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Letras em dia, Português, 11.

° ano Questão de aula – Educação Literária

Nome: N.º: Turma:

Avaliação: O(A) professor(a):

Antero de Quental, Sonetos Completos

Lê atentamente o soneto de Antero de Quental.

Acordando
Em sonho, às vezes, se o sonhar quebranta
Este meu vão sofrer, esta agonia,
Como sobe cantando a cotovia,
Para o Céu a minh’ alma sobe e canta.

5 Canta a luz, a alvorada, a estrela santa,


Que ao mundo traz piedosa mais um dia...
Canta o enlevo das coisas, a alegria
Que as penetra de amor e as alevanta...

Mas, de repente, um vento húmido e frio


10 Sopra sobre o meu sonho: um calafrio
Me acorda. – A noite é negra e muda: a dor

Cá vela, como dantes, ao meu lado...


Os meus cantos de luz, anjo adorado,
São sonho só, e sonho o meu amor!

ANTERO, Quental de, 2016. Os Sonetos Completos.


Porto: Porto Editora (p. 61)

1. Divide o poema em partes lógicas, relacionando essa divisão com os seus dois polos estruturantes.

2. Apresenta uma explicação para a repetição dos verbos «subir» e «cantar».

3. Interpreta o valor do deítico «Cá», tendo em conta o sentido geral do poema.


Letras em dia, Português, 11.° ano Questão de aula – Educação Literária

Sugestões de resolução

Antero de Quental, Sonetos Completos, p. 72


1. O soneto baseia-se na oposição sonho/realidade, estes são os dois polos estruturantes do poema, que pode ser
dividido em duas partes. Na primeira, correspondente às duas quadras, o sujeito poético refere a sua evasão da
realidade para o sonho («se o sonhar quebranta / Este meu vão sofrer», vv. 1-2). Nesta parte, é explorado um
vocabulário de conotação positiva: «cantando», «Céu», «luz», «alvorada», «estrela santa», «piedosa», «enlevo»,
«alegria», «amor». No início do primeiro terceto, a conjunção adversativa «Mas» introduz uma oposição ao que foi
descrito anteriormente. Inicia-se assim a segunda parte do poema, correspondente aos dois tercetos. Nesta parte, o
sujeito poético refere o acordar do sonho e a sua consequência – o regresso à angústia. O vocabulário, de conotação
negativa, opõe-se ao da primeira parte: «vento húmido e frio» (v. 9), «calafrio» (v. 10), «A noite é negra e muda», «dor»
(v. 11). O título do poema («Acordando») sugere o momento de charneira entre o sonho e a realidade; conjugado no
gerúndio, transmite a ideia de lentidão, como se o sujeito lírico se quisesse agarrar à perfeição e felicidade que o sonho
lhe dá, atrasando a sua «caída» na realidade.
2. Os verbos «subir» e «cantar» surgem na primeira parte do poema, relacionando-se um com o outro e associando-se
à felicidade do sonho. O sujeito poético compara a sua alma à da cotovia. A sua alma «sobe e canta» «Para o céu» (v.
4), tal «Como sobe cantando a cotovia» (v. 3). A sua alma sobe, eleva-se para o «Céu», para um mundo ideal e
perfeito. A repetição anafórica de «Canta», na segunda estrofe, destaca a sua importância, pois é quase uma Ação de
Graças, um louvor ao mundo, à alegria e ao amor. E só o sonho permite essa libertação e elevação da alma, só o sonho
permite atingir essa plenitude.
3. O deítico «Cá» situa a dor próxima do sujeito poético («a dor / Cá vela, como dantes, ao meu lado», vv. 11-
-12), comprovando que o sonho, espaço e tempo de evasão da realidade e da angústia, é breve, efémero.
Subentendemos que, se a dor da realidade está «cá», o sonho, a felicidade e o ideal estarão «lá», distantes, ainda que
intensamente desejados.

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