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Que tipo de líder

você quer ser?


Defina a sua pegada.

Rebecca Newton

N
Nos programas de desenvolvimento de lideranças uma per-
gunta muitas vezes fica faltando: “Que tipo de líder você quer ser?”.
Facilitamos e incentivamos a autoconsciência nos líderes em as-
censão (que tipo de líder você é); ajudamos a mapear sua trajetórias
(como você se tornou o líder que é); compartilhamos conhecimen-
tos e ideias (que tipo de líder você deveria ser); e ajudamos as pes-
soas a adquirir novas habilidades e a adotar novos comportamentos
(como se tornar o líder que você deveria ser).
Mas não nos focamos suficientemente naqueles que talvez se-
jam os componentes centrais da liderança de sucesso — a intenção
da liderança (o tipo de líder que você quer ser) e o impacto (que le-
gado você quer deixar). Refiro-me a estes dois componentes, jun-
tos, pelo termo “pegada de liderança”.
Na minha experiência, muitos já pensaram sobre a própria pe-
gada de liderança em algum momento, mas poucos a definiram
com clareza suficiente para orientar o seu comportamento e avaliar
se foram bem-sucedidos ou não. Dentre os que o fizeram, poucos
se deram ao trabalho de refletir regularmente sobre o conceito —
deixando-o guiar suas decisões diárias — ou de compartilhá-lo para
obter retorno e se responsabilizar pelos resultados.

Rebecca Newton é psicóloga de negócios, consultora de liderança e pesquisadora visitante


do Departamento de Administração da Faculdade de Economia e Ciência Política de Londres.

1 Harvard Business Review Brasil OnPoint | Abril e Maio 2015


Que tipo de líder que você quer ser?

Vou dar um exemplo na prática. Gail Kelly, CEO que a única liderança eficaz é a que se apoia no conceito
do Grupo Westpac, um dos maiores bancos da Aus- de generosidade de espírito. Essa ideia é boa para Gail
trália, vencedor do prêmio Empresa Mais Sustentá- Kelly porque é uma pegada que ela escolheu e definiu
vel no Fórum Econômico Mundial este ano em Davos, pessoalmente. Ela a desenvolve com sua equipe de lide-
falou aberta e honestamente sobre suas metas de legado rança e a associa diretamente aos resultados espera ver
em liderança pessoal. Ela as resumiu na expressão “ge- nos negócios.
nerosidade de espírito.” De acordo com Gail, generosi- Os critérios de sucesso de liderança não devem ser os
dade de espírito tem dois elementos-chave. O primeiro mesmos para todos. Nós é que temos de defini-los. Lí-
é acreditar no poder das pessoas para fazer a diferença deres devem dar a si espaço, tempo e direito; se neces-
(intenção de liderança). A segunda é criar um ambiente sário devem pedir ajuda a fim de estabelecer claramente
em que elas possam dar o melhor de si e, asssim para fa- a cultura de liderança que querem construir em torno
zer essa diferença (impacto de liderança). de si; devem avaliar — baseados tanto em suas próprias

Muitos já pensaram sobre sua pegada de liderança


em algum momento, mas poucos a definiram
com clareza suficiente para orientar o seu
comportamento e avaliar seu “sucesso.”
Kelly também pensa sobre táticas de liderança, mas observações quanto em comentários alheios — se estão
elas estão a serviço da pegada de liderança definida por ela. agindo de acordo com ela; e fazer as mudanças necessá-
Segundo Gail, os líderes dotados dessa generosidade de rias para construí-la no dia-a-dia e mantê-la.
espírito têm humildade, são bons ouvintes e demons-
tram empatia. Não são egoístas, intolerantes, excessi- Para criar uma pegada de
vamente críticos; não matam o mensageiro nem procu- liderança é fundamental:
ram por bodes expiatórios. Não ficam em cima do muro ■ Definir o tipo de líder que você quer ser. Saber clara-
quanto à eficácia de determinada iniciativa antes de de- mente se isso está alinhado com, e ajuda a alcançar, a
cidir se a apoiam ou não. Dão retorno de forma honesta sua visão organizacional e propósito.
e no tempo oportuno — você não espera seis ou 12 meses ■ Promover a autoconsciência, refletir sobre seu próprio

para receber a sua avaliação anual de desempenho. De- comportamento e incentivar os outros a dar retorno.
sempenho fraco logo recebe atenção. Como afirma Gail: ■ Reconhecer as diferenças que possam surgir entre a

“Quero supor que você, colega, quer o melhor para mim sua intenção e o impacto do que você faz. Autorregula-
e para todos os demais. Sou generosa em minhas supo- ção. Como diz Emma Soane da LSE: “A força e o desa-
sições sobre suas motivações latentes e sobre suas inten- fio da autorregulação é garantir a coerência entre a sua
ções em relação a mim, por mais difícil que às vezes seja personalidade, seu comportamento e suas metas de
pressupor que as intenções são boas”. liderança”.
Essa abordagem parece estar funcionando bem na O desafio que agora proponho a cada cliente, seja ele
West-pac — em pesquisas internas de comprometi- já estabelecido ou novo na sua jornada de liderança,
mento, 97% dos funcionários relatam ter consciência de será exatamente aquele que faço a mim mesma regular-
que seu trabalho está ligado aos objetivos da empresa. mente: Você sabe que pegada de liderança quer deixar e
Não estou, de modo algum, defendendo a ideia de dedica ao assunto uma atenção diária e especial?

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Competências que
diferenciam líderes
de sucesso
Crises externas revelam pistas.

Signe M. Spencer

E
Em uma situação de crise, que competências diferenciam líde-
res de sucesso dos demais? Esta foi a questão básica que nos levou a
fazer um estudo comparativo (ainda inédito), para saber como líde-
res seniores de alta performance — CEOs, presidentes, conselheiros
ou chefes de regiões ou unidades de negócios lideram em tempos
de crises externas.
Usando nosso banco de dados, examinamos histórias de crise,
como: mudanças nas leis locais que afetaram seriamente o mo-
delo de negócio; colapso da moeda local; catástrofes naturais, a
possibilidade de falência; a recusa inesperada da aprovação do
balanço pelos auditores e a exposição negativa da empresa e seus
produtos na mídia, para observar como os líderes agiram para ter os
melhores resultados, em comparação com líderes menos eficazes
em situações parecidas.
No grupo dos “melhores resultados”, encontramos os seguintes
relatos literais:
■ O problema foi resolvido, e a equipe ficou mais bem preparada
para enfrentar outros problemas no futuro

Signe M. Spencer é a líder global de assesment executivo do Hay Group.

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Competências que diferenciam líderes de sucesso dos demais

■ Nenhum funcionário foi perdido, e o problema foi re- ■ Trabalho em equipe e cooperação (especialmente nos
solvido de forma satisfatória níveis que se concentram na busca e valorização da
■ Testes científicos demonstraram que não havia proble- opinião dos outros). Formar uma equipe para lidar com
ma algum com o produto — a empresa recebeu crédito a crise, às vezes incluindo pessoas de fora da empresa.
da mídia por ter sido tão cuidadosa Vimos que todas as histórias de sucesso tinham pelo
■ Reagimos às questões de oscilação de moeda tão rápido menos uma dessas três competências — mais da metade
que tivemos uma vantagem competitiva tinha duas ou todas as três (Ver quadro Competências). Es-
■ Encontramos o equilíbrio ideal em nossas negociações, sas competências têm em comum um tema de cooperação
mostrando ao mercado que estávamos confiantes e iría- ou de colaboração, de levar a sério a posição do seu colega
mos sobreviver à crise. Ao mesmo tempo, deixamos claro para buscar o entendimento mútuo positivo.
aos credores que havia a ameaça de falência. Isso para que A capacidade de fazer isso, sob estresse, costuma estar
deixassem suas posições rígidas de lado e pudéssemos en- fundamentada em formas de Inteligência Emocional que
contrar uma solução (e a empresa conseguiu se recuperar). não fazem parte de competências genéricas de liderança.
■ Resolvemos a crise, vencemos, e o negócio continua a Elas podem abranger um senso de objetividade e humilda-
se expandir de sobre a sua posição e os seus desejos; equilíbrio ou resi-
Entre os relatos do grupo de líderes de “resultados me- liência emocional; autogerenciamento — a capacidade de
nos eficazes” os relatos foram em outra direção: permanecer lúcido e sereno em circunstâncias estressantes.
■ Sem resolução (questões ou confrontos jurídicos
contínuos)
Competências que ajudam a lidar com situações de crise:
■ Multas aplicadas pelo governo
1
■ Publicidade negativa que não foi contornada 0.9
■ Evitamos um desastre total, mas a lucratividade foi afetada 0.8

Tivemos aumentos no custo e ainda não resolvemos o


0.7

0.6
problema básico 0.5
■ Uma parte da empresa precisa ser vendida 0.4
0.3
Ao analisar a diferença de comportamento entre os dois 0.2
grupos, certas competências eram comuns nos dois gru- 0.1

pos de relatos: 0
foco no entender a dinâmica trabalho 2 ou 3
■ Pensamento analítico cliente individual das
pessoas
em equipe delas
■ Busca de informações % do grupo que demonstra a competência
■ Impacto e influência menos eficaz melhores resultados
■ Iniciativa
■ Pensamento conceitual
■ Consciência organizacional (compreender as relações de Na área da inteligência emocional, o autoconhecimen-
poder nas organizações) to é fundamental para compreender os outros, o que, por
■ Liderança de equipes (observada em exatos 50% dos sua vez, sustenta a capacidade de fazer um bom gerencia-
eventos analisados) mento de relações. Além disso, esse autoconhecimento é
Essas competências foram observadas em pelo me- fundamental para gerenciar a si mesmo, permitindo, as-
nos metade dos relatos, e são exatamente as que se sim, a gestão de pessoas.
deveria esperar nessas situações. No entanto, elas Em circunstâncias normais é possível “encenar” uma
foram observadas um pouco mais frequentemente nas versão “falsa” ou “vazia” das competências de gestão de
situações menos eficazes do que nas situações mais efi- pessoas. Contudo, nas hipóteses trazidas pelo estudo,
cazes. Esta percepção nos levou a concluir que o que ca- muitos líderes que usaram apenas suas habilidades de li-
pacita os líderes a se saírem bem em situações desafiado- derança de equipes ou impacto e influência sem o apoio
ras não é só a perspicácia empresarial, nem as habilidades de competências emocionais mais profundas, não foram
de liderança de negócios habituais. Estava claro que algo eficazes. Como ficou evidenciado, em situações de crises
mais é necessário. externas, a capacidade de ouvir as pessoas (dentro e fora
Então, voltamos nossa atenção para três competências da empresa, incluindo clientes) com objetividade e com-
genéricas relacionadas com melhores resultados em crises: preensão; de administrar suas reações e nível de estresse;
■ Foco no cliente e de montar uma equipe cooperativa para enfrentar a crise
■ Compreensão dos outros (compreender as posições traz melhores resultados.
dos outros e as razões para justificá-las, mesmo sob es-
tresse e quando não há consenso) HBR Reprint R1502D–P

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