Este documento discute o sistema de espionagem do Exército brasileiro contra movimentos sociais. Apesar da extinção do SNI em 1992, o Exército continua monitorando e "fichando" pessoas consideradas prejudiciais à "ordem social" por meio de uma rede de 541 agentes. Recentemente documentos vazados revelaram que o Exército classifica jornais e movimentos como o MST como "forças adversas" e defende táticas que possam violar direitos para combatê-los.
Este documento discute o sistema de espionagem do Exército brasileiro contra movimentos sociais. Apesar da extinção do SNI em 1992, o Exército continua monitorando e "fichando" pessoas consideradas prejudiciais à "ordem social" por meio de uma rede de 541 agentes. Recentemente documentos vazados revelaram que o Exército classifica jornais e movimentos como o MST como "forças adversas" e defende táticas que possam violar direitos para combatê-los.
Este documento discute o sistema de espionagem do Exército brasileiro contra movimentos sociais. Apesar da extinção do SNI em 1992, o Exército continua monitorando e "fichando" pessoas consideradas prejudiciais à "ordem social" por meio de uma rede de 541 agentes. Recentemente documentos vazados revelaram que o Exército classifica jornais e movimentos como o MST como "forças adversas" e defende táticas que possam violar direitos para combatê-los.
Escrevi nesse site, no mês de março do praticando uma política de inteligência
corrente ano, dois artigos discutindo a que admite "arranhar direitos dos questão da violência política nos países cidadãos", além de classificar os da América Latina, sobretudo nos do movimentos sociais como “forças cone Sul. Argumentava então, que adversas”. Mais do que isso, para o existia uma política deliberada no Exército, movimentos populares como o sentido de forçar um esquecimento sobre MST se equiparam ao “narcotráfico e ao os horrores e crimes praticados pelas crime organizado”, numa tentativa de ditaduras militares. Discutia ainda que criminalizar os movimentos sociais e era preciso que os arquivos da ditadura, torná-los forças que precisam ser à exemplo do que ocorreram com os das conhecidas, combatidas e "eliminadas". Delegacias Especializadas de Ordem São os velhos sujeitos “indesejáveis” do Política e Social (DOPS), fossem abertos Estado Novo e da Ditadura Militar. Os e colocados à disposição da sociedade, documentos recuperados pelo matutino pois assim, entidades de direitos paulista nos mostram, pela primeira vez, humanos e pesquisadores poderiam desde o processo de redemocratização do jogar luzes nesse passado obscuro da país, os subterrâneos da máquina de nossa história recente. espionagem do Exército. Essa tese, defendida por todas as Sabemos que em todo lugar do mundo, entidades de direitos humanos do país, os Estados mantêm serviços de deve ganhar um novo alento, espionagem. Até as empresas se utilizam principalmente agora que veio à tona desse mecanismo. Vejam o recente caso novas evidências de que o Estado dos grampos do BNDES, aliás realizados continua com um permanente sistema de por velhos arapongas do extinto SNI. inteligência, sob a responsabilidade do Nem os próprios partidos de esquerda Exército brasileiro e centrado no são contra um Serviço de Inteligência. Gabinete da Segurança Institucional, Mas o modelo precisa ser diferente: órgão vinculado diretamente ao Palácio apartidário, que não controle o cotidiano do Planalto. dos cidadãos por suas atividades Refiro-me aos fatos narrados, políticas e que seja submetido a um recentemente, pelo jornalista da Folha de rigoroso controle do Congresso S. Paulo, Josias de Souza, que revelou Nacional, sob o manto da sociedade documentos secretos obtidos por aquele civil. jornal, onde o Exército continua No entanto, o que está acontecendo é Pública com o objetivo de coordenar e exatamente o contrário. Mesmo com a integrar as atividades de inteligência de extinção do SNI em 1992, o Estado não todo o país, através de uma rede de deixou de exercer atividades de controle informações. Caberá à rede, conforme sobre os movimentos populares e sociais fundamenta o decreto, “identificar, e continua “fichando” pessoas que acompanhar e avaliar ameaças reais ou possam ser consideradas nocivas à potenciais, além de promover a coleta, “ordem social”, os velhos e difamados busca e análise de dados e de produzir “subversivos”. conhecimentos que subsidiem decisões A reconstrução de um sistema de na esfera de inteligência dos governos informação começou ainda no governo federal, estadual e municipal”. Não é Itamar Franco, quando no dia 13 de mais nada do que a recriação do velho junho de 1994 foi criada a Escola de SNI com outro nome. Inteligência Militar do Exército. Essa Atualmente são 541 agentes trabalhando escola tinha como objetivo modernizar a nessa rede. Praticamente ninguém fica ação do próprio Exército, preparando-o imune aos espiões do Exército. para o novo momento histórico Conforme constatou o jornalista Josias decorrente da "abertura política e da de Souza, eles estão espalhados em todas anistia" no plano interno, e da as regiões do país e realizam espionagem "hegemonia dos Estados Unidos", no política, econômica, empresarial e campo internacional, principalmente social. O Exército chega mesmo a após a derrocada do Leste Europeu. Para classificar os jornais segundo a sua isso, como revela os documentos obtidos "posição partidária", "dependência do pela Folha de S. Paulo, a Escola de poder econômico" e "grau de influência Inteligência deveria “reeducar velhos exercido pelo governo". arapongas” e formar espiões para os No entanto, são os movimentos sociais novos tempos, com o objetivo de quem são mais enfaticamente defender o “bem público, a salvação monitorados. Aliás, a criação do pública e a ordem pública”. Mesmo que Subsistema de Inteligência de Segurança para atingir esses objetivos, tivessem que Pública (Decreto No. 3.448/00, de 08 de “arranhar direitos dos cidadãos, numa maio de 2000) que me referi acima foi espécie de arbítrio necessário”. realizado exatamente após o Governo No ano de 1997, o governo FHC deu um Federal admitir que estava mal novo passo, encaminhando projeto de lei informado sobre o MST e sobre o ao Congresso Nacional, propondo a movimento dos caminhoneiros. Para criação da Agência Brasileira de quem não se lembra, no início do mês de Informações (ABIN). O Congresso maio do ano 2000, militantes do Nacional votou a matéria apenas no ano Movimento dos Trabalhadores Sem de 1999 e no dia 07 de dezembro, o Terra (MST) ocuparam e acamparam em Presidente Fernando Henrique Cardoso 14 prédios públicos por todo o país; e os sancionou a Lei No. 9.883/99, caminhoneiros fizeram uma conturbada instituindo a ABIN e o Sistema greve, ameaçando o abastecimento em Brasileiro de Informações (SISBIN). E todo o território nacional. Na época o mais recentemente, no dia 8 de maio de governo FHC avaliava que se existisse 2000, o Governo Federal publicou o um “sistema de coletas de informações Decreto No. 3.448/00, criando um em todo o país” tanto a greve dos Subsistema de Inteligência de Segurança caminhoneiros como as ocupações do MST poderiam ser evitadas (FSP, 09 brasileiros que defendem causas – que maio 2000). lhes parecem justas – com instrumentos Para se ter uma idéia de como esse que a opinião pública não reconhece sistema de espionagem trata os como legítimos”. E não deixa de retomar movimentos sociais, amparo-me nos o velho e usual chavão de que as exemplos divulgados pelo Exército organizações sociais e manifestações através do General de Divisão Luiz públicas são vítimas dos agitadores Cesário da Silveira Filho, Chefe do infiltrados que agem para manobrar a Centro de Comunicação Social do massa para os seus interesses políticos. Exército, no 07 de agosto de 2001, e “Normalmente, os anseios dessa parcela publicado na Folha de S. Paulo no dia da população são explorados por seguinte. Diz o general: lideranças que têm interesses e objetivos divergentes da massa manobrada, “O Exército, didaticamente, instigando-a à violência e à quebra das denomina da seguinte maneira os normas de convivência pacífica”. objetivos da busca de informações: a) "inimigo: mentor de uma ameaça O maior exemplo disso, o Exército busca externa; b) "forças adversas": os no Movimento dos Trabalhadores Sem segmentos radicais infiltrados em Terra (MST), para qualificá-lo como grupos, movimentos sociais, “força adversa” símbolo. Diz o general, entidades e organizações não- enfaticamente: governamentais, de cunho ideológico ou não - atuando no país “Em verdade, a adjetivação aplica- ou no exterior - com potencial para se àqueles que, abrigados pelo realizar ações ilegais que venham a movimento, atuam, de forma comprometer a ordem pública e, até flagrante, à margem da lei e da mesmo, a ordem interna do país”. ordem, defendendo uma estratégia revolucionária por descrer na via O general enfatiza ainda que é de suma pacífica eleitoral, invadindo e importância compreender a diferença causando danos a prédios públicos e entre os termos "força adversa" e propriedades privadas; obstruindo "inimigo", pois assim se pode rodovias e pontes; agindo com estabelecer procedimentos, técnicas e violência física contra pessoas; equipamentos utilizados pelo Exército. incitando à desobediência civil e, Segundo ele, o objetivo em relação ao portanto, colocando em risco a lei e “inimigo” é neutralizá-lo, ao passo que a ordem pública”. em relação às “forças adversas” a Daí que, para combater esses sujeitos conduta tem que ser outra. “indesejados” a conduta tem que ser No entendimento do Exército e da outra, mesmo que essa conduta arranhe Agência Brasileira de Informações os direitos constitucionais dos cidadãos, (ABIN), as “forças adversas” são ao passo de incentivar a sua constituídas, na maioria das vezes, “por “eliminação”. E a democracia e a liberdade ainda respiram sufocadas!
* ANGELO PRIORI é Doutor em História e presidente da Associação dos Docentes da UEM (Aduem)