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A têmpera do aço foi considerada durante séculos como uma das maravilhas da natureza e
somente por volta de 1895, quando Osmond descreveu a microestrutura de um aço
temperado, o termo “martensita” foi introduzido6. Todavia, a situação de perplexidade ante
a natureza do fenômeno persistiu até a segunda década do século XX quando Bain 2
descobriu a existência de uma deformação intrínseca à transformação (“mudança de
forma”) e propôs um mecanismo pelo qual a martensita poderia ser formada com um
mínimo de deformação atômica, partindo da austenita. O mecanismo então proposto pode
ser descrito como uma deformação homogênea em que um movimento coordenado dos
átomos converte a malha de Bravais cúbica de faces centradas da austenita na tetragonal ou
cúbica de corpo centrado da martensita (Fig. 6.5). Esta deformação conhecida como
“Distorção de Bain” é parte integrante das modernas teorias cristalográficas pertinentes à
transformação martensítica3-4. A existência de distorção de malha é considerada uma
característica básica de uma classe de transformações de fases não difusionais à qual
pertence à transformação martensítica observada nos aços.
martensita
fase matriz
martensita
fase matriz
A fig 6.2 é uma micrografia ótica de uma martensita típica em uma liga de Cu-Al-Ni. As
faixas hachuradas, em contraste com as lisas, são maclas, as quais mudam de direção como
mostrado esquematicamente na figura 6.3 e na textura apresentada na fig 6.4. Estas análises
mostram claramente uma mudança de forma linear associada à TM, e pode ser descrita por
uma matriz como um operador.
Fig. 6.4. Textura feita por EBSD em uma liga de Cu-Al-Ni monocristalina apresentado as
diferentes direções de maclagem.
1.2 Transformações martensíticas: cristalografia.
Quando uma deformação é linear, esta deformação é representada pela seguinte equação:
r2 Ar1 (6.2)
onde A representa a matriz aij. Assim, um vetor r1 é transformado no vetor r2 pela matriz A.
Já que a fase matriz e a fase martensítica apresentam diferentes estruturas, uma
transformação de coordenadas torna-se necessária. Em um caso bem geral, vamos tomar
dois sistemas de eixos representados pelos vetores a, b e c, aqui chamados de sistema
velho, e A, B e C, chamados de sistema novo. Escrevemos a Eq.6.3 e resolvendo em função
de A, B e C, escrevemos a Eq.6.4, ambas representadas no espaço direto. Entretanto, prova-
se que as equações são similares no espaço recíproco, apresentado nas Eq.6.5 e 6.6, onde
a*, b* e c* representam os vetores base do espaço recíproco, os quais correspondem a a, b
e c, e o mesmo é aplicado a A*, B* e C*.
onde xyz e XYZ referem-se a rede direta (direção) e hkl e HKL a rede recíproca (plano).
A R 1 AR ou A R AR 1 (6.9)
A R T AR ou A R AR T (quando R é ortogonal), (6.10)
onde
A = operador do sistema antigo;
A = operador do sistema novo;
R = matriz de rotação;
R 1 = inversa de R ;
R T = transposta de R .
Pelo fato dos operadores estarem freqüentemente referidos a fase matriz no cálculo da
cristalografia martensítica, a similaridade das transformações é sempre usada.
Para analisar como um cristal de martensita é produzido a partir de um cristal matriz sem
difusão, consideremos um exemplo típico de transformação em aço de CFC (cúbico de face
centrada) para TCC (tetragonal de corpo centrado). Na Fig. 6.5(a) podemos notar uma rede
TCC dentro de duas células CFC com o valor de c/a = 2 . Deste modo, alongando os
eixos x e y, e contraindo o eixo z, temos uma relação c/a da martensita que é
aproximadamente igual a 6. Este mecanismo foi originalmente proposto por Bain2. Embora
o mecanismo seja diferente de uma liga para outra, é sempre possível criar a martensita a
partir de uma fase matriz pela combinação do alongamento, da contração e do cisalhamento
ao longo de certas direções. Podemos escrever a matriz de transformação de rede para um
parâmetro de rede do CFC = a0 e um parâmetro do TCC igual a a e c:
a 2 / a0 0 0
B 0 a 2 / a0 0 (6.11)
0 0 c / a 0
De forma similar, a matriz de deformação da rede com relação a rede matriz é dada a
seguir:
B R BR T
1 / 2 1 / 2 0 a 2 / a 0 0 0 1 / 2 1 / 2 0
B 1 / 2 1 / 2 0 0 a 2 / a0 0 1 / 2 1 / 2 0 (6.12)
0 0 1 0 0 c / a 0 0 0 1
x 1 / 2 1 / 2 0 X H 1 / 2 1 / 2 0 h
y 1 / 2 1 / 2 0 Y , K 1 / 2 1 / 2 0 k (6.13)
z 0 0 1 Z L 0 1 l
0
velho novo novo velho
Fig. 6.5. Mecanismo da transformação CFC-TCC (ou CCC) por Bain. xyz representam os
eixos do cristal na rede CFC da fase matriz, enquanto que XYZ representam os eixos na
martensita TCC.
Assim, para o exemplo da Fig.6.5, correlacionamos 101 p com 111 m , 112 p
com 011 m e
111 p com 011m por correspondência de rede, sendo os índices p e m as fases matriz e
martensítica respectivamente.
Entre muitas mudanças estruturais martensíticas, as mais importantes são aquelas nas quais
as ligas possuem a fase , que são caracterizadas pela razão elétron/átomo (e/a) 1,5. São
ligas como Au-Cd, Ag-Cd, Cu-Al-(Ni), Cu-Zn-(Al), etc., onde suas estruturas cúbicas de
corpo centrado (CCC) ou CCC ordenada ficam estabilizadas nas TMs.
Fig 6.6. Apresentação esquemática da razão pela qual o cisalhamento invariante de rede é
requerido na transformação martensítica; (a) mudança de forma na transformação
martensítica; (b) e (c) representam a acomodação do esforço por introdução de
deslizamentos (b) ou maclas (c), respectivamente.
Deste modo a maclagem é descrita em maiores detalhes como se segue. Dois cristais de
macla são geralmente relacionados por uma operação simétrica com um plano espelhado ou
um eixo de rotação. Na deformação por maclagem, uma macla é criada por um
cisalhamento próprio, enquanto que as maclas são introduzidas pela TM como
anteriormente descrito, e elas podem agir como um tipo de deformação sob tensão. Por esta
correlação as maclas têm uma relação próxima com o efeito de memória de forma. É
conveniente usar uma esfera unitária e um elipsóide resultante de um cisalhamento para
discutir a deformação por maclagem, como mostra a Fig.6.7. Neste processo de
cisalhamento, K1 e 1 representam o plano cisalhante e a direção de cisalhamento
respectivamente. Obviamente que K1 é um plano invariante e K2 é outro nesta análise. O
plano que é normal a K1 e paralelo a 1 é chamado de plano de cisalhamento, e a interseção
de K2 e o plano de cisalhamento é chamado de 2. K1, K2, 1, 2 e um cisalhamento de
maclagem s são chamados de elementos de maclagem. Inicialmente para criar uma macla
por este processo, a rede precisa ser restaurada. Para satisfazer esta condição, existem dois
casos18.
Fig. 6.7. A deformação de uma unidade esférica em um elipsóide por cisalhamento, e a
definição de K1, K2, 1, 2 e s.
No caso I, dois vetores de rede ficam sobre o plano K1, e um terceiro vetor de rede é
paralelo à direção 2. Neste caso, K1 e 2 são representados por índices racionais, e os dois
cristais de macla são relacionados por um espelho simétrico em relação ao plano K6. Esta é
chamada de maclagem do tipo I. No caso II, dois vetores de rede estão no plano K2, e o
terceiro vetor de rede é paralelo a direção 6. Neste caso, K2 e 1 são irracionais, e os dois
cristais de macla estão relacionados pela rotação de em torno do eixo 6. Esta é chamada
de maclagem do tipo II. Em alguns sistemas cristalinos, K1, K2, 1 e 2 podem ser índices
racionais, são chamados de compostos de maclagem, e os dois cristais de maclas tem
características simétricas. Em relação às transformações de maclas como uma deformação
invariante de rede, segue:19 K1 para o tipo I de maclagem, precisa originar-se a partir de um
plano espelho na fase matriz, enquanto que 1 para o tipo II de maclagem precisa originar-
se a partir do eixo duplo cruzado na fase matriz. Os elementos de maclagem podem ser
calculados pela teoria de Bilby-Crocker,20 os quais são experimentalmente confirmados.
P1 1 P2 B (6.14)
onde B representa a matriz de deformação de rede para criar uma rede martensítica a partir
de uma rede matriz, P2 uma matriz de cisalhamento invariante de rede e 1 uma matriz de
rotação de rede. Nesta teoria há um foco em minimizar a energia de deformação associada
com a transformação. Fazendo P2B = F e separando F em uma matriz simétrica Fs e na
matriz de rotação , a matriz simétrica pode ainda ser diagonalizada por uma
transformação de eixo principal, assim:
F Fs Fd T (6.15)
onde Fd é uma matriz diagonal, é uma matriz para a diagonalização e T sua transposta.
Substituindo a Eq. 6.15 na Eq.6.1, temos:
P1 1 Fd T (6.16)
Na Eq.6.16, somente a matriz Fd não é uma matriz de rotação, e sendo uma matriz diagonal
com os termos de deformação, escrevemos:
1 0 0
Fd 0 2 0 (6.17)
0 3
0
Considerando a distorção por Fd, há uma mudança de uma esfera unitária para um elipsóide
no sistema do eixo principal, como mostra a Fig. 6.8. Quando há uma interseção entre o
elipsóide e o plano, em geral, isso não é um plano. Entretanto, se e somente se uma das
condições a seguir for satisfeita, existirá um plano não distorcido28.
(1) Um i é igual a 1, um outro será maior que 1 e o restante menor que 1 (Ex.: 1<1,
2 >1, 3 =1);
(2) dois i's são iguais a 6.
Fig. 6.8. A deformação de uma esfera unitária em um elipsóide por Fd no sistema de eixo
principal.
Fig 6.9. (a) Uma micrografia de MEV típica da auto-acomodação da martensita 7R(14). (b)
Quatro variantes de planos de hábito (A, B, C, D) foram identificados por análises de
superfície. (After Murakami et al.33)
Visto que as TMs não estão associadas com a mudança de composição, as curvas de
energia livre de ambas as fases matriz e martensítica em função da temperatura podem ser
representadas esquematicamente como mostrado na Fig.6.12, onde T0 representa a
temperatura de equilíbrio termodinâmico entre as duas fases, e GpmMs = Gm - Gp
simboliza a força motriz para a nucleação da martensita, onde Gm e Gp representam a
energia livre de Gibbs da martensita e da fase matriz respectivamente. O mesmo argumento
aplica-se para a transformação reversa. Assim, T0 foi aproximado para ½(Ms + As). Assim,
uma mudança da energia livre de Gibbs de um sistema que está sob TM pode ser escrito
como se segue:
Temperatura [K]
Fig. 6.12. Representação esquemática das curvas de energia livre para as fases matriz e
martensítica, e suas relações com as temperaturas Ms e As. Ts é o superresfriamento
requerido para a transformação.
onde gc = gm - gp é a mudança da energia livre química entre a matriz e a martensita por
unidade de volume, e ge é a energia elástica de deformação em torno da plaqueta de
martensita. A equação acima significa que metade da mudança de energia livre química é
armazenada como uma energia elástica em uma amostra. A partir desta análise, eles
mostraram que a temperatura As pode estar abaixo de T0. Assim, T0 = ½ (Ms + Af) é a
melhor aproximação para a transformação termoelástica, como proposto por Tong e
Wayman em 1974.
Quando discute-se o efeito da tensão na TM, segue-se a análise de Patel e Cohen feita em
1953. Como descrito anteriormente, a TM se processa por um mecanismo de cisalhamento,
e assim interage com a tensão aplicada. Se a tensão auxilia ou se opõe a transformação é
facilmente determinado pelo cálculo do trabalho realizado no sistema pela tensão aplicada.
Obviamente, se o trabalho é positivo, a tensão auxilia a transformação, e vice e versa.
d S H *
, (6.22)
dT T
O efeito de memória de forma (a ser abreviado EMF daqui por diante) é uma propriedade
única de certas ligas que apresentam a transformação martensítica. Sendo a liga deformada
em uma fase de baixa temperatura, ela recupera sua forma inicial quando devidamente
aquecida para uma temperatura crítica chamada de temperatura de transformação reversa. A
mesma liga tem uma outra propriedade única chamada de superelasticidade (SE) em uma
alta temperatura, que está associada a uma considerável deformação não-linear recuperável
(até 18%) sob carregamento e descarregamento.
Terminologia
Referências