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Prof Jairo Ivo dos Santos – Disciplina de Micologia Clínica – ACL5137

DERMATOFITOSES (TINHAS)
DEFINIÇÃO

São micoses cutâneas causadas por fungos filamentosos hialinos, chamados de dermatófitos. Os
dermatófitos são fungos queratinofílicos pois, estão adaptados em causar infecções nos tecidos cutâneos
queratinizados, como a pele, e seus anexos, como pelos, cabelos e unhas. Esses fungos produzem uma
enzima proteolítica chamada de queratinase. A queratinase é capaz de hidrolisar a queratina, que é a
principal proteína fibrosa da camada córnea da pele.

Os dermatófitos compreendem três gêneros: Epidermophyton, Microsporum e Trichophyton.

As principais espécies causadoras de dermatofitoses são:

1. Gênero Epidermophyton: Epidermophyton floccosum;

2. Gênero Microsporum: Microsporum canis, Microsporum gypseum, Microsporum nana e Microsporum


audouinii. Recentemente, o Microsporum gypseum e Microsporum nanum, foram renomeados por alguns
autores, como Nannizzia gypsea e Nannizzia nana.

3. Gênero Trichophyton: Trichophyton rubrum, Trichophyton mentagrophytes (variedades interdigitale e


mentagrophytes), Trichophyton tonsurans, Trichophyton verrucosum, Trichophyton megninii e
Trichophyton schoenleinii. Atualmente, as variedades interdigitale e mentagrophytes, do Trichophyton
mentagrophytes são consideradas duas espécies distintas: Trichophyton interdigitale (antropofílico) e
Trichophyton mentagrophytes (zoofílico).

ECOLOGIA E TRANSMISSÃO

De acordo com a sua ecologia e modo de transmissão, os dermatófitos podem ser agrupados em três
grupos:

1. Antropofílicos: são representados por espécies que estão adaptadas ao ser humano. Elas compreendem o
maior número de espécies, e as mais importantes são: Epidermophyton floccosum, Microsporum audouinii,
Trichophyton rubrum, Trichophyton tonsurans, Trichophyton schoenleinii e Trichophyton mentagrophytes
da variedade interdigitale e que hoje é conhecida apenas como Trichophyton interdigitale. As espécies
antropofílicas são transmitidas por contato inter-humano, ou por fômites, como roupas, calçados bonés, etc
(Figura 1);

2. Zoofílicos: compreendem as espécies adaptadas aos animais como Microsporum canis (gato e cão),
Trichophyton mentagrophytes variedade mentagrophytes e que hoje é conhecida como Trichophyton
mentagrophytes (várias espécies de animais) Microsporum nanum (suínos) e Trichophyton verrucosum
(bovinos). A transmissão se faz por contato com animais infectados (Figura 1);
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3. Geofílicos: compreendem aquelas espécies encontradas no solo. A principal espécie deste grupo é o
Microsporum gypseum. A transmissão se faz por contato com o solo contaminado (Figura1).

Figura 1. Aspectos ecológicos dos dermatófitos.

A transmissão dos dermatófitos faz-se pelo contato do hospedeiro com pessoas e animais infectados, solo
contaminado e fômites como roupas, toalhas, calçados, e instrumentos de manicure e pedicure (Figura 2).
A transmissão é favorecida por pequenas escoriações, e traumas na pele e nas unhas. Outros fatores
predisponentes para as dermatofitoses são a umidade, calor e maceração.

Figura 2. Formas de transmissão das dermatofitoses.

PATOLOGIA NAS DERMATOFITOSES

Numa infecção por dermatófitos, observa-se o desenvolvimento de uma resposta inflamatória (eczema), de
intensidade variável, no local da infecção. Os principais sinais clínicos observados são eritema,
descamação e alopecia. Na pele, a lesão se desenvolve do centro para a periferia, ocasionando a clássica
forma de anel (Figura 3).

Figura 2. Lesão em forma de anel.


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Os pelos e cabelos acometidos ficam enfraquecidos com a invasão fúngica e, não raro, quebram e caem. As
unhas apresentam-se com a coloração alterada, espessas, e com depósito de material queratinizado,
embaixo da lâmina ungueal.

PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

As diversas formas de dermatofitoses podem ser nomeadas com a palavra latina Tinea mais o local
anatômico em latim:

1. Tinea capitis: quando o couro cabeludo é acometido.

As espécies mais associadas a esta forma clínica são o Microsporum canis e o Trichophyton tonsurans. De
modo geral, estas formas são chamadas de tinhas tonsurantes, porque há quebra dos pelos no local da
infecção (Figura 3). Elas geralmente respondem bem a terapêutica, e os pelos voltam então a crescer, após
o tratamento.

Figura 3. Aspectos clínicos de formas de tinhas tonsurantes de tinea capitis.

Um tipo de tinea capitis menos comum é o quérion. Ele resulta de um processo inflamatório mais
intenso no couro cabeludo, com formação de linfadenopatia, em resposta a invasão fúngica.
Geralmente está associado a infecções por espécies menos adaptadas ao ser humano, como as
espécies zoofílicas e geofílicas (Figura 4).

Figura 4 . Aspecto clínico do quérion.


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A tinha fávica ou favo é um tipo de tinea capitis, causada pelo Trichophyton schoenleinii. Na lesão,
observa-se a formação de escútulas, que são crostas constituídas por líquido seroso, células
descamativas e elementos fúngicos. Esta forma clínica pode levar a alopecia permanente, por causa
da formação de uma foliculite do tipo cicatricial, no local da lesão (Figura 5).

Figura 5. Tinha fávica ou favo.

2. Tinea pedis: pé e espaços interdigitais. Nesta forma, os pés são acometidos, podendo haver lesões secas
ou com formação de vesículas (Figura 6).

Figura 6. Tinea pedis.


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3. Tinea unguium: unha da mão ou do pé. As espécies mais frequentemente envolvidas são o Trichophyton
rubrum e o Trichophyton interdigitale. As onicomicoses por dermatófitos (ou tinea unguium) podem ser
de quatro tipos:

3.1. Onicomicose subungueal distal ou lateral. É uma lesão que acomete a região abaixo da lâmina ungueal,
e inicia-se na região distal ou lateral da unha. Compreende mais que 95% dos casos de tinea unguium
(Figura 7).

Figura 7. Onicomicose do tipo subungueal distal ou lateral.

3.2. Onicomicose subungueal proximal. A lesão inicia-se na região proximal da unha junto à raiz da unha
(Figura 8). É rara e acomete pacientes imunodeprimidos, como pacientes com Aids, ou em uso contínuo de
corticoides. É causada pelo Trichophyton rubrum.

Figura 8. Onicomicose subungueal proximal.

3.3. Onicomicose superficial branca. Também é pouco comum. Acomete a superfície da lâmina ungueal. É
observada em infecções por Trichophyton interdigitale e por espécies de Fusarium (fungo filamentoso
hialino não-dermatófito) (Figura 9).
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Figura 9. Onicomicose superficial branca.

3.4. Onicomicose distrófica total: Resulta da progressão dos tipos anteriores de onicomicose (Figura 10).

Figura 10. Onicomicose distrófica total.

4. Tinea corporis: acomete a região de pele glabra do corpo (Figura 11).

Figura 11. Tinea corporis.

5. Tinea cruris: quando acomete a virilha e nádegas (Figura 12).

Figura 12. Tinea cruris.


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6. Tinea barbae/Tinea faciei: assim chamada quando acomete o rosto (com ou sem barba e bigode) ou face
(Figura 13).

Figura 13. Tinea faciei/Tinea faciei.

7. Tinea manuum: quando a mão é acometida (Figura 14).

Figura 14. Tinea manuum.

8. Tinea imbricata. É uma forma clínica de dermatofitose, que ocorre em populações indígenas das regiões
equatoriais, que expressam um antígeno recessivo, que as tornam susceptíveis a esta forma clínica.
Apresenta-se como lesão anelar, concêntrica, na parte glabra da pele, e é causada pela espécie
Trichophyton concentricum (Figura 15).

Figura 15. Tinea imbricata.


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Também, pode haver reações imunológicas do tipo imediato, aos antígenos dos dermatófitos, que se
apresentam na forma de eczemas. Essas reações são conhecidas como dermatofítides ou mícides, que
desaparecem quando o paciente é tratado com antifúngicos.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

As dermatofitoses devem ser diferenciadas de várias outras afecções parecidas da pele, pelos, cabelos e
unhas (Figura 16).

Figura 16. Afecções cutâneas que podem confundir com dermatofitoses.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

Os materiais biológicos devem ser obtidos por raspagem, no caso de pele e unhas. Os pelos devem
coletados com pinça depilatória por tração, para se obter a amostra com a raiz.

Devem ser preparadas lâminas para exame micológico direto. Neste caso, o material deve ser
previamente clarificado com KOH, para que possa ser examinado ao microscópio. Ao exame
microscópio de material de pele e unhas, são observadas hifas hialinas septadas e artroconídios
(Figura 17).

Figura 17. Hifas hialinas e artroconídios de dermatófitos na lesão.


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Nos pelos infectados, podem ser observados artroconídios arredondados, de tamanho variável, no
interior dos pelos (Endothrix), ou na superfície dos pelos (Ectothrix) (Figura 18).

Figura 18. Infecção de pelo do tipo Endothrix e Ectothrix.

O exame micológico direto não permite reconhecer as espécies de dermatófitos presentes. Para a
sua identificação taxonômica, é necessário cultivá-los em ágar Sabouraud, com ou sem inibidores
(cloranfenicol e cicloheximida). Ao serem cultivados a 25 ºC, os dermatófitos crescem num período
de duas a três semanas. Para a sua identificação, é feita análise macro e micromorfológica de suas
colônias (Figura 19).

Figura 19. Exemplos de macro e micromorfologia de colônias de dermatófitos.

Às vezes, é necessário realizar alguns testes adicionais ou complementares, para que se possa
identificar algumas espécies, com maior segurança.

O teste da urease é realizado no meio de Christensen, e serve para verificar se o isolado é produtor
ou não de urease. A urease, presente no fungo, vai hidrolisar a ureia do meio, dando como produtos
de degradação a amônia, a qual vai alcalinizar o meio, fazendo com que haja viragem da cor do
indicador vermelho fenol (Figura 20).
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Figura 20. Resultado do teste de urease.

O teste deve ser lido num período de até cinco dias. O teste da urease diferencia Trichophyton
mentagrophytes e Trichophyton interdigitale, que dão reação positiva, do Trichophyton rubrum,
que dá reação negativa.

O teste de perfuração de pelos in vitro é utilizado para diferenciar Trichophyton mentagrophytes e


Trichophyton interdigitale, que dão reação positiva, do Trichophyton rubrum, que dá reação
negativa. Fragmentos de cabelo humano, de aproximadamente 1 cm, são colocados em uma placa
de Petri, e esterilizados por autoclavação. É então adicionado 20 ml de água destilada estéril,
contendo algumas gotas de extrato de levedura (produto comercial) estéril a 10%. Vários
fragmentos de colônias são colocados por cima dos pelos, dentro da placa estéril. O material é
incubado a temperatura ambiente, no escuro. Os pelos são examinados no microscópio, entre lâmina
e lamínula com uma gota de lacto-fenol azul algodão, semanalmente, para observar a ocorrência de
reação positiva (exemplo Figura 21).

Figura 21. Teste de perfuração de pelo in vitro.


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O teste do crescimento em arroz é realizado em grãos de arroz, previamente cozidos e esterilizados.


Ele permite diferenciar Microsporum canis (espécie zoofílica), no qual ocorre crescimento, de
Microsporum audouinii (antropofílico), no qual não há crescimento (Figura 22).

Figura 22. Teste de crescimento em arroz, para diferenciar M. canis e M. audouinii.

As provas nutricionais, usadas para diferenciar algumas espécies de Trichophyton, utilizam o meio
para Trichophyton. É um meio comercial, conhecido como “Trichophyton agars”, que contém sete
tubos, de composição distinta, numerados de 1 a 7. Esses meios têm a seguinte composição:

T1: ácido casamínico


T2: ácido casamínico + inositol
T3: ácido casamínico + inositol + tiamina
T4: ácido casamínico + tiamina
T5: ácido casamínico + ácido nicotínico
T6: nitrato de amônio
T7: nitrato de amônio + histidina.
Eles são usados para auxiliar na identificação de algumas espécies de Trichophyton, baseado em
suas necessidades nutricionais. Assim, utiliza-se o meio definido, contendo o meio-base e diferentes
nutrientes (fatores de crescimento), em cada um dos sete tubos. As espécies identificadas nesse
meio, geralmente são aquelas que apresentam uma prevalência mais baixa, exceto o Trichophyton
tonsurans (Figura 23).

Figura 23. Meio nutricional para Trichophyton.


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TRATAMENTO

Várias classes de antifúngicos podem ser utilizadas no tratamento das dermatofitoses:

1. A griseofulvina é usada por via oral principalmente para tratar de Tinea capitis;

2. Os derivados azólicos: como o miconazol, clotrimazol, isoconazol, tioconazol, são usados


topicamente. O cetoconazol, fluconazol e itraconazol são usados topicamente ou por via oral;

3. As alilaminas, como a terbinafina, são usadas oralmente e topicamente;

4. As morfolinas, como amorolfina, são usadas topicamente.

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