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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:

o direito de retirada é a solução adequada?

A CLÁUSULA ARBITRAL ESTATUTÁRIA E A VINCULAÇÃO DO ACIONISTA: O


DIREITO DE RETIRADA É A SOLUÇÃO ADEQUADA?
The approval of an arbitration agreement in the corporate statutes: is the withdrawal right the proper
solution?
Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais | vol. 77/2017 | p. 99 - 125 | Jul - Set / 2017
DTR\2017\5713

Gabriella Bianchini
Graduada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e candidata ao título de LL.M pela
King’s College London. Membro do comitê de diretores da Inovarb-Amcham e da área de Arbitragem
Internacional do Wilmer Cutler Pickering Hale and Dorr LLP em Frankfurt, Alemanha. Coach da
equipe da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo no 24th Willem C. Vis International
Commercial Arbitration Moot. Advogada. gaottobianchini@gmail.com

Marina Martins Martes


Graduada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Coach da equipe da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo no 24th Willem C. Vis International Commercial Arbitration Moot
e na VIII Competição Brasileira de Arbitragem Petrônio Muniz. Advogada.
marinammartes@gmail.com

Área do Direito: Arbitragem; Societário


Resumo: O presente artigo tem como objetivo o estudo do uso da arbitragem no direito societário,
em especial a recente alteração da Lei das Sociedades por Ações que estabeleceu o direito de
retirada no caso de inserção de convenção arbitral no estatuto social de Sociedade Anônima.
Inicialmente, o objetivo desse artigo é compreender a possibilidade do uso da arbitragem para dirimir
conflitos societários, bem como analisar a introdução de cláusulas arbitrais em estatutos sociais de
companhias. Posteriormente, busca-se ponderar a divergência doutrinária com relação à vinculação
de acionistas dissidentes à cláusula arbitral estatutária. Por fim, explora-se a questão do direito de
retirada por inclusão de cláusula arbitral que foi recentemente incorporado pela Lei das Sociedades
por Ações e como a cláusula arbitral estatutária é regulada pelo direito estrangeiro.

Palavras-chave: Cláusula arbitral estatutária - Sociedades Anônimas - Vinculação de acionistas -


Princípio da maioria - Autonomia da vontade - Direito de retirada
Abstract: This article has the purpose of examining the use of arbitration in corporate law, especially
the recent modification to the Brazilian Corporations Law (Lei das Sociedades por Ações) which
established the right of withdrawal in case of approval of an arbitration agreement into the bylaws of a
corporation. Firstly, this article aims understanding the possibility of using arbitration in order to solve
corporate conflicts, as well as analyzing the inclusion of an arbitration agreement in the corporate
bylaws. Secondly, it examines authorities’ understandings as to what extent a dissident shareholder is
bound to an arbitration agreement included in the bylaws. Finally, it evaluates the withdrawal right due
to the approval of an arbitration agreement in the corporate bylaws, which has recently been
incorporated by the Brazilian Corporations Law (Lei das Sociedades por Ações) and it presents the
different foreign regulation regarding the arbitration agreement in corporations’ bylaws.

Keywords: Arbitration agreement in the bylaws - Corporations - Binding arbitration to shareholders -


Majority principle - Parties’ autonomy - Withdrawal right
Sumário:

1 Introdução - 2 A arbitragem societária - 3 A cláusula arbitral estatutária - 4 A vinculação dos


acionistas a cláusula arbitral estatutária - 5 O direito de retirada e a alteração da Lei de Arbitragem -
6 Direito comparado - 7 Conclusão - 8 Bibliografia

1 Introdução

A utilização da arbitragem como forma de resolução de conflitos societários, especificamente no


âmbito das sociedades anônimas (“SAs”), vem ganhando relevância nos últimos anos, em virtude
dos abusos da maioria acionária e da proteção da qual necessitam os acionistas minoritários1.

No Brasil, o estatuto da sociedade pode estabelecer que as divergências entre os acionistas e a


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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários, poderão ser


solucionadas mediante arbitragem. Essa possibilidade está prevista na Lei das Sociedades por
Ações (Lei 6.404/76 – “LSA“), em seu art. 109, § 3º.

Apesar da previsão legal e embora a arbitragem seja frequentemente adotada como forma de dirimir
conflitos relativos a uma companhia, são ainda verificadas diversas divergências doutrinárias acerca
da compatibilização entre os princípios gerais da arbitragem e os princípios gerais do direito
societário, notadamente no que tange à vinculação de acionistas à cláusula arbitral inserida no
estatuto social.

Diante das discussões doutrinárias a respeito da preservação da autonomia da vontade como pilar
da arbitragem e dos direitos essenciais dos acionistas, a LSA foi alterada para que passasse a
prever o direito de retirada para acionistas contrários à inserção de cláusula arbitral no estatuto social
da companhia. O direito de retirada é muitas vezes visto como a solução para que os fundamentos
balizadores da arbitragem sejam respeitados, para que a igualdade entre os acionistas seja
preservada e para que seja garantida segurança jurídica no âmbito das companhias.

Considerando tal alteração legislativa, o presente artigo analisará as diferentes perspectivas acerca
da vinculação dos acionistas à cláusula arbitral estatutária e examinará, de forma crítica, a
importância do direito de retirada para a preservação, tanto dos direitos societários, como dos
princípios que norteiam o procedimento arbitral.

2 A arbitragem societária

Conforme determina a Lei de Arbitragem (“LA”), em seu art. 1º, para que o objeto do litígio possa ser
discutido em arbitragem, é necessário que diga respeito a direito patrimonial e disponível. Trata-se
da arbitrabilidade da matéria, que é a condição essencial para que um determinado conflito seja
submetido à arbitragem. Para Carlos Alberto Carmona2, são arbitráveis as causas que tratem de
matérias a respeito das quais o Estado não crie reserva específica por conta do resguardo dos
interesses fundamentais da coletividade e desde que as partes possam livremente dispor acerca do
bem sobre o que controvertem.

Direitos não patrimoniais (tais como os direitos da personalidade – direito à vida, a honra, a imagem,
ao nome – e o estado da pessoa – modificação da capacidade, como interdição, dissolução do
casamento, atributos do poder familiar, como guarda) são, portanto, excluídos do juízo arbitral.

A lei também exige que os direitos sejam disponíveis. A disponibilidade de um direito, por sua vez, se
refere à possibilidade de seu titular ceder, de forma gratuita ou onerosa, sem qualquer restrição.
Logo, como dispõe Francisco Cahali:

(...) necessário terem as partes o poder de autorregulamentação dos interesses submetidos à


arbitragem, podendo dispor sobre eles pelas mais diversas formas dos negócios jurídicos; são, pois,
interesses individuais, passíveis de negociação, ou seja, podem ser livremente exercidos pela parte3.

Carlos Alberto Carmona apresenta a disponibilidade como a possibilidade de um direito ser ou não
exercido livremente pelo seu titular, sem que haja norma cogente impondo o cumprimento do
preceito, sob pena de nulidade ou anulabilidade do ato praticado com sua infringência. Assim, são
disponíveis aqueles bens que podem ser livremente alienados ou negociados, por encontrarem-se
desembaraçados, tendo, o alienante, plena capacidade jurídica para tanto4.

Importante esclarecer, porém, que eventuais impactos patrimoniais destes direitos, como também do
direito penal, conforme o caso, são arbitráveis (e.g. partilha de bens na separação ou no divórcio),
basta apenas que tenham caráter patrimonial e sejam disponíveis aos detentores do direito.

Dentro do âmbito societário, especificamente no que se refere às SAs, consideram-se arbitráveis


todas as matérias relativas as relações da companhia com seus acionistas e as relações dos
acionistas entre si. Isso significa que, como regra, todas as controvérsias e litígios envolvendo a
companhia dizem respeito a direitos patrimoniais e disponíveis5.

Notadamente, a disponibilidade dos direitos societários está associada com fato de que as pessoas
se vinculam a uma sociedade anônima adquirindo ações e livremente se desvinculam delas se
desfazendo. Os direitos e obrigações dos sócios, previstos em normas de direito objetivo no estatuto,
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o direito de retirada é a solução adequada?

incorporam-se à ação e com ela circulam, transferindo-se aos sucessivos titulares pelo próprio fato
de serem parte integrante da coisa e não pelo fato de qualquer regra adveniente6. Portanto, os
direitos podem ser livremente exercidos por seus titulares acionistas. Trata-se de direitos individuais,
circunscritos no âmbito particular da companhia.

Conforme ensina Modesto Carvalhosa, a análise da arbitrabilidade objetiva dos litígios societários
não pode partir de premissas individualistas, já que a clássica visão de disponibilidade e de
titularidade de direitos levaria à impossibilidade de utilização da arbitragem para estes conflitos. A
natureza plural das sociedades deve ser considerada para a definição dos parâmetros da
arbitrabilidade.

Nesse sentido, a forma pela qual as decisões sociais são tomadas deve ser levada em consideração,
pois ela reflete a disponibilidade do exercício pelos acionistas.

Assim, a arbitrabilidade das matérias societárias estaria relacionada às decisões de assembleias


gerais. Para Modesto Carvalhosa, portanto, tudo aquilo que pode ser validamente decidido pela
sociedade é arbitrável, pois se refere à autonomia privada da companhia, presente na disponibilidade
do tema pela Assembleia Geral7.

Como visto, a doutrina entende que todas as matérias relacionadas às SAs (ou pelo menos grande
parte delas) são arbitráveis. Além disso, os sistemas legais relativos ao procedimento arbitral e à
regulamentação das SAs dialogam entre si, o que cria um ambiente de receptividade para as
convenções arbitrais no contexto de uma companhia.

O melhor exemplo disso é o fato de a LSA possibilitar expressamente que os litígios relativos às
sociedades anônimas venham a ser solucionados pela via arbitral (art. 109, § 3º, LSA). Nos termos
da lei, conflitos entre acionistas minoritários, acionistas controladores ou controvérsias entre a
companhia juntamente com seus acionistas e administradores poderão ser resolvidos pela via
arbitral. Outro fator que demonstra a correlação entre os sistemas legais é a alteração ocorrida na LA
em 2015 que acabou por alterar a LSA. A alteração na LA incluiu artigos na LSA que foram
determinantes para o papel da arbitragem no cenário das sociedades anônimas, como o art. 136-A,
que será analisado com maior profundidade nos tópicos seguintes.

Assim, considerando a arbitrabilidade dos direitos que envolvem uma SA e o diálogo entre os
sistemas legais, estão livres a companhia e seus acionistas para acordarem a respeito da submissão
de seus eventuais conflitos à jurisdição arbitral.

Como será visto a seguir, para que as particularidades das SAs possam ser compatibilizadas com o
procedimento arbitral, alguns princípios precisaram ser relativizados e as regras da arbitragem
adequadas ao contexto em que estão inseridas. Tais conformações, como a previsão do direito de
retirada por inclusão de cláusula arbitral, causam diversas divergências doutrinárias, que influenciam
diretamente na possibilidade de as matérias societárias serem solucionadas por um árbitro ou
tribunal arbitral escolhido pelas partes.

3 A cláusula arbitral estatutária

Conforme exposto no tópico anterior, as Sociedades Anônimas podem valer-se da arbitragem como
mecanismo de resolução de disputas societárias relativas a direitos patrimoniais e disponíveis. Para
tanto, tais sociedades podem optar por incluir uma cláusula compromissória diretamente em seu
Estatuto Social ou em instrumentos parassociais, notadamente no acordo de acionistas. Além disso,
existe também naturalmente a hipótese de celebração de compromisso arbitral após o surgimento de
eventual disputa8.

A possibilidade de inclusão de cláusula compromissória no Estatuto Social está expressamente


prevista na LSA, que dispõe em seu art. 109, § 3º 9 que: “O estatuto da sociedade pode estabelecer
que as divergências entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os
acionistas minoritários10 , poderão ser solucionadas mediante arbitragem, nos termos em que
especificar”.

Importante notar que a inclusão de uma cláusula compromissória no Estatuto Social trata-se de
deliberação que deve ser aprovada pela maioria, tendo em vista o princípio da maioria e a ausência
de quórum específico para esse tipo de deliberação11 . Nesse contexto, contudo, surgem diversas
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o direito de retirada é a solução adequada?

discussões com relação à vinculação da cláusula arbitral: deve a cláusula vincular a sociedade como
um todo, inclusive os acionistas dissidentes?12 Tal questão será enfrentada mais adianta, mas,
desde já, cumpre esclarecer que a cláusula compromissória, ao ser inserida no Estatuto Social, se
torna uma norma estatutária e não constitui um pacto parassocial.

Muitos entendem que a cláusula compromissória, ainda que inserida no estatuto social, constituiria
negócio jurídico autônomo e teria, portanto, natureza de pacto parassocial. Neste cenário, a cláusula
compromissória não atingiria os acionistas dissidentes13 .

Com a devida vênia, não nos parece que esse entendimento seria o mais adequado. Em primeiro
lugar, porque a natureza de cláusula estatutária da cláusula compromissória em nada prejudica o
princípio da autonomia da cláusula arbitral – muito pelo contrário, assim como defende Pedro Batista
Martins, o princípio da autonomia está integrado à natureza de norma estatutária da cláusula
compromissória14 . Além disso, tal entendimento não coaduna com a recente inclusão do art. 136-A
na LSA, o qual, como será exposto mais adiante, prevê que a cláusula compromissória inserida no
Estatuto Social “obriga a todos os acionistas”. Ora, uma cláusula inserida no estatuto social e que
atinge a todos os acionistas de uma companhia não pode ser vista como um pacto parassocial15 .

Evidentemente, o cenário é diferente quando uma cláusula compromissória é inserida no âmbito de


um acordo de acionistas (sendo este, sim, um pacto parassocial). Neste caso, a cláusula vinculará
apenas os contratantes de tal acordo e não a sociedade16 ou os acionistas que não fazem parte do
acordo. Importante também notar que a base legal para inserção de cláusula compromissória em
acordo de acionistas não é o art. 109 da LSA (que faz referência especificamente ao “estatuto da
sociedade”), mas, sim a própria LA que autoriza de um modo amplo a utilização do mecanismo para
solução de litígios envolvendo questões patrimoniais e disponíveis.

Vale ressaltar que, em alguns casos, companhias possuem cláusulas compromissórias apenas no
acordo de acionista, mas não em seu estatuto social. Nessas situações, a cláusula de eleição de foro
do estatuto social será utilizada para os conflitos referentes a questões societárias da companhia que
surjam entre a companhia e seus acionistas ou entre os acionistas controladores e acionistas
minoritários. Por outro lado, conflitos entre acionistas que façam parte do acordo de acionistas e que
digam respeito a questões relativas à interpretação do acordo de acionistas, estarão no escopo da
cláusula compromissória do acordo de acionistas e deverão ser submetidos a arbitragem17 .

Independentemente de qual seja o cenário, ou seja, tanto no caso das companhias que possuem
cláusula compromissória em seu estatuto social e no acordo de acionistas, quanto no caso de
companhias que possuem cláusula arbitral apenas em algum desses dois instrumentos, é de grande
importância que tais cláusulas tenham redação bastante clara e definam com clareza seus limites.

A Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A (“Eletropaulo”), por exemplo, possui
cláusula compromissória em seu estatuto social e em seu acordo de acionistas, sendo que ambas
definem de modo bastante claro sua respectiva abrangência. A cláusula constante do estatuto social
da Eletropaulo prevê:

A Companhia, seus Acionistas, Administradores e os membros do Conselho Fiscal obrigam-se a


resolver, por meio da arbitragem, perante a Câmara de Arbitragem do Mercado, toda e qualquer
disputa ou controvérsia que possa surgir entre eles, relacionada com ou oriunda, em especial, da
aplicação, validade, eficácia, interpretação, violação e seus efeitos, das disposições contidas na Lei
6.404/76, no Estatuto Social da Companhia, nas normas editadas pelo Conselho Monetário Nacional,
pelo Banco Central do Brasil e pela Comissão de Valores Mobiliários, bem como nas demais normas
aplicáveis ao funcionamento do mercado de capitais em geral, além daquelas constantes do
Regulamento do Nível 2, do Regulamento de Arbitragem da Câmara de Arbitragem do Mercado, do
Regulamento de Sanções e do Contrato de Participação Nível 2 de Governança Corporativa. 18
[grifos próprios]

Por vez, a cláusula contida no acordo de acionistas da Eletropaulo dispõe:

Com exceção das controvérsias referentes a obrigações que comportem, desde logo, execução
judicial, todas as demais controvérsias resultantes deste Acordo e/ou a eles relativas, inclusive, mas
não apenas, quaisquer questões relacionadas à existência, validade, eficácia ou adimplemento
contratual deverão ser, obrigatória, exclusiva e definitivamente, submetidas à arbitragem a ser
administrada pela Câmara de Arbitragem do Mercado da BM&FBovespa (...). 19
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

Como visto, as cláusulas compromissórias da Eletropaulo definem de modo bastante claro quais
eventuais conflitos estarão no escopo do estatuto social e do acordo de acionistas. Vale ainda
ressaltar que a cláusula arbitral estatutária da Eletropaulo segue o padrão de cláusula
compromissória exigida pela BM&FBovespa para listagem no Novo Mercado. Diversas outras
companhias desse mesmo segmento possuem cláusulas arbitrais estatuárias no mesmo molde – é o
caso da Embraer, da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) e da CVC Brasil Operadora e Agência de
Viagens S.A.

Assim, nota-se que, muitas vezes, as sociedades anônimas não somente podem incluir cláusula
arbitral estatutária, como também devem incluí-la, sendo este o caso das sociedades anônimas
abertas do Novo Mercado.

Diante de todo o exposto, cabe agora discutir e compreender como ocorre a vinculação à cláusula
arbitral estatutária por parte dos acionistas de uma sociedade anônima.

4 A vinculação dos acionistas a cláusula arbitral estatutária

Como já mencionado, a questão da vinculação dos acionistas à cláusula arbitral estatutária é um


ponto bastante debatido no âmbito da arbitragem societária. Isso se deve justamente ao fato de que
a convenção de arbitragem não é apenas a demonstração de que as partes em comum acordo
escolheram por solucionar seus conflitos pela via arbitral, mas, mais que isso, é a forma pela qual as
partes renunciam a jurisdição estatal (a todos constitucionalmente garantida pelo art. 5º, XXXV, CF
(LGL\1988\3))20 . Por esse motivo, a concordância inequívoca das partes é elemento obrigatório e
condição sine qua non para que a convenção de arbitragem (e consequentemente a escolha pelo
método privado de solução de conflitos) seja considerada válida21 .

A arbitragem tem, portanto, como pilar de sustentação e fundamento principiológico a autonomia da


vontade das partes, desde a faculdade de dispor dessa via alternativa de solução de conflitos
quando a lei o permite (art. 1º, LA), até a formulação das disposições procedimentais que regerão os
respectivos procedimentos arbitrais. Assim sendo, a manifestação da vontade das partes não pode
se dar de forma viciada, sob pena de ameaçar o próprio instituto de arbitragem e ferir o pleno
exercício da liberdade de contratar.

Em relação a autonomia da vontade, Selma Lemes:

Princípio da Autonomia da Vontade é a mola propulsora da arbitragem em todos os seus quadrantes,


desde a faculdade de as partes em um negócio envolvendo direitos patrimoniais disponíveis
disporem quanto a esta via opcional de conflitos (art. 1.º), até como será desenvolvido o
procedimento arbitral, no que pertine à forma de indicação dos árbitros (art. 13), seja material ou
formal, desde que não viole os bons costumes e a ordem pública (art. 2.º, §§ 1º e 2º); se a decisão
será de direito ou por equidade (art. 2.º); eleger a arbitragem institucional (art. 5.º); prazo para o
árbitro proferir a sentença arbitral (arts. 11, III, e 23) (…).22

Ocorre que, conforme já mencionado no tópico anterior, o art. 136-A da LSA é categórico ao afirmar
que a aprovação da inserção de convenção de arbitragem no estatuto social, observado o quórum do
art. 136, obriga a todos os acionistas, dispensando, portanto, a necessidade de que todas as partes
contratuais consintam com a inserção da cláusula. A princípio, tal artigo aparenta criar um
antagonismo com o elemento essencial da arbitragem uma vez que a regra possibilita às
companhias a imposição de uma cláusula compromissória estatutária a quem não a tenha
constituído ou a ela não tenha aderido expressamente.

É importante ressaltar que o art. 136-A se refere a uma alteração estatutária posterior à constituição
da sociedade23 .

Dentro desse contexto, verifica-se uma relevante divergência doutrinária a respeito da vinculação de
dissidentes a cláusula compromissória inserida no estatuto social. A maioria doutrinaria defende a
aplicação irrestrita do princípio da maioria a convenção de arbitragem e a vinculação do acionista
dissidente à determinação da assembleia geral que aprovou a inserção de cláusula compromissória
estatutária superveniente (dentre os defensores de tal posicionamento encontram-se Pedro Martins,
Rodrigo Tellechea, Selma Lemes e Diego Franzoni). Por outro lado, a minoria doutrinária entende
que vinculação do acionista à cláusula arbitral depende diretamente de sua expressa manifestação
de consentimento diante da inclusão de uma cláusula arbitral no estatuto social (norteada por
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Modesto Carvalhosa).

A vinculação do acionista dissidente, como é trazida pelo art. 136-A, LSA é aceita pela maioria da
doutrina, tem uma fundamentação principiológica que justifica a submissão de todos os acionistas à
cláusula arbitral inserida no estatuto social. Trata-se do princípio da maioria, que é regra inderrogável
do direito societário.

O princípio da maioria em uma SA se sustenta com a seguinte lógica: o acionista, ao ingressar


voluntariamente em uma sociedade, aceita submeter-se as regras societárias, dentre as quais a que
determina que, na ausência de quórum especial previsto no estatuto ou na lei, as decisões da
assembleia geral serão tomadas com base na maioria absoluta dos votos (art. 129, LSA). Esse
princípio se estende por todas as deliberações societárias, incluindo a deliberação que determina a
inclusão de uma cláusula arbitral no estatuto social24 .

As deliberações tomadas por maioria (feitas conforme os parâmetros legais e livres de quaisquer
atos abusivos) são importantes uma vez que elas representam o interesse social25 (art. 115, LSA). O
interesse maior social, por sua vez, representa o cerne da função social da companhia (que possui
um objeto social a ser atingido – art. 2º, LSA) e, portanto, prevalece quando em conflito com o
interesse particular do acionista26 . Além de representar o interesse da companhia como um todo, a
preservação das decisões tomadas em assembleia por maioria garante a segurança jurídica e a
igualdade entre os acionistas.

Os acionistas, enquanto integrarem a mesma organização social, devem ser tratados com base no
princípio constitucional do tratamento igualitário (art. 5º, caput, CF (LGL\1988\3)), não podendo
nenhum deles receber tratamento privilegiado em detrimento dos demais. Ou seja, o regime jurídico
da sociedade anônima não admite que se atribuam a acionistas de mesma classe e espécie
quaisquer direitos (ou obrigações) distintos em relação à estrutura ou ao funcionamento orgânico da
companhia.

Ademais, para os defensores da vinculação do acionista dissidente à cláusula arbitral, a igualdade


contida dentro do princípio da maioria seria motivo igualmente relevante para que todos os acionistas
se submetam ao acordo arbitral. Seria tratar desigualmente seus acionistas caso parte deles
pudesse escolher entre a jurisdição estatal e a jurisdição arbitral, apenas por terem discordado da
inserção da cláusula arbitral no estatuto social, enquanto os demais acionistas, que concordaram
com a alteração do estatuto, permanecessem vinculados obrigatoriamente a arbitragem.

Outro argumento respalda-se no fato de que o tratamento distinto entre acionistas sujeitos à cláusula
compromissória e acionistas não sujeitos poderia ensejar uma série de dificuldades processuais,
notadamente de decisões (arbitrais e judiciais) antagônicas, o que contribuiria para um alto nível de
insegurança e incerteza nas relações societárias. Um dos defensores dessa corrente é Rodrigo
Tellechea, que afirma:

A alternativa de se manter jurisdições concorrentes não é adequada nem satisfatória para o


problema, na medida em que gerava profunda insegurança ao regime jurídico da arbitragem no
direito das sociedades. A permanência e a convivência, dentro de uma mesma companhia, de alguns
acionistas vinculados ao juízo arbitral e outros ao juízo estatal, violavam regras societárias relevantes
e podiam causar graves prejuízos à sociedade.27

Assim, após a deliberação da matéria em assembleia geral, não poderia mais existir a vontade de
cada acionista, mas apenas da norma social que espelha a vontade da companhia. A manifestação
de cada acionista, vista isoladamente, será, como veremos no tópico seguinte, apenas considerada
para fins de exercício do direito de recesso (quando cabível), ou para fundamentar a anulação da
decisão por abuso da maioria.

A alteração da LSA em 2015, com a inclusão do art. 136-A28 , portanto, tomou como base o princípio
da maioria, a igualdade e a segurança jurídica ao determinar que uma cláusula arbitral estatutária
vinculará a todos os acionistas de determinada companhia, independentemente de manifestação
contrária, aplicando-se, inclusive, aos dissidentes.

Por outro lado, para aqueles que defendem a não vinculação do acionista dissidente, o fato de que a
cláusula arbitral significa a verdadeira e deliberada renuncia à jurisdição estatal, a torna diferente, no
âmbito contratual, das demais cláusulas contratuais que regulamentam o negócio jurídico. Dessa
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o direito de retirada é a solução adequada?

forma, em um estatuto social, a cláusula arbitral não poderia ser comparada as demais cláusulas
organizacionais da companhia, submetidas ao princípio da maioria.

À frente dessa corrente doutrinaria esta Modesto Carvalhosa, que vê a previsão do art. 136-A, LSA
como uma afronta a previsão constitucional do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CF (LGL\1988\3)).
Esse conflito se daria pelo fato de que a Constituição Federal garante aos indivíduos, com natureza
personalíssima, o princípio do livre acesso à justiça. Assim, sendo o direito de acesso ao Poder
Judiciário um direito essencial e personalíssimo do acionista, diferentemente de outros direitos
regulados pelo estatuto social de uma companhia, sua renúncia dependeria de manifestação de
manifestação expressa, não comportando aceitação tácita ou por referência29 .

Ademais, impor a cláusula arbitral aos acionistas que não concordaram expressamente com a sua
inclusão no estatuto, seria privar os acionistas de seus direitos essenciais. Esse raciocínio é
justificado pelo fato de que o art. 109, § 2º, LSA não permite que determinada assembleia geral ou
dado estatuto social elida as garantias necessárias à satisfação dos direitos particulares dos
acionistas. Assim, sendo a utilização da arbitragem um direito subjetivo pertencente a todo e
qualquer acionista sempre que o estatuto social contiver cláusula compromissória, a vinculação
caracterizar-se-ia como uma prerrogativa individual do acionista de aderir à cláusula compromissória
a qualquer tempo e conforme sua concordância30 . Não se trataria, portanto, de um dever ou
obrigação do acionista no sentido de vincular-se ao juízo arbitral estatutário.

Por fim, para a doutrina minoritária a não vinculação do acionista dissidente à cláusula arbitral se
daria pelo fato de que a cláusula compromissória estatutária teria natureza de pacto parassocial, não
pertencendo às normas organizativas do estatuto social. Nesse sentido, não seria correto, conforme
o direito societário, opor cláusula compromissória ao acionista dissidente, assim entendido aquele
que tenha manifestado expressamente discordância quanto à sua inclusão no contrato social ou no
estatuto da companhia, ainda que essa cláusula tenha sido aprovada por maioria.

Entretanto, em que pese estarmos diante de uma situação de imposição da cláusula arbitral aos
acionistas que se manifestaram expressamente contrários à sua adoção, trata-se da única solução
compatível tanto com a estrutura da LA como com o sistema da LSA. Conforme já esclarecido acima,
tais sistemas legais dialogam entre si e a única forma de fomentar esse diálogo é adequar a
legislação, limitando ou relativizando certas regras. Nesse sentido, a cláusula arbitral estatutária
deve ser considerada uma norma organizacional da companhia que vincula a todos os acionistas,
bem como as demais cláusulas estatutárias, preservando-se a igualdade entre eles31 .

A solução encontrada pelo legislador pátrio para harmonizar a vinculação prevista no art. 136-A com
o acesso à justiça constitucionalmente garantido e com os direitos essenciais dos acionistas, foi a de
relativizar o princípio da maioria, possibilitando que o acionista dissidente, que não concorde com a
inclusão da cláusula arbitral no estatuto social, se retire da companhia32 .

O direito de retirada previsto pelo art. 136-A, a despeito de não se inserir no rol das causas possíveis
do art. 137 LSA, como será desenvolvido a seguir, é o verdadeiro remédio para a situação do
acionista dissidente que, dentro da própria companhia, pode utilizá-lo como freio aos poderes da
maioria.

Por fim, o sistema disposto pelo art. 136-A, não fere preceitos constitucionais, uma vez que não nega
aos acionistas vinculados o seu acesso à justiça, apenas os condiciona a uma jurisdição específica
(caso os dissidentes decidam permanecer na sociedade, mesmo discordando da inserção da
cláusula arbitral no estatuto social). Está, portanto, assegurado ao acionista o acesso à justiça, pela
jurisdição arbitral33 .

5 O direito de retirada e a alteração da Lei de Arbitragem

Como visto no tópico anterior, o direito de retirada por inclusão de cláusula compromissória no
estatuto social foi uma solução encontrada pelo legislador para tratar da situação do acionista
dissidente, de forma a compatibilizar o princípio da autonomia da vontade com o princípio da maioria.

O direito de retirada, previsto nos arts. 136 e 137 da LSA, consiste em real corretivo ao princípio da
maioria que impera nas sociedades anônimas34 , justamente por proteger interesse particular do
acionista (distinto do interesse social) É, portanto, instituto de ordem pública que dá ao acionista o
poder jurídico de extinguir as relações que o vinculam à sociedade na ocasião em que a reforma do
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estatuto da companhia puder provocar um antagonismo entre o interesse social e o interesse


particular do acionista.

A possibilidade de retirada por inclusão de cláusula arbitral estatutária foi trazida à LSA por meio da
Lei 13.129/2015 que, além de alterar a LA, também incluiu um novo artigo na LSA, o art. 136-A35 .
Tendo em vista o entendimento da doutrina majoritária36 de que as hipóteses de direito de retirada
previstas nos arts. 136 e 137 da LSA são taxativas37 , a inclusão desse novo dispositivo foi essencial
para solucionar a questão da possibilidade de retirada no caso de inclusão de cláusula arbitral
estatutária.

Cumpre notar, contudo, que mesmo antes da inclusão do art. 136-A na LSA, parte da doutrina e
jurisprudência já entendia que a cláusula arbitral estatutária vinculava todos os acionistas, inclusive
os dissidentes. Isto porque, a existência de acionistas vinculados e não vinculados à cláusula arbitral
dentro de uma mesma poderia gerar problemas ainda maiores, como o comprometimento da
segurança jurídica. Assim, já em 2002, se posicionava Juliana Krueger Pela:

A convivência, dentro de uma mesma CIA, de acionistas sujeitos a um determinado juízo arbitral
pode engendrar situações ainda mais complexas e insolúveis. Pense-se, por exemplo, em duas
ações concorrentes movidas por acionistas minoritários contra a companhia, uma delas proposta
perante o Poder Judiciário por um acionista dissidente na deliberação sobre a adoção da cláusula
compromissória, e a outra proposta perante o juízo arbitral, por um acionista que consentiu com tal
deliberação. A única solução seria o exercício do direito de recesso. Essa solução, além de ser a
mais eficiente, por evitar os custos de administração de dois sistemas de resolução de litígios,
mantém incólume a autonomia do acionista dissidente, em consonância com os ditames da LA.38

Nesse sentido decidiu também o Tribunal de Justiça de Minas Gerais em 2009:

Ação ordinária. Dissolução de sociedades. Incidentes processuais de impugnação ao valor da causa


e gratuidade judiciária. Agravo retido. Não conhecimento. Contrato social que elegeu a ""arbitragem""
como forma de resolução das controvérsias. Validade. Interpretação do art. 86, do CPC
(LGL\2015\1656), e da Lei 9.307/96. 1. O agravo retido somente é conhecido quando há pedido
expresso nas razões de apelação, todavia, não há possibilidade de se interpor agravo retido em
incidente processual e pugnar por sua apreciação quando da interposição do apelo nos autos
principais, por se tratar de procedimentos distintos. 2. Contra a decisão que acolheu a impugnação à
gratuidade judiciária, proferida no incidente processual, não foi interposto qualquer recurso, não
sendo cabível a argüição nas razões do apelo interposto na lide principal. 3. A deliberação acerca da
adoção do juízo arbitral configura-se como qualquer outra deliberação social, portanto, a minoria
vencida dissidente deverá vincular-se à cláusula, sob pena de subversão dos princípios societários e
do próprio interesse maior social. 4- Os honorários da sucumbência relacionam-se ao proveito obtido
pela parte, e hão de ser justos, por corresponder a uma prestação de serviços, realizada sem
dedicação exclusiva, pois, definitivamente, o tempo não é todo empregado em prol de um único
cliente. Assim, a verba sucumbencial arbitrada na sentença é legal e equilibrada, desmerecendo
qualquer retificação.39 (grifos próprios).

A insegurança jurídica que poderia ser gerada pela possibilidade de apenas parte de os acionistas
estarem vinculados à cláusula arbitral é ainda maior no caso das sociedades anônimas abertas, que
possuem inúmeros acionistas em seu quadro acionário, sem qualquer tipo de estabilidade. Nesse
contexto, vale destacar decisão de 2015 proferida na ação coletiva movida contra a Petrobras em
Nova Iorque. Neste caso, conforme comentado por Francisco Müssnich e André de A. Cavalcanti
Abbud40 , a corte de Nova Iorque entendeu que a cláusula estatutária da Petrobras era obrigatória
para todos os acionistas que haviam adquirido ações da companhia, não acolhendo a argumento de
que, sob a lei brasileira, as cláusulas arbitrais deveriam ser aprovadas por unanimidade.

Importante também lembrar o direito de retirada não é o único meio pelo qual um acionista pode se
retirar da sociedade – um acionista pode também alienar suas ações a terceiros a qualquer tempo,
sem motivo específico41 . Ou seja, mesmo antes da inclusão do art. 136-A na LSA, o acionista que
não concordasse com a inserção da cláusula arbitral tinha a possibilidade de retirar-se da sociedade
por meio da alienação de suas ações a terceiros, sendo que, se optasse por ficar na companhia,
estaria vinculado à cláusula arbitral.

Não obstante, a previsão do direito de retirada devido à inclusão de cláusula arbitral foi de grande
importância, pois garante que o acionista minoritário terá o direito de se retirar da sociedade e ser
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

reembolsado pela companhia pelo valor de suas ações, nos termos do art. 45 da LSA. De certa
forma, portanto, pode-se afirmar que o art. 136-A preencheu uma lacuna da LSA, mas não criou um
direito que antes era inexistente. Esse foi, inclusive, o racional adotado no Projeto de Lei do Senado
406/2013, que deu origem à Lei 13.129/2015. Especificamente com relação à questão do direito de
retirada, a justificação do referido Projeto de Lei dizia que:

Assim, com o escopo de aprimorar a Lei de Arbitragem e sintonizá-la com o cenário de crescente
participação do Brasil no cenário internacional, a presente proposta tem por foco alterações pontuais
que não afetam a sua estrutura normativa principal (...). Preenche lacuna atualmente existente em
benefício das companhias, permitindo, de forma clara e organizada, a utilização da arbitragem para
dirimir conflitos societários, mediante modificação estatutária, aprovada em Assembleia Geral, com
quorum qualificado de pelo menos metade das ações com direito a voto, que obrigará a todos os
acionistas. Protege, todavia, os acionistas minoritários, ao assegurar a eles o direito de retirada se
discordarem da deliberação que institui a convenção de arbitragem. Suspende ainda a eficácia da
deliberação que aprovar a inclusão da convenção de arbitragem no estatuto social, até o decurso do
prazo de trinta dias previsto na lei societária para o exercício do direito de retirada, evitando que
entre a data da deliberação e o término do prazo do recesso exista dúvida sobre a competência do
Poder Judiciário para resolver eventuais conflitos42 (grifos próprios).

Verifica-se, portanto, que a intenção maior das leis atuais sobre as sociedades anônimas é manter o
poder absoluto da maioria, sem, entretanto, abandonar a minoria à sua mercê, nem colocar em risco
a continuidade e viabilidade do funcionamento da empresa (cuja preservação é – por motivos de
interesse geral, econômico e social – um dos principais objetivos da lei). Tal direito concedido ao
acionista tem como função conciliar dois interesses: o da companhia, de poder modificar o estatuto
social, e o do acionista minoritário, de não ser obrigado a sofrer restrições ou a continuar sócio de
companhia cujo cerne é diferente daquele do momento em que subscreveu ou adquiriu suas ações.
Ainda, importante notar que a LSA resguardou, ao prescrever esse direito, o princípio da autonomia
da vontade, basilar do instituto da arbitragem.

Por fim, vale ressaltar que com a inclusão do art. 136-A na LSA, o direito de retirada não pode mais
ser visto como uma mera faculdade do acionista dissidente43 , mas, sim, como uma obrigação, uma
vez que o acionista que não se retirar, estará automaticamente vinculado à cláusula arbitral. Nesse
sentido, verifica-se o entendimento de Rodrigo Tellechea:

Ora, se a despeito de remédio previsto na lei, o acionista decide não se retirar da companhia quando
a maioria dos seus pares, reunidos em assembleia geral, deliberam inserir cláusula compromissória
estatutária para fins de deslocar o locus de resolução de conflitos societários daquele contrato à
jurisdição estatal para arbitral – essa passividade em materializar-se seu interesse particular
consolida-se no tempo, legitimando a atuação da maioria.44

Na realidade, a natureza de “obrigação” do direito de retirada é necessária para que o racional e


objetivo da lei sejam atendidos, de modo a possibilitar o bom funcionamento das sociedades
anônimas.

6 Direito comparado

As questões acima discutidas também aparecem nos sistemas legais estrangeiros, porém com
ligeiras diferenças quando comparadas ao direito brasileiro. Como exemplo, analisaremos a
legislação dos seguintes países: Alemanha, Suíça, Itália e Estados Unidos da América.

Na Alemanha, não há qualquer previsão legal que possibilite a inclusão de cláusula arbitral nos
estatutos sociais de companhias. Entretanto, a Corte Suprema Alemã (Bundesgerichtshof) decidiu
em 2009 (leading case) que cláusulas arbitrais poderiam ser inseridas em estatutos sociais mediante
a aprovação de todos os acionistas. A necessidade de aprovação pela totalidade dos acionistas está
relacionada com a autonomia da vontade, necessária para a constituição de um procedimento
arbitral válido45 . Diante disso, não há, na lei alemã, previsão legal acerca da possibilidade do
acionista dissidente se retirar da companhia, visto que apenas com decisão unânime a cláusula
arbitral será incluída no estatuto social.

Na Suíça, ainda há divergências a respeito da inserção de cláusulas arbitrais em estatutos sociais e


de seu poder vinculante, visto que nem o Código Civil suíço, nem o Estatuto de Direito Internacional
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

suíço tratam especificamente do assunto. Dentre outros motivos, aqueles que defendem a não
vinculação dos acionistas dissidentes sustentam que, tendo em vista o alto preço de um
procedimento arbitral, a vinculação dos acionistas dissidentes violaria o art. 680 do Código de
Obrigações (“CO”), que proíbe a companhia de requerer que o acionista contribua com montante
maior que o correspondente ao valor de suas ações. Entretanto, em linha com decisões da Suprema
Corte Suíça que já entenderam pela vinculação dos acionistas à cláusula estatutária, existe um
projeto que visa alterar o Código de Obrigações para adicionar um novo artigo ao CO (697l, CO46 )
similar ao art. 136-A da LSA brasileira. O novo artigo proposto ao CO prevê a vinculação de todos os
acionistas à cláusula arbitral estatutária, porém diferencia-se do provimento da lei brasileira, visto
que não prevê o direito de retirada ao acionista dissidente.

A lei italiana, por vez, prevê um quórum qualificado (dois terços) para inclusão de cláusula arbitral no
estatuto social e contém uma previsão bastante similar ao art. 136-A da LSA brasileira dispondo
sobre o direito de recesso dos acionistas dissidentes47 . A inserção de cláusula arbitral em estatutos
de sociedades anônimas abertas, contudo, é vedada pela lei italiana. O legislador entendeu que os
investidores em uma companhia aberta não estariam interessados na administração da sociedade,
não tendo conhecimento sobre seu estatuto, de forma que não faria sentido vinculá-los a uma
cláusula arbitral48 .

Por fim, nos EUA, o Federal Arbitration Act não veda a inclusão de arbitragem nos estatutos sociais
de companhias, sendo a questão tratada pela lei de cada estado. Entretanto, assim como na Itália,
existe também nos EUA uma vedação com relação à inclusão de cláusulas arbitrais no âmbito
companhias abertas. A Securities and Exchange Comission (“SEC”) vem rejeitando historicamente o
registro de companhias abertas que prevejam a arbitragem como mecanismo de resolução de
disputas entre os acionistas. Em 1990, ao tratar do Initial Public Offer (“IPO”) da companhia Franklin
First Financial Corp, o SEC apresentou objeção à inclusão de cláusula arbitral obrigatória aos
investidores, afirmando que esta seria contrárias ao interesse público. Tal posicionamento se
manteve ao longo dos anos e foi recentemente reafirmado no IPO do The Carlyle Group L.P, em
2012, que teve seu registro negado por conta da previsão da arbitragem como mecanismo de
resolução de disputas49 .

Como verificado, a possibilidade de utilização da arbitragem em conflitos societários e de inclusão de


cláusula em estatuto social – especialmente quando se trata de companhia aberta – é bastante
controversa, não apenas no Brasil, mas ao redor de todo mundo. A análise do direito estrangeiro
demonstra, mais uma vez, que a questão ainda é relevante e deverá ser cada vez mais discutida,
tendo em vista a complexidade das relações societárias.

7 Conclusão

Em face de todo o exposto, conclui-se que o direito de retirada por inclusão de cláusula arbitral no
estatuto social foi uma solução adequada e justa encontrada pelo legislador para compatibilizar o
princípio da maioria com o princípio da autonomia da vontade.

Não seria razoável permitir que cláusulas arbitrais estatutárias vinculassem apenas parte dos
acionistas, o que afrontaria diretamente o princípio da maioria, um dos princípios basilares do direito
societário. Além disso, tal situação traria uma enorme insegurança jurídica, uma vez a companhia
poderia ter que enfrentar em determinados casos ações concorrentes e decisões conflitantes. Não é
à toa que o princípio da maioria é de tamanha importância no direito societário – ele o único capaz
de permitir o funcionamento ao mesmo tempo eficiente e democrático dentro de uma companhia.

Por outro lado, também não seria adequado obrigar que os acionistas que não concordassem com a
cláusula arbitral permanecessem na companhia, o que violaria o princípio da autonomia da vontade,
um dos pilares da arbitragem. Justamente por consistir em uma renúncia ao Poder Judiciário, a
opção pela arbitragem não pode ser presumida – o que não significa, contudo, que um acionista
pode valer-se dessa prerrogativa para, a seu exclusivo critério e quando lhe for conveniente,
apresentar objeções à escolha da via arbitral.

Nesse contexto, o direito de retirada é a melhor – se não a única – solução para resolver o problema.
Ao permitir que um acionista que não concorde com a inserção de uma cláusula arbitral estatutária
se retire da companhia, mediante reembolso de suas ações, a vontade da maioria está sendo
respeitada, sem que a vontade do acionista dissente esteja sendo desconsiderada ou prejudicada.
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

Isto porque, o acionista dissidente poderá optar por permanecer na sociedade ou retirar-se desta,
estando ciente de que, se permanecer, estará sujeito a todas as normas de seu Estatuto Social,
incluindo a cláusula arbitral. A autonomia da vontade do acionista reside justamente na escolha que
lhe é facultada pelo art. 136-A e que, se não exercida, se torna uma obrigação, vinculando
automaticamente o acionista à cláusula arbitral.

É evidente que o direito de retirada traz maior segurança ao uso da arbitragem no direito societário, o
que possivelmente possibilitará a ampliação do uso do instituto nesse segmento, trazendo vantagens
não somente às companhias, mas também a seus acionistas, que, ao optar pela arbitragem, tem a
possibilidade de dirimir seus conflitos por meio de um procedimento célere, técnico e sigiloso.

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1 WALD, Arnoldo. A arbitrabilidade dos conflitos societários: considerações preliminares (I). Revista
de Arbitragem e Mediação, v. 12, 2007.

2 CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei 9.307/96. 3. ed. rev. atual
e ampl. São Paulo: Atlas, 2009, p. 39.

3 CAHALI, José Francisco. Curso de arbitragem. 5. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2015.

4 CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo... cit., p. 39.

5 Esse é o entendimento de Rodrigo Tellechea: “A regra é que as controvérsias, desinteligências


e/ou litígios envolvendo a companhia e seus acionistas e/ou seus acionistas entre si digam respeito a
questões patrimoniais e disponíveis, estando, portanto, dentro dos limites objetivos estabelecidos
pelo art. 1º da LA. São, portanto, plenamente passíveis de resolução por arbitragem, seja de direito
ou equidade, controvérsias relacionadas a temas societários internos diversos, dentre os quais a
Página 12
A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

dissolução parcial/total, a exclusão de sócios, a apuração de haveres, etc.” (TELLECHEA, Rodrigo.


Arbitragem nas Sociedades Anônimas. São Paulo, 2016, p. 338-339).

6 LOBO, Carlos Augusto Silveira. A cláusula compromissória estatutária. Revista de Arbitragem e


Mediação, n. 22, ano 6, p. 32, jul.-set. 2009.

7 CARVALHOSA, Modesto; EIZIRIK, Nelson. Estudos de direito empresarial. São Paulo: Saraiva,
2010, p. 22-23.

8 O compromisso arbitral, ao contrário da cláusula arbitral, é firmado pelas partes após o surgimento
de um litígio, conforme definido por Francisco José Cahali: “O compromisso arbitral, como referido, é
a convenção através da qual as partes submetem à arbitragem um litígio já inaugurado. Pode ser
judicial, celebrado por termo nos autos, perante o juízo ou tribunal onde tem curso a demanda, ou
extrajudicial, promovido através de instrumento público ou particular, sendo, nesta última forma,
necessariamente por documento escrito, e com duas testemunhas (art. 9º, caput e §§ 1º e 2°, da Lei
9.307/1996)”. CAHALI, José Francisco. Curso de arbitragem cit., p. 177.

9 Importante notar que, muito embora o art. 109, § 3º, tenha sido incluído na Lei das S.A. apenas em
2001, por meio da Lei 10.303/2001, a possibilidade de utilização da arbitragem para conflitos
societários já era possível, especialmente após a edição da Lei 9.307/96, e teve sua origem no
Código Comercial de 1850, que previa em seu art. 294 que “todas as questões sociais que
suscitarem entre sócios durante a existência da sociedade ou companhia, sua liquidação ou partilha,
serão decididos em juízo arbitral”. Nesse sentido, confira: VILELA, Marcelo Dias Gonçalves.
Arbitragem no direito societário. Belo Horizonte: Mandamentos Editora, 2004, p. 153-154.

10 Não obstante a previsão legal expressa de que conflitos entre acionistas serão atingidos pela
cláusula arbitral, importante lembrar que os litígios que não tiverem relação com o objeto social da
companhia (ainda que travados entre acionistas) não serão atingidos pela cláusula compromissória.
Nesse sentido, entende Pedro Batista Martins: “Logo, a cláusula arbitral estatutária, de eficácia
interna, não pode ser invocada para resolver conflitos de origem externa e envolver terceiros alheios
e não vinculados aos efeitos da cláusula compromissória”. MARTINS, Pedro A. Batista. Arbitragem
no direito societário. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2012, p. 160.

11 Tal entendimento decorre de previsão expressa da Lei das S.A.: “Art. 129. As deliberações da
assembleia-geral, ressalvadas as exceções previstas em lei, serão tomadas por maioria absoluta de
votos, não se computando os votos em branco” [grifos próprios]. Cumpre ressaltar, contudo, que,
caso haja quórum específico previsto no Estatuto Social, este deverá ser respeitado.

12 Outro ponto bastante discutido com relação ao tema é a vinculação dos administradores que
também ocupam a posição de acionista. Pedro Batista Martins entende que tais administradores
devem se vincular à cláusula compromissória, tanto em sua qualidade de acionista, quanto de
administrador, tendo em vista que seria “difícil, senão impossível, discernir como autônomas as
relações de subordinação do dirigente à sociedade que administra, e do acionista ou sócio que tem o
dever de zelar pelo cumprimento das normas sociais (...)”. MARTINS, Pedro A. Batista. Arbitragem
no direito societário cit., p. 214.
Com posicionamento contrário, confira: ADAMEK, Marcelo Vieira. Responsabilidade civil dos
administradores de S/A e as ações correlatas. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 429.

13 Esse é o entendimento de Modesto Carvalhosa: “A cláusula compromissória estatutária é um


negócio jurídico autônomo (art. 8º da LA) que não se confunde com as cláusulas organizativas
constantes do estatuto social. A cláusula compromissória estatutária não afeta o direito dos
acionistas não pactuantes. Não há oponibilidade dessa cláusula aos direitos essenciais que não
estão vinculados aos seus termos por expressa manifestação individual de vontade”. CARVALHOSA,
Modesto. Cláusula compromissória estatutária e juízo arbitral. In: LOBO, Jorge (coord.). Reforma da
Lei das Sociedades Anônimas. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 334. Nesse mesmo sentido,
também se posicionam: CARVALHOSA, Modesto de Sousa Barros. Comentários à Lei das
Sociedades Anônimas. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, v. 2, p. 347; CRAVEIRO, Mariana Conti.
Cláusula arbitral e pacto parassocial: algumas contribuições do direito societário para a arbitragem.
Revista Brasileira de Arbitragem, Comitê Brasileiro de Arbitragem CBAr & IOB; Comitê Brasileiro de
Página 13
A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

Arbitragem CBAr & IOB 2014, v. XI, Issue 42, p. 63- 64.

14 “Sem embargo de manter íntegra sua autonomia, a cláusula compromissória pode se integrar,
plenamente aos demais termos e condições constantes do estatuto social. Um conceito não afasta o
outro. Ao contrário, são integrativos”. MARTINS, Pedro A. Batista. Arbitragem no direito societário
cit., p. 109.

15 Nesse sentido, vale destacar os ensinamentos de Paulo Toledo: "Como dizer-se parassocial a
cláusula compromissória se: a) insere-se no estatuto; b) abrange todos os acionistas, presentes ou
futuros. Não se pode equipará-la ao acordo de acionistas, este sim parassocial (...). Também não se
percebe como possa uma norma estatutária-seja ou não organizacional, e faça parte ou do ato
constitutivo ou de alguma alteração posterior-dizer respeito somente a uma parcela dos acionistas.
Não faz sentido, por exemplo, que um litígio entre a sociedade e dois de seus acionistas seja, quanto
a um deles, solucionado pela via arbitral, e quanto ao ouro, deva ser levado ao Judiciário". TOLEDO,
Paulo Fernando Campos Salles de. A arbitragem na Lei da Sociedades Anônimas. In: CASTRO,
RodrigoMonteiro de; ARAGÃO, Leandro Santos de. Sociedade Anônima – 30 anos da Lei 6.404/76.
2007, p. 265.

16 Muito embora, em princípio, a companhia não esteja vinculada à cláusula compromissória


inserida em acordo de acionistas, a situação pode ser diferente quando a companhia assina o acordo
como interveniente-anuente.

17 Essa questão foi discutida no julgamento da Apelação 0156576-96.2012.8.19.0001 pelo TJ-RJ:


“(...) A cláusula compromissória estabelecida no Acordo de Acionistas só vale para solucionar
divergências futuras entre os sócios, fundadas na ‘interpretação’ do referido Acordo. E não entre eles
e a Sociedade (Cláusula 7ª). Preliminar rejeitada”. BRASIL. TJRJ. 2ª Vara Empresarial da Comarca
da Capital. Apelação Cível 0156576-96.2012.8.19.0001, rel. Des. Jaqueline Lima Montenegro, Rio de
Janeiro, 2014.

18 Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A. Estatuto Social. Disponível em:
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[http://siteempresas.bovespa.com.br/consbov/ExibeTodosDocumentosCVM.asp?CNPJ="61.695.227/0001-93&CCVM=
Acesso em: 23.06.2017.

20 “A existência de convenção arbitral exclui a apreciação do conflito pelo Poder Judiciário Estatal
em decorrência da vontade manifestada pelas partes, desde que preenchidos os seus requisitos e
que seja admitida a utilização deste método no caso concreto (arbitrabilidades objetiva e subjetiva
...). E assim, a convenção vincula as partes e se impõe aos contratantes, mesmo contra a vontade
unilateral de algum deles, autorizando, conforme o caso, a instalação imediata do juízo arbitral”.
CAHALI, José Francisco. Curso de arbitragem cit.

21 “A cláusula compromissória exige declaração de vontade para se aperfeiçoar com o negócio


jurídico, sob pena de ser inexistente, insuscetível de outorgar jurisdição aos árbitros. A adoção da
cláusula compromissória representa uma renúncia à jurisdição estatal, ao direito de o Poder
Judiciário apreciar o mérito da disputa. (...) nesse contexto, correta a afirmação de Carmen Tibúrcio e
Luís Roberto Barroso no sentido de que a opção pela cláusula compromissória representa,
simultaneamente, a renúncia à jurisdição estatal e, portanto, ao direito constitucional de acesso ao
Judiciário. Trata-se de renúncia prévia e veiculada em abstrato, antes de os conflitos se
apresentarem concretamente. Por isso mesmo, a decisão das partes de se submeterem
obrigatoriamente à arbitragem independentemente de uma nova manifestação de vontade quando da
erupção do conflito deve decorrer de forma clara do ajuste por elas firmado” (NANNI, Giovanni
Ettore. Direito civil e arbitragem. Sao Paulo. Atlas, 2014, p. 30).
Nesse mesmo sentido, Paulo Nasser e Felipe Sperandio: “Para que haja arbitragem é preciso que as
partes queiram. É imperiosa, pois, a manifestação de vontade quanto à submissão da disputa a um
método privado de solução, em detrimento da jurisdição estatal”. NASSER, Paulo Magalhães;
SPERANDIO, Felipe Volibrecht. Direito processual empresarial. Sob a coordenação de Gilberto
Gomes Bruschi, Mônica Bonetti Couto, Ruth Maria Junqueira de A. Pereira e Silva, Thomaz Henrique
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

Junqueira de A. Pereira. Ed. Campus Jurídico, 2012, p. 634-635.

22 Apud BENEDETTI JUNIOR, Lidio Francisco. Da convenção de arbitragem e seus efeitos.


Disponível em: [http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3951].

23 Caso a cláusula tenha sido introduzida no momento da constituição da companhia, todos os


acionistas que vierem a fazer parte da companhia estarão vinculados a cláusula arbitral. Além disso,
caso um acionista decida por entrar em uma companhia que já possui em seu estatuto social a
previsão de uma cláusula arbitral, não há divergências a respeito de sua vinculação ao método
privado de solução de conflitos. Isso pois, ao concordar em entrar na companhia, o acionista
concorda também com todas as disposições do estatuto social, incluindo a convenção de arbitragem.

24 Segundo Carlos Augusto Lobo “Quem ingressa em uma organização está ipso facto manifestando
vontade de aceitar as disposições do respectivo estatuto. Sejam as disposições existentes no
momento da aquisição de ações, sejam aquelas que futuramente forem introduzidas pela maioria na
forma da lei, compra-se um pacote fechado (mas transparente), sujo conteúdo é o status de sócio”.
LOBO, Carlos Augusto Silveira. A cláusula compromissória estatutária. Revista de Arbitragem e
Mediação, n. 22, ano 6, p. 17-18. Jul.-set. 2009.

25 Sobre as deliberações tomadas por maioria, Pedro Martins: “A maioria prevalece nas
deliberações assemblares. A maioria reflete, por suposto, a vontade da coletividade, e a minoria se
sujeita à esta maioria por esta exprimir a manifestação da coletividade social (...) o princípio
majoritário é regra inderrogável do direito societário" e ainda “a unanimidade é simples quimera em
qualquer esfera do relacionamento em sociedade. Impensável pretender que uma organização como
as anônimas funcione de forma unânime. Da mesma forma que seria impraticável submeter toda e
qualquer sociedade ao controle da minoria. Daí o direito ter adotado a deliberação majoritária como a
forma mais democrática de deliberação social e como o meio mais adequado de se dar continuidade
a um ente importantíssimo para o desenvolvimento das nações”. MARTINS, Pedro Antônio Baptista.
In: YARSHELL, Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setogutti. Processo societário. São Paulo: Quartier
Latin, 2012, p. 624-626.

26 Sobre o princípio da maioria e o interesse social, confira Marcelo Vilela: “Após a deliberação da
assembleia geral, não há que se falar na vontade de cada associado, mas na norma social que
espelha a vontade da companhia. A manifestação de cada associado, vista isoladamente, será
apenas considerada para fins de direito de recesso. Há que se ter como válida a decisão do corpo
societário tomada pela maioria, mesmo em se tratando de deliberação acerca do juízo a ser eleito
para dirimir conflitos futuros no âmbito do funcionamento da sociedade vinculando-se a todos os
associados ausentes ou dissidentes". VILELA, Marcelo Dias Gonçalves. Arbitragem no direito
societário cit., p. 200-201.

27 TELLECHEA, Rodrigo. Arbitragem nas Sociedades Anônimas cit., p. 444.


Nesse mesmo sentido, Jose Virgilio Lopes Enei: “(...) se apenas alguns acionistas estiverem
vinculados à arbitragem, qualquer demanda de interesse geral de uma certa categoria de acionistas
poderá suscitar a propositura de demandas paralelas tanto na via arbitral, como na via judiciária, com
sério risco de decisões conflitantes e com um inegável desperdício de recursos”. ENEI, José Virgílio
Lopes. A arbitragem nas sociedades anônimas. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Financeiro e
Econômico, n. 131, São Paulo, v. 44, p. 106, 2004.

28 Apesar de a alteração da lei ter sido realizada apenas em 2015, o legislador apenas adotou o
posicionamento doutrinário majoritário que já defendia a vinculação do acionista dissidente a
cláusula arbitral estatutária.

29 Antes da inclusão do art. 136-A na LSA, Modesto Caravalhosa já manifestava-se contrariamente


à vinculação do acionista dissidente: “Ao renunciar à jurisdição estatal para adotar o juízo arbitral, o
acionista e a sociedade estão renunciando a um direito essencial, que, portanto, tem caráter
personalíssimo, não se transmitindo aos acionistas que não renunciaram expressamente a esse
direito constitucionalmente assegurado (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal)” (CARVALHOSA,
Modesto; EIZIRIK, Nelson. A nova Lei das S/A. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 58). Apos a mudança
da LSA com a inclusão do art. 136-A, Modesto Carvalhosa continua defendendo a não vinculação,
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

acreditando que o artigo infraconstitucional contraria ditames constitucionais: “O texto normativo


constante no art. 136-A da Lei 13.129 de 2015 determina a imposição do pacto compromissório
arbitral a todos os acionistas de uma companhia por deliberação majoritária tomada em assembleia
geral. O preceito indigitado fere frontalmente o instituído no inciso XXXV do art. 5º da CF
(LGL\1988\3), pois não pode um instituto de natureza eminentemente privada inserido num estatuto
social revogar o direito pleno do acionista de socorrer-se ao Poder Judiciário nos seus conflitos de
natureza societária, a não ser que tenha manifestado sua vontade, expressa e pontualmente nesse
sentido” (CARVALHOSA, Modesto. Seminário da International Bar Association- Celebrando a Carta
Magna e o Estado de Direito- USP, em 13.11.2015).

30 “Como referido, sendo complemento ou transposição das regras contidas na Lei Societária, o
estatuto social não poderá contrariar, de forma alguma, dispositivos contidos na Constituição, nas
leis ordinárias e na Lei Societária. Não poderá o estatuto privar os acionistas dos direitos essenciais
previstos no próprio art. 109 dessa lei, em seu § 2º, que reza: ‘Os meios, processos ou ações que a
lei confere aos acionistas para assegurar os seus direitos não podem ser elididos pelo estatuto ou
pela assembleia geral’”. CARVALHOSA, Modesto; EIZIRIK, Nelson. A nova Lei das S/A cit., p. 58.

31 Maria Eugênia Finkelstein expõe que “as Sociedades Anônimas são constituídas por meio de um
estatuto social (...), que é a lei máxima que rege a vida da companhia e a relação desta com seus
acionistas. É no estatuto social que se encontram disposições gerais que regulam o funcionamento
da companhia” (FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Direito empresarial. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006, v.
20).

32 TELLECHEA, Rodrigo. Arbitragem nas Sociedades Anônimas cit., p. 469.

33 “Argumenta-se que o direito essencial de acesso à justiça não pode ser entendido como direito
irrenunciável e inafastável, mas sim como a prerrogativa de escolher entre uma dentre duas
alternativas: o Poder Judiciário ou o juízo arbitral. Desde que o acionista tenha assegurada uma
dessas alternativas, não haveria que se falar em violação a direito essencial” (TELLECHEA, Rodrigo.
Arbitragem nas Sociedades Anônimas cit., p. 392). Nesse sentido, veja Marcelo Vilela: “a adoção do
juízo arbitral importa apenas em retirar do Poder Judiciário a apreciação do mérito da demanda,
transferindo-a a um árbitro que também está investido de poder jurisdicional, de forma a exigir deste
o respeito às garantias processuais previstas constitucionalmente. O direito essencial de acionista,
nesse aspecto, é aquele substanciado no direito de ação, que lhe garante a solução do conflito por
um terceiro imparcial e investido de poder jurisdicional” (VILELA, Marcelo Dias Gonçalvez.
Arbitragem no direito societário cit., p. 192).

34 Nesse sentido, confira: TELLECHEA, Rodrigo. Arbitragem nas Sociedades Anônimas cit., p. 443;
OCHMAN, Renato. O direito de retirada de acionistas. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, 1992, p. 108; CUKIER, Daniel. A Arbitragem Ampliada ao
Direito Societário. Revista de Mediação e Arbitragem, São Paulo, 2014, p. 241; LOBO, Carlos
Augusto Silveira. A cláusula compromissória estatutária. Revista de Arbitragem e Mediação, n. 22,
ano 6, p. 20-21, jul.-set. 2009.

35 “Art. 136-A. A aprovação da inserção de convenção de arbitragem no estatuto social, observado o


quórum do art. 136, obriga a todos os acionistas, assegurado ao acionista dissidente o direito de
retirar-se da companhia mediante o reembolso do valor de suas ações, nos termos do art. 45.”

36 Nesse sentido, posicionam-se Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira: “Os casos que
dão direito de retirada são, por isso, taxativos, e não podem ser ampliados: o acionista só tem direito
de retirada nos casos previstos na LSA” (LAMY FILHO, Alfredo; BULHÕES PEDREIRA, José Luiz.
Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009, v. 1, p. 330). Com o mesmo posicionamento,
confira: DE LUCCA, Newton. O direito de recesso no direito brasileiro e na legislação comparada.
São Paulo, 1999, p.113-114; MÜSSNICH, Francisco Antunes Maciel. Reflexões sobre o direito de
recesso na Lei das Sociedades por Ações. In: LOBO, Jorge. Reforma da Lei das Sociedades
Anônimas. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 287-297.

37 Por outro lado, parte da doutrina, como Nelson Eizirik, entende que o artigo 136 não tem natureza
taxativa: “Prevalece na doutrina o entendimento de que somente podem ensejar o direito de retirada,
com o reembolso do valor das ações, as hipóteses expressamente previstas na Lei das S.A. Trata-se
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

de um mito que não encontra qualquer amparo na lei societária. Na realidade, o que é vedado é a
exclusão do direito de recesso por dispositivo estatutário ou por deliberação de assembleia, por
tratar-se de um direito essencial do acionista. Nada impede, a nosso ver, que o estatuto crie novas
hipóteses de recesso para determinada classe de ações. Particularmente, no caso de companhias
fechadas, pode constituir um atrativo adicional para a subscrição de ações a possibilidade de o
acionista desfazer-se do investimento realizado mediante o direito de recesso, tal como no Direito
Italiano” (EIZIRIK, Nelson. A Lei das S.A. comentada. Arts. 121 a 188. 2. ed. São Paulo: Quartier
Latin, 2015, v. II, p. 227). Rodrigo Tellechea entende da mesma forma: “As hipóteses de recesso
tendem a ser classificadas como taxativas, não admitindo extensão estatutária. Contudo, sustenta-se
que a aplicação convencional dos casos legais de recesso em sociedades anônimas fechadas é
possível- por meio do princípio da autonomia privada- e seu exercício não fere os núcleos rígidos
desse tipo societário” (TELLECHEA, Rodrigo. Sociedades Anônimas fechadas: direitos individuais
dos acionistas e cláusula compromissória estatutária superveniente. Tese de Doutorado (USP),
2015, p. 21).

38 PELA, Juliana Krueger. Notas sobre a eficácia da cláusula compromissória estatutária. Revista de
Direito Mercantil, Industrial, Financeiro e Econômico, n. 126 p. 138-139, abr.-jul. 2002. Com o mesmo
posicionamento: TOLEDO, Paulo Fernando Campos Salles de. A arbitragem na Lei da Sociedades
Anônimas. In: CASTRO, RodrigoMonteiro de; ARAGÃO, Leandro Santos de. Sociedade Anônima –
30 anos da Lei 6.404/76. 2007, p. 265.

39 BRASIL. TJMG. 13ª Câmara Cível. Apelação Cível 1.0024.08.071075-9/001. Des. Francisco
Kupidlowski, 09.07.2009.

40 “Nenhum dos argumentos dos autores foi capaz de convencer a Justiça de NY de que não
estavam vinculados à arbitragem. Primeiro, a decisão afastou a tese de que as regras aplicáveis aos
contratos de adesão tornariam ineficaz a cláusula arbitral prevista no estatuto social da Petrobrás.
Para o juiz, aceitar essa tese seria o mesmo que tornar inexequíveis todas as cláusulas arbitrais
previstas nos estatutos sociais de mais de 160 companhias brasileiras, incluindo aquelas listadas no
Novo Mercado.
Segundo, a Justiça de NY discordou da alegação de que, sob a lei brasileira, as cláusulas arbitrais
dos estatutos sociais deveriam ser aprovadas por unanimidade para serem vinculantes a todos os
acionistas. A decisão notou que essa matéria não está listada dentre aquelas que exigem aprovação
unânime, previstas nos arts. 221 e 294 da Lei das S.A., e que, portanto, deveria prevalecer a regra
geral da maioria simples, prevista no art. 136 da lei societária. Ao rejeitar esse argumento, a decisão
invocou a recente alteração da Lei de Arbitragem feita pela Lei 13.129 de 2015, que incluiu regra
expressa na lei societária vinculando todos os acionistas, inclusive dissidentes, ausentes ou que se
abstiveram, à regra da maioria na adoção da arbitragem (art. 136-A). O juiz lembrou que essa regra
confirma o entendimento prevalecente” (grifos próprios). MÜSSNICH, Francisco; ABBUD, André de
A. Cavalcanti. Processos contrato e Petrobrás deverão usar a via arbitral. p. 05.09.2015. Disponível
em: [http://www.conjur.com.br/2015-set-05/processos-petrobras-deverao-usar-via-arbitral]. Acesso
em: 23.06.2017.

41 Nesse sentido, ensina Sérgio Botrel: "A partir do momento em que se admite que a finalidade do
direito privado é concretizar e/ou conciliar a realização de direitos fundamentais, o direito de recesso
há que ser interpretado como um mecanismo de concretização do direito fundamental de não
permanecer associado (direito de livre associação). Nas SA, o exercício desse direito fundamental se
viabiliza não só pelo recesso, mas também pela previsão legal de livre transferência da participação
societária. Assim, o acionista exerce o seu direito de não permanecer associado mediante a
alienação de suas ações" (grifos próprios). BOTREL, Sérgio. Direito societário constitucional. São
Paulo: Atlas, 2009, p. 112-114.

42 Projeto de Lei 406/2013, p. 6. Disponível em:


[http://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm="2930454&disposition=inline]." Acesso em:
23.06.2017.

43 Nesse sentido já se posicionaram Modesto Carvalhosa e Nelson Eizirik, afirmando que a


vinculação à cláusula arbitral estatutária seria uma faculdade do acionista: “Trata-se de preceito
cogente. Em consequência, a supressão da instância judicial e sua substituição pelo juízo arbitral
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A cláusula arbitral estatutária e a vinculação do acionista:
o direito de retirada é a solução adequada?

estatutário devem ser consideradas como uma faculdade para os acionistas e uma obrigação
contratual para a sociedade. Somente para aqueles acionistas que se vincularam expressamente a
tal supressão, nos diversos momentos da existência da sociedade, é o juízo arbitral oponível”
(CARVALHOSA, Modesto; EIZIRIK, Nelson. A nova Lei das S/A cit., p. 58).

44 TELLECHEA, Rodrigo. Arbitragem nas Sociedades Anônimas cit., p. 469.

45 Caso II ZR 255/08 de 6.4.2009, Bundesgerichtshof: “[20] Die Schiedsabrede muss grundsätzlich


mit Zustimmung sämtlicher Ge-sellschafter in der Satzung verankert sein; alternativ reicht eine
außerhalb der Satzung unter Mitwirkung sämtlicher Gesellschafter und der Gesellschaft getrof-fene
Absprache aus” (Tradução livre: A convenção de arbitragem deve ser incluída no estatuto apenas
com o consentimento de todos os acionistas; alternativamente a companhia e todos os seus
acionistas poderão realizar um compromisso arbitral fora do estatuto). Essa decisão foi confirmada
em 2017 pelo Caso ZB 23/16 de 06.04.2017.

46 O artigo cuja aprovação encontra-se tramitando no parlamento suíço tem a seguinte redação:
“Arbitration . Art. 697l 1 The bylaws may provide that corporate disputes shall be resolved by an
arbitral tribunal. They might provide that the arbitration clause is binding for all shareholders, the
corporation and its bodies. 2 The arbitration proceedings are governed by the provisions of the 3rd
part of the Swiss Code of Civil Procedure. The bylaws may, within the scope of these provisions,
regulate the details of the arbitral proceeding. 3 If an arbitral award is to effect the corporation and all
shareholders, the board of directors shall notify the shareholders of the initiation of the respective
arbitration proceeding and points out to them their rights in such proceedings” (Tradução livre: 1. Os
estatutos podem prever que as disputas corporativas sejam resolvidas por um tribunal arbitral.
Poderão prever que a cláusula de arbitragem seja vinculativa para todos os acionistas, a corporação
e seus órgãos. 2. Os procedimentos da arbitragem são regidos pelas disposições da 3ª parte do
Código de Processo Civil Suíço. Os estatutos podem, no âmbito destas disposições, regular os
pormenores do procedimento arbitral. 3. Se uma sentença arbitral tiver o poder de afetar a
companhia e todos os acionistas, o conselho de administração notificará os acionistas do início do
respectivo procedimento arbitral e apontará seus direitos sobre tal processo).

47 Tais previsões estão contidas no artigo 34 do Decreto Legislativo 5/2003, conforme comenta
Diego Franzoni. Cf. FRANZONI, Diego. Arbitragem societária. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2015, p. 135-137.

48 Essa é a explicação dada por Francesco Paolo Luiso. Cf. LUISO, Francesco Paolo apud
FRANZONI, Diego. Arbitragem societária cit., p. 56.

49 A esse respeito, confira: TYAGI, Karan Singh. Carlyle leaves out mandatory arbiration clause in
IPO. Kluwer Arbitration Blog. Disponível em: [
http://kluwerarbitrationblog.com/2012/02/07/carlyle-leaves-out-mandatory-arbitration-clause-in-ipo/].
Acesso em: 26.06.2017.

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