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1º OFÍCIO GERAL – Boa Vista/RR

AO JUÍZO DA 3ª VARA FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA SJRR

Autor (a): Eduarda Queiroz de Almeida França


Réu: Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)
PAJ n. 2021/005-01604

EDUARDA QUEIROZ DE ALMEIDA FRANÇA, brasileira, solteira,


desempregada, portadora do RG 3272702 SSP/RR, inscrita no CPF sob o n. 981.672.352-20,
telefone (95) 99170-9701, sem endereço eletrônico, residente e domiciliada na rua caracarana,
n. 101 -1, bairro 13 de setembro, Cep n. 69308-100, Boa Vista-RR, por meio da Defensoria
Pública da União, por sua Defensora Pública Federal in fine assinada, vem, respeitosamente, à
presença de Vossa Excelência, propor a presente

AÇÃO PARA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO


CONTINUADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA – BPC/LOAS COM PEDIDO DE
TUTELA DE URGÊNCIA

em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS, Autarquia


Previdenciária Federal, situada na Avenida Avenida Glaycon de Paiva, 86, Centro, Boa
Vista/RR, pelas razões fáticas e de direito que seguem.

1. PRELIMINARMENTE
1.1. Da gratuidade da Justiça
A parte autora faz jus ao benefício da gratuidade da justiça, por força do art. 5º,
LXXIV, da Constituição Federal de 1988, e nos moldes do art. 98 e ss., do CPC/15, em razão
de ser economicamente hipossuficiente, não tendo como arcar com as despesas processuais e
honorários advocatícios, sem prejuízo do próprio sustento e de sua família.

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1.2. Das prerrogativas da Defensoria Pública da União

Registre-se, por outro lado, que, nos termos do artigo 44, I, da Lei
Complementar nº 80/94 (Lei Orgânica da Defensoria Pública), os membros da
Defensoria Pública da União gozam das prerrogativas de intimação pessoal em todos
os processos e graus de jurisdição; e contagem em dobro dos prazos processuais, o que
espera que sejam observadas por esse Juízo.

1.3. Do interesse de agir


Em relação ao benefício assistencial e aos benefícios por incapacidade, é possível
conhecer de um deles em juízo, ainda que não seja o especificamente requerido na via
administrativa, desde que preenchidos os requisitos legais, observando-se o contraditório e o
disposto no artigo 9º e 10 do CPC, nos termos do Tema nº 217 da TNU.

2. DOS FATOS
A autora, atualmente com 30 (trinta) anos de idade sendo mãe solteira de uma
criança de 4 (quatro) anos de idade, é pessoa portadora de Epilepsia (CID10 – G 40.2),
conforme laudo médico em anexo datado em 31/05/2021, pelo médico Gustavo Ubirajara
Marques, CRM-RR 869.
Diante de seu quadro de saúde e da sua vulnerabilidade socioeconômica, a parte
autora solicitou administrativamente, em 03/04/2019, a concessão de Benefício Assistencial à
Pessoa com Deficiência (NB: 7047795287). Desse modo, foram agendadas a avaliação social
para o dia 31/03/2020 e avaliação médica para o dia 01/04/2020, ocorre que devido a da
pandemia do coronavírus (COVID-19), todas os atendimentos presenciais foram suspensos
pelo INSS, entretanto concedido a antecipação do valor de R$ 600,00 por até três meses.
Após isso, foram reagendadas ambas avaliações a social para o dia 18/11/2020 e a
médica para o dia 26/11/2020. No entanto, a parte autora teve seu pedido indeferido, pela
justificativa de que “Não atender às exigências legais da deficiência para acesso ao BPC-
LOAS”.

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Sabe-se que administrativamente a parte autora não teria o deferimento do seu


pedido, pois a epilepsia não se enquadra na legislação para PCD, dessa maneira o INSS acaba
negando os pedidos desse benefício na via administrativa. Ocorre também que:

A epilepsia trata-se de uma condição médica crônica, cuja principal característica é a


ocorrência de crises epilépticas com variadas manifestações (tanto no que se refere à
frequência, quanto à forma do sintoma). Pode ser considerada como incapacitante nos
casos em que substancialmente limita o portador sobre qualquer atividade básica do
cotidiano. (Disponível em: <https://alestrazzi.jusbrasi
l.com.br/artigos/1138559855/epilepsia-da-direito-a-aposentadoria-pelo-inss>. Acesso em
30 de Set. 2021,).

Diante do exposto, destaca-se que apesar de haver tratamento para a epilepsia ela
ainda não tem cura. Assim, em razão da moléstia, o portador de epilepsia pode ter direito a
receber um benefício assistencial (LOAS/BPC) ou um benefício previdenciário, porém a sua
concessão pelo INSS depende da avaliação pela perícia médica.
É importante frisar a orientação do Conselho de Recursos do Seguro Social, em
seu Enunciado n. 5: “É importante ressaltar que a identificação dos beneficiários do BPC e a
avaliação das suas condições sociais são de caráter restrito, sendo necessárias para as
atividades de revisão do benefício e outras que se seguirão no âmbito da assistência social.”
A parte autora e seu filho residem com sua tia que a ajuda em todos os cuidados
necessários e no do seu filho, pois a autora não possui mais condições de residir sozinha,
devido as diversas crises de epilepsia.
Por tais razões, faz-se necessária a tutela jurisdicional a fim de resguardar os
direitos da parte autora à percepção do auxílio.

3. DO DIREITO
3. FUNDAMENTOS JURÍDICOS
Consoante disposição do artigo 20, § 2º e 3º, da Lei nº 8.742/93, são pressupostos
para obtenção do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência: a) condição de
pessoa com deficiência, que pressupõe impedimentos de longo prazo que impossibilitem sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas e

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b) situação de risco social, ou seja, a impossibilidade de a pessoa prover a própria


manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Com efeito, o benefício assistencial em questão, de que trata a Lei nº 8.742/93,
regulamentando o artigo 203, inciso V, da Constituição, inserindo-se no âmbito da Assistência
Social, volta-se, primordialmente, para aqueles que, não tendo contribuído para a obtenção de
um benefício previdenciário, estejam em situação periclitante e não tenham, de forma
autônoma ou por familiares próximos, meios de se manterem.

3.1. Do direito ao benefício assistencial e do conceito de deficiência


Um dos requisitos para a concessão do benefício, segundo aduz o artigo 20, §3º
da Lei 8.742/93, é que o requerente seja portador de deficiência, em qualquer idade, que lhe
tragam impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
que prejudiquem a sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições
com outras pessoas. Tal entendimento foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro
seguindo o disposto no artigo 1º da Convenção sobre Direitos da Pessoa com deficiência.
Nesse ponto, destacam-se dois enunciados da Turma Nacional de Uniformização
(TNU)1:
“Súmula 29: Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a
vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa,
mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento.
 
Súmula 48: Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o
conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de
incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo
com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do
início sua caracterização.”

Em relação ao estado de saúde da parte autora, os documentos que instruem os


autos evidenciam que ela possui epilepsia (CID10 – G 40.2), e faz o uso de carbamazepina
que é anticonvulsivante, antipsicótico e antiepilético. Além disso, a parte autora estar
começando a apresentar quadros de ansiedade, (CID 10- F 41). Nesse seguimento, é
incontestável a presença de uma piora em seu quadro clínico.

1
Enunciados 29 e 48, respectivamente, do Tribunal Nacional de Uniformização.
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Como já mencionado anteriormente que a doença da parte autora não é


reconhecida administrativamente para o reconhecimento de concessão do benefício, verifica-
se, em contrapartida as decisões judiciais evidenciando outros posicionamentos:

RECURSO ESPECIAL Nº 1912187 - PE (2020/0339878-5) DECISÃO Trata-se de


Recurso Especial (art. 105, III, a e c, da CF/1988) interposto contra acórdão proferido pelo
Tribunal Regional Federal da 5ª Região assim ementado: PREVIDENCIÁRIO E
PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE.
INDEFERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. PRETENSÃO DE REVISÃO DO
ATO. AJUIZAMENTO DA AÇÃO APÓS O QUINQUÊNIO LEGAL. PRESCRIÇÃO.
NOVO PEDIDO NA VIA JUDICIAL. PRETENSÃO RESISTIDA. CONFIGURAÇÃO
DA LIDE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. DIB NO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE
PROVIDA. 1. A autora ajuizou, em 31.08.2015, ação contra o INSS a fim de rever o ato
administrativo, realizado em 30.07.2010, que indeferiu o pedido de concessão do benefício
assistencial à pessoa com deficiência. [...] O pedido de concessão do benefício assistencial
possui alicerce no art. 203, V, da Constituição Federal, que elenca, entre os objetivos da
assistência social, "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora
de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria
subsistência ou tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei". 5. O cerne da
questão está em apreciar a existência de enfermidade ou deficiência que implique inaptidão
para o exercício de atividades laborais e da vida independente, bem como de haver
hipossuficiência econômica própria ou da família, nos moldes da Lei nº 8.742/93. 6.
Conforme laudo pericial produzido em Juízo, a parte autora encontra-se total e
definitivamente incapacitada para o trabalho e para a vida civil, apresentando quadro de
epilepsia, retardo mental moderado e polineuropatia periférica (CID G40/F71/G62.9.) 7.
Também o requisito da hipossuficiência econômica se encontra devidamente atendido,
conforme consignado no Laudo Social produzido em Juízo (Id 4058300.5798375), no qual
a assistente social atesta que o autor reside sozinho, tendo como única fonte de renda o
valor de R$ 85,00 (oitenta e cinco reais), proveniente do Programa Bolsa Família, além de
auxílio de familiares e amigos para alimentação e o pagamento do aluguel da casa onde
vive.. MINISTRO HERMAN BENJAMIN Relator (STJ - REsp: 1912187 PE
2020/0339878-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Publicação: DJ
17/02/2021).

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5284660-08.2020.4.03.9999 RELATOR:Gab.36-


DES.FED.LUCIAURSAIA APELANTE:INSTITUTO NACIONALDO SEGURO
SOCIAL- INSS APELADO:SAMUELBUENO DE SAMPAIO ROBERTO
REPRESENTANTE:IDALINABUENO DE SAMPAIO DACOSTA Advogado do (a)
APELADO:GERSON CLEITON CASTILHO DA SILVA- SP390213-N OUTROS
PARTICIPANTES: DECISÃO. A Lei nº 8.742/93, que dispõe sobre a organização da
Assistência Social, veio regulamentar o referido dispositivo constitucional, estabelecendo
em seu art. 20 os requisitos para sua concessão, quais sejam, ser pessoa portadora de
deficiência ou idosa, bem como ter renda familiar inferior a ¼ do salário mínimo.
Considera-se pessoa com deficiência, para fins de concessão do benefício de prestação
continuada, aquela que, segundo o disposto no artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, coma
redação dada pela lei nº 13.146/2015, "tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições comas
demais pessoas". Quanto ao primeiro requisito, deve-se atentar ao laudo pericial, realizado
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em setembro de 2018 (Id. 136662269), o qual atesta que a autora, é portadora de


epilepsia do tipo misto, e encontra-se incapacitada de forma total e permanente para o
trabalho, bem como necessita da supervisão de terceiros para as atividades diárias
[...]. Por isso, para sua concessão não há que se exigir uma situação de miserabilidade
absoluta, bastando a caracterização de que o beneficiário não tem condições de prover a
própria manutenção, nemde tê-la provida por sua família. Não se tem dúvida de que o § 3º
do art. 20 da Leinº 8.742/93 é constitucional, tendo o Supremo TribunalFederaldecidido
nesse sentido (ADIN nº 1.232/DF, Relator p/ acórdão Ministro NelsonJobim, j.
27/08/1998DJ 01/06/2001). Por tais razões, a parte autora faz jus à percepção do benefício
assistencial, uma vez que restou demonstrado o implemento dos requisitos legais para sua
concessão. Os juros de mora e a correção monetária serão aplicados de acordo como
vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013,
observado o julgamento finaldo RE 870.947/SE. Diante do exposto, nos termos do art. 927
c/c art. 932, IVe V, do CPC, NEGO PROVIMENTO Á APELAÇÃO DO INSS, na
forma da fundamentação. [grifo nosso]

Assim, o que se busca é apenas o direito assegurado àquelas pessoas que, de


alguma forma, necessitam da atuação assistencial do Estado, como é o caso evidente da
Autora, não somente em função da moléstia que lhe acomete, conforme documentos
anexados, que por si só já é cruel em virtude do estigma social, mas, sobretudo, em razão da
carência econômica sofrida, motivo pelo qual a concessão do benefício LOAS-deficiente é
medida de rigor.

3.2. Do critério de miserabilidade


Já no que pertine ao segundo requisito (situação de risco social), atinente à renda
per capita familiar, tem-se, também, o seu preenchimento, pelos motivos que serão expostos a
seguir.
O grupo familiar da parte autora é formado exclusivamente por ela, de acordo
com o CadÚnico anexo, o qual comprova faixa de renda familiar por pessoa (per capita) até
R$ 178,01 (cento e setenta e oito reais), cadastrado desde 10/08/2018, de maneira que a
vulnerabilidade social está comprovada.
Nesse contexto, importante trazer a lume a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), nos autos da Reclamação (RCL) nº 4374, que reconheceu a
inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social
(LOAS – nº 8.742/93), o qual prevê como critério para a concessão de benefício à idosos

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ou deficientes a renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo, por
considerar que esse critério está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Nesse gizo, o Ministro Gilmar Mendes, citando seu par Sepúlveda Pertence, nos
autos da Reclamação nº 4374 MC/PE, assim retratou com precisão:
“A constitucionalidade da norma legal, assim, não significa a inconstitucionalidade
dos comportamentos judiciais que, para atender, nos casos concretos, à Constituição,
garantidora do princípio da dignidade humana e do direito à saúde e à obrigação
estatal de prestar assistência social ‘a quem dela necessitar’, independentemente da
contribuição à seguridade social, tenham de definir aquele pagamento diante da
constatação da necessidade da pessoa portadora de deficiência ou do idoso que não
possa prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. No caso que
ora se apresenta, não parece ter havido qualquer afronta, portanto, ao julgado. (...)”

Nas palavras do Ministro Gilmar Mendes:


“Portanto, os programas de assistência social no Brasil utilizam, atualmente, o valor
de ½ salário mínimo como referencial econômico para a concessão dos respectivos
benefícios. Tal fato representa, em primeiro lugar, um indicador bastante razoável de
que o critério de ¼ do salário mínimo utilizado pela LOAS está completamente
defasado e mostra-se atualmente inadequado para aferir a miserabilidade das
famílias que, de acordo com o art. 203, V, da Constituição, possuem o direito ao
benefício assistencial.
Em segundo lugar, constitui um fato revelador de que o próprio legislador vem
reinterpretando o art. 203 da Constituição da República segundo parâmetros
econômico-sociais distintos daqueles que serviram de base para a edição da LOAS
no início da década de 1990. Esses são fatores que razoavelmente indicam que, ao
longo dos vários anos desde a sua promulgação, o § 3º do art. 20 da LOAS passou
por um processo de inconstitucionalização. Portanto, além do já constatado estado
de omissão inconstitucional, estado este que é originário em relação à edição da
LOAS em 1993 (uma inconstitucionalidade originária, portanto), hoje se pode
verificar também a inconstitucionalidade (superveniente) do próprio critério definido
pelo § 3º do art. 20 da LOAS. Trata-se de uma inconstitucionalidade que é resultado
de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas
dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro)” (grifo nosso).”

Ainda, a Corte Suprema, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores


posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos:
“Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de
notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas
modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de
concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4.
Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20,
§ 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. RE
567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min.

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GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO


ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-194 DIVULG 02-10-
2013 PUBLIC 03-10-2013.”

Dessa forma, mesmo que a renda per capita da família da autora ultrapassasse
esse critério, cumpre registrar que, por ocasião do julgamento da Reclamação 4374-PE, o STF
declarou a inconstitucionalidade parcial do artigo 20, §3º, Lei nº 8.472/93, diante das
“notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas
modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão
de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro)”.
Por isso, a interpretação do caso concreto deve observar as vulnerabilidades
fáticas da parte demandante, sob o crivo dos princípios da dignidade da pessoa humana, da
proporcionalidade e da razoabilidade.
Outrossim, não se pode olvidar que o benefício em comento tem cunho
assistencial, o que impõe a verificação da presença de seus requisitos legais em sintonia com
as diversas legislações e políticas públicas voltadas à Assistência Social, haja vista que
também apresentam como substrato a dignidade da pessoa humana.
Não obstante, por vezes, o rigor procedimental deve ser flexibilizado para que
assim se conheça a realidade material do requerente. Certo é que há de se dar essa
oportunidade sempre que diante de casos que justifiquem perquirir acerca da presença ou não
da miserabilidade; evitando-se que o rigor procedimental contribua com eventual exclusão
social, mediante o norte informado pela busca do restabelecimento do mínimo de dignidade
da pessoa humana, enquanto fundamento da República.
Conforme documentação juntada aos autos é evidente o direito da autora à
concessão do benefício, visto que preenche todos os requisitos legais para concessão do
benefício assistencial: miserabilidade e deficiência devido a sua incapacidade.

4. DA FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS


Cumpre assinalar que o princípio da fungibilidade busca flexibilizar certas normas
processuais, com o objetivo de alcançar o direito material objetivado na demanda e apresentar

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o processo com um instrumento de realização do direito pleiteado. De tal forma, sua aplicação
na seara previdenciária não seria diferente.
Não é demais relembrar que a autarquia deve conhecer de toda matéria de fato a
ela apresentada e conceder o benefício mais vantajoso ao segurado, orientando-o sobre como
requerer, conforme Enunciado nº 5 do próprio Conselho de Recursos da Previdência Social:

“A Previdência Social deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer


jus, cabendo ao servidor orientá-lo nesse sentido.”

Já é bastante difundida a tese de que o magistrado pode conceder, em sentença,


benefício previdenciário diverso do requerido pela parte autora na exordial. Tal
acontecimento ocorre geralmente na hipótese de benefício por incapacidade, visto que existe
fungibilidade entra a aposentadoria por invalidez e benefícios assistenciais, vez que benefícios
semelhantes.
É certo que o magistrado pode conceder ao autor benefício concedido, sem que
isso configure em julgamento extra petita ou ultra petita. Tal entendimento, ressalta-se, leva
em consideração os fins sociais da norma previdenciária, bem como a hipossuficiência do
segurado.
Sendo assim, considerando os fundamentos apontados e a aplicação do princípio
da fungibilidade, requer-se a concessão do benefício que seja mais vantajoso à parte autora.

5. DA TUTELA DE URGÊNCIA
O presente caso impõe a concessão da tutela de urgência, na forma do artigo 300
do Código de Processo Civil (CPC).
A probabilidade do direito é demonstrada pelo acervo documental reunido – que
atesta o quadro de deficiência da autora que acarreta impedimento de longo prazo – e o perigo
de dano irreparável decorre da própria natureza alimentar do benefício, sobretudo, em se
cuidando de pessoa pobre, impossibilitada de prover o próprio sustento pelo seu trabalho.
Nesse cenário, o provimento de urgência liminar, que assegure o benefício
assistencial e proteção social é medida que se impõe.

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Caso não se considere aplicável aos Juizados Especiais Federais as disposições


relativas à tutela de urgência, ainda assim, nos termos do artigo 4º da Lei nº 10.259/2001, o
juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do
processo, para evitar danos de difícil reparação.
Ante a fragilíssima situação econômica, a demora na implantação do benefício a
que faz jus, acarretará à parte autora, invariavelmente, dano totalmente irreparável.
Considerando que se trata de prestação de natureza alimentar, ainda que sejam
futuramente pagos os valores em atraso, ao cabo de possivelmente longo processo judicial, o
que se vislumbra no momento é uma situação de pobreza extrema repentina, tendo em vista
que a parte autora está impossibilidade de trabalhar, em razão de sua deficiência, e teve seu
benefício indeferido.
Por outro lado, a probabilidade do direito está presente nos fatos alegados e nas
provas documentais trazidas aos autos, que formam o conjunto necessário à realização da
cognição sumária e à concessão da tutela pretendida.
Ainda de se notar que o juízo pode determinar todas as providências práticas
cabíveis para alcançar o resultado prático da tutela, tais como a imposição de multa sem
limitação de valor, realização de cálculos, restabelecimento imediato do benefício, dentre
outras (artigo 497, CPC).
Finalmente, não há qualquer tipo de vedação de tutela provisória em face do INSS
em causas previdenciárias (Súmula nº 729 do STF).
Consoante narrado, há provas que conduzem à probabilidade do direito,
apontando para a certeza de procedência do pedido inicial, visto que a parte requerente é
pessoa deficiente, enquadrando-se nos parâmetros exigidos para receber o benefício
assistencial.
Dessa forma, trata-se de verba alimentar, cujo imediato pagamento justifica-se
para concretizar o direito humano à alimentação adequada, examinado sob a ótica do direito
de estar livre da fome, o qual conflui para garantir a dignidade da pessoa humana.
Diante de todo o exposto, presentes estão os requisitos para a concessão da tutela
de urgência pleiteada, eis que patente o direito da requerente em receber a benesse e a

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urgência em razão da imprescindibilidade do benefício assistencial para a subsistência e de


sua família.

6. DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer:


a) O recebimento da presente ação;
b) A concessão do benefício da gratuidade da justiça à parte autora, nos termos do artigo 98
do CPC, em razão de não possuir condições financeiras de arcar com as custas, despesas
processuais e honorários advocatícios, sem prejuízo próprio e de sua família;
c) A intimação pessoal da Defensoria Pública da União de todos os atos do processo, na forma
do artigo 44, inciso I, da Lei Complementar nº 80/94;
d) A concessão da tutela de urgência em decisão liminar, diante da urgência do presente caso,
para o fim de ser determinado ao INSS a imediata concessão do Benefício de Prestação
Continuada (BPC) à pessoa com deficiência, em favor da parte autora, sob pena de incidência
de multa diária a ser fixada por este juízo;
e) A citação do INSS para, querendo, contestar os termos da presente demanda, no prazo
legal, com as advertências previstas no artigo 344 do CPC, bem assim, para que forneça toda
a documentação de que dispõe, para o esclarecimento da causa (artigo 11 da Lei nº
10.259/01);
f) Seja julgado procedente o pedido inicial, com condenação do réu à concessão do benefício
assistencial à parte autora, desde a data do requerimento administrativo 03/04/2019, e ao
pagamento das parcelas vencidas, com correção monetária e juros; ou
g) Subsidiariamente, caso seja o entendimento deste juízo, a concessão do benefício mais
vantajoso à autora.
Requer-se, ainda, a utilização de todos os meios de provas, notadamente
documental, perícia socioeconômica, médica e testemunhal.
Atribui-se à causa o valor de R$ 51.161,22 (cinquenta e um mil e cento e sessenta
e um reais e vinte e dois centavos), correspondente às parcelas mensais vencidas acrescidas de
doze vincendas.

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1º OFÍCIO GERAL – Boa Vista/RR

Termos em que pede deferimento.


Boa Vista/RR, datado eletronicamente.

JAQUELINE GUEDES MARINHO


Defensora Pública Federal

NATHÁLIA KAROLINE GOMES RODRIGUES


Estagiária da Defensoria Pública da União

Documentos Concatenados:

1. Questionário de Hipossuficiência;
2. Outorga;
3. Declaração de Veracidade de Informações;
4. RG dos integrantes do núcleo familiar;
5. Certidão de Nascimento do Filho da Requerente;
6. CTPS dos integrantes do núcleo familiar;
7. Comprovante de Cadastramento no Cad-Único;
8. Comprovante de Residência;
9. Extrato Previdenciário - CNIS;
10. Declaração INSS;
11. Documentos Médicos;
12. Extrato de Marizete;
13. Requerimento do benefício;
14. Comunicado de Decisão;
15. Valor da Causa.

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QUESITOS PARA PERÍCIA MÉDICA:

1. Qual a especialidade médica do Sr. Perito?


2. A parte autora é portadora de alguma patologia? Quais são as doenças indicando o
CID e suas consequências?
3. A parte autora se submete a tratamento médico regular, específico, eficaz e gratuito?
4. A partir dos laudos e exames juntados aos autos é possível atestar a data de início da
incapacidade da parte autora?
5. As lesões que acometem a parte autora reduzem ou impedem definitivamente o
exercício da atividade laborativa que habitualmente exercia?
6. Caso exista sequelas, as mesmas estão consolidadas?
7. As condições socioeducativas da parte autora a permitem de se reabilitar em outra
profissão? Em qual? O mercado atual comporta profissionais como a parte autora?
8. A parte autora em busca de emprego estaria em igualdade de condições (física, mental,
intelectual e sensorial) com as demais pessoas?
9. A parte autora pode ser considerada pessoa com deficiência?
10. Poderia o douto perito relacionar a medicação que a autora ingere para controle, as
enfermidades causam efeitos colaterais (sonolência, enjôos, cansaço físico e
intelectual, mal-estar, dentre outros)?
11. Caso a resposta para o quesito anterior tenha sido afirmativa, os efeitos colaterais da
medicação ingerida podem interferir na atividade ou desempenho profissional do
autora?

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