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Neuropsicologia:

história e
conceitos
básicos

Prof. Esp. Fellype Ribeiro


Curso de Psicologia - AESA
O que é neuropsicologia?
• A Neuropsicologia é considerada uma disciplina científica que se ocupa das
relações cérebro/funções cognitivas, ou seja, das funções cognitivas e suas
bases biológicas, de forma mais ampla, as relações entre cérebro e
comportamento humano (Rodrigues, 1993).

• É uma ciência que integra conhecimentos, instrumentos, métodos e modelos


teóricos de várias áreas, tendo caráter interdisciplinar em suas origens, que
busca estabelecer uma relação entre os processos mentais e o funcionamento
cerebral;

• Define-se também como uma ciência dedicada a estudar a expressão


comportamental, emocional e social das disfunções cerebrais (Lezak et al.,
2004), os déficits em funções superiores produzidos por alterações cerebrais.
Neuropsicologia na história...
A história da Neuropsicologia pode ser reconstruída a partir de
diferentes prismas, mas uma versão amplamente aceita estabelece
cinco períodos distintos:
• 1º período (1860 a 1905) - marcado pela descobertas da Área de Broca e Área de Wernicke.
• 2º período (1905 e 1940) - período denominado por neurologistas e psicólogos de pré-
científica.
• 3º período (1945 a 1970) - é caracterizado pelos estudos experimentais realizados com
amostras amplas de indivíduos.
• 4º período - é caracterizado pela aproximação da Neuropsicologia com a Psicologia
Cognitiva, constituindo um novo campo de estudo denominado Neuropsicologia
Cognitiva.
• 5º período - tem como marco o surgimento das técnicas de neuroimagem, possibilitando
a investigação da atividade cerebral enquanto o indivíduo realiza tarefas cognitivas.
1º período: 1945 a 1970
• Esta etapa iniciou-se com as descobertas e escritos de Paul Broca sobre
pacientes que haviam perdido a capacidade de produção da fala,
decorrente de lesão em área cerebral específica, localizada na terceira
circunvolução frontal esquerda, posteriormente denominada Área de
Broca.
• Em seguida, Karl Wernicke descreveu o caso de um paciente com déficit
na compreensão da fala, mas com a produção da mesma intacta,
associada à lesão na primeira circunvolução temporal do hemisfério
esquerdo, região que passou a ser denominada de Área de Wernicke.
• Diagrama da linguagem proposto por Lichthein em 1885;
1º período: 1945 a 1970
A área de Wernicke está
relacionada com a compreensão da
linguagem; e a área de Broca está
relacionada com a produção da
linguagem. Uma lesão em
Wernicke leva a uma alteração na
linguagem oral e escrita, tornando
a comunicação sem muita precisão
e com dificuldade de compreensão.
  Já uma lesão na área de Broca
leva a uma dificuldade em se
expressar verbalmente, porém com
a compreensão preservada.
2º período: 1905 e 1940.
• Surge do questionamento à metodologia dos diagramas, período denominado por
neurologistas e psicólogos de pré-científica. As críticas fundamentam-se em torno de três
pontos básicos:
• 1. A falta de objetividade das observações do comportamento. As conclusões estavam
basicamente fundamentadas em impressões clínicas, e não em observação controlada e na
quantificação do fenômeno;
• 2. A fragilidade das provas utilizadas para identificação da localização da lesão;
• 3. A inadequação dos conceitos psicológicos utilizados.

*Influenciados por Jackson (1866) e Freud (1891), o movimento intitulado Holismo,


Antilocalizacionismo ou Antiassociacionismo rejeitou a possibilidade de localização de um
componente cerebral específico associado à linguagem. Sob a influência da Gestalt, os
antiassociacionistas partiam da premissa de que os processos mentais não podiam ser
decompostos em subprocessos independentes, uma vez que a expressão do fenômeno mental
era mais complexa do que as relações entre os processos cognitivos que as compunham
3º período: 1945 a 1970
• O objetivo maior dos pesquisadores mais conhecidos desta fase foi
superar as críticas metodológicas feitas aos diagramas. Para tanto,
três mudanças fundamentais foram implementadas:
• 1. A metodologia dos estudos de caso foi substituída por
metodologia específica de estudo psicométrico com grupos;
• 2. Os dados do paciente passaram a ser contrastados com dados de
indivíduos saudáveis;
• 3. As condutas clínicas de observação efetuadas pelos
neurologistas foram substituídas pela aplicação de testes
psicológicos tipificados (Benedet, 2002).
4º período:
• O quarto período é caracterizado pela aproximação da Neuropsicologia com a
Psicologia Cognitiva, constituindo um novo campo de estudo denominado
Neuropsicologia Cognitiva. Um aspecto que marcou esta etapa foi à construção de
modelos teóricos de processamento da informação baseados em dados obtidos em
laboratório com indivíduos saudáveis.
• Vale salientar que este movimento ocorreu paralelamente no Reino Unido, Estados
Unidos e Canadá.
• Na União Soviética, Luria desenvolveu um marco conceitual para a interpretação dos
dados neuropsicológicos, constituindo a Neuropsicologia Histórico-Cultural, em
consonância com a fisiologia e a neurologia, mas sem negligenciar a perspectiva
humanista na compreensão das doenças envolvendo disfunções cognitivas (Kristensen,
Almeida & Gomes, 2001). A partir dessa perspectiva Luria propôs a localização dinâmica
das funções cognitivas, postulando a existência de sistemas funcionais complexos e
integrados, conceitos que influenciaram fortemente pesquisadores e clínicos.
5º período:
• O surgimento das técnicas de neuroimagem, possibilitando a
investigação da atividade cerebral enquanto o indivíduo realiza tarefas
cognitivas. Tais exames permitiram a identificação das redes neurais
subjacentes aos processos cognitivos, confirmando resultados obtidos
por estudos clínicos prévios (Cubelli, 2005).
• O advento de tais tecnologias cobrou da Neuropsicologia uma
redefinição e ampliação do alcance de suas práticas, para além do
estabelecimento da correlação anátomoclínica.
• Nesse cenário, o diagnóstico funcional, a preocupação com a avaliação
neuropsicológica contextualizada e compreensiva ganharam força.
FRENOLOGIA
• Foi fundada pelo médico austríaco Franz Joseph Gall, no inicio do
séc. XIX, onde supunha-se uma relação do formato do crânio com
comportamentos da inteligência humana (é uma pseudo-ciência).
HOMÚCULO DE PEINFELD
• Neurocirugião canadense Wilder Peinfeld, em 1950, cartografou
várias regiões do córtex através de eletrodos.
Teoria do Sistema Funcional
• Pyotr Kuzmicj Anokhin (1898-1974), mas Alexander Romanovich Luria conseguiu ampliá-la,
aplicando-a ao Sistema Nervoso Central humano.

• A proposta do sistema funcional é buscar onde está a falha no sistema funcional, qual a rota
neuronal utilizada e porque ela não está sendo eficiente. Não se trata de associar uma área
específica ou mesmo uma única função.
UNIDADES FUNCIONAIS

• A primeira unidade funcional foi descrita como a responsável pela vigília e pelo tônus cortical.
• A segunda unidade funcional era a encarregada de receber, processar e armazenar as
informações que chegavam do mundo externo e interno.
• E a terceira unidade funcional regularia e verificaria as estratégias comportamentais e a
própria atividade mental.
1 ª unidade 2 ª unidade 3 ª unidade
funcional funcional funcional

• Regulação da • Recebe e analisa as • Desenvolvimento de


atividade cerebral; informações captadas intenções e
pelos órgão do sentido; programação de uma
• Equilibrar o
funcionamento em • Analisada e integra as ação;
nível de atividade sensações; • Elaborar e realizar
(nem muito excitado, • Sensações ações;
nem muito inibido); transformadas em • Monitorar as ações;
percepções que são
• Responder as reações • Regula a ação física e
armazenadas na
(Ex.: fome, barulho); memória; mental do individuo
• Tronco cerebral; • Occipital, temporal e no ambiente;
parietal. • Frontal;
• Luria descreve o funcionamento das áreas
corticais da segunda e terceira unidades
funcionais.
• Na segunda unidade funcional as áreas
primárias, também conhecidas como áreas
de projeção, são grupos de neurônios que
respondem somente à propriedade muito
específicas do estímulos. Nas áreas visuais
primárias, por exemplo, existem
grupamentos neuronais próprios para
processar informações apenas de cor, de
forma ou de movimento. No caso das
áreas auditivas primárias, há grupos
específicos para cada frequência sonora!
• As áreas primárias são
responsáveis apenas pela
sensação.
• Percepção, que podemos
entender como a formação de
uma imagem, só começa a
aparecer nas áreas corticais
secundárias;
• Já as áreas terciárias são
chamadas de áreas de
superposição, ou de
integração. (Ex. concerto)
A Neuropsicologia no Brasil
• A Neuropsicologia chega ao Brasil através das práticas da neurologia.

• Tem como como marco a tese intitulada “Contribuição para a


psicopatologia da afasia em crianças” (1950) do médico pediatra
Antonio Branco Lefévre, considerado patrono e fundador da
Neuropsicologia brasileira.

• A interdisciplinaridade é a característica central da Neuropsicologia


brasileira desde seus primórdios.
A Neuropsicologia no Brasil
• Na atualidade, a formação em Neuropsicologia clínica ocorre basicamente por meio
de cursos de pós-graduação lato sensu, ou seja, através de especializações
reconhecidas pelo Ministério da Educação.

• A Sociedade Brasileira de Neuropsicologia – SBNp, fundada em setembro de 1988 e


o Instituto Brasileiro de Neuropsicologia e Comportamento – IBNeC, fundado em
outubro de 2009 são duas instituições de referência na produção de conhecimento
no Brasil.
• A neuropsicologia é, muitas vezes, dividida em duas áreas
principais: neuropsicologia clínica e neuropsicologia experimental.

O neuropsicólogo comportamental,
O neuropsicólogo clínico trata pacientes também trata de pacientes clínicos, mas a
com lesões cerebrais, mensura déficits na ênfase é sobre definições conceituais de
inteligência, personalidade e funções comportamento e não operacionais. Os
sensório-motoras por procedimentos de casos individuais, em vez de estatísticas de
testes especializados e relaciona os grupo, são o foco da atenção, e esta
resultados com as áreas específicas do abordagem geralmente envolve testes
cérebro que foram afetadas. menos formais para estabelecer desvios
qualitativos do funcionamento "normal".

A divisão entre as duas não é absolutamente clara!


Áreas de atuação:
• Instituições acadêmicas, realizando pesquisa, ensino e supervisão;
• Instituições hospitalares;
• Instituições forenses;
• Clínicas e consultórios privados
• Atendimentos domiciliares, realizando diagnóstico, reabilitação,
orientação à família
• Trabalho em equipe multidisciplinar.
Principais funções cognitivas:
Inteligência
Funções
executivas
Atenção

Linguagem

Memória
Emoções
Resolução do CFP 002/2004
Reconhece a Neuropsicologia como especialidade em Psicologia para
finalidade de concessão e registro do título de especialista!

Utiliza instrumentos especificamente


padronizados para avaliação das funções
neuropsicológicas envolvendo
principalmente habilidades de atenção,
percepção, linguagem, raciocínio,
abstração, memória, aprendizagem,
habilidades acadêmicas, processamento
da informação, visuoconstrução, afeto,
funções motoras e executivas.
Atua no diagnóstico, no
acompanhamento, no Estabelece parâmetros para
tratamento e na pesquisa da emissão de laudos com fins
cognição, das emoções, da clínicos, jurídicos ou de
personalidade e do perícia; complementa o
comportamento sob o diagnóstico na área do
enfoque da relação entre desenvolvimento e
estes aspectos e o aprendizagem.
funcionamento cerebral.
Alguns dos objetivos práticos do Neuropsicólogo:
• Levantar dados clínicos que permitam diagnosticar e estabelecer tipos de intervenção, de
reabilitação particular e específica para indivíduos e grupos de pacientes em condições nas
quais:
a) ocorreram prejuízos ou modificações cognitivas ou comportamentais
devido a eventos que atingiram primária ou secundariamente o sistema
nervoso central;
b) o potencial adaptativo não é suficiente para o manejo da vida prática,
acadêmica, profissional, familiar ou social; ou
c) foram geradas ou associadas a problemas bioquímicos ou elétricos do
cérebro, decorrendo disto modificações ou prejuízos cognitivos,
comportamentais ou afetivos.

• Reabilitação Neuropsicológica: intervenções necessárias junto ao paciente, aos familiares, para que
possam melhorar, compensar, contornar ou adaptar-se às dificuldades;
• Produzir dados objetivos e formula hipóteses sobre o funcionamento cognitivo, atuando como auxiliar na
tomada de decisões de profissionais de outras áreas, fornecendo dados que contribuam para as escolhas
no processo de tratamento.
• Fornecer informações em processos jurídicos nos quais estejam em questão o desempenho intelectual de
indivíduos, a capacidade de julgamento e de memória.
Alguns referenciais teóricos atuais sobre
estudos em Neuropsicologia:
Alguns referenciais teóricos atuais sobre
estudos em Neuropsicologia:
REFERÊNCIAS:
• Hazin, I.; Fernandes, I.; Gomes, E.; Garcia, D.; Neuropsicologia no Brasil: passado, presente e futuro.
Estudos e Pesquisas em Psicologia, vol. 18, núm. 4, 2018, pp. 1137-1154.

• Haase, V. G.; et al. Neuropsicologia como ciência interdisciplinar: consenso da comunidade brasileira de
pesquisadores/clínicos em Neuropsicologia. Revista Neuropsicologia Latinoamericana. ISSN 2075-9479 Vol
4. No. 4. 2012.

• Rodrigues, N. (1993). Neuropsicologia: uma disciplina científica. Rodrigues, N. & Mansur, L. L. (Eds.).
Temas em neuropsicologia, 1, 1-18. São Paulo: Tec Art.

• Conselho Federal de Psicologia. Resolução nº 002/2004 - Reconhece a Neuropsicologia como especialidade


em Psicologia para finalidade de concessão e registro do título de especialista.

• Leandro Kruszielski. Teoria do sistema funcional. Disponível em:


https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/301895/mod_resource/content/1/
Teoria_do_Sistema_Funcional_texto_LEANDRO%5B1%5D.pdf

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