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Patologias do Sistema Nervoso Central

Brasília-DF.
Elaboração

Tatiana Góes Freitas


Letícia Paranhos R. D. Coelho

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 5

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 6

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 8

UNIDADE I
PARALISIA CEREBRAL E ESCLEROSES........................................................................................................ 9

CAPÍTULO 1
PARALISIA CEREBRAL (PC)........................................................................................................ 10

CAPÍTULO 2
ESCLEROSE MÚLTIPLA (EM)....................................................................................................... 13

CAPÍTULO 3
ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA (ELA)................................................................................. 16

UNIDADE II
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS..... 18

CAPÍTULO 1
EPILEPSIA................................................................................................................................ 20

CAPÍTULO 2
HIDROCEFALIA........................................................................................................................ 27

CAPÍTULO 3
ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL (AVC).................................................................................... 29

CAPÍTULO 4
TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO DEVIDO À DOENÇA DE HUNTINGTON.................................. 31

CAPÍTULO 5
TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO DEVIDO A LESÃO CEREBRAL TRAUMÁTICA............................ 33

CAPÍTULO 6
TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO DEVIDO À DOENÇA DE PARKINSON..................................... 35

CAPÍTULO 7
TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO DEVIDO À DOENÇA DE ALZHEIMER...................................... 37

CAPÍTULO 8
TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO VASCULAR........................................................................... 43
CAPÍTULO 9
TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO FRONTOTEMPORAL.............................................................. 46

UNIDADE III
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO................................................................................................. 49

CAPÍTULO 1
DEFICIÊNCIA INTELECTUAL (DI)................................................................................................. 49

CAPÍTULO 2
TRANSTORNO DE DÉFICIT DE
ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE (TDAH)............................................................................................ 53

CAPÍTULO 3
TRANSTORNOS DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)............................................................................. 56

CAPÍTULO 4
TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DA APRENDIZAGEM.................................................................... 64

CAPÍTULO 5
TANV: TRANSTORNO DE APRENDIZAGEM NÃO VERBAL............................................................. 72

UNIDADE IV
CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AGNOSIA, APRAXIA, AFASIA E AMNÉSIA E PATOLOGIAS
FREQUENTES EM AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO...................................................................................... 75

CAPÍTULO 1
GNOSIAS................................................................................................................................ 76

CAPÍTULO 2
PRAXIAS.................................................................................................................................. 79

CAPÍTULO 3
AFASIAS.................................................................................................................................. 82

CAPÍTULO 4
AMNÉSIA................................................................................................................................. 84

CAPÍTULO 5
DEPRESSÃO............................................................................................................................ 85

CAPÍTULO 6
TRANSTORNO BIPOLAR DO HUMOR......................................................................................... 87

REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 90
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém
ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a
evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

5
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para
aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

6
Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

7
Introdução
Nesta apostila o leitor encontrará informações acerca de algumas das patologias oriundas
de alterações do Sistema Nervoso Central, tais como: Paralisia Cerebral, Esclerose
Múltipla, Esclerose Lateral Amiotrófica, Epilepsia, Hidrocefalia, entre outros. Estas
são atendidas em ambulatório neurológico e, eventualmente, em outros ambulatórios
complementares para o tratamento.

Abordaremos também algumas patologias que podem ser tratadas em ambulatório


neurológico e no psiquiátrico, podendo os profissionais de ambas as especialidades
encaminharem pacientes para o atendimento em neuropsicologia. Estas patologias
são consideradas como patologias neuropsiquiátricas, como: Doença de Alzheimer,
Transtorno Neurocognitivo Vascular e o Frontotemporal.

Algumas patologias que interferem no decorrer do desenvolvimento da criança também


serão abordadas, tais como a Deficiência Intelectual, o Transtorno de Déficit de
Atenção/Hiperatividade, o Transtornos do Espectro Autista, Transtornos Específicos
da Aprendizagem e o Transtorno de Aprendizagem Não Verbal.

O leitor encontrará informações sobre alterações da sensopercepção, apraxias, afasia e


amnésia, bastante importantes de serem conhecidos a fim de evitar confusão durante o
processo de avaliação e posterior reabilitação neuropsicológica.

Por último, saindo um pouco das patologias primariamente oriundas de alterações


do Sistema Nervoso Central, abordaremos brevemente sobre alguns transtornos
psiquiátricos que são comumente mal interpretados ao olhar do senso comum e que
merecem atenção especialmente no momento das entrevistas (inicial e devolutiva) com
o paciente e os familiares que possivelmente podem estar mais presentes.

Objetivo
» Transmitir conhecimentos sobre os diversos assuntos para que o aluno
possa perceber quais são aqueles que mais lhe agradam ou chamam a
atenção para futuro aprofundamento.

8
PARALISIA CEREBRAL UNIDADE I
E ESCLEROSES

Introdução
Neste primeiro momento, serão abordadas as patologias mais comuns decorrentes de
alterações em alguma região do Sistema Nervoso Central.

O sistema nervoso do organismo humano é dividido em duas partes, o Sistema Nervoso


Central (SNC) e o Sistema Nervoso Periférico (SNP). O SNC é constituído pelo encéfalo
e pela medula espinhal, e o SNP é formado por nervos e gânglios, que são responsáveis
pelo transporte de informações sensoriais entre o SNC e os demais órgãos do organismo.

No SNC encontram-se a substância cinzenta e a substância branca. A substância


cinzenta é formada pelos corpos de neurônios e a substância branca é constituída pelos
axônios, que são fibras nervosas. A cor esbranquiçada é devido à mielina que encobre
os axônios.

Mesmo que mínimas, quaisquer alterações da integridade do SNC, seja anatômica


ou funcional, podem trazer comprometimentos ao indivíduo em sua capacidade de
aprendizagem, inclusive no meio acadêmico, o que prejudica significativamente o
desenvolvimento intelectual caso o comprometimento do SNC ocorra nos primeiros
anos de vida.

É importante lembrar que “o córtex cerebral é a camada de substância cinzenta que


reveste os hemisférios cerebrais” (HAASE et al, 2013). Dependendo da localização de
origem, as patologias vasculares podem ser chamadas de “corticais”, quando originárias
no córtex; ou “subcorticais”, quando as lesões estão nas estruturas mais internas,
“abaixo do córtex”. As lesões corticais apresentam sintomas cognitivos e motores
súbitos, enquanto as subcorticais são mais discretas, inclusive com microinfartos
imperceptíveis em testes de rastreio, mas visíveis em exames de imagem.

As artérias cerebrais têm a função de irrigar grandes áreas cerebrais, e danos nestas
artérias de maior calibre são facilmente identificados pelos pacientes e por seus
cuidadores, pois a sintomatologia é evidente.

9
Objetivos
» Compreender os aspectos gerais sobre Paralisia Cerebral, Esclerose
Múltipla e Esclerose Lateral Amiotrófica.

» Identificar os sintomas que podem ser apresentados e ter atributos para


desmistificar possíveis estereótipos de que o paciente “não faz porque
tem preguiça” ou que “nunca vai conseguir fazer...”, especialmente junto
aos familiares e ambientes acadêmico ou laboral.

» Compreender a complexidade das referidas patologias e ter noção sobre


o trabalho do neuropsicólogo, especialmente no acolhimento tanto dos
pacientes quanto dos familiares.

CAPÍTULO 1
Paralisia Cerebral (PC)

A Paralisia Cerebral é caracterizada por desordens não progressivas que ocorrem no


desenvolvimento do cérebro, seja no período fetal ou na infância, que interferem nos
movimentos motores e posturais.

A paralisia cerebral é uma deficiência que não altera a inteligência, mas pode afetar
membros de diferentes formas:

» braço e perna de um dos lados do corpo;

» duas pernas;

» ambos os braços e pernas.

Existem diversos tipos de paralisia cerebral:

» Espástico: os músculos ficam tensos e contraídos. Ocorre devido a danos


no córtex motor e é o mais frequente.

» Discinético: movimentos involuntários ocorridos devido aos danos nos


gânglios da base.

10
PARALISIA CEREBRAL E ESCLEROSES │ UNIDADE I

» Atáxico: movimentos descoordenados, que afetam o equilíbrio e a


percepção do posicionamento do corpo no espaço. Ocorre devido a danos
no cerebelo.

» Tipos mistos: combinação de danos.

Os sintomas podem se apresentar em diferentes níveis de intensidade e acarretam em


uma limitação das experiências sensoriais. A criança com paralisia cerebral não vai ter
acesso às mesmas sensações decorrentes de atividades comuns a outras crianças, como
andar de bicicleta e perceber a relação entre o equilíbrio e a velocidade que impõe ao
pedalar; correr pela praia, sentindo as diferentes texturas da areia (quente, molhada,
fina...) no solado do pé; dar uma cambalhota; pular na piscina; entre outras.

Figura 1. Crianças brincando.

Fonte disponível em: <https://mibufc.files.wordpress.com/2012/08/pinturas-e-imagens-de-crianc3a7as-brincando.jpg>.

Já é sabido pela literatura que a limitação no desenvolvimento motor tem relação direta
com prejuízos no desenvolvimento cognitivo. Sendo assim, a criança com paralisia
cerebral muito comumente apresenta quociente intelectual abaixo da faixa média para
sua idade.

Pode haver dificuldades no desenvolvimento da comunicação, nas habilidades


visuoespaciais, além de a criança com paralisia cerebral precisar de maior tempo
para lidar com as informações, seja pela gravidade de seu quadro ou por privação de
oportunidades para aprender por tentativas e erros e por experimentação. Os cuidadores
e professores desta criança precisam ser instruídos sobre à necessidade que ela tem

11
UNIDADE I │ PARALISIA CEREBRAL E ESCLEROSES

de maior tempo para entender os estímulos do meio, para armazenar e expressar as


informações.

Antes de se formar em neuropsicologia, o profissional é psicólogo e, neste âmbito, deve


também atentar a questões emocionais do contexto de seu cliente/paciente. No caso
do atendimento da criança com paralisia cerebral, o profissional da psicologia deve
observar a maneira com que os pais, em especial a mãe, lidam com as dificuldades
da criança. Em alguns casos, faz-se necessário uma ou mais sessões específicas com a
mãe ou os cuidadores para entender quais eram as expectativas sobre a criança desde
a gestação, como lidaram com o diagnóstico, como esta criança foi recebida neste lar,
o que esperam dela etc. É importante orientar para que estes adultos evitem limitar
ainda mais esta criança, por motivos psicodinâmicos próprios deste(s) adulto(s). Um
contexto facilitador é extremamente importante para que esta criança aprenda a lidar
com os frequentes fracassos que irão surgir, tanto em meio acadêmico quanto no social.

O diagnóstico de paralisia cerebral é feito por um neurologista infantil, com base na


história de vida e das características clínicas encontradas em sua avaliação, incluindo
as alterações motoras, “retardo no desenvolvimento, persistência de reflexos arcaicos,
anormalidades posturais e outros sinais patológicos” (TABAQUIM; JOAQUIM, 2013).

Quando é solicitada a avaliação neuropsicológica, os testes devem ser pensados a fim


de propiciar a execução por parte do paciente. Evita-se, então, utilizar testes como
o subteste “cubos” (WISC) em crianças cuja manifestação motora não lhe permita a
manipulação adequada. Para avaliação da capacidade de raciocínio geral de crianças
de 3 a 9 anos, pode-se utilizar a Escala de Maturidade Mental Columbia, que não exige
uma resposta verbal, tem apresentação lúdica e não é tão complexa quanto o Raven.

A paralisia cerebral é uma síndrome ocorrida geralmente por falta de oxigênio


ou hemorragia no cérebro, na hora do nascimento, e pode abranger:

» diminuição da coordenação motora;

» rigidez e perda da força muscular;

» descontrole de membros, cabeça e olhos;

» tremores.

A reabilitação é feita com fisioterapia e terapia ocupacional para auxiliar no combate da


rigidez muscular.

12
CAPÍTULO 2
Esclerose Múltipla (EM)

Esclerose múltipla é uma doença crônica decorrente de comprometimento nos circuitos


subcorticais do Sistema Nervoso Central, devido à desmielinização, que é a perda
progressiva da bainha de mielina sobre os nervos. Afeta o cérebro, a medula espinhal e
o nervo óptico. Algumas características são:

» origem em uma disfunção do sistema imunológico;

» deterioração da mielina.

Algumas informações relevantes sobre o funcionamento neuronal:

» mielina é o tecido que protege as fibras nervosas e garante a transmissão


de informações entre os neurônios;

» na esclerose Múltipla, a mielina é danificada ou destruída;

» as lesões da mielina provocam falhas na condução das informações;

» as fibras nervosas transmitem os sinais dos nervos para o cérebro e o


restante do corpo;

» com o comprometimento ou bloqueio dos sinais nervosos, as fibras vão


transmitir sinais também modificados;

» ao receber sinais nervosos comprometidos, surgem sintomas da doença,


tais como a perda da aptidão física, redução da eficiência intelectual,
entre outros.

Figura 2. Desmielinização.

Fonte disponível em: <https://images1.minhavida.com.br/imgHandler.ashx?mid=35093>.

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UNIDADE I │ PARALISIA CEREBRAL E ESCLEROSES

Afeta pacientes jovens, com início entre os 20 e 30 anos. O indivíduo acometido


pode apresentar uma série de sintomas, tais como: extremo cansaço, diminuição da
acuidade visual, desequilíbrio, falhas mnésticas, disfasia (linguagem), ataxia (motora).
Cerca de 30% dos pacientes com Esclerose Múltipla têm dificuldades de memória
(MALLOY-DINIZ et al., 2015).

Os sintomas aparecem em diferentes regiões do nosso organismo.

REGIÃO ALGUNS SINTOMAS MAIS COMUNS


» Fadiga.
» Depressão.
Central
» Instabilidade de humor.
» Comprometimento cognitivo.
» Nistagmo
(oscilações rítmicas, repetidas e involuntárias de um ou ambos os olhos).
Visual
» Neurite óptica
(inflamação do nervo óptico).
» Disfagia
Garganta
(dificuldade de engolir).
» Disartria
Fala
(dificuldade para articular as palavras para falar).
» Fraqueza.
» Espasmos
Musculoesquelética (contração muscular súbita e involuntária).
» Ataxia
(perda do controle muscular durante a realização de movimentos voluntários).

Em uma ou mais regiões também pode haver sensação de dor, hipoestesia ou parestesia.

Até o momento conta com uma ampla gama de opções terapêuticas bastante eficazes,
mas ainda é uma doença que não tem cura. O tratamento é feito com um neurologista
e tem o objetivo de evitar os picos de processo inflamatório. Mesmo com a medicação,
é possível que sintomas ainda sejam relatados, porém, em uma intensidade mais
abrandada. O estado emocional do indivíduo interfere significantemente em sua
percepção da doença e de seus sintomas.

É preciso investigar as queixas a fundo, a fim de entender quais são suas causas.
Por exemplo: se o paciente informa estar triste, é importante averiguar se ele tem
vontade de realizar as atividades que fazia antes da doença. Em caso negativo, pode-se
investigar sobre a probabilidade de uma depressão. Caso o indivíduo tenha interesse,
mas apresente extremo cansaço, talvez se trate de uma fadiga física.

É importante que o profissional faça orientações, inclusive por meio de um documento


ou reunião à empresa em que o paciente trabalha, informando sobre a necessidade

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PARALISIA CEREBRAL E ESCLEROSES │ UNIDADE I

de intervalos para descanso mais frequentes, para que os patrões saibam como é a
melhor maneira de extrair o melhor rendimento deste profissional, evitando julgar a
doença como uma preguiça ou má vontade, o que pode interferir negativamente em
uma avaliação de desempenho.

Em testes de aprendizado/memória, provavelmente este paciente apresentará alguma


dificuldade na evocação dos estímulos previamente apresentados. Ao trabalhar no
programa de reabilitação neuropsicológica, o uso de dicas/pistas é bastante útil para
auxiliar nesta etapa de evocação, visto que os estímulos foram registrados.

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CAPÍTULO 3
Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)

Trata-se de uma doença degenerativa com comprometimento progressivo dos neurônios


motores localizados no cérebro e na medula espinhal. Conforme as células nervosas vão
perdendo sua capacidade de transmitir impulsos nervosos, é dada origem à doença.

Os sintomas mais comuns incluem a paresia gradual da musculatura dos membros,


disfagia (dificuldade de deglutição), disartria (dificuldade na articulação) e dispneia
(dificuldade respiratória). Pode haver paralisia progressiva de todos os músculos sobre
os quais, em condições saudáveis, temos domínio voluntário sobre sua movimentação
e articulação.

Sendo assim, é um paciente com dificuldade para engolir alimentos, o que pode acarretar
em desnutrição, se não for devidamente assistido; não consegue se expressar de forma
suficiente a ser compreendido com facilidade, o que pode gerar frustrações emocionais.
Também podem apresentar fraquezas na musculatura respiratória, o que é uma causa
comum de morte dos pacientes acometidos com ELA.

Outros sintomas são:

» endurecimento muscular;

» atrofia muscular;

» cãibras;

» tremor muscular;

» espasmos;

» diminuição ou perda da sensibilidade.

A morte dos neurônios interfere no funcionamento dos músculos do organismo


humano, comprometendo, progressivamente, a fala, a deglutição, além dos músculos
dos membros. A consciência e os órgãos dos sentidos permanecem inalteradas.

O início dos sintomas ocorre próximo aos 54 anos, abruptamente e com sobrevida média
de 3 a 5 anos. É uma doença que ainda não tem cura. Metade dos pacientes morre em 30
meses e 20% pode sobreviver de 5 a 10 anos. O tratamento é majoritariamente médico,
mas com melhor eficácia se houver cuidado multidisciplinar abrangendo os serviços de
psicoterapia, fonoaudiologia, fisioterapia e acompanhamento nutricional.

16
PARALISIA CEREBRAL E ESCLEROSES │ UNIDADE I

Com as dificuldades motoras progressivas, é natural que o paciente vá tendo cada vez
mais dificuldade funcional e torne-se dependente para atividades diárias. A somatória
das incapacidades e da extrema dependência comumente geram irritabilidade,
sintomas ansiosos e depressivos no paciente, o que pode acarretar em conflitos com os
familiares ou cuidadores que lhe auxiliam, caso estes não tenham estrutura emocional
suficientemente fortalecida para lidar com o doente. Neste sentido, a psicoterapia,
sendo individual ou familiar, é indicada como suporte para a dinâmica familiar e melhor
qualidade de vida dos envolvidos.

Há poucos estudos sobre a cognição de pacientes acometidos com Esclerose Lateral


Amiotrófica. O que se sabe é que há déficits cognitivos abrangendo principalmente as
funções executivas e aspectos da linguagem e de memória. Alterações do comportamento
dos indivíduos com ELA são muito semelhantes às encontradas em indivíduos com
Transtorno Neurocognitivo Frontotemporal.

Uma escala globalmente utilizada por profissionais da saúde, em geral o médico,


para avaliação da funcionalidade do indivíduo com Esclerose Lateral Amiotrófica é a
“Amyotrophic Lateral Sclerosis Functional Rating Scale-Revised”.

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PATOLOGIAS FREQUENTES
EM AMBULATÓRIO
NEUROLÓGICO UNIDADE II
E TRANSTORNOS
NEUROCOGNITIVOS

Introdução
O neuropsicólogo que trabalha com maior proximidade a serviços neurológicos, com
frequência vai receber encaminhamentos de casos de pacientes acometidos com
Epilepsia e decorrentes de Acidentes Vasculares.

No caso das epilepsias, é muito comum a necessidade de avaliação pré e pós-operatória


daquele paciente que ainda apresenta sintomas, mesmo com ingestão correta de
medicação. Quando a medicação não é suficiente para controle dos sintomas epilépticos,
a equipe de neurologia pode oferecer ao paciente a possibilidade de fazer neurocirurgia
para remoção ou abrandamento dos sintomas. A avaliação neuropsicológica vem
para evidenciar e comparar os déficits e habilidades do paciente antes e depois da
neurocirurgia.

Ao lidar com casos de Acidente Vascular Cerebral (AVC), o neuropsicólogo encontrará


uma gama de queixas, dependendo da localização e da dimensão das alterações.
Geralmente os encaminhamentos solicitam avaliação global das funções cognitivas.
A avaliação dos aspectos afetivos e de personalidade também deve ser considerada a
fim de melhor orientar o paciente e seus familiares.

A hidrocefalia é uma patologia importante de ser conhecida a fim de que o profissional


possa estar atento aos sintomas e verificar a possibilidade de realização de avaliação
neurológica e/ou exame de imagem para um diagnóstico preciso, pois os sintomas
desta doença são reversíveis após a neurocirurgia. Nem sempre o paciente vem
ao neuropsicólogo com a hipótese diagnóstica de hidrocefalia, ainda mais se vier
encaminhado de outro profissional que não seja o neurologista.

O termo “demência” utilizado no DSM-IV foi substituído por “transtorno neurocognitivo


maior” no DSM-V, que engloba outras patologias. Algumas delas são:

» Transtorno Neurocognitivo devido à doença de Alzheimer.

» Transtorno Neurocognitivo vascular.


18
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

» Transtorno Neurocognitivo devido à doença de Parkinson.

» Transtorno Neurocognitivo Frontotemporal.

» Transtorno Neurocognitivo devido a lesão cerebral traumática.

» Transtorno Neurocognitivo devido à doença de Huntington; entre outros.

A categoria Transtorno Neurocognitivo abrange o grupo de transtornos em que o déficit


clínico primário esteja entre as funções cognitivas e que não estavam presentes no
nascimento.

Tratemos, então, de um estado de dificuldades em determinado grau, em que há


comprometimento da memória concomitante a comprometimento em alguma função
da vida diária.

Alguns transtornos são reversíveis, tais como os ocasionados por drogas, questões
emocionais, metabólicas, endócrinas, nutricionais, cardiovasculares, infecciosas. Ao
tratar a origem, os sintomas “demenciais” também deixam de se apresentar.

Outros casos não têm reversibilidade, tais como o Transtorno Neurocognitivo devido à
doença de Alzheimer, o Transtorno Neurocognitivo Vascular, Transtorno Neurocognitivo
Frontotemporal, entre outros. O melhor tratamento para adiar a progressão da maioria
destes transtornos é aliar medicação com reabilitação neuropsicológica.

Objetivos
» Elucidar sobre patologias mais comuns de ambulatório neurológico com
demanda de avaliação neuropsicológica.

» Transmitir conhecimentos sobre a atuação do neuropsicólogo em cada


caso.

» Fornecer ao aluno conhecimentos sobre Transtornos Neurocognitivos


para que seja capaz de identificá-los.

» Transmitir conhecimentos sobre a atuação do neuropsicólogo junto às


referidas patologias.

19
CAPÍTULO 1
Epilepsia

A epilepsia é um distúrbio cerebral caracterizado por crises epilépticas. É necessário


que ocorra, pelo menos, duas crises dentro de um intervalo de 24h para que seja
caracterizada.

Crises epilépticas são o desequilíbrio entre excitação e inibição de impulsos da atividade


elétrica cerebral. Há descargas súbitas, excessivas e descontroladas de um grupamento
neuronal, ocorrendo de modo espontâneo ou secundário a eventos exógenos.

As crises epiléticas também são chamadas de manifestações ictais. Ocorrem,


predominantemente, no córtex cerebral e sua atividade é geralmente intermitente e
recorrente.

É importante frisar que crise não é sinônimo de convulsão, pois pode haver crise que não
seja convulsiva. Convulsões são especificamente as crises com manifestação motora,
em que há episódios de contração muscular excessiva ou anormal.

As crises podem ser decorrentes de uma disfunção neuronal focal ou generalizada.

Figura 3. Crises epilépticas.

Fonte disponível em: <http://lh3.ggpht.com/-X4m5_0w9ciw/T2-e1MgXFCI/AAAAAAAAGpk/_36y31B_TSE/image_


thumb%25255B26%25255D.png?imgmax=800>.

As crises parciais ou focais são as mais comuns. Têm origem em redes neuronais
específicas de um dos hemisférios cerebrais e podem se originar em estruturas
subcorticais.

As crises parciais podem ser simples ou complexas.

» As crises parciais simples têm início súbito, com duração breve e não há
perda da consciência. Nem sempre apresenta sintomas e pode ser seguida
de uma fraqueza transitória.

20
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

» As crises parciais complexas vêm acompanhadas de perda da consciência,


em que não há contato com o ambiente. Durante a crise, alterações
motoras são comuns, podendo apresentar movimentos mastigatórios;
movimentos intensos das mãos e dedos; caretas; rasgar roupas; pegar e
soltar de maneira repetitiva um objeto; entre outras ações sem sentido.
Após a crise o indivíduo apresenta confusão mental e amnésia.

As crises parciais generalizadas se originam em algum ponto de uma rede neuronal


e rapidamente se propagam em redes neuronais de ambos os hemisférios cerebrais.
Podem incluir estruturas corticais e subcorticais e perda da consciência.

Dentre as crises generalizadas, existe a crise de ausência, a crise tônica, a crise clônica,
a crise tônico-clônica (mais comum) e a crise mioclônica, descritas a seguir:

» Crise de ausência: perda súbita da consciência (não mais que 30


segundos). O indivíduo fica estático, com fixação do olhar, sem responder
aos estímulos. Pode acontecer muitas destas crises ao longo do dia.

» Crise tônica: contrações musculares repentinas e duradouras, deixando


os membros tensos, estendidos com duração de poucos segundos ou
minutos. Há perda de consciência e, comumente, desvio dos olhos e
cabeça para um lado ou até rotação de todo o corpo.

» Crise clônica: contrações musculares do corpo ou membros, movimentos


de flexão e estiramento dos membros de forma repetitiva e rítmica,
com duração de poucos segundos ou minutos. Pode haver flexão de um
membro e giro do pescoço.

» Crise tônico-clônica: perda súbita da consciência, queda ao solo e o


indivíduo pode emitir um grito ou gemido. Há uma rigidez generalizada,
em que a cabeça fica retraída, os braços flexionados e as pernas extendidas
(fase tônica). Posteriormente, ocorre uma fase em que os músculos
alternadamente relaxam e se contraem, surgindo os abalos clônicos de
grande amplitude. Durante a fase clônica desta crise, o indivíduo pode
morder a língua ou evacuar. A duração média é de 3 minutos e, no período
pós-ictal, o indivíduo vai recuperando a consciência aos poucos, podendo
sentir cansaço, dor de cabeça, confusão e sonolência.

» Crise mioclônica: abalos musculares abruptos, rápidos e repetitivos,


simétricos nas extremidades, em que é comum deixar cair objetos das
mãos. O indivíduo mantém-se consciente e descreve sensação de “choque
elétrico”.

21
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

O chamado Estado de Mal Epiléptico é caracterizado por uma crise de duração


prolongada ou por duas ou mais crises seguidas, mas sem a retomada completa da
consciência entre estas crises, podendo provocar uma condição duradoura.

Sabe-se que as crises vão ocasionar sintomas de acordo com a região envolvida.

Quanto à etiologia, a epilepsia é chamada Idiopática é aquela de causa genética. Em


casos em que a epilepsia foi originada a partir de uma lesão, chama-se de epilepsia
Sintomática. E quando não se sabe a causa, chama-se de epilepsia Criptogênica.

A variante mais estudada entre as epilepsias de etiologia idiopática é a Epilepsia


mioclônica juvenil. Esta é uma síndrome generalizada, com início na adolescência,
geralmente precipitada por privação do sono, fadiga, abuso de álcool e estimulação
luminosa. Estes jovens apresentam maiores dificuldades no desempenho de tarefas
que envolvem a formação de conceitos, abstração, flexibilidade mental, velocidade de
processamento e planejamento.

Entre as epilepsias parciais, a mais frequente é a Epilepsia de Lobo Temporal. Os


pacientes acometidos com este tipo descrevem alterações psíquicas momentâneas,
como medos, dejà vu (sensação de que já esteve em determinado lugar ou já fez a
mesma coisa antes) e o jamais vu (esquecimento total de algo cotidiano). Descrevem,
também, sensações gástricas crescentes, como “uma bola que vai subindo”; alucinações
olfativas ou gustativas; palpitações (percepção dos batimentos cardíacos), piloereção
(ereção dos pelos, conhecida por “arrepios”); alterações gastrointestinais.

Na avaliação neuropsicológica, as disfunções comumente encontradas em indivíduos


com epilepsia de lobo temporal são as alterações de linguagem envolvendo nomeação,
déficits mnésticos e disfunções executivas. Estudos atribuem este perfil como “reflexo do
espraiamento de descargas epileptiformes em um circuito temporofrontal” (FUENTES
et al, 2008).

A Epilepsia de Lobo Frontal vai apresentar sintomatologia diferente, dependendo


da área específica que for afetada na região frontal. A maior parte dos prejuízos está
relacionada às funções motoras e de funções executivas. Dentre as alterações motoras
podem ocorrer movimentação excessiva dos membros, alterações posturais, entre
outras, geralmente em crises com duração de 10 a 30 segundos. Impulsividade,
agressividade e labilidade do humor são alterações comportamentais comuns.

Epilepsia do Lobo Parietal e do Occipital são menos frequentes. Quando ocorridas


no Lobo Parietal, são comuns as parestesias contralaterais. Alucinações visuais e
movimentos dos olhos e da cabeça são uma característica encontrada em Epilepsia do
Lobo Occipital.

22
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

Em crianças, a epilepsia interfere no aprendizado acadêmico e há uma relação entre


menor idade de início das crises e menor desempenho nas disciplinas escolares. Sendo
assim, quanto mais velha for a criança em seu primeiro episódio, menor será o impacto
acadêmico. Em crianças, com a remissão das crises, muito frequentemente há melhora
no rendimento acadêmico.

Independentemente do tipo de síndrome epiléptica, as crises levam ao dano neuronal,


e a cada crise, os danos aumentam. Nem todos os casos têm as crises cessadas com
medicamento. Estima-se que cerca de 30% dos casos permaneçam com as crises
refratárias ao tratamento medicamentoso. Nestes casos em que não há constatação de
diminuição ou interrupção das crises, a realização de neurocirurgia é necessária.

O diagnóstico é realizado por meio de entrevista descritiva das crises. O exame de


eletroencefalograma (EEG) também é necessário para a caracterização da atividade
elétrica cerebral.

Figura 4. Tipos de crises epilépticas.

Fonte disponível em: <http://i.imgur.com/8MBlzkM.jpg>.

Ao atender um indivíduo com epilepsia, é importante que, tanto paciente quanto seus
familiares, sejam orientados quanto à necessidade de ingestão medicamentosa correta
e manutenção das consultas com neurologista, mesmo na ausência das crises.

A avaliação neuropsicológica de pacientes com epilepsia vai auxiliar a compreender


a dimensão do impacto da síndrome na funcionalidade e auxiliam no prognóstico,
revelando quais são as potencialidades e as maiores dificuldades do indivíduo; e

23
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

orientando para possíveis atividades que podem ser realizadas em seu cotidiano. A
avaliação pode, também, fazer acompanhamento da evolução do indivíduo.

Antes da aplicação de qualquer teste é importante entender o caso detalhadamente, por


meio de entrevistas com o paciente, com os familiares e com profissionais da saúde que
atendem este paciente. Esta coleta de dados tem o objetivo de entender, basicamente, “o
tipo e a frequência das crises, as medicações em uso e como estes fatores se manifestam,
atualmente, sobre a cognição e o comportamento” (PAULA; COSTA, 2016).

A próxima etapa vai incluir a aplicação de testes com o objetivo de responder às


solicitações de quem requeriu a avaliação. É importante caracterizar as habilidades
pré-mórbidas, geralmente através de testes que avaliam a inteligência cristalizada e
por meio de entrevista detalhada com os familiares ou pessoas de convívio acadêmico
ou profissional do paciente.

A avaliação neuropsicológica pode ser solicitada no momento pré-operatório a fim


de mensurar o estado cognitivo e emocional do sujeito ainda com a sintomatologia
epiléptica. Os mesmos testes devem ser utilizados para a avaliação pós-operatória,
garantindo melhor comparação de desempenho pré e pós cirúrgico. O objetivo é
averiguar quais déficits estavam presentes com a doença e em quais funções houve
melhora, assegurando ao paciente e à equipe médica, a realidade cognitiva do paciente
em questão.

Da mesma forma com que o profissional da neuropsicologia se interessa mais pelo


resumo dos resultados de exames de imagem, profissionais de outras áreas precisam
ter acesso prático aos dados obtidos no exame neuropsicológico.

Assim, em um ambiente multidisciplinar, o neuropsicólogo precisa organizar os dados


de maneira prática para que a discussão em equipe seja fluida e que todos possam
entender quais são as potencialidades e as dificuldades dos pacientes.

Uma sugestão para esta situação é que os resultados abaixo da média sejam apresentados
na cor vermelha e aqueles na faixa média, ou acima desta, em verde. A autora enfatiza
que, para os pacientes, é importante manter a prática de entregar um relatório descritivo
e fazer as devidas orientações.

É sempre importante lembrar que o neuropsicólogo é livre para escolher suas técnicas
avaliativas, mas também precisa estar bastante esclarecido sobre o diagnóstico e suas
variações, inclusive quanto aos fatores que podem interferir na execução de uma tarefa.
Como os testes e outros instrumentos não são absolutos, devem ser interpretados
dentro do contexto, pois nada substitui o raciocínio clínico.

24
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

Algumas orientações sobre a epilepsia são imprescindíveis ao público em geral, ao


presenciar uma crise convulsiva, tais como:

» procurar manter a calma;

» tentar virar a cabeça do indivíduo para o lado, para que a saliva não
impeça a respiração;

» proteger a cabeça com algo suave, pode apoiar na perna de alguém


(preferencialmente na coxa) ou em uma peça de roupa dobrada;

» não colocar nada na boca na pessoa, nem objeto nem nada líquido;

» não tente despertar o indivíduo;

» permaneça ao lado do indivíduo até terminar a crise e informe-o do


ocorrido com o máximo de tranquilidade possível, evitando maiores
constrangimentos.

Figura 5. Como agir diante de crise convulsiva.

Fonte disponível em: <http://3.bp.blogspot.com/-cfUJgfzxwso/Tbsw7jQZtrI/AAAAAAAAAJs/2s1PhLMAIsE/s1600/epilepsia-ajuda.


jpg>.

1. Mantenha-se calmo e acalme quem assiste à crise.

2. Coloque a pessoa de lado, com a cabeça baixa, de modo que a saliva possa
escorrer para fora da boca.

25
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

3. Desaperte a roupa em volta do pescoço.

4. Ponha qualquer coisa macia debaixo da cabeça da pessoa. Pode ser sua
mão ou sua perna, impedindo-a de bater a cabeça no chão ou em objetos
próximos.

5. Permaneça junto da pessoa até que volte a respirar calmamente e comece


a acordar.

6. Ofereça-se para ajudar no regresso para casa ou chamar alguém da


família.

É muito comum a pessoa ficar constrangida, principalmente se tiver muita gente olhando.
Neste caso, reações hostis, como uma defesa do ego, podem ocorrer. É importante que
a pessoa seja respeitada, caso não queira conversar após a crise ou não queira ajuda.

Figura 6. O que NÃO fazer.

Fonte disponível em: <https://crescercomsaude.files.wordpress.com/2009/05/epilepsia2.jpg?w=510&h=379>.

1. Não coloque nada na boca da pessoa, ela pode morder e se machucar.


Também não tente puxar a língua da pessoa.

2. Não tente acordar nem force a pessoa a se levantar.

3. Não lhe dê NADA para beber (nunca dê líquidos a alguém que está
inconsciente).

26
CAPÍTULO 2
Hidrocefalia

O líquido que envolve e circula pelo Sistema Nervoso Central é chamado de líquor. Este
é produzido no cérebro pelo plexo coroide. O cérebro saudável produz uma gota de
líquor a cada dez segundos, em média. Ao ser produzido, passa pelo ventrículo lateral,
depois pelo forame de Monro, pelo 3o ventrículo, pelo aqueduto, pelo 4o ventrículo e,
por último, é absorvido nas granulações.

Figura 7. Circulação liquórica.

Fonte disponível em: <http://www.raquelzorzi.com.br/hidrocefaliaemcriancas>.

Caso ocorra algum incidente cerebral, seja uma infecção nas granulações ou
traumatismo craniano, um AVC... em que haja sangramento que se misture ao
líquor, esse sangramento vai circular junto ao líquor e, ao chegar nas granulações, vai
entupi-las. Entupindo, o líquor não pode ser absorvido. Sendo assim, fica excedente,
pois o cérebro continua produzindo. A Hidrocefalia é o acúmulo de líquor no cérebro.

Figura 8. Hidrocefalia.

Fonte disponível em: <https://static.tuasaude.com/img/posts/2014/11/50d2469c231355d8dabc861b30847e03-640_427.


jpeg>.

27
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

Figura 9. Hidrocefalia em exame de imagem.

Fonte disponível em: <http://www.neurocranioecoluna.com.br/site/images/neurocirurgia/hidrocefalia_01.jpg>.

A hidrocefalia de pressão normal caracteriza-se por alterações cognitivas subcorticais,


apresentadas como declínio, apraxia da marcha e incontinência urinária. O exame de
neuroimagem é capaz de revelar um aumento do volume do sistema ventricular e leve
atrofia cortical.

O paciente com hidrocefalia apresenta marcha comprometida apraxicamente.


A habilidade motora é preservada, o indivíduo consegue andar, mas a praxia da
marcha é alterada, o paciente anda sem boa desenvoltura, como se fosse uma criança
aprendendo a andar.

O tratamento é neurocirúrgico. Na grande maioria dos casos, punções liquóricas


(líquido que percorre o Sistema Nervoso Central) repetidas trazem melhorias sobre a
cognição e a marcha. Em outros casos, a implantação de uma válvula para regulagem
do fluxo já é suficiente. Faz-se importante fazer fisioterapia, reabilitação cognitiva e
outras intervenções indicadas a cada caso.

28
CAPÍTULO 3
Acidente Vascular Cerebral (AVC)

O acidente vascular cerebral é causado pelo comprometimento do fluxo sanguíneo ou


ruptura aguda de vasos que fluem para o cérebro. Há dois tipos de AVC:

» AVC Isquêmico: de ocorrência frequênte (cerca de 80% dos casos), este


tipo é decorrente de comprometimento do fluxo sanguíneo em alguma
região do encéfalo, causado por um coágulo. Lembrando que o sangue
é responsável por levar nutrientes e oxigênio para o tecido cerebral, se
ele não alcança determinada região do cérebro, isso poderá causar a
morte dos neurônios daquela região. Os sintomas do AVC isquêmico são
percebidos como iniciados “de repente”. No AVC isquêmico transitório,
os sintomas são passageiros. Algumas causas de AVC isquêmico são:
infarto, fibrilação atrial, doenças nas válvulas coronárias, cardiopatia
chagásica.

» AVC Hemorrágico: menos comum, ocorre por rompimento de algum


vaso sanguíneo cerebral, que ocorre muito em pacientes hipertensos e
pela ruptura de aneurismas cerebrais. O paciente sente dores de cabeça
muito fortes, podendo vir acompanhadas de fraqueza e/ou sonolência.
Os danos nas regiões do cérebro afetadas, podem ser irreversíveis.

Figura 10. AVC Isquêmico e AVC Hemorrágico.

Fonte disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/-6297XOeC4Yo/VjtFlhp5YdI/AAAAAAAAHmg/x3iAxHykoSs/s1600/fhAEhzg.jpg>.

29
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

Sabemos que o oxigênio é transportado pelo sangue. Sendo assim, as células nervosas
da área afetada ficam privadas de oxigênio, o que impede seu funcionamento. Com isto,
a parte do corpo que é controlada por estas células também sofre impacto, apresentando
fraquezas ou incapacidade de funcionar. Pode ocorrer, ainda, perda da consciência, do
funcionamento cerebral como um todo, sendo a causa mais comum de incapacidade
e morte. A maior incidência é em idosos, hipertensos, diabéticos, fumantes e pessoas
com colesterol alto.

É importante reconhecer os sintomas o mais breve possível, pois o tratamento de


desobstrução do coágulo para a minimização de sequelas deve ser feito nas primeiras
4 horas.

De acordo com o DSM-V, as evidências de doença cerebrovascular encontradas em


exames de neuroimagem (ressonância magnética ou tomografia computadorizada)
englobam um ou mais dos seguintes eventos:

» um ou mais dos grandes vasos infartados ou hemorrágicos;

» um único infarto ou hemorragia situada em uma região específica do


cérebro, como o giro angular, o tálamo, ou porções anteriores e basais do
cérebro;

» dois ou mais infartos lacunares fora do tronco cerebral;

» lesões extensas e confluentes da substância branca;

Nos exames de neuroimagem, as lesões de substância branca aparecem descritas como


“doença do vaso menor”, ou “mudanças isquêmicas subcorticais”.

30
CAPÍTULO 4
Transtorno Neurocognitivo devido à
doença de Huntington

Esta doença é uma desordem degenerativa, com comprometimento nos circuitos


subcorticais, com perdas específicas de neurônios do estriado, que é composto pelo
núcleo caudado e putamen.

Figura 11. Corpo Estriado.

Fonte disponível em: <https://www.psicoactiva.com/atlas/estriado.jpg>.

De condição genética, a doença conduz à deterioração progressiva do sistema nervoso.


Manifesta-se a partir dos 40 anos de idade, o tempo de evolução médio da doença é de
15 anos após o diagnóstico dos sintomas motores. Só há tratamento sintomático,
o que leva o paciente, inexoravelmente, ao óbito.

Ocorrem mudanças cognitivas, comportamentais e motoras, comumente nesta ordem.


Prejuízos cognitivos são progressivos e incluem alterações nas funções executivas,
mais especificamente na velocidade de processamento, organização e planejamento.
As mudanças comportamentais estão altamente associadas ao declínio funcional, como
a depressão, irritabilidade, ansiedade, sintomas obsessivo-compulsivos, desinibição e
mudanças de personalidade. Entre as alterações motoras, os pacientes apresentam um
quadro, chamado Coréia, caracterizado por distúrbio de movimento, que acomete todas
as regiões do corpo, tais como: movimentos bruscos, hipercinéticos e involuntários.

Com a progressão da doença, os pacientes apresentam prejuízo intenso da marcha


e os movimentos involuntários e desordenados mais graves podem interferir

31
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

significativamente no autocuidado, como tomar banho, vestir-se e ir ao banheiro,


tornando o indivíduo acometido cada vez mais incapacitado, inclusive para andar.
No estágio terminal, o controle motor para comer e deglutir é intensificado a ponto de
colaborar de forma significativa para a morte do indivíduo.

O neuropsicólogo que trabalhar atendendo a esta condição deve saber que o prejuízo
motor acaba produzindo uma disartria (produção da fala), sendo de difícil compreensão.
Perdas de memória também são frequentes.

As barreiras na comunicação e o aumento progressivo da dependência comumente


impulsionam a alterações de humor, como o aumento de comportamentos impulsivos
ou irritáveis. Uma atenção profissional se faz necessária para evitar maiores desgastes
emocionais do indivíduo e de sua família, já que, em fase mais avançada da doença, os
cuidados necessários vão além das demandas decorrentes do declínio cognitivo.

A orientação familiar deve ser constante, inclusive procurando acolher as angústias dos
familiares e cuidadores, que precisam estar em boas condições físicas e de estrutura
emocional para que possam cuidar deste doente com menos cansaço e evitando a
sobrecarga, tão comum em cuidadores.

32
CAPÍTULO 5
Transtorno Neurocognitivo devido a
lesão cerebral traumática

É um dano cerebral, causado por fatores externos, como um impacto na cabeça ou


outras ocorrências de movimento rápido (aceleração/desaceleração) em que houve
deslocamento do cérebro na caixa craniana.

De acordo com o DSM-V, as características específicas de um trauma cerebral incluem,


pelo menos, um dos seguintes eventos:

» perda de consciência;

» amnésia pós-traumática;

» desorientação e confusão;

» sinais neurológicos: um novo surgimento de convulsões, perda de campo


visual, anosmia (perda total do olfato), hemiparesia (paralisia de um dos
lados do corpo).

Dentre as causas mais comuns estão:

» as quedas, especialmente em pessoas idosas;

» acidentes de trânsito, com maior foco para motociclistas.

Há lesões cerebrais chamadas de “lesões de contragolpe”, que ocorrem quando o


cérebro se choca com a parte óssea que o protege, mas no lado oposto ao do impacto.
Por exemplo: se o indivíduo sofreu impacto na parte frontal da cabeça, dentro do crânio,
o cérebro é jogado rapidamente para a parte de trás, oprimindo o lobo occipital e áreas
mais próximas a ele. Ao ser lançado para a parte de trás, o cérebro choca-se com o osso
e este impacto interno pode causar danos. Dependendo da intensidade do golpe, ao
voltar, o cérebro ainda corre risco de chocar com a parte frontal do crânio, causando
outro golpe.

A lesão cerebral traumática pode acarretar distúrbios convulsivos e, dependendo da


gravidade, pode levar o indivíduo ao óbito.

Quanto à cognição, as dificuldades vão variar de acordo com a intensidade e extensão


da lesão e das áreas afetadas. Dentre os principais déficits, podem abranger domínios

33
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

variados, tais como atenção, funções executivas, memória e cognição social (capacidade
de julgamento e comportamento social desajustados). Em uma lesão mais grave, com
hemorragia intracraniana, por exemplo, os prejuízos também são mais acentuados,
como afasia, dispraxia construtiva, entre outros.

Em bebês ou crianças pequenas, as lesões podem acarretar em prejuízos no


desenvolvimento neuropsicomotor. Em adolescentes e adultos, os déficits
neurocognitivos abarcam maior propensão à fadiga, hipersensibilidade a luz e som e
labilidade do humor (irritabilidade, depressão, ansiedade, hostilidade ou apatia). Em
idosos, a desorientação e confusão mental são comuns após lesão cerebral traumática.

Em muitos casos o processo de reabilitação traz inúmeros benefícios para que o


indivíduo retome, ao máximo, seu potencial funcional. O objetivo do tratamento é
tentar restaurar a autonomia e independência deste indivíduo, para que seja menos
dependente dos cuidados alheios e, talvez, possa retomar seus afazeres anteriores ao
evento traumático.

34
CAPÍTULO 6
Transtorno Neurocognitivo devido à
doença de Parkinson

Este transtorno é caracterizado por comprometimento nos circuitos subcorticais. É uma


doença neurodegenerativa cujos sintomas principais são: tremor, rigidez e lentidão.
Para entendermos melhor, vamos voltar à bioquímica dos neurotransmissores:

Há uma região do cérebro chamada de corpo estriado, responsável por controlar a


postura e os movimentos do corpo humano. Por meio da acetilcolina, o corpo estriado
ativa os movimentos e, através da dopamina, os inibe. A dopamina é produzida na
substância negra e faz a comunicação entre esta região e o corpo estriado. No Parkinson,
há perda de neurônios da substância negra. Sendo assim, a diminuição da concentração
de dopamina é significativa, o que faz com que seja muito mais difícil para o doente
inibir movimentos (tremores) indesejáveis e controlá-los (rigidez).

Figura 12. Receptor de dopamina.

Fonte disponível em: <http://4.bp.blogspot.com/-AFr22AUhIgI/URrmHhYhLkI/AAAAAAAAAJg/Jq_mHy2JR5k/s1600/


neuronio+parkinson.bmp>.

Figura 13. Substância Negra.

Fonte disponível em: <http://www.neurocranioecoluna.com.br/site/images/neurocirurgia/estimulacao_cerebral/


estimulacao_02.jpg>.

35
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

A doença de Parkinson costuma aparecer após os 65 anos.

O paciente acometido com a doença vai apresentar manifestações clínicas variadas,


com destaque para o quadro motor, composto por rigidez muscular, tremor de repouso,
bradicinesia (lentificação dos movimentos), rigidez na marcha (geralmente caminha
arrastando os pés, com passos bem curtos e com necessidade de apoio), diminuição da
expressão mímica facial e alteração postural (é comum andarem com a cabeça inclinada
para frente), com alto risco de queda. Há, ainda, manifestações não motoras, tais como
anomia, depressão, distúrbios do sono, alterações cognitivas e comportamentais,
disfunção autonômica, entre outras.

Figura 14. Sintomas parkinsonianos.

Fonte disponível em: <http://www.pdtrials.org/wp-content/uploads/2015/10/Parkinsons-Disease-signs.jpg>.

O paciente acometido com Parkinson tem mais chances de desenvolver algum


outro Transtorno Neurocognitivo. Cerca de 40 a 50% dos pacientes com Parkinson
vão apresentar sintomas demenciais, caracterizados por diminuição da memória,
da atenção, das funções executivas e visioespaciais, alterações da personalidade e
transtornos comportamentais.

Geralmente, o comprometimento motor está presente há, pelo menos, um ano antes do
início do declínio cognitivo, que tem desenvolvimento gradual. Quanto maior a idade de
início da doença de Parkinson, maiores são as chances de desenvolvimento de doença
concomitante.

Em testes neuropsicológicos, a atenção sustentada é mais preservada do que a atenção


utilizada para realizar testes que avaliam a velocidade de processamento.

36
CAPÍTULO 7
Transtorno Neurocognitivo devido à
doença de Alzheimer

Alzheimer é a doença neurodegenerativa mais comum entre os idosos senis, afetando


cerca de 15% dos idosos acima dos 65 anos e dobrando a cada 5 anos. A instalação
do quadro é de início insidioso e a progressão da doença depende muito de fatores
genéticos e da reserva cognitiva (rede neuronal desenvolvida previamente). Geralmente
a evolução é lenta, podendo levar mais de 15 anos.

Os principais fatores que definem a doença de Alzheimer são a deterioração progressiva


das funções cognitivas, especificamente das habilidades visioespaciais e memória, e,
concomitantemente, a perda da funcionalidade.

Ocorre comprometimento nos circuitos corticais e com grande perda de neurônios


hipocampais.

Figura 15. Hipocampo.

Fonte disponível em: <http://www.psiqweb.med.br/site/FBArquivos/NO/00000292/00000292_621.jpg>.

Desenvolve-se progressivamente, decorrente de processo degenerativo, iniciando seu


curso pelos lobos temporais mesiais, afetando o hipocampo e, consequentemente, a
memória. Há certa atrofia cortical, em especial nos córtex límbico e associativo, bem
como aumento no volume dos ventrículos cerebrais.

37
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

Figura 16. Alzheimer.

Fonte disponível em: <http://www.institutoalzheimerbrasil.org.br/Uploads/contents_images/


d3ba00948a403e37dfc9453c2dc56f02.jpeg>.

A acetilcolina é um neurotransmissor usado pelo hipocampo, que é a região mais


envolvida nos processos de memória (que inclui a aprendizagem). Os níveis de
acetilcolina caem progressivamente durante o envelhecimento, e, nos pacientes
com Alzheimer, a queda dos níveis de acetilcolina é drasticamente mais elevada. Há
também outros processos bioquímicos alterados na doença, mas ainda em estudo pela
comunidade científica.

São comuns os déficits mnésticos, de linguagem (perda da nomeação, compreensão) e


habilidades visuoespaciais.

Na fase inicial da doença os pacientes começam a ter dificuldades cognitivas,


especificamente na aquisição de novas memórias (aprendizado), alguma dificuldade em
acompanhar o tempo, desorientação espacial e mudanças de humor, podendo aparecer
sintomas de depressivos, como apatia, perda de iniciativa etc.

Nesta fase, a linguagem e as habilidades motoras continuam como antes. O doente é


capaz de manter uma conversa, é sociável e compreende a comunicação, como gestos,
entonação etc. Pode acontecer de o paciente não reconhecer facilmente o lugar onde
está e ter lapsos de memória durante uma conversa. Uma estratégia eficaz é auxiliar,
informando sobre o assunto que estava sendo discutido e, caso o fornecimento de dicas
não esteja sendo suficiente ou esteja provocando frustrações no indivíduo, pode-se
mudar o foco da conversa ou mudar de ambiente.

38
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

Figura 17. Necessidade de ajuda.

Fonte disponível em: <https://md24housecall.com/wp-content/uploads/2016/03/A0177_Closeup-portrait-sad-alone-dark-


gloomy-frustrated-stressed-senior-mature-woman-hands-on-head-looking-down-having-really-bad-nigh.jpg>.

A fase leve é o momento ideal de se introduzir um cuidador na vida diária deste


idoso, pois ainda é capaz de escolher e entender a necessidade, embora muitas vezes
apresentem resistência por não terem compreensão global de seu quadro. Também é
uma fase em que precisa ser pensado sobre a possibilidade de retirada da direção de
um automóvel, pois na próxima fase os déficits são mais abrangentes e estes idosos em
trânsito podem pôr em risco a própria vida e a de outros.

Figura 18. Retirada da direção.

Fonte disponível em: <http://www.chapadensenews.com.br/files/fotos/196519.jpg>.

A fase moderada abrange outras áreas cerebrais e funções cognitivas, ocasionando


déficits na linguagem, nas habilidades visioespaciais e o comprometimento para
a realização das atividades diárias avançam um pouco mais. Este idoso passa a
apresentar-se um pouco mais descuidado com sua higiene pessoal (ou demandando
ajuda para conseguir se arrumar como de costume).
39
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

Figura 19. Auxílio na higiene do idoso adoentado.

Fonte disponível em: <https://static-blog.getninjas.com.br/guia/wp-content/uploads/2015/02/idosos.jpg>.

Já ocorre perda parcial da capacidade de reconhecimento, mantendo intactas as


recordações mais solidificadas, como os ambientes familiares e orientações pessoais
(próprio nome, idade, lugar de nascimento, nome de seu cônjuge e parentes). Passa a ter
dificuldades na fala e linguagem (afasia) e para realizar funções básicas já aprendidas,
como se vestir e utilizar talheres.

Figura 20. Ajuda para vestir.

Fonte disponível em: <http://conteudo.imguol.com.br/c/noticias/2014/02/09/9fev2014---chen-wenyao-ajuda-sua-mae-a-mei-


a-se-vestir-na-casa-onde-vivem-em-jianyang-provincia-de-fujian-sudeste-da-china-wenyao-de-64-anos-cuida-de-sua-mae-de-
106-anos-ha-decadas-ela-diz-que-1391954678057_956x500.jpg>.

Nesta fase moderada da doença, o idoso já é dependente de um cuidador em tempo


integral, pois começam as manifestações físicas/motoras, como debilidade muscular,
alterações de postura, caminhada, maior cansaço, entre outros.

40
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

Figura 21. Limitações físicas na Doença de Alzheimer.

Fonte disponível em: <http://www.maisquecuidar.pt/AndarilhoArticulado.htm>.

O idoso nesta fase é mais sonolento, repetitivo com a fala e com atitudes (abre e fecha
gavetas, dobra e desdobra roupas...), pode apresentar sinais psicóticos (delírios,
alucinações e ilusões) e perde o interesse por atividades das quais gostava antes. É um
paciente que pode relatar que alguém em sua residência está roubando seu dinheiro
(sendo que talvez esqueceu onde o guardou), que os familiares estão combinando sua
internação para ficar com seus bens, entre outros.

Na fase mais avançada da doença, o comprometimento cerebral já avançou para


as porções do lobo frontal, ocasionando em alterações das funções executivas, da
personalidade e do comportamento.

Figura 22. Idoso tira a roupa.

Fonte disponível em: <https://www.google.com.br/url?sa=i&rct=j&q=&esrc=s&source=imgres&cd=&cad=rja&uact=8&ved=


0ahUKEwjaoo_Eze3TAhWCk5AKHf6bDl8QjRwIBw&url=http%3A%2F%2Fblogoge1.blogspot.com%2F2015%2F06%2Firritado-idoso-
tira-roupa-apos-ser.html&psig=AFQjCNHMFfKxDTkJbK_75K54RNVeRufRhA&ust=1494790114655347>.

41
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

A rigidez muscular e a alteração de postura estão mais acentuadas e podem, ainda, surgir
tremores e crises epiléticas. Muito frequentemente, os idosos nesta fase apresentam
incontinência urinária e fecal e certa perda de resposta à dor.

Cognitivamente é um idoso desorientado com relação ao tempo e ao espaço, não


sabendo informar em que data está e, se não estiver em sua casa de infância, não saberá
informar onde está. A apatia é mais marcante, assim como os sintomas psicóticos e
a agitação psicomotora. Apresenta maior agressividade, que pode ser atribuída a
múltiplos fatores, como dores, cansaço, remédios e um ambiente exigente.

O indivíduo nesta etapa já não se tem mais a preservação das capacidades automáticas
adquiridas, como tomar banho, vestir-se sozinho, andar ou comer (incluindo pegar a
comida com os talheres, levar a comida à boca, mastigar e deglutir).

Figura 23. Auxílio na alimentação na fase avançada.

Fonte disponível em:< http://portalamigodoidoso.com.br/wp-content/uploads/2012/07/idosa-com-a-infermeira-portal-amigo-


do-idoso.jpg..

É de extrema importância que o familiar/cuidador seja orientado para conseguir


controlar as situações de ansiedade e agitação dos doentes com Alzheimer, porque estas
podem gerar comportamentos cada vez mais desgastantes a todos os envolvidos.

42
CAPÍTULO 8
Transtorno Neurocognitivo Vascular

O Transtorno Neurocognitivo Vascular costuma ser decorrente de comprometimento


nos circuitos subcorticais que agrupam o conjunto de quadros de perdas cognitivas e
alterações da personalidade associadas a lesões cerebrovasculares.

As lesões cerebrovasculares são de diversas causas, podendo consistir em:

» pequenas áreas de enfarte ou doença dos pequenos vasos (microvascular);

» grandes lesões tromboembólicas (múltiplos infartos);

» lesões desmielinizantes secundárias à interrupção da irrigação sanguínea


local;

» infartos lacunares;

» lesões únicas em locais estratégicos (tálamo, giro angular esquerdo,


núcleo caudado, gânglios da base);

» angiopatia amiloide;

» acidentes vasculares cerebrais hemorrágicos (rompimento dos vasos


sanguíneos cerebrais) ou obstrução, entre outros.

Figura 24. Obstrução do fluxo sanguíneo.

Fonte disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/-uOrgO0M0_7M/UcqQ940qDyI/AAAAAAAAA-8/1cuyIKM7psE/s640/demencia-


vascular.jpg>.

43
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

A etiologia vascular é heterogênea, pois vai depender do tipo de lesão, da localização e


da extensão da lesão, que pode ser focal, multifocal ou difusa. A certeza é de que, após
o acidente vascular cerebral, a circulação de sangue no cérebro é menor.

O surgimento da doença é abrupto, com rápido desenvolvimento de déficits, inclusive


cognitivos. Pressão alta, diabetes e tabaco são predispositores para desencadear o
Transtorno. A prevalência é maior em indivíduos do sexo masculino do que nos do sexo
feminino.

De acordo com critérios do DSM-V, para a doença ser classificada como Transtorno
Neurocognitivo vascular leve é necessário um só acidente vascular cerebral ou doença
extensa da substância branca. Para ser caracterizado como Transtorno Neurocognitivo
vascular maior, é preciso que tenha ocorrido, pelo menos, um dentre estes eventos:

» dois ou mais acidentes vasculares cerebrais;

» um acidente vascular cerebral estrategicamente situado;

» uma combinação de doença da substância branca.

Os sintomas iniciais são variados, pois dependem da localização da lesão. É muito comum
que o paciente tenha complicações vasculares associadas, como “hipertensão arterial,
sopro carotídeo, doença cardiovascular, diabete e dislipidemias” (DALGALARRONDO,
2008). A maior prevenção é a boa saúde cardiovascular.

Nos três meses após um acidente vascular cerebral, 20 a 30% dos indivíduos apresentam
falhas cognitivas, motoras e na funcionalidade. Posteriormente, o paciente passa a ter
menor controle do corpo, sendo comum ocorrer distúrbio de marcha, com quedas
frequentes, dificuldade de movimentação dos membros de um mesmo lado do corpo,
dificuldade na fala ou na articulação das palavras, déficit visual de uma parte do campo
visual e incontinência urinária nos estágios mais avançados.

Quando ocorre doença isquêmica em pequenos vasos, costuma haver o desenvolvimento


de sintomas depressivos concomitante à lentidão psicomotora e à disfunção executiva
(“depressão vascular”).

É comum escutar os familiares relatarem que o paciente “de um dia para o outro
começou a...” falar com a boca torta, ter dificuldade para segurar um talher ou se perder
no trânsito, por exemplo.

Os déficits cognitivos podem ser atribuídos a uma ruptura dos circuitos


córtico-subcorticais, com possível influência na atenção, em especial na velocidade do

44
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

processamento de informações e na capacidade executiva, mas podem variar de um


caso para outro.

Na avaliação neuropsicológica, na etapa de averiguação dos resultados quantitativos da


aplicação dos testes, é comum a ocorrência de falhas de coerência sequencial nos testes
de memória com histórias. É um paciente capaz de evocar o conteúdo apresentado
dentro da quantidade de informações esperadas para sua faixa etária, porém, de maneira
desorganizada. No reconhecimento tardio, o desempenho flui melhor com a utilização
de pistas/dicas, o que pode ser um bom recurso para o programa de reabilitação
neuropsicológica, incluindo a orientação para que o cuidador faça uso desta estratégia
no cotidiano deste paciente.

45
CAPÍTULO 9
Transtorno Neurocognitivo
Frontotemporal

O Transtorno Neurocognitivo Frontotemporal compreende uma série de variantes


sindrômicas, causado por degeneração de um ou ambos os lobos frontais e temporais
do cérebro. Seu desenvolvimento é progressivo, tem início normalmente entre os 40 e
os 65 anos e acarreta em mudança comportamental e de personalidade e/ou prejuízo
na linguagem.

Conforme a doença progride, os pacientes acometidos tendem a apresentar sinais e


sintomas que podem ser uma combinação dos subtipos existentes.

Como existem diversas funções a serem, reguladas pelos dois lobos mais envolvidos, há
variâncias na apresentação dos sintomas. O DSM-V subdivide a doença em dois grupos,
sendo um grupo denominado de Transtorno Neurocognitivo frontotemporal de variante
(ou subtipo) comportamental, e o outro Transtorno Neurocognitivo frontotemporal de
variante (ou subtipo) linguística.

Transtorno neurocognitivo frontotemporal de


variante comportamental
Indivíduos com a variante comportamental do Transtorno Neurocognitivo
Frontotemporal apresentam graus variados de apatia ou desinibição, com prejuízo da
capacidade de insight. Podem perder interesse na socialização, inclusive com desinteresse
pelas atividades e pessoas habituais, apresentar perda funcional no autocuidado, nas
responsabilidades pessoais ou evidenciar comportamentos socialmente inadequados.
Nos estágios posteriores, pode ocorrer perda de controle dos esfíncteres.

Transtorno neurocognitivo frontotemporal de


variantes linguística
Indivíduos com Transtorno neurocognitivo frontotemporal de variante linguística
apresentam afasia progressiva primária, mas cada variante tem suas especificidades.

Os indivíduos acometidos com a variante linguística semântica (denominada


anteriormente por demência semântica) podem apresentar prejuízos importantes na
compreensão de palavras, na nomeação de objetos, e no reconhecimento do significado

46
PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS │ UNIDADE II

de estímulos visuais (agnosia associativa). Com a progressão da doença, também é


comum a redução progressiva da produção verbal. Na avaliação neuropsicológica, é
percebido como um paciente que economiza esforço ao fornecer respostas, mas mantém
a preservação dos conhecimentos previamente adquiridos sobre as vertentes da língua,
como a gramática, a leitura em voz alta e a escrita ortograficamente correta de palavras
regulares.

O quadro clínico é definido de acordo com a localização e abrangência anatômica da


lesão. Inicialmente ocorrem alterações da personalidade e de comportamento, seguidas
de déficits de linguagem.

Dentre as alterações de personalidade, podemos ter um indivíduo apático e insensível


que, anteriormente, se comovia com as demandas alheias e buscava ajudar.

As alterações de comportamento podem incluir o isolamento social, perda de crítica,


inflexibilidade mental, descuido da higiene pessoal, comportamentos rituais (incluindo
a possibilidade de colecionismo), deambulações inadaptadas, entre outras.

Figura 25. Idoso acumulador patológico.

Fonte disponível em: <https://gcdn.emol.cl/psicologia-y-tendencias/files/2016/09/acumulador-compulsivo.jpg>.

Os déficits de linguagem abrangem redução da fluência verbal, estereotipias, ecolalia e


sinais de hiperoralidade (repetir as frases inúmeras vezes ou ecoar aquilo que os outros
dizem).

Em geral, pacientes acometidos com algum subtipo desta demência apresentam


reflexos primitivos frontalizados (preensão palmar, sucção e projeção tônica dos
lábios), início insidioso e progressivo de distúrbios de linguagem, alterações precoces
de personalidade e de comportamento, como: isolamento social, apatia, desinibição,
impulsividade, irritabilidade, hiperoralidade (repetir as frases inúmeras vezes ou ecoar
aquilo que os outros dizem) e descuido com a higiene pessoal.

47
UNIDADE II │ PATOLOGIAS FREQUENTES EM AMBULATÓRIO NEUROLÓGICO E TRANSTORNOS NEUROCOGNITIVOS

Figura 26. Projeção tônica dos lábios.

Fonte disponível em: <http://3.bp.blogspot.com/-PgFdGJktb8o/TvvamX6BgzI/AAAAAAAAATA/xXs_LPY8V3Y/s400/


BOA+VELHINHA+01.jpg>.

Existem várias técnicas utilizadas para realizar o diagnóstico tais como, imagiologia
cerebral, eletroencefalograma ou testes neuropsicológicos, que podem auxiliar na
caracterização da doença.

Em testes padronizados, a variante comportamental do Transtorno Neurocognitivo


frontotemporal aponta para prejuízos comuns no raciocínio abstrato, na atenção
concentrada (distratibilidade), na capacidade de planejamento e julgamento e nas
funções executivas (flexibilidade mental e controle inibitório). Nos estágios iniciais, as
capacidades perceptomotoras e a memória (incluindo a capacidade de aprendizagem)
estão relativamente preservadas.

Ainda não existe cura para o Transtorno. O que se pode fazer é cuidar dos sintomas
secundários, como a depressão, podem ser aliviados pela psicoterapia e/ou medicação.
Os profissionais da saúde têm o papel de fornecer conhecimentos sobre a doença,
incluindo os motivos pelos quais a pessoa se comporta de determinada maneira. Assim,
os familiares podem auxiliar o paciente a lidar com seus sintomas em vez de insistir
para que se comporte de tal maneira, evitando maiores conflitos.

Como a doença atinge o indivíduo em idade produtiva, em que ainda desfrutam de


plena independência, é comum o abalo das relações familiares e laborais. O apoio de
profissionais, amigos e familiares tende a fazer uma diferença positiva na forma de
gerir a doença. A psicoterapia via auxiliar o doente a lidar com as questões emocionais
decorrentes destas transformações e com a nova perspectiva de vida, entre outras
demandas.

48
TRANSTORNOS DO UNIDADE III
DESENVOLVIMENTO

Introdução
Serão descritas brevemente às características de algumas patologias ocorridas ao longo
do desenvolvimento infantil. Faz-se importante que o neuropsicólogo as conheça
para que possa identificar em uma avaliação e auxiliar a família orientando quanto às
possibilidades e limitações desta criança, inclusive acolhendo os variados sentimentos e
expectativas destes familiares, auxiliando-os a olhar esta criança com uma aproximação
mais fidedigna de suas reais condições.

Objetivos
» Fornecer informações sobre Deficiência intelectual.

» Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade.

» Transtornos do Espectro Autista.

» Transtornos Específicos da Aprendizagem.

» Transtorno de Aprendizagem Não Verbal.

CAPÍTULO 1
Deficiência Intelectual (DI)

Trata-se de uma deficiência caracterizada por limitações significativas em dois âmbitos,


consecutivamente:

1. funcionamento intelectual;

2. comportamento e funcionamento adaptativo socialmente.

49
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

Para que o diagnóstico seja caracterizado, ambos os déficits precisam ser existentes
desde o período de desenvolvimento, sendo necessário auxílio constante para que o
indivíduo possa desempenhar as atividades de vida diária para lidar com as demandas
externas, seja em casa, na escola, no trabalho ou outro ambiente.

Os déficits intelectuais devem ser averiguados tanto pela avaliação clínica quanto
por testes de inteligência padronizados, individualizados e adequados culturalmente
e psicometricamente. A avaliação deve englobar a mensuração do quociente de
inteligência (QI), a capacidade de “raciocínio, solução de problemas, planejamento,
pensamento abstrato, juízo” (DSM-V) e a aprendizagem.

Uma pontuação de teste abaixo de 70 indica uma limitação no funcionamento intelectual.


Para a padronização do Teste de Inteligência Wechsler para Crianças (WISC-IV), foram
avaliadas 120 crianças diagnosticadas previamente como deficientes mentais. A média
de desempenho daquelas classificadas como Deficientes Mentais Leves foi de 60 pontos
de QI Total, com 9 pontos de desvio padrão. Crianças diagnosticadas como Deficientes
Mentais Moderadas obtiveram média de desempenho de 46 pontos de QI Total, com 8
pontos de desvio padrão.

O comportamento expresso por um funcionamento adaptativo limitado abarca


dificuldades quanto ao relacionamento interpessoal, autoestima, resolução de
problemas sociais, capacidade de seguir regras e leis e evitar ser vítima, assumindo
suas responsabilidades sociais. Compreendem, também, questões acerca de atividades
do cotidiano, como os cuidados de higiene pessoal, cuidados com a saúde, utilização de
dinheiro, transporte, telefone, entre outras competências.

Os graus de deficiência intelectual variam, passando por dificuldades leves para se ajustar
a situações novas (mas podendo ser educáveis), à falta de percepção sobre situações em
que pode por sua vida em perigo (como querer soltar a mão dos pais/responsáveis e
querer atravessar a rua rapidamente e sem olhar), crises de agressividade (inclusive
autoagressividade, como morder as unhas até produzir ferimentos, por exemplo) e
persistência de reflexos primitivos devido à imaturidade do SNC.

Após avaliação e constatação do diagnóstico, o neuropsicólogo pode trabalhar visando


conscientizar este indivíduo sobre seus limites, ensinar estratégias para responder às
demandas o mais próximo do esperado, valorizar suas capacidades e buscar atividades
em que seja necessário o uso de seus recursos psíquicos mais preservados.

O ideal é trabalhar a partir de contextos reais, criar situações de aprendizagem positivas,


com elogios perante aos sucessos (mesmo que pequenos) e significativas na vida desta
criança, usar situações e formas mais concretas possíveis, dividir as tarefas em partes

50
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

e apresentar materiais de diferentes tipos, tais como: objetos, músicas, expressões


corporais, expressões faciais, entre outras.

Citamos aqui dois exemplos para ilustrar como este aproveitamento dos recursos
intelectuais pode ser feito, mesmo com a presença marcante de déficits cognitivos em
indivíduos adultos, em idade produtiva laboralmente:

1. Limitação das habilidades verbais, mas com preservação da coordenação


motora e da atenção concentrada, pode trabalhar em estoque de
supermercado.

Figura 27. Estoque.

Fonte disponível em: <https://4.bp.blogspot.com/-mQ8Ky3g-eb4/VwBrf-a7slI/AAAAAAAA3w0/13Yy1Q55c9Q_qDQFwX9LoIinOGy-


c3eQQ/s1600/IMG_5202.JPG>.

2. Falhas práxicas, mas com preservação (mesmo que mínima) das


capacidades mnésticas pode atuar no balcão de informações de um
shopping ou terminal rodoviário.

Figura 28. Balcão de informações.

Fonte disponível em: <http://www.shoppingviacatarina.com.br/public_html/ecentiva/uploads_fck/vc_P4120007.jpg>.

51
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

O objetivo é tentar melhorar, o funcionamento das pessoas dentro de seu próprio


ambiente, a fim de melhorar sua qualidade de vida ao ter a sensação satisfatória de
realização. Ao desempenhar atividades que valorizem o que há de melhor no indivíduo
(mesmo que esteja abaixo do esperado para sua faixa etária), temos melhora em termos
de autoestima, satisfação pessoal, orgulho e outros princípios de autoidentidade.

Outras síndromes apresentam deficiência intelectual, tais como:

1. Síndromes e condições genéticas e malformativas;

2. Síndrome de Down;

3. Síndrome do X-Frágil;

4. Microcefalia;

5. Síndrome do alcoolismo fetal;

6. Síndrome do Cri du chat (miado do gato);

7. Síndrome de Angelman.

52
CAPÍTULO 2
Transtorno de Déficit de
Atenção/Hiperatividade (TDAH)

O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento que se caracteriza por um padrão


persistente de sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade. Pode ser
apenas do tipo desatento, apenas hiperativo ou do tipo combinado, com desatenção e
hiperatividade.

A apresentação do TDAH do tipo desatento inclui a incapacidade de permanecer


em uma tarefa por tempo prolongado, as crianças parecem não ouvir e perdem seus
materiais com mais frequência que os outros indivíduos de sua idade.

Figura 29. Desatenção.

Fonte disponível em: <http://www.isaudebahia.com.br/noticias/detalhe/noticia/seu-filho-e-desatento-ou-tem-tdah/>.

As características fundamentais do indivíduo acometido com TDAH do tipo hiperativo


são: o excesso de atividade (além da manifestação de outros de mesma idade),
inquietação, grande dificuldade de permanecer sentado, incapacidade de aguardar,
entre outros.

53
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

Figura 30. Hiperatividade.

Fonte disponível em: <http://espacorafah.com.br/wp-content/uploads/2016/02/hiperativo.jpg>.

A apresentação do tipo combinada envolve critérios de desatenção concomitante ao


preenchimento dos critérios de hiperatividade-impulsividade, desde que presentes nos
últimos 6 meses.

O indivíduo com TDAH tem maior busca por novidades. Diante de situações novas,
estimulantes ou desafiadoras (como os jogos de videogame, por exemplo) a criança é
capaz de controlar seus sintomas com esforço voluntário por algum tempo.

Pessoas com TDAH tem maior dificuldade em concluir seus objetivos, iniciando vários
projetos, mas que não chegam ao final, incluindo os âmbitos acadêmico, profissional
e relacionamento afetivo. Apresentam maior envolvimento em acidentes de trânsito,
mais multas por excesso de velocidade e perdem seus objetos com mais frequência do
que indivíduos sem este acometimento.

Figura 31. TDAH: perda de objetos, perda de foco atencional.

Fonte disponível em: <http://www.institutoinclusaobrasil.com.br/wp-content/uploads/2016/05/hiperativo15B15D.jpg>.

54
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

A avaliação neuropsicológica do paciente com suspeita de TDAH precisa ser feita


cautelosamente, a fim de diferenciar os sintomas de outras patologias, como o transtorno
opositor e desafiante, o Transtorno Bipolar, manifestações emocionais, entre outras
possibilidades. O profissional deve estar bastante embasado cientificamente e fazer
entrevista minuciosa com os pais, com a escola, com outros ambientes em que a criança
convive e, também, com a própria criança.

Dificuldades mais frequentes em estudantes com TDAH.

Lentidão para aprender conteúdos e realizar tarefas escolares.


Dificuldade para ignorar estímulos irrelevantes e para interromper uma resposta já iniciada.
Dificuldade de organizar e planejar.
Dificuldade de sustentar a atenção durante uma atividade mental prolongada. Essa dificuldade é tanto maior quanto menos
motivadora for a atividade.
Elevada variabilidade de desempenho: um estudante pode apresentar bom desempenho em certa atividade num dia e falhar
em outra de mesma natureza no outro.
Baixa sensibilidade as recompensas: os alunos com desenvolvimento típico se sentem recompensados mais facilmente que
os estudantes com TDAH, que podem precisar de mais atenção para entender que seu esforço está sendo valorizado.
Imediatismo/Aversão à espera: mesmo que a consequência de uma ação seja muito boa futuramente, indivíduos com TDAH
tendem a desvalorizar recompensas que levam mais tempo para serem alcançadas, preferindo recompensas menores, mas
imediatas.
Menor sensibilidade à punição: estudantes com TDAH podem ter dificuldade para inibir comportamentos de risco, ou seja,
comportamentos que podem trazer consequências negativas, mesmo que já tenham vivido e aprendido que a punição é
bastante provável ou grave.
Dificuldade para lidar com o tempo, pessoas com TDAH costumam achar que o tempo demora mais para passar do que
realmente passa. Elas podem ter dificuldades para estabelecer prioridades, cumprir prazos, concluir suas tarefas, avaliar as
consequências em longo prazo etc.
Dificuldade de aprendizagem da leitura e da matemática, mesmo que não tenham dislexia ou discalculia do desenvolvimento
(mas com frequência têm), os problemas de leitura, escrita e aritmética são comuns.
Fonte: Cartilha de Aprendizagem Pearson, 2015.

O tratamento do indivíduo com diagnóstico de TDAH é por meio de medicação


concomitante a psicoterapia. Muitas vezes a criança acometida também frequenta um
profissional da psicopedagogia e faz aulas de reforço escolar.

Figura 32. Reforço escolar.

Fonte disponível em: <http://www.vb.by/files/content/0216/163_2.jpg>.

55
CAPÍTULO 3
Transtornos do Espectro Autista (TEA)

Nova nomenclatura

O transtorno do espectro autista (TEA) é uma patologia do neurodesenvolvimento


muito frequente e que acontece em diferentes condições genéticas.

Desde a descoberta deste diagnóstico, diversas nomenclaturas já foram utilizadas para


classificá-lo, conforme os manuais oficiais de classificação de doenças.

De “transtorno global do desenvolvimento” (classificação adotada na 10a edição


da Classificação Internacional de Doenças – CID-10) e “transtorno invasivo do
desenvolvimento (classificação adotada na 4a edição do Manual Diagnóstico e Estatístico
de Transtornos Mentais – DSM-IV-TR), o autismo, segundo o DSM mais atual (DSM-V),
passa a ser enquadrado na categoria de “transtornos do espectro autista” (TEA).

Esta mudança não envolve só a nomenclatura, ela também determina a eliminação


de todas as subcategorias que este diagnóstico envolvia antes, como: “síndrome de
Asperger”, “transtorno desintegrativo da infância” e “autismo atípico”. A partir de
então, passa-se a adotar a classificação TEA em diferentes níveis de intensidade, ou
seja, “transtorno do espectro autista” “leve”, “moderado” ou “grave”.

Esta mudança no DSM-V veio a simplificar muito o processo de diagnóstico do autismo,


visto a infinidade de variações com que este transtorno pode se apresentar em cada
sujeito. A existência de subcategorias demarcadas pela sintomatologia, como “síndrome
de Asperger” e “autismo atípico”, não contemplava todas essas variações.

Haviam muitos sujeitos que, apesar de apresentarem claros traços de autismo, não se
encaixavam em nenhuma destas subcategorias, ou não se encaixavam em apenas uma,
ou ainda, sujeitos com um quadro mais leve eram encaixados na mesma subcategoria
que sujeitos com quadro grave. Daí o motivo desta forma anterior de classificação ter
caído por terra.

O que se sucede agora é que, ao invés de separar os indivíduos com os aspectos


comportamentais característicos do autismo por subcategorias, todos são designados
como TEA, seguido do grau de intensidade com que ele apresenta o transtorno. Afinal,
em cada indivíduo os comportamentos autísticos evoluem de maneira particular, pois

56
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

são influenciados por variáveis ambientais, como: a história de vida, o contexto social e
as estimulações do ambiente. É preciso considerar a singularidade de cada caso.

Definição
Não se sabe exatamente quais são as causas do autismo, entretanto pode-se enumerar
diversos fatores de risco que parecem favorecer o desenvolvimento destas condições,
são eles:

1. Fatores Genéticos:

Segundo pesquisas, pais que possuam um filho portador de autismo,


apresentam cerca de 10% de chances de ter um segundo filho com a mesma
condição. Outros estudos genéticos com gêmeos idênticos concluem que
se um dos irmãos tem autismo, a chance do outro ter também varia entre
36-95%. No caso de gêmeos não-idênticos, a chance reduz para até 30%.

2. Fatores Ambientais:

Foi levantada a hipótese de que alguns casos de autismo podem ter sido
causados por fatores ambientais capazes de interferir no desenvolvimento
cerebral do bebê, durante o período gestacional, como por exemplo,
doenças congênitas, rubéola, encefalites, meningites, uso de drogas, má
nutrição materna, dentre outros.

O diagnóstico do TEA é feito com a avaliação do desenvolvimento do sujeito (desde a


sua primeira infância), nas três áreas à seguir:

» Área da comunicação – Prejuízos nesta área podem envolver desde


um mutismo total e não atendimento aos chamados, até um excelente
desenvolvimento da fala, com uso de palavras, por vezes rebuscadas
demais para a idade, mas nenhuma habilidade para entender expressões
emocionais, gestos, símbolos e metáforas (sentidos figurados).

Comportamentos relacionados:

› ausência ou atraso na aquisição da linguagem verbal e não verbal


(déficit no uso de gestos, ausência total de expressões faciais);

› falha para manter a conversação;

57
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

› não atender quando chamado;

› discursos repetitivos, incluindo ecolalia (repetição constante para si


mesmo, de frases e conteúdos ouvidos de diálogos, desenhos animados,
filmes etc.)

› dificuldade em interpretar expressões faciais (percepção de emoções)


e verbais;

› ausência de brincadeiras sociais, já que estas estão quase que totalmente


baseadas na comunicação, como: esconde-esconde, pega-pega etc.

» Área do comportamento – Alterações de comportamento frequentes,


como: movimentos repetitivos sem função aparente (por exemplo,
balançar o troco para frente e para trás), apego a rotinas ou interesses
restritos, podem variar desde ausência completa até uma grande
intensidade destas manifestações.

Comportamentos relacionados:

› comportamentos motores repetitivos, com função de autoestimulação


sensorial (pular, balançar, fazer movimentos com os dedos e/ou mãos,
fazer careta, bater palma etc.);

› hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse excessivo


por aspectos sensoriais do ambiente (por exemplo, aparente falta de
sensibilidade a dor/temperatura, reação excessiva aos sons ou texturas
específicas, cheirar ou tocar objetos de forma exagerada, fascinação
visual por luzes ou movimento);

› apego a rotinas (rejeição à mudanças, rigidez no seguimento de


algumas regras, necessidade de fazer sempre o mesmo caminho ou de
comer sempre os mesmos alimentos);

› interesses restritos à coisas específicas e muito exagerados, que


chegam a comprometer as interações sociais (por exemplo, só falar, só
brincar, só desenhar coisas relacionadas a um determinado assunto,
sem desenvolver uma riqueza imaginativa ou fantasiosa);

› preocupação com partes de objetos (por exemplo, brincar apenas


com as rodas dos carrinhos, girando-as, ou de alinhar os brinquedos,
observando-os fixamente).

58
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

» Área da interação social – prejuízos nesta área podem se caracterizar


por desde um isolamento crônico (indivíduos que passam a maior parte
do tempo sozinhas, balbuciando, realizando movimentos repetitivos sem
nenhuma função aparente), até uma aproximação social com dificuldades
de interação e formação de vínculos.

Algumas das dificuldades relacionadas são:

› pouco ou nenhum contato visual durante as interações sociais;

› dificuldade em interpretar e entender as intenções dos outros, bem


como de iniciar ou responder às interações;

› ausência de interesse por pares ou interações incomuns, como: puxar


a mão de uma pessoa e levá-la até a porta, ao invés de pedir-lhe que a
abra.

› falta de reciprocidade sócioemocional (expressar emoções ao outro e


ser afetado pelas emoções dos outro);

› ausência de procura espontânea pelo compartilhamento de prazer


(compartilhar momentos e situações com os outros);

› dificuldade para compartilhar brincadeiras imaginativas;

› a criança possui falha no desenvolvimento de interações com pessoas


da mesma idade, preferindo aproximação com adultos.

Como já foi citado anteriormente, as formas de apresentação dos TEA irão variar muito
de pessoa para pessoa, tanto em quantidade, como em intensidade dos sintomas (mais
grave ou mais sutil). É o conjunto desses sintomas e o seu grau de comprometimento
na qualidade de vida da pessoa que irá definir a gravidade do TEA.

Dependendo do nível de gravidade apresentado, os sintomas dos TEA podem ser


percebidos antes mesmo dos três anos de idade (já é possível fazer o diagnóstico, por
exemplo, por volta dos 18 meses de vida) ou, mais tardiamente, nos casos das formas de
apresentação mais leves. É muito comum que os sintomas de autismo, na infância, sejam
confundidos com sintomas de surdez, já que a criança autista não atende a chamados
mas, com a investigação de um profissional especializado é possível distinguir uma
coisa da outra.

59
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

Segundo o médico Gustavo Teixeira, referencia internacional em tratamento do TEA,


a intervenção neste tipo de quadro é multiprofissional. É necessário o apoio de uma
equipe de saúde especializada, para que seja feita a criação de um Plano Individual
de Tratamento (PIT). O PIT consiste em um projeto de tratamento que leva em
consideração todas as necessidades individuais da criança com autismo.

Saber identificar as necessidades de cada criança com autismo é fundamental para


criar um plano individualizado e personalizado para que todas as suas potencialidades
sejam exploradas. Para isto, é importante considerar diversos fatores, incluindo
as necessidades específicas de cada criança, o grau de gravidade dos sintomas, a
disponibilidade e a adesão familiar ao tratamento.

As Intervenções conjuntas ajudam na melhoria da qualidade de vida da criança,


proporcionando uma melhor adaptação no meio em que vive.

As possibilidades e técnicas de tratamento que existem, atualmente, para o autismo são


múltiplas. Abaixo seguem alguns exemplos:

» ORIENTAÇÃO FAMILIAR E PSICOEDUCAÇÃO

A orientação familiar e oferecimento de material psicoeducativo deve


ser a primeira intervenção terapêutica. É fundamental para aumentar a
adesão ao tratamento e para gerar expectativas realistas sobre a evolução
da criança ao longo do tempo.

» ENRIQUECIMENTO DO AMBIENTE

Expor a criança a um ambiente doméstico rico em diferentes estímulos


sensoriais. Para esse enriquecimento do ambiente existem alguns
protocolos de intervenção que incluem, por exemplo: duas exposições
diárias (manhã e tarde) a diferentes fragrâncias de perfumes; escutar
diferentes ritmos musicais durante o dia; realizar diferentes atividades
motoras e assim por diante. A criança precisa ser estimulada diariamente
com pelo menos 30 exercícios combinados com estímulos diferentes
envolvendo os cinco sentidos (olfato, tato, paladar, visão e audição).

» MEDICAÇÃO

Algumas medicações podem ser utilizadas quando identificamos


“sintomas-alvo”, que são sintomas comportamentais que atrapalham o
funcionamento global da criança (por exemplo, bater a cabeça na parede)
e que podem ser melhorados com medicamentos específicos.

60
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

» TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL

Ajuda a criança a reconhecer seus sentimentos e regular suas


emoções; controlar ansiedade, reduzir a impulsividade e melhorar seu
comportamento social, além de reduzir comportamentos repetitivos e
estereotipados, controlar acessos de raiva e ensinar novas habilidades à
criança ou adolescente.

» TREINAMENTO EM HABILIDADES SOCIAIS

O treinamento em habilidades sociais é uma modalidade terapêutica


fundamental para o tratamento do autismo, pois as principais dificuldades
dessas crianças estão relacionadas com a esfera social.

» TERAPIA ABA

Tratamento comportamental que tem ganhado destaque atualmente


pelo sucesso de suas intervenções é chamado Análise do Comportamento
Aplicado ou ABA (Applied Behavior Analysis), consiste no estudo e na
compreensão do comportamento da criança, de sua interação com o
ambiente e com as pessoas com quem ela se relaciona.

» FONOAUDIOLOGIA

Estimulação das habilidades de comunicação verbal e não-verbal.

» TERAPIA OCUPACIONAL

Objetiva o ensinamento de habilidades de vida diária para tornar a criança


mais independente possível. As habilidades treinadas podem incluir: se
vestir, se alimentar, tomar banho, ensinar a criança a pedir auxílio e a se
relacionar com outras crianças ou cuidadores.

» TERAPIA DE INTEGRAÇÃO SENSORIAL

Objetiva auxiliar a criança a lidar com as informações sensoriais do


ambiente. Comumente, crianças com autismo apresentam dificuldade de
lidar com questões sensoriais, como sons, luzes e odores. Desta forma,
a intervenção poderia ajudar, por exemplo, crianças que apresentam
dificuldades para lidar com o toque, ou com a textura de uma roupa nova,
ou que se incomoda com o barulho dos carros na rua ou com o perfume
da mãe.

61
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

» MÉTODO TEACCH

O método TEACCH (Treatment and Education of Autistic and related


Communication-handicapped Children) ou tratamento e educação de
crianças com autismo e dificuldades de comunicação é uma metodologia
amplamente utilizada na aprendizagem de crianças com autismo. O
método utiliza pistas visuais para o ensinamento de habilidades, por
exemplo: cartões ou figuras que ensinem a criança a se vestir a partir de
informações quebradas em pequenos passos e ilustradas em diferentes
cartões.

» MÉTODO PECS

O PECS (Picture Exchange Communication System) ou Sistema de


comunicação por figuras utiliza cartões com símbolos para a aprendizagem
de habilidades de comunicação. A criança é treinada para usar os cartões
para perguntar ou responder à perguntas e para manter uma conversação.

» MÉTODO FLOORTIME

O Floortime foca no estímulo ao desenvolvimento emocional e relacional


da criança. O método busca entender os sentimentos da criança e relação
com seus cuidadores e também na maneira como a criança se relaciona
com os órgãos do sentido (olfato, audição, visão, tato e paladar).

» MEDIADOR ESCOLAR

Um profissional importante no tratamento e no processo pedagógico dessa


criança é o mediador escolar. Ele funcionará de elo entre educadores, pais
e o estudante. Trabalhará auxiliando a criança na sala de aula e em todos os
ambientes escolares, mediando e ensinando regras sociais, estimulando
a comunicação e sua participação em sala, acompanhando a interação
social dela com outras crianças, corrigindo rituais e comportamentos
repetitivos e acalmando o estudante em situações de irritabilidade e
impulsividade.

» ESPORTES

As atividades esportivas e de psicomotricidade também merecem


destaque nas intervenções com crianças e adolescentes com autismo, pois
melhoram a saúde clínica da criança, auxiliam muito no desenvolvimento
de habilidades motoras e de consciência corporal.

62
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

» GRUPOS DE APOIO

Os grupos de apoio são formados por pais, profissionais e pesquisadores


que buscam a divulgação do conhecimento científico sobre o autismo,
promovendo campanhas e atividades direcionadas a motivar e orientar
as famílias em sua procura por diagnóstico, tratamento, educação e
inclusão social.

Quanto mais cedo intervenções como estas forem feitas, melhor para o prognóstico e
qualidade de vida do indivíduo.

Um dado importante a ser ressaltado é que, segundo pesquisas, o TEA é um quadro


clínico que costuma acometer mais meninos do que meninas.

Figura 37. Sinais de alerta para autismo.

Os sinais de alerta para o TEA


Aos 6 meses Não sorri expressando alegria.
Aos 9 meses Não responde à interação (sorrisos, caretas ou sons); não busca a interação produzindo sons, sorrisos ou caretas.
Aos 12 meses Não balbucia, não responde ao lhe chamarem pelo nome, não segue com o olhar os gestos que o outro lhe faz.
Aos 18 meses Não fala palavras e não expressa o que quer.
Aos 24 meses Não fala frases com duas palavras que não sejam apenas imitação e repetição.
Fonte: Miranda (2012).

63
CAPÍTULO 4
Transtornos específicos da
Aprendizagem

Para alguns alunos, aprender na maneira como a escola ensina (ensino formal) flui de
uma forma natural, suas habilidades são desenvolvidas em consonância com o que é
ensinado na escola. Mas esta não é a realidade de todos. Muitos alunos apresentam
dificuldades em aprender algumas disciplinas da forma esperada e isso pode ocorrer por
diversos motivos, tais como: falta de interesse/motivação, atraso no desenvolvimento
cognitivo global, problemas de atenção, TDAH, deficiência visual ou auditiva, déficit
no Processamento Auditivo Central (PAC), dificuldade em entender o que está sendo
pedido, problemas familiares e emocionais ou, ainda, por um Transtorno Específico
da Aprendizagem, que é o que nós vamos estudar agora. Os Transtornos Específicos
da Aprendizagem, segundo o DSM-V, envolvem 3 modalidades:

» Com prejuízo na leitura (também chamada de dislexia): déficit na


precisão, velocidade, fluência e compreensão da leitura.

» Com prejuízo na matemática (mais conhecida como discalculia):


distúrbio no senso numérico, memorização de fatos aritméticos, precisão
ou fluência de cálculo, precisão no raciocínio matemático.

» Com prejuízo na expressão escrita (conhecida como disgrafia


e disortografia): déficit de precisão na ortografia, na gramática e na
pontuação e falta de clareza ou organização da expressão escrita.

A denominação de Transtornos Específicos da Aprendizagem existe porque eles


dizem respeito a dificuldades em apenas alguns aspectos particulares da aprendizagem,
não significa que a aprendizagem como um todo, do indivíduo, esteja afetada. Neste
capítulo, vamos entender quais são os aspectos particulares da aprendizagem que cada
um desses transtornos acomete e como cada um se apresenta no indivíduo.

Dislexia
A dislexia, assim como os outros Transtornos Específicos da Aprendizagem, é uma
alteração do neurodesenvolvimento, de origem neurobiológica, que compromete a
capacidade do cérebro de perceber e processar certos tipos de informação com eficiência
e exatidão. A dislexia é caracterizada por uma dificuldade na habilidade de leitura e

64
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

de tradução dos sons em letras e das letras em seus sons. Em outras palavras, o que
acontece é que a pessoa não consegue entender muito bem que cada palavra é formada
por partes menores (sons de letras e sons de sílabas que se juntam) e não percebe que
novas palavras podem ser formadas quando sons são acrescentados, tirados, invertidos
ou substituídos nas palavras. Ou seja, há uma incapacidade naquilo que aprendemos na
disciplina de Funções Cognitivas, como sendo a “consciência fonológica”. Lembram-se?

Por ter essa dificuldade no âmbito da decifração dos códigos escritos (leitura), a pessoa
com Dislexia, consequentemente, também apresentará dificuldades na escrita.

Costuma-se considerar a Dislexia um transtorno heterogênio, pois as dificuldades e


necessidades que os disléxicos podem apresentar em relação à leitura, não são sempre
as mesmas e não há um único método de tratamento que sirva para todos. O que é
certo, é que este transtorno demanda uma avaliação e atendimento interdisciplinar,
com a participação de profissionais especializados da psicologia, neuropsicologia,
fonoaudiologia e psicopedagogia.

Apesar de ter um desenvolvimento atípico na aptidão literária, as pessoas com dislexia


costumam ter inteligência acima da média e apresentar altas habilidades em diversos
campos, como o das artes plásticas, da música, do teatro, da oratória etc. Dislexia nada
tem a ver com Deficiência Intelectual.

O intelecto do disléxico está preservado, o que está comprometido é apenas o seu


processamento fonológico e outros componentes do cérebro que estão relacionados
aos aspectos perceptivos da leitura (componentes visuais e auditivos). Este déficit no
processamento fonológico do disléxico, compromete dois dos domínios da linguagem:
o sintático (estruturação frasal) e o semântico (significado do que se lê ou do que se
escreve), além de comprometer, também, a memória operacional que estudamos na
Unidade IV, da disciplina “Funções Cognitivas”.

O comprometimento na memória operacional e no domínio semântico acontecem


quando o disléxico vai ler. Uma leitura muito lenta e trabalhosa acaba sobrecarregando
a memória operacional e isso atrapalha a interpretação dos textos lidos.

É importante ressaltar que, por mais que o disléxico tenha potencial para entender e
assimilar o conteúdo acadêmico, se este for passado através da leitura, ele não vai ter
um bom rendimento. Como o nosso sistema escolar é totalmente baseado na leitura, o
disléxico tenderá a ter prejuízo em todas as disciplinas.

65
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

Apesar das dificuldades relacionadas à leitura, o disléxico não possui qualquer


prejuízo em sua capacidade de compreensão auditiva, portanto se alguém ler
um texto para ele em voz alta, ele compreenderá sem dificuldades.

Na identificação deste transtorno específico de aprendizagem, assim como dos outros


dois que iremos estudar, a participação dos professores é essencial. Em geral, é na escola
que acontece a primeira suspeita de que a criança possa ter algum transtorno específico
de aprendizagem. Antes disso, a criança não costuma passar por situações que testem
essas capacidades de forma a tornar evidente a existência de uma dificuldade. Por este
motivo, o diagnóstico costuma acontecer em idade escolar.

Diagnóstico

Antes de falar do diagnóstico da dislexia e dos outros transtornos específicos da


aprendizagem, é importante que saibamos que existe um programa de rastreio desses
transtornos que não é amplamente divulgado e conhecido aqui no Brasil, mas que aos
poucos vêm ganhando espaço no nosso cenário. Este programa chama-se Resposta à
Intervenção (do inglês “Response to Intervention” – RTI). Por meio dele, é possível
identificar se uma dificuldade de aprendizagem da criança é apenas uma dificuldade
que pode ser resolvida a partir de uma intervenção individualizada ou se trata de
um transtorno específico da aprendizagem. Se for apenas uma dificuldade, a criança
conseguirá avançar nas diferentes etapas deste programa e se, o que ela tiver for um
transtorno específico da aprendizagem, as suas dificuldades irão se manter apesar da
intervenção individualizada e ela não avançará nas etapas que se sucedem.

Pode-se suspeitar que a criança possui um transtorno específico da aprendizagem,


a partir do momento em que as suas habilidades acadêmicas afetadas estejam
significativamente abaixo do esperado para a sua idade e que mesmo passando por
intervenções dirigidas a estas dificuldades a criança não avance em seu desempenho.

Abaixo você pode conferir o que os critérios diagnósticos para transtornos específicos
da aprendizagem incluem:

Figura 40. Critérios diagnósticos para os Transtornos Específicos da Aprendizagem.

Leitura lenta e incorreta de palavras e feita sob Lê palavras isoladas em voz alta de forma lenta, incorreta ou hesitante; frequentemente
esforço. “advinha” palavras.
Dificuldade de compreender o significado do que Pode ler corretamente um texto, porém não entende a sequência, as relações, as inferências
é lido. ou os sentidos mais profundos do que foi lido.
Dificuldades de soletração. Pode acrescentar, omitir ou substituir vogais ou consoantes.
Dificuldade de expressão escrita. Frases apresentando múltiplos erros de gramática ou pontuação, organização inadequada dos
parágrafos, pouca clareza ao expressar as ideias apor meio da escrita.

66
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

Dificuldades no domínio do senso numérico, dos Tem pouco conhecimento dos números, sua magnitude e a relação entre eles; se perde no
fatos numéricos ou cálculos meio de uma conta, podendo confundir os procedimentos.
Dificuldades no raciocínio matemático. Demonstra muita dificuldade em aplicar conceitos, fatos ou procedimentos matemáticos para
resolver problemas quantitativos.
Fonte: Instituto ABCD, 2015.

Com base nesses critérios, um médico especialista, com a ajuda da avaliação de


outros profissionais que podem ser psicólogos especialistas em neuropsicologia,
psicopedagogos ou fonoaudiólogos, poderá estabelecer um diagnóstico efetivo de
dislexia ou outro transtorno específico da aprendizagem.

A incidência da Dislexia varia de 5 a 8% das crianças que apresentam dificuldade


escolar, com maior prejuízo em crianças do gênero masculino.

Figura 41. Dificuldades comuns a crianças/jovens, com transtornos específicos da aprendizagem.

PERCEPÇÕES COTIDIANAS:
Identificar os dias da semana e os meses do ano (noção de tempo).
Reproduzir uma história na sequência correta.
Seguir ordens e rotinas.
Desenvolver a noção de orientação espacial (confusão com localização e direções).
Inverter os pés ao calçar sapatos ou confundir direita/esquerda, em cima/ embaixo (lateralidade).
Perceber o esquema corporal.
Lidar com padrões de sons que se repetem (acompanhar o ritmo de uma música)
Aprender canções com rima.
LINGUAGEM:
Demonstrar atraso na aquisição da fala.
Persistir em uma fala infantilizada.
Trocar sons ao pronunciar determinadas palavras.
Demonstrar dificuldades para nomear objetos.
Utilizar expressões amplas “lá, naquela lugar”.
Usar substitutos “coisa”, “negócio”, “treco”.
Substituir palavras semanticamente parecidas (falar cadeira ao invés de poltrona).
ATIVIDADES CORPORAIS
Dificuldade para amarrar cadarço de sapatos.
Falta de precisão para agarrar objetos arremessados no ar.
SITUAÇÕES QUE ENVOLVEM LEITURA E ESCRITA:
Assistir a um filme com legenda.
Aprender um novo idioma.
Fonte: Instituto ABCD, 2015.

Tratamento

O tratamento recomendado para a dislexia é aquele que é feito levando em consideração a


necessidade de cada disléxico, pois, como vimos, a dislexia é um transtorno heterogêneo,
as dificuldades podem variar de um disléxico para o outro. Mas, os especialistas que são

67
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

capacitados para fazer o tratamento são o fonoaudiólogo, o psicopedagogo, o psicólogo


(para cuidar dos problemas emocionais que o disléxico costuma apresentar) e o
neuropsicólogo (que pode cuidar das questões relacionadas à memória e à atenção, além
de ajudar na avaliação para o possível diagnóstico). Isto não significa que o disléxico
precisará passar obrigatoriamente por todos estes profissionais para ser tratado. Como
foi falado, é necessário investigar a demanda de cada um.

O fato de o disléxico apresentar dificuldades na aprendizagem da leitura e escrita não


significa que ele não possa aprender a ler. Significa apenas que ele necessitará de um
método de ensino que atenda às suas necessidades especiais. Nesse caso, o que costuma
funcionar é a ênfase no ensino dos sons das palavras, na associação de cada letra ao seu
respectivo som. Para saber mais sobre estas técnicas veja os materiais abaixo:

» Vídeo “Transtornos específicos de aprendizagem: estratégias para o


acompanhamento educacional”, disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=VYVlRxmfS-E>.

» Texto “O que funciona para os alunos com dificuldades persistentes em


leitura e escrita nos anos iniciais?”:

» Disponível em: <http://www.institutoabcd.org.br/wpcontent/


uploads/2015/05/recomendacoes_extraidas_do_documento_best_
evidence_encyclopedia_john_hopkins_university.pdf>.

» Vídeo “Todos Aprendem (Módulo 3) - Como ajudar o aluno a ouvir, entender


e falar melhor?”, disponível em: <https://vimeo.com/107807863>.

Discalculia
A discalculia é um transtorno específico da aprendizagem caracterizado por déficits
no processamento de informações numéricas, que envolvem habilidades como:
compreender o conceito de número e manipulá-los mentalmente, contar, aprender
os sistemas cardinais e ordinais, completar sequências de números, compreender
o significado dos sinais das 4 operações básicas (+, -, x, ÷) e da igualdade (=);
reconhecer princípios de medidas, reconhecer valores de moedas, entender fatos
aritméticos, compreensão das horas, dentre outros. Por ser um transtorno específico
de aprendizagem, a discalculia tem muitas características em comum com a dislexia.

Trata-se de um transtorno do neurodesenvolvimento, derivado de uma disfunção


biológica, o diagnóstico costuma acontecer em idade escolar e causa danos ao

68
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

desenvolvimento socioemocional de crianças e adolescentes, por conta do diagnóstico


tardio e da falta de compreensão que estes jovens enfrentam até serem diagnosticados.

Além disso, a discalculia também não significa prejuízo do intelecto, mas apenas uma
disfunção em alguns processos cognitivos ligados às capacidades matemáticas. Pessoas
com discalculia podem apresentar altas habilidades em áreas do conhecimento que
não estejam diretamente ligadas à matemática, como as artes, as profissões da área de
humanas etc.

Qualquer transtorno específico de aprendizagem, pode se apresentar de forma isolada


ou em combinação com outros da mesma categoria. É comum encontrar crianças com
discalculia e dislexia, bem como com dislexia e disgrafia, por exemplo. Mas, é importante
ressaltar que os transtornos específicos da aprendizagem só podem ser suspeitados na
ausência de deficiência intelectual e lesões neurológicas e, na presença de exposição ao
ensino formal.

Figura 44. Dificuldades percebidas na discalculia.

O indivíduo com transtorno de habilidades matemáticas poderá apresentar:


Dificuldade para processar auditivamente, entender e escrever números.
Dificuldade para perceber velocidade, temperatura e tempo.
Dificuldade para compreender como os números se relacionam uns com os outros.
Memória de trabalho ou operacional ruim e dificuldade para lidar com várias informações ao mesmo tempo.
Lentidão da velocidade de processamento.
Fonte: Weinstein, 2010.

Figura 45. Dificuldades Acadêmicas na discalculia.

Em termos acadêmicos alunos com discalculia poderá apresentar:


Dificuldade para entender conceitos numéricos simples (tais como, local/valor e o uso das quatro operações).
Falta de conhecimento intuitivo sobre números (valor e relação entre os números).
Problemas para aprender, evocar e/ou usar fatos e procedimentos numéricos (ex.: taboada, divisões longas).
Mesmo que estes alunos produzam uma resposta correta ou usem um número correto, eles geralmente o fazem de maneira mecânica e sem
confiança.
Fonte: Weinstein, 2010.

Diagnóstico

Assim como nos demais transtornos específicos de aprendizagem, quando há suspeita


de descalculia, por parte do professor ou da família, o aluno deve ser encaminhado para
uma avaliação diagnóstica interdisciplinar, para então dar início ao tratamento.

Para uma avaliação detalhada é necessário decompor os componentes


das habilidades matemáticas em partes menores e avaliá-las

69
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

individualmente. Dessa forma, o diagnóstico de um transtorno


de habilidade matemática será melhor realizado por uma equipe
interdisciplinar (composta por fonoaudiólogo, neuropsicólogo,
psicopedagogo e médico neuropediatra), que poderá observar e
discutir o desempenho em cada domínio cognitivo específico e as
influências mútuas entre eles: formação de conceitos, velocidade de
processamento da informação, memória de trabalho, decodificação
de símbolos, domínio de leitura e escrita, atenção, memória, senso
numérico, domínio de procedimento, noções de tempo e espaço, entre
outros (WEINSTEIN, 2010, p. 6).

Tratamento

O tratamento deve ser direcionado às necessidades específicas do jovem e podem


contar com profissionais como o fonoaudiólogo, o psicólogo, o neuropsicólogo e o
psicopedagogo.

Em discalculia, torna-se necessária a disposição de acomodações pedagógicas em sala


de aula, que atendam às necessidades especiais do aluno, como o uso de calculadora
na realização de tarefas, por exemplo. Estas acomodações são legalmente garantidas,
desde que o aluno tenha diagnóstico formal do quadro.

Segundo a literatura especializada, a prevalência da discalculia costuma ser de 5% das


crianças que apresentam dificuldade escolar.

Disgrafia e disortografia

Enfim chegamos a última modalidade dos transtornos específicos da aprendizagem,


que são os relacionados à escrita. Nesta modalidade existem dois tipos:

1. Disgrafia: distúrbio que afeta a expressão escrita do indivíduo,


prejudicando a sua clareza ou organização. Pessoas que apresentam
este distúrbio costumam cometer erros como: mudar a forma das letras,
aumentar ou diminuir o seu tamanho de forma aleatória na frase, não
respeitar margens, ultrapassar a linha, colocar uma pressão no lápis
excessiva ou deficitária, escrever as letras de forma invertida (escrita
espelhada) e escrever letras muitas vezes indecifráveis, com traçados
defeituosos e irregulares.

70
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

2. Disortografia: distúrbio que afeta a capacidade de escrever


corretamente e de expressar ideias através da escrita. Indivíduos que
apresentam este transtorno costumam cometer erros como: escrever
frases mal estruturadas, incompletas, com pobreza de vocabulário,
falta de elementos essenciais (como conectivos, por exemplo), repetição
de palavras, linguagem empobrecida, faltas ou erros de pontuação, de
concordância, falta de concatenação das ideias, inversão na ordem das
letras ou das sílabas nas palavras ou omissão ou substituição destas. Além
disso, em se tratando de gramática, essas pessoas podem ter dificuldades
em categorizar, utilizar corretamente tempos verbais e dividir orações.

O procedimento para diagnóstico e tratamento destes transtornos são os mesmos que


se aplicam à dislexia e à discalculia. A origem da disgrafia e da disortografia também é
semelhante à destes dois transtornos.

71
CAPÍTULO 5
TANV: Transtorno de aprendizagem não
verbal

O Transtorno de Aprendizagem Não Verbal (TANV) também é considerado um subtipo


específico dos transtornos de aprendizagem, porém ainda não é reconhecido por muitos
pesquisadores, por isso não consta nos sistemas classificatórios de doenças, existentes.
Como ele não consta na categoria oficial de Transtorno Específico da Aprendizagem do
DSM-V, resolvemos colocá-lo em uma sessão à parte.

O TANV é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por um déficit


no processamento da informação perceptual não linguística. Este déficit produz
problemas tanto na recepção e decodificação da informação, quanto na expressão, por
consequência.

As disfunções que o transtorno de aprendizagem não verbal envolve são variadas e


abrangem diversos domínios cognitivos. Sumarizando estas disfunções por domínio
atingido, temos:

» Psicomotricidade:

› dificuldades de equilíbrio;

› dificuldades de habilidades grafo-motoras;

› falha na coordenação motora (praxias)

» Visual, espacial, organizacional:

› falha na percepção espacial e nas relações espaciais;

› memória fotográfica pobre;

› imaginação deficitária.

» Sócioemocional:

› baixa compreensão da comunicação não verbal;

› apego a rotina e rejeição a mudanças e situações novas;

› déficit no julgamento e nas interações sociais.

72
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO │ UNIDADE III

A seguir acompanharemos, na íntegra, um texto retirado do livro: “Distúrbio


de Aprendizagem Não Verbal em casa – Um guia para os pais”, escrito pela
especialista Pamela B. Tanguay, traduzido e resumido por Letícia Cottini:

Nonverbal Learning Disabilities at Home – A


parent’s Guide
Pamela B. Tanguay

(Distúrbio de Aprendizagem Não Verbal em casa – Um guia para os pais)

Tradução e resumo: Letícia Cottini

O que é?
Distúrbio de Aprendizagem Não Verbal é uma deficiência neurológica,
generalizada, que é causada por danos no circuito cerebral.

Áreas de déficit:

» Tátil (percepção): capacidade de identificar algo somente pelo toque.

» Tátil (atenção): capacidade de atender as estratégias de ensino que


exigem contato.

» Percepção Visual: capacidade de verificar com precisão o campo visual


ou ambiente e processar o que é visto.

» Atenção Visual: capacidade de atender a estratégias de ensino que


utilizam modalidade visual.

» Orientação Espacial: consciência de onde o indivíduo está no espaço e


sua proximidade física com os outros objetos.

» Coordenação Psicomotora: capacidade de comandar o seu corpo para


fazer aquilo que ele deseja que seja feito, no momento desejado.

» Generalização da Informação: aplicação de uma informação aprendida


previamente, em uma situação semelhante.

» Flexibilidade Mental: capacidade de assimilar e processar novas


informações ou ideias que irão influenciar na sua maneira de pensar
sobre um tópico ou uma situação.

» Pragmática: uso funcional e prático da linguagem.

» Habilidade Social: capacidade de interagir apropriadamente, baseado


nas normas estabelecidas de relação social.

73
UNIDADE III │ TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO

» Adaptabilidade: capacidade de se ajustar a uma nova situação.

» Estabilidade Emocional: consistência no bem estar emocional.

» Função Executora e Organização: capacidade de organizar, priorizar e


planejar pensamentos e atividades.

Sinais precoces de alerta:

» Dificuldade em se acalmar desde bem pequena? Ela consegue se


acalmar sozinha ou necessita de ajuda?

» Dificuldade para dormir?

» A criança é ativa? Consegue executar as atividades motoras próprias


da sua idade?

» A criança possui medo excessivo?

» A criança parece não entender causa e efeito?

» Quando aprende a andar, a criança se mostra muito instável? (mais do


que normalmente é verificado em outras crianças).

» Possui dificuldade em subir e descer escadas? (falta de estabilidade).

» Odeia surpresas e assusta-se com muita facilidade?

» Não gosta que sua rotina seja alterada?

» Dificuldade de interagir com outras crianças?

Papel dos pais

Os pais devem desempenhar o papel central no desenvolvimento da criança e


no programa de intervenção ao qual ela será submetida.

Fonte: Tanguay, 2000.

Diagnóstico

O diagnóstico só pode ser efetuado se este distúrbio estiver causando prejuízos sociais
no indivíduo. Caso esteja, o procedimento a ser seguido é o mesmo dos transtornos
específicos da aprendizagem.

74
CONCEITOS E
CONSIDERAÇÕES GERAIS UNIDADE
SOBRE AGNOSIA, APRAXIA,
AFASIA E AMNÉSIA E IV
PATOLOGIAS FREQUENTES EM
AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO

Introdução
Esta Unidade apresentará aos estudantes algumas das alterações neurológicas que o
paciente pode apresentar e que não são tão comumente abordadas pelo senso comum ou
em reportagens. Por vezes os pacientes se sentem desajustados do meio em que vivem,
mas não compreendem o porquê, pois não percebem suas limitações. Os familiares
também sentem dificuldades e lidar com este membro adoentado.

A avaliação correta auxilia no entendimento das limitações do indivíduo e no melhor


esclarecimento diagnóstico e diminuindo a possibilidade de equívocos na prescrição
medicamentosa, ao discutir o caso com outro profissional da saúde que atenda este
paciente.

Apesar de não serem patologias primariamente decorrentes de alterações no Sistema


Nervoso Central, julgamos importante apresentá-las nesta apostila, pois é importante
que o neuropsicólogos saibam reconhecê-las, especificamente para entender o discurso
do paciente e pensar em um melhor horário para a avaliação e pensar na ordem de
aplicação dos instrumentos.

Compreendendo os comportamentos do paciente e os momentos de maior pico de uma


fase eufórica ou depressiva, a interpretação do desempenho dos testes também vai ser
diferenciada.

Objetivos
» Prover informações básicas acerca das Agnosias, Apraxias, Afasias e
Amnésia.

» Fornecer respaldo teórico para que o neuropsicólogo seja capaz de


interpretar adequadamente a performance do paciente psiquiátrico
diante da avaliação.

75
» Auxiliar o aluno a ter um olhar diferenciado para o paciente com
Depressão ou Transtorno Bipolar do Humor, auxiliando no raciocínio
clínico, inclusive para manejo de psicoterapia ou elaboração do programa
de reabilitação neuropsicológica, quando indicados.

CAPÍTULO 1
Gnosias

O primeiro contato do organismo humano com o meio externo se dá por meio dos
órgãos dos sentidos (tato, visão, olfato, paladar e audição). Estando estes saudáveis, a
próxima etapa é a decodificação dos estímulos, processo que vai transformar o estímulo
em uma sensação perceptível.

A sensopercepção corresponde à sensação e à interpretação dos estímulos que se


apresentam diante de nós. As sensações são percebidas pelos órgãos dos sentidos e a
decodificação é feita em processo de segunda ordem em nosso cérebro.

Para cada órgão do sentido, podemos citar alguns exemplos:

» tato: primeiro ocorre o contato da pele com a água, para depois o cérebro
decodificar que a água está fria.

» visão: primeiro o estímulo luminoso chega ao trato óptico, para, então,


ser decodificado e entendemos que aquele estímulo visual é a imagem de
um caderno.

» paladar: o primeiro contato é o do alimento com as papilas gustativas, o


segundo momento é a decodificação de que aquele é o sabor doce de uma
manga.

» olfato: inicialmente o aroma chega às vias nazais e posteriormente, o


cérebro pode traduzir aquela informação, informando que se trata do
cheiro de um eucalipto.

» audição: o estímulo sonoro chega ao trato auditivo e, depois, é decodificado


como sendo o som do toque de uma mensagem que chegou ao celular.

Sabemos que há casos em que algum dos órgãos dos sentidos não está em pleno
funcionamento das vias receptoras dos estímulos. Quando a pele está queimada, por
76
CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AGNOSIA, APRAXIA, AFASIA E AMNÉSIA E PATOLOGIAS FREQUÊNTES EM
AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO │ UNIDADE IV

exemplo, e uma bolha encobre o ferimento, não há a mesma sensibilidade receptora


de estímulos do que se estivesse em seu estado sadio. Quando a visão não está em sua
plena saúde, o indivíduo não é capaz de enxergar adequadamente, em alguns casos fica
ou nasce cego. O mesmo para os demais órgãos dos sentidos.

Também pode haver pleno funcionamento das vias receptoras dos estímulos, mas
ocorrer falhas na decodificação dos mesmos. Sendo assim, a pessoa pode receber os
estímulos visuais, mas não ser capaz de identificar que aquele objeto que vê é uma
escova de dentes, por exemplo. Este distúrbio do reconhecimento (de objetos, odores,
sons, pessoas, formas...) sem prejuízo do sentido específico (ou sem prejuízo mnéstico)
é chamado de agnosia.

Exemplos de dificuldades de reconhecimento que as pessoas com agnosia podem


apresentar:

» visual: objetos, pessoas, cores...auditiva: latido de um cachorro, buzina,


som da campainha, do telefone...

» tátil: ao tocar, não percebe que a panela está quente e pode queimar;
há dificuldade no reconhecimento de formatos, não sabendo distinguir o
que é uma maçã de um abacaxi, por exemplo;

» olfato: não sentir cheiro de queimado, não diferenciar cheiro de comida


apodrecida da comida feita na hora;

» paladar: não perceber se a comida está estragada, doce, apimentada...

Figura 33. Agnosia.

Fonte disponível em: <http://agnosia-ot.weebly.com/uploads/1/9/3/4/19340935/1699986.jpg?205>.

77
CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AGNOSIA, APRAXIA, AFASIA E AMNÉSIA E PATOLOGIAS FREQUÊNTES EM
UNIDADE IV │ AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO

A pessoa é capaz de identificar que há um objeto diante de seus olhos (ou um alimento na
boca), mas não é capaz de identificar que objeto ou alimento é aquele. Em alguns casos,
as pessoas são capazes de reconhecer visualmente o objeto, mas não sabem informar
ao certo qual é a utilidade, mesmo que saibam utilizá-lo na vida real. A dificuldade é em
descrever o uso.

Por exemplo: a pessoa pode estar diante de uma escova de dentes, ser capaz de nomear,
ou seja, dizer que o nome daquele objeto é “escova de dentes”, mas, ao ser questionada
sobre a finalidade da escova de dentes, não sabe informar. Mesmo assim, a pessoa pode
pegar a escova e utilizá-la para escovar seus dentes.

Este tipo de dificuldade não deve ser confundida com dificuldades de memória, pois,
aqui, a dificuldade é no processo gnóstico, ou seja, de percepção ou de associação
concomitante ao funcionamento saudável das vias sensoriais primárias receptoras de
estímulos.

Em certos casos o paciente pode se colocar em risco, ingerindo comida podre ou não
ouvindo a buzina de um carro que alerta para que não atravesse a rua; ou colocar em
risco a vida de outros, caso não perceba o cheiro de queimado, por exemplo.

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CAPÍTULO 2
Praxias

Praxia é a capacidade de realização correta de movimento voluntário, tais como: fechar


a tampa de uma garrafa, riscar um palito de fósforos, descascar uma fruta, entre outros.

Chama-se de apraxia a dificuldade na execução de movimentos voluntários orientados a


um propósito, em especial em atividades que exigem o uso de motricidade fina. Existem
diversos subtipos de apraxias, algumas delas serão descritas a seguir:

A apraxia ideomotora é a inabilidade de realizar atos motores sob comando verbal,


mesmo que estes sejam realizados espontaneamente pelo indivíduo. O indivíduo
apáxico pode ter dificuldades na realização correta de certos movimentos, mesmo que
ele saiba informar e descrever minuciosamente como estes devem ser feitos. Estudos
científicos apontam que os déficits na produção de gestos estão relacionados a lesões
frontais e parietais à esquerda.

A apraxia ideomotora é mais comum relacionada ao uso de objetos e ferramentas,


como um talher, um elástico ou uma chave de fenda, do que a realização de gestos
com conotação simbólica, como acenar com a mão, por exemplo. A apraxia ideomotora
geralmente é resultante de lesão no hemisfério esquerdo.

Figura 34. Apraxia.

Fonte disponível em: <http://www.medfriendly.com/images/ideational_apraxia.jpg>.

A apraxia da marcha é uma dificuldade para andar, descartando-se fraqueza, perda


sensorial ou falha de coordenação motora. O indivíduo apresenta marcha lenta, com
passos curtos, sem levantar o pé do chão e passando a impressão de hesitar a cada
passo dado.

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UNIDADE IV │ AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO

A apraxia do vestir é referente à inabilidade de vestir as peças de roupa na ordem


correta, obedecendo ao esquema corporal, mesmo que as capacidades motoras simples
e a cognição global estejam preservadas. Esta resulta geralmente de lesões no hemisfério
direito. Eventualmente, os pacientes podem tentar vestir as calças nos braços ou podem
colocar uma roupa íntima por cima de outra peça.

Figura 35. Apraxia do vestir.

Fonte disponível em: <http://images4.fanpop.com/image/photos/20400000/Publicity-Photo-superman-the-


movie-20409110-1009-1400.jpg>.

Apraxia bucofacial refere-se à incapacidade de realização de movimentos orais sob


comando, tal como soprar um fósforo ou por a língua para fora. Por outro lado, podem,
espontaneamente, fumar, engolir ou lamber os lábios ao sentir farelos, por exemplo.

A apraxia construtiva é a incapacidade ou a dificuldade de reproduzir elementos


gráficos ou tridimensionais, tais como trabalhar com figuras geométricas, montar
quebra-cabeças, fazer um desenho, entre outros. Esta dificuldade deve ser referente a
tarefas que o indivíduo fazia com facilidade, anteriormente à lesão neurológica. Este
tipo de apraxia é resultante de lesões no hemisfério direito.

Deve-se descartar algumas hipóteses sobre a não realização do movimento a ser


analisado:

» presença de agnosias;

» falha de compreensão do que foi solicitado;

» presença de Transtorno Opositor Desafiante;

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CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AGNOSIA, APRAXIA, AFASIA E AMNÉSIA E PATOLOGIAS FREQUÊNTES EM
AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO │ UNIDADE IV

» desatenção;

» ausência de alterações do tônus;

» dificuldade de compreensão.

O avaliador precisa se certificar de que o paciente entende o que precisa fazer e que
há registro sobre o que está sendo solicitado, não exigindo do paciente que realize
movimento que nunca realizou anteriormente.

81
CAPÍTULO 3
Afasias

O termo afasia está relacionado as alterações da fala. Algumas das principais causas
estão relacionadas às isquemias na região da artéria cerebral média. Há diversos
subtipos de afasias, cada qual com sua particularidade. As principais limitações podem
permear entre:

» repetição;

» redução da fluência;

» expressão verbal fragmentada;

» parafasias.

Em cada subclassificação de afasia, pode haver preservação de componentes da


linguagem, como:

» fluência;

» repetição;

» articulação;

» fonologia;

» sintaxe.

Dentre as mais conhecidas, estão a Afasia de Broca, caracterizada por distúrbios na


expressão, com uso de poucas palavras, em uma fala não fluente e grande dificuldade
na evocação de palavras. Ocorre decorrente de lesão no lobo frontal esquerdo.

A afasia de Wernicke também é bastante comum entre as afasias, sendo permeada por
profunda alteração da compreensão verbal. A expressividade tende a ser logorreia,
em que o paciente fala aleatoriamente e sem conexão com aquilo que lhe foi dito.
As alterações cerebrais estão correspondentes aos giros medial e superior.

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AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO │ UNIDADE IV

Figura 36. Afasias.

Fonte disponível em: <http://cienciasecognicao.org/neuroemdebate/wp-content/uploads/2014/06/afasia-1.png>.

83
CAPÍTULO 4
Amnésia

Dificuldades relacionadas a etapa de evocação das informações que ficaram armazenadas


na memória. De acordo com o DSM-V, amnésia é a “incapacidade de recordar
informações autobiográficas importantes que é inconsistente com o esquecimento
comum”, que ocorre em indivíduos saudáveis.

A reabilitação neuropsicológica do paciente com amnésia precisa abranger objetivos


simples e pautados na repetição, priorizando manter o paciente orientado e informado
sobre seu acometimento. As repetições iniciais podem ser:

- Seu nome é Fulano, você tem XX anos, é casado e mora na cidade de


São Paulo.

E o indivíduo repete as informações todos os dias, várias vezes. Conforme o paciente


se acostume com a rotina repetitiva, pode-se inserir um calendário grande em algum
ponto de grande visualização na residência, para que este indivíduo possa se orientar.
Ao acordar, circula-se o dia corrente e, ao ir dormir, marca-se um “X” por cima deste
dia, simbolizando seu término.

Figura 37.

Fonte disponível em: <http://contadorpublico.com.br/v3/wp-content/uploads/2017/02/Calendario-do-PIS-2016.jpg>.

É importante que um cuidador de convívio seja ativo no tratamento, para que possa
repetir a ele estas informações com frequência, até que sejam internalizadas. A partir
de então, podem-se trabalhar outros aspectos relacionados à sua autonomia.

84
CAPÍTULO 5
Depressão

As características prementes dos pacientes em episódio depressivo são o humor triste


ou irritável, a perda do interesse em atividades que antes eram interessantes, anedonia,
melancolia e pessimismo. Estes sintomas podem cursar com irritabilidade, ansiedade,
pânico, queixas somáticas variadas, tendência a ideias de menos-valia, alterações de
sono, apetite, energia, libido e motivação, alterações de pensamento, como sentimento
de culpa, de fracasso, desesperança com o futuro e ideação suicida nos casos mais
graves. Podem vir acompanhados de alterações somáticas e cognitivas, que afetam
significativamente o funcionamento do indivíduo.

Figura 38. Depressão.

Fonte disponível em: <http://www.hospitalespecializado.com.br/blog/wp-content/uploads/2014/05/depressao.jpg>.

Há diferentes apresentações da doença e o que as diferem são, basicamente, o tempo de


duração, o momento em que ocorrem e a intensidade com que os sintomas interferem
no funcionamento cotidiano.

O transtorno depressivo maior é o mais comum. Para este diagnóstico é necessária à


ocorrência de “episódios distintos de pelo menos duas semanas de duração, envolvendo
alterações nítidas no afeto, na cognição e em funções neurovegetativas, e remissões
interepisódicas” (DSM-V).

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UNIDADE IV │ AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO

Uma forma mais crônica de depressão é o chamado transtorno depressivo persistente


(também conhecido como distimia), que pode ser diagnosticada quando a perturbação
do humor continua por pelo menos dois anos em adultos e, no caso de crianças,
persistência por um ano.

Quando o primeiro episódio depressivo ocorre após os 60 anos, a depressão é


caracterizada como de início tardio. Neste caso, o paciente acometido apresenta maior
grau de apatia, isolamento social, solidão, rede social não estruturada e disfunção
cognitiva, especialmente na atenção e velocidade psicomotora. Este tipo de depressão
pode ser indicativo de um futuro desenvolvimento de transtorno Neurocognitivo.

A associação de Alzheimer e depressão é bastante comum e o grau de incapacidade e


dependência do indivíduo passa a ser exacerbado.

Muitas vezes os quadros de depressão são subestimados pelos pacientes e/ou seus
familiares, que acabam não dando importância aos sintomas. Consequentemente, são
subdiagnosticados e subtratados, o que contribui para a diminuição da qualidade de
vida do paciente.

Os profissionais devem ser devidamente esclarecidos sobre os critérios diagnósticos


e como identificar e avaliar os sintomas por meio da fala do sujeito e de possível
acompanhante que conviva com ele. Não se deve confundir quadro de depressão com
a tristeza ou luto normais, ocorridos diante de determinadas situações. O luto pode
induzir grande sofrimento, mas não costuma provocar um episódio de transtorno
depressivo maior.

Durante a realização de testes neuropsicológicos, com frequência, o paciente depressivo


informa que não se lembra ou que não sabe responder, sempre transmitindo uma
informação de que não é capaz. Entretanto, se são apresentados elementos como dicas,
o paciente comumente sabe indicar a resposta. É evidente que não há vontade em se
esforçar para lembrar, mas também não há déficit primário de memória.

Em alguns casos o paciente não mantém a atenção em alerta o suficiente para registrar
as informações que lhe são apresentadas. Em testes de memória, é comum que seu
desempenho seja limitado na evocação imediata, mas que não perca muitas informações
na etapa de evocação tardia. A diminuição da quantidade de elementos evocados na
etapa imediata ocorre por redução da atenção. E, como a memória está preservada, o
que ficou registrado é facilmente evocado na etapa de avaliação da memória tardia.

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CAPÍTULO 6
Transtorno Bipolar do Humor

O transtorno bipolar é uma doença mental caracterizada por alterações de humor que
se manifestam pela alternância entre episódios depressivos e de euforia em diversos
graus de intensidade. Quanto mais episódios a pessoa tiver, maior será sua deterioração
cognitiva. Os períodos de remissão são bastante frequentes e, quando o paciente está
eutímico, as alterações psicopatológicas mais intensas regridem.

O primeiro episódio que os pacientes apresentam é o depressivo, depois podem


apresentar ou episódio de mania ou de hipomania. Geralmente, os primeiros sintomas
iniciam entre os 20 e 30 anos. Contudo, em alguns casos, podem começar na infância
ou após os 65 anos de idade.

Há duas classificações importantes do Transtorno Bipolar, e suas caracterizações estão


descritas a seguir, de acordo com DSM-V e Dalgalarrondo (2008):

» Transtorno Bipolar tipo I: caracterizado por episódios depressivos


intercalados com períodos de eutimia e seguidos de fases maníacas bem
caracterizadas. Pelo menos um episódio maníaco é necessário para o
diagnóstico desta vertente.

» T. Bipolar tipo II: são episódios depressivos intercalados com períodos


de eutimia e seguidos de fases hipomaníacas. Consiste em um ou mais
episódios depressivos maiores e pelo menos um episódio hipomaníaco,
sendo que o episódio depressivo maior deve ter duração de pelo menos
duas semanas, e o hipomaníaco, de, no mínimo, quatro dias.

Dentre as características dos pacientes em episódio depressivo estão o humor triste, a


perda do interesse em atividades que antes eram interessantes e o pessimismo.

O humor durante episódio maníaco costuma ser descrito como eufórico,


excessivamente alegre, expansivo ou irritável. Para ser caracterizado, é importante
que tenha ocorrido internação ou duração de uma semana no mínimo, estando
presente quase todos os dias.

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CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AGNOSIA, APRAXIA, AFASIA E AMNÉSIA E PATOLOGIAS FREQUÊNTES EM
UNIDADE IV │ AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO

Figura 39. Transtorno Bipolar do Humor.

Fonte disponível em: <http://idealistik.joueb.com/images/mask.gif>.

Quando os pacientes com Transtorno Bipolar envelhecem e chegam à terceira idade,


geralmente apresentam riscos “duas vezes aumentado para evoluir para um quadro
demencial quando comparados com pacientes com outras doenças crônicas” (KESSING;
NILSSON, 2003).

O indivíduo em estado de mania pode apresentar aumento da sociabilidade, conversando


com estranhos como se fossem amigos de infância, sem crítica de sua inadequação;
pode haver alteração na autoconfiança, delírios de grandeza, desinibição sexual, fuga
de ideias, redução da necessidade de sono (diferente de insônia, em que o paciente quer
dormir, mas não consegue), entre outras alterações.

No DSM-V há uma advertência importante que deve ser observada durante o processo
de avaliação, especificamente na fase da entrevista, sobre a cautela que se deve ter
para “não confundir sintomas de mania com sintomas de abusos de drogas ou efeitos
colaterais de medicamentos (p. ex., esteroides, L-dopa, antidepressivos, estimulantes)”.

Figura 40. Drogas.

Fonte disponível em: <http://www.nucleointegrado.med.br/wp-content/uploads/2014/04/drogas03.jpg>.

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CONCEITOS E CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AGNOSIA, APRAXIA, AFASIA E AMNÉSIA E PATOLOGIAS FREQUÊNTES EM
AMBULATÓRIO PSIQUIÁTRICO │ UNIDADE IV

Quando a cognição é avaliada, os pacientes com Transtorno Bipolar apresentam


dificuldades cognitivas relacionadas aos componentes das funções executivas, com
lentificação do pensamento e da atividade motora, dificuldade para se concentrar,
raciocinar e tomar decisões.

A reabilitação neuropsicológica pode auxiliar o paciente a se adaptar melhor ao mundo.


Deve ser realizada durante o período de eutimia, pois é quando o paciente tem condições
de melhor absorver a intervenção.

Considerações finais
Espera-se que, neste ponto, o aluno tenha adquirido informações importantes para
ser capaz de identificar algumas das patologias que se encontra mais frequentemente
no atendimento em neuropsicologia, especialmente em contexto de comunicação com
outros profissionais da saúde. Este atendimento holístico traz uma vasta gama de
benefícios ao paciente e deve ser sempre incentivado.

Ao ter conhecimento do conteúdo abordado nesta apostila, o aluno pode ter uma
maior aproximação de quais áreas teve mais interesse e que pode aprofundar seus
conhecimentos, contribuir com a comunidade científica por meio de pesquisas e cuidar
de seus pacientes com olhar mais embasado.

Desejamos aos alunos um excelente aprendizado desta área sensacional que é a


neuropsicologia e colocamo-nos à disposição para futuro contato.

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Referências

Dalgalarrondo, P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. – 2.


ed. – Porto Alegre: Artmed, 2008. 440p.

Fuentes et al, Avaliação neuropsicológica aplicada às epilepsias. In.: Fuentes et al.


Neuropsicologia: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2008.

Haase, V. G.; Antunes, A. M.; Bertola, L.; Paula, J. J.; Abreu, N.; Malloy-Diniz, L. F.
Método anatomoclínico na interpretação dos resultados das investigações clínicas:
síndromes demenciais do idoso. In.: Malloy-Diniz, Fuentes e Cosenza. Neuropsicologia
do envelhecimento: uma abordagem multidimensional. Porto Alegre: Artmed, 2013.

Kessing, L.V.; Nilsson, F.M. (2003). Increased risk of developing dementia in patients
with major affective disorders compared to patients with other medical illnesses. J
Affect Disord, 73, 261-269

Malloy-Diniz, L. F.; Mattos, P.; Abreu, N.; Fuentes, D. Neuropsicologia: Aplicações


clínicas. Porto Alegre: Artmed, 2015.

Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-V – 5. ed. – Dados


eletrônicos. – Porto Alegre: Artmed, 2014.

Miranda, M. C.; Muszkat, M.; Mello, C. B. Neuropsicologia do Desenvolvimento:


Transtornos do Neurodesenvolvimento. Rio de Janeiro: Rubio, 2012.

Paula, J. J.; Costa, D. S. A entrevista clínica em neuropsicologia. In.: Malloy-Diniz, L.


F.; Mattos, P.; Abreu, N.; Fuentes, D. Neuropsicologia: Aplicações clínicas. Porto
Alegre: Artmed, 2016.

Tabaquim, M., L., M.; Joaquim, R., M. Funções neuropsicológicas na paralisia cerebral.
Arch Health Invest (2013) 2(5): 40-46.

Tanguay, P. Nonverbal Learning Disabilities at Home – A parent’s Guide.


Londres e Filadelfia, 2000.

Wechsler, D. Escala de inteligência Wechsler para crianças: WISC-IV: manual técnico.


4. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2013.

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