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S 112 Neder JA, Nery LE, Bagatin E

Avaliação da disfunção e da incapacidade nas


pneumoconioses*
Evaluation of respiratory dysfunction and disability

JOSÉ ALBERTO NEDER 1 , ERICSON BAGATIN 2 , LUIZ EDUARDO NERY 3

RESUMO
A determinaçâo das conseqüências funcionais (disfunção) e do seu impacto na vida diária (incapacidade) são aspectos centrais
da avalição de pacientes com doença ocupacional respiratória. A presente revisão apresenta as bases fundamentais para o
entendimento dos instrumentos utilizados para a definição do grau de disfunção, incluindo aspectos clínicos, funcionais
pulmonares e, em algumas circunstâncias, da capacidade de exercício. Em especial, apresenta-se uma classificação multifatorial
do grau de disfunção com o intuito de nortear a concessão ou não de benefícios previdenciários em nosso meio.

Descritores: Avaliaçao da deficiência; Testes de função respiratórias; Doenças respiratórias; Doenças ocupacionais;
Exposição ocupacional; Condições de trabalho

ABSTRACT
The determination of functional consequences (dysfunction) and their impact on daily life (incapacitation) is central to
the evaluation of patients with occupational respiratory diseases. The present review addresses the fundamentals underlying
the instruments used to determine the degree of dysfunction, including clinical aspects, as well as those related to
pulmonary function and, in some circumstances, exercise tolerance. In particular, a multifactorial system of classifying
the degree of dysfunction is presented, with the objective of informing decisions related to the awarding of retirement
benefits in Brazil.

Keywords: Disability Evaluation; Respiratory function tests; Respiratory tract diseases; Occupational diseases; Occupational
exposure; Working conditions

INTRODUÇÃO

Os têrmos impairment e disability, secundários ter graduação variável e é habitualmente avaliada


a doença respiratória, utilizados nas publicações por testes de função pulmonar (mas não exclusi-
da American Medical Association(1-3) e da Ameri- vamente).
can Thoracic Society, (4-5) traduzidos como disfun- Em contraste, a American Thoracic Society de-
ção e incapacidade, referem-se a diferentes con- fine incapacidade como o efeito global da disfun-
ceitos que devem ser claramente entendidos. As- ção na vida do paciente. Assim, a incapacidade
sim, disfunção respiratória é definida como uma não é relacionada apenas a condições médicas,
condição puramente médica, resultante de uma mas envolve fatores mais complexos, tais como:
anormalidade funcional. Ela pode ser estável ou idade, sexo, dimensões corpóreas, educação, con-
não, temporária ou permanente. A disfunção pode dições psicológica e socioeconômica e requerimen-

* Trabalho realizado na da Disciplina de Pneumologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São
Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP) Brasil e na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas -
UNICAMP - Campinas (SP) Brasil.
1. Professor Adjunto Livre Docente da Disciplina de Pneumologia da Escola Paulista de Medicina (EPM) da Universidade
Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP) Brasil.
2. Professor Assistente Doutor da Área de Saúde Ocupacional do DMPS da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade
Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP) Brasil.
3. Professor Adjunto Doutor e Chefe da Disciplina de Pneumologia do Departamento de Medicina da Escola Paulista de
Medicina (EPM) da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: José Alberto Neder. Rua Professor Francisco de Castro, 54 - CEP 04050-020, São Paulo,
SP, Brasil. E-mail: sefice@pneumo.epm.br

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tos energéticos da ocupação. Outro conceito de tória ventilatória acessória e respiração com lábi-
cunho médico-administrativo é o grau de empre- os semicerrados. Todos os ruídos adventícios de-
gabilidade (employability) de determinado indiví- verão ser descritos, localizados topograficamente,
duo. Não raramente, o médico é chamado a opi- quantificados e situados quanto à fase do ciclo
nar se um indivíduo pode ou não ser empregado, respiratório. De fundamental importância, ainda, é
ou manter-se em determinada função. Sua opi- a procura de sinais não torácicos ou sistêmicos
nião deve considerar a capacidade do examinado que indiquem patologia pulmonar avançada, os
em ir e vir do trabalho, permanecer no local pelo quais modificarão substancialmente a graduação
tempo necessário e realizar com segurança, para da disfunção: cianose ou pletora, baqueteamento
si e para os colegas, as tarefas propostas pelo digital, dilatação venosa jugular, edema de mem-
empregador. Assim, se um indivíduo com uma anor- bros inferiores e asteríxis.
malidade médica tem ainda a capacidade de su-
portar confortavelmente as exigências do deslo- Radiograma
camento e da função, ele pode ainda ser conside- No estabelecimento diagnóstico e prognóstico
rado empregável. Neste contexto, as informações de pneumopatias ocupacionais por poeiras mine-
médicas serão utilizadas como esteio do raciocí- rais é crucial a leitura do radiograma de tórax se-
nio legal, mas serão cotejadas com diversos ou- guindo os radiogramas padrão da Classificação
tros aspectos socioergonômicos. Internacional de Radiografias das Pneumoconioses.(8)
Embora apenas nos casos com maior acometimento
AVALIAÇÃO DA DISFUNÇÃO radiográfico exista uma discreta correlação entre
os achados clínicos, radiológicos e funcionais res-
Na presença de entidade nosológica ocupaci- piratórios, a uniformização da linguagem interob-
onal com substrato anatomofuncional estável ou servador é fundamental para a quantificação do
potencialmente estável - silicose, asbestose, pneu- dano anatômico e o seguimento longitudinal.
moconiose do trabalhador do carvão - podem ser A avaliação radiológica de outros aspectos como
empregados no diagnóstico e quantificação do hiperinsuflação pulmonar, diminuição da vasculari-
dano respiratório: avaliação clínica, exame radio- zação, presença de bolhas, achatamento diafrag-
gráfico torácico, tomografia computadorizada, tes- mático, espessamento pleural, anormalidades car-
tes de função pulmonar e testes cardiopulmona- díacas direitas, alterações esqueléticas torácicas
res de exercício.(6-7) (principalmente cifoescoliose avançada) podem su-
gerir comprometimento respiratório significativo.
Avaliação clínica
A obtenção de uma história clínica detalhada Tomografia computadorizada de alta resolução
e completa deve sempre preceder a investigação do tórax
laboratorial. Como já salientado, deve-se enfatizar Nos últimos anos, tem sido utilizada com mai-
a história ocupacional, ambiental, mórbida pregres- or frequência a tomografia computadorizada e,
sa e atual, dos hábitos de lazer e tabágica. principalmente, a tomografia computadorizada de
Os principais sintomas respiratórios - dispnéia, alta resolução no diagnóstico das alterações pleu-
tosse, expectoração, sibilância - devem ser cuida- ropulmonares associadas ao asbesto. Embora a baixa
dosamente inquiridos, observando-se a relação disponibilidade e o custo elevado ainda limitem o
temporal com a história de exposições ocupacio- uso da tomografia computadorizada de alta resolu-
nais ou não. Idealmente, todos os sintomas deve- ção e cortes finos no diagnóstico, trata-se de um
riam ser objetivamente graduados por esquema exame praticamente indispensável na detecção das
classificatório específico. Para a dispnéia, tal con- imagens intersticiais iniciais, no diagnóstico das
duta é essencial (Tabela 1). anormalidades pleurais e na investigação de pro-
O exame físico deve ser geral, com avaliação váveis neoplasias de pleura e pulmão. Neste con-
pormenorizada dos sinais associados à possível texto, a tomografia helicoidal apresenta clara van-
doença respiratória subjacente. Especificamente, tagem em relação às técnicas tradicionais. Ela deve
deve-se atentar para o padrão respiratório e pos- ser obrigatoriamente realizada em decúbito ven-
turas corporais peculiares, utilização da muscula- tral, sendo identificados na asbestose: espessamento

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TABELA 1

Classificação de disfunção no repouso e no exercício para doenças


respiratórias com anormalidade funcional estável

Grau Ι ΙΙ ΙΙΙ ΙV
Variável Sem disfunção Disfunção leve Disfunção moderada Disfunção acentuada
a) Sintoma Andando rápido Andando no plano Andando devagar
Dispnéia Ausente no plano ou subindo com pessoa da mesma no plano 100 metros
ladeira devagar idade ou subindo o lance esforços menores ou
de escada mesmo no repouso
b) Mecânica ventilatória
*% CVF ** > LI nl # 60 - LI nl 51 - 59 < 50
%VEF1 *** > LI nl # 60 - LI nl 41 – 59 < 40
VEF1/CVF (%) > LI nl # 60 - LI nl 41- 59 < 40
% CPT ** > 80 70 - 79 61 - 69 < 60
c) Troca gasosa
*% DLCO > 70 60 – 69 41 – 59 < 40
PaO2 (mmHg) > LI nl # 60 - LI nl 55 - 59 < 55
d) Exercício
*VO 2 máx > 80 # 60 – 79 41 - 59 < 40 ou < 1 L/min
(% previsto)
VO2máx > 25 20 – 24 16 - 19 < 15 ou < 1 L/min
(mL/min/kg ou L/min)
Modificada da American Medical Association, 1984, 1988, 1993; American Thoracic Society, 1982, 1986; Nery, Neder, Bagatin,
1994. * Os valores previstos da normalidade seguem as normas da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.
** São as variáveis fundamentais para a graduação do distúrbio restritivo(ver o texto); *** É a variável fundamental para a graduação
do distúrbio obstrutivo; # LI nl: Limite inferior da normalidade - limite inferior do intervalo de confiança de 95% (X - 1,64 x desvio-
padrão); NOTA: Graduar de acordo com o teste mais alterado; CVF: capacidade vital forçada; VEF1: volume expiratório forçado no
primeiro segundo; CPT: capacidade pulmonar total; DLCO: capacidade de difusão pulmonar para o monóxido de carbono; SaO2:
saturação arterial de oxihemoglobina; PaO 2: pressão parcial de oxigênio no sangue arterial; VO2máx: consumo máximo de oxigênio.

dos septos interlobulares, bandas que se esten- latório toracopulmonar. Destaca-se a importância
dem da pleura ao parênquima, pontos e linhas de variáveis simples e reprodutíveis, obtidas a par-
subpleurais e, nos estágios mais avançados, anor- tir da manobra expiratória forçada: capacidade vi-
malidades císticas tipo faveolamento e bronquio- tal forçada, volume expiratório forçado no primeiro
lectasias de tração (sinais de alta predição de fi- segundo e a relação entre eles. No propósito de
brose intersticial). Estas alterações são habitual- graduar a disfunção, não se recomenda a utiliza-
mente localizadas nas regiões periféricas e poste- ção de outros parâmetros espirométricos de maior
riores dos lobos inferiores. Vários trabalhos, inclu- variabilidade inter e intrapessoal e padronização
sive em nosso meio, têm constatado a maior sen- ainda deficiente, como os fluxos meso e tele-expi-
sibilidade da tomografia computadorizada de alta ratórios. Os critérios de aceitabilidade e reproduti-
resolução em relação ao radiograma de tórax na bilidade das curvas, análise dos resultados, valores
identificação das alterações intersticiais. Por ou- de referência e demais aspectos técnicos devem
tro lado, num número expressivo de indivíduos seguir rigorosamente as recomendações das Dire-
com alterações radiológicas (1/0 ou mais), a to- trizes para Testes de Função Pulmonar da Sociedade
mografia computadorizada de alta resolução não Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.(10) Deve-se
mostrou comprometimento intersticial pulmonar, o atentar para o fato de que o diagnóstico de dis-
que confirma a maior especificidade deste exame.(9) túrbio restritivo baseia-se na redução da capaci-
dade pulmonar total (CPT). A redução isolada da
Testes funcionais respiratórios capacidade vital forçada (CVF) não é patognomô-
A espirometria constitui o teste de maior impor- nica de distúrbio restritivo, já que diversas condi-
tância prática para o estudo do desempenho venti- ções podem reduzi-la, inclusive a obstrução das

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vias aéreas. Na indisponibilidade da medida da CPT para os casos nos quais a queixa de dispnéia é des-
(preferencialmente por pletismografia corporal), a proporcional à disfunção pulmonar aferida no re-
CVF pode ser utilizada, com reservas, para definir pouso, e nos indivíduos que exercem atividades com
distúrbio restritivo. esforço sustentado de grau moderado ou com picos
A capacidade de difusão pulmonar para o mo- de esforço intenso. Pode ainda ser utilizado para
nóxido de carbono traz informações sensíveis a avaliar a tolerância ao esforço do indivíduo no de-
respeito da integridade anatomofuncional da tro- sempenho do seu trabalho, numa análise comparati-
ca gasosa através da membrana alveolocapilar. Em va com o requerimento energético de várias ativida-
nosso meio, embora poucos serviços disponham des recreacionais, domésticas e ocupacionais.(12) A
deste teste, é de importância fundamental a avali- gasometria arterial no exercício, mesmo em indiví-
ação da capacidade de difusão pulmonar para o duos com testes de repouso normais, pode revelar,
monóxido de carbono na identificação e grada- precocemente, alterações nas trocas gasosas.
ção da disfunção e incapacidade das pneumoco- Para uma correta interpretação do teste de exer-
nioses. Caso sua mensuração seja disponível, a cício cardiopulmonar, devemos considerar os se-
técnica de respiração única deverá ser preferida, e guintes aspectos: certificar-se da presença de re-
ser realizada com rígidos padrões técnicos e após lação causal entre a disfunção aeróbia e a doença
no mínimo oito horas sem o uso do tabaco.(11) respiratória em questão; definir-se o grau de per-
As determinações das pressões parciais de oxi- da funcional aeróbia, numa análise comparativa
gênio e de dióxido de carbono no sangue arterial com os valores previstos de VO 2max para indiví-
periférico apresentam considerável variabilidade duos de mesmo sexo, idade, dimensão corpórea e
interindividual. Elas podem estar ainda preserva- nível de atividade física habitual (porcentagem do
das na vigência de comprometimento anatomo- VO 2max previsto); determinar-se o grau de capa-
funcional, apresentando menor correlação com a cidade aeróbia remanescente, num enfoque com-
tolerância ao exercício do que o volume expirató- parativo com as prováveis demandas ocupacionais
rio forçado no primeiro segundo. Embora menos ou da vida diária (VO2máx, L/min ou mL/min/kg);
sensíveis, alterações significativas da pressão par- nos indivíduos idosos e com peso acima do espe-
cial de oxigênio no sangue arterial ou da pressão rado para a altura, a expressão em mL/min/kg deve
parcial de dióxido de carbono no sangue arterial ser evitada, já que tende a subestimar grosseira-
são específicas de comprometimento ventilatório mente a capacidade atual de exercício. (13)
ou das trocas gasosas em pacientes com disfun-
ção fixa por pneumoconioses. A medida não inva- Outros exames
siva da saturação de oxihemoglobina deve ser en- De acordo com situações clínicas específicas,
carada apenas como uma estimativa da oxigena- outros exames opcionais poderão ser empregados,
ção sanguínea, devendo seus resultados serem tanto no contexto diagnóstico, quanto da avalia-
confirmados com a aferição invasiva da pressão ção da disfunção: eletrocardiograma, ecocardio-
parcial de oxigênio no sangue arterial. grama, estudo hemodinâmico, exames hematoló-
gicos e bioquímicos, exame polissonográfico e/ou
Teste de exercício cardiopulmonar monitorização noturna da oximetria, entre outros.
O teste de exercício cardiopulmonar, com a Estes exames poderão ser úteis para a comprova-
determinação direta das respostas ventilatórias, ção de distúrbios sugeridos pela avaliação clínica
cardiovasculares e metabólicas, é um procedimento e documentação objetiva de achados que possam
sensível para avaliacão e quantificação objetiva da influenciar na graduação da disfunção.
limitação funcional. Uma redução da tolerância ao
exercício aeróbio é definida quando o consumo CLASSIFICAÇÕES DE DISFUNÇÃO
de oxigênio no pico de uma atividade limitada por
sintomas (VO2max) encontra-se abaixo do limite As tentativas de graduar a disfunção respirató-
inferior da normalidade para indivíduos de mesma ria em classes de progressiva gravidade remontam
etnia, sexo, idade, altura, massa muscular e nível ao início do século passado. Entretanto, apenas em
de atividade física regular. 1982 a American Thoracic Society propôs um es-
O teste de exercício cardiopulmonar é indicado quema classificatório de ampla aceitação desenvol-

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vido para caracterizar disfunção grave, baseado na visto) deve ser preferida em relação à capacidade
espirometria, na capacidade de difusão pulmonar remanescente (VO2máx em valores absolutos ou
ao monóxido de carbono e na avaliação da capaci- corrigidos para o peso total nos eutróficos ou peso
dade de exercício.(4) Assim, a disfunção foi definida magro nos indivíduos em sobrepeso). Em situa-
espirometricamente como grave quando a capaci- ções de admissão, afastamento e recolocacão ocu-
dade vital forçada fosse inferior a 50% do previsto pacional, ambas devem ser analisadas.
e o volume expiratório forçado no primeiro segun- A presença das seguintes condições indica sem-
do e a relação entre ele e a capacidade vital força- pre disfunção acentuada, independentemente da
da estivessem abaixo de 40% do previsto. Adicio- graduação sugerida pela classificação: cor pulmo-
nalmente, valores de capacidade de difusão pul- nale; síndrome neoplásica de qualquer origem; hi-
monar para o monóxido de carbono menores do poxemia arterial no repouso - pressão parcial de oxi-
que 40% do previsto eram indicativos de disfunção gênio no sangue arterial < 60 mmHg ou saturação
respiratória grave. Nos casos em que a espirometria arterial de oxihemoglobina < 90%, se associadas ao
e/ou a capacidade de difusão pulmonar para o cor pulmonale, hipertensão pulmonar ou poliglobu-
monóxido de carbono estavam alterados, mas sem lia, e pressão parcial de oxigênio no sangue arterial
disfunção grave (ou seja, indivíduos com distúrbio de repouso ou exercício < 55 mmHg ou saturação
ventilatório leve a moderado) era indicado o teste arterial de oxihemoglobina < 88%, independente-
de exercício. Na avaliação cardiorrespiratória no mente de outros achados; obstrução permanente de
exercício aeróbio, foram considerados como suges- vias aéreas superiores, associada à hipercapnia.
tivos de disfunção grave os valores de VO2máx abaixo A presença de distúrbio respiratório do sono
de 15 ml/min/kg, ou caso 30% a 40% do VO2max deve ser cuidadosamente avaliada, e requer estu-
obtido fosse insuficiente para o indivíduo suprir as do polissonográfico para a precisa quantificação
demandas enegético-metabólicas de uma jornada da disfunção. Deve-se observer se a terapia clíni-
diária de oito horas. ca e/ou cirúrgica foi aplicada em toda sua exten-
Em 1984, 1988 e 1993 a American Medical são, antes de definir dano funcional permanente.
Association(1-3) e em 1986 a American Thoracic Deve-se atentar também para condições ocupaci-
Society(5) introduziram o conceito de graus inter- onais especiais, que podem elevar o grau de dis-
mediários de disfuncão causada por doenças res- função, como o uso de protetores respiratórios ou
piratórias. As classificações são similares e utili- trabalho em ambiente poluído, de um paciente com
zam variáveis espirométricas, o VO2máx e a capa- disfunção respiratória já diagnosticada.
cidade de difusão pulmonar para o monóxido de Admitindo-se que, mesmo nas condições ditas
carbono para definir graus leve, moderado e acen- fixas, a disfunção no repouso e exercício pode
tuado de comprometimento. A classificação da modificar-se longitudinalmente (com ou sem in-
American Medical Association, além de introduzir tervenção terapêutica), aconselha-se a repetição
a graduação da dispnéia, considera, na análise das medidas avaliadoras em intervalo variável de
espirométrica, o limite inferior da normalidade meses a anos, dependendo da doença de base e
como correspondente ao limite inferior do inter- quadros intercorrentes.
valo de confiança de 95% do valor previsto.
Baseando-se nestas referências clássicas, e na REFERÊNCIAS
experiência com a avaliação funcional no repouso
e exercício de pacientes com pneumoconiose, pro- 1. American Medical Association. The respiratory system.
pomos uma classificação de disfunção respirató- In: American Medical Association. Guides to the
ria que incorpora os avanços obtidos nessa área. evaluation of permanent impairment. 2nd ed. Chicago:
AMA: 1984. p. 85-101.
Desta forma, como explicitado na Tabela 1, os
2. American Medical Association. The respiratory system.
achados clínicos, funcionais pulmonares de repou- In: American Medical Association. Guides to the
so e, ocasionalmente, de exercício, servirão de base evaluation of permanent impairment. 3rd ed. Chicago:
para a graduação da perda funcional. AMA; 1988. p. 107-18.
Na análise do VO2máx, quando o objetivo for 3. American Medical Association. The respiratory system.
In: American Medical Association. Guides to the
orientar a concessão de benefício previdenciário, evaluation of permanent impairment. 4th ed. Chicago:
a perda funcional (VO2máx, porcentagem do pre- American Medical Association; 1993. p. 115-29.

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American Lung Association. Evaluation of impairment/ 9. Sette A, Neder JA, Nery LE, Kavakama J, Rodrigues RT,
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Respir Dis. 1982;126(5):945-51. and pulmonary gas exchange impairment in workers
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