Você está na página 1de 23

EXCELENTÍSSIMO JUÍZO DE DIREITO DO ____ JUIZADO ESPECIAL

(VARA) DA FAZENDA PÚBLICA DE SÃO PAULO/SP

Tutela de Urgência
Prioridade de tramitação

MARIA EDUARDA SOUZA, (qualificação), por sua procuradora que esta


subscreve (vide procuração anexa), com base no art. 5º, §1º 1, art. 6º2 e 1963 da
CF/88, art. 6º, “d” da lei 8080/904 e outros, vem, respeitosamente à presença de
Vossa Exª, propor:

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C TUTELA ANTECIPADA

em face do ESTADO DE SÃO PAULO, com endereço funcional para citação na


Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, situada na Rua Pamplona, 227 - 17º
andar - Bela Vista – São Paulo/SP, CEP 01405-902, CNPJ: 46.379.400/0001-50,
pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.

1. DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA
1
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:

2
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
Constituição.

3
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação.

4
Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):
I - a execução de ações:
[...]
d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;
A autora é estudante e a sua situação econômica bem como a de sua família
não lhe permitem arcar com as custas processuais e honorários advocatícios sem
que isso implique em prejuízo ao seu sustento e de seus familiares (conforme
declaração em anexo e documentos que comprovam sua ausência de renda e a
renda dos seus pais), razão pela qual, requer-se a este Juízo que seja deferido o
benefício da gratuidade da justiça, nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV da
CF/885, bem como com fulcro no art. 986 e seguintes do CPC/15 e ainda o disposto
na Lei 1.060/50.

2 - TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA

A doença neuromuscular grave e crônica que acomete a autora, caracteriza-


se por fadiga rápida e severa dos músculos voluntários e iniciou-se já em sua
forma grave acarretando: problemas de respiração e para engolir e dificuldades de
locomoção em decorrência da fraqueza muscular. Assim, fundamentados em sua
deficiência física e no relatório médico que instrui esta exordial e ainda nos termos
do art. 1048, I e §§ 1º e seguintes do Código de Processo Civil 7 c/c art. 9º, VII8 da
Lei13.146/15 (Lei Brasileira de Inclusão), requer que lhe seja concedida o
benefício de TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA conferido à pessoa com
deficiência.

3 - DOS FATOS

5
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
[...]
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

6
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as
despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

7
Art. 1.048. Terão prioridade de tramitação, em qualquer juízo ou tribunal, os procedimentos judiciais:
I - em que figure como parte ou interessado pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos ou portadora de
doença grave, assim compreendida qualquer das enumeradas no art. 6º, inciso XIV, da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro
de 1988 ;
§ 1º A pessoa interessada na obtenção do benefício, juntando prova de sua condição, deverá requerê-lo à autoridade
judiciária competente para decidir o feito, que determinará ao cartório do juízo as providências a serem cumpridas.

8
Art. 9º A pessoa com deficiência tem direito a receber atendimento prioritário, sobretudo com a finalidade de:
[...]
VII - tramitação processual e procedimentos judiciais e administrativos em que for parte ou interessada, em todos os
atos e diligências.
A autora, uma jovem de apenas 21 (vinte e um) anos, relata que
subitamente, em meados de agosto de 2020 começou a ter dificuldades para
engolir e para respirar.

Como nunca havia sentido nada parecido e por conta da dificuldade de


respirar, num primeiro momento imaginou que podia tratar-se de covid-19, razão
pela qual procurou um médico clínico-geral que sem o resultado de qualquer
exame comprobatório recomendou apenas que ela permanecesse em quarentena
para acompanhar o surgimento de outros sintomas. Depois de apenas 2 dias em
isolamento, ela percebeu dificuldade em abrir seu olho direito, era como se não
houvesse força suficiente para mantê-lo aberto e para piscá-lo, além disso estava
com um quadro chamado de diplopia (visão dupla).

Nesse momento procurou um oftalmologista, o qual não encontrou


nenhuma anormalidade na visão da autora, encaminhando-a urgentemente para um
neurologista.

Após passar por consulta com o neurologista e também com um


pneumologista, foram solicitados diversos exames, não sendo ainda encontrado
qualquer anormalidade que justificasse a fraqueza muscular, os problemas oculares
e a dificuldade para deglutir e respirar.

Como resultado das dificuldades de deglutir e respirar representavam


grande risco para a vida da autora, os médicos resolveram hospitalizá-la para que a
mesma recebesse auxílio para executar essas funções.

Durante os 40 dias de internação os médicos continuaram procurando um


diagnóstico e novos exames foram feitos, mas a autora só piorava, pois além de
não melhorar dos primeiros sintomas apresentados passou a ter dificuldade para
articular palavras e não tinha forças nem mesmo para mastigar, passando a
alimentar-se por sonda.

Sem perspectivas de melhoras já que não havia diagnóstico, os familiares


da autora conseguiram através de uma “vaquinha” nas redes sociais arrecadar
fundos para transferi-la para um hospital particular onde passaram a ser
acompanhados por uma neurologista especialista em doenças raras.

Já em janeiro de 2021, após a realização de exames de sangue expecíficos e


de outros exames complementares, tais como a eletroneuromiografia (exame
neurofisiológico, utilizado no diagnóstico e prognóstico de lesões no sistema
nervoso periférico), a médica-assistente conseguiu diagnosticar que a patologia da
autora trata-se de uma doença autoimune grave chamada MIASTENIA GRAVIS
(na sua forma mais agressiva).

O QUE É A MIASTENIA GRAVIS?

Como trata-se de uma doença rara e desconhecida pela grande maioria


das pessoas, para melhor entendimento, aqui cabe alguns esclarecimentos a
respeito da patologia.

A miastenia gravis é uma doença de origem autoimune 9 que ocorre por


motivos desconhecidos e é provocada por um defeito na transmissão dos impulsos
nervosos para os músculos, por conta do nosso sistema imunológico começar a
produzir anticorpos que danificam os receptores musculares que recebem os sinais
produzidos pelos nervos. É como se eles perdessem a comunicação, o cérebro
envia o impulso elétrico para o músculo mas o sinal não chega até ele.

É similar ao ocorrido em alguém que sofreu um traumatismo na coluna com


lesão medular e deixa de andar porque os sinais elétricos que saem do cérebro já
não conseguem chegar aos músculos das pernas, só que na miastenia gravis o
problema não ocorre na medula e sim no final do percurso, na parte onde as fibras
nervosas se conectam às fibras musculares10.

Segundo a Nota Técnica 26913/2021 do Núcleo de Avaliação de


Tecnologias em Saúde – NATS (utilizado em outro processo) a incidência
(número de casos novos) varia de 5-30 por milhão de habitantes e a prevalência
(número total de casos) varia de 100-200 por milhão de habitantes, com discreto
predomínio em mulheres.
As complicações clínicas mais relevantes da MG são tetraparesia 11 e
insuficiência respiratória (tal qual aconteceu com a autora). O tratamento da
doença objetiva o controle dos sintomas motores característicos, a diminuição das
exacerbações, o aumento do período em remissão e o tratamento das crises
miastênicas, infelizmente é uma doença que ainda não tem cura!

A partir do diagnóstico a autora passou finalmente ao tratamento que num


primeiro momento envolveu um procedimento emergencial chamado plasmaferese
(método onde utiliza-se uma máquina similar à usada na hemodiálise, onde é
filtrado do plasma do sangue as substâncias indesejadas que causam os sintomas),

9
Uma doença autoimune surge quando o nosso sistema imunológico começa a produzir anticorpos de forma
inapropriada, ou seja, são anticorpos que vão atacar e destruir elementos e estruturas saudáveis do nosso próprio
organismo.

10
Fonte: https://www.mdsaude.com/neurologia/miastenia-gravis/
11
É uma desordem que afeta os músculos dos membros (braços e pernas) causando fraqueza anormal dos mesmos.
o qual foi essencial para manter a sua vida e que propiciou que alguns dias depois
fosse possível lhe dar alta hospitalar.

Após o controle dessa crise que quase ceifou a vida da autora, passou-se a
fase de estabilização da doença, a qual envolveu uma combinação de diferentes
fármacos que atuam no organismo de forma distinta visando evitar novos crises.
Neste sentido, e conforme relatório médico (em anexo), a autora já fez uso
de inúmeras substâncias, tais como:

 Prednisona;
 Piridostigmina;
 Azatioprina; e
 Ciclofosfamida.

Ocorre que nenhum desses fármacos manteve estável a saúde da autora, que
já há quase 1 ano se mantém entre idas e vindas ao hospital, com sua saúde se
deteriorando a cada dia e sem conseguir estudar, trabalhar ou auxiliar sua família.

Sua esperança ressurgiu quando a médica que lhe acompanha prescreveu


um medicamento chamado MICOFENOLATO DE MOFETILA 1,5 g por dia
(correspondente à 3 comprimidos por dia), por período indeterminado e
ininterrupto, pois conforme citado no próprio relatório médico há vários
estudos científicos promissores com relação ao uso deste medicamento para a
patologia da autora.

Apesar disso e do medicamento já possuir registro na ANVISA, ainda


possuí uso off label12 para a patologia que acomete a autora, o que ocasionou a
sua negativa de fornecimento pela Farmácia de Alto Custo do Estado de São
Paulo (vide comprovante em anexo).

Como no relatório médico (em anexo) a neurologista que acompanha o caso


foi bastante taxativa ao informar a URGÊNCIA da medicação, sob pena da
paciente perder seus movimentos, precisar de UTI por dificuldade de
respiração com o consequente risco de morte.
A família ficou desesperada, o que motivou nova campanha nas redes
sociais visando arrecadar o valor para a compra do medicamento, visando evitar o
mal maior que seria a ocorrência de uma nova crise. O valor arredacado foi
suficiente para 2 meses de tratamento.

Conforme os 3 (três) orçamentos em anexo, a medicação é de alto custo


para a autora pois cada caixa custa em média R$ 452,44 e como ela precisa de
12
Uso off label basicamente é uma utilização não constante na bula do medicamento, conforme pode ser lido no site da
Anvisa que pode ser acessado pelo link: https://bit.ly/3tmBXgq
2 caixas por mês o valor está estimado em aproximadamente R$ 904,88 por
mês.

Com o início da medicação a autora já experimentou grande melhora em


seu quadro clínico, mas agora teme não ser possível dar continuidade na sua
recuperação devido a impossibilidade de conseguir o medicamento por não possuir
condições financeiras para arcar com os custos para além desses 2 meses, pois
conforme já informado o tratamento é contínuo e por prazo indeterminado.

A angústia causada por essa dúvida inclusive é fator que pode desencadear
novas crises conforme consta no próprio Protocolo Clínico e Diretrizes
Terapêuticas da doença, logo em sua introdução: “A miastenia gravis (MG) é uma
doença autoimune da porção pós-sináptica da junção neuromuscular caracterizada
por fraqueza flutuante que melhora com o repouso e piora com o exercício,
infecções, menstruação, ansiedade, estresse emocional e gravidez (1).
A fraqueza pode ser limitada a grupos musculares específicos (músculos
oculares, faciais, bulbares) ou ser generalizada (2 3). A crise miastênica é definida
por insuficiência respiratória associada a fraqueza muscular grave(1)”.

Como se percebe, o quadro de saúde da Autora é gravíssimo e delicado,


sendo que nem ela nem sua família, dispõem de meios financeiros para fazer frente
às despesas médicas para manutenção do tratamento indicado pela especialista que
lhe acompanha, o que os leva a um estado de desespero, pois e Estado de São
Paulo, conforme se comprova com documentação em anexo, se nega ao custeio do
imprescindível medicamento.

Ademais, já juntamos nos autos o Relatório Médico para Judicialização de


Acesso à Saúde, disponibilizado pelo próprio Fórum Nacional do Judiciário para a
Saúde do CNJ.

No referido documento a médica assistente destaca que o tratamento da


autora é contínuo, devendo ser feito diariamente através do uso do referido
medicamento pois a forma ininterrupta é condição sine qua non para o controle da
patologia . Foi destacado ainda que o fármaco é aprovado pela Anvisa, sendo
imprescindível e urgente para a requerente. Ressalte-se, mais uma vez que, a
ausência do fornecimento do medicamento poderá ocasionar grave risco do
bem-estar da autora, com possível perda de movimentos e comprometimento
da função respiratória, o que pode levá-la à óbito.

A médica deixa bem claro que, apesar de ser uma medicação de uso off
label, o fármaco em tópico é muito utilizado e eficaz como opção terapêutica
em diversos países, sendo que as opções mais convencionais em uso no Brasil já
foram utilizadas sem sucesso e a autora teve melhora terapêutica significativa
apenas após iniciar o uso do medicamento aqui pleiteado. A eficácia inclusive
pode ser comprovada nos próprios exames laboratoriais da autora.

Como bem destacado, a autora tem apenas 21 (vinte e um) anos, iniciando
sua vida e já encontra-se com comprometimento da capacidade de locomoção,
sendo que, a ausência da medicação na forma prescrita poderá colocar em risco
também funções vitais.

Há, nos autos, relatórios de 3 (três) médicos distintos. Em todos os


relatórios, os profissionais da saúde destacam que a opção terapêutica mais
indicada para a autora é o medicamento requerido, qual seja, MICOFENOLATO
DE MOFETILA, acrescentando ainda que a não utilização do fármaco poderá
levar à danos irreversíveis, incluindo a morte.

Portanto, resta inquestionável que o medicamento é imprescindível para


evitar novas crises e novas sequelas para autora.
Sendo assim, em decorrência dos fatos acima pontuados, alternativa não
restou, senão a propositura da presente ação.

4 – DA MEDICINA BASEADA EM EVIDÊNCIAS

A definição mais utilizada e citada em inúmeros artigos científicos é que a


Medicina Baseada em Evidências é “o uso consciente, explícito e judicioso da
melhor evidência clínica disponível ao tomar decisões sobre o tratamento de um
paciente”. Por definição, é a integração da melhor evidência científica com a
experiência clínica e os desejos individuais do paciente.

Dessa forma, tendo em vista a Nota Técnica 2691313 do Núcleo de


Avaliação de Tecnologias em Saúde – NATS, Conselho Nacional da Justiça 14
(juntado aos autos) afirmando que embora o micofenolato de mofetila seja
comumente utilizado para pacientes transplantados de órgãos sólidos (rins,
coração e fígado), os pacientes de outras doenças graves autoimunes podem se
beneficiar dos seus efeitos, entre eles as pessoas com miastenia gravis,
principalmente quando há intolerância ou impossibilidade de uso das medicações
de primeira linha como azatioprina ou ciclosporina (caso exato da autora),
devemos analisar a medicina baseada em evidências.

Prossegue a Nota Técnica nos informando inclusive que:

13
Produzida pelo Hospital Israelita Albert Einstein.
14
Disponível em: https://www.cnj.jus.br/e-natjus/pesquisaPublica.php <digitar miastenia>
“Em diversos centros é encarado como terapia de primeira
linha por especialistas. Estudos observacionais sugerem
benefício do micofenolato em longo prazo. Um estudo
retrospectivo de dois centros incluiu 102 pacientes com
miastenia gravis anticorpo anti receptor de acetilcolina
positivos que foram tratados com micofenolato sozinho ou
micofenolato e prednisona. Oitenta por cento dos pacientes
em seguimento por mais de 24 meses tiveram um desfecho
favorável com mínimas manifestações clínicas e a dose de
prednisona foi baixada após 12 meses. Após 24 meses, 55
por cento dos pacientes deixaram de usar prednisona (Heir
MK, 2010)”.

Sendo assim, a procuradora que está subscreve fez análise de diversos


artigos acadêmicos científicos junto à Biblioteca Eletrônica Científica Online -
SciELO (uma biblioteca eletrônica que abrange uma coleção selecionada de
revistas científicas brasileiras), buscando por artigos científicos que comprovem a
efetividade da medicação pleiteada. Juntamos alguns artigos nos documentos
probatórios e pedimos vênia para transcrever alguns trechos que destacam a
segurança e efetividade do medicamento pleiteado e que devem ser considerados
para deferir os pedidos da presente exordial.

“O micofenolato de mofetil é um novo medicamento


imunossupressor já estabelecido na medicina de
transplante. Recentemente, foram relatados os resultados de
três ensaios clínicos abertos com micofenolato de mofetil na
miastenia gravis. Micofenolato de mofetil em uma dose de
1,0-2,0 g / dia foi administrado em 2 pacientes com
miastenia gravis refratária grave e em 1 paciente com
síndrome de miastenia gravis-polimiosite. Além da anemia
hemolítica reversível dependente da dose em 1 paciente, não
ocorreram efeitos colaterais graves. Uma melhora
considerável dos sintomas miastênicos foi observada em
todos os pacientes dentro de 3-6 meses após o início desta
terapia. O micofenolato de mofetil pode ser considerado
uma alternativa útil no tratamento da miastenia gravis
grave quando os regimes terapêuticos padrão falham.
Geralmente é bem tolerado e sua aplicação é simples.”15

Em relação à segurança, outro artigo científico aduz que:


15
Schneider C, Gold R, Reiners K, Toyka KV. Mycophenolate mofetil in the therapy of severe myasthenia gravis. Eur
Neurol. 2001;46(2):79-82. doi: 10.1159/000050768. PMID: 11528156.
“Os autores relatam uma análise retrospectiva do uso de
micofenolato de mofetil (MyM) em 85 pacientes com
miastenia gravis autoimune. O status pós-intervenção (PIS)
da Myasthenia Gravis Foundation of America (MGFA) foi
usado para caracterizar a resposta ao tratamento em cada
paciente. Sessenta e dois pacientes (73%) alcançaram um
status PIS indicando melhora. Os testes quantitativos de
força realizados na maioria dos pacientes antes e depois
do tratamento também melhoraram. Os efeitos colaterais
do MyM foram observados em 27% dos pacientes, mas
necessária a descontinuação em apenas 6%.”16

Sendo assim, diante de estudos científicos fica comprovado que a utilização


do MICOFENOLATO DE MOFETILA traz melhoras significativas para pacientes
com miastenia gravis (MG) e interrompe a progressão da doença.

Ante todo exposto, sem maiores delongas, diante da legislação, da nota


técnica, dos estudos baseados em evidências e das decisões judiciais adiante
apresentadas, fica claro, que não há como suprimir o direito Constitucional da
Dignidade da Pessoa Humana, Direito à vida e a Saúde em prol da sua atual não
prescrição (em bula) para o tratamento específico de miastenia gravis (MG).

Razões burocráticas, isoladamente, não devem ser suficientes para


contraindicar um tratamento que, apoiado em evidências robustas, tem grande
chance de trazer mais benefícios do que riscos para a paciente.

5 - DO MÉDICO PARTICULAR

A título de esclarecimento, destacamos que, com o devido respeito e


admiração pelo Sistema Único de Saúde, sabemos que, tendo em vista a alta
demanda, ele se torna moroso e insuficiente, não garantindo uma efetiva prestação
de serviço para todos. A própria autora sempre se utilizou dele, entretanto,
conforme relatado, devido à especificidade de sua patologia, é forçoso reconhecer
que se ela tivesse permanecido no SUS ela poderia ter ido à óbito em decorrência

16
Meriggioli MN, Ciafaloni E, Al-Hayk KA, Rowin J, Tucker-Lipscomb B, Massey JM, Sanders DB. Mycophenolate
mofetil for myasthenia gravis: an analysis of efficacy, safety, and tolerability. Neurology. 2003 Nov 25;61(10):1438-
40. doi: 10.1212/01.wnl.0000094122.88929.0b. PMID: 14638974.
da demora no seu diagnóstico e consequente demora para início do seu tratamento
pois seus sintomas por meses apenas foram piorando.

Conforme relatado nesta exordial, o desespero da família levou-os a realizar


uma “vaquinha” nas redes sociais e com o valor arrecadado fizeram uso do sistema
da rede particular de saúde, inclusive a médica neurologista que descobriu o
diagnóstico e acompanha a autora até o momento, é especialista na área de
doenças raras.
Dessa forma, o relatório juntado aos autos foi elaborado por sua médica
particular, a qual tem sido paga com a ajuda de pessoas que se compadeceram da
situação da autora, pois nem mesmo plano de saúde ela tem. Todavia, isso não
retira seu direito à liminar pretendida e ao julgamento procedente final do mérito.

Nesse sentido é o entendimento da 11ª Câmara de Direito Público do TJSP,


o qual não exige que o medicamento seja prescrito por médico credenciado ao
SUS. Vejamos:
EMENTA: MEDICAMENTO Fornecimento de
medicamento de alto custo – Acetato Abiraterona
(Zytiga) 1000mg/dia – Paciente com diagnóstico de
neoplasia maligna da próstata – Desnecessidade de
que o medicamento seja prescrito por médico
credenciado à rede do SUS - Cabimento à vista do
bem jurídico tutelado, a vida – Inteligência do artigo
196 da Constituição da República - Questão
recentemente dirimida pelo C. STJ no julgamento do
REsp nº 1.657.156/RJ, DJE 04/05/2018, mediante a
sistemática dos recursos repetitivos (Tema nº 106 -
STJ), que fixou tese a respeito da necessidade de
concessão, pelo Estado, de medicamentos não
incorporados em atos normativos do SUS (Programa
de Medicamentos Excepcionais), preenchidos
determinados requisitos – Sentença denegatória da
segurança reformada – Precedentes do STF, STJ e
deste Egrégio Tribunal. Recurso provido em parte. 17

A fim de corroborar a dispensabilidade de médico exclusivamente do SUS


para concessão da liminar (e também para o julgamento final de mérito), citamos
jurisprudência do próprio Superior Tribunal de Justiça. Vejamos:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.


AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MANDADO
DE SEGURANÇA. DIREITO À SAÚDE.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO.
LAUDO MÉDICO PARTICULAR. ALEGAÇÃO
DE AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E
CERTO. SÚMULA 7 DO STJ. INCIDÊNCIA.
1. O Estado (as três esferas de Governo) tem o dever
de assegurar a todos os cidadãos, indistintamente, os
direitos à dignidade humana, à vida e à saúde,
conforme inteligência dos arts. 1º, 5º, caput, 6º, 196 e
198, I, da Constituição da República
2. O fato de o medicamento não integrar a lista básica
do SUS não tem o condão de eximir os entes
federados do dever imposto pela ordem
constitucional, porquanto não se pode admitir que
regras burocráticas, previstas em portarias ou normas
de inferior hierarquia, prevaleçam sobre direitos
fundamentais.
3. Conforme reiterada jurisprudência desta Corte
de Justiça, a escolha do fármaco ou do melhor
tratamento compete ao médico habilitado e
17
TJSP; Apelação Cível 1001835-07.2019.8.26.0045; Relator (a): Oscild de Lima Júnior; Órgão Julgador: 11ª Câmara
de Direito Público; Foro de Arujá - 2ª Vara; Data do Julgamento: 04/05/2021; Data de Registro: 04/05/2021
conhecedor do quadro clínico do paciente,
podendo ser um profissional particular ou da rede
pública, pois o que é imprescindível é a
comprovação da necessidade médica e da
hipossuficiência. [...] 6. Agravo interno a que se nega
provimento (AgInt no AREsp 405.126/DF, Rel.
Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe
26/10/2016)

Ademais, junta-se ainda (vide anexo) o currículo lattes da médica


assistente da autora, Dra. Cristiane Franklin, no qual demonstramos sua vasta
experiência na patologia da autora, conforme segue:

“Fellow em doenças raras no CIMG - Centro de Investigaçao em


Miastenia Gravis de MG/UFMG. Foi professora de Neurologia e Neuroanatomia
NA UNI-BH e também, na Faculdade de Ciências Médicas de MG. Possui
doutorado pela Universidade Federal de Minas Gerais (2013). Tem experiência
em Neurologia clínica, atuando principalmente nas seguintes áreas: miastenia
gravis, neurite optica desmielinizante, esclerose multipla e neuromielite.”

Além da descrição transcrita acima, a médica assistente da autora


realizou seu doutorado em pesquisas voltadas para miastenia gravis. Sendo assim,
visando um atendimento especializado, que traga segurança para sua saúde, a
autora buscou por uma profissional que realmente conhece sua patologia. Esse fato
não pode, de forma alguma, retirar seu direito ao fornecimento do medicamento
por parte do Estado.

6 - DA MEDIDA LIMINAR
Com fundamento no que dispõe o artigo 300, do CPC, caput e § 2º, requer-
se, liminarmente, a antecipação dos efeitos da sentença, no sentido de determinar
que o Réu forneça à Autora, no prazo máximo de 10 (dez) dias, o medicamento
Micofenolato de Mofetila nos seguintes termos prescritos pelo médico assistente:
1,5 g por dia (correspondente à 3 comprimidos por dia), totalizando 2 caixas com
90 comprimidos / mês, por período indeterminado.

Conforme mencionado, a concessão da tutela ora pretendida em sede de


liminar no presente caso encontra guarida no artigo 300, § 2º do CPC/2015, nos
termos que seguem.

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando


houver elementos que evidenciem a probabilidade do
direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do
processo.
§ 2º. A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente
ou após justificação prévia. (sem grifo original).

Ao analisar o caso, resta indubitável que a autora preenche todos os


requisitos para a concessão da tutela pleiteada.

A evidente probabilidade do direito (fumus boni iuris) reside no fato de que


a autora possui todas as provas hábeis, por meio de farta documentação médica
(relatórios detalhados e exames probatórios da patologia) que comprova a urgência
e necessidade na realização do tratamento médico indicado, bem como a negativa
de fornecimento do medicamento por parte da Ré, sob alegação de que o
medicamento não é fornecido para a patologia da autora.

No que tange ao perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo,


conforme relatório médico minuciosamente descrito, restou comprovado que a
autora, diagnosticada com miastenia gravis (MG), caso não faça o devido uso da
medicação e consequente tratamento da doença, corre risco de piora das suas
incapacidades, razão pela qual, de maneira enfática, indicou-se a utilização do
Micofenolato de Mofetila como a melhor opção terapêutica para a paciente. Dessa
forma, caso não haja a antecipação dos efeitos da tutela, afiguram-se os
possíveis danos irreparáveis à saúde, e, até mesmo, à própria vida da autora,
além de poder causar déficits graves e incapacitantes, conforme consta
expressamente no relatório médico.
Sabe-se o quanto essas questões burocráticas para liberação de medicação
por via judicial são, na maioria dos casos, demorada. Sendo assim, para que não
ocorra qualquer atraso e interrupção no tratamento da autora, o que poderá
ocasionar sérios agravamentos em seu quadro clínico, como a perda dos
movimentos em uma jovem de apenas 21 (vinte e um) anos, o deferimento da
liminar é medida que se impõe para que todo o trâmite de liberação do fármaco
seja realizado em tempo hábil sem comprometer a continuidade do tratamento da
requerente. Ademais, sabe-se também que os processos judiciais não são decididos
dentro de um período de 1 (um) mês e alguns dias (tempo de tratamento que a
autora ainda dispõe do medicamento adquirido com o dinheiro da arrecadação em
redes sociais).

Nota-se, portanto, plenamente comprovado os requisitos autorizadores da


concessão da tutela de urgência (probabilidade do direito e perigo de dano ou o
risco ao resultado útil do processo), nos termos do artigo 300, § 2º do CPC.

Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial majoritário do Egrégio


Tribunal de Justiça de São Paulo, para casos que envolvem exatamente a mesma
medicação requerida nos autos. Vejamos:

EMENTA: REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE


SEGURANÇA. Fornecimento gratuito do medicamento
Micofenolato de Mofetil 500mg. Paciente portador de
miastenia gravis. Pedido de liminar deferido. Sentença
de procedência. Feito distribuído em 17/06/2016, não se
aplicando a ele, necessariamente, o entendimento
consolidado no REsp nº 1.657.156 – Acórdão publicado no
DJe de 04/05/2018. Cabimento da ação à vista do bem
jurídico tutelado, a vida. A Jurisprudência de nossos
tribunais já se firmou no sentido da responsabilidade
solidária dos entes federados, de forma que qualquer deles
tem legitimidade para figurar no polo passivo da demanda
que objetive o acesso a meios e medicamentos para
tratamento de saúde. O autor comprovou
indubitavelmente a necessidade do medicamento
descrito na petição inicial, além da sua hipossuficiência
financeira para adquiri-lo. Dessa forma, cumpre ao ente
público demandado o seu fornecimento. Remessa
necessária não acolhida.18 

Frise-se ainda que o medicamento em questão é padronizado e


fornecido no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, constando Relação

18
(TJSP;  Remessa Necessária Cível 1026864-40.2016.8.26.0053; Relator (a): Antonio Celso Faria; Órgão Julgador: 8ª
Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 7ª Vara de Fazenda Pública; Data do
Julgamento: 25/04/2019; Data de Registro: 25/04/2019)
Nacional de Medicamentos – RENAME/2020 do Componente Especializado da
Assistência Farmacêutica.

Sobre a hipossuficiência da autora e de seus familiares, há diversos


comprovantes que demonstram sua ausência de renda (ainda na condição de
estudante), bem como uma baixa renda dos seus pais, sendo que apenas o seu pai é
o provedor de toda família. Dessa forma, o grupo familiar não possui condições de
manter a compra mensal do medicamento pleiteado (custo médio em torno de R$
900,00) sem comprometer a subsistência da família.

Destaca-se, portanto, que ficou demonstrado a imprescindibilidade do


fármaco pleiteado, por meio de 3 (três) relatórios médicos circunstanciados e
fundamentados, a hipossuficiência da autora e da sua família e a aprovação
do medicamento pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA,
bem com padronização e fornecimento no âmbito do Sistema Único de Saúde
– SUS, constando Relação Nacional de Medicamentos – RENAME/2020
(apesar de ser fornecido para doença diversa). Ademais, há nos autos a
negativa de fornecimento por parte da ré.

Cumpre ressaltar, que consoante o artigo 300, §1º do NCPC, a justiça


poderá exigir caução, CONFORME O CASO, podendo SER DISPENSADA SE A
PARTE ECONOMICAMENTE HIPOSSUFICIENTE NÃO PUDER OFERECÊ-
LA. Razão pela qual, requer a dispensa, tendo em vista da situação atual da
Requerente, que NÃO TEM CONDIÇÕES DE ARCAR COM AS DESPESAS.
Neste caso, o fato de o juiz da causa dispensar essa garantia não vicia,
absolutamente, o provimento jurisdicional pleiteado.

Portanto, presentes os requisitos legalmente exigidos pelo art. 300 do CPC,


a Requerente pugna pela antecipação da tutela com o fito de determinar à
Requerida forneça à Autora, no prazo máximo de 10 (dez) dias, o
medicamento Micofenolato de Mofetila nos seguintes termos prescritos pelo
médico assistente: 1,5 g por dia (correspondente à 3 comprimidos por dia),
totalizando 2 caixas com 90 comprimidos / mês, por período indeterminado,
sob pena de multa a ser fixada por este r. juízo (CPC, art. 537).

7 - DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO PEDIDO

A manutenção da saúde e, consequentemente, da vida são direitos


consagrados pela Constituição Federal de 1988, inerente a todo ser humano,
constituindo direitos inalienáveis e irrenunciáveis conforme os artigos 5º, caput e
artigo 6º indicados a seguir:
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida (...).
§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata.

Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde.

Observa-se que o sistema constitucional brasileiro, diferentemente do que


acontece em outros países, consagrou a saúde como direito fundamental. E, nessa
condição de direito fundamental, sua aplicabilidade torna-se imediata e direta,
consagrando e densificando o direito à saúde. Como assegura o art. 5ª, §1º da CF,
tais direitos são considerados como uma espécie de “mandado de otimização” para
o intérprete-aplicados, a indicar que deva privilegiar a interpretação que maior
eficácia confira ao direito fundamental em causa.

A fundamentabilidade está calcada na relevância da saúde como condição


essencial para a manutenção da vida humana, bem como para a fruição de todos os
demais direitos pelo indivíduo, fundamentais ou não. A preservação da saúde é um
pré-requisito para que a pessoa consiga ter uma vida digna.

No que tange a responsabilidade do Réu para o fornecimento do


medicamento, cabe ressaltar que o Estado deve zelar pelo direito à vida, sendo o
direito à saúde de competência da União, Estados, Distrito Federal e Municípios
(art. 23, II, CF), bem como a competência de organizar a seguridade social,
garantida a universalidade da cobertura e do atendimento, conforme o art. 194,
parágrafo único, inc. I.

Nesse sentido, de maneira mais contundente dispõe o art. 196, da CF, que:

“a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido


mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução
do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal
e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção
e recuperação"

Dessa forma depreende-se que é dever do Estado garantir aos seus cidadãos
o direito à saúde, sendo inconcebível a recusa ao fornecimento do medicamento
MICOFENOLATO DE MOFETILA, pois comprovadamente necessário para
evitar a piora das incapacidades da autora, acometida de grave doença.
O medicamento postulado pela parte autora é devidamente
padronizado/incorporado pelo SUS e consta na Relação Nacional de
Medicamentos Essenciais – RENAME/2020
(https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/relacao_medicamentos_rename_2020
.pdf). Sendo assim, deve ser respeitado o princípio da integralidade garantido
constitucionalmente no que tange ao direito à saúde. A Relação Nacional de
Medicamentos Essenciais – RENAME “compreende a seleção e padronização de
medicamentos indicados para atendimento de doenças ou de agravos no âmbito do
SUS”.
A negativa da medicação se deu sob a justificativa de que o medicamento
MICOFENOLATO DE MOFETILA não está contemplado no Protocolo
Clínico e Diretrizes Terapêuticas para o tratamento da patologia da autora.

Todavia, por tratar-se de uma doença rara, os protocolos ainda estão em


estudo, aplicando-se neste caso a chamada Medicina Baseada em Evidências, a
qual já aponta a segurança e eficácia do medicamento em questão. Ademais todos
os medicamentos que foram prescritos como sendo convencionais não surtiram
efeito, alguns inclusive causaram efeitos colaterais e tiveram que ser suspensos. O
único medicamento que vem apresentando resultados é o MICOFENOLATO DE
MOFETILA, tendo em vista os resultados dos seus exames laboratoriais antes e
depois de fazer uso da medicação em pauta.
Ao analisar os documentos probatórios juntados aos autos, nota-se que a
médica assistente deixou bem claro que a falta do medicamento por levar a
perda de movimentos e até à morte, demonstrando assim sua
imprescindibilidade para a autora.
A seu turno, também estão evidenciados a incapacidade financeira da
autora e de sua família para arcarem mensalmente com o custo do medicamento
prescrito.
Para comprovar a incapacidade financeira não se exige comprovação de
pobreza ou miserabilidade, mas, tão somente, a demonstração da incapacidade de
arcar com os custos referentes à aquisição do medicamento prescrito, o que está
claramente comprovado pelos documentos (voto do Relator Min. BENEDITO
GONÇALVES do Resp. 1.657.156 do STJ).
Por fim, o medicamento é devidamente registrado na ANVISA.

8 - DO TRATAMENTO PLEITEADO - USO OFF-LABEL

Sobre o uso do medicamento não constar em bula (uso off label) para
a patologia da autora citamos a NT 26913/2021 emitida pelo próprio Conselho
Nacional de Justiça através do Núcleo de Avaliação de Tecnologia e Saúde
(projeto do CNJ em conjunto com o Ministério da Saúde em parceria com o
Hospital Sírio Libanês (e-NatJus CNJ) e disponível em: https://www.cnj.jus.br/e-
natjus/pesquisaPublica.php <digitar miastenia> a qual num caso idêntico ao da
autora concluiu que:
“ [...]
Conclusão Justificada: Favorável
Conclusão: CONSIDERANDO que o paciente é acometido
por doença crônica, chamada miastenia gravis, que demanda
tratamento com imunossupressão crônica;
CONSIDERANDO que o paciente já fez uso dos três
medicamentos de primeira linha para a imunossupressão na
doença (prednisona, azatioprina e ciclosporina) e apresenta
intolerância Página 4 de 5 por efeitos colaterais a eles;
CONSIDERANDO que o micofenolato de mofetila é opção
imunossupressora para miastenia gravis aceita em diversos
consensos internacionais e com estudos que sustentam
possível eficácia;
CONCLUI-SE que há elementos técnicos que permitem a
prescrição e o uso da droga no caso em tela;
Há evidências científicas? Sim
Justifica-se a alegação de urgência, conforme definição
de Urgência e Emergência do CFM? Sim
Justificativa: Com risco potencial de vida
[...].”

Sabe-se que as notas técnicas têm por objeto auxiliar os magistrados na


formação de um juízo de valor quando da apreciação de questões clínicas
apresentadas em ações judiciais envolvendo a assistência à saúde. E, conforme
pode ser observada na NT indicada, o tratamento com micofenolato de mofetila é
uma opção terapêutica utilizada no tratamento de miastenia gravia e sua escolha
se dá de acordo com entendimento do médico especialista, conforme acontece
no caso concreto.
Dessa forma, a nota técnica trazida acima deve ser considerada, uma vez
que deixa claro as características e a gravidade da patologia que acomete a autora,
sendo que no próprio documento consta que a doença pode evoluir agressivamente
e caso não seja feito o uso da medicação indicada, isso poderá acontecer de forma
ainda mais célere.

Importante citarmos também a Lei 8080/90, a qual é popularmente


conhecida como “Lei do SUS”. Sobre o assunto da presente lide, temos seu art. 6ª
asseverando o que segue:

Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do


Sistema Único de Saúde (SUS):
[...]
d) de assistência terapêutica integral, inclusive
farmacêutica;

O objeto da presente demanda é exatamente a assistência terapêutica


integral, por meio do fornecimento do fármaco imprescindível para assegurar a
saúde da demandante.
A utilização do medicamento de forma off-label não pode justificar
ausência de tratamento para autora, devendo ser seguidas as prescrições
farmacológicas dos médicos assistentes.
Sobre o tema, ainda que o medicamento em questão ainda não conste dentro
do Sistema Único de Saúde (SUS) como medicamento específico para tratamento
de miastenia gravis, ressalte-se o que foi decidido pelo E. Superior Tribunal de
Justiça no julgamento do REsp nº 1.657.156, de relatoria do Ministro
Benedito Gonçalves, sob o rito dos recursos repetitivos, cuja tese recentemente
fixada passou a ser:
“A concessão dos medicamentos não incorporados em
atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos
seguintes requisitos:
i) Comprovação, por meio de relatório médico
fundamentado e circunstanciado expedido por médico que
assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade
do medicamento, assim como da ineficácia, para o
tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do
medicamento prescrito;
iii) existência de registro do medicamento na ANVISA,
observados os usos autorizados pela agência.” (EDcl no
REsp 1657156/RJ, Rel. Ministro BENEDITO
GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
12/09/2018, DJe 21/09/2018).

Outrossim, conforme já mencionado, o medicamento postulado pela parte


autora é devidamente padronizado/incorporado pelo SUS e consta na Relação
Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME/2020
(https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/relacao_medicamentos_rename_2020
.pdf), sendo devidamente registrado na ANVISA.
Portanto, ao analisar os documentos probatórios juntados aos autos, nota-se
que a autora preenche todos os requisitos exigidos no Resp. 1.657.156 do STJ,
uma vez que a médica assistente deixou bem claro que a falta do medicamento
pode levar a perda de movimentos, além de outros déficits neurológicos,
demonstrando assim sua imprescindibilidade para a autora.
A seu turno, também estão evidenciados a incapacidade financeira da
autora e de sua família para arcarem mensalmente com o custo do medicamento
prescrito.
Diante do exposto, nota-se que a autora, preenche, claramente, todos os
requisitos exigidos pelo REsp nº 1.657.156, devendo, desse modo, ser fornecida a
medicação (mesmo que de forma off label), uma vez que a situação fática atende
às exigências do STJ.

9 - DOS DANOS MORAIS

Imperiosa se faz a condenação do Réu ao pagamento de indenização a título


de danos morais pois a Autora, ao ver negado pedido de tratamento médico
necessário à preservação de sua vida e à sua saúde, sofreu inequívoco dano moral.

Sobre o tema, o Código Civil Brasileiro preleciona que:

Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária,


negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito ( arts. 186 e 187 ),
causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em
lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo
autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem

Nestas hipóteses a responsabilização dos agentes independe, inclusive, da


demonstração de qualquer tipo de prova do dano, que é considerado, segundo a
melhor doutrina e jurisprudência aplicável à espécie, danum in re ipsa.

Nesse sentido, há de se observar que, no caso em concreto, a autora


experimenta situação de nítido constrangimento, sofrimento e profunda angústia,
tendo em mira a urgência de seu estado clínico que se soma à injusta e
injustificada negativa de fornecimento do qual necessita.

A situação é grave, envolvendo a própria vida da autora. Deve, portanto,


gerar reprimenda do Judiciário para fixar a indenização a título de danos morais no
valor de R$ 10.000,00 (treze mil reais), até mesmo à título punitivo e educativo.

10 – DAS PROVAS

Protesta por todos os meios de prova em Direito admitidos, em especial, a


prova testemunhal, documental, pericial, depoimento pessoal e tudo a mais que se
fizer necessário para o deslinde da causa.

11 - DOS PEDIDOS
Ex positis, a autora requer:

a) Seja concedida, inaudita altera pars, medida liminar para que seja
determinado ao Réu que forneça à autora, no prazo máximo de 10
(dez) dias, o medicamento Micofenolato de Mofetila nos
seguintes termos prescritos pelo médico assistente: 1,5 g por dia
(correspondente à 3 comprimidos por dia), totalizando 2 caixas
com 90 comprimidos / mês, por período indeterminado;

b) Seja fixada multa para a hipótese de não cumprimento voluntário da


ordem judicial de cumprimento da liminar (em caso de sua
concessão), nos termos do art. 537 do CPC/2015;
c) Seja dispensada qualquer audiência, nos termos do art. 319, VII do
CPC, uma vez que a autora não tem interesse em audiência de
conciliação ou de mediação;

d) Seja intimada a Ré para que no prazo legal ofereça resposta, sob


pena de confissão e revelia, nos termos do artigo 344 do Código de
Processo Civil;

e) Seja, no mérito, julgada procedente a demanda, confirmando a


liminar
deferida, afim de que seja concedido à autora o fornecimento do
medicamento Micofenolato de Mofetila nos seguintes termos
prescritos pela médica assistente: 1,5 g por dia (correspondente à
3 comprimidos por dia), totalizando 2 caixas com 90
comprimidos / mês, por período indeterminado;

f) Seja condenado o Réu ao pagamento de indenização por danos


morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), devendo o referido
sofrer acréscimo de juros moratórios, na forma composta e correção
monetária, desde a data do evento, nos termos da Súmula 54 do STJ;

g) Seja deferido à autora os benefícios da assistência judiciária gratuita;

h) Seja deferido à autora a prioridade de tramitação processual, tendo


em vista ser pessoa com deficiência;

i) Seja a Ré condenada em honorários advocatícios sucumbenciais em


20% sob o valor da causa, em caso de recurso;

10 – DO VALOR DA CAUSA

Dá à causa o valor de R$ 20.858,56 (vinte mil oitocentos e cinquenta e oito


reais e cinquenta e seis centavos).

São Paulo, 06 de maio de 2021.

Termos em que, respeitosamente,


Pede deferimento.
Ana Paula Rodrigues Brisolla
OAB/SP 334446

Você também pode gostar