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Início do tratamento: Outubro/2016. Frequência: semanal.

Breves informações do paciente


Paciente M, 30 anos, formado em psicologia. Veio a Campinas para realizar
seus estudos e, desde estão, mora longe dos pais.
Sua principal queixa chega por meio de uma desestabilização em sua vida
amorosa/afetiva. São conflitos relacionais recorrentes que o deixam ansioso, a ponto
de relatar alterações físicas; além de um constante sentimento de culpa em suas
ações.

RELATO DE SESSÃO – 01/11


Como de costume eu subi até a recepção para chamá-lo. Ele estava a minha
espera, sentando e mexendo no celular.
T. Boa tarde M. vamos lá?
P. Boa tarde André, vamos!
Então descemos as escadas em direção à sala. Ao chegarmos ele
prontamente se dirigiu ao divã e começou seu relato.
P. Essa semana aconteceu algumas coisas que me fizeram sentir um mix de
sentimentos?
T. Como assim um mix de sentimentos?
P. Ah... uma mistura de sensações, boas e ruins. Por exemplo, tive uma
resposta daquele processo seletivo que eu estava esperando e não fui aprovado, uma
outra menina foi chamada. Puxa, eu esperava que fosse contratado. Acredito ter ido
bem em todas as etapas, na prova, na entrevista. Mas não foi dessa vez.
T. E como você reagiu a essa resposta?
P. Eu esperava passar mesmo. Além do fato de eu precisar de emprego, penso
que fiz um bom processo, dei meu melhor, meu currículo é até razoável... Eles até
falaram que eu tinha o perfil para vaga, que me encaixava nas expectativas deles, mas
eu não sei o que eles esperavam. E é por isso que veio essa mistura de sentimentos.
Tenho a impressão de que sou um bom candidato, mas quando eu não sou aprovado
parece que eu não sou bom o suficiente, sabe?
T. Me fala um pouco mais sobre esse sentimento.
P. As vezes me sinto incapaz. Sei do meu potencial, das minhas capacidades,
mas as vezes eu não sei como me posicionar ou o que pensar. Por exemplo a F.
(namorada), ela me faz sentir inseguro quando fala sobre meus erros. Que eu não
chego no horário, que eu não faço as coisas que ela quer e do jeito dela... Parece que
nunca está bom, sempre tem algo de ruim que ela quer apontar em minhas atitudes.
T. E como você se vê?
P. Não me vejo egoísta, por exemplo. Sei que busco meu espaço, busco fazer
minhas coisas, mas não deixo de procurá-la, de dar atenção, mesmo quando ela fica
emburrada ou brava comigo por algum motivo. Aí tenho que escutar dela que eu sou
muito folgado, que quero as coisas sempre do meu jeito. E eu não acho isso
verdadeiro. Procuro sempre pensar na gente quando vou planejar algumas coisas,
pergunto se ela tem interesse em fazer um programa ou outro, essas coisas... Aí me
pego pensando se sou tão egoísta assim, ou se não sou bom o suficiente para
conseguir um emprego, apesar de falarem que sou um bom candidato.
T. Quem está falando sobre você, é você ou são os outros?
Segue-se um breve silêncio.
P. Difícil isso... acho que por isso me vem esse mix de sentimentos...
T. Me parece que a influência da fala das outras pessoas em você é tão grande
que você se contesta o tempo todo... quase se como sua identidade fosse colocada
em questão.
P. Sim... é verdade... as vezes parece que eu nem sei mais quem sou.
Segue-se um breve silêncio.
P. E é dentro do relacionamento com F. que eu vivencio isso. Eu queria tanto
que fosse diferente, que ela fosse diferente, que não brigasse tanto pelas coisas. Tudo
vira sempre uma grande discussão que as vezes nem dá vontade de falar nada.
T. E como você gostaria que F. fosse?
P. Ah, eu queria um companheira, que me respeitasse do jeito que eu sou, que
me acompanhasse, que pudéssemos nos divertir, curtir. Mas tem sido tudo tão pesado
já há um bom tempo que nem sei mais... Já tem um tempão que está assim... Aí
penso em terminar para poder procurar uma pessoa assim, por outro lado eu gostaria
de poder fazer isso com F., gosto dela.
T. Me parece que você tem duas F., uma ideal e uma real. E que as duas não
estão nem de perto sendo a mesma pessoa. Você deseja um relacionamento ideal,
mas está com uma pessoa real, com suas qualidades e defeitos.. Será que essa
pessoa ideal existe?
E então mais um momento de silêncio.
P. Pode ser que não... mas entendo o que você quer dizer... Eu tenho uma
expectativa de um relacionamento, mas no dia a dia não está acontecendo e eu não
sei o que fazer...
T. E aí eu trago novamente sua fala descrita como mix de sentimentos. Talvez
você tenha uma dificuldade em se encontrar, constituir uma identidade que possa se
fortalecer para suportar a fala dos outros e, então, buscar aquilo que você quer.
P. Sim, exatamente... me sinto assim, repensando a todo tempo quem eu sou
de acordo com o que os outros falam.
T. Em outras sessões falamos muito sobre a importância desse seu
fortalecimento interno, e as suas experiências tem contribuído para isso, seu antigo
emprego, seus planos para buscar um apartamento sozinho... percebo um desejo de
fortalecimento interno.
P. É verdade... e talvez por isso também meu relacionamento não está dando
certo... preciso pensar mais sobre isso...
T. Nossa sessão está se encerrando... Procure ficar com essa reflexão sobre
que fala sobre você, se há uma voz interna que você reconhece como sendo sua ou
se a fala dos outros estão determinando quem você é, suas escolhas e caminhos...
P. Perfeito... vou me empenhar nisso... obrigado.
T. Tenha uma boa semana e até a próxima sessão.
P. Obrigado André, até a próxima.

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