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DOSSIER

AVALIAÇÃO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

2014/2015
Avaliação em Psicologia Clínica

Índice:
MÉTODOS OBJECTIVOS ................................................................................................................. 3
Provas de desenvolvimento...................................................................................................... 4
Provas de inteligência ............................................................................................................. 16
Provas instrumentais .............................................................................................................. 79
Escalas sintomáticas ............................................................................................................. 127
Escalas nosográficas ............................................................................................................. 136
MÉTODOS PROJECTIVOS ........................................................................................................... 166
Rorschach.............................................................................................................................. 167
TAT ........................................................................................................................................ 232
CAT ........................................................................................................................................ 260
O Jogo Lúdico ........................................................................................................................ 278
O desenho ............................................................................................................................. 283
FUNCIONAMENTOS DA PERSONALIDADE ................................................................................. 406
Classificação das defesas ...................................................................................................... 407
Dimensões do funcionamento da personalidade – avaliação estrutural ............................. 408
Diagnóstico estrutural: três níveis da organização da personalidade .................................. 409
Fases pré-genitais ................................................................................................................. 410
Fases genitais ........................................................................................................................ 424
Estrutura Neurótica .............................................................................................................. 439
Estrutura Psicótica ................................................................................................................ 456
Estados-limite e os seus arranjos ......................................................................................... 477
Doentes Psicossomáticos...................................................................................................... 485

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MÉTODOS OBJECTIVOS

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PROVAS DE DESENVOLVIMENTO

1. ESCALA DE DESENVOLVIMENTO MENTAL DE GRIFFITHS

Esta escala do desenvolvimento permite avaliar a inteligência e a linguagem da criança.


Aplica-se a crianças dos 0-2 anos e dos 2-8 anos. Normalmente é utilizada por recomendação
pediátrica. Cada sub-escala da Prova avalia uma área do desenvolvimento e é aplicada no
sentido contrário à idade da criança.

Medem as sequências do desenvolvimento significativas da evolução cognitiva,


indicadoras do crescimento mental, em crianças em situação de risco.
São utilizadas como instrumento de avaliação em várias problemáticas:
 Atraso global do desenvolvimento
 Privação do meio envolvente
 Problemas específicos como:
o Atrasos na fala
o Perturbações psicomotoras
o Fraca coordenação visuo-motora
o Síndrome de Down

Cada sub-escala é composta por itens diversificados e abarcam a maior parte dos
aspetos do desenvolvimento infantil. Os itens estão ordenados por grau crescente de
dificuldade.
Administração da Escala – Recomendações Sumárias
 Faça uso do interesse, da curiosidade e do foco de atenção da criança
 Qualquer item pode ser passado duas vezes
 Os itens podem ser apresentados por qualquer ordem, mas não se esqueça de verificar
se todas as escalas foram completadas. (Preferencialmente só se deve passar a outra
escala quando a anterior estiver completa)
 Inicie a aplicação de cada escala pelos itens correspondentes a 6 itens antes da idade
cronológica da criança
 Termine a aplicação após o insucesso de 6 itens consecutivos em cada escala
 Consulte o Manual para saber muito bem as instruções de aplicação e de cotação dos
itens

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 Permite, através da cotação dos resultados, obter o Quociente Geral de


Desenvolvimento da Criança (QD)
 Obter um perfil que expressa as áreas desenvolvimento mais valorizadas e as mais
desvalorizadas em relação ao seu QD
 Comparar os resultados da criança com a média das crianças da sua faixa etária
 Verificar se um resultado baixo numa área corresponde a um défice isolado ou a um
atraso global do desenvolvimento
 Avaliar a repercussão do défice sobre os diferentes parâmetros do desenvolvimento
 Interpretar as divergências de resultados nas diferentes áreas
 Comparar o desenvolvimento de uma criança, em avaliações sucessivas, para obter
informação sobre o seu ritmo de desenvolvimento (nunca num período inferior a 6
meses)
 Para além da interpretação dos QD geral e parcelares, é fundamental uma análise
qualitativa dos comportamentos da criança em relação a:
o Capacidade de atenção
o Empenho na tarefa proposta
o Adesão ao outro
o Tipo de abordagem às tarefas
o Estratégias utilizadas
 Podem ser detetados:
o Défices de atenção
o Dispraxias visuais
o Défices fonológicos… etc.

A Escala é composta pelas sub-escalas:

A. Locomotora: Avalia o desenvolvimento motor, incluindo o equilíbrio, a coordenação


motora e o controlo dos movimentos. Os itens administrados incluem atividades
adequadas a cada faixa etária, como subir escadas, chutar uma bola, saltar, andar de
bicicleta e saltar à corda.
B. Pessoal/Social: Avalia o desenvolvimento da socialização, as competências ao nível da
autonomia da criança em atividades quotidianas, assim como o seu nível de independência
e a capacidade de interagir com os pares. Os itens administrados incluem atividades
ajustadas a cada faixa etária tais como vestir e despir, destreza com os talheres e
conhecimentos sobre a sua data de aniversário e morada.

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C. Audição e Linguagem: Avalia o desenvolvimento linguístico, a linguagem recetiva


(compreensão) e expressiva. Os itens administrados incluem atividades ajustadas a cada
faixa etária, como nomear objetos e cores, repetir frases, descrever uma imagem e
responder a um conjunto de questões sobre compreensão, semelhanças e diferenças.
D. Coordenação óculo-manual: Avalia o desenvolvimento da motricidade fina da criança, a
destreza manual e as competências visuo-motoras. Os itens administrados incluem
atividades ajustadas a cada faixa etária, como enfiar contas, cortar com a tesoura, copiar
figuras geométricas e copiar letras e números.
E. Realização: Avalia o desenvolvimento de atuar em situações práticas, as competências
visuo-espaciais incluindo a rapidez de execução e precisão. Os itens administrados incluem
atividades ajustadas a cada faixa etária, como a construção de pontes e escadas, encaixes
de figuras geométricas e construção de padrões com cubos.
F. Raciocínio Prático: Avalia o desenvolvimento das competências numéricas, a capacidade
da criança resolver problemas práticos, ordenar sequencias, compreensão de conceitos
matemáticos básicos e questões morais. Os itens administrados incluem atividades
ajustadas a cada faixa etária, como contar e comparar tamanhos, comprimentos e pesos.
Esta subescala também avalia os conhecimentos que a criança tem a cerca dos dias de
semana, as competências ao nível das sequências visuo-espaciais e a compreensão do que
é certo e errado (a partir dos dois anos).

Cada Subescala é composta por itens diversificados e abarcam a maior parte dos aspetos do
desenvolvimento infantil.
Cada subescala engloba 24 itens (6 itens por cada ano).
Os itens estão ordenados por grau crescente de dificuldade

1. Utilização
 Problemas relacionado com atraso global de desenvolvimento;
 Privação do meio ambiente;
 Outros problemas específicos de desenvolvimento, como, atrasos na fala, perturbações
psicomotoras, fraca coordenação visuo-motora e Síndrome de Down.

2. Cálculos essenciais
Cada ano engloba 6 itens em cada uma das 6 subescalas, e cada item vale 1 ponto.
Calcular a Idade Mental:

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 Soma-se os pontos obtidos em cada subescala

 Até aos 2 anos: divide-se o resultado de cada subescala por 2

 A partir dos 3 anos: multiplica-se o resultado de cada subescala por 2.

Calcular o Quociente de Desenvolvimento Parcial:

 Divide-se a I.M. correspondente a cada subescala pela idade real da criança em meses
(I.C. – idade cronológica), e multiplica-se por 100.
𝐼𝑀
𝑄𝐷𝑃 = × 100
𝐼𝑅

Calcular o Q.D. Geral:

 Soma-se as “idades mentais parciais” e divide-se pelo número de subescalas.

As contas para cada parâmetro são feitas em relação aos meses correspondentes. Por
exemplo: ter uma pontuação de 12 no primeiro ano da escala A, significa que a criança está ao
nível dos 12 meses relativamente a crianças no primeiro ano de vida; uma pontuação de 2 no
ano III da escala B significa que a criança se encontra ao nível dos dois meses dos 3 anos de
vida, ou seja, de crianças com 3 anos e 2 meses.

O Quociente de Desenvolvimento Geral (QDG) é dado pela média dos diferentes parâmetros.

Valor de Normativo
O valor do QDG encontra-se na média dos parâmetros normativos se se encontrar no
intervalo 100±10.

 É desejável que a Idade Mental não seja inferior à Idade Cronológica.


 Devem-se relacionar os quocientes parciais de desenvolvimento entre si.
 É também útil observar os itens a cuja resposta a criança teve sucesso, ou falhou, para se
compreender em que áreas e aspetos residem as suas capacidades e dificuldades.
 É necessário ter em conta que os resultados finais que se obtiverem com a análise dos
resultados da criança à Escala, devem ser relacionados com as circunstâncias e motivos
que levaram à realização desta prova como esclarecimento para as hipóteses diagnósticas
colocadas.

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→PERFIS DE DESENVOLVIMENTO←
 A avaliação das crianças pode fazer-se, unicamente, com base nos resultados das
subescalas (ou resultados parciais das subescalas).
 O resultado mais significativo é o Quociente Geral (QG).
 Porém, se houver um reteste e se tiverem que se fazer comparações (por exemplo, entre
os resultados obtidos por uma criança antes e depois de um tratamento), já será útil
traçar-se um “Perfil”, onde se trabalharão comparativamente os Quocientes de
Desenvolvimento obtidos em cada subescala (como tal, terão que se calcular também os
resultados parciais dos Quocientes de Desenvolvimento).
 Estes perfis são muito importantes, especialmente, para bebés muito novos, onde é, tanto
mais, relevante compreender em que aspetos do desenvolvimento se vão registando os
progressos.
 Calculam-se portanto os resultados parciais.

3. Interpretação
 Interpretação dos resultados padronizados ou notas z
O examinador deve utilizar os resultados padronizados para interpretar o desempenho
da criança nas diferentes subescalas, de acordo com as descrições qualitativas das categorias e
o contexto social da criança.
 Por exemplo um valor de z ou de 0 diz-nos que o desempenho da criança na Subescala
em questão está na média, enquanto um valor z inferior a -2 indica um atraso
significativo de desenvolvimento ou dificuldades de aprendizagem.
 A existência de resultados baixos em todas as subescalas indica um atraso global de
desenvolvimento ou dificuldades de aprendizagem significativas.
 Do mesmo modo, consideram-se pertinentes as discrepâncias que se afastam mais de 2
desvios-padrão relativamente ao perfil 50, numa subescala ou na comparação entre
subescalas ou entre várias avaliações, realizadas em diferentes ocasiões. Estas
informações dão indicações valiosas acerca das forças e dificuldades da criança e do
seu ritmo de progresso.

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 Interpretação dos resultados do perfil de desenvolvimento


Os resultados de perfil de desenvolvimento obtidos, quer com versão original, quer
com esta revisão da Escala dos 2 aos 8 anos fornece informação útil que pode ser utilizada
para:
 Compreender o nível de desenvolvimento da criança, no momento da avaliação e
identificar áreas fortes e fracas;
 Examinar com os pais/cuidadores a necessidade de posteriores avaliações ou
encaminhamento para as intervenções terapêuticas necessárias;
 Desenvolver programa de intervenção precoce ou programa educativos;
 Avaliar os efeitos desses programas, no caso de a criança fazer uma reavaliação no
final dos mesmos;
 Examinar com os pais/cuidadores os encaminhamentos ou opções educativas.
A Escala dos 2 aos 8 anos é um instrumento de avaliação do desenvolvimento e, por si só, não
é um teste de diagnóstico.
Ainda assim, depois de algum tempo, os examinadores experientes acabam por
aprender a reconhecer que determinados perfis de desenvolvimento são característicos de
dificuldades específicas de desenvolvimento.
 As crianças com perturbação/atraso da linguagem ou défice auditivo, geralmente,
têm resultados baixos na subescala da linguagem, na subescala de raciocínio e
também na subescala pessoal-social, que são dependentes da linguagem.
 As crianças com atraso nas competências ao nível da motricidade fina têm tendência
a ter resultados substancialmente mais baixos na subescala Coordenação olho-mão e
na de realização.
 As crianças com deficiência física, incluindo situações como paralisia cerebral
moderada e crianças com hipotonia, apresentam dificuldades em ambas as áreas
motoras, global e fina, pelo que têm resultados mais baixos na subescala de
locomoção e na de coordenação olho-mão. Se tiverem problemas visuo-percetivos a
subescala de realização poderá estar particularmente afetada.
 As crianças com autismo tendem a ter dificuldades com itens de subescalas de
linguagem e também na de pessoal-social, que abordam as competências de
relacionamento social. Estas crianças têm melhores resultados nas subescalas de
coordenação olho-mão e de realização.
 Crianças com síndrome de Asperger também têm resultados baixos nas competências
interpessoais, mas podem ter resultados relativamente mais elevados na subescala de

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linguagem; podem ter resultados baixos nas subescalas de realização e de


coordenação olho-mão se tiverem dispraxia.
´

 Interpretação dos resultados de avaliação utilizando modelos de constructos


 Quando se analisam os resultados da Escala dos 2 aos 8 anos, o examinador deve ter
em conta os itens cotados como sucesso, incluindo os itens mais avançados para a
idade da criança, para determinar se há áreas que se destacam, utilizando modelos de
constructos para cada subescala, apresentado de seguida.
 Se a criança tem sistematicamente sucesso em itens que representam um constructo
específico, essa área do desenvolvimento é considerada como uma força.
 Do mesmo modo, quando tem insucesso num conjunto de itens, o examinador pode
procurar um padrão de dificuldades dentro de cada subescala, utilizando este mesmo
modelo.

→ESCALA DOS 0 AOS 2 ANOS (Vd. exemplos vários colocados no outro documento sobre a
Escala de Griffiths publicado no ‘Sítio da Disciplina’)

Nesta idade a Escala inclui as sub-escalas A, B, C, D e E.

Tal como anteriormente se disse, se não forem mencionados quaisquer valores em


relação às Idades Mentais relativamente às idades inferiores àquelas que são referidas atribui-
se a cada uma o valor de 52 (a cada sub-escala em cada ano, que é o número de semanas de
cada ano, portanto o valor máximo que se pode obter em cada sub-escala desta faixa etária).

1. Avaliação de bebés com menos de 1 ano de idade


1) Resultados Totais

Idade Cronológica

Regra para bebés menores de 8 meses: Existe uma regra para acerto da Idade Cronológica (e
da Idade Mental) no caso de a criança ter menos do que 8 meses de idade. Se o bebé tiver
menos de 8 meses de idade: Somam-se 8 semanas à Idade Cronológica e à Idade Mental
antes de se obterem os Quocientes de Desenvolvimento.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Com bebés com menos de 1 ano de idade: conta-se o número completo de semanas desde a
data de nascimento até à data do teste. O número de dias que exceder o número de semanas
apurado conta-se da seguinte forma:

1 dia extra Ignorar

2 ou 3 dias extra Contar como 1/3 da semana

2 ou 5 dias extra Contar como 2/3 da semana

6 dias extra Contar como mais uma semana completa

Idade Mental = Total de Pontos


3
QGD = IM x 100
IC
2) Resultados Parciais

IMA, ..., E = Total de pontos de A, ..., E x 5


3

No caso de bebés com menos de 8 meses:

QGDA, ..., E = IMA, ..., E + 8 x 100


ICA, ..., E + 8

No caso de bebés com mais de 8 meses:

QGDA, ..., E = IMA, ..., E x 100


ICA, ..., E

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2. Avaliação de bebés na transição entre o 1º e o 2º anos


1) Resultados Totais

Idade Cronológica

Com bebés com mais de 1 ano de idade: Conta-se o número completo de semanas desde a
data de nascimento até à data do teste. O número de dias que exceder o número de semanas
apurado conta-se da seguinte forma:

1 dia extra Ignorar

2, 3, 4 ou 5 dias extra Contar como 1/2 semana

6 dias extra Contar como 1 semana completa

A única diferença consiste agora no cálculo das Idades Mentais.

IM 1º ano = Total de pontos do 1º ano


3
IM 2º ano = Total de pontos do 2º ano
2
IM = IM do 1º ano + IM do 2º ano

QGD = IM x 100
IC

2) Resultados Parciais

IMA, ..., E = Total de pontos de A, ..., E x 5 + 52


2
QGDA, ..., E = IMA, ..., E x 100
ICA, ..., E

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Avaliação em Psicologia Clínica

3. Avaliação de bebés com mais de 2 anos de idade

Idade Cronológica - Calcula-se da mesma forma que no caso anterior.

1) Resultados Totais

IM 2º ano = Total de pontos do 2º ano


2
IM = 52 + IM do 2º ano

QGD = IM x 100
IC

2) Resultados Parciais

Cálculos da Idade Mental e do Quociente de Desenvolvimento semelhantes aos anteriores.

→ESCALA DOS 2 AOS 8 ANOS (Vd. exemplo do ‘Caso Diogo’ publicado na ‘Arealunos’)

Nesta idade a Escala inclui as sub-escalas A, B, C, D e E, e ainda a sub-escala F.

Tal como anteriormente se disse, se não forem mencionados quaisquer valores em


relação às Idades Mentais relativamente às idades inferiores aquelas que são referidas atribui-
se a cada uma o valor de 12 (a cada sub-escala em cada ano, que é o número de meses de
cada ano, portanto o valor máximo que se pode obter em cada sub-escala desta faixa etária).

Idade Cronológica

Calcula-se em anos e meses e expressa-se em meses.

1) Resultados Totais

IMA, ..., X = IMA, ..., X (A variável ‘x’ é a escala – E ou F - que foi passada
x à criança)

QGD = IM x 100
IC

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Avaliação em Psicologia Clínica

2) Resultados Parciais

IMA, ..., E = IMA, ..., E do 1º ano + 2º ano + ....... (A variável ‘x’ é a escala – E ou F - que foi passada
à criança)

QDA, ..., E = IMA, ..., E x 100


ICA, ..., E
Perfil do Desenvolvimento

A assíntota vertical é o eixo das ordenadas, onde se colocam os valores dos QDs parciais.

A assíntota horizontal é o eixo das abcissas, onde se assinalam as sub-escalas (A, B, C, D, E, F).

Para se obter o perfil do desenvolvimento da criança assinalam-se os valores dos QDs


parciais em cada uma das sub-escalas e unem-se os traçados.

Análise da Escala: Os valores de referência para se apreciarem os Quocientes de


Desenvolvimento são os seguintes:

Valores dos QD Nível de desenvolvimento

> 125 Superior

[100 - 125] Médio alto

= 100 Médio

[75 - 100] Médio baixo

É desejável que a Idade Mental não seja inferior à Idade Cronológica.

Devem-se relacionar os quocientes parciais de desenvolvimento entre si.

É também útil observar os itens em cuja resposta a criança teve sucesso ou falhou, para se compreender
em que áreas e aspetos residem as suas capacidades e dificuldades.

É necessário ter em conta que os resultados finais que se obtiverem com a análise dos resultados da
criança à Escala, devem ser relacionados com as circunstâncias e motivos que levaram à realização desta
prova como esclarecimento para as hipóteses diagnósticas colocadas.

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Avaliação em Psicologia Clínica

→Exame←
Dar a Análise Quantitativa
 Calcular a Idade Mental;
 Calcular o Quociente de Desenvolvimento Parcial;
 Calcular o Q.D. Geral;

Dar Análise Qualitativa – descrição de perfil de desenvolvimento


1. Avaliar se o QG se encontra dentro da média ou não.
2. Mencionar quais são as subescalas que estão fora de média e relacioná-las de acordo
com o que cada uma aborda.
 Subescalas que estão muito desenvolvidas
 Subescalas que estão muito atrasadas
3. Calcular em que meses se encontra a sua Idade Mental, nas diferentes subescalas que
estão ou demasiado atrasadas ou demasiadas avançadas (Idade mental x 100 a dividir
pela idade cronológica.
4. Avaliar que tipo de desenvolvimento está presente (Homogéneo ou Heterogéneo).
5. Enquadrar a idade com os estágios Freudianos ou piagetianos.
6. Fazer comparação com elementos da entrevista Clínica e supostas conclusões de acordo
com o quadro clínico psicanalítico.
Análise dos Itens:
 Os itens são analisados quanto ao grau de dificuldade e à capacidade discriminativa. Para
a maior parte destes, deveria haver uma amplitude, desde o mês em que nenhuma
criança conseguia realizar o item, passando pela idade em que uma percentagem
crescente de crianças realizava o item até uma idade em que todas realizavam com
sucesso.
 Deste modo, a amplitude varia entre os diferentes itens, sendo que no extremo inferior
estão itens relativos ao desenvolvimento precoce e no extremo superior itens que
apenas algumas das crianças mais velhas seriam capazes de resolver com sucesso.
Distinguir crianças com resultados altos, médios e baixos.
 Índice de discriminação é obtido pela correlação entre o resultado de cada item (1
corresponde a sucesso e 0 a insucesso) com os resultados da subescala a que pertence o
item e o resultado da Escala Geral. Grande maioria dos itens tem-se correlação mínima
de 0.50, sendo que os valores mais baixos estarão nos extremos superior e inferior da
Escala.
 Maior coeficiente de correlação Maior discriminação do item.

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PROVAS DE INTELIGÊNCIA

1. MATRIZES PROGRESSIVAS DE RAVEN

Permitem aceder á inteligência geral lógico-dedutiva. Trata-se de completar a


sequência.

Existe uma escala de 5 graus no que diz respeito à capacidade intelectual de cada
sujeito:

Grau I “Intelectualmente superior” (percentil igual ou superior a 95).

Grau II Capacidade intelectual acima do esperado (percentil entre o intervalo 75-94.

Grau II+ quando o percentil está no intervalo 90-94.

Grau III Capacidade intelectual dentro da média (quando o percentil se encontra no


intervalo 26-74.

Grau III+ quando está acima do percentil 50 e Grau III- quando se encontra
abaixo do mesmo.

Grau IV Capacidade intelectual claramente abaixo do esperado (quando o percentil


se encontra no intervalo 6-25).

Grau IV- quando se encontra abaixo do percentil 10.

Grau V Déficit intelectual (quando o percentil é igual ou inferior a 5).

Tipos de Matrizes:

1. SPM (Standard Progressive Matrices) – 6 aos 65 anos (adultos com pouca escolaridade).
Matrizes standard – adultos (5 séries).

Normas de Correção e Pontuação:

 Quando existe mais do que uma resposta assinalada anula-se.


 Para cada resposta correta atribui-se 1 ponto.
 Total – soma das pontuações obtidas (A+B+C+D+E).
 Tempo livre – diferença entre a hora que termina e a hora de começo da prova.

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Discrepância – diferença entre o valor empírico obtido e o valor esperado em cada


conjunto.
 PD – valor empírico total da pontuação direta – varia de 10 a 60 pontos.

Tabela da Pontuação Total (PD) e os Resultados Esperados:

Tabela Exemplo de como se aplica na realidade a prova:

Quando a discrepância é superior a 2 pontos, não se aceita a pontuação total como uma
estimação consistente do funcionamento da capacidade intelectual do sujeito.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Tabela de Conversão da Pontuação Directa em Percentil:

2. CPM (Coloures Progressive Matrices) – 5 aos 11 anos – crianças (3 séries).

Normas de Correção e Pontuação:

 Em cada uma das colunas (conjunto de 12 elementos) somam-se as respostas dadas


pelo sujeito que apareçam dentro dos círculos existentes nessa coluna.
 Atribui-se 1 ponto por cada resposta correta.
 Total - soma das pontuações obtidas em todas as colunas (A+ Ab + B).
 Discrepância dos conjuntos das colunas A, Ab e B – diferença entre o valor empírico
obtido e o valor esperado em cada conjunto (de acordo com a pontuação total
empírica obtida).
 PD – valor empírico total da pontuação direta – varia entre 10 a 31 pontos.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Tabela Exemplo de como se aplica na realidade a prova:

Quando a discrepância é superior a 2 pontos, não se aceita a pontuação total como uma
estimação consistente do funcionamento da capacidade intelectual do sujeito.

Tabela de Conversão da Pontuação Directa em Percentil:

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3. APM (Advanced Progressive Matrices) – adultos com mais escolaridade - 2 séries. A


segunda avalia a capacidade de exatidão e clareza de raciocínio lógico com poder de
discriminação em níveis mais altos de inteligência.

Normas de Correção e Pontuação:

 A escala é composta por um conjunto: o “Set”, o I e II. Em cada um somam-se as


respostas dadas pelo sujeito que apareçam dentro dos círculos existentes nesse
conjunto.
 Concede-se 1 ponto por cada resposta correta.
 A soma dos pontos obtidos no conjunto II é a pontuação direta que pode ser
interpretada com as escalas e o uso destes mostrando na secção seguinte.

Em função dos resultados a cada sujeito é atribuído um percentil correspondente ao seu


nível de inteligência geral, lógico-dedutível.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Tabela de Conversão da Pontuação Directa em Percentil:

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Avaliação em Psicologia Clínica

→Exame←

Análise Quantitativa
1. Enquadrar o percentil no grau adequado para determinar o nível intelectual em que o
sujeito se encontra.
2. Calcular possíveis discrepâncias entre os resultados obtidos (ver na tabela)
Análise Qualitativa
1. Interpretar o grau em que se encontra o sujeito
2. Relacionar o valor do percentil com o valor do QI.
3. Relacionar o grau com a entrevista Clínica e os outros possíveis testes.
4. Se houver discrepâncias superiores a 2 pontos entre as séries consta-se que há existência de
deterioração mental.

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Avaliação em Psicologia Clínica

2. ESCALA DE INTELIGÊNCIA DE WESCHSLER

Implicações clínicas das escalas e dos subtestes de Wescheler:

Escala Verbal Escala de Realização


Envolve: Envolve:
 Capacidade para lidar com símbolos  Grau e qualidade do contacto não-
abstractos verbal com o meio envolvente
 Qualidade da educação formal e da  Capacidade de integrar estímulos
estimulação do ambiente – influência de perceptivos e respostas motoras
variáveis socioculturais adequadas
 Compreensão, memória e influência verbal  Capacidade de trabalho em situações
concretas
 Rapidez de execução
 Capacidade de avaliar informações
visuo-espaciais
Subtestes verbais Subtestes de realização
1. Informação 1. Completamento de Gravuras (Lacunas)
Mede o fundo de conhecimento que o sujeito Avalia:
mantém armazenado e a capacidade para o aplicar  Capacidade de discriminação do
(Inteligência cristalizada). Excelente medida da essencial e o não essencial
capacidade geral. Informação e Vocabulário são bons  Memória visual
preditores do desempenho escolar.  Capacidade de concentração e
Quando os resultados não se explicam por razões percepção das relações todo/parte
socioculturais, dá indícios de como o sujeito lida com  Interesse e atenção ao meio
o meio envolvente contacto com a realidade envolvente
indícios de desorganização do pensamento Resultados elevados remetem para:
(respostas bizarras; auto-referências).  Boa acuidade visual
Resultados elevados podem indiciar:  Interesse pelo mundo circundante
 Boa memória remota  Boa percepção das relações
 Interesses culturais todo/parte
 Ambição intelectual ou intelectualização  Capacidade de diferenciação entre o
como defesa de carácter obsessivo essencial e o não essencial
(respostas minuciosas)  Bom contacto com a realidade
 Interesse pelo meio envolvente
 Atitude de alerta ou vigilância traços Resultados baixos podem associar-se à
paranóides ausência ou diminuição das capacidades acima
referenciadas ou à presença de:
 Depressão
 Ansiedade
Resultados baixos podem indiciar:  Impulsividade
 Não aproveitamento escolar
 Falta de estimulação do meio envolvente
 “O conhecimento é uma coisa
perigosa”temas ligados a conflitos que
causem angústia
 Tendência para o agir

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Avaliação em Psicologia Clínica

2. Vocabulário 2. Disposição de Figuras (Sequências)


É uma boa medida da inteligência verbal pela alta Permite avaliar:
correlação com a soma das notas da escala verbal. É  A capacidade para organizar e
uma medida bastante estável boa referência para integrar lógica e sequencialmente
estimativa da inteligência pré-mórbida. É estímulos complexos
influenciado pelas experiências precoces de  Compreensão do significado de
socialização.meio envolvente precoce. O tipo de situações interpessoais
resposta reflecte um nível de generalização  Capacidade de determinar
conceptual que pode ser mais primitivo (nível prioridades com antecipação das suas
funcional ou instrumental) ou mais maduro (nível consequências ao nível das relações
mais abstracto). sócio-culturais
Pode dar indícios sobre :  A capacidade de processamento
 Antecedentes, experiências de vida, visual
 Tolerância à frustração, Resultados elevados indicam:
 Nível e organização do  Bom nível de inteligência social
pensamentoverbalizações desviantes que  Capacidade de antecipação das
denunciam perturbações do processo do consequências de actos
pensamento (bizarrias, auto-referências,  Boa organização visual
confabulações)
 Problemas de percepção auditiva
 Falta de atenção e/ou de motivação Resultados muito elevados (3 pontos acima
Resultados altos: da média), podem indiciar, em adolescentes,
 Reflectem boa inteligência geral tendência para passagem ao acto, à
 boas condições socioculturais manipulação de pessoas com sentido anti-
 podem ser associados a mecanismos de social
intelectualização e compulsivos
Resultados baixos: Resultados baixos podem dar conta de:
 fundo de informação pobre  Pobreza de ideias
 inteligência geral limitada  Dificuldade em planear acções
 falta de motivação  Processamento da informação lento
 hipoactividade  Dificuldades nas relações interpessoais
 dificuldades de linguagem expressiva

3. Aritmética 3. Cubos
Mede a capacidade de raciocínio lógico, de É uma prova de inteligência fluida que permite
abstracção e rapidez de cálculo. Memória auditiva estabelecer relações entre as coordenadas
imediata. Avalia a capacidade de concentração, espaciais.
resistência à distractibilidade e contacto com a Avalia:
realidade. É influenciada pelos antecedentes,  Capacidade de análise e síntese
oportunidades e experiências escolares do sujeito. É  Capacidade de conceptualização
uma prova vulnerável a estados emocionais. visuo-espacial
Resultados altos indiciam:  Coordenação visuo-motora-espacial
 Boa capacidade computacional associada a  Organização e velocidade perceptiva –
boa concentração e, em consequência o tempo de execução relaciona-se
resistência à distractibilidade. com o nível de conceptualização visuo-
 Bom contacto com o meio envolvente espacial e com a eficiência
 Rapidez no manejo dos números  Estratégia de solução de problemas
 Boa memória auditiva imediata Resultados altos indicam:
Resultados baixos:  Boa capacidade de conceptualização
 Pouca capacidade de raciocínio matemático  Aptidão para a análise e síntese de

24
Avaliação em Psicologia Clínica

 Dificuldades de concentração problemas e flexibilidade na sua


distractibilidade resolução
 Dificuldades de memória auditiva imediata.  Boa coordenação visuo-motora

Resultados baixos :
 Dificuldades na capacidade ao nível
dos símbolos abstractos
 Possibilidade de disfunção neurológica
 Dificuldades na coordenação visuo-
motora

4. Compreensão 4.Composição de objectos (Puzzles)


É uma medida da capacidade de inteligência É uma prova de bom indicador do estilo
cristalizada. cognitivo. Uma boa pontuação indica um estilo
Avalia: independente de campo
 Capacidade de juízo social; conhecimento Avalia:
prático e maturidade social.  Capacidade de síntese de um conjunto
 Capacidade para avaliar a experiência integrado
passada.  Capacidade de formação de conceitos
 Integração das normas parentais e sociais. visuais
 É uma boa medida de compreensão verbal,  Capacidade de antecipação das
de memória e atenção. relações parte/todo
 Avalia a capacidade de pensamento  Processamento visual
abstracto. (provérbios).  Velocidade perceptiva e manipulativa
Compreensão + Sequências boa medida de Resultados altos:
inteligência social  Adequada coordenação motora
Resultados altos:  Boa organização visual
 Capacidade de organização de  Flexibilidade de pensamento
conhecimentos Resultados muito altos podem indiciar um
 Maturidade social nível elevado de ansiedade e tendência à
 Maturidade da função do juízo manipulação do meio envolvente como forma
 Excesso de respostas ou respostas múltiplas de controlo da ansiedade
podem estar associadas a tendências
compulsivas
Resultados baixos: Resultados baixos
 Dificuldades em lidar com o meio envolvente  Falta de capacidade de planeamento
superprotecçãodificuldades na  Dificuldades perceptivas e/ou visuo-
autonomia motoras
 Pensamento concreto  Pensamento concreto e dificuldades
 Dificuldades na expressão verbal (falta de na formação de conceitos visuais
experiência ou por perfeccionismo)  Dificuldades emocionais ligada ao
 Presença de ideias fóbicas associadas a corpo próprio
temas dos itens,  Angústia de perda da própria
 Atitude de oposição integridade
 Dificuldade de controlo dos impulsos

25
Avaliação em Psicologia Clínica

5. Semelhanças 5. Código
Medida de inteligência cristalizada. Tem elevada Avalia:
correlação com inteligência geral. Sensível a  Velocidade de processamento
disfunções cerebrais.  Capacidade de seguir instruções sob
Avalia: pressão de tempo
 Capacidade de raciocínio lógico  Atenção selectiva
 Capacidade de conceptualização verbal 3  Concentração (resistência à
níveis: pensamento concreto, funcional ou distractibilidade)
abstracto  Flexibilidade mental
 Capacidade de identificar aspectos Resultados elevados resultam da combinação
essenciais e não-essenciais de:
Resultados elevados:  Elevada motivação
 Bom nível de abstracção e boas capacidades  Destreza para a memorização de
de insight símbolos
 Descartam a hipótese de limitação intelectual  Rapidez perceptivo-motora
 Podem indiciar traços obsessivos Resultados baixos
 Tendência à intelectualização  Dificuldades de coordenação visuo-
Resultados baixos: motora
 Remetem para rigidez e/ou distorção nos  Ansiedade
processos de pensamento  Dificuldades de atenção
 Emergência do processo primário do  Insucesso por lentificação pode
pensamento (perturbação borderline ou remeter para depressão
esquizofrenia)  Impulsividade

6. Memória de Dígitos 6. Labirintos


Avalia: Dão informação sobre a capacidade para
 Capacidade de atenção interpretar e organizar materiais percebidos e
 Memória imediata (ordem directa) a sua velocidade na execução da tarefa. Avalia
 Memória e capacidade de reversibilidade a precisão da execução, o controlo da
(ordem inversa) impulsividade e a capacidade de atenção.
 Capacidade de concentração Resultados altos revelam:
 Tolerância ao stress  Capacidade de planificação
correlacionada com capacidade para
retardar a impulsividade
 Adequada capacidade de coordenação
visuo-motora
Resultados baixos denunciam impulsividade e
pobre coordenação visuo-motora

26
Avaliação em Psicologia Clínica

→ WPPSI – 4 a 6 anos
A WPPSI-R é uma medida do funcionamento cognitivo de crianças com idades entre os
3 anos e os 6 anos e 6 meses (versão portuguesa).
A WPPSI-R compreende duas subescalas: verbal e de realização. Cada uma delas
permite calcular notas standard com uma média de 100 e um desvio-padrão de 15 pontos.
Na subescala de realização são sobretudo respostas motoras que são pedidas
(apontar, colocar, desenhar) e na subescala verbal são respostas verbais.
As duas subescalas tem cada uma 5 subtestes, mais um opcional. Cada um dos subtestes
permite calcular notas standard com média de 10 pontos e desvio padrão de 3.
Os subtestes verbais sãoInformação, Compreensão, Aritmética, Vocabulário, Semelhanças e
Frases memorizadas (opcional).
Os subtestes de realização sãoPuzzles, Cubos, Lacunas, Labirintos, figuras geométricas e
tabuleiro de animais (opcional).

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Avaliação em Psicologia Clínica

WISC-R – 6 aos 16 anos

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Avaliação em Psicologia Clínica

→ WISC-III – 6 aos 16 anos

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Avaliação em Psicologia Clínica

A WISC-III é um instrumento para avaliar as competências cognitivas das crianças e


adolescentes com idades entre os 6 anos e os 16 anos e 11 meses.
A WISC-III compreende duas subescalas: verbal e de realização. Cada uma delas
permite calcular notas standard com uma média de 100 e um desvio-padrão de 15 pontos. As
duas subescalas têm cada uma 5 subtestes obrigatórios, acrescidos de mais um opcional.
Cada um dos subtestes permite calcular notas standard com média de 10 pontos e
desvio padrão de 3. E possível ainda calcular-se três índices fatoriais: Compreensão verbal,
Organização preceptiva e Velocidade de processamento.

1. Competências medidas por cada subescala


→Escala Verbal (Compreensão Verbal) QIV

I - Subtestes essencialmente verbais


1. Informação
A nota de informação tem uma boa correlação com a nota total (0,73). E é a mais saturada
pelo factor G.
 Mede da inteligência cristalizada.
 Mede o nível dos conhecimentos adquiridos a partir da educação na escola e na família.

30
Avaliação em Psicologia Clínica

 Apela à memória episódica de longo prazo.


 Permite verificar a organização temporal.
 Nas crianças que apresentam problemas de linguagem (disfasias), dificuldades de
aprendizagem (déficits seqüenciais) ou desatenção - impulsividade é particularmente
frequente a existência de um déficit na organização temporal.
 Proporciona também uma ideia acerca da curiosidade intelectual dos sujeitos mais
velhos em relação às ciências.
 A criança deve manifestar curiosidade intelectual. Esse interesse pode todavia ser
entravado por problemas emocionais, como a depressão.
 O clínico deve estar atentos pois devido à complexidade da prova uns rejeitam, outros
ficam ansiosos ou deprimidos, outros têm um comportamento errático.
Resultados elevados podem indiciar: a) Boa memória remota; b) Interesses culturais ; c)
Ambição intelectual ou intelectualização como defesa de carácter obsessivo (respostas
minuciosas); d) Interesse pelo meio envolvente; e) Atitude de alerta ou vigilância → traços
paranoides.
Resultados baixos podem indiciar: a) Não aproveitamento escolar; b) Falta de estimulação do
meio envolvente; c) “O conhecimento é uma coisa perigosa” → temas ligados a conflitos que
causem angústia; d) Tendência para o agir.
2. Semelhanças
 Examina a capacidade de estabelecer relações lógicas e a formação de conceitos
verbais ou de categorias.
 Avalia a capacidade de síntese e de integração de conhecimentos.
 É um subteste difícil para as crianças com limitações intelectuais.
Resultados elevados: a) Bom nível de abstração e boas capacidades de insight; b) Descartam a
hipótese de limitação intelectual; c) Podem indiciar traços obsessivos; d) Tendência à
intelectualização.
Resultados baixos: a) Remetem para rigidez e/ou distorção nos processos de pensamento; b)
Emergência do processo primário do pensamento (perturbação borderline ou esquizofrenia).
3. Vocabulário
 Mede a competência linguística, os conhecimentos lexicais e, sobretudo, a facilidade de
elaboração do discurso.
Tal como no subteste Semelhanças, é importante observar a justeza do vocabulário
utilizado e a precisão do pensamento.

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Avaliação em Psicologia Clínica

 O tipo de resposta reflete um nível de generalização conceptual que pode ser mais
primitivo (nível funcional ou instrumental) ou mais maduro (nível mais abstrato).
Resultados altos: a) Refletem boa inteligência geral; b) boas condições socioculturais; c)
podem ser associados a mecanismos de intelectualização e compulsivos.
Resultados baixos: a)fundo de informação pobre; b) inteligência geral limitada; c) falta de
motivação; d) hipoatividade; e) dificuldades de linguagem expressiva; f) Um desempenho
baixo pode traduzir falta de familiarização com o contexto educativo ou ausência de
experiência escolar.
4. Compreensão
 Examina a capacidade do sujeito exprimir as suas experiências.
 Apela ao conhecimento de regras de relacionamento social.
 Permite observar quer a facilidade de argumentação (quando é pedido ao sujeito para
justificar as suas respostas), quer a flexibilidade mental (quando é solicitada uma
segunda resposta ao mesmo item).
Resultados altos: a) Capacidade de organização de conhecimentos; b) Maturidade social; c)
Maturidade da função do juízo; d) Excesso de respostas ou respostas múltiplas podem estar
associadas a tendências compulsivas.
Resultados baixos: a) Dificuldades em lidar com o meio envolvente → superprotecção
→dificuldades na autonomia; b) Pensamento concreto; c) Dificuldades na expressão verbal
(falta de experiência ou por perfeccionismo); d) Presença de ideias fóbicas associadas a temas
dos itens; e) Atitude de oposição; f) Dificuldade de controlo dos impulsos; g) sugere uma certa
forma de inércia frontal (nos sujeitos que experimentam dificuldades neurológicas na
mobilização dos seus recursos cognitivos durante a tentativa de evocação de várias soluções
para um mesmo problema) ou revelar desconhecimento das regras sociais, falta de empatia e
de julgamento (que caracterizam frequentemente os sujeitos que apresentam uma disfunção
não verbal).

2- Subtestes de Atenção e Concentração


5. Aritmética
 Avalia a capacidade de cálculo mental, a compreensão de enunciados verbais de uma
certa complexidade e a capacidade de raciocínio.
 É bastante sensível a um déficit de atenção (e à falta de controlo da impulsividade).

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Requer uma boa capacidade da memória de trabalho (e da memória para sequências


de procedimentos) necessária para manter presente todos os elementos do problema
a resolver.
 O examinador deverá estar atento ao modo de resolução adaptado pela criança,
sobretudo quando a sua resposta está errada.
Resultados altos indiciam: a) Boa capacidade computacional associada a boa concentração e,
em consequência resistência à distratibilidade; b) Bom contacto com o meio envolvente; c)
Rapidez no manejo dos números; d) Boa memória auditiva imediata.
Resultados baixos: a) Pouca capacidade de raciocínio matemático; b) Dificuldades de
concentração → distratibilidade; c) Dificuldades de memória auditiva imediata.
6. Memória de Dígitos
 Dígitos na Ordem Direta mede a memória auditiva sequencial e é bastante sensível à
capacidade de escuta e às flutuações da atenção.
 Quando o sujeito repete todos os números, mas não na ordem em que eles lhe foram
apresentados, trata-se especificamente de capacidade de evocação sequencial em
modalidade auditiva e não de um déficit de natureza mnésica ou atencional.
7. Dígitos no Sentido Inverso
 Mede a capacidade de memória de trabalho. Esta tarefa é geralmente mais difícil que
a precedente. É esperado que o resultado na Ordem Inversa seja um ou dois pontos
inferiores ao obtido na Ordem Direta.
 Um resultado (excecional) igual ou superior na Ordem Inversa parece indicativo do
recurso a excelentes estratégias executivas e da utilização preferencial de um modo de
evocação visual (que substitui uma atenção auditiva enfraquecida).

→Escala de Realização (Organização Percetual) QIE


1- Subtestes de Coordenação Viso-motora
8. Código
 Mede a capacidade de associar números a símbolos e de memorizar corretamente
essas associações, a fim de executar a tarefa o mais rapidamente possível.
 Avalia a capacidade de aprendizagem «mecânica», automatizada.
 Um bom resultado sugere um estilo sequencial preferencial.
 A reprodução dos símbolos requer uma boa caligrafia, muitas vezes ausente nas
crianças impulsivas (os problemas psicomotores finos são frequentemente relacionados
com esta problemática).

33
Avaliação em Psicologia Clínica

Resultados elevados resultam da combinação de: a) Elevada motivação; b) Destreza para a


memorização de símbolos ; c) Rapidez percetivo-motora.
Resultados baixos: a) Dificuldades de coordenação visuo-motora; b) Ansiedade; c) Dificuldades
de atenção; d) Insucesso por lentificação pode remeter para depressão; e) Impulsividade. f)
Um resultado fraco pode depender de uma dificuldade da memória cinestésica da sequência
gestual a executar, ou ser observado em certas crianças dispráxicas.
9. Cubos
 Examina a capacidade de organização e processamento viso-espacial / não-verbal, a
capacidade para decompor mentalmente os elementos constituintes do modelo a
reproduzir.
 É considerada uma medida de resolução de problemas não verbais e usada como
uma das contraprovas de déficits nas funções executivas.
 Permite identificar dificuldades de automonitorização presentes quando a criança é
incapaz de reconhecer erros evidentes, mesmo quando é desafiada a descobrir esses
erros ou a comparar o seu trabalho com o estímulo, após a aplicação formal do
subteste.
 A escolha do tipo de estratégia (global, analítica ou sintética) que permite a execução
da tarefa revela-se um excelente índice da inteligência não-verbal, bem como das
capacidades de raciocínio viso-espacial.
 Em comparação com outras medidas de aptidão viso-espacial, o subteste de Cubos
supõe o recurso a um funcionamento viso-percetivo, capacidades construtivas,
coordenação, rapidez psicomotora.
Resultados altos indicam: a) Boa capacidade de conceptualização; b) Aptidão para a análise e
síntese de problemas e flexibilidade na sua resolução; c) Boa coordenação visuo-motora;
Resultados baixos: a) Dificuldades na capacidade ao nível dos símbolos abstratos;
Possibilidade de disfunção neurológica; c) Dificuldades na coordenação visuo-motora.
10. Composição de Objetos
 Mede a capacidade de organizar um todo a partir de elementos separados, apela à
capacidade de integração percetiva e é sensível a dispraxia de construção.
 Proporciona uma oportunidade para observar diretamente a estratégia de resolução
dos problemas (itens).
Resultados altos: a) Adequada coordenação motora; b) Boa organização visual; c) Flexibilidade
de pensamento.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Resultados muito altos podem indiciar um nível elevado de ansiedade e tendência à


manipulação do meio envolvente como forma de controlo da ansiedade.
Resultados baixos: a) Falta de capacidade de planeamento; b) Dificuldades percetivas e/ou
visuo-motoras; c) Pensamento concreto e dificuldades na formação de conceitos visuais; d)
Dificuldades emocionais ligada ao corpo próprio; e) Angústia de perda da própria integridade.
11. Pesquisa Símbolos
 Apela para a capacidade de discriminação percetiva. Depende de uma boa capacidade
de atenção visual e de memória de trabalho.
 As crianças impulsivas, ou com déficit de atenção, obtêm com frequência os
resultados mais baixos, da subescala de execução, no Código e em Procurar Símbolos.
 Quando o Código é melhor sucedido que Procurar Símbolos, prevalece a suspeita de
uma dificuldade de ordem grafo-motora, associada à execução de símbolos
inabituais, permanecendo totalmente preservadas as competências percetivas.
 Se Procurar Símbolos é uma prova que apresenta resultados superiores relativamente
ao Código, trata-se de uma criança que não aprendeu a autoregular o seu
desempenho numa tarefa cronometrada, mais do que um deficit de atenção visual
e/ou da discriminação percetiva, ou da existência de um controlo insuficiente da
impulsividade.
12. Labirintos
 Examina a capacidade de antecipação e de planeamento, requer uma estratégia viso-
espacial em memória de trabalho.
É bastante sensível à impulsividade do método ou abordagem adaptada.
 As crianças mais jovens, que sofrem de dispraxia motora, apresentam dificuldades na
realização desta tarefa: o insucesso provém de uma incapacidade de planificação da
sua execução gestual, como se existisse uma desconexão entre a intenção e a
realização do gesto a efetuar.
Resultados altos revelam: a) Capacidade de planificação correlacionada com capacidade para
retardar a impulsividade; b) Adequada capacidade de coordenação visuo-motora.
Resultados baixos denunciam impulsividade e pobre coordenação visuo-motora.

2- Subtestes de Organização Visual


13. Completar Figuras

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Avaliação em Psicologia Clínica

 É o primeiro subteste da escala a ser aplicado podendo, por isso, esperar-se que o
resultado obtido seja negativamente influenciado pelo efeito de novidade, sobretudo
numa criança tímida, por uma reação de inibição ansiosa.
 Apela a uma forma de memória visual e a um bom senso prático. O examinador deve
pedir ao sujeito, sobretudo aos mais velhos (10 anos ou mais), para nomear a parte
que falta, uma vez que a resposta pode proporcionar um bom índice das suas
capacidades de acesso lexical (escolha da palavra exata) e da sua cultura geral.
 As crianças impulsivas, bem como os sujeitos disfásicos, frequentemente apresentam
uma tendência para utilizar termos vagos, em vez de evocar o termo exato.
 À semelhança do subteste Informação, uma fraca escolarização, ou a pertença a meio
sóciocultural desfavorecido, pode explicar a pobreza do vocabulário utilizado pelo
sujeito.
Resultados elevados remetem para: a) Boa acuidade visual; b) Interesse pelo mundo
circundante. c) Boa perceção das relações todo/parte; d) Capacidade de diferenciação entre o
essencial e o não essencial; e) Bom contacto com a realidade.
Resultados baixos podem associar-se à ausência ou diminuição das capacidades acima
referenciadas ou à presença de: a) Depressão; b) Ansiedade; c) Impulsividade.
14. Disposição de Figuras
 Requer uma boa capacidade de análise percetiva, bem como uma integração do
conjunto das informações disponíveis.
 Uma pontuação fraca pode refletir um dano nas funções frontais de autoregulação.
 A relação dos desenhos que compõem cada história exige uma forma de discurso
interior que pode manifestar-se não funcional nos sujeitos que apresentam uma
disfasia, sobretudo recetiva. Muitas vezes as crianças disfásicas evidenciam
dificuldades na perceção do tempo e do espaço, que podem ser detetadas nesta
tarefa.
Resultados elevados indicam: a) Bom nível de inteligência social; b) Capacidade de
antecipação das consequências de atos. c) Boa organização visual. Resultados muito elevados
(3 pontos acima da média), podem indiciar, em adolescentes, tendência para passagem ao ato,
à manipulação de pessoas com sentido anti-social.
Resultados baixos podem dar conta de: a)Pobreza de ideias; b) Dificuldade em planear ações;
c) Processamento da informação lento. D) Dificuldades nas relações interpessoais.

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Avaliação em Psicologia Clínica

2. Os índices Factoriais
Segundo Wechsler, a interpretação dos resultados fatoriais é mais fidedigna que a
interpretação individual dos subtestes e oferece importantes informações de interesse clínico
e educacional.
Compreensão Verbal reflete o conhecimento verbal adquirido e o processo mental
necessário para responder às questões, que seria a capacidade de compreensão (raciocínio
verbal).
Organização Percetualconsiste na medida do raciocínio não-verbal, raciocínio fluido (por
exemplo sem “perda da linha de raciocínio”), atenção para detalhes e integração visomotora
(integração entre perceção visual e comportamento motor – “olhar e fazer”).
Resistência à Distratibilidadeestá dentro do domínio verbal e depende de memória auditiva
e processamento sequencial. O fator apresenta grande correlação com a habilidade
matemática e, além de atenção, avalia concentração e memória imediata. O rendimento no
fator é influenciado pela ansiedade, carência de estratégias mentais e pobreza de
automonitoramento. Não deve ser interpretado se os resultados de Aritmética e Dígitos
diferirem em quatro ou mais pontos.
Velocidade do Processamentoreflete velocidade psicomotora (Código) e velocidade mental
(Procurar Símbolos) para resolver problemas não verbais, avaliando, também, a capacidade de
planear, organizar e desenvolver estratégias. As suas habilidades incluem-se em dois domínios,
pois processamento implica cognição e velocidade e têm componentes tanto
comportamentais como cognitivos. Resultados baixos refletem pobreza no controlo motor, o
qual não deve ser interpretado se os valores alcançados em Aritmética e Dígitos diferirem em
quatro ou mais pontos.

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Avaliação em Psicologia Clínica

3. Utilização
 A versão portuguesa da WISC-III foi desenvolvida para ser utilizada em sujeitos com
idades compreendidas entre os 6 e os 16 anos e os 11 meses.
O principal objetivo da WIC-III e a avaliação do desempenho cognitivo da criança ou do
adolescente.
 A WISC III é utilizada em diferentes domínios, nomeadamente em avaliações
psicopedagógicas, em orientação escolar, na identificação de necessidades educativas
especiais (ex: dificuldades de aprendizagem, atrasos de desenvolvimento,
sobredotação), em avaliação clínica e neuropsicológica e em investigação.
 Desempenha um papel essencial também na determinação do nível intelectual de
sujeitos identificados como deficientes mentais.
Para a administração dos 10 subtestes obrigatórios o examinador necessita de um
tempo aproximado de 60 a 90 minutos. Caso opte por aplicar os 3 subtestes opcionais,
o tempo adicional será de 10 a 15 minutos.

4. Avaliação
Com os valores dos 3 Q.I. podemos fazer a análise inter-individual, ou seja, comparar a criança
em estudo com as crianças do seu grupo etário, tendo em conta que o valor médio dos Q.I. é
100, e utilizando a tabela:

Análise inter-individual – comparar os resultados do sujeito com a média dos sujeitos da


mesma idade. Estudam-se os resultados dos QIs verbal, de realização e total.

 Entre os 90 e os 110 encontra-se dentro da média.

38
Avaliação em Psicologia Clínica

1ª Análise: quantitativa (inter-individual)

QI verbal – avalia a compreensão verbal e proporciona informações sobre processamento de


linguagem, raciocínio, atenção, aprendizagem verbal e memória.

QI realização – medida da organização percetual e avalia o processamento visual, capacidade


de planeamento, aprendizagem não-verbal e capacidade para pensar e manipular estímulos
visuais com rapidez e velocidade.

QI total (melhor medida da capacidade cognitiva da WISC-III)

Diferenças significativas entre o Qi Verbal e o Qi de Realização, flutuações nos índices fatoriais

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

2ª Análise: quantitativa

Índices Fatoriais: Compreensão Verbal; Organização Percetiva; Resistência à Distração;


Velocidade de Processamento

3ª Análise: qualitativa (intra-individual) - comparação dos resultados obtidos pela criança nas
várias provas.
|QI verbal – QI realização|

Diferença ≥ 12 pontos é considerada significativa:

 Se a diferença for superior ou igual a 12 pontos, o sujeito tem um raciocínio


heterogéneo. Neste caso, o Q.I. total é pouco fiável - reflete facilidade oral e auditiva e
capacidade para expressar ideias em palavras.
 Se a diferença for inferior a 12 pontos, o sujeito tem um raciocínio homogéneo e o Q.I.
total é fiável - expressa uma facilidade visuomotora.

Se dentro de uma das escala verbal ou de realização existir uma grande discrepância entre
as subescalas, estas não representam uma medida unitária e a diferença entre os Qis não pode
ser interpretada. Dispersão nas subescalas verbais, por exemplo, indicam que a inteligência
dita verbal não foi a responsável pelos scores obtidos nas subescalas, houve influência de
outras variáveis.

 Para aceder ao perfil do sujeito, ou seja, aos seus pontos fortes e frágeis, recorremos
ao Método dos sinais, transformando os valores das provas em sinais através de
scatters.
 Se o raciocínio for homogéneo faz-se uma análise conjunta, determinando-se a média
total das notas ponderadas de todas as provas e faz-se só 1 scatter. A esta média
soma-se sucessivamente 1,5; 2,5 e 3 ; e subtrai-se -1,5; -2,5 e -3. Aos valores somados
vão corresponder os sinais +, ++ e +++; aos valores subtraídos correspondem os sinais -
;--;e---

A média assumirá o valor 0

 Se o raciocínio for heterogéneo o procedimento é idêntico mas a análise de cada sub-


escala é independente. Determina-se a média de cada uma das sub-escalas
separadamente, ou seja fazem-se 2 scatter.

43
Avaliação em Psicologia Clínica

5. Elementos a considerar na Interpretação


Segundo Carroll (1993b), considera-se que o fator que satura as provas verbais representa a
inteligência cristalizada (Gc) – que intervém nas tarefas que supõe aprendizagens anteriores:
Tarefas marcadas pela cultura e educação; E o fator que satura as provas de realização
representa a Visualização geral (Gv), que e um componente de inteligência que intervém nas
tarefas que exigem estruturação espacial;
Meio Socio-cultural:
 Um QI verbal significativamente superior ao de realização é mais frequente nas
crianças cujo Pai possui uma profissão intelectualmente superior;
 Sendo o QI verbal considerado como uma medida da Inteligência cristalizada (GC), esta
é a componente da inteligência global mais sensível à educação e à escolarização;
 Crianças que vivem em ambientes com condições socioculturais superiores, têm
oportunidades de aprendizagem mais numerosas e mais ricas; a qualidade das suas
interações familiares estimula a aquisição de competências verbais superiores à
média;
Problemas de aprendizagem:
 As crianças que sofrem de problemas de aprendizagem apresentam frequentemente
um QI verbal significativamente inferior ao QI de realização;
 Estudos com disléxicos mostraram que 76% tinham um QI verbal inferir ao QI
realização; em 35,7% dos casos a diferença era significativa;
 O perfil Realização > verbal, observado nas crianças com problemas de aprendizagem,
podem ser interpretados em termos de inteligência cristalizada (Gc), que é a mais
sensível ás aprendizagens escolares; logo não é extraordinário que o QI verbal esteja
deprimido quando apareçam os problemas de aprendizagem. Essa “depressão” terá
tendência para aumentar ao longo do tempo (efeito bola de neve);
 O sujeito em que a Gc está pouco desenvolvida devido ás dificuldades de
aprendizagem dispõe de competências intelectuais menos favoráveis para realizar
novas aprendizagens; em consequência disto, o seu QI verbal diminuirá e a diferença

44
Avaliação em Psicologia Clínica

entre QIs irá aumentando. Nota-se efetivamente que se encontram maiores diferenças
entre QIs, à medida que as idades vão aumentando, das mais novas para as mais
velhas.
O Estilo cognitivo:
 O estilo cognitivo designa os modos de apreensão e de resolução dos problemas
característicos de uma pessoa;
 Kauffman avançou a hipótese que a diferença entre Qis poderá ser a consequência do
estilo cognitivo dos sujeitos;
 A diferença poderá ser a consequência de um estilo cognitivo dependente ou
independente do campo. A dependência ou independência de campo representam os
dois polos de um continuum.
 Num extremo encontramos os sujeitos muito autónomos relativamente as
informações exteriores (Independência de campo), e na outra extremidade, os sujeitos
muito dependentes dessas Informações exteriores (dependência de campo).
 Entre esses dois extremos, podemos reencontrar uma diversidade de nuances na
apreensão da realidade exterior;
 A dependência ou Independência de campo são particularmente manifestos assim que
os sujeitos são confrontados com tarefas intelectuais de natureza visuo-espacial;
 Os sujeitos independentes de campo demonstram uma grande facilidade em analisar
as suas perceções visuais e em mudar de ponto de vista relativamente ao campo
percetivo.
Pelo contrário, os sujeitos dependentes do campo tem muita dificuldade em se
desligar da perceção de conjunto e do seu ponto de vista inicial;
 É possível que um QI realização superior ao QI verbal, seja sinal de um estilo
cognitivo independente do campo; e inversamente um QI verbal superior poderá
indicar um estilo cognitivo dependente de campo;
A Delinquência:
 Os adolescentes delinquentes apresentavam mais um QI realização superior ao QI
verbal.

45
Avaliação em Psicologia Clínica

→Exame←
Análise Quantitativa
1. Verificar se os QIs estão dentro da média.
2. Verificar se existe uma diferença superior ou inferior de 12 valores entre os QIs (para
depois definir o tipo de raciocínio);
3. Construção do Scatter: Verificar os valores significativos (++; +++; --; ---);
4. Relacionar resultados com respetiva escala e posteriormente com os índices fatoriais.
Análise Quantitativa
1. Descrever se os resultados estão dentro da média;
2. Justificar e descrever o tipo de raciocínio e relacionar com elementos da entrevista
clinica.
3. Relacionar dados de scatter com a entrevista clínica.
4. Reunir todos os elementos e compará-los (QI´s, Scatter e entrevista);
5. Enquadrar quadro clinico e possível diagnóstico.

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→ WAIS-R – dos 16 aos 64 anos

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→WAIS-III – dos 16 aos 79 anos

A WAIS-III é um instrumento para avaliar o funcionamento intelectual de adolescentes


e adultos com idades entre os 16 anos e os 89 anos. A WAIS-III compreende duas subescalas:
verbal e de realização.
Cada uma delas permite calcular notas standard com uma média de 100 e um desvio-
padrão de 15 pontos.
A subescala verbal tem 6 subtestes obrigatórios, acrescidos de mais um opcional.
A subescala de realização tem 5 subtestes obrigatórios mais dois opcionais.
Cada um dos subtestes permite calcular notas standard com média de 10 pontos e desvio
padrão de 3.
É possível ainda calcular-se quatro índices fatoriais: Compreensão verbal, Organização
percetiva, Velocidade de processamento e Memoria de trabalho.

1. Utilização
 A WAIS-III é um instrumento de avaliação da inteligência particularmente útil numa
ampla gama de situações. Em primeiro lugar, pode ser utilizada para orientação
vocacional no ensino secundário ou superior.

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Avaliação em Psicologia Clínica

 É também frequentemente utilizada como um instrumento de base para avaliação das


dificuldades de aprendizagem ou para identificar sujeitos sobredotados. Por outro
lado, é ainda habitual utilizar os testes de inteligência no âmbito escolar para
prognosticar o êxito académico futuro.
 Pode ser igualmente administrada com vista a um diagnóstico diferencial de
perturbações neurológicas e psiquiátricas que afetem o funcionamento mental. E por
fim, também utilizado em áreas de investigação clínica.

2. Avaliação
1. Análise quantitativa:

Análise inter-individualcomparar os resultados do sujeito com a média dos sujeitos da


mesma idade. Estudam-se os resultados dos QIs verbal, de realização e total. Entre os 90 e os
110 encontra-se dentro da média.

1ª Análise: quantitativa (inter-individual)

QI verbal, QI de realização, QI total

Tabela A12. Conversão da soma dos resultados padronizados em QI Verbal

Soma dos QI Verbal Soma dos QI Verbal 22 59 74 114

resultados resultados
23 60 75 115
Padronizados Padronizados
24 61 76 116
6 45 58 98
25 62 77 117
7 46 59 99
26 63 78 118
8 47 60 100
27 64 79 118
9 48 61 101
28 66 80 119
10 49 62 102
29 67 81 120
11 50 63 103
30 68 82 121
12 51 64 104
31 69 83 122
13 51 65 105
32 70 84 124
14 52 66 106
33 72 85 125
15 53 67 107
34 73 86 126
16 54 68 108
35 74 87 127
17 55 69 109
36 75 88 128
18 55 70 110
37 76 89 129
19 56 71 111
38 77 90 131
20 57 72 112
39 78 91 133
21 58 73 113

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Avaliação em Psicologia Clínica

40 79 92 134 49 89 101 147

41 80 93 136 50 90 102 148

42 82 94 137 51 91 103 149

43 83 95 139 52 92 104 150

44 84 96 140 53 93 105 152

45 85 97 142 54 94 106 153

46 86 98 143 55 95 107 154

47 87 99 144 56 96 108-114 155

48 88 100 146 57 97

Tabela A13. Conversão da soma dos resultados padronizados em QI de Realização

Soma dos QI Verbal Soma dos QI 26 67 71 129

resultados resultados Verbal


27 68 72 131
Padronizados Padronizados
28 69 73 132
5 46 50 100
29 70 74 134
6 47 51 101
30 72 75 136
7 48 52 102
31 73 76 137
8 49 53 103
32 75 77 139
9 50 54 104
33 76 78 141
10 51 55 106
34 78 79 143
11 52 56 107
35 79 80 145
12 53 57 108
36 80 81 147
13 54 58 109
37 82 82 148
14 55 59 111
38 83 83 149
15 56 60 112
39 85 84 151
16 57 61 113
40 86 85 152
17 58 62 115
41 88 86 153
18 59 63 116
42 89 87 154
19 60 64 117
43 91 88-95 155
20 61 65 118
44 92
21 62 66 119
45 94
22 63 67 121
46 95
23 64 68 123
47 97
24 65 69 125
48 98
25 66 70 127
49 99

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Avaliação em Psicologia Clínica

Tabela A14. Conversão da soma dos resultados padronizados em QI Total

Soma dos QI Total Soma dos QI Total Soma dos QI Total Soma dos QI Total
resultados resultados resultados resultados
Padronizados Padronizados Padronizados Padronizados

11 45 61 67 111 101 161 134

12 45 62 68 112 101 162 135

13 45 63 68 113 102 163 135

14 45 64 68 114 102 164 136

15 45 65 69 115 103 165 137

16 45 66 69 116 103 166 138

17 46 67 70 117 104 167 139

18 46 68 70 118 105 168 140

19 47 69 71 119 105 169 141

20 47 70 71 120 106 170 142

21 48 71 72 121 107 171 143

22 48 72 73 122 107 172 144

23 49 73 74 123 108 173 145

24 49 74 75 124 108 174 146

25 50 75 76 125 109 175 146

26 50 76 76 126 109 176 147

27 51 77 77 127 110 177 148

28 51 78 78 128 110 178 149

29 52 79 79 129 111 179 150

30 52 80 80 130 112 180 151

31 53 81 81 131 112 181 152

32 53 82 82 132 113 182 153

33 54 83 83 133 113 183 154

34 54 84 83 134 114 184 154

35 55 85 84 135 114 185 155

36 55 86 85 136 115 186 155

37 56 87 85 137 116 187 155

38 56 88 86 138 117 188 155

39 57 89 86 139 117 189 155

40 57 90 87 140 118 190 155

41 58 91 88 141 118 191 155

42 58 92 89 142 119 192 155

43 59 93 89 143 119 193 155

44 59 94 90 144 120 194 155

45 60 95 91 145 121 195 155

69
Avaliação em Psicologia Clínica

46 60 96 91 146 121 196 155

47 61 97 92 147 122 197 155

48 61 98 92 148 123 198 155

49 62 99 93 148 124 199 155

50 62 100 94 150 125 200 155

51 63 101 94 151 126 201 155

52 63 102 95 152 127 202 155

53 64 103 96 153 127 203 155

54 64 104 96 154 128 204 155

55 65 105 97 155 128 205 155

56 65 106 98 156 129 206 155

57 66 107 98 157 129 207 155

58 66 108 99 158 130 208 155

59 67 109 99 159 132 209 155

60 67 110 100 160 133

2ª Análise: quantitativa

Índices Fatoriais

Qis e Índices Fatoriais:

QIs / Índices Fatoriais Classificação % Pop. Portuguesa


Superior a 130 Muito superior 2,5
120-129 Superior 7,2
110-119 Médio Superior 16,5
90-109 Médio 49,7
80-89 Médio Inferior 16
70-79 Inferior 6,2
Inferior a 69 Muito Inferior 1,8

2. Análise qualitativa:

Análise intra-individualcomparar e interpretar os resultados do próprio sujeito nas


diferentes provas – os seus pontos fortes e frágeis. Análise mais importante e grande mais-
valia destas provas. Compara-se o sujeito em relação à sua própria média.

70
Avaliação em Psicologia Clínica

2ª análise: qualitativa (intra-individual)

|QI verbal – QI realização|

 Quando a diferença entre QI verbal e QI realização for inferior a 12 pontos, não é


significativa, a diferença entre as potencialidades verbais e potencialidades
manipulativas não é significativa, o raciocínio é homogéneo.
 Quando a diferença é igual ou superior a 12 o raciocínio é heterogéneo. Quando o
raciocínio é homogéneo trabalha-se com as provas em conjunto, com a média total de
todas as provas, pois nenhuma das competências está a influenciar a outra. Quando o
raciocínio é homogéneo o QI total é fiável.
 Se o sujeito tiver um raciocínio heterogéneo, convém avaliar em que medida esse
raciocínio é heterogéneo. Quando o raciocínio é heterogéneo trabalha-se com a média
do somatório dos valores verbais e de realização em separado pois caso contrário, uma
prova influenciaria a outra. O QI total é menos fiável pois está influenciado pela
heterogeneidade das potencialidades do sujeito.

Diferenças entre Índices Fatoriais

 Compreensão Verbal e Organização Percetiva semelhante à comparação entre Qi Verbal


e Qi Realização.
 Índice de Compreensão Verbal e Índice de Memória de Trabalho poderá revelar
diferenças entre a capacidade do sujeito para reter e processar a informação em
memória e os seus conhecimentos adquiridos e aptidões de raciocínio verbal.
 Índice de Organização Percetiva e Índice de Velocidade de Processamento permite
identificar discrepâncias entre as capacidades visuo-espaciais e de raciocínio fluído e a
capacidade para processar rapidamente a informação.

Scatter

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Avaliação em Psicologia Clínica

É com os pontos fortes que se pode intervir e trabalhar os pontos fracos. É através de um
scatter (método dos sinais) que é possível transformar as notas standard do sujeito em sinais
(0 na média; + acima da média; ++ muito acima da sua média; - abaixo da sua média; - - muito
abaixo da sua média).

Permite aceder à distribuição dos resultados do sujeito em função de uma curva de Gauss,
permitindo traçar um perfil do sujeito. Faz-se a análise das potencialidades ou fragilidades do
sujeito, o que está na média não interessa. Em função das potencialidades e fragilidades do
sujeito, liga-se à história clínica do sujeito e ajuda na intervenção. É importante que durante
a prova se anotem todas as observações para que a análise possa ser mais apurada e ser
possível fazer uma análise resposta a resposta.

→WAIS-III – Quociente de Deterioração Mental (QDM):

O QDM/QD diz respeito à estimativa da diminuição mental, na medida em que há funções que
apresentam um declínio mais acentuado com a idade e outras menos.

Com o avanço da idade há características que se vão deteriorando, como por exemplo, a
memória.

São consideradas 8 provas na escala:

 As provas que “mantém”, ou seja, as que não declinam com o avanço da idade:
Informação, vocabulário, composição de objetos e complemento de gravuras.

 As provas que “não mantém”, ou seja, aquelas cujos resultados declinam mais com o
avanço da idade: Memória de Dígitos, Semelhanças, Código e Cubos.

Para aceder ao QDM voltamos às notas diretas e convertemo-las em notas ponderadas por
idade, através de tabelas por grupos de idade que só se utilizam para este cálculo (não servem
para aceder aos Q.I.).

𝑷𝒓𝒐𝒗𝒂𝒔 𝒒𝒖𝒆 𝒎𝒂𝒏𝒕é𝒎−𝑷𝒓𝒐𝒗𝒂𝒔 𝒒𝒖𝒆 𝒏ã𝒐 𝒎𝒂𝒏𝒕é𝒎


QDM = 𝑷𝒓𝒐𝒗𝒂𝒔 𝒒𝒖𝒆 𝒎𝒂𝒏𝒕é𝒎

72
Avaliação em Psicologia Clínica

A interpretação do valor do QDM é feita com base numa comparação com valores normativos
da população geral:

QDM Percentagem da população que possui deterioração mental


≤ 0,13 80%
0,18 - 0,22 90%
0,23 – 0,30 95%
≥ 0,31 99%

Assim, se por exemplo, um sujeito apresentar um QDM = 0,19, significa que tem uma
probabilidade de 90% de possuir uma deterioração cognitiva. Da população que apresenta
um QDM entre 0.18 e 0.22, apenas 10% não possui deterioração mental.

 Um quociente positivo indica probabilidade de deterioração mental.


 Quanto maior o QDM maior a probabilidade de possuir uma deterioração cognitiva.

→Exame←
Análise Quantitativa
1. Verificar se os QIs estão dentro da média.
2. Verificar se existe uma diferença superior ou inferior de 12 valores entre os QIs (para depois
definir o tipo de raciocínio);
3. Construção do Scatter: Verificar os valores significativos (++; +++; --; ---);
4. Mencionar resultados com respetiva escala e posteriormente com os índices fatoriais.
5. Calcular o Quociente de Deterioração Mental

Análise Quantitativa
1. Descrever/justificar se os resultados estão dentro da média;
2. Justificar e descrever o tipo de raciocínio e relacionar com elementos da entrevista clinica.
3. Comparar e interpretar os resultados do próprio sujeito nas diferentes provas – Pontos
frágeis e fortes – Scatter;

4. Relacionar dados de scatter com a entrevista clínica.


5. Interpretar valor do QDM.
6. Reunir todos os elementos e compará-los (QI´s, Scatter e entrevista);
7. Enquadrar quadro clínico e possível diagnóstico.

73
Avaliação em Psicologia Clínica

→Escala de Memória de Wechsler

A Escala Clínica de Memória de Wechsler permite aos psicólogos uma avaliação rápida
e precisa da memória dos sujeitos. Graças a este instrumento, em conjunto com a WAIS, é
possível precisar, com o auxílio de índices apropriados, a discordância eventual entre o
resultado de um teste de memória e o resultado de um teste de inteligência, isto é, calcular a
possibilidade de “Deterioração Mnésica”.
O manual compreende uma tabela, dando para cada subteste, para cada faixa etária e
para cada sexo, a média e o desvio padrão. A Escala Clínica de Memória de Wechsler é
composta por sete sub-testes:
 Teste I - Informação Pessoal e Geral
 Teste II - Orientação Imediata

 Teste III - Controlo Mental


 Teste IV - Memória Lógica

 Teste V - Memória de Dígitos


 Teste VI - Reprodução Visual

 Teste VII - Aprendizagem Associativa

1. Utilização
No âmbito da avaliação clínica contribui para o diagnóstico e identificação de
disfunções da memória; identificação precoce de demências e condições degenerativas;
quantificação das disfunções da memória; identificação dos aspetos da memória que estão
deteriorados ou preservados; avaliação dos défices de codificação vs. recuperação; avaliação
de modalidades específicas da memória (por exemplo, auditiva ou visual); medida da eficácia
das intervenções; descrição dos aspetos qualitativos do funcionamento da memória; e
monitorização objetiva do desenvolvimento da doença.

2. Instrução para Aplicação e Critérios de Cotação


Esta escala não visa uma discriminação fina entre as aptidões mnésicas superiores. O objetivo
procurado é o de revelar esta ou aquela deficiência no domínio da memória e de mensurar a
sua importância. É destinada a adultos (a partir dos 20 anos) e é de aplicação individual. O
tempo da prova é de sensivelmente 30 minutos.

74
Avaliação em Psicologia Clínica

Teste I - Informação Pessoal e Geral

Compreende seis questões simples de informação pessoal e geral: idade, onde nasceu,
presidente da república actual, presidente da república anterior, etc. Este teste discrimina
muito pouco ou nada os sujeitos normais ou os quase normais.

Cotação: 1 ponto por sucesso. Na idade toleramos 1 erro de 1 ano a mais ou a menos.

Nota Máxima: 6 pontos

Teste II - Orientação Imediata

Consiste em cinco questões simples destinadas a testar a orientação imediata do sujeito: ano,
mês, dia, onde se encontra (instituição) e onde fica esse local (ponto de referência).

Cotação: 1 ponto por sucesso.

Nota Máxima: 5 pontos

Teste III - Controle Mental

1. Contar de 20 para 1; Nota máxima 3 pontos.

2. Alfabeto; Nota máxima 3 pontos.

3. Contar de 3 em 3; Nota máxima 3 pontos.

Nota Máxima Total do Teste III: 9 pontos

Teste IV – Memória Lógica

É composta por dois textos que lemos ao sujeito e que ele deve memorizar e voltar a contar.
Este teste tem por objetivo medir a memória imediata, logo que se trate de material lógico.

Nota Máxima Total do Teste V: 17 pontos

Teste VI – Reprodução Visual


O sujeito deve traçar de memória as figuras geométricas simples que lhe foram mostradas
durante 10 segundos. Apresentam-se os três cartões por ordem alfabética.
Cotação Máxima Total do Teste VI: 15 pontos (soma de A, B, C1 e C2)

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Avaliação em Psicologia Clínica

Teste VII – Aprendizagem Associativa


Compõe-se por 10 pares de palavras, para certos pares a associação é fácil, para outros é
difícil, por exemplo: Norte-Sul (fácil) Obedecer-Metro (difícil). Pedimos ao sujeito que aprenda
a associar estas palavras em 3 ensaios.
Nota Máxima: 21 pontos

Nota Total da Escala - a nota total da escala é a soma dos totais de todos os sub-testes, pode
ter um máximo de 96 pontos.

→ Quociente de Memória:

As diferentes notas obtidas para um sujeito, obtidas nos sete testes da Escala Clínica
de Memória devem ser adicionadas para obter a Nota Total de Memória (Resultados Brutos).

Para resolver a questão da transformação destes Resultados Brutos em Quociente


Memória (QM), Wechsler construiu uma tabela em função da idade do indivíduo e do seu
resultado bruto.

76
Avaliação em Psicologia Clínica

77
Avaliação em Psicologia Clínica

→ Avaliação da Deterioração Mnésica / Interpretação:

A Deterioração Mnésica é obtida operacionalmente com uma diferença entre o QM


obtido na Escala Clínica de Memória e o QI obtido na Escala de Inteligência-WAIS (DMQM-
QI).

Por exemplo: Caso de Luísa (trabalho de grupo):


QIT= 84; QM= 64:
DM =64-84=20: Resultado positivo.
A diferença entre QM e QI distribui-se normalmente em torno do valor 0.

*Os valores inferiores a 0 são obtidos pelos indivíduos que têm uma inferioridade na
Escala Clínica de Memória, em relação à Escala WAIS. Trata-se, então, de sujeitos que
apresentam as aptidões mnésicas menos elevadas, que não fazem prever o seu nível
intelectual.

*Os valores positivos, indicam a existência de uma certa superioridade das aptidões
mnésicas, em relação ao nível intelectual.

Quanto maior for a diferença entre QM e QI negativa, maior é a probabilidade de não


a podermos atribuir à heterogeneidade normal das aptidões e, por consequência, maior é a
probabilidade da natureza patológica do desvio (Tabela 4 do Manual).

→Exame←

Análise Quantitativa
1. Com o valor do QM (quociente mental) calcular o valor do QDM/DM (deterioração mental);
2. Verificar Tabela 3 do manual
3. Mencionar o valor de QDM obtido.
Análise Qualitativa
1. Interpretar valor de QDM (se é positivo ou não)
2. Relacionar valor de QDM com o valor de QIT (QI Total)
3. Relacionar resultados com elementos anteriormente utilizados (entrevista clínica, WAIS,
etc).
4. Enquadrar quadro clínico e fazer possível diagnostico.

78
Avaliação em Psicologia Clínica

PROVAS INSTRUMENTAIS

1. FIGURA COMPLEXA DE REY

A análise da Figura Complexa de Rey resulta de uma conjugação sintética dos vários
aspetos a seguir referidos.
Os elementos resultantes da observação relativos ao comportamento e reações da
criança durante o teste ajudam a precisar a apreciação da prova.
Há que prestar também atenção aos elementos relativos à projeção corporal tais como
reproduções em espelho, questões relativas à lateralidade, e relações de execução e
posicionamento espacial.
O objetivo final é procurar conjugar os elementos resultantes da análise efetuada com a
possibilidade da obtenção de uma resposta às questões formuladas durante a colocação das
hipóteses diagnósticas que levaram a que esta prova tivesse sido aplicada.
A prova gráfica da organização percetiva. Diagnóstico diferencial entre deficiência mental
e adquirida no seguimento de traumatismo craniano. A figura é complexa e obriga a síntese e
o raciocínio analíticos que são organizadores. Hoje é utilizada a perspetiva mais clínica do que
psicométrica. Esta prova é sensível ao controlo visuo-motor, memória imediata e rapidez do
desenho mental.

→Interpretação resultados:

Quantitativo – tipo de reprodução (que pode ser do 1 ao 7, sendo o 7 o menos evoluído e o


tipo 1 o mais evoluído); exatidão de reprodução; e tempo de execução.

Qualitativo – particularidades das reproduções (ex: começa pelos elementos de dentro ou de


fora, etc.); comparação dos tipos de execução na cópia e na memória (houve evolução ou
retrocesso – por exemplo, passa do tipo 2 na cópia para o tipo 5 na memória).

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Avaliação em Psicologia Clínica

→FIGURA A←

Figura A: Aplicada a crianças a partir dos 8 anos.

1.Correcção e Pontuação

A)Reprodução por Cópia


1.Correcção
1.1. Tipo de cópia/ Tipo de erro
 Estão ordenados do mais racional para o menos racional.

Tipo I – Construção sobre a armação/estrutura: O sujeito começa o desenho pelo rectângulo


central que passa a funcionar como a armação, sobre o qual dispõe todos os demais
elementos da figura. O rectângulo grande constitui, pois, a base que serve de referencia e de
ponto de partida para a construção da figura. O mais evoluído. Começa a aparecer por volta
dos 7, 8 anos e é predominante a partir dos 10, 11 anos. Significa a existência de uma boa
capacidade de compreensão das estruturas principais e secundárias que organizam a figura.

80
Avaliação em Psicologia Clínica

Tipo II – Detalhes englobados na armação/estrutura: O sujeito começa por um ou outro


detalhe contíguo ao grande rectângulo (por exemplo, a cruz da parte superior do lado
esquerdo), ou traça o grande rectângulo, incluindo nele algum dos detalhes (por exemplo, o
quadrado exterior contíguo ao ângulo inferior esquerdo do rectângulo central) e utiliza-o como
armação do seu desenho, como no tipo I. Atribui-se também, a este tipo II o processo pouco
frequente, que consiste em desenhar as diagonais do rectângulo antes do seu contorno,
utilizando, de seguida, este como armação. Tipo intermédio. Começa também a aparecer nas
mesmas idades dos anteriores.

Tipo III – Contorno geral da figura: O sujeito começa o seu desenho pela reprodução do
contorno integral da figura sem diferenciar nela, explicitamente, o rectângulo central. O
sujeito obtém assim uma espécie de “contentor” onde são depois colocados todos os detalhes
interiores. Neste tipo há uma acentuação na estrutura envolvente da figura e na distinção
dentro/fora. Surge com alguma frequência maioritariamente até aos 7 anos de idade.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Tipo IV – Justaposição de detalhes: O sujeito vai desenhando os detalhes uns ao lado dos
outros como se estivesse a fazer um puzzle. Não existe um elemento director da reprodução.
Uma vez terminada, melhor ou pior, a figura é globalmente reconhecida e pode até estar
perfeitamente conseguida. Está relacionado com uma capacidade de análise e de síntese das
estruturas grafo-percetivas que não tem em conta as estruturas organizativas primárias e
secundárias. É frequente nas crianças entre os 5 e os 10, 11 anos.

Tipo V – Detalhes sobre fundo confuso: O sujeito desenha um grafismo pouco ou nada
estruturado, no qual não é possível identificar o modelo, embora existam certos detalhes
reconhecíveis, pelo menos na sua intenção. Está relacionado com uma perceção global onde
avultam algumas estruturas graficamente melhor percecionadas. É próprio de crianças
menores de 4, 5 anos de idade.

82
Avaliação em Psicologia Clínica

Tipo VI – Redução a um esquema familiar: O sujeito transforma a figura num esquema que lhe
é familiar e que pode, por vezes, recordar vagamente a forma geral do modelo ou de alguns
dos seus elementos (casa, barco, peixe, boneco, etc.). A criança procura atribuir um sentido às
formas sem sentido que constituem a figura de Rey, identificando-as a algo semelhante que já
conhece no seu universo perceptivo. É próprio das crianças mais novas e desaparece após os 4,
5 anos de idade.

Tipo VII – Reprodução irreconhecível/Garatuja: O sujeito faz simplesmente umas garatujas


nas quais é impossível reconhecer qualquer dos elementos do modelo e tão pouco a sua forma
global. É próprio, ou de crianças muito novas, ou de crianças com patologias mais
desorganizadas ou em fases mais regressivas do desenvolvimento.

83
Avaliação em Psicologia Clínica

Ainda que seja importante identificar o processo de cópia, a exactidão e o grau de perfeição do
trabalho são outras variáveis importantes. Para avaliá-las correctamente, é necessário ter em
conta o número de elementos copiados e a sua relação. Osterrieth dividiu a figura em 18
partes (quer na cópia como na reprodução de memória):

1 – Cruz exterior continua ao ângulo superior esquerdo do retângulo grande.


2 – Retângulo grande, armação da figura.
3 – Cruz de Santo André, tomada pelas diagonais do retângulo grande.
4 – Mediana horizontal do retângulo grande 2.
5 – Mediana vertical do retângulo grande 2.
6 – Pequeno retângulo interior (contiguo ao lado esquerdo do retângulo 2, limitados pelas
semidiagonais esquerdas deste e cujas diagonais se cortam sobre a mediana 4).
7 – Pequeno segmento colocado sobre o lado horizontal superior do segmento 6.
8 – Quatro linhas paralelas situadas no triângulo formado pela metade superior da mediana
vertical e a metade superior da diagonal esquerda do retângulo 2.
9 – Triângulo retângulo formado pela metade do lado superior do retângulo 2, pelo
prolongamento superior da mediana vertical 5, e pelo segmento que une o extremo deste
prolongamento com o ângulo superior direito do retângulo 2.
10 – Pequena perpendicular ao lado superior do retângulo 2, situada debaixo do elemento 9.
11 – Círculos com três pontos inscritos, situado no sector superior direito do retângulo 2.
12 – Cinco linhas paralelas entre si e perpendiculares à metade inferior da diagonal direita do
retângulo 2.

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Avaliação em Psicologia Clínica

13 – Dois lados iguais que formam um triângulo isósceles construído sobre o lado direito do
retângulo 2, exteriormente a este.
14 – Pequeno losango situado no vértice extremo do triângulo 13.
15 – Segmento situado no triângulo 13, paralelamente ao lado direito do retângulo 2.
16 – Prolongamento da mediana horizontal que constitui a altura do triângulo 13.
17 – Cruz da parte inferior, compreendendo o braço paralelo ao lado inferior do retângulo 2 e
o pequeno prolongamento da mediana 5 que a une a este lado.
18 – Quadrado situado no extremo inferior esquerdo do retângulo 2, prolongamento do lado
esquerdo, compreendendo também a sua diagonal.

2.Critérios de Pontuação
2.1. Riqueza e exactidão da Cópia

(Assinalam-se as diversas unidades reproduzidas, pontuam-se segundo os critérios desta


imagem e somam-se os pontos obtidos, sendo que a pontuação máxima é de 36 pontos.)

2.2. Tempo de Cópia


O tempo de execução é arredondado sempre para o minuto seguinte. (EXEMPLO: 2’15’’ ou
2’50’’ são arredondados para 3’).

B)Reprodução de Memória
Os mesmos critérios aplicados à reproducão por cópia.

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Avaliação em Psicologia Clínica

2.Aferição do Autor

A) Reprodução por cópia


Os percentis da aferição total de pontos na Cópia são dados pela tabela:

(A pontuação directa é encontrada nos valores do centro da tabela na respectiva coluna da idade –
depois associamos ao percentil da linha.)

(Aferição Portuguesa)

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Avaliação em Psicologia Clínica

Graduação das formas de cópia (vão das reacções mais primitivas às mais evoluídas):
1ª – Tipo VI: “Redução da figura a um esquema familiar”. Este tipo de reprodução surge entre
os 4 e os 5 anos, embora muito raramente, e desaparece aos 6 anos. Os sujeitos que atuam
assim partem, em geral, do círculo, assimilando-o a uma cara, para desenhar um boneco,
ignorando todo o resto do modelo.
2ª – Tipo V: “Fundo de linhas mais ou menos confusas onde se destacam certos detalhes
claramente reconhecíveis”. A maior frequência deste tipo de reprodução dá-se no grupo dos 4
anos (50%), no qual predomina. Contudo, diminui rapidamente e desaparece no grupo dos 8
anos.
3ª – Tipo IV: “Justaposição de detalhes sem traço-base, terminando num conjunto mais ou
menos coerente”. É o tipo de reprodução predominante nos grupos de 5 a 10 anos. A sua
frequência é elevada nos grupos de 4 a 7 anos alcançando o se máximo no grupo dos 8 anos
(70%) para diminuir depois, de forma bastante regular, até à idade adulta onde tem uma
representação mínima.
4ª – Tipo III: “Contorno geral no qual se colocam depois todos os detalhes”. Esta conduta não
predomina em nenhuma idade; porém, mantém-se no decurso de toda a evolução como tipo
complementar. Com exceção do grupo dos 10 anos, em que tem a sua frequência máxima
(35%), diminui, no conjunto, a partir dos 6 anos e deixa de ser apreciável nos adultos.
5ª – Tipo II: “Detalhes englobados na armação”. Este tipo nunca chega a ser predominante em
nenhuma idade e pode, assim, como o III, ser considerado um tipo complementar. Aparece no
grupo dos 6 anos e aumenta progressivamente até aos 12 anos, idade em que alcança a sua
mais alta frequência (42 em 100) para diminuir em seguida até à idade adulta.
6ª – Tipo I: “Desenho que começa pelo retângulo central que serve de estrutura a todo o
desenho”. É o tipo de reprodução característico do adulto, grupo em que alcança, aliás, a
frequência máxima (55%) que é, por outro lado, a única predominante. Esta produção está
presente desde os grupos de 4 anos e aumenta, lentamente, através dos diferentes grupos de
idade até alcançar, bruscamente, o máximo. Os tipos I e II só variam num ponto. No tipo II o
sujeito começa por um detalhe contíguo ao retângulo e passa, depois, ao retângulo central
para construir, como no tipo I, a estrutura base do seu desenho. Estes dois tipos de
reprodução então, pois, muito próximos.

Uma vez que tanto o tipo II como o tipo I se distinguem dos restantes pela polarização
do desenho em torno do retângulo central, parece que se poderá, legitimamente, considerar
este tipo II (que se encontra também nos adultos) como uma variedade do tipo I, e reunir estes

87
Avaliação em Psicologia Clínica

tipos de reprodução (praticamente iguais, enquanto os outros são muito diferentes) num tipo
global superior.

Portanto têm-se:
7ª – Tipo I + Tipo II: “Baseado no retângulo central que serve de estrutura ao desenho”.
Verifica-se este tipo de reprodução em todas as idades; tem um crescimento lento até aos 10
anos e passa a ser dominante aos 13 anos, depois de competir com o IV nos 11 e 12 anos;
continua a progredir até alcançar o máximo (81%) no grupo dos adultos.

A evolução do processo de cópia em função da idade passará, assim, pelas três etapas
seguintes, caraterizadas, cada uma delas, pelo predomínio de um tipo de cópia (o tipo mais
frequente para essa idade, em geral 50% e superior) e a presença de dois tipos secundários.

Etapa I Tipo V Predomina nos 4 anos como tipo secundário


Com o tipo IV
Etapa II Tipo IV Predomina dos 5 aos 11/12 anos
a) com o tipo III Como tipo secundários dos 5 aos 7 anos
b) com o tipo I /II Como tipo secundário dos 7 anos aos 11/12 anos
Etapa III Tipo I / II Predomina dos 11/12 anos aos adultos
Como tipo IV Como tipo secundário

Tabela, em percentis, dos vários tipos de cópia. (Os números mostram que as crianças
muito pequenas já podem apresentar um tipo superior. Vê-se também que o tipo I – o mais
evoluído – corresponde à mediana das formas de cópia encontradas nos adultos.)

(Nota: 4 (estádio 1); 5/6 (estádio 2); 7/10 (estádio 3); 11/12, 13/15 e adultos (estádio 4))

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Avaliação em Psicologia Clínica

(Aferição Portuguesa)

Os percentis da exactidão e riqueza na Cópia são dados pela tabela:

Para se apreciar a qualidade de execução observam-se os percentis:

Percentil Qualidade da Reprodução


p < 50 Reprodução de qualidade inferior
p = 50 Reprodução de nível médio
P > 50 Reprodução de qualidade superior

89
Avaliação em Psicologia Clínica

(Aferição Portuguesa)

Os percentis da aferição do tempo na Cópia são dados pela tabela:

(EXEMPLO: se a criança tiver 7 anos e um tempo de cópia de 11 minutos então encontra-se no


percentil 25)

90
Avaliação em Psicologia Clínica

Observam-se também os percentis quanto à rapidez de execução:

Percentil Qualidade da Reprodução


p < 50 Reprodução muito lenta
p = 50 Reprodução de nível médio
P > 50 Reprodução muito rápida

(Aferição Portuguesa)

Relação qualidade/rapidez
Conjugar a correção ou inexatidão da reprodução com a rapidez ou lentidão de
execução:
 Figura reproduzida bem e rapidamente – O melhor dos resultados esperáveis. Significa
boa capacidade gráfica (a relativizar com o tipo de reprodução, será tanto melhor quanto
mais esta se aproxime do tipo I ou II, mas há que ter em conta que o tipo IV também é
comum numa criança) e boa capacidade de organização grafo-percetiva.
 Figura reproduzida bem, mas lentamente – Significa a existência de boas capacidades
grafo-percetivas, mas o resultado fica prejudicado pela lentidão da execução. As
hipóteses de isto acontecer são: meticulosidade, perfeccionismo, aspetos defensivos de
carácter rígido, receio de errar, lentidão e morosidade devidas a características
obsessivas ou a aspetos depressivos.
 Figura reproduzida mal, mas lentamente – Significa a existência de capacidades grafo-
percetivas diminuídas. O sujeito pode, ainda assim, ter feito um esforço por rememorar e
reproduzir a figura e a lentidão advir daí, ou por outro lado, a lentidão ser mais uma das
marcas das suas dificuldades. Isto pode ser devido a problemas de memória, depressão,
déficit de perceção ou organização visual, envolvimento neurológico.

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Figura reproduzida mal e rapidamente – Significa a existência de capacidades grafo-


percetivas diminuídas, possivelmente prejudicadas por uma execução pouco cuidada ou
por dificuldades de memória. As hipóteses de isto acontecer são: impetuosidade,
desistência, deficit de memória, baixa resistência à frustração, dificuldades de atenção e
concentração, dificuldade de auto-apreciação sobre as performances, fragmentação de
personalidade, patologias do agir, envolvimento de problemática a nível neurológico,
deficit cognitivo generalizado.

B) Reprodução de Memória

Tipo de construção, exactidão, riqueza da reprodução e rapidez igual à Reprodução por Cópia.

(Nota: 4 (estádio 1); 5/6 (estádio 2); 7/10 (estádio 3); 12/12l e 13/adultos (estádio 4))
(Aferição Portuguesa)

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Avaliação em Psicologia Clínica

(Aferição Portuguesa)

Os percentis da aferição total de pontos na Memória são dados pela tabela:

(A pontuação directa é encontrada nos valores do centro da tabela na respectiva coluna da


idade – depois associamos ao percentil da linha.)

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Avaliação em Psicologia Clínica

(Aferição Portuguesa)

Comparando os “tipos” na cópia e na reprodução da memória, comprova-se que aos 6


anos, aproximadamente, metade dos sujeitos mantém o mesmo processo de elaboração e que
esta proporção, com algumas flutuações, aumenta com a idade. Nos adultos alcança 73% dos
casos. No entanto, não se deve esquecer que nos adultos se encontram os tipos de cópia mais
evoluídos e que estes tendem a conservar-se na reprodução da memória.
As regressões do tipo de cópia na reprodução de memória observam-se, sobretudo, em
crianças até aos 7 anos. Ausente o modelo que as incitava a um certo tipo de construção e
guiadas somente pela recordação, tendem, com frequência, a acusar uma tendência para a
elaboração irracional e complicada da figura.
É evidente que o emprego desta última tabela permitirá situar o sujeito de acordo com as
suas capacidades de memória. Uma tipificação da duração do processo de reprodução de
memória não apresenta apenas interesse prático; há sujeitos escrupulosos que prolongam o
seu esforço enquanto outro, expeditos, pensam rapidamente que a sua recordação está
esgotada. Basta referir que, dos 4 aos 15 anos, a mediana das distribuições progride de 6 a 3
minutos para voltar a ser de 4 minutos no grupo dos adultos.

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Avaliação em Psicologia Clínica

3.Considerações sobre os resultados

A) Reprodução por Memória


 PROCESSO DE CÓPIA NITIDAMENTE INFERIOR:
a) A reprodução é defeituosa
1 – Tempo de cópia em geral longo: sujeito provavelmente pouco desenvolvido do ponto de
vista intelectual; dispraxia de construção gráfica, percepção visual confusa, sincretismo e
dificuldade de análise visual e espacial.
Em crianças pequenas estas dificuldades são normais. Deve-se ter em consideração o meio
cultural donde provém o sujeito, a sua escolaridade e o valor dado pela escola e família ao
desenho livre.
2 – Tempo de cópia anormalmente curto: a incapacidade de análise é, provavelmente, mais
marcante que no caso precedente; o tempo muito curto corresponde à cópia de um só
elemento fácil ou de uma garatuja rápida que o sujeito considera suficiente.
b) Ainda que o processo de cópia seja nitidamente inferior, relativamente à idade do
sujeito, a cópia é precisa e rica:
1 – Tempo de cópia longo, por vezes muito longo: sujeito cuidadoso, aplicado com dificuldades
para analisar rápida e racionalmente as estruturas espaciais.
2 – Tempo de cópia curto, traçado em geral fácil e firme: certos sujeitos dotados para o
desenho, copiam, por vezes, pouco racionalmente, mas fazem-no com segurança, avançando
progressivamente. Têm uma forma peculiar de analisar a realidade visual e reproduzem,
geralmente muito bem, a figura, mesmo quando se lhes pede que o façam de memória.

 PROCESSO DE CÓPIA NITIDAMENTE SUPERIOR:


a) A cópia é precisa e rica, executada em tempo normal, por vezes um pouco longo:
sujeito aplicado e preciso que estrutura racionalmente os dados visuo-espaciais.
b) A cópia é pouco precisa, há esquecimentos e o tempo de execução é frequentemente
curto: pode-se antever uma tendência para “aldrabar”, não levando a prova a sério e,
por vezes, uma certa lentidão gráfica na execução, apesar de uma elaboração
perceptiva global desenvolvida.

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Avaliação em Psicologia Clínica

B) Reprodução por Memória


 PROCESSO DE CÓPIA NITIDAMENTE SUPERIOR:
O processo de cópia foi normal ou superior, ainda que a reprodução seja nitidamente
insuficiente: neste caso, mesmo que não exista problema na percepção e organização dos
dados a fixar, a pobreza da reprodução manifesta, claramente, alterações da memória visual.
No entanto, também se pode considerar como causa desta dificuldade um bloqueio originado
por uma escrupulosidade exagerada ou, em certos casos, pelo interesse que o sujeito teria em
simular a sua falta de memória.
 PROCESSO DE CÓPIA NITIDAMENTE INFERIOR:
O processo de memória foi nitidamente inferior, a reprodução é muito pobre. Neste caso,
falha tanto a recordação como a percepção. A insuficiência na reprodução confirma o nível
inferior da elaboração visuo-espacial. Todavia, em relação à cópia defeituosa, o problema da
reprodução pode ser tão evidente que se pode colocar a hipótese de falta de memória.
No entanto, existem casos em que o tipo de cópia melhora ao passar-se ao segundo tempo da
prova: nestes casos pode-se pensar, então, numa certa lentidão do sujeito para se orientar
num complexo visuo-espacial.

A prova permite, por vezes, observações que têm valor sintomático:


1 – Trocas de posição da figura – alguns sujeitos colocam a figura na posição vertical
(originalmente está colocada na posição horizontal) antes da prova começar, ficando, assim, o
losango para cima com o vértice para a direita. A figura, colocada desta forma, torna o aspecto
de uma casa. As instruções de aplicação da prova exigem que se volte a colocar a imagem na
posição certa.
Em crianças pequenas, esta mudança de posição é relativamente frequente mas em
adolescentes e em adultos indica uma mentalidade bastante rudimentar.
Em certos casos, apesar de se corrigir a posição da figura, o sujeito copia-a colocando-a
verticalmente e assemelhando-a a uma casa com uma bandeira em cima, facto que se acentua
na reprodução de memória.
2 – A partir dos 12 anos, os tipos de cópia descritos nos grupos V, VI e VII consideram-se como
índices de provável debilidade mental.
3 – Observam-se em psicopatas – geralmente com deterioração mental – acrescentos e
sobrecargas: certos elementos repetem-se e existe uma tendência para preencher superfícies,
ou engrossar todas as linhas repassando-as. O desenho torna-se pesado, carregado e confuso.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Estes fenómenos acentuam-se geralmente quando se passa da cópia para a reprodução de


memória ainda que, por vezes, só apareçam nesta segunda fase da prova.
4 – Em crianças pequenas pode-se encontrar, também, macro e micro-grafismo, cujas
correlações com outros aspectos do comportamento mereciam ser estudadas
sistematicamente.

C) Relação entre a Cópia e a Memória

 Cópia e Memória de boa qualidade: A mais desejável. Tanto melhor quanto mais rápida e
mais bem executada.
 Cópia melhor que a memória: Dificuldades de memorização. A conjugar com os restantes
elementos obtidos com a passagem desta prova.

→Exame←

Análise Quantitativa

1º Ver o tipo de erro dado na reprodução da cópia e na reprodução da memória;

2º Cotar a imagem e somar os pontos todos

3º Ver em que percentil o sujeito se encontra (tendo em conta o total da pontuação e tendo
em conta a idade):

 Cópia: quadro II – riqueza e exactidão da cópia;


 Memória: quadro VI – riqueza e exactidão da reprodução de memória

4º Ver em que estádio de desenvolvimento em que se encontra o sujeito (tendo em conta o


percentil do mesmo e o tipo de erro dado na cópia/memória:

 Cópia: Quadro II – tabela dos tipos de cópia;


 Memória: Quadro V – tipo de contrução da figura na reprodução de memória.

Análise Qualitativa

1. Identificar o tipo de Cópia utilizada;

2. Enquadrar dados da exatidão com os normativos da população portuguesa

3. Enquadrar os tempos de execução com os normativos da população portuguesa.

4. Identificar o tipo de Cópia utilizada na memória;

5. Enquadrar dados da exatidão na memória com os normativos da população portugues

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Avaliação em Psicologia Clínica

→FIGURA B←

Figura B: Aplicada a crianças entre os 4 e os 7 anos.

1.Correcção e Pontuação

A diferença entre o quadrado e o rectângulo deverá ser nítida para que cada figura
constitua um elemento.

Consideram-se reconhecíveis: as superfícies com um contorno mais ou menos circular


(círculo) e com um contorno poligonal (outras figuras), desde que a sua posição relativa
permita relacionar cada uma delas com o elemento correspondente da figura. Por exemplo:

98
Avaliação em Psicologia Clínica

uma série de figuras vagamente poligonais, alinhadas ou desordenadas, não permitem


nenhuma identificação; pelo contrário, se estão distribuídas segundo as relações de
continuidade existentes entre o rectângulo, o quadrado e o triângulo, as superfícies permitem
identificar três figuras reconhecíveis. Por outro lado, um rectângulo, um quadrado e um
triângulo claramente desenhados, contam cada um como um elemento ainda que estejam
distribuídos desordenadamente sobre a folha.

b)POSIÇÃO DOS ELEMENTOS SECUNDÁRIOS:

o Os dois pontos do círculo bem colocados à direita………………………………………………………………………….…….. 1 ponto


(se estão sobrepostos ou muito afastados em vez de estarem um ao lado do outro – 0,5 pontos)
o A cruz colocada à esquerda do triângulo…………………………………………………………………………………….………. 1 ponto
o O semicírculo colocado no centro da base do rectângulo…………………………………………………………..……….. 1 ponto
(se não está no centro, mas dentro do rectângulo – 0,5 pontos)
o Se o número de linhas verticais do semicírculo é exacto, quer dizer, 4……………………………………………..… 1 ponto
o A diagonal correctamente colocada……………………………………………………………………………………………...... 1 ponto
o O ponto do quadrado colocado no ângulo inferior direito………………………………………………………….………. 1 ponto
o Quando este mesmo ponto é claramente mais grosso do que os dois pontos do
círculo…………………………………………………………………………………………………………………………………………..… 1 ponto
o O signo = (igual) colocado dentro do quadrado pequeno formado pela intersecção do rectângulo com o
quadrado………………………………………………………………………………………………………………….………………….… 1 ponto
(se este signo corta os lados do quadrado pequeno – 0,5 pontos)

PONTUAÇÃO MÁXIMA: 8 pontos

c)TAMANHO PROPOSICIONAL DOS 4 ELEMENTOS PRINCIPAIS:

o Círculo e triângulo de tamanho semelhante……………………………………………………………………………..……….…… 1 ponto


o Círculo quadrado e triângulo de tamanho semelhante………………………………………………………………..……….… 1 ponto
o Igualdade entre as alturas do quadrado e o rectângulo……………………………………………………………………….... 1 ponto
o Proporcionalidade das 4 formas geométricas……………………………………………………………………………….…….…. 1 ponto

Trata-se de uma igualdade aproximada de 4mm mais ou menos. Concede-se 0,5pontos se falta
o triângulo ou o círculo, desde que exista proporcionalidade entre os outros dois elementos.

PONTUAÇÃO MÁXIMA: 4 pontos

99
Avaliação em Psicologia Clínica

d)SITUAÇÃO RELATIVA DOS 4 ELEMENTOS PRINCIPAIS:

o Sobreposicão entre triângulo e círculo ou seus equivalentes reconheciveis…………………………………….….. 1 ponto


o Sobreposicão entre triângulo e rectângulo ou seus equivalentes reconheciveis………………………………….. 1 ponto
o Sobreposicão entre círculo e rectângulo ou seus equivalentes reconheciveis……………………………………... 1 ponto
o Sobreposicão entre quadrado e rectângulo ou seus equivalentes reconheciveis…………………………………. 1 ponto
(se não há mais do que uma simples justaposição ou se a sobreposição é exagerada – 1 ponto)

PONTUAÇÃO MÁXIMA: 8 pontos

Pontuação máxima da figura B: 31 pontos

2.Quadros Para a Análise dos Resultados

A) Reprodução da Cópia

(Aferição Portuguesa)

100
Avaliação em Psicologia Clínica

(Aferição Portuguesa)

B) Reprodução por Memória

101
Avaliação em Psicologia Clínica

(Aferição Portuguesa)

102
Avaliação em Psicologia Clínica

2. TESTE DE RETENÇÃO VISUAL DE BENTON

Aplicado dos 8 anos para a frente. É usado por excelência na patologia cerebral:

 Associada a quadros paranoides, depressivos graves e preocupações autistas


 Avalia Memória imediata; habilidade grafo-percetiva e visuo-espacial.
 Discriminação entre lesão cerebral e perturbação funcional devido a questões
emocionais que impedem o total funcionamento cerebral, se há ou não incidência
orgânica
 Medida sensível ao declínio cognitivo precoce
 Medida da extensão da retenção imediata em sujeitos com prejuízo da linguagem (não
implica o uso de linguagem)

Deve ser aplicado sempre tendo em consideração o QI pré-mórbido, aplica-se geralmente


após uma WAIS.

Serve para avaliar:

 Perceção-Visual;
 Memória-Visual;
 Habilidades Visuo-construtitvas;

Existem 3 Formas de Teste para cada uma das formas em função das necessidades a
avaliar:

 C
 D
 E

No entanto, existem, ainda, quatro Modos de Aplicação do teste e qualquer Forma de


Teste (C, D e E) pode ser utilizada em qualquer um dos tipos de aplicação.

 Aplicação A: 10 segundos de exposição de cada prancha e reprodução imediata da


memória por parte do sujeito;
 Aplicação B: 5 segundos de exposição de cada prancha e reprodução imediata da
memória por parte do sujeito;
 Aplicação C: O sujeito copia os desenhos que se mantém à sua vista;
 Aplicação D: 10 segundos de exposição de cada prancha e reprodução da memória
pelo sujeito, depois de um intervalo de 15 segundos;

103
Avaliação em Psicologia Clínica

A escolha do tipo de reprodução é feita em função do que se considera a gravidade da


situação e o que se quer avaliar.

Cada prova tem 10 pranchas – cada uma com 1 ou mais desenhos geométricos.

1. Normas de Correção e Pontuação:

Sistema de Avaliação da Execução do sujeito:

 Número de respostas corretas – mede a eficiência geral da execução;

Cada desenho se classifica na base do “tudo ou nada” e concede-se 1 ou 0 pontos. A


pontuação total de cada uma das formas do teste oscila entre 0 e 10 pontos.

As formas fundamentais de valorização de cada um dos desenhos das formas C, D e E.

Os critérios de avaliação são bastante flexíveis, visto que o principal interesse se centra
em apreciar a capacidade do sujeito para reter uma impressão visual e não a sua
habilidade para desenhar.

 Valorização dos erros – tem em conta o tipo de erros específicos cometidos pelos
sujeitos. Os erros específicos permitem uma análise das características qualitativas
complementar ao número total de erros que constitui um índice de eficácia geral da
execução.

Os possíveis tipos específicos de erros são classificados em seis categorias:

Omissões (e adições), distorções, perseverações, rotações, má colocação e erros de


tamanho. Cada um destes tipos de erros pode referir-se a cada uma das figuras das
várias pranchas, ou seja, podem existir 63 erros específicos nas 6 principais categorias.
Na mesma prancha pode surgir mais do que um erro.

104
Avaliação em Psicologia Clínica

Outros determinantes de uma Execução Defeituosa (para além dos erros e que nos permitem
confirmar a existência de patologia cerebral):

a) Falta de esforço adequado por parte de pacientes hostis, associados a paranoides.


b) Incapacidades de os pacientes muito deprimidos completarem as reproduções,
particularmente, nos desejos mais complexos.
c) Incapacidade de pacientes com dificuldade física para completar as reproduções,
particularmente, nos desejos mais complexos.
d) Preocupação autista nos doentes esquizofrénicos que os leva aa reproduções
irrelevantes.
e) Atitude grafomotora deficiente e escassa adaptação à tarefa do teste, por falta de
educação e experiencia adequada - – indivíduos com grande pobreza cultural/ cultura
diferente da ocidental.
f) Execução defeituosa por parte de pessoas que simulam incompetência mental.

2. Interpretação

(USAR O QI TOTAL DA WAIS-R)

→APLICAÇÃO A←

o Adultos:

 2 Pontos abaixo do esperado – Aviso DM


 3 Pontos abaixo do esperado – Sugere DM
 4 Pontos abaixo do esperado – Claro DM

105
Avaliação em Psicologia Clínica

 3 Pontos acima do esperado – Aviso DM


 4 Pontos acima do esperado – Sugere DM
 5 Pontos acima do esperado – Claro DM

o Crianças:

 2 Pontos abaixo do esperado – Aviso de dificuldade específica na memória visual e na


função visuo-motora.
 3 ou mais Ponto abaixo do esperado – Sugere a dificuldade.

106
Avaliação em Psicologia Clínica

 3 Pontos acima do esperado – Aviso de dificuldade específica.


 4 ou mais Ponto acima do esperado – Sugere a dificuldade

→APLICAÇÃO B←

A correção de 1 ponto, aplicada a partir das normas das reproduções corretas da aplicação A
(tabela acima), ofereceria resultados satisfatórios para a aplicação B. assim, uma diferença
superior a 1 Ponto entre a aplicação A e a aplicação B, permite concluir DM.

107
Avaliação em Psicologia Clínica

→APLICAÇÃO C←

o Adultos:

o Crianças:

108
Avaliação em Psicologia Clínica

O resultado vê-se em função dos acertos e erros que era esperado para o sujeito com
determinada idade e QI, são essas diferenças que dizem se há organicidade ou se está em
causa uma questão mais emocional que não permite que o sujeito utilize as suas capacidades.

Se a WAIS apresenta uma probabilidade elevada de deterioração mental, é necessário


perceber ao que está associada esta deterioração (há deterioração cerebral ou invasão de
fatores fantasmáticos que impede que o sujeito ponha em prática as suas funções), pois o não
uso das funções pode inibir a capacidade cognitiva.

Análise Qualitativa
A administração A e C podem ser muito valiosas na clínica e na avaliação das capacidades de
aprendizagem de crianças podendo dar indicação da importância dos fatores cognitivos não
verbais como componentes da incapacidade de aprender.
Também se podem identificar três tipos de dislexia em crianças e adolescentes:
1) Síndrome de perturbações da linguagem, caracterizada por deficiências da
linguagem oral, mas com as aptidões visuo-perceptivas e visuo-construtivas mantidas íntegras.
2) Síndrome de perturbações grafo-motoras e articulatórias, caracterizada por
dificuldades de articulação na fala e realizações deficitárias na administração C do TRVB, mas
mantendo íntegras as aptidões da linguagem;
3) Síndrome de perturbações da percepção visuo-espacial, caracterizada por
realizações defeituosas na administração A do TRVB, mas mantendo íntegras as aptidões de
linguagem e da articulação da fala.

109
Avaliação em Psicologia Clínica

3. TESTE GESTÁLTICO VISUO-MOTOR DE BENDER

A partir dos 6 anos, embora a sua autora considere que o teste tem validade entre os
4 e os 11 anos. O objetivo é obter, através do uso de padrões com diferentes graus de
complexidade e princípios de organização, um índice de maturação percetivo-motora,
desenvolvimento mental e afetivo.

Consiste num total de 9 cartões, cada um deles medindo 14,9 cm de comprimento por
10,1 cm de altura. Cada cartão de fundo branco é constituído por estímulos formados por
linhas contínuas ou pontos, curvas sinuosas ou ângulos, desenhados a preto.

A partir do estudo da própria autora é possível identificar que todas as figuras do


instrumento são regidas por três princípios gestálticos: princípio do fechamento, da
proximidade e da continuidade.

Sendo assim, 5 figuras do teste são formadas por linhas retas ou continuas e 4 figuras
por pontos ou círculos. A função gestalt visuo-motora é para Bender uma função fundamental
associada à aptidão de linguagem e estritamente associada às diversas funções intelectuais
(perceção visual, etc.).

Este instrumento parte da premissa que a perceção e reprodução de figuras são


determinadas por princípios biológicos e de ação sensório-motora, que variam em função do
padrão desenvolvimental.

→MODELO I←

1. Descrição do modelo

2. Critérios de Cotação

Quadrado sobre ponta sempre correto: ângulos medidos pela grade A.

110
Avaliação em Psicologia Clínica

Eixo horizontal: medida pela grade C, o eixo é considerado como horizontal, se o centro do
quadrado estiver no interior do ângulo C.
Tangência correta: existe um ponto de contacto e um só entre o círculo e o quadrado, tolera-
se um contacto de um milímetro.

Ponto de tangência do eixo:

 A forma do quadrilátero é corretamente reproduzida: há 4 lados; tolera-se um ângulo mal


reproduzido;
 Há a tangência ou quase tangência;
 A reta virtual que une os centros dos círculos e do quadrado, passa pelo ponto de
contacto; tolera-se um milímetro de separação.

Círculo igual ao modelo: contido na coroa da grade D1.

Quadrado igual do modelo: a grade D2 é utilizada para o quadrado, da mesma forma que a
grade D1 para o círculo: o quadrado deve ficar por inteiro compreendido entre os dois da
grade.

→MODELO II←

1. Descrição de modelo

2 (II)

Os determinantes do modelo são:

 Três linhas paralelas horizontes de círculos, espaçadas 5,5mm.

111
Avaliação em Psicologia Clínica

 Dez paralelas fazendo com a horizontal um ângulo de mais 115º, inclinadas a 25º sobre a
esquerda da vertical e espaçadas 12,5mm. Cada uma das 30 intersecções é o centro de um
círculo de 1,5mm de diâmetro.
Podemos considerar a figura como um conjunto horizontal de dez elementos inclinados
para a esquerda e compreende para cada um 3 pequenos círculos alinhados.

As rubricas utilizadas para este modelo são:

 A forma,
 O número,
 As relações de proximidadeseparação,
 Orientação,
 Alinhamento,
 Dimensão.
2. Critérios de Cotação

Número correto de elementos: há 11 grupos de círculos, nitidamente perceptíveis.

Nenhum contacto entre os círculos no interior de um elemento: o espaço deve ser nítido.

Todos os elementos estão inclinados para a esquerda: utiliza-se a grade B: as horizontais da


grande, estando paralelas à borda superior da folha do desenho, consideram-se que um
elemento está inclinado para a esquerda quando o centro do círculo inferior está situado à
direita da vertical, passando pelo centro do círculo superior do elemento.

Paralelismo dos elementos: os elementos são considerados paralelos, quando se pode seguir
as linhas de inclinação sucessivas com uma reta da grade B, sem modificar a direção desta.

Eixo inclinado de 0 a 5º sobre a horizontal: o eixo do modelo II é a reta que une os centros dos
círculos extremos da linha superior. Se há mais de 11 elementos, não se consideram senão os
11 primeiros. Utiliza-se a grade C. A nota é concedida se o centro do último círculo, à direita da
linha superior, é interior ao ângulo C.

Alinhamento correto dos círculos da linha superior: círculo  4 mm, o alinhamento é


considerado como correto, quando nenhum círculo da linha fica totalmente fora da zona
determinada para as tangentes aos dois círculos extremos. Grade B. A tangência exterior é
tolerada, mas a nota não é concedida se no mínimo dois círculos tangentes exteriormente
ficam situados de uma e de outra parte da zona.

112
Avaliação em Psicologia Clínica

Comprimento total da figura compreendida entre 8 e 14 cm: a nota não pode ser concedida
senão quando o número de elementos é exato. Pela grade B mede-se a distância entre os
centros dos círculos extremos da linha superior.

→MODELO III←

1. Descrição do modelo

4 (III)

Embora os termos não sejam adequados, chamaremos aos dois elementos do modelo, um
“quadrado” e “ogiva”.
Dentro do “quadrado” distinguiremos os lados e a base; na “ogiva” a curva (parte central
arredondada) e os ganchos (as duas extremidades).

Os lados do “quadrado” medem 18mm.

A “ogiva” é tangente ao ângulo direito do quadrado, o seu eixo de simetria forma com a
base do quadrado um ângulo de 30º.

As rubricas utilizadas para o modelo são:

 A forma,
 Relações de proximidadeseparação,
 Orientação geral,
 Orientação precisa,
 Dimensão.
2. Critérios de Cotação

Mesmo nível na conclusão dos dois lados: os dois vértices dos lados ficam à mesma distância
da base. Cotar utilizando as linhas paralelas da grade B.

Curvas bem-feitas: a forma da curva respeita com precisão a simetria e as proporções internas
do modelo (relação entre a profundidade e a distância entre os ganchos).

113
Avaliação em Psicologia Clínica

Ganchos bem-feitos: respeitam a forma arredondada e o sentido da abertura conformes ao


modelo. A nota não é concedida se um dos ganchos é duas vezes mais profundo ou mais
extenso que o outro.

Colocação correta da curva: a curva está situada na zona delimitada pelas medianas da base e
do lado direito do quadrado.

Ponto de tangência correto: a parte superior da curva toca o ângulo direito do quadrado.
Tolera-se urna ligeira secância ou uma ligeira separação.

Tangência: tolera-se uma ligeira secância.

Quadrado igual ao modelo: a reprodução está situada completamente no interior da zona


delimitada pelos dois quadrantes da grade.

→MODELO IV←

1. Descrição do modelo

3 (IV)

Este modelo pode ser descrito como um conjunto que compreende:

 Vértice S1;
 Três ângulos: A1 do vértice S1 (determinado por 3 pontos distantes 5mm); A2 do vértice
S2 8determinado por 5 pontos distantes 5mm); A3 do vértice S3 (determinado por 7
pontos distantes 5mm).
As distâncias em S, S1, S2, S3, são iguais entre eles e medem 15mm.

Os ângulos A1, A2, A3, medem 1:8º e SS3 é a bissectriz dos 3 ângulos.

As extremidades dos ângulos estão alinhadas.

114
Avaliação em Psicologia Clínica

Neste modelo, as relações de equidistância e de paralelismo são múltiplas, e, é


praticamente impossível considerar a evolução genética do conjunto, sendo descritos os
aspectos mais interessantes. As rubricas utilizadas são:

 A forma,
 O número,
 Relações de proximidadeseparação,
 Orientação geral,
 Orientação precisa,
 Os alinhamentos,
 As dimensões.

2. Critérios de Cotação
Maioria de pontos: é necessário para conceder a nota, que pelo menos metade dos elementos
seja constituída de pontos (nenhum branco é visível no interior).

Ângulo A1 correcto: o ângulo não está invertido; o número de pontos está correcto (3 pontos);
o centro dos três pontos ou círculos não estão alinhados (usar uma recta da grade B).

Ângulo A2 curvo: o ângulo não está invertido; o ângulo é constituído por um número qualquer
de pontos; existem muitos ângulos abertos para a esquerda, cuja sucessão determina o
aspecto curvo de A2. Comentário dos reveses: ângulo A2 chato; em A2 há um ângulo aberto
para a direita.

Ângulo A3 correcto: o ângulo não está invertido; o número de pontos está correcto (7 pontos);
não existe senão um ângulo aberto para a esquerda, no qual o vértice é o quarto ponto de A3.

Ângulo A3 curvo: o ângulo não está invertido; o ângulo é constituído por um número variado
de pontos; existem muitos ângulos abertos para a esquerda, nos quais a sucessão determina o
aspecto curvo de A3. Comentário dos reveses: ângulo chato; em A3, apresentando dois
ângulos para a direita.

Número correcto de pontos em todos os ângulos: 1 ponto para o vértice S; 3 pontos para o
ângulo A1; 5 pontos para o ângulo A2; 7 pontos para o ângulo A3.

Eixo horizontal: o eixo da figura é a direita que une o centro do vértice S ao vértice do ângulo
A3, denomina-se S3. A horizontal do eixo é medida com a grade C, fazendo coincidir o vértice C

115
Avaliação em Psicologia Clínica

com S, e uma horizontal da grade com a borda superior da folha: o eixo é considerado como
horizontal se S3 está situado no interior do ângulo C, ou a rigor sobre um lado de C.

Os quatro pontos do eixo estão alinhados: o alinhamento é considerado correto quando S1 e


S2 estão situados no todo ou em parte no interior da zona determinada pelas tangentes
comuns exteriores a S e S3. Materializa-se uma após outra tangente por meio de uma reta da
grade B.

Equidistância sobre o eixo: mede-se por meio da grade B as distâncias SS1, S1S2 e S2S3.

Simetria: comentário dos reveses: o eixo não é a bissetriz dos ângulos; os pontos do ângulo A3
não são equidistantes.

→MODELO V←

1. Descrição do modelo

7 (V)

O modelo é constituído por dois hexágonos secantes.


Um está em posição vertical, o outro em posição oblíqua; o ângulo de inclinação mede 38º.
Os dois hexágonos idênticos medem 40mm de comprimento e 15mm de largura.

Eles comportam um ângulo que se encontra no vértice superior do hexágono vertical (A), e
no vértice inferior do hexágono oblíquo, sendo A o hexágono em posição vertical e B o
hexágono em posição oblíqua.

A secância é determinada da seguinte forma: o ângulo do vértice superior e ângulo superior


direito do hexágono B fica no interior do hexágono A; o ângulo superior esquerdo do hexágono
A fica no interior do hexágono B.

As rubricas utilizadas são:

116
Avaliação em Psicologia Clínica

 A forma,
 Relações de proximidadeseparação,
 Orientação geral,
 Orientação precisa,
 Dimensões.

2. Critérios de Cotação

Hexágono A: um angulo suprimido ou mal reproduzido: um único angulo é suprimido ou mal


reproduzido, mas não invertido. Comentário dos reveses: A, B, C – um único angulo mal
reproduzido; D, F – um angulo mal reproduzido um angulo invertido; E – dois ângulos
suprimidos.

Orientação correta dos dois hexágonos: o hexágono A está disposto na vertical; o hexágono B,
colocado à esquerda do hexágono A, é reproduzido numa posição globalmente oblíqua em
relação a este último.

Secância correta: o angulo do vértice E e o angulo superior direito do hexágono B estão no


interior do hexágono A; o angulo superior esquerdo do hexágono A está no interior do
hexágono B.

Hexágono A igual ao modelo: interior da grade F.

Análise dos resultados

 Comparação do nível obtido neste teste e do nível mental global.


 Análise da pontuação global, por comparação aos êxitos para cada modelo.
 Avaliação do comportamento da criança.
 Aplicação da prova para 4 - 6 anos a crianças com mais de 7 - 8 anos, cujo resultado
global seja inferior à norma de 6 anos. Como quase não pode existir influência da
aprendizagem, considerar-se-á o melhor resultado das duas aplicações.

Interpretação Qualitativa

Clawson oferece-nos um esquema interpretativo que, apesar de se referir ao Bender


composto por nove figuras, pode servir para tirar conclusões na versão Santucci-Percheux, a
nível tanto de aspetos emocionais como orgânicos.

117
Avaliação em Psicologia Clínica

Factores organizacionais

Referem-se aos aspetos de disposição das figuras na página usada pelo indivíduo.

Sequência

Arranjo ou ordem das figuras.

1. Rígida: as figuras são desenhadas numa sequência direta na página. A colocação dos
desenhos parece forçada e sem consideração por tamanho ou forma.
2. Ordenada: sucessão regular de figuras com a exceção da realização de uma inversão
(mudança de direção).
3. Irregular: mais de uma mudança de direção mas, mudanças lógicas para possibilitar mais
espaço para uma figura.
4. Confusa: não são desenhadas mais do que três figuras em sequência e as restantes estão
espalhadas pela página.
5. Figura I no centro com as outras colocadas arbitrariamente à volta (confusa).

A ordem do desenho é uma manifestação da abordagem intelectual do indivíduo. As


crianças adaptadas normalmente arranjam as figuras numa sequência ordenada ou irregular. A
ordem rígida está associada a um funcionamento intelectual rígido. A ordem confusa está
associada com desorganização do funcionamento intelectual. O arranjo à volta da figura I está
associado com comportamentos de passagem ao ato.

Coesão na página

1. Tendência de borda: dois terços das figuras são dispostos ao longo da borda vertical de tal
maneira que não se estendem além da linha média. A borda do papel parece servir como
linha de indicação e de orientação do desenho.
2. Tendência de topo: dois terços ou mais das figuras estão dentro do terço superior da
página.
3. Tendência de base: dois terços das figuras estão dentro do terço inferior da página.

A compressão das figuras numa pequena porção da página reflete uma personalidade
que tende a se retirar do seu ambiente. A criança sente-se ameaçada pelo mundo, tal como o
percebe e tem uma necessidade excessiva de se apegar a alguém ou alguma coisa (pode ser
indicador de disfunção cerebral mínima e como forma de compensar o transtorno percetual
usando a borda da página como ponto de referência).

118
Avaliação em Psicologia Clínica

Uso do espaço branco

Outras formas não habituais de usar o espaço:

1. Arranjo expansivo: as figuras são espalhadas amplamente pela página com uma grande
separação entre as mesmas.
Indica uma criança ativa com sentimentos agressivos e rebeldes.
2. Uso de mais do que uma página: está relacionado com a expansão do desenho.
Indica uma criança ativa, auto centrada e agressiva que tende a agir de acordo com os seus
impulsos para gratificação imediata das suas necessidades (pode indicar psicopatia).
3. Papel mudado de orientação.
Comportamento de passagem ao ato e expressão de negativismo indica crianças
resistentes e rebeldes.

Modificação do tamanho da figura

A alteração de tamanho diz respeito a flutuações de pelo menos um quarto do


tamanho dos estímulos padrão.

1. Tamanho da figura aumentado: quando mais de metade das figuras apresentam um


aumento no eixo vertical ou horizontal.
Transformação no contrário da ansiedade (formação reativa) através de uma
supercompensação e expansibilidade do humor, característico de crianças expansivas e
atuantes.
2. Tamanho da figura diminuído: quando mais de metade das figuras apresentam uma
diminuição.
Revela pobreza de impulsos. Característico de uma criança inibida, que se sujeita ao
controlo adulto e reprimiu os seus impulsos e a sua responsividade emocional.
3. Tamanho da figura irregular: aumento ou diminuição progressiva do tamanho das figuras
ou, pelo menos, uma figura muito grande.

Um aumento do tamanho das figuras está associado a comportamento lábil, baixa


tolerância à frustração, comportamento rápido e descontrolado aos estímulos. Pode revelar
propensão a explosões de raiva com leve provocação. Quando existe uma diminuição
progressiva pode revelar tendência a internalizar a ansiedade que pode ser acompanhada de
conversão da ansiedade a reações somáticas.

119
Avaliação em Psicologia Clínica

Modificação da forma (Gestalt)

Fechamento

Refere-se à reprodução, sem coincidência parcial da união da figura total ou de


qualquer sub-parte da mesma. Pode apresentar os seguintes desvios:

1. Quebra de contornos;
2. Trespasse no ponto de junção;
3. Pequena separação de sub-partes;
4. Penetração de uma sub-parte por outra;
5. Deslocamento de uma sub-parte;
6. Absorção do vértice de uma sub-parte por outra.

Se cerca de metade das figuras apresentam os desvios descritos pode-se dizer que o
protocolo demonstra dificuldades de fechamento. Estes desvios são vulgares em crianças
adaptadas.

Estas dificuldades são expressão de medo ou excessivo atrito nas relações interpessoais,
podem indicar que a criança nunca teve uma relação satisfatória com um adulto significativo:
privação emocional.

Simplificação
Uso de conceitos menos maduros na reprodução das figuras. A figura é considerada
imatura quando é típica de uma idade mental abaixo da idade da criança. Os desvios têm que
estar presentes em, pelo menos, três unidades para que seja considerada regressiva:

1. Uso de círculos, traços ou vírgulas em vez de pontos ou laçadas;


2. Uso de pontos por laçadas;
3. Uso de arcos em vez de ângulos nítidos.

As figuras compostas por linhas apresentam simplificação quando:

1. A idade mental equivalente da forma básica está abaixo da idade mental da criança;
2. A junção das sub-partes não se aproxima da apropriada para a idade como é apresentada
no quadro maturacional.

120
Avaliação em Psicologia Clínica

Os sinais regressivos aparecem tanto em protocolos normais como de crianças


perturbadas ou com distúrbio orgânico, a quantidade é que faz a diferença (mais de duas
figuras).

Rotação

Rotação da figura total sobre o seu eixo (mais de 15 graus).


As crianças perturbadas emocionalmente apresentam mais pequenas rotações (15 a
25 graus) que as crianças normais. Rotações no sentido dos ponteiros do relógio parecem
indicar afeto embotado e pobreza de impulsos. As rotações no sentido inverso parecem indicar
expansibilidade e por vezes oposicionismo. Uma rotação de 90 a 180 graus, a partir dos oito
anos, é sugestiva de organicidade.

Mudança de angulação
Mudança maior de 15 graus no tamanho de qualquer ângulo.

Na figura II, a partir dos 10 anos, a presença de colunas verticais sugere a falta de expressão
manifesta de sentimento ou embotamento de afeto. A presença de arqueamentos inusitados
indica autocentramento.

Métodos de trabalho

Rasura
A criança com desenvolvimento normal manifesta a necessidade de rasurar. A criança
que não manifesta essa necessidade revela auto conceito e motivação pobres. A criança
obsessiva manifesta a necessidade de rasura numerosas vezes uma vez que o empenho
representa a tentativa de controlar a ansiedade.

Repassamento
Ato de tornar a fazer uma linha ou um ponto feito previamente. As crianças adaptadas
fazem-no na tentativa de tornar o desenho mais parecido com o modelo. As crianças
perturbadas fazem-no pouco, mas preenchem círculos ou aumentam pontos com
repassamento repetido e muitas vezes vigoroso. Isto revela uma tensão excessiva e canais
inadequados de expressão como forma de a libertar. Pode revelar imaturidade tanto física
como emocional, assim como um atraso percetual.

Tempo
Os tempos das crianças perturbadas são mais curtos, exceto para a criança obsessiva
(mais ou menos 6 minutos).

121
Avaliação em Psicologia Clínica

Qualidade da linha
O esboço, no sentido de linhas repetidas, curtas, sobrepostas, é, habitualmente,
associado a ansiedade e auto conceito pobre. Crianças que produzem linhas quebradas ou com
trespasse podem apresentar problemas nas relações interpessoais. Linhas com tremores
grosseiros são mais sintomáticas de fatores orgânicos.

Figuras emolduradas
Consiste em molduras em torno das figuras. O uso de linhas para separar as figuras é
uma maneira da criança expressar insegurança e ansiedade. Envolve sentimentos de
inadequação em relação às exigências feitas pelos adultos e pode conduzir ao isolamento.

Transtornos Neuropsicológicos
Nem todas as crianças com transtornos do S.N.C. irão deformar as reproduções dos
modelos.

Os desvios grosseiros não são característicos apenas de crianças com lesão cerebral,
pois crianças psicóticas e deficientes mentais também podem apresentam rotações, colisões e
fragmentações. No entanto, a maioria dos protocolos fornecem informações sobre o teste da
realidade e da idade mental, cabendo ao psicólogo formular ou rejeitar essa hipótese através
desse diagnóstico diferencial.

Se aparecerem quatro ou mais desvios, o psicólogo pode formular, com confiança, que
a criança possui um transtorno do S.N.C.

Os desvios são os seguintes:

1. Simplificação de uma ou mais figuras num nível de três ou mais anos abaixo da idade
mental da criança;
2. Fragmentação de uma ou mais figuras;
3. Colisão de uma figura com outra ou com a borda do papel;
4. Rotação igual ou maior do que 90 graus de uma ou mais figuras;
5. Número incorreto de unidades em três ou mais figuras;
6. Perseveração de um tipo de unidade de figura em figura;
7. Má qualidade da linha;
8. Vírgulas e/ou traços em duas ou mais figuras.

122
Avaliação em Psicologia Clínica

Simplificação
Quando a criança é incapaz de reproduzir o modelo ou não tem vontade de dispender
energia, produz uma versão simplificada do estímulo. Esta versão simplificada pode ser devida
a resistência e à hostilidade ou a causas fisiológicas. Neste último caso, a criança pode
demonstrar confusão e indecisão, esforço e verbalizar as suas dificuldades.

A diferenciação entre as razões da simplificação baseia-se no grau e extensão do


desvio.

Fragmentação
Montagem das sub-partes do estímulo de forma separada. À simplificação extrema da
forma total com nas sub-partes, chama-se fragmentação. A criança separa as partes sem
parecer ter tentado ou pretendido fazer a conexão. Esta alteração introduz a possibilidade de
transtorno cerebral, deficiência mental ou processo psicótico. A diferença com as dificuldades
de junção é que nestas houve algum esforço para fazer a conexão tangencial ou coincidente.

Colisão
Encontro de duas figuras ou de uma figura com a borda da página. É encontrada nos
protocolos de crianças impulsivas, ativas, psicóticas ou com transtornos do S.N.C. Indica um
sério defeito da individuação. No caso de lesão cerebral, o psicólogo fica com a sensação que a
criança excluiu toda a perceção visual exceto a do estímulo perdendo a perspetiva. A colisão é
um indício de transtorno do S.N.C., mas uma só não é suficiente para essa conclusão.

Rotação
Uma rotação grosseira (90 a 180 graus) é indicadora da possibilidade de perturbações
de identidade ou lesão cerebral. Só uma rotação pode ser um fracasso momentâneo mas,
nesse caso, a criança menciona o seu erro e presta-se a fazer o desenho corretamente.

Número incorreto de unidades


Refere-se à perseveração ou à mutilação por aumento ou diminuição de unidades. É
necessário um erro de duas ou mais unidades em três ou mais figuras. Encontra-se com
alguma frequência em crianças com dificuldades de leitura ou com patologia do S.N.C.

Perseveração

A anterior é considerada como perseveração dentro da figura. A perseveração de


figura a figura pode ser descrita como um atraso do estímulo, ou transporte do elemento

123
Avaliação em Psicologia Clínica

mnésico para um segundo desenho. Aparece mais frequentemente nas crianças com
transtornos do S.N.C.

Qualidade da linha
Irregularidades como tremor grosseiro do braço ou da mão, dificuldades em executar
os cantos, as linhas retas e curvas tornam-se onduladas. Estas características levantam a
questão quanto à possibilidade de um transtorno do S.N.C.

Traços e vírgulas
Quando substituem pontos, e depois dos oito anos pode ser indício de que o
desenvolvimento percepto-motor está atrasado por comprometimento do S.N.C. Podem ser
executados por crianças impulsivas, não colaborantes, que não se preocupam com a precisão.

Estes desvios são encontrados mais frequentemente em crianças com incapacidades


orgânicas do que em qualquer outro grupo clínico.

Indicadores Emocionais de Koppitz


1. Expansão: uso de mais do que uma folha - impulsividade e passagem ao ato;
2. Linha ondulada: duas ou mais mudanças abruptas na direção das linhas de pontos –
instabilidade na coordenação motora e na personalidade por fatores orgânicos ou
emocionais;
3. Repassamento: todo o desenho repassado ou reforçado – impulsividade, agressividade,
possível passagem ao ato;
4. Ordem confusa: figuras espalhadas arbitrariamente na página – fraca capacidade de
planeamento e de organização do material, confusão mental;
5. Tamanho pequeno: tamanho da metade do modelo em ambas as direções, na figura ou
nas sub-partes – ansiedade, retraimento, constrição, introversão;
6. Segunda tentativa: abandono do desenho ou de parte do mesmo, sem haver terminado, e
realização de segundo desenho noutra parte da folha – impulsividade, falta de controlo,
ansiedade.

Indicadores Emocionais conforme compilação de Groth-Marnat


1. Perseveração: disposição rígida, comum em personalidades compulsivas, mau controlo de
impulsos e teste da realidade comprometido, dificuldade de planeamento e má
concentração.

124
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Rotação: grau severo de disfunção, possível psicose, tendências oposicionistas, má


capacidade de atenção e capacidade limitada para a aprendizagem.
3. Concretismo: estados regressivos, dificuldades de pensamento abstrato (representação de
um objeto concreto em vez da figura estímulo).
4. Acréscimo de ângulos: má coordenação visuo-motora, insegurança e hesitação.
5. Superposição: insegurança e dúvida compulsiva, potencial para a atuação agressiva.
6. Distorção: capacidade comprometida para abstrair e formar categorias revelando
perturbação severa. (perda da forma por destruição da configuração).
7. Embelezamento: intensa preocupação com necessidades interiores, intensa ansiedade e
dificuldade de concentração (acréscimo de linhas que não se enquadram na configuração
com intenção estética).
8. Omissão: dificuldade de síntese e de integração, perturbação da coordenação de atos
motores, rutura de funções do Ego.
9. Abreviação: possível negativismo e/ou baixa tolerância à frustração (redução do número
de unidades).
10. Falta de fechamento: ansiedade, hesitação, dúvida sobre si mesmo, dificuldade em
terminar tarefas, relações e difíceis e provocadoras de ansiedade, comportamentos de
passagem ao ato e agressão.
11. Expansão: controlo emocional insuficiente, impulsividade, atos agressivos, expansividade
compensatória de sentimentos de inadequação.
12. Redução do tamanho: Sentimentos de inadequação, insegurança, tendência ao
retraimento e constrição emocional.
13. Arranjo rígido, metódico: rigidez e meticulosidade, tentativa de criar um sentimento de
segurança com sentimentos subjacentes de vulnerabilidade e inadequação.
14. Arranjo confuso, caótico: fortes sentimentos de ansiedade, desorientação, má
compreensão e julgamento comprometido.
15. Arranjo constrito, comprimido: depressão, insegurança e sentimentos de inferioridade.

125
Avaliação em Psicologia Clínica

TABELA DE RESULTADOS PARA OS CINCO MODELOS

Mod. I Mod. II Mod. III Mod. IV Mod. V

(Máx. 15 pontos) (Máx. 16 pontos) (Máx. 12 pontos) (Máx. 22 pontos) (Máx. 16 pontos)

Idade Q1 Méd Q3 Q1 Méd Q3 Q1 Méd Q3 Q1 Méd Q3 Q1 Méd Q3

6 anos 2 4 5 3 5 6,5 3 5 7 3 5 7 1 3 4,5

7 anos 4 7 9 5 7 8 5 6 8 5 7 9 2 5 8

8 anos 5 8 10 6 8 10 6 8 9 6 9 12 4 6 9

9 anos 6 9 11 8 8 11 8 10 11 7 9 13 6 8 12

10 anos 8 10,5 12 8 10 12,5 8 11 12 8,5 12 15 8 12 14

12 anos 9 11 12 10 11,5 13 9 12 12 10 15 18 11 13 15

14 anos 9 11 12 10 13 13 9 11 12 13 16 19 12 14 15

Escala de Maturação

Escala de maturação referente aos nove modelos originais.

126
Avaliação em Psicologia Clínica

ESCALAS SINTOMÁTICAS
Sintoma – substituto de uma satisfação pulsional que não se deu porque o recalcamento
transformou o prazer em desprazer. Isto reporta ao Modelo Pulsional. O recalcamento impede
a satisfação e a recarga para o exterior. É comum haver sintomas que aparecem e
desaparecem rapidamente. É necessário ver em que momento da vida aparece e também tem
a ver com questões orgânicas, ou seja, a interpretação não depende de um único
acontecimento. Muitos sintomas são somáticos.

Os sintomas evoluem, transformam-se, alguns desaparecem ou dão lugar a outros – crítica a


teorias mais breves, como a cognitiva. Os sintomas dividem-se em estados ansiosos (e crises
de angustia) e estados depressivos.

1. Estados Ansiosos
Algo causa angústia de frustração que faz sentido e traduz-se em graus diferentes. O
estado afetivo doloroso que consiste num sentimento penoso, que dá conta de um perigo
impreciso, eminente, a qualquer momento. Aparece como um sintoma geral de alarme,
em muitas descrições teóricas, com inscrição psicodinâmica, onde a noção de conflito
desempenha o papel principal. Uma crise de angústia é pontual, em relação a algo
especifico e difere de estados ansiosos crónicos que são mais concretos e mais associado a
planos somáticos.

Tipos de Ansiedade/Angústia
Ansiedade normal – experiência de ansiedade que é ajustável e habitual sentir quando
estamos expostos a uma situação difícil, associa-se a ideias pessimistas perante um
acontecimento geral.

Ansiedade reativa – pode ser causada por um acontecimento traumático, individual ou


coletivo, algo que o sujeito vivencia como insuportável: pode originar reações de
ansiedade aguda, reações as situações prolongadamente, reações a frustrações afetivas,
etc.

Ansiedade neurótica – nos estados neuróticos constitui-se como sendo o principal sintoma.

Ansiedade psicótica – em todas as psicoses. É particularmente grave, pelo maior risco


suicida que apresenta.

127
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Estados Depressivos

Sintoma clínico constituído por dois sintomas fundamentais:

o Humor depressivo – implica uma visão pessimista do mundo e de si próprio


o Inibição das funções – uma diminuição global das forças pulsionais, dos processos
intelectuais, da atividade motora.

É importante reconhecer a ansiedade que normalmente acompanha a depressão e a sua


variedade clínica, para que se possa avaliar o seu risco de suicídio que em algumas
situações é muito elevado. Frequentemente aparece o suicídio ou a tentativa nestes
estados.

Classificação

o Depressões primárias:

Endógenas – episódios maníacos (formas bipolares)

Exógenas – depressões neuróticas (fazem parte de um determinado tipo de


funcionamento de um tipo de personalidade) e depressões reativas.

o Depressões secundárias:

Depressões somáticas

Depressões associadas ao consumo de substâncias, esquizofrenia, neurose de carácter,


patologias, etc.

Classificação francesa – J. Bergeret

o Depressão neurótica – assenta numa relação de objeto genital (baseada no conflito


edipiano), surge como sintoma-compromisso e que aparece na sequência do retorno
do recalcado, recalcamento deixa de funcionar, o conflito entre ego e superego
intensifica-se e surge o recalcado.
o Depressão psicótica – baseia-se na recusa da realidade e numa relação de objeto
funcional (afeto não emerge, a relação é basicamente funcional), numa angústia de
aniquilamento.
o Depressão limite – corresponde a uma descompensação do estado limite. Baseia-se
numa relação de objeto anaclítica, numa angústia de perda do objeto.

128
Avaliação em Psicologia Clínica

1. INVENTÁRIO DE ESTADO-TRAÇO DE ANSIEDADE (S.T.A.I.)

Objetivo: avaliar se a ansiedade aparece como estado ou traço da estrutura psíquica do


sujeito.

População alvo: jovens e adultos

Poderá ser útil em diversos campos de investigação mas também em todas as formas
de perturbação emocional. Permite perceber se as características da ansiedade são reativas a
determinada situação ou situações ou se é um traço de personalidade.

2. INVENTÁRIO DEPRESSIVO DE BECK (B.D.I)

Objetivo: Avaliar a depressão do sujeito. É um questionário com 21 grupos de sintomas que


cobrem toda a sintomatologia depressiva como sentimentos de fracasso, perda de apetite, etc.
População-alvo: Jovens e adultos.
Possibilita uma avaliação da depressão, dando conta de quais são as suas principais
características mas não permite fazer um diagnóstico de depressão, apenas a intensidade do
estado depressivo do sujeito.

É constituído por 21 itens que estão divididos em duas sub-escalas: Sub-Escala


Cognitiva-Afectiva e Sub-Escala Somática.

Essencialmente, consiste num inventário para medir a severidade de episódios


depressivos. É constituído por diferentes itens relacionados com sintomas depressivos como a
desesperança, irritabilidade e as cognições como a culpa ou sentimentos de estar a ser
castigado, bem como sintomas físicos como a fadiga, perda de peso e a diminuição da libido.
Este teste tem como objetivo fornecer as principais avaliações de aspetos da personalidade,
através de afirmações que abrangem o estado físico e mental, assim como atitudes morais e
sociais do sujeito.

129
Avaliação em Psicologia Clínica

Sub-Escala Cognitiva-Afectiva Sub-Escala Somática

1. Estado de humor 15. Incapacidade de trabalhar


2. Pessimismo 16. Perturbação do sono

3. Sentimento de fracasso 17. Fatigabilidade

4. Sentimento de insatisfação 18. Perda de apetite

5. Sentimento de culpabilidade 19. Perda de peso

6. Sentimento de auto-punição 20. Hipocondria

7. Ódio a si mesmo 21. Perda de líbido

8. Auto-acusação
9. Desejos suicidas
10. Crises de choro
11. Irritabilidade
12. Afastamento social
13. Incapacidade de decisão
14. Distorção da imagem corporal

Cada item contém um conjunto de 4 ou 5 afirmações que o sujeito deve seleccionar de


acordo com o seu estado de espírito nesse dia. Em cada uma das categorias as afirmações
estão listadas de forma crescente de gravidade, mostrando a 1ª afirmação a ausência de
sintoma. O resultado final do Inventário é obtido através da soma de cada um dos 21 itens
num total de 63 pontos.

1. Interpretação dos Resultados

130
Avaliação em Psicologia Clínica

(População Portuguesa)
Score total Nível de depressão
0-11 Ausência de depressão
12-17 Depressão Ligeira
18-24 Depressão Moderada
25-63 Depressão Grave

→Exame←

Análise Quantitativa

Enquadrar o valor total do Inventário de Beck na cotação geral para se estabelecer o quadro
depressivo.

Análise Qualitativa

Interpretar quadro depressivo, relacionando-o com outros elementos já aplicados ao sujeito


(entrevista clínica, wais/wisc, matrizes de Raven…).

3. QUESTIONÁRIO HOLANDÊS DO COMPORTAMENTO ALIMENTAR

Objetivo: avalia o comportamento alimentar (que abrange o conjunto de atitudes e factores


psicossociais implícitos na selecção e decisão de quais os alimentos a ingerir) e o estilo
alimentar (que diz respeito à categorização do comportamento alimentar, de acordo com as
dimensões psicológicas atribuídas ao estilo, com o objectivo de se estabelecerem diferenças
individuais consideradas como determinantes do peso em excesso e do peso deficitário).

É um questionário composto por 33 itens segundo uma Escala de Likert de cinco pontos
(nunca/raramente/às vezes/frequentemente/muito frequentemente) dividido em 3 escalas:
escala de Restrição (10 itens), escala de Ingestão Externa (10 itens) e escala de Ingestão
emocional (13 itens).

Avalia as seguintes dimensões: restrição alimentar, ingestão emocional (ingestão determinada


por factores emocionais) e ingestão externa (ingestão determinada por factores externos).

131
Avaliação em Psicologia Clínica

População alvo: jovens (a partir dos 9 anos) e adultos com perturbações do comportamento
alimentar (anorexia, bulimia, ingestão compulsiva, obesidade).

1. Interpretação das escalas

Escala de Restrição → esforço que o sujeito exerce regularmente para controlar o seu apetite
e ingestão de alimentos, envolvendo-se em dietas.

Escala de Ingestão Emocional → perda de controlo da ingestão por exposição a factores de


stress emocional, implicando desinibição alimentar nessa situação.

Escala de Ingestão Externa → desinibição ou perda de controlo que ocorre devido a factores
externos intrínsecos aos alimentos ou à situação social em que são ingeridos.

Um resultado elevado numa das dimensões implica um modo de reagir aos alimentos que
se traduz num padrão ou num estilo alimentar.

4. QUESTIONÁRIO DE IDEAÇÃO SUICIDA

Objetivo: avaliar a gravidade dos pensamentos suicidas.

População alvo: adolescentes e jovens adultos.

É constituído por 30 itens, variando as respostas de 1 (“o pensamento nunca ocorreu”) até 7
(“o pensamento ocorreu sempre”. Os 30 itens são pontuados de 0 a 6, numa direcção
patológica, sendo a pontuação máxima de 180, indicando cognições suicidas ocorrendo quase
todos os dias.

Uma pontuação igual ou superior a 41 pode ser um indicativo de significativa psicopatologia e


de potencial risco de suicídio.

132
Avaliação em Psicologia Clínica

5. SCL-90 (SYMPTOM CHECKLIST-90)

Inventário multidimensional que avalia o grau de intensidade e dimensão dos


sintomas psicológicos. Medida de autopreenchimento.

Não se trata de uma medida de personalidade embora permita aceder a um perfil, é


uma medida de avaliação de sintomas. Sabe-se que em determinadas patologias predominam
determinados sintomas, a escala permite aceder a intensidade desses sintomas. Não permite
fazer diagnóstico de funcionamento, permite ver que o individuo em determinadas dimensões
sintomáticas apresenta parâmetros mais ou menos elevados.

9 Dimensões primárias de sintomas:

o Somatização
o Obsessividade-compulsividade
o Sensibilidade interpessoal
o Depressão
o Hostilidade
o Ansiedade fóbica
o Ideação paranóide
o Psicoticismo

3 Índices globais de distúrbio:

o Índice geral de sintomas (IGS) – somatório dos sintomas dividido por 90 (num índices da
escala)
o Índice de sintomas positivos (ISP) – todos os sintomas acima de zero; somatório de todos
os sintomas positivos, dividido pelo número de sintomas positivos
o Total de sintomas positivos (TSP)

Permite aceder ao gráfico do perfil sintomático: valor de corte = 1,7 – valor de corte em
clínica para que sintoma seja clinicamente significativo.

133
Avaliação em Psicologia Clínica

6. BSI – BRIEF SYMPTOM INVENTORY

(versão reduzida da SCL-90, criada pela autora)

É um inventário de auto resposta com 53 Itens onde o individuo deverá classificar o grau
em que cada problema o afectou durante a última semana, numa escala tipo Likert que varia
entre 0 (“nunca”) a 4 (“muitíssimas vezes”).

Avalia sintomas psicopatológicos em termos de 9 dimensões de sintomatologia:

Somatizaçãoreflete o mal-estar do funcionamento somático como dores localizadas e


outros equivalentes somáticos da ansiedade. Itens: 2, 7, 23, 29, 30, 33 e 37.

Obsessão-Compulsãoinclui cognições, impulsos e comportamentos que são experienciados


como persistentes e aos quais o individuo não consegue resistir. Itens: 5, 15, 26, 27, 32 e 36.

Sensibilidade Interpessoalsentimentos de inadequação pessoal, inferioridade,


principalmente na comparação com outras pessoas. Auto depreciação, hesitação, desconforto
e timidez nas interações sociais são características desta dimensão. Itens: 20, 21, 22 e 42.

Depressãosintomas de afeto e humor disfórico, perda de energia vital, falta de motivação e


de interesse pela vida. Itens: 9, 16, 17,18, 35 e 50.

Ansiedadesintomas de ansiedade generalizada e de ataques de pânico, nervosismo, tensão


e componentes cognitivas que envolvem apreensão tal como alguns correlatos somáticos.
Itens: 1, 12, 19, 38, 45 e 49.

Hostilidadeinclui pensamentos, emoções e comportamentos característicos do estado


afetivo negativo de colera. Itens: 6, 13, 40, 41 e 46

Ansiedade Fóbicaresposta de medo persistente, a uma pessoa, local ou situação especifica,


que sendo irracional e desproporcionado em relação ao estimulo, conduz a comportamento de
evitamento. Itens: 8, 28, 31, 43 e 47.

Ideação Paranóidepensamento projetivo, hostilidade, suspeição, grandiosidade,


egocentrismo, medo da perda de autonomia e delírios são reflexos desta perturbação. Itens: 4,
10, 24, 48 e 51.

Psicoticismoescala desenvolvida de modo a representar este constructo como uma


dimensão continua da experiencia humana. Abrange itens indicadores de isolamento, de estilo
de vida esquizoide e sintomas primários de esquizofrenia como alucinações e controlo do
pensamento. Itens: 3, 14, 34, 44 e 53.

134
Avaliação em Psicologia Clínica

E avalia 3 índices globais que constituem avaliações sumárias de perturbação emocional,


representado aspectos diferentes de psicopatologia (IGS- Índice Geral de Sintomas; TSP- Total
de Sintomas Positivos e IST- Índice de Sintomas Positivos).

1. Cálculos e Interpretação

1º PASSO → Calcular o total de cada dimensão.

𝑇𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑐𝑎𝑑𝑎 𝑑𝑖𝑚𝑒𝑛𝑠ã𝑜


2º PASSO → Calcular 𝑁º 𝑑𝑒 𝑖𝑡𝑒𝑛𝑠

𝑇𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑎 𝑝𝑟𝑜𝑣𝑎
3º PASSO → IGS = 53

4º PASSO → TSP = somatório do nº de itens de todas as dimensões (menos daquelas cujo


resultado é inferior a 1.7).

𝑇𝑂𝑇𝐴𝐿
5º PASSO → ISP =
𝑇𝑆𝑃

É provável ser encontrado um valor igual ou superior a 1.7 no ISP em pessoas


perturbadas emocionalmente. → Sintomas são clinicamente significativos.

A simples leitura dos índices globais permite avaliar, de forma geral, o nível de
psicossintomatologia apresentado:

135
Avaliação em Psicologia Clínica

ESCALAS NOSOGRÁFICAS
Aparecem para a necessidade de sistematização e identificação nosográfica das
entidades psiquiátricas. Pesquisa e teorização do campo psicopatológico.

A descrição dos sintomas e classificação do fenómeno mental e estruturação de uma


nosologia da doença mental.

1. INVENTÁRIO MMPI-2 – INVENTÁRIO DA PERSONALIDADE MULTIFÁSICO

Indicação: disfunções personalidade, problemáticas atuais (perfil de personalidade atual),


personalidade e comportamentos interpessoais. Para indivíduos com idade >16 anos com
motivação e boa capacidade de concentração. Necessário que exista muita instrução, isto é,
maturidade.

Dimensões avaliadas: tem escalas de validade para aferir se o protocolo é válido ou não.

Escalas de validade:

o (L) mentira
o (F) incoerência – frequência das incoerências
o (K) correção, pontuação interrogante (para itens não preenchidos, dúvidas, etc.)

10 Escalas básicas:

o Hipocondria
o Depressão (escala muito sensível)
o Histeria
o Desvio psicopático
o Masculino/feminino
o Paranoia
o Psicastenia (sintomas obsessivos-compulsivos)
o Esquizofrenia (resultado deve ser analisado com cuidado, sempre em associação com
outra escala, pois é das escalas menos potentes do MMPI)
o Hipomania
o Introversão social

136
Avaliação em Psicologia Clínica

15 Escalas de conteúdo:

Ansiedade, medos, obsessão, depressão, preocupações com a saúde, pensamento


extravagante/bizarro, hostilidade, cinismo, condutas antissociais, comportamento tipo A, baixa
autoestima, mal-estar social, problemas familiares, interferência laboral, indicadores negativos
de tratamento.

18 escalas suplementares e 31 subescalas Harris-Longoes (1955)

Resultados e perfil de funcionamento:

O perfil é feito com base nas notas T, uma vez que cada valor bruto corresponde a uma
nota T. os valores que se encontram abaixo ou dentro do valor normativo não são
significativos, apenas os que se encontram acima têm valor clínico.

Escalas clínicas:

Valores T entre 30 e 70 correspondem a valores normativos. Valores acima de 70 (notas T) são


considerados clinicamente significativos, exceto para a escala da depressão onde se considera
que valores acima de 65 já são clinicamente significativos.

Interpretação resultados

1º - Escala a escala.

2º - Código de 2 dígitos – avaliação conjunta das duas escalas clínicas com valores mais
elevados (ver psicodiagnóstico).

Desvantagem – muitas perguntas e repetição das mesmas. Pode induzir em erro.

1. Correcção e Codificação
1) Correção Manual das Folhas de Resposta
 3 Escalas de Validade;
 10 Escalas Clínicas;
 15 Escalas de Conteúdo;

PD (Pontuação Direta) – contar número de respostas que aparecem debaixo das pequenas
caixas do modelo (ignorando as rodeadas) – basicamente, número de respostas para cada
categoria.

137
Avaliação em Psicologia Clínica

2) Elaboração do Perfil Básico

De seguida enquadramos a PD de cada categoria nesta Tabela e convertemos o valor da


pontuação direta em T – As tabelas estão impressas e existem para casa tipo de escalas e para
os diferentes sexos.

 3 Escalas de Validade;
 10 Escalas Clínicas;
 15 Escalas de Conteúdo;

Traçam-se e unem-se de forma separada no perfil individual. Os valores das pontuações T


das PD (pontuações diretas) de cada uma das escalas que foram transformados em cima, são
os valores unidos.

3) Codificação

Serve para resumir os padrões obtidos na Prova, visto que reduz uma amplitude de perfis
obtidos para algo mais manejável. Na codificação se converte um número a cada escala clínica:

 Hs converte-se em 1;
 D converte-se em 2;
 Hy converte-se em 3;
 Pd converte-se em 4;
 Mf converte-se em 5;
 Pa converte-se em 6;
 Pt converte-se em 7;
 Sc converte-se em 8;
 Ma converte-se em 9;
 Si converte-se em 0;

Estes números são a base para os padrões de codificação dos perfis.

138
Avaliação em Psicologia Clínica

1º - Escrever debaixo os números que representam as escalas clínicas por ordem decrescente
segundo a pontuação T do sujeito, desde o maior para o menor.

Neste exemplo, a escala mais alta é Pd = 94, pelo que o número 4 deverá ser o primeiro no
código.

Código: 4 2 6 8 3 7 1 0 9 5 F L K

139
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Interpretação

1 → Interpretar cada escala tendo em conta o valor T.

Conversão da Pontuação Directa em valores T:

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Avaliação em Psicologia Clínica

141
Avaliação em Psicologia Clínica

Interpretação da Pontuação Directa:

142
Avaliação em Psicologia Clínica

Interpretação das Escalas de Validade:

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

Interpretação das Escalas Clínicas:

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

2 → Interpretar o código

151
Avaliação em Psicologia Clínica

152
Avaliação em Psicologia Clínica

→Exame←

Análise quantitativa

1. Verificar se as pontuações das escalas de validade podem ser válidas.

2. Verificar se os valores de cada escala clínica se encontram dentro da média.

Análise Qualitativa

1. Mencionar e sugerir possíveis explicações para valores que estão fora da média.

2. Interpretar o Código.

3. Relacionar dados obtidos com elementos anteriormente utilizados (entrevista clínica,


wais…)

4. Enquadrar quadro clínico e possível diagnóstico.

2. MINI-MULT

Este teste corresponde a uma versão reduzida do MMPI – inventário multifásico de


personalidade de Minnesota, não composto pela escala básica introversão social e
masculino/feminino. Destina-se a sujeitos entre os 16 e os 55 anos que saibam ler e escrever.

O Mini-Mult fornece avaliações dos principais aspetos da personalidade, através de


afirmações que abrangem o estado físico e mental, assim como atitudes morais e sociais do
sujeito, às quais ele terá de responder utilizando os termos “verdadeiro” ou “falso”.

As caraterísticas de personalidade do sujeito, bem como o seu perfil clínico,


determinam-se depois das respostas dadas às escalas clínicas e às escalas de validade.

1. Normas Mini-Mult

Índice de dissimulação F-K

De -11 a 11 inclusive, “o perfil encontra-se válido”.

De infinito a -11 exclusive “o perfil encontra-se inválido”.

De 11 exclusive a infinito “o perfil encontra-se inválido”

153
Avaliação em Psicologia Clínica

Índice de Ansiedade (AI)

Acima de 50 a “Ansiedade é um componente significativo”

Inferior a 50 a “Ansiedade não é um componente significativo”

Quociente de Internalização (IR)

Acima de 1 “sujeito que tende a ter muitos sintomas somáticos e sentimento subjectivo de
stress”.

Inferior a 1 “sujeitos que tendem à actuação e externalização dos conflitos”.

Valores concomitantemente altos de AI e IR encontram-se em “sujeitos caracterizados por


ansiedade e depressão”.

Valores concomitantemente baixos de AI e IR encontram-se em “sujeitos caracterizados por


passagens ao acto.

AV

Acima de 70: “presença de psicopatologia”

Abaixo de 70: “não presença de psicopatologia”

Imagem desfavorável (F – K ≥ 12): perfil das escalas clínicas em sentido ascendente e em


dentes de serra em que os picos correspondem às escalas pares (D, Pd, Pa e Sc). L e K muito
baixos em relação a F, que é muito elevada e mais elevada do que as escalas clínicas. Em caso
de perturbação grave, F é muito elevada, mas geralmente mais baixa do que a mais alta das
escalas clínicas.

Imagem favorável (F – K ≤ -18): perfil das escalas clínicas é geralmente plano e a maior parte
delas situam-se abaixo da média (T=50) F é muito baixa em relação a L e K, que ultrapassam
frequentemente a nota T=70.

Notas muito baixas na escala Hipocondria: mesmo em sujeitos normais é raro a nota bruta
em Hs ser inferior a 3. Este índice só diz respeito à falsificação no sentido favorável.

Elevações acima de T=70 são mais confiáveis em termos de diagnósticos, pois são
características da dinâmica individual.

Elevações entre T=60 e 65 correspondem a tendências do sujeito

154
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Interpretação

Escalas de validade:

o Escala L – Escala de mentira → deteta a tendência excessiva para se apresentar de forma


excessivamente favorável ou desfavorável; Cerca de 95% dos sujeitos ditos “normais”
respondem V a este tipo de itens; Um resultado elevado representa tendência para se
apresentar sob um apeto demasiado favorável.
o Escala F – escala de infrequência → proporciona uma medida de tendência para o sujeito
ser sincero. O resultado corresponde a respostas raramente dadas por sujeitos sem
perturbações psicológica; Nota T >70 pode encontrar-se em: a) incompreensão dos itens
ou respostas dadas ao acaso; b) falsificação deliberada no sentido desfavorável; c)
perturbação psicológica série (psicótica); Sujeitos normais mas não conformistas: 60 < T >
70.
o Escala K – escala ou fator de correcção → relacionada com uma atitude de defesa.
Resultado elevado significa uma atitude hiperdefensiva e resultado baixo revela
tendência para autocrítica; A distorção do perfil recai apenas sobre algumas escalas
clínicas e com peso diferente. Depende do nº de itens da escala K que pertencem a cada
uma das escalas clínicas; Para eliminar o efeito desta distorção adiciona-se à nota bruta
de cada escala atingida um valor fraccionário ou total da nota bruta de K.

Escalas clínicas:

o Hipocondria (Hs): sintomas determinados por queixas somáticas. Tem correlação


elevada com a escala Histeria (Hy).

T ≤ 50  elevação moderadamente baixa → sujeitos ativos, capazes e responsáveis ou até


moralistas; associado a ausência de preocupações somáticas.

T ≥ 65  elevação alta → sujeitos imaturos, autocentrados, queixosos, pessimistas, e


narcisicamente egocêntricos; a ansiedade não é um sintoma característico.

o Depressão (D): sentimentos de desânimo, pessimismo e desespero, hipersensibilidade.

Associada às escalas (Hs) e (Hy) constituem a “tríada neurótica” cuja elevação relativa facilita o
diagnóstica diferencial entre as perturbações neuróticas.

65 ≤ T ≤ 75 -A elevação na escala D indica que as defesas contra a ansiedade não são
suficientes.

Se T≥80 existe um quadro de depressão clinica eventualmente tendências suicida, cujo risco é
maior se houver elevação noutras escalas (4 (Pd) e 9 (Ma) ou 4, 7 (Pt), 8 (Sc) e/ou 9).

155
Avaliação em Psicologia Clínica

o Histeria (Hy): queixas físicas específicas ou mal estar, negação de problemas, ausência
de ansiedade social.

T ≥ 60  uso da negação; investigar a forma como operam os mecanismos de defesa.

T ≥ 80  sugere sintomatologia clássica de conversão; associado a uma tendência para evitar a


consciência dos conflitos internos, mantendo-os ao nível inconsciente e canalizando-os para
sintomas somáticos.

Nota: As elevações desta escala parecem associar-se a uma tendência para evitar a consciência
de conflitos internos, mantendo-os a nível inconsciente e canalizando-os através de sintomas
somáticos: repressão.

Valores elevados nestas 3 escalas indicam um funcionamento do tipo neurótico

o Desvio Psicopático (Pd): desajustamento social, especificamente os transtornos de


carácter associados a défices de controlo dos impulsos que levam a passagem ao ato.

Elevação nesta escala isolada é interpretada como indicando imaturidade e impulsividade;


estes sujeitos usam a externalização, a actuação ou a intelectualização como mecanismos de
defesa

Elevação combinada com a escala 9, indica a possibilidade elevada de comportamento


impulsivo;

Elevação combinada com a escala 8, associa-se a um comportamento anti-social, num nível


que sugere psicose.

o Paranoia (Pa): sintomas de suspeição, hipersenbilidade interpessoal, compatíveis com


o uso de defesas paranóides podem encontrar-se me sujeitos com T < 35.

Elevação acentuada é típica de sujeitos psicóticos com sintomas paranóides.

Elevação combinada com a escala (Sc) é muito eficaz para o diagnóstico de esquizofrenia
paranóide.

o Psicastenia (Pt): (distúrbio obsessivo-compulsivo): avalia o padrão neurótico incluído


aspetos fóbicos e obsessivo-compulsivos.

Uma elevação isolada pode ser interpretada como ansiedade e pensamento obsessivo, medos,
auto-desvalorização e baixa auto-confiança.

 Pt < 70 – moderado;
 80 < Pt < 89 – marcante;

156
Avaliação em Psicologia Clínica

 Pt= 90 - severo

Elevação combinada com a escala 2 (D) sugere desconforto interno

Elevação combinada com a escala 8 (Sc):

 7 > 8  luta contra a ansiedade relacionada com processo psicótico


 7 < 8  processo psicótico pode considerar-se instalado
o Esquizofrenia (Sc): sujeitos que se caracterizam pela presença de ideias e
comportamentos bizarros e inusitados e pela qualidade específica de afetos.

Escala fraca porque a sintomatologia é muito heterogénea e complexa para ser avaliada por
uma escala. Há melhoria com a correção de K, mas é preciso muito cuidado no diagnóstico
mesmo quando há elevações importantes.

T < 80, o diagnóstico de esquizofrenia tem de ter outros dados.

Elevações até T< 90 podem ser encontradas em sujeitos extremamente ansiosos, em pré-
psicóticos e em perturbações borderline. Estas elevações são associadas com dificuldades nas
interações sociais, afastamento, alienação, com ênfase na fantasia inferior, dificuldades na
comunicação que se relacionam com problemas de concentração e de pensamento.

o Hipomania (Ma): estado hipomaníaco e casos leves de mania, caracterizados por


hiperatividade, sentimentos de grandiosidade, excitação e fuga de ideias.

Elevações nesta escala, dependendo do perfil, podem ser encontradas em personalidades


psicopáticas, na forma agitada de depressão, em síndromes organico-cerebrais e em estados
hipomaníacos.

T = 65 podem estar associadas com super atividade ineficaz, uso de negação como defesa e
auto-conceito grandioso.

Elevação nesta escala com baixo valores na (D), ou o inverso, pode sugerir perturbação bipolar.

Resultados muito baixos nesta escala sugerem a existência de quadro depressivo severo
mesmo quando não haja confirmação pela elevação da (D).

157
Avaliação em Psicologia Clínica

3. Interpretação Clínica dos Perfis

Notas sobre interpretação de perfis:

Uma grande elevação pressupõe um estado de doença grave;

Existe um caráter fásico frequente em que se associam particularmente o grupo de tríade


neurótica: Hs, D e Hy; e o Grupo psicótico ou tríade psicótica que compreende as escalas Pa, Pt
e Sc;

Notas sobre validade de perfis:

Na distribuição das notas, a normalidade entre 50 e 70, sendo 50 o limite mínimo e 70 o limite
máximo.

1º Grupo dos perfis neuróticos, é composto por 3 variações:

a) Perfil neurótico banaleste perfil corresponde às neuroses de angústia e de histerias de


angústia, sem grande expressão depressiva, mas eventualmente com sintomas físicos. Ele
manifesta-se por uma elevação entre 70 e 80, nas três escalas da tríade neurótica (Hs, Hy e D),
sendo a D a mais elevada de todas. Este facto não é indicador de presença de um elemento
depressivo mas sim de ansiedade. Pode existir elevação de Pt.

b) Perfil neurótico graveEste perfil corresponde às neuroses com acentuação de tríade


neurótica, e do perfil anterior (acima de 70).

c) Perfil psicossomático Este perfil caracteriza-se por uma elevação da tríade neurótica, com
elevação máxima sobre Hs e Hy. O facto do D ser pouco expresso responde à perturbação de
ansiedade convertida em manifestações somáticas. É impossível distinguir esse perfil do da
histeria de conversão.

2º Grupo dos perfis psicóticos, é composto por duas variações:

a) Perfil psicótico Difásicoeste perfil caracteriza-se por uma elevação na tríade neurótica (Hs,
D e Hy) e por uma elevação mais acentuada na tríade psicótica (Pa, Pt, Sc) à direita. Na tríade
psicótica o Pt está frequentemente a mais elevada. Outras vezes é a escala Sc que é a mais
elevada. Estes perfis correspondem normalmente às esquizofrenias delirantes.

b) Perfil psicótico monofásicoé semelhante ao anterior, só que a tríade neurótica é inferior a


70.

3º Grupo dos perfis psicopáticos, é composto por duas variações:

a) Perfil típico da personalidade psicopáticaé caracterizado por uma elevação isolada da


escala Pd.

158
Avaliação em Psicologia Clínica

b) Perfil psicopático associado Surgem associações que mascaram as manifestações clínicas.


Escala Ma: combinação frequente nas perturbações do comportamento dos adolescentes.
Escala Pa: Acentua-se a gravidade. Sinal de mau prognóstico.

4º O perfil Paranóico

É possível em sujeitos com dificuldades profissionais: conflituosos com os superiores.

Muitas vezes faz-se acompanhar por uma elevação da escala L e Pa

→Exame←

Análise quantitativa

1. Verificar se as pontuações das escalas de validade podem ser válidas.

2. Verificar se os valores de cada escala clínica se encontram dentro da média.

Análise Qualitativa

1. Mencionar e sugerir possíveis explicações para valores que estão fora da média.

2. Interpretar o Código.

3. Interpretar o Índice de Dissimulação;

4. Interpretar índice de Ansiedade

5. Interpretar Quociente de internalização.

6. Relacionar dados obtidos com elementos anteriormente utilizados (entrevista clínica,


wais…)

7. Enquadrar quadro clínico e possível diagnóstico.

159
Avaliação em Psicologia Clínica

3. NEO-PI-R

Inventário de personalidade. Operacionalização da teoria dos big five. Aplicada a partir dos 17
anos.

Avalia 5 dimensões da personalidade:

Permite um esquema compreensivo, a descrição do posicionamento do sujeito face a


estas dimensões, que sintetiza o seu estilo emocional, interpessoal, experiencial, atitucional e
motivacional. Pode-se desenhar um perfil que especifica os traços do sujeito em cada domínio.

Vantagens: Aplicação fácil e rápida, amplo espectro de aplicação, construção de um modelo


de personalidade flexível.

Limitações: Medida auto-avaliativa (não possui uma escala de validade), inexistência de uma
escala para medir a desejabilidade social, prova recente e com necessidade de investigação
psicométrica complementar.

1. Cotação

1ºPASSO → somar os itens de cada categoria de cada faceta.

2ºPASSO → fazer os valores totais de cada categoria das facetas.

3ºPASSO → somar os valores totais das 6 categorias dentro de cada faceta.

4ºPASSO → ver nas tabelas os percentis de cada faceta.

160
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Interpretação

Categorias das facetas

Neuroticismo (N) Avalia a adaptação vs. Instabilidade emocional. Identifica indivíduos com propensão
para a descompensação emocional, ideias irrealistas, desejos e necessidades
excessivas e respostas de coping desadequadas.

Características de sujeitos com pontuações altas → preocupado, nervoso,


emocionalmente inseguro, sentimento de inadequação, hipocondríaco.

Características de sujeitos com pontuações baixas → calmo, relaxado, resistente,


seguro, não-emotivo, satisfeito consigo mesmo.

Extroversão (E) Avalia a quantidade e a intensidade das interacções interpessoais, o nível de


actividade, a necessidade de estimulação e a capacidade de exprimir alegria.

Características de sujeitos com pontuações altas → sociável, activo, falador, orientado


para a relação interpessoal, optimista, amante da diversão, afectuoso.

Características de sujeitos com pontuações baixas → reservado, sóbrio, pouco


exuberante, distante, orientado para a tarefa, tímido, silencioso.

Abertura (O) Avalia a procura proactiva e apreciação da experiência por si própria; avalia também a
tolerância e exploração do não-familiar.

Características de sujeitos com pontuações altas → curioso, com interesses diversos,


criativo, original, imaginativo, não tradicional.

Características de sujeitos com pontuações baixas → convencional, pragmático,


limitado, não artístico e não analítico.

Amabilidade (A) Avalia a qualidade da orientação interpessoal num contínuo que vai desde a
compaixão ao antagonismo nos pensamentos, sentimentos e acções.

Características de sujeitos com pontuações altas → sentimental, bondoso, de


confiança, prestável, disposto a perdoar, crédulo, recto.

Características de sujeitos com pontuações baixas → cínico, rude, desconfiado, pouco


cooperativo, vingativo, impiedoso, irritável, manipulador.

161
Avaliação em Psicologia Clínica

Conscienciosidade Avalia o grau de organização, persistência e motivação no comportamento orientado


(C) para um objectivo. Contrasta pessoas que são de confiança e escrupulosas com
aquelas que são preguiçosas e descuidadas.

Características de sujeitos com pontuações altas → organizado, confiável,


trabalhador, auto-disciplinado, pontual, escrupuloso, arranjado, ambicioso,
perseverante.

Características de sujeitos com pontuações baixas → irresponsável, preguiçoso,


despreocupado, frouxo, negligente, hedonista e sem objectivos.

Facetas do Neuroticismo (N)

Ansiedade Pontuações altas → tenso, medroso, preocupado, apreensivo.

Pontuações baixas → calmo, relaxado, estável, corajoso.

Hostilidade Pontuações altas → irritável, facilmente frustrado, zangado.

Pontuações baixas → amigável, moderado, pouco susceptível de se ofender.

Depressão Pontuações altas → sem esperança, com sentimentos de culpabilidade, em baixo,


triste, melancólico.

Pontuações baixas → raramente triste, com esperança, optimista.

Auto-consciência Pontuações altas → envergonhado, inferiorizado, embaraçável.

Pontuações baixas → equilibrado, seguro, sentimento de adequação, à vontade.

Impulsividade Pontuações altas → incapaz de resistir às tentações, cede aos desejos.

Pontuações baixas → resiste às tentações, auto-controlado.

Vulnerabilidade Pontuações altas → nervoso, entra em pânico, incapaz de lidar com o stress.

Pontuações baixas → flexível, calmo, competente, resistente.

162
Avaliação em Psicologia Clínica

Facetas da Extroversão (E)

Acolhimento Caloroso Pontuações altas → amigável, conversador, afectuoso.

Pontuações baixas → frio, distante dos outros, formal.

Gregariedade Pontuações altas → gosta de conviver, simpático, gregário, alegre, social.

Pontuações baixas → evita multidões, solitário, prefere estar sozinho, auto-


contido.

Assertividade Pontuações altas → dominante, com força de vontade, confiante, decidido.

Pontuações baixas → não assumido, reservado, evita afirmar-se.

Actividade Pontuações altas → enérgico, com ritmo rápido, vigoroso.

Pontuações baixas → sem pressa, vagoroso e deliberado.

Procura de Excitação Pontuações altas → exibicionista, procura estimulações fortes, aceita riscos.

Pontuações baixas → evita a sobre-estimulação, cauteloso, sério, sem interesse


na excitação.

Emoções Positivas Pontuações altas → alegre, espirituoso, divertido.

Pontuações baixas → pouco entusiasta, plácido, sério.

Facetas da Abertura à Experiência (O)

Fantasia Pontuações altas → Imaginativo, aprecia sonhar acordado, elabora fantasias.

Pontuações baixas → Prefere o pensamento realista, prático, evita sonhar acordado.

Estética Pontuações altas → Valoriza a experiência estética, arrebatado pela arte e beleza.

Pontuações baixas → insensível à beleza, não aprecia arte.

Sentimentos Pontuações altas → responde emocionalmente, sensível, empático, valoriza os seus próprios
sentimentos.

Pontuações baixas → leque limitado de emoções, insensível ao ambiente.

Acções Pontuações altas → procura a novidade e variedade, procura novas actividades.

Pontuações baixas → prefere o familiar, segue uma rotina rígida, adaptado à sua maneira de
ser.

163
Avaliação em Psicologia Clínica

Ideias Pontuações altas → curioso intelectualmente, orientado teoricamente, analítico.

Pontuações baixas → pragmático, factualmente orientado, não aprecia desafios intelectuais.

Valores Pontuações altas → horizontes largos, tolerante, não conformista, espírito aberto.

Pontuações baixas → dogmático, conformista, limitado, conservador.

Facetas da Amabilidade (A)

Confiança Pontuações altas → atribui intenções benevolentes aos outros.

Pontuações baixas → cínico, suspeita de que os outros são desonestos e perigosos.

Rectidão Pontuações altas → franco e frontal ao lidar com os outros.

Pontuações baixas → maquiavélico, calculista.

Altruísmo Pontuações altas → altruísta, socialmente interessado e orientado.

Pontuações baixas → centrado em si próprio, relutante em envolver-se nos problemas


alheios.

Complacência Pontuações altas → complacente, tolerante, brando.

Pontuações baixas → antagonista, contestador, agressivo.

Modéstia Pontuações altas → humilde, modesto, simples.

Pontuações baixas → arrogante, visão inflamada de si próprio, narcisista.

Sensibilidade Pontuações altas → tendência a ser guiado por sentimentos, particularmente os de


simpatia, ao ajuizar e tomar atitudes.

Pontuações baixas → realista, racional, comove-se dificilmente.

Facetas da Conscienciosidade (C)

Competência Pontuações altas → sente que é capaz, sensível, prudente e eficaz.

Pontuações baixas → sente-se incapaz, tem baixa auto-estima.

Ordem Pontuações altas → tendência a manter o ambiente limpo, bem organizado,


ordenado.

Pontuações baixas → desorganizado, desleixado.

164
Avaliação em Psicologia Clínica

Obediência ao dever Pontuações altas → aderência estrita a padrões de conduta, princípios éticos,
obrigações morais.

Pontuações baixas → irresponsável, com quem não se pode contar.

Esforço de realização Pontuações altas → atraído pelo êxito, diligente, com orientação na vida e com
objectivos.

Pontuações baixas → pouco ambicioso, preguiçoso.

Auto-disciplina Pontuações altas → persistente, aptidão para continuar uma tarefa, apesar do
enfado e das distracções.

Pontuações baixas → prostrado, desiste em face da frustração.

Deliberação Pontuações altas → cauteloso, ponderado, planificador.

Pontuações baixas → espontâneo.

165
Avaliação em Psicologia Clínica

MÉTODOS PROJECTIVOS

166
Avaliação em Psicologia Clínica

RORSCHACH

O Rorschach é um instrumento de avaliação projectivo utilizado na clínica e que


permite aceder ao modo de funcionamento psíquico do sujeito. É composto por 10 cartões:
 Cartões 1,4,5,6 e 7: tons de cinza
 Cartões 2 e 3: tons de cinza e vermelho
 Cartões 8,9 10: tons de pastel

1. Para que servem as provas projectivas?

Pretende compreender o modo de funcionamento psíquico do sujeito. Cada pessoa


tem um funcionamento psíquico específico e portanto, terá uma prestação específica na prova
de RCH. O seu funcionamento específico é acedido pela análise da sua prestação na prova uma
vez que, há um paralelismo entre o funcionamento psíquico do sujeito e a sua prestação no
teste, o seu funcionamento reflecte-se no teste. Acede-se ao seu funcionamento psíquico pela
análise do seu processo de resposta.

Qualquer resposta do sujeito no RCH resulta de um balanceamento entre percepção


e projecção.

 CONTEXTOS DE APLICAÇÃO
Aplica-se em contexto clínico, individualmente ou em complementaridade com o
TAT ou CAT (crianças). São utilizadas em processos de recrutamento e selecção de
profissões específicas tais como, forças de segurança, juízes, etc.

 CONSTITUIÇÃO DO PROTOCOLO
Folha A4 com 3 colunas:
 1ª coluna: discurso espontâneo do sujeito (coluna mais importante)
 2ª coluna: inquérito
 3ª coluna: psicograma (reúne todos os dados da cotação)

167
Avaliação em Psicologia Clínica

 PASSAGEM DO PROTOCOLO

1. Passagem espontânea dos cartões


Os cartões devem ser apresentados por ordem e entregues ao sujeito na sua mão
(para que os possa manipular como quiser) e na posição correcta.
Deve escrever-se (1ª coluna) tudo o que o sujeito diz (respostas cotáveis) e registar-se
o tempo de latência das respostas (tempo que vai desde o momento em que o sujeito recebe
o cartão até dar uma resposta cotável). Regista-se ainda a posição em que se encontrava o
cartão quando o sujeito deu a resposta.
O examinador deve assumir uma atitude de neutralidade “benevolente”: aceitar todas
as respostas do sujeito sem se manifestar; não dizer nada que vá induzir qualquer tipo de
respostas do sujeito, não pode ser directivo.
2. Inquérito
Depois de passados os 10 cartões uma primeira vez para registar as repostas do
sujeito, volta-se a passar (pela mesma ordem) todos os cartões em que se questiona o sujeito
sobre o seu processo de resposta, com o intuito de perceber de que forma o sujeito constrói as
suas respostas. Pretende-se responder às questões: Onde viu? (modo de apreensão); Como
viu? Porque viu? (determinantes).
Muitas vezes nesta segunda fase, o sujeito vê mais coisas do que na primeira vez (estas
respostas devem ser anotadas na segunda coluna).
No caso das crianças o protocolo é diferente, os cartões apenas são passados uma vez
e quando a criança devolve cada cartão faz-se o inquérito (as crianças não aguentam uma
segunda passagem dos cartões).
No caso do sujeito não dar algumas repostas consideradas fundamentais (exemplo: se
o sujeito não viu figuras humanas no cartão III), faz-se o chamado inquérito dos limites.
Segundo Klopfer (1964), este inquérito tem como finalidade suscitar as reacções nas direcções
até aí evitadas pelo sujeito.
Por fim, realiza-se a chamada prova das escolhas em que se questiona sobre quais os
dois cartões que mais gostou e os dois que menos gostou e porquê. Esta prova trata-se de um
apelo à escolha e à rejeição e um apelo aos afectos (gostar, não gostar). Permite ao sujeito
manifestar os seus investimentos em relação a um material que até aqui lhe foi imposto.
3. Cotação
Na 3ª coluna colocam-se as cotações que permitem formar o psicograma e, a partir
dele, a análise do protocolo de Rorschach.

168
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Conteúdo Manifesto e Conteúdo latente

 Conteúdo Manifesto:
O que se vê, trata-se de questionar a relação ao real, estabelecida pelo sujeito. Em
Rorschach estão presentes duas dimensões que permitem descrever o conteúdo manifesto
dos cartões:

 Dimensão Estrutural: Os cartões diferenciam-se pelo seu carácter unitário ou pela sua
organização bilateral e ainda pelo seu carácter inteiro e maciço ou disperso.
 Organização: Todos os cartões se encontram organizados em torno de um eixo central
mais ou menos evidente e manifesto. Este eixo é mais manifesto nos cartões ditos
unitários (I, IV, V, VI e IX). Nos cartões de configuração bilateral, a simetria torna-se
mais evidente na repetição em espelho (II, III, VII e VIII).
Implicações latentes destas estruturas formais: cartões unitários com
mediana manifesta podem reflectir a imagem do corpo humano
organizado simetricamente em torno de um eixo; cartões bilaterais
podem reflectir a representação de relações.
 Carácter fechado (inteiro) ou aberto (disperso): São fechados os cartões I, IV, V e VI e
abertos os cartões I, II, III, VII, VIII, IX e X. O cartão I é o único que apresenta um duplo
registo de fechado e aberto simultaneamente.
Simbolicamente, aberto/oco é uma referência feminina/materna (I, II, VII
e IX), por oposição o fechado/compacto e associado à presença de
apêndices salientes que remetem para uma referência fálica (IV e VI).
 Dimensão cromática/sensorial: No que se refere à cor, é necessário distinguir três tipos
de cartões: cinzento-escuro (I, IV, V e VI), cinzentos (VII), negro-branco-vermelho (II e III)
e os pastel (VIII, IX e X).

Cartões cinzento-escuro ou com contraste negro-branco:


Quando atingem a sensibilidade do sujeito dão origem a manifestações da ordem da
inquietude, ansiedade ou angústia mais ou menos intensas, o que pode ser explicado, por
exemplo, por uma correspondência cultural. Preto e cinzento são considerados, na cultura
ocidental, como cores de tristeza e luto. Podem no entanto evocar outros conteúdos mas, a
sensibilidade ao preto (= ansiedade, tristeza e depressão) emana de um conformismo social
que faz parte da realidade.

169
Avaliação em Psicologia Clínica

Cartões vermelhos (II e III:


O contraste entre o preto, branco e vermelho pode ser sentido brutalmente. A
presença do vermelho é determinante na solicitação dos afectos brutos, ou seja, na
reactivação de movimentos pulsionais. Há ainda uma ligação cultural entre o vermelho e as
emoções violentas, a sexualidade e a agressividade. O sujeito é sempre sensível ao vermelho
mas pode não interpretar nada no vermelho, pode defender-se do vermelho.
Estes cartões, pela sua configuração bilateral, são indutores de representações de
relações.

Cartões pastel (VIII, IX e X):


Cartões indutores de afectos e emoções. Pelos seus tons favorecem as regressões.

 Conteúdo Latente:
Trata-se da dimensão simbólica do cartão, para o que ele remete.

→Cartão I←

A tonalidade emocional é, geralmente, disfórica ou neutra, camuflada por referências formais


banais.

A solicitação simbólica está fortemente conotada pela situação de apresentação, de contacto


com o desconhecido, entrada na matéria o que, força o sujeito a recorrer, quer a uma conduta
dependente passiva, quer a mobilizar activamente, as suas forças defensivas. A um nível
menos evoluído, o cartão reactiva a relação pré-genital com a mãe nos seus aspectos positivos
e ou negativos, nas imagens de segurança ou ameaça.

Respostas Banais – pássaro, morcego ou borboleta

Podem surgir variações às respostas banais (exemplo: borboleta a voar, borboleta esmagada
no chão, etc.), cada uma delas é cotável e tem um significado diferente.

170
Avaliação em Psicologia Clínica

→Cartão II←

Há uma mudança no estímulo provocada pela introdução do vermelho. O conteúdo latente


depende do modo de apreensão do sujeito, se vê no preto, vermelho ou branco. A
interpretação depende da parte da mancha que o sujeito interpreta.

A carga emocional é, de uma forma geral, fortemente vivenciada, no sentido de um simples


mal-estar, de uma excitação positiva ou de uma reacção negativa.

A solicitação simbólica é diferente se a interpretação da mancha abranger as três cores (negro,


vermelho e branco) ou se estiver circunscrita nas manchas vermelhas, no buraco branco ou no
negro. Interpretado superficialmente e de uma maneira geral, o vermelho reflecte as
“diferentes pulsões agressivas” de nível evoluído (a luta e a competição) ou de nível primário
(explosão ou dispersão). A problemática de castração é frequente, o cartão tem um carácter
libidinal.

É um cartão bissexuado nas suas formas, o que pode desencadear respostas específicas.

Apreendido globalmente, o estímulo pode dar lugar a fantasmas que remetem para uma
problemática pré-genital de nascimento, de relações precoces com a mão, simbióticas e/ou
destrutivas.

Respostas Banais – dois animais ou cabeças de animais.

→Cartão III←

A relação emocional é geralmente positiva: o cartão permite uma certa descontracção pela sua
estrutura menos centrada e menos pesada. O prazer pode ser evocado, excepto quando a

171
Avaliação em Psicologia Clínica

relação de das personagens é problemática ou quando estas personagens pertencem a um


mundo irreal maléfico ou ainda, quando são desvitalizadas.

Este cartão refere-se à forma como o sujeito se vive, à sua identidade, estuda-se a
representação de si e também a representação da relação. A solicitação simbólica dominante
resulta da disposição espacial das silhuetas humanas que se impõem no cartão. É um cartão
bissexuado (parte cima feminina e parte de baixo masculina) no qual é esperado que as
mulheres vejam mulheres e os homens identifiquem figuras masculinas.

Podem também ser expressos a necessidade de representação de si face ao outro e o tipo de


relação “convergente ou divergente”. Este cartão é particularmente propício a respostas
cinestésicas (k), referentes a questões relacionais ou interaccionais.

Na posição inversa (V) a imagem reenvia, de imediato, para o irreal poderoso e ameaçador; a
insistência no vermelho mediano pode constituir uma referência ao interior do corpo.

Respostas banais – figuras humanas (preto), borboleta ou laço (vermelho central)

É tão importante que os sujeitos identifiquem figuras humanas que se isso não acontecer,
questiona-se se não as conseguem ver (inquérito dos limites).

→Cartão IV←

A tonalidade emocional é, quase sempre, disfórica. O preto intenso e a dispersão levam a que
o cartão provoque reacções de angústia ou de grande desconforto e mal-estar.

A solicitação simbólica deste cartão remete para a ideia de potência, força, virilidade,
autoridade. O cartão desperta tomadas de posição de dominação ou submissão, sendo
considerado que o papel superegóico pode ser o de uma imagem paterna ou de uma imagem
materna omnipotente.

Respostas comuns - monstro, gigante, king kong, etc.

Respostas Banais - pele de animal.

172
Avaliação em Psicologia Clínica

→Cartão V←

A tonalidade emocional é, em geral, neutra e pouco pronunciada por ser o cartão que mais se
aproxima da realidade. Pode ter uma tonalidade emocional disfórica se houver persistência da
reacção ansiosa do cartão IV e só é eufórica quando há valorização narcísica, ou alívio, no
reconhecimento de uma realidade objectiva.

Apesar de se considerar que este cartão força a adaptação à realidade objectiva, comporta,
simbolicamente, um apelo ao sentimento de integridade, talvez ao conceito de si, à unidade
do Ego. Este sentimento de integridade pode corresponder à integridade psíquica ou somática.

Pela própria dimensão da mancha e o seu carácter unificador/uniforme os sujeitos, muitas


vezes mesmo com psicopatologia pesada, conseguem resistir e dar uma resposta próxima da
banalidade (exemplo: borboleta com asas rasgadas). [no entanto, os sujeitos com
psicopatologia pesada, chegam ao cartão X e não conseguem resistir]

Respostas banais – pássaro, borboleta ou morcego.

→Cartão VI←

A reacção emocional é, com mais frequência, negativa que positiva. O clima é muitas vezes
semelhante ao do cartão IV. O cartão é rejeitado com frequência nas escolhas e mesmo
recusado de uma forma espontânea.

Solicitação simbólica: está muito carregado de implicações sexuais. Apesar de ser bissexuado,
é a dimensão fálica que é utilizada mais vezes. A dimensão fálica pode ser activa ou passiva
(submissão) ou uma problemática de castração podem exprimir-se através do jogo de imagens
em movimento (k) ou passivas (esbatimentos), independentemente das representações
sexuais simbólicas ou não.

173
Avaliação em Psicologia Clínica

Resposta banal – pele de animal

→Cartão VII←

A tonalidade emocional reflecte o carácter “inacabado” e “desarticulado”, ou seja, o carácter


instável e como que em desequilíbrio, do estímulo e a reacção é neutra ou francamente
negativa.

Quer pela dimensão estrutura como pela cromática, remete para as relações com o primeiro
objecto. A implicação simbólica é, então, claramente feminina e/ou materna. O cartão impele
o sujeito a situar-se em relação ao sexo feminino, à imagem feminina ou à imagem materna
em função da própria relação primitiva do sujeito com a mãe.

Respostas frequentes (não tem banalidades) – duas mulheres a olhar uma para a outra, caras
de rapariga a rir, etc.

→Cartão VIII←

Com a introdução dos cartões pastel é esperado que o sujeito mude a sua atitude (novos
estímulos que os sujeitos podem considerar agradável ou desagradável).

A tonalidade emocional é muito diferente, muitas vezes positiva. A reacção negativa só


aparece como consequência do interior de corpo ou de corpo deformado.

Solicitação simbólica: a presença da cor é considerada como solicitação à comunicação, à


troca. Pela relação entre cores e emoções, remete para a forma como o sujeito se relaciona
com o com o mundo exterior, para a sua expressão dos afectos (afectividade).

Respostas banais – mamíferos (rosa)

174
Avaliação em Psicologia Clínica

→Cartão IX←

A tonalidade emocional é função da aceitação ou da resistência ao apelo simbólico do cartão.

Solicitação simbólica: há uma solicitação à regressão (superior à dos cartões VIII ou X). Esta
posição regressiva pode ser vivida positiva ou negativamente, mas reenviam sempre para um
simbolismo materno pré-genital, associado, ou não, aos fantasmas de gravidez ou de
nascimento.

Respostas banais – duas cabeças de bebé ou de homem (rosa)

→Cartão X←

Remete para a separação e para a individuação. Pela sua dimensão estrutural (dispersa) e
pelas cores, põe à prova a capacidade de unificação do sujeito. Propícia respostas de detalhe
(d) mais do que respostas globais (g).

A reacção emocional está ligada a dois factores: trata-se do último cartão, a ruptura desta
situação pode ser sentida como alívio ou como ferida; a dispersão do cartão facilita ou
bloqueia as associações.

Por ser o último cartão desempenha um certo papel, “cartão de transferência”. A sua
solicitação simbólica é diferente consoante a centração é feita nas cores, na dispersão ou na
importância do espaço branco. Este pode ser um cartão de festa ou de fragmentação, todos os
extremos são possíveis.

Respostas banais – cabeça de coelho (verde inferior); caranguejo, polvo, aranha (azul lateral);
animais (cinzento).

175
Avaliação em Psicologia Clínica

3. Princípios Elementares de Cotação


Cotar um protocolo é reduzir as respostas a sinais convencionais, isto é, codifica-las.

A cotação não é mais do que um esboço cómodo que serve de quadro e de ponto de
partida para a reflexão e que facilita a compreensão dos protocolos:

♥ Pelo seu carácter objectivo a cotação fornece um quadro às impressões e à intuição do


psicólogo
♥ A cotação é o ponto de partida da reflexão, na medida em que ela é resultante da
dinâmica instaurada entre a actividade perceptiva e a vivência emocional e que ela
reflecte também a integração da dimensão afectiva na organização mental.

A cotação realiza-se após uma leitura atenta do conjunto do texto e depois de


anotadas as impressões que dele se destacam (tonalidade emocional, verbalização, atitude,
etc.). A leitura do texto, a cotação e o estabelecimento do psicograma são posteriores à análise
propriamente dita.

É necessário cotar todas as respostas do sujeito (cada imagem, associação,


transformação de nova imagem, etc., quer esta seja dada de forma afirmativa, negativa ou
interrogativa). É necessário anotar os elementos qualitativos (referências pessoais,
observações de simetria, observações críticas, reacções choque, etc.) e os comentários
pessoais.

Uma resposta Rorschach é uma resposta cotável que depende de quatro parâmetros,
nomeadamente:
♥ Modo de apreensão (responde à questão “onde é que na mancha vê a imagem que
refere?”, tentando saber qual a parte da mancha é que foi utilizada pelo testado);
♥ Determinantes (corresponde à questão “onde e porquê?”. Os símbolos repartem-se
em várias categorias, segundo se trate de uma característica do estímulo ou de um
contributo mais pessoal que poderá ser a atribuição de movimento, intenção,
sentimento penoso, impressão de profundidade, etc.);
♥ Conteúdo (corresponde à questão “o que é que o sujeito disse?”);
♥ Banalidades (corresponde à resposta que é frequente numa população, e àquilo
que é ou não banal).
A cada uma destas questões corresponde uma série de símbolos convencionais, entre os
quais é preciso escolher aquele(s) que podem dar conta, o mais fielmente possível, da resposta
do sujeito tal como ele a viu e enunciou, sem que a subjectividade do próprio psicólogo
interfira. Para responder às três primeiras questões é necessário interrogar o sujeito aquando

176
Avaliação em Psicologia Clínica

do inquérito. É no entanto, necessário distinguir entre as respostas espontâneas do sujeito e


uma nova abordagem ou uma reelaboração (que não deverá ser cotada, ou apenas deve ser
considerada em tendência, embora entre na análise propriamente dita).

3.1. Análise quantitativa

3.1.1. Cotação

1. Modos de apreensão

Responde à questão onde. Remetem para a localização na mancha da interpretação


do sujeito ou seja, onde o sujeito vê o que diz que vê. Os modos de apreensão dão conta da
estratégia perceptiva que o sujeito utiliza ao abordar a mancha, traduz-se na localização que o
sujeito nos dá.

Esta localização pode ser global, um detalhe, etc. Desde o cartão I ao cartão X são
possíveis todos os tipos de modos de apreensão.

Existem 5 símbolos básicos de modos de apreensão:


1.1 G (resposta global);
1.2 D (grande detalhe);
1.3 Dd (pequeno detalhe);
1.4 Dbl (interpretação de um detalhe branco);
1.5 Do (detalhe oligofrénico ou inibitório).

1.1 Resposta G (resposta global)


o Cota-se G quando a interpretação se refere à mancha inteira.
o Se uma pequena parte da mancha é excluída, admite-se a cotação G - (G).
o Há uma excepção no cartão III: visto em posição direita e quando são referidas
personagens nas partes negras laterais, mesmo que os vermelhos e o cinzento
central não sejam interpretados.

Corresponde a um nível cognitivo perceptivo muito importante. Existem diferentes tipos de


G’s patológicos, no entanto, há que perceber que não é por aparecer apenas um G patológico
ou um Do que o indivíduo é patológico, mas se houver excesso de repetição destas respostas,
aí já poderá haver patologia. Os G’s patológicos são:

177
Avaliação em Psicologia Clínica

Gcontaminados: o sujeito dá uma resposta global em que está a percepcionar o exterior e o


interior da mancha (o sujeito confunde o interior com o exterior) ex: vejo uma águia com um
rato no estômago – vê uma realidade interior com uma exterior – mesma percepção. “Da
maneira que está a olhar para mim, está a pensar mal de mim.” (o sujeito não tem os limites
bem definidos). Quando este tipo de respostas aparece aparece muitas vezes o sujeito pode
ter um funcionamento psicótico ou esquizofrénico.

Gconfabulados: O sujeito percepciona um pequeno detalhe de uma forma correcta e depois


de forma abusiva generalizando esse detalhe para toda a imagem sendo o resultado
totalmente incorrecto. Acontece muito nas crianças mas nos adultos toma outras
repercussões. (Modo imaturo de percepcionar) “ Estou a ver umas tenazes logo esta mancha é
um caranguejo.” O sujeito percepciona um detalhe e generaliza-o.

Gsincréticos: mais nas crianças – soma das partes (juntar membros, então é pessoa). O sujeito
vê as partes mas não atinge o todo. “Estou a ver uns pés aqui, aqui uns braços, uma cabecinha,
então é uma pessoa.”

Também podemos distinguir os G quanto à qualidade de construção:

G primário ou simples – resposta global simples ou primária– é uma constatação simples – o


sujeito não tem de trabalhar cognitivamente, não tem trabalho pois faz apenas constatações –
o sujeito é preguiçoso. “É um pássaro” (visto em toda a prancha)

G secundário ou organizado – resposta global elaborada/ secundária/ organizada– mais


actividade mental. Sujeito é dinâmico e criativo. “Isto faz-me lembrar uma cena do Lago dos
cisnes. Aqui uma bailarina em pontas e aqui outros dois bailarinos a ergue-la no ar.

1.2 Resposta D (grande detalhe)


o Cota-se D quando a interpretação se refere a uma parte facilmente isolável do
conjunto.
o Trata-se de um recorte referido com frequência (1 em cada 22), que se impõe à
percepção e que é determinado estatisticamente.
o Existe uma lista das localizações (cf. anexo).
o Qualquer combinação de D deve ser cotada em D.
o Interpretação de um detalhe que do ponto de vista perceptivo (não tem nada a ver
com o que a pessoa projecta) se impõe, um detalhe que é frequentemente
interpretado, respostas que usam apenas parte da mancha facilmente isolável do
conjunto, ou seja se destaca à vista/perceptivamente.

178
Avaliação em Psicologia Clínica

o Trata-se de um detalhe referido com frequência, determinado estatisticamente.


o Frequentemente coincide com partes maiores da mancha, mas não é essa a
definição, o D não tem a ver com o tamanho do detalhe que é interpretado.

1.3 Resposta Dd (pequeno detalhe)


o Pode referir-se a qualquer pequeno pormenor, a qualquer recorte raro, ou ainda a
partes da mancha isoladas de forma inusual. Não se impõem à percepção.
o Pode significar minúcia, no entanto, se for excessivo pode significar compulsão por
minúcia.
o O D e o Dd diferenciam-se pela dimensão perceptiva da mancha, não pelo tamanho
(apesar de, habitualmente, o D estar associado aos maiores e o Dd aos mais
pequenos) mas sim pela frequência, o D impõe-se perceptivamente e o Dd não se
impõe perceptivamente. Dd pode então, corresponder a qualquer pequeno
pormenor, qualquer recorte raro, ou ainda a partes da mancha isoladas de forma
pouco usual.
o Valor interpretativo: O sujeito quando está a interpretar vários detalhes pode estar
a explorar o cartão. Mas pode também estar a ter uma atitude defensiva. Pode
muitas vezes ser associado a uma dimensão agressiva, exemplo, interpretação dos
detalhes como garras, etc.
 O que é importante perceber é que quando o sujeito da os detalhes e está a
explorar o cartão é um sujeito que faz o mesmo na vida real, se interpreta
D’s associados a boas formas (banalidades) é um sujeito adaptado. O D
remete para as questões da socialização.
 É importante perceber em que cartão/cartões o Dd surge, o seu conteúdo.

1.4 Resposta Dbl (detalhe branco)


o Cota-se Dbl quando a interpretação se refere unicamente a uma parte branca,
situada no interior ou no exterior da mancha: pormenor intramacular ou
extramacular.
o Caso particular: no cartão IX, o pormenor intramacular central é cotado Dbl quando
só a forma é determinante e D quando a cor é tida em conta, sendo, neste caso,
considerado uma cor entre as outras.
o Valor interpretativo – a interpretação do branco depende do tipo de resposta e do
cartão em que surge. O branco remete para várias questões têm sempre que se ter

179
Avaliação em Psicologia Clínica

em conta o conteúdo/tipo da resposta e a dimensão simbólica/conteúdo latente do


cartão.
 Exemplo: Cartão VII - cartão materno, que favorece a regressão interpretar
o branco como neve e frio pode ser interpretado como frieza afectiva,
distanciamento, etc.
 A centração no branco tem, geralmente, um carácter defensivo, a pessoa
pode refugiar-se no branco para se defender da solicitação latente do
cartão. Dependendo do cartão assim depende também o valor
interpretativo da resposta.

1.5 Resposta Do (detalhe oligofrénico)


o Cota-se Do quando um elemento é tratado isoladamente, num contexto parcial,
porquanto ele faz implicitamente parte de um todo (exemplo no III: “cabeça de
homem” no D negro sup., sendo habitual a referência a personagem inteira em G).
o Assim, o Do refere-se unicamente às respostas com conteúdo frequente (F+) ou
banal e corresponde a uma dupla redução: do campo perceptivo e do conteúdo.
o Exemplos: A resposta única “uma perna” no pormenor lateral inferior do cartão III,
que corresponde, de facto, à perna das personagens vistas habitualmente inteiras é
cotada Do. Na mesma localização do cartão III, a resposta “um homem com um
grande nariz” não é um Do, já que não responde à segunda condição: restrição de
conteúdo.
o No cartão V, “asas” em D lateral cota-se Do F+ Ad, dado que a resposta banal dada
em G é “borboleta” .
o Mecanismo de inibição típico de sujeitos depressivos. Onde habitualmente um
sujeito vê figuras inteiras estes sujeitos vão ver apenas parte dessa figura.
o Do está sempre associado a um Hd (detalhe humano) ou Ad (detalhe animal) e
nunca um objecto!
o Do também representa um carácter defensivo, sujeito defende-se do que a imagem
toda lhe provocaria, restringe o campo perceptivo e vê apenas uma parte da figura.
Localizações associadas
A par destas respostas facilmente localizáveis, há outras que podem ser mais complexas,
por exemplo, aquelas que chegam a G a partir de um pormenor ou que incluem pormenores
brancos numa localização mais vasta.

180
Avaliação em Psicologia Clínica

Podem-se, então, associar símbolos, destacando aquele que corresponde à localização


final, que deve, geralmente, ser anotado em segunda posição, o que permite pôr em evidência
o processo perceptivo. Esta prática não é geral.
 (D)G: construção de uma resposta global a partir da combinação de vários D.
Exemplo no cartão VIII: “animais ali, que estão a tentar escalar uma montanha”. Os
animais são os D rosa lat. e a montanha todo o D central.
Não confundir com uma resposta global cujos elementos seriam depois
pormenorizados. Por exemplo, no cartão X, “um fundo submarino, aqui
caranguejos, ali corais…” deve ser cotado G.
 (Dbl)G: construção de uma resposta a partir de um pormenor branco. Exemplo no
cartão II: “um disco voador envolvido em chamas num céu de tempestade”, em que
o disco voador é visto no Dbl central, as chamas nos vermelhos e o céu de
tempestade nos negros laterais.
 Gbl: resposta global com integração de branco. Se os pormenores brancos são
simplesmente incluídos numa resposta global sem lá estarem na origem, cota-se
Gbl. Exemplo no cartão I: “uma máscara” em G, cujas partes brancas centrais
interiores seriam os olhos.
 (Dbl)D: construção de uma resposta em D a partir de um pormenor branco ou
adjunção a um Dbl de um ou mais pormenores habitualmente cotados D. Exemplo
no cartão II: “um avião a jacto, com chamas que saem dos reactores” no Dbl central
e vermelho inferior.
 D bl: respostas em que há a simples inclusão de um pormenor branco em D.
 (Dd)G ou (Dd)D: respostas em que há construção (em G ou em D) a partir de um
Dd.
Atenção: não confundir com uma simples precisão dada num segundo tempo.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Como ver qual o tipo de Modos de Apreensão para cada cartão:

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Avaliação em Psicologia Clínica

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Avaliação em Psicologia Clínica

2. Determinantes

Os símbolos repartem-se em várias categorias, segundo se trate de uma característica


do estímulo (forma, cor ou esbatimento) ou de um contributo mais pessoal que poderá ser a
atribuição de movimento, de intenção, de um sentimento penoso, de uma impressão de
profundidade, etc.
É obvio que nenhuma destas categorias é totalmente objectiva ou subjectiva e que
cada resposta é fruto do encontro entre a realidade exterior e a subjectividade do sujeito.
Para cotar os determinantes é necessário perceber ao que o sujeito é sensível.
Há vários determinantes que se encontram divididos em dois eixos: perceptivo e
projectivo. No entanto, como já foi referido, toda e qualquer resposta implica projecção e
percepção, e não apenas uma delas, mas há determinantes que se enquadram mais no eixo
perceptivo como a forma, cor e esbatimento e outros no projectivo como as cinestesias. Por
exemplo, vejo um pássaro a voar – o pássaro não esta a voar o sujeito é que projecta o
movimento.

 EIXO PERCEPTIVO (está lá para ser observado)

Determinante formal (F)


Quando é a simples configuração da mancha ou de uma das suas partes que está na
origem da resposta.
Para cada uma das respostas dadas, aprecia-se a qualidade da forma que se traduz em
F+, F- ou F+. A qualidade de uma forma aprecia-se segundo dois critérios:
 Adequação formal da resposta à mancha: a forma em questão é ou não
objectivamente próxima da mancha ou da parte da mancha interpretada?
 Frequência de aparecimento da resposta: é lógico pensar que uma forma dada
muitas vezes numa população geral é efectivamente adequada ao estímulo.

Assim, a qualidade da forma pode ser:


 Bem vista (F+): forma adequada, apropriada à configuração da mancha. Aqui o
sujeito procura ser objectivo, racional e consegue;
 Mal vista (F-): forma inadequada. Aqui o sujeito tenta ser objectivo e racional mas
não consegue;
 Indeterminada (F+): forma imprecisa, indeterminada. A resposta do sujeito não
permite o julgamento por serem respostas com contornos demasiado vagos

187
Avaliação em Psicologia Clínica

(exemplo: ilhas, nuvens, etc.) ou porque o sujeito não sente necessidade de precisar
(um animal).

Na ausência de lista de F+ e de F- estabelecida estatisticamente referirmo-nos à lista


de vários autores apresentada por C. Beizmann em Livret de Cotation des Formes.
Cotar-se-á F+ uma forma reputada boa e/ou precisa; cotar-se-á F- uma forma
inadequada à configuração do estímulo. Uma pessoa que cote muito com F+ pode ter uma
necessidade interior de ser racional e objectivo.
No entanto há respostas sobre as quais não se pode estabelecer se são adequadas ou
não, já que o sujeito não nos dá a possibilidade de as julgar, quer porque é incapaz de o fazer,
quer porque não sente necessidade de a precisar (“um animal”), quer porque os contornos são
vagos (“ilhas”, “nuvens”, “algo de geográfico”). Estas respostas são cotadas F+.
Atenção: O F+ não deve nunca ser o reflexo de uma indecisão do próprio examinador, mas
sim corresponder a uma insuficiência de tomada de posição do sujeito.

Determinante da cor (C ou C’)


Há dois tipos de cor às quais o sujeito pode reagir:

o As cores cromáticas: vermelho e pastel – C


o As cores acromáticas: cinzento, preto e branco – C’

Quando uma cor desempenhou efectivamente um papel na formação da resposta, é


preciso avaliar a sua importância:

 FC ou FC’: quando a cor está integrada numa resposta com uma forma precisa
dominante. Cota-se FC- ou FC- se a forma for inadequada. Por exemplo, ouço o
ruído de um motor lá fora, é de certeza de um mercedes, muito bom. Gosto deste
barulho.
 CF ou C’F: quando o impacte da cor prima sobre a formalização. Em geral, a forma é
então imprecisa. Por exemplo, ouço o ruído de um motor, que horror, detesto. De
certeza que é um carro de contentor do lixo.
 C ou C’: quando é só a cor a determinante da resposta.
Exemplos: “um boné vermelho” – FC
“sangue” – C, mas “mancha de sangue” – CF
“uma tempestade” – C’, mas “nuvens cinzentas espalhadas” – C’F
“uma borboleta nocturna” (no inquérito: “porque é cinzenta”) – FC’

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Avaliação em Psicologia Clínica

Atenção: não confundir com a simples localização que o sujeito faria de forma espontânea. Por
exemplo no cartão X: “o azul, caranguejos” que será um F+; ou no cartão II: “no vermelho vejo
uma borboleta” (no inquérito: “porque tem a forma”) seria um F+, enquanto “uma borboleta
vermelha” seria cotada em FC.
Não considerar como respostas cor as considerações técnicas sobre as cores, por exemplo,
“para obter esta cor é preciso misturar o vermelho e o amarelo”.

O que é esperado é que o sujeito seja sensível à mudança de tonalidades da cor, pois
estas vão-se alterando à medida que se avança nos cartões. O sujeito pode ser sensível de
diversas formas, pode gostar, não gostar, etc., a forma como reage é variada.
A presença de uma ou outra resposta cor (C, C’, CF, etc.) dá conta de uma sensibilidade
à realidade. É esperado nos protocolos que adulto que dêem sobretudo FC – cor tem a ver
com os afectos e o F com a razão – FC são resposta em que o sujeito demonstra afectos
contidos pela razão. FC>C + CF
Num protocolo de crianças é esperado respostas C e CF. Num adulto este tipo de
respostas em determinado número dão conta de uma imaturidade emocional.
 Cores escuras (preto e cinzento) remetem para aspectos mais depressivos
 Branco depende do cartão em que surge e do tipo de tema. Temas frios
remetem para um vazio, falhas afectivas.

Determinante do esbatimento (E)


Cota-se esbatimento quando uma resposta foi co-determinada ou determinada pelo
aspecto matizado das cores (sobretudo cinzenta), pelo seu esbatido, ou pela impressão táctil,
ou pela profundidade, ou pela transparência. Tem a ver com as gradações ou as nuances de
uma mesma cor.
Por exemplo, no cartão IV, o sujeito diz que é um urso, não só pela sua forma, mas também
pelo seu pelo muito espesso no preto que se diferencia do cinzento.
Existem três tipos de esbatimento, nomeadamente:
 E textura: está associado a carências afectivas;
 E perspectiva: por exemplo, no cartão VI quando o sujeito diz que é uma vista
aérea do Grand Canion;
 E difusão: é mais raro e mais preocupante, estando associado à perda de limites.
Por exemplo, quando o sujeito no cartão V diz que é um pingo de azeite na água.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Tal como para as cores, avalia-se o peso deste determinante em relação à forma e
cota-se:

 FE: quando o esbatimento está integrado numa forma precisa ou dominante.


Cota-se FE- se a forma for inadequada.
 EF: quando o esbatimento foi preponderante sobre a forma, que é então
indeterminada.
 E: quando o esbatimento é determinante único.

Exemplo no cartão VI: “uma pele de tigre” (no inquérito: “tem a forma de uma pele e o aspecto
manchado, os pelos esbatidos fizeram-me pensar no tigre”) – FE.

Atenção: nem todas as peles de animal neste cartão são cotadas como FE, é preciso que o
esbatimento seja explicitado espontaneamente ou no inquérito.
“uma peliça de carneiro” – EF.
“um agasalho” – E.

 EIXO PROJECTIVO (não está lá para ser observado – é o sujeito que cria)

Determinante de cinestesias (K e k – kp, Kan e kob)


Cinestesias - respostas de atribuição de movimento a uma forma específica:
 O elemento formal da cinestesia revela uma conduta ligada ao reconhecimento de
uma imagem que deve corresponder às exigências da adequação perceptiva (a
expressão das moções pulsionais concilia-se com as exigências superegóicas)
 Quando associada a boa qualidade formal, a cinestesia organiza um compromisso
harmonioso entre percepção e projecção que delimita um espaço transitivo
 Como índice de mentalização e sinal de recurso ao imaginário, as cinestesias
enriquecem o funcionamento cognitivo e testemunham uma actividade mental
complexa e criativa
 Ao nível da actividade defensiva, os mecanismos de defesa são exibidos nas
encenações relacionais ou narcísicas que presidem à elaboração das imagens

190
Avaliação em Psicologia Clínica

Grandes Cinestesias:
K: Grandes cinestesias que significa o corpo inteiro em movimento. Cota-se K sempre que uma
forma humana dotada de vida é interpretada, quer o movimento ou a acção das personagens
seja claramente exprimido, quer se trate de uma atitude ou mesmo de uma intenção ou de
uma relação. Estas cinestesias são as mais importantes porque são as que nos trazem mais
características do sujeito, mais profundas e genuínas.
Exemplos: “personagens que se olham”, “uma mulher a rezar”, “um homem a dormir”,
dois homens a lutar”.
Dado que o aspecto formal é parte integrante da K, avalia-se sempre a qualidade desta
forma numa dada resposta e cota-se K- se a forma for inadequada. Basta cotar K se a
forma for adequada.

As respostas K dão-nos informação acerca de quatro aspectos fundamentais do


funcionamento psíquico do sujeito:
 IMAGEM CORPORAL
 Quando associada a F+ - limites estáveis e definidos, capacidade para representar-se
a si e às imagos parentais
 Quando associado a F- - dificuldades de diferenciação entre o interior e o exterior
 PROCESSO DE SEPARAÇÃO-INDIVIDUAÇÃO
 Quando as figuras são apreendidas sem ambiguidade e claramente separadas -
apreensão inequívoca das figuras humanas que remete para a continuidade do ser, pertença
ao mundo humano e capacidade para se identificar com outro ser humano, sem se confundir
com ele
 Quando as figuras se confundem (temas de duplo, excessiva proximidade, respostas
«gémeos») ou são ambíguas (dupla pertença ao reino animal e humano) - dificuldades ao nível
deste processo
 IDENTIFICAÇÃO SEXUAL
 Quando há atribuição clara de sexo às figuras, correspondendo maioritariamente ao
sexo do sujeito - não há dificuldades ao nível da identificação sexual e as pulsões agressivo-
libidinais são bem manejadas
 Quando essa atribuição não se faz, é ambígua, é caricatural ou não corresponde à
actividade ou aos atributos ornamentais / corporais projectados - dificuldades ao nível da
identificação sexual, ansiedade no confronto com as representações humanas

191
Avaliação em Psicologia Clínica

 REPRESENTAÇÃO DA RELAÇÃO
 O valor interpretativo das respostas a este nível depende do tipo de relação, da acção
ou da postura em que as figuras são apreendidas
 Algumas cinestesias não colocam o problema da identificação / relação dada a valência
narcísica (temas de espelho nos cartões bilaterais ou representações humanas solitárias nos
cartões compactos), remetendo para a procura de uma imagem de si gratificante

Pequenas Cinestesias:
 Kp: Cota-se kp quando uma parte de um corpo humano é vista em movimento e
normalmente em movimento brusco, ou então figuras inteiras em movimento mas vistas
a partir de um pequeno detalhe.
Exemplo: “um braço levantado para bater”; ou quando uma forma humana inteira é
percebida em movimento num Dd.
 Kan: Cota-se kan quando a resposta põe em cena um animal ao qual é atribuído um
movimento. Para cotar kan é preciso que o movimento seja exprimido por um verbo de
acção.
Exemplo: “uma borboleta com as asas abertas” será F+, e “uma borboleta a voar” será
kan.

Por convenção, no cartão VIII, os animais em movimento vistos nos D rosa laterais são
cotados F+ se o cartão é interpretado em posição direita e em kan se o cartão estiver de lado.
Isto deve-se a que o cartão em posição direita sugere com muita facilidade o movimento, não
havendo assim nenhum contributo pessoal para os ver em movimento, enquanto que no
cartão percebido de lado os animais estão em posição estática.

 Kob: Cota-se kob quando há atribuição de um movimento a um objecto ou a um


elemento, estando a força desse movimento no interior desse objecto ou elemento.
Exemplo: “explosão de uma bomba atómica”, “água que escorre”. Nestas respostas a
determinação formal é quase inexistente.
 Claro-obscuro – Clob: Cota-se Clob uma resposta que é determinada pelo efeito massivo
e extenso, uniformemente sombrio da mancha inteira ou de um grande D, efeito
sustentado por um sentimento de medo, de ameaça, de angústia.
Exemplo: “um estandarte negro” não é Clob; mas “algo de tenebroso, uma visão de
pesadelo, nefasto, lembrando um vampiro” é Clob.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Por definição, estas respostas só aparecem nos cartões negros, mas a sua ocorrência é
possível no cartão IX em imagens muito carregadas de angústia.
Exemplo: “o fim do mundo, uma impressão de terror”.
A mesma impressão de ameaça destrutiva pode ser sentida no cartão II, devendo ser
considerada uma tendência Clob.

O aspecto formal pode estar integrado em graus diversos, pelo que se cota:
 FClob: as respostas cujo elemento formal é dominante (Exemplo: “um animal
monstruoso, como um vampiro, hirsuto, horrível”, no cartão IV).
 ClobF: quando a impressão domina sobre a forma (Exemplo: “é inquietante esta planta
carnívora”, no cartão IV)
 Clob: as respostas que não têm nenhum suporte formal (Exemplo: “um pesadelo”,
“uma força demoníaca”, no cartão IV)

3. Conteúdos
A categoria de conteúdos a que pertence a resposta é indicada por uma abreviatura.
As 15 categorias geralmente admitidas não esgotam a riqueza das respostas, apenas
constituem um inventário de imagens correntes. É possível um reagrupamento posterior por
grandes temas (cf. psicograma em anexo). Sendo artificial querer fazer entrar algumas
respostas num grupo, é melhor deixá-las tal como aparecem, como por exemplo, “máscara”,
“explosão”.
Os conteúdos estão relacionados com o que o sujeito vê. Os conteúdos mais vulgares
são o conteúdo humano (H) e o animal (A), sendo que o H diz respeito a figuras humanas
inteiras e o A a figuras animais inteiras. Depois há variações:
o Hd: partes de figuras humanas;
o (H): tem a ver com figuras humanas irreais, míticas, de lendas, sobrenaturais. Mas não
figuras históricas. Se o sujeito vir um monstro sem mais descrições ou descrições
humanas cota-se em (H), mas se tiver elementos de animais já é um (A);
o (Hd): partes de figuras humanas irreais, míticas, de lendas, sobrenaturais. Mas não
figuras históricas. Exemplo: uma cara de bruxa;
o Ad: partes de animais;
o (A): tem a ver com figuras animais irreais, míticas, de lendas, sobrenaturais. Mas não
figuras históricas. Exemplo: cartão III: “vejo um alien”;
o (Ad): partes de figuras animais irreais, míticas, de lendas, sobrenaturais. Mas não
figuras históricas. Exemplo: uma cara de bruxa

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Exemplo: “vejo Jesus Cristo” – H; “claramente metade urso, metade homem” –


H/A; “uma sereia” - (H)
o Bot: Tudo o que são plantas, arvores, flores, etc. cota-se botânica;
o Anat: Tudo o que são partes interiores de corpo cota-se como anatomia;
o Sg: O sangue cota-se por si só, é um conteúdo importante;
o Sx: Respostas com conteúdo sexual;
o Mancha: Quando as pessoas vêem manchas o conteúdo é mancha;
o Masc.: Máscara cota-se como máscara;
o Arq: Monumentos cota-se como arquitectura;
o Arte: Desenhos, pinturas, desenhos de crianças, etc. são cotados como arte;
o Elem: Fogo, água, ar, terra são elementos;
o A: Pele de animal por convenção é sempre A;
o Obj: Os objectos são objectos;
o Simb.: Símbolos são cotados como símbolos. Exemplo: emblemas de clubes, etc.;
o Expl: Explosões, fogo de artíficio, etc.;
o Astro: Planetas, etc. cota-se como astronomia;
o Geo: Geografia, exemplo mapas, países, etc.;
o Vulcão: Vulcão pela sua importância a nível interpretativo a Chabert cota como vulcão;
o Vest: vestuário;
o Pais: paisagens;
o Abstracção: categorias tão gerais que são abstracções exemplo: alegria, primavera,
etc. (abstr).

Nota: animais mortos, esfolados, espalmados, etc. são sempre más formas.

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Avaliação em Psicologia Clínica

4. Banalidades

São os conteúdos que aparecem 1 em cada 6 respostas numa determinada população,


numa mesma localização.

A banalidade refere-se, assim, à frequência de uma certa localização com um


determinado conteúdo, isto é, ao reconhecimento perceptivo de uma certa realidade,
qualquer que seja a eventual elaboração do próprio conteúdo.

Estas respostas são designadas pela menção Ban após o conteúdo.

O determinante formal é, por definição, dominante e em F+ (FC+, K+, etc.), releva de


uma confrontação de resultados que não foram verificados estatisticamente (cf. anexo) e de
uma geração a outra verificam-se alterações, pelo que se justificaria a realização de trabalhos
estatísticos sobre esses dados.

Cartão Modo de apreensão Banalidade


I G Pássaro, morcego ou borboleta
II D negros Duas cabeças de animais ou dois animais

III G Homens, personagens


D vermelho médio Borboleta, laço
IV G Pele de animal

V G Pássaro, morcego, borboleta


VI G ou D inferior Pele de animal
VII NÃO HÁ NÃO HÁ

VIII D rosa lateral Dois animais (expecto peixes e pássaros)


IX D rosa Cabeça de homem, de bebé
X D azul lateral Caranguejo, polvo, aranha

D verde médio Cabeça de Coelho


D cinzento superior Dois animais

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Avaliação em Psicologia Clínica

3.1.2 Psicograma

O psicograma consiste na recolha ordenada/ disciplinada dos resultados quantitativos


individuais do sujeito para, posteriormente, poderem ser comparados com os resultados da
população normativa a que pertencem. A análise quantitativa tem como objectivo a
comparação.

A análise quantativa é realizada pela elaboração do psicograma. Este consiste na


recapitulação dos dados obtidos. Uma vez terminada a cotação, agrupam-se todas as
categorias de respostas numa folha de modo a que se possam comparar com os valores
normativos, tornando-se evidentes os traços salientes (tudo o que se afasta da norma). A
interpretação do protocolo do sujeito irá indicar sobre esses traços salientes.

Psicograma

R G % F A F%
Ad F+%
Rec D % +
 H Fa%
T.T. Dbl % ± Hd F+a%

T.R. Dd % C A%
FC H%
T.L. Do % CF
Ban
C’
FC’
C’F

E
FE
EF

K
kan
Kob
Kp

T. Sucessão
T. Apreensão G D Dd Dbl
TRI Σ K : Σ C
FC Σk:ΣE
RC%
IA%

Elementos Qualitativos

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Avaliação em Psicologia Clínica

1ª coluna: dados gerais

Respostas (R) – número de respostas (as respostas adicionais não entram para o psicograma!
Cotam-se no inquérito!!)

Recusas (Rec) – há recusa sempre que o sujeito devolve o cartão sem ter dado uma resposta
cotável. Não há assim nem tempo de latência, nem tempo total.

Tempo total (T.T.) – soma dos tempos totais de cada cartão.

Tempo por resposta (T.R.) – tempo total/número de respostas

Tempo de latência médio – tempo de latência total/número de respostas

2ª coluna: coluna dos modos de apreensão

Colocar os 5 modos de apreensão básicos: G, D, Dd, Do, Dbl

Nunca se põe se, por exemplo, não há Gbl, Gbl = 0, se não está representado não aparece no
psicograma

Coloca-se o número de modos de apreensão, a percentagem e setas que indicam se é elevado


() ou baixo (), se estiver na média não se coloca nada. Para saber se é alto ou baixo ver livro
de cotação da (?).

3ª coluna: determinantes

Só vamos pôr no psicograma o que existe no protocolo, não se coloca nada igual a zero! O
somatório dos determinantes e dos modos de apreensão tem que ser igual ao número total de
respostas.

4ª coluna: conteúdos

Começa-se pelos H e A.

5ª coluna: percentagens

197
Avaliação em Psicologia Clínica

Elementos quantitativos do psicograma:

Choque ou equivalente de choque:

Trata-se de perturbações do processo associativo que se referem a diferentes elementos e


mais especificamente a factores temporais, à sequência dos modos de apreensão e à
qualidade formal dos determinantes. Sendo a intensidade da perturbação e a maneira de dela
se defender, distingue-se:

 Choque manifesto: que se exprime verbalmente de uma forma directa (“Oh! Que horror!”,
“É horroroso!”), ou através do silêncio ou da recusa.
 Equivalente a choque: que são objectiváveis de diferentes maneiras: 1) numerosas
manipulações; 2) alongamento do tempo de latência; 3) comentários verbais; 4) críticas
objectivas ou subjectivas; 5) redução ou aumento espectacular do número de respostas; 5)
brusco empobrecimento da qualidade das respostas.
 Fenómenos de choque: mais correntemente descritos são:
o Choque cor (cores pastel e vermelho)
o Choque clob, também designado por choque negro
Há outras características do material que podem provocar reacções de choque.

Perseveração: (fenómeno patológico) quando uma resposta fortemente adequada num cartão
se repete duas vezes de forma arbitrária (F-) nos cartões segintes. Compulsão à repetição –
repete em duas-três pranchas a mesma resposta negativa.
Observação cor: observação subjectiva de prazer ou de desprazer sobre as cores.
Observação de simetria: presença de observação sobre a simetria das manchas.
Crítica subjectiva: crítica de si, da sua eficácia ou dificuldades.
Crítica de objectiva: crítica referente às características do estímulo.

198
Avaliação em Psicologia Clínica

Cálculo de Percentagens Comparação com valores normativos

𝐺
G% = x100 Valor normativo: 20% a 30%.
𝑅

𝐷
D%= x100
𝑅
Valor normativo: 60% a 80%

𝐷𝑏𝑙
Dbl% = x100 Valor normativo: 0% a 3%
𝑅

𝐹+ + 𝐹− + 𝐹±
F% = x100 Valor normativo: 50% a 70%
𝑅

𝐹+𝐾+𝑘𝑎𝑛+𝐹𝐶+𝐹𝐸+𝐹𝐶𝑙𝑜𝑏
F% alargado = x100
𝑅

𝐹±
𝐹+ +( 2 ) Valor normativo: 80% a 90%
F+% = x100
𝐹+ +𝐹− +𝐹±

F+% alargado =
(𝐹+)+(𝐹±/2)+(𝐾+)+(𝑘𝑎𝑛+)+(𝐹𝐶+)+(𝐹𝐸+)+𝐹𝐶𝑙𝑜𝑏+)
x100
𝑁º 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑠𝑝𝑜𝑠𝑡𝑎𝑠 𝑐𝑜𝑚 𝑑𝑜𝑚𝑖𝑛â𝑛𝑐𝑖𝑎 𝑓𝑜𝑟𝑚𝑎𝑙

𝐴+𝐴𝑑
A% = x100
𝑅

(Se há muitos (A), calcular duas percentagens: Valor normativo: 35% a 50%

uma que os inclua e outra que os exclua)

𝐻+𝐻𝑑
H% = x100 Valor normativo: 12% a 18%
𝑅

(Se há muitos (H), calcular duas percentagens:


uma que os inclua e outra que os exclua)

Ban. = Valor normativo: 4 a 5 banalidades para 30 respostas.

R= Valor normativo: 30 respostas

T.A.: Tipo de apreensão

Anota-se as localizações apresentadas no protocolo segundo a ordem convencional (G-D-Dd-


Dbl-Do) e sublinha-se aquelas cujas percentagens são superiores à norma e sobrelinham-se as
que são inferiores à mesma.

199
Avaliação em Psicologia Clínica

Pode ser:

- tipo de apreensão incompleto ou completo, dependendo do uso de todas ou só de algumas


apreensões.
- tipo de apreensão desarmónico ou harmónico dependendo da pouca ou muita utilização dos
tipos de apreensão.
(2 traços abaixo da letra – muito acima da média
1 traço abaixo da letra – acima da média
1 traço acima da letra – abaixo da média)

T.R.I.: tipo de ressonância íntima (serve para verificar se o sujeito está mais voltado para o seu
interior ou para o exterior. Procura dar-nos orientação interna do sujeito. Queremos saber
como é que o sujeito reage a estímulos externos. Ex: há pessoas que reagem mais
emotivamente a um concerto do que outras). Permite aceder ao mundo interno/externo, ou
seja da atitude que o sujeito tem para consigo próprio e para com o mundo. O mundo (externo
ou interno) é enriquecido pelo outro, e o TRI permite perceber se o sujeito investe mais no
interno ou no externo.

K (simboliza o mundo interno)/C (simboliza o mundo externo)

= K / C+CF+FC

200
Avaliação em Psicologia Clínica

(A cada resposta K atribuise 1 ponto;


A cada resposta C ou C’ atribui-se 1,5 pontos;
A cada resposta CF ou C’F atribui-se 1 ponto;
A cada resposta FC ou FC’ atribui-se 0,5 pontos)

Tipos de T.R.I
K >C T.R.I. Introversivo (<4 = reduzido e >4 = dilatado)
(pessoas mais isoladas, sós, com dificuldades na
socialização, mais criativos – dão muita
importância ao interior)
K<C T.R.I. extroversivo (<4 = reduzido e >4 = dilatado)
(pessoas menos criativas, mais sociais)

K ↑≅ C↑ T.R.I ambiqual (mais rico pois o sujeito dá muita


importância ao mundo interno e ao mundo
externo)
K↓≅ C↓ T.R.I. coartativo (PATOLÓGICO) (forma menos
grave do quartado. Mostra a presença de uma
inibição muito forte.)
K=0; C=0 T.R.I coartado (PATOLÓGICO) (neurose muito
grande ou psicose. Está tudo bloqueado, nada se
manifesta. não consegue exprimir afectos nem
trabalhar o imaginário.)

F.C.: Forma complementar (serve para nos ajudar a verificar se o TRI é mesmo interno o
externo) – quando o TRI é contraditório à FC, isto indica que há uma parte inconsciente
(recalcada) do sujeito que tende a ir contra o consciente. (Os k confirmam a introversividade e
os E confirmam a extroversividade.)

k/ E = kan+kob+kp / E+EF+FE

(kan, kp e kob= 1 ponto;


E = 1,5 pontos;
EF = 1,5 pontos;
FE = 0,5 pontos.)

R.C.: Reacção/reactividade à cor (percentagem das respostas dadas nos três últimos cartões
em relação ao número total de respostas. Serve para verificarmos se o sujeito reagiu muito ou

201
Avaliação em Psicologia Clínica

pouco à mudança da cor. Dá-nos conta do potencial afectivo do sujeito. É importante que
algumas destas respostas integrem a cor como determinante, pois são elas que dão conta da
mobilização dos afectos. Há outros cartões que também nos dão conta dos afectos (II, III), pelo
que se deve fazer a ligação disto com aqueles cartões e perceber se houve respostas
determinantes com a cor vermelha ou não.

∑ 𝑅 (𝑉𝐼𝐼𝐼+𝐼𝑋+𝑋)
𝑅
X100

(sendo que o valor normativo é de 30 a 40%)

I.A.: Índice de Angústia (forma muito directa/ grosseira para avaliar a angústia – permite
analisar se a angústia é forte ou não)

𝐴𝑛𝑎𝑡.+𝑆𝑔.+𝑆𝑒𝑥.+𝐻𝑑
x100
𝑅

(sendo que o valor normativo é de ˂12%)

3.1.3. Leitura dos traços salientes

3.2. Análise quantitativa


3.2.1. Estudo da actividade cognitiva e intelectual
3.2.2. Estudo do nível de socialização
3.2.3. Estudo da dinâmica afectiva

4. Posição das pranchas

Posição direita ^
Meia rotação à direita >
Inverte ˅
Meia rotação à esquerda <

5. Significados das cotações

G simples: testemunha a existência de uma adaptação perceptiva de base, que permite penar
que o sujeito possui possibilidades de abordar o mundo socializado; qualidade perceptiva
radica na realidade, estas respostas dizem respeito a uma moldagem do sujeito a uma
percepção dominante, sem esforço pessoal de elaboração ou de construção.

202
Avaliação em Psicologia Clínica

→ uma maioria de G também pode representar uma atitude defensiva que consiste em o
sujeito não se aplicar numa procura mais aprofundada ou mais pessoal, assim, pode remeter
para o recalcamento ou para uma desconfiança externa na relação ao outro.

D: significado adaptativo e socializado. Respostas D associadas a F+, FC ou K testemunham


uma capacidade de inserção no real e de controle das percepções - presença de um ego
suficientemente forte que se submete à prova da realidade. O D também poderá servir de
ancoradouro a todas as defesas que vão utilizar a realidade exterior para fazer face às
emoções e aos fantasmas do sujeito.

Dd: podem assinalar uma abordagem intelectual ou cognitiva meticulosa e minuciosa,


inscrevendo-se num registo defensivo de estilo rígido.

Dd arbitrário: movimentos de um pensamento ilógico, interpretativo, mesmo delirante.

Dbl: pode revelar uma atitude de oposição que se manifesta ao nível do modo de apreensão;
também pode ser entendido como uma falta fundamental de carência verdadeira nas
primeiras relações com a mãe.

F: número suficiente de F testemunha a utilização de um modo de funcionamento corrente,


habitual, normal e necessário, que consiste em apreender a realidade o mais próximo possível
do seu contorno formal.

F%: supõe uma obediência de base à instrução que consiste em moldar-se aos quadros
perceptivos mais salientes, tendo em conta a realidade.

F+: permite apreciar a adaptação perceptiva e socializante de um sujeito; critérios de resposta


F+ são duplos: o F+ pode corresponder a uma resposta relativamente corrente ou por outro
lado podem corresponder a produções mais raras.

F-: são necessários pois mostram a capacidade do sujeito de se enganar, de falhar, de se


perturbar e de diminuir o controlo; se ultrapassarem as normas assinalam a ineficácia das
defesas da realidade ou a derrapagem de adaptação perceptiva.

F±: podem assinalar um pensamento vago que não encontra os seus limites, que deixa a
realidade exterior escapar a qualquer circunscrição precisa; podem também traduzir
mecanismos de ordem da dúvida, da hesitação, da precaução externa, da prudência face à
implicação que suscita a tomada de decisão.

203
Avaliação em Psicologia Clínica

Cinestesia: são as respostas mais importantes, porque são aquelas que se encontram
carregadas de mais elementos do mundo interno do sujeito → como não há movimento nas
imagens, o movimento que o sujeito relata é uma criação sua. Dá informação suplementar na
medida em que elas se definem pela projecção de um movimento que não existe no material.
De cada vez que uma cinestesia é sustentada por um percepto de boa qualidade, organiza-se
um compromisso harmonioso entre percepção e projecção; índice de aptidão de um sujeito
para se situar numa área transitiva (a realidade perceptiva e o investimento de sentido
subjectivo).

K: forma humana dotada de vida é interpretada, quer o movimento ou a acção das


personagens → questão da construção da pessoa em relação com o seu meio objectal.

Kan: cinestesias animais – grandes cinestesias incompletas, o sujeito não assume o que vai
projectar, deslocando de forma imatura para os animais. Caracterizam o fabulário e as
fantasias imaginárias da infância; dizem respeito às moções pulsionais e às procuras objectais
primárias, em que as conotações orais são extremamente frequentes; remetem para o
deslocamento dos movimentos pulsionais para imagens animais – a sua dimensão agressiva ou
libidinal pode ser destacada com facilidade.

Kob: cinestesias objecto: tem a ver com a agressividade integrada parcial e não integrada na
personalidade. O movimento é projectado no conteúdo objecto; emana de uma fonte interna,
da excitação corporal; pode aparecer sob a forma de ameaça para a ocorrência de uma
explosão ou desintegração, ou pode servir de porta-voz de fontes de vida ricas e calorosas.

Kp: projecção de movimentos em imagens humanas parciais, ou projecção de movimentos


mínimos em imagens humanas inteiras. São respostas suportadas em mecanismos de
identificação projectiva; as cargas fantasmáticas são aqui intensas e as partes más, não
aceitáveis pelo sujeito, são atiradas para o exterior.

C: estão associadas aos afectos, sentimentos e emoções → aproximação subjectiva ou afectiva


à realidade → permite ver se o sujeito se ligou à realidade através do subjectivo. Intervenção
da cor nas respostas remete para uma consideração das características da realidade exterior;
um certo número de resposta C remete para uma simples constatação perceptiva; em
oposição a ausência de respostas que utilizam a cor pode inquietar pelo levantamento ou o
desinteresse pelo mundo exterior.

204
Avaliação em Psicologia Clínica

FC: leva a aspectos de formação reactiva, de conformismo e de submissão passiva aos


estereótipos adaptativos; estes conteúdos também se referem ao mundo concreto e social de
que à subjectividade emocional e fantasmática do indivíduo.

CF: comandada pelas forças defensivas que têm tendência a minimizar ou a negar o impacte
emocional e fantasmático do material.

C’: sinal de alerta, inquietação vaga, pouco circunscrita, reenviam às relações precoces;
retraimento pulsional narcísico. Pode assinalar apenas a presença de um sentimento, ou
mesmo de uma impressão disfórica muito próxima.

Clob: têm a ver com o contraste disfórico e desagradável do fundo branco com o preto da
mancha que deixa o sujeito perturbado.

E: resposta determinada pela sensibilidade aos tons esbatidos.

FE: esbatimento textura: refere-se à sensibilidade táctil, ao tocar; a referência ao tocar implica,
de imediato, a reactivação de uma sensibilidade primária muito precoce → o tocar, o ser
tocado reenviam-nos aos cuidados da primeira infância; refere-se a uma procura de apoio, de
um continente, de um envelope.

Edifusão: são constituídos por engramas pouco definidos; tem um valor defensivo no avançar
de respostas vagas que desempenham um papel de ecrã relativamente às emergências
fantasmáticas – mecanismo de recalcamento.

EF: esbatimento de perspectiva: são constituídos segundo três dimensões, em que o


esbatimento dos tons é explorado enquanto definidor de diferentes planos no espaço; a
utilização tridimensional do esbatimento, ao mesmo tempo que assinala as insatisfações
narcísicas do sujeito, sublinha o esforço para as remediar através de uma conduta activa e de
uma articulação perceptiva-sensorial.

A: constitui um fato de integração adaptativa e socializante. Um A muito elevado pode


assinalar uma carapaça social rígida como defesa maior, utilizada para evitar o contacto
autêntico, a relação verdadeira. Um A% muito baixo não tem de obrigatoriamente significar
uma falha na socialização.

H: dá conta da capacidade de um indivíduo se identificar com uma imagem humana. O H% é


considerado um índice de socialização.

205
Avaliação em Psicologia Clínica

(H): pode estar integrado numa vida imaginária rica de fantasia, mas não deve constituir a
maioria das respostas H, pois nesse caso o sujeito refugia-se num mundo cortado da realidade
relacional e concreta, não consegue diferenciar o real do imaginário.

Hd: pode tratar-se de uma abordagem fóbica da representação humana; pode estar ligado ao
recalcamento das representações sexuais. Quando o H% é constituído maioritariamente por
resposta Hd isto pode traduzir uma ausência de integridade das imagem do corpo e/ou a
existência no sujeito de uma angustia de fragmentação.

Anat.: duro (osso) ou mole (fígado, pulmão). Os conteúdos anatómicos moles mostram que o
sujeito localiza as suas preocupações no corpo ou intelectualiza de forma defensiva para ficar
bem visto pelo examinador; pode ainda ter um valor sexual

6. A Psicopatologia no Rorschach

♥ AS NEUROSES

- O Simbolismo:
Os protocolos de pacientes neuróticos põem em evidência uma sensibilidade particular à
especificidade dos estímulos, o que se observa em:
 Reacções diferenciadas em relação às diferentes pranchas
 Variações nos tempos de latência
 Variações na produtividade
 Existência de choques e equivalentes choque
 Multiplicação de comentários
Assim, as modalidades de reacção podem ser:
* Inibição
Alongamento dos tempos de latência
Diminuição da produtividade
Choques
Recusas
* Aumento das defesas lábeis
Precipitação
Fuga para a frente
Latências curtas
Comentários e exclamações múltiplas

206
Avaliação em Psicologia Clínica

* Agravamento das defesas rígidas

Alongamento das latências


Precauções verbais
Multiplicação das respostas
Hesitações
Intelectualizações

A diferenciação do material pode, então, desencadear reacções ao simbolismo


particular de cada prancha; nesta medida, observam-se nos protocolos de pacientes
neuróticos modificações qualitativas e quantitativas no processo de resposta Rorschach face às
pranchas susceptíveis de reenviar para um simbolismo sexual (sobretudo as pranchas IV e VI,
mas também as II e III, na medida em que reactivam a dinâmica relacional). Assim, o
funcionamento neurótico no Rorschach faz com que o aspecto formal das imagens subentenda
um conteúdo latente, cujo simbolismo oferece ao conteúdo manifesto novas significações. Isto
testemunha a capacidade para inscrever o pensamento numa dupla referência, a saber
perceptiva e projectiva, e, portanto, num sistema onde a relação simbólica pode estabelecer-
se. O paciente neurótico raramente perde a consciência de que está a interpretar, o que se
traduz geralmente em precauções verbais, no uso dos verbos no condicional e em comentários
que põem a tónica na dúvida e no carácter subjectivo da resposta.
Outros factores do Rorschach dão conta dessa socialização de base - qualidade do F+%,
A%, H% e número de Ban - e demonstram a possibilidade de lidar com a realidade interna e
externa, mesmo quando esta capacidade está ameaçada pelo peso das projecções ou pela
massividade dos afectos. Esta dupla inscrição das respostas na realidade externa e no mundo
fantasmático e a oscilação entre uma e outro define o simbolismo no Rorschach.

- Os Símbolos Sexuais:
Se encontramos nos protocolos de pacientes neuróticos respostas simbólicas que reenviam
para as figuras parentais nos seus aspectos mais regressivos, o simbolismo que domina nestes
protocolos é o sexual, o que mostra a capacidade de deslocamento, através do recurso à
metáfora. Assim:
♥ Raramente encontramos respostas corporais directas e cruas.
♥ As respostas anatómicas dizem respeito ao hiper-investimento de determinadas partes
do corpo, baseado na atribuição de um sentido secreto sexual.

207
Avaliação em Psicologia Clínica

♥ Observamos o predomínio da angústia de castração (prancha II interpretada sob a


égide da angústia de castração e pranchas IV e VI reactivando a fantasmática sexual).

- O Conflito Intrapsíquico:

A Oscilação entre Processo Primário e Processo Secundário


O conflito no Rorschach expressa-se pela existência de tendências opostas no interior
da personalidade, uma assegurando a ligação à realidade e a outra destruindo esses laços.
Assim, observamos claramente na sequência das respostas movimentos que dão conta da
organização das instâncias psíquicas (id, eu, supereu). De facto, o funcionamento neurótico
mostra a articulação interna do conflito no seio de uma cena mental habitada pelas
representações dos movimentos pulsionais que constituem o seu núcleo - o espaço psíquico
está povoado de objectos internos representáveis e investidos afectivamente.
A existência de um conjunto razoável de respostas F- nos protocolos de pacientes
neuróticos permite-nos apreender o conflito do sujeito, demonstrando a ligação entre os
processos primários e os processos secundários e, portanto, pondo em evidência a formação
de compromisso (na verdade, um valor muito elevado de F+% pode dar conta de um hiper-
investimento da realidade externa como fuga à realidade interna). A ficção, a dramatização, o
romance, a ilusão e, portanto, o erro, são os modos de ser por excelência da neurose, logo, é
precisamente esta capacidade de ligação que nos permite fazer o diagnóstico diferencial entre
a neurose e os funcionamentos limite:
♥ Nos protocolos de pacientes neuróticos, existe sempre uma continuidade na
sequência das respostas, embora o compromisso entre o desejo e a defesa possa ser
manifesto ou latente.
♥ Nos protocolos de pacientes neuróticos, a emergência dos processos primários difere
das produções psicóticas, isto porque a ligação à realidade mantém-se satisfatória e as
distorções formais acompanham normalmente respostas de simbolismo sexual-
agressivo.

O Conflito entre Instâncias


O conflito entre instâncias é dificilmente apreendido no Rorschach, na medida em que não
é imediatamente observado, mas deve ser deduzido de determinadas características do
protocolo:
♥ O conflito entre desejo e defesa aparece na alternância entre a expressão dos desejos
(nomeadamente através da emergência dos movimentos pulsionais) e as
manifestações defensivas - por exemplo, a alternância entre uma imagem cinestésica

208
Avaliação em Psicologia Clínica

altamente projectiva e um determinante formal inibitório, que traduz a censura


superegóica, ou a associação de determinantes cinestésicos com determinantes
sensoriais, que mostram a angústia associada à expressão do desejo.
♥ O conflito entre desejo e defesa traduz-se também pela alternância de representações
contrastadas, nas quais os movimentos pulsionais subjacentes não aparecem
directamente, mas através da oscilação entre respostas com simbolismo sexual e
conteúdos mais neutros ou funcionando como ecrãs (estas oscilações dão conta da
capacidade de metabolizar os conflitos e aparecem fundamentalmente nas pranchas
IV e VI).

O Conflito Edipiano
Igualmente, o conflito edipiano não aparece como tal no Rorschach, na medida em
que não existem estímulos que reenviem para a triangularização, a diferença de sexos ou a
diferença de gerações; porém, o material do teste oferece configurações perceptivas que
favorecem a associação e a projecção de imagens sexuais masculinas e femininas, o que coloca
o sujeito numa situação conflituosa que implica:
 Reconhecer ou negar a identidade sexual das representações
 Reconhecer ou negar as dupla valência masculina e feminina que solicita processos
identificatórios específicos.
É na questão da identificação sexual que se centra o conflito edipiano no Rorschach.
De facto, a questão da integração corporal e psíquica não se coloca normalmente nos
protocolos de pacientes neuróticos - a representação do corpo aparece unificada e as
referências espaciais são sólidas e testemunham o sentimento de continuidade. No entanto, a
questão da identidade sexual, relacionada com a falha narcísica secundária característica
destes pacientes, está bem patente - os factores relacionados com a representação de si põem
em jogo a problemática identificatória que constitui o núcleo essencial da neurose. Assim, a
análise das cinestesias realça a extrema dificuldade (ou mesmo a impossibilidade) em
identificar claramente o género das imagens humanas: as representações humanas são
sexualmente neutras ou com uma identidade sexual ambígua ou reportam-se a imagens irreais
ou desvitalizadas.
Na neurose histérica, a reivindicação fálica traduz-se pela hiper-valorização dos
conteúdos de simbolismo fálico e pela desvalorização das referências femininas. Por outro
lado, na neurose obsessiva, a ambiguidade caracteriza as cinestesias e as associações nas
pranchas com simbolismo sexual, ambos fundados em representações de tipo homossexual.

209
Avaliação em Psicologia Clínica

- A Dramatização:
Outra característica dos protocolos de pacientes neuróticos é a capacidade de pôr em
cena as representações e os afectos, isto é, dramatizá-los através de cenários que permitem a
sua elaboração.
Na neurose histérica, a dramatização aparece essencialmente na verbalização e nas
características qualitativas do protocolo, as quais revelam a labilidade característica destes
pacientes. Tipicamente, estes são protocolos onde não existem muitas respostas K ou G
organizadas, aparecendo uma inflação das repostas C - os afectos precedem a representação e
dão às imagens um aspecto ambíguo, pleno de angústia e de interditos. Essa enorme
reactividade emocional mantém um estado de excitação permanente, que assegura a coesão
psíquica, ameaçada se o desejo for satisfeito.
Desde logo, a reactividade dos sujeitos histéricos às pranchas pastel tem um
significado singular: enquanto as respostas C das pranchas II e III colocam em jogo a
problemática sexual, as últimas três pranchas induzem movimentos regressivos
(nomeadamente representações primitivas e modalidades precoces de contacto com os
objectos), processo que se inicia desde logo na prancha VII, que frequentemente provoca
graves perturbações em sujeitos histéricos (pode acontecer a emergência brutal dos processos
primários e desorganização temporária das produções, compensadas pela aumento das
respostas C na prancha VIII).
Assim, o predomínio das respostas C tem:
♥ Função defensiva contra a emergência de conteúdos recalcados
♥ Função de manutenção da excitação
♥ Função defensiva contra a angústia desencadeada pela emergência de representações
ligadas a falhas inerentes às relações objectais precoces
Neste contexto, a excitação alimenta a dramatização dos movimentos pulsionais
dando-lhes a energia necessária para a inflação e exagero dos afectos. Esta dramatização
aparece também no comportamento do sujeito durante a passagem, tornando o processo
transferencial bastante patente: as expressões exageradas de afecto, os suspiros, a labilidade
aparecem com o intuito de chamar a atenção e seduzir para desviar a relação com o clínico
para um outro contexto fora da situação de teste, que é angustiante, reactivando fantasmas
de sedução na relação transferencial.
Na neurose obsessiva, a dramatização passa por condutas activas de construção e
elaboração, baseadas no hiper-investimento do pensamento, que se traduz em respostas K ou
em G’s organizados acompanhando respostas formais de boa qualidade (em geral reactivando
uma fantasmática homossexual e/ou anal). Este tipo de respostas dá conta da importância

210
Avaliação em Psicologia Clínica

dada ao controlo e vigilância através do pensamento, enquanto que os movimentos pulsionais


são reprimidos ou, pelo contrário, expressados explosivamente (segundo o esquema clássico
da retenção-expulsão).
No entanto, esta actividade representacional é, por vezes, decepcionante nas
produções - a dramatização cinestésica parece pretender surgir em toda a sua amplitude, mas
a repressão imposta aos movimentos pulsionais restringe a expressão, o que se reduz no
carácter repetitivo (por vezes mesmo perseverante) das respostas.
A dramatização também está presente na neurose obsessiva na persistência de uma
sensibilidade à cor que pode ser relacionado com a existência de um núcleo histérico; na
verdade, a ausência de repostas C num protocolo obsessivo piora o prognóstico e a avaliação
da gravidade do quadro, isto porque a existência de respostas C mostra que o contacto com as
estimulações exteriores é ainda possível e que ainda tem ecos internos.

- Conclusão:
Resumindo, as características dos protocolos de pacientes neuróticos são as seguintes:
♥ Fonte sexual dos conflitos e sua tradução simbólica, a qual dá conta da capacidade de
deslocamento e de mentalização do sujeito; tais conflitos não se exprimem
directamente devido à repressão do superego, o que assinala a organização
estruturante dos interditos edipianos associados à angústia de castração
♥ Continuidade e plasticidade do trabalho psíquico, que se traduz nos movimentos
associativos (através dos conteúdos fantasmáticos e das operações defensivas) e que
reenvia para a estabilidade da identidade e da individuação, garantindo a conservação
dos aspectos dinâmicos e relacionais e permitindo a utilização de vários registos de
funcionamento
♥ Eficácia do recalcamento

Estas características dão conta da existência de um espaço privado, construído


através das ligações estabelecidas entre os elementos que dele fazem parte e da
qualidade libidinal dos investimentos objectais; em certa medida, tal espaço privado
oferece um continente para as produções imaginárias do sujeito, produções essas que
podem ser contadas, dramatizadas perante o olhar do outro

211
Avaliação em Psicologia Clínica

♥ O NARCISISMO

- O Rorschach e o Narcisismo:
Algumas características do Rorschach permitem-nos analisar a dimensão do narcisismo:
♥ A organização espacial das pranchas
 Pranchas compactas - a fronteira entre o interior e o exterior tem que ser
estável e bem definida para que estas manchas sejam reconhecidas enquanto um
todo unificado e coerente
 Pranchas bilaterais - evocam a representação da relação, podendo reactivar a
dimensão especular
♥ As qualidades cromáticas e sensoriais das pranchas
 Os contrastes negro - branco podem induzir afectos depressivos ligados ao
vazio (podem emergir fantasmas de morte evitados por respostas de abstracção ou
imagens que revelam o esvaziamento ou arrefecimento)
 O vermelho pode desencadear defesas rígidas contra os movimentos pulsionais
 As cores pastel podem demonstrar a qualidade das relações estabelecidas com
os objectos

- Características do Narcisismo:

Manifestações qualitativas
♥ Modalidades particulares da relação transferencial
 Condutas caracterizadas pela sedução sem conotação sexual, baseados em
movimentos de idealização e relação especular (o clínico é valorizado pelas suas
competências e saberes, à medida das qualidades excepcionais do próprio sujeito)
 Condutas de desprezo face à situação de teste, ao material e ao clínico
♥ Características da verbalização
 O sujeito refere-se constantemente a si mesmo, tanto nos comentários como
nas respostas propriamente ditas
 A situação é explorada como lugar de manifestação de uma subjectividade
omnipresente que, simultaneamente, se desenrola perante o olhar do outro e o
nega, com o objectivo de evitar todo o encontro com o outro, atribuindo-lhe um
papel de espelho que neutraliza as trocas pulsionais (distingue-se da verbalização
histérica, na medida em que está ausente qualquer conotação libidinal)
 A expressão de certos temas aparece enfatuada: a verbalização afirma sem
«nuances» o saber, o domínio, o poder

212
Avaliação em Psicologia Clínica

 Observa-se a utilização de adjectivos exagerados, baseados em movimentos de


idealização e desvalorização
 Nas pranchas que solicitam de maneira particular os movimentos pulsionais,
observamos comportamentos com finalidade narcísica:
 Evocação de experiências valorizantes;
 Rejeição massiva do teste ou da situação, tornados responsáveis pela pobreza
associativa;
 Centração sobre a simetria como manobra defensiva utilizando as
características objectivas do material;
 Enfatização da dimensão especular das pranchas bilaterais;
 Referências ao eixo médio das manchas impregnadas de referências narcísicas
ou de significados objectais inscritos no contexto de uma relação anaclítica

O Hiper-Investimento dos Limites


♥ Boa ligação à realidade
 Os valores elevados de F% e F+% mostram a capacidade de circunscrever o
objecto e diferenciá-lo do contexto em que se inscreve
 O elevado valor de F%, associado a um F+% satisfatório, dá conta de um grande
investimento no estabelecimento de fronteiras entre o interior e o exterior
(colocando em jogo a problemática do envelope corporal) e do recurso às
características objectivas dos estímulos (as respostas F têm um significado defensivo
de inibição dos movimentos pulsionais, sobretudo agressivos)
♥ Predomínio de respostas tipo «pele» (respostas que evocam uma superfície que
impõe limites entre interior e exterior)
 A importância conferida aos limites e a necessidade de se apresentar como
uma superfície sem falhas camufla o “tecido esburacado” que caracteriza as
personalidades narcísicas
 A necessidade de manter a continuidade do ser face à ameaça de morte leva a
um contra-investimento das barreiras com o duplo objectivo de, por um lado,
preservar o espaço interno e manter o outro afastado e, por outro lado, manter a
imagem ideal de si.
 Na depressividade, a angústia de diluição é ainda mais óbvia - aparentemente,
há uma maior evocação objectal, mas este objecto desejado não é um outro
separado do self, mas um objecto que tem como função colmatar as falhas do
sujeito; isto expressa-se numa maior permeabilidade das fronteiras, numa

213
Avaliação em Psicologia Clínica

diminuição do controlo formal e no excesso de identificação projectiva (o sujeito


confunde-se com o material).

A Representação de Si e a Idealização
♥ Idealização do Self grandioso
 A análise das respostas tendo em conta duas dimensões - grau de realidade
das imagens e amplitude da idealização ou desvalorização - dá conta da
permanência do Eu Ideal e da sua não substituição pelo Ideal do Eu (as respostas H
vão desde as representações humanas sem distanciamento no espaço e no tempo,
mas ainda adaptadas, até respostas humanas irreais e descritas de forma
completamente positiva ou completamente negativa; as respostas A podem ir
desde respostas de boa qualidade formal, apresentadas de forma negativa ou
positiva, mas sem excessos, até imagens de animais irreais, apresentando
distorções perceptivas, dadas em termos excessivamente positivos ou negativos)
♥ Outras manifestações
 Recurso extremo a adjectivos que enaltecem ou desvalorizam as imagens
percecionadas, como se os objectos não existissem por si, mas apenas perante o
olhar de alguém (o sujeito narcísico e os seus objectos não existem senão através do
olhar-espelho que reflecte as suas características idealizadas ou altamente
desvalorizadas)
 Respostas K com o selo do disfarce, do factício, isto é, do falso self, reenviando
sempre para a aparência, para a periferia e para o contorno
 Tendência para a desvitalização, baseada em mecanismos de idealização-
desvalorização (a desvitalização dos conteúdos humanos dá conta da luta do sujeito
para negar a origem interna das pulsões, que são petrificadas e associadas a uma
representação de omnipotência, esvaziada de toda a vida e acção)
 Ausência de processos identificatórios em termos sexuais (não há atribuição de
sexo às imagens ou essa atribuição assenta na bissexualidade)

Representação da Relação
♥ O desdobramento
 Projecção do Eu Ideal sobre os objectos, baseada num mecanismo de
desdobramento
 Ausência de conflito entre instâncias (o supereu não age, excluindo todos os
sentimentos de culpa)

214
Avaliação em Psicologia Clínica

 Relações especulares expressas directa (afirmação do carácter idêntico das


representações humanas e multiplicação das repostas de tipo «reflexo») ou
indirectamente (através das respostas humanas nas quais a interacção está ausente,
mesmo que sejam percebidas duas personagens), visando manter a unidade,
afirmando ao mesmo tempo a duplicação.
 O outro não existe enquanto tal (a evocação do outro provoca excesso de
excitação libidinal, desencadeando angústias demasiado incontroláveis).
♥ Negação dos movimentos pulsionais (particularmente observada nas pranchas II e III,
já que estas reactivam modalidades relacionais, nas quais os investimentos libidinais
e/ou agressivos podem ser mobilizados)
 Na maior parte das vezes, o vermelho não é interpretado nem integrado nas
respostas.
 Quando há interpretação do vermelho, este é sobretudo explorado como
referência descritiva, usada para delimitar a imagem (não há associação entre o
vermelho e a pulsão, mas uma atitude de não saber, de incerteza que parece ser uma
negação drástica do impacto pulsional da cor).
 As respostas K assentam no mesmo tipo de condutas
- Os verbos são imprecisos
- A dúvida é verbalizada quando a acção é projectada
- A acção é banal, estilizada ou estereotipada
- O sujeito mantém-se numa atitude de neutralidade evasiva

As Modalidades Defensivas
♥ Clivagem
 G’s maioritariamente primários e impressionistas, mostrando a dificuldade de
integração e síntese do sujeito
 As cores desencadeiam afectos muito contrastados, com grandes oscilações
entre sentimentos muito positivos ou muito negativos
 As cinestesias reenviam para representações muito idealizadas ou altamente
desvalorizadas
 Nos determinantes formais, observamos a manutenção do juízo da realidade,
acompanhada por bruscas e brutais emergências dos processos primários, ilustrando
o funcionamento clivado
 Nas temáticas utilizadas, observam-se três características - existência de
perceptos ou muito positivos ou muito negativos; sobreposição de imagens muito

215
Avaliação em Psicologia Clínica

idealizadas e muito desvalorizadas; fragmentação de perceptos habitualmente


apreendidos globalmente, percepcionados com conotações subjectivas heterogéneas
e contraditórias
 Temas de omnipotência mágica (imagens de divindades, reis, fadas, mágicos,
etc.) apresentados numa sequência tal que mostra a visão maniqueísta do mundo.

♥ Identificação projectiva
 Projecção sobre os objectos de partes do self, acompanhada pela necessidade
de controlar esses objectos, impedindo-os de qualquer acção (a inibição dos
movimentos pulsionais é activamente procurada em imagens imóveis ou
petrificadas)
 Movimentos autênticos de identificação projectiva em repostas isoladas,
baseadas numa agressividade oral muito intensa, na evocação de personagens
maléficas associadas a kp’s ou no surgimento de um bestiário inquietante ou
persecutório

A Angústia Branca e a Depressão Anaclítica


♥ Encontramos raramente as características ligadas à angústia de castração
♥ Encontramos frequentemente a angústia de abandono (a dimensão destrutiva pode
estar presente mas assume as cores do luto - negro - e do vazio - branco)
* Existência de muitas respostas C’, que dão conta de uma sensibilidade
específica ao branco, relacionada com a relação precoce e os afectos
depressivos a ela associados
* Respostas Dbl reactivando as experiências de falta e a carência afectiva
* Hiper-investimento da sensação
* Aparecimento de temas de frio, vazio e branco nas pranchas com
simbolismo materno mais patente, o que dá conta de uma insuficiência da
imago materna
* Utilização de respostas C’ enquanto tentativa de neutralizar o desejo e
extinguir a pulsão
* Surgimento da morte em imagens de decomposição e degradação que
ameaçam o narcisismo do sujeito e reenviam para o medo de ver o
edifício narcísico, fundado na idealização, desmoronar.

216
Avaliação em Psicologia Clínica

♥ AS PSICOSES

- Sinais de Psicose no Rorschach:


Segundo Palem, os protocolos de pacientes psicóticos apresentam as seguintes
características:
* F+% inferior a 70% Indiferenciação Eu - Outro
* Recusa ou equivalente na prancha V má
qualidade da ligação à realidade
* Perseveração Falhas na identificação primária;

* Ausência de K’s e H’s Particularidades dos processos


* Confabulação ou fenómenos aparentados cognitivos (pensamento bizarro).

* Presença de abstracção
* Presença de Cn (nomeação das cores) Perturbação emocional e relacional
(ausência de contenção e integração dos
* TRI extratensivo afectos)

* Choque na prancha VII e IX -perturbação da relação objectal precoce

Fragilidade na representação de si;


* Referências pessoais na prancha IX
* Conteúdos relacionados com a Falhas na integração corporal

fragmentação, a morte e a doença

* R baixo - repressão das associações / pobreza associativa e fantasmática

- Perturbações do Pensamento, Imagem Corporal e Representação da Relação:


Os mesmos factores que são classicamente considerados como determinados pelo
trabalho do pensamento revelam-se também portadores da representação da imagem de si e
da relação.

A Atenção
A descontinuidade psíquica é impressionante e manifesta-se em:
♥ Quantidade de rupturas (os pacientes psicóticos abordam as pranchas sem manter
uma atenção continuada).
♥ Importância das dificuldades de concentração, associadas a fortes dificuldades de
selecção.
♥ Falência das condutas de atenção e diferenciação:

217
Avaliação em Psicologia Clínica

- Escolha de localizações não habituais


- Frequência elevada de respostas Dd
- Indiferenciação figura-fundo (demonstrada pela utilização como localização do
branco tanto como do negro ou dos detalhes coloridos, pelo nivelamento do espaço da
pranchas e pela neutralização das diferenças)
- Perseveração (obedece à compulsão de repetição e traduz-se no aparecimento
reiterado de respostas semelhantes em pranchas diferentes, o que implica uma não
observação das características da realidade e uma incapacidade de diferenciação).
♥ Modo de apreensão favorecendo a abordagem global; quando aparecem, as respostas
Dd não dizem respeito a uma atitude de análise e exploração da mancha, aparecendo
em localizações extremamente raras, sem obedecer aos princípios da percepção,
sendo respostas de má qualidade formal e de carácter arbitrário (por vezes são
portadoras de associações interpretativas baseadas em mecanismos de identificação
projectiva).
♥ Respostas vagas e sem limites, que traduzem as dificuldade de separação entre os
objectos (negação da singularidade e da separação em relação aos objectos,
manifestada na sobreposição de imagens portadoras da representação de si e da
imago materna negação da alteridade).

A Dissociação
A noção de dissociação constitui o núcleo conceptual da análise do pensamento psicótico.
 Verbalização bizarra e plena de maneirismos
 Incapacidade para manter uma atitude ajustada à situação
 Ligações arbitrárias entre as palavras e as coisas, definindo articulações singulares
entre perceptos e sequências linguísticas
 Modalidades de construção herméticas, pouco acessíveis à compreensão
 Respostas desprovidas de ressonância emocional
 Instabilidade do fluxo associativo e aparecimento de bloqueios
 Representação do corpo fragmentada (a desintegração do corpo manifesta-se na
raridade das respostas humanas inteiras, na ausência de movimento, na ausência de
verbos, na não expressão da pulsão e na importância das repostas Hd e Anat, que
testemunham uma extrema fragilidade e uma ausência de continente - estamos
perante um self desmantelado e um aparelho mental fragmentado)
 Desdobramento que vem negar a relação e afirmar a indiferenciação Interior-Exterior,
expressa pela ausência de respostas K

218
Avaliação em Psicologia Clínica

 Incapacidade para se situar num espaço imaginário que permita o jogo


representacional (deserto do pensamento)

O Raciocínio
Os processos de pensamento psicóticos não se caracterizam pelo transbordar dos
processos primários, mas pela impossibilidade de construir representações mentalizadas e
pelo recurso a imagens corporais fragmentadas e sem ligação. A indiferenciação entre o
interior e o exterior é patente e traduz a ausência de continente psíquico.
♥ Deficit de capacidades de conceptualização (imagens concretas para representar
pensamentos abstractos e interpretação simbólica da cor ou do esbatimento como
defesa contra a angústia de fragmentação)
♥ Distanciamento do objecto ligada à noção de espaço psíquico - não há espaço
transicional (incapacidade de oscilação entre processos primário e secundários,
integrando aspectos projectivos e aspectos perceptivos)
♥ Aparecimento de G contaminados
♥ Multiplicação das respostas Anat (que reenviam para a extrema permeabilidade do
envelope corporal)
♥ Reactividade à cor e ao confronto relacional através do retraimento e fragmentação
♥ Força do contra-investimento que impede qualquer expressão dos processos primários

7. A angústia e os Mecanismos de Defesa no Rorschach

7.1. Tipos de Angústia


Angústia de Castração:
O fantasma da castração encontra-se sob os mais diversos símbolos, evocando a inveja
do pénis, o tabu da virgindade e os sentimentos de inferioridade; o tipo de conflito e o nível de
preocupações do sujeito constituem um elemento essencial e reconhecem-se na
especificidade das reacções aos cartões:
♥ Num protocolo lábil, os afectos são massivamente utilizados para impedir a
emergência das representações - a angústia exprime-se intensamente ao nível da
verbalização mas só muito raramente está associado a representações, sendo usada
como sinal de alarme
♥ Num protocolo rígido, as manifestações de afecto são dadas a mínima - a angústia é
perceptível pelo reforço das defesas, quer nos modos de apreensão (aumento de G),
quer numa multiplicação de recortes com a preocupação constante de se colar à

219
Avaliação em Psicologia Clínica

realidade do estímulo (respostas F), valorizando a realidade objectiva contra a


emergência de representações angustiantes
♥ Num protocolo inibido de tipo fóbico, encontramos restrição do campo perceptivo e
tendência para a concretude, mas os afectos podem aparecer de forma massiva e
brutal, em particular sob a forma de bloqueio

Angústia da Perda do Objecto:


A qualidade das problemáticas depressivas no seio da organização psíquica do sujeito
manifesta-se claramente no Rorschach, sendo os índices de depressão:
♥ Inibição
♥ Sensibilidade específica ao preto e ao branco
♥ Tonalidade disfórica dos conteúdos de referência
♥ Capacidade em associar e ligar um afecto de sofrimento a uma ou várias
representações de perda
Angústia de Aniquilamento:
A angústia de aniquilamento pode expressar-se em afectos maciços e transbordantes
ou, pelo contrário, numa ausência total de afectos, reenviando essencialmente para a noção
de integridade corporal.

7.2. Os Mecanismos de Defesa


Os diferentes tipos de mecanismos de defesa vão traduzir-se, no Rorschach, através de
três tipos de dados. Os procedimentos podem, com efeito, aparecer:
♥ quer fora da resposta cotável, na verbalização ou nas características qualitativas não
verbais que acompanham a produção de imagens
♥ quer na própria resposta, no seio de uma sequência associativa estigmatizada por uma
cotação
♥ quer através de um ou vários factores combinados cujo agrupamento permite
determinar um mecanismo de defesa específico.

1. Defesas da Série Rígida

- Procedimentos Rígidos:
 Manifestações fora da resposta

220
Avaliação em Psicologia Clínica

Traduzem a preocupação do sujeito em ajustar ao máximo a imagem associada que


fornece à realidade perceptiva do cartão e dão à verbalização um aspecto muito específico,
pesado e embaraçado, escondendo as representações significativas para o sujeito
♥ Precauções verbais
♥ Dúvida
♥ Ruminações
♥ Denegação (referindo-se ao aspecto externo da percepção)
♥ Apego aos pormenores (traduzindo-se nos comentários e descrição minuciosa dos
engramas)
♥ Precisões numéricas (aparecendo na discriminação escrupulosa de alguns elementos
do material)
♥ Formações reactivas (traduzindo-se em fórmulas de respeito e comentários objecto)

 Respostas ou sequências de respostas


♥ Denegação
♥ Formação reactiva
♥ Dúvida traduzida pela hesitação entre duas imagens ou entre duas interpretações no
seio de uma mesma resposta

 Factores específicos
♥ Descrição (focalização nos contornos externos que dá conta de uma formalização
excessiva)
♥ Expressão de afectos a mínima (tipo de ressonância íntima coarctado ou introverso o e
respostas sensoriais pouco numerosas são testemunho da luta contra a emergência
dos afectos e das emoções)
♥ Dúvida (elevação do número de respostas F±, que mostram o receio do compromisso
e da tomada de posição)
♥ Preocupação de domínio do material (evidencia a necessidade de manter os desejos e
de controlar as emergências pulsionais consideradas perigosas)
♥ Apego aos pormenores (utilização de D e Dd)
♥ Intelectualização (combinação de vários factores - presença de G organizados,
determinantes cinestésicos, conteúdos específicos, comentários)
♥ Isolamento ou negação das ligações, quer entre representações e afectos (traduzindo-
se no aumento do F% e pela escassez de determinantes sensoriais), quer entre duas
representações (traduzindo-se num aumento da percentagem de respostas D e Dd)

221
Avaliação em Psicologia Clínica

- Mecanismos de Tipo Obsessivo:


Nos protocolos neuróticos de tipo obsessivo, os procedimentos defensivos rígidos têm
influência.
 Formalismo excessivo - F% elevado associado a um controlo medianamente eficaz
(apesar do aparecimento de engramas F- com significado dinâmico) mostra o uso
preferencial do recurso à realidade externa como defesa contra a realidade interna -
que, porém, se infiltra através do aparelho defensivo (retorno do recalcado).
 Isolamento - recorte perceptivo que ignora os laços e as relações entre as imagens
 Anulação retroactiva - evidenciada na hesitação entre imagens diferentes, opostas,
mesmo contraditórias, na presença importante de respostas vagas, na ruminação na
verbalização, no ir-e-vir entre representações contrastadas
 Formação reactiva - manifesta-se nos comentários, nas respostas particulares e nos
factores específicos já citados, assim como nas dificuldades de integração/expressão
da agressividade, no comportamento face ao clínico, na representação da relação
(muito centrada na delicadeza, conveniência ou negação do carácter conflitual)
 Denegação - aparece através de comentários e na sequência das respostas

Defesas Rígidas de Carácter

- Ausência de articulação:
 Procedimentos rígidos não articulados entre si (não há congruência entre
manifestações fora das respostas, associações fornecidas e factores específicos)
 Mecanismos isolados erigidos em condutas comportamentais, cuja dimensão agida se
traduz em F% muito elevado e não contradição das formações reactivas (não há
retorno do recalcado)
 Não há anulação retroactiva (a dúvida não é permitida dada a extrema rigidez).
-Eficácia relativa dos procedimentos defensivos:
 Não há formação de compromisso (as emergências em processo primário ou estão
completamente ausentes ou são particularmente cruas e directas)
 Conjuntamente com as defesas rígidas aparecem mecanismos de inibição
consideráveis ou procedimentos defensivos primários (clivagem, recusa, projecção
interpretativa)
 Mediocridade do controlo formal

222
Avaliação em Psicologia Clínica

Defesas Rígidas de Tipo Narcísico

 Centração na simetria e referências ao eixo mediano - utilizadas como recurso às


características objectivas do estímulo e servindo de suporte a relações especulares,
negando a diferença
 Valores elevados de F% e F+% - sobreinvestimento das barreiras (porém, o controlo
pode ser invadido por uma fantasmática deformante)
 Conteúdos A - animais com carapaças ou peles específicas
 Conteúdos Obj - roupas, tecidos, máscaras, armaduras
 Conteúdos H - respostas humanas caracterizadas pela função consignada.

2. Defesas da Série Lábil

- Procedimentos Lábeis:
 Manifestações fora das respostas
Recurso a alguns elementos da realidade interna (em particular, os afectos) como
defesa contra a emergência de outros elementos dessa realidade interna (nomeadamente, as
representações):
♥ Comentários regulares, gerais, iterativos, que surgem desde a apresentação dos
cartões e dão a impressão de uma reactividade imediata.
♥ Dramatização - carácter excessivo e exagerado da verbalização, ênfase dado à
expressão de prazer/desprazer.
♥ Labilidade das reacções emocionais, muitas vezes contrastadas - sugestionabilidade,
vulnerabilidade e sensibilidade ao meio envolvente.
♥ Acentuação do desconhecido, do não-saber, da ausência de imaginação sob forma de
denegações sucessivas.
♥ Manipulação lábil da linguagem - discurso precipitado, rapidez dos tempos de latência,
associações por contiguidade ou consonância.

 Respostas ou sequência de respostas


♥ Recalcamento - recusa ou incapacidade em fornecer associações nos cartões de
simbolismo sexual.
♥ Denegação - evitamento de uma representação cuja dimensão simbólica é evidente,
sendo investido um determinado tipo de conteúdo que serve de ecrã a essa
representação.
♥ Erotização das relações através das encenações cinestésicas.

223
Avaliação em Psicologia Clínica

♥ Realce da reactividade emocional - privilégio dado às cores na determinação das


respostas.

 Factores específicos – Recalcamento


♥ Cuidado em manter à distância os cartões - recurso a uma abordagem global e
imprecisa da mancha.
♥ Recurso às manifestações sensoriais - TRI extratensivo.
♥ Sugestionabilidade e vulnerabilidade - grande sensibilidade aos determinantes
sensoriais.
♥ Prevalência atribuída à realidade subjectiva - F% baixo.
♥ Simbolismo transparente.
♥ Confronto entre desejos contraditórios - carácter contrastado das associações.

 Factores específicos - Falência do recalcamento

♥ Fuga para a frente na interpretação.


♥ Flutuações importantes no registo das respostas.
♥ Manifestações emocionais muito intensas - TRI muito dilatado.
♥ Perda de controlo sobre a realidade objectiva - F+% muito baixo.
♥ Conteúdos crus com valência sexual e regressiva.

Mecanismos de Defesa Histéricos


 Recalcamento

♥ Qualidade geral da produção de factura lábil - comentários, teatralismo, dramatização.


♥ TRI extratensivo dilatado.
♥ Reacções específicas aos cartões de simbolismo sexual - recusa, agravamento dos
procedimentos lábeis.
♥ Espessura simbólica dos conteúdos (demonstrando o impacto fantasmático do
estímulo).
♥ Oscilação entre defesa e retorno do recalcado (evocando o conflito intrapsíquico) num
duplo registo de funcionamento, fantasmático e adaptativo.

Defesas Lábeis Narcísicas

- Manifestações transferenciais:
 Condutas de sedução.
 Desqualificação global e excessiva da situação de teste.

224
Avaliação em Psicologia Clínica

 Centração na vivência subjectiva - a situação é utilizada como lugar de ostentação e


exibicionismo.
- Tratamento da cor:
 Cor vermelha - negação dos movimentos pulsionais, quer pela ausência de utilização
ou integração do vermelho, quer pela exploração do vermelho como referência
descritiva.
 Cores pastel - dificuldade em comprometer-se num movimento regressivo, quer pela
ausência de respostas C pastel, quer pela exploração das cores como delimitadores
dos contornos.
 Cores acromáticas - sensibilidade ao cinza, ao negro e ao branco dão conta do recurso
à sensação como defesa face aos movimentos pulsionais.

Defesas Maníacas e Luta Anti-Depressiva


 Logorreia - produção maciça e confusa.
 Ausência de tempos de latência e de silêncios (as lacunas são insuportáveis).
 Associações por contiguidade ou consonância.
 Extrema reactividade ao meio (aumento considerável das respostas C).
 Frequência das emergências em processo primário (projecção maciça dos afectos).

3. Defesas da Série de Inibição

- Procedimentos de Inibição:
 Manifestações fora das respostas
♥ Tentativa de luta contra a implicação projectiva sentida como perigosa.

♥ Restrição na produção, na participação subjectiva e na verbalização.


♥ Tempos de latência longos.
♥ Silêncios numerosos.
♥ Recusas e bloqueios associativos frequentes.

 Respostas ou sequências de respostas

♥ Anonimato das personagens humanas.


♥ Imprecisão e indeterminação das acções projectadas.
♥ Frequência das repressões cinestésicas.

225
Avaliação em Psicologia Clínica

♥ Minimização dos movimentos projectivos - a redução das cargas pulsionais traduz-se


em fórmulas diminutivas ou verbos cujo alcance e intensidade é menor.
♥ Evitamento perceptivo de localizações particulares.
♥ Banalização como ecrã a uma expressão mais espontânea.

 Factores específicos

♥ Dificuldades de implicação e receio de envolvimento - F% elevado e muitas respostas


F±.
♥ Freio da expressão fantasmática - TRI e Fórmula Complementar coartados.
♥ Emergência de afectos de angústia - reactividade sensorial específica ao negro;
cinestesias isoladas com temáticas de queda/vertigem.
♥ Conteúdos fóbicos - animais ansiogénicos.
♥ Conteúdos hipocondríacos.
♥ Conteúdos banalizados, factuais e concretos, despojados de qualquer dimensão
fantasmática ou imaginária.

Mecanismos Fóbicos
Projecção
Evocação de imagens ansiogénicas (animais potentes; insectos repugnantes) que
aparecem num contexto restritivo - latências longas, verbalização limitada, manifestações de
ansiedade.
Evitamento e fuga
Manifestam-se através do comportamento, sideração face ao material, reacções de
angústia fortemente inibitórias e incapacidade associativa.
Deslocamento
Repetição da sequência projecção / deslocamento / evitamento nos cartões cujo impacto é
ansiogénico.

- Inibição nos Funcionamentos Borderline:


 Vazio ideativo - pobreza das produções, não-implicação na prova, recurso a imagens
de objectos concretos, desprovidos de referências latentes (F% muito elevado)
 Emergências cruas dos processos primários
 Respostas sem espessura simbólica e sem ressonância fantasmática

226
Avaliação em Psicologia Clínica

Defesas Primárias
- Emergência em Processo Primário:
 Manifestações fora das respostas
♥ Desconfiança, vigilância extrema e reticência do sujeito em envolver-se na prova.
♥ Grande diferença entre as produções espontâneas e o inquérito.
♥ Prolixidade e multiplicação das respostas.
♥ Abundância e extravagância da verbalização.

 Respostas ou sequências de respostas

♥ Localizações arbitrárias, mal definidas e pouco coerentes.


♥ Respostas F- que evidenciam a qualidade medíocre do controlo formal.
♥ Respostas cinestésicas interpretativas ou delirantes.
♥ Respostas C enquanto testemunho de ausência de contenção dos movimentos
pulsionais.
♥ Conteúdos específicos que assinalam a ausência de integridade corporal (Hd, Anat, Sg,
H/A, H/Obj).

 Factores específicos
♥ Má qualidade da ancoragem no real - F+% baixo
♥ Desinteresse pelo concreto/real - D% baixo.
♥ Invasões fantasmáticas - TRI muito dilatado.
♥ Fragilidade da socialização - diminuição do número de Ban.
♥ Conteúdos pertencentes a registos específicos - referências ao corpo em imagens
mutiladas / fragmentadas; respostas anatómicas; respostas (H) e Hd com conotação
persecutória; conteúdos A contaminados pela fragmentação; bestiário arcaico,
dominado pela perigosidade, omnipotência e destrutividade.
♥ Compulsão à repetição e indiferenciação - ausência de reactividade específica aos
cartões.

Mecanismos de Defesa Psicóticos

Os procedimentos descritos anteriormente sustêm os mecanismos psicóticos.


Projecção
Enquanto defesa compulsiva:
♥ A indiferenciação interno-externo manifesta-se na projecção de uma vivência corporal
fragmentada.

227
Avaliação em Psicologia Clínica

♥ A inadequação perceptiva das respostas está ligada ao não reconhecimento do objecto


enquanto tal.
♥ Num contexto paranóico, a projecção permite colocar no exterior as pulsões
agressivas destrutivas do sujeito.
Recusa
Rejeição em reconhecer a realidade:
♥ Recusa da castração e da diferença entre os sexos.
♥ Recusa em reconhecer a realidade exterior enquanto tal.

Resumo dos principais mecanismos de Defesa:

Identificação projectiva: 3 processos nesta operação: externalização das partes do Self com indiferença às
características reais do objecto externo; capacidade de misturar os limites entre si e o outro; necessidade
exagerada de controlar o outro. Partes do sujeito estão separadas: fica com o bom e projecta o mau.

Respostas isoladas (clivadas) subentendidas por uma agressividade oral muito intensa: respostas como
"mandíbulas", "dentes", etc., ou evocação de personagens maléficas (tais como "monstros" e "bruxas")
associadas a kp; ou, então, no aparecimento de um bestiário inquietante e persecutório ("uma espécie de
porco não muito agradável", "uma cabeça de ave de rapina", "aranhas, é mau").

Intensidade da projecção: A massividade da projecção ligada a uma qualquer problemática (medo, morte,
destruição, perseguição, etc.), conduz a uma distorção na captação do real.

Cartão VIII, respostas 17 e 18 no seu conjunto: “poderíamos chamar isto animais que sobem, ursos ou ratos
ou grandes ratos, ratazanas.”, “Aqui apercebo uma árvore, eles sobem uma árvore, tentam agarrar um
ramo. É desagradável mas é a verdade”

Intencionalidade projectiva: O sujeito está mais ou menos convencido que a imagem possui um sentido
oculto, que ele tem que desvendar. As intenções atribuídas às imagens, além de arbitrárias, atestam uma
convicção projectiva e interpretativa. Os elementos projectados não são reconhecidos pelo sujeito como
pertencendo-lhe, mas resultam de uma manipulação mal feita: a atitude é interpretativa.

Cartão IX, resposta 20: “No personagem há qualquer coisa de mau, nem homem nem animal”

Cartão VII, I.Limites: “é um erro, é preciso dizer francamente o que há” “zangada com uma colega”

Clivagem do ego: Coexistência, no seio do ego, de duas atitudes psíquicas para com a realidade exterior na

228
Avaliação em Psicologia Clínica

medida em que esta vem contrariar uma existência pulsional: uma tem em conta a realidade, a outra nega a
realidade em causa e coloca em seu lugar um produto do desejo. Estas duas atitudes persistem lado a lado
sem se influenciarem reciprocamente. Esta clivagem, como se vê, não é propriamente uma defesa do ego,
mas uma maneira de fazer coexistir dois processos de defesa: um voltado para a realidade (recusa), outro
para a pulsão, este podendo de resto redundar na formação de sintomas neuróticos (sistema fóbico, por
exemplo).

Denegação: aparece também na verbalização. Refere-se ao nível do discurso manifesto, ao aspecto externo
da percepção (e não à representação associada). “Processo através do qual o sujeito, apesar de formular
um dos seus desejos, pensamentos ou sentimentos até então recalcado, continua a defender-se dele,
negando que ele lhe pertence”- aparece através de comentários ou no seio de respostas ou de sequências
de respostas. Por outro lado, ela não constitui uma modalidade defensiva exclusivamente rígida, dado que
a encontramos noutras organizações neuróticas para além da neurose obsessiva. Ela é, no entanto,
característica tal como o recalcamento, de funcionamentos psíquicos do tipo neurótico, na medida em que
ela supõe a existência de um campo psíquico interno do sujeito, através do qual se manifesta um sistema de
representações e de afectos. Afirma negando.
“Não é claro”, “Não vejo bem”, “Isto não é, apesar de tudo, uma águia... não, não é uma ave de rapina,
qualquer coisa menos agressiva”.

Formação Reactiva: A referencia a mecanismos do tipo formação reactiva é possível quando somos
confrontados com traços convergentes do estilo: dificuldades na integração e/ou expressão da
agressividade (ou da atracção libidinal) no comportamento face ao clinico, representações de relações
(respostas K) muito centrados na delicadeza, na conveniência, ou na negação do caracter conflitual
agressivo ou libidinal dessas relações, em que os suportes perceptivos de tais respostas afastam a dimensão
cromática do estimulo (sobretudo o vermelho).
Para além do “Obrigado” no principio do cartão, surgem em comentários do tipo “Está muito bem
desenhado, muito ordenado, muito claro...”. “Dois mordomos que se cumprimentam”.

Centração Narcísica: Descrição fina e modulada dos afectos, dos traços de carácter, das vivências dos
personagens da história. A referência pessoal apareceria, pontual, esmaltando a história com comentários
de uma espécie de imediatidade que curto-circuita a elaboração. Podemo-nos aperceber até que ponto
este mecanismo (o acento posto na vivência subjectiva) concorre para a elaboração de uma história
centrada na descrição psicológica do herói e sem dramatização relacional. O sujeito coloca, través deste
funcionamento, uma representação de si mesmo".
- O sujeito recorre, nos seus comentários e nas suas respostas, a referencias unicamente reportadas a si

229
Avaliação em Psicologia Clínica

mesmo: o que ele experimenta, o que sente, a sua maneira de ver as coisas, as suas recordações,
fragmentos da sua biografia.
- A situação é explorada num único sentido - centrípeto- como lugar de manifestação de uma subjectividade
omnipresente que, ao mesmo tempo, se apoia no olhar do outro e o nega.
- O objectivo narcísico é evitar qualquer encontro com o outro, atribuindo-lhe um papel de espelho que
neutralize as trocas pulsionais.
- ênfase dada a alguns temas(que têm a ver, em particular, com tudo o que toca á representação de si), no
sentido de um extremismo das qualidades utilizadas, subentendido, sem dúvida, por mecanismos de
idealização ou de desvalorização.

Dramatização: capacidades mostradas pelo sujeito em encenar representações e afectos, isto é, em


dramatizá-los através de encenações que permitem a sua elaboração mais ou menos conseguida.
- nos protocolos histéricos, a dramatização aparece na inflação das respostas cor, que vai no mesmo sentido
da ênfase dos comentários: os afectos são mostrados, confere às produções uma espessura, ao mesmo
tempo intangível e ambígua, pesada de angustia e de não-dito. Mantém um estado de excitação
permanente (dominância de C).

Intelectualização: usa conhecimentos do próprio para dar sentido ao que vê. Aparece através da propensão
para a abstracção ("um domínio ou a fatalidade", cartão I; "a noite, a fatalidade", catão IV; "um abandono,
um dom de si", cartão VII). Esta tendência é particularmente forte na prova das escolhas e nos comentários
associados a cada um dos cartões sob a forma de títulos ("banalidade", "domínio", "majestade", "mistério",
"sabedoria",…) traduzem bem as preocupações essenciais reveladas, por outro lado, noutras associações:
salientam a oposição entre valores idealizados ("domínio", "majestade", "mistério", "fatalidade") e valores
muito desqualificados ("banalidade", "nada de nada", "pateta", "nham-nham"), num sistema de
qualificação projectiva que trai uma preocupação narcísica fundamental.

Clivagem: objecto ou muito positivo ou muito negativo (“devemos odiar o pecado e amar o pecador”).

Isolamento: Isola partes do objecto nem sequer falando delas, falando apenas do resto. Fala apenas de uma
parte das imagens tipo cartão 2 falar só dos elefantes e não do sangue.

Interpretação Projectiva: certeza daquilo que está a dizer (“aqui vê-se claramente”, “é muito óbvio aqui”).

Racionalização: tenta dar sentido a qualquer coisa de forma a sair da parte mais pulsional agressiva ou
sexual (“eu vejo pornografia por causa da arte”, “eles estão em luta, devem ser antropógrafos”).

230
Avaliação em Psicologia Clínica

Projecção: colocar no outro qualidades nossas ou desejos (“ele vai ser um grande artista”).

Identificação: identificar-se com um grupo ou com o Outro de modo a anular a ansiedade. (ex:
comportamentos delinquentes feitos em grupo).

Anulação: afirmar uma coisa e diz que não era isso. (“isso são elefantes, não… não, são mais pássaros”)

Introjecção: aceitar as qualidades dos objectos e torna-las como sendo suas (“esta pessoa é muito forte…eu
também sou assim”).

Deslocamento: passar as coisas de um objecto para o outro (“esta a discutir com a mãe, mas o pai é que nos
estava a irritar”).

Idealização: o outro é perfeito e sem falhas nenhumas ou então é horrível e não tem nenhuma
característica boa (“esta mulher é linda, todas deviam ser como ela”).

Conversão: Passar da mente para o corpo (“esta imagem está a dar-me dores de cabeça”).

Compensação: (“esta mulher não consegue ajudar os pais no campo por não ter força, por isso vai trabalhar
para a escola por ser muito boa aluna”)

231
Avaliação em Psicologia Clínica

TAT

Henry Muray criou esta prova projectiva de personalidade – o sujeito projecta o que
sente, o que está no seu interior, nas imagens que lhe são mostradas.

Este teste é temático e figurativo, sendo que cada imagem reenvia para um conflito
emocional universal específico (amor, ódio, solidão, sexo, etc.).

Apercepção – tem a ver com o facto do sentido/ da interpretação que o sujeito vai dar
a cada uma das imagens tem a ver com aquilo que está presente nas mesmas mas também
tem a ver com a memória do próprio sujeito (memórias sobre situações semelhantes que o
sujeito vivenciou, teme ou quer vivenciar).

Actualmente, apresentam-se apenas 13 a 14 cartões a cada sujeito.

O sujeito é convidado a contar uma história a partir de cada imagem. “Vou-lhe mostrar
algumas imagens. Gostaria que me contasse uma história para cada uma delas.”

Neste teste, ao contrário daquilo que acontece no Rorschach, não vemos o conflito,
mas sim o mecanismo de defesa do sujeito.

Tão ou mais importante do que aquilo que o sujeito diz (conteúdo), é a forma/ o modo
como o diz – é a forma que vai distinguir os sujeitos e as suas patologias. (Por exemplo: 2
sujeitos falam sobre cancro. 1 fala com calma enquanto o outro fala de forma muito
amedrontada).

Após o grande desuso, a escola francesa de TAT veio reabilitar o mesmo e torna-lo no
2º teste projectivo mais utilizado. O seu trabalho foi, em 1º lugar estudou o conteúdo latente
de cada imagem – quais os assuntos predominantes que têm de ser reconhecidos em cada
imagem. Em 2º lugar dedicaram-se a estudar o conteúdo banal para cada imagem – qual era o
tema mais frequente abordado pelas pessoas. Criou uma teoria acerca do TAT.

1) SITUAÇÃO TAT – situação muito particular em que um examinador pede ao sujeito para
imaginar uma história a partir de cada imagem. Só existe situação TAT quando há material
(pranchas), quando há uma instrução (dada pelo examinador ao sujeito) e quando há um
examinador. Tem também de haver um contexto profissional. Esta situação é
extremamente conflitual porque cada um dos parâmetros que a constitui encena uma
situação ou um conflito.

232
Avaliação em Psicologia Clínica

A) MATERIAL – qualquer cartão é constituído por um conteúdo manifesto (reenvia para


a imagem ser percepcionada – aquilo que está em cada imagem para ser visto) e por
um conteúdo latente (o que aquilo que e percepcionado – conteúdo manifesto – faz o
sujeito imaginar – reenvia para o processo primário do pensamento: a imaginação). O
sujeito entra em conflito pois não sabe se há-de dar mais importante àquilo que vê ou
àquilo que imagina.
B) INSTRUÇÃO – está-se a pedir ao sujeito que imagine (que funcione com o seu
processo primário do pensamento) mas ao mesmo tempo pede-se que controle essa
imaginação e que imagine segundo aquilo que vê – as imagens (processo secundário
do pensamento).
C) EXAMINADOR – diz ao sujeito que este tem a liberdade para fazer e para dizer tudo
aquilo que quer (processo primário do pensamento) mas ao mesmo tempo é ele – o
examinador – que dá a prancha ao sujeito. Ou seja, é ele – o examinador . que tem o
controlo, que realmente manda.

2) PROCESSO TAT – é o conjunto dos processos mentais ou da actividade mental que


ocorrem no sujeito enquanto este está numa situação TAT.
♥ 1º MOMENTO – o conteúdo manifesto da imagem é percepcionado.
♥ 2º MOMENTO – o conteúdo latente da imagem, juntamente com a instrução dada ao
sujeito (para imaginar) desencadeia no sujeito uma regressão, isto é, uma
abaixamento do controle do sujeito, desencadeando lembranças da sua vida sem que
este se aperceba ou percepcione.
♥ 3º MOMENTO – este conjunto de representações e afectos/ lembranças que não
estão organizadas (assim como tudo aquilo que pertence ao inconsciente) irá ou não
aceder ao consciente para ser simbolizado através de palavras. No caso do TAT, as
lembranças do sujeito vão ou não tornar-se conscientes dependendo da rigidez do
ego – um ego mais forte vai tornar o conteúdo consciente porque não tem medo de
exteriorizar/ de aceitar aquilo que quer dizer enquanto que um ego mais frágil não se
quer confrontar com determinadas realidades. Quando o sujeito tem um ego frágil,
isto faz com que apenas percepcione o conteúdo manifesto da imagem. Quando o
sujeito percepciona este mesmo conteúdo latente e ao mesmo tempo projecta o seu
íntimo tem um ego forte (por mais horrível/triste que seja a história contada por
este).

233
Avaliação em Psicologia Clínica

Depois disto, a escola francesa criou uma folha de análise/ decomposição do TAT. Consiste
num inventário de procedimentos que o sujeito pode utilizar para construir a sua história.
Estes procedimentos estão organizados segundo as formas psicopatológicas mais frequentes:

1. Conteúdo Manifesto e Conteúdo Latente


→ Prancha 1 ←

Conteúdo Manifesto: Um rapaz com a cabeça entre as mãos a olhar para um violino colocado
à sua frente.

Conteúdo Latente: identificação com um individuo jovem numa situação de imaturidade


funcional, confrontado com um objecto adulto, cujas significações simbólicas são
transparentes.

 Objecto e criança percebidos na sua integridade: o sujeito é capaz de se situar perante


um objecto inteiro
 O rapaz é incapaz, no tempo presente, de se servir do objecto mas a impotência será
ultrapassada no futuro: reconhecimento da angústia de castração
 Negação da imaturidade funcional e da impotência actual da criança: problemática
narcísica e luta anti-depressiva dominantes; evitamento da angústia de castração
 O rapaz é incapaz, nunca vai conseguir: insuficiência do investimento em si. Surgem
afectos depressivos
→ Prancha 2 ←

Conteúdo Manifesto: cena campestre com uma rapariga que segura livros. Homem com um
cavalo e uma mulher encostada a uma árvore, que pode ser percebida como estando grávida.
Diferença de gerações não é evidente, mas a diferença dos sexos é clara.

234
Avaliação em Psicologia Clínica

Conteúdo Latente: relação triangular figurada é suscetível de reativar o conflito edipiano.

 Efetiva diferenciação entre as personagens: identidade estável


 Relação dual entre o casal e a rapariga dependente ou por anulação de uma
personagem: conflito numa relação dual
 Pseudo-triangulaçao por telescopagem de papéis ou por clivagem entre o bom e o
mau objecto que se substitui à diferença dos sexos: processos identitários pouco
estáveis
 Reconhecimento do laço que une o casal e rapariga portadora de desejos libidinais em
relação ao homem e movimentos agressivos em relação à mulher: conflito edipiano,
movimento pulsional
 Atração pelo sexo oposto e rivalidade com a personagem do mesmo sexo
 Laços entre as personagens massivamente atacados: nos contextos psicóticos podem
ser associados a fantasmas da cena primitiva
→ Prancha 3BM ←

Conteúdo Manifesto: individuo cujo sexo e idade são indeterminados, caído junto de uma
banqueta. No canto esquerdo encontra-se um pequeno objecto difícil de identificar.

Conteúdo Latente: reenvia para a problemática da perda do objecto e poe a questão da


elaboração da posição depressiva; põe à prova a representação narcísica de si próprio e os
processos identificatórios.

 Afectos depressivos reconhecidos e associados a representação da perda de objecto


 Recusa do reconhecimento anterior: defesa do tipo maníaco

235
Avaliação em Psicologia Clínica

→ Prancha 4 ←

Conteúdo Manifesto: um casal, uma mulher junto de um homem que se afasta; diferença de
sexos clara mas não diferencia gerações.

Conteúdo Latente: remete para o conflito pulsional no seio de uma relação heterossexual;
existe uma maior representação do dualismo pulsional.

 Encontra-se com muita frequência instabilidade nas identificações, o que se traduz


pela tomada de posições alternativas masculinas ou femininas: por vezes é o homem
que é percebido como potente e forte e a mulher frágil e dependente ou, por outro
lado, uma mulher dominadora que se confronta com um homem fraco e submisso. É
importante que haja uma ligação possível entre a libido e a agressividade.
→ Prancha 5 ←

Conteúdo Manifesto: mulher de meia-idade, com uma mão na maçaneta olha para o interior
da sala; mulher está entre o dentro e o fora.

Conteúdo Latente: imagem materna que penetra, olha, não pré-julga sobre o registo conflitual
no qual o sujeito se vai situar, pois as modalidades de relação à imagem materna são
múltiplas.

 A mãe vem surpreender uma cena transgressiva: instância superegóica


 Imagem materna sedutora: mulher que mostra a perna nua entre a racha da saia:
fantasmas incestuosos.

236
Avaliação em Psicologia Clínica

→ Prancha 6BM ←

Conteúdo Manifesto: um casal, um homem visto de frente, com um ar preocupado e uma


mulher idosa que olha para algures; cartão estruturado pela diferença de sexos e de gerações.

Conteúdo Latente: remete para a proximidade mãe-filho num contexto de mal-estar. A


diferença de gerações reenvia para o interdito da aproximação edipiana, dado que a mulher
tem as costas voltadas para o jovem.

 Reconhecimento dos afectos: tema de luto; luto do pai com muita frequência,
podendo esta evocação ser sustentada por um fantasma de parricídio.
→ Prancha 6GF ←

Mesma coisa que a 6BM, mas o tema é invertido: pai/filha – temática de sedução.

Conteúdo Manifesto: representa um casal heterossexual. Uma jovem sentada no primeiro


plano, volta-se para um homem que se inclina para ela e tem um cachimbo na boca.

Conteúdo Latente: remete para um fantasma de sedução. Põe à prova a capacidade de


integrar a identificação feminina no seio de uma relação de desejo.

 Quando a problemática narcísica domina, há um sobre-investimento do corpo, do ar


ou da postura das personagens, a sua idealização, ou pelo contrário, a sua depreciação
sem verdadeira possibilidade de elaboração do conflito pulsional.

237
Avaliação em Psicologia Clínica

→ Prancha 7BM ←

Conteúdo Manifesto: representa duas cabeças de homens, lado a lado. Um “velho” virado
para um jovem que está amuado. Diferença de gerações marcada, mas não há noção de
imaturidade funcional.

Conteúdo Latente: reenvia para a proximidade pai-filho num contexto de reticência do filho. O
conflito deverá desenvolver-se em termos de ternura e oposição. A energia pulsional é
mobilizada tanto no seio de movimentos agressivos como libidinais.

 Quando uma proximidade mais terna é evocada: remete só para a erotização da


relação e pode testemunhar um apoio possível num bom pai, o que revela a resolução
do conflito edipiano e do acesso à ambivalência.
→ Prancha 7GF ←

Conteúdo Manifesto: é uma mulher com um livro na mão, inclinada para uma menina com
expressão sonhadora que, segura uma boneca nos braços. Diferença de gerações é acentuada
pela presença da boneca. A imaturidade funcional caracteriza a posição da menina.

Conteúdo Latente: reactiva a problemática das relações mãe-filha em duas dimensões: a


rivalidade e identificação.

238
Avaliação em Psicologia Clínica

 Contexto edipiano: a imagem pode dar origem a temas de iniciação e da identificação


feminina. A mãe é portadora de desejo e a filha volta-lhe as costas. Trata-se de um
cenário clássico entre o desejo de saber e a defesa contra esse desejo.
→ Prancha 8BM ←

Conteúdo Manifesto: Um homem deitado, dois homens inclinados sobre ele com um
instrumento. Em primeiro plano um rapaz só de costas viradas para a cena, e uma espingarda.
(Não há diferença de sexo, diferença de gerações, sem imaturidade funcional).

Conteúdo Latente: Reenvia para uma cena de agressividade aberta que põe em presença
homens adultos, e um adolescente num contexto de posição contrastada activa/passiva. O
conflito dever-se-á organizar à volta da cena de agressividade aberta do segundo plano,
pondo-a em relação com o rapaz, e com a espingarda, do primeiro plano. Referencia o
problema de agressão corporal que pode ser vivida ao nível de castração ou ao nível de
destruição.

→ Prancha 9GF ←

Conteúdo Manifesto: Uma jovem, atrás de uma árvore, segurando uns objectos. Vê uma
segunda jovem correr num plano abaixo (sem diferença de sexo ou geração, sem imaturidade
funcional).

239
Avaliação em Psicologia Clínica

Conteúdo Latente: Reenvia a uma situação de rivalidade feminina num contexto dramatizado.
O conflito dever-se-á organizar à volta da rivalidade feminina acentuada ao nível do material,
pelas semelhanças entre as duas mulheres e pelo facto que uma parece vigiar a fuga da outra.

→ Prancha 10 ←

Conteúdo Manifesto: Um casal abraçado. (Só as casas estão representadas, o contraste


branco-negro está acentuado). (Por vezes introdução de diferença de gerações, ou igualdade
de sexos).

Conteúdo Latente: reenvia para proximidade e expressão libidinal do casal. As partes do rosto
na sombra não podem ser reconstruidas e integradas numa representação completa por
sujeitos que sofrem de angústia de fragmentação ou de desintegração. A ausência de uma
figura inteira, torna possível a sua reconstrução através do estímulo parcial.

 Num contexto de problemática narcísica a diferença de sexos não é tida em conta e dá


lugar a relações especulares: relação homossexual, busca de uma imagem ideal de si
próprio e negação da diferença.
 No caso das problemáticas psicóticas, há uma incapacidade para distinguir
personagens na sua integridade corporal. As qualidades particulares de sombra e de
luz favorecem a confusão e a telescopagem dos papéis nos sujeitos com identidade
frágil.

240
Avaliação em Psicologia Clínica

 Prancha 11 ←

Conteúdo Manifesto: Paisagem caótica com contraste de sombra e claridade. (Detalhe à


esquerda estilo dragão ou serpente).

Conteúdo Latente: o não reconhecimento da angústia constitui um índice patológico. Evoca o


combate contra a natureza, representada nos sues aspectos perigosos, o que remete para a
evocação das relações com a mãe natureza, isto é, com a mãe arcaica. O cartão reactiva
materiais psíquicos de ordem pré-genital, pelo que se espera encontrar relatos de fantasmas
arcaicos. Põe à prova a capacidade do sujeito elaborar a angústia pré-genital. Interessa
perceber a capacidade do sujeito em compor esse material, emergir e construir uma paisagem
relativamente organizada apegando-se apenas aos elementos mais estruturantes do material
manifesto.

→ Prancha 13B ←

Conteúdo Manifesto: Um rapazinho sentado à porta de uma cabana em madeira (contraste


luz exterior e escuridão interior).

Conteúdo Latente: reenvia para a solidão num contexto de precaridade do simbolismo


materna figurada pela casa feita de tábuas desunidas.

241
Avaliação em Psicologia Clínica

 Sendo que esta imagem reactiva angústias de separação e perda do objecto, espera-
se que os afectos depressivos surjam associados a representações de perda. Por
vezes surgem defesas maníacas através de relatos organizados à volta da luta
antidepressiva.
→ Prancha 13MF ←

Conteúdo Manifesto: Uma mulher deitada, o peito descoberto e um homem em primeiro


plano com o braço diante da cara.

Conteúdo Latente: remete para a expressão da sexualidade e agressividade no casal. Interessa


perceber em que medida a dimensão passional da relação heterossexual é percebida e pode
ser traduzida através de um cenário legível.

 A sexualidade aparece na evocação da ligação do casal e a agressividade na eventual


evocação de um crime passional.
 Os temas de culpabilidade e remorso, relacionados com a expressão da sexualidade
e da agressividade, mostram a oscilação entre o desejo, a libertação pulsional e a
defesa em termos de interdito e de culpabilidade.
 São aqui postas à prova as capacidades de ligação dos movimentos pulsionais
agressivos pelos movimentos libidinais.
→ Prancha 19 ←

Conteúdo Manifesto: Imagem “surrealista” de uma casa sob neve ou de um barco na


tempestade, com fantasmas, ondas, etc.

242
Avaliação em Psicologia Clínica

Conteúdo Latente: tanto o mar como a neve são referências à natureza que remetem para a
imagem materna. Reactiva uma problemática pré-genital na evocação de um continente e de
um meio que permitem a projecção do bom e do mau objecto. Incita, ainda, à regressão e à
evocação de fantasmas fobogénicos.

 Pretende-se, aqui, perceber se o sujeito é capaz de organizar a separação entre o


dentro e o fora, como também, evocar um continente e um meio que permitam a
projecção do bom e do mau objecto. Se o sujeito consegue evocar as experiencia
positivas e negativas, assegurando a clivagem entre o bom e o mau: guardar o bom no
interior e expulsar o mau para o exterior.

 Prancha 16 ←

Conteúdo Manifesto: “Carta branca” para o sujeito.

Conteúdo Latente: Reenvia ara a maneira como o sujeito estrutura os seus objectos
privilegiados e as relações que ele estabelece com eles. (Nível a que se coloca. Peso e impacto
dos processos defensivos). Na ausência de um suporte imagem, os elementos transferenciais
podem tornar-se dominantes. Por vezes é uma boa prancha de diagnóstico positivo e
diferencial dos modos de funcionamento.

2. Folha de Análise

Série A (rigidez ou controlo) – EXTREMO: neurose obsessiva. Dá conta dos procedimentos de


rigidez e controlo do mundo interno do sujeito.

A1 Referência à realidade externa (o sujeito recorre a referências da realidade externa para


não se confrontar com a realidade interna)

o A1-1: Descrição com ligação aos detalhes/ com ou sem justificação da interpretação.
(sempre que o sujeito está a descrever aquilo que está a ver na imagem – o seu conteúdo
manifesto. Está apenas a percepcionar em vez de falar de si próprio, do seu mundo
interno)
o A1-2: Precisões: temporal – espacial – numérica. (ex: “isto passa-se numa quinta no
Douro, por volta do século XVII e está um homem a plantar um, dois, três plantas”)
o A1-3: Referências sociais, ao senso comum e à moral.
o A1-4: Referências literárias, culturais (ex: “isto passa-se no campo, por volta do século
XVI e ali está uma rapariga da cidade…”)

243
Avaliação em Psicologia Clínica

A2 Investimento na realidade interna (há um controlo, o sujeito está sempre atento/com


cuidado)

o A2-1: Recurso ao fictício, ao sonho (ex: “isto não é real, é apenas um sonho”, “peça de
teatro, dois actores”)
o A2-2: Intelectualização (ex: falar de anatomias para mostrar que é uma pessoa com
conhecimentos. Também é considerado intelectualização quando o sujeito põe a
personagem da história a pensar – forma de não sentir)
o A2-3: Denegação (a denegação é uma afirmação pela negativa. Ex: “tenho aqui uns
relógios para vender, mas olhe que não sou nenhum vigarista (quando ele sabe que o
é)”)
o A2-4: Acento posto nos conflitos intra-pessoais – balanceamento entre a expressão
pulsional e a defesa (ex: “um menino que está no seu quarto a tentar estudar violino mas
está indeciso se continua ou se vai para a rua brincar com os outros meninos da sua
idade”)

A3 Procedimentos do tipo obsessivo

o A3-1: Dúvida: precauções verbais, hesitações entre interpretações diferentes, ruminação


(quando o sujeito está em dúvida entre duas ou mais coisas. A ruminação mental é
quando o sujeito tem um conflito interno e não consegue resolvê-lo.)
o A3-2: Anulação (mecanismo pelo qual o sujeito afirma uma coisa e logo a seguir nega ter
dito/ pensado aquilo que disse/pensou.)
o A3-3: Formação reactiva (ex: todo o desejo sexual passa ao oposto – a pessoa deixa
completamente de ter esse desejo. Passa de um extremo ao outro devido, por exemplo,
a um sentimento de culpa que lhe possa aparecer à consciência. “o rapaz vai à caça com
o pai, quando odeia passar tempo com ele, odeia-o e sem querer dá-lhe um tiro, o que
gera nele um grande sentimento de culpa. Vai para o hospital com ele e começa a dizer
que está a ser tratado por bons profissionais – revela preocupação com este.)
o A3-4: Isolamento entre representações ou entre representação e afecto – afecto
minimizado (afecto totalmente controlado. Ex: “tem uma certa simpatia por ela”)

244
Avaliação em Psicologia Clínica

Série B (labilidade ou “deixa ir”) – EXTREMO: neurose histérica. Aqui o sujeito mostra o seu
interior.

B1 Investimento na relação

o B1-1: Acento posto nas relações inter-pessoais, pôr em diálogo. (sempre que há duas
pessoas a relacionarem-se. Põe a relação em diálogo. Ex: “uma mãe que chamou o filho
está a falar com ele sobre se ela deve ou não ir para um lar e ele responde: não deves
ir.”)
o B1-2: Introdução de pessoas não figurando na imagem (ex: “mãe a falar com o filho e de
repente começa a falar da tia Manuela”)
o B1-3: Expressão de afectos (ex: “homem apaixonado pela mulher”)

B2 Dramatização

o B2-1: Entrada directa na expressão; Exclamações; Comentários pessoais – teatralismo;


histórias com altos e baixos
o B2-2: Afectos fortes ou exagerados (ex: “o homem está perdidamente apaixonado por
ela”)
o B2-3: Representações e/ou afectos contrastados – balanceamento entre desejos
contraditórios (ex: “um homem que saiu no domingo à tarde para passear com a sua
mulher que estava mal disposta quando saiu de casa mas depois ficou bem disposta”, “a
mulher gosta do homem mas ele não gosta dela”, “é uma princesa que namora com o
seu motorista”)
o B2-4: Representações de acções associadas ou não a estados emocionais de medo, de
catástrofe, de vertigem…

B3 Procedimentos do tipo histérico

o B3-1: Mobilização de afectos ao serviço do recalcamento de representações


o B3-2: Erotização das relações, simbolismo transparente, detalhes narcísicos com valor de
sedução
o B3-3: Labilidade nas identificações

245
Avaliação em Psicologia Clínica

Série C (evitamento do conflito) – EXTREMO: funcionamento boderline.

CF Sobre-investimento da realidade externa (o sujeito agarra-se demasiado às coisas externas)

o CF-1: Acento posto no quotidiano, no factual, no fazer – referência “placada” à realidade


externa
o CF-2: Afectos de circunstância, referências a normas exteriores

CI Inibição (são os silêncios, as recusas, as histórias muito curtas)

o CI-1: Tendência geral à restrição (tempo de latência longo e/ou silêncios importantes
intra-histórias, de colocar questões, tendência recusa, recusa)
o CI-2: Motivos dos conflitos não precisados, banalização, anonimato dos personagens
o CI-3: Elementos ansiogénicos seguidos ou precedidos de paragens no discurso

CN Investimento narcísico (pessoas voltadas para dentro ou se são viradas para fora têm
sempre de se dar com pessoas como ela)

o CN-1: Acento posto na experiência subjectiva – referências pessoais


o CN-2: Detalhes narcísicos – idealização da representação de si e/ou da representação do
objecto (valência +/-) (idealização de si. Ex: “filho a passear com o pai e o filho diz “pai,
queria crescer para ser um pai como tu”; “menino que está no camarim à espera para
actuar na ópera de Sydney”)
o CN-3: Pôr em quadro – afecto título – postura significante de afectos (pôr em quadro=
em vez de contar uma história diz “isto parece um quadro, um quadro que representa…”;
afecto título= “esta imagem representa o amor, o carinho”; postura significante de
afectos= “uma pessoa totalmente curvada para a vida” – a postura corporal da figura da
imagem pode representar, neste caso, depressão – “um casal que acabou de se conhecer
e ela está totalmente agarrada a ele” (amor))
o CN-4: Insistência nos limites e nos contornos e nas qualidades sensoriais
o CN-5: Relações especulares (=relações em espelho. Ex: “uma mulher que esteve imigrada
durante muitos anos. Depois voltou e vai até um penhasco e vê-se a si própria quando
era criança (vê uma criança)”; “pai e filho a conversarem. O pai é magistrado e o filho
seguiu as suas pisadas. O pai olha para o filho e acha-o igual a si: as mesmas
preocupações, as mesmas ambições…”)

246
Avaliação em Psicologia Clínica

CL Instabilidade dos limites (não há limites. Ex: “tenho a certeza que aquela pessoa (que ele
nunca viu) me odeia profundamente”)

o CL-1: Porosidade dos limites (entre narrador/ sujeito da história; entre dentro/fora…)
(quando o sujeito está a contar uma história e nós (examinadores) percebemos que a
história que está a ser contada pelo sujeito é muito idêntica à sua história pessoal –
sujeito não consegue distinguir o “eu” daquilo que está na imagem)
o CL-2: Apoio no percepto e/ ou no sensorial
o CL-3: Heterogeneidade dos modos de funcionamento (interno/externo; perceptivo/
simbólico; concreto/ abstracto…)
o CL-4: Clivagem

CM Procedimentos anti-depressivos (aqui o sujeito luta contra a depressão)

o CM-1: Acento posto na função de apoio do objecto (valência +/-) – apelo ao clínico (a
função do objecto é a de suportar o sujeito. Ex: “um casal abraçado e ela está a pensar
no quanto ele é importante para ela e que se não fosse ele, ela já teria desmoronado”)
o CM-2: Hiper-instabilidade das identificações
o CM-3: Piruetas, viravoltas, “piscadela de olho”, ironia, humor (ironia= ex: “isto é alguém
que vê-se logo que a vida lhe corre lindamente”; “piscadela de olho”= ex: “um homem
que engatou uma mulher e levou-a para a cama e não lhe correu bem. O doutor sabe
como é, também é homem” – trazer o examinador para a história para não a viver
sozinho)

Série E (emergência dos processos primários) – EXTERMO: funcionamento psicótico. Dá conta


do inventário de procedimentos que atestam a emergência do processo de pensamento
primário (tem a ver com o sonho) – pode significar criatividade mas quando em excesso,
estamos perante um psicótico.

E1 Alteração da percepção

o E1-1: Escotomia de objecto manifesto (mecanismo de recusa da realidade. Ex: o sujeito


não teve em linha de conta o violino porque para ele fazer isto teria de se confrontar
com algo que lhe vai causar sofrimento – para evitar o sofrimento utiliza o processo de
pensamento primário e, assim, recusa a realidade. – ex: existe uma arma na imagem mas
o sujeito conta uma história sem abordá-la.)
o E1-2: Percepção de detalhes raros ou bizarros com ou sem justificação arbitrária

247
Avaliação em Psicologia Clínica

o E1-3: Percepções sensoriais – falsas percepções


o E1-4: Percepção de objectos deteriorados ou de personagens doentes, malformadas

E2 Massividade da projecção

o E2-1: Inadequação do tema ou estímulo – perseveração (repetição) – fabularão fora da


imagem – simbolismo hermético
o E2-2: Evocação do mau objecto, tema de perseguição, procura arbitrária da
intencionalidade da imagem e/ou das fisionomias ou atitudes – idealização de tipo
megalómana (evocação do mau objecto= ex: “uma menina que lhe morreu a mãe é
criada pela madrasta que a odeia e que não lhe quer nada bem”; procura arbitrária da
intencionalidade da imagem e/ou das fisionomias= ex: “pela expressão da cara deste
miúdo, vê-se perfeitamente que odeia o violino (percepção diferente da realidade)” –
projecta aquilo que tem no seu interior.”
o E2-3: Expressões de afecto e/ou de representações massivas – expressões cruas ligadas a
uma temática sexual ou agressiva (ex: “uma mulher que se pôs por baixo do homem. As
mulheres querem todas é sexo. São todas umas putas” (temática sexual))

E3 Desorganização das referências identitárias e objectais

o E3-1: Confusão das identidades – telescopagem dos papéis (confusão de identidades= o


sujeito está a contar uma história e vai inserindo várias personagens e a certa altura já
não sabemos identificar quem é quem)
o E3-2: Instabilidade dos objectos
o E3-3: Desorganização temporal, espacial ou da causalidade lógica

E4 Alteração do discurso

o E4-1: Perturbações da sintaxe – falhas verbais


o E4-2: Indeterminação, discurso vago
o E4-3: Associações curtas
o E4-4:Associações por contiguidade, por consonância

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Avaliação em Psicologia Clínica

3. Legibilidade

O conceito de Legibilidade foi criado pela escola francesa do TAT.


Para qualquer história, tem de ser identificada qual a sua legibilidade para que no final,
se possa identificar qual o tipo mais comum presente naquele sujeito.

Um texto é considerado legível quando basta uma primeira leitura para o leitor captar
o sentido do texto. Isto quer dizer que o texto está bem estruturado.

Tipo I (+): pressupõe que o sujeito para contar a história teve um tipo de funcionamento
mental normal ou neurótico. É necessário que haja uma predominância de procedimentos de
controle (A1 e A2) juntamente com procedimentos de labilidade (B1 e B2). A história tem de
ter presente afectos moderados e modelados. necessário que a história tenha afectos
positivos ou negativos mas que não sejam brutais. É necessário que a história seja claramente
estruturada (princípio, meio e fim), que se perceba imediatamente aquilo que o sujeito disse
(apenas mentes estruturadas produzem histórias estruturadas). A história tem de ter
ressonância fantasmática (que o sujeito tenha em conta o conteúdo latente da imagem
quando conta a sua história).

Tipo II (+-): pressupõe que o sujeito para contar a história teve um tipo de funcionamento
mental neurótico. Predominância clara de procedimentos de controle (A3) ou de
procedimentos de labilidade (B3) exagerados. Presença de afectos ou muitíssimo controlados
ou muitíssimo exagerados. A história já não é tão estruturada porque já tem mecanismos de
defesa – aqui já não é entendível à primeira. Já não se pode falar em ressonância fantasmática
mas sim em impacto fantasmático (quando o sujeito já se defende contra essa depressão).

Tipo III (- +): tipo limite ou (-) tipo psicótico. No tipo limite (-+) tem de haver uma
predominância de procedimentos C enquanto que no tipo psicótico (-) tem de haver uma
predominância de procedimentos E. Os afectos ou estão totalmente ausentes ou são massivos.
A história já é pouco estruturada e muitas vezes não se percebe. Não se pode falar em
ressonância nem em impacto fantasmático. Deve-se falar em invasão fantasmática (é a
consciência do sujeito ser invadida) ex: “um homem que chegou a casa e viu que a mulher o
abandonou. Ficou na penúria. Está a chover. Está desesperado. Curioso, está com um problema
nas costas e a cabeça parece que vai cair.” Neste caso começa por uma fantasia de desamparo,

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Avaliação em Psicologia Clínica

abandono, e perda do objecto e depois a pessoa fica totalmente descompensada – começa a


ser invadida pelo fantasma da perda de identidade.

EXEMPLO CONCLUSIVO:
Prancha 1
“Visivelmente é uma criança a olhar para o violino. Tem sem dúvida uma página de música.
(A1-1) Ele reflecte como poderia tocá-lo. (A2-2) Ele tem uma batuta. (A1-1) Ele concentra-se no
instrumento. (A1-1) (?) Talvez imagine que poderá tocar. (A3-1) Ele questiona-se sobre como
tocar violino. (A3-1) Não consigo fazer uma história. (CN-2) Com certeza que ele vai aprender a
tocar violino. (A2-2)”

Aqui observamos um puro controle. Não há procedimentos de labilidade. Não há presença de


afectos, por isso não pode ser legibilidade do tipo 1.
Aqui a legibilidade é tipo 2.

4. Tipo de Resolução de Conflito Evocado

→ Solução adequada ou adaptada.


→ Solução por compromisso viável.
→ Solução dependente da ajuda exterior.
→ Solução moralizante.
→ Solução auto-punitiva ou de falhanço.
→ Solução por enquistamento ou retracção narcísica.
→ Solução por satisfação directa das pulsões.
→ Solução incoerente ou esquizofrénica.
→ Solução ausente.
→ Solução por submissão ou passividade.

O melhor índice global de adaptação ou desadaptação pode ser visto pelo tipo de
resolução de conflito.

250
Avaliação em Psicologia Clínica

EXEMPLO ILUSTRATIVO:
Prancha 2
“É uma rapariga que sempre viveu no campo com os seus pais mas agora cresceu, tem 20 anos
e já não suporta mais viver ali: quer mudar-se para a cidade. Então vai falar com os seus pais e
ao fazê-lo, estes ficam muito deprimidos e tristes…”

Solução totalmente adaptado: é a forma ideal de resolver o conflito, no entanto não é a mais
utilizada porque as pessoas nunca são totalmente normais. Só as pessoas muitos fortes e
muito seguras de si é que a utilizam. Consta no seguinte: o sujeito enfrenta de forma aberta o
conflito e resolve-o totalmente a seu favor de uma forma socialmente integrada (tem em
conta o outro).
“… no entanto ela tenta falar com eles o mais abertamente possível, dizendo que já não gosta
de viver ali e que eles têm de respeitar o que a faz feliz. Decide então ir-se embora para a
cidade.”
Solução por compromisso viável: Evita o conflito absoluto e resolve-o em beneficio próprio
mas através de um compromisso, fazendo cedências.
“… diz aos pais que se vai embora para a cidade mas que promete voltar todos os fins-de-
semana.”
Solução dependente de ajuda exterior: o sujeito já não é capaz de resolver ele próprio o
conflito e pede ajuda a alguém do exterior para resolver o conflito ou espera por
circunstâncias exteriores favoráveis.

“… a rapariga pede à prima que tente fazer com que os seus pais mudem de ideias.” (pede
ajuda a alguém)
“… a rapariga fica à espera que os pais morram para puder mudar-se para a cidade.”
(circunstâncias exteriores)
Solução por retracção narcísica: o sujeito tenta resolver o conflito utilizando o sono, o sonho
ou a fuga solitária.
“… ela vai deitar-se e vai dormir.” (sono)
“… então ela traz um livro romântico e vai lê-lo e sonhar.” (sonho)
Solução moralizante: o sujeito abdica de resolver o conflito a seu favor.
“… então ela decide que vai dedicar a sua vida a cuidar dos pais.”
Solução por satisfação directa e imediata das pulsões: o sujeito resolve o conflito
imediatamente e totalmente a seu favor. Não têm em conta as exigências sociais. Resolução
de conflito típico dos psicóticos.

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Avaliação em Psicologia Clínica

“… então decide matar os pais.”

5. Os tipos de Funcionamento

♥ Registo Neurótico
→ Neurose Obsessiva
A neurose obsessiva caracteriza-se por um estilo rígido de conflito intrapsíquico (série
A). Predominam o controlo, a supressão do afecto, a rigidez e o conflito entre agressividade e
defesa. O objectivo e a representação calcam o subjectivo e o afecto (secura e tristeza).

Na neurose obsessiva pretende-se controlar a hostilidade e a agressividade. A


obsessão visa recobrir o medo de ser descoberto e o distanciamento visa evitar agredir e ser
agredido (superego sádico e paranóia). Há assim uma formação substitutiva do pensamento. O
sujeito recorre à racionalidade, à dúvida, à ruminação, escrúpulos, às hesitações, ao
dogmatismo e ao pensamento mágico. Há também uma firmeza das ideias persistentes e dos
rituais: se há luta contra alguns pensamentos há inibição e restrição do pensamento e da acção

As condutas adoptadas por estes sujeitos são a rigidez nas posturas, a exigência, o
pavor face ao imprevisto, a compulsão (sistematizar, ordenar, excluir a surpresa, falsificar e
denegar). Os temas dominantes são o trabalho, a moral, a religião e os conflitos (com a
autoridade, agredir/ ser agredido, submeter/ ser submisso, crueldade/ generosidade,
obscenidade/ pureza, ordem/ desordem, amor/ ódio, bissexualidade/ homossexualidade).

Quanto à linguagem, predominam a sobriedade, precisão, neutralidade, rigor, lógica,


recusa afectiva, poucos verbos, poucos adjectivos, precauções verbais, e o uso do condicional.

No que se refere às defesas e tendo em conta que o recalcamento é insuficiente, são


muitas as defesas a que o obsessivo recorre. São elas o isolamento (realidade, objectivo,
mudança de tema), a intelectualização (conhecimento, distanciamento), a racionalização
(afastamento do afecto), a ruminação (dizer, redizer e nada dizer), o deslocamento (reduzir a
intensidade emocional), a anulação (substituir por contrários), a denegação (dizer e dizer que
não disse) e as formações reactivas (banalização ou irritabilidade ou obediência ou cortesia).

→ Neurose Histérica
A neurose histérica é caracterizada por um estilo lábil de conflito inter-psíquico (série
B). Há aqui um acto de deixar ir, de invasão do afecto através da dramatização e adjectivação

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excessiva e ainda um conflito entre o desejo e a defesa. Têm um desejo (incestuoso)


impossível (de querer e não poder), o que leva a fixações fálicas e a regressões à oralidade. Há
uma expressão edipiana clara com abaixamento do reconhecimento dos interditos – sedução e
avidez afectiva.

Na neurose histérica, os temas são essencialmente edipianos, com fantasmas sexuais e


teatralizações como necessidade de ser amado, protegido e de desespero pelo facto do
objecto de amor estar afastado.

As condutas adoptadas podem ser, ou de precipitação e encurtamento de distância,


ou de alheamento e distractibilidade.

Quanto aos modos de pensamento e linguagem, pode haver ou um fraco


investimento e vago das expressões, ou uma qualificação excessiva com adjectivos,
comentários, dramatização (intensa expressão emocional, labilidade, introdução de múltiplas
personagens com labilidade identificatória).

Relativamente às defesas, o recalcamento destaca-se. Outras das defesas a que o


histérico pode recorrer são a amnésia (ou falso esquecimento), a fuga (acção ou imobilidade) a
retirada histérica (desinteresse, silêncios, vivência subjectiva e experiencial

→ Neurose Fóbica (inibição, neurose de angústia)


A fobia caracteriza-se por um evitamento de um objecto ansiogénico (fóbico), que
substitui o objecto original (ex: do pai para o cavalo do Hans). As inquietações e angústias são
transpostas para o concreto, o factual ou corporal.

A neurose fóbica está relacionada com a restrição, com a redução na participação do


sujeito, com as recusas, bloqueios e rupturas associadas.

♥ Registo Limite
No registo limite a tónica é posta na dificuldade da relação eu/ outro ou interno/
externo. Há uma precariedade do sentimento do eu. As condutas agidas e a procura do
outro que nunca aparece como suficientemente gratificante são as principais características.
As lógicas são dominantemente aconflituais visto que não existe a constituição do outro
diferente.

Há duas expressões para uma mesma problemática. Por um lado, há uma retirada
pulsional. O sujeito fecha-se a qualquer contacto (esta é uma retirada narcísica que nada

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Avaliação em Psicologia Clínica

tem a ver com o autismo) e tem um sentimento de perda inultrapassável. Tem um


sentimento de vazio, onde domina a cor branca. Se, pelo contrário, dominar o negro, isso
significa que o sofrimento é muito maior. Esta lógica narcísica sustenta-se face à iminência
da invasão do objecto. Por outro lado, a segunda lógica é a da exposição depressiva. Neste
caso, os sujeitos são excessivamente apegados ao objecto mas também são sempre muito
modificados por qualquer movimentação do objecto que é vivida com muito sofrimento. Há,
simultaneamente, uma impossibilidade de se largar do objecto e uma impossibilidade de
obter uma gratificação deste.

No estilo narcísico há riscos de invasão, dissolução, ruptura dos limites, porosidade dos
envelopes sobre investimento dos limites, retorno a si, isolamento, desprezo ou imobilização
do outro.

No estilo depressivo, de perda do objecto, o outro é recusado, há uma deformação e


deturpação do real e o reforço das barreiras é feito por adesão, apoio e dependência.

→ Estilo Narcísico
No estilo narcísico há referências directas e claras a perdas importantes e precoces.
Estes são sujeitos com uma imensa solidão devido ao sofrimento e mal-estar com que falam
do outro. O máximo da manifestação de dor face à relação com o outro é a raiva narcísica e a
aproximação ao outro é sempre vivida com um sofrimento imenso.

Uma das características é a falha profunda do mundo psíquico que impõe uma
construção de funcionamento de prótese. O outro funciona na lógica de prótese. Estes sujeitos
necessitam de se sentir elogiados pelos outros. Dão-se a ver para serem admirados e não
amados. Já desistiram de ser amados.

Oscilam entre dentro e fora. Fora falta sempre qualquer coisa, pelo que voltam para
dentro, voltam a procurar…

São sujeitos com falhas na elaboração psíquica. Há aqui dois tipos de expressão: uns
não conseguem fantasiar e para eles tudo é aterrador e outros partem para o agir. Estes
sujeitos apresentam também perturbações identitárias e identificatórias (eu – um – único;
outro (raiva, ódio, inveja).

A sua expressão dominante é uma ferida intolerável que leva à retirada, à centração e
ao desprezo. Em última instância, quando a ferida é muito grande e as defesas são poucas, há
imobilização e morte psíquica. Não há encenações mas sim pôr em quadro. Pelo temor do

254
Avaliação em Psicologia Clínica

sofrimento há retirada libidinal (polaridade narcísica da vida pulsional). Não há sexualidade


nem desejo (isto insere-se na lógica da imobilidade).

O Eu do sujeito é vacilante – inflação do Eu (Dd narcísicos, referências pessoais e


autobiográficas). Pode haver idealização ou desidealização com sobreinvestimento na
aparência e omnipotência do pensamento contra perda intolerável (na lógica da
racionalidade).

Na construção das narrativas há um vai e vem entre o investimento do objecto e


retraimento pela angústia que suscita. A fragilidade identitária e identificatória levam a uma
vigilância face ao externo e centração no Eu, na identidade e na unicidade; o branco e o vazio
levam ao recurso à realidade externa para assegurar as fronteiras entre o dentro e o fora.

Há uma centração no Eu com exclusão do outro através do pôr em quadro, da vivência


subjectiva, das referências pessoais e autobiográficas e dos afectos intensos. Contudo, há
uma incapacidade do sujeito se diferenciar face ao outro, o que se expressa pelas personagens
vagas, indistintas ou grandiosas.

Os temas dominantes operam à volta do verbo olhar (ver e ser visto), tocar (calor e
frio), limites (contorno, sombreado, luzes, espaço) – investimento sensual e sensorial da
realidade. Há uma valorização dos contornos e envelopes e uma procura de pele delimitante
(Dd narcísicos, sensorialidade). Quanto aos afectos, o corpo é visto como uma máquina a
significar, sem desejo e sem sedução. Há uma postura significante de afectos com afectos
título, sem qualquer cenário ou âmbito relacional) há também um apelo ao olhar e espelho
(onde nos vemos e perdemos).

→ Estilo Depressivo
O estilo depressivo caracteriza-se por abandono, rejeição, ausência de prazer, extenso
e interno sofrimento, incapacidade e impotência e mundo em perigo.

Os temas abordados são de perda, suporte, anáclise, ausência do outro (ou salvador,
ou perseguidor, ou rejeitante), nostalgia, desespero, doença, fraqueza, abandono, insucesso,
infelicidade, suicídio, morte (ou a excessiva felicidade e amor e finais felizes), chamadas à paz e
à calma, mania. Estes protocolos caracterizam-se pela restrição com clichés, personagens
tristes, passivas, dependentes, com empobrecimento, conformismo e miséria.

Há aqui uma instabilidade e precariedade. Amor e ódio são indissociáveis, há angústias


de aniquilamento, de desabamento mortífero, de vazio (negro), fantasmas destrutivos, pulsões

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Avaliação em Psicologia Clínica

de morte sem para-excitação. A depressão e a mania estão também presentes pela


impotência, inferioridade, humor, recusa do mal e sofrimento, ilusão da falta, procura de
cumplicidade, sobrecarga megalomaníaca e idealizações (“tudo bem no melhor dos mundos”).

O estilo depressivo está relacionado com perturbações do pensamento, embora haja


comunicação e até mesmo linguagem poética (telescopagem, perturbações da sintaxe).

As modalidades defensivas são as mais arcaicas: clivagem, idealização primitiva.

♥ Registo Psicótico
A psicose expressa-se no TAT pelo predomínio de procedimentos de tipo E. as psicoses
implicam alterações na relação com o real (percepção) e nas modalidades do discurso. As
perturbações na relação com o real manifestam-se através dos Dd raros e bizarros, das
falsas percepções, percepções sensoriais, percepções de objectos fragmentados e mal
formados e da escotomia de objectos manifestos. As perturbações nas modalidades do
discurso expressam-se por falhas verbais, discurso vago e indeterminado (fragilidades
identificatórias e perturbações maciças do real, associações curtas, rupturas e falhas das
ligações, abstracções e simbolismo +/- hermético.

Estes sujeitos têm falhas maciças da identidade: falhas da integridade, confusão de


identidade e instabilidade do objecto (o objecto não é captável porque não há apego à
realidade). Apresentam também confusões espaço-temporais.

As temáticas psicóticas giram à volta das representações e afectos crus e maciços


(sexuais ou agressivos). Há a preserveração dos temas, inadequação dos temas aos estímulos
e também arbitrariedade dos temas.

Uma das características fundamentais nas psicoses é a incompletude do Eu numa


problemática da identidade. Trata-se de limitações e frustrações muito importante que
ocorreram precocemente, impostas ao Eu e que ocorrem devido a regressões e fixações
arcaicas.

O conflito é com a realidade, onde há alterações profundas pela projecção e


sobrecarga fantasmática. Há uma desagregação corporal, perda da identidade e apagamento
dos limites (corporais, espaço-temporais, eu-outro e dentro-fora).

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Avaliação em Psicologia Clínica

Os afectos e as representações têm um carácter de massividade, crueldade,


omnipotência, sem interditos, com incoerências e paradoxos. A angústia pode ser muito
intensa (angústia de fragmentação, destruição e morte), o que é sinal de desrealização e
depersonalização. As defesas são sádicas, com comprometimento do reconhecimento de si e
do outro, com recusa da separação, das diferenças e da alteridade. Implicam desligação,
desertificação e, em última instância, morte psíquica. As defesas típicas são a projecção, a
recusa da realidade e a clivagem do Eu.

O pensamento é marcado pelas rupturas, descontinuidade, dissociação e separação. A


factura pode ser mais expansiva ou mais inibida, mais paranóide (com apego, vigilância e
arbitrariedade face ao exterior) ou mais retirada da realidade. Há uma impossível
objectivação ou impossível subjectivação.

Há dois tipos de expressão na psicose: as manifestações exuberantes e as temáticas.

As psicoses são as estruturas de funcionamento mais arcaicas (oral e anal), onde se


pode verificar fixação ou regressão. As defesas são arcaicas: projecção (arbitrário), recusa
(ódio) da realidade. O ego é organizado devido a falhas primitivas na relação com o objecto
materno. O Eu – outro e o dentro – fora não estão separados nem ligados. No modelo
relacional privilegia-se a relação eu/ outro e dentro/ fora, onde o sujeito está confundido com
o objecto porque a separação é impossível. Também é impossível uma ligação de boa
qualidade.

Em termos estruturais, há três formas de expressão das psicoses:

→ Esquizofrenia
Esta é a estrutura com fixação e/ ou regressão mais arcaicas, dominância oral receptiva
e passiva.

Há uma recusa primária da realidade, retirada da realidade, com sobrecompensação


eventual através da actividade delirante (sempre mal sistematizada). Quando se aproxima da
realidade surge a confusão e quando se afastam há uma recusa do sentido e da alteridade.

Há impossibilidade de figurar, com falhas do continente e conteúdos bizarros. As


palavras são as coisas. As palavras e as ideias são insólitas, o discurso incompreensível e o
julgamento deficiente

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Avaliação em Psicologia Clínica

→ Melancolia
Nesta estrutura há uma fixação e/ ou regressão oral sádica (morder, devorar,
incorporação, introjecção). Há o primado da agressividade, que não é anal mas sim oral, de
destruição não só do objecto mas também do próprio sujeito.

A problemática melancólica é a introjecção dos aspectos frustrantes do materno. O


mau objecto é interiorizado. Há uma ausência do impulso vital, fragilidade e dependência
trágica face ao objecto.

Na melancolia há uma fusão com o mau objecto na morte. Por outro lado, na mania
há uma recusa desse mal e sofrimento, uma recompensa face à angústia dos fantasmas
sádicos destruidores que ameaçam o sujeito (sentimentos e descargas muito intensas).

Recorre-se ao arbitrário para preencher o vazio, os objectos não se fixam e há uma


pulverização e perda de sentido.

Especificamente no TAT, a melancolia manifesta-se pela confusão entre o narrador e


as personagens dos cartões (confusão do tempo e do espaço). Os afectos e as representações
são massivos, com temas de sobrevivência, de falta de recursos, de pobreza e miséria. As
imagens são muito contrastadas num universo desertificado, onde há pouco investimento da
realidade e onde predomina a perda. A relação com a realidade e a percepção caracteriza-se
pela sensorialidade, separação de planos, confusão identitária e a não procura de limites.
Quanto à linguagem, as frases são infinitas, sem verbos nem acção. Há o recurso a piruetas
maciças, com ironia e desprezo, que visa recusar o vazio.

→ Paranóia
Esta é a estrutura psicótica mais evoluída.

Há aqui uma fixação e/ ou regressão anal (retenção – expulsão – rejeição). É o


pensamento mágico que ordena estas lógicas violentas de retenção/ expulsão.

O Eu é mais distinto do Outro (apesar de haver uma maior distinção, esta é sempre
deficiente) e há uma dependência agressiva do outro.

A ameaça de penetração sádica e anal revela-se através da angústia de fragmentação.


As defesas usadas são a recusa (mais parcial) da realidade, ser destruído pelo objecto, a
vigilância e a intencionalidade projectiva. (omnipotência, megalomania).

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Avaliação em Psicologia Clínica

O sujeito tem uma atitude crítica, vigilante, um estilo rebuscado, pretensioso com
afirmação de autonomia, não se deixa dominar e evita a inferioridade.

A relação de objecto é marcada pelo medo persecutório, daí a desconfiança, a


necessidade de controlo, o recurso a leis e lógicas aberrantes, o ódio à realidade e a convicção
inabalável. Há uma centração no perceptivo, embora arbitrário e temático (recurso a Dd raros
e insólitos, intencionalidade e arbitrário do pensamento, vigilância e desconfiança). Os temas
são crus: influência, poder e magia (espionagem, suspeita, ciúme, homossexualidade, ataque
ao próprio). As personagens são poderosas e com força e os objectos são destrutivos.

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Avaliação em Psicologia Clínica

CAT
O CAT é um teste temático, ou seja, cada imagem remente para um tema e, por isso
mesmo, a história que a criança conta relaciona-se com aquilo que percepciona da imagem e
também com as suas fantasias ( memórias afectivas de situações semelhantes pelas quais já
passou).

É composto por 10 cartões onde as imagens figurativas estão sozinhas ou em relação.

 Contém conteúdo manifesto e conteúdo latente, sendo que este segundo é a mensagem
simbólica que exala desta figura). Por exemplo, no primeiro cartão estão presentes
pintainhos à mesa – é um tema que remete para a oralidade, com o facto de a criança se
sentir cheia ou vazia (bem tratada ou não) e, ainda, para a rivalidade de irmãos.

1. Técnica de passagem CAT: é passado quando a criança já tem domínio razoável da


linguagem e é até aos 11-12 anos, sendo que para crianças mais velhas existe a versão do
CAT com figuras humanas (11-12anos). Antes de passar a prova é necessário criar um
ambiente propicio à intimidade, colocar a criança à vontade e só depois dizer que se irá
passar a prova.
 Evitar contacto frente a frente, sendo que é preferível estarem lado a lado, criança e
terapeuta.
 Depois das instruções dadas à criança – o terapeuta deve ser o mais breve possível e
ter as pranchas por ordem. Atitude do examinador deve ser de neutralidade afectiva
positiva mas, como são crianças pode ter uma atitude mais próxima.
 Não deve usar cronómetros pois pode provocar a competição: responder depressa,
entre outros. Pode-se não contabilizar os tempos.

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Avaliação em Psicologia Clínica

2. Conteúdo Manifesto e Conteúdo Latente

→ Cartão 1 ←

Conteúdo Manifesto: três pintainhos sentados à volta de uma mesa sobre a qual há uma
grande taça cheia. Ao lado, esbatido, um grande frango; taça de comida; colher, guardanapo;
banco, toalha, madeira.

Conteúdo Latente: remete para uma relação com a imagem materna da ordem da oralidade.
As respostas dizem respeito à oralidade versus gratificação ou frustração, em torno da qual se
centra a rivalidade fraterna.

Para além da evidente evocação da comida, a actividade oral remete para o conjunto de
representações inconscientes de gratificação ou de frustração associadas à relação com a
imagem materna.

a) este cartão remete para a capacidade de interiorizar um “bom” objecto, garante da


coerência identitária. Na falta desta interiorização, em virtude de uma experiência
fantasmatica oral onde predominem componentes destrutivas, a relação com a imagem
materna é regida pela inveja.
b) a presença-ausência da imagem parental, sugerida pelo carácter esbatido do frango
grande, questiona a sua capacidade continente e de suporte ligada às primeiras relações
de objecto. A sua falha pode suscitar a angústia depressiva, ou até uma vivência de
abandono. A vivência carências pode ser simbolizada pela percepção das taças vazias.
c) a ambiguidade do meterias favorece a expressão da dúvida identificatória: “frango-galo”,
e a inversão dos papéis parentais: pai que alimenta. É verdade que os rapazes no período
edipiano vêem mais facilmente um “galo” num contexto de evitamento de confronto
com a imagem materna considerada demasiado assustadora. A expressão de uma
rivalidade na fratria traduz-se pela eliminação de um rival para alcançar o objecto
amado. Essa situação claramente triangular faz intervir o ciúme fundado no laço libidinal
com o objecto. A sombra do frango que plana e que vigia pode também ser
compreendida como uma instância superegóica.

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Avaliação em Psicologia Clínica

→ Cartão 2 ←

Conteúdo Manifesto: um urso grande puxa uma corda, também puxada do outro lado por
outro urso grande com um ursinho por trás; o ursinho puxa a corda com o urso grande; corda
atrás do urso grande, cauda, chão.

Conteúdo Latente: remete para a relação triangular progenitor-filho num contexto agressivo
e/ou libidinal. As respostas estão relacionadas com a escolha identificatória e com a expressão
de uma interação agressiva ou lúdica. A corda veicula interesses fálicos e masturbatórios.

Se as diferenças de geração aparecem muito nitidamente através das diferenças de tamanho,


a diferença de sexo, essa, não é clara. O cartão convida a criança a situar-se, por um lado, em
relação à dialética grande-pequeno, forte-fraco, primeiro esboço de distinção identitária e
depois identificatória e, por outro lado, relativamente à percepção da aproximação libidinal ou
conflitual no seio do casal parental, diferenciado ou não.

a) Se a relação não é conhecida na sua triangulação, os protagonistas não diferenciados


exercem a mesma actividade, cuja superioridade, na melhor das hipóteses, é ligada ao
maior número: “dois”, maior ou mais forte do que “um”. A força, confundida com a
omnipotência não sexuada pode tornar os animais irreconhecíveis (lobos, raposas, maus)
associados a fantasmas destrutivos.
b) O sobreinvestimento do suporte aparece em detrimento da representação de relação
para traduzir, acima de tudo, a falta do continente materno não fiável ou até precário
(neve, gelo). (Exemplo: “a família dos ursos que tenta puxar uma corda. E depois um
outro urso que quer puxar a corda. Estou a perceber, ele deve ter caído, a mamã, e talvez
ele levanta-a. Ela escorregou nas rochas porque é gelo, numa montanha de gelo. E a
corda, há um bocadinho que ficou aí” Guy, 7 anos).
c) Num contexto edipiano, o material remete para a diferença de sexo dos protagonistas, e
para a escolha das alianças ligada ao processo identificatório. Está escolha é,
simultaneamente, sinónimo de rivalidade, mas a sua gestão pode ser feita através da
mediação de um adulto assinalando o deslocamento. A forma e a intensidade das

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Avaliação em Psicologia Clínica

moções agressivas reactivadas dependem da proximidade e da acuidade do conflito


edipiano cuja sanção é sempre a castracao (neste caso, provavelmente a representada
pela roptura da corda). A distanciação permite expressões moduladas e socializadas mais
ou menos lúdicas (exemplo: “tem ursos que fazem desporto (...)”). Mas nas raparigas a
renúncia aos atributos fálicos não está isenta de uma vivência depressiva.
→ Cartão 3 ←

Conteúdo Manifesto: um leão, com um cachimbo e uma bengala, está sentado num cadeirão.
À direita, em baixo do cartão, um ratinho num buraco; juba, cauda, garras; canteiro florido,
trave de madeira.

Conteúdo Latente: remete para a relação com uma imagem de potência fálica. Remete para
uma imagem paterna potente cujos atributos podem ser valorizados ou denegridos. O ratinho,
com o qual a criança geralmente se identifica, encarna a impotência ou a manha.

Embora a imagem esteja saturada de elementos significativos pela própria escolha do bestiário
e pelos seus atributos, viris, potência e omnipotência podem ser associadas quer à imagem
paterna, quer à imagem materna, quer à sua combinação monstruosa e indiferenciada.

a) O acesso às oposições dialécticas potência/omnipotência, grande/pequeno,


dominador/dominado, activo/passivo, fortemente sugeridas pela desproporção relativa
dos dois animais, contribui para as diferenciações identitárias. Mas ele depende da
gestão das moções pulsionais agressivas: menos solicitadas, elas desorganizam a
narrativa e impedem as suas referências essenciais. A potência pode ser assimilada a
uma omnipotência destrutiva propícia à confusão dos papéis e das inferências (exemplo:
“um monstro [faz uma voz grossa] numa cadeira com uma bengala. E aqui é a sua casa,
um grande lobo! Ouh! [sacode o cartao] e um... [gagueja] um... c... cãozinho. Um
cachimbo, ali. Tem dentes enormes! [agita-se, levanta-se]” (Simon, 3 anos). A sobrecarga
pulsional determina, nestes contextos, fantasmas destrutivos cuja direcção levanta

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Avaliação em Psicologia Clínica

problemas (“há um tigre (...) ele não está contente, talvez o tenham magoado. Fizeram-
lhe sangue” Jérémie, 5anos).
b) A ausência de um objecto interno constituído impede que se aborde a problemática da
força cuja representação pode ser reduzida a uma imagem desamparada ou submetida
ao apoio do outro. No limite, esta representação pode sugerir um envelope vazio (“balão
vazio”, “pijama de leão”). Quando a relação leão-rato é mencionada, ela é de tipo
protético (“isto é...é um leão... Avô, que é rei e se aborrece, um rato que o olha e decide
brincar com ele, para o distrair. E é tudo.” Charlotte, 9anos).
c) Do ponto de vista edipiano, a imagem é bem sexuada, temida, denegrida ou suscita
ciúmes, consoante os meios que a criança encara para se apropriar dos atributos da
imagem paterna ou escapar ao perigo que ela poderia representar. Por exemplo, a
bengala que o ratinho procura agarrar pode revestir a forma de um apoio indispensável.
Mas o destaque do leão na imagem é tal que a dimensão relacional pode ser
escotomizada ou relegada para segundo plano em proveito da representação de si, num
contexto narcísico ou identificatório que fica por precisar. Além disso, para os rapazes
não se pode aceder aos atributos da força sem se correr o risco depressivo de perder o
objecto de amor como sanção pelos desejos incestuosos (“o rei dos animais, o leão está
sentado numa cadeira, ele pensa que a sua...sua mamã não volta porque ele está à
espera, então ele põe a mão no queixo (...) [a mãe dele não volta mais?] Penso que está
na prisão, ela queria dar um passeio e havia um menino, e o bebé leão que estava com
ele e, e por isso ela foi presa e ele vai chamar o papá e vão ter medo do leão” Rémy, 5
anos).
→ Cartão 4 ←

Conteúdo Manifesto: um grande canguru com um chapéu, um saco e um cesto onde está uma
garrafa de leite. Ele tem na bolsa marsupial um bebé canguru que segura um balão. Por trás
dele, uma criança canguru numa bicicleta; fitas, flores no chapéu, pinheiro; chão, paisagem,
cinzento/branco esbatido.

264
Avaliação em Psicologia Clínica

Conteúdo Latente: remete para a relação com a imagem materna eventualmente num
contexto de rivalidade fraterna. A rivalidade e o que se passa no ventre das mães. As crianças
cangurus apresentam os conflitos de autonomização/dependência.

As diferenças de tamanho e de posição relativamente à mãe são muito claras; do mesmo


modo que os atributos de cada um dos cangurus estão claramente definidos: cada um tem ou
possui, à sua maneira, qualquer coisa cuja dimensão simbólica pode ser percebida.

a) A ênfase inide sobre a capacidade de discriminar claramente os três cangurus e de


estabelecer, depois, oposições mais ou menos sumárias «grande/pequeno». Os três
animais pertencem, em princípio, à mesma espécie, o que garante uma das bases da
coesão identitária. Muitas crianças que não conhecem os cangurus utiliam outros nomes
de animais mais familiares, o que não altera em nada o conteúdo latente. Mas mesmo
quando as referencias identitárias fundamentais estão, ao que parece, estabelecidas, os
conflitos de dependência e de autonomização relativamente à imagem materna nunca
são resolvidos de uma vez por todas, a fortiori nas crianças mais pequenas; também, os
elementos que este cartão reactiva podem acentuar as oscilações entre estas posições
ou assinalar conflitos mais profundos inscritos nas vicissitudes dos procedimentos de
separação/individuação.
b) O sobreinvestimento do quadro perceptivo, sobretudo quando se tem em conta a
dimensão sensorial do branco interpretado como neve e frio, pode remeter para uma
deficiência do suporte e para a equivalência afectiva desta vivência de perda de objecto
e/ou de abandono. Quando a rivalidade fraterna é evocada nestes contextos, ela parece
absolutamente secundária, sendo o essencial o regresso do fantasmático a posições mais
gratificantes no seio materno a fim de abolir as tensões pulsionais.
c) A estruturação edipiana permite que se reconheçam as solicitações femininas deste
cartão e/ou que se testemunhem as incertezas que ainda existem a este respeito.
Mesmo quando as crianças mais pequenas substituem os cangurus por outros animais
melhor conhecidos, como corças, cabras, ratos, estes são termos que se utilizam no
femnino. Mais raramente aparecem raposas, cães, burros e até mesmo elefantes, apesar
dos atributos mamíferos. Se em geral estas escolhas revelam dificuldades
identificatórias, também podem traduzir o receio de se confrontar com omnipotência da
imagem materna. Sempre neste registo inscreve-se a interrogação relativa ao
nascimento dos bebés.

265
Avaliação em Psicologia Clínica

→ Cartão 5 ←

Conteúdo Manifesto: num quarto sombrio, uma caminha com dois ursinhos dentro. Por trás,
uma cama grande cujos cobertores parecem estar levsntados por alguma coisa; uma grande
cama em segundo plano, cobertor não mencionado; candeeiro de mesinha de cabeceira,
janela, tapete, barras da caminha; olhos abertos de um ursinho, contraste branco/cinzento.

Conteúdo Latente: remete para a curiosidade secual e para os fantasmas da cena primitiva.
Remete para a cena primitiva e para os jogos sexuais entre crianças.

Carácter antropomórfico do cenário manifesto onde a proximidade das camas, pequena e


grande, condensa o essencial das solicitações latentes quanto à aproximação libidinal do casal
parental.

a) Apesar do destaque dos elemento simbólicos libidinais, o cartão pode arrastar uma
recrudescência de fantasmas destrutivos estando todo o interior ameaçado por
perseguidores externos ou mal diferenciados. A dificuldade também pode incidir sobre a
individuação dos dois ursinhos, confundidos num só, ou percebidos como duplos
gémeos. A petrificação pulsional («ursinhos embalsamados») pode formar uma defesa
face a uma desorganização identitária.
b) Quando a elaboração da posição depressiva é demasiado dolorosa, evidenciam-se a
ausência, a privação, o abandono. A insistência em elementos sensoriais (cinzento,
branco, madeira) e em suportes (chão, almofada) permite o deslocamento da
necessidade de referências consistentes para o meio envolvente; estas modalidades
constituem, então, a economia do afecto depressivo e da evocação da perda do objecto.
c) São outras as produções sobre a inibição, a agitação, ou até a recusa, se relacionam de
forma transparente com a cena primitiva, que as componentes fóbicas doo acme
edipiano acentuam. As narrativas podem então mostrar a organização da pára-excitação
relativamente à sexualidade parental; a pára-excitação pode, paradoxalmente, passar
pela evocação da sexualidade infantil versus jogos interactivos ou actividade auto-

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Avaliação em Psicologia Clínica

erótica, cuja carga de excitação parece menor ao lado da que a aproximação libidinal
entre os pais contém. (“Dois ursinhos na cama, um pequeno ursinho e uma pequena
ursinha. O candeeiro está apagado. Já não sabem que mais fazer, então divertem-se…não
sei mais. Essa não é grande coisa! Não havia muita imagem, como é cinzento não se pode
ver muito bem.” Rémy, 5 anos).

Quando a depressão se exprime no registo edipiano, trata-se de um afecto doloroso, associado


à vivência de exclusão relativamente ao casal paental e/ou à culpabilidade que as pulsões
voyeuristas e a actividade masturbatória provocam. No período de latência, as narrativas
constroem-se mais em torno do interdito relativo às moções pulsionais ou às estratégias
encaradas para o infrigir (“Eles fingem dormir mas não dormem.”).

→ Cartão 6 ←

Conteúdo Manifesto: uma gruta na qual se vêem mais ou menos bem dois ursos grandes. À
frente, um ursinho, olhos abertos e folhas. Duas silhuetas de ursos numa gruta obscura,
ursinho deitado; garras do ursinho, folhas de azevinho.

Conteúdo Latente: remete para a curiosidade sexual e para os fantasmas da cena primitiva. O
cartão 6, assim como o precedente, remete para a cena primitiva e para a masturbação.

Os cartões 5 e 6 remetem, num registo edipiano, para o mesmo tipo de problemática. A


diferenca manifesta entre os cartões 5 e 6 tem a ver com o cenário antropomórfico do
primeiro e com a cena especificamente animal do segundo. Os dois ursos grandes estão lado a
lado e o ursinho, afastado, tem os olhos de um animal bem acordado.

a) A triangulação é secundária ou desconhecida quando predominam a delimitação dos


espaços internos e externos, investida positiva ou negativamente (“muito quente lá
dentro, frio lá fora”, “a casa ela está toda destruída”) e a relação dual com a imagem
materna arcaica. Nalguns casos, a situação relacional não é de todo percebida, de tal

267
Avaliação em Psicologia Clínica

forma a omnipotência do bestiário passa para primeiro plano, determinando fantasmas


de destruição e de desaparecimento.
b) O cartão pode reactivar uma temática de perda de objecto e de abandono num contexto
oral, dando origem a uma vivência de miséria, ou até de desnutrição, tanto mais patético
quanto a criança está privada da capacidade de fantasmatizar.
Num contexto de analidade não estruturante, a deficiência do continente materno
pode ser simbolizada por um habitáculo que, em vez de oferecer um espaço
tranquilizador e diferenciador relativamente ao exterior, se apresenta como um
orifício com dupla saída/ túnel (“Então isto é um ursinho que está numa gruta com o
pai e a mãe, numa gruta e à frente há bosque, um pouco. Há folhinhas. E depois, no
fundo há uma grande, uma grande, uma imensa estrada” Guy, 7 anos).
c) A expressão da curiosidade sexual relativamente ao casal parentao é comparável à que
surge no cartão 5. Neste caso ela complica-se com o deslocamento da curiosidade para o
exterior, o que confere ao conflito edipiano, sobretudo nos rapazes, uma variante em
termos de dependência relativamente ao objecto materno: o interdito da exploração
dado pela mãe está duplamente conotado. As modalidades edipianas reactivadas face a
este cartão podem revestir diferentes formas e entre elas as de um conflito
identificatório, fonte de afectos depressivos (“[…] ele não dorme porque está triste…
[agita-se]…também o papá urso tem orelhas mais pequenas, o bebé tem orelhas
maiores” Gaelle, 4 anos). Elas também podem dar origem a “escotomas” e a inversões
das imagens parentais (pai alimentador) ao serviço de um evitamento da imagem
materna. A introdução de uma dimensão regressiva pode ter a mesma função.
→ Cartão 7 ←

Conteúdo Manifesto: na selva, um tigre salta para um macaco. O macaco parece agarrar-se a
lianas. Um tigre, com as presas à vista e a deitar as garras de fora; garras, dentes do tigre,
cauda, proporções relativas entre o tigre e o macaco; vegetação, chão manchado.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Conteúdo Latente: remete para uma relação carregada de agressividade (versus castração ou
devoração). Remete para o receio da agressividade privilegiando o registo de castração.

Como o cartão 3, a relação entre os dois animais não é simétrica e comporta um eixo activo-
passivo. Agressividade agida, agressividade sofrida, podem inscrever-se quer num contexto de
destrutividade sinónimo de uma não distinção sujeito-objecto, quer no quadro da rivalidade
edipiana, ou ainda entre ambos, o que favorece a situação projectiva.

a) A percepção da situação agressiva pode determinar a emergência de fantasmas


destrutivos cujo carácter mais ou menos invasor prejudica a estabilidade identitária (“É
um tigre, o…o…o tigre e…corre, e quer apanhar um macaco…o macaco, ele tem medo e é
tudo [é tudo?] isso vai acabar perigoso, isso vai acabar o, o macaco vai trepar e o leão
talvez vai deixar cair o ramo e é tudo. Isto não é um crocodilo? O crocodilo vai morder o
tigre e o tigre vai lutar com o crocodilo e o crocodilo vai ganhar (…)” Patrick, 7 anos). As
confusões dos perceptos e da linguagem revelam geralmente a confusão dos papéis
agressor/agredido.
b) Pouco solicitada por este cartão, a perda do objecto pode aparecer indirectamente
através do sobreinvestimento numa polaridade sensorial fria e nua, apesar do aspecto
luxuriante do cenário vegetal (“Não está bom tempo, está cinzento” Marine, 6 anos; para
Thierry de 5 anos a cena passa-se “na neve” e Norbert de 7 anos prefere controlar a
situação a fim de não reconhecer a impotência e a depressão que ela poderia engendrar
e dita a narrativa num tom imperativo).
c) Quando o eixo edipiano é estruturante, a agressividade é manipulada num contexto
relacional onde representações e afectos são solicitados em quantidades possíveis de
gerir pela linguagem e sem sobrecarga de excitação: agressor e agredido estão
diferenciados, mesmo quando os recursos pessoais são mobilizados em proveito de uma
identificação com o agressor ou com o macaco, mais fraco e mais pequeno, mas ágil e
manhoso. Em todos estes casos, a castração reconhecida, aceite ou não, é negociada
através das representações de relação (“Um grande tigre com cauda que queria apanhar
uma ma, um macaco, e o macaco subia à árvore com a sua pequena, a sua grande
cauda; o tigre queria comê-lo. Subia para o ramo. Ele tinha uma grande cauda o tigre!
Talvez fossem do mesmo tamanho a cauda!” Jérôme, 5 anos).

269
Avaliação em Psicologia Clínica

→ Cartão 8 ←

Conteúdo Manifesto: dois macacos grandes sentados num sofá bebem por chávenas. À
direita, um macaco grande sentado num pufe aponta para um macaquinho. O macaco no
primeiro plano fala com o macaquinho; numa moldura, uma cabeça de macaco com óculos e
um penteado com fitas e rendas; flores e argolas nas orelhas dos macacos grandes; flores do
sofá.

Conteúdo Latente: remete para a culpabilidade associada à curiosidade e à transgressão na


relação pais-filhos. O macaco grande, no primeiro plano, remete para uma imagem parental,
paterna ou materna. A criança é convidada a situar-se nas relações familiares.

O cartão evoca, em princípio, uma dupla relação dual entre os macacos situados em planos
diferentes. As diferenças de tamanho e os atributos favorecem a diferenciação de gerações e
de sexo.

a) As diferenciações elementares na são percebidas e a pluralidade das “personagens” é


fonte de confusões quando as referências iniciais não estão, ou ainda não estão,
suficientemente ancoradas. A proximidade dos macacos, manifesta no cartão, pode
então veicular fantasmas agressivos do ponto de vista da destrutividade mais ou menos
crua (“Ele, a mamã do lobo, do neão. O macaco, o papá do macaco e o bebé e a mamã. E
a mamã ela o grita para o bebé: «pára bebé, pára de fazer disparates». Ela tinha subido
para a cadeira. A mamã pô-lo na cadeira e a mamã o tem o olho furado” Violette, 7
anos).
b) Este cartão, assim como o precedente, é pouco propício à expressão da perda do
objecto. No entanto, ela pode aparecer através das ameaças de rejeição desprovidas de
sanção superegóica (“É preciso que ele se vá embora para outro lado”) ou através de uma
vivência de angústia de separação ou de abandono por uma imagem materna não fiável
(“(…) Ela diz-lhe vou-me embora daqui a bocado, então depois ela vai-se embora e a
criança tem medo. Ele vai, ela apanha a mamã, segue-a devagarinho e já não tem medo.

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Avaliação em Psicologia Clínica

A mamã ela não vê, esconde-se e tem medo que ela lhe ralhe. Uma fotografia da ama
que morreu, óculos, chapéu.” Christophe, 7 anos).
As expressões indirectas da problemática depressiva são, no entanto, mais frequentes;
elas podem passar por intermédio das defesas maníacas, evocando à cena uma ruidosa e
confusa barulheira; a importância atribuída à figuração de suporte ou à ausência de
suporte do macaquinho, sem intervenção de afecto nem evocação de perda, também
pode ser um sinal da sensibilidade à falta.
c) A diferenciação edipiana das gerações e dos sexos aparece com o seu eventual cortejo de
hesitações (“O papá, não, a mamã”). O par no segundo plano é heterosexuado com um
possível deslocamento para as personagens dos avós. O duplo pólo relacional é
percebido, o par de trás diz segredos «ao ouvido» numa proximidade a maior parte das
vezes lidibinal (“Eles divertem-se bem juntos”); o par adulto-criança no primeiro plano
está encarregue de veicular as leis superegóicas e os desejos de transgressão (“Eles
bebem chá, eles bebem chá, a irmã e o papá, e o bebé tem de ouvir o que lhe diz a
mãe….como eu, faço asneiras” Amélie, 5 anos).

A proximidade dos elementos fóbicos nas crianças complica o interdito do desejo de ver o
que se passa no seio do casal, pelo perigo que a exploração deslocada para o exterior poderia
comportar; a relação de dependência à imagem materna fica assim reafirmada (“não sair”,
“ficar com a mamã”). A hipersexualização das representações, na mesma idade, também
pode ser espectacular (“Ainda sobram dois? Não há casa de banho? [ausenta-se]. Então a
mamã que não está casada teve um bebé e o bebé diz-lhe que eles não são os dois casados e
a avó ela está atenta, olha! E de repente os macacos eles levantam-se, eles ouve que o bebé
acabou de falar, eles dizem que…há uma princesa que sai com um rapaz, o rapaz vai
apaixonar-se pela rapariga. Já voltaram os meus pais?” Aline, 5 anos).

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Avaliação em Psicologia Clínica

→ Cartão 9 ←

Conteúdo Manifesto: um quarto sombrio cuja porta está aberta. Uma cama de criança com
um coelho dentro, sentado. Porta aberta para uma divisão iluminada, o coelho está virado
para a porta; janela, espelho, contraste claro-escuro; descontinuidade das grades da cama,
cortinas abertas.

Conteúdo Latente: remete para uma problemática de solidão e/ou de abandono. Remete para
além do medo do escuro e da solidão, para a curiosidade sexual.

O cartão 9, o único que representa um indivíduo isolado, remete para a capacidade de estar só
e de gerir a solidão. A elaboração da posição depressiva é, desta vez, prioritariamente
solicitada. Mas alguns elementos manifestados também podem, consoante a problemática da
criança, remeter para os fundamentos identitários ou, se a idade e a maturidade o permitirem,
para as implicações da estruturação edipiana. Os aspectos depressivos ligados à vivência de
exclusão do casal parental fazem então parte deles.

a) A problemática reside na unificação e na coesão dos perceptos que a elaboração da


linguagem revela, nem que seja através de uma identificação descritiva sumária. Se esta
coesão mínima for penosa, o interior confunde-se com o exterior, arrastando fantasmas
destrutivos obtidos de elementos fóbicos não estruturados em torno de um objecto
fobogénico preciso. As «personagens» introduzidas fora da imagem: lobo, gorila,
caçadores, ladrões, homenzinho mau; distinguem-se então mal o coelho, cuja
individuação não se destaca.
b) A expressão de perda do objecto passa, quer directamente pela representação da solidão
e do abandono podendo determinar a inanição e a morte (“Ele já não tem cobertor, já
não tem cama, já não tem nada para comer, já não tem ninguém” Corinne, 7 anos), quer
pela intervenção de modalidades antidepressivas. As modalidades antidepressivas mais

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Avaliação em Psicologia Clínica

frequentes são a excitação resultante da recusa maníaca através de uma narrativa que
pretende ser “muito divertida” ou cheia de personagens, ou até de “luz” e de “sol”
apesar do estímulo. Nesse caso, representação e afecto são evitados. Outras
modalidades consistem em evidenciar a precariedade do meio e do suporte (“Cama
partida”, “faltam grades”, “os pés estão partidos”…) enquanto deslocamento da vivência
de sofrimento. A gestão narcísica deste tipo de conflito assenta no sobreinvestimento
dos dados sensoriais do material: cinzento, preto, branco, superfície, cenário, a fim de
ignorar o que não existe; (“Aí é um coelho que ficou doente, então telefonou ao médico e
o médico disse-lhe para ficar na cama durante três dias. É tudo.” Charlotte, 9 anos –
tenta «adaptar-se» à solidão de um modo autogerido que nega a dependência).
c) Num contexto edipiano a solidão evocada relativamente ao casal parental reintroduz
nostalgicamente a representação da relação. A porta está então aberta, no sentido
duplamente figurado, para o que os pais fazem, no seu quarto ou algures, e para a
rivalidade face ao progenitor simbolicamente mais seguro. Podem então aparecer as
hesitações identificatórias, os interditos ditados pelo superego e a expressão de afectos;
angústia e tristeza integram-se em cenários onde a oposição ficção/realidade bem
construída, por vezes através do recurso ao sonho, permite modular o impacto
fantasmático ligado à masturbação e ao seu interdito. O auto-erotismo pode oferecer
igualmente uma via de arranjo da solidão (“Ele não está cansado, ainda quer brincar no
baloiço, mas a sua mamã não quer”); os temas de «cama partida» remetem, nesses
casos, para a transgressão e para a retaliação castradora.
→ Cartão 10 ←

Conteúdo Manifesto: um cãozinho, deitado de barriga para baixo nos joelhos de um cão
grande. À direita uma casa-de-banho e toalhas; boca aberta do cãozinho, pata do cão grande
levantada em cima do cãozinho; as diferenças de tonalidade claro-escuro dos dois cães, banco.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Conteúdo Latente: remete para a relação agressiva progenitor/filho num contexto de


analidade, evidenciando-se a proximidade corporal. Remete para a dialéctica
disparate/punição num contexto superegóico e/ou transgressivo.

Muitos elementos manifestos do cartão sugerem bastante directamente a relação num


contexto de aprendizagem da limpeza com os seus aspectos imprevisíveis: a submissão ao
desejo do progenitor, em geral ao da mãe, ou a agressividade para com ela que suscita a
repressão. Mas a esta situação de constrangimento, que é portadora de mensagens agressivas,
acrescenta-se uma dimensão libidinal através da proximidade corporal em que o bater é
susceptível de reactivar múltiplas polaridades fantasmáticas. O conteúdo latente também
poderia ser formulado da seguinte forma: “batem num cão” ou “um cão está a apanhar”,
segundo as orientações do erotismo anal. Mas ainda assim é preciso que agressividade e libido
possam estar ligadas, caso contrário assiste-se a uma sobrecarga pulsional não negociável,
quer destrutiva, quer erótica.

a) Os dois cães são pouco ou nada diferenciados, e por vezes confundidos com outros
animais ou personagens introduzidos. Como sempre, a desorganização da linguagem
anda a par com a invasão fantasmática. A destrutividade assenta mais num fantasma de
absorção oral do que num real conhecimento da situação anal, mesmo quando aparecem
termos escatológicos. A versão erótica também pode ser confusa através de um
amontoar indefinido de animais «que se pões em cima» não se destacando a dimensão
anal.
b) A angústia de perda do objecto e de aniquilamento depressivo de origem anal é aqui
directamente sugerida pelo material manifesto (“Ele tinha vontade de ir à casa de banho,
mas não queria sentar-se lá. Tinha medo de cair no buraco.” Charlotte, 9 anos). A
figuração muito clara da proximidade corporal pode reactivar, nalgumas crianças, a
vivência de importantes perturbações no «handling», isto é, na forma como o corpo é
objecto de cuidados, de negligências ou até de agressões ou intrusões, o que mostra a
precariedade dos assentos narcísicos a este nível.
c) O estabelecimento do eixo edipiano pressupõe, primeiro, o claro destacar de uma
imagem parental em relação à qual a criança é levada a situar-se e, depois, o
reconhecimento do manejo da agressividade segundo o eixo sadomasoquista. A ligação
entre a agressividade e proximidade libidinal autoriza o acesso à ambivalência.

Mas o material latente não pode ser lido da mesma maneira para as raparigas e para os
rapazes, na medida em que ele remete, com mais precisão do que o cartão 2 poderia sugerir,

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Avaliação em Psicologia Clínica

para as modalidades positivas ou negativas do eixo edipiano. Consoante o momento do


desenvolvimento, estas modalidades prefiguram as orientações hétero ou homossexuais,
relacionadas com o investimento anal. Talvez seja esse o sentido deste cartão colocado em
último lugar, depois de os fantasmas edipianos terem sido fortemente solicitados nos cartões
5 e 6. (“Oh! Cães! Ah eu conto a história. Então o papá diz ao cão: vai fazer xixi. Ele vai até às
casas de banho com a toalha e quando fez xixi puxa o autoclismo e depois vai brincar com…não
com o seu dono hen?...sozinho. Isto é baba? Para já o papá baba-se, olha para as gotas! Para
já o miúdo está a bocejar. Como é que isto se chama? Ele fecha a coisa para tapar o buraco.”
Thierry, 5 anos – analidade e Édipo negativo)

3. Folha de análise

Categoria MC: motricidade e corpo – procedimentos que traduzem recurso ao copo e


motricidade para construir a história. É ainda muito infantil.

MC1: Retraimento, inibição motora, manifestações auto-eróticas.


MC2: Instabilidade psicomotora, agitação motora e/ou verbal, interrupções pelo agir
MC3: Risos, mímicas, caretas, ruídos, onomatopeias
MC4: Participação corporal: deslocações, gestos
Categoria RC: a criança para contar a história relaciona-se muito com o clínico, a relação é tão
importante quanto a história – podem ser pedidos, perguntas, etc.

RC1: Procura da proximidade corporal


RC2: Perguntas, observações dirigidas ao clinico, apelos, apóstrofes
RC3: criticas ao material e/ou situação, queixas, pedidos de gratificações complementares
RC4: Autodepreciação, autovalorização
Categoria RE: recurso à realidade externa – é preciso ver se o recurso à realidade externa foi
excessivo ou não, por exemplo, se a criança se limitou a descrever o cartão, se sim cotar-se-á
como RE1. Ao ser excessivo significa que a criança recorre à realidade para não ter contacto
como interior.

RE1: Recurso à evidência, apego ao conteúdo manifesto


RE2: Recurso aos lugares-comuns da vida quotidiana, importância dada ao concreto, ao fazer,
ao conformismo, referencias à realidade ambiente
RE3: insistência no enquadramento, nas delimitações e nos suportes (presentes ou em falta)

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Avaliação em Psicologia Clínica

RE4: Insistência nas qualidades sensoriais do material


RE5: Sobreinvestimento na qualidade do objeto: apego aos Dd narcísicos (valências positiva ou
negativa).
Categoria EI: recurso ao evitamento e inibição – histórias curtas, tendência recusa, muitos
silêncios, anonimato das crianças/personagens, poucas explicações, entre outros aspetos.

EI1: Restrição, silêncios, recusas, tendências para a recusa, necessidade de fazer perguntas
EI2: Anonimato, razões dos conflitos não esclarecidas, colagens, banalizações
EI3: Evitamentos específicos, evocação de elementos ansiogénico seguidos ou precedidos de
paragens no discurso
Categoria RA: recurso ao afecto – deve existir sempre recurso ao afecto mas moderado pois,
se for excessivo/massivo pode por em causa a integridade do self (como fazer xixi nas calças,
por exemplo, é uma demonstração de desregulação do self).

RA1: Expressão verbalizada de afectos


RA2: Dramatização, exagero, teatralismo, afectos contrastados, labilidade emocional
RA3: Acentuação na tradução corporal dos afectos
RA4: Afectos inadequados, afectos maciços
Categoria IF: recurso ao imaginário e ao fantasma – se for excessivo a criança perde o contacto
com a realidade. Isto deve existir moderadamente. IF4: simbolismo transparente: falar
directamente de sexo; IF9: telescopagem pode remeter para perturbações de identidade
quando conta histórias com vários personagens e torna-se complicado perceber quem é quem
(falta de limites).

IF1: Introdução de ‘’personagens’’ que não figuram na imagem


IF2: Apelo ao imaginário infantil dos contos
IF3: Encenações, diálogos, importância dada às interacções, digressões: transparência das
mensagens simbólicas
IF4: Erotização das relações, dominância da temática sexual e/ou simbolismo transparente
IF5: Instabilidade identificatória, hesitações, confusões sobre o sexo das ‘’personagens’’,
IF6: Insistência nas representações de acção (ir, correr, dizer, fugir, fazer)
IF7: Fabulação longe dos cartões, inadequação do tema ao estímulo
IF8: Expressões cruas, ligadas a uma temática sexual ou agressiva; expressão de afectos e/ou
de representações maciças associadas a qualquer problemática
IF9: Confusão identitária, telescopagem de papéis, instabilidade de objectos

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Avaliação em Psicologia Clínica

Categoria OC: recurso à objectividade e controlo. OC1 e os outros primeiros são recursos
normativos, por outro lado, o OC4 é anulação, deixando, por isso, de ser tão normal (poderá
acontecer em pessoas que foram violentadas sexualmente); OC8: escotomas e extravagâncias
perceptivas – desadequação à realidade, não ver as coisas do objecto manifesto, ou seja, não
aceita a realidade (tendência recusa). Exemplo de OC8 é no cartão dos ursinhos falar apenas
de dois quando lá se encontram três.

OC1: Descrição com apego a pormenores


OC2: Insistência no fictício, afastamento espácio-temporal (com ou sem precisão numérica)
OC3: Elementos de tipo de formação reactiva (obediência, simpatia, limpeza, auxilio, dever,
dinheiro)
OC4: Anulação
OC5: Isolamento de elementos, de personagens ou de sequências da narrativa
OC6: (De)Negação, recusa
OC7: Repetição, ruminação, perseveração
OC8: Falsas percepções, escotomas, extravagâncias perceptivas
OC9: Perturbações da sintaxe, perturbações da organização temporal
OC10: Ligações arbitrárias, associações curtas, extravagâncias do pensamento

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Avaliação em Psicologia Clínica

O JOGO LÚDICO
A brincadeira é o meio pelo qual a criança consegue controlar as suas angústias e de
controlar uma situação que, de outra forma seria impossível. Para Freud, as crianças repetem,
nas suas brincadeiras, tudo o que, na vida, lhes causou profunda e impressão e, brincando,
tornam-se ‘senhores’ da situação. As crianças brincam para fazer alguma coisa que, na
realidade fizeram com elas.

Através da brincadeira, a criança não só realiza os seus desejos como também domina
a realidade graças aos movimentos de projecção dos perigos internos sobre o mundo externo.

O brinquedo é, então, um meio de comunicação. É a ponte que permite ligar o mundo


externo e o mundo interno, a realidade objectiva e a fantasia. O brincar não é só um
passatempo para viver situações prazerosas mas também uma maneira de elaborar
circunstâncias traumáticas.

Segundo Melanie Klein, ao brincar, a criança domina realidades dolorosas e controla


medos instintivos, projectando-os no exterior – no brinquedo. Este mecanismo é possível pois
a criança, desde cedo, tem a capacidade de simbolizar.

O brincar está para a criança como a associação livre de ideias para o adulto. Logo, a
neurose de transferência desenvolve-se da mesma forma, não sendo as figuras parentais
atuais, mas as internalizadas, que são projectadas no analista, que terá como principal função
interpretar todo o material associativo que a criança faz.

A criança não só estabelece uma transferência positiva e/ou negativa com o


psicoterapeuta, como também é capaz de estruturar, através dos brinquedos, a representação
dos seus conflitos básicos, das suas principais defesas e fantasias acerca da doença e cura,
deixando em evidência, já nos primeiros encontros do acompanhamento, o seu
funcionamento mental.

Nos brinquedos oferecidos pelo psicólogo, a criança deposita parte dos sentimentos,
que representam os distintos vínculos com os objectos do seu mundo interno. Assim, muitos
fenómenos que não seriam obtidos pela palavra, poderão ser observados através do brincar,
onde a criança, projectará as suas questões-chave, tanto no decorrer do jogo quanto na
maneira como usa os materiais e os brinquedos.

278
Avaliação em Psicologia Clínica

As crianças, de maneira geral, agem, falam e/ou brincam de acordo com as suas
possibilidades maturativas, emocionais, cognitivas e de socialização, e é pela sua acção (activa
ou passiva) que elas exprimem as suas possibilidades, descobrindo-se a si mesmas e
revelando-se aos outros.

O papel do psicólogo durante a entrevista lúdica deve ser, essencialmente, o de


estimular a interacção conduzindo a situação de maneira a que possa deixar transparecer a
compreensão, respeitando e acolhendo a criança de modo a que esta se sinta segura e aceite.
Em parte, o papel do psicólogo é passivo, porque funciona como observador, mas também é
activo, na medida em que a sua atitude é atenta na compreensão e na formulação de
hipóteses sobre a problemática do entrevistado, assim como na acção de efectuar perguntas
para esclarecer dúvidas acerca da brincadeira. Ainda, e dependendo da situação, o psicólogo
pode não participar na brincadeira ou, pelo contrário, desempenhar um papel caso seja esse o
desejo da criança.

Uma análise detalhada da hora de jogo permite:

a) A identificação do conflito actual do paciente;


b) Colocar em evidência os mecanismos de defesa principais utilizados e ansiedades;
c) Avaliar o tipo de harmonia que a criança consegue estabelecer com o terapeuta e o tipo de
ansiedade que pode contra-transferencialmente despertar neste;
d) Pôr em manifesto a fantasia de doenças e cura

É importante ter em linda de conta: a forma como a criança se aproxima dos


brinquedos, a sua atitude no início e no final do jogo, a sua localização no consultório, a sua
atitude corporal e o manejo do espaço.

Efron e colegas propõem um guia de 8 indicadores que possibilitam estabelecer


critérios mais sistematizados e coerentes para orientar a análise com fins diagnósticos/
prognósticos, em especial, para a classificação do nível de funcionamento da personalidade:

1) A escolha de brinquedos/ jogos está relacionada com o momento evolutivo emocional e


intelectual em que a criança se encontra.

Erik Erikson descreve três fases sucessivas na evolução dos brinquedos das crianças:
→ auto-esfera (o brinquedo da criança é centralizado na exploração do próprio corpo e/ou nos
objectos que estão imediatamente no seu alcance);

279
Avaliação em Psicologia Clínica

→ microesfera (a criança expressa as suas fantasias através de pequenos brinquedos


representativos);
→ macroesfera (a criança, por incorporar a vivência social, passa, através das suas relações, a
dividir o mundo com os outros).

Piaget também propõe uma classificação que tem em conta a estrutura do jogo e a evolução
das funções cognitivas da criança:
→ Até aos 2 anos: brinquedos e jogo de exercício (em que a conduta lúdica é destinada
exclusivamente para a obtenção de prazer)
→ Entre os 2 e os 8 anos: brinquedos e jogos simbólicos (em que a criança desenvolve a
capacidade de representar uma realidade que não está presente no seu campo perceptivo)
→ A partir dos 8 anos: brinquedos e jogo de regras (em que a criança imita as actividades dos
adultos e pertencem ao domínio do código social).

2) Cada criança estrutura uma modalidade do brinquedo que lhe é própria, baseada nas
formas de manifestação simbólica do seu ego e dos seus traços de funcionamento
psíquico.

Entre as principais modalidades temos:

→ Plasticidade: esta pode ser observada quando a criança consegue expressar as suas
fantasias através de brincadeiras organizadas com sequência lógica, utilizando brinquedos ou
objectos que podem modificar a sua função de acordo com a sua necessidade de expressão,
mostrando uma variedade de recursos egóicos e uma significativa riqueza interna, sem
necessidade de recorrer a mecanismos de controlo excessivos.

→ Rigidez: quando a criança fixa certos comportamentos ou acções lúdicas de maneira rígida
para expressar uma fantasia, esta mostra grandes dificuldades para aproveitar e/ou modificar
os atributos dos brinquedos e um ego pobre em recursos frente à ansiedade, resultando na
escolha de brinquedos e jogos monótonos e pouco criativos.

→ Estereotipia e perseveração: os jogos estereotipados e perseverantes são a modalidade


mais patológica do funcionamento egóico, típica de crianças com funcionamento psicótico (ex:
de entre tantos brinquedos, usar apenas um boneco para bater na sua própria cabeça). Por
vezes, através do jogo, fica clara a falta de respostas afectivas e a presença de maneirismos e
movimentos estereotipados, assim como de acções auto-agressivas, evidenciando uma

280
Avaliação em Psicologia Clínica

desconexão com o mundo externo, tendo como única finalidade a descarga de impulsos do id
sem fins comunicacionais.

3) A avaliação da motricidade é muito importante uma vez que o manejo adequado das
possibilidades motoras, no que diz respeito à integração do esquema corporal,
organização da lateralidade e estruturação espaço-temporal, possibilitará à criança o
domínio dos objectos do mundo externo no campo social, escolar e emocional,
satisfazendo as suas principais necessidades como a autonomia, enquanto que
dificuldades neste âmbito provocarão, certamente, limitações e frustrações.
4) A personificação é a capacidade da criança para assumir e desempenhar papéis no
brinquedo. É o elemento comum em todos os períodos evolutivos, através do qual as
crianças transformam os seus brinquedos ou a si mesmas em personagens imaginárias
ou não, de acordo com a sua faixa etária, expressando sentimentos, tipos de relações e
conflitos, sempre em sintonia com a realidade do seu mundo interno. A análise deste
indicador permitirá compreender o equilíbrio existente, ou não, entre o superego, o id e
a realidade, verificando também a capacidade de fantasiar na definição de determinados
papéis que, com o auxílio da mágica lúdica, possibilitará, pelo menos durante um período
limitado, a satisfação dos desejos mais grandiosos que o seu “eu” consciente, em outras
circunstâncias, não lhe permitiria.
5) Criatividade: criar é inventar ou transformar a partir da própria capacidade. Quando a
criança constrói um novo objecto ou transforma um já existente, mostra a sua
capacidade de relacionar elementos novos no brinquedo a partir da reorganização de
experiências anteriores. Assim, a criatividade é um processo mental de manipulação do
ambiente do qual resultam novas ideias, formas e relações.
6) Quando a criança utiliza uma variedade de elementos para se expressar no brinquedo,
está a exercitar a sua capacidade simbólica. O jogo é uma forma de expressar a
capacidade simbólica, e a vida fantasiada torna-se mais observável à medida que a
criança se torna apta para o jogo simbólico.
Durante o 1º ano de vida, por exemplo, o brinquedo consiste simplesmente na
manipulação de objectos; depois desse período, passa a ser usado funcionalmente, numa
acção repetitiva e, quando o jogo de faz-de-conta aparece, a criança começa a usar
vários brinquedos simbolicamente, visando a objectos que representam outros objectos.
Desta maneira, uma folha de papel pode tornar-se num avião; um pau pode ser
transformado num cavalo; uma penela e uma colher num tambor; etc.

281
Avaliação em Psicologia Clínica

Em todos os períodos evolutivos, o simbolismo habilita a criança a transferir interesses,


fantasias, ansiedades, culpa, tendências destrutivas, para outros objectos e/ou pessoas,
revelando preocupações e ansiedades, aspirações e desejos, na tentativa de obter
através da acção lúdica, o domínio do mundo externo e, como indicador avaliativo,
possibilita compreender também a capacidade expressiva da criança e a qualidade do
conflito.
7) A tolerância à frustração e a
8) Adequação à realidade são indicadores que têm a ver com a aceitação ou não das
instruções e enquadramento da hora de jogo, assim como com a aceitação dos limites,
do próprio papel e do papel do outro, da separação dos pais, do tempo de início e fim, do
resultado dos jogos, etc. Tudo isto está intimamente relacionado com as possibilidades
egóicas e com o princípio do prazer e da realidade.

→ O Jogo Lúdico é uma técnica de avaliação clínica muito rica pois permite compreender
a natureza do pensamento infantil, fornecendo informações significativas do ponto de vista
evolutivo, psicopatológico e psicodinâmico, possibilitando formular conclusões diagnósticas,
prognósticas e indicações terapêuticas.

O jogo e a psicopatologia:

 Patologia define-se pela repetição, persistência prolongada, para além da idade.


 Suposto ser apelo espontâneo, quando patologia não acede facilmente e aparecem
estereotipias, etc.

282
Avaliação em Psicologia Clínica

O DESENHO

1. Etapas do desenho:
 Realismo fortuito → a partir dos 18 meses, a criança começa a interessar-se pelo traço
que o objecto traçante imprime. Ao rabisco inicial, sem intenção de representar seja o
que for, sucedem-se formas esquemáticas reconhecíveis: a espiral, o “círculo primordial”
(circulo incompleto, aberto de um dos lados que é capaz de servir de base para a
representação da maior parte dos objectos conhecidos da criança: figura humana por
exemplo) que permitem à criança encontrar ocasionalmente semelhanças entre um
traço e um objecto e interpretá-lo nesse sentido.
 Realismo falhado → entre os 2 e os 3 anos aperfeiçoam-se os esquemas básicos do
grafismo: aparecem as linhas verticais, depois as horizontais, as linhas paralelas. A
criança, embora sem relevantes aquisições, domina cada vez melhor o seu grafismo (o
traço vai-se tornando mais firme; as linhas, inicialmente descontínuas, tornam-se
uniformes) e aparece o desenho intencional, frequentemente anunciado com
antecedência. Mas entre a intenção e as capacidades gráficas, há ainda um desnível e a
criança falha no seu propósito. Mais adiante, poerá encontrar um compromisso: um
grafismo não intencional. O círculo, por exemplo, é associado a um objecto conhecido:
um animal. A criança acrescenta-lhe então dois traços verticais representando as pernas
e dá-lhe o nome de uma qualquer ave.

Mesmo depois de um domínio dos automatismos gráficos, a criança continua a falhar na


capacidade sintética. A criança representa as diversas partes de um objecto não tendo em
conta as suas posições relativas (sincretismo). Assim, numa figura humana, as pernas podem
ser desenhadas ao lado do tronco e os olhos ao lado da cabeça. O sinal mais seguro, talvez, da
passagem da etapa do realismo falhado para a etapa do realismo intelectual ser-nos-á dado
então pela perda deste sincretismo, e a sua substituição pela capacidade de integração das
diversas componentes de um todo no respeito das suas posições recíprocas: pela capacidade
sintética.

 Realismo intelectual → dos 3 aos 6/7 anos faz a aquisição progressiva de todos os
esquemas gráficos: a linha sinuosa, o círculo, a cruz, o quadrado, o triângulo e o losango,
que lhe permitem representar intencionalmente, um modelo interno. Mas nesta etapa, a
criança desenha o que conhece, o que sabe existir, e não aquilo que vê e como o vê. Daí
que nesta etapa se notem características específicas, que importa descrever. São elas:

283
Avaliação em Psicologia Clínica

o A Transparência: a criança reproduz certos elementos do desenho que


normalmente devem estar escondidos. Por exemplo: o umbigo sob a roupa, o
conteúdo do estômago, cenas familiares vistas da rua, como se as paredes fossem
transparentes, etc. A transparência começa a desaparecer entre os 8 e 9 anos e já
não se verifica aos 12.
o Rebatimento: ainda pela preocupação de desenhar tudo o que sabe que existe, a
criança rebaterá os planos, podendo, assim, representar partes que de outro modo
ficariam invisíveis. Por exemplo: num carro, as rodas aparecem deitadas ao lado do
corpo central; uma mesa tem os pés no prolongamento do tampo, etc.
o A Narrativa Gráfica: consiste em resumir numa só imagem os vários elementos de
uma história que se desenrola em momentos diferentes (tipo simbólico); ou repetir
o personagem principal a cada momento da história, mantendo o cenário de fundo
(tipo sucessivo); ou ainda repetir o cenário e personagens isoladamente para assim
indicar com clareza a relativa descontinuidade dos acontecimentos. É uma das
características mais importantes desta etapa por, exactamente, marcar na
capacidade de representação, a passagem do estático ao dinâmico no desenho
infantil.
o A mudança de ponto de vista: a criança desenha “observando” partes do objecto de
um ângulo e parte de outro, o que pode dar dois olhos num rosto de perfil; pés de
perfil e corpo visto de frente; uma sala com os móveis encostados à parede na
vertical e a mesa vista de cima, etc.
 Realismo Visual → as coisas são desenhadas tal como são vistas e não como são
conhecidas, como no realismo intelectual. Este tipo de desenho pode já manifestar-se,
esporadicamente, a partir dos 6/7 anos, mas na opinião da generalidade dos autores, é
por volta dos 12 anos que está solidamente adquirido.

As aquisições posteriores verificar-se-iam apenas ao nível do domínio das técnicas e


não das estruturas mentais.

284
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Interpretação de alguns aspectos gerais do desenho

Localização no papel:

Característica: Simbolismo:
No meio da página Indica pessoa ajustada.
Crianças que desenham no centro da página mostram-se mais
autodirigidas, autocentradas.
Desenhos fora do centro da página Pessoas mais descontroladas e dependentes.
Quando não levado a grandes extremos da página, indica grande
segurança.
Desenho num dos cantos Pessoas que fogem do meio. Pode indicar fuga ou desajuste do
indivíduo ao ambiente.
No eixo horizontal, mais para a direita do Comportamento controlado, desejando satisfazer as suas necessidades
centro horizontal e impulsos; prefere satisfações intelectuais do que emocionais.
No eixo horizontal, mais para a esquerda Comportamento impulsivo; procura a satisfação imediata das suas
do centro horizontal necessidades e dos seus impulsos.
Lado esquerdo da página Indica inibição ou controlo intelectual; introversão.
Lado direito da página Extroversão; procura a satisfação imediata. O desenho no canto
superior direito é mais grave que no canto superior esquerdo.
Na linha vertical, acima do ponto médio Desajuste com possibilidade de reagir ao mesmo. Acha que está a lutar
muito e o sente que o seu “goal” é inatingível; tende a procurar
satisfação na fantasia, em vez de na realidade; tende a manter-se alheio
e inacessível.
Abaixo do ponto médio da página O indivíduo sente-se inseguro e inadequado, em depressão, preso à
realidade e ao concreto, firme e sólido. A criança (escola primária)
prefere o quadrante de cima e esquerdo, mas quando atinge o 8º ano
escolar volta gradualmente para o centro.
Abaixo, mas quase no centro Desajuste, debilidade física e fuga.
Fora da margem do papel Debilidade mental ou fraco índice de socialização.
Figuras penduradas nas margens do papel Reflectem a necessidade de suporte; medo de acção independente;
(como janelas penduradas das bordas das falta de auto-afirmação do sujeito.
paredes)

285
Avaliação em Psicologia Clínica

Pressão no desenhar:

Característica: Simbolismo:

Pouca pressão, traço leve Baixo nível de energia, pressão e restrições.


Neuróticos medrosos e esquizofrénicos crónicos e catatónicos exibem
pouca pressão, linhas quase esbatidas.
Indivíduos deprimidos e com sentimentos de inadequação preferem
traços muito leves, quase apagados.
Muita pressão, traços fortes Sujeitos extremamente tensos.
Psicopatas, casos orgânicos epilépticos e encefalíticos empregam forte
pressão.

Caracterização do traço:

Característica: Simbolismo:
Forte Medo, insegurança, agressividade sádica, dissimulação.

Leve normal Bom tónus, equilíbrio emocional e mental.


Apagado Dissimulação da agressividade, medo de revelar os seus problemas,
debilidade física, inibição, timidez discreta.
Trémulo Insegurança, dissimulação onde ganha tempo para enfeitar os traços.
Doenças cerebrais, disritmia, esgotamento nervoso.
Recto com interrupções Pessoa que contorna a situação. Dissimulação do problema. Pessoa
agressiva que se controla.
Interrompido, mudando de direcção Dissimulação do carácter. Não aceitação do meio ambiente. Oposição.
Peludo Personalidade primitiva; age mais pelo instinto do que pela razão.
Quase sempre acusa uma disritmia.
Ondulado, dentro do tipo ciclotímico Disritmia. Doença cerebral.
A negrito Entrada no conflito.

Pontilhado Grande dissimulação, quase neurótica.


Apagado e retocado Zona de conflito. Quanto maior a recta, maior o conflito.
Sombreado Sonhadora. Pode ainda ser descuidada, sádica; mascara os seus
conflitos, medos e inseguranças. Presa à fase anal. Pouco cuidadosa
com a roupa.
Passado e repassado Conflito na zona em que aparecer: boca, braço, etc.
Apagado, emendado e retocado Zona de conflito e dissimulação.
Repetido Uso de muitos traços. Insegurança, sentimento de perda afectiva,

286
Avaliação em Psicologia Clínica

imaturidade sexual, homossexualidade (principalmente no desenho da


árvore). Agressividade para com o problema encontrado.
Recta partida Traço dentilhado. Pode aparecer nos acessórios e não na própria figura.
Repressão à agressividade, com tendência à introspecção.
Anguloso Tendência à introversão, ao isolamento. Aparecer em figuras onde há
um reforço no contorno e negrito (simultaneamente), indica rejeição à
figura humana. Trata-se de um conflito grave, encontrado em casos de
crianças violentas.

Simetria do desenho:

Característica: Simbolismo:

Falta de simetria Insegurança emocional.

Simetria bilateral Rigidez. Sistema obsessivo-compulsivo de controlo emocional que pode


ser expresso por repressão e superintelectualização. Também pode
indicar depressão.

Detalhes no desenho:

Característica: Simbolismo:

Detalhes inadequados Tendência a retraimento.

Falta de detalhes adequados Sentimento de vazio e energia reduzida, característica de indivíduos


que empregam defesas pelo retraimento e, às vezes, depressão.
Detalhe excessivo Compulsivo-obsessivo.

Crianças neuróticas ou adultos com sentimentos de que o mundo é incerto,


imprevisível ou perigoso, tendem a procurar defender-se contra o caos externo ou interno,
criando um mundo rigidamente organizado e altamente estruturado, sendo que os seus
desenhos tendem a ser muito exactos. Criam elementos rígidos e repetitivos. Não há linhas
fora do lugar. Tudo é posto junto pela força, pois sentem que sem pressão, tudo se
desagregará.

Obsessivos-compulsivos e esquizofrénicos: performances muito perfeitas, executadas


com um inusual cuidado e controle, o que indica um self muito fraco, assim como medo de se
deixarem levar pelos impulsos, sentindo, deste modo, que têm de estar sempre vigilantes.

287
Avaliação em Psicologia Clínica

O sentimento de rigidez é o mais frequente é a característica que mais


frequentemente acompanha o detalhe excessivo. Representam uma pessoa com corpo e
cabeça bem erectos, pernas presas uma à outra, num estado de vigília, tensão, mantendo o
self contra o mundo exterior. Expressam atitudes basicamente defensivas.

Para estas pessoas, as relações espontâneas com outras pessoas, assim como o mundo
exterior, representam uma grande ameaça. São incapazes de relaxar e de ter comportamentos
impulsivos. Actuam sempre com percalço, sob pressão do dever.

Esta rigidez defensiva impede a espontaneidade e a auto-afirmação, que permite uma


legítima quantidade de irresponsabilidade, indulgência e relaxamento.

Movimentos no desenho:

Quase todos os desenhos sugerem alguma forma de tensão cinestésica, desde a rigidez
até à extrema mobilidade.

Pessoas jovens mostram mais movimentos funcionais ou abortados, devido ao produto


das suas fantasias.

Figuras sem movimentos indicam repressão, inibição aos estímulos interiores. Quanto
menos movimento, mais curto será o caminho para a neurose.

O movimento está associado à inteligência e ao tónus vital.

Característica: Simbolismo:

Movimento excessivo Indica histerismo latente, excitação. Também pode indicar necessidade
de comunicação (se os traços tendem a sair das margens trata-se de
aspectos negativos). O indivíduo inquieto produz desenhos que contém
consideráveis movimentos.
Movimento monótono Pode corresponder a uma apatia.

Movimentos hesitantes Insegurança, dissimulação, fraco controlo sobre as suas reacções.

Tamanho da figura:

A relação entre o tamanho do desenho e o espaço disponível na folha de papel pode


estabelecer um paralelo com a relação dinâmica entre o sujeito e o seu ambiente, ou entre o
sujeito e as suas figuras parentais.

288
Avaliação em Psicologia Clínica

Assim, o tamanho sugere a forma como o sujeito está a reagir à pressão do ambiente,
ou a forma como se sente no seio familiar.

O tamanho da figura contém, portanto, indicações acerca da auto-estima ou fantasias


de auto-superação (aumento da valorização própria).

O desenho médio de uma figura completa é de, aproximadamente, 7 polegadas de


comprimento, ou dois terços do espaço disponível.

Característica: Simbolismo:

Tamanho normal Inteligência; capacidade de abstracção espacial; equilíbrio emocional.

Tamanho diminuto Pode ser caso de inteligência elevada mas com problemas emocionais.
Pode indicar inibição da personalidade, desajuste, repressão à
agressividade, factor somático (caso de desnutrição). Timidez e
sentimentos de inferioridade.
Tamanho grande Fantasia. Se está bem centrada pode significar ambições que poderão
ser alcançadas.
Tamanho exageradamente grande Sentimento de opressão do ambiente, com concomitante acção
(atingindo quase os limites da página) supercompensatória, ou fantasia (uma pessoa pequena que se desenha
grande, por exemplo). Debilidade mental (não tendo noção do
tamanho).
Em outros desenhos, poderá ainda revelar tendências narcísicas ou
exibicionistas.
Pode também revelar uma forte agressividade.

Uso da borracha:

Característica: Simbolismo:

Uso normal Autocrítica.

Ausência total (quando a borracha está Falta de crítica.


presente)
Uso exagerado Autocrítica já consumada e estruturada. Incerteza, indecisão e
insatisfação consigo mesmo.
Ainda pode indicar dissimulação, falta de controlo ou fuga.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Riscar o papel:

Indica dificuldades de adaptação e fraco índice de controlo.

3. Significação das cores

Quanto à variação:

Característica: Simbolismo:

Branco Oposição.

Preto Sentimento de morte, ódio, negativismo absoluto, e, se usado sozinho:


tristeza, medo.
Preto e branco Ansiedade, depressão, grandes temores.

Cinzento Disforia, tristeza, insatisfação.

Azul Depressão, calma, tristeza, desejo de afirmação e inibição.

Azul frio Controlo, pessoa policiada.

Azul celeste Misticismo.

Azul e amarelo combinados Dificuldade, gerando conflito e desejo de afirmação.

Vermelho Agressão, destruição, ódio, sensibilidade sexual, força e vigor. É a cor


mais emocional. O interesse pelo vermelho decresce à medida que a
criança supera a fase impulsiva e ingressa a fase da razão e de maior
controlo emocional.
Pode assinalar-se 2 tipos de simbolismo:
Simbolismo negativo: roubo, guerra, destruição.
Simbolismo universal: cólera, paixão, sangue, temor sexual.
Vermelho e amarelo combinados Agressão e hostilidade.

Vermelho e preto Auto-agressividade, tendência a suicídio.

Verde Criação, reprodução. Indivíduo emocionalmente fraco, imediatista.


Distúrbios digestivos e intestinais. Inibição.
Amarelo sol Força, energia, violência, estabilidade, euforia.

Alaranjado Desejo de contacto, repressão da agressividade, desejo de simpatia


forçada, mais fantasia de acção.
Bordeaux Ansiedade.

Roxo Paixão, depressão (símbolo intermediário), paz e realização.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Marrom Problema de sujidade, sentimento de culpa ligado à masturbação,


presa à fase anal. Pode ser algo utilizado por imposição do grupo. Sexo
e culpabilidade.
Marrom, violeta e azul Grande depressão.

Quanto à intensidade e frequência do uso das cores:

Característica: Simbolismo:

Vermelho Temor de castração.

Amarelo Bom tónus vital, alegria.

Recusa total da cor Neuróticos graves e psicóticos retraídos.

Simbolismo quanto à disposição das cores:

Característica: Simbolismo:

Cores separadas Expansão, porém com emoções controladas ou dirigidas. Desejo de


ordem, equilíbrio.
Cores entrelaçadas, misturadas Menos controlo emocional.

Cores superpostas Regressão, conflito emocional agudo, conflito da relação “Eu-mundo”.

Cores desordenadas, justapostas de modo Confusão mental, descontrolo, carácter desenfreado, sem noção de
confuso, com negligência limite de comportamento, desorganização psíquica.
Cores muito separadas na área disponível Compulsividade, desejo de perfeição, disciplina rígida.

Cores cuidadosamente dispostas, Circunspecção, actividade disciplinada e limitada.


ocupando a área disponível

4. O Desenho como Técnica Projectiva

Existem dois tipos de Desenho como técnica projectiva:

4.1. O desenho temático

Pede-se à criança para desenhar uma casa, uma árvore ou uma pessoa. A casa é
apropriada à simbolização do corpo da criança, ao útero ou à casa paterna; a árvore é
adequada a reflectir os sentimentos relativamente profundos e os mais inconscientes da

291
Avaliação em Psicologia Clínica

criança a respeito de si mesma; a pessoa veicula a visão consciente da criança relativamente a


si própria e ao mundo que a rodeia.

O teste de Machover – “Desenho de uma pessoa” – consiste em pedir ao desenho que


desenhe uma pessoa e, logo a seguir, o desenho de uma pessoa do sexo oposto ao desenhado
em primeiro lugar. Resumidamente, os fundamentos teóricos seriam: a projecção de si mesmo
– aqui não se faz por intermédio da palavra (como no MMPI), nem é mediada pela percepção
visual (como no RCH e no TAT), mas por um grafismo específico: o corpo humano. O corpo e a
sua imagem são determinados pelo que há de mais específico e desprovido de equívocos: a
presença do sexo feminino ou masculino. Identificando-se ao seu próprio sexo, a criança aceita
e faz suas, na estrutura de personalidade, os papéis, as concepções, as condutas e as pulsões
próprias do seu sexo. Esta identidade sexual (quem sou eu, menino ou menina?) é o local onde
sedia o sentimento de normalidade, referência que assegura a expansão da personalidade.

É a personalidade, e não os estados emocionais temporários, que Machover tem em


vista, partindo do pressuposto que a criança projecta a sua própria imagem no desenho da
figura humana. Este, encara os desenhos como expressão dos mais permanentes e firmes
traços da personalidade.

I – Desenho da figura humana

Pode ser usado para:

1) Avaliar o desenvolvimento infantil


O foco está sobre o desenvolvimento infantil, profundamente estudado por Koppitz que
produziu um sistema de avaliação objectivo muito usado internacionalmente. Para
aplicar a técnica deste, solicita-se à criança o desenho de uma pessoa inteira numa folha
branca. A avaliação é feita com um único desenho, e inclui 30 itens evolutivos, pontuados
como estando: ausentes ou presentes. Os itens presentes são somados e a criança
recebe, então, um score global. A análise também pode ser realizada na avaliação pela
presença de itens esperados, incomuns e excepcionais, tendo em conta a idade da
criança.
(A análise dos itens evolutivos encontra-se no livro de Koppitz, 1968)
(Wechsler, 1996 – contribuições para a melhoria da fidedignidade da avaliação)

292
Avaliação em Psicologia Clínica

2) Avaliar a personalidade e o ajustamento emocional


Koppitz (1968), estabeleceu uma escala de 30 indicadores emocionais capazes de
diferenciar crianças sem e com problemas emocionais (em atendimento clínico). A
presença de três ou mais indicadores, especialmente em crianças com mais de nove anos
de idade, apontaria para a possível presença de desajustamento emocional. Alguns
indicadores são pontuados conforme a idade da criança.
Machover (1949) também desenvolveu outra forma de avaliar a personalidade e os seus
aspectos estruturais e dinâmicos. Na aplicação, solicitava-se também o desenho de uma
figura do sexo oposto à primeira “desenhada”. Também há a possibilidade de se solicitar
o desenho de uma pessoa na chuva, o que permitiria investigar reacções do examinado a
situações de tensão. Recomenda-se, ainda, a realização de um inquérito ou a construção
de uma história sobre a figura.
Ao desenhar uma pessoa, o indivíduo projecta a sua imagem corporal no papel (“a
figuração do nosso corpo é formada pela nossa mente, ou seja, o modo pelo qual o corpo
se apesenta a nós” Schildren, 1981). Essa imagem envolve uma apercepção do corpo,
possuindo bases fisiológicas, libidinais e sociológicas e está intimamente relacionada com
o conceito que o indivíduo tem de si mesmo.
No entanto, e segundo Van Kolck (1984), o desenho também pode ser a representação
de outros aspectos do indivíduo, tais como aspirações, preferências, pessoas vinculadas a
ele, imagem ideal, padrões e hábitos, atitudes para com o examinador e a situação de
testagem. Essa variedade de possibilidades torna a técnica muito rica, mas também
dificulta a interpretação acurada e fidedigna de um DFH.

3) Avaliar aspectos específicos, como a ansiedade


O DFH também pode ser utilizado para avaliar aspectos específicos tais como a
ansiedade.
Handler (1967) propôs uma escala com 20 índices de ansiedade. Este, preocupou-se em
estabelecer critérios de scores para a análise de maneira formal, que abrangem tanto a
ansiedade causada por situações externas stressantes como por causas intrapsíquicas. 20
índices foram descritos, atribuindo-se scores de acordo com as características do
desenho para cada um deles, em escalas de quatro ou dois pontos, onde, nesta última, a
presença é um indicador de ansiedade.

293
Avaliação em Psicologia Clínica

 Sexo da figura: o DFH é considerado como a expressão da auto-imagem de crianças que,


teoricamente, a projectam as suas identificações e os seus conflitos no desenho. Portanto,
seria expectável que desenhassem figuras do seu próprio sexo. Machover (1949) afirmou
que crianças que desenham figuras do sexo oposto provavelmente apresentam um
problema no desenvolvimento da sua identidade sexual; no entanto, alguns estudos não
encontraram qualquer relação entre o sexo da figura, a identificação sexual e os
problemas emocionais.
Não se tem conhecimento sobre as razões que levam uma criança ou um adulto a
desenhar primeiro uma figura do sexo oposto. Porém, está claro que, por si só, o sexo do
DFH não é indicador de normalidade ou de patologia.

Normas de Interpretação de Aspectos Gerais do Desenho da Figura Humana:

Proporção entre os desenhos feitos:

1) A proporção entre as figuras humanas desenhadas pode basear-se na idade de cada um.
Nesse caso, trata-se de minuciosidade e desejo de perfeição.
2) A proporção simboliza o valor que o propósito atribui à figura desenhada. Se a mãe é
desenhada num tamanho maior do que os outros membros da família, ela é tomada como
figura dominante. Pode, também, representar uma idealização – a idealização de que a
mãe seja a figura desejada.
Uma figura de um irmão maior que o pai: sentimento de ciúme.
Quando a figura é menor: é sinal de uma compensação, rebeldia, sentimento de não-valia.

Posição da figura desenhada:

Característica: Simbolismo:

Figura de frente Quando a figura é do próprio sexo do sujeito, significa aceitação do seu
próprio sexo. Resolução da fase edipiana. Aceita o muindo de frente.
Desenho de perfil Pode ser uma dissimulação ou um desajuste, ou incapacidade de
enfrentar o meio. Indiferença ao meio. Deficiência afectiva.
Corpo de frente e rosto de perfil Carácter não bem ajustado aos seus propósitos. Falta de aprendizagem,
técnica.
Negrito Conflito no desenho.

Desenho de costas Dissimulação dos impulsos culpados e inconfessáveis. Pode ser caso de
ambivalência sexual. Uma esquizotimia.
Figura de pé Significa força, energia, adaptação.

294
Avaliação em Psicologia Clínica

Figura sentada ou agachada Inibição, submissão, debilidade física, fraca energia para responder aos
estímulos externos. Facilidade no campo sexual. Ideias suicidas.
Deitado Patológico. Pode revelar uma situação como, por exemplo, o sujeito ter
uma pessoa doente na família.
Figura inclinada Solta no espaço. Instabilidade psíquica ou somática. Desvio do controlo
visuo-motor. Disritmia cerebral. Perturbação mental, tumor cerebral,
etc. Sofre de enxaquecas.
Aparecem órgãos sexuais Pode ser verificado até aos 7 anos (auto-afirmação, descoberta do
sexo). No adulto: quando há representação do sexo, pode ser um
problema grave no terreno sexual.
Pode ser uma fantasia de masculinidade.

Transparência nas figuras:

É natural até aos 5/6 anos. Além dessa idade, a figura é desenhada sem transparência.
Quando aparecem elementos sexuais através da roupa, irá demonstrar curiosidade
sexual. Também pode tratar-se de uma criança atrasada.
Transparência no adulto: é uma resposta a uma prática sexual culposa.

Figuras cabalísticas:

Onde aparece geometrismo, estereotipia, trata-se de problemas sexuais ou de


personalidade esquizóide. Nesses casos, a figura humana é desenhada de uma forma nada
idêntica à realidade.

Figuras grotescas:

Insensibilidade, baixo nível mental.

Figura não inteira:

Característica: Simbolismo:

Só a cabeça Censura ao seu próprio corpo. Problema de grande censura sexual.

Cabeça exagerada Debilidade mental. Pode ser caso de pessoas que tenham doentes na
família. Pode ser narcisismo ou valorização exagerada da própria
inteligência.
Tamanho reduzido Menos-valia, sentimento de inferioridade. Pouca inteligência.

Desenho só do busto Censura à área genital.

295
Avaliação em Psicologia Clínica

Partes omissas Faltando um braço, ou uma perna, etc., aparece em débeis mentais,
problemas somáticos, neuroses. Pode ser censura relacionada à parte
omitida. Aparece também entre psicóticos e imaturos, que não querem
tomar conhecimento dos problemas do mundo.

Sucessão das partes desenhadas:

Característica: Simbolismo:

Início pela cabeça É o mais comum. Indica a aceitação do desenvolvimento humano.

Início pelo pescoço Elemento de ligação entre as forças afectivas e os impulsos


controladores do corpo. Indica pessoa que vive sob controlo. Pessoa
que se controla. Controla os desejos do corpo.
Início pelo cabelo Problema de virilidade, sexualidade.

Início pelo rosto Função social: no rosto estão todos os elementos da inter-relação
social. Pessoas que têm preocupação em agradar. Necessidade de
inter-relação com as pessoas.
Desenvolvimento bilateral Relaciona-se com as pessoas que procuram dissimular.

Início pelos ombros Pessoas com ambição, desejo de auto-afirmação, dificuldades gástricas.
Fantasia de força, de poder (no caso de ombros largos).
Início pelos braços Indivíduo que ambiciona poder económico, compreensão e afecto.
Conforme a posição dos braços, verifica-se se o indivíduo está a
fantasiar as ambições. Sentimento de culpa, se estes estão retocados.
Desejo de inter-relação. Necessidade de aquisição de bens. Pessoas que
gostaria de ter uma boa vida social, mas que não o fazem devido às
suas condições financeiras, etc. É importante verificar se a ambição é
positiva ou negativa.
Início pelas mãos Pessoa muito forreta ou muito ambiciosa, ou muito pobre. Pode
mostrar um grande sentimento de culpa; frustração; ou mostrar
alguma situação real.
Início pelas pernas Indica desejo de mudança – física, profissionalmente, academicamente
ou de fantasia (como nada tem, começa por onde ele quer).
Início pelo pé O mesmo que começar pela perna. Em geral, indica um problema
sexual.
Cabeça desenhada em último lugar Sugere a possibilidade de sério distúrbio mental.

Início pelos pés, com dedos Indica pessoa de afectividade primitiva, de sensualidade instintiva, sem
controlo e de grande agressividade.

296
Avaliação em Psicologia Clínica

Normas para a Interpretação Específica de cada parte da Figura Humana:

Cabeça:

É a parte do corpo onde se localiza o “Eu”. Há, portanto, uma grande ênfase dada ao
desenho da cabeça, com excepção dos neuróticos, deprimidos ou desadaptados socialmente.
A maior parte do autoconceito do indivíduo está focado na cabeça.

A cabeça é considerada como sendo o centro do poder intelectual, social e do controlo


dos impulsos corporais.

Característica: Simbolismo:

Cabeça grande, em relação ao tamanho Ambição, aspirações intelectuais, introspecção, fuga à fantasia.
do corpo
Cabeça exagerada Narcisismo, egocentrismo, exibicionismo. Fantasia maior do que a
capacidade de realização. Sentimento de menos-valia. Crítica do
mundo para o indivíduo. Debilidade mental, problemas somáticos
(dores de cabeça, por exemplo). Escasso sentido espacial, com base em
defeito intelectual.
Cabeça pequena em relação ao corpo Sentimento de menos-valia, preocupação, crítica.

Cabeça redonda. Circular e pequena Pode ser um caso paranóide.

Cabeça geométrica, triangular, quadrada Problema psicótico.

Cabeça desenhada com muita clareza, em Pode indicar que o sujeito recorre, habilmente, à fantasia, como um
contraste com o corpo, vagamente estratagema compensatório, ou pode ter sentimentos de inferioridade
esquematizado ou vergonha relacionada às funções e partes do seu corpo.
Rosto:

Característica: Simbolismo:

Cabelo, olho, nariz, com ausência de Pode referir-se a problema psicótico. Toda a vez que um indivíduo
contorno facial deixa o humano, trata-se de um problema psicótico. Dificuldade em ter
contacto com o estímulo exterior.
Desenho do rosto sem olhos, nariz, boca Pode indicar ausência de relação com o meio. Fuga às respostas, aos
estímulos exteriores. Imaturidade para não se comunicar com ninguém.
Contorno reforçado Dificuldade de inter-relação social. Restrição à figura projectada. A
cabeça pode estar bem marcada e o rosto delineado. São, em geral,
pessoas com tendência à fuga: perante problemas, fogem. Insegurança,
com capacidade de vencê-los.

297
Avaliação em Psicologia Clínica

Olhos:

Característica: Simbolismo:

Olhos Podem ser representados apenas com um traço. Isto pode revelar:
autismo, introversão, não aceitação do meio. Pessoas que “fecham” os
olhos para não ver. Imaturidade afectiva.
Omissão dos olhos Imaturidade afectiva: psicossocial. Egocentrismo. Pode ser dissimulação
de uma atitude imatura para responder a um estímulo exterior. Pode
ser um problema patológico.
Olhos representados por um ponto Pode ser um meio imaturo de enfrentar a vida. Aspecto regressivo na
maturidade afectiva.
Olhos vazios sem pupilas. Egocentrismo: recusa em enfrentar a realidade. Podem ter um aspecto
agressivo. Podem ter uma significação particular para o sujeito
(sadismo). O mundo está fechado para ele, ou percebido muito
vagamente, com pequena dissimulação e detalhes.
Olhos ‘queixosos’, bem trabalhados Desenhados por elemento feminino: aspirações ‘queixosas’. Atitude
geral. Agressividade. Em meninas: ideia de se afirmar sexualmente,
chamar a atenção. Em pessoas de maior idade: pode estar ligada ao
problema da masturbação. Em rapazes: problema de sexualidade
inadaptada. Desenho homossexual ou ambivalente.
Olhos fechados Podem indicar imaturidade para enfrentar problemas. Autismo.
Pessoas que querem fugir ao meio. Pode ser uma situação real. A
pessoa não quer enfrentar o problema e fecha os olhos ao mesmo.
Olhos oblíquos para baixo Depressão: debilidade consciente. Fraco controlo diante do meio em
que vive.
Olhos satânicos, para cima Na mulher: desejo de contacto sexual, masturbação. Narcisismo –
desejo de afirmação no grupo.
No homem: ambivalência sexual.
Olhos a negrito Inter-relação social. Conflito, agressividade. Satisfação furtiva. Recusa
total do meio.
Retoque nos olhos Pode ser um problema somático ou psíquico.

298
Avaliação em Psicologia Clínica

Sobrancelhas e pestanas:

Característica: Simbolismo:

Sobrancelhas e pestanas O traço da pestana com o traço dos olhos em linha recta: personalidade
forte, decidida e teimosa. Regressão da evolução afectiva (fase anal),
autoritarismo.
Sobrancelhas levantadas Livre expressão, arrogância, desdém ou dúvida. O paranóico dá muita
ênfase aos olhos.
Sobrancelhas em traços finos Fina sensibilidade.

Peluda e farta Sensualidade primitiva.

Cabelos:

Característica: Simbolismo:

Cabelos desordenados Imoralidade sexual.

Na mulher (cabelos em cascata) Indivíduo mais desinibido. Move-se bem no ambiente. Pode significar
reacção às formas negativas, se apresentadas nos outros testes.
Imaturidade psicossocial.
Cabelos de mulher agarrados à cabeça É comum nas mulheres solteiras.
(lisos)
Cabelo desenhado com cuidado (bem Pessoa com bom equilíbrio psicossexual, bom nível mental.
delineado)
Cabelo muito certo Pessoas moralistas, que se controlam. Pode ainda ser um exibicionismo
ou narcisismo.
Ênfase em preencher o espaço envolvido, ou no vigor do sombreado.
Virilidade sexual.
Cabelo em escova Reacção agressiva a algo que o indivíduo não aceitou dentro do grupo.

Cabelo com trança Sujeição: controlo dos impulsos sexuais, dos próprios impulsos.

Rapaz que dá à mulher penteado Desordem sexual, imaturidade sexual, narcisista e hostil à mulher.
desordenado e ao do rapaz muita ordem Ênfase no cabelo, sobre o peito com uma barba: indicação de pujança
viril.
Cabelo ondulado, em formas de cachos Quando se combina com outros enfeites chamativos, feito por
meninas, é encontrado entre adolescentes e meninas sexualmente
delinquentes, ou com desejos de chamar a atenção. Meninas
sexualmente precoces.
Quando o cabelo serve para tapar a cara Dissimulação de problemas.

299
Avaliação em Psicologia Clínica

Quando tapado com um chapéu Dissimulação sexual.

Costeletas Aspecto fálico: pode responder a uma fantasia de poder sexual.

Sombra vigorosa do cabelo com limites Conflito de virilidade, que surge em condutas sexualmente desviadas.
mal delineados
Cabelo curto Sentimento de perda de virilidade. Jovens com a sexualidade bem
definida.
Rapaz que desenha mulheres com cabelos Carácter regressivo ou esquizóide. Sexualidade infantil com vivas
bem delineados e homens com chapéus fantasias viris. Está a aumentar a sua impotência com o chapéu.
incongruentes
Cabelo colado em caracol Repressão sexual. Conceitos morais errados, etc.

Carecas Sentimento de debilidade, de impotência. À medida que o cabelo


diminui, maior o problema ou o temor de ficar careca.
Testa grande Desejo de afirmação da inteligência. Situação real. Problema somático.

Franja Cobertura do problema sexual ou corporal (por exemplo, testa grande-


é comum usar franja). Dependência da virilidade sexual e distinção
social. Quando o sujeito desenha a figura masculina e feminina, estás
devem ser comparadas. No caso de desenhar o sexo masculino com
retoques, etc., revela problema (repressão à figura feminina).

Bigode e barba:

Característica: Simbolismo:

Bigode e barba Raramente aparece em desenhos de adolescentes e adultos. Só


aparece em esquizóides ou esquizofrénicos.
Bigode e barba bem feitos Virilidade evidente. Quando o indivíduo do sexo masculino desenha o
sexo feminino com estas características, verifica-se um caso de
ambivalência sexual, confusão sexual, conflito com a figura materna
autoritária.

Óculos:

Colocar óculos: necessidade inconsciente. Problema somático. Aspecto de ambição.


Resposta de cobertura. Dissimulação da dificuldade em enfrentar o mundo.

300
Avaliação em Psicologia Clínica

Nariz:

Essencialmente, possui simbolismo sexual.

Preocupação com o nariz indica culpabilidade causada pela masturbação.

Característica: Simbolismo:

Omissão do nariz Relacionada a um temor de castração: mesmo quando omitido (pela


mulher).
Nariz grande Virilidade. Sexo em grande escala. Desenhado por homens pode ser
mecanismo de compensação: homens frios.
Nariz grande, num homem velho Impotência. Se o desenho apresentar nariz na mulher e no homem não:
representa a figura feminina fálica, dominadora.
Nariz curto, pequeno Temor de castração. Consciência de debilidade sexual.

Nariz com deformações Pode ser uma situação real. Sentimento de menos-valia. Projecção da
figura de um indivíduo da família. Desvio sexual.
Nariz com retoque Indivíduo com problema de punição: auto e heteropunição (pela sua
conduta sexual desviaste).
Nariz desenhado com um corte ou sombra Indecisão ou inadequação sexual, que também podem ser indicadas
(vertical) por uma braguilha grande nas calças, ou gravata. Indica, também,
temores de castração, dúvida, indulgência auto-erótica.
Nariz visto de frente Sombreado, reforçado ou omitido: conflito sexual. Imaturidade.
Complexo de inferioridade. Homossexualidade.
Nariz chato Primitivismo intelectual, sexual.

Nariz afilado Práticas agressivas sexuais. Quanto maior a diminuição, maior o


problema de castração.
Representação das narinas Fantasia no campo sexual.

Narinas com asas bem acentuadas Aspecto de forte sexualidade. Agressividade. Indício de força, teimosia,
comando, impulsividade. Quando desenhadas a negrito, o problema
agrava-se.
Narina acentuadamente retocada Fantasia de expor a fantasia do item anterior.

Nariz arrebitado Realização sexual. Mecanismo de compensação na mulher. Uma


situação real ou um problema sexual.

301
Avaliação em Psicologia Clínica

Boca:

Refere-se às tendências captativas, como nutrição, satisfação da líbido oral, relações


sociais – dar e receber afeição e, até mesmo, relações sexuais.

Característica: Simbolismo:

Boca grande Relaciona-se com uma ambição: desejo de inter-relação social;


necessidade física. Aquele que “vive para comer”. Ambicioso. Pode ser
um problema psicossocial neutro. Conduta sexual desviaste. Acessos de
mau humor.
Boca com um traço só, recto Introversão ou por deficiência ou por rejeição do ambiente.

Boca côncava aliada a um grande número Dependência, sintomas gástricos.


de botões
Boca redonda ou oval, com lábios grossos Agressividade oral. Pode ser conduta sexual desviante.

Boca com linhas simples, de perfil, Erotismo oral nas suas disposições sexuais.
exprimindo grande tensão
Boca de palhaço Em pessoa psiquicamente imatura. Procura simpatia forçada.

Boca em arco de cupido Expressões lamuriosas. Em raparigas: sexualidade precoce.

Boca projectada, bicuda Trata-se de personalidades muito primitivas. Age instintivamente.


Agride verbalmente. Pode exibir desejo de auto-afirmação.
Dentes na boca Agressividade oral.

Cachimbo ou palito na boca São símbolos de conduta ou traços sexuais.

Negrito na boca Agressão oral. Problemas reais. Inter-relação social e sexual.

Negrito no lábio inferior Pessoa que responde à expressão.

Língua Dificilmente aparece; só em esquizóides, esquizofrénicos ou em


pessoas com desvios de conduta sexual; pode ser um problema real.
Lábios Acompanham a forma da boca (semelhante à boca).

Dentes A partir dos 7 anos: raramente aparece em pessoas normais. Aparece


em psicopatas, em indivíduos disrítmicos, epilépticos, pessoas imaturas
afectivamente. Situação real ou problema somático. Pode ser uma
forte agressividade.

302
Avaliação em Psicologia Clínica

Orelhas:

Se não forem representadas no desenho, indica passividade como traço de


personalidade do próprio.

Característica: Simbolismo:

Omissão É comum.

Ênfase na orelha Resistência à autoridade.

Orelhas muito grandes Sensibilidade à crítica e desejo de aprovação social. Esquizofrenia.


Reacções paranóides. Conflitos homossexuais.
Orelhas pontiagudas Situação real. Complexo de inferioridade. Sexualidade primitiva.

Queixo:

Característica: Simbolismo:

Queixo Pouco estudado. É um símbolo sexual. Afirmação social, teimosia,


firmeza, decisão (queixo partido).
Prega nasalabial (em adultos e crianças) Desejo de afirmação.

Queixo fugidio Pessoa com dificuldades sexuais, pessoa fugidia.

Queixo redondo Traço de feminidade.

Pescoço:

Constitui uma zona de conflito entre o controlo emocional e os impulsos corporais.


Quando encontrado nos desenhos normais, não há nada a se notar.

Característica: Simbolismo:

Omissão Aponta um caso perigoso. Dificuldade maior de controlo entre os


aspetos intelectuais e os impulsos do corpo. Simbolismo - castração.
Inferioridade. Regressão. Dificuldade de coordenação dos impulsos.
Pescoço curto e grosso Poder físico (como o de atleta). Pode relacionar-se às forças instintivas.
Mecanismo de compensação.
Protuberância redonda na garganta Ilusão simbólica de castração. No histérico, suicídio ligado ao pescoço.
Uma linha horizontal, ou um colar separando o pescoço da cabeça –

303
Avaliação em Psicologia Clínica

dificuldade intelectual de controlar os impulsos vitais, a expressão


própria, conforme as exigências sociais.
Para o homem – É o tórax.
Para a mulher – Da cintura para baixo.
Pescoço fino e comprido Mecanismo de compensação. Pessoa de controlo rígido. Moralismo.
Enfeites no pescoço – separa o corpo (impulsos vitais) da cabeça
(controlo intelectual racional).
Pescoço reto, negrito, uso de borracha, Indica coordenação dos seus impulsos e controlo intelectual, certa
etc. consciência da bifurcação da sua personalidade. Conflitos decorrentes
da força do superego.
Enfeites no pescoço Separação do corpo (impulsos físicos) da cabeça, mantendo-se graças
ao controlo intelectual racional.
Ênfase no desenho do pescoço Perturbação por falta de coordenação de seus impulsos e controlo
intelectual, certa consciência da bifurcação da sua personalidade.
Conflitos decorrentes da força do superego.

Ombros:

Característica: Simbolismo:

Exagerados ou representação apagada Fantasia psicossexual. Temor à debilidade sexual. Mecanismos de


compensação. Autocrítica. Impulso de poder físico.
Geométrico, em linha recta Débeis mentais e imaturidade psíquica.

Ombros estreitos em relação ao corpo Depressão, sentimento de menos-valia, problema somático.

Ombros arredondados Se todos os outros traços comprovarem, poderá ser:


homossexualidade, inter-relação sexual, confusão sexual.
Músculos (masculino) Acentuação do mamilo – compensação – desejo de força. Poderá ser
ambivalência sexual. Projeção do próprio eu – Virilidade reprimida.

Costelas:

Costelas – a sua representação no desenho é rara. Da-se no caso de esquizofrenia e indica


problema grave.

304
Avaliação em Psicologia Clínica

Braços:

Característica: Simbolismo:

Braços e mãos Relacionam-se com o desenvolvimento do eu a sua adaptação social,


ou inter-relação com o ambiente. A extensão, direção e influência das
linhas dos braços relacionam-se com o grau e espontaneidade da
pessoa no ambiente.
Braços desenhados Inter-relação com o ambiente.

Omissão dos braços É frequente no caso de rompimento com o mundo exterior (caso dos
psicóticos).
Pessoas com quebra da palavra. Pessoas eróticas. Oposição ao grupo.
Sentimento de menos-valia. Mecanismo de compensação.
Esquizofrênicos e disrítmicos.
Ocasionalmente, os braços podem ser omitidos na figura feminina,
desenhada por rapazes, rejeitados pelas mães.
Braços rígidos, apertados ao corpo Pessoa esquizoide. Fuga do indivíduo ao meio. Desejo de superar o
problema.
Para trás Falta de confiança. Insegurança da sua participação no meio ambiente,
em conflito por pressões narcísicas.
Afastados da área genital Sentimento de culpa, podendo ser por masturbação..

Braços em movimento com o outro, junto Tentativa de vencer a dificuldade frente ao meio.
ao corpo
Braços em horizontal e de forma Aparecem, geralmente, em desenhos simples e regressivos, refletindo
mecânica em ângulo reto com a linha do contato superficial e não afetivo.
corpo
Um braço para cima e outro para baixo Fantasia.

Os braços para cima (rígidos) Fantasia, no sentido de ambição – Sentimento de culpa.

Braços em negrito Conflito – Aspeto somático – dificuldade de contato com o mundo


interior. Sentimento de menos-valia.
Braços muito longos Ambição por alguma aquisição ou proeza, dependendo de outros
traços.
Braços finos Indicio de introversão. Não reage aos impulsos interiores, debilidade
física ou psíquica.
Braços mais largos que todo o corpo Dificuldades de inter-relação. Fantasia, ambição maior que a
capacidade de realização.
Com articulação Preocupação hipocondríaca.

305
Avaliação em Psicologia Clínica

Amputação Sentimento de castração (qualquer dos braços ).

Mãos:

Característica: Simbolismo:

Mãos (ausência ) Enquadra-se no caso de ausência de braços – Falta de confiança nos


contactos sociais, na produtividade, ou em ambos.
Mãos no bolso Personalidade delinquente. Pessoas dadas ao furto. Sentimento de
menos-valia. Critica do grupo ou autocrítica. Punição. Masturbação ou
valentia, como se acariciasse uma pistola.
Mão maior em relação às outras partes Ambição em todos os sentidos. Sentimento de menos-valia. Problema
do corpo somático.
Contornos imprecisos da mão Indicam a mesma coisa que a ausência de mãos.

Mãos fechadas Pessoa usuária (em todos os sentidos). Difícil nas relações sociais,
repressão, agressividade, fantasia dessa agressividade.
Mão em bolacha Com problemas de agressividade.

Mão diminuída Sentimento de culpa, relacionada com a masturbação. Sentimento de


menos-valia, cerceamento e agressividade deprimida.
Mão em garfo Disritmia, psicóticos, imaturidade, débeis mentais.

Mão grande Em rapazes indica fortaleza, compensação por debilidade. Reacção


contra o uso indevido das mãos.
Mão em perfil Grande índice de inteligência.

Mão aberta Necessidade de afecto e inter-relação.

Mãos atrás Evasão. Observadas entre meninas que desejam atrair e que riem as
unhas.
Mãos cruzadas na zona central Preocupação com prática auto-erótica.

Dedos:

Característica: Simbolismo:

Em alfinete Agressividade.

Quando retocados, apagados Personalidade reprimida, agressividade reprimida, impulsividade.

Dedos em maior número do que o normal Quando não estão relacionados com debilidade mental, pode estar
relacionado com um problema psíquico, com esquizofrenia ou
imaturidade psíquica.

306
Avaliação em Psicologia Clínica

Dedos sem preponderância da mão Indício de agressão infantil. Geralmente, dedos numa só linha, com
grande pressão e combinados com outros traços agressivos.
Dedo polegar maior que os outros dedos, Simbolismo sexual. Práticas desviantes. Problema somático.
retocados ou apagados, a negrito Mecanismo de compensação.
Dedos longos, finos Situação real. Sentimento de manos-valia. Desejo de afirmação.
Mecanismo de compensação. Poderá ser característico de uma pessoa
com um grande equilíbrio.
Dedos delineados, vagos Sentimento de culpa, sentimento de menos-valia.

Dedos grossos e curtos Baixo nível mental. Objectivismo. Cerceamento, agressividade


reprimida. Dificuldade de inter-relação. Situação real.
Articulação dos dedos Mais ou menos relacionado com reacção instintiva, sendo mais
instintiva do que intelectual.

Unhas:

Unhas longas (desenhadas por homens, em figuras de homens): pontiagudas-


ambivalência. Confusão sexual. Sentimento de menos-valia. Situação real.

Anéis nos dedos:

Característica: Simbolismo:

Desenhados por homens (fazer Se o homem é casado e desenha a aliança a negrito, isso indica conflito.
associação)
Anéis vistosos (desenhados por homens) Sinal de ambivalência, confusão sexual. Afirmação económica, social.

Desenhados por mulheres Afirmação no campo social, narcisismo, etc.

Cintura:

Característica: Simbolismo:

Cintura Um elemento que marca a parte do tórax com a cintura genital,


controladora dos impulsos sexuais e corporais.
Traço a marcar a cintura Poderá ser uma preocupação ou controlo dos impulsos do corpo.

Cinto com fivela Estamos perante um controlo narcisista.

307
Avaliação em Psicologia Clínica

Pernas:

Pernas e pés são fontes de conflitos e de dificuldades. A recusa em completar o


desenho, além da cintura, ou usar poucas linhas para completá-lo indica perturbação sexual.

Característica: Simbolismo:

Pernas juntas (paralelas e unidas) Se combinadas com braços baixos, junto ao corpo: introversão,
isolamento, aspecto somático, problema sexual, sentimento de culpa,
dificuldade de carácter social.
Pernas separadas Debilidade, problema somático.

Pernas longas Debilidade mental ou problema de compensação. Pode ser necessidade


de auto-afirmação social, locomoção, ambição, fuga do meio ambiente,
desajuste ao ambiente.
Pernas grossas e longas Desejo de contacto, fuga, sem possibilidade de realizar a ambição
desejada.
Pernas curtas Situação real ou problema somático. A negrito: conflito.

Pernas em sinal de movimento Frente ao desajuste, entre a fantasia e a capacidade de realização.


Fantasia de reacção. Psicopatia.
Pernas arqueadas Situação real, está em desajuste.

Recusa em desenhar a zona de bifurcação Traçando uma linha ao meio, para dar a impressão de calças e os
das pernas (de frente) contornos externos das pernas: imaturidade psicosexual nos rapazes.
Pernas borradas, reforçadas ou com Desenhadas por mulheres: indicam um conflito sexual, pois, na mulher,
mudanças de linhas as pernas têm significado sexual específico, são a melhor parte do
corpo.
Figura feminina hostil, com pernas Narcisismo e imaturidade psicosexual.
torcidas e com aparência masculina,
desenhadas por rapazes que desenharam
um belo varão

Pés:

Indicam a segurança geral do indivíduo no meio ambiente.

Característica: Simbolismo:

Representação Locomoção, inter-relação, função social, aspecto sexual.

Calcanhar muito acentuado Problema sexual.

Dedos nos pés Quando aparecem numa figura vestida indica agressividade, quase de

308
Avaliação em Psicologia Clínica

natureza patológica.

Pés, calcanhar e dedos Agressividade sexual. Símbolo de castração.

Omissão dos pés ou pernas Cerceamento, dificuldade de contacto. Situação real. Sentimento de
menos-valia.
Pés para dentro Ambivalência no comportamento.

Pés, um virado para um lado e o outro Indecisão, ambivalência do comportamento, atitudes pessoais. Várias
para outro tentativas. Censura à figura humana, à figura projectada: dissimulação
do conflito, oposição.

Tronco:

Característica: Simbolismo:

Arredondado Indica agressividade.

Caixa quadrada com ângulos Indica maior agressividade.

Omissão do tronco Normal em pessoas pequenas. Entre adultos, aparece em doentes com
complicações de carácter evolutivo e escleróticas, embora omitam o
tronco na figura masculina e sombreiem-no na figura feminina.
Tronco desenhado por duas linhas Encontrado em indivíduos regressivos, primitivos ou desorganizados.
paralelas, ininterruptas, da cabeça aos
pés, formando uma caixa
Parte inferior do tronco, não fechada Indício de preocupação sexual.

Corpo na figura do próprio sexo do Indica descontentamento com o corpo que possui. Também pode
indivíduo que desenha indicar compensação pela gordura ou debilidade física, ou temor de
engordar. Ainda pode ser associado a resistência em tornar-se adulto.
Tronco bem longo Pode indicar compensação pela sua altura abaixo da normal.

Roupas:

A roupa surge devido à necessidade de protecção, ao pudor e socialização. A


indumentária nasceu da harmonia desses três aspectos e tem o seu carácter social.

Antes de desenhar, o indivíduo pode vacilar quanto à escolha da roupa, sendo que está
deve ser considerada na interpretação geral das tendências observadas.

309
Avaliação em Psicologia Clínica

Característica: Simbolismo:

Transparência nas calças e saias Debilidade mental. Imaturidade psicossexual, exibicionismo,


narcisismo.
Paletó ou camisola, botões numerosos, Dependência feminina, gerando conflito.
sombreados, e furos para os botões
Detalhes do item anterior mais bolsos Maior o conflito, maior a dependência. Volta à etapa anterior.

Botões de punho mas camisas Associa –se com o que está acima escrito. Elemento psicótico.

Botões no paletó e lapela Maior afirmação de dependência, ambivalência sexual.

Lenço no bolso em linha recta Facilidade sexual.

Lenço no bolso em bico Fantasia de virilidade.

Desenhado por homens, com Sentimento de culpa, apego à figura materna.


transparência ou contornos dos seios
Sombreado nos seios Aspecto de cobertura sexual. Problema somático.

Colarinho:

Pode estar relacionado com um aspecto sexual: pode ser um problema real sexual ou
pode estar relacionado com uma compensação (pescoço longo)

Característica: Simbolismo:

Pescoço longo Compensação devido a problemática sexual.

Colarinho muito grande ou muito estreito Compensação devido a sentimento de inferioridade. Dificuldade sexual,
dificuldade somática.
Decote, desenhado por um homem ou Indica dificuldade sexual, desejos inconfessáveis.
acentuado a negrito ou sombreado
desenhado por uma mulher
Desenhado por mulheres Indica mecanismo de compensação (pescoço maior ) ou problema
sexual, ou imaturidade. O excesso de detalhes, desenhado por homens,
indica anormalidade, ambivalência sexual, exibicionismo, etc.
Na mulher é mais normal e aceitável.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Cinto e calças:

Característica: Simbolismo:

Cinto apertado, no homem Estabilidade, força.

Calças, no homem Transparência: aspecto de deficiência mental ou narcisismo,


exibicionismo, conflito sexual.
Calças com braguilha e riscadas com Revela um problema sexual. Pânico sexual, por prática de masturbação.
muitos traços Sinais de insegurança.
Calças quadriculadas, com transparência Simbolismo de cima mais: violentação e temor de castração.
nas pernas, a negrito ou sombreado
Desenho da figura feminina, com trajes Caso de ambivalência.
masculinos, feito por meninos ou meninas
Figura com calções Mecanismo de compensação (praia, etc. ), debilidade física ou sexual.

Elementos acessórios:

Característica: Simbolismo:

Meias e luvas Símbolo com resposta de cobertura sexual. Sentimento de culpa.


Menos –valia, dissimulação, fantasia de realização sexual ou prática
sexual.
Saltos altos marcados, a negrito Indica problema sexual. Problema de masturbação, narcisismo com
ambivalência sexual.
Chapéu Protecção: correlação com a casa. A negrito: dificuldade de
aprendizagem.
Jóias e maquilhagem (jóias desenhadas Problema do próprio sujeito. Situação real. Desejo de afirmação social,
por homens) afirmação sexual e económica.
Pode estar relacionado com mutilação.
Guarda-chuva Aspecto sexual (forma cilíndrica): ambissexual: fechado-masculino;
aberto-feminino.
Cachimbo, rolos ou diplomas, armas na Simbolismo sexual.
mão, bengala
Cigarro ou cachimbo na boca Ênfase erótica-oral.

Pastas, malas muito retocadas Pode ser simbolismo sexual. Receptiva-feminina; côncova-masculina.

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Nus:

Característica: Simbolismo:

Nus Em rapazes: expressão de forte masculinidade.

Nus, mostrando pouca diferença entre Indivíduos sexualmente débeis. Confusão ou não identificação com o
características masculinas e femininas seu papel sexual, repressão da libido.
Desenho sem roupa Corpo feito em serpente. Cabeça de palhaço: problema sexual.

II – Desenho da família

Administração:

Geralmente solicita-se ao sujeito que deseja a sua família e, a seguir, pede-se que
nomeie as figuras desenhadas. Não há mais instruções, a não ser oferecer algum tipo de
encorajamento caso haja indícios de hesitação ou mesmo confusão (“a dizer o que quisessem a
respeito dos seus desenhos”).

Por outro lado, Corman (1967) propôs que, após a representação da família imaginária,
se introduza um questionário, para que o sujeito indique, dentre os diferentes membros, qual
é considerado o melhor, o pior, o mais feliz, o mais infeliz e qual o seu preferido.
Complementarmente, deve dizer quem seria, se fizesse parte dessa família, as razões da
escolha desse personagem de identificação.

Interpretação:

Hulse, propôs uma abordagem gestáltica como sendo especialmente útil para explorar
aspectos psicodinâmicos, principalmente para revelar precocemente conflitos da criança, bem
com a percepção que esta tem da sua família, e dos seus sentimentos e atitudes em relação
aos diferentes membros desta. Destacava a importância de se considerar o tamanho de cada
pessoa representada, o tamanho relativo de alguns membros relativamente a outros, a
distância das figuras entre si e a sua posição no papel.

Só secundariamente é que Hulse se deteve na interpretação da distribuição sequencial


das figuras, das omissões, dos “exageros caricaturescos”, do sombreado e em outros aspectos
enfatizados por outros autores.

312
Avaliação em Psicologia Clínica

Campos (1977) lembra que há omissão do próprio sujeito na representação da família,


quando ele não se sente nela incluído, dela não participa, não recebe afecto ou se há
problemas de rejeição. Por outro lado, tanto a distribuição sequencial como a ênfase dada a
algum membro da família podem relacionar-se com a valência afectiva que ele tem para o
sujeito, seja num sentido positivo como negativo.

Se o próprio sujeito se coloca em primeiro lugar, a hipótese é de egocentrismo e, se se


coloca em último, de cerceamento.

A representação de algum membro da família em negrito pode identificar um conflito


com essa pessoa. Uma figura riscada pode indicar simbolicamente o desejo de afastá-la da
família ou subentender um desejo da sua morte. Igualmente, se um membro da família é
circunscrito num círculo, pode ter essa mesma significação ou pode denotar uma ênfase
especial por razões afectivas ou circunstanciais (doença, por exemplo). A inclusão, na
representação familiar, de pessoas falecidas, pode sugerir fixação. E se a família é desenhada
em grupos que se distanciam uns dos outros, há uma hipótese de divisão na constelação
familiar.

Hammer (1991) refere o tamanho como talvez sendo a variável mais importante.
Assim, uma grande figura materna sugere uma mãe dominante, enquanto um pai pequeno,
apenas maior que o próprio sujeito, indica que este percebe aquele como sendo somente um
pouco mais importante do que ele (o próprio). Por outro lado, chama a atenção para a
existência ou de uma relação ou não entre tamanho idade, e levanta, assim hipóteses:

 tamanhos diversos para representar gémeos podem revelar sentimentos diferenciados


para com esses membros da família.
 A criança que desenha um irmão menor (até um bebé) de igual tamanho ao seu, está a
pressupor que ele representa uma figura competitiva, ameaçadora da sua posição na
família.
 Se um adulto desenha-se a si mesmo no colo materno, está a manifestar tendências
regressivas.

Outra relação que este autor estabelece é entre a proximidade ou afastamento das
figuras e distância emocional entre as pessoas desenhadas. Membros da família distantes uns
dos outros configuram um grupo familiar desunido, como se as pessoas fossem desenhadas
individualmente e não como família, e sem evidência de “troca emocional”. Ao contrário, uma
criança que se coloca ao lado de um dos pais, demonstra as suas próprias preferências ou

313
Avaliação em Psicologia Clínica

efeitos de conflito edipiano. Por outro lado, o distanciamento afectivo pode ter uma
representação simbólica pela interposição de elementos extra entre membros da família, que
denunciam uma interferência no canal de comunicação ou no intercâmbio afectivo. (Exemplo:
desenhar uma árvore entre a figura materna e a paterna pode sugerir dificuldades no
relacionamento do casal ou o desejo de separá-los). Para clarear a significação afectiva das
relações mútuas, é importante observar a expressão facial que o sujeito empresta a cada
figura (pode apresentar um ar afectuoso, bondoso ou, pelo contrário, agressivo e proibitivo).

O sujeito que se sente rejeitado, não atendido, carente, desenhar-se-á (caso se inclua
na representação familiar) de um modo diferente daquele que se percebe como filho
preferido. A inclusão ou a omissão do próprio, associa-se com a presença ou não de um
sentimento de pertinência. A omissão de irmãos pode denunciar sentimentos de rivalidade,
que tenta, simbolicamente, excluir da família, figuras competitivas.

Se os membros da família são representados por figuras muito diferentes daquelas do


grupo sociocultural do sujeito, como, por exemplo, marcianos, isso pode significar que
somente num plano muito distante do nível da realidade ele pode conceber um maior
contacto de integração com eles, o que também sugere que este procura um refúgio na
fantasia.

Corman (1967) diferencia três níveis de interpretação do desenho de uma família:


 Nível gráfico: tem em conta a amplitude, a força e o ritmo do traço, a localização na página
e o movimento do traçado.
o A amplitude do traço: se é maior ou mais restrita, associa-se como expansão vital
ou inibição.
o A força do traço: representa a força dos impulsos, com libertação ou inibição dos
instintos. Esses aspectos podem ser considerados em relação ao desenho total ou
podem ser usados para enfatizar um personagem (por exemplo, desenhando-o
bem maior que os restantes personagens).
o Ritmo do traço: subentende-se como o sujeito desenvolver a tarefa de forma mais
espontânea ou, pelo contrário, estereotipadamente, numa repetição simétrica dos
traços, pontos, etc., até atingir o seu grau de minuciosidade que pode chegar a ser
compulsivo.
o Localização: a parte superior representa a expressão da fantasia, a inferior, de
ausência de fantasia, de energia, como zona de depressão. O lado esquerdo
relaciona-se com o passado, e o lado direito com o futuro, enquanto os lugares

314
Avaliação em Psicologia Clínica

que ficam vazios significam zonas proibidas. Assim, o movimento do traço da


esquerda para a direita tem um sentido progressivo enquanto que o contrário tem
um sentido regressivo.
 Nível das estruturas formais: a representação da figura humana é pressuposta como o
esquema corporal do sujeito, sendo possível avaliar a sua maturidade (muito embora haja
influência também de aspectos emocionais, além dos cognitivos) e a presença de
transtornos do esquema corporal. Este nível tem em conta uma diferenciação entre os
tipos de representação das figuras: como as mais espontâneas (onde predominam linhas
curvas) e as mais rígidas (onde predominam linhas rectas). Destaca, assim, um tipo
sensorial (o mais espontâneo e livre) e um tipo racional (o mais rígido), sendo que este
último começa a ser mais frequente nos desenhos de crianças após começarem a escola.
 Nível do conteúdo: são considerados os aspectos projectivos do desenho. No entanto,
antes de ser feita qualquer interpretação projectiva, é necessário que se examina em que
medida é que o desenho obedece ao princípio da realidade (com a representação exacta
da família real) ou se este resulta apenas da fantasia do sujeito que, então, projectará
tendências pessoais diversas em personagens distinta.
Neste nível, é importante salientar quatro pontos que devem ser especialmente
considerados:
o A valorização da personagem principal: a personagem principal é a mais
importante no sentido de que as relações do sujeito com esta são especialmente
significativas, seja porque o “admira, inveja, teme”, seja porque se identifica com
ela. Evidencia-se como a primeira figura a ser desenhada; pela colocação em
primeiro lugar; pelo maior tamanho; por merecer um traço mais cuidado, mais
caprichado ou com mais adornos; pela sua localização ao lado de uma figura
importante (do pai, por exemplo); por ser desenhada numa posição mais central,
de modo a chamar a atenção das outras figuras; por ser aquela mais enfatizada,
por representar o próprio sujeito, que com ela se identifica.
o A desvalorização de uma personagem: a desvalorização implica intenção de
negação, que é indicada, frequentemente, pela omissão total de uma figura ou de
detalhes da mesma. Mas pode também ser sugerida pelo tamanho menor em
comparação com as restantes figuras; pela colocação sequencial em último lugar;
pela sua localização ser distanciada da localização das restantes figuras
(horizontalmente ou num plano inferior); pela sua representação ser menos
trabalhada, cuidada ou detalhada; por ser depreciada de alguma maneira, como

315
Avaliação em Psicologia Clínica

pela omissão do nome; ou, ainda, por ser uma figura com que raramente o sujeito
se identifica.
o A distância entre as figuras: a distância entre as figuras associa-se a dificuldades
no relacionamento e tanto pode ser indicada pelo afastamento entre as
representações das personagens como por outros indícios como por um traço de
separação.
o A presença de representações simbólicas: a inclusão de animais (domésticos ou
selvagens) no desenho do sujeito, serve para a expressão mais livre de diferentes
tendências pessoais que podem, assim, ser mascaradas. Desta forma, desenhar
irmãos como sendo figuras de animais seria uma forma de desvalorizá-los como
pessoas. Mas, como se trata de representações simbólicas, deve-se tentar analisar
a sua possível significação.
Finalmente, observa-se que, no nível de conteúdo, o autor dá uma ênfase significativa à
interpretação dos conflitos infantis, principalmente aos que considera mais notórios, “os
conflitos de rivalidade fraterna e os conflitos edipianos” .

Groth-Marnat (1999) valoriza especialmente a primeira colocação, que identifica a


pessoa com a qual estão associados os sentimentos mais fortes do sujeito, sejam eles positivos
ou negativos. A omissão do sujeito é explicada pela ausência de poder ou de influência
familiar. Variações no traço, borraduras ou o uso de cor podem indicar sentimentos específicos
em relação a membros da família.

Já no desenho cinético da família, a dinâmica das relações familiares é especialmente


focalizada, sendo importante identificar a presença ou a natureza das interacções. As
actividades representadas, às vezes, são estereotipadas, reflectindo papéis do cotidiano da
família, mas, mesmo assim, o facto da criança seleccionar uma acção específica pode ter
significação.

Burns e Kaufman (1978) lembram que a acção de cozinhar, por exemplo, aparece
frequentemente, porém, simboliza uma figura materna protectora, enquanto a actividade de
limpar associa “com mães compulsivas que se preocupam mais com a casa do que com a gente
que a habita”. Já o pai que é representado no carro a conduzir ou é representado no trabalho,
pode significar que não está tão integrado na família como aquele que é representado a ler o
jornal, a pagar as contas ou a brincar com os filhos.

316
Avaliação em Psicologia Clínica

Conforme Groth-Marnat (1999) comenta, se um membro da família é representado


“numa posição precária” ou no verso do papel, pode-se pressupor a existência de tensão ou,
mesmo, de algum conflito não resolvido do sujeito com essa pessoa. No caso do sujeito não
bem desenhada, há “insegurança quanto aos seus sentimentos de pertença na família”, que,
quando são exacerbados, traduzem-se pela omissão do sujeito no desenho.

Qualquer ênfase numa figura identifica uma característica marcante ou um


envolvimento específico. Figuras em plano mais elevado associam-se com sentimentos de
dominação e poder, enquanto braços estendidos podem sugerir “uma tentativa de controlo do
ambiente”.

Determinadas dificuldades no relacionamento podem transparecer no estilo do


desenho, como pela compartimentalização, que denuncia isolamento, que pode ser inclusive
da criança e dos seus sentimentos. Pessoas podem ser representadas encapsuladas ou
enquadradas de forma simbólica.

Podem, também, ser colocadas barreiras entre as figuras, denotando um bloqueio da


energia emocional. Como se trata de representações simbólicas, devem ser examinadas cm
cuidado.

Certas actividades agressivas entre irmãos, que também podem desenvolver o


arremesso de uma bola ou de uma faca, podem indicar rivalidade fraterna.

“Luz” e “Fogo” podem ser consideradas representações correctas de sentimentos


positivos de interacção, relacionados com afeição e amor, embora “fogo” possa subentender
raiva por falta de gratificação das necessidades correspondentes.

“Nuvens pesadas” podem ter relação com preocupações e depressão.

Por outro lado, se há sentimentos de instabilidade, o sujeito pode “tentar criar alguma
estabilidade sublinhando todo o desenho ou os indivíduos com os quais as suas relações
parecem instáveis”.

317
Avaliação em Psicologia Clínica

Normas para a Interpretação do desenho da família:

Característica: Simbolismo:

Análise de cada figura A primeira pessoa desenhada é aquela à qual o sujeito da maior
relevância, seja por motivos positivos ou negativos. Verificar traços,
negritos, transparências, riscados, localização, proporção, etc., da
pessoa desenhada são dados importantes. Também é relevante
identificar a segunda, a terceira, etc. Pessoa desenhada. De acordo com
a colocação das figuras, descobre-se a valência dessas pessoas para o
sujeito que as desenhou.
Omissão do próprio Não sente que participa, de facto, na família. Não recebe o afecto de
que precisa. Rejeita ou sente-se rejeitado (ou desejo de se afastar). O
desejo de se afastar pode estar relacionado com a pessoa que o sujeito
desenha em último lugar. Pode ser um mecanismo de compensação. O
sujeito procura atrair a figura e, não conseguindo, desenha-a no final.

Normas para a Interpretação dos traços do desenho da família:


Característica: Simbolismo:

Figura a negrito Conflito com os familiares.

Figura riscada Problema em relação a essa figura.

Família num quadrado Desejo de se libertar da família. Sente que não se ajusta à família.

Começa por desenhar o pai e depois Pode ser uma figura fálica. Predominância da mãe ou do pai.
inverte e decide desenhar a mãe, ou você-
versa
Figura desenhada a tapar a outra figura Desejo de ocultar essa figura. Ciúme.

Figura dentro de um conjunto circular Pode ser uma figura que deseja eliminar, inconscientemente, ou uma
(circunscrever uma figura) pessoa que represente grande validade para o sujeito. Problema
somático (alguém na família doente).
Representação do próprio em primeiro Egocentrismo. Mecanismo de compensação.
lugar
Representação do próprio em último lugar Cerceamento.

Representação da família só através das Em pessoas inteligentes, auto-crítica. Problema de restrição corporal.
cabeças Às vezes dá-se o caso do sujeito desenhar uma vizinha ou uma pessoa
estranha. Se a figura é bem aceite, isso é observado através da
localização, do tamanho, etc. Se a figura estiver retocada ou a negrito
indica conflito.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Desenhar pessoas mortas na família Poderá ser uma fixação sob vários aspectos.

Desenhar e riscar Poderá ser o desejo de afastar a pessoa, ou um caso de morte.

Representação simbólica Deve ser interpretada com o sujeito: pode representar uma situação
real.
Família separada em grupos Significa divisão da família. A divisão poderá ser feita em classes,
partindo do maior para o mais pequeno.
Família de mãos dadas, com o pai e a mãe Ideia de como o próprio se vê dentro do grupo. Cerceamento. Se
a puxar desenhado a negrito, o problema é grave.
Ombro direito mais largo Problema somático. Extroversão. Vontade de maior comunicação com
o mundo. Situação real.
Cabeça da mãe maior que as restantes Atribuição de maior autoridade social à figura materna.

Caso ilustrativo:
 Informações básicas: César é um menino de 10 anos de idade, que tem uma irmã gémea e
um irmão de 12 anos. O pai deixou de ser funcionário público quando ficou com um
problema na perna e um problema de visão, por causa de um acidente, passando a
trabalhar como vendedor de pipocas em frente do colégio de César. Este auxilia-o,
diariamente, a empurrar a carroça de pipocas até ao portão da escola, indo buscá-lo ao
final da tarde. A mãe trabalha como balconista de uma grande loja, tendo melhor
remuneração que o marido. Conseguiu para o filho mais velho, que também trabalha
como office-boy de um banco, uma bolsa de estudos num colégio particular. É o filho para
o qual a mãe “passa bem as roupas”, “compra roupas” e com quem conversa. Afirma que
ele “vai ser alguém na vida” (sic). Ellen, a irmã gémea de César, mora com os padrinhos,
pessoas de posses que lhe dão tudo, porque não têm filhos. Visita a família aos fins de
semana, e a mãe quer que ela “estude e faça um bom casamento” (sic).
 Motivos do encaminhamento: César foi encaminhado pelo SOE à psicóloga porque tem-se
isolado dos colegas, não brinca no intervalo e, às vezes, chora. Diz não gostar da sua casa,
porque fica muito sozinho.

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Interpretação: A figura mais importante, talvez por uma questão de identificação, é o pai.
Foi desenhada em primeiro lugar. Nota-se que foi representado com o seu problema físico
(com uma perna mais curta) e com chapéu, indicando que precisa de protecção.
A mãe é a figura maior, possivelmente por ser quem trabalha mais, recebe melhor
ordenado e comanda a organização da casa.
O irmão mais velho, Robson, é representado próximo da mãe e num plano superior aos
dos irmãos, o que condiz com o fato de ser mais valorizado por ela. Mas, mesmo sendo
mais velho, a sua figura é menor que a de César, o que se relaciona, certamente, com a
competição entre ambos e com o desejo deste de que Robson seja inferior a ele.
Ellen, a irmã gémea de César, é desenhada em tamanho maior que ele, inclusive maior que
todas as figuras do sexo masculino, assim como a mãe é a maior da família. Evidencia-se a
valorização das figuras femininas, talvez em função do papel da mãe, que é o mais
produtivo da família.
César sente-se o mais rejeitado, o menor. É o último a ser representado, distante de todos.
Desenha-se depois da irmã, apesar de esta ter a mesma idade. Identifica-se com o pai
(pelo desenho), mas também não se aproxima dos demais. Permanece de braços abertos,
mas não dá nem recebe. O sentimento de rejeição fica evidente, assim como a valorização
dos irmãos ou, mais especificamente, da irmã, embora valorize mais o pai, com quem se
identifica.
As figuras são pobres, com expressão humilde, sem adornos. Falta riqueza expressiva.
Além disso, não há uma percepção integrada da estrutura familiar (as figuras estão
distantes, flutuando), o que denuncia a distância afectiva, que é real na família.

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Avaliação em Psicologia Clínica

III – Desenho da Casa, Árvore e Pessoa

Administração:

O psicólogo entrega ao sujeito três folhas de papel branco, lápis e borracha,


solicitando-lhe que desenhe uma casa, uma árvore e uma pessoa. Contudo, Hammer (1991)
propõe que se entregue uma folha de cada vez, colocando-a com a dimensão maior
horizontalmente na frente do sujeito para o desenho da casa, e verticalmente para o desenho
da árvore e da pessoa. Já Groth-Marnat (1999) sugere que seja fornecida apenas uma folha de
papel para que o sujeito faça nela os três desenho → esta proposta é valiosa para que se possa
analisar as inter-relações dos três desenhos.

Normalmente, a fase gráfica é seguida por uma fase verbal. Nesta, pode utilizar-se
uma abordagem mais aberta, sugerindo ao sujeito que fale da casa, árvore e pessoa que
desenhou, que conte uma história que integre os três elementos.

Topper e Boring (1969) propuseram a utilização de 7 folhas de papel: uma com linhas
incompletas, para o sujeito completar o desenho, e as demais para que este desenhasse uma
casa, uma árvore uma pessoa (completa), uma pessoa do sexo oposto (completa), ele mesmo
(completo) e qualquer outra coisa que queira. A elaboração destes desenhos seguia-se um
questionário de 15 perguntas, numa base de faz-de-conta.

Morris (1979) salienta também a importância das observações durante a testagem.


Devem ser registadas as reacções do sujeito às instruções, que podem envolver indícios de
ansiedade, resistência, desconfiança ou, pelo contrário, cooperação ou de aceitação passiva da
tarefa. Para além disto, deve anotar-se o tempo de reacção e os comportamentos verbais e
não-verbais.

Interpretação:
Simbolismo da casa, árvore e pessoa. É essencial “considerar as áreas mais amplas da
personalidade investigadas por esses três conceitos”.

De um modo geral, pensa-se na casa como o lar e as suas implicações, subentendendo


o clima da vida doméstica e as inter-relações familiares, tanto na época actual como na
infância. Em consequência, há uma tendência para as crianças expressarem as suas relações
com os pais e irmão, enquanto que pessoas casadas vão reflectir, no desenho, aspectos das

321
Avaliação em Psicologia Clínica

suas relações adultas com os demais membros. Contudo, quanto mais comprometido estiver o
sujeito, maior a probabilidade de projecção de relações mais agressivas.

Assim, a casa envolve a percepção da família, seja numa óptica actual, passada ou,
ainda, num futuro idealizado, mas também aspectos do ego que tem tal percepção, que
podem representar um auto-retrato.

A árvore e a pessoa permitem analisar a auto-imagem e o autoconceito ou “diferentes


aspectos do self”. Aspectos projectados na árvore associar-se-iam com conteúdos mais
profundos da personalidade, enquanto, na pessoa, revelariam “a expressão da visão de si
mesmo mais próxima da consciência e da sua relação com o ambiente”.

Não obstante, existe uma hipótese de que a árvore reflecte a relação com o pai, assim
como o desenho da casa envolveria aspectos da relação com a mãe.

Groth-Marnat (1984) refere que “as projecções que fazemos nas outras pessoas
(incluindo os nossos pais) são, na verdade, projecções externas de autopercepções e de
sentimentos” → deste modo, não é absurdo afirmar que as três figuras (casa, árvore e pessoa)
exploram os sentimentos do sujeito sobre si mesmo ou os sentimentos do sujeito em relação a
outras pessoas significativas.

Hammer (1991) afirma que os três desenhos proporcionam, simultaneamente,


informações de diferentes níveis de personalidade:

 O desenho da pessoa revela: “o grau de ajustamento num nível psicossocial”;


 O desenho da árvore investiga: “os sentimentos e auto-atitudes mais duradouras e
profundas” → sendo este o menos susceptível a mudanças em situações de reteste;
 O desenho da casa estaria num ponto intermédio entre o desenho da pessoa e o desenho
da árvore.

Os desenhos cromáticos suplementam os acromáticos pois atingem camadas mais


profundas da personalidade, em razão do impacto emocional da cor, da sua associação a
aspectos infantis (lápis de cor usados na infância) e devido ao facto de que o sujeito, ao chegar
à fase cromática está afectivamente mais vulnerável do que no início da tarefa.

Impressão geral: na análise do desenho, em primeiro lugar, é essencial identificar a


impressão geral que este causa. Pressupondo-se que a casa, a árvore e a pessoa
especificamente desenhadas tenham sido seleccionadas por terem uma significação simbólica
para o sujeito, como temas importantes da sua vida passada ou por se associarem a aspectos

322
Avaliação em Psicologia Clínica

mais profundos da sua personalidade, algo de muito pessoal se comunica pela impressão geral
transmitida pelos conteúdos projectados.

Interpretação de aspectos projectivos e expressivos globais: segundo Groth-Marnat


(1984), a posição e o tamanho são muito importantes, principalmente quando os três
desenhos são feitos na mesma folha, pressupondo-se casa e árvore como representações
parentais e a figura humana como envolvendo mais implicações pessoais. Assim, posição e
tamanho relativos podem indicar não só características específicas de constelação familiar,
mas também podem associar-se com certos aspectos dinâmicos da interacção. A proximidade
da figura humana com a casa ou com a árvore, por exemplo, pode sugerir uma relação mais
estreita ou uma identificação mais definida. A colocação da pessoa entre a casa e a árvore
pode veicular-se à necessidade de união da família ou à necessidade de se sentir mais
protegida. A percepção da relação dos pais pode ser vislumbrada também pelo manejo dos
elementos posição e tamanho. A separação dos desenhos individuais pode corresponder a
distanciamento emocional ou, mesmo, o antagonismo, enquanto que a predominância do
tamanho de um deles pode sugerir uma posição de poder, dominação, ou até, de opressão.
Por outro lado, a ausência real ou não, pode ser indicada por uma figura pequena ou distante.
Porém, se é a figura humana que se destaca pelo tamanho, a questão deve ser analisada com
cuidado pois pode relacionar-se com o egocentrismo, exibicionismo, com uma necessidade de
chamar a atenção ou, ainda, de compensação por sentimentos de inadequação ou de
insegurança.

Assim, posição, tamanho e outros detalhes que esclareçam conexões afectivas


assumem significação mais específica, a partir do embasamento teórico. Neste caso, a
colocação da pessoa entre a casa e a árvore não se ligaria a uma necessidade de união da
família ou de busca de protecção mas, muito pelo contrário, vincular-se-ia a um desejo de se
interpor, de interferir na relação.

Eventualmente, o sujeito desenha casas ou árvores adicionais. Nestes casos, considera-


se a hipótese de haver mais do que uma imagem de uma das figuras parentais ou de ambas.
Isso também poderia ser apresentado pelo desenho de uma única árvore ou de uma única
pessoa, mas “composta por dois (ou mais) estilos diferentes”.

323
Avaliação em Psicologia Clínica

 Normas para a Interpretação do desenho da casa:

A casa desenhada assume, na maioria das vezes, dois significados:

a) Constitui um auto-retrato, expressando as fantasias, o ego, a realidade, os contactos, a


acessibilidade, a ênfase oral, anal ou fálica com os elementos;
b) Expressa a percepção da situação do lar no presente, ou como desejava que fosse no
futuro, ou uma combinação das três formas.
Teto:

O teto pode ser desenhado, pelo indivíduo, com o simbolismo de representar a área da
fantasia da sua vida.

Característica: Simbolismo:

Teto exageradamente grande e o resto da Imersão na fantasia e relativo retraimento do franco contacto
casa diminuída interpessoal; problemas de imaturidade afectiva; ambição maior do
que a capacidade de realização; narcisismo, caso seja combinado com
os traços da figura humana.
Ausência do teto Deforma o mundo ambiente. O sujeito está a cortar o contacto com o
mundo exterior, dado que é mais notado entre os indivíduos a quem
falta a fantasia e entre personalidades coarctadas e de orientação
concreta. Suspeita de esquizofrenia.
Teto ligeiramente afastado ou deslocado Indica dificuldades de aprendizagem.
da parede
Teto muito elaborado Compulsividade. Enfrenta um problema.

Teto um pouco solto Pessoas asmáticas; disritmias.

Teto com acabamento em bico Simbolismo sexual.

Tetos sombreados, com buracos Debilidade. Dificuldade de aprendizagem, ideias de fuga do ambiente.
Problemas somáticos.
Portas e janelas dentro do contorno do Indicam existência de uma fantasia. Comum em pacientes
teto de modo a que a casa seja toda esquizofrénicos ou esquizóides.
construída pelo teto
Teto reforçado por forte pressão do traço Sujeitos que estão a tentar defender-se de ameaças de ruptura do
ou por repetidas linhas sobrepostas controlo da fantasia. Ocorre mais frequentemente nos desenhos de
(quando isto não ocorre nas outras partes pré-psicóticos embora também apareça, mas em menor escala, nos
da casa) portadores de neuroses ansiosas. De qualquer das formas, indica uma
acentuada preocupação e temor de que aqueles impulsos

324
Avaliação em Psicologia Clínica

descarregados na fantasia, se manifestem através de comportamentos


abertos ou distorçam a percepção da realidade.

Telha:

Telhas com muitos traços: inteligência inferior, problemas de gagueira, perturbação da


fala.

Paredes:

A força e a adequação das paredes da casa estão directamente relacionadas com o


grau de força do ego, na personalidade.

Característica: Simbolismo:

Paredes desconjuntadas Sujeitos com desintegração do ego.

Contornos das paredes reforçados Frequentemente apresentado por psicóticos incipientes, que são
hipervigilantes e, muitas vezes, conscientes, para manter a integridade
do ego.
Contornos das paredes com um traço Denota um sentimento de iminente crise da personalidade e fraco
fraco e inadequado controlo do ego sem sequer o emprego de defesas compensatórias. Os
sujeitos que apresentam estes contornos defeituosos das paredes
estão mais conformados com a sua patologia iminente (aceitam o mal
como inevitável e desistem de lutar) do que os sujeitos que reforçam
abertamente o contorno das paredes. Em vez de tentarem livrar-se do
estado patológico, adoptam uma atitude passiva de submissão às
forças desintegradoras que o ameaçam.
Paredes transparentes Entre adultos, revela comprometimento do senso de realidade, sendo
verificadas entre deficientes de nível muito baixo; crianças psicóticas
desenham frequentemente paredes transparentes (permitindo a visão
de objectos do interior da casa), mas com isso indicam imaturidade
conceptual, usando uma ingénua liberalidade na forma de apresentar a
realidade.

325
Avaliação em Psicologia Clínica

Porta:

A porta é o detalhe da casa através do qual é feito o contacto directo com o ambiente.

Característica: Simbolismo:

Porta muito pequena em comparação Reflecte uma relutância em estabelecer contacto com o ambiente, com
com as janelas e à casa no geral retraimento no intercâmbio pessoal. Timidez e receio nas relações com
os outros. A sua instabilidade emocional nas inter-relações com os
outros resulta em sofrimento e o sujeito mostra-se relutante em expor-
se novamente.
Porta bem acima da linha que representa É outra forma dos sujeitos tentarem conservar a sua personalidade. É
o chão da casa, sem que apareçam comum naqueles que procuram estabelecer contacto com os que os
degraus cercam, unicamente segundo as suas conveniências.
Porta excessivamente grande Indivíduos muito dependentes dos outros.

Porta aberta Raramente encontrada. Revela uma necessidade interna de receber


calor emocional do exterior (se o inquérito posterior ao desenho
revelar a cheia). Se o sujeito declara que a casa está vazia, a porta
aberta indica um sentimento de extrema vulnerabilidade, uma falta de
adequação das defesas do ego.
Porta fechada Autodefesa, aspecto de regressão, defesa contra o mundo.

Duas portas Ambivalência: está em casa, mas a pensar noutra coisa.

Porta aberta e um caminho à vista Pessoa equilibrada, ou que procura novos caminhos.

Fechaduras ou dobradiças:

Ênfase em fechaduras ou em dobradiças demonstra uma sensibilidade defensiva, do


tipo encontrado, com frequência, em paranóides. Indica medo hiperdefensivo do perigo
externo. Também pode significar problemas sexuais ou desejo de contacto sexual.

Janelas:

As janelas representam um meio secundário de interacção com o ambiente.

Característica: Simbolismo:

Janelas completamente nuas, sem Indivíduos que se relacionam com os demais de forma
cortinas ou postigos ou caixilhos demasiadamente rude e directa. O uso de tato é mínimo no seu

326
Avaliação em Psicologia Clínica

comportamento.

Reforço no contorno das janelas Se tal reforço não aparece em outras partes do desenho, indica, com
frequência, sujeitos com fixações orais ou traços orais de carácter.
Ocasionalmente, porém, indica tendências anais.
Janelas junto ao teto Problema somático. Cerceamento. O indivíduo não tem por onde fugir.
Dificuldade de contacto sexual (caso seja desenhado por um adulto).
Pode indicar uma situação real.
Janelas no suposto lugar, simples, Equilíbrio.
abertas, sem ênfase
Janelas com grades Indivíduo que se sente cercado. Desejo de protecção. Reacção sobre os
seus próprios impulsos.
Janelas com vidraças Isolamento, desejo de protecção contra os impulsos ou estímulos
exteriores. Pode ser uma barreira (deixa estar para ver como fica).
Cerceamento.
Janelas fechadas com trinco Autodefesa contra os estímulos exteriores. Insegurança. Situação real.

Janelas com persianas Dissimulação (vida através de cortinas). Problema somático.


Exibicionismo. Narcisismo.
Distorção nas proporções das janelas É convencional que as janelas da sala sejam maiores que as da casa-de-
banho. Quando ocorrem desvios desta regra, é sinal de forte pressão
das necessidades emocionais. Uma nítida aversão aos contactos sociais
é indicada pela desvalorização da função da sala de estar no desenho,
quando a janela deste é menor do que as outras.
Janelas de casas-de-banho maiores do que as do resto da casa tendem
a reflectir experiências referentes a severos ensinamentos de hábitos
higiénicos, no passado infantil do sujeito. Também têm sido
encontradas nos que sofrem de sentimentos de culpa, por
masturbação, e sintomas de lavar compulsivamente as mãos.
Janelas da frente, em altura diferente das Reflectem directamente uma dificuldade de organização e forma que
janelas do lado (o que sugere que a altura pode, empiricamente, sugerir esquizofrenia precoce.
do chão não é a mesma)
Pessoa à janela Família bem equilibrada, harmoniosa. Ansiedade.

327
Avaliação em Psicologia Clínica

Cortinas, postigos ou persianas:

Característica: Simbolismo:

Postigos ou cortinas nas janelas, Denotam necessidade de retraimento e extrema relutância à


apresentadas como fechadas interacção com os outros.
Postigos ou venezianas ou cortinas Atitude de interacção controlada com o ambiente.
colocadas nas janelas mas total ou Certo grau de ansiedade demostrada nas relações interpessoais.
parcialmente abertas Assistentes sociais mostram predileção por este sinal de controlo
intercâmbio emocional com os outros.

Chaminé:

É um símbolo fálico que aparece com frequência nos desenhos dos rapazes, passando
a assumir aspectos de carácter sexual, quando apresenta certas características especiais (por
exemplo, se o rapaz desenha a casa com cortinas, flores, etc.).

Característica: Simbolismo:

Chaminé cortada obliquamente, telhado Indica os sentimentos de fraqueza do sujeito relativamente ao seu
mostrando-se através da chaminé pénis. Problrmas de delinquência sexual.
(chaminé transparente)
Chaminé a cair sobre a ponta do telhado Indícios de delinquência sexual.

Chaminé em 2D numa casa representada Revela os sentimentos de delinquência sexual, no sentido de haver
em 3D menor substância na parte fálica do que nas outras da sua imagem
corporal.
Várias chaminés na mesma casa Delinquência sexual. Mascara os sentimentos de inadequação fálica,
sob uma capa de esforço viril compensatório devido às várias chaminés.
Chaminé alongada com um tamanho Chaminé de forma fálica com a extremidade arredondada; chaminé em
exagerado que a fase é dada pela pressão do traço, pelos sombreados ou pela
colocação proeminente, como uma chaminé muito alongada que se
eleva desde o chão, constituindo a face central do desenho inteiro:
traduzem os sentimentos de inadequação fálica de delinquentes
sexuais.
Em indivíduos bem ajustados, a chaminé indica apenas um detalhe
necessário na representação da casa.
Entretanto, se o sujeito sofre de conflitos psicossexuais, a chaminé –
em vitude do seu papel estrutural e a sua saliência em relação ao corpo
da casa – é susceptível de receber a projecção dos sentimentos latentes
do sujeito, acerca do seu próprio pénis.

328
Avaliação em Psicologia Clínica

Fumo na chaminé, aparecendo em forma Indica conflito.


de novelo
Quando o fumo aparece a negrito Problema mais grave.

Fumo acentuadamente dirigido para um Reflecte sentimentos de pressão ambiental e, entre crianças, aparece
lado, como se estivesse sob efeito do frequentemente associado a dificuldades de leitura, em que há uma
vento pressão maciça por parte dos pais, quer como causa, quer como
reacção. Adolescentes que experimentam pressão individa por parte
dos pais (o que dificulta a sua adaptação social), utilizam esta forma de
representar o fumo. Surge também em sujeitos logo após entrarem no
serviço militar.

Perspectiva da casa:

Característica: Simbolismo:

Casa desenhada como se fosse vista de Pessoas que, basicamente, rejeitaram a situação doméstica e os valores
cima esposados. Exibem, compensatoriamente, sentimentos de
superioridade, com uma revolta contra os valores tradicionais,
ensinados no lar. Atitudes iconoclastas acompanham-se de
sentimentos de estar acima das exigências de convenção e
confrontação.
Casa desenhada como se fosse vista de Sujeitos que se sentem rejeitados e inferiores na situação doméstica.
baixo Sentimentos de desvalia misturam-se à auto-estima e, ainda,
sentimentos de inadequação à realidade do lar.
Casa vista de longe, como se estivesse Dois tipos de sujeitos:
distante do observador → Aqueles que projectam um auto-retrato no desenho da casa,
revelando os seus sentimentos de retraimento e inacessibilidade;
→ Aqueles que revelam a sua percepção da situação doméstica, mas
que se sentem incapazes de enfrentá-la. Neste caso, revelam que
consideram as boas relações com os de casa como uma coisa
inatingível.
Casa do tipo “perfil absoluto” “Perfil absoluto” significa que a casa foi desenhada apenas pelo lado
apresentado pelo sujeito. A frente da casa, incluindo a porta, ou outra
entrada, não é vista, o que implica ser menos acessível. Indica sujeitos
retraídos, em oposição, ou inacessíveis aos contactos interpessoais. Os
paranóides evasivos também são propensos a procurar um refúgio
neste tipo de desenho.
Casa desenhada por trás Se não há indicação da porta dos fundos, reflecte as mesmas
tendências ao retraimento e à oposição que a de “perfil absoluto”, mas

329
Avaliação em Psicologia Clínica

com sentido patológico, em maiores proporções. Frequente em pré-


psicóticos, onde a necessidade de se proteger, retraindo-se, é mais
agudamente sentida.

Linha representativa do solo:

A relação entre a casa, a árvore e a pessoa desenhada e a linha do solo, reflecte o grau
de contacto do sujeito com a realidade.

A mesma ligação simbólica entre o solo e a realidade prática evidencia-se, também,


através da linguagem coloquial: “ele tem os pés na terra”.

O contacto firme, ou não, com o solo, é da maior importância para o diagnóstico.


Esquizofrénicos latentes ou fronteiriços têm, invariavelmente, dificudades em apresentar os
seus desenhos em contacto com a realidade (representada pela linha do solo). Apresentam, ou
uma figura apoiando-se fragilmente sobre a linha segmentada, ou irregular, ou sobre uma
linha amorfa, com aspecto de nuvem, ou (no caso da árvore), como se fosse levantada acima
do seu nível pela raiz.

Um desenho que paira, todo ele, acima da linha que representa o solo, indica um
maior grau de patologia esquizofrénica e um maior grau de afastamento da realidade, com
absorção pela fantasia.

Acessórios:

Característica: Simbolismo:

Casa com árvores, vegetais e outros Falta de segurança, daí a necessidade de cercar e de proteger a sua
detalhes casa.
Muito jardim Expressão sexual feminina, desejo e repressão.

Casa desenhada com árvores, folhagem Pode ser simbolismo sexual ou desejo de realização sexual. Situação
real.
Casa com escadas Aspecto típico do gago.

Florzinhas, patinhos Imaturidade afectiva. Pode ainda ser ambição, desejo de conquistar
algo.
Caminho bem feito que conduz à porta Controlo e tato no seu contacto com os outros.

Caminho longo e sinuoso Ocorre entre aqueles que, inicialmente, se retraem, mas
eventualmente tornam-se cordiais e estabelecem uma relação
emocional com os outros. Demoram algum tempo e mostram-se

330
Avaliação em Psicologia Clínica

cautelosos a fazer novas amizades mas, quando a relação se


desenvolve, tende a ser profunda.
Caminho excessivamente largo na Revela uma tentativa de encobrir o desejo de se manter afastado,
extremidada virada para o observador e empregando uma cortesia superficial.
conduzindo em linha recta até à porta,
mas diminuindo acentuadamente a
largura, ficando mais estreito que a porta
Gradeamento em torno da casa Comportamento defensivo.

Caminhos bifurcados Podem indicar indecisão, imaturidade afectiva. Situação real (como por
exemplo, a escolha de um emprego traz indecisão).
Casa com porta aberta e caminho à vista Pessoa equilibrada, que procura novos caminhos.

Caminho com pedras Pode indicar vida traumatizante, psíquica ou economicamente.


Situação real. Dificuldade de contacto com o mundo.
Calçada reta em frente da casa, ou Falta de energia para vencer os problemas.
caminho que acabe em montanha
Casa com sombra e água fresca Situação real. Comodismo. Mecanismo de compensação.

Casa com varanda Mecanismo de compensação. Problema em relacionar-se socialmente.

Torres Isolamento, introversão.

Torres cheias de janelas Exitação sexual.

Elevadores Problema sexual. Fantasia de realização sexual.

Desenhar um casebre Desejo de isolamento, de descansar em paz, de romper com o mundo.


Sentimento de perda da situação, que pode ser amorosa, económica ou
social. Situação real. Romantismo: forma imatura de reagir aos
estímulos ambientais.
Casa ou apartamento de 2 andares Cerceamento, depressão.

Igreja Sublimação sexual, sublimação dos impulsos.

Hospital Dissimulação de hipocondria. Situação real.

Escola Mecanismo de compensação. Vaidade. Simbolismo intelectual.

Apartamento Situação real. Desejo de contacto sexual.

331
Avaliação em Psicologia Clínica

 Normas para a Interpretação do desenho da árvore:

No desenho da árvore, tem sido observado que o sujeito selecciona, na sua memória,
de entre um número incontável das árvores que já viu, aquela com a qual tem a maior
identificação empática e, ao desenhar, modifica e cria essa árvore, novamente, segundo a
reacção cinestésica determinada pelos próprios sentimentos íntimos.

Nos desenhos da Árvore, verifica-se que o indivíduo omite os galhos se não se


relaciona com as outras pessoas. Assim, o sujeito projecta-se durante o processo de desenhar
a Árvore, tornando-a um verdadeiro auto-retrato.

Às vezes, a árvore é desenhada sacudida pelo vento, ou partida devido a uma


tempestade: isto é o reflexo dos efeitos da pressão ambiental suportada pelo sujeito.

A expressão inconsciente da própria imagem, através do desenho, ficou muito


evidente num caso narrado por Hammer, em que uma senhora desenhou uma cesta em cima
da árvore, que continha quatro frutos. A mesma tinha quatro filhos e o desenho representava,
claramente, o orgulho íntimo que sentia pelo seu papel maternal.

Interpretação geral do desenho da árvore:

Ao interpretar o desenho de uma árvore, pode-ssee julgá-lo como um todo,


intuitivamente. Mesmo sem se analisar os detalhes, pode-se ter uma impressão geral da
harmonia ou da inquietação, do vazio, da nudez ou da plenitude, ou ter uma impressão da
hostilidade e prevenção. → Este constitui o primeiro estágio da interpretação do desenho da
Árvore, e para que isto seja possível, é necessário que o sujeito que o irá interpretar olhe para
o desenho, num primeiro momento; olhe simplesmente, sem qualquer atitude crítica.

Alguns desenhos possibilitam um estudo adequado do carácter do sujeito que os


desenhou e outros contituem meras contribuições para um diagnóstico da personalidade.

Ao analisar a linha do desenvolvimento da Árvore – da base ao topo – Koch afirma que


à medida que o desenho é executado, partindo das raizes e subindo, o sujeito revela,
paralelamente, como sente o seu desenvolvimento no tempo, isto é, a sua história psiquica ao
longo da sua vida. Este refere que traços de experiências remotas tendem a ser representados
na base do tronco e, os de ocorrência mais recente, no topo. Buck vem afirmar que quanto

332
Avaliação em Psicologia Clínica

mais baixa for a cicatriz, proventura desenhada no tronco da Árvore, mais cedo teve lugar a
experiência traumática.

Exemplo: Hammer encontrou um menino de 12 anos que desenhou uma ferida bem
acentuada, aproximadamente a meio do tronco da árvore. O tratamento psicoterapêutico
consequente revelou que a morte da sua mãe, quando ele tinha 5 anos fora,
inconscientemente, sentida como um abandono e o ferira profundamente.

Aárvore – dos três desenhos – é o que melhor revela a auto-imagem do sujeito, no


contexto de relacionamento com o ambiente em que está inserido.

Buck ainda acrescenta que:

 O tronco representa o sentimento de poder básico e a força interior do sujeito (a força do


ego) – frequentemente, representa a área básica do autoconceito.
 A estrutura dos galhos revela o seu sentimento de capacidade para obter satisfação
através do ambiente (atingindo um nível mais inconsciente da mesma área que é atingida,
no desenho da Pessoa, pela adequação dos braços e das pernas);
 A organização do desenho total reflecte como o sujeito se sente em relação ao seu
equilíbrio intrapessoal.

As partes externas da copa, as extremidades, formam a zona de contacto com o


ambiente, a zona de relacionamento e intercâmbio entre o que é interior e o que é exterior.

Tronco:

O tronco representa o sentimento de poder básico e a força interior do sujeito, ou


seja, a força do ego.

Característica: Simbolismo:

Tronco reto, proporcional Evolução normal da personalidade.

Tronco com linhas tremidas, torto com Desenvolvimento físico e psíquico com traumatismos.
nós
Tronco solto no espaço, sem raiz, sem Falta de apoio. Desorientação. Sem firmeza. Flutuante. Insegurança.
base, longe da linha da terra
Tronco curto Pressão externa. Falta de expressão do eu.

Base do tronco reta, ou na extremidade Criancice. Infantilidade. Limitação do horizonte intelectual.


do papel Imaturidade. Regressão.

333
Avaliação em Psicologia Clínica

Tronco alargado para a direita Timidez perante a autoridade. Desconfiado. Zelo. Por vezes, orgulho e
obstinação.
Tronco alargado para a esquerda Atraso. Inibição. Preso ao passado. Viscosidade. Dependência materna.

Tronco alargado para os dois lados Atraso. Dificuldades de vida e de compreensão.

Tronco de base alargada que vai afinando Imaturidade. Carácter primitivo. Vitalidade. Indiferenciação.
até terminar em bico, ou que não chega a Predomínio da vida instintiva. Sujeito mais prático do que teórico.
acabar em bico
Tronco de cor escura Em adultos, significa imaturidade, labilidade do humor, passividade,
sem energia, quietude.
Tronco em cone Senso prático. Carácter grotesco. Simplório.

Tronco com um engrossamento e Sujeito acanhado. Atraso. Estreiteza. Estagnação de afectos.


estreitamento Espasmodicidade.
Tronco mais longo que a copa Predomínio da vida instintiva, inconsciente. Imaturidade. Debilidade
mental. Infantilidade. Inquietação motora. Vivacidade de fundo
emocional. Normal nas crianças até começarem a frequentar o jardim
de infância. Em idade de escola primária, a copa pode ser do tamanho
do tronco. Entre meninas, o tronco é um pouco mais longo do que
entre os meninos.
Copa mais longa que o tronco Predomínio da esfera intelectual, espiritual. Tendência para o cómico.
Capacidade de abstracção. Idealismo. Arrogância e ardor. Fanatismo
apaixonado. Ambição. Superficial.
Equilíbrio entre o tamanho do tronco e da Pode ser encontrado entre débeis mentais.
copa
Reforço das linhas periféricas do tronco Reflecte a necessidade de manter a personalidade intacta, empregando
defesas compensatórias para encobrir e combater o medo de
desintegração da personalidade. O sujeito tenta proteger-se contra
esta eventualidade com todos os recursos disponíveis.
Retoques no tronco e animais a sair do O sujeito sente que um segmento da personalidade está
mesmo patologicamente sem controlo (dissociado) e tende à destruição
(sentimento de culpa, por exemplo). Pode indicar que o sujeito está
identificado mais com o animal desenhado no tronco do que com a
árvore, expressando as suas ansiedades regressivas através do
isolamento, do calor, e da protecção intrauterina. É frequentemente
encontrado em crianças obsessivas ou fóbicas (com tendência à
dissociação) e, ocasionalmente, em adultos imaturos.
Tronco reto, como um poste Pessoa de controlo muito rígido, com recursos manuais em vez de
intelectuais. Símbolo fálico masculino.

334
Avaliação em Psicologia Clínica

Tronco grosso e curto com copa grande Ambição, em todos os aspectos. Problemas somáticos.

Tronco com curva para a esquerda Apego à mãe.

Tronco com curva para a direita Desejo de expansão. Oposição a alguém, por despeito.

Tronco aberto na parte inferior e superior Pessoas indecisas. Comportamento flutuante.

Nódulos no tronco Situação traumatizante.

Reforço das linhas de contorno Reflecte a necessidade sentida pelo sujeito de manter a personalidade
intacta. Emprega defesas compensatórias para encobrir e combater o
temor da difusão e desintegração da personalidade.
Contorno muito leve, ou com falhas Se isto não acontece nas outras partes: revela, em grau adiantado,
sentimentos de iminente colapso da personalidade, ou perda de
identidade pessoal – estágio no qual não há esperança de que as
defesas compensatórias impeçam a desintegração iminente. Revelam
irritabilidade, explisividade, nervosismo e impaciência.
Contornos irregulares à esquerda Vulnerabilidade. Conflitos e dificuldades. Inibição. Adaptação difícil.

Contornos irregulares à direita Traumas psíquicos. Carácter difícil. Interesses por coisas más.

Contornos ondulados em ambos os lados Vitalidade. Capacidade de adaptação. Sujeito que vence as dificuldades.

Contornos em linhas difusas e Sensibilidade. Empatia. Disposição à identificação. Carácter hesitante.


interrompidas Sentimento obscuro dos limites da sua personalidade.
Saliências no contorno do tronco Traumatismos, doenças graves, acidentes, dificuldades profundamente
sentidas pelo sujeito.

Superfície do Tronco:

É a zona de contacto entre o interior e o exterior. A qualidade do invólucro sugere diferenças


existentes entre a atitude interior e a conduta exterior. Como um véu, tanto pode cobrir,
proteger e inclusive, disfarçar o verdadeiro ser.

Esta pode ser:

Característica: Simbolismo:

Traço pontiagudo, anguloso, quadrado, Indica susceptibilidade, vulnerabilidade, mordaz, grotesco. “Não tem
reto, serrilhado papas na língua”, obstinado, pungente, observador, sensível, violento,
cólera, crítico, remusgão.

335
Avaliação em Psicologia Clínica

Traço curvo, arredondado, arqueado Facilidade e necessidade de fazer amizades; capacidade de adaptação;
simpatia.

Superfície manchada Traumas (sofreu muito), falta de esclarecimento, masturbação


(observada em casos isolados). Muitas vezes a característica podde ser
considerada como elemento decorativo.

Superfície com sombra à esquerda Levemente sonhador; leve tendência à introversão; susceptibilidade e
vulnerabilidade moderadas; inibição; desgosto em expressar-se; se é
gordo: falta de mobilidade, rigidez, falta de agilidade, presunção.
Superfície com sombra à direita Capacidade para fazer amizades, disposto a adaptar-se.

Uma superfície áspera dá lugar a mais atritos que uma lisa, sobre a qual tudo desliza. A
relação é mútua: o áspero é mais fácil de fazer, porém adere melhor que o liso. A irritabilidade
inerente à pessoa grotesca pressupõe uma impressionabilidade aumentada e, por outro lado,
uma capacidade de observação bastante aguçada e crítica, que descobre, rapidamente, os
pontos vulneráveis que dão lugar às divergências.

Relação entre a largura e a altura da copa da árvore:

A relação entre a largura e a altura da copa, com pequenas oscilações, é em média de


10:7, isto é, a altura da copa é de 0,7, em relação à largura. Portanto, a característica
permanece bastante uniforme.

336
Avaliação em Psicologia Clínica

A árvore normal:

Koch conseguiu obter dados estatísticos básicos para a construção da árvore normal.
Como resultado, organizou o seguinte quadro:

Raiz:

A raiz corresponde à parte inconsciente do Eu, às forças impulsivas, instintivas e não


elaboradas: ao Id da teoria freudiana.

Característica: Simbolismo:

Raiz de traço duplo Domínio dos impulsos. Maturidade. Frequente entre pessoas normais.

Linha de terra, debaixo da qual fica Também indica equilíbrio, maturidade.


subentendida a raiz
Raízes visíveis Indício de desenvolvimento incompleto. Imaturidade, mas não
relacionada directamente com o nível intelectual. Primitividade. Vida
instintiva.
Linha de terra bem escura, a negrito Ansiedade. Desejo de ocultar, disfarçar os conflitos íntimos.

Raiz com um só traço Pessoa primitiva, cujos impulsos não são fiscalizados pelo consciente.
Pouca independência enraizada à família.
Raiz sombreada e com transparência, Dificuldades em enfrentar o meio.
negrito, traços

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Avaliação em Psicologia Clínica

Raiz e linha da terra acima do nível da raiz Pessoas neuróticas ou incapacidade intelectual.

Raiz a sair da base do papel É normal até aos 10 anos. No adulto está ligada à dificuldade de
aprendizagem, ou ao carácter dependente. Insegurança. Sentimento de
inadequação. Prende-se à base do papel como segurança
compensatória. Indivíduos deprimidos também podem escolher a base
inferior do papel para apoiar o seu desenho.
Sem raiz Pessoa auto-suficiente. Não precisa de apoio.

Ênfase no desenho da raiz Pode indicar indevida preocupação com a submissão à realidade. Já
foram encontradas raízes em forma de garra, como se agarrassem o
solo fortemente, em pacientes que, seguidamente, entraram em crises
e foram internados – o desenho reflectia o apego hipervigilante à
realidade e ao medo de perder o contacto com a mesma.
Raiz vista através do solo transparente Falha na capacidade do sujeito de perceber a realidade. Se o sujeito
tem inteligência média, ou acima da média, em adultos ou
adolescentes, esta percepção defeituosa da realidade deve servir para
alertar o clínico sobre a possibilidade de uma esquizofrenia.
Raiz de tamanho desproporcionado Sinal de neurose.

Copa:

Característica: Simbolismo:

Copa esférica (uma circunferência ou uma Aparece mais frequentemente nos desenhos de rapazes. Aparece mais
elipse fechada) aos 7 anos, diminui dos 9 aos 13 e aumenta depois até alcançar a
frequência inicial. A parcentagem dos débeis mentais difere pouco das
dos normais (apenas não oscila nem diminui tanto na puberdade, já
que não sofre tantas alterações de desenvolvimento).
As copas consideradas como esféricas nunca podem estar vazias: ramos
e folhas podem ficar penduradas ou, nos desenhos dos mais novos, as
frutas. Este tipo de copa pode indicar: tendência ao fantástico,
convencionalismo, falta de sentido construtivo, inclinações a aspirações
não diferenciadas, presunção, falta de energia, puerilidade,
ingenuidade, medo da vida real, falta de autenticidade, tipos emotivos,
tipo acomodado, impressionabilidade, falta de concentração (se a
forma é concentrada, tensa).
Copa envolvida por uma membrana Algumas copas não podem ser consideradas como genuinamente
esféricas, nem como verdadeiras copas com ramos. A ramagem está
coberta por uma membrana. Parece que deseja mais encobrir e fechar

338
Avaliação em Psicologia Clínica

do que unificar, já que o interior da copa parece bem mais fraco. Indica
retraimento, opacidade, timidez, não se encotra a si mesmo, e por
vezes falta de sinceridade.
Arcadas na copa Bons modos, amabilidade.

Copa encaracolada Contém um movimento curvado, que oscila livremente, mostrando


fluência e velocidade, resultando em formas de laço, arco e
arredondadas. Indica actividade, mobilidade, fanta de tranquilidade,
fadiga, industriosidade, comunicabilidade, loquacidade, cortesia,
alegria, humor, entusiasmo, vingança, falta de perseverança,
improvisão, ostentação, romantismo, valorização do aspecto externo,
talento descritivo, bom gosto, afetação, pedantismo, confusão,
exagero, malabarismo, vaidade, superficialidade, capricho,
despreocupação.
Copa achatada na parte superior Inibição, forte pressão do ambiente, obediência, resignação,
sentimento de inferioridade.
Copa aumentada para o lado direito Extroversão, auto-suficiência, dedicação, afeição, empreendimento,
mudança constante de objectivos, arrogância, vaidade.
Copa aumentada para o lado esquerdo Introversão, falta de desejo de progredir, ligação ao passado, fixação
materna, tendência ao autismo, timidez, má vontade, teimosia,
quietude.
Copa pequena É normal até aos 9/10 anos. Além dessa idade indica infantilidade,
imaturidade e regressão neurótica.

Copa grande Fantasia, vaidade, narcisismo, entusiasmo, exibição.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Copa justaposta ao tronco sem Falta de desenvolvimento normal do tronco até à copa; há uma
continuidade interrupção – um traço entre a copa e o tronco. As energias não fluem
normalmente do tronco para os ramos. Indica discordância entre a
capacidade de acção, entre querer e fazer; esquematismo, falta de
lógica, visão curta e infantil, inadaptabilidade. É normal em crianças
pequenas: depois dos 7/8 anos pode revelar neurose infantil, ou atraso
mental.
Copa com linhas curvas Doçura, imaginação, compreensão afectiva.

Copa curva em espiral Elasticidade na comunicação e adaptação; mobilidade, demasiada


conversão; bom gosto, delicadeza.
Copa dividida em fragmentos ou pedaços Diferenciação, riqueza interior; os ramos envolvem-se para evitar o
choque: ocultamente dos propósitos, protecção de si mesmo.

Copa em forma de raios ou varas É a forma oposta à anterior: os ramos estendem-se, rígidos, em todas
as direcções. Agressão, atrevimento; exigência, teimosia. Multiplicação
de interesses, agitação. Superficialidade, distracção.

Copa feita com linha em serra, com Nervosismo, irritabilidade. A maior acentuação do ângulo dará o
dentes significado respectivo.

Copa feita por um conjunto mais ou Actividade, agitação, ânsia de viver. Capricho, espontaneidade.
menos discordante de linhas Inconsequência, improvisação, ambivalência, desorientação.

Copa sombreada Impressionabilidade, empatia, indeterminação, irresolução, confusão,

340
Avaliação em Psicologia Clínica

irrealidade. Neutralidade, passividade, suavidade.

Copa aberta Um pouco incompleta, indecisão, indeterminação; eventualmente,


tendência à investigação, à iniciativa.

Copa em ponta Crítica, agressividade.

Copa com ramificações estreitas Sensibilidade, impertinência, susceptibilidade.

Copa com linhas simples Normal na infância e, depois, pelo menos, débil e/ou falta de
maturidade intelectual ou afectiva (neurose).

Copa com estratos ou árvore de É a árvore à qual o jardineiro dá a forma que quiser. Pressupõe um grau
espaldeira muito insignificante de personalidade e originalidade, porque resultou
do amestramento. Indica domesticação, correcção forçada, tendência à
sistematização e à técnica, rigidez de personalidade. Sem
autenticidade, mecanização, disciplina, tradicionalismo, vontade de
auto-educação, superficialidade; aluno modelo e cidadão modelo, sem
originalidade.
Copas cortadas Desenvolvimento detido, impedido; inibição, sentimento de
inferioridade, teimosia, resistência; timidez.

341
Avaliação em Psicologia Clínica

Copa centrípeta Ramos e arcos enfreixam o centro, como cascas de cebola. Indica
autocentralização, narcisismo, auto-suficiência, pouca extroversão.
Concentração, reduzida comunicabilidade e sociabilidade.
Eventualmente: harmonia, plenitude interior, firmeza, decisão.

Copa centrífuga Ramos orientados do centro para fora. Implica um significado duplo:
agressivo e receptivo. Isto vale especialmente para a copa radial, ramos
em raio. Quando o ramo não é duplo, a agressividade não é intensa.
Indica agressão, actividade, iniciativa, extroversão. Às vezes, fadiga e
confusão íntima de forças.

Copa pendurada aos lados do tronco Cansaço, depressão, falta de energia, passividade, indecisão, apatia.

Parte da copa omitida Seja porque os ramos estão cortados, seja porque parece que foi tirado
um pedaço da copa formando espaços vazios. A sensação de falta de
alguma coisa vai indicar sentimento de inferioridade, como também
sentimentos de que está a esconder algo. Os espaços vazios também
podem aparecer em árvores ramosas sob a forma de manchas brancas
no sombreado da copa.
Copa a apresentar um conjunto Calma interior, equilíbrio, repouso, pose, artificialidade.
equilibrado, sem tender para algum dos
lados

Copa com formas contraditórias a) Com ramos em direcções opostas: contradição,


inconsequência, desadaptação, teimosia, desorientação.

342
Avaliação em Psicologia Clínica

b) Com ramos que se cruzam: oposição, crítica, ambivalência, luta


entre afectividade e controlo e os significados do item a).

c) Com ramos interrompidos na sua intersecção: (principalmente


em linhas curvas) – concessão, consideração, delicadeza, faz
favores a outrém. Quando em linhas rectas – corresponde ao
item b).

Copa com galhos que continuam grossos Debilidade, inibição, contradição, violência. Primitividade, rendimento,
até à extremidade quantitativo, imposição.

Copa com galhos muito curvos Reserva, artificialismo, domesticação, inibição de afectos, obsessão
neurótica, detenção, angústia, inadaptação.

Copa em excesso Impressionabilidade, instabilidade, falta de concentração, fantasia,


agitação.

343
Avaliação em Psicologia Clínica

Copa com ramos ascendentes (e às vezes Entusiasmo, actividade, fanatismo, fantasia, imaginação criadora com
como se fossem línguas de fogo) execussão de outrem.
Copa com ramos descendentes Cansaço, frustração, depressão, falta de energia, passividade,
indecisão, inibição, tendência a expandir-se com agressividade.
Copa com ramos descendentes do lado Exteriorização de um maior entusiasmo do que aquele que é vivido
esquerdo e ascendentes do lado direito interiormente; esforço de superação do abatimento, depressão ou
fadiga.

Linhas que separam a copa do tronco Indica dificuldade; quase sempre neurose.

Flores:

Característica: Simbolismo:

Flor bem localizada Situação real.

Árvore cheia de flores Imaturidade. Primavera eterna.

Copa só contornada, sem recheio Vazio da alma, porque o espaço da copa é o campo de expressão do
indivíduo.

Galhos ou ramos:

Representam os recursos subjectivos do sujeito para alcançar satisfação no ambiente,


para apriximar-se dos outros, para se expandir e, deste modo, realizar-se. Representam os
membros da árvore que equivalem, no autoconceito do indivíduo, aos braços no desenho da
pessoa.

Ocasionalmente, o sujeito poderá tentar mascarar com optimismo superficial e


compensatório os seus sentimentos mais profundos de incapacidade para obter satisfação.
Poderá, por exemplo, desenhar a pessoa com longos braços abertos, num esforço viril,

344
Avaliação em Psicologia Clínica

contudo, no desenho da árvore, mostrará através dos ramos cortados e partidos que,
basicamente, ele não sente nenhuma esperança real de sucesso.

Característica: Simbolismo:

Extremidades dos ramos envolvidos por Atenua as suas intenções, não expressando agressividade. Timidez
ramagens semelhantes a chumaços de perante a realidade. Agradável nas relações. Cheio de atenções. Por
algodão vezes, impenetrável. Diplomata, discreto.

Arranjo dos ramos a) Com harmonia: serenidade, gosto, calmo, apoiado, em si,
insensibilidade, ausência de tensões.
b) Desarmonia: excitabilidade, inquietude, impressionabilidade,
extrovertido.
c) Coordenação sem significado: ‘vagabundagem’, irreflexão,
errante, insaciável, ‘laissez-faire’.
d) Formas repetidas sucessivamente: estereotipia, entre crianças:
sem expressão de sentimentos, pobreza na mesma. Esta
estereotipia significa perturbação na evolução do indivíduo e
da não regularidade obtida pela disciplina. Coleccionadores.
Maturidade inigual. Usadas como brincadeira, distracção. Falta
de sentido de realidade. Repressao, atraso. Esquematismo.
Pouca capacidade de adaptação.

Ramos em forma de palmas Tendência ao fechamento. Prudente. Confiante.

Galhos finos e pequenos Avarento.

Galhos frondosos e vivos Humor alegre.

Galhos muito longos, sem direcção certa Tendência para fugir ao que é estabelecido, a sonhar. Indisciplina.
(de forma curva para preencher o espaço Regressão, medo, excitação. Atraso.
vazio)
Galhos que formam ângulos entre si Imaturidade, primitividade, esquematismo.

345
Avaliação em Psicologia Clínica

Tendência para os galhos curvarem-se Desconfiança, cautela.

Galhos com traços simples e não duplos Imaturidade. Aparece muito entre imbecis e pessoas idosas.
Sentimento de impotência e de ausência do Ego. Desenvolvimento
afectivo inferior. Frequente entre as crianças.
Preenchimento do espaço da copa com Imaturidade e regressão. Atraso (parte da personalidade não se
galhos, frutos ao acaso (enchendo o desenvolveu, não é um problema inato).
espaço ao longo do tronco, chegando ao
solo e galhos abaixo e isolados)
Galhos abertos com traços em sentidos Ambivalência afectiva e volitiva.
opostos, galhos opostos, galhos cruzados
(da esquerda para a direita
principalmente)
Galhos muito longos, arqueados e Descuido, falta de controlo, redução da capacidade intelectual.
sinuosos Reserva, tímido de afectos. Neurose compulsiva. Convulsão, medo.
Ramos finos nas pontas Elevada sensibilidade. Impressionabilidade. Elevada reactividade.
Crítica. Agressividade. Reservado. Impenetrável.
Galhos secos, pontudos Agressividade, sadismo.

Galhos a expandirem-se (tipo serpentes) e Decréscimo da eficiência intelectual. Dispersão. Preocupação com o
copa em forma de bandeira esvoaçante, menos importante. Tendência à fantasia. Falta de adaptabilidade. Falta
ou tubo de fumo de discernimento. Incapacidade para agir. Perturba-se com facilidade.

Galhos altos e finos (muito projectados Indivíduos receosos de procurar satisfação no ambiente e que,
para cima e pouquíssimo para os lados) consequentemente, compensam isso na fantasia (elevando-se para o
topo da página) como gratificação substantiva. São desenhos mais
comuns entre indivíduos que se situam na faixa introversão-
esquizóidia.
Galhos que se estendem tanto na lateral, Equilíbrio nos esforços da procura da auto-satisfação.
para o ambiente exterior; real, bem como
para cima, para a área da fantasia
Galhos para o alto, a ponto de fazer o Exemplo extremo de um sujeito que se excede ao fantasiar. Enquanto
topo da árvore ultrapassar o limite os introvertidos e os esquizóides tendem a exagerar na direcção dos
superior da página galhos para o alto, somente os que se aproximam do extremo do
processo esquizóide, estendem os ramos para além dos limites da
página.

346
Avaliação em Psicologia Clínica

Flexibilidade na estrutura dos galhos: Sinal favorável. Denota sentimentos de alta capacidade por parte dos
primeiro mais grossos e mais próximos, sujeitos em obter satisfação no seu ambiente (contando, naturalmente,
depois mais finos e afastados que esta estrutura seja do tamanho adequado em relação ao tronco).
Ramos semelhantes a bastões, ou a Presença de impulsos íntimos de hostilidade e de agressão. Se o quadro
lanças pontiagudas, ou que apresentam comportamental indica que o indivíduo não está a exteriorizar esses
espécies de ganchos como o dos anzóis, impulsos, e pelo contrário, parece calmo, podemos estar seguros de
ao longo de uma superfície que este ajustamento superficial é obtido devido aos esforços de
repressão, com simultâneas tensões interiores de consideráveis
proporções. Nestes casos, será interessante investigar, nos desenhos,
indicações de falta de controlo, para avaliar a possibilidade de
incipiente e catastrófica descarga destes impulsos. Se os sinais de
controlo são demasiadamente enfatizados podem, por si só, ser
considerados como sendo indicadores de iminente extravasão dos
impulsos, em comportamentos abertos, já que o potencial defensivo do
indivíduo pode estar a prestes a esgotar-se.
Galhos de 2D, abertos nas extremidades Sentimento de pouco controlo sobre a expressão dos próprios
impulsos.
Tronco da árvore incompleto e dele O núcleo da personalidade está lesada. Tem sido encontrado em
saindo galhos pequenos crianças, reflectindo o crescimento emocional bloqueado, mas com
ensaios hesitantes e débeis de esforços por retomar o crescimento,
estimulado pela terapia.
Galhos que se viram para dentro (para a Egocentrismo e fortes tendências introversivas, ruminadores.
própria árvore, em vez de se virarem para Encontrado em obsessivos compulsivos.
fora, para o exterior)
Escultura superdesenvolvida dos galhos, Demasiada ênfase dada à busca do prazer; dúvida acerca dos seus
num tronco atrofiado sentimentos essenciais de valor e importância.
Galhos pequenos, copa atrofiada sob um Frustração devido à inabilidade de satisfazer as necessidades básicas.
tronco muito grande
Galhos dirigindo-se para o sol, como um Ocorre em desenhos de crianças com acentuadas e frustadas
apelo necessidades de afecto. A árvore estende os braços ansiosos em busca
do calor de uma figura representativa de autoridade (neste caso,
expressa pelo sol), da qual o indivíduo está carente.
Galhos e copa inclinada sob um sol Criança ou sujeito intimidado pelo domínio de uma figura parental, ou
grande e baixo, pesando sobre a árvore outra que exerça autoridade e o faça sentir-se dolorosamente
controlado, subjugado e perturbado.
Galhos secundários, desenhados como se Os galhos mais pequenos parecem estar enterrados nos galhos
estivessem encravados no corpo dos maiores, que deles provêm – tendência masoquista.

347
Avaliação em Psicologia Clínica

ramos primários – a sua extremidade Hammer narra o caso de uma senhora que reclamava do número de
mais fina é a que está em contacto com o vezes que chamara o bombeiro para arranjar o esgoto da sua cozinha
tronco da árvore ou com o ramo que dele “se eu tiver de chamar mais uma vez... (e o autor esperava que a frase
deriva (em vez de ser a extremidade terminasse com alguma expressão de raiva) vou bater com o rolo na
externa) cabeça do bombeiro...”, “eu vou arrancar os cabelos dele”.
A direcção intrapunitiva da sua descarga agressiva foi coerente com a
orientação masoquista revelada no desenho dos galhos com aspecto de
estarem encravados nos próprios ramos ou tronco.

Folhas:

Característica: Simbolismo:

Folhas na copa ou nos ramos As folhas são o traje da primavera: vivacidade, preocupação com a
aparência, levidade, primitivismo, ostentação, ingenuidade. Dotes
decorativos.
Folhas que caem Afrouxamento, sensibilidade, distracção, esquecimento, alheamento.

Folhas ao longo dos galhos O mesmo que o 1º item mais: tendência à ordem e à sistematização. A
máscara, quando é muito acentuada, cai na estereotipia.

Frutos:

Indicam o desejo da maturação, de compreender os problemas da vida. Entre crianças até aos
9/10 anos é normal o desenho com frutos muito grandes na copa.

Característica: Simbolismo:

Frutos Indica produto, utilidade, rendimento da árvore.


Na infância e na adolescência: gosto pelo resultado imediato, desejo de
triunfar. Sentido de observação e de apresentação. Impaciência,
oportunismo. Em adultos: fixação na infância ou na adolescência.
Oportunista. Improviso. Influenciável. Desejo de mostrar as suas
capacidades. Desejo de ver resultados imediatos. Necessidade de ser
estimado.
Frutos que caem (ver folhas) Sacrifício, renúncia, abdicação, frustração. Sentimento de morte, de
perda.

Outros acessórios:

Característica: Simbolismo:

Ninhos Desejo de protecção; imaturidade; dependência.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Enfeites, adornos Indivíduo com bom humor. Crítica no sentido mais leve. Pessoas
irreverentes. Enfrentam os problemas a brincar.
Paisagem mais evidente do que a própria Desejo de fuga.
árvore
Árvore com cerca à volta Insegurança.

Árvore localizada numa colina Vida mais espiritual.

Árvore com olhos Sentimento de culpa e de perseguição.

Serpente a envolver a árvore Protecção contra tendências sexuais. Indício de perigo e atitude
defensiva perante a regressão da líbido.
Sol Símbolo paterno, masculinidade, sentimento libidinal.

Árvore dentro de um vaso/pote São encontrados entre crianças com distúrbios sexuais. O traço peludo
também pode indicar problemas sexuais, sensualidade.

Impressão do conjunto da árvore:

Característica: Simbolismo:

Árvore encurvada, voltando à terra, tendo Indício de regressão. Preso ao passado. Inversão dos instintos. Pressão
sido atingida pelo vento, desenhada do ambiente. Coacção. Falta de apoio. Vencido pelas vicissitudes.
muito baixa no papel Impelido pelas circunstâncias.
Árvore inclinada para a direita Impulsividade. Encantamento. Dedicação. Influenciável, não resiste à
tentação. Disposto ao sacrifício, boa vontade, desapego ao passado,
renovador.
Árvore inclinada para a esquerda Necessidade de protecção. Cuidadoso. Má vontade. Adaptação.
Sensação de pressão. Ligação ao passado. Teimosia. Comodismo.
Retraído.
Folhas, frutos, galhos, flores caídas ou a Falta de atenção, sacrifício. Sensibilidade, sentimentos finos.
cair Mimosidade. Leve separação entre sentimentos e pensamentos. Falta
de firmeza. Impulso de dar, franqueza. Rapidez, esquecimento.
Árvore erecta na vertical Sentimentos próprios, maturidade. Inteligência. Espiritualidade.
Imaginário. Presunçoso, digno, erguido. Ambivalente. Pose.
Superestimação de si mesmo.
Claro-escuro, escurecimento de todo o Depressão. Regressão. Ansiedade. Humor vacilante. Passividade.
desenho com espaços claros, sombreado Desorientação. Influenciabilidade. Incerteza. Indecisão. Sem energia.
em torno da árvore Por vezes, indício de imaturidade.
Árvore grande Tendência à expansão.

Árvore pequena Desencorajamento. Regressão. Controlo.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Árvore do tipo “buraco de fechadura” A representação do tronco e folhagem, como por uma linha contínua,
sem divisão entre a copa e o tronco. Realmente, apresenta-se um
espaço em branco, fechado e vazio que, como as respostas de espaço
no RCH, é comum nos indivíduos que estão sempre em oposição e que
são negativas.
Árvore “rachada” As linhas laterais que formam o tronco não apresentam quaiquer traços
que as liguem uma à outra; elas estendem-se para cima, cada uma com
os seus galhos, formando uma estrutura independente. Dá a ideia de
que é uma árvore partida em duas árvores unidimensionais, lado a
lado. Isto sugere uma divisão da personalidade, uma dissociação dos
componentes primordiais da personalidade, uma reestrutura de
defesas e o perigo dos impulsos interiores atravessem para o exterior.
Este é um indício indicativo de esquizofrenia.
Desenho de “chorões” Geralmente encontrado entre indivíduos deprimidos.

Árvores frutíferas Muito encontradas entre mulheres grávidas. As crianças (35% em


jardim de infância e 9% até aos 10 anos) até cerca dos 14 anos
identificam-se com a fruta da árvore, que representa a figura materna.
Crianças com sentimentos de rejeição representam a fruta a cair da
árvore, ou já no chão.
Árvore sob a qual paira uma ave de Sentido de condenação.
rapina
Árvore sob a qual um cão urina Indica sentimento de completa autodesvalia, auto-estima baixa
(extremo), sentido de degradação.
Árvore que o homem ameaça destruir O homem é identificado com a figura paterna. Indica um terrível
com golpes de machado sentimento de iminente mutilação física.

Idade atribuída à árvore:

As implicações dos sentimentos de imaturidade que aparecem nos desenhos dos


adultos – que representam uma planta jovem, em vez de representarem uma árvore
amplamente desenvolvida – são claras.

Para se obter um índice mais acurado do nível de desenvolvimento expresso pela


árvore desenhada, quando o sujeito acaba de desenhar, é-lhe perguntada qual a idade da
mesma. A idade indicada está relacionada com o nível de maturidade psicossexual do sujeito.

350
Avaliação em Psicologia Clínica

Isto foi confirmado através dos estudos de Hammer com imaturos sexuais, que estão
fixados ou que regrediram para um nível infantil – nível em que as exigências sexuais se
expressam pelas acções de ver, tocar e manipular, simultaneamente.

Estas práticas constituem toda a actividade sexual da esmagadora maioria dos


pedófilos. – Devido à sua imaturidade, quando as necessidades sexuais do pedófilo reclamam
ser satisfeitas, ele procura essa satisfação em objectos imaturos, aproximadamente da idade a
que ele próprio se sente psicossexualmente adaptado.

Comparando os desenhos de pedófilos com os desenhos de delinquentes sexuais que


seduzem mulheres adultas, Hammer verificou que a idade média atribuída por estes últimos à
sua árvore desenhada foi de 24 anos, enquanto que a idade média atribuída pelos pedófilos foi
de 10 anos, confirmando a hipótese de que a idade atribuida à árvore constitui um índice de
imaturidade sexual.

Árvore apresentada como morta:

Uma das perguntas do inquérito posterior à elaboração do desenho destina-se a


apurar os sentimentos do sujeito acerca da árvore estar ou não viva.

Tem-se verificado que aqueles que respondem negativamente estão


significativamente desajustados. Esta resposta, no entanto, é mais comum entre pessoas
retraídas, esquizofrénicas, deprimidas e com severas neuroses, que renunciaram à esperança
de algum dia conseguirem um ajustamento razoável.

Noutros estudos com delinquentes sexuais, Hammer verificou uma progressão


crescente dos sedutores de adultos aos pedófilos heterossexuais e destes aos pedófilos
homossexuais, relativamente ao número dos que viram as suas árvores como estando mortas,
paralelamente à distância crescente dum objecto sexual apropriado.

Por outro lado, estes dados paralelos tendem a retificar a observação de que as
pessoas mais doentes psicologicamente, vêm as suas árvores como estando mortas e, por
outro lado, tendem a descrever os pedófilos homossexuais, que se desviam da norma, tanto
em relação à idade quanto ao sexo do parceiro escolhido, como o subgrupo mais doente dos
delinquentes sexuais estudados. Uma distância crescente do objecto sexual apropriado
acompanha um aumento da probabilidade de séria psicopatologia.

351
Avaliação em Psicologia Clínica

A ocorrência de árvores mortas é confirmada como sendo um índice de patologia


séria.

No inquérito que se segue à elaboração do desenho, se a árvore é apresentada como


estando morta, interessa-nos descobrir se a morte é percebida como decorrente de causa
externa ou interna. Se é dito que a morte da árvore foi motivada por coisas tais como
parasitas, venenos, raios, etc., o paciente considera que o exterior é o responsável pelas suas
dificuldades e, usualmente, sofre de agudos sentimentos traumáticos. Se, por outro lado, diz
que a morte da árvore foi motivada por coisas tais como apodrecimento da raiz, do tronco ou
dos galhos, o indivíduo encara-se a si mesmo como doentio e inaceitável, ou seja, como
causador dos seus problemas.

Em geral, Hammer encontrou patologia e culpa muito mais intensas naqueles que
percebem a árvore como tendo apodrecido por si mesma do que naqueles que perceberam a
árvore como morta devido a motivos externos – o prognóstico é melhor quando o dano é
atribuído a agentes externos.

Se a árvore é percepcionada como estando morta, pergunta-se ao sujeito há quanto


tempo é que ele acha que ela pode ter morrido. Tem-se observado que o tempo dito como
decorrido desde a morte da árvore pode servir como indicativo da relativa duração dos
sentimentos do sujeito, de desajuste, inabilidade ou forte sentimento de futilidade e de perda
de esperança, conforme seja o caso.

 Interpretação do desenho da pessoa:

Conforme Hammer (1991), o desenho da pessoa pode conter elementos do auto-


retrato ou de um self ideal, embora possa resultar “da percepção de outras pessoas
significativas (pais, irmãos, etc.)”. Deste modo, frequentemente, há representação das
características pessoais, físicas ou psicológicas, como são na realidade (inclusive, muitas vezes,
com registo de defeitos físicos), como são percebidas, sentidas, imaginadas ou projectadas nos
demais. Por isso, é extremamente importante verificar o tipo de pessoas desenhadas,
definindo-a melhor pelo confronto com os comentários do sujeito ou com as suas respostas ao
questionário (caso haja).

A seguir, é preciso considerar outros itens do desenho como a cabeça, que se associa
com aspectos intelectuais e “frequentemente reflecte a necessidade de controlo racional dos

352
Avaliação em Psicologia Clínica

impulsos e/ou da fantasia”, os detalhes associados com a comunicação e interacção com o


ambiente (principalmente os traços faciais, os braços e as mãos) e com a atitude do sujeito
frente aos seus impulsos (tronco).

Finalmente, é conveniente lembrar que qualquer ênfase ou elaboração específica de


alguma parte do corpo pode ter uma conotação real ou simbólica de um problema ou de um
conflito, merecendo, certamente, uma especial análise.

Sob outros pontos de vista, o desenho da pessoa, no HTP (House, Tree, Person), pode
ainda ser examinado conforme as considerações sobre o desenho da figura humana. (Ver
“Normas de Interpretação de Aspectos Gerais do Desenho da Figura Humana” e “Normas
para a Interpretação específica de cada parte da Figura Humana Desenhada”)

Indicadores de Diagnóstico:
 Traços psicóticos:
Em pacientes com funcionamento de nível psicótico, são frequentes as produções
bizarras, com distorções importantes, que resultam no aparecimento de figuras ilógicas e
irrealísticas.

Pacientes esquizofrénicos (com excepção de alguns casos paranóides bem integrados)


são os que apresentam este tipo de desenho mais comprometido.

No desenho da casa observam-se:

a) Ausência de partes essenciais (portas, janelas), sugerindo inacessibilidade ou mau contacto


com o ambiente;
b) Representação ilógica, pela presença de transparências;
c) Representação sincrética, em que o telhado substitui a casa total, reflectindo a
exacerbação da fantasia;
d) Problemas de perspectiva, com a representação simultânea de três lados da casa, ou com
a parede extrema desproporcionalmente maior que a parede principal, mesmo em casos
com um bom nível intelectual;
e) Paredes com a extremidade fendida, denunciando quebra dos laços com a realidade.

353
Avaliação em Psicologia Clínica

No desenho da árvore, notam-se:

a) Tronco fendido, compatível com desorganização da personalidade;


b) Copa com tamanho mínimo, revelando mau contacto ou tendências de se afastar do
ambiente.

No desenho da pessoa, são as seguintes as características:

a) Ausência de partes essenciais (olhos, mãos, braços, tórax, cabeça, etc.) sugerindo a falta de
percepção do corpo como totalidade ou “incapacidade para lidar com os problemas da
vida”;
b) Representação ilógica, com transparências, observando-se órgãos internos, através do
vestuário;
c) Ambivalência no perfil, com corpo e cabeça em direcções opostas;
d) Omissão da roupa ou ênfase nos órgãos sexuais, como desconsideração de normas sociais
ou, ainda, sugerindo aspectos agressivos;

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Avaliação em Psicologia Clínica

e) Superacentuação dos olhos e das orelhas, denunciando uma hipervigilância paranóide ou


subentendendo componentes alucinatórios;
f) Perfil típico esquizofrénico: sem cabelo, um rosto parecido com uma máscara e um corpo
magro, rígido e desvitalizado.

 Disfunção cerebral:
Em casos com problemas de disfunção cerebral, foram observadas muitas rasuras,
sendo que o desempenho piora a cada nova tentativa de representar o conceito, com queixas
dos pacientes de não se sentirem capazes de realizar a tarefa.
As figuras são simples, concretas. A qualidade da linha é comprometida, e o desenho é
feito com linhas quebradas, esboçadas, irregulares. As dificuldades de simetria sugerem falta
de equilíbrio. Por outro lado, a fadiga leva à pioria do desempenho nos últimos desenhos,
principalmente quando é usada a fase cromática.
Em todos os desenhos há problemas de organização, em especial considerando as
relações das partes com o todo. No desenho da casa essas dificuldades aparecem mais
precocemente.

 Traços depressivos e traços hipomaníacos:


Numa pesquisa de Freitas (1997), com 30 casos de pacientes que sofreram perdas
significativas, foram identificados traços caracterizados como depressivos e hipomaníacos:
Traços depressivos:
a) Casa simples, vazia, pobre, com portas abertas;
b) Árvore desprotegida, ténue, desvitalizada, podendo apresentar nódulos, sombreados,
ramos frágeis e copa pequena;

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Avaliação em Psicologia Clínica

c) Figura humana frágil, mas organizada, sugerindo impotência; ênfase na cabeça e no


tronco; semblante triste; figura simétrica relacionada com o controlo obsessivo.

De um modo geral, os desenhos apresentam um tamanho pequeno, sem sugestão de


movimento, com traço débil, trémulo, cortado, inibido. A localização pode variar mas,
habitualmente, são desenhos soltos “no ar”.

Exemplo das produções de uma mulher de 41 anos, com uma crise depressiva após ter
perdido recentemente um filho de 16 anos com leucemia:

Traços hipomaníacos:
a) Casa desenhada em perspectiva, com tamanho grande; ênfase nas portas e presença
de flores;
b) Árvore com grande dimensão, em expansão, ultrapassando os limites da folha; copa
esférica; ramos para fora e para o alto;
c) Figura humana de tamanho grande, com os braços para fora e para o alto; fisionomia
com expressão de triunfo; impressão de imaturidade, de infantilidade.

De um modo geral, os desenhos são localizados no canto da folha, voltados para o


“alto”. Observam-se movimentos de expansão, mas as linhas são grossas, e o traço é forte,
feito com pressão.

Exemplo das produções de uma mulher de 43 anos que perdeu o marido à 6 meses
devido a um enfisema pulmonar. Após enviuvar, passou a gastar excessivamente, a participar
em jogos de azar, com apostas altas, e a discutir com as pessoas, com agressividade verbal
desproporcional à situação:

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Avaliação em Psicologia Clínica

4.2. O desenho livre

São desenhos não temáticos. Este apoia-se nas concepções dinâmicas da psicologia e
nomeadamente nos conceitos psicanalíticos, em particular na noção de símbolo e na
teorização dos mecanismos de defesa.

Melanie Klein considerava o brincar (no qual incluía o desenho) como um modo de
fazer associação livre, equivalente à produção verbal do adulto e substituta desta na
psicanálise da criança. Em qualquer dos modos de fazer associação livre, Klein constatou que a
tradução de fantasia, desejos e experiências, utilizava a mesma linguagem e o mesmo modo
de expressão que são comuns também no sonho. O que quer dizer que o conteúdo manifesto,
neste caso o desenho, é o resultado final de um trabalho (processo secundário) levado a cabo
por existência da actividade fantasmática inconsciente (processo primário) e simboliza o
conteúdo latente.

F.Dolto alargou o conceito de projecção no desenho tanto ao nível do conteúdo


projectado, como ao nível dos modos de projecção:

o O conteúdo: a criança não exprime apenas certos pensamentos e sentimentos, mas


projecta uma imagem total de si mesma no desenho. Essa imagem é a imagem do
corpo, que tem uma significação dinâmica e que traduz o interesse que temos pelo
corpo e não a representação que dele fazemos.
Ora, o interesse varia segundo a parte do corpo investida: se a criança investe grande
interesse na zona oral, as sensações que provêm desta região tornar-se-ão muito
intensas e fonte de prazer. Diz-se então que o investimento libidinal da zona oral é
prevalente. Mudando os investimentos zonais com o desenvolvimento, cada criança
tem portanto uma imagem dinâmica do seu corpo, resultante dos diversos

357
Avaliação em Psicologia Clínica

investimentos libidinais feitos nas diferentes partes do corpo. Uma vez que é com o
nosso corpo que apreendemos o mundo exterior, a relação da criança com o próprio
corpo exprime também as suas relações libidinais com os objectos do mundo exterior.
A imagem do corpo é, assim, o reflexo de tudo o que o sujeito viveu com as pessoas
das suas relações, não somente naquilo que sentiu, mas também naquilo que
simbolicamente intuiu. É toda a globalidade e não apenas as coisas parciais,
sentimentos fugazes ou estados afectivos temporários, que seriam objecto de
projecção.
o Os modos de projecção: a imagem do corpo pode projectar-se em todas as
representações quaisquer que sejam, - um objecto, um vegetal, um animal – e não
apenas nas representações humanas. Estas, aliás, seriam particularmente apropriadas
para a projecção da imagem do corpo pós-edipiana (“Somente após o Édipo, a imagem
do corpo é projectável na representação humana completa” Dolto). A projecção global
da imagem do corpo verificar-se-ia também nos desenhos não figurativos.

4.2.1. Mecanismos de Defesa utilizados no desenho

O estudo das defesas no desenho, adquire sentido quando este é encarado dentro de
uma teoria kleiniana, na qual a formação de símbolos constitui, ela própria, uma estratégia
defensiva e em que a análise dos processos de simbolização é, simultaneamente, uma análise
das defesas.

M.Klein, ao defrontar-se com severas inibições do brincar e, portanto das fantasias,


verificou que a inibição constituía uma barreira ao desenvolvimento das fantasias, barreira
essa que se erguia como defesa contra a ansiedade que o desenrolar da actividade
fantasmática levantava. Constatou, também, que a interpretação apropriada das ansiedades
relançava o trabalho de fantasia da criança e os processos dinâmicos da sua vida mental..

As defesas são vivenciadas como fantasias inconscientes relativas a aspectos do ego


e/ou do objecto. Esses aspectos são enfatizados, depreciados, controlados, divididos,
escotomizados, etc., com o objectivo de diminuir ansiedade existente nos vínculos objectais e
preservar o equilíbrio psíquico.

Estas fantasias traduzem-se em modos específicos de conduta relativamente aos


objectos internos e externos, acreditando, assim, satisfazer as necessidades e evitar os perigos
fantasiados. Por exemplo, numa fantasia em que domina o medo de que a agressividade possa
desorganizar e destruir definitivamente o objecto, obriga a manter essa agressividade dentro

358
Avaliação em Psicologia Clínica

de certos limites, para o que o sujeito tenderá a perceber só o que é bom no objecto, evitando
assim tomar conhecimento dos seus sentimentos agressivos, e a valorizar exclusivamente o
amor por ele, traduzindo-se, eventualmente, tal facto, na adopção de condutas externas de
reconhecimento, trato delicado, amabilidade generalizada, etc. Esta necessidade interna
obrigará a uma perda da espontaneidade e da liberdade de sentir. Sentir livremente exporia o
sujeito ao “perigo” de sentir raiva.

Este tipo de conduta resultante de tais fantasias, podem ser conceptualizadas como
“formação reactiva”.

O uso de uma defesa responde, pois, a um espectro de fantasia relativas ao vínculo


objectal a que podemos dar a seguinte arrumação:

1. Fantasia sobre o estado do ego: ego forte ou fraco; clivado ou íntegro; grau de
construtividade, de bondade ou maldade.
2. Fantasias complementares sobre o estado do objecto: danificado, fracturado, inteiro,
frágil; do seu grau de maldade ou de bondade.
3. Fantasias referentes ao vínculo possível: atitude de bondade ou persecutória do
objecto para com o ego.
4. Fantasias referentes ao tipo de resposta temida: e relativas ao modo de controlar,
neutralizar, regular e preservar o ego do objecto para evitar o reaparecimento do
vínculo temido.

Evolução dos processos defensivos:

Os processos defensivos têm um desenvolvimento evolutivo:

 Defesas primárias: frente a ansiedade também primárias ou psicóticas, erigidas contra as


actividades sustentadas pela pulsão agressiva.
 Defesas adaptadas ou mais evoluídas: as chamadas defesas neuróticas, dirigidas contra as
manifestações libidinais.

Em termos mais específicos, pode considerar-se a seguinte sequência evolutiva:

 Mecanismos esquizóides: onde se agrupam: a clivagem, a negação, a idealização e o


controlo omnipotente.
 Mecanismos maníacos e obsessivos: correspondentes à entrada na etapa depressiva, onde
incluiríamos: o controle obsessivo, o triunfo sobre o objecto, o desprezo pelo objecto, o
isolamento, a anulação e a formação reactiva.

359
Avaliação em Psicologia Clínica

 Mecanismos neuróticos: os mais classicamente conhecidos, cujas designações são: o


deslocamento, o recalcamento, a regressão e a sublimação.

Classificação mais conveniente:

A) IDENTIFICAÇÃO PROJECTIVA:

A identificação projectiva é o mecanismo pelo qual o ego deposita, por projecção, um


vínculo (um aspecto do ego ligado a um objecto com uma fantasia especial: agressiva,
amorosa, etc) num objecto, o qual passa a ter as mesmas características do vínculo projectado:
objecto agressivo, amoroso, etc.

O objecto para o qual se faz a projecção pode ser um objecto interno, que é, então,
marcado pelas características que o ego, por projecção, lhe atribui (neste caso, falamos de
identificação projectiva no objecto interno). Se a identificação projectiva se faz num objecto
externo, o ego amplia o seu âmbito geográfico, pois uma parte sua passa a fazer parte do
objecto externo na fantasia. Como consequência, tanto pode acontecer que o objecto seja
percebido com as características da parte projectada do ego, como pode o ego identificar-se
com o objecto.

A identificação projectiva, tanto pode ser um mecanismo normal como patológico. Em


condições normais favorece a relação empática de comunicação e entendimento com o
objecto, por duas razões:

 Porque através da identificação projectiva o sujeito pode pôr-se no lugar do outro.


 Porque pode conseguir que o outro se ponha no seu lugar: a maneira de falar, os
gestos, o tom de voz, produzem no outro ressonâncias afectivas de irritação, simpatia,
aproximação ou rejeição derivadas dos aspectos que o objecto deposita nele.

A qualidade normal do funcionamento da identificação projectiva, depende não só de


como funcionaram as identificações projectivas do sujeito nas primeiras relações objectais,
mas também como se fizeram as identificações projectivas dos seus primeiros objectos (os
pais) e que repercussão produziram nele.

Os índices de patologia ou adaptação do mecanismo de identificação projectiva, são


dados pelos factores que a seguir se descrevem, sendo certo que é sempre um critério seguro
de patologia o carácter intensamente agressivo, raivoso ou invejoso da identificação
projectiva.

360
Avaliação em Psicologia Clínica

Factor quantitativo: predomínio das identificações projectivas com características


evacuativas, ou, ao contrário, a sua utilização ao nível mais organizado dos mecanismos
obsessivos, que permitem manter o controlo das partes clivadas e projectadas.

Factor qualitativo: a qualidade da fantasia ou parte do ego projectada, isto é, a


natureza benigna ou maligna da parte projectada do self e da fantasia que se deposita no
objecto.

Finalidade: para se livrar dos aspectos maus do objecto interno; para resguardar os
aspectos bons; para reparar o objecto, etc.

Explicitemos, um pouco, diferenciando a função dominante do mecanismo, as suas


modalidades e as diversas finalidades:

 Função dominante do mecanismo: na medida em que implica pôr para fora aspectos do
ego, corresponde a uma função anal expulsiva ainda quando a finalidade é
incorporativa. (“Embora possa haver formas orais de rejeição, como o cuspir e o expelir,
os impulsos orais são sempre de tipo receptivo, incorporativos. Portanto, tudo o que se
deseja dissociar, projectar e pôr para fora dos limites do ego, corresponde a uma função
anal-expulsiva”).
Quando o depósito de um aspecto próprio num objecto externo se dá num contexto
oral incorporativo, a sua finalidade é incorporar o objecto externo ao próprio ego (na
medida em que apaga a diferença (ego-objecto). A finalidade é incorporativa, mas o
mecanismo (depositar) é anal-expulsivo.
 Modalidades da identificação projectiva: os conteúdos das identificações projectivas
(orais, uretrais, genitais) conferem, às relações objectais, modalidades específicas. Os
conteúdos que são evacuados através de uma função anal-expulsiva, podem
corresponder a diferentes níveis da evolução libidinal: fantasias incorporativas, anal-
sádicas, fálicas, genitais: pode-se projectar um seio que devore ou que morda, que
envenene, etc. A predominância de qualquer uma destas fantasias contidas na
identificação projectiva, condicionará as modalidades (esquizóides, melancólicas,
fóbicas, etc) dos vínculos com os objectos. Por exemplo: através da identificação
projectiva, o ego projecta-se no objecto para comer, chupar, devorar, no nível oral;
queimar com urina no uretral; destruir com excrementos ou gases no anal, etc.
 Finalidade da identificação projectiva: a finalidade para a qual o mecanismo é utilizado
varia na identificação projectiva normal e patológica e de um indivíduo para outro
dentro do mesmo grau de patologia.

361
Avaliação em Psicologia Clínica

Finalidades:
a) Livrar-se de partes do self, indesejáveis, por causar ansiedade ou dor, expulsando,
com isso, a tensão gerada;
b) Livrar-se de partes más e proteger com isso o bom objecto interno da
contaminação das partes más;
c) Depositar o self ou partes do self no objecto, para manter o controlo e conseguir a
união com ele e, assim, evitar o sentimento de separação pela fantasia de se
“meter” dentro do objecto;
d) Manter a salvo uma parte boa por descrença nas próprias capacidades para
preservá-la;
e) Ser uma forma de reparação primária do objecto;
f) Manter-se dentro do objecto para roubá-lo, feri-lo ou destruí-lo;
g) Colocar partes do self nos objectos com o fim de os conhecer, identificar-se com
eles (base da empatia), e comunicar.

As consequências do uso deste mecanismo são várias e de vulto para o funcionamento


mais ou menos integrado do indivíduo. Assim, por exemplo, se o seu uso pode evitar a
consciência da separação, da dependência, da admiração pelo objecto e do concomitante
sentimento de perda, de ansiedade, inveja, etc., pode mergulhar o indivíduo em ansiedades
persecutórias, claustrofobias, pânico, sentimentos de confusão, de fragmentação, intensos
medos de retaliação, etc.

Ao contrário, o uso normal do mecanismo (e entende-se aqui por normal a sua


utilização sem um excessivo fundo de raiva e inveja) suporta a precoce organização do ego,
torna possível a relação com os objectos totais, facilita a empatia (pôr-se no lugar do outro por
colocação nele de algo de si próprio), a comunicação interna e interpessoal.

Ao longo da evolução do indivíduo, as identificações projectivas sofrem uma gradual


modificação na intensidade e na qualidade. No início da etapa esquizo-paranóide, a incipiente
integração do ego permite à identificação projectiva uma acção de distorção em relação ao
objecto tendo como resultado que as qualidades ou partes do ego projectadas, são
vivenciadas como pertencentes ao depositário. A sua principal finalidade é incorporar o
objecto externo: quando um bebé projecta um aspecto seu (a boca, por exemplo) dentro do
seio da mãe, não é somente para se livrar desse aspecto, mas sim para recuperar a união pré-
natal, mediante um duplo processo de união: o seio da mãe dentro do bebé e o bebé, ou uma
parte sua, dentro do seio da mãe.

362
Avaliação em Psicologia Clínica

Se houver uma adequada relação continente da mãe, diminui a ansiedade persecutória


resultante do carácter ávido, ou de um modo agressivo, do projectado, e aumenta a
capacidade integrativa do ego.

Com a entrada na situação depressiva, entram em funcionamento mecanismos de


controlo das projecções que vão permitir a diferenciação entre o mundo externo e o mundo
interno e, assim, fortalecer a distinção entre o ego e o objecto. Na etapa depressiva, a
identificação projectiva tem por fim obter a empatia com o objecto, desenvolvendo,
consequentemente, as funções da comunicação e conhecimento do outro, e a reparação do
objecto que a criança crê danificado pelas fantasias agressivas da etapa procedente. A
identificação projectiva adquire agora um valor fundamental no processo de simbolização.

Ainda do ponto de vista evolutivo, é no estádio de desenvolvimento que Heimann


denomina perverso-polimorfa, período situado entre o oral e o anal expulsivo, que a
identificação projectiva funciona com particular violência. Nesse período, o bebé experimenta
as excitações de todas as zonas do corpo de forma desintegrada e deseja, com vigor, a sua
imediata satisfação. As fantasias desencadeadas pela excitação das diferentes zonas do corpo
criam grande confusão, a qual, somada a um incremento do sadismo, intensifica as qualidades
agressivas das identificações (“a tendência anal-expulsiva, como reacção defensiva, alivia o
ego da confusão ao permitir-lhe evacuar os objectos perseguidores internalizados, os conflitos
e as tensões equiparadas com excrementos”).

As identificações patológicas, pela quantidade de sadismo e pelo conteúdo que


veiculam, correspondem a fixações ou regressões a etapas mais primitivas do desenvolvimento
que tiveram já, elas próprias, características patológicas. Nas identificações projectivas, que
M.Klein descreve como típicas da posição esquizo-paranóide, as partes projectadas não sofrem
alteração de maior e seguem certas linhas demarcantes. Mas quando o excesso de sadismo, de
inveja, ou ainda, as falhas da função continente do objecto externo alteram o processo, a
tensão torna-se esmagadora para o bebé e a identificação projectiva ganha características
maciças e muito violentas, tendo, como consequência, a desintegração do objecto (clivagem) e
do ego.

Normalidade e patologia da identificação projectiva:

 Identificação projectiva psicótica: existe uma forma de identificação projectiva


característica das situações patológicas, onde a intensidade da inveja, da hostilidade e da
angústia domina o quadro: os aspectos do ego dissociados e fragmentados são

363
Avaliação em Psicologia Clínica

projectados no objecto, desintegrando-o também em pequeníssimas parcelas. A


realidade externa, é então percebida de forma violentamente persecutória, gerando um
também violento ódio contra ela assim como contra a realidade interna. O ego
fragmenta-se para tentar ver-se livre de uma percepção angustiante e, ao mesmo tempo,
o aparelho perceptivo é atacado e destruído. Os múltiplos fragmentos a que o objecto
fica reduzido, são chamados “objectos bizarros”, os quais, violentamente expulsos pela
identificação projectiva patológica, povoam o espaço externo de objectos maus e criam
uma realidade que se torna cada vez mais dolorosa e persecutória: frente a ela, o ego
reage com vivências de vazio, de despersonalização, etc.
 Identificação projectiva indutora: é a identificação projectiva própria da psicopatia.
Caracteriza-se por ser violenta, excessiva e ter como característica básica, por parte do
ego: “uma manipulação súbita e brusca, que tende a paralisar e a anular a capacidade de
discriminação do objecto externo”.
Procura também depositar partes más (fantasias correspondentes a qualquer nível
libidinal) no objecto externo, mas, diferentemente da identificação projectiva psicótica, o
ego mantém o controlo do projectado para evitar a reintrojecção e para induzir o objecto
a assumir activamente as características projectadas. A intensidade e o sadismo
correspondem a uma intensificação do “período perverso-polimorfo”.
 Identificação projectiva normal: nesta, o ego mantém o controlo daquilo que foi
depositado no objecto a fim de manter os limites da identidade e distinguir-se do objecto
e não já para evitar a reintrojecção do projectado, como na identificação projectiva
indutora, e muito menos, como na psicótica, para se livrar da realidade interna.

Nos desenhos:

Clivagem e identificação projectiva maciça nos desenhos: os mecanismos de clivagem, tao


inevitavelmente unidos aos mecanismos da identificação projectiva que constituem a sua
base, têm como consequência:

 Desorganização do ego e do objecto;


 Vivencias de esvaziamento;
 Vivencias de despersonalização

O que, no desenho, se manifesta por:

364
Avaliação em Psicologia Clínica

1) Fracasso na organização gestáltica: falta de organização, coerência e movimento


harmónico.

2) Ataque às funções adaptativas: as características anteriores mais alterações lógicas:


- noção de perspectiva (na frente e atrás, na frente e perfil)
- noção do tamanho adequado: relação entre as partes do objecto em si
- noção de volume

3) A folha em branco, representante do mundo externo, é tratada como depositária de


objectos fragmentados, confusos e persecutórios (expressão dos processos
evacuativos).

Nestes desenhos vêem-se objectos sem conexão entre si; objectos sujos ou fragmentados;
objectos isolados; objectos vazios de conteúdo.

365
Avaliação em Psicologia Clínica

4) Não há boa delimitação entre o que é interno e o que é externo. Os limites do desenho
são:
- vagos, de traços com zonas abertas (expressão de indiferenciação):

366
Avaliação em Psicologia Clínica

- excessivamente rápidos e exacerbados, quando predominam mecanismos de


controle obsessivo:

5) As figuras humanas (a casa ou a árvore) aparecem fragmentadas, em ruínas, sem


relação entre as suas partes. O desenho é, no geral: vazio; despersonalizado; sinistro;
persecutório; grotesco; e apresenta graves alterações dos limites; tamanho exagerado;
projecção de traços estranhos.

Neste desenho, as partes interior e superior são feitas separadamente. A solução de


continuidade é encontrada nos riscos verticais que a unem:

367
Avaliação em Psicologia Clínica

Aqui, a figura humana apresenta um aspecto desumanizado com bizarrias:

 Análise do desenho de uma menina de 7 anos: podemos ver, de um ponto de vista formal,
que parece não haver uma intenção de comunicar uma vez que os objectos não têm
relação entre si: são objectos internos sem vínculo entre si e são expulsos com a finalidade
de livrar-se deles. Também não existe organização gestáltica, pois não está integrado por
uma ideia directriz. Formado por diferentes categorias de objectos sem relação visível
entre si. Acontece, por vezes, que a falta de sentido de uma produção gráfica é lacuna
preenchida pela verbalização. Neste caso, e apesar de dar nomes a alguns objectos, a
dificuldade em contar uma história ou de associar ideias a partir dos objectos nomeados,
manifestam dificuldade de simbolização associada ao processo de identificação projectiva
maciça.

368
Avaliação em Psicologia Clínica

B) MECANISMOS ESQUIZÓIDES:

I – A clivagem

É o processo pelo qual o ego e um objecto único, são divididos, fantasmaticamente,


em dois. A divisão do objecto é estabelecida em função das características idealizadas e
persecutórias, e em correspondência com uma concomitante divisão do ego, estruturando-se,
portanto, dois vínculos simultâneos: um vínculo entre um ego cheio de amor e um objecto
idealizadamente bom.

Esta divisão do objecto e do ego corresponde a um mecanismo primário que implica,


contudo, um certo grau de organização da realidade caótica do começo da vida, já que permite
afastar e separar dois tipos de experiência que se sucedem de forma alternada:

 Experiência de união, protecção e satisfação.


 Experiência de abandono, dor e separação.

A clivagem corresponde, de início, a uma simples divisão do objecto e do ego, sendo


que um dos pares dissociados é alternadamente desconhecido, ignorado, isolado pelo ego. As
clivagens primárias dão como resultado os objectos parciais: seio-pénis; ideal-perseguição.

369
Avaliação em Psicologia Clínica

Durante a evolução normal e na medida em que diminui a ansiedade persecutória


(graças a uma mãe continente), a clivagem assume características menos rígidas quanto ao
grau de distância entre o idealizado e o persecutório, aproximando-se paulatinamente de uma
divisão entre o bom e o mau, favorecendo a síntese depressiva e, portanto, a integração de
todas as partes do ego e do objecto.

Patologia: na medida em que a clivagem é a base dos mecanismos defensivos


posteriores, estará sempre presente, com maior ou menor intensidade, em toda a produção
gráfica.

Interessa verificar:

 Qual o grau de patologia, através do grau de distância entre o idealizado e o


persecutório;
 Quais são os aspectos do ego e do objecto que estão mantidos separados.

No desenho, apontam-se, como principais características, os traços formais delimitados,


rígidos e duros.

1) Os personagens humanos são revestidos com caracteres extra-humanos de poder,


geralmente físico, às vezes mental.

370
Avaliação em Psicologia Clínica

 idealmente bom: Deus, fada, super-homem.

Neste desenho, o super-homem vai tirar alguém injustamente preso numa cadeia de
estilo caixa forte, a avaliar pelas grades e portas reforçadas.

 Idealmente mau (persecutório): diabo, bruxa.

O desenho mostrará:

 Um dos aspectos dissociados: o idealmente bom ou o idealmente mau;


 Ambos os aspectos vinculares dissociados numa mesma produção gráfica.

371
Avaliação em Psicologia Clínica

Neste desenho, uma figura agressiva e má com “venenos” dentro das bolsas, contrasta
com a cândida figura da “menina a tratar das flores”:

Ou neste desenho, em que a figura protectora tenta esconder o bom objecto da parte
destrutiva. Aliás, sem sucesso absoluto visto que o objecto é ainda beliscado por um ténue
raio:

 Podem manifestar-se ambos os aspectos dissociados do ego: um aspecto impotente e


paralisado e um aspecto impulsivo-agressivo.
 O vínculo desejado com o objecto idealizado: Batman, Robin dos bosques.

372
Avaliação em Psicologia Clínica

2) Nos personagens humanos estaria enfatizado não só o poder como também a


capacidade defensiva frente a possíveis ataques do mundo exterior: personagens
blindados com formas humanas, não sensíveis e invulneráveis: por exemplo o
desenho da tartaruga ninja (acima mencionado) ou o desenho do homem de lata:

Estas características também se manifestam no desenho das casas como fortalezas e


castelos:

Quando a clivagem faz parte da defesa maníaca, costuma manter o mesmo grau de
rigidez ou de distância, mas os pares de objectos dissociados variam.

A dissociação é estabelecida entre o objecto idealizado (com características de objecto


inteiro, rico em conteúdos não agressivos, unido ao ego idealizado) e o objecto depreciado
(despedaçado, empobrecido, destruído, unido ao ego agressivo).

373
Avaliação em Psicologia Clínica

A idealização ou valorização dos aspectos ou funções do ego e do objecto e a


depreciação de outros, torna-se claro em:

o Tratamento evidente de certas zonas corporais numa mesma figura (maior ênfase
nalgumas em detrimento de outras);
o Objectos que simbolizam, cada um deles, uma característica ou função pessoal (por ex:
o moral e corporal, o agressivo e o bom, mente-corpo, afecto-sexo).

II – A idealização

O mecanismo de idealização está inevitavelmente unido ao mecanismo de clivagem e


defende, inicialmente, de ansiedades persecutórias. A crescente idealização do objecto bom
tem por finalidade afastá-lo do objecto persecutório e torna-lo invulnerável. Tal mecanismo
anda a par da negação omnipotente: as características indesejáveis do objecto são negadas,
enquanto é, simultaneamente, recoberto de bondade, amor, invulnerabilidade, poderes
mágicos, poder omnipotente de protecção, etc.

A intensidade da idealização está directamente relacionada com a intensidade de


perseguição frente ao objecto e é uma defesa que resulta de ansiedades persecutórias (medo
de ser atacado e destruído pelo objecto).

O mecanismo de idealização também faz parte das defesas maníacas na situação


depressiva (mitigando em tal caso a ansiedade depressiva).

Idealização nos desenhos;

A idealização como mecanismo esquizóide manifesta-se nos desenhos das figuras


humanas pela ênfase do poder mágico defensivo, frente a possíveis ataques de morte:

→ as figuras humanas são grandes, com exaltação da capacidade mágico omnipotente:

 Domínio-controle: Deus, Santos


 De protecção dos fracos: Batman, Super-Homem
 De comando: Reis, policiais
 De força física: boxeurs, atletas, artes marciais

Na medida em que a idealização supõe clivagem, o par dissociado pode corresponder


às características persecutórias ou idealizadas do objecto: objectos desprotegidos, com um
objecto idealmente protector. A idealização integra, também, todos os quadros neuróticos: o

374
Avaliação em Psicologia Clínica

que varia é a apreciação dos aspectos que são idealizados e dos que são temidos ou
depreciados, o que costuma ser expresso nas zonas corporais enfatizadas, por exemplo,
cabeça em detrimento do corpo, ou a musculatura em detrimento da capacidade intelectual.

III – Denegação e controle omnipotente

São mecanismos primitivos que respondem à impotência do ego frente aos impulsos
destrutivos e a estes impulsos projectados nos objectos.

A denegação como processo defensivo, tem por finalidade não ver os aspectos do ego
e do objecto que atemorizam, e corresponde à fantasia de que aquilo que não é visto não
existe e, portanto, não implica perigo.

Está ligada ao controle omnipotente, à fantasia de possuir tanto o ego como o objecto
idealizado, e de manipulação do objecto persecutório.

O grau de omnipotência do ego e dos objectos idealizados, é proporcional ao grau de


poder destrutivo do ego agressivo e do objecto mau. Durante a etapa depressiva, a denegação
e o controle omnipotente fazem parte das defesas maníacas frente à perseguição e à dor. A
denegação propôs-se negar, simultaneamente, a destruição do objecto e os sentimentos de
dor, dependência e necessidade do ego. Está ligada à fantasia de controlar o objecto, negando
o medo da separação e da dependência e favorecendo as fantasias de reparação do objecto.

Patologia: estes mecanismos implicam sempre uma privação para o ego, na medida
em que limitam as suas possibilidades de conhecimento.

1) Denegação nos desenhos: figuras humanas pobres, de olhos fechados, sorriso


estereotipado, tipo palhaço, baixo contacto com meio e com características infantis. A
árvore e a casa também são infantis, fechadas, empobrecidas.

375
Avaliação em Psicologia Clínica

2) Controle omnipotente: as fantasias de controle omnipotente frente à perseguição,


estão directamente ligadas aos mecanismos de idealização do objecto protector e do
ego. Quanto ao poder e invulnerabilidade temos estes 2 desenhos que expressam a
necessidade de possuir o ego invulnerável, para o que terá de ser forte, poderoso e
insensível.

Nota importante; como parte das defesas maníacas, e na medida em que estão
orientadas para negar a depressão, a dependência, etc., e para controlar o objecto
persecutório destruído, estas defesas manifestar-se-ão através do movimento, da riqueza do
conteúdo, das formas de controle mágico do objecto, ou através da capacidade omnipotente
de reparação.

376
Avaliação em Psicologia Clínica

O grau de patologia (e, portanto o critério de diferenciação entre processos


esquizóides e maníacos), é medido:

→ pela intensidade com que se manifestam;


→ pelo maior ou menor domínio de fantasias de desprezo e de triunfo;
→ pelo grau de integração ou de adequação do desenho: dimensões relativas, adequação das
características reais.

C) DEFESAS MANÍACAS:

A organização das defesas maníacas inclui mecanismos que já se manifestavam


durante a etapa esquizo-paranóide (clivagem, idealização, negação, controle omnipotente),
mas que adquirem, durante a etapa depressiva, características especiais. No primeiro caso
estavam dirigidas para impedir um ataque aniquilador do ego; agora têm por finalidade
defender o objecto dos ataques ambivalentes do ego e este da ansiedade e culpa depressivas
ligadas à fantasia de destruição do objecto.

Na situação depressiva, o bebé consegue uma nova relação com a realidade e


descobre situações importantes como:

1) A dependência da mãe, que teme haver perdido devido às suas fantasias


agressivas;
2) O valor que ela tem para si;
3) A sua ambivalência, os seus desejos agressivos, vorazes, e o sentimento de
necessidade que dela tem, assim como o desejo de a conservar. Surgem, em
consequência, intensos sentimentos de culpa depressiva, medo de perder a mãe
de que necessita, medo de tê-la destruído e a preocupação e a necessidade de
repará-la.

As defesas maníacas são uma tentativa de evitar o processo de intensa dor e


sofrimento psíquico que estão implicados nesta descoberta. A experiência depressiva está
relacionada com o conhecimento da existência de um mundo interno e da posse de um
objecto valorizado, do qual necessita. Por isso, as defesas maníacas levam a evitar e a negar
este sofrimento fugindo para o mundo exterior e negando, evitando ou invertendo a
dependência do objecto, a ambivalência, a preocupação e a culpa.

377
Avaliação em Psicologia Clínica

Um dos mecanismos defensivos específicos é a omnipotência, acompanhada de


fantasias de controle e de domínio dos objectos. Este mecanismo é necessário para:

→ Negar a dependência do objecto, o medo de ser abandonado e a emergência da


agressividade por este abandono;
→ Satisfazer a fantasia de reparação total do objecto, mediante um ego que tem
poderes mágicos de reconstrução.

O bebé tem necessidade de sentir que domina os objectos internos e externos, não só
para que eles não o abandonem, como também para que não se destruam dentro de si.

Os mecanismos de idealização tendem a negar a fantasia de destruição do objecto,


conferindo-lhe invulnerabilidade, riqueza de conteúdo, beleza. Um objecto assim, não
detestado nem agonizante, evita tanto o medo de perseguição, como o sofrimento psíquico: o
luto.

Os mecanismos de negação tendem a desconhecer a realidade psíquica: o


conhecimento entretanto adquirido sobre a agressividade, o valor do objecto e o medo de
ataca-lo; assim como as partes da realidade externa que correspondem aos seus conflitos:
negação do abandono, das situações que produzem frustração e tristeza, do medo do
afastamento real da mãe, etc.

Os mecanismos de clivagem tendem a evitar a dor que é produzida pela ambivalência


(amar e odiar ao mesmo tempo).

Uma característica especial da defesa maníaca é a identificação do ego com o objecto


idealizado: o ego que se funde e confunde com este objecto parcial, omnipotente, cheio de
vida, de poder, de alimento, incha com a fantasia de ter devorado o objecto idealizado, já que
as características sofredoras, desprotegidas, necessitadas e dependentes, do próprio ego, são
depositadas nos objectos externos. A defesa maníaca implica, então, mecanismos de
identificação projectiva: as características projectadas são as de um “necessitado”, de um
“faminto”, enquanto as características assumidas pelo ego são as de um “peito cheio”,
“nutridor”, que se auto abastece.

Numa relação maníaca de objecto, participa uma tríade de sentimentos que tendem a
anular os ganhos da situação depressiva:

378
Avaliação em Psicologia Clínica

O controlo, o triunfo e o desprezo, ligados à valorização do objecto, ao consequente


sentimento de dependência do objecto, ao temor de perda do objecto e aos sentimentos de
culpa.

 Controlo → ao mesmo tempo que controlar é um modo de negar a dependência da


relação ao objecto, é também uma maneira de obriga-lo a satisfazer necessidades de
dependência, uma vez que um objecto totalmente controlado é, até certo ponto, um
objecto com que se pode contar.
 Triunfo → é a negação de sentimentos depressivos ligados à valorização e à
importância afectiva outorgada ao objecto. Relaciona-se com a omnipotência e tem
dois aspectos importantes:
o Um deles tem a ver com um ataque primário infligido ao objecto e ao triunfo
experimentado ao derrota-lo (sobretudo quando está fortemente conotado
com a inveja);
o O outro, ao sentimento de triunfo que aumenta como parte da defesa
maníaca, porque serve para manter dentro de apertados limites, sentimentos
depressivos que, de outro modo, surgiriam: sentir saudade do objecto,
estranhá-lo.
 Desprezo → em relação ao objecto, é também negar o quanto este é valorizado;
actua como defesa contra as experiências de perdas e culpa. Um objecto desprezível
não merece que alguém sinta culpa em relação a ele e o desprezo por semelhante
objecto fornece a justificação para que se continue a atacá-lo.

Patologia: as defesas maníacas procuram negar a situação depressiva e o trabalho de


luto, mas preparam o caminho para outro colapso, já que implica, em si, um novo ataque
sádico ao objecto que é devorado, desprezado e despojado de poder de que o ego se apropria
para o controlar. O incremento dos sentimentos de desprezo, motivados pela inveja
subjacente, interfere no desenvolvimento normal, na medida em que impede o processo de
luto, a normal depressão e, consequentemente, a elaboração e organização mental.

Defesas maníacas nos desenhos:

Figura humana → O tamanho é enfatizado como expressão de inflação do ego. Diversamente,


os mecanismos da identificação projectiva indutora, a ênfase não está na musculatura, mas no
limite corporal que é aumentado. A localização geralmente é central e para cima o que
corresponderá a sentimentos de euforia.

379
Avaliação em Psicologia Clínica

Neste desenho, feito por uma criança de cinco anos e meio, numa altura em que se
verificava um real abandono por parte da mãe e estava entregue a um pai que pensava
sobretudo na mãe ausente, a criança parece inverter a situação: vira ostensivamente as costas
a um par implorante e, portanto, dependente. Aqui parece haver denegação da situação
depressiva e evitado o reconhecimento de necessidade do objecto:

Há uma grande preocupação em encher o desenho de conteúdos, que tendem a


enriquecer: botões, enfeites, flores: evita-se assim o temor à destruição interna do objecto e
os próprios sentimentos de vazio manifestam-se abertamente através de figuras muito
grandes e vazias (tipo bolas):

Nos desenhos infantis, a necessidade de negar o medo da perda de objecto é expressa


por figuras de criança com bolas, em paisagens cheias de flores, com roupas muito enfeitadas,
etc.

380
Avaliação em Psicologia Clínica

Outro frequente modo de expressar é a figuração de rainhas, reis, princesas,


personagens possuidoras de grandes riquezas, ou ainda palhaços e circos:

MAS, o grau de patologia e, logo, o de normalidade, é medido:

 Pela intensidade com que se manifestam;


 Pelo maior ou menor domínio de fantasias de desprezo e triunfo;
 Pelo grau de integração e de adequação do desenho (dimensões relativas, adequação
das características reais).

D) MECANISMOS DE CONTROLO OBSESSIVO:

Como acontece com os outros processos de defesa, também aqui é necessário, para
um diagnóstico mais acurado, diferenciar entre a sua utilização num quadro evolutivo
(controlo adaptativo) e a sua utilização num quadro psicótico latente exigindo defesas
obsessivas patológicas: controlo omnipotente.

Sob a designação genérica de controlo obsessivo, costumam destacar-se: a anulação; o


isolamento e a formação reactiva.

Na evolução infantil, a vivência do dano causado ao objecto, e a culpa e a dor por o ter
infligido, fenómeno inerente à posição depressiva, trazem como consequência a inibição e
controlo da agressividade.

Tal controlo tem por finalidade preservar o objecto da própria agressividade, e o ego
do sofrimento que implica aceitar a ambivalência.

381
Avaliação em Psicologia Clínica

No começo da situação depressiva, o objecto ainda não pode ser reparado porque a
quantidade de ódio continua intensa; o dano ao objecto não pode ser negado maniacamente,
de forma total, porque o ego já conseguiu integração suficiente e percebeu o dano. Surge,
então, como possibilidade de protecção e de preservação do objecto, a prevenção contra
novos ataques: os mecanismos controlam o vínculo hostil com o objecto previamente
dissociado.

Normalmente surgem os mecanismos anal-retentivos modificando os mecanismos


antecedentes (anal-expulsivo) da identificação projectiva excessiva. Estes, marcam a
possibilidade de reter e conter os impulsos e os sentimentos, permitindo, portanto,
estabelecer a noção dos limites do ego. Permitem ainda a discriminação entre o dentro e o
fora, entre ego e objecto externo, entre o ego e o objecto interno, e mantêm uma conexão
com os aspectos projectados. Favorecem, portanto, a noção de identidade, de ordenação
temporal e espacial e o desenvolvimento do sentido da realidade. Os mecanismos de controlo,
neste sentido (ordem versus caos; diferenciação-noção de limite corporal e psicológico versus
indiferenciação e processos expulsivos), marcam o ponto de passagem da psicose e psicopatias
para a neurose e adaptação.

O controlo obsessivo pode adquirir, contudo, características patológicas


correspondentes ao controlo omnipotente. Tende então a estereotipar-se com características
rígidas e excessivas, com predominância dos mecanismos de isolamento e de anulação. A
ordem transforma-se em meticulosidade exagerada, o ajustamento à realidade adquire
características rígidas, ritualistas. O ego perde possibilidades de sentir e empobrece-se. A
finalidade já não é preservar o objecto e sim evitar a clivagem e a desintegração do ego. Os
mecanismos obsessivos actuam, então, como contenção de situações de desintegração
psicótica, confusão e indiscriminação.

Nos desenhos:

Controlo adaptativo (obsessivo) e controlo omnipotente → o controlo adaptativo permite a


realização de desenhos, nos quais se manifesta um bom ajustamento à realidade, quanto ao
tamanho, localização no espaço, discriminação entre mundo externo e interno, gestalt
mantida, organização coerente das partes no todo, correspondência entre o objecto gráfico e
o objecto real, e a harmonia.

382
Avaliação em Psicologia Clínica

Neste desenho, estas características estão presentes, aparte, talvez, do excessivo vazio
humano:

A passagem para o controlo omnipotente manifesta-se:

1) Desenhos empobrecidos, esvaziados, pelo predomínio de mecanismos de isolamento e


de anulação:

2) Reforço excessivo dos limites, sombreados ou riscos excessivos que trazem como
consequência figuras sujas ou figuras rígidas, imóveis:

383
Avaliação em Psicologia Clínica

Nas figuras humanas, quanto mais nos aproximamos das situações psicóticas, maior o
predomínio de figuras rígidas e vazias, expressão de despersonalização.

O desenho da casa e da árvore pode ser desordenado ou precariamente organizado:


casas-telhado; casas fechadas; mostrar aumento de super-pormenorização: telhas do telhado,
pedras do caminho, folhas nas árvores, etc.:

Este controlo, na medida em que não é adaptativo, fracassa; as figuras adquirem


características incomuns e há desorganização da gestalt.

I – Anulação

A anulação assenta sobre o mecanismo de clivagem e como os outros mecanismos


obsessivos, controla o vínculo agressivo com o objecto. Mobiliza fantasias mágico
omnipotentes muito intensas, cujo conteúdo é que uma fantasia boa ou um acto bom, podem
apagar, anular, outra fantasia ou acto agressivo anterior. Os dois vínculos ou estão presentes
simultaneamente, ou podem apresentar-se sucessivamente, impedindo que qualquer conflito
surja graças à fantasia omnipotente de anulação, à intensidade e à rigidez dos mecanismos de
clivagem e isolamento que lhe andam associados.

A anulação, na medida em que evita a integração do objecto (evitando assim o


confronto com a depressão), reforça a clivagem e ataca a capacidade de síntese. Mecanismo
que corresponde a níveis primitivos do desenvolvimento, que assenta na omnipotência e na
magia do pensamento e da acção. Porque o aspecto perigoso do vínculo com o objecto se
impõe de forma constante, o consumo de energia é também constante e em grande
quantidade, limitando fortemente o seu investimento em experiências que favoreçam a
evolução, trazendo assim um empobrecimento tanto afectivo como intelectual.

384
Avaliação em Psicologia Clínica

Numa personalidade adaptada costuma apresentar-se sob forma de pedido de perdão


ou de desculpas, mas como mecanismo dominante mostra a patologia das situações e
encontra-se nas personalidades pré-psicóticas, neuroses obsessivas graves e psicopatias, numa
palavra em todas as desorganizações graves de personalidade. O que se compreende, porque:

1) É um mecanismo que não só evita a ansiedade ligada à presença simultânea do amor e


do ódio, sendo, já por isso, indirectamente gratificante, como confere uma gratificação
adicional directa e imediata ligada ao subsequente sentimento de omnipotência do
pensamento na modificação da realidade.
2) Esta gratificação, porque imediata, é uma característica convidativa ao uso e abuso do
mecanismo que, na medida que opera sobre a realidade, priva esta de uma importante
componente, a temporalidade (anulação retroactiva), alterando-a profundamente e
impedindo a integração do ego ou fomentando a sua desintegração.

Nos desenhos, manifesta-se:

1) Na necessidade permanente de apagar o desenho já realizado, ou algumas das suas


partes;
2) Apagar e sujar partes ou zonas do desenho racionalizando, por exemplo, com
sombreados;
3) Desenhar sobre um objecto gráfico já desenhado, ocultando-o;
4) Riscar figuras.

385
Avaliação em Psicologia Clínica

II – Isolamento

O mecanismo de isolamento consiste na dissociação primária entre os vínculos de


amor e os agressivos. Tende a confirmar essa dissociação e a mantê-la, evitando que os pares
associados se unam na fantasia ou na realidade, pois tal união significaria a desorganização do
ego, fantasiada como caos ou loucura. Corresponde a um reforço dos mecanismos da clivagem
esquizóide, seja porque a marcha para a situação depressiva parou, seja por regressão.

Dado que a fantasia defensiva dominante é evitar a união (vivida como catástrofe
persecutória) está bloqueada a possibilidade de síntese (por ruptura das conexões
associativas) e com ela, a integração do ego e do objecto.

O temor à união dos pares dissociados, cria a necessidade de manter uma distância
extrema em relação ao mundo externo (para evitar uma mobilização emocional) e a anestesia
afectiva correspondente a um bloqueio.

A patologia do mecanismo depende da sua intensidade e do seu grau de


predominância. Pode ser adaptativo se o seu uso for instrumental. Por exemplo: manter a
angústia isolada numa situação de crise na qual é necessária uma conduta activa e eficaz, onde
não falta uma certa harmonia e leveza do traço:

O isolamento é um mecanismo mas primitivo que a formação reactiva. Implica um


marcado afastamento afectivo e está unido a fantasias de controlo mágico omnipotente do
objecto.

386
Avaliação em Psicologia Clínica

Apresenta-se como defesa extrema em quadros pré-psicóticos, como controlo do


mecanismo de identificação projectiva excessiva, protegendo, no caso, do perigo de
desorganização: em que, à esquerda, figura um homem “entalado”, do qual a criança toma
distância desenhando (figura do meio) um “boneco” (um homem desvitalizado), o que parece
não ser ainda suficiente pois acrescenta, isolado dos outros, um “boneco a dormir”:

Nos desenhos em geral: na generalidade, apresentam-se pobres, frios, de escassos


conteúdos, frequentemente pequenos, com limites bem definidos e vazios. Estão sozinhos
dentro da folha e, nalguns casos, enquadrados. O desenho livre é pobre, desarticulado, frio.
Geralmente são desenhados objectos materiais.

Nas figuras humanas;

 Figuras com expressão que não revelam afecto, geralmente reduzidas ao tamanho da
cabeça. É frequente a cabeça aparecer demarcada como num retrato. Acentuação
paranóide do olhar. Figuras sem movimento, com maior ou menor grau de
despersonalização:

387
Avaliação em Psicologia Clínica

A cabeça é sempre enfatizada (controlo intelectual) e pode aparecer como cabeça do tipo
“capacete” ou “robot”:

O aumento de patologia do mecanismo manifesta-se na acentuação do fechamento das


figuras e no aumento dos traços correspondentes a sentimentos de despersonalização.
 A necessidade de manter isolados os vínculos hostis e afectuosos dissociados, manifesta-se
pela criação de personagens antitéticas (ex: polícia e ladrão).

Na casa:

A casa aparece também pobre, fechada, isolada, sem nada em volta, de difícil acesso:

As portas e janelas não existem, estão fechadas, ou colocadas muito alto:

388
Avaliação em Psicologia Clínica

Quando domina o medo do fracasso do mecanismo, o controlo é intensificado:


excessos de fechaduras em portas e janelas, cercas com aspecto agressivo (pontas) ou inclusão
de molduras (racionalizando a produção como se fossem quadros); casa telhado, casa cercada,
casa forte.

Neste desenho, temos uma casa com porta a sugerir blindagem, com “fechaduras de
segredo”. Ao lado, isolada, uma “ilha”. A vegetação florida desta, sugere claramente a
clivagem entre os aspectos amorosos e agressivos:

Fracasso da defesa: a tentativa de limpar, ordenar e polir o desenho, normalmente


não tem sucesso e aparecem desenhos sujos ou borrados (desenhos acima referenciados). As
provas gráficas mais claras do fracasso das tentativas de anulação correspondem aos casos em
que o objecto anulado é somente riscado ou mal apagado, de maneira que permanece
graficamente presente. Seguramente que o que se queria anular era a realidade. Ver a
realidade (olhos abertos) confere-lhe existência, o que parece evidente se cotejarmos esta
tentativa com a figura da mulher executada seguir, na qual os olhos aparecem fechados (aqui,
a defesa é conseguida):

389
Avaliação em Psicologia Clínica

A anulação pode verificar-se entre o objecto gráfico e a verbalização correspondente.


Por exemplo: uma representação gráfica de uma figura com aspecto pouco protector,
combinado com uma produção verbal onde se destaca algum aspecto bondoso dela. Aqui, a
figura monstruosa agressiva (o que é manifesto nos dentes e nos cabelos espetados, para além
do aspecto geral), desempenha o papel de nadador-salvador em efectividade de funções:

III – Formação Reactiva

A formação reactiva responde à necessidade de manter uma dissociação entre o


vínculo amoroso e o vínculo agressivo estabelecidos com o objecto, reforçando o primeiro e
mantendo o segundo sob controle.

Apesar de baseada numa relação ambivalente (dissociada), corresponde, do ponto


de vista evolutivo, aos ganhos da posição depressiva. Supõe uma preocupação pelos danos
causados ao objecto e medo de não poder repará-lo: o ego fantasia, como defesa, que o dano
acontecerá no futuro se o objecto for agredido. Mas ao negar o dano já causado ao objecto,
fica bloqueada a possibilidade de uma autêntica reparação. No entanto, existem nesta
situação sentimentos próprios da situação depressiva: a preocupação pelo objecto, empatia
com o sofrimento do objecto e desejos de preservá-lo.

A aceitação da necessidade, da dependência e do valor do objecto é maior que no


isolamento.

Este mecanismo, quando usado ao serviço da adaptação, da evolução, favorece o


reforço dos limites e a modificação dos mecanismos expulsivos de ataque ao objecto. Contudo,
estão subjacentes ansiedades persecutórias (medo de enlouquecer/ser enlouquecido;
desorganizar/ser desorganizado) relacionadas com o receio de assumir a agressividade clivada,
parte da ambivalência.

390
Avaliação em Psicologia Clínica

As formações reactivas adaptativas permitem o ajustamento a normas sociais


(horários, cerimoniais, trabalho) que, por se oporem ao princípio do prazer, despertariam, à
falta de controle, a agressividade ou a rebeldia.

Como mecanismo dominante da personalidade, dá à conduta um grau de constância


mais ou menos exagerado: busca de ordem, meticulosidade, amabilidade permanente, que
leva a diversos graus de rigidez, dureza, falta de espontaneidade e de afectividade. Este
desenho foi praticamente todo desenhado com o auxílio da régua:

O controlo da agressividade por meio deste mecanismo nunca é total. Implica uma
luta permanente por parte do ego para manter a agressividade dentro dos limites,
determinando um gasto considerável de energia psíquica. O deslocamento, mecanismo mais
evoluído, tornará o processo mais económico e eficaz.

Conclusão:

Nos desenhos: quando a defesa faz parte de uma personalidade bem integrada, dará
como resultado produções gráficas ordenadas, com boa localização espacial, distinção entre o
que é interno e o que é externo e entre as partes internas.

Além das características comuns a todos os mecanismos obsessivos: meticulosidade,


pormenorização, necessidade de rever e refazer os desenhos – o que mostra a dificuldade de
desprender-se da produção e indica um funcionamento retentivo – e do aparecimento de
zonas sujas em consequência das emendas introduzidas (fracasso do controle implícito na
busca da ordem, da simetria e da limpeza) as figuras caracterizam-se ainda por:

391
Avaliação em Psicologia Clínica

 Não agressivas; roupa cuidada; ausência de sedução, presença de aspectos formais: roupa
fechada, fato gravata; movimento corporal inexistente ou coarctado (rigidez e tensão
corporais), mostrando o controlo imposto aos impulsos; preocupação pelos limites da
figura; localização e tamanho médios.~

E) DEFESAS NEURÓTICAS:
I – O Deslocamento

A necessidade de dissociar o vínculo agressivo do vínculo amoroso com o objecto, está


subjacente a este mecanismo. As características persecutórias atribuídas ao objecto externo
odiado, são transferidas (deslocadas) para outro ou outros objectos externos que passam a ser
temidos ou evitados enquanto depositários de fantasias agressivas.

Este é o mecanismo latente das fobias. Freud estudou-o pela primeira vez no caso do
“Pequeno Hans”. Nele, as fantasias terroríficas em jogo na relação com o pai foram deslocadas
para os cavalos.

O deslocamento tem como finalidade proteger o vínculo amoroso com o objecto,


situando o temor (e, de modo latente, o ódio) noutros objectos menos necessários, que
podem ser evitados e odiados e por cuja perda não se sofre. Isto alivia o ego do perigo e da
dor, permitindo-lhe situar impulsos (de morder, de afogar, invadir, etc) e partes corporais
(dentes, genitais, etc) no objecto externo (identificação projectiva).

Na evolução normal, o deslocamento está presente nos processos de generalização e


de formação de símbolos.

Quando indica detalhes mínimos, é um mecanismo típico de técnicas obsessivas; a


preocupação concentra-se em aspectos ou pormenores não essenciais à realidade, mas sobre
os quais foram deslocadas situações vinculares essencialmente carregadas.

Tal é o deslocamento de “baixo para cima”, que corresponde a uma necessidade de


situar na parte superior do corpo, conflitos relativos às funções e aos órgãos genitais. Este tipo
de deslocamento pode estar presente em conversões histéricas (ex: equação garganta-vagina),
ou em conflitos relacionados com rendimento intelectual (equação potência intelectual-
potência sexual) ou com a posse do pénis – neste desenho este tipo de mecanismo traduz-se
pelas particularidades das cabeleiras:

392
Avaliação em Psicologia Clínica

Nos desenhos, o que é “deslocado” varia de um caso para o outro, sendo em termos
gerais, um vínculo conflitual com o objecto de que se precisa, no qual está contida sempre
uma função, uma parte corporal, ou um impulso vivido como perigoso. Manifestam-se
graficamente na:

1) Necessidade de adicionar um novo objecto, o simbolizador do vínculo.


Neste desenho a agressividade aparece deslocada para o cão ladrando e a casa a
arder, enquanto é preservado o vínculo amoroso entre o sujeito e o objecto
representado pelos amáveis cumprimentos:

Nestes desenhos, por sua vez, nota-se o deslocamento do interesse pela procriação:
para os pássaros e plantas, para um, e para o ninho da árvore, no outro:

393
Avaliação em Psicologia Clínica

2) Localização da situação conflitual em objectos acessórios do desenho, no “fundo” ou


na “decoração” do objecto gráfico.
Neste desenho, a “cena” desenvolve-se à frente, à esquerda. Ao fundo, a casa a arder
(e, de lado, o cão a ladrar) suporta o deslocamento da agressividade, permitindo um
relacionamento pacífico entre as duas personagens. No caso em questão, os
elementos do protocolo permitem pensar que o conflito se joga entre duas partes de
si mesma. Objectos interiorizados, portanto:

Na figura humana a localização da situação conflitual faz-se em zonas corporais não


conflituais: preocupação pela potência sexual deslocada no desenho para a gravata ou para o
nariz, etc.

394
Avaliação em Psicologia Clínica

II – O Recalcamento

Fenomenologicamente, manifesta-se por lacunas do pensamento, do sentir ou


verbalizar (lapsos). É o esquecimento não intencional dos factos e fantasias, ocorridos na
realidade interna e externa.

Está relacionado, em parte, com mecanismo de negação (responde à fantasia


“necessito não conhecer tal aspecto meu e do objecto: se não o conheço, não existe”).

Assenta, também, num mecanismo de clivagem embora num plano mais evoluído e
adaptativo.

Dentro da teoria Kleiniana, na evolução normal, o recalcamento é herdeiro do


mecanismo de clivagem e torna-se possível, em resultado da elaboração da etapa depressiva.

O recalcamento como mecanismo adaptativo marca a possibilidade de clivagem entre


as fantasias e entre a vida consciente e inconsciente. Tal clivagem não se refere a uma divisão
rígida e irreversível mas é comparável a uma membrana permeável, porosa, que, embora
possibilite a separação de ambos os aspectos da realidade psíquica, permite ao ego
permanecer em contacto com as fantasias ou recordações funcionalmente recalcadas.
Mantém operacionalmente separadas as fantasias conscientes e inconscientes, que são
mobilizadas frente a qualquer contacto com os objectos e situações externas. Se fossem
totalmente conscientes, impossibilitariam o contacto com a realidade. favorece o bom
funcionamento psíquico mediante o esquecimento do trivial, do acessório e do secundário.

Como mecanismo neurótico, funciona como um dique de “contenção”, provocando


empobrecimento e bloqueio.

H.Segal refere-se às causas de tal rigidez: “se a clivagem inicial for excessiva, o
recalcamento posterior será de excessiva rigidez neurótica. Quando a clivagem inicial foi
mesmo severa, o recalcamento lesará menos o sujeito e o inconsciente estará em melhor
comunicação com a mente consciente”.

O recalcamento empobrece o ego, na medida em que o limita nas suas funções


mnésicas e perceptivas (para evitar a percepção do vínculo temido), o sujeito necessita de
“não ver” aqueles aspectos da realidade e dos objectos externos que poderiam fazer
“recordar” ou despertar os impulsos e as necessidades recalcadas. É um mecanismo mudo,
que se exprime mais pela “falta de” (recordações, afectos, etc) do que pelo reforço de

395
Avaliação em Psicologia Clínica

determinadas condutas como é o caso da formação reactiva que implica uma necessidade
permanente de reforçar o vínculo amoroso para o controle do vínculo hostil na relação
ambivalente com o objecto. No recalcamento, o conflito ambivalente resolve-se pela
“ausência de afecto”, pela indiferença.

Desenhos: dado o avançado nível evolutivo a que corresponde o recalcamento, supõe


uma boa organização da personalidade e, portanto, do esquema corporal.

 As figuras humanas, apresentam com frequência indicadores de outros mecanismos.

Neste desenho, podemos observar o movimento coarctativo (inibição) numa actividade


que pressupõe grande movimentação das figuras; vislumbra-se também o recurso a
mecanismos de controle obsessivo, na quantidade e simetria dos pormenores do edifício
maior, assim como do mecanismo de isolamento, no espaço à esquerda onde se situa a
árvore e a tabuleta:

 São figuras habitualmente completas e harmoniosas com localização espacial e tamanho


adequados.
 A gestalt está conservada. De acordo com a intensidade do recalcamento, pode aparecer
pobreza de conteúdos e aspectos rígidos (falta de movimento ou movimento coarctado).
 A preocupação e a luta contra as tendências exibicionistas e o erotismo corporal,
evidenciam-se:
o Nas figuras harmoniosas mas não sexuais, muito vestidas, “tapadas”. Pouca
preocupação com os pormenores da roupa.

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Avaliação em Psicologia Clínica

o Na falta de traços sexuais secundários, cortes marcados na cintura, corte de figura


a nível genital ou tronco alto. Ênfase na cabeça, no cabelo, nos olhos.
o Na expressão directa do conflito através de figuras humanas antitéticas quanto ao
exibicionismo: bailarina, mulher sedutora vs figura vestida, tapada.
o Pode aparecer pela sobre ou sub-dimensionação das figuras que representam o
par antitético.
Neste desenho, o exibicionismo, representado pela menina a saltar à corda,
aparece reduzidíssimo, enquanto o outro elemento do par antitético, a
escoptofilia, aparece deslocada para o sol, um ser longínquo e inanimado, na
realidade, mas que graficamente se impõe pela proximidade e características:

o A clivagem pode manifestar-se entre a realização gráfica e a verbal (ex: figuras


sedutoras e exibicionistas e escotomização destas características centrais na
verbalização.
A intensidade ou o grau de recalcamento pode manifestar-se por:
o Figuras rígidas ou coarctadas nos seus movimentos.
o Figuras pobres quanto a conteúdos.
o Distancia entre os pares dissociados quando estes aparecem desenhados. (No
desenho anterior, a distância significada pelos tamanhos das representações e
pela escala dos seres: figura humana de um lado, e ser inanimado do outro).

No desenho da casa e da árvore, mantêm.se como características gerais: boa


organização gestáltica; relação de pares, tamanhos e localização espacial adequados;

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Avaliação em Psicologia Clínica

características harmónicas. Vazio e pobreza de conteúdos, são características variáveis de


acordo com o grau de rigidez e de controlo das defesas.

III – A inibição (ou restrição do ego)

Manifesta-se como impotência ou deficit de uma ou mais funções do ego: não ver, não
ouvir, não aprender, etc. Uma função ou conduta é inibida por ser sentida como perigosa por
estar ligada à realização de fantasias agressivas. Evita-se o perigo fantasiado, anulando ou
restringindo a função ligada a estas fantasias (ver os desenhos apresentados como exemplo do
mecanismo anterior [recalcamento] e os comentários feitos a propósito dos mesmos).

A inibição surge como defesa perante ansiedades paranóides e depressivas.

Frente a ansiedades paranóides, exprime a necessidade de autocastração, para evitar


ataques relatiatórios do objecto (ex: se os ganhos intelectuais são vividos como triunfos
sádicos sobre os pais, a capacidade intelectual transforma-se em fonte de ansiedade e
conflitos). Inibir uma capacidade provoca sofrimento e impotência, mas protege o ego de
temores mais primários.

A inibição torna-se presente, da mesma forma, frente a ansiedades depressivas. As


fantasias subjacentes são também de agressão ao objecto, mas é acentuado o medo de
danificá-lo e a inibição tem a finalidade de protegê-lo.

A inibição ou restrição do ego, refere-se não só à limitação de uma função que


potencialmente se poderia desenvolver, como também a um empobrecimento e a uma
diminuição geral do ritmo das funções egóicas (percepção, motricidade, ritmo associativo) e
costuma acompanhar os estados depressivos. Resulta de introjecções patológicas do objecto
(introjecção dos objectos danificados, mortos ou agonizantes, com os quais o ego fica
identificado).

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Avaliação em Psicologia Clínica

Neste desenho, perante duas figuras de simbolização sexual evidente, “o menino fica
em casa porque partiu uma perna e não pode andar”. Os aviões “não são de passageiros” (e
esconderão, por detrás desta afirmação, um potencial bélico não visível, expressão, também,
de inibição), dão-nos uma ideia do que poderá ser a razão da imobilização (inibição) da
criança: a contenção da sua agressividade destrutiva que, no caso, estava ligado a sentimentos
de exclusão e abandono:

Desenhos:

Figuras humanas: a vivência de impotência e de inadequação evidencia-se


através de:

1) Figuras humanas pequenas e fracas.


2) Traço débil.
3) Amputação ou castração de zonas corporais conflituais ou relacionadas com as situações
conflituais.
Neste desenho, o esconder das mãos dentro dos bolsos (inibição da agressividade)
é acompanhado por um esboço de formação reactiva: as flores:

399
Avaliação em Psicologia Clínica

O mesmo se pode verificar neste desenho. Os sinais variam conforme a conotação de inibição:
por exemplo, nas inibições intelectuais são características a cabeça quadrada, o cabelo tipo
capacete com aspecto de “robot” e muito sombreado:

4) A inibição transparece ainda no reforço ou pelo tratamento especial de certas zonas ou, ao
contrário, pela ausência de partes específicas: mãos, pés, por exemplo. Manifesta-se
também por impotência verbalizadas pelo sujeito durante a produção “não sabe, não pode
desenhar al ou tal aspecto do desenho”.
Neste desenho, a criança coloca perante a tarefa de executar um desenho livre, depois de
muita hesitação e manifestações verbais de incapacidade, desenha os contornos da marca
do papel que costuma ver-se à transparência.

5) A inibição como mecanismo mais abrangente da personalidade aparece no desenho de


figuras fracas, inseguras, pequenas; ou figuras de pessoas sentadas ou encostadas, como
expressão de baixa vitalidade e de fraqueza do ego (com excepção das pessoas que têm
impedimentos físicos reais, em cujo caso seria indício de uma boa integração de
deficiência).

400
Avaliação em Psicologia Clínica

Na casa e na árvore, predominam as características gerais de pequenez de conteúdo; a


casa é rudimentar, solitária e pequena. Como exemplo ilustrativo temos o desenho desta
menina com uma inibição grave:

A árvore é pobre, com pouca folhagem, sem frutos, com desconexão de partes ou
zonas mais importantes. Estas características correspondem à expressão directa da inibição
como defesa.

Na inibição, contudo, o material gráfico pode registar a fantasia omnipotente e


agressiva do triunfo, que motiva, na conduta manifesta, a inibição como sintoma e defesa, um
pouco à semelhança do RCH em que a um número alto de respostas movimento, corresponde,
com frequência, a uma conduta inibida na prática.

IV – A Regressão

Esta é a reactualização dos vínculos objectais correspondentes a momentos evolutivos


já superados no desenvolvimento individual. O ego capitula frente a situações actuais que não
pode resolver e apela para modalidades de relação mais primitivas do ponto de vista evolutivo,
que foram, no seu tempo, eficazes para manter o equilíbrio.

A regressão pode implicar uma modificação estrutural (que se organiza, então, a um


nível mais primário) ou pode limitar-se a afectar determinados vínculos ou funções (por
exemplo: reactivação da dependência limitada a figuras paternas, diferentemente de uma
regressão total à atitude oral-receptiva-passiva infantil).

Como mecanismo normal manifesta-se quotidianamente no dormir e no sonhar;


evolutivamente, regressão está unida à necessidade de progressão, já que a evolução nunca é
linear: processa-se em etapas através de pequenas regressões ao estado intermediário
anterior.

401
Avaliação em Psicologia Clínica

Tais processos apresentam-se como consequência natural de situações dolorosas,


chegando a ser indispensáveis para a sua elaboração: por exemplo nas situações de luto, a
reactualização de atitude oral-perceptivas, a reactivação da dependência e corte transitório
com o mundo externo, implicam processos de regressão indispensáveis para a consecução de
um bom desprendimento do objecto perdido.

Quando a regressão se coloca ao serviço do ego, torna possível a conexão com


fantasias inconscientes que o favorecem e enriquecem, constituindo a base dos processos
criativos.

“A regressão patológica implica uma regressão estrutural, reversível ou não, a pontos


perturbados do desenvolvimento. Na doença psíquica produz-se sempre uma regressão a fases
do desenvolvimento anteriores nas quais estavam presentes perturbações patológicas que
criaram bloqueios e constituíram pontos de fixação”.

Na avaliação psicológica, interessa-nos determinar quais as possibilidades de


regressão, quais as possíveis situações de tensão susceptíveis de desencadear a regressão e o
nível de organização (neurótica ou psicótica) a que essa regressão levará.

Desenhos: um dos indícios facilmente observáveis é um progressivo incremento e


exacerbação do controlo obsessivo (incremento do reforço, super-pormenorização),
acompanhado de um maior empobrecimento e confusão do objecto conseguido.

402
Avaliação em Psicologia Clínica

A análise dos elementos do desenho também nos podem fornecer indicações, na


medida em que apresentarem zonas destruídas; casas em ruína, com rupturas; perdas de
equilíbrio ou equilíbrio precário: figuras caindo, ou sem base de apoio. Neste desenho,
podemos observar alguns destes sinais:

V – A Sublimação

Na teoria freudiana, é a canalização dos impulsos instintivos para as actividades


criadoras, socialmente adaptadas, como resultado de um processo bem sucedido de renuncia
a um fim instintivo.

As abordagens à teoria Kleiniana permitem vincular o conceito de sublimação às


ansiedades e ganhos derivados da situação depressiva. A dor e o sofrimento relacionados com
os objectos queridos e valiosos, que se teme haver destruído, mobilizam impulsos de
reparação, e de recriação dos objectos internos e externos, que constituem a base da
criatividade e de sublimação. H.Segal refere-se a este momento da situação depressiva:

“A ânsia de recriar os seus objectos perdidos impede o bebé a juntar o que despedaçou,
a reconstruir o destruído, a recriar e a criar. Ao mesmo tempo, o desejo de proteger os seus
objectos leva-os a sublimar os impulsos que sente como destrutivos. Deste modo, a
preocupação pelos objectos muda os fins instintivos e produz uma inibição dos impulsos
instintivos”.

Referindo-se ao conceito de Freud:

“Só através de um processo de luto se podia produzir uma renúncia bem sucedida. A
renúncia a um fim instintivo, ou a um objecto, é uma repetição e ao mesmo tempo, uma

403
Avaliação em Psicologia Clínica

revivência da renúncia ao seio. Como nesta primeira situação, o bebé tem êxito se o objecto a
que deve renunciar pode ser assimilado pelo ego, graças a um processo de perda e de
recuperação internas. Eu sugiro que um objecto assim assimilado se converte num símbolo
dentro do ego…”.

A possibilidade de sublimar, supõe a capacidade de reparação, e está em relação


directa com ela, na medida em que se propõe proteger o objecto de novos ataques hostis e a
repará-los pelos danos que já sofreu. A sublimação é em si mesma, um trabalho de reparação,
que implica um vínculo de amor com um objecto total e se exprime através da criatividade, da
capacidade de se realizar e de se auto-reparar.

Desenhos: seguindo este ponto de vista, pode conceber-se que a necessidade de


desenhar surge, na evolução, como uma tentativa de recriação e de reparação dos objectos.
Assim, como as primeiras palavras recriam o objecto interno e o tornam independentes do
externo, o desenho responde, da mesma forma, à necessidade de recriação dos primeiros
objectos. Quando pedimos a alguém que faça um desenho, estamos a colocar esse alguém
diante de uma tarefa de criação, ou de recriação, de um objecto, de uma tarefa reparatória.
Tarefa essa que pode mostrar tanto as ansiedades, as dificuldades ou as preocupações que se
mobilizam nessa tarefa face à reparação, como o estado dos seus objectos internos e do seu
ego: inteiros, despedaçados, parcializados, etc.

Na medida em que a sublimação e a reparação estão indissoluvelmente unidas, o grau


de desenvolvimento da capacidade de sublimação vai transparecer:

a) Na disposição, atitude e modalidades com que o sujeito enfrenta a tarefa


projectiva: ansiedades e defesas frente à (re)criação.
b) No aspecto inteiro, sólido, harmonioso (reparado) ou, pelo contrário, destruído,
do objecto gráfico.

1) No que toca à atitude do sujeito quanto às suas capacidades reparatórias, Psiccolo refere:
a. Atitude depressiva adaptativa, traduzida na preocupação em realizar a tarefa
adequadamente, no clima emocional de introspecção, na adequada capacidade de
auto-crítica e na adequada valorização.
b. Diferentes tipos de condutas desajustadas, indicadores de conflitos que interferem
na execução de uma autêntica reparação: referências à inabilidade e ao medo de
realizar a tarefa; auto-crítica exagerada (medo de não contar com recursos
reparatórios); incapacidade de defender-se do objecto gráfico, que é vivido como

404
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permanentemente incompleto, não terminado (tendência reparatória em luta


contra impulsos hostis); necessidade de sair da tarefa rapidamente evitando todo
o contacto afectivo-depressivo (evitamento de ansiedades depressivas);
entusiasmo exagerado, diversão, brincadeira: negação maníaca.
2) Referindo-se às características que determinado objecto gráfico terminado possui e que
evidenciam o grau de reparação que o sujeito consegue em relação aos seus objectos e ao
seu ego, assinalamos que:
Quanto mais destruído, despedaçado, desarmónico é um objecto, maior será a quantidade
de destrutividade e menor a capacidade para conseguir uma síntese depressiva adequada
e para desenvolver capacidades sublimatórias. Como a sublimação é o resultado da
elaboração parcial ou total da situação depressiva, ela exprime-se nos desenhos pelo grau
de aproximação a objectos inteiros, integrados, harmoniosos, adequadamente
relacionados com o que há em volta, receptivos, protectores, etc.

Critérios de análise:

a) Gestalt mantida: objectos gráficos completos, inteiros, sólidos, por oposição a objectos
destruídos, atacados na totalidade ou em zonas circunscritas. Atitude do sujeito face
aos objectos desenhados: preocupação em corrigi-los, grau de aceitação das
imperfeições, negação delas, etc.
b) Objectos totais ou parcializados: o objecto gráfico obtido regista todo o objecto real ou
partes do mesmo e, neste caso, importa saber que partes do objecto são desenhadas e
se correspondem a zonas diferenciáveis do corpo: cara, tronco, etc.
c) Diferenciação e conexão mundo interno/mundo externo: verificam-se através dos
limites do desenho e do tipo de tratamento dos órgãos de recepção e das zonas de
contacto com o mundo externo.
d) Integração das diferentes áreas da personalidade: (pensamento-afecto-acção):
tratamento balanceado, supercentrações, omissões.
e) Plasticidade e ritmo: movimento harmónico, versus rigidez, estereotipia e coarctação.

405
Avaliação em Psicologia Clínica

FUNCIONAMENTOS

DA PERSONALIDADE

406
Avaliação em Psicologia Clínica

CLASSIFICAÇÃO DAS DEFESAS


 Defesas maduras: adaptação
o Supressão: atitude mental na qual põe de parte um pensamento negativo até
conseguir alcançar melhores condições para lidar com esse pensamento.
o Antecipação: atitude mental na qual antecipa uma situação dolorosa de forma a
conseguir lidar com ela.
o Altruísmo: possibilidade de retirar satisfação em ajudar os outros.
o Humor
o Sublimação

 Defesas neuróticas: baseadas na repressão – aspectos conflituantes da experiencia


interna são banidos da consciência.
o Repressão: ideia reprimida
o Formação reactiva
o Projecção neurótica
o Deslocamento
o Isolamento do afecto
o Intelectualização

 Defesas de distorção da imagem: baseadas na dissociação – aspectos da experiencia


consciente são dissociados para evitar o conflito.
o Cisão/ Clivagem: característica da posição esquizoparanóide
o Idealização primitiva: sujeito observa-se a si mesmo e aos outros de forma ideal,
ou seja, observa apenas a parte positiva.
o Desvalorização
o Identificação projectiva
o Controlo omnipotente
o Negação primitiva

Observa-se que as defesas de distorção da imagem são frequentemente mencionadas como defesas
primitivas na literatura psicanalítica.

407
Avaliação em Psicologia Clínica

DIMENSÕES DO FUNCIONAMENTO DA PERSONALIDADE –


AVALIAÇÃO ESTRUTURAL
Sem patologia Patologias leves da Transtornos graves da
Personalidade Personalidade

Nível de Organização Normal Nível neurótico de organização Nível borderline de organização da


Organização da personalidade ou transição personalidade. Borderline e psicótico
entre os níveis neuróticos e
borderline de organização da
personalidade.
Senso e sentido do Sentido do self e dos outros Senso do self e dos outros Senso do self e dos outros mal
Self bem captado, estável, relativamente bem integrado, integrado, superficial e irrealista.
realista e integrado estável e realista.
Qualidade das Capacidade de avaliar as Capacidade de avaliar as Predomina o modelo de
Relações Objectais necessidades dos outros, necessidades dos outros, funcionamento de relacionamento que
independentemente das independentemente das atende às próprias necessidades.
necessidades do self. necessidades do self. Relações Relações interpessoais instáveis e
Relações interpessoais interpessoais estáveis e superficiais. Prejuízo grave nas relações
estáveis e profundas. profundas mas, possivelmente amorosas, com ausência de relações
Intimidade sexual conflituosas. Dificuldade em sexuais ou, relações sexuais caóticas.
combinada com afecto. integrar sexualidade e afecto
Capaz de ter em conta as
necessidades dos outros.
Investimentos Investimento no trabalho e Investimento no trabalho e/ou Pouco ou nenhum investimento no
nas actividades de lazer actividades de lazer. Existe uma trabalho e nas actividades de lazer
maior dificuldade
Defesas Predominam as defesas Predominam as defesas Predominam as defesas baseadas na
maduras, variadas e neuróticas (recalcamento), cisão / clivagem
defesas neuróticas variadas defesas maduras e
baseadas na cisão
Rigidez Flexibilidade rigidez Rigidez grave
Teste de realidade Intacto e estável Intacto e estável Inexistente e instável
Sistema de valores Sistema de valores Sistema de valores totalmente Sistema de valores contraditório e
internalizado e totalmente internalizado e desenvolvido e internalizado, internalizado de forma incompleta
dimensão ética do desenvolvido com padrões porém com padrões muito
sujeito flexíveis. Não é rígido rígidos

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DIAGNÓSTICO ESTRUTURAL: TRÊS NÍVEIS DE


ORGANIZAÇÃO DA PERSONALIDADE
Normal Neurótico Borderline

Identidade Consolidada Consolidada Pouco consolidada


Defesas Predominam defesas Defesas baseadas Defesas baseadas
maduras predominantemente na predominantemente na
repressão dissociação
Rigidez/ repetição Adaptação flexível Rigidez mas, em Rigidez grave.
circunstâncias muito
precisas porque, em outras
é considerada normal
Teste de realidade Intacto e estável Intacto e estável Essencialmente intacto,
mas se deteriora num
contexto de intensidade
afectiva. A capacidade de
ler com exatidão os estados
intensos dos outros está
comprometida. Em
situações muito stressantes
o teste de realidade pode
ser perturbado.

409
Avaliação em Psicologia Clínica

FASES PRÉ-GENITAIS
1. Fase Oral
(1º ano de vida – do nascimento ao desmame)

1. Desenvolvimento Psicossexual
 Sexualidade infantil
1. Regiões corporais de maior sensibilidade são as zonas genitais e as erógenas;
2. Objectivo – conduz a actividades que desempenham um papel no prazer preliminar;
3. Autoerótica;
 Zona erógena: boca
 Zona aerodigestiva – esófago, estômago, órgãos respiratórios;
 Órgãos da fonação – linguagem;
 Órgãos dos sentidos – paladar, nariz, olfacto, visão;
 Toque e pele;
 Objecto original do desejo sexual – seio materno/ seu substituto.
 Primeira pulsão sexual – ato de mamar;
 Satisfaz a necessidade de alimento e proporciona prazer por si só;
 Relação com a mãe – função alimentar ou nutricional e satisfação libidinal;
 Objectivo Pulsional Duplo
1. Autoerótico (noção de mundo externo – anobjectal/indiferenciação eu/não-eu);
2. Desejo de incorporar objectos (desejo específico de oralidade – ao engolir e
incorporar o alimento o objecto é parte do sujeito mas não é objecto externo);
 Fases
I. Fase Oral Primitiva:
 0-6 meses;
 Fase pré-ambivalente;
 Verdadeira fase oral de Freud;
 Subfases: Fase Narcísica Primária e Fase Anaclítica;
 Características: Prevalência da sucção/aspiração;
 Ausência de diferenciação entre o próprio corpo e o objecto exterior; Ausência de
amor e de ódio propriamente ditos;
II. Fase Oral Tardia:
 6 – 12 meses;
 Ou fase oral sádica;

410
Avaliação em Psicologia Clínica

 Predominam as pulsões “canibalescas”;


 Aparecimento dos dentes, o morder e mordiscar dos objectos, do seio materno –
completa a sucção da fase anterior;
 Morde para responder à frustração e exprimir uma pulsão agressiva em si própria
– resultado: incorporação sádica e destruidora do objecto; objecto incorporado é
vivenciado como sendo atacado, mutilado, absorvido e rejeitado no sentido de
destruição.

2. Relação de Objecto
 Inter-relação Dialéctica – forma como o sujeito constitui os objectos (externos e internos)
e como moldam a actividade.
 1º Objecto é a Mãe – a pessoa que desempenha a maior parte dos cuidados prestados à
criança;
 Noção de objecto é problemática pois, no inicio, não existem imagens de objectos no
sentido psicológico da palavra, encontrando as primeiras representações de objecto
dispersas, mais ou menos retalhadas, parcelares e não unificadas.
 Recém-nascido não tem noção do mundo exterior e apenas das próprias percepções
internas de tensão e de calma – não distingue os outros de si próprio.
 Bebé está a braços com bocados de objectos – objectos parciais – constituídos por
bocados do corpo da mãe (seio) e bocados do seu próprio corpo.
 Relação do bebé com os objectos parciais – autoeróticas e relação anaclítica (deitar-se
sobre/apoiar-se sobre – dependência absoluta que liga a criança à mãe).
 Descoberta Real dos Objectos – através de um processo gradual.
 Relação objectal constitui-se no momento de ausência do objecto anaclítico – quando
sente que o objecto lhe faz falta;
 Criança aprende a diferenciar as suas impressões – primeira diferenciação é entre
objectos conhecidos/de confiança (objectos de confiança e amados) e objectos
esquisitos, não habituais e estranhos (objectos perigosos).
 Aprende a distinguir-se da mãe e a comunicar com ela, a compreendê-la. São
importantes as reacções ao contacto, à pressão física – pela manipulação corporal
real da criança pela mãe.
 A relação ambivalente é contemporânea – altura do aparecimento das pulsões
sádicas.

411
Avaliação em Psicologia Clínica

 Tendência para morder – desejo de destruir a mãe associado à aspiração de uma


união libidinal com ela – primeiro conflito que ameaça a unidade primitiva
reconfortante com a mãe.
 Ódio mais antigo do que o amor (Freud) – pulsão agressiva é a projecção para o
exterior do “mau” que faz com que o objecto exterior seja o objecto de ódio.
 Desmame
 Conflito relacional específico que se traduz na resolução da fase oral.
 Ligada à ablactação;
 Traumatismo – vivido como uma consequência da agressão, como um castigo
“taliónico” no registo da frustração.
 Com ou sem traumatismo, deixa no psiquismo humano o rasto permanente da
relação primordial à qual põe termo. Patologicamente ou não, a imagem do seio
materno domina, de alguma forma, toda a vida do sujeito.

2. Fase Anal
(2º e 3º ano de vida)

Faculdades de andar, falar, pensar, controlar os esfíncteres, etc., desenvolvem-se e põe ao


alcance da criança uma independência relativa, mas real.

1. Desenvolvimento Psicossexual
 Prazer anal existe desde o início da vida mas não é o espape libidinal principal e não está,
ainda conflitualizado;
 Controlo esfincteriano e ato de defecção – ato sobre o qual a criança adquiriu um domínio
suficiente, o prazer ligado a essa defecção e os conflitos específicos que lhe dizem respeito
ocupam uma situação privilegiada;
 Fonte pulsional corporal/Zona erógena parcial – mucosa anorrectal ou
anorrectossigmoidiana e a mucosa da zona intestinal de excreção, investida por uma líbido
difundida a todo o interior e não só ao orifício;
 Objecto da pulsão anal – difícil de descrever devido à crescente complexidade do jogo
pulsional:
 A mãe (objecto privilegiado das pulsões da criança) torna-se uma pessoa inteira, mas
não deixa de ser um objecto funcional, parcial que a criança manipula similarmente à
manipulação que faz relativamente às matérias fecais;
 Objecto libidinal intermédio – bolo fecal (conteúdo intestinal) cujas funções são:

412
Avaliação em Psicologia Clínica

a) Excitante directo da erogeneidade da zona corporal mucosa;


b) Parte do seu próprio corpo que a criança pode, por uma decisão voluntária,
conservar ou exteriorizar permitindo-lhe fazer a distinção entre objecto interno e
externo – se o medo de ser comida constitui a angústia oral, a de ser despojada do
conteúdo do corpo por arrancamento, de ser esvaziada representa a angústia anal.
c) Moeda de troca entre ela e os adultos. Freud fazia equivalência entre as fezes, a
prenda que se oferece ou recusa, o dinheiro, etc.
 Objectivo Pulsional – muito complexo pois não assenta apenas na função defecatória:
 Defecar = expulsar – não é o único prazer vivido diariamente. VS. Reter – proporciona
um poder erógeno.
 Sub-Fases:
1. Fase Expulsiva:
a) Objectivo – gozar as sensações agradáveis durante a excreção, descarregar tensão,
eliminar vai estimular a mucosa anorrectal e produzir um prazer sexual comparável
ao da sucção na fase oral – prazer auto-erótico;
b) Para além do prazer “natural” é obtido um estímulo adicional consequente à
importância que os pais atribuem às funções anais, que conduz a criança ao ato
neuromuscular – “fazer força”
c) Clisteres frequentemente administrados por mães ansiosas – fonte de estímulo
intenso. O clister tem um significado frustrador de esvaziamento intestinal forçado
e de excitação erógena.
Resumo da 1ª Fase:
 O auto-erotismo narcísico que ela comporta sempre.
 O seu aspecto sádico, que caracteriza aliás a totalidade da fase anal de tal modo
que se designa habitualmente esta fase pelo qualificativo “sádico-anal”.
Aspecto Sádico tem dupla fonte:

 Na origem, o ato de expulsão está em causa, sendo as matérias fecais


consideradas objectos que são destruídos que não são considerados pelas
crianças;
 Os factores sociais entram mais tarde em jogo, já que a criança pode utilizar a sua
capacidade de expulsão para desafiar os pais que fazem questão de lhe ensinar a
ser limpa.

413
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Fase Retentiva – o prazer principal reside na retenção. Origens deste prazer:


a) Descoberta feita pela criança de que a estimulação intensa da mucosa pode,
para além da expulsão, ser provocada também pela retenção; prazer auto-
erótico masochista – componente normal da sexualidade – o prazer ligado ao
ato retencional torna-se objecto de uma procura activa;
b) A importância que os adultos atribuem às fezes é outro aspecto importante da
origem deste prazer. Quando os outros consideram estes produtos como
preciosos, a criança prefere conservá-los em seu poder em vez de os dar. Aqui
o elemento sádico entra em cena e a criança pode: optar por usar as suas
matérias fecais como presente para demonstrar o seu afecto; ou, retê-las, o
que assume um gesto hostil (sádico) em relação aos pais preocupados com a
sua produção, mas que é mais conservador relativamente ao objecto (interno e
externo);

2. Relação de Objecto
 Os modelos das relações mânticas pela criança com as suas matérias fecais e os conflitos
ocasionados pela educação para a limpeza orientam o individuo na relação de objecto,
com as suas características específicas:
 Sadismo
 Este período é definido pelo sadismo – agressão carregada de prazer contra um
objecto.
 Os componentes eróticos e agressivos encontram-se nas duas fases, tal como a
bipolaridade da própria pulsão sádica, constituindo duas tendências gratificantes: para
destruir o objecto externo; ou para conservá-lo e exercer nele um certo controlo;
 Conquista da disciplina esfincteriana – permite à criança descobrir a noção da sua
propriedade privada (as fezes que entrega ou não), do seu poder: auto-erótico sobre o
seu trânsito intestinal e sobre o próprio corpo; ou afectivo sobre a mãe que o filho
pode recompensar ou frustrar). Isto é acompanhado por sentimentos de omnipotência
e de sobrestima narcísica vivido como o prazer que sente ao controlar, dominar, por
oposição à mãe, ou seja, possuir.
 Todo o objecto de desejo é alvo da exerção dos direitos da própria criança e assimilável
à sua posse mais primitiva, as matérias fecais.

414
Avaliação em Psicologia Clínica

 Masoquismo
 Objectivo passivo de aceder ao prazer por experiências dolorosas.
 Sadismo e Masoquismo – ligados aos castigos corporais, para os quais as nádegas são o
alvo preferido. O bater representa uma saída para tendências sádicas, mas a função
masoquista é mais complexa.
 Só pode operar em certas condições, não devendo a dor ser excessivamente forte nem
grave.
 O fato de que um açoite possa excitar sexualmente a criança tem sido alvo de
controvérsias. Mas, na teoria ortodoxa, isto ocorre porque a libido se desloca do ânus
para a pela das nádegas e para os músculos nadegueiros. Mas esta teoria não é alvo de
discórdia.
 No fundo, existe uma relação bem conhecida entre o sadismo e masoquismo que é
utilizada pela criança que se comporta de forma muito activa e agressiva a fim de
provocar os outros para que lhe batam.
 Ambivalência
 As relações permanecem ambivalentes;
 Ambivalência fisiologicamente assente sobre a atitude contraditória em relação às
matérias fecais que serve de modelo às relações com os outros.
 Os objectos exteriores podem ser:
 Eliminados, subtraídos, ou seja, recusados, expulsos e destruídos;
 E, simultaneamente, introjectados, ou seja, guardados como objectos de
apropriação, retidos como uma posse preciosa e amada.
 Bi e Homossexualidade. Actividade e passividade. Narcisismo anal
a) Bissexualidade: raízes psicologias e fisiológicas na fase anal do desenvolvimento.
 O recto aparece como um órgão de excreção côncavo: enquanto órgão de
excreção pode expulsar activamente algo e desta capacidade derivariam as
tendências masculinas; enquanto órgão côncavo pode ser excitado passivamente
pela penetração de um corpo estranho, donde derivariam as tendências
femininas;
b) A oposição do par actividade-passividade: marca profundamente as relações
objectais características desta fase, em que não se trata da oposição masculinidade-
feminilidade no sentido sexuado destes termos.

415
Avaliação em Psicologia Clínica

 A criança é sensibilizada, na sua relação com outrem, para a percepção de um


conjunto de pares antagonistas: par bom-mau; bonito-feio; mas sobretudo par
grande-pequeno totalmente específico.
 Face ao adulto, a criança sentir-se-á ou mais pequena ou maior e a mais forte
desde que se imagine leão, tigre ou chefe militar. O mais alto grau de relação
valorizada de amor está pois envolvido no par subjugar – ser subjugado, dominar
– ser dominado.
c) O narcisismo: colocado em primeiro plano.
 Razões:
 Qualidade de parte do corpo atribuída ao bolo fecal;
 Conquista da independência pela marcha e o controlo esfincteriano;
 Possibilidades de oposição e de regateio face ao objecto materno;
 Sentimento de omnipotência e de auto- sobreestimaçao;
 Caracter centrípeto, narcísico dos objectos sexuais dominados pelo auto-
erotismo nesta altura;
 É importante relacionar:
 A oposição actividade-passividade;
 O aspecto dual, binário, de uma relação de objecto que exclui qualquer
verdadeira genitalização;
 O reforço narcísico do sentimento de potencia ao qual está subordinada a
procura de complementação entre um grande e um pequeno (o objecto
tem de ser ou muito fraco ou muito forte, comprazendo-se o sujeito no
papel inverso e dependente);
 O aspecto centrípeto por fim, e portanto narcísico, dos objectivos sexuais;
Compreendemos assim que a relação objectal seja do tipo homossexual, sendo
a característica genital acessória.

3. Fase Fálica
(Após o 3º ano de vida)

Com base nas fases anteriores, por abandono ou solução dos conflitos afectivos que
lhes pertencem, a fase fálica instaura uma relativa unificação das pulsões parciais sob uma
certa primazia dos órgãos genitais.
Não é uma verdadeira genitalização da libido.

416
Avaliação em Psicologia Clínica

A palavra “sexo” é ambígua e não é de uma diferenciação sexual que a criança toma
aqui consciência.
Apenas o órgão anatómico masculino tem valor de existência tanto para o rapaz, que o
tem, como para a rapariga, que não o tem.

1. Desenvolvimento Psicossexual
 Erotismo Uretral
 Fase Uretral – fase intermediária entre as fases anal e fálica.
 Objectivo primário deste erotismo – prazer de urinar e um prazer de retenção.
 Começa por ser auto-erótico, orientando-se para objectos (fantasmas de urinar
para cima dos outros, por exemplo) enquanto a enurese poderá, após o auto-
erotismo de origem, adquirir o valor de uma equivalente masturbatório
inconsciente. O prazer de urinar revestir-se-á em geral de uma duplo aspecto:
a) Nos dois sexos, um significado fálico, até mesmo sádico, sendo a micção o
equivalente a uma penetração activa, ligada a fantasmas de estragar ou destruir;
b) Pode ser sentido como um “deixar-correr”, um prazer passivo de rendição e
abandono dos controlos.
 Nos rapazes, o “deixar-correr” passivo pode condensar-se com outros
objectivos passivos como de ser acariciado no pénis ou de receber excitações
no períneo (próstata), esses objectivos passivos do erotismo uretral podem
combinar-se com fantasmas bastante sádicos como se vê na análise de casos
graves de ejaculação precoce.
 Nas raparigas, a parte activa serve mais tarde para expressar os conflitos quase
sempre centrados na inveja do pénis. Quanto ao significado passivo do “deixar-
correr”, desloca-se neste caso, frequentemente, da urina para as lágrimas.
 Seja como for, o controlo do esfíncter vesical acarreta um orgulho narcísico que teria
a sua origem no fato de os pais envergonharem a criança quando esse controlo
fracassa. Outros pensam que a maior frequência da micção (relativamente à excreção
anal) suscita recompensas igualmente mais frequentes, reforçando o sentimento de
orgulho. Mas se a vergonha permanece a força especifica dirigida contra as tentações
eróticas-uretrais, a ambição seria o representante especifico da luta contra esse
sentimento de vergonha.
 A Masturbação Infantil
 Já na fase oral se assiste no bebé ao despertar de manifestações eróticas especificas
ao nível dos próprios órgãos genitais.

417
Avaliação em Psicologia Clínica

 O seu determinante ocasional reside, para alem dos cuidados de higiene, na excitação
natural da micção.
 Masturbação Secundária - Quando entra em jogo a disciplina do esfíncter vesical, o
prazer hedónico apoiado sobre a micção vai dissociar-se dela para procurar reproduzir-
se por si, repetitivamente.
 Frequentemente negada pelos adultos, provavelmente em função do seu próprio
superego.
 Deixa traços profundos e inconscientes na memória e parece representar uma das
causas principais da famosa amnésia infantil, que se prende pela actividade reprimida
pelos pais, mas sobretudo com os fantasmas sexuais próprios da idade –
masturbatórios, de essência edipiana, logo angustiante e culpabilizante.
 A Curiosidade Sexual Infantil
a) A “descoberta” da diferença anatómica entre os sexos é uma expressão ambígua. Para
a criança ainda só existe um único sexo que é representado pelos seres dotados de um
pénis. Pela masturbação ou no decurso das suas investigações, a criança vai tomar
consciência da realidade anatómica do pénis; e começa a interrogar-se sobre a
existência ou não existência desse atributo corporal nela própria ou nos outros. Nesta
altura colocam-se outros enigmas: origem das crianças, procriação, gravidez, etc.
b) A cena primitiva – cenas nas quais a criança foi ou fantasiou ser testemunha do coito
dos pais. Faz parte dos fantasmas primitivos ou originários, impregnado toda a vida
fantasmática, quaisquer que sejam as experiências reais dos sujeitos.
Mecanismos em causa:
A identificação com um dos parceiros, por vezes com os dois, no sentido da
passividade;
A projecção da própria agressividade do sujeito, sendo esta “cena primitiva”
percepcionada pela criança como sádica, em função dos ruídos, gritos ou gemidos
ouvidos.
O sentimento de abandono que o fato de ficar excluída dessas relações induz nas
crianças.
c) A escoptofilia ou voyeurismo – instinto parcial (vai contribuir no adulto para o prazer
preliminar mas que, na criança, exige satisfação por conta própria) pode estar
relacionado com a “cena primitiva”. É muitas vezes auditivo. Por sublimação pode dar
origem à epistemofilia – pesquisadores e curiosos de todo o tipo.

418
Avaliação em Psicologia Clínica

 As Teorias Sexuais Infantis


 Na ausência de respostas satisfatórias – ou da possibilidade de as integrar – a criança
interpreta os fatos à sua maneira em função da sua vivência libidinal, estando toda a
descoberta subordinada às forças pulsionais.
a) As teorias infantis da fecundação:
 Fecundação oral por ingestão de um alimento milagroso ou pelo beijo, crença
está geralmente mais presente na rapariga, na qual persiste por vezes até à
puberdade e mesmo além.
 Teorias que se referem à micção e em que o papel de cada um dos parceiros é
mal definido: urinar ao mesmo tempo, urinar na mulher, etc.
 Teorias implicando a exibição dos órgãos genitais.
 Quanto à troca do pénis por uma criança, já se trata de uma teoria mais
elaborada…
b) O nascimento anal – a crença de que as crianças são evacuadas pelo ânus diz
respeito aos fantasmas e interesses da fase anal. Aparecem seguidamente
elaborações mais evoluídas: nascimento pelo umbigo, ou a seguir uma extracção
forçada e sangrenta do corpo materno. A interpretação anal sofre então um
recalcamento.
c) A concepção sádica do coito depende muito mais dos restos fantasmáticos da fase
anal e dos fenómenos projectivos do que de uma realizada qualquer a que a
criança possa ter assistido.

2. O aspecto narcísico e pré-genital da fase fálica


 O pénis não é ainda percepcionado como um órgão genital mas sim como um órgão de
potência ou de completude, ou seja, um falo, dai o nome dado a essa fase.
 Uma certa ambiguidade surgiu pelo fato de Freud utilizar indiscriminadamente os termos
pénis e falo:
 O pénis é o próprio órgão masculino, na sua realidade anatómica;
 O falo realça a função simbólica erradamente atribuída ao pénis. Por falo deve
entender-se um fantasma de acordo com o qual a posse de um pénis proporciona e
significa completude e potência.
 Estamos, aqui, muito mais no registo narcísico do que libidinal objectal. A criança
tornou.se seguramente capaz de diferenciar os sexos, mas apenas o faz ao nível de uma
realidade anatómica exterior e falsamente interpretada. Não se trata da diferença entre

419
Avaliação em Psicologia Clínica

um homem relativamente a uma mulher, mas entre a presença ou a ausência de um único


termo. Ambos os progenitores serão percepcionados em função da sua potência ou da sua
fraqueza, simbolizada por essa posse ou essa falta.
 Parece que o que melhor caracteriza o falo, para Freud, é o fato de ser um objecto
destacável, transformável e, nesse sentido, objecto parcial.
 A fase fálica é a fase da “"descoberta” da diferença dos sexos. Dever-se-ia antes dizer que
é a fase da recusa dessa diferença, recusa muito característica que vai consistir:
 Para o rapaz, em negar a castração (narcísica) pela negação do sexo feminino;
 Para a rapariga, em negar do mesmo modo essa castração pela reivindicação do falo
(narcísico) através da reinvidicaçao do pénis (o clítoris há-de crescer);
 Não podendo o verdadeiro sexo masculino definir-se senão em relação à existência de um
sexo feminino positivo, o reconhecimento deste aspecto positivo apenas será possível
numa fase genital e pós-edipiana, tanto na rapariga como no rapaz. Na idade adulta, a
mulher dita clitoriana é na realidade uma mulher passiva, contrariamente ao que se
costuma imaginar, e a mulher verdadeiramente genital obtém o seu prazer ao envolver
activamente o pénis, sem angústia, sem medo de o absorver ou destruir nem de capar o
seu companheiro.

3. Angústia de Castração:
 Designa a reacção afectiva subsequente à verificação da ausência do pénis na menina,
verificação esta que acarreta no rapaz o medo fantasmático de o perder e na menina o
desejo de o adquirir.
 Esta angústia de incompletude ou da falta determina a angústia de morte contra a qual o
fantasma de desejo de ter uma criança (espécie de reduplicação de si) representa uma
defesa habitual.
 É consciente ou pré-consciente na criança que se apercebe da falta de pénis no outro ou
nela própria. Parte de uma representação falsa da realidade (fantasma de mutilação
peniana, a qual não pode aliás ser assimilada à verdadeira castração que consiste na
ablação, não do pénis, mas das gónadas) e é uma interpretação à qual nenhuma criança
escapa.
 Não é necessária qualquer intervenção dos adultos para que a criança “sofra” de angústia
de castração, face à qual deve aprender a defender-se e não ainda a render-se. É certo que
os adultos intervêm por “interdições castradoras” como as defesas exteriores visando
reprimir as actividades imbuídas de um qualquer valor libidinal (curiosidade, garridice da

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Avaliação em Psicologia Clínica

rapariguinha, disposições bélicas do rapaz, etc.). Mas estas intervenções exteriores


interditoras não fazem mais do que sensibilizar, e não criar, uma angústia de castração
que existe independentemente delas e que não só é normal mas também maturadora.
 A criança vai pois negar este mal-estar ou esta angústia, defender-se dela como sempre, e
nesta luta as atitudes do rapaz e da rapariga diferentes.
 No rapaz
 É possuidor de um pénis de que as raparigas carecem e superinveste nesse pénis:
 Libidinalmente, enquanto instrumento da satisfação sexual (masturbação e os
seus fantasmas);
 Mas também, e sobretudo, enquanto símbolo da valorização narcísica de si
próprio, marcada nomeadamente pelas tendências exibicionistas,
predominantes nesta fase. Diz-se então que o rapaz se identificou com o seu
pénis. É aliás em resultado desse narcisismos levado ao extremo que surge o
receio, sentido pelo rapaz, de que possa vir a ser causado algum mal ou dano ao
seu pénis.
 Fases:
a) Numa primeira fase, a criança tenta negar a realidade. E é ao nível dessa mesma recusa
da diferença que nasce a perversão em geral.
b) É seguidamente graças a um desejo de reparação mágica que o nosso menino tenta
tranquilizar-se: há-de acabar por crescer, pensa ele a propósito das raparigas. O que
não o impede de conservar a sua angustia, pois mesmo quando vê e aceita a diferença,
atribui a carência feminina, não a uma condição fundamental, mas sim a uma
mutilação sofrida como castigo imaginário aplicado pelos pais para punir certos
desejos e prazeres semelhantes aos que ele próprio perceciona como sendo interditos
(masturbação).
c) A negação de estender todas as mulheres esta ausência de pénis é ainda uma defesa,
que permanecera mesmo depois de a criança ter tido de se render à evidência. Para
ela, só tiveram de sofrer essa sorte as que se tornaram culpadas de pulsões
inadmissíveis. Durante muito tempo ela – e isto é válido para os dois sexos – mantem a
sua crença numa mãe peniana (designação preferível a fálica), a qual, idealizada, não
teria sido vítima da castração e conservaria a seus olhos esse pénis imaginário, símbolo
e apanágio do falo, isto é, da potência adulta.
É um abuso de linguagem falar de “mãe fálica”. Na realidade é designado um imago de
mãe anterior à distinção, uma personagem parental todo-poderosa e só isso. Quanto à

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expressão “mulher fálica” temos de reconhecer que se trata de uma “palavra de


homem” que projecta facilmente as suas próprias angústias de castração sobre o
suposto “falismo” das mulheres. O que um homem destes procura numa mulher destas
é simultaneamente uma mãe e um objecto erótico.
 Na rapariga
 Para Freud, o rapaz e a rapariga são muito parecidos.
 A vagina seria ignorada e a actividade sexual é clitoriana, não ocorrendo a passagem
do clítoris para a vagina, enquanto zona erógena predominante, senão mais tarde na
vida, muitas vezes perto da puberdade.
 Ao descobrir a sua falta de pénis, a rapariga, após um período de denegação e de
esperança, vê-se forçada a aceitar rapidamente essa ausência.
 Nenhuma recusa pode apagar nela a falta real, a qual não é sentida como a ameaça
de uma castração imaginária mas sim como um fato fisiológico.
 Contrariamente ao rapaz, esta constatação e a grande decepção que se lhe segue não
só ocorre antes do Édipo, como permite ainda à rapariga entrar precisamente no
Édipo.
 Começa por ser para a menina uma verdadeira e profunda ferida narcísica
acarretando um sentimento de inferioridade no plano corporal e genital, tornando
mais complicado ainda e reforçado por factores socioculturais que ninguém se
lembraria de negar e relativamente aos quais seria mesmo muito interessante
estudar a origem real bem como a variabilidade consoante as civilizações.
 A nossa menina vai defender-se contra esse mal-estar:
a) O primeiro elemento a aparecer é um tema de reivindicação. É a famosa inveja do
pénis, ou ainda reivindicação fálica, semelhante à recusa da diferença por parte do
rapaz. A rapariga chega mesmo a pensar que tinha sem dúvida um pénis e que o
perdeu, o que reforça a ideia de o reconquistar.
b) Forçada a aceitar a sua falta, a rapariga vai culpar a mãe e aproximar-se do pai,
realizando assim esse momento essencial da evolução psicossexual da mulher, a
qual tem, contrariamente ao rapaz, de efectuar uma verdadeira mudança de
objecto para entrar no Édipo.
Para Freud, o factor decisivo em causa no desapego da mãe reside no que se pode
aqui chamar complexo de castração que, apos a ferida narcísica que provoca na
menina, desvaloriza a mãe, afectada pela mesma ausência do pénis.
A entrada no Édipo da rapariga, e consequentemente o seu acesso à genitalidade,
é de natureza mais ou menos reaccional e defensiva.

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c) Outra defesa, desta feita de natureza mais edipiana: o desejo de ter um filho, que
vai substituir o desejo de ter um pénis. Diz-se que a líbido da menina se desloca ao
longo da equação pénis = filho. É com essa finalidade que a menina elege o pai
como objecto de amor abandonado o seu primeiro objecto libidinal, a mãe, que se
torna assim objecto do seu ciúme, permanecendo esta ruptura com a mãe
marcada por uma extrema ambivalência, pelo fato de ser a primeira.

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FASES GENITAIS
O Complexo de Édipo:
 O que é?
 Organizador central na estruturação da personalidade;
 Principal eixo de referência da psicogenética humana para os psicanalistas freudianos;
 Conflito:
 Sexualmente especificado;
 Inscrito numa problemática a três – triangular/ternária – mãe, pai e criança;
 Inaugura a verdadeira genitalização da líbido.

1. Generalidades e definição
 No decurso da sua própria autoanálise, Freud descobriu o Complexo de Édipo;
 Formulação da situação edipiana no rapaz - Afirma que a sua libido se orientou para a
sua mãe e, ao mesmo tempo, sentia ciúme pelo pai, um ciúme em conflito com o afeto
que tinha por ele;
 Aspeto negativo – hostilidade em relação ao pai – difícil de fazer pela ambivalência
como a cobertura afetuosa reacional em relação ao pai que podem ocultar esse aspeto
negativo;
 Não é, apenas uma rivalidade amorosa simples, reveste-se de diversas formas e isto
para a
 mesma criança.
 Em todo um conjunto de casos mistos e também de períodos mistos em que as duas
formas anteriores podem intervir simultânea ou separadamente numa relação dialética
colocando em jogo, para além da ambivalência relativa a cada um dos dois
progenitores, as componentes hétero e homossexuais de toda a criança. Estas duas
formas (positiva e negativa) encontram-se em diversos graus na forma completa do
complexo de Édipo.
 Caso do Rapaz:
a) Ou sob a forma positiva com:
 O seu aspeto positivo propriamente dito (mas mais valeria dizer libidinal): amor
pela mãe;
 O seu aspeto negativo (ou melhor, agressivo): ódio pelo pai;
b) Ou sob a sua forma negativa ou invertida na qual:

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 O aspeto positivo ou libidinal é representado pela atitude feminina carinhosa do


rapaz em relação ao pai;
 Enquanto o aspeto negativo ou agressivo será a hostilidade ciumenta sentida em
relação à mãe;
c) Em todo um conjunto de casos mistos e também de períodos mistos em que as duas
formas anteriores podem intervir simultânea ou separadamente numa relação
dialética colocando em jogo, para além da ambivalência relativa a cada um dos dois
progenitores, as componentes hétero e homossexuais de toda a criança. Estas duas
formas (positiva e negativa) encontram-se em diversos graus na forma completa do
complexo de Édipo.
 A antropologia psicanalítica empenha-se em identificar a estrutura triangular do Édipo,
da qual afirma a universalidade, nas mais diversas culturas e não só.
 Complexo de édipo – o produto da instituição social constituída pela família, logo é
suscetível de mudar ao sabor das transformações desta como aliás se pode
demonstrar. Mas as diferenças efetivamente observadas nas formas de expressão do
Édipo consoante as sociedades ou culturas.
 A importância da estrutura familiar no estabelecimento de um sistema simbólico
destinado a transmitir, num dado contexto sociocultural, uma lei fundamental nas
relações sociais.
 A proibição do incesto é essa lei.
 Está sempre presente;
 Condição universal e minimal para que uma cultura se diferencie da natureza;
 Exigência colocada a todo o ser humano de dominar a situação edipiana, e de acordo
com a qual a humanidade primitiva teria estado supostamente organizada em tribos
conduzidas por um chefe que teria um dia sido morto e comido pelos seus filhos,
sendo este homicídio do pai primitivo considerado como o momento de origem da
humanidade. Esta incorporação teria dado lugar ao primeiro “remorso” – ou seja, o
primeiro pecado – e à primeira inibição.
 Sobre a questão de uma estrutura pré-edipiana
a) Atualmente parece falar-se mais facilmente de “triangulação” do que de conflito
edipiano no sentido em que Freud o entendia. E coloca-se cada vez mais enfase no
momento bastante precoce em que, após o nascimento, a mãe “regressa à cama do
pai”, isto é, reinveste o seu parceiro sexual, desinvestindo pela mesma ocasião o filho,
pelo menos de maneira relativa;

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Avaliação em Psicologia Clínica

b) A idade do Édipo começou por ser para Freud relativamente indeterminada. Uma vez
afirmada a existência de uma organização genital infantil, o Édipo é referenciado a
essa fase, ou seja, ao período dos três aos cinco anos.
No entanto, o pensamento de Freud evolui no que respeita a esse ponto: após ter
começado por afirmar que o Édipo era destruído aos cinco anos, pelo menos no rapaz,
admitirá posteriormente que nessa altura é apenas recalcado, objeto, não se
efetuando plenamente a escolha do objeto senão na puberdade e permanecendo a
sexualidade infantil essencialmente autoerótica.
c) O problema do Édipo feminino prende-se com esta questão e nomeadamente através
da identificação do apego pré-edipiano à mãe, particularmente visível na rapariga, na
medida em que o complexo de Édipo implicará para ela uma mudança e o objeto de
amor, a mãe para o pai, o que levou aos psicanalistas a evidenciar a especificidade do
Édipo feminino.
 Ensaio de definição
 Édipo – uma problemática relacional fundamental da dimensão social, conflitual e
estruturante, histórica no sentido em que surge um momento relativamente precoce
do desenvolvimento de cada individuo e em que confere à evolução afetivo-sexual
deste e ao seu prognóstico um caráter de quase conclusão universal, especificada
enfim por uma estrutura triangular entre a criança, o seu objeto natural e o portador
da lei.
 O caráter fundador do Édipo enquanto representante do laço original de todas as
relações humanas e sobre o seu papel fundamental na estruturação da personalidade e
na orientação do desejo humano, papel que se afirma nas funções capitais que lhe são
reconhecidas, nomeadamente:
 Escolha do objeto de amor definitivo;
 Acesso à genitalidade;
 Efeitos sobre a constituição do superego e do ideal do ego;

2. Relação de Objecto Edipiana


 A própria história do Édipo
 Momento em que as fixações arcaicas fortemente investidas, ao pai e (ou) à mãe, são
reproduzidas sobre outro homem ou sobre outra mulher que surge a neurose. Por
outras palavras, ultrapassar as tendências edipianas representa uma condição

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preliminar para o acesso à sexualidade adulta normal, enquanto agarrar-se a elas


inconscientemente significa assentar a pedra angular da neurose.
 O Complexo de Édipo no rapaz
 O desenvolvimento das relações objetais é aqui relativamente simples, já que o rapaz
permanece ligado ao seu primeiro objeto, a mãe, apesar de a pessoa desta ter
evidentemente outro sentido no plano do investimento.
a) Dependente da mãe – do seu poder e do seu desejo e confrontado com as relações entre os
pais, o rapaz introduz o pai na díade inicial mãe-filho, ao mesmo tempo que toma
consciência de que o objeto do desejo materno se encontra na realidade no pai, o qual
possui o falo que é o atributo da autoridade, da potência e da lei. Por isso o nosso rapaz
vai manifestar dois tipos de apego.
b) Investimento objetal francamente sexual da mãe – para a conquista da qual vai
desenvolver todos os recursos captativos e agressivos que afirmam a sua posição fálica.
Graças a uma primeira identificação com o pai, pode mesmo sentir que participa da sua
potência mágica. No entanto, já nessa altura e no contato da realidade:
 A agressividade pulsional bruta sofre uma sublimação (atividades lúdicas,
desempenho escolar);
 Da mesma forma, o próprio objetivo hedónico primitivo é sublimado em objetivo
sentimental que permite à criança ganhar a estima das pessoas crescidas e reforçar a
sua autoconfiança;
Na sua tentativa de conquista do objeto materno, o rapaz depara-se com um rival na
pessoa do pai, rival de que sente inveja pela sua superioridade real e que ele
sobrestima pelo seu significado simbólico, enquanto os fantasmas edipianos mais não
fazem do que reforçar os temas fantasmáticos da castração.
A culpabilidade da criança torna-se crescente, pois é a presença, real ou simbólica, da
imagem paterna que basta para afirmar o direito contra o qual a criança se insurge.
c) O segundo tipo de apego consiste, mesmo na forma positiva do Édipo do rapaz, num
apego libidinal ao pai, o qual deve ser capaz de suster o investimento fantasmático do
rapaz em dois planos:
 O de um rival a suplantar, é certo;
 Mas sobretudo o que um modelo a imitar, com que se parecer. O desejo do
filho não se reduz a tirar o lugar ao pai, mas também a imitá-lo tomando-o
como modelo. Isto pressupõe que o rapaz necessita investir o pai, possuidor
macho da mãe, de líbido passiva. Por outras palavras, imitar o pai significa
igualmente agradar ao pai, deixar-se talhar, moldar e até mesmo fecundar por

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Avaliação em Psicologia Clínica

ele… o que define tipicamente uma posição homossexual passiva, cujo papel
nesta fase não tem senão uma função de maturação e de estruturação;
Esse apego verdadeiramente libidinal ao pai por parte do rapaz dá-nos conta,
ao mesmo tempo:
1º - Do problema, aliás complexo, da dupla identificação materna e paterna da
criança.
2º - Do facto de as relações com o pai por parte do rapaz na fase edipiana
estarem marcadas antes do mais pela ambivalência e não serem redutíveis a
uma simples manifestação de ódio.
3º - Por fim, de outro aspeto da psicogénese da bissexualidade humana
relativamente à qual já assinalámos as determinantes de ordem anal.
d) A competição edipiana, porem, não é real mas apenas fantasmática, pelo dato de a mãe
ter já escolhido o pai e de só poder dar ao rapaz consolações maternas desligadas de líbido
erótica. Donde:
1. A certeza da inutilidade dos seus esforços permitirá à criança:
 Ultrapassar a angústia de castração, sendo esta por sua vez determinante no
abandono do objeto incestuoso;
 Renunciar tanto à tentativa de sedução erótica da mãe como à competição com
o pai;
 Aspirar enfim à conquista de objetos de substituição. Porque a liquidação
completa do conflito edipiano será acompanhada de um desapego que, sem
destruir os objetos previamente investidos, permitirá no entanto ao rapaz “fazer
o luto” desses objetos libertando a energia libidinal pronta para ser reinvestida
em novos objetos.
2. É também necessário que o rapaz possa abandonar qualquer atitude de sedução em
relação ao rival paterno.

A atitude feminina carinhosa do rapaz em relação ao pai apenas é estruturante na


medida em que possa ser ultrapassada. Caso contrario, essa fixação contribuirá para
determinar atitudes homossexuais passivas inconscientes, tanto quanto exista um
complexo de castração (inconsciente) que ateste uma não resolução do Édipo.

 Sequência no rapaz:
 Desejo edipiano;

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Ameaça fantasmática de castração pelo pai e angustia de castração superada


tanto pela identificação ao pai (agressor) como pela renuncia à mãe (objeto
incestuoso);
 Fim brutal do Édipo e entrada na latência.
 O Complexo de Édipo na Rapariga
 O desenvolvimento objetal torna-se mais complicado, visto que a rapariga tem de
dar um passo suplementar, a transferência da mãe para o pai.
a) O seu objetivo é agora o de obter por parte do pai o que a mãe lhe recusou. As
tendências recetivas substituem as tendências ativas. E a rapariga dirige-se para o pai –
e, secundariamente, para os homens – já não neste caso numa atitude de
reivindicação viril mas para captar a admiração daquele que a mãe escolheu como
objeto de amor, ou seja, para o seduzir.
Existe, também, uma deceção especificamente feminina ainda mais importante: a
menina tem a sensação de que possuía outrora um pénis e que a mãe lho tirou.
b) O seu objetivo é agora o de obter por parte do pai o que a mãe lhe recusou. As
tendências recetivas substituem as tendências ativas. E a rapariga dirige-se para o pai –
e, secundariamente, para os homens – já não neste caso numa atitude de
reivindicação viril mas para captar a admiração daquele que a mãe escolheu como
objeto de amor, ou seja, para o seduzir.
c) A isto acresce um ódio ciumento, carregado de culpabilidade para com a mãe. No
entanto, alguns vestígios do apego pré-edipiano à mãe – mais longo, não esqueçamos,
do que no rapaz – permanecem e admite-se geralmente que as mulheres são mais
ambivalentes a respeito da mãe do que os homens a respeito do pai.
 O Declínio do Complexo de Édipo
 A evolução do complexo de Édipo vai permitir a Freud apreender a especificidade
do destino masculino e feminino.
a) O rapaz renuncia aos desejos sensuais orientados para a mãe e às pretensões hostis
para com o pai e isto sob o choque da ameaça de castração. Não se trata de um
simples recalcamento do complexo mas sim um verdadeiro desmembramento, de um
estilhaço e mesmo de uma destruição. Na realidade, já identificámos as variações do
pensamento de Freud a esse propósito. Sabe-se por outro lado que existe um segundo
movimento edipiano na altura da puberdade, que proporciona ao individuo a ultima
oportunidade de resolver o Édipo espontaneamente.
b) Na rapariga. A renúncia ao complexo de Édipo é mais progressiva e menos completa.
Esta renúncia advém do medo de perder o amor da mãe, medo esse que não constitui

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Avaliação em Psicologia Clínica

uma força tao poderosa e tao dinâmica quanto a angústia de castração, a qual porem
desempenha igualmente o seu papel. Por fim, a ferida narcísica intervirá também para
desencadear o recalcamento do primeiro movimento edipiano (infantil). Esta fenda
narcísica também vigora no rapaz, que se perceciona então como possuidor de um
pénis demasiado pequeno.
 Efeitos, papel e funções do complexo de Édipo
a) O Édipo é o ponto nodal à volta do qual se ordenam as relações que estruturam a
família humana, no sentido lato da sociedade por inteiro. É o momento em que o ser
humano se vê confrontado pela primeira vez com o fenómeno social. Pode-se
considerar que um dos efeitos do complexo de Édipo – através da interdição do
incesto e da instauração da moral – constitui uma vitória da espécie sobre o individuo.
b) O Édipo é também o momento fundador da vida psíquica. A sexualidade que o
condiciona atinge aqui o seu apogeu, com o acesso à genitalidade, caraterizado entre
outros por:
 A primazia da zona genital;

O ultrapassar do autoerotismo

Ego, Superego, Ideal do Ego:


 O que é?
 O Superego é o herdeiro do complexo de Édipo;
 O estabelecimento do Superego pode ser considerado como um caso de identificação
conseguida.
 A Identificação
a) Um processo psicológico pelo qual um individuo assimila um aspeto, uma propriedade,
um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, com base no modelo
deste.
A personalidade constitui-se e diferencia-se por um conjunto de identificações.
O ego é constituído pela sedimentação das anteriores relações objetais ou ainda a
relação de objeto perdida é substituída pela identificação do Ego ao objeto – Freud.
b) Existem dois grandes movimentos identificatórios, constitutivos da personalidade e
que a diferenciam:
 A identificação primária, modo primitivo de constituição do individuo com base no
modelo do outro, correlativa da relação de incorporação oral, visando antes do mais

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Avaliação em Psicologia Clínica

assegurar a identidade do indivíduo, a constituição do Self e do Eu. Logo,


aparecendo essencialmente no registo narcísico.
 A identificação secundária,
contemporânea do movimento edipiano, fazendo-se sucessivamente com ambos os
progenitores nos seus carateres sexuados, e constitutiva da identidade sexual e da
diferenciação sexual.
c) No Édipo, existem dois apegos simultâneos, psicologicamente diferentes: o apego
objetal à mãe e a identificação com o pai, em que a forma positiva do Édipo nasce do
encontro entre estes dois apegos (caso do rapaz).
Na realidade, na forma completa do movimento edipiano coexistem quatro tendências
e duas identificações: tendência carinhosa em relação ao pai e à mãe; tendência hostil
em relação ao pai e à mãe; identificação ao pai e à mãe, em que as diferenças de
intensidade apresentadas por estas duas identificações refletem a desigualdade dos
dois tipos de disposições sexuais.
Finalmente, a destruição do complexo de Édipo dá lugar a duas instâncias “morais”:
 O Ideal do Ego, herdeiro do narcisismo: faz isto; sê igual ao teu pai; pensa como ele;
sente como ele.
 O Superego, herdeiro do Édipo: não faças isto; não faças como o teu pai (sê como
ele, mas escolhe outro objeto).

O conflito edipiano do rapaz ocorre entre o desejo de ter o pai e o sentimento de que
isso o impede de identificar-se com ele. A saída é a renúncia ao desejo de ter para poder
ser como. De igual modo, a rapariguinha tem de renunciar a possuir falicamente a mãe
para se identificar com ela e de renunciar a ser o pai na esperança de ter o pai.

A propósito do Ideal do Ego, que a idealização ocorre mais cedo, isto é, anteriormente
ao Édipo, quando a criança atribui aos pais poderes mágicos. É agora a primeira vez que
a idealização diz respeito ao comportamento moral. Para além da introjeção parental
sob a imagem legisladora do Superego, o Édipo deve resolver-se pela sublimação da
imagem parental interiorizada.

 O Desenvolvimento do Superego
 Interiorização de todas as interdições passadas e presentes que finaliza a formação da
instância psíquica chamada Superego.
 Para escapar aos conflitos centrados sobre o amor, o ódio, a culpabilidade e a angústia,
não é com os pais tal como são na realidade que a criança se identifica, mas sim com

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Avaliação em Psicologia Clínica

pais idealizados, puros, sem defeito, fiéis aos seus próprios princípios, etc. O que é
interiorizado é o próprio Superego dos pais.
 Funções do Ego, do Superego e do Ideal do Ego
a) As funções do Ego estão centradas na relação com a realidade. O seu objetivo é
realizar um certo compromisso entre as pressões do Id, do Superego e do mundo
exterior.
b) As funções do Superego estão centradas nas exigências morais. A função crítica assim
designada constitui uma instância que se separou do Ego e parece dominá-lo – uma
parte do Ego apõe-se à outra, julga-a de maneira crítica e toma-a, por assim dizer,
como objeto.
Esta censura opera em grande parte de forma inconsciente de maneira que se pode
falar de um “sentimento de culpabilidade inconsciente”, apesar da aparente
contradição dos termos. O que explica em parte o rigor irracional do Superego.
A sua constituição transforma numerosas funções mentais. A angústia converte-se em
parte em sentimentos de culpabilidade. Sendo o Superego o herdeiro dos pais
enquanto fonte não só de ameaças e de castigos mas igualmente de proteção e de
amor reconfortante, torna-se tão importante estar em bons ou em maus termos com
o Superego como fora outrora estar em bons ou em maus termos com os pais. A
autoestima – e a sua recarga permanente em aportes narcísicos – já não depende da
aprovação ou da rejeição por parte de objetos externos, mas antes do sentimento
interior de ter feito ou de não ter feiro o que devia.
c) Quanto ao Ideal do Ego foi muito tempo confundido com a de Superego. É uma
instância diferenciada e constitui um modelo ao qual o sujeito procura conformar-se.
A sua função essencial consiste em ser uma referência para o Ego. A sua origem –
apesar da atualização reforçada na altura do Édipo – permanece principalmente
narcísica.

3. Resumo face ao Superego:


 É o herdeiro do complexo de Édipo e constrói-se por um mecanismo de identificação
com as imagens parentais interiorizadas, introjetadas.
 Faz as suas exigências atribuídas aos pais, função que se deve pois em grande parte à
projeção e que pode facilmente ser reprojetada, isto é, deslocada sobre personagens
de autoridade que venham a surgir. Pode assim mostrar-se – e mostra-se na realidade
muitas vezes – mais severo do que os próprios pais.

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Avaliação em Psicologia Clínica

 A partir do momento, enfim, em que se dilui progressivamente a crença na


omnipotência parental, o Superego vem substituir-se enquanto sistema autónomo que
forma a base da consciência moral.

O Período de Latência:
 O que é?
 5º/6º Anos até à Puberdade;
 Segue-se ao Édipo;
 Fase seguinte do desenvolvimento é considerada como uma fase calma e de
consolidação das posições adquiridas.
 Fase de paragem no desenvolvimento sexual.
 Não significa que não se observem manifestações sexuais;
 Não se pode descrever uma nova “organização” da sexualidade durante esse período –
por isso é que é período e não fase.

1. Desenvolvimento Psicossexual
 No declínio do Édipo, as impossibilidades reais de satisfação pulsional – externas ou
internas – e a criação do Superego internalizado e as pressões sociais exteriores juntam-se
e originam a entrada no período de latência, durante o qual se verifica essencialmente
uma modificação estrutural das pulsões sexuais.
Esta transformação torna possível a utilização da energia pulsional ao investi-la noutros
objetos mas talvez permita sobretudo a perseguir outros objetivos, com a crescente
tensão tendendo a satisfazer-se de maneiras substitutiva.
Observa-se assim, a dessexualização das relações de objetos como dos sentimentos que
se traduz por uma prevalência do carinho sobre os desejos sexuais. As tendências libidinais
encontram-se inibidas quanto ao objetivo e transformadas em tenras emoções.
Para Freud este período é de redistribuição das energias pulsionais.
Esta aparente calma não é muitas vezes real e a masturbação, as tendências edipianas e
as regressões pré-genitais continuam em cerda medida presentes. Razão pela qual a
menor importância classicamente assumida aqui pela sexualidade apenas é relativa e não
absoluta.

2. A Relação de Objecto
 Transformação dos investimentos de objetos em identificações com os pais e que os
desejos libidinais dirigidos para os pais, enquanto objetos de amor, vao ser substituídos

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Avaliação em Psicologia Clínica

por expressões sublimadas de afeto – carinho, devoção, respeito – este período é


favorável às aquisições educativas, escolares, culturais, e é de fato uma altura de aquisição
eminentemente recetiva no campo intelectual.
 Os 7 anos são considerados a idade da razão em todos os sentidos da palavra e bastaria
lembrar a intensa necessidade de explicações lógicas então manifestada pela criança.
 A energia pulsional disponível é canalizada para os jogos ou para as mais diversas
atividades sociais, o que leva a identificar aqui uma verdadeira mudança de objeto. A
criança é cada vez mais atraída por objetos concretos que não representam um produto da
imaginação como os contos de fadas que tanto lhe agradavam na sua infância. Quis-se dar
duas explicações:
a) Durante o período de latência, as crianças não se atrevem a entreter-se com
pensamentos abstratos, por causa do perigo de voltar a despertar os conflitos sexuais.
b) As crianças não necessitam disso, já que o seu Ego é suficientemente forte e não se
encontra em situação de perigo imediato.

No entanto, a criança ainda procura estar junto do objeto de amor, pelo menos ao
princípio do período de latência, onde a ambivalência é maior, expressando - se no
comportamento por uma alternância de obediência e de rebeldia, seguida de remorso. A
tendência para as reações hostis desaparecerem, a criança começa a aproximar-se das
outras pessoas que a rodeiam para estabelecer com elas relações amigáveis. Está, então,
pronto para ser influenciada pelas outras crianças e os adultos que não os pais. Tornando-
se capaz de os comparar, a sua fé na omnipotência enfraqueceu.

A Puberdade:
 Não é uma fase nem um período mas, frequentemente, uma crise – crise da adolescência
– cujo início põe termo geralmente de maneira bastante brusca ao período de latência que
a antecede.
 Tarefa psicológica essencial – adaptação da personalidade às novas condições produzidas
pelas transformações físicas, podendo considerar todos os fenómenos psíquicos que
caraterizam a puberdade como tentativas de restabelecimento do equilíbrio perturbado.

1. Desenvolvimento Psicossexual
 Carateriza-se por uma revivescência pulsional maciça brutal e, por vezes, dramática pela re
e sobreativaçao tanto das pulsões agressivas como da líbido.

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Entre a latência e a puberdade – momento intermédio de pré-puberdade ou pré-


adolescência – durante o qual as pulsões presentes são investidas sem discriminação.
As tendências infantis voltam a aparecer em força, ainda que em condições diferentes,
enquanto os mecanismos de defesa, que transformavam as tendências negativas em
positivas, enfraquecem ou desaparecem.
O desenvolvimento sexual parece retomar, exatamente, no ponto onde fora abandonado
na altura da resolução do complexo de Édipo e dá-se então, habitualmente, uma
intensificação das pulsões edipianas.
 Crise narcísica e identificatória – pontuada por dúvidas angustiantes sobre a autenticidade
de si próprio, do corpo e do sexo, realizando uma nova “fase espelho” e caraterizando a
famosa “idade ingrata”. Mesmo fora de qualquer fator ou contexto psicótico, observam-se
sentimentos de “estranheza”.
Inquietações manifestam-se a propósito do nariz, dos olhos, das olheiras, da modificação
dos traços, do cansaço sentido, sem falar do desenvolvimento dos próprios órgãos genitais
e das suas consequências bem como do aparecimento dos carateres sexuais secundários.
 O rapaz vai continuar durante toda a sua vida a atribuir um valor narcísico ao seu pénis. Na
rapariga ocorre na altura da puberdade uma mudança de direção com tendência para
transferir – sempre sob o angulo narcísico – o interesse manifestado pelos órgãos genitais
para a totalidade do corpo: são todas as preocupações conhecidas acerca da beleza do
rosto e da silhueta, a preocupação em “conservar a linha”, os cuidados relativos à roupa, à
higiene, até mesmo à alimentação, enquanto permite ou desfavorece em certo “ideal” na
constituição ou na manutenção das “formas”.
As estruturas psíquicas podem ser reequacionadas e de qualquer forma a puberdade será
a última oportunidade oferecida ao adolescente para resolver espontaneamente o conflito
edipiano, caso não o tenha feito anteriormente.
 A puberdade propriamente dita, autenticada pelo acesso à maturidade sexual física,
assinala-se – sobretudo no rapaz – pelo fato de que, se o acréscimo do investimento
instintual permanecia outrora relativamente indiferenciado, a libido vai doravante
concentrar-se especificamente em sentimentos, objetivos e ideias genitais, sendo as
tendências pré-genitais relegadas para segundo plano, o que não as impede de surgir de
novo na primeira ocasião. A libido essa que se encontra condicionada designadamente
pelo fato de que, nas nossas civilizações, as vias de saída heterossexuais são limitadas por
um consenso social que se opõe veementemente às relações sexuais durante a
adolescência.

435
Avaliação em Psicologia Clínica

 A masturbação: As tendências genitais acrescidas acabam por expressar-se numa


atividade masturbatória cuja necessidade é sentida como uma necessidade ao mesmo
tempo muito imperiosa e muito reprovada, tanto pelo próprio como por outrem, dando
origem a sentimentos de culpabilidade muito intensa, apesar de se tratar, no nosso
contexto sociocultural, de um fenómeno normal enquanto única saída possível para a
satisfação das necessidades sexuais.
A masturbação não deixa de ser muito culpabilizada e angustiante:
 Quer devido à pressão externa. Basta mencionar os habituais relatos assustadores
quanto à sua pretensa nocividade com as suas consequências imaginárias: loucura,
impotência, esterilidade, perda dos órgãos genitais. Medos esses que são na maior
parte das vezes alimentados pelos adultos que se defendem assim contra a sua própria
culpabilidade e angustia a esse propósito.
 Quer sobretudo pelo fato de esta culpabilidade se referir à revivescência dos conflitos
edipianos não resolvidos e do complexo de castração. Não esqueçamos que o Superego
é constituído substituindo a interdição externa, e o que importa sobretudo, mais até do
que a própria masturbação, são os fantasmas masturbatórios que a acompanham, os
quais são então muitas vezes de tipo edipiano.
 “A puberdade é ultrapassada, isto é, a sexualidade está instalada na personalidade,
quando o sujeito se torna capaz de ter um orgasmo completo” – neste campo, as
perturbações com origem em recalcamentos passados podem servir de base a neuroses.
Os que tem medo, por exemplo, dos caracteres da maturidade, ou seja, do
reconhecimento da realidade das pulsões sem angústia perante elas nem necessidade de
passagem ao ato compulsiva, tentam prolongar um estado de dependência real com uma
esperança “irreal” de omnipotência.

2. A Relação de Objecto, a escolha Objectal


 Na pré-adolescência, a libido dirige-se de novo para os objetos de amor da infância, isto é,
os objetos de amor parentais, e a primeira tarefa do Ego vai ser abandonar, fazer
desaparecer a todo o custo, esta escolha parental. Na realidade o dilema volta a colocar-
se entre a relação materna pré-genital e dual por um lado e por outro a relação objetal
triangular e genital.
 Regra geral – o individuo jovem vai isolar-se e comportar-se como um estranho perante a
família; é a revolta pubertária contra os pais, a autoridade ou os seus substitutos
simbólicos. Emancipação está tanto mais ruidosa e espetacular quanto mais tardia e as

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fixações criança-pais – fixação da criança pela submissão ou dos pais pela reprovação –
tiverem sido mais ou menos constrangedoras.
 Esta luta contra os investimentos passados pode conduzir quer à rejeição total dos pais, à
rutura, a um modo de vida completamente diferente, quer ao restabelecimento do
equilíbrio na tolerância reciproca e no afeto partilhado. A saída deste conflito depende,
mais ainda do que da atitude real dos pais, do modo de resolução ou de não resolução do
conflito edipiano, sendo oferecida, uma vez mais, uma última oportunidade ao individuo
para o liquidar espontaneamente,
Uma possibilidade de passagem ao ato pode transparecer nos comportamentos de
reivindicação ativa e geralmente violenta tanto em relação, primeiro, ao “burguês” num
contexto afetivo-politico confuso, como mais tarde ao parceiro sexual ao nível afetivo ou
ao “patrão” no plano social.
Nesta tentativa de solução do conflito, a escolha de novos objetos libidinais desempenhará
para o adolescente um papel considerável. A maioria das vezes, trata-se de apegos
compulsivos e passageiros a seres quer da mesma idade, com os quais a relação assume a
forma de uma amizade apaixonada ou de um amor real, quer, ou ao mesmo tempo, mais
velhos, que representam claramente substitutos parentais, que terão cada vez menos
traços comuns com as imagens parentais originais, à medida que se processa a maturação.
Estas fixações amorosas passageiras, muitas vezes abandonadas, tanto mais rápida e
completamente quanto mais tiverem sido apaixonadas e exclusivas, não representam
verdadeiramente relações objetais, mas antes apegos identificatórios, dominados que
estão pelo esforço enviado para se agarrarem ao mundo exterior de um modo narcísico.
O adolescente regride do amor objetal ao narcisismo.
A primeira escolha objetal da puberdade será pois muitas vezes uma escolha
homossexual, até mesmo com experiências homossexuais ocasionais entre adolescentes
(talvez mais nas raparigas), experiências essas que não devem ser forçosamente
consideradas como patológicas porque:
 Refletem muitas vezes somente a solidez da identificação parental que o adolescente
procura dissolver.
 Surgem como um fenómeno temporário de adaptação.
 Não conduzem a fixações definitivas.
 São frequentemente devidas tanto à timidez perante o outro sexo (e às tradições
culturais) quanto ao prolongamento da orientação narcísica da maior parte das
necessidades objetais do período em causa.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Notas:

a) Na rapariga, a masturbação é clitoriana, ainda que susceptível de ser mais facilmente


“deslocada” do que no rapaz para substitutos: nariz, boca, cabelo… com fantasmas
bissexuais referenciados às relações dos pais enquanto o sujeito imagina desempenhar os
dois papéis, e talvez sobretudo o papel masoquista.
b) A proibição total, em ambos os sexos, de qualquer atividade autoerótica não parece
menos patológica do que a masturbação compulsiva. Tanto uma como outra evidenciam o
fato de que os conflitos subjacentes não foram resolvidos e as suas consequências fazem-
se sentir não só no plano dos comportamentos sexuais como nas relações sociais.
Não podemos deixar de dizer que há de fato uma ligação entre neurose e masturbação,
mas… apenas neurótico, e na medida em que os fantasmas e a reprodução da
masturbação só são patogénicos por causa dos conflitos Id/Superego, eles próprios
patogénicos. As consequências psicológicas da culpabilidade e da angústia que são
temíveis e não os efeitos da masturbação enquanto tal.

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Avaliação em Psicologia Clínica

ESTRUTURA NEURÓTICA

1. Noção de Neurose
Esta entidade clínica teve muita dificuldade em se separar das doenças nervosas
propriamente ditas, como é o caso da epilepsia, e da própria loucura, à qual chamamos em
termos científicos de psicose. Esta neurose pode, antes de mais, ser individual mas, também,
ser familiar. É evidente que a neurose individual tem uma conotação particular no contexto de
uma neurose familiar.

A Neurose Individual:
Relaciona-se com a aceitação clássica da neurose de acordo com a primeira tópica
freudiana, ou seja, toda ela assenta no princípio de recalcamento histérico.

 A ideia simples da neurose: a tomada de consciência de algo recalcada permite curar os


sintomas, a neurose é o produto do recalcamento, um recalcamento que diz respeito
essencialmente à sexualidade. Na realidade, a situação neurótica não é assim tão simples,
uma vez que, a concepção histérica utiliza, sem dar por isso e sem tirar consequências, o
pano de fundo edipiano e o desejo incestuoso.

 A concepção contemporânea da neurose ou a neurose de acordo com a segunda tópica


freudiana: A sua sintomatologia é muito mais vaga, daí a existência de uma grande
dificuldade a diagnosticá-la. Estamos, normalmente, perante um mal-estar em que se
confundem avidez e frustração ao ponto que, pelo menos num primeiro tempo, se
poderia considerar que a neurose se caracteriza pela vontade de recuperar a todo o custo
as balizas em falta de uma evolução libidinal bem conduzida.

Vislumbra-se porém, de maneiras mais ou menos evidentes mas sempre perceptível,


um primeiro ponto de referência: o carácter insaciável da procura com uma avidez tal que
nenhuma compensação consegue dar-lhe resposta. Esta insaciável procura pode assumir
formas extremamente variáveis, como histéricas ou até mesmo paranóides a mínima.

Inversamente, a depressão neurótica pode estar num primeiro plano escondendo mal
um queixume raivoso, clausurado num ‘’tudo ou nada’’ ou ainda emboscado numa
omnipotência passiva mais ou menos obsessiva e difícil de descobrir.

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Avaliação em Psicologia Clínica

A toma de consciência desta polaridade permite encarar as carências, ou mesmo os


traumatismos infantis, de uma forma mais aberta e de reavaliar com outro olhar as causas
infantis que supostamente podem explicar tudo. Assim, as consequências das frustrações
infantis aparecem mais como falhas a serem elaboradas, dificuldades em desencadear um
trabalho de luto, que como expedientes impenitentes e recalcados.

 O inconsciente da neurose obriga a reconsiderar a sua fase existencial, frustração e avidez,


mesmo que à primeira vista os seus alicerces estejam a perder referências. O Ego torna-se
parcialmente inconsciente, a erotização de um Superego sádico faz dele um parceiro
incómodo e as forças neuróticas já não são somente o produto secundário do
recalcamento: estão em ligação directa com o Id em toda a sua potência desordenada.

A identificação da omnipotência pulsional poderá ser descrita sob forma de violência


fundamental (J. Bergeret).

A identificação da dependência, ao mesmo tempo recusada e obstinada, uma espécie de


atitude regressiva que alguns descreverão como uma libido à procura de objecto (R. Fairbain).

Estes dois pontos de vista que nos parecem identificar os movimentos essenciais da
avidez aparente assumem uma forma particular no inconsciente. Constituem em primeiro
lugar dois tipos de relação de objecto bem diferenciados que, como Freud parece antecipar
em 1914, prefiguram um tipo de cunho prévio à constituição da triangulação edipiana. Mais
ainda, a sua condensação contribui para o desejo incestuoso: com efeito, como pode a criança,
privada de argumentos biológicos convincentes, ter o atrevimento de se imiscuir na
problemática dos desejos parentais?

É-lhe necessário ter razões sólidas, tais como a conjugação de uma omnipotência pulsional
sem limites e de uma vontade obstinada de regresso a uma dependência de tipo fetal. Assim,
o desejo incestuoso fundador do Édipo é o protótipo da neurose típica.

 As formações incestuosas simbólicas: Já por si bastante complexa, a situação complica-se


muitas vezes na medida em que os rebentos incestuosos já não são apenas elementos
mais ou menos regressivos de um conflito edipiano mal abordado, pouco conflitualizado,

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Avaliação em Psicologia Clínica

muito pouco ou nada elaborado, mas também fenómenos activos oriundos do


inconsciente dos pais e que produzem o que poderemos chamar ‘’formações incestuosas
simbólicas’’ que congelam os processos de identificação em sistemas de repetição mais ou
menos inextricáveis.

A Neurose Familiar:

Poder-se-á dizer que existe neurose familiar quando o desejo incestuoso da criança é
retomado em espelho pelos pais que se tornam parceiros interessados nesse desejo.

Não será este clima de sedução recíproca que se poderá constituir um sistema
pulsional do tipo amor-ódio.

Existem, no entanto, situações em que a ligação incestuosa simbólica ocupa o espaço


por inteiro e se torna o elemento preponderante da história de um destino. É assim possível
dizer que, se existe um núcleo neurótico típico, existem também situações incestuosas
simbólicas típicas quase sempre ligadas às depressões parentais.

 A parte visível e sintomática não é, muitas vezes, muito reveladora, dado que se
caracteriza por relações de objecto em que imperam o domínio sistemático e, de uma
forma mais escondida ainda, a dependência recíproca. Estes dois elementos
condicionam funcionamentos mentais mais rígidos e de tempos a tempos com
revelações explosivas, clásticas ou mesmo mais graves ainda.
 Muitas vezes, a parte invisível só é revelada posteriormente ou no decurso de uma
psicanálise. Trata-se, essencialmente, de proibições implícitas fundamentais cuja
primeira consequência é a esterilização das trocas verbais. Se por um lado as crianças
desfrutam abertamente perante as proibições explicitas, por outro lado as proibições
implícitas são menos contornáveis.

A forma mais gravosa destas neuroses familiares conduzem a uma sistematização –


descrição feita pela escola de Palo Alto a propósito do double mind – que diz respeito,
essencialmente, às neuroses patológicas.

Para constituir uma psicose, é necessária uma ruptura muito profunda dos laços
afectivos que deixa o caminho livre para excitações aterrorizadoras, pelo que a maio parte
desses comportamentos pertence à neurose.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Também se vê, por esta descrição simbiótica das ligações mãe-filho, que estamos
muito perto do conceito lacaniano de forclusão incidindo sobre o nome do pai. Esta
exclusividade materna contém de facto uma exclusão – e não só de nome – mas também da
imagem do pai da criança na sua própria mente em favor do pai dela, logo, do seu narcisismo.

2. O Núcleo Edipiano Típico

O conflito sexual da neurose situa-se ao nível genital do Édipo mesmo que as aptidões
defensivas levem a percorrer as vias de regressões pré-genitais (anais ou mesmo orais). O
conflito no rapaz decorre da rivalidade edipiana com o pai no projecto de conquista da sua
mãe. Esse projecto é abandonado em função tanto dos sentimentos delicados que existem em
relação ao pai como, também, do receio de medidas de retaliação desta último (a castração).
Pesa ainda e, sobretudo, o lugar do pai na cabeça da mãe.

o A proibição do pai é interiorizada, pelo que se que o Superego é o ‘’herdeiro do


complexo de Édipo’’. Ao mesmo tempo, a identificação com este último projecta sobre
o futuro a posse da mulher. A masturbação infantil, espécie de participação
alucinatória na cena primitiva, cessa a maior parte das vezes com a instauração do
Superego. A sua revivescência na adolescência desencadeia, assim, uma culpabilidade
considerável; o receio de destruição ou de doença dos órgãos genitais, relacionado
com a masturbação, é a expressão mais evidente da angústia de castração.

Na rapariga, a posição não é exactamente simétrica devido à mudança de objecto (dos


cuidados maternos para o amor do pai) e da castração anatómica ser diferente.

As identificações edipianas:
A identificação do menino com o pai e da menina com a mãe são os herdeiros mais
evidentes do complexo de Édipo. Na realidade, não são as únicas saídas e a instauração dessa
herança permanece altamente problemática.

Para começar, este modo de resolução do complexo de Édipo não deixa de ser parcial,
o desejo incestuoso persiste apesar de deslocado e é ele que cai sob a alçada do Superego.
Visto sob este ângulo, as identificações com os pais do mesmo sexo apenas constituem um

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Avaliação em Psicologia Clínica

destino particular do investimento libidinal, insuficiente em relação ao retorno incansável da


pulsão e do seu destino incestuoso.

Uma das razões para tal é que estas identificações ‘’homossexuais’’ não são óbvias e
são mesmo radicalmente postas em causa, nos dois sexos, por razões diferentes.

No rapaz, em primeiro lugar, a identificação com o pai coloca em questão o Édipo


Invertido, isto é, a posição feminina do rapaz em relação ao pai. Ora, esta posição é
dificilmente tolerada na medida em que implica a castração. Na rapariga, a identificação à mãe
edipiana também não é simples dado que na sua sombra transparece a imagem da mãe fálica
pré-edipiana. A identificação homossexual em particular tem muita dificuldade em conquistar
uma posição através dos arcanos do domínio e da dependência que caracterizam esta imago.

 Existe uma terceira saída que ocupa um lugar considerável: a identificação com o
progenitor do sexo oposto.
Apesar de existir renúncia à realização incestuosa, a identificação heterossexual não deixa de
permitir que se conservem laços privilegiados com o progenitor edipiano ou pelo menos com a
sua imagem.

A Castração Edipiana:

A castração edipiana está evidentemente gravada no destino biológico da diferença


dos sexos e o Superego masculino vai subsequentemente conservar um rigor não igualado
pelo seu homólogo feminino.

O receio desta medida de retaliação por parte do pai, não deve fazer esquecer o
contexto da maturação edipiana nem as ressonâncias que a castração implica na organização
psíquica e no universo que dela decorre. Pode-se reconstituir essa maturação, através dos
mistérios do recalcamento, como uma renúncia à omnipotência infantil de posse incestuosa,
pelo menos em parte, em proveito da aquisição de um Superego mais ou menos rígido e de
identificações mais ou menos problemáticas: sendo que para o homem a problemática é não
tenho ‘’o’’ falo e; para a mulher a problemática é ao nível de ‘’não ser’’ o falo.

A entrada no Édipo é o princípio de uma história singular na medida em que as pessoas


que nela se encontram implicadas estão elas próprias individualizadas.

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Avaliação em Psicologia Clínica

O conflito entre o Superego e as pulsões sexuais é apenas a trama mais evidente sobre
a qual se tece a neurose. O recalcamento, que é a sua primeira consequência, frequentemente
ultrapassado pelos acontecimentos, cede posição ao sintoma, que expressa a tal ponto os
resquícios de identificações inconscientes oriundas do cenário edipiano imaginário, que não
pode ser visto unicamente como uma formação de compromisso entre a pulsão e a defesa.

3. Formas pseudoneuróticas em patologia mental

De certa forma, o êxito da neurose prejudicou-a. Tudo o que não era do âmbito da
psicose foi abusivamente rotulado como neurose. Vamos então, eliminar sucessivamente:

 A «neurose» de angústia;
 A depressão dita «neurótica»;
 As «neuroses» fóbicas;
 As «neuroses» de carácter.

 A neurose de angústia
a) A Clínica da Angústia: a angústia aguda tem de particular que é uma angústia sem
causa, súbita e frequentemente paroxística que, deve ser, assim, distinguida da:
 Angústia, ou melhor, da ansiedade relativa a uma dificuldade real da vida,
particularmente intensa no período que antecede um prova qualquer;
 Mas também da angústia que aparece no contacto com certos objectos ou em
certas circunstâncias cujo valor simbólico é suficiente para a desencadear, apedar
de não haver causa real relevante – poderá, então, ser uma angústia fóbica, bem
diferente da angústia flutuante ou do surto de angústia que permanece sem
objecto;
 Finalmente, da angústia ligada a uma dor orgânica

A este propósito é importante distinguir o sintoma somático do sintoma psíquico:


quanto mais o sintoma pode ser especificado e preciso no seu desencadeamento, na sua
intensidade e na sua localização, mais se deve suspeitar da sua organicidade; quanto mais,
pelo contrário, o sintoma é difuso, indiscernível no conjunto corporal e mais ainda no conjunto
psíquico, mais a probabilidade de uma manifestação psíquica.

b) Significado de angústia: é na realidade um tipo de relação completamente


insuportável, não se pode organizar sem arranjos importantes que lhe retiram o seu
carácter de crise aguda. Com efeito, a angustia neurótica, como vimos, é a angústia de

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Avaliação em Psicologia Clínica

castração – o seu arranjo através do diversos mecanismos de defesa neuróticos, ainda


que sejam inconstantes e precários, deixam raramente a angústia no seu estado puro.

Por outro lado, a angústia esquizofrénica, consiste em sentimentos de transformação


interior e exterior com perda dos limites do Ego, daí a designação de angústia de
fragmentação. O surto de angústia está, neste caso, no máximo e é comunicativo, aos mais
alto grau, ao meio circundante.

Numa posição intermédia, existe um terceiro tipo de angústia. Com um


desencadeamento por vezes brutal, podendo fazer-se passar por uma doença orgânica –
ataque de pânico – ou desde logo instalada num contexto depressivo: angústia de ‘’falta de
ser’’, onde a menor perda do objecto afectivo é vivenciada como catastrófica. Angústia
depressiva dos estados-limite.

Assim, o grande surto de angústia é a principal porta de entrada para da psicose e da


depressão, e num grau bem menor da neurose.

 A depressão essencial (utilizada para designar depressões não psicóticas e não


neuróticas): opõe-se à depressão melancólica, caracterizada por um delírio de indignidade,
mas igualmente, à depressão neurótica verdadeira.
a) As ideias depressivas: não têm, nestes casos, um carácter delirante sendo que,
levam antes o sujeito a considerar subitamente as dificuldades da vida como
sendo insuperáveis. Passa de repente a subestimar as suas capacidades e a
sobrestimar o esforço, sendo que essa desvalorização permite-lhe fugir à luta e
consequentemente à angústia. No entanto, esta perda de auto-estima abre portas
à eventualidade suicidária.
O quadro é, muitas vezes, menor evidente na medida em que as perturbações remontam à
infância. Esta aflição manifesta-se regularmente por tensões corporais intervaladas com mal-
estar difuso, instabilidade ou mesmo uma irrefreável necessidade de resolver os conflitos pela
passagem ao acto.

b) O cansaço e o cortejo neurasténico que o acompanha, feito de anorexia,


impotência ou frigidez, hipotensão arterial, entre outros, associam-se em
proporção variável com as ideias depressivas.
c) O terceiro elemento da depressão dita neurótica é a insónia: é um sintoma raro
de não estar presente. Tudo ocorre como se a angústia, anulada durante o dia pelo

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Avaliação em Psicologia Clínica

investimento psíquico da depressão e físico da astenia, despertasse de noite,


provocando pesadelos e insónia.
A própria depressão parece coincidir com a recuperação de uma parte importante da
vida interior, quer seja devido a um luto quer a um insucesso da vida sentimental ou
profissional. Outro caso é quando existe um desmoronamento da vida psíquica, sentida aliás
como uma perda de energia vital. Todo o pensamento está centrado no corpo e é muito difícil
fazê-lo sair. A pobreza dos objectos internos é tal que só os objectos exteriores reais poder
servir de apoio. A perda do objecto afectivo não faz senão desvendar a fragilidade narcísica
subjacente. O ingresso precário numa situação genital é revelado e os mecanismos de defesa
contra a depressão que puderam outrora iludir já não desempenham o seu papel.

 As Neuroses Fóbicas aparecem na realidade em qualquer funcionamento de patologia


mental. Com efeito, se a existência das manifestações fóbicas – medos injustificados em
relação à presença de objectos ou de situações cujo papel só pode ser explicado através de
carácter simbólico – não é discutível, também é possível no entanto associa-las a uma
determinada estrutura.
Freud e a histeria de angústia: a situação foi esclarecida por ele na medida em que apenas
reteve, destas descrições, um só tipo de fobia verdadeiramente neurótica – a histeria de
angústia.

Outras fobias:
 De sintomas assemelham-se aos da neurose obsessiva, como o medo de objectos
sujos, de excrementos, de micróbios ou mesmo do cancro, ou à histeria como a
ereutofobia ou a fobia de impulsos;
 De medos que se integram num quadro mais complexo incluindo os surtos de angústia
ou os surtos de um estado depressivo. Esses medos dos estados-limite comportam
aliás, um pânico considerável tanto face a uma situação de solidão como de encontro
com um estranho, lembrando muito no fim de contas os terrores infantis;
 Finalmente, os processos que se situa francamente na linha psicótica. Tal como
acontece com a cancerofobia quando se reveste de um aspecto hipocondríaco marco
muito próximo de uma somatização quase delirante. A própria agorafobia, na sua
forma mais grave, confina à impossibilidade total de sair para rua sem ser
completamente acompanhado e pode então ser considerada como um verdadeiro
sintoma de cobertura, espécie de derradeira defesa contra a psicose subjacente.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Isto diz bem até que ponto as fobias são apenas sintomas que devem ser relacionados
com o seu contexto. Excluindo a histeria de angústia, cuja natureza sexual é, em principio,
evidente. Estas não podem ser consideradas como estruturas neuróticas.

 A neurose hipocondríaca: é uma designação completamente injustificada. A hipocondria


corresponde com efeito à crença numa perturbação doentia orgânica em relação com um
simples aumento das sensações cenestésicas normais que são, então, penosamente
vividas.
a) A hipocondria psicótica: indivíduos doridos, queixosos perante os quais todos os
cuidados e melhores vontades do mundo são ineficazes. A crença da sua
perturbação está enraizada e é quase delirante. Continuarão a passar por
médicos até que um diagnostico de organicidade acabe, por desgaste, ser
estabelecido. Mas, mais um vez, o sujeito não ficará satisfeito, apesar de ver as
duas ideias reforçadas, e todos os tratamentos fracassarão. Chegando a esta
fase, o ciclo persecutório pode encerrar-se pela passagem à psicose paranóide.
b) A hipocondria depressiva: pacientes que apresentam um surto de angústia, um
estado psicasténico com o cortejo mais ou menos variado de perturbações
diversas. A crença na realidade somática das perturbações não é total, a
agressividade e mesmo o simples pedido de ajuda são vividos de um forma
extremamente culpabilizada. O retorno masoquista é satisfeito pela intervenção
cirúrgica abusiva.

 As neuroses de carácter têm de particular o facto de serem ‘’neuroses sem sintomas’’,


latentes, mudas, tão confundidas com as exigências da sociedade moderna que, quando a
descompensação ocorre, se produzem perante o espanto geral: é como um pesado
carvalho que se parte de repente.
a) A personalidade de carácter: são personalidades hipernormais, activas, sólidas,
protectoras de quem as rodeia, cuja única discordância consistiria numa
tendência à invasão que parentes e amigos toleram quase sempre com crescente
dificuldade. A fragilidade de uma posição deste tipo só transparece realmente na
evidente incapacidade em questionar a sua própria pessoa e a sua concepção da
vida. O resultado de tal atitude é de três ordens:
 Hiperatividade com gasto considerável de energia que dá muito nas
vistas e é considerada como um sinal de êxito social;

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Dureza em relação aos que o rodeiam, tanto mais constrangedora


quanto é acrescida de uma equivalente dureza em relação a si próprio;
 Esterilização de tudo o que pode surgir da vida inconsciente com,
nomeadamente, uma sexualidade pobre ou mesmo inexistente sem que
isso constitua um problema.

No entanto, por detrás do autoritarismo e segurança de si mesmo transparece uma


considerável dependência em relação aos que o rodeiam.

Em certos casos, porém, o rasto libidinal permanece através do próprio conformismo


moral, sem qualquer suspeita de cumplicidade possa jamais ser emitida: controlo da
sexualidade alheia sob pretexto de moralidade ou de pedagogia, condenação sem apelo e
despropositada do erostismo e da pornografia, etc. A sexualidade destes indivíduos é menos
inexistente mas igualmente pobre apesar de ser considerada como normal.

b) A economia destas neuroses de carácter: a personalidade de carácter é


inteiramente definida por uma actividade e uma vontade de que se dizem ser
conscientes. Essa consciência, segura de si mesma, constitui uma sólida muralha
edificada ao nível do Ego, espécie de linha defensiva cuja rigidez evita a
emergência de afectos e tudo aquilo que se relaciona com a vida fantasmática.
Quanto à vida libidinal, esta manifesta-se no modo de formação reactiva, ou seja,
hipermoralismo. No entanto, diferentemente nas neuroses obsessivas, onde o
controlo se exerce ao nível dos objectos, aqui exerce-se ao nível do Ego deixando
filtrar a menor quantidade possível de elementos pulsionais.
c) Os diferentes tipos de descompensação: a descompensação, muitas vezes, é
uma trovoada num céu sereno. E com efeito surpreendente verificar como a
descompensação ocorre neste tipo de personalidades quase sempre quando o
individuo já não tem de se confrontar com dificuldades importantes. Ou então,
um facto desencadeado pode ser posto em causa e é a derradeira dificuldade
que faz vacilar o edifício considerado, até então, como sendo sólido.

Um primeiro modo de descompensação consiste na revelação de uma neurose


obsessiva subjacente, ou por vezes, a uma neurose histérica.

Todavia, o principal modo de descompensação é a depressão, cujo elemento


psicasténico é, muitas vezes, preponderante. Essa fraqueza é considerada como uma ferida

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Avaliação em Psicologia Clínica

narcísica terrível, tudo se passa como se algo tivesse sido, irremediavelmente, quebrado. A
fantasmatização é pobre e gira em redor desta recuperação de forças.

o Existe, ainda, outro tipo de descompensação: a psicossomática. Trata-se, então, de


variadas doenças orgânicas que muitas vezes balizam toda a vida dos doentes cuja
vertente de fantasmatização é, neste caso, quase nula.
o Finalmente, existe ainda uma outra saída da descompensação no idoso: a demência
senil melancólica ou delirante.

4. Neuroses autênticas
A histeria aparece, sem duvida, como a expressão de uma pulsão habitada pelo corpo,
ao inverso dos comportamentos obsessivos como fruto de uma mentalização, no entanto, esta
distinção não é suficiente. De uma maneira mais precisa, a histeria assume plenamente a
omnipotência da pulsão e as devidas consequências: da percepção vertiginosa do seu limite
extremo, o desejo de desejo insaciado, à sua incorporação fundamental, ou seja, o fantasma
incestuoso. É neste sentido que, com a histeria, toda a pulsão se tornará incestuosa.

Inversamente, no caso da neurose obsessiva, o isolamento obsessivo assume um papel


de referência essencial pela transformação da omnipotência pulsional em pulsão de
omnipotência, mentalizada sob a forma de pensamento todo-poderoso e secundariamente
incorporada em domínio omnipotente. O universo obsessivo é extremamente complexo na
medida em que faz intervir, nesta ruptura, um mecanismo muito primitivo: uma violência
fundamental omnipotente que se encontra a psicose em estado puro. Aqui, é imediatamente
infiltrada por elementos pulsionais eróticos que ocultam o movimento fundamental do
isolamento: transformação da omnipotência pulsional em pulsão de omnipotência, ou seja, de
omnipotência pela omnipotência.

Assim, quando os desenvolvimentos do imaginário obsessivo se confrontam com a


duvida, ou seja, com as falhas da omnipotência, tentam obliterá-la pela intervenção do
pensamento mágico, como as superstições confessadas ou inconfessáveis que nos habitam a
todos a diversos níveis.
As formas patológicas evidenciado os sintomas histéricos ou obsessivos típicos
aparecem desde logo como fracassos flagrantes dos esforços de adaptação do sujeito. Os
escapes caracteriais persistem mas são de certa forma ultrapassados pelos acontecimentos.
Isso corresponde evidentemente a situações em que os conflitos intrapsíquicos e edipianos

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Avaliação em Psicologia Clínica

e/ou pré-edipianos são preponderantes e só podem esperar resolver-se pelo aparecimento de


sintomas dispendiosos para a vida psíquica e para vida em geral dos indivíduos.

5. Histeria de Conversão

 Os sintomas médicos ou «somáticos». Os sintomas histéricos de conversão foram


primeiramente descritos no plano médico. Por muito clássicos que sejam, não são as
manifestações mais frequentes na histeria.

Os acidentes paroxísticos. Charcot afirmou: trata-se de uma cise de agitação


espetacular cujo simbolismo sexual está muitas vezes presente e que pode assumir todo o tipo
de formas, desde o acesso de sonambulismo em pleno dia até à imitação da crise de epilepsia.
Em geral, a perda das urinas as mordeduras na língua estão ausentes na crise histérica
enquanto estão presentes em ataques de epilepsia.

Os equivalentes menores: vão desde crises nervosas de agitação até desmaios súbitos,
entre outros.

As perturbações de aparência neurológica: as paralisias são perturbações mais


frequentes, sendo raramente bem constituídas clinicamente, quase sempre estranhas logo de
inicio; não há qualquer perturbação dos reflexos.

 Os sintomas psíquicos: apesar de coexistirem com sintomas somáticos, são quase sempre
suficientes por si só e são, aliás, muito mais frequentes do que os clássicos acidentes de
conversão.

A sedução e avidez afectiva: constituem o seu primeiro sintoma, primeiro na


apresentação e sobretudo no que ela tem de essencialmente subjectivo. Esta maneira de ser
do histérico foi descrita de múltiplas maneiras: necessidade de atrair a atenção sobre si
mesmo, egocentrismo, dependência afectiva, falta de controlo emocional, vaidade,
provocação, erotização da relação, etc. Na realidade trata-se de um mesmo e único
fenómeno, espécie de precipitação afectiva que tende a encurtar espontaneamente as
distancias relativamente ao outro.
A fuga ou amnésia: caracterizam com efeito o segundo movimento. Ainda que a
atitude de retraimento do histérico possa, por vezes, assumir a aparência de verdadeira fuga, a
maior parte das vezes manifesta-se de uma maneira muito mais subtil: é amnésia histérica:
trata-se simplesmente do esquecimento de um acontecimento no qual o paciente está

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Avaliação em Psicologia Clínica

demasiado envolvido nos seus afectos e tudo o que lhe diz respeito. Trata-se, por vezes, de
uma verdadeira amnésia das palavras que o histérico quer pronunciar e esquece
imediatamente. O fantasma essencial, por vezes realizado, não deixa de ser a fuga por
síncope, ou melhor, por inanição. Num menor grau, a fuga pelo sono é muitas vezes o seu
equivalente.
As relações sexuais são muito frequentes do que se diz classicamente e a frigidez
muito mais rara do que se pensa. No entanto, o comportamento sexual só se pode realizar
numa espécie de halo amnésico, não pode ter sido previsto e, em todo o caso, tem de ser
imediatamente esquecido.
O carácter histérico – o conjunto da atitude em causa corresponde portanto a um
duplo movimento de sedução – retraimento que marca esta verdadeira ambivalência ao nível
do corpo que é o sinal distintivo da histeria. Sendo a neurose obsessiva, por sua vez,
caracterizada por uma atitude de ambivalência ao nível do pensamento.

6. Histeria de angústia

É a fobia colocada sob o signo da sexualidade e, consequentemente, a única fobia


neurótica.

A Clínica: o riso dos jovens empregados que provoca a sua fuga desvairada quando
entra numa loja representa a projecção da sua culpabilidade interior em relação à cena de
sedução do velho merceeiro enquanto os jovens representam, por sua vez, os objectos sexuais
que poderiam comover o líder destes jovens.
O medo de sair à rua tem a ver com a mesma evocação da sexualidade, do ponto de
vista do inconsciente a rua significa o passeio e por conseguinte sair à rua significa andar pelos
passeios a oferecer-se.
7. A neurose obsessiva

Aspectos clínicos: o isolamento é o primeiro sintoma, o que significa que numa relação
a primeira coisa que impressiona é a esterilização da afectividade, dado que no obsessivo, o
pensamento substitui-se aos actos, ao ponto de haver desaparecimento quase total da
espontaneidade. Este pensamento vai servir de barreira permanente entre ele e os outros,
tanto que o primeiro movimento do obsessivo é de se retirar, distanciar, contrariamente ao
histérico. Esta atitude pode corresponder geralmente, ao carácter esquizóide.

451
Avaliação em Psicologia Clínica

Este distanciamento permite um afastamento de qualquer relação ou proximidade


afectiva, daí a frieza dos gestos e a ausência de emotividade.

A sua sexualidade é pobre e não pode manifestar-se, na maior parte dos casos, senão
num contexto sadomasoquista. Ao nível da fala, pelo contrario quando começa dá-se o inverso
e o obsessivo evidencia uma prolixidade a toda a prova.

A mente é de uma lógica inesgotável mesmo que nem sempre seja muito adaptada. O
desbragamento na expressão não o incomoda, mas também aqui se trata mais de uma
aventura intelectual do que uma expressão lúbrica. O que poderá dizer da sexualidade é
desafectizado e sem qualquer correspondência com a sua vida sexual real.

 O isolamento é uma verdadeira inibição dos afectos a respeito da qual nos podemos
interrogar se consiste num sistema defensivo ou num verdadeiro empobrecimento da vida
psíquica.
 O controlo obsessivo: é a segunda vertente da sintomatologia do obsessivo – as
preocupações, os temas de ordem, precisão, completude, mania de coleções. Importa,
todavia, eliminar duas acepções correntes desse controlo obsessivo: as obsessões sexuais
e a ideia fixa. Passar muito tempo a falar daquilo que não se faz é uma maneira segura de
isolar a sexualidade, as obsessões por sua vez, não são na realidade sexuais, antes pelo
contrario, caracterizam temas de ordem que, são meios para controlar ou lutas as pulsões
libidinais.
A ideia fixa, por muito repetitiva e obsessiva que seja, também não é uma obsessão.
 O carácter obsessivo: o controlo incessante assume, nestas pessoas, um papel
considerável desde as aquisições escolares da criança durante o período de latência até ao
domínio de um sistema económico ou industrial passando por todas as manias de coleções
seja de livros, móveis antigos, selos e, mais ainda, a manipulação do dinheiro. A
meticulosidade, a limpeza, a parcimónia e a obstinação são, em pano de fundo, os
elementos de carácter mais frequentemente encontrados. Assim, podemos perceber que
o imprevisto é a coisa mais temida. A gestão da distancia em relação ao seus objectos
afectivos, nem muito perto, nem muito longe, volta a ser posta em casa na mesma altura
em que a omnipotência do pensamento oferece duvidas.
 A superfície: a resposta imediata à perda do controlo obsessivo é uma reacção
brutal, ou mesmo destrutiva para os seus próprios objectos de amor.
 Mais em profundidade: a angústia latente nunca totalmente recalcada como na
histeria volta a surgir em força. A depressão, caso se instale, e apesar de latente,

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Avaliação em Psicologia Clínica

muitas vezes, não deixa de ser grave. O obsessivo suicida-se de um forma


metódica, sem alarido, contrariamente aos histéricos. Tanto assim que casos de
suicídios são quase sempre bem-sucedidos. Caso venha a escapar, a ferida
narcísica é intolerável e a reincidência é uma regra.
 O ritual obsessivo: é outro destino desta ambivalência do obsessivo. Por muito clássico e
demonstrativo que seja, não é sintoma mais frequentemente encontrado à semelhança da
grande conversão do histérico. Apresenta-se em primeiro lugar sob a forma de obsessão –
impulso classicamente descrita como a irrupção da duvida no pensamento e com ela, de
uma ordem interna considerada pelo individuo como um fenómeno mórbido e em
desacordo com o seu Ego consciente; ela persiste apesar de todos os esforços para se
livrar dela e, só desaparece com a sua realização (do ritual). Se observarmos bem, trata-se
da condensação dos dois sintomas anteriores: isolamento pelo carácter aritmético e
artificial desses impulsos e controlo obsessivo pela necessidade de repetição. Acresce um
terceiro factor: omnipotência do pensamento ou pensamento mágico.

Esta condensação, em si, revela-se muitas vezes inoperante: a angústia reinfiltra


continuamente o processo, daí essas repetições ad eterno, essas lavagens incessantes, essas
esquisitices de vestuário cuja incompletude reque novos rituais. É o que se chama de anulação
pelo ritual, que por contaminação progressiva acaba por chegar a uma rede compulsional
totalmente alheia à obsessão inicial, dado o deslocamento tão considerável.

Neuroses obsessivas, estados – limite e psicoses:

Nos casos em que o índice de histerização é fraco, ou mesmo inexistente, a


intensidade dos elementos depressivos é constante. As neuroses obsessivas cujos elementos
psicasténicos ou de carácter são frequentes afiguram-se desse logo como estados-limite cujo
arranjo neurótico permanece precário. O mesmo acontece na maior parte dos casos em que os
rituais dominam a sintomatologia. Verdadeiras passagens ao acto marcam o fracasso da
omnipotência do pensamento ao mesmo tempo que ficam sujeitos à sua influencia: o ritual
obsessivos, diferentemente da conversão histérica, permanece mediado pelo pensamento. Em
situação desconfortável proporciona, um equilíbrio instável cujo funcionamento conduz à
depressão grave mais ainda do que à psicose.

Quando finalmente os sintomas rituais obsessivos invadem a cena com mecanização


de comportamentos e apragmatismos, ou no caso das convicções conjuratórias se tornarem
quase delirantes, já parece tratar-se somente de estigmas neuróticos, defensivos
relativamente a uma estrutura psicótica subjacente.

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Avaliação em Psicologia Clínica

8. A depressão neurótica

Representa, antes de mais, um elemento preponderante na descompensação


neurótica.
O sofrimento ligado à desvalorização da imagem narcísica, seja qual for o factor de
conjuntura, modifica os processos de pensamento. Tudo se passa como se a vida psíquica
coagulasse num processo único que tende a querer ocupar todo o espaço: ruminação. Trata-se
de uma máquina infernal que corrói o sujeito pelo interior, escolhendo preferencialmente os
recantos mais dolorosos e paralisa o funcionamento mental ao ponto de provocar um
verdadeiro retraimento da maioria dos seus investimentos. Apesar das aparências, trata-se de
um processo muito activo, logo muito dispendioso: toda a energia psíquica disponível é
colocada ao serviço da ruminação.

Nas neuroses frágeis mas ainda não descompensadas a depressão permanece mais
discreta e frequentemente disfarçada. Por vezes, trata-se de uma aflição latente e familiar mas
os rebentos mais frequentes manifestam-se através de reacções de tipo agressivas às quais se
chama – perturbações caracteriais.

Existe, finalmente, todo o tipo de posições intermédias associadas a um mal-estar mal


definido ou mesmo a perturbações de natureza funcional que enchem os consultórios
médicos. Esses estados podem assumir a aparência de neurose de destino: neurose de
fracasso, neurose de abandono, nem todas são de considerar como sendo do âmbito das
depressões existenciais.

A natureza neurótica da depressão revela-se pela capacidade de utilizar a dor


depressiva para fins de elaboração psíquica apesar dos sintomas, da ruminação e até mesmo
da recusa.

A introdução de uma terceira pessoa (real ou fantasma) pode romper o circulo vicioso
da ruminação em prol de produções mentais mais associativas.

As situações de insucesso, de separação e de abando podem, assim, apesar das


circunstâncias, orientar-se para um trabalho de luto que indica a elaboração dos conflitos
edipianos: o afecto destrutor pode converter-se em afecto reconstrutor.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Assim, a depressão neurótica evidencia:

o Para além da severidade do Superego, a importância do vácuo narcísico do Ego


relacionado com a precariedade das identificações que lhe permitem construir.
o A integração ou não da castração edipiana através da capacidade de elaboração do
trabalho de luto
o A depressão neurótica aparece como a pedra-de-toque das condições de possibilidade do
trabalho de elaboração do pré-consciente e, por consequência, o local especifico da vida
psíquica.

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Avaliação em Psicologia Clínica

ESTRUTURA PSICÓTICA

A manifestação psicótica terá como primeira característica a de estar situada numa


estratificação “completamente outra”, merecendo, assim, verdadeiramente, o qualificativo do
alienado que lhe é atribuído.

A alienação de conteúdo, tal como se manifesta na alucinação, no delírio, nas “ideias


loucas” de toda a natureza, mas sobretudo a alienação quanto ao continente e esta é a
originalidade da psicose e também a sua gravidade relativamente ao funcionamento habitual
considerado como normal a alienação de continente incide primitivamente sobre a própria
estruturação do fenómeno mental, sobre a elaboração do pensamento tal como o vivenciamos
e conhecemos e manifesta-se especialmente sobre a maneira como o sistema nervoso
fisiologicamente sensível às diferenças perceptíveis está ancorada na dimensão diferencial e na
percepção das distâncias das relações e das estruturas.

Esta sensibilidade diferencial do sistema nervoso é-nos restituída em todas as formas


da actividade mental.

 Ao nível do real ou do imaginário


 Na actividade perceptiva, em que as diferenças formais são sentidas no recorte
espacial sincrónico da imagem.
 Nos fantasmas, em que se juntam às variações sincrónicas anteriores as variações de
ordem diacrónica da história, do acontecimento e da memorização.
 Ao nível do simbólico

Encontraremos o eco desta percepção diferencial na estruturação verbal que retoma


no recorte oposicional do significante, as articulações diferenciais do significado.

Assim, serão sucessivamente integradas numa rede de estruturas cada vez mais
diferenciadas, com crescente valor semântico, as percepções inerentes à receção de formas
reais e aos investimentos económicos que elas implicam por um lado (geradoras do
funcionamento da parte imaginária do psiquismo) em prol de uma organização cada vez mais
simbólica não deixando subsistir senão as linhas de estruturação esquemática estruturais (os
seus limites) para só reter finalmente os seus representantes verbais. Abandonam, assim, em
parte, a ordem da realidade (e do económico, que lhe está ligada) em benefício da organização
do semântico: esta compensa aquela… ou melhor, esta completa aquela.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Esta organização diferencial permanece o ponto fulcral do funcionamento psíquico são


ou neurótico, requerendo a existência separada e bipolar de um individuo e de um mundo
objectal (ou de representações deste).

Na impossibilidade de funcionar sobre este modo, encontrar-nos-emos na presença de


uma organização unipolar que funciona ou na clivagem absoluta (fundamentalmente outro,
alienado) ou na fusão (sem distanciamento objetalizante e portanto sem tomada de
consciência possível); tal se afigura no seu conjunto aquilo assume o papel de pensamento no
psicótico, tal nos parece ser o fenómeno mais notável que tentaremos traduzir nestas páginas.
O conhecimento teórico deste modo de organização psicótico, a sua abordagem dinâmica e
clínica, parece-nos com efeito dever ser considerada como mais notável do que a explicação
directa dos conteúdos ou do que as descrições clinicas que as exprimem.

Este estado de coisas explica as dificuldades muito particulares com que deparam os
terapeutas habituados antes do mais à elaboração e ao estudo dos conteúdos para abordar o
dos continentes, o qual constitui para nós o primeiro tempo de abordagem do psicótico, o
primeiro tempo mas não o único, evidentemente, pois o tempo propriamente dito do
“sentido” também existe no psicótico, apesar de relativamente dissociado dado que nem
sempre é recebido como tal pelo paciente, que durante todo um período o percorre, o atua,
mais do que o percebe.

É uma iniciativa eminentemente ousada a de queres descrever e tratar a psicose se


tivermos em conta que a particularidade principal da vivência psicótica reside como acabámos
de ver no desaparecimento relativo do quadro mental de referencia, aquele que qualquer um
reconhece implicitamente como sendo seu, como conteúdo das suas vivencias, aquele pelo
qual passa a nossa percepção, aquele que por conseguinte rege a estruturação mais habitual
dos nossos conteúdos, e que por essa razão também serve de quadro de referencia implícito
nas descrições clínicas a considerar.

Aqui já não são somente as personagens que são “loucas”; na psicose poder-se-ia dizer
que já não há personagem nem “mundo”: há fusão do todo ou funcionamento de fragmentos
clivados. Como descrever então a psicose sem fazer em primeiro lugar um esboço desse
funcionamento particular que, muito antes de se expressar por conteúdos significativos,
começará por impor ao interlocutor um modo existencial particular de mentalização, na qual o
carácter pré-objectal determinará um registo funcional e estrutural perfeitamente inusitado o
qual, repito, é específico da “loucura” psicótica.

457
Avaliação em Psicologia Clínica

É pois em primeiro lugar nesta abordagem formal, que implica elementos de


mentalização que lhe são próprios, que situaremos a primeira parte deste estudo da psicose;
quero falar da relação de objecto psicótica e das consequências imediatas sobre as suas
capacidades representativas e comunicativas.

 A palavra do psicótico

A actuação e o pensamento concreto: a inaptidão primária em existir de maneira


diferencial levar-nos-á a falar da linguagem do psicótico como de uma não-linguagem; esta,
com efeito, não fará mais do que expressar, excluindo a diferenciação significante verbal, a sua
insuficiente abertura a qualquer alteridade pela imaturidade da relação de objecto fusional
que comporta. Empenhar-nos-emos portanto, preferencialmente, em sentir à maneira do
psicótico a experiencia vital que ele percorre e a sua maneira de a traduzir. Introduzir-nos-
emos também a esse nível no registo que faz para ele ofício de linguagem, com um valor mais
expressivo do que propriamente comunicativo, provavelmente mais próximo como vimos do
modo de funcionamento pela actuação do que de um funcionamento verbal. Chegaremos
então aos aspectos mais arcaicos da existência e da comunicação, verdadeiro aquém relacional
próximo da fusão na qual, diferencialmente do que acontece com o neurótico ou o sujeito são,
não há mais do que uma experiencia fusional ou clivada.

O terapeuta começa por ser parte interessada e por conseguinte estruturante do


individuo no seu ser antes da sua introdução, por uma distanciação nascente no registo
Pessoante e pessoado do ter, fundador, na alteridade, da palavra e da tomada de consciência
da realidade.

No psicótico, a insuficiência, ou mesmo a inaptidão, em distanciar-se no aspecto


imaginário e simbólico deixa naturalmente espaço para sistemas equivalente de expressão
directa das pulsões, não por mentalização mas por reificação.

Com efeito, não se trata de um verdadeiro fenómeno mental, de uma ideia ou de um


desejo mas de uma verdadeira coisificação de qualquer esboço de mentalização. O carácter
normalmente imaginário do pensamento dá lugar à reificação alucinatória ou delirante pela
qual uma neo e pseudo-realidade substitui na imanência percepcionada da sua materialidade
o carácter aleatório e unicamente representativo do que seria uma actividade imaginária
verdadeira, evocadora do ausente.

Esta tendência à reificação também encontra uma saída na organização materializada


e “atuada” do campo existencial, no qual um certo recorte organizador da realidade – com

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Avaliação em Psicologia Clínica

valor interpretativo – passa a ser o depositário externo e reificado do que teria sido
normalmente do domínio interno da intenção e do desejo.

Esta exteriorização reificante permite assim substituir a tomada de consciência interna


de um desejo (isto é, o insight): por uma encenação dramatizada visando uma certa
organização do exterior, modalidade reificada e transposta para o exterior num efeito
evidentemente defensivo, do que deveria ter sido do sistema interno e subjectivo do
pensamento e do afecto; é o que certos autores chamaram “o pensamento reificante do
psicótico”.

Um “recorte” interpretativo e projectivo da realidade faz ofício de pensamento e vai


servir de campo relacional para o psicótico, apesar de ser o campo da linguagem e do
pensamento, espaço habitual de encontro electivo e privilegiado, que está normalmente
encarregado dessa função.

Por todas estas razões, a abordagem do psicótico far-se-á muito melhor ao nível
concreto do gesto, da mímica, das exclamações ou dos gritos, das conotações ou das intenções
que percepciona electivamente nos seus interlocutores, do que ao nível verbalizado, triunfo da
elaboração pré-consciente dos pensamentos conscientes numa actividade denotatória
rigorosa. Alem disso, é por essa mesma razão que ele poderá mais facilmente “representar” as
suas pulsões ou “ser representado” numa actualização mimada e acentuada, próxima do
psicodrama, do que estaria à vontade numa psicoterapia puramente verbal. No psicótico, é a
articulação entre estes dois registos que se revela primordial para qualquer actividade de
comunicação.

Mais ainda, pela sua aptidão em identificar-se no fundo mais do que em erigir-se numa
forma separada, o psicótico vai “integrar-se” melhor por identificação à conversa entre dois
interlocutores próximos do que inserir-se num verdadeiro diálogo (é pela mesma razão que
prefere também por vezes falar de si na terceira pessoa). Há aqui um tempo de maturação que
se deve saber respeitar a todo o custo no psicótico.

Mais sensível aos valores absolutos, às quantidades de energia que o animam e que
sente directamente na sua vivência corporal profunda, do que à percepção mais intelectual
das diferenças e das qualidades, o psicótico será sempre mais sensível à “música” do que às
“letras”… digamos, para ser mais explícito, que nele uma não dispensa a outra e que o acesso
ao tempo verbal secundário deve ser precedido ou acompanhado logicamente pelos vários
níveis de actuação.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Esta noção deve ser na minha perspectiva a pedra-de-toque de toda a compreensão


e de toda a abordagem psicoterapêutica da psicose e do psicótico.

Esta particularidade do funcionamento psicótico leva-nos a considerar a importância


fundamental da sua abordagem terapêutica em instituição (e não só sob forma de entrevistas).
A instituição para psicóticos deveria, tanto pela sua estruturação como pelo seu
funcionamento, ser o espaço privilegiado das actuações, da sua recolha e da sua integração
progressiva numa organização significante verbal secundária, lugar portanto de passagem
electiva do outsight ao insight pelo jogo das introjecções bem-sucedidas.

Sem entrar em pormenor nestes métodos, mas para articular a relação de objecto
particular do psicótico com a vertente terapêutica à qual naos e dedica no entanto este
compêndio, salientarei a título de exemplo duas modalidades de abordagem do psicótico pelo
agir institucional.

Tendo identificado na prática que após o período de tratamento na instituição, a saída


por um certo tempo estabelecido à partida fazia passar o sujeito de um sistema terapêutico
institucional real (pela sua presença) para um sistema apelando à evocação imaginária
(durante os períodos de ausência) tem lugar na realidade, quando se sabe respeitar um certo
prazo de ausência (nem muito curto nem muito longo, variável consoante os sujeitos e os
períodos de tratamento), uma acentuação considerável das introjecções pelo jogo reforçado
das alternâncias de presenças e de ausências, retomando nesse aspecto o desenvolvimento
genético da mentalização normal baseada igualmente na ausência e na presença do objecto.

O estudo da relação de objecto dará progressivamente lugar à organização clínica,


semiológica, constituindo a bem dizer as modalidades clínicas constitutivas de um certo
reagrupamento sintomático definido pela nosografia clássica.

Neste caso, a perspectiva descritiva pura intervém muito pouco, em relação à


“tomada” relacional e pela mesma ocasião terapêutica que instaura ao coloca-la. Finalmente é
sobre as particularidades terapêuticas que uma compreensão deste tipo deixa entrever que
terminaremos este delineamento da psicose, consciente da brevidade clinica que impusemos
voluntariamente a nós próprios em prol de uma proximidade dinâmica máxima cujo interesse
clinico e eficácia terapêutica compensarão a pobreza académica.

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Avaliação em Psicologia Clínica

1. Relação de Objecto Psicótica

A psicose parece que se caracteriza essencialmente por uma fixação e uma não
superação do registo pré-objectal. À partida, o latente participa por assim dizer no modo da
fusão e da identificação a uma totalidade fusional em que não existe ainda separação entre o
indivíduo e o meio que o rodeia e onde as trocas não são ainda percepcionadas como uma
aquisição (do registo do ter) mais como uma simples expansão do seu ser. Percebe-se desta
forma a predominância nesta “diálise” dos mecanismos de absorção e difusão próprios deste
período que levaram a defini-lo como pertencendo a uma fase oral do desenvolvimento.
Lembremos desde já que se entende por esta designação não só mecanismos mas sobretudo a
um nível de estruturação (e portanto de pensamento). Esses mecanismos fazem precisamente
intervir manifestações de tipo oral – pela boca, olhos, nariz, ânus, pele, etc.. antecedem
geneticamente a possibilidade de distinguir um dentro e um fora (com os limites que isso
implica e naturalmente o espaço que circundam, base do futuro Ego).

Os modos de funcionamento desse sistema, afigurando-se como essencialmente


ligados à entrada ou à saída, serão presididos pelo fenómeno de dupla polaridade da
introjecção (meter para dentro) ou da projecção (meter para fora) sem que haja jamais, nesta
fase, unipolar por excelência, a constituição de um verdadeiro distanciamento objectal, sem
que haja também diferenciação entre a realidade interior e o meio circundante. A repetição
sucessiva dos períodos de ausência, seguidos do regresso da mãe ou da pessoa encarregue de
cuidar da criança, vai implicar a intervenção sucessiva de períodos alucinatórios de desejos
(com a insuficiência das satisfações que acarreta) e a sua diferenciação da satisfação
verdadeira pela presença real do objecto exterior de que a criança necessita. As alternâncias
de períodos de satisfação ou de necessidade correspondendo por sua vez às manifestações
alternadas das pulsões, particularmente da pulsão alimentar (sem que haja no entanto nesta
fase ausência de vivencias de outra ordem) as sensações alternantes de plenitude e de
vacuidade, de bem-estar e de carência não tardarão normalmente em organizar o sujeito em
entidade funcional, como lugar de vivência e, melhor dizendo, como sujeito.

Esse lugar é, primitivamente, único à partida (apenas existe o individuo de impressão


que é o latente na sua vivencia unipolar).

A repetição da presença e da ausência associada à satisfação e à carência vai permitir


pouco a pouco isolar o sujeito vivenciante do seu polo exterior que, graças a essas
experiencias, não vão tardar em ficar dissociados de acordo com uma linha funcional divisória
definida pela ausência possível e a carência (própria dos elementos exteriores) e a

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Avaliação em Psicologia Clínica

permanência da vivência e a imediatidade da percepção (delimitando o sector próprio do


sujeito e do seu meio interior).

No sujeito normal, a passagem desta situação fusional e narcísica unipolar para o


reconhecimento progressivo de urna distanciação bipolar sujeito-objecto inaugura as primeiras
manifestações da autonomização do Ego separado pouco a pouco do meio circundante. A
existência “de um Ego separado do objecto que o origina” sela a passagem de um modo de
existência unipolar à bipolaridade objectal, passagem essa que resolve o que os analistas
designam como situação pré-objectal, caracterizando o modo de relação de objecto com o
mesmo nome, diferenciada da relação dita objectal, que se caracteriza pela separação do
sujeito e do objecto.

O feliz desenlace deste processo de maturação, chamado de personação, delimita


igualmente a superação da zona de funcionamento psicótico e a entrada na problemática
neurótica ou normal.

No plano do funcionamento mental, a organização de um Ego separado não Ego vai


permitir a diferenciação entre a realidade exterior e a interior (ou fantasmática) por um lado, e
revela-se por outro lado contemporânea da maneira de ser comportamental e psíquica
particular, articulada de maneira fundamental sobre o reconhecimento implícito do sujeito
separado dos objectos, separação suscitável de ser expressa nos seus conteúdos psíquicos,
pelas representações (distinguidas das percepções da realidade exterior) e enfim transmissíveis
verbalmente. É precisamente a aquisição dessa existência separada, desse Ego pessoa, que se
revela deficiente no paciente psicótico.

Mãe do psicótico:

Independentemente dos factores orgânicos que podem intervir nas perturbações do


desenvolvimento mental, o factor educativo e por conseguinte o papel dos elementos
genéticos, especialmente da relação materna primária – como objecto fundamental de
identificação estruturante – revelam-se extremamente importantes.

Deve ser atribuído um lugar muito especial à mãe do psicótico, a qual pode pelas suas
atitudes profundas manter o latente e mais tarde o paciente numa situação nada propícia a
facilitar a eclosão das manifestações pessoantes:

 Uma mãe hiperprotetora – não permitindo à criança aceder ao registo do desejo ao estar
sempre presente (e ao prevenir os seus menores desejos que torna assim inexistentes).

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Avaliação em Psicologia Clínica

 Uma mãe ausente – mais raramente, que não permite à criação ligar (é o tempo do
desejo) a espera penosa e as representações do objecto desejado.

Nestas duas ocorrências, o elemento notável revela ser a manifesta insuficiência do


desejo.

No primeiro caso: uma insuficiência de motivação pela presença excessiva da mãe


previne o “vácuo” no qual o desejo toma consistência.

No segundo caso: a figuração é tornada inútil pelo fato de nunca estar completada (e
por assim dizer reforçada como tempo intermédio) e mais tarde como sentido pela experiencia
da satisfação que já não a conota para a criança negligenciada.

O mesmo acontece com a criança satisfeita a contratempo: caso da mãe que “não
ouve o pedido” (aquela que lhe dá de comer quanto tem frio ou que o tapa quando tem fome)
e que injecta o seu próprio desejo.

Esta é a forma de discordância entre uma necessidade fisiológica que se exprime e o


sentido (desviante) que a mãe lhe confere (um pouco como numa falsa interpretação); a
criança grita e a mãe não sabe reconhecer e nomear a pulsão. Não poderá tão-pouco integrar
mais tarde por identificação essa função geradora do insight. Estamos aqui perante uma das
mais sólidas raízes da inaptidão em mentalizar as pulsões, em representá-las, em dizê-las. É
também uma das manifestações mais frequentemente encontradas no psicótico no qual a
função do desejo perturbada revela-se incapaz de significar realmente o movimento pulsional.

A função materna não se restringirá porém a esse papel todavia tao importante de
ligação (ou se preferirmos de soldadura) da moção pulsional em vias de emergência com o seu
objecto significante.

A esta deficiência fulcral no seu papel estruturante em relação ao continente – do


desenvolvimento das capacidades de representação pulsional – somar-se-ão as importantes
deficiências ao nível do conteúdo, consecutivas à própria natureza dos constituintes e em
relação directa com a sua organização mental: a mãe do psicótico não soube deixar instalar-se
o esboço de uma relação pessoada, essencialmente impelida, como vimos, pela sua própria
necessidade patológica de exclusividade. Este estado de espirito tenderá igualmente a afastar
a criança de qualquer saída para o exterior e nomeadamente para esse outro que representa
habitualmente o pai do psicótico. Não só a omnipresença materna tornará impossível a
instauração da relação entre a criança e o seu pai, como no plano imaginário (no plano da

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Avaliação em Psicologia Clínica

relação existente entre o imaginário da mãe e o imaginário desabrochante da criança),


eliminará fundamentalmente dos seus próprios conteúdos tudo o que pode lembrar e evocar o
lugar da terceira passagem, do Outro, do pai, tudo o que poderia a esse nível introduzir a
criança numa dimensão triangular pela presença reconhecida de uma terceira pessoa no
imaginário da mãe e no seu discurso.

Este fenómeno que foi introduzido na problemática analítica sob o nome de forclusão,
assume uma importância decisiva na edificação egóica insuficiente do psicótico.

Com efeito, por pouco que o pai do psicótico se mostre por sua vez em falta, que não
possa pela sua própria intervenção ajudar a criança na sua separação da mãe, a criança
acabará irremediavelmente confinada ao registo Unipolar e fusional impróprio para uma
implantação objectal satisfatória, improprio também para um bom funcionamento mental.
Constrangido na sua conquista do objecto e na instauração da sua autonomia, o psicótico
(parte não diferenciada da mãe pré-objectal) nunca poderá “acordar” qualquer busca objectal
à sua necessidade, alienado por definição e poder-se-ia dizer por essência, acabará por
constituir de forma discordante dois polos de funcionamento que se ignoram, acarretando
uma verdadeira dissociação do económico e do sentido com:

 Um polo interno de crescente – pressão pulsional – visando a descarga espontânea das


pulsões (realizando-se então electivamente por passagens ao ato, directas mas não
mentalizadas) com valor essencialmente económico.
 Um polo externo de representação (dado que possui o equipamento mental necessário)
que não expressa o seu desejo, desacordado como sentido mas que não será mais do que
o eco alienado de um exterior irremediavelmente estranho, não mediatizado pelo desejo e
pela pulsão – dai a alucinação e o delírio.

Esta última característica explica o aspecto “discordante” particular do psiquismo


psicótico que por vezes não é mais do que um reflexo do exterior e dos outros, bastante
semelhante neste ponto ao que os psicossomátistas descreveram sob a designação de
reduplicação projectiva.

Trata-se de uma elaboração de pensamento trazida do exterior, por assim dizer


injectada na corrente de pensamento por via recorrente. Este pensamento não expressa a
percepção da realidade na dimensão afectiva e selectiva do sujeito e das suas pulsões.
Representa somente a organização do campo mental sobre um modo semelhante à

464
Avaliação em Psicologia Clínica

reprodução do percepcionado e consoante as modalidades funcionais que caracterizam esta


função nervosa.

Um pouco como o computador organiza as mensagens que recebe em função de


certos programas oriundos do exterior, sem poder jamais acrescentar o menor dado que seja
pessoal, o psicótico organiza muitas vezes de acordo com a possibilidade fisiológica que tem –
de acordo com uma programação de ordem sensorial que é definida pela existência de um
sistema nervoso – as imagens e percepções numa sintaxe que não é a expressão de um desejo
ou de uma escolha sentida como pessoal. Aparece como um reflexo da organização exterior
trazida por assim dizer de fora.

Sendo incapaz de produzir e de reconhecer como suas as representações incumbidas


de o significar, o psicótico não tem a possibilidade de separar uma actividade de mentalização
figurando um desejo – reconhecido como tal – como actividade mental de origem interna.

Será, então, facilmente fonte de equívoco alucinatório ou delirante que não faz senão
expressar essa inaptidão em separar o real do fantasmático não assumido como tal:
projectará, ou seja, constituirá sob a forma perceptiva de uma pseudo-realidade externa, os
elementos figurativos dos seus movimentos pulsionais (internos) sem sentir, como é
normalmente o caso, toda a subjectividade que caracteriza no sujeito normal a vivência
habitual do desejo na sua elaboração fantasmática e representativa, enquanto imagem mental
diferenciada da percepção.

Assim, a psicose foi definida como modalidade de mentalização caracterizando a não-


separação do sujeito e do objecto (sob o signo da fusão e da não pessoação) e os grandes eixos
sindromáticos reagrupando sob “designações diversas” os grandes conjuntos funcionais
correspondendo às formas particulares de relação de objecto previamente definidas e unidas
nos recortes de uma taxinomia nosográfica.

Organização do Ego:

Marcada pela maior ou menor ausência da organização objectal, é a diversos níveis


deste percurso – o qual vai desde o narcisismo primário até à organização anal, passando da
fase oral esquizoparanóide para a depressão diriam os kleinianos, sem esquecer os aspectos
específicos da passagem do objecto dito parcial para o objecto total – que se vão desenrolar
essas diferentes estratificações da relação objectal e os seus aspectos clínicos. Essas fases
ocupam, como sabemos, todo o período dito oral da organização libidinal, que encontramos

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Avaliação em Psicologia Clínica

nos pacientes psicóticos fixados aos diversos graus desta estruturação pré-objectal (e,
naturalmente, pré-genital).

A organização do ego – que não atingiu a fase objectal e as suas estratificações,


organização – que nas suas fases (orais, anais e fálicas) permite aceder progressivamente aos
aspectos essenciais da estruturação objectal (sobretudo edipiana). Por outro lado, esta
organização do ego levanta os aspectos semiológicos e clínicos desta problemática que visa
essencialmente a organização normal ou a neurótica. Ao psicótico apenas falta a progressão
maturadora dessas estruturações sucessivas e o seu acabamento na primazia genital, e não,
como se poderia pensar, as experiências sentidas da vivencia anal ou genital que estão
naturalmente presentes no psicótico (que não deve ser confundido com o latente como se vê
demasiadas vezes): o psicótico teve, durante a sua vida, experiências da série anal ou genital;
as fases de estruturação anal ou genital é que estão mal definidas no caso dele.

Pseudomecanismos:

Consoante os casos, encontramos no psicótico mecanismos de defesa neuróticos, do


tipo obsessivo ou histerofóbico, ou mecanismos muito mais regressivos implicando um cerdo
regresso ao narcisismos primário (tal como no autismo e no apragmatismo esquizofrénico),
tendo toda a sintomatologia somente um valor de empréstimo, representando para o paciente
as tentativas de solução de um género ou de outro sem que se trate de uma organização
estrutural verdadeira, e especialmente sem a solidez que caracteriza as estruturas verdadeiras.

Significa na realidade a utilização de conjuntos funcionais existindo no paciente tais


como a possibilidade de “fazer obsessões” ou de “fazer angústia” nas quais eventualmente a
angústia de castração permitirá escapar temporariamente à angústia de fragmentação que o
poderia oprimir em certas situações.

É assim que se observam, por exemplo, autênticas psicoses esquizofrénicas


“agarrarem-se” desesperadamente a certas formações obsessivas que as ajudam a manter-se
in situ qual estaca plantada em terra solta, apresentando o que se designa então, para as
distinguir das manifestações que existem numa verdadeira estruturação obsessiva, como
obsessões degenerativas, que são muito diferentes quanto à sua compreensão. Limitar-nos-
emos no que se segue a apresentar os principais reagrupamentos sintomáticos aparecendo
sob designações diversas e em entidades clinicas diferentes como modalidades de organização
a diferentes níveis da estruturação pré-objectal.

466
Avaliação em Psicologia Clínica

2. Organização Clínica
Autismo:

O autismo esquizofrénico caracteriza o primeiro e mais arcaico desses níveis de


organização, cuja manifestação essencial reside, para fugir ao “trauma” de uma impossível boa
relação com objectos circundantes, numa fixação electiva e persistente a um movimento de
desinvestimento sistemático do mundo exterior e no regresso sem representação e sem
mentalização (a qual faz intervir os objectos e o exterior) a uma vivência próxima do biológico.
O que e encontra realizado no regresso ao estado narcísico primário invocado para o sono,
sono esse que pode, aliás, ser manifesto em certos sujeitos que “dormem” ou pelo menos que
se mantêm num clinostatismo mais ou menos permanente, na clássica “posição fetal” que
evidencia bem o extremo nível de regressão da sia vivência habitual. Esta posição autística
pode aliás acompanhar-se nas formas extremas de um rejeição sistemática de todos os
contactos e designadamente de uma recusa alimentar que pode vir complicar
consideravelmente o prognóstico no plano vital.

Impõem-se, a este nível, uma chamada de atenção quanto às possibilidades de


compreensão de tais estados regressivos. Se podemos de fato invocar com base em
manifestações deste tipo o regresso a uma situação fetal, com a relação materna intra-uterina
que isso implica, seria porém profundamente errado pensar numa qualquer intencionalidade
significante por parte do paciente (o que diferencia das manifestações histéricas podendo
realizar a mesma sintomatologia exterior).

Assim, trata-se muito mais de uma tentativa de regresso ao zero objectal assumido
numa reificação com valor de actuação primária, descarregando fora de qualquer
mentalização e de qualquer intenção significante, fora da comunicação também, a vacuização
sistemática de tudo o que poderia de perto ou de longe implicar uma qualquer dependência
objectal ou relaciona mesmo ao nível puramente representativo (destruição do pensamento).

Suprime, assim, qualquer possibilidade de construir o menor desejo cuja elaboração se


encontra, por assim dizer, escamoteada. Este último é substituído pela sua reificação imediata:
a actuação substitui o desejo, impedindo-o assim de aparecer.

É desta forma que a passividade total e atuada que encontramos nesses


apragmatismos esquizofrénicos substitui antecipadamente qualquer desejo (e qualquer
consciencialização do desejo) de regressar, num movimento em direcção a um narcisismo
primário, à bem-aventurada totalidade de uma posição omnipresente anterior à dependência

467
Avaliação em Psicologia Clínica

objectal. É com esta atitude que julgamos poder relacionar o essencial do processo de
cronicização – hospitalar ou não – que é atribuído à passividade do paciente perante a sua
doença e o seu mundo exterior. A solidez a toda a prova desses estados bem conhecidos nos
“asilos” traduz na realidade uma estabilidade económica fundamental, obtida no conforto
relativo desta vivencia de omnipotência que esta posição anobjectal lhes confere.

Catatonia:

Um outro nível dessa posição anobjectal é obtido na catatonia que é uma contractura
muscular quase total com rigidez do tronco e dos membros, cujo essencial reside no plano da
musculatura numa contracção simultânea dos músculos agonistas e antagonistas, fixando de
uma forma curiosa toda a motricidade segmentar e dando ao paciente uma aparência
estatuificada (chamada conservação das atitudes).

Este fenómeno muscular, de resto clássico nestas formas clinicas de esquizofrenia,


implica uma vivência muito específica, na qual um dos aspectos fulcrais é seguramente
constituído por “bloqueio” antecipado de qualquer movimento, e por conseguinte de toda e
qualquer diligência em direcção a um objecto. A posição catatónica implica segundo creio,
sobre o modo muscular atuado, o desaparecimento real de toda a iniciática motora (e portanto
do prazer que esta implicaria) num sujeito assim dispensado antecipadamente de qualquer
busca objectal.

Delírio Paranóide:

Outro elemento dessa relação de objecto pré-objectal é sem dúvida (e,


provavelmente, o mais conhecido), a criação alucinatória ou delirante com que deparamos,
em clínica, na esquizofrenia paranóide. Tudo se passa nessa altura como se o sujeito, que já
não tem a possibilidade de se manter no anobjectal (como era o caso anterior), não fosse
ainda capaz de situar no objectal verdadeiro (ou seja, como Ego-sujeito, separado do seu
objecto, que seria sentido como objecto-separado do meio ambiente, fenómeno em que se
poderia falar da existência de um objecto separado e total).

Nesta fase intermédia, situa-se um nível de relação de objecto particular, no qual os


objectos existentes já não são negados, mas no qual também não são apreendidos como
separados do sujeito (e pertencendo portanto ao mundo exterior diferenciado), tratando-se de
uma fase pela qual o objecto, consubstancial ao sujeito, é sentido como pertencendo ao seu
ser (apreendido) mas não ainda ao seu ter. Nesta experiencia é impossível separar a priori o
objecto externo verdadeiro, fonte de satisfação pulsional, da sua representação alucinatória,

468
Avaliação em Psicologia Clínica

prefiguração externa do desejo, no qual há reactivação alucinatória (de origem interna) do


rasto mnésico de uma satisfação prévia sentida ao seu contacto.

A esse nível o sujeito ainda não é capaz de distinguir o seu desejo ou o seu fantasma
da percepção exterior que para ele tem o mesmo valor. Donde resulta habitualmente uma
confusão profunda entre o real e o fantasmático, entre o interior e o exterior, entre a
experiência objectiva e subjectiva, os quais precisamente nesta fase intermédia não estão
separados.

Isto explica a riqueza particular destas formas clínicas em manifestações alucinatórias


ou delirantes.

Os objectos não são apreendidos separadamente e como totalidade separada senão


por um sujeito total (entenda-se por aí: separado do meio circundante e em relação com ele
após a constituição do Ego). No psicótico, os objectos são percepcionados com parte
constitutiva do seu ser e aproximamo-nos aqui da realidade de objecto parcial. Sendo a
qualidade de objecto parcial coextensiva, esta noção de sujeito parcial, que caracteriza
precisamente o polo do sujeito, antes da verdadeira constituição de um Ego separado, fundado
no mesmo movimento como sabemos o sujeito total separado dos seus objectos igualmente
totais.

Esta característica do objecto total justifica a aptidão para a projecção alucinatória ou


delirante de uma parte do sujeito nessa outra parte dele próprio que é nesta fase o munto
exterior, do qual não se encontra diferenciado. Esta definição do carácter parcial do objecto
(parte do Ego não diferenciada) não é a definição adiantada por Klein, mas explica a relação do
sujeito com o seu objecto parcial que vem juntar-se aos estudos kleinianos. A definição
kleiniana do objecto parcial revela a possibilidade de colocar num processo de clivagem a
parte má do Ego para dora do sujeito (ficando a parte boa interiorizada) – operação
denominada de a projecção do mau objecto. Esta operação apenas é realizável nesta fase
devido à não separação do sujeito e do objecto. Este movimento de projecção para o exterior
sob forma alucinatória ou delirante do objecto mau representa um dos mais típicos
mecanismos do movimento oral que é representado como sabemos ao longo de todo este
período pela possibilidade de deslocamento num movimento de diálise indo de um dos polos
para o outro (polos não ainda separados nesta fase como subjectal e objectal). Nalguns dos
seus elementos constituintes. A vantagem dessa projecção psicótica reside na possibilidade do
afastamento para o extremo distal da parte má, é a projecção no meio exterior, consubstancial
(e não sobre o meio exterior como se vê na projecção fóbica neurótica, por exemplo).

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Avaliação em Psicologia Clínica

Essa atitude caracteriza-se no plano clínico pelo aparecimento de manifestações


delirantes ou alucinatórias nas quais o sujeito vivencia como “exógeno” o que poderia ser
sentido como mau (como é o caso das ideias delirantes de perseguição em que a agressividade
do sujeito é reportado aos outros, ao exterior), conservando também para si as vantagens
indiscutíveis no plano económico de uma tal situação: o interior permanece bom, o sujeito
pode desta forma continuar a gostar de si mesmo e a considerar-se digno de amor nesta
situação privilegiada.

Nesta fase específica da relação de objecto esquizofrénica, tudo parece vivenciar uma
indefinição considerável da função do sujeito topicamente disperso em múltiplos ilhéus
caracterizando a vivência dita “fragmentada” da existência esquizofrénica no seu contexto
clínico mais acentuado: a alienação. Esta representa o funcionamento característicos desses
Egos estruturados funcionando por isso unicamente sobre o modo parcelar do individuo
parcial e do objecto parcial sem poder jamais alcançar uma elaboração mais completa de um
Ego diferenciado do seu mundo objectal. No plano clínico, essa atitude traduzir-se-á pelo
aspecto particularmente “flutuante” dos pacientes que nunca podem por assim dizer “focar-
se” sobre a realidade do momento.

Delírio Paranóico:

Na organização de tipo paranóico da personalidade tudo se passa de forma diferente.


Esta é caracterizada pela sobrestima de si próprio e o desprezo pelos outros e representa a
evidencia de um “Ego organizado e não alienado” – isto é, um Ego topicamente erigido – capaz
“de uma abordagem organizada, de uma ato reflectido, moldado numa forma social
conhecida”.

Nestas estruturas mais “evoluídas” do que as anteriores, o Ego é aparentemente


constituído como existente, mas só pode admitir a existência objectal, na medida em que o
objecto lhe permite assumir a omnipotência do seu controlo sobre ele. Esta é uma condição
essencial da organização objectal do paranóico.

Trata-se, assim, de uma contra partida narcísica evidente para o Ego particularmente
frágil cuja omnipotência afirmada constitui a única forma de compensar a perda – que fere
sempre o narcisismo – da omnipresença primitiva. Se o sujeito não está em todo o lado, tem
pelos menos de ser o centro, o agente determinante e criador, ao qual o objecto “deverá a sai
vida e a sua função”.

470
Avaliação em Psicologia Clínica

O objecto não é considerado em si próprio, não é mais do que um instrumento que


nunca será separado do seu criador senão para lhe confirmar assim a menor custo a impressão
da sua omnipotência e do seu formidável valor do qual não pode abdicar.

Assim como o paranóide pode, se o desejar, dispersando-se, separar a boa parte de si


próprio da má que clivou, o paranóico (constituindo-se de forma fictícia em individuo
separado) só o consegue na expressa condição de controlar a repartição dos bens,
adjudicando-se a todo o custo o que pode ser bom. Há dois ou mais indivíduos fragmentados
na paranóide para quem a constituição do objecto permanece aleatória, e há apenas um
sujeito perfeito e um objecto-caixote do lixo para o paranóico que só pode erigir-se em
entidade separada na condição de ser a melhor parte do sistema.

O que explica também em parte a escolha homossexual preferencial destes pacientes


que se procuram em todo o lado nesta atitude. A escolha homossexual do paranóico
perfeitamente assinalado por Freud, representa na realidade uma escolha intermédia, por
assim dizer, um termo de passagem entre o narcisismo ou amor de si próprio e o amor
objectal.

Igualmente no plano da relação com a mãe, pode dizer-se que o esquizofrénico


representa uma parte não separada desta. Para o paranóico, que surge como muito
recentemente separado do seu objecto primário, parece que deva ser evitado a todo o custo o
encontro afectivo e submergidor com esta ultima, considerada demasiado perigosa por ser
ainda, demasiado importante. Defende assim a fragilidade da sua recente autonomia pela
projecção rejeitante em relação a esta última.

A falta de poder manter a fusão total e o conforto narcísico que esta representa, o
paranóico conserva nesta posição o seu estatuto de bom sujeito protegido dos ataques da má
mãe-objecto mantida assim à distância.

Pode, desta forma, afirmar-se como sujeito relativamente separado sem deixar de
conservar as vantagens narcísicas que esta projecção lhe confere: na impossibilidade de
continuar a possuir tudo, só pode finalmente funcionar na condição expressa de se sentir
possuidor de tudo o que é bom.

Isto torna inútil realçar o carácter desreal (no sentido de delirante) dessas
personalidades aparentemente muito seguras, do seu orgulho desmedido e patológico, do seu
desprezo pelos outros que observam com uma curiosidade desconfiada, e dos quais não se

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Avaliação em Psicologia Clínica

podem acercar a não ser com as mais extremas reservas – com reticência – e para detectar as
suas eventuais torpezas.

O paranóico, inapto para todo e qualquer desejo que considera como perigoso, fraco
sob a sua pseudopotência, tentará sem tréguas ser confirmado pelo outro na sua boa
consciência: não terá assim de descobrir o seu desejo de ser amado. Utilizará para tal a via
desafetivada da justiça em busca da qual se envolverá em intermináveis processos, ou da
razão nas suas discussões lógicas, por vezes surpreendentes, e onde a rectidão do seu
raciocínio pretenderia esconder a ele próprio e aos outros a trágica indigência da sua
duplicidade.

Esta descrição do paranóico hiperestruturado e sistematizado no que se poderia


considerar como uma carapaça caracterial rígida afasta-nos bastante da indefinição, da
ausência de limite, melhor dizendo da irrealidade e de toda a imaterialidade do seu contrapeso
esquizofrénico: o paranóide.

Depressão:

A posição clínica dita depressiva representa outro nível da organização pré-objectal do


Ego, cuja organização oral se exprime de acordo com a outra modalidade funcional que a
caracteriza: quero falar, por oposição à projecção, da actividade dita introjectiva. Nesta
eventualidade que, segundo Klein, se assemelha mais à posição objectal verdadeira, tudo se
passa como se o individuo perdendo as suas ilusões megalomaníacas e narcísicas de
omnipresença e de omnipotência constituísse uma primeira relação real e objectiva com o
mundo exterior na qual se descobrisse por oposição fraco e impotente, dependente,
perfeitamente incapaz de afirmar o seu Ego na assunção e no domínio real dos objectos,
objectos doravante separados (e por conquistar) fundamentalmente diferentes dos primeiros
objectos constitutivos da identificação primária.

É pela experiencia diminuidora e ameaçadora de dependência perante o objecto


materno em primeiro lugar, e os outros objectos seguidamente, que é apreendido, numa
vivencia fundamentalmente de fraqueza trágica e de desvalorização, o novo sentimento de
existir que se elabora.

A utopia desrealizante do esquizofrénico (utopia no sentido epistemológico de


ausência de local) ou a hipertrofia maniqueísta do paranóico, ambas assentes na recusa da
realidade escapando à omnipotência do Ego, opõem-se à vivência depressiva como sendo
caracterizada pelo reconhecimento real do objecto como existindo separadamente e

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Avaliação em Psicologia Clínica

subemergindo assim o sujeito, que se vê “reduzido às suas próprias dimensões”, no sentimento


dramático da sua impotência. Em certos pacientes, é frequente encontrarmos na sequencia de
acontecimentos diversos (lutos, insucessos, perda de seres ou de objectos amados, ou por
vezes mesmo o contrário: satisfação ou sucessos inesperados, etc.) um regresso à posição
depressiva que acabámos de entrever e na qual, como Freud demonstrou, o prejuízo sofrido
pelo sujeito (que não consegue decidir-se a abandonar definitivamente o objecto frustrante) o
arrastará no movimento regressivo inverso, caracterizado pela retoma no interior de si
próprio, sobre o modo da identificação, por introjecção do mau objecto, destinado a conservá-
lo apesar de tudo.

Esta identificação contendo o carácter mau da nova introjecção traduzir-se-á na


tonalidade afectiva específica da depressão: na desvalorização fundamental, a tristeza, o
pessimismo profundamente enraizado e a ausência de qualquer impulso vital, e manifestar-se-
á no plano clínico pelo desmoronamento psicomotor, a lentificação da fala e dos movimentos,
a ideação lenta, e a dor moral. Caracteriza, com o esgotamento físico e a fusão com o mau
objecto na morte, o quadro clássico da melancolia.

Este abatimento durará, consoante os indivíduos, um tempo muito variável, e


resolver-se-á muitas vezes no movimento inverso dito movimento maníaco, no qual o carácter
penoso da evidência objectal será negado. Um pouco como na não diferenciação
esquizofrénica ou na projecção do mau para o exterior do paranóico, deparamo-nos
novamente com esse movimento na mania, apesar da constituição do objecto como existindo
realmente e separadamente, pseudo-superação mágica da dependência objectal negada.

Vivenciado na excitação e no triunfo maníaco, na alegria fervente e por vezes clástica,


a agitação motora, a fuga das ideias, as associações lúdicas, os jogos de palavras, o débito
verbal e gestual aumentado, poder-se-ia dizer que esses estados maníacos constituem a
negação defensiva da depressão.

Permite compreender a existência num mesmo paciente de períodos ora maníacos,


ora depressivos, sendo, por assim dizer, a posição defensiva em relação à outra, realizando o
quadro clássico da psicose maníaca depressiva.

Isto explica todas as variantes possíveis desta associação clínica, desde o simples
quadro da melancolia recidivante sem episódio maníaco, com, entre esses dois extremos, a
alternância dita cíclica de uma ou outra dessas formas patológicas entrecortadas por episódios
de normalidade clínica habitualmente completa. A existência nesses pacientes de uma relação

473
Avaliação em Psicologia Clínica

de objecto total já constituído pode ainda explicar a possibilidade de cura clínica posterior na
qual o comércio objectal normal fora desses períodos de descompensação permite
reencontrar dentro de certos limites períodos caracterizados por uma vivência não psicótica
(nem melancólica, nem maníaca), justificada por um prognóstico clínico para a psicose
maníaco-depressiva relativamente favorável.

3. Relações entre desrealização, despersonalização e delírio

O recalcamento, mecanismo psíquico primordial, na sua ordem regressiva, é o


principal argumento neurótico, e situa-se sobretudo ao nível do genital. Em caso de insucesso
habitual do recalcamento, o Ego procura um mecanismo bastante frequente em toda a
patologia limite, o desdobramento dos imagos ligado a outros mecanismos anexos de
projecção, de forclusão e de recusa. Desta forma, segundo Freud, o Ego aceita deformar-se em
vez de ter de se fragmentar. No entanto, se esses mecanismos falham, corre-se o risco de ir
mais longe nos danos à integridade do Ego, em direcção aos processos psicóticos: esse Ego
começa por se clivar, por se desdobrar antes de eventualmente chegar à sua última
degradação: o rebentamento, a fragmentação em núcleos dispersos tendo perdido qualquer
ligação entre eles.

A fase do desdobramento dos imagos corresponde a uma dupla relação com a


realidade: uma parte da realidade exterior, sentida como positiva e tranquilizadora, é
apreendida correctamente pelo Ego, mas uma outra parte da realidade, considera como
incómoda, frustrante, inquietante ou perigosa, encontra-se ou deformada num sentido mais
tranquilizador, ou mais ou menos negada. Esta é uma atitude muito frequente dos imaturos de
todas as idades mesmo fora de qualquer organização estrutural claramente definida. Uma tal
clivagem incluindo sobre as representações objectais pode conduzir a fenómenos de
desrealização muitas vezes confundidos erradamente com a despersonalização.

A despersonalização constitui uma operação psíquica mais regressiva ainda. Se esta


dicotomia incidindo sobre as imagos não consegue conter a pressão ansiogénica, o Ego do
individuo tem de ir até à sua progressiva fragmentação; chega a dicotomizar-se a si mesmo. Já
não é só o objecto externo que requer que se tomem precauções e distancias, mas também o
objecto interno, ligado ao narcisismo primário, que vai sendo pouco a pouco sacrificado, mais
ou menos perdido. Se esta perda narcísica vai até uma recuperação fantasmática sobre o
corpo do sujeito, ficamos pelos mecanismos hipocondríacos ou se esta tentativa de
recuperação fantasmática permanece ao nível do próprio psiquismo, vamos dar à posição
autística. Mas existe uma situação, em geral pouco estável, em que não há ainda necessidade

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Avaliação em Psicologia Clínica

de “delírio” corporal nem psíquico, na qual o objecto narcísico foi perdido sem ter podido
obter ainda qualquer recuperação compensatória, nem no sentido regressivo pré-objectal nem
no sentido salvador objectal; é o momento da crise de despersonalização.

Trata-se de escapar à situação ansiogénica deixando de ser encontrar nela, sem abanar
ainda demasiado a estrutura do Ego. Desta fase em diante, chega-se ao desdobramento da
personalidade, acentuando-se, por vezes, até à sua completa fragmentação em núcleos
dispersos. A partir deste momento, toda uma parte do Ego reconstrói uma neo-realidade
fantasmática mais tranquilizadora – o delírio.

Desrealização, despersonalização, desdobramento do Ego, fragmentação e delírio são


apenas fases sucessivas no sentido regressivo de um Ego não só em simples conflito de
manipulação genital dos objectos, ou seja, em conflito interno, com ele próprio, mas sim em
real dificuldade de contacto os objectos externos e internos, encontrando-se o conjunto das
suas representações mais ou menos externalizado em tudo o que apresentam de demasiado
angustiante.

A desrealização pode facilmente ocorrer numa pessoa normal, é ma simples falha do


funcionamento mental; uma parte da realidade torna-se estranha à sua própria pessoa;
enquanto a despersonalização corresponde a uma parte do Ego que se torna estranha a si
próprio; é uma “dúvida de consciência”. Quando as defesas contra as pulsões ou contra a
realidade não são suficientes, uma parte das representações pulsionais e objectais
previamente eliminadas regressa ao consciente que não as reconhece. É este o aspecto
“estranho” sentido pelo sujeito tanto nos fenómenos de desrealização como na
despersonalização. É um desmoronamento regressivo do Ego perante o insucesso das antigas
defesas, o sujeito já não se atrevendo a investir a sua líbido sobre os objectos externos nem
sobre o seu próprio corpo e não podendo tão-pouco identificar-se com um objecto mantido
total. Uma parte do que era “interior” tem de ser vivenciado como “exterior” aos limites do
Ego. Assim como a imagem de si mesmo, o sentimento de “eu total” constitui-se na criança a
partir do conhecimento do objecto; mais tarde, qualquer dificuldade de reconhecimento, de
apreensão, de perda do objecto, pode conduzir a uma perturbação do sentimento de
realidade (desrealização) ou do sentimento de si mesmo (despersonalização).

A despersonalização não é totalmente contemporânea do delírio pois o estatuto


fantasmático do objecto ainda não se encontra completamente ocultado; o lugar onde deveria
estar o objecto mantém-se, apesar de vazio; o paciente ainda o sabe, na medida justamente
em que sente que esse lugar se encontra desocupado – alucinação negativa.

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Avaliação em Psicologia Clínica

É importante distingui claramente a despersonalização verdadeira (crise aguda


operada por um movimento regressivo pré-objectal fantasmático importante) da simples
angústia de despersonalização tão frequente nas organizações imaturas, ainda instruturadas
do tipo, por exemplo, das diversas variedades de estados-limite.

Estes dois fenómenos estão ligados aos problemas da perda de objecto mas o primeiro
situa-se ao nível de uma regressão pré-objectal enquanto o segundo não passa a maior parte
das vezes de uma dialéctica oral. A despersonalização verdadeira corresponde a um
enfraquecimento primário do narcisismo, fase de alarme, e defesa contra o delírio. A simples
angústia de despersonalização só indica um enfraquecimento progressivo e secundário do
narcisismo; é sobretudo uma fase, um sinal e uma defesa no registo depressivo (mais do que
delirante) o que evidentemente não quer dizer que não se possa passar eventualmente da
segunda para a primeira serie de fenómenos.

4. O Universo Psicótico

A psicose constitui um universo psíquico estranho, invulgar e desconhecido. A


estranheza, o próprio psicótico pode vivenciá-la em particular nos princípios de esquizofrenia
em que o insólito se mistura com o sentimento de transformação do mundo. O estranho para
o psicótico é a maleabilidade habitual do psiquismo humano, à qual foge fazendo erupção fora
da história individual.

Na psicose, as moções pulsionais não conseguem constituir um sistema pulsão-defesa


devido à carência de imagens de identificações que proporcionam o fundamento, o apoio
primordial da intricação pulsão-defesa. Aqui, elas são labeis, pouco fiáveis ou aterradoras.

Na psicose, as moções pulsionais não são confrontadas senão com o Superego arcaico
aterrador e nenhum sistema interiorizado pode ser constituído. Existe uma verdadeira
“esquize” – talvez a mais fundamental do mundo psicótico – entre pulsões e o que poderia
servir de defesas. Só resta, assim, uma solução – a evacuação para o exterior e em ordem
dispersa de todos esses elementos e daí a primazia dos mecanismos de projecção.

A projecção é logo, de início, fragmentada em elementos dispersos: pulsões, Superego


sádico, vestígios de identificações e é a necessidade vital já que não há como na neurose um
sistema amortecedor cujo arranjo permite capitalizar a energia pulsional sem que porém se
torne demasiado persecutória.

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Avaliação em Psicologia Clínica

ESTADOS-LIMITE E OS SEUS ARRANJOS

Sigmund Freud para estabelecer a noção de estado-limite partiu da sua definição do


conflito neurótico para estabelecer, pouco a pouco, distinções entre diferentes categorias não
neuróticas. A introdução do conceito de Narcisismo, o realce do papel do Ideal do Ego, a
descrição da escolha de objecto anaclítica, a descoberta do papel assumido pelas frustrações
afectivas da criança levaram Freud a reconhecer, em 1931, a existência de tipo libidinal
narcísico, sem Superego completamente constituído, em que o essencial do conflito pós-
edipiano não se situa num oposição entre Ego e Superego, assim como retratado em 1924 uma
deformação do Ego – apresenta-se como intermédia, justamente, entre o rebentamento
psicótico e o conflito neurótico.

1. Ponto de vista genético


 Numa primeira fase, os estados iniciais do Ego da criança pequena, após a sua distinção do
não-Ego, permanece ainda mais ou menos indiferenciados, sem estrutura estável.
 Numa segunda fase, haveria na continuação estado em que as linhas de força
determinadas pelos conflitos, frustrações, os efeitos das pulsões e da realidade, as defesas
do Ego e as suas reacções às pressões internas e externas, começariam a orientar-se para
constituição de uma estrutura autentica.
 Já na terceira fase, alcançar-se-ia finalmente uma verdadeira estrutura (descompensada
ou não). Nessa altura as linhas de clivagem ficariam sólidas e definitivamente constituídas
e já não poderiam variar.

2. Situação Nosológica

Assim, os estados-limite situam-se entre a estrutura neurótica e a estrutura psicótica


mas, apenas ao nível da primeira e segunda fase de organização do Ego, ou seja, antes que
haja constituição de uma estrutura no sentido verdadeiro do termo.

 A linha psicótica: é considerada pelos autores contemporâneos como marcada à partida


por frustrações precoces, tirando habitualmente a sua origem do pólo materno. Um ego
que sofre várias fixações ou importantes regressões a esse nível pré-organiza-se de
maneira psicótica (fig.1). Isto ocorre no decurso da fase oral ou, mais tarde, durante a
primeira parte do período anal (fase de rejeição anal). Um tal esboço de organização
conheceria um silencio evolutivo durante o período de latência, e a adolescência que surge

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Avaliação em Psicologia Clínica

a seguir traria as consideráveis transformações conhecidas no plano estrutural e, nessa


altura, tudo poderia ser de novo posto em causa: o sujeito conservaria ainda uma pequena
oportunidade de ver o eixo de evolução do seu Ego deixar a linha psicótica, ainda não
completamente fixada que, em caso de doença poderá dar origem a uma neurose clássica
de tipo histérico ou obsessivo.

Figura 1: Modo de Estruturação Psicótico

No entanto, na adolescência, e na grande maioria dos casos, um Ego pré-organizado


psicoticamente vai muito simplesmente continuar a sua evolução no seio da linha
psicótica na qual já se encontra suficientemente envolvido; organizar-se-á
seguidamente, de forma definitiva, sob forma de estrutura psicótica verdadeira e
estável. Já não é possível alterar este aspecto: se o sujeito adoece na sequência de um
acidente interior ou exterior, só podemos ver nascer uma psicose, ainda que sob
diversas formas, seguramente, mas sem qualquer outra possibilidade patológica.

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Avaliação em Psicologia Clínica

Figura 2: Modo de Estruturação Neurótico

 A linha neurótica: segue, por sua vez, uma evolução bastante vulgar até ao momento do
conflito edipiano, ou seja, no rapaz, o período correspondente à fase anal (fase anal de
retenção) à fase fálica. Se, na sequência do conflito edipiano e das suas contingências,
existem fixações demasiado fortes ou regressões demasiado importantes e essa duas
fases, o Ego vai pré-organizar-se segundo um sistema relacional e defensivo de modo
neurótico. Da mesma forma que, para a linha psicótica, o período de latência vai operar
uma paragem da evolução estrutural, enquanto pelo contrario a chegada à adolescência
desencadeará transformações estruturais idênticas às que foram descritas acima a
propósito da linha psicótica. Se nessa altura os conflitos internos e externos se revelam
demasiado intensos, o Ego pode vir a deteriorar-se mais, a recorrer a sistemas defensivos
e relacionais mais arcaicos, ultrapassando a simples economia pulsões- Superego em prol

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de um questionamento mais ou menos sério da realidade e, regressamos assim à linha


anterior conduzindo a uma evolução no sentido de uma estrutura psicótica definitiva.
No entanto, na maioria dos casos, o Ego neuroticamente pré-organizado mantém-se
no âmbito neurótico e tende a organizar-se de forma definitiva segundo a linha de
estruturação neurótica.

3. Arranjo-limite

Estes estados-limite são, então aquelas pessoas que cujo Ego superou, sem muitos
obstáculos, o momento em que as frustrações da primeira idade poderiam ter operado
fixações pré-psicóticas tenazes e incómodas e, que também não voltaram, na sua evolução
posterior, a tais fixações. Todavia, na altura em que se encarrilava para eles a evolução
edipiana normal, esses indivíduos sofreram um traumatismo psíquico importante.

Esse traumatismo deve ser pensado no sentido afectivo, o que significa que
corresponde a uma inquietação pulsional ocorrendo num estado do Ego ainda muito
insuficientemente organizado e muito imaturo no plano do equipamento, da adaptação e das
defesas: por exemplo, uma tentativa de sedução sexual por parte de um adulto.

Ou seja, a criança entrou nessa altura, muito precocemente, muito brutalmente e


muito massivamente em contacto com dados edipianos. Essa inquietação genital precoce
constitui um verdadeiro traumatismo afectivo por si só, pois não pode ser recebido pela
criança de um modo perceptivo e relacional, objectal acabado e genital. Assim, o Ego só pode
então procurar integrar essa experiência antecipada às outras experiências do momento, e
arruma essa percepção junto das frustrações e das ameaças à sua integridade narcísica.

É impossível para este sujeito apoiar-se no amor do pai para suportar os sentimentos
eventualmente hostis em relação à mãe, e inversamente.

Ser-lhe-á, também, difícil utilizar o recalcamento para eliminar do consciente o excesso


de tensão sexual ou agressiva. Vê-se, desta forma, forçado a recorrer a mecanismos
semelhantes aos que o psicótico utiliza: recusa, identificação projectiva, desdobramento de
imagos, manejo omnipotente do objecto.
Esse traumatismo (fig.3) desempenhará de certa forma o papel de primeiro
desorganizador da evolução psíquica do individuo. Suspenderá de imediato, a evolução
libidinal que, todavia, havia sido iniciada em condições normais. O estado-limite mantém-se
numa posição organizadas mas não estruturalmente fixa, ou seja, o tal inconstante constante –

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é um simples esforço relativamente instável e dispendioso para o Ego o permanecer fora das
duas grandes linhas de estruturas verdadeiras das quais uma ( a linha psicótica) foi ultrapassa e
a outra (linha neurótica) não pôde ser alcançada quanto à evolução, quer pulsional quer
maturativa, do Ego.

Figura 3: Modo de Organização – Limite

4. Organização económica

O estado-limite situa-se antes de mais como uma doença do narcisismo. Tendo


ultrapassado o perigo de fragmentação, o Ego não pôde, no entanto, aceder a uma relação de
objecto genital, ou seja, ao nível dos conflitos neuróticos entre o Id e o Superego. A relação de
objecto imediato contra o qual se defende o estado-limite é essencialmente a depressão.

A angústia do psicótico é a angústia de fragmentação – é uma angústia sinistra, de


desespero, de retraimento e de morte. A angústia do neurótico é a angústia de castração – é

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uma angústia de culpa, sentida no presente mas centrada num passado que se adivinha muito
erotizado. A angústia do estado-limite (quadro 1) é uma angústia de perda de objecto e de
depressão que diz respeito, simultaneamente, a uma vivência passada infeliz no plano
narcísico mais do que erótico e, ao mesmo tempo, permanece centrada sobre um futuro
melhor, tingido de esperança, de salvamento, investida na relação de dependência com o
outro.

Quadro 1:

Sintomas Angústia Relação de Principais defesas


objecto
Psicose Despersonalização  Recusa
Delírio Fragmentação Fusional  Desdobramento do
ego
Estado-  Desdobramento dos

limite Depressão Perda de Anaclítica imagos


objecto  Forclusão
Neurose Sinais:  Recalcamento
 Obsessivos Castração Genital
 Histéricos

A relação de objecto psicótica permanece fusional ao objecto materno – é de tipo


narcísico integral no sentido em que está incluída no narcisismo da mãe ou do seu
representante. Conduz ao autismo, aos desinvestimento dos objectos e da realidade e a uma
neo-construção objectal.

A relação objectal neurótica supõe uma triangulação conotando o conflito edipiano e


requerendo um potencial genital suficiente. A relação de objecto do estado-limite permanece
numa relação a dois, mas diferente da díade primitiva encontrada nas psicoses. Trata-se de um
ser amado pelo outro, sem deixar de estar ao mesmo tempo separada dele como objecto
distinto e, simultaneamente, apoiando-se contra ele.

Já no estado-limite, parece existir uma divisão do campo relacional em dois sectores


distintos: um deles conservando uma correcta avaliação da realidade e, o outro funcionando
de um modo menos realista, mais idealista e mais utilitário ao mesmo tempo – corresponde a

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um modo de defesa. Para não ter de se fragmentar, o Ego deforma-se sem no entanto
rebentar e, assim, vai funcionar com o mundo exterior distinguindo-se neles dois sectores: um
adaptativo e um anaclítico.

O recalcamento desempenha nos estados-limite um papel menor do que nas neuroses


em prol do desdobramento de imagos, das reacções projectivas, do evitamento, da forclusão e
de outros mecanismos acessórios que se revelam todos mais arcaicos, mas também menos
exigentes em formações reactivas do recalcamento. A necessidade de separar os objectos
exteriores em tranquilizadores por um lado e, preocupantes por outro, aproxima-nos das
atitudes de identificação projectiva e da idealização pré-depressiva.

A regressão no estado-limite: não incide, como nas neuroses, sobre a simples


representação pulsional mas sim, constitui uma degradação parcial da pulsão.

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Figura 4: Quadro Geral da Evolução dos Modos de Organização

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DOENTES PSICOSSOMÁTICOS

A atitude psicossomática corresponde a uma concepção da medicina. Em vez de


considerar uma medicina dos órgãos, coloca a ênfase numa medicina geral do organismo,
numa abordagem global, holística, do individuo doente. Assim, todo o doente é
psicossomático.

 Ensaio da definição: Para se poder dizer que uma doença é psicossomática, tem de se
evidenciar a existência de um conflito. deve-se poder estabelecer a ‘’relação precisa que
existe entre a situação conflitual do doente e a sua doença, e isto até mesmo na própria
doença. Trata-se de conflitos que o individuo, em primeiro lugar com o mundo exterior e,
seguidamente intrapsíquicos. Esses mesmo conflitos provocam manifestações mentais ou
manifestações somáticas, ou de ambos os tipos, em proporção variável.
 Etiopatogenia: Podemos ter casos de doentes que apresentam perturbações funcionais
sem afecção orgânica ou mental detectável; ou doentes portadores de lesões
acompanhadas de sintomas decorrentes de factores psicológicos; ou ainda doentes com
sintomas neurovegetativos, como asma, hipertensão, arterial e outros.
Uma emoção-choque é muitas vezes evocada na origem de certas doenças – diabetes,
entre outros. mas não se pode esquecer que uma determinada situação tem uma
importância particular para um individuo em função da sua história e do seu
desenvolvimento psicológicos. Estudos clínicos, efectuados em doentes em relação aos
quais se pôde estabelecer todos os antecedentes biográficos, demonstraram a existência
de uma relação cronológica entre a evolução da sua doença e os acontecimentos
repercutindo-se sobre a sua vida afectiva. A situação que precipita o individuo na doença
reveste-se para esse doente de um significado afectivo particular, por estar ligada ao seu
passado ou a uma problemática conflitual não resolvida.
Os afectos podem, assim, pela tensão emocional crónica que acarretam, levar à produção de
perturbações funcionais crónicas e, seguidamente de lesão orgânica. Por outro lado, se a
expressão motora ou verbal da agressividade ou da ansiedade se encontra bloqueada, as
descargas do sistema nervoso central são desviadas para o sistema vegetativo, provocando
perturbações patológicas no funcionamento dos órgãos.

A causalidade de doença não é linear, unívoca mas sim, multifactorial.

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Avaliação em Psicologia Clínica

F. Alexander perspectiva uma doença como uma função de diversas variáveis:


constituição hereditária, traumatismo obstétrico, doenças orgânicas na infância, experiências
primordiais da primeira infância relativas aos cuidados, à educação, ao sono; acidentes da
infância; traumatismo afectivos da infância; clima afectivo do meio familiar e traços específicos
dos pais e das pessoas que o rodeiam; traumatismo físicos posteriores; experiências afectivas
posteriores, interpessoais e profissionais.

 Organização Psicossomática: a psicanálise estabeleceu a importância da relação de


objecto e permitiu compreender a origem das perturbações a partir da relação do
individuo com o seu meio. A aplicação destas noções ao doentes psicossomáticos mostrou
o papel das frustrações precoces por carência afectiva.
Os doentes psicossomáticos parecem ter apresentado uma fragilização dessa ordem no
inicio do seu desenvolvimento, na fase pré-objectal, mais exactamente, idade pré-verbal
da primeira infância em que o orgânico e o psicológico, o fisiológico e o relacional são
indistintos e, em que a diferenciação individuo-objecto torna o sujeito extremamente
dependente da mãe.
Quando o individuo é frustrado nessa fase das satisfações passivas narcísicas
indispensáveis, seja por doença, seja por ausência de cuidados ou de carinho, vai passar
por um estado de aflição altamente prejudicial para o seu harmonioso desenvolvimento,
tanto somático como afectivo com a possibilidade de reactivação conflitual posterior.
Pode reconhecer-se nos doentes psicossomáticos uma tendência em utilizar mecanismos
de defesa próximos daqueles que encontramos nas psicoses, clivagem e identificação
projectiva, por exemplo. Certos tipos de respostas patológicas correspondem ou a um
desejo de fuga por repetição da atitude de dependência ou a uma atitude de agressividade
e luta ou, ainda, a uma contradição entre essas duas atitudes (asma, úlcera gástrica).
Considera-se que a doença psicossomática corresponde a um nível de organização da
personalidade mais arcaico comparativamente aos sintomas neuróticos. Isto é, os doentes
psicossomáticos para lutarem contra as suas pulsões vão edificar um carácter com uma
notória falta de flexibilidade e de adaptabilidade. Aparentemente bem adaptados
socialmente, não deixam filtrar qualquer manifestação afectiva e a sua frieza vai impedir a
emergência dos desejos ou das representações. A sua profunda necessidade de
dependência e a intensidade da sua agressividade colocá-los-ia em perigo se aceitassem a
intrusão na sua vida consciente das pulsões libidinais e agressivas.
Marty, De Muzan e David descreveram este funcionamento mental como sendo um
funcionamento onde o pensamento é operatório. Assim, o homem psicossomático,

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cortado do seu inconsciente, caracteriza-se por uma ausência de liberdade fantasmática,


com pobreza do sonho diurno e nocturno, por uma desvitalização da linguagem privada de
qualquer carga emocional e por uma dessecação da relação. Nega a sua originalidade
como a dos outros – aparece nivelado, conformo, num mundo sem atractivo e sem
horizonte. Próximo do pensamento operatório descrito pela escola de Paris, o conceito
americano de alexitimia saliente as particularidades psicolinguísticas do discurso, no qual
predominam os conteúdos pragmáticos do pensamento, enquanto sentimentos e
emoções não conseguem ser descritos nem expressos por palavras.
 Histeria, hipocondria e doenças psicossomáticas: Vêem-se assim surgir claramente as
diferenças que existem entre os doentes psicossomáticos e outros doentes que implicam o
seu funcionamento corporal, como os histéricos ou hipocondríacos.
Na histeria de conversão: a patologia diz respeito à vida de relação, mas sem lesão
orgânica. Nessa neurose, os conflitos inconscientes expressam-se por sintomas que têm
um significado simbólico. Correspondem a uma organização já evoluída que, abrange a
linguagem e o gesto. A regressão apenas afecta as representações.
Na hipocondria: onde o interesse do doente está centrado sobre o seu corpo, onde existe
um inquietude imaginária de uma lesão que, efectivamente, não existe – há uma regressão
pulsional parcial por desinvestimento do objecto em proveito de um sobreinvestimento
narcísico, com desintricamento pulsional.
Nos doentes psicossomáticos: a regressão faz-se a um nível muito arcaico, próximo da
regressão psicótica, mas sem rebentamento do Ego. A noção de mentalização considerada
como ligada à quantidade e à qualidade das representações psíquicas permite delinear as
diferenças clinicas e evolutivas consoante os indivíduos. Se podemos ver afecções
somáticas de tipo regressivo ocorrer em sujeitos bem mentalizados, observa-se em sujeito
mal mentalizados, cujo sistema pré-consciente perdeu o seu valor funcional, uma
desorganização progressiva, psíquica e depois somática, podendo evoluir, após diversos
pródomos tais como a depressão essencial ou as angústias difusas, para uma doença
grave. A patologia afecta a vida vegetativa, mas a neurose de órgão é uma resposta
somática que não tem por objectivo expressão uma emoção e que, inversamente à
conversão histérica, é desprovida de sentido.
Desde a conversão à somatização há recalcamento progressivo dos afectos. Sendo que, a
cura psicossomática deve permitir o caminho inverso, com a libertação das pulsões e a
retoma da actividade fantasmática. Caso contrario, o doente passará não da angústia ao
sintoma ou ao delírio como o neurótico ou o psicótico mas sim, da angústia à morte.

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Nota terapêutica: o tratamento destes sujeitos deve consistir num contexto relacional afectivo
com o terapeuta. Uma compreensão profunda da personalidade do doente com esta
disposição é necessária para evitar uma irrupção psicótica ou um desmoronamento do
equilíbrio colectivo do meio circundante.

RESUMO DAS PRINCIPAIS ESTRUTURAS DA


PERSONALIDADE
Angústia Conflito Defesas Relação de
objecto
Neurose Ang+ustia de Entre o Id e o Recalcamento Genital
(superego) Castração Superego
Psicose (id) Angústia de Entre a Clivagem Funcional
Aniquilamento/ realidade e o Id
Fragmentação
Borderline (ideal Angústia de Ideal do eu Clivagem e Anaclítica
do eu) perda do Idealização (dependente)
objecto

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