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investigacao-e-exploracao-favorecem-o-engajamento-o-pensamento-
cientifico-e-a-aprendizagem-significativa
Publicado em NOVA ESCOLA 09 de Junho | 2022

Valorização docente

Educador Nota 10:


atividades de investigação
permitem desenvolver
aprendizagens
significativas
Três dos projetos vencedores da 24ª edição do Prêmio
Educador Nota 10 propõem o trabalho com o levantamento
de hipóteses e a realização de pesquisas e entrevistas,
estimulando a autonomia e o protagonismo dos estudantes
Aline Naomi
A professora Cristiele Borges propôs diversas atividades de investigação para
estimular o desenvolvimento de aprendizagens de crianças bem pequenas.
Foto: Divulgação/Trupe
A investigação e a exploração são ferramentas essenciais para a aprendizagem,
sobretudo das crianças. Não é por acaso que explorar é um dos seis direitos de
aprendizagem na Educação Infantil propostos pela Base Nacional Comum
Curricular (BNCC), que têm como objetivo assegurar condições para o
desenvolvimento integral dos pequenos.
Segundo o documento, é direito da criança “explorar movimentos, gestos, sons,
formas, texturas, cores, palavras, emoções, transformações, relacionamentos,
histórias, objetos, elementos da natureza, na escola e fora dela, ampliando seus
saberes sobre a cultura, em suas diversas modalidades: as artes, a escrita, a
ciência e a tecnologia”.
“É muito importante essa exploração porque as crianças vão tomando
consciência do próprio processo de aprendizagem”, afirma Dayse Gonçalves,
formadora de professores e uma das selecionadoras dos projetos da 24ª edição
do Prêmio Educador Nota 10.
Entre os dez vencedores da edição de 2022, três trabalhos se destacam por
proporcionar experiências investigativas. São explorações que respondem a
perguntas genuínas dos estudantes, aspecto fundamental para a construção de
uma aprendizagem significativa.
Batatinha doce quando nasce…
Professora de crianças bem pequenas (dois e três anos) da EMEI Joaninha, em
Novo Hamburgo (RS), Cristiele Borges começou a pensar em seu projeto no
início de 2020, quando as aulas presenciais foram suspensas e o futuro da
pandemia ainda era incerto. A ideia era não só criar um vínculo das crianças
com a escola, mas também oferecer uma oportunidade de investigação a elas.
Teve início então a proposta do cultivo de batata doce na água. “Era algo que
podia gerar um cuidado, algo que as crianças pudessem ter em comum para
compartilhar como um objeto de discussão”, explica a professora.
Ela conta que o cultivo desse tubérculo na água também era algo novo para a
equipe escolar, uma vez que difere do já conhecido feijão no algodão. “O cultivo
do feijão costuma acabar muito rápido, e ninguém sabia quanto tempo mais as
escolas ficariam fechadas.”
Como as crianças dependiam da ajuda dos responsáveis, foram criados grupos
no WhatsApp com os familiares. Pelo aplicativo, foram compartilhados vídeos
registrando o processo e o levantamento de hipóteses das crianças sobre o que
aconteceria com as plantas.
Esses registros constituíram um perfil no Instagram, no qual consta também a
documentação de trabalhos realizados posteriormente com outros cultivos,
como o do girassol e o do milho de pipoca. Uma preocupação da educadora era
não mostrar somente o produto final do projeto, mas também todo o
processo.
“Não era só para as famílias enviarem, por exemplo, a foto do desenho da
criança, mas a criança desenhando e o que que ela estava contando. Porque
era isso que nos interessava para poder acompanhar a evolução dos alunos”,
ressalta Cristiele.
“Além de promover a autonomia das crianças nesse processo exploratório, o
projeto ajudou a desenvolver a comunicação — expressar-se é outro direito de
aprendizagem previsto na BNCC. Outro aspecto positivo foi a conexão das
famílias com a escola e também entre elas”, destaca a professora.
Cristiele Borges
Etapa: Educação Infantil (dois e três anos)
Projeto: A voz das crianças: conexões que aproximam
Escola: EMEI Joaninha, em Novo Hamburgo (RS)

Por que o projeto é inovador?


Criatividade com simplicidade. Cristiele usou uma experiência já conhecida —
a do cultivo do feijão no algodão — e a adaptou de forma simples e criativa.
Isso mostra que é possível oferecer práticas investigativas às crianças com
atividades e materiais comuns e acessíveis.
Foco no processo. Mais do que o produto final, o processo foi o centro de
interesse da professora. Também vale destacar a importância da documentação
para evidenciar o desenvolvimento de habilidades — como curiosidade para
aprender, autonomia e comunicação — ao longo do projeto.
Conexões na comunidade escolar. Ao aproximar as famílias da escola, o
projeto ajudou a estabelecer vínculos na comunidade escolar. “Uma família de
haitianos, mesmo sem saber falar português, recebeu apoio de outro grupo
para se comunicar com a escola”, lembra a professora Cristiele.

Aprender a aprender
A presença de aves quero-quero despertou uma série de investigações de
crianças pequenas em Santa Catarina. Foto: Divulgação/Trupe
Localizado em uma área de proteção ambiental, o Núcleo de Educação Infantil
Taquaras, em Balneário Camboriú (SC), costumava receber visitas constantes
das aves quero-quero. Esse fato chamou a atenção e despertou uma série de
dúvidas nos estudantes de quatro e cinco anos da professora Jaqueline Weiler.
Ela viu então a oportunidade de proporcionar uma experiência investigativa aos
seus alunos. “Entendi que aquilo não era só uma curiosidade passageira, mas
que ela poderia ser respondida. Eu vi ali uma potencialidade e comecei a
explorar mais o levantamento de hipóteses”, conta.
Dessa forma, a professora percebeu que poderia se inspirar nas etapas de uma
pesquisa científica para dar seguimento ao projeto. A princípio, todas as
hipóteses dos alunos sobre por que um quero-quero era maior do que outro e
do que eles se alimentavam, entre outras questões, foram registradas em uma
planilha
Na época, como os alunos estavam frequentando a escola em esquema de
rodízio, a professora trabalhava com uma parte da turma presencialmente e,
para a outra, ela enviava um vídeo com instruções para as atividades.
Uma das propostas foi o registro do comportamento dos quero-queros em
determinadas horas do dia. A documentação foi feita em uma planilha, mas
cada aluno podia registrar as informações da forma como quisesse, com
números, palitinhos ou desenhos. Ao longo desses registros, surgiam novas
hipóteses sobre os pássaros. “A ideia era que os alunos fossem os protagonistas
desse processo de exploração”, salienta a educadora.
Para verificar com a turma se as hipóteses correspondiam ou não à realidade, a
professora levou livros sobre o tema e organizou conversas com um biólogo e
um estudante de Medicina Veterinária. Isso foi fundamental para mostrar às
crianças que há formas de realizar pesquisa para além dos artigos da internet.
Segundo Jaqueline, o projeto fez com que as crianças aprendessem a aprender.
“Elas têm conhecimentos e informações de sobra, mas é [preciso] aprender a
aprender, como diz o título do projeto. Não só [conseguir] a informação pronta,
mas aprender a fazer pesquisa, estudar e buscar informação.”
Jaqueline Weiler
Etapa: Educação Infantil (quatro e cinco anos)
Projeto: A pesquisa como prática educativa: aprendendo a aprender com os
quero-queros
Escola: Núcleo de Educação Infantil Taquaras, em Balneário Camboriú (SC)
Por que o projeto é inovador?
Protagonismo dos alunos. Em todos os momentos do projeto, as crianças
foram incentivadas a refletir, questionar e buscar respostas de forma
autônoma. A professora atuou como mediadora, estimulando a discussão e
trazendo materiais para enriquecer a investigação.
Escuta ativa. Foi fundamental a educadora ter uma escuta ativa não só ao
longo do projeto, mas desde o início, ao perceber os questionamentos dos
estudantes como uma oportunidade de exploração. “Os projetos nascem da
escuta do educador”, diz Jaqueline.
Aprendizagem com significado. A pesquisa sobre os quero-queros levou as
crianças a se mobilizarem quando encontraram um ninho próximo a um campo
de futebol. Com a ajuda da professora, elas organizaram avisos e sinalizações
para garantir a segurança da ninhada. Esse engajamento comprova a
importância de uma aprendizagem conectada com o contexto do aluno.

Aprender brincando

A professora de Educação Física Rosalina de Lázaro estimulou os alunos a


investigarem brincadeiras da época de seus familiares. Foto: Divulgação/Trupe
Mesmo antes da pandemia, trabalhar com brincadeiras já fazia parte dos planos
de Rosalina de Lázaro, professora de Educação Física na EE José dos Santos, em
Aspásia (SP). Para começar, ela pediu aos seus alunos, dos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental, que perguntassem aos responsáveis do que eles
costumavam brincar quando crianças.
Dessas conversas, saiu uma lista de brincadeiras. As turmas então pesquisaram
sobre elas na internet e fizeram cartazes explicando as regras de cada uma. Nas
aulas, cada uma das cinco salas do 2º ao 5º ano ficou responsável por uma
dessas atividades. Mas tudo mudou com a chegada da pandemia e o
fechamento das escolas.
Com os alunos afastados, a coordenação organizou grupos de WhatsApp, nos
quais a professora enviava um roteiro e um vídeo explicando uma brincadeira.
“Às vezes, eu mesma fazia a brincadeira com a minha neta ou com a minha mãe
e aí gravava o vídeo”, lembra Rosalina.
De acordo com as orientações da professora, inicialmente, os alunos tinham de
realizar as brincadeiras já conhecidas em casa com a família, adaptando as
regras ao contexto e ao ambiente. Essas mudanças eram escritas e também
explicadas oralmente aos colegas.
Depois, as turmas fizeram entrevistas mais estruturadas com os familiares. “Até
produzi um vídeo ensinando a fazer um microfone de papel para eles
simularem a entrevista”, conta a professora. Os alunos seguiam um roteiro de
perguntas sobre brincadeiras e depois pediam que o adulto entrevistado lhes
ensinasse a brincar daquela forma.
Tudo foi registrado em vídeo e está documentado no blog do projeto. “Vieram
vídeos maravilhosos. Foi muito lindo e emocionante ver a satisfação dos avôs,
das avós, dos pais”, comenta Rosalina. As turmas também pesquisaram sobre
brincadeiras de origens africana e indígena, incentivando a ampliação do
repertório das crianças e a autonomia da pesquisa.
Ao final do projeto, os estudantes fizeram uma autoavaliação escrevendo o que
eles aprenderam ao longo do processo de investigação das brincadeiras. E
mesmo com aula uma vez por semana e dificuldade de acesso de alguns alunos
à internet, Rosalina viu resultados positivos na aprendizagem das crianças.
“Não tem uma receita pronta”, observa a docente. “O importante é o aluno
entender que existem essas brincadeiras e conhecê-las. A partir do momento
em que ele conhece essas brincadeiras, o professor tem de dar o pontapé
inicial e falar que os adultos brincavam, que eles também foram crianças.”
Rosalina de Lázaro
Componente e etapa: Educação Física (2º ao 5º ano do Ensino Fundamental)
Projeto: Brincadeiras de quintal
Escola: EE José dos Santos, em Aspásia (SP)
Por que o projeto é inovador?
Valorização das histórias e culturas. Com as entrevistas, os alunos puderam
valorizar as histórias e experiências das pessoas de seu convívio e também da
comunidade escolar. A pesquisa de práticas de origens africana e indígena
também contribuiu para reconhecer a importância dessas culturas no contexto
brasileiro.
Explorações múltiplas. Além de trabalhar os aspectos corporais, o projeto
permitiu desenvolver outras dimensões, como a cultural e a social. Isso tudo em
um contexto de pandemia e fechamento das escolas.
Além dos muros da escola. A atividade fez tanto sucesso que Rosalina recebeu
depoimentos de que as brincadeiras estavam sendo realizadas também por
alunos de outra instituição. “Nossos estudantes têm irmãos em uma escola de
Educação Infantil, mas mesmo quem não tinha irmãos lá estava participando”,
diz a professora.

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