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HISTÓRIA E NARRATIVA – CERTEAU

CERTEAU, MICHEL DE. A ESCRITA DA HISTÓRIA. p. 65-109. Rio de


Janeiro: Forense Universitária, 1999.

Atualmente, a história da Historiografia, ou seja, a história da escrita da História,


enquanto área de pesquisa, dialoga com outras ciências e entre os pensadores da
construção dessa narrativa. Não só o debate historiográfico foi construído, como a
própria História enquanto disciplina é constantemente ressignificada, reescrita e
repensada.
Entendemos a História e as Narrativas como produtoras de uma relação advinda
de um lugar de produção e de discurso histórico. Os autores aqui citados estão em fluxo.
Tem em comum o entendimento da historiografia como prática de diferenciação. Mais
do que isso, observam a relação entre a História e a Narrativa como operações dentro de
uma perspectiva histórica e socialmente localizável. Assim, colocaremos em evidência,
nos próximos parágrafos, reflexões e debates propostos por alguns historiadores naquilo
que a Historiografia propõe no seu romper, inventar e modificar constante.

Michel de Certeau propõe em seu trabalho entender como se opera a escrita da


História. Para o autor, a História é, ao mesmo tempo, uma disciplina, uma prática e uma
escrita. Aprendemos com Certeau que a História não diz respeito somente ao passado,
ao já vivido e ao já experimentado. Ela também se remete ao vivo, ao social e ao
cultural de um tempo presente. Com Certeau aprendemos que a historiografia pode ser
um trabalho de separação.
Certeau constrói a narrativa histórica enquanto processo construtivo e
transformador, enquanto produto histórico, que precisa de critérios teórico-
metodológicos rígidos para compreender-se como tal. Para isso mapeia os 3 elementos
componentes da operação historiográfica que se articulam: o lugar social, as práticas e a
escrita.
O LUGAR SOCIAL é (qual o lugar social? Em que interfere?) É o lugar que
vai oferecer estudos condicionantes ao passado. O autor abre o Capítulo II, Operação
Historiográfica, demarcando a fala de um historiador como a demarcação de um lugar,
um atrelamento do discurso ao lugar onde esse discurso é produzido. E na página 65 diz
qual o objetivo do seu trabalho: entender a História como uma arte de encenação que,
“nesta perspectiva, gostaria de mostrar que a operação histórica se refere à combinação
de um lugar social, de práticas "científicas" e de uma escrita.” Sendo assim, Assim,
Certeau prossegue dando voz ao que considera o não-dito. E entende que a pesquisa
historiográfica só faz sentido dentro de um espaço-tempo específico. Um lugar social
(66) é um lugar particular, que é investigado de maneira particular pelo historiador. E é
tese de Certeau, portanto, entender que esses lugares sociais e seus desenvolvimentos
políticos, econômicos, culturais fazem parte da análise do historiador. Porém esse lugar
precisa ser analisado com rigor metodológico. Assim, o não-dito (p. 58) deve ser
captado dentro desse rigor, para que não vire falácia, para que possa ser comprovado.
Assim também a Instituição Histórica (p. 60) deve ser pensada como “este lugar
deixado em branco ou escondido pela análise que exorbitou a relação de um sujeito
individual com seu objeto, é uma instituição do saber” (p. 67). “O discurso "científico"
que não fala de sua relação com o corpo [Pg. 070] social é, precisamente, o objeto da
história. Não se poderia tratar dela sem questionar o próprio discurso historiográfico
(69-70).” Assim, obras de valor para a História são aquelas, segundo o autor, que podem
ser analisadas dentro da operação historiográfica.
O pensamento do autor é importante, para relativizarmos as nossas ideias sobre
os nossos objetos de estudo e não criarmos em nossa escrita histórica uma tendência à
produção de verdades. Certeau nos precisa que o discurso acadêmico possui um
conjunto de regras a serem utilizadas, mesmo estando essa imposição no silêncio.
Sendo assim, é a partir desse lugar que se determinam os limites e os métodos de
pesquisa a fim de atender os verdadeiros interesses. Entretanto, a produção
historiográfica é partilhada entre a escrita e o conhecimento científico do pesquisador.
Além disso, é fundamental a neutralidade do pesquisador.
O autor nos mostra que o lugar é determinante para se escrever sobre ele, uma
vez que o historiador para escrever a história é preciso saber como funciona essa
sociedade. Por isso, a natureza e a cultura são de fato fundamentais para a pesquisa. A
operação historiográfica fabrica o historiador. Todo trabalho científico opera uma
redistribuição do espaço e o estabelecimento das fontes através de uma ação instaurada
por técnicas de transformação.
As PRÁTICAS DO ASPECTO LITERÁRIO e do discurso histórico são
indissociáveis, porém mitigada por elementos controláveis. Certeau nos estimula a
pensar em quais são os procedimentos práticos analíticos, nos trazendo à reflexão de
que esses não são simplesmente escolha metodológica. É criação instrumental do
historiador, é subsídio para a narrativa. É também a sua visão sobre fato passado. E,
nesse processo de avaliação das fontes, aos poucos o historiador percebe o processo sem
volta do afastamento desse Outro: aqui está a identidade do pesquisador e sua utilização
por, pela e para a História.
O autor no término da sua exposição sobre o lugar social ressalta a atividade de
pesquisa. Michel de Certeau afirma que a atividade de pesquisa histórica está inserida
em um lugar, no qual de acordo com os seus interesses definirá o que pode vir a ser
feito e o que não é permitido ser realizado. Através destes apontamentos Certeau nos
deixa claro sobre o peso que a instituição e o lugar social dos indivíduos possuem sobre
a construção do discurso do historiador.
Além disso, o que podemos ver seria a necessidade dos usos de técnicas e
métodos científicos, para legitimarem a História como disciplina e o que nela vem a ser
produzido. Ao pensarmos sobre a História como uma prática, a argumentação de
Certeau começa calcada na necessidade de uma técnica para a realização da produção
historiográfica (CERTEAU,1982, p. 78).
A crise, que se agravou de forma substancial, quando as ciências sociais foram
de certa forma se distanciando da realidade da teoria quanto à prática. Nesse sentido, o
autor faz uma pergunta importante: “Quando a história se torna para o prático, o próprio
objeto de sua reflexão, pode-o inverter o processo de compreensão que refere um
produto a um lugar?” E responde de forma categórica que, em caso afirmativo, seria ele,
o historiador um fujão; pois acabaria por ceder a um pretexto ideológico. Sendo a
história formada por um dado conjunto de pensamentos sistematizados, cujas
referencias se remetem a lugares, quer seja econômico, social, cultural etc, a dicotomia
entre o que faz e o que diria do que faz, só serviria de verdade à ideologia vigente e|ou
reinante.
Assim a história seria protegida da prática efetiva. E uma prática sem teoria, na
visão do autor, acabaria fatalmente, num determinado dia no “dogmatismo de valores
eternos ou na apologia de um intemporal”.
O autor cita alguns autores, como Michel Foucault, Paul Veyne e Serge
Moscovici, como atestadores de um despertar epistemológico, que naturalmente, na
tentativa de organizar o produto do trabalho a um lugar, um discurso a uma prática, e
esta conseqüentemente a uma escrita, se caracterizou de fato, um discurso sobre a
ciência. O historiador pode assim, obter respostas para as suas indagações, pelo fato de
passar a conhecer para que realmente serve o seu produto, para onde vai e
principalmente o porquê dele.
A prática do historiador se centraria em transformar um objeto em histórico, em
historicizar um elemento, o qual não sendo analisado dentro de um contexto
possivelmente ficaria no espaço do não-dito. Através de Certeau vemos que a prática do
historiador se assemelha a de um operário. Assim ele declara que o historiador trabalha
sobre um material, o que teria como objetivo transformar ele em História.
A descrição da prática muito se assemelharia à ação de um metalúrgico, como Certeau
comparou em seus escritos (CERTEAU,1982, p. 79). Em linhas gerais caberia à pratica
do historiador a articulação entre o natural e o cultural e a seleção de suas fontes com as
quais ele pretende trabalhar. Contudo, é importante pensar que o próprio recorte da
documentação está sujeito às ações do lugar social onde o individuo está inserido
(CERTEAU,1982, p. 81-2). Na visão de Michel de Certeau a História como disciplina
necessitaria de adotar uma perspectiva interdisciplinar. A História buscaria segundo o
autor por modelos e conceitos de outras áreas, criticando-os, experimentando-os e assim
controlando o que poderia estar coerente e o que estaria equivocado (CERTEAU,1982,
pp. 88-9). Assim, através da ação das instituições a prática do historiador também
possui um limite dado pela disponibilização de documentos e métodos para os seus
estudos. A História como uma escrita depende da passagem do que o historiador
realizou em sua prática, para uma elaboração de um texto histórico.
A ESCRITA, a discussão central de Certeau, característica de seu viés
narrativo, é uma das ferramentas utilizadas para dissecar o discurso histórico, vivido e
interpretado a um só tempo. E deve ser realizada com rigor metodológico, ratificando o
caráter científico do fazer historiográfico. (construção textual – fruto da capacidade do
historiador em transitar pelas especificidades que a narrativa histórica pressupõe,
conferindo-lhe credibilidade e inteligibilidade, tornando-se, assim, discurso).
Assim, através da percepção desses componentes, Certeau analisa o elementos
sobre os quais o discurso não fala e demonstra o nível de participação do historiador no
processo de efetivação da pesquisa acadêmica. É desse procedimento que resulta a
possibilidade de controlar em toda extensão o discurso histórico produzido, ratificando
o caráter cientifico do conhecimento histórico, além de promover reflexões atuais sobre
questões históricas.
O que podemos entender em Certeau é que o historiador é visualizado como o
aspecto central de todo o processo. Sua ação munido desses 3 componentes é a relação
entre teoria e prática. Certeau preocupa-se em entender como encarar o complexo
processo de elaborar um texto com conteúdo voltado para o passado. E, ainda que o
discurso seja silencioso, não escapa aos limites e escopo do ato de escrever História.
Influencia decisivamente no fazer do historiador, sua pesquisa e sua escrita. Por meio
desse procedimento, será possível identificar o grau e a intensidade do historiador na
construção do conhecimento histórico, que permeia todo o caminho da pesquisa e, até
muitas vezes, antes dela.
A produção historiográfica é, portanto, muito mais um conjunto de interferências
do meio (seja ele individual, social ou institucional) do que um resultado abstrato
extraído do passado. Sendo assim, o jogo da dissimulação a que alude Albuquerque
serve também para compreender as produções acadêmicas, resultado do cruzamento de
reservas de domínio: institucional, individual e social, num verdadeiro palco de
conflitos e tensões não declarados. As provocações de Michel de Certeau ainda
possuem um caráter denunciante.
Esse processo ocorreria pela própria relação com o limite, a qual a atividade
histórica possui. Para Michel de Certeau a história enquanto uma escrita está submetida
a uma ordem cronológica do discurso, a uma arquitetura harmoniosa do texto e ao
fechamento do artigo ou livro, mesmo que se acredite em uma pesquisa histórica, a qual
nunca se esgote em suas possibilidades de estudo (CERTEAU,1982, p. 94). A escrita da
História faz parte de uma prática social, pelos pensamentos de Certeau. Para o autor ela
está controlada pelas práticas, as quais são frutos de diversos interesses do lugar social.
Assim, uma das funções da História enquanto uma escrita estaria na sua função de
passar valores e assumir um caráter didático. Certeau argumenta que a escrita acaba por
fazer a história, como também por contar histórias, sendo assim de interesse ao caráter
de ensinamento, para a sociedade (CERTEAU,1982, p. 95). O autor reflete sobre as
várias formas de discurso existentes: o literário, o lógico e do historiador. Michel de
Certeau frisa que o discurso histórico pretende possuir um conteúdo verdadeiro
(verificável), na forma de uma narração, para se ter validade (CERTEAU,1982, p. 101).
Uma das formas de conferir uma legitimação a um argumento seria através da citação.
Esta modalidade indicada anteriormente leva o citado à categoria de referencial, para
dar credibilidade as suas idéias. Não podemos esquecer que há um comprometimento
nos estudos históricos, com aquilo que pode ser verificado e atestado cientificamente.
O silêncio, também era desejado por ela.
 No entanto, a epistemologia, sem referência, possibilitaria a teoria do conhecimento,
somente uma mediação sobre algo vazio, sobre o vácuo, por assim dizer; seria trabalhar
com o mito, e não com a história em si. O historiador, nesse caso específico, teria o
papel de desmistificar o mito, ou seja, de desfazê-lo e ao mesmo tempo, de percebê-lo
como sendo um produto do senso-comum, das ideias que proliferam. Sobre os mitos
gerados pela história é que são articuladas as identidades presentes. O silêncio participa
da linguagem, e neste desvio a escritura histórica se edifica. No entanto, o esquecimento
do silêncio se faz necessário para que a história assuma sua função contemporânea.
A NARRATIVA para Certeau perpassa pela percepção do ambiente que nos
cerca. Do nosso lugar social, em qual sociedade estamos inseridos. Os recortes
temporais, a formulação de um objeto de pesquisa e a utilização das fontes saem do
caminho da utopia, da ficção e ganham um viés de problematização a fim de que se
estabeleça historicidade à temática estudada.
A escrita é a última etapa da operação historiográfica, para Certeau. É o
contraponto dos procedimentos investigativos. Aqui é que percebemos, segundo
Certeau, a lógica responsável, inovadora e controlável do historiador. Em seu rigor de
pesquisador é que o historiador mais uma vez irá concretizar suas práticas metódicas e
confirmar seu lugar social, produzindo um discurso histórico. Ou seja, irá exercer seu
papel fundamental na operação historiográfica.
Certeau entende a narrativa como parte de uma associação combinativa com o
discurso lógico. É essa associação que define um discurso histórico, portanto. E a
narrativa historiográfica emprega-se as fontes, a confiabilidade ao leitor ao inserir
outros historiadores, deduções a coesão e a relação espaço-temporal para construir
pontes entre o contexto e o passado, seja na reintrodução dos mortos, seja nas reflexões
sobre o seu tempo.

Além disso, a escrita histórica é fruto das vivencias do profissional da História, as quais
suas idéias perpassam ao texto devido às escolhas existentes dele e do lugar social no
qual está inserido. Podemos concluir que como disciplina a História está submetida ao
contexto social na qual está situada. Sendo vista como prática, ela possuiria um
conjunto de técnicas, que normatizariam a operação historiográfica. Ao seguirmos as
normas estabelecidas, daríamos credibilidade à produção de uma pesquisa histórica.
Assim como a prática, vemos que a escrita possui leis, para legitimarem a sua validade
acadêmica. Após as leituras sobre Certeau podemos perceber que a escrita da História
não pode ser fruto de apenas desejos pessoais sem uma relação com o lugar social onde
estamos inseridos. Nossos escritos necessitam possuir uma relevância para a sociedade,
se for almejado receber um reconhecimento de nossos pares, pela nossa produção do
saber.
Portanto, a operação histórica, se refere a um tripé essencial que estabelece relações
entre as práticas científicas e a escrita; isto tudo combinado a um lugar social. Este
último, sempre submetido de certa forma a particularidades.
A multiplicidade de filosofias individuais em nome de uma história total, na ótica de
Certeau, nada mais é do que um fragmentado quadro demonstrativo que possibilita a
análise de que a relatividade histórica está calçada na fragmentação, caracterizando
assim, o não dito. E o fato, de que os enunciados, na linguagem de análise, são
previamente e|ou anteriormente escolhidos, sem ao menos passarem pela simples
observação, reforça o pensamento do autor no que se refere especificamente a facilidade
de falsificações.
A pesquisa histórica é movimentada pela localização sócio cultural de quem a
realiza, portanto é praticamente impossível examinar um discurso sob a ótica
independente da instituição. Os filósofos divergiam entre si, mas ainda assim, através de
suas poderosas instituições, formava um grupo isolável particular da sociedade. Foi R.
Aron, que acabou substituindo o privilégio silencioso de um lugar, por um outro,
poderoso e discutível de um produto.E foi a instituição do saber (relação de um sujeito
com o objeto), que marcou a origem das ciências modernas. Portanto, a relação
intrínseca entre uma instituição social e a definição do saber, proporcionou a
especialização de instituições políticas, eclesiásticas etc. O que ocasionou a
redistribuição do espaço social, também chamado de fundação de “corpos”.
Um lugar científico foi constituído, após o endurecimento das universidades ao se
fecharem, num momento bastante crítico. E, a relativa retirada dos assuntos religiosos e
públicos, possibilitou a instauração de uma instituição de saber indissociável.
Segundo as pesquisa de Habernas, uma “repolitização das ciências humanas se impõe:
não se poderia dar conta dela, ou permitir-lhe o progresso sem uma teoria crítica de sua
situação atual na sociedade”. Concordo plenamente com o autor, pois na verdade é de
total leviandade toda e qualquer mudança, que não seja antes discutida, avaliada,
principalmente no papel que exerce de positivo na sociedade.
Uma mudança de sociedade, no entanto, permite ao historiador, conforme o texto, um
distanciamento com relação aquilo que se torna globalmente um passado.
De acordo ainda com o seu pensamento, o historiador ao trabalhar nas margens, a vagar
nas sombras, distante do paraíso de uma história global, transita no lado oposto das
racionalizações adquiridas, caminha por desvios, cercados por regiões exploradas,
como: o mundo esquecido dos camponeses, a loucura, a feitiçaria, etc. Transita,
portanto, pelas zonas silenciosas.
As ausências, as ressignificações e as finitudes são inerentes à História. A
história da historiografia é a prova e o relato das mudanças, da finitude, das variações de
sentidos, de valores e de usos da História. Ela é a realização concreta da mudança no
tempo.
Apesar de a história ter sido fragmentada numa pluralidade de histórias, havia
evolução e o conhecimento histórico restabelecia o mesmo pela relação comum.
Atualmente, (para o autor), o conhecimento histórico é julgado melhor por sua
capacidade de medir exatamente os desvios, não só quantitativos, mas também
qualitativos. A operação histórica tem efeito duplo; por um lado, historiza o atual e por
outro lado, a imagem do passado mantém o valor de primeiro representar aquilo que
falta.
          A operação que faz passar da prática da investigação à escrita, causa estranheza
ao autor, devido naturalmente ao processo de investigação, por exemplo, poder ser
interminável, enquanto que um texto, obrigatoriamente tem que possuir um final
estruturado. E ainda sob o olhar de suas observações, conclui que a escrita história ainda
hoje permanece controlada pelas práticas, sendo ela própria uma prática social. Confere
ao leitor, portanto, um lugar pré estabelecido, distribuindo o espaço. Mas ao mesmo
tempo, tem o regulamento ambivalente “de fazer história”. E, como disse Jean
-Pierre Faye, de impor violências de um poder e de fornecer escapatórias.
A escrita dispensa na cronologia de todo o relato, a um não dito que é o seu
apostolado. “A lei sempre tira partido daquilo que escreve”. A cronologia tem o papel
de indicar um segundo aspecto do serviço que o tempo presta a história; ela na verdade,
contradiz a possibilidade do recorte em períodos, e a historiografia trabalha para
encontrar um presente que é o fim de um percurso longo, na história cronológica.
Onde se estabelece o lugar do morto e o lugar do leitor? Segundo o texto, marcar um
passado é dar um lugar a morte, mas ao mesmo tempo, é também redistribuir o espaço
das possibilidades, ditar de forma negativa aquilo que está por fazer e por conseqüência,
utilizar a narratividade que enterra os mortos, como um caminho de estabelecer um
lugar próprio para os vivos. “O que é que o historiador fabrica quando se torna escritor?
Seu próprio discurso deve revelá-lo”.
O texto, em si é muito complexo, com citações de vários autores e um tanto
repetitivo. No entanto, foi importante estuda-lo, pois fortificou ainda mais a minha
crença, na complexidade de opiniões entre os autores historiadores e que cada um
possui diferenciados pontos de vista, por vezes, sobre vários assuntos; que divergem
entre se, deixando evidente que não existe verdade absoluta e que a interferência do
homem na natureza e em tudo que ele se propõe a fazer, causa transformações. No caso
especifico de Certeau, a sua projeção aconteceu fora dos muros eclesiásticos, devido a
revolução estudantil de 1968, que ao contrário de muitos intelectuais, Certeau
simpatizou com as reivindicações dos estudantes, com as suas inconformações.

RESUMAÇO PARA QUE AVANCEMOS NA QUESTÃO.


A Operação Historiográfica precisamente possibilita analisar as produções
históricas e o próprio objeto de estudo para reflexão, haja vista que em história todo
pensamento remete a “lugares “ sociais, econômicos, culturais, etc. A operação histórica
se refere a junção de um lugar social de práticas científicas e de uma escrita, esta se
constrói em função de uma instituição. Na realidade, toda pesquisa historiográfica se
articula num lugar de produção sócio-econômico, político e cultural o que implica certas
imposições ligadas a privilégios particulares. Ao analisar-se a falta do objeto tira da
história o privilégio do qual se vangloriava quando se pretendia encontrar a verdade.
Vale ressaltar que a relatividade histórica tem por base que a totalidade histórica
se destaca pela multiplicidade de filosofias individuais. Essa relatividade não funciona
senão no interior de um campo fechado
A instituição histórica não dá apenas uma estabilidade social a uma doutrina.
Sabe-se que em História toda “doutrina” é abstrata e recalca sua relação com a
sociedade. A produção histórica se encontra partilhada entre a obra literária de quem
constitui autoridade e o trabalho científico de quem faz pesquisa.
Desde a obtenção dos dados documentais à redação do livro, a prática histórica é
inteiramente relativa a estrutura da sociedade. Se ocorre na sociedade uma mudança,
permite ao historiador um afastamento com relação aquilo que se torna globalmente um
passado.
Outro aspecto importante em pesquisa histórica remete a neutralidade. A história
permanece voltada a fabricação localizada em tal ponto deste sistema. A articulação da
história com um lugar é a condição de uma análise da sociedade. Levar a sério o seu
lugar não é ainda explicar a história. Fazer história é uma prática, na verdade, a
organização histórica é relativa a um lugar e a um tempo.
Pode-se afirmar que o historiador tem o tempo como material de análise ou
como objeto de estudo, e trabalha de acordo com seus métodos de estudo. Sendo assim,
a operação histórica é científica a medida que transforma o meio ou que faz de uma
organização social, literária, etc a condição e o lugar de uma transformação.
Além disso, em História tudo inicia-se a partir de um gesto de separar, de reunir,
de transformar em documentos certos objetos distribuídos de outra maneira.
Um trabalho é considerado científico quando opera uma redistribuição do espaço e
consiste em dar lugar ao estabelecimento das fontes. Além do mais a análise
contemporânea buscar reconstruir o objeto a partir de cenários e a utilização das
técnicas atuais de informação leva o historiador a separar aquilo que, em seu trabalho
esteve ligado a construção de objetos de pesquisa e das unidades de compreensão e a
acumulação dos dados.
Entretanto, o historiador não pretende reconstruir uma história global, mas, racionaliza
as informações adquiridas. O trabalho determinado por um limite é uma estratégia da
prática histórica que se prepara para a teorização de acordo com as possibilidades
oferecida pela ciência da informação. A história se torna um lugar de controle onde se
exerce uma função de falsificação. Nela podem ser evidenciados os limites de
significabilidade relativos aos modelos que são experimentados.
No que se refere ao conhecimento histórico pode-se dizer que ele é julgado mais
por sua capacidade de medir exatamente os desvios, não apenas quantitativos, mas
qualitativos com relação as construções formais presentes. Assim, o historiador se
coloca na fronteira onde a lei de uma inteligibilidade encontra seu limite como aquilo
que deve incessantemente ultrapassar deslocando-se daquilo que não deixa de encontrar
sob outras formas.
O lugar que a história criou, combinando o modelo com os seus desvios, ou
agindo na fronteira da regularidade representa um aspecto da definição. Mais importante
que a referência ao passado é a sua introdução sob a forma e uma distância tomada. A
operação histórica tem um efeito duplo, de um lado, historiciza o atual, exige a
explicitação sobre a relação da razão em um lugar próprio que por oposição a um
passado se torna presente.
De fato, a escrita histórica permanece controlada pelas práticas. Por outro lado,
os resultados da pesquisa se expõem de acordo com uma ordem cronológica. A
temporalização cria a possibilidade de tornar coerente uma ordem. Se a historiografia
resulta de uma operação atual e localizada, enquanto escrita, repete outro início
impossível de datar ou de representar. A escrita histórica compõe um conjunto coerente
de grandes unidades, uma estrutura de lugares e de personagens . Além disso, a escrita
põe em cena uma população de personagens, mentalidades sob formas e conteúdos
diferentes.
Portanto, a escrita não fala do passado senão para enterrá-lo. Ela é um túmulo no
duplo sentido de que através de um mesmo tempo ele honra e elimina. A linguagem
permite a uma prática de situar-se com relação ao outro, o passado. E o passado por si
mesma é uma prática. E a historiografia se serve da morte para articular uma lei do
presente. Ela não descreve as práticas silenciosas que a constroem, mas efetua uma nova
distribuição de práticas já sistematizadas.

CONCLUSÃO DA QUESTÃO:
Sendo assim, entendemos que a História e a Narrativa se complementam, se intercalam,
se utilizam uma da outra, mas não ensinam ofício e não se findam com o tempo. O que
permite a pesquisa são as questões, as problematizações, como se justificam, quais são
as hipóteses e dúvidas ao longo do percurso. E toda a construção teórico-metodológica
da pesquisa é histórica, datada e faz parte de um lugar, de um tempo, de um meio social
e de situações políticas, ou seja, de condições que não se repetem.

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