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EDUCAÇÃO
Educação, Porto Alegre, v. 44, n. 1, p. 1-13, jan.-abr. 2021
e-ISSN: 1981-2582 ISSN-L: 0101-465X
http://dx.doi.org/10.15448/1981-2582.2021.1.32875
Natalia Araujo Souza Resumo: Este artigo apresenta dados de uma pesquisa qualitativa inspirada na
Metodologia da Investigação Comunicativa. Tem como objetivo analisar a percepção
Neves1
orcid.org/0000-0002-8776-5262 dos servidores técnico-administrativos em educação sobre os cursos de capacitação
nataliaraujos@gmail.com ofertados pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Os dados coletados
foram obtidos a partir de entrevista comunicativa em profundidade. As informações
resultantes da pesquisa revelam que os servidores técnico-administrativos em educa-
ção têm muitas ideias que podem contribuir com o Programa de Capacitação e que a
Eglen Sílvia Pipi Aprendizagem Dialógica pode trazer melhorias relevantes para a Educação Corporativa.
Rodrigues1 Palavras-chave: educação corporativa, técnico-administrativo em educação,
orcid.org/0000-0001-8634-7248
aprendizagem dialógica, capacitação
eglenrodrigues@gmail.com
Abstract: This article presents data acquired through qualitative research, inspired
by the Methodology of Communicative Research. It aims to analyze the percep-
tion that technical-administrative servants in education have towards the training
courses that are offered by UFMT. The collected data was obtained from in-depth
Recebido em: 28 dez. 2018. communicative interviews. The information gathered from this research reveals
Aprovado em: 22 abr. 2021. that the Technical-Administrative Servants in education have several ideas that can
Publicado em: 21 jun. 2021. contribute to improving the Training Program. The research came to the conclusion
that Dialogic Learning can be used to bring improvements to Corporate Education.
Keywords: corporate education, technical-administrative in education, dialo-
gical learning, training
1
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Rondonópolis, MT, Brasil.
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A interdisciplinaridade é “(...) um método de pesquisa e de ensino suscetível de fazer com que duas ou mais disciplinas interajam entre
si” (Marques, 2000, p. 57).
Natalia Araujo Souza Neves • Eglen Sílvia Pipi Rodrigues
Educação corporativa no serviço público: um estudo de caso com enfoque na aprendizagem dialógica 3/13
formação continuada tem sido satisfatório e se interpretações da realidade a qual estão inseridos.
existe uma intencionalidade de se pensar em (...) Nessa perspectiva, o aprendizado ocorre de
ofertas de cursos baseados na perspectiva de forma coletiva” (Franco, 2016, p. 51).
uma formação mais dialógica. Nesta perspectiva, Freire (2015b) ressalta que
De natureza qualitativa, inspirada na Metodo- para ser possível um ensino baseado na dia-
logia de Investigação Comunicativa, a pesquisa logicidade, é fundamental que a prática seja
foi também descritiva, quanto à caracterização redimensionada neste sentido, que seja crítica,
dos objetivos, e um estudo de caso, no que implicando em um pensar certo, que envolva o
concerne à caracterização dos procedimentos. movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o
O instrumento de coleta de dados utilizado foi a pensar sobre o fazer. Dessa forma, é fundamental
entrevista em profundidade. O universo da pes- a reflexão crítica sobre a prática, pois é pensando
quisa abrangeu os TAEs da UFMT, cinco lotados criticamente a prática que é possível melhorá-la.
no Câmpus de Rondonópolis e um na UFMT de
Cuiabá, sendo este, portanto, o lócus de pesquisa. A educação corporativa no serviço público
Conforme Mello (2006), a Metodologia de In-
Nesta seção, contextualizamos o tema desta
vestigação Comunicativa vem sendo desenvolvida
pesquisa, falando brevemente sobre a Gestão de
pelo Centro Especial de Investigação em Teorias
Pessoas, a Educação Corporativa e a Gestão por
e Práticas Superadoras de Desigualdades (CREA)
Competência. Em seguida, discorremos sobre o
da Universidade de Barcelona, a partir da Teoria do
Programa de Capacitação dos TAEs da UFMT e
Agir Comunicativo de Habermas, como também
sobre a Aprendizagem Dialógica.
do conceito de dialogicidade de Paulo Freire.
Com a globalização e as inovações tecno-
pública federal direta, autárquica e fundacional assimilados nos programas de educação continu-
(Decreto nº 5.707, de 23/02/2006), o modelo ba- ada das empresas e de qualificação profissional”
seado na gestão por competência tornou-se uma (Ricardo, 2012, p. 40).
referência-chave na administração pública fede- É necessário, então, pensar em formas cada
ral, tornando necessário que a gestão de pessoas vez mais dialógicas para desenvolver a apren-
promova a gestão por competências. Conforme dizagem, pois, dessa maneira, o conhecimento
o inciso II do artigo 2º do Decreto nº 5.707/2006, pode ser adquirido e compartilhado de um modo
gestão por competência é a “gestão da capacitação mais agradável e satisfatório.
orientada para o desenvolvimento do conjunto de
conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias O programa de capacitação dos TAES
ao desempenho das funções dos servidores, visando da UFMT
ao alcance dos objetivos da instituição”.
O Câmpus de Rondonópolis está em cons-
Neste sentido, o investimento na Educação
tante crescimento, e, portanto, é extremamente
Corporativa vem trazendo resultados satisfatórios
necessário que seja disponibilizada e incentiva-
para a expansão do conhecimento nas orga-
da uma educação continuada para que todos
nizações (Nonaka et al., 2011). Conforme estes
os servidores acompanhem esse crescimento,
autores, a educação corporativa é “aquela que é
para que essa instituição ofereça cada vez mais
desenvolvida dentro das organizações com foco
um serviço de qualidade para a sociedade com
bem específico de promover a disseminação de
profissionais capacitados e atualizados.
conhecimento dentro do ambiente organizacio-
Atualmente, a UFMT conta com 1.576 TAEs e,
nal” (Nonaka et al., 2011, p. 111).
destes, 82 estão lotados no Câmpus de Rondo-
Freire (2015a) revela que não seriam poucos os
nópolis (Universidade Federal de Mato Grosso,
exemplos que poderiam ser citados, de planos,
2016a, 2016b).
de natureza política ou simplesmente docente,
Conforme o Relatório de Gestão (2008–2016)
que falharam porque os seus realizadores par-
da UFMT, os cursos de capacitação têm o in-
tiram de sua visão pessoal da realidade. Porque
tuito de qualificar da melhor forma possível as
não levaram em conta, os homens em situação
atividades dos servidores. Anualmente, a UFMT
a quem se dirigia seu programa, a não ser como
elabora o Plano Anual de Capacitação e Desen-
puras incidências de sua ação.
volvimento Humano (PAC), que tem a finalidade
Nessa perspectiva, Libâneo (2001) assegura que:
de “contribuir para o desenvolvimento do servidor,
estão inseridos. Para tanto, é preciso que A fim de preservar a identidade dos sujeitos par-
o aluno reflita sobre o que o professor ticipantes desta pesquisa, lotados na UFMT/CUR,
explica, para que ele reelabore os conte- estes são aqui identificados por nomes fictícios,
údos dados e tenha a sua própria opinião,
conforme disposto no Quadro 1, apresentado a
relacionando esse aprendizado com o
seguir, sugeridos por nós, na condição de pesqui-
contexto em que vive (Aubert et al., 2016).
sadoras. Também é informado o local de lotação do
6. Solidariedade: tem como base deixar os
colaborador da pesquisa. Já o participante lotado
âmbitos dialógicos de aprendizagem aber-
tos à participação de todas as pessoas. em Cuiabá é identificado, ao longo deste estudo,
pelo cargo que exerce: gerente de capacitação.
Para Aubert et al. (2016, p. 184), “[...] todo
projeto educacional que tem a intenção Quadro 1 – Os participantes da pesquisa do Câmpus
de ser igualitário deve se basear na so- Universitário de Rondonópolis (CUR)
lidariedade”. Ressaltam, também, que
não existe ensino solidário se as pessoas Nome fictício Local de lotação
envolvidas não são solidárias.
Instituto de Ciências
7. Igualdade de diferenças: este prin- Murilo
Humanas e Sociais – ICHS
cípio defende o direito de todos de
aprender tudo aquilo que se deseja e Instituto de Ciências Agrárias
Marcos
se necessita. E, por outro lado, implica e Tecnológicas – ICAT
em rejeitar o etnocentrismo que não Instituto de Ciências Exatas e
respeita as diferenças e o relativismo Madalena
Naturais – ICEN
que nega a equidade (Flecha, 1997). Este
Maria Pró-Reitoria
princípio busca, por conseguinte, garantir
a diversidade cultural, o direito de todos Morgana Biblioteca
e todas de poderem viver e pensar de
Fonte: Elaborado pelas pesquisadoras a partir de
maneira diferente.
dados fornecidos pelos participantes da pesquisa.
Análise dos dados: o que revelam e o Os dados coletados foram analisados de forma
que desejam os TAEs qualitativa. O primeiro entrevistado foi o gerente
Nesta seção, analisamos os dados oriundos da de capacitação, que é um servidor técnico-ad-
entrevista comunicativa. Os participantes lotados ministrativo em educação lotado em Cuiabá,
no Câmpus de Rondonópolis foram selecionados onde ocupa o cargo de administrador. Com este
por meio de sorteio, por local de lotação, e o participante foram analisados os seguintes eixos:
participante lotado em Cuiabá, MT, foi escolhido o diálogo e a percepção geral sobre os cursos
devido ao cargo que ocupa (Gerente de Capa- de capacitação ofertados pela UFMT.
citação e Avaliação de Desempenho da UFMT). Nas entrevistas com os servidores técnico-ad-
Vale ressaltar que os dados desta pesquisa ministrativos em educação, lotados no Câmpus
foram colhidos no final do ano de 2016 e início de de Rondonópolis, foram analisados os seguintes
2017. Desse modo, todas as análises feitas se dão eixos: carga horária; temática e material didático;
a partir dessas informações, não considerando plataforma EAD; método de ensino e forma de
as mudanças ocorridas a partir do ano de 2017. avaliação; relação entre tutor-aluno e aluno-aluno;
As entrevistas ocorreram no horário e local de motivação para participar dos cursos; percepção
trabalho dos participantes, no mês de outubro geral sobre os cursos de capacitação ofertados
de 2016. Uma vez concluídos a transcrição e o pela UFMT. Ressaltamos que com a permissão dos
resumo das entrevistas em profundidade, os participantes, todos os encontros foram gravados.
participantes tiveram acesso a esses documentos Após a análise das entrevistas, passamos a
para que os revisassem e fizessem as alterações discutir as dimensões exclusoras e as dimensões
que julgassem necessárias. transformadoras, de acordo com os componentes
Natalia Araujo Souza Neves • Eglen Sílvia Pipi Rodrigues
Educação corporativa no serviço público: um estudo de caso com enfoque na aprendizagem dialógica 7/13
mesmo modo, cumprir com a legislação vigente, Com relação à carga horária dos cursos, em ge-
que determina que a área de gestão de pessoas ral, os participantes acham que estão adequadas,
deve promover a gestão por competência, não exceto o participante Marcos, que acha que pode-
sendo, assim, algo facultativo à organização. ria, dependendo do curso, ser reduzida, para que
Podemos concluir, então, que apesar de al- não se torne cansativo. Para ele, “Às vezes, você
gumas barreiras enfrentadas no Programa de tem um curso que fica muito maçante pela carga
Capacitação, conforme cita o gerente, existem horária muito extensa, então às vezes, dependen-
bem mais pontos com grande potencial para se- do do curso, dava para reduzir um pouquinho a
rem melhorados e transformados e que poderão carga horária e deixar ele um pouco mais prático”
alavancar a educação continuada dos servidores. (Marcos, comunicação pessoal, 21 out. 2016).
Um desses pontos é uma maior proximidade com Nesse sentido, assim como Rodrigues (2012,
os servidores e as chefias para identificar mais de p. 138), entendemos que “o tempo é um fator im-
perto as necessidades de capacitação, alinhando, portante no planejamento. As atividades devem
dessa maneira, o desenvolvimento das compe- ser sempre planejadas considerando um horário
tências pessoais com os objetivos da instituição. de início e de término. É muito importante que a
duração exata seja preestabelecida e divulgada”.
Entrevista comunicativa em Com relação ao material didático dos cursos,
profundidade com TAEs DA UFMT/CUR os participantes avaliaram que esses materiais
são satisfatórios, exceto Madalena e Morgana,
Depois da entrevista com o gerente de ca-
que afirmaram, respectivamente:
pacitação, demos início às entrevistas com os
participantes lotados em Rondonópolis, nos dias Teve um que era sobre ética, uma coisa bem
20 e 21 de outubro de 2016, solicitando que, teórica. (...) Acaba não sendo muito interativo,
do que se fosse um vídeo (...) Mas atende os
primeiramente, falassem sobre suas trajetórias objetivos, em questão de trazer o que você
profissionais e acadêmicas, a fim de conhecer precisa saber sobre o tema. (Madalena, co-
municação pessoal, 20 out. 2016)
mais adequadamente os participantes. Em sínte-
se, obtivemos as seguintes informações, expostas
Acho fraco, pois geralmente são cópias de
no Quadro 2, em que organizamos os dados na
livros e/ou das legislações. (Morgana, comuni-
sequência das entrevistas realizadas.
cação pessoal, 21 out. 2016)
Quadro 2 – Perfil dos participantes da pesquisa
lotados em Rondonópolis De acordo com Rodrigues (2012, p. 151) “in-
dependentemente do tipo de suporte ou da
Nível do cargo
Participante Escolaridade tecnologia utilizada, os materiais de apoio devem
ocupado
criar um diálogo com o aprendiz, orientando a
Madalena Superior Superior aprendizagem e possibilitando a análise, a con-
Murilo Superior Médio sulta, a dinamização dos conteúdos e a reflexão”.
Sobre a temática, todos os participantes re-
Maria Superior Médio
latam que deveriam ser propostos mais temas
Marcos Superior Médio
específicos para cada área de atuação. Morgana
Morgana Superior Superior disse que até o momento não houve nenhum
Fonte: Elaborado pelas pesquisadoras a partir das curso voltado para a sua área de atuação, que
entrevistas com os participantes. é a biblioteca (Morgana, comunicação pessoal,
21 out. 2016). O participante Marcos assinalou:
A seguir, analisamos os eixos da pesquisa
A cada ano, quando você faz a avaliação de
definidos para a entrevista com os servidores desempenho, você solicita o curso que você
TAEs da UFMT/CUR. gostaria de fazer, porém não funciona. Eles es-
peram uma quantidade X de repercussões para
Natalia Araujo Souza Neves • Eglen Sílvia Pipi Rodrigues
Educação corporativa no serviço público: um estudo de caso com enfoque na aprendizagem dialógica 9/13
poder montar um curso (...). Então, eu acho que autora afirma, ainda, que o Moodle é um ambiente
ao invés deles perguntarem “O que nós quere-
mos”, eles poderiam dar uma lista de cursos que virtual de aprendizagem que tem sido bastante
seriam ofertados e aí nós escolhemos dentre adotado pelas instituições ultimamente.
essa oferta qual o que melhor se enquadraria.
(Marcos, comunicação pessoal, 21 out. 2016) Sobre o método de ensino dos cursos, a maio-
ria dos participantes optou por não expressar sua
Para Moraes e Eboli (2012, p. 276) é neces- opinião. Marcos disse apenas que “o método de
sário, inicialmente, realizar um diagnóstico das ensino vai muito de acordo com cada instrutor”
competências críticas organizacionais, “que, em (Marcos, comunicação pessoal, 21 out. 2016).
síntese, são aquilo que a empresa sabe fazer de Rodrigues (2012) aponta que,
melhor, e/o deveria saber”. Esses autores falam
Em Educação Corporativa, a metodologia deve
da importância de definir os principais atributos ser baseada na análise de experiências e de
de competência da instituição dentro de cada situações de vida, e não simplesmente em
assuntos teóricos. As técnicas que utilizam a
eixo definido e, em seguida, identificar o público experiência dos aprendizes, como os trabalhos
que está relacionado com eles. em grupo, os exercícios de simulação, as ativi-
dades de resolução de problemas e os estudos
É fundamental, também, que o professor utilize de caso, são mais eficazes do que as técnicas
os conteúdos da matéria para ajudar os alunos de transmissão. (Rodrigues, 2012, p. 140)
o aluno deve perceber qual será a utilidade do Oprimido, em que traz o termo e o significado da
aprendizado na sua vida pessoal e/ou profissional. percepção bancária da educação, que é, para esse
Destarte, apesar das divergências de opiniões autor, um instrumento de opressão, pois “a educação
entre os participantes sobre o formato das ava- se torna um ato de depositar, em que os estudantes
liações, chegamos ao entendimento que, inde- são os depositários e o educador, o depositante”,
pendentemente do formato, as avaliações devem afirmando, ainda, que “em lugar de comunicar-se,
estar relacionadas com a realidade do servidor, o educador faz ‘comunicados’ e depósitos que os
trazendo questões práticas do seu dia a dia. educandos, meras incidências, recebem paciente-
No que concerne à relação entre tutor-aluno e mente, memorizam e repetem. Eis aí a percepção
aluno-aluno, é essencial existir uma boa relação ‘bancária’ da educação” (Freire, 2015a, p. 80).
entre todos os envolvidos no processo de apren- Conforme Rodrigues (2012), essas são algumas
dizagem, para que essa dinâmica aconteça da funções que um instrutor deve desempenhar:
melhor forma possível. Conforme Freire (2015a, p.
mediar à troca de informações e saberes; (...);
109) “o diálogo é uma exigência existencial”, pois dinamizar as relações aluno-aluno e aluno-ma-
a dialogicidade deve começar antes mesmo de o terial didático para garantir a aprendizagem
e o fluxo comunicacional; (...); incentivar os
educador-educando se encontrar “com os edu- aprendizes a compartilhar problemas, soluções
cando-educadores em uma situação pedagógica, e aprendizagens; identificar as dificuldades e
necessidades dos aprendizes (...); valorizar os
mas antes, quando aquele se pergunta em torno conhecimentos prévios que cada aprendiz traz
do que vai dialogar com estes” (Freire, 2015a, p. 115). consigo; promover a interatividade, a troca
entre os aprendizes. (Rodrigues, 2012, p. 130)
Sobre as relações tutor-aluno e aluno-aluno,
os participantes refletiram:
Nessa perspectiva, entendemos que cada
servidor técnico-administrativo tem muito a cola-
Eu acho que teria que haver o diálogo des-
borar nos cursos de capacitação, pois eles trazem
de a parte de propor e realizar um novo curso.
consigo uma grande bagagem de experiências
(Madalena, comunicação pessoal, 20 out. 2016)
pessoais, profissionais e acadêmicas que pre-
(...) como em geral são poucos tutores (...) cisam ser valorizadas e compartilhadas com os
você não consegue ter um diálogo. Mas eles
demais, para que as aulas sejam mais dinâmicas,
sempre estão disponíveis, você consegue se
comunicar via plataforma, via e-mail, eles se interessantes e ricas em aprendizagem.
colocam sempre bastante acessíveis. A maior
Com relação à motivação para participar dos
parte deles pelo menos. (Murilo, comunicação
pessoal, 20 out. 2016) cursos de capacitação, os participantes são unâ-
nimes ao dizer que um dos motivos que os levam
(...) já fiz curso que o professor foi lá na plata-
forma e respondeu tudo certinho e teve outros a fazer os cursos de capacitação é a progressão
que o professor não respondia de forma algu- na carreira, além da obtenção de aprimoramento
ma. (Maria, comunicação pessoal, 20 out. 2016)
pessoal e profissional. O que os participantes fa-
Os cursos mais técnicos, eles pecam um pouco zem questão de deixar claro é que se os cursos
na dialógica, nessa interação e depende muito fossem mais específicos, eles os fariam inde-
também do instrutor. A gente ainda tem, infeliz-
mente, alguns instrutores (...) que ainda trazem pendentemente da progressão. Murilo (2016) e
(...) aquela formação bancária (...) Acho que essa Marcos (2016) declararam:
formação mais dialógica ela pode ser melho-
rada dentro da universidade como um todo.
(Marcos, comunicação pessoal, 21 out. 2016) Os cursos de capacitação acabam sendo opor-
tunidade de conhecimento, de aprendizagem,
embora nem sempre eles venham de encontro
Nos cursos virtuais não existe diálogo. Nos àquilo que a necessidade real do nosso dia a dia.
fóruns a gente fica com vergonha de digitar. Eles acabam contribuindo de alguma forma, pois
(Morgana, comunicação pessoal, 21 out. 2016) todo conhecimento é válido, além do que eles
são peças-chave na progressão dos servidores.
(Murilo, comunicação pessoal, 20 out. 2016)
O pensamento de Marcos converge com o ex-
posto por Freire (2015a), na sua obra Pedagogia do
Natalia Araujo Souza Neves • Eglen Sílvia Pipi Rodrigues
Educação corporativa no serviço público: um estudo de caso com enfoque na aprendizagem dialógica 11/13
(...) Eu acredito que se esses cursos passassem soluções de aprendizagem devem ser centradas
a ser um pouco mais específicos a gente faria
independente da progressão, a gente faria pelo em aprendizagens significativas e garantir o es-
conhecimento, pela formação profissional em treito vínculo entre o conhecimento e a realidade
si. (Marcos, comunicação pessoal, 21 out. 2016)
de trabalho do empregado”.
Importante dizer que, conforme Goulart e Pes-
As falas dos participantes confirmam aquilo
soa (2004), a conscientização dos gestores e dos
que enfatiza Rodrigues (2012, p. 126), isto é, que
instrutores de aprendizagem é o passo principal
“o adulto se motiva a aprender a partir de sua
para propagar, na instituição, uma cultura de que
vivência, de suas necessidades e de seu interesse.
a capacitação é essencial para a sobrevivência
A aprendizagem de adultos deve ser significativa,
da organização.
ou seja, deve ter significado para cada indivíduo”.
Nesta perspectiva, depreendemos que a maior
Compreendemos, assim, que a progressão
demanda está em relação à temática dos cur-
funcional é uma grande motivação para que
sos, pois os cursos de capacitação deveriam ser
os TAEs participem dos cursos de capacitação.
direcionados à área específica do servidor, a fim
Outra grande motivação é quando estes cursos
de ajudá-lo a solucionar as dificuldades do dia
são diretamente ligados à área de atuação do
a dia. Além disso, a UFMT deveria ofertar mais
servidor, tornando-se mais interessantes ao ser-
cursos e atender aos pedidos de cursos que os
vidor, representando a oportunidade de ampliar
servidores fazem, anualmente, na avaliação de
os conhecimentos de sua própria área.
desempenho. É importante também oferecer
No que tange à percepção geral sobre os
cursos presenciais, pois alguns tipos de cursos
cursos de capacitação ofertados pela UFMT,
pecam por serem a distância, e mesmo estes,
cada um dos participantes assim se manifestou
poderiam contar com atividades que possibilitas-
sobre este eixo da pesquisa:
sem uma maior interação entre alunos e instrutor.
por mais que o curso seja interativo, eu
acho que peca um pouco por ser à distância
Dimensões exclusoras e dimensões
(Madalena, comunicação pessoal, 20 out. 2016)
transformadoras
Eles são interessantes, já que é uma proposta Com base nas falas dos participantes desta
de aperfeiçoamento do pessoal, mas eu vejo
que muitas vezes (...) a gente não consegue pesquisa, temos como dimensões exclusoras: a
definir, ter muito clara essa relação com aquilo carga horária extensa; o material didático muito
que a gente precisa no dia a dia. (Murilo, co-
municação pessoal, 20 out. 2016) teórico; o não atendimento aos cursos solicita-
dos pelos TAEs; o fato de serem oferecidos, de
Eu acredito que a oferta é pouca. (...) a gente forma recorrente, os mesmos cursos; cursos com
solicita uma coisa e vem outra (...) esse ano
vieram os mesmos cursos de sempre (...) eu temáticas muito amplas, que não ajudam muito
acho que poderia ter uma diversidade maior. na rotina de trabalho do servidor; poucas vagas,
(Maria, comunicação pessoal, 20 out. 2016)
mesmo nos cursos a distância; as avaliações
Eu vejo muitas falhas ainda nesses cursos. (...) não são baseadas em exemplos práticos do
oferta deles é pequena (...) Você tem um curso
cotidiano; pouco ou nenhum diálogo nos cursos
muito amplo e que muitas vezes não agrega
nada para você no seu dia a dia. (Marcos, co- ofertados, principalmente nos cursos a distância,
municação pessoal, 21 out. 2016)
não apenas durante o curso, mas também em
servidores enfrentam diariamente na sua área Comunidade de Aprendizagem. [ca. 2010]. Apren-
dizagem dialógica. https://www.comunidadedea-
de atuação. É preciso disponibilizar novos cursos prendizagem.com/uploads/materials/3/bbea4bd-
que contemplem as temáticas demandadas pelos 3004329144308d8efcc1c8061.pdf
servidores, assim como aprimorar o material e as Braga, F. M., Gabassa, V., Mello, R. R. (2010). Apren-
avaliações, focando em exemplos e questões dizagem dialógica: ações e reflexões de uma prática
educativa de êxito para todos(as). EdUFSCar.
práticas da atividade profissional. É importante
buscar outros métodos de ensino principalmente Braga, F. M., Gabassa, V., Mello, R. R. (2012). Comunidades
de Aprendizagem: outra escola é possível. EdUFSCar.
nos cursos a distância, para tornar a aprendizagem
Brasil (2006). Decreto n.º 5.707, de 23 de fevereiro
mais atrativa, mais voltada para o diálogo e para de 2006. Institui a Política e as Diretrizes para o De-
o compartilhamento de experiências e saberes. senvolvimento de Pessoal da administração pública
federal direta, autárquica e fundacional, e regulamenta
dispositivos da Lei n.º 8.112, de 11 de dezembro de
Considerações finais 1990. (2006). Diário Oficial da União. Casa Civil. http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/
Nesta pesquisa, analisamos a percepção dos Decreto/D5707.htm
TAEs sobre os cursos de capacitação ofertados Flecha, R. (1997) Compartiendo palavras: el aprendizaje
pela UFMT e, através das entrevistas em profundi- de las personas adultas a traves del diálogo. Paidós.
dade, foi possível alcançar o entendimento acerca Franco, M. C. (2016). Gestão democrática participativa
dos objetivos que nos propomos pesquisar. em comunidades de aprendizagem: a perspectiva de
profissionais de uma escola pública da rede estadual de
Com esta pesquisa, percebemos que a apren- ensino em Rondonópolis – MT. [Dissertação Mestrado,
dizagem dialógica pode ser uma forma de mi- Universidade Federal de Mato Grosso]
nimizar as dificuldades enfrentadas também na Freire, P. (2013). À sombra desta mangueira (11. ed.).
Paz e Terra.
educação corporativa, pois a aprendizagem dia-
lógica prima por uma aprendizagem que procura, Freire, P. (2015a). Pedagogia do oprimido (59. ed., rev.
e atual.). Paz e Terra.
dentre outros aspectos: o diálogo igualitário entre
os sujeitos; a transformação das relações entre Freire, P. (2015b). Pedagogia da autonomia: saberes
necessários à prática educativa (52. ed.). Paz e Terra.
as pessoas por meio do diálogo; a construção de
espaços de convivência compartilhada e dialoga- Gómez, J. et al. (2006). Metodología comunicativa crí-
tica. El Roure.
da através da interação social e a aprendizagem
Goulart, S., Pessoa, E. (2004). Educação corporativa como
para todas as pessoas, orientando-as para uma base da estratégia organizacional. Caso Leader Magazine.
vida melhor através das mudanças sociais. In Mundim, A. P., Ricardo, E. J (Orgs.), Educação Corpo-
rativa: fundamentos e práticas (pp. 58-71). Qualitimark.
Por fim, ressaltamos que esta pesquisa não tem
o intuito de generalizar as concepções que todos Habermas, J. (2012a). Teoria do agir comunicativo: ra-
cionalidade da ação e racionalização social (v. 1). WMF
os servidores técnicos do Câmpus de Rondonó- Martins Fontes.
polis têm sobre os programas de capacitação da
Habermas, J. (2012b). Teoria do agir comunicativo: sobre a
UFMT. Nem também almejamos com essa pesqui- crítica da razão funcionalista (v. 2). WMF Martins Fontes.
sa esgotar os estudos acerca desta temática, pelo
Libâneo, J. C. (2001). O essencial da didática e o trabalho
contrário, sugerimos, para investigações futuras, de professor – em busca de novos caminhos, nov. 2001.
http://limaribeiro.net/File/Content/Document/pt-br/
a construção de uma proposta de transformação
didatica-do-ensino-superior-o-essencial-da-didatica.pdf
para o programa de capacitação da UFMT/CUR.
Marques, R. (2000). Dicionário breve de Pedagogia (2.
ed. rev. e aum.). Presença.
Referências Mello, R. R. (2006). Metodologia de investigação comu-
nicativa: contribuições para a pesquisa educacional na
Aubert, A, Flecha, A., García, C., Racionero, S. (2016). construção de uma escola com e para todas e todos.
Aprendizagem dialógica na sociedade da informação. Anais da 29ª Reunião Anual da Associação Nacional de
EdUFSCar. Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, Caxambu, MG,
Brasil, 1, 1-17. https://anped.org.br/biblioteca/item/
Amaral, H. K. (2006). Desenvolvimento de competências
metodologia-de-investigacao-comunicativa-contri-
de servidores na administração pública brasileira. Re-
buicoes-para-pesquisa-educacional-0
vista do Serviço Público, 57(4), 549-563. https://revista.
enap.gov.br/index.php/RSP/article/view/211/216
Natalia Araujo Souza Neves • Eglen Sílvia Pipi Rodrigues
Educação corporativa no serviço público: um estudo de caso com enfoque na aprendizagem dialógica 13/13
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Coordenadora do Grupo de Estudos em Aprendizagem
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Endereço para correspondência
Natália Araujo Souza Neves/ Eglen Sílvia Pipi Rodrigues
Silva, M. C., Gasparin, J. L. (2006). A teoria da ação
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na educação escolar. UNICAMP. (v. 1). https://livrozilla.
com/doc/1499231/vii-semin%C3%A1rio-nacional-de- Avenida dos Estudantes, 5055, bloco administrativo,
-estudos-e-pesquisas sala 1
Cidade Universitária, 78736-900
Universidade federal de Mato Grosso. (2016a). A UFMT.
http://www.ufmt.br/ufmt/site/secao/index/Cuiaba/812. Rondonópolis, MT, Brasil