração;
 quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente
superiores aos praticados no mercado nacional ou forem incompatíveis
com os fixados pelos órgãos oficiais competentes;
 para a aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de bens
produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integre a
Administração Pública e que tenha sido criado para esse fim específico;
 na contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento,
em consequência de rescisão contratual, desde que atendida a ordem
de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas condições
oferecidas pelo licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devida-
mente corrigido;
8 Dispensa e inexigibilidade de licitação

 para a aquisição de bens ou serviços nos termos de acordo internacional


específico aprovado pelo Congresso Nacional, quando as condições
ofertadas forem manifestamente vantajosas para o Poder Público;
 para a aquisição de componentes ou peças de origem nacional ou estrangeira,
necessários à manutenção de equipamentos durante o período de garantia
técnica, junto ao fornecedor original desses equipamentos, quando tal
condição de exclusividade for indispensável para a vigência da garantia;
 na contratação realizada por empresa pública ou sociedade de economia
mista com suas subsidiárias e controladas para a aquisição ou alienação
de bens, prestação ou obtenção de serviços, desde que o preço contratado
seja compatível com o praticado no mercado;
 na celebração de contrato de programa com ente da Federação ou com
entidade de sua administração indireta, para a prestação de serviços
públicos de forma associada nos termos do autorizado em contrato de
consórcio público ou em convênio de cooperação;
 para o fornecimento de bens e serviços, produzidos ou prestados no
País, que envolvam cumulativamente alta complexidade tecnológica e
defesa nacional, mediante parecer de comissão especialmente designada
pela autoridade máxima do órgão;
 na aquisição de bens e contratação de serviços para atender aos con-
tingentes militares das forças singulares brasileiras empregadas em
operações de paz no exterior, necessariamente justificadas quanto
ao preço e à escolha do fornecedor ou executante e ratificadas pelo
comandante da força.

Função extraeconômica da contratação


A Administração Pública estará dispensada da licitação quando não tiver por
finalidade vantagem econômica, mas outros fins pretendidos pelo Adminis-
trador Público. As hipóteses para essa dispensa são (BRASIL, 1993):

 quando a União tiver que intervir no domínio econômico para regular


preços ou normalizar o abastecimento;
 quando houver possibilidade de comprometimento da segurança
nacional;
 para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das
finalidades precípuas da administração, cujas necessidades de instalação
e localização condicionem a sua escolha;
Dispensa e inexigibilidade de licitação 9

 na contratação de instituição brasileira incumbida, regimental ou estatuta-


riamente, da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional ou
de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contra-
tada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins
lucrativos;
 para a aquisição ou restauração de obras de arte e objetos históricos,
de autenticidade certificada, desde que compatíveis ou inerentes às
finalidades do órgão ou entidade;
 a impressão dos diários oficiais, de formulários padronizados de uso da
administração, e de edições técnicas oficiais, bem como para prestação
de serviços de informática a pessoa jurídica de direito público interno,
por órgãos ou entidades que integrem a Administração Pública, criados
para esse fim específico;
 para as compras de material de uso pelas Forças Armadas, com exceção
de materiais de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade
de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico
dos meios navais, aéreos e terrestres;
 na contratação de associação de portadores de deficiência física, sem
fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgãos ou entidades da
Administração Pública, para a prestação de serviços ou fornecimento
de mão de obra, desde que o preço contratado seja compatível com o
praticado no mercado;
 para a aquisição ou contratação de produto para pesquisa e
desenvolvimento;
 para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organiza-
ções sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo;
 na contratação realizada por Instituição Científica e Tecnológica (ICT)
ou por agência de fomento para a transferência de tecnologia e para o
licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida;
 na contratação da coleta, processamento e comercialização de resíduos
sólidos urbanos recicláveis ou reutilizáveis, em áreas com sistema de
coleta seletiva de lixo, efetuados por associações ou cooperativas for-
madas exclusivamente por pessoas físicas de baixa renda reconhecidas
pelo Poder Público, como catadores de materiais recicláveis, com o
uso de equipamentos compatíveis com as normas técnicas, ambientais
e de saúde pública;
 na contratação de instituição ou organização, pública ou privada, com ou
sem fins lucrativos, para a prestação de serviços de assistência técnica e
10 Dispensa e inexigibilidade de licitação

extensão rural no âmbito do Programa Nacional de Assistência Técnica


e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária;
 na contratação em que houver transferência de tecnologia de produtos
estratégicos para o Sistema Único de Saúde (SUS), no âmbito da Lei
nº. 8.080, de 19 de setembro de 1990;
 nas contratações visando ao cumprimento do disposto nos arts. 3º a 5º
e 20 da Lei nº. 10.973, de 2 de dezembro de 2004, para o fomento de
inovação e pesquisa;
 na contratação de entidades privadas sem fins lucrativos para a imple-
mentação de cisternas ou outras tecnologias sociais de acesso à água para
consumo humano e produção de alimentos, para beneficiar as famílias
rurais de baixa renda atingidas pela seca ou falta regular de água;
 para a aquisição por pessoa jurídica de direito público interno de insumos
estratégicos para a saúde produzidos ou distribuídos por fundação, que,
regimental ou estatutariamente, tenha por finalidade apoiar órgão da
Administração Pública direta, sua autarquia ou fundação em projetos
de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico
e tecnológico e estímulo à inovação.

Algumas dessas hipóteses, em verdade, atendem a mais de uma finalidade,


que leva à dispensa de licitação, mas há ainda a hipótese prevista no inciso
XXII do art. 24 da Lei de Licitações (BRASIL, 1993), que não se enquadra
em nenhuma dessas hipóteses especificamente, que ocorre quando da con-
tratação de fornecimento ou suprimento de energia elétrica e gás natural com
concessionário, permissionário ou autorizado.

Inexigibilidade e impossibilidade de licitar


A inexigibilidade de licitação se diferencia da dispensa porque nesta há a
possibilidade de competição e, pelos motivos elencados para a dispensa, o
administrador público poderá dispensar o processo licitatório.
Entretanto, na inexigibilidade, não há a possibilidade de licitação porque
há apenas um objeto ou apenas uma pessoa que atenda às necessidades da
Administração Pública, tornando inviável a realização do processo licitatório
(DI PIETRO, 2018), portanto, a inexigibilidade da licitação é verificada antes
da dispensa. Haverá a impossibilidade de licitar. Justen Filho (2009, P. 345-
346) afirma que:
Dispensa e inexigibilidade de licitação 11

[...] a conclusão acerca da caracterização da inexigibilidade faz-se em momento


logicamente anterior ao do reconhecimento da dispensa. Num primeiro mo-
mento, avalia-se se a competição é ou não viável. Se não o for, caracteriza-se a
inexigibilidade. Se houver a viabilidade de competição, passa-se à verificação
da existência de alguma hipótese de dispensa.

São três as hipóteses expressamente previstas para a inexigibilidade, con-


forme art. 25 da Lei nº. 8.666/1993 (BRASIL, 1993, documento on-line):

Art. 25 [...]
I — para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam
ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo,
vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade
ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do
local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato,
Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;
II — para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei,
de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização,
vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;
III — para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente
ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica espe-
cializada ou pela opinião pública.

A primeira hipótese para a inexigibilidade se caracteriza pela ausência


de alternativas à Administração Pública, pois só existe um único produto em
condições de atender às necessidades do Estado.
A realização de uma licitação seria apenas um gasto de dinheiro desne-
cessário à Administração Pública, pois haveria apenas um único competidor
em condições de atender à demanda estatal, mas há alguns requisitos a serem
observados.
O primeiro deles é que a solução necessária à necessidade estatal deve ser
técnica e economicamente viável, ou seja, a Administração Pública deverá
optar por soluções que possibilitem a competição e o processo licitatório,
mesmo que a melhor solução seja uma alternativa única.
Se efetivamente se apurar que não há uma alternativa à inexigibilidade de
licitação (por exemplo, apenas aquele único bem daquele fornecedor atende
à Administração, não existindo nenhum outro similar), é que poderá o ente
público deixar de licitar. Outro requisito é que o critério de escolha pela
Administração Pública seja o objeto em si, não a marca ou sua preferência.
A escolha do objeto a ser adquirido não deverá considerar a marca ou o
seu uso comercial, mas apenas a impossibilidade de concorrência em seu
fornecimento (JUSTEN FILHO, 2009).
12 Dispensa e inexigibilidade de licitação

A Lei nº. 13.303, de 30 de junho de 2016 (BRASIL, 2016), que versa sobre o estatuto
jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias,
prescreveu hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação, estabelecendo critérios
objetivos (valor da obra ou serviço, por exemplo) para a dispensa e conceituando a
especialização para a inexigibilidade.

A segunda hipótese — a contratação de serviços técnicos de natureza


singular, com profissionais ou empresas de notória especialização — re-
presenta a impossibilidade de seleção de serviços por meio de critérios
objetivos, quando, por exemplo, tratarem-se de objeto imaterial, tornando
muito difícil a quantificação objetiva para a abertura de processo licitatório.
Para a contratação desses serviços especializados, é necessária a presença
de três requisitos:

 a singularidade do objeto necessário à Administração Pública;


 o serviço técnico profissional especializado;
 a notória especialização do contratado.

Um exemplo de notória especialização do contratado é a contratação, pelo município,


de serviços técnicos para o mapeamento do subsolo para confecção de planta dos
encanamentos e das fiações enterradas por meio de equipamento que realiza radio-
grafias do subsolo sem a necessidade de abertura do solo. É um equipamento único
e um serviço altamente especializado.

A terceira e última hipótese é a contratação de profissionais do setor artístico,


cuja atividade é fruto da generosidade e criatividade pessoal de um certo artista.
Dispensa e inexigibilidade de licitação 13

Diferentemente da modalidade de concurso público, em que se pretende


uma certa manifestação artística não ligada às características pessoais de
determinado artista, nessa hipótese de inexigibilidade, não se quer premiar
ou destacar aquele que apresenta a melhor manifestação artística, mas
aquele desempenho artístico que apenas determinado artista tem. Dois
requisitos deverão ser observados pelo administrador público (JUSTEN
FILHO, 2009):

 que a manifestação artística possa satisfazer à necessidade estatal (ou


seja, de nada adiantaria a contratação de um pintor específico para uma
festa de réveillon na orla do Rio de Janeiro, mas sim um cantor popular
para esse tipo de festa);
 a consagração artística do artista a ser contratado, em outras palavras,
há a necessidade que a crítica especializada reconheça o artista como
notoriamente qualificado pela opinião pública (para que se evitem
favoritismos ou escolhas arbitrárias).

O Quadro 1 apresenta a distinção entre dispensa e inexigibilidade.

Quadro 1. Distinção entre dispensa e inexigibilidade

Inexigibilidade Dispensa

Impossibilidade de competição Possibilidade de competição

Deriva da natureza do objeto Depende da necessidade do Estado

Rol exemplificativo Situações exaustivas

Diante das distinções entre os institutos, o dever de licitar é a regra, mas,


em algumas ocasiões, o legislador admite a possibilidade da sua inexigibilidade
ou até mesmo a sua dispensa.
14 Dispensa e inexigibilidade de licitação

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União,


5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/consti-
tuicao.htm. Acesso em: 17 dez. 2019.
BRASIL. Lei nº. 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da
Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração
Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União, 22 jun. 1993. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm. Acesso em: 17.dez. 2019.
BRASIL. Lei nº. 13.303, de 30 de junho de 2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da
empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Diário Oficial da União, 1
jul. 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/
lei/l13303.htm. Acesso em: 17 dez. 2019.
DI PIETRO, M. S. Z. Direito Administrativo. 30. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2017.
DI PIETRO, M. S. Z. Direito Administrativo. 31. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2018.
JUSTEN FILHO, M. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 13. ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
TARTUCE, F. Manual de Direito Civil. 7. ed. São Paulo: Método, 2017.

Leituras recomendadas
CARVALHO FILHO, J. S. Manual de Direito Administrativo. 31. ed. São Paulo: Editora
Atlas, 2017.
JUSTEN FILHO, M. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 17. ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

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