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2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Embora as viagens científicas fossem organizadas já desde os séculos XVI e XVII,
Abdalla (2012) aponta que é no século XVIII que elas se intensificaram, transformando-se em
uma etapa distinta na formação de jovens naturalistas. Além disso, Kury (2001) aponta que as
viagens eram uma etapa fundamental para a investigação científica, pois era a partir da coleta
de espécimes durante uma expedição científica que se começava a transformação da natureza
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fontes não só para os estudos sobre a sociedade da época, mas para o estudo das redes de
colaboradores que contribuíam com as expedições. Em seus registros, os viajantes procuravam
relatar com pormenores os detalhes de suas viagens, incluindo em seus diários descrições de
sua interação com os habitantes locais. No caso da Expedição Thayer, o principal relato da
viagem foi aquele escrito conjuntamente por Elizabeth Agassiz. Diariamente, Elizabeth
sentava-se para escrever algumas linhas em seu diário, às quais receberam adições posteriores
por Louis Agassiz e foram publicadas em 1865 com o título de A Journey in Brazil. O livro
atingiu grande sucesso rapidamente e foi reeditado por diversas vezes e recebendo uma tradução
para o português, editada no ano 2000 pela editora do Senado Federal como parte da coleção
“O Brasil visto por Estrangeiros”.
A própria coleção editada pelo Senado Federal reflete a importância do Brasil no
contexto das viagens científicas, particularmente ao longo do Oitocentos. No século XIX, o
Brasil surgiu como um dos principais destinos para muitos naturalistas viajantes que partiram
em expedições. Belluzzo (1999), em sua obra, debate o interesse dos viajantes em visitar o
Brasil apontando que, até o início do século XIX, ter acesso às terras brasileiras era uma tarefa
repleta de obstáculos, uma vez que as políticas protecionistas da Coroa Portuguesa mantinham
firme controle sobre sua colônia no continente americano. É a partir de 1808, quando a Família
Real portuguesa se transferiu para o Brasil com a sua corte, que estas condições começaram a
ser modificadas. Quando o príncipe-regente Dom João de Bragança assinou o Decreto de
Abertura dos Portos às Nações Amigas, poucos dias após o seu desembarque em Salvador, ele
não só abriu as portas ao comércio, mas também à ciência europeia. Assim, muitos naturalistas
começaram a planejar as suas incursões às terras brasileiras, até então largamente inexploradas.
Posteriormente, o casamento de Dom Pedro de Alcântara com Maria Leopoldina de Áustria
também exerceu sua influência no cenário científico, uma vez que a arquiduquesa austríaca
trouxe em sua comitiva alguns dos principais naturalistas austro-alemães. Outro motivo pelo
qual o Brasil atraiu a atenção de diversos naturalistas, principalmente em meados do século
XIX, foi a percepção de que os trópicos eram um local privilegiado para o estudo do problema
da origem das espécies, como apontado por Moreira (2002).
Assim sendo, ao longo de todo o século XIX inúmeros naturalistas desembarcaram no
país e passaram meses ou mesmo anos vivendo no Brasil e estudando a flora, fauna, geologia e
cultura brasileiras. Dentre algumas das expedições mais renomadas, podemos citar a expedição
do príncipe Maximilian de Wied-Neuwied (1815-1817), a do botânico Auguste de Saint-
Hillaire (1816-1822), a da dupla de alemães Carl von Martius e Johann Baptiste von Spix (1817-
1821), a do Barão de Langsdorff (1824-1829), a passagem de Charles Darwin durante a viagem
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do Beagle (1832 e 1836), as incursões de Alfred Wallace (1848-1852), Henry Bates (1848-
1859) e Richard Spruce (1849-1864) na Amazônia, a brasileira Comissão Científica do Império
(1859-1861) e a Expedição Thayer (1865-1866), liderada pelo naturalista suíço Louis Agassiz
(1807-1873). Podemos citar ainda o naturalista britânico James Trail (1873-1875), cuja viagem
pela região amazônica foi amplamente analisada por Sá (1996), em uma tese de doutorado que
nos fornece um exemplo sobre como analisar as fontes resultantes de uma viagem científica.
Obras clássicas, como a de Cândido de Mello-Leitão, publicada originalmente em 1941, que
oferece um panorama amplo sobre estas e outras expedições que visitaram o país,
contextualizando-as e discutindo as diferenças entre elas e a de Paulo Vanzolini, publicada em
1996, que discute a contribuição das pesquisas realizadas por estes viajantes para o
desenvolvimento da Zoologia, fornecem embasamento para compreender a vinda de
naturalistas estrangeiros para o Brasil.
Liderada pelo suíço Louis Agassiz (1807-1873), naturalista que já há época possuía
grande renome nos círculos acadêmicos e intelectuais europeus e norte-americanos, a expedição
surgiu a partir do interesse de Agassiz pelo estudo da glaciação no Hemisfério Sul. O grande
renome do naturalista, já na época em que veio ao Brasil, contribui para a existência de ampla
bibliografia discutindo aspectos variados de sua passagem pelo país. Biografias do naturalista,
como aquelas publicadas por Edward Lurie (1988) e Christoph Irmscher (2013) auxiliam na
compreensão de suas ideias científicas e motivações que o trouxeram para o Brasil. O
naturalista tinha dois objetivos com sua viagem: coletar peixes amazônicos e encontrar vestígios
da ação recente de geleiras na América do Sul. Com seus estudos sobre glaciação, pretendia
comprovar a existência de um fenômeno de extinção recente que explicasse os achados fósseis
como uma descontinuidade entre as espécies, o que acreditava eliminaria a possibilidade de
uma interpretação evolutiva, refutando assim a teoria proposta por Charles Darwin e Alfred
Wallace. As ideias científicas de Agassiz foram compartilhadas com o público brasileiro
durante sua estada no país por meio de conferências realizadas no auditório do Colégio Pedro
II, no Rio de Janeiro. Estas conferências foram posteriormente analisadas por Gastão Galvão
de Souza (2009) e auxiliam a compreender as investigações realizadas pelo naturalista no
Brasil.
Dentre as questões investigadas por Agassiz no Brasil, suas visões raciais foram aquelas
que mais receberam o enfoque de pesquisadores posteriores. Inserido nos debates entre o
monogenismo e o poligenismo que, nos Estados Unidos, eram encabeçados por figuras como o
médico Samuel Morton, Agassiz acreditava que as diferenças entre os diferentes povos eram
resultado de diferentes criações. Para os poligenistas, como Agassiz, Deus haveria criado
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diferentes raças humanas, cada uma com características particulares que as adaptavam para a
vida em uma região determinada do planeta. Assim, quando chegou em Manaus, o naturalista
aproveitou da oportunidade para registrar fotograficamente as diferenças entre os grupos
humanos que ali viviam e os efeitos da mestiçagem. Suas fotografias, altamente controversas
pela sexualização dos indivíduos fotografados nus, foram discutidas por Haag (2010), Kury
(2001), Machado (2010), Menand (2001-2002) e Sousa (2008). A partir de suas obras, é
possível compreender o contexto dos debates raciais nos Estados Unidos, onde Agassiz morava,
e entender a relação dos viajantes com a população brasileira e suas interações com seus
colaboradores locais.
A partir da bibliografia discutida até aqui, será possível compreender como era praticada
a ciência Oitocentista, particularmente nas expedições científicas que tinham como destino o
Brasil, onde os viajantes se deparavam com uma natureza tropical e uma diversidade humana
que geralmente lhe era incomum. No entanto, a partir da revisão da bibliografia selecionada
identifico que, em todos os casos, os autores tratam da experiência de viajantes masculinos,
homens que lideravam grandes grupos formados por outros homens em viagem científica pelo
país. O papel das mulheres na ciência Oitocentista é, até então, menos discutido e precisa ser
melhor explorado, motivo pelo qual direciono minha pesquisa para a participação específica de
Elizabeth Agassiz em meio a Expedição Thayer. A vida da viajante já foi brevemente analisada
em um artigo publicado por Santos (2005), mas sem destacar a relevância de Elizabeth no
trabalho científico liderado por Louis Agassiz. De acordo com Lindsay (1998), não eram raros
os casos em que as mulheres de naturalistas contribuíssem com a carreira dos maridos, ora fosse
como colaboradoras ativas no trabalho científico, como me parece ser o caso de Elizabeth, ora
como esposas e donas de casa, encarregadas de administrar a vida familiar e domiciliar destes
naturalistas. Assim, com este trabalho de conclusão de curso pretendo contribuir para a
compreensão do papel das mulheres na ciência Oitocentista, a partir de uma análise de caso
particular que investiga a atuação de Elizabeth Agassiz enquanto membro da comitiva que
viajou o Brasil com a Expedição Thayer
3. OBJETIVOS
4. FONTES E METODOLOGIA
As fontes que serão utilizadas nesta pesquisa e que já foram identificadas são:
AGASSIZ, Elizabeth Cary (ed.). Louis Agassiz: his life and correspondence. Boston/New
York: Houghton, Mifflin and Company. 1885. Disponível em:
<https://archive.org/details/louisagassizhisl00agas> Acesso em: 12 jan. 2020.
AGASSIZ, Louis; AGASSIZ, Elizabeth Cary. A Journey in Brazil. Boston: Ticknor and Fields,
1868. Disponível em: <https://archive.org/details/journeyinbrazil00agasiala>. Acesso em: 12
jan. 2020.
BIBLIOTECA ERNST MAYR. Group portrait of Thayer Expedition assistants and volunteers.
Disponível em: <http://library.mcz.harvard.edu/ernst_mayr/burkhardt> Acesso em: 21 fev.
2020.
GUYOT, Arnold. Memoir of Agassiz, 1807 – 1873. National Academy of Sciences, 1878.
Disponível em: <http://www.nasonline.org/publications/biographicalmemoirs/memoir-
pdfs/guyot-arnold.pdf> Acesso em: 21 fev. 2020.
JAMES, William. Louis Agassiz. Cambridge: University of Harvard Press, 1896. Disponível
em: <https://archive.org/details/louisagassizword00jame> Acesso em: 2 jan. 2020.
As fontes que serão utilizadas nesta pesquisa incluem o livro de viagem publicado após
o término da Expedição Thayer, de autoria de Elizabeth Agassiz, que também foi responsável
pela redação e publicação de uma biografia sobre seu marido, Louis Agassiz, onde é possível
encontrar maiores detalhes sobre sua interação pessoal e profissional com seu marido, não
apenas no contexto da viagem. O seu relato de viagem poderá ser comparado com aquele
produzido por outros membros da expedição, como o geólogo Charles Frederick Hartt e o
filósofo William James, permitindo assim comparar a experiência de viagem masculina e
feminina. Da mesma forma, será interessante comparar a biografia de Agassiz produzida por
Elizabeth com aquela produzida por um amigo e contemporâneo do naturalista, o geólogo e
geógrafo Arnold Guyot. Fontes como o livro de viagem e a biografia de Louis Agassiz contêm
informações redigidas pela própria Elizabeth sobre a expedição, sua vida com Agassiz e
parceria científica com ele, relatadas a partir de sua própria experiência.
Além dos livros, analisarei as correspondências trocadas entre Elizabeth Agassiz e seu
marido com o Imperador D. Pedro II. Estas correspondências foram publicadas pelo Museu
Imperial do Rio de Janeiro e auxiliarão na compreensão da relação dos viajantes com o
monarca, revelando ainda suas impressões sobre o Brasil e a participação do governo brasileiro
na expedição. Já no relatório anual do Museum of Comparative Zoology para o ano de 1866,
foram publicadas informações científicas detalhadas sobre os resultados da expedição, uma vez
que o museu recebeu os espécimes coletados no Brasil pelos viajantes, muitos dos quais
trabalhavam na instituição. Será interessante, a partir da análise desta fonte, comparar os
resultados atribuídos ao trabalho de Elizabeth com aquele dos demais membros da comitiva.
Ademais, na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional será possível ter acesso a
periódicos digitalizados que possuem notícias e relatos publicados principalmente por
brasileiros sobre a passagem da expedição pelo Brasil, possibilitando compreender a percepção
dos nacionais sobre a passagem da comitiva científica pelo país. Na página da Hemeroteca
Digital, farei a busca por estes periódicos utilizando alguns critérios de pesquisa. Atualmente é
possível utilizar três critérios de busca: a pesquisa por periódico, por período ou local. Dentre
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estas possibilidades, a pesquisa por período é a que retorna o maior número de resultados, pois
realiza a busca em todos os periódicos e locais durante o período selecionado. Uma vez que a
seleção do período comporta apenas a escolha por década, a busca será realizada no período
compreendido entre os anos de 1860 e 1869, que engloba os anos em que a Expedição Thayer
esteve no país. Como palavra-chave, buscarei pelos termos “Agassiz” e “Thayer”, de forma a
tentar obter o maior número possível de notícias sobre a expedição.
Quanto ao suporte, a maior parte das fontes foi originalmente publicada sob forma de
impresso, mesmo no caso dos periódicos. No entanto, atualmente todas já estão disponíveis em
formato digital online, sendo esta a forma de acesso das fontes durante a pesquisa, a partir das
páginas do Internet Archive, da Biblioteca Ernst Mayr, da Biodiversity Library e da Hemeroteca
Digital da Biblioteca Nacional. A principal característica das fontes é ter sido produzida por
membros da Expedição Thayer, com exceção das notícias publicadas nos periódicos, sendo,
assim, a maioria delas produzida pelos próprios viajantes. Todas as fontes serão lidas e fichadas,
organizadas de forma a separar aquelas que são de autoria de Elizabeth Agassiz das demais. O
relatório sobre sua experiência será analisado com base na bibliografia sobre as mulheres
cientistas Oitocentistas e sobre as expedições de História Natural que estiveram no Brasil
durante o período.
Além das fontes textuais, pretendo também analisar algumas fontes iconográficas, uma
vez que existem algumas fotografias da expedição e seus membros. As fotografias disponíveis
digitalizadas na Biblioteca Ernst Mayr, da Universidade de Harvard, podem ser analisadas com
a ajuda da História da Arte e da Semiótica para compreendê-las como um discurso, ainda que
imagético, que revela aquilo que os viajantes julgaram ser necessário registrar
fotograficamente.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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