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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 3
1.1 Conceito ........................................................................................................ 3
1.2 Panorama Geral da História Arte ................................................................ 6
2. ARTE PRÉ-HISTÓRICA ..................................................................................... 12
2.1. Arte Rupestre ............................................................................................. 14
3. ARTE GREGA .................................................................................................... 19
3.1 O Belo e a Estética ..................................................................................... 19
3.2 Escultura ..................................................................................................... 23
4. ARTE ROMANA ................................................................................................. 27
4.1 Influências Gregas e Etruscas na Produção Artística Romana ............. 27
4.2 Pintura e Escultura Romanas ................................................................... 27
5. IDADE MÉDIA .................................................................................................... 31
5.1 Contexto...................................................................................................... 31
5.2 Expressões Artísticas Medievais .............................................................. 32
5.3 Arte Românica ............................................................................................ 34
5.4 Arte Gótica .................................................................................................. 35
6. RENASCIMENTO ............................................................................................... 39
6.1 Contexto...................................................................................................... 39
6.2. Pintura ......................................................................................................... 41
6.3 Escultura ..................................................................................................... 45
7. BARROCO ...................................................................................................... 48
8. ARTE BARROCA NO BRASIL .......................................................................... 58
9. MANEIRISMO .................................................................................................... 61
10. ROCOCÓ ........................................................................................................ 64
11. NEOCLASSICISMO ........................................................................................ 67
11.1. A Arte Neoclássica ................................................................................. 69
11.2. É Cole des Beaux-Arts ................................................................................ 72
12. IMPRESSIONISMO ......................................................................................... 75
13. EXPRESSIONISMO ........................................................................................ 79
14. ARTE MODERNA ........................................................................................... 82
1
15. POP ART ........................................................................................................ 89
16. ARTE PÓS-MODERNA .................................................................................. 94
17. ARTE CONTEMPORÂNEA .......................................................................... 104
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA............................................................................ 113
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1. INTRODUÇÃO
1.1 Conceito
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Os aspectos em comum de produções tão distintas — como uma pintura
renascentista, uma catedral gótica ou um poema de Homero, por exemplo —
adquirem um conceito geral de arte no mundo Ocidental a partir do século XVIII. É
incontestável que, antes disso, a palavra “arte” já era utilizada para designar
habilidades especiais de algumas realizações: pintura, escultura, música, teatro, etc
(EAGLETON, 2005).
Esse conceito geral de arte está associado à noção do “belo” no Ocidente,
decorrente dos conhecimentos da estética, um ramo da filosofia. Os conceitos têm a
necessidade de ter personagens conceituais que contribuam para a sua definição —
os personagens ou os “objetos” da filosofia são, em grande parte, a arte, o artista e a
criação artística, seja esta de qualquer categoria: música, teatro, artes plásticas,
literatura. Sob esse aspecto, a filosofia da arte pode ser entendida como um ramo da
estética, uma vez que a atividade artística promove a emergência do belo. A estética
tem como objeto todas as poéticas, sejam elas de uma arte compromissada ou não,
realista ou idealista, naturalista ou lírica, figurativa ou abstrata, douta ou popular.
Fischer (2002) defende que a arte quer ser contemplada por leis que lhe são
próprias, sem abdicar da totalidade dos seus valores espirituais, sociais e éticos, de
forma que toda a plenitude de significado e de funções que a obra irradia advém, na
verdade, da sua própria realidade de arte. Assim, a obra não adquire validade pela
função, e sim possui uma função justamente por ser suficiente.
A função da arte modificou-se ao longo da história humana desde a sua origem.
O homem adequou à arte as mudanças ocorridas na sociedade, nos seus costumes,
na sua religiosidade, na sua forma de fazer política, de conceber a ética. Na busca
humana de fazer de seu espaço algo significativo, a arte sempre teve, desde o início
da humanidade, um papel essencial na compreensão do universo, na relação dialética
com a realidade, com os fenômenos e com a sua imaginação lúdica. Durante muito
tempo, a validade da arte estava centrada na sua função na sociedade, ou seja, a
obra de arte só tinha validade mediante a função que ela desempenhava dentro da
sociedade.
Quando enfocamos, por exemplo, a arte clássica, observamos que ela era uma
produção de arte que não era entendida em primeiro plano como arte, “[...], mas como
formas que se encontravam no meio religioso ou também no mundano, como
decoração do próprio mundo em seus atos de destaque: o culto, a representação dos
soberanos e outros” (GADAMER, 1985, p. 27).
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Circundando a definição do conceito de arte, nos deparamos com a
necessidade de fornecer uma resposta objetiva e clara para a pergunta: “O que é arte?
Embora não haja uma definição exata, objetiva e cientificamente comprovada,
o termo “arte” remete a dois conceitos básicos, segundo Ferreira (2014, documento
on-line)
[...] um mais restrito, pois trata da arte como ‘obra de arte’, circunscrita na
história da arte, feita por artistas e na maioria das vezes localizada em instituições
artísticas; o outro é mais amplo, pois concebe a arte como o conjunto de atos criadores
ou inovadores presentes em qualquer cultura humana.
O conceito mais restrito surge em um contexto histórico-cultural delimitado
espacial e temporalmente, e é a partir dele que a história da arte se desenvolve, uma
vez que é balizada pelo contexto teórico e institucional legitimador, como, por
exemplo, museus, teatros e galerias de arte. Ao conceito amplo, podemos associar a
noção de “arte” como um adjetivo: a arte da gastronomia, a arte da perfumaria, a arte
da joalheria, por exemplo.
Há algumas possibilidades específicas do objeto artístico que permitem
classificar o conceito de arte. As chamadas definições estéticas destacam como
condição necessária a intenção de provocar experiências estéticas; as definições
institucionalistas se referem ao caráter condicional da legitimação da obra pelas
instâncias da teoria e da crítica da arte, cumprindo certas regras e procedimentos; e
as definições históricas identificam a relação das produções artísticas com uma
determinada tradição histórica (ALMEIDA, 2014).
Danto (2010) não afirma que algo pode ser considerado arte apenas pela
afirmação do artista e pela legitimação por parte dos críticos e curadores. O autor
pressupõe que objetos ou eventos podem ser reconhecidas como obras de arte por
conter determinadas características que as coisas banais não possuem.
Corroborando com a teoria de Danto (2006), Mammi (2012) reconhece que o
conceito moderno de arte surge no Renascimento, porém seu significado (da arte) tem
a ver com algo atemporal e inesgotável. O autor concorda com a perspectiva dantiana
(relativa ao pensamento de Danto) de que tudo pode, em um primeiro momento, ser
arte. Não porque é legitimado pelo mundo da arte, mas sim quando passa a
desempenhar um papel fundamental na totalidade da cultura: a possibilidade de gerar
novas experiências significativas. É a sua capacidade de inaugurar novos campos de
experiência. Seu significado pertence ao agora. Conforme defende Mammi (2012, p.
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9): Talvez seja próprio da obra de arte não pertencer a nenhum tempo específico – ou
talvez a todos, mas sempre como se proviesse de outro tempo, passado ou futuro.
Quem sabe um dia outra civilização, ou uma outra fase desta, desvelará a valência
artística de uma luta de Ali, ou de um número de dança de Astaire. Uma obra de arte
é um objeto que sobrevive à vida e à intenção que a gerou, e a todos os discursos
produzidos sobre ela. Nesse sentido, “o que resta” é, simplesmente, sinônimo de
“arte”.
A partir das vanguardas artísticas do século XX, a construção dos conceitos de
arte se tornou complexa, volátil e subjetiva, inviabilizando definições abrangentes o
suficiente para dar conta de abarcar todas as experiências ou linguagens da arte. A
crítica e a teoria da arte estabeleceram parâmetros externos (não mais relacionados
apenas com a virtuosidade ou o domínio técnico do artista, ou do conteúdo da obra)
que pudessem definir o fato artístico, como: o discurso que sustenta a obra, a
consagração institucional e a resposta dos especialistas e do público, por exemplo
(ECO, 2004).
Uma possibilidade para contornar o dilema pode ser ancorada nos raciocínios
de Wittgenstein (2000), que alega que compreender o conceito de arte não é,
necessariamente, ser capaz de defini-lo teoricamente. O importante é saber usá-lo
para reconhecer e elucidar obras de arte e para distinguir, diante de novas
experiências artísticas, aquilo que pode ser denominado arte ou não.
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Figura 2: Laca chinesa da Dinastia Ming (séc. XVI) e ânfora grega (500 – 350 a.C.)
Fonte:
Thomas Hernandez/Shutterstock.com.
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(p. ex., Deutscher Werkbund e Bauhaus), defendendo a ruptura da distinção entre
artista e artesão (ARGAN, 1998).
A definição de belas artes foi incorporada ao vocabulário da crítica e da história
da arte no século XVIII, para denominar as tradições e regras acadêmicas europeias,
instituídas pela obra Les Beaux-Arts Réduits à un Même Principe (As belas-artes
reduzidas a um mesmo princípio), publicada em 1746, de autoria de Charles Batteaux
(1713–1780). Logo, essas regras foram normatizadas e detalhadas pela École des
Beaux Arts (Escola de Belas Artes) de Paris (BEAUX-ARTS, 2017). O conceito original
de beaux arts (belas artes) foi aplicado às consideradas “artes superiores”, de caráter
não utilitário, opostas às artes aplicadas e decorativas.
Gombrich (1999) destaca que, embora a noção de beaux-arts remeta ao século
XVIII, já havia distinção entre “artes maiores” e “artes menores” na Antiguidade
Clássica, que separava as artes liberais, aquelas relacionadas às atividades mentais,
das “artes mecânicas”, que se referiam aos trabalhos práticos e manuais. Também os
gregos caracterizaram separações entre as “artes superiores”, que são associadas
aos sentidos considerados superiores, como a visão e a audição, das “artes menores”,
geralmente associadas aos ofícios e ao artesanato.
Quando houve a distinção das artes maiores ou menores (séc. XVIII) a partir
de suas finalidades, designou-se que as artes aplicadas têm como fim aquilo que é
útil ao homem e às belas artes, sendo aquelas cuja finalidade é o belo. “Com a ideia
de beleza surgem as sete artes ou as belas-artes, modo pelo qual nos acostumamos
a entender a arte” (CHAUI, 2000, p. 406). O Manifesto das Sete Artes foi publicado
em 1923, escrito pelo pesquisador italiano Ricciotto Canudo, onde foi mencionado,
pela primeira vez, o termo “sétima arte” para se referir ao cinema.
Atualmente, as sete artes são as seguintes: 1. Música (som). 2. Artes cênicas
(Teatro/Dança/Coreografia — movimento). 3. Pintura (cor). 4. Escultura (volume). 5.
Arquitetura (espaço). 6. Literatura (palavra). 7. Cinema (audiovisual — contém artes
anteriores, como a música para trilha sonora, artes cênicas para dublagem, captura
de movimentos, pintura, escultura e arquitetura para o design e literatura, para
roteiros) (COVALESKI, 2012; CHAUI, 2000).
Posteriormente, outras categorias passaram a integrar a lista das belas artes:
8. Fotografia (imagem). 9. História em quadrinhos (cor, palavra, imagem). 10.
Videogames (integra os elementos de outras artes). 11. Arte digital (integra artes
gráficas computadorizadas 2D, 3D e programação).
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As artes aplicadas ganham evidência em um cenário relativamente mais
recente, a exemplo do movimento Arts & Crafts, surgido na Inglaterra no fim do século
XIX. O Arts & Crafts dedica-se à criação das artes manuais em plena era industrial,
produzindo móveis e padronagens exclusivas para têxteis e papéis de parede,
comercializados até os dias atuais, como ilustra a Figura 3 (ARGAN, 1998).
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Figura 4: "O Beijo", de Gustav Klimt, 1909.
SAIBA MAIS:
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Figura 5: Cadeira MR 20.
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2. ARTE PRÉ-HISTÓRICA
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História foi uma idade do homem dominada pelo terror cósmico, e a arte estava
centrada nas sensações, nos sentidos, na memória e no mimetismo. O homem estava
voltado para a observação da natureza, dos animais, para a magia (conceitos
totêmicos e místicos). A arte vinha impregnada, em suas representações, de questões
místicas.
Saiba Mais:
Mimetismo é adaptação na qual um organismo possui características que o
confundem com um indivíduo de outra espécie. Podendo ser também o processo
pelo qual um ser se ajusta a uma nova situação; adaptação.
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objetivos, os homens buscavam a simetria harmoniosa, linhas agradáveis ao olhar,
decorando com primor o cabo das facas, esculpindo os ossos e o marfim, pintando
com beleza todos os seus objetos de uso. Isso nos conduz a pensar que os homens
da Pré-História tinham um forte sentido das formas, dos volumes e das cores e que
obedeciam a certas normas e convenções nas suas representações dos animais,
humanas e simbólicas.
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Essas cenas são pouco comuns na arte rupestre, pois quase não há registros de
figuras que interagem (BELL, 2008).
SAIBA MAIS:
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os dedos como pincéis, porém há indícios de terem empregado pincéis feitos de penas
e pelos (SANTOS, 2000). A aplicação de cores nos seus desenhos era criteriosa,
havendo nuances de claro–escuro em alguns animais. A cor destaca algumas figuras
evidenciadas em vermelho, frequentemente utilizado, criando efeitos visuais
estimulantes, corroborando com a colocação de Dondis (2007, 38): “A cor está, de
fato, impregnada de informação, e é uma das mais penetrantes experiências visuais
que temos todos em comum [...]”Há pinturas que revelam, inclusive, forças direcionais
curvas, que possuem potencial dramático de transmissão de informações, formadas
pelos grupos de animais pintados nas paredes de pedra.
Podemos reconhecer a textura como uma combinação de ambos os sentidos
(tato e visão) nas pinturas rupestres. Elas são realizadas sobre as pedras e utilizam
pigmentos naturais, que, por vezes, possuem texturas granuladas. A noção de
projeção para além da superfície também é presente nos conjuntos pictóricos
paleolíticos.
A nova forma de vida instituída pelo Neolítico (5.000–3.000 a.C.) originou
muitas habilidades e invenções humanas, ampliadas com a manipulação dos metais
(Idade do Metais, aproximadamente 3.300–1.000 a.C.). Dentre elas, a cerâmica, a
tecelagem e a fiação se constituíram como métodos básicos para a construção
arquitetônica, acrescidos do domínio da fabricação de instrumentos em pedra
(JANSON; JANSON, 2009). Na transição para a agricultura, ao abandonar a vida
nômade que conduzia o homo sapiens e suas famílias a abrigarem-se nos lugares
que a natureza oferecia, certamente surgiram moradias que se assemelhavam a
cabanas construídas com os mais diversos materiais. Esses abrigos, construídos com
madeira, peles de animais e fibras que as pessoas começaram a tecer, não resistiram
ao tempo. Baumgart (1999, p. 10) afirma que “[...] cabanas dos mais diversos
materiais, não eram arquitetura no sentido de uma arte da construção, que somente
pode ser designada como tal quando excede a necessidade puramente prática
através de uma conformação espacial [...]”. Os monumentos megalíticos são os mais
significativos representantes da arquitetura pré-histórica, conhecidos como
construções de culto. Hauser (2003, p. 11) esclarece que “Os ritos religiosos e os atos
de culto assumem agora o lugar da magia e da feitiçaria [...]”. Isso significa que o
homem neolítico superou o esforço pela defesa contra os ataques do inimigo e as
necessidades materiais que o levaram a recorrer a práticas mágicas no período
Paleolítico. A vida neolítica gravitava em torno da casa e do campo, da lavoura e da
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pastagem, da aldeia e do santuário. As formações megalíticas conhecidas são: o
menir, o dólmen e os círculos de pedra (CROMLECH).
Figura 7: Monumentos megalíticos: (a) menir; (b) dólmen; (c) círculo de pedra.
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O menir é um dos grandes monólitos pré-históricos, o qual consiste em grandes
pedras verticais isoladas, encontradas principalmente no norte da Europa, como
Irlanda, e no nordeste da França.
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3. ARTE GREGA
3.1 O Belo e a Estética
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com prazer, deleita o olho e se expõe para ser admirado” (OLIVEIRA, 2003,
documento on-line).
O Período Arcaico é delimitado historicamente entre o século VII a.C. até a
época das Guerras Pérsicas, no século V a.C., quando se inicia o Período Clássico,
que dura até o fim da Guerra do Peloponeso, no século IV a.C. O século de Péricles
corresponde ao século V a.C., período em que as atividades intelectuais, artísticas e
políticas manifestaram “[...] o esplendor da cultura helênica” (SANTOS, 2000, p. 27).
Foi o período de ascensão de Atenas como grande potência militar, econômica e
cultural, quando surge uma noção mais clara do belo estético.
Nesse momento histórico, observa-se o imenso desenvolvimento das artes
figurativas gregas. Em relação às demais manifestações artísticas ocorridas em
períodos anteriores — a arte egípcia, por exemplo —, a arte grega representa uma
significativa evolução na representação. Se os egípcios produziam sua arte de forma
subordinada a cânones de representação, desvinculando-a, portanto, das exigências
da visão, a arte grega propõe a visão subjetiva em primeiro plano. O contexto no qual
se insere a arte grega clássica é voltado à vida — não há significativos registros de
uma arte que cultuasse a morte, como na arte dos egípcios, por exemplo —, pois essa
arte liga-se diretamente com o saber, com a inteligência. A inteligência conduz ao
belo, e a arte o representa, de modo que a arte possui um grande diferencial na
civilização grega, ocupando um lugar de destaque na vida cotidiana do povo. Não
restringindo sua produção artística a um único aspecto (o culto, para exemplificar) e
nem aos interesses de um determinado grupo social, a arte esteve inserida em um
âmbito autônomo, sem amarras com influências externas. A arte grega — ligada à
inteligência — tinha em seus líderes (representantes do povo) a figura de seres com
atributos de grande conhecimento e sentido de justiça, que se dedicavam ao bem-
estar da sociedade.
O hedonismo grego justifica a expressão de uma arte voltada ao prazer, à vida:
os gregos contemplavam a natureza em sua total harmonia, proclamando, em suas
produções, o entusiasmo pela vida, suas paixões e deleites. Conforme afirma Santos
(2000, p. 27):
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Dos povos da antiguidade, os que apresentavam uma produção cultural mais livre
foram os gregos. Eles não se submeteram às imposições de sacerdotes ou de reis
autoritários e valorizaram especialmente as ações humanas, na certeza de que o
homem era a criatura mais importante do universo. Assim, o conhecimento através
da razão, esteve sempre presente acima da fé em divindades.
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Figura 8: Detalhe da pintura em cerâmica.
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3.2 Escultura
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responsabilidade do escultor Fídias. A escultura da Grécia Clássica, então, alcançou
um realismo inédito na história da arte. Não se satisfazendo mais com a postura rígida
das esculturas arcaicas, a exemplo dos kouros, os escultores gregos estudaram
possibilidades de avançar na representação e criaram escolas nas quais regras e
padrões de proporções foram instituídos. Eco (2004) destaca que a harmonia
pitagórica (resultante do perfeito equilíbrio dos opostos da natureza) associou-se à
exigência de simetria, que se impôs como um cânone do belo na arte da Grécia
Clássica. No século IV a.C., a noção de cânone já incorporava elementos à simetria
das esculturas, e os escultores estabeleceram novas regras para uma justa
proporção, que não eram apenas baseadas no equilíbrio de dois elementos iguais.
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Figura 11: Três Deusas, Museu Britânico de Londres.
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Figura 12: “Laocoonte e seus filhos” é uma escultura do período helenístico que se encontra no
museu do Vaticano.
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4. ARTE ROMANA
4.1 Influências Gregas e Etruscas na Produção Artística Romana
A era da arte helenística aos poucos deu lugar ao predomínio da arte romana,
após a vitória romana sobre os coríntios, em 146 a.C. A Grécia foi fundamental como
província do Império Romano, influenciando profundamente sua cultura, que passou
a ser conhecida como cultura greco-romana. A Roma dos césares adotava uma
administração uniforme do Império e produziu uma “arte imperial” (HAUSER, 2003),
que incorporou a estética grega e, no decorrer do tempo, fixou o padrão universal de
moda e bom gosto. Os etruscos viveram na Itália Central e efetuaram a transição da
Idade do Bronze pré-histórica para a histórica. A principal contribuição dos etruscos
para os romanos se concentra na arte de construir.
As culturas grega e etrusca convergiram para o desenvolvimento da arte
romana principiada a partir do século II a.C., momento em que Roma dominava a
totalidade do Mediterrâneo e avançava sobre o norte da Europa e da Ásia. A cultura
etrusca possuía características orientalizadas, acentuadas pelas relações comerciais
que este povo realizava com os demais povos da bacia do Mediterrâneo. A partir do
século IV a.C., observou-se um processo gradativo de helenizarão dos romanos, o
qual se manifestou em todas as esferas da sua cultura artística, a exemplo da
escultura, da arquitetura, da literatura e, inclusive, da língua e da religião. Os romanos
importavam esculturas e demais objetos da Grécia e reproduziam cópias em suas
oficinas de arte. A estrutura de pensamento romano era muito diferente do caráter
grego: a sabedoria do grego era uma tentativa para explicar a beleza, já a do romano,
um esforço para consolidar o poder. O grego era muito especulativo, o romano, muito
prático.
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romanos, porém Baumgart (1999) sugere que devem ter existido, levando-se em
consideração o costume de representar em amplas composições as batalhas dos
generais vitoriosos. Pompeia era uma cidade romana com muitos reflexos da arte
helenística, e o pouco que foi preservado, tanto da pintura grega quanto da pintura
romana, deve-se, em grande parte, à erupção do vulcão Vesúvio (79 d.C.), que
soterrou os edifícios construídos. Nossa imaginação especula sobre o tipo de pintura
existente antes da catástrofe, já que, conforme Janson e Janson (2009, p. 77): “O que
resta é capaz de surpreender o observador como sendo o aspecto mais excitante,
bem como desconcertante, da arte sob o domínio romano [...]”
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O afresco é uma técnica de pintura mural executada sobre uma base de gesso ou
nata de cal ainda úmida. Seu nome deriva da expressão italiana fresco, de mesmo
significado no português. No afresco, o artista deve aplicar pigmentos puros diluídos
somente em água, de modo que as cores penetrem no revestimento e, quando secas,
passem a integrar a superfície em que foram aplicadas. Pode ser feito em parede,
muro ou teto, porém a durabilidade do trabalho é maior em regiões secas, uma vez
que a umidade pode provocar rachaduras na parede e danificar a pintura. O termo
afresco também é utilizado ao se referir a pinturas feitas dessa forma, com as pinturas
em igrejas e edifícios públicos, que ocupam grandes extensões (AFRESCO, 2017).
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Figura 14: Baixo-relevo romano.
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5. IDADE MÉDIA
5.1 Contexto
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As paredes e os vitrais falavam da vida de Cristo [...]” (WOLFFLIN, 2000, p. 78). A
função da música na Idade Média, portanto, era levar os fiéis a um estado de contrição
e drástica humildade, apagando os traços de individualidade, diluindo-os em uma
coletividade submissa. Segundo Fischer (2002), o conteúdo dessa música era
determinado pelo contexto litúrgico e por suas associações: sofrimento divino, pecado
humano. A finalidade da música não era produzir um sentimento subjetivo indefinido,
mas de produzir uma emoção coletiva uniforme. Ela tinha um caráter objetivo, se a
compararmos com o caráter subjetivo e expressivo da música profana, cuja ascensão
coincidiria com a ascensão da burguesia, no fim da Idade Média. A Idade Média, de
modo geral, acaba com o naturalismo do pensamento grego, pois não vê mais a
beleza sensual e física que se manifesta na arte e na literatura e descarta o sensível
como forma de conhecimento, além de que o homem passa a querer sair do “mundo
das sombras” (a realidade) para contemplar a perfeição divina. Chauí (2000) observa,
então, um retorno ao pensamento platônico. A base da filosofia se encontra em Santo
Agostinho e São Tomás de Aquino, dois pensadores medievais importantes, os quais
definiram duas grandes vertentes do pensamento: a Patrística e a Escolástica.
Da tomada de Roma pelos povos bárbaros até o século IX, quando Carlos
Magno foi coroado imperador do Ocidente, a cultura clássica praticamente
desapareceu na Europa Ocidental. Os valores culturais e as expressões artísticas dos
povos invasores são radicalmente diferentes das artes produzidas pelos gregos e os
romanos. Percebemos a ausência da representação da figura humana e uma forte
preocupação decorativa. Santos (2000) destaca que o caráter decorativo da arte
bárbara é consequência do nomadismo daqueles povos. Nesse sentido, eles criaram
pequenos objetos — particularmente joias — que pudessem ser transportados com
facilidade.
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Figura 15: Coroa Imperial (séc. X).
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artistas, artesãos, decoradores e construtores, pois as igrejas eram os únicos edifícios
públicos que continuaram a ser construídos.
O estilo artístico vigente entre o século XI e o início do século XIII na Europa foi
denominado “Arte Românica”, correspondendo ao período caracterizado pela
decadência do sistema feudal. Observa-se, na literatura de história da arte, porém,
que a Igreja conservava poder e influência, determinando a produção cultural e
artística do momento, cuja maior representação foram as basílicas. Pode-se constatar,
então, que a produção artística — seja a pintura ou a escultura — é indissociável da
arquitetura (GOMBRICH, 1999; JANSON; JANSON, 2009). O elemento religioso
conseguiu manter uma unidade de toda a produção artística na Europa, cuja coesão
foi reforçada pela Arte Românica.
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superfícies para aplicar os afrescos (SANTOS, 2000). Os murais românicos eram
inspirados nas iluminuras dos livros religiosos, vastamente produzidos nos mosteiros
e conventos, os quais narravam a história sagrada. A pintura românica não descrevia
assuntos profanos.
.
Fonte: Mestre de Taüll (2002, documento on-line).
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da forma que o estilo se desenvolveu: iniciou-se na arquitetura e, por
aproximadamente um século (de 1150–1250, período equivalente à Época das
Grandes Catedrais), manteve nessa categoria seu papel dominante.
A escultura gótica, incialmente, era rigorosamente arquitetônica em espírito,
porém, após 1200, perdeu essa exclusividade; a pintura gótica, por sua vez, atingiu
seu apogeu criativo entre 1300 e 1350, na Itália Central. Quando examinamos a época
gótica como um todo, observamos uma mudança gradual de ênfase: da arquitetura
para a pintura — ou do caráter arquitetônico para o pictórico. Na fase inicial, tanto a
escultura quanto a pintura gótica refletiram o contexto monumental das grandes
catedrais; na fase final, conhecida como Gótico Tardio, as duas categorias se
empenharam em buscar os efeitos pitorescos, ricos em pequenos detalhes (JANSON;
JANSON, 2009).
Enquanto as estátuas de santos aplicadas às basílicas românicas pareciam
sólidos pilares firmemente encaixados na moldura arquitetônica, o mestre que
trabalhou nas esculturas da Catedral de Chartres (França, 1145–1220) imprimiu vida
a cada uma das figuras.
Fonte: Pack-Shot/Shutterstock.com.
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A pintura gótica prenunciou o Renascimento de forma gradativa, e, claro,
durante muitos séculos antes. É perceptível a procura do realismo na representação
pictórica, sem, contudo, ter obtido êxito naquele momento. Essa categoria artística
desenvolveu-se nos séculos XIII, XIV e início do século XV, com importantes
representações na Itália. Gombrich (1999) atribui à arte italiana o protagonismo na
pintura gótica, devido ao contato da Itália com a Arte Bizantina: os italianos
conseguiram — antes dos demais artistas — transpor a barreira que separa a
escultura da pintura. Apesar de toda a rigidez, a arte bizantina já modelava as faces
em luz e sombra e revelava uma compreensão correta dos princípios do escorço. Um
exemplo da influência da arte bizantina na pintura gótica é encontrado na obra de
Giovanni Gualteri, conhecido como Cimabue, o pintor mais importante do século XIII.
Sua nítida preocupação com o realismo das figuras é exemplificada pela obra Madona
Entronizada.
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pinturas murais e nos afrescos quanto na ilustração de livros (as iluminuras
medievais). As iluminuras e os vitrais são apartes importantes da arte gótica. As
iluminuras são as ilustrações dos manuscritos bíblicos, os quais compartilham os
princípios da pintura gótica. Já os vitrais multicoloridos são fortemente representativos
da arte gótica, sobretudo da arquitetura gótica.
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6. RENASCIMENTO
6.1 Contexto
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No Renascimento, a arte deixa de ser serva do dogma, uma vez que o
Humanismo a salva desse cativeiro. Ela deixa de ser o “útil” de Aristóteles e da Idade
Média e assume a função de mostrar aos homens a realidade da forma lógica e exata,
e o belo assume a definição de perfeição. A arte se une à ciência empírica e passa a
ser reconhecidamente uma forma de conhecimento, é cosa mentale, ou seja, do
espírito e da inteligência. Ela pressupõe o ensino dos mestres, e não dos teólogos. É
racional, e os sentimentos são, em grande parte, vistos como inimigos (SÁNCHEZ
VÁZQUEZ, 1999). A arte no Renascimento conserva as ideias clássicas gregas de
harmonia, equilíbrio, proporção, nas quais a natureza é concebida como a ordem de
todas as coisas. Todavia, não é entendida somente como independente do homem,
visto que abrange todo o universo, todas as ações práticas dos homens, ou seja, as
leis, as convenções estabelecidas pelos homens, a organização política e social.
Sánchez Vázquez (1999) e Eco (2004) observam, no entanto, um conceito de
natureza bastante amplo no Renascimento. A arte utiliza-se das ideias clássicas e das
novas conquistas, como a perspectiva geométrica. A arte cria, dessa maneira, uma
segunda natureza, uma nova realidade, porém de uma forma que transcende a própria
realidade, pois ela manifesta a perfeição racional desejada e idealizada para suas
vidas, mas que só pode ser conhecida por intermédio da razão.
40
O artista tem a sua personalidade própria, é original e criador, principalmente
na pintura. Portanto, este se distingue do artesão, e sua arte se diferencia das artes
mecânicas, manuais e servis. O Renascimento altera a relação medieval entre o divino
e o humano. Deus é mais humano e o ser humano é mais divino. Assim, a natureza e
o corpo do homem entram na estética de beleza platônica da provação e da ordem.
O corpo humano aparece idealizado (homem divinizado), é o belo ideal dos corpos
sensíveis (não o transcendente do medieval). O Renascimento, dessa forma, exclui a
categoria do feio na arte, que existia na Idade Média (GOMBRICH, 2002; ECO, 2004).
6.2. Pintura
Representar a realidade de tal forma que ela pareça algo orgânico e vivo é um
dos objetivos da pintura renascentista. A pintura provocou uma nova concepção de
obra de arte, que, como tal, também deve se tornar um organismo. Não era possível
conceber os organismos de uma pintura — homens, animais, plantas, etc. —, por si
só, como organismos vivos, seu conjunto, que, na natureza, nunca se apresentava
dessa forma, deveria também se tornar uma unidade orgânica (HAUSER, 2003)
A pintura do Renascimento alcança duas importantes conquistas que vinham
sendo buscadas na pintura medieval: a perspectiva e o sfumato, que permitiram o
alcance de um inédito realismo. A combinação da técnica da perspectiva científica e
da aplicação do sfumato permitiu o alcance de um inédito realismo nas pinturas. Ao
dominar esses inventos, o Renascimento viu surgir inúmeros mestres da pintura, cada
qual mantendo suas características próprias. A pintura como imitação do real encontra
na obra de Masaccio (1401–1428) sua manifestação. Primeiro mestre reconhecido da
Renascença Italiana (do período Quattrocento), Masaccio produziu afrescos com uma
plasticidade e realismo nunca vistos. O cuidadoso realismo de Masaccio parece
convencer o espectador da veracidade da cena retratada e convidá-lo a participar da
pintura, como no grande afresco da igreja de Santa Maria Novella, em Florença.
41
Figura 19: Santíssima Trindade (1427) — Mural em Santa Maria Novella, Masaccio.
42
tem despertado a atenção dos observadores e proporcionado diversas leituras,
teorias, textos, música e, inclusive, filmes.
43
ocupa o retábulo central do conjunto (SANTOS, 2000; BAUMGART, 1999). Deus é
representado por uma figura masculina com corpo vigoroso, cercada de anjos, e
estende a mão para tocar a mão de Adão, representado por um homem jovem, “[...]
cujo corpo forte e harmonioso concretiza magnificamente o ideal de beleza do
Renascimento” (SANTOS, 2000, p. 89).
Figura 21: A Criação do Homem, Teto da Capela Sistina (1508–1512), Vaticano, Roma.
44
Figura 22: Escola de Atenas (1509–1511), Stanza della Segnatura, Vaticano, Roma.
6.3 Escultura
45
Figura 23: Monumento Equestre a Colleoni (1480–1488), Veneza.
46
Na escultura da juventude artística de Michelangelo, Argan (2003) ressalta o
conceito de “inacabado”, que será adotado pelo artista em suas esculturas da fase
madura. Nessa obra, ao contrário, deve-se falar do “demasiadamente acabado”: “As
imagens são concebidas em uma dimensão que está além da realidade natural, além
do espaço: a luz deve fluir sobre a forma polida sem penetrar nela, o ar não deve
envolvê-la nem ofuscá-la” (ARGAN, 2003, p. 28).
47
7. BARROCO
Na história da arte, refere-se à arte produzida no século XVII até meados século
XVIII (consensualmente entre 1600 e 1750) como barroco. O termo foi utilizado pela
primeira vez no fim século XVIII e aplicava-se aos fenômenos que, de acordo com a
estética classicista predominante, eram considerados extravagantes, confusos e
bizarros. É importante salientar que o Classicismo (o modelo renascentista) não se
incluía nesse conceito e permaneceu presente nas expressões artísticas até quase o
fim do século XIX — o estilo neoclássico atesta sua prevalência. Embora não exista
consenso quanto ao significado do termo Barroco, uma das correntes o identifica
como um nome originário da Península Ibérica que significa “pérola de origem
irregular” (WOLFFLIN, 2000; HAUSER, 2003; BAUMGART, 1999). Essa acepção foi
utilizada de maneira depreciativa para caracterizar as inovações artísticas posteriores
ao Renascimento e como denúncia aos exageros cometidos pelos artistas pós-
renascentistas.
As subdivisões mais importantes do Barroco são: o Barroco cortesão--católico
e o Barroco classicista. O Barroco cortesão-católico tem uma tendência sensualista,
monumental e decorativa, é aquilo que se entende pela acepção tradicional de
“barroco”. Já o Barroco classicista é um estilo mais estrito, formalmente mais rigoroso.
Nessas duas tendências, os fatores sociais que determinam o Barroco geram
impactos distintos e serão estudados à luz da teoria e das obras produzidas
(HAUSER, 2003).
O contexto do surgimento do movimento na Europa possui estreita ligação com
a reação da Igreja Católica à Reforma Protestante (século XVI). A Contrarreforma ou
Reforma Católica decretou que a arte deveria inspirar os espectadores com temas
fervorosamente religiosos.
O Barroco é reflexo de aspectos importantes desse período da história da
civilização ocidental (século XVII), em que ocorreram mudanças que conferiram novas
feições à Europa da Idade Moderna. Embora tenha sido um movimento de caráter
religioso, a Reforma Protestante teve consequências que ultrapassaram os limites da
fé, provocando mudanças em outros aspectos da cultura europeia. A mais significativa
vertente dessas mudanças o surgimento dos Estados nacionais e dos governos
absolutos, fenômeno em que cada nação conseguiu se libertar da submissão
exclusiva ao papa (WOLFFLIN, 2000). Contudo, para entender os princípios do
48
Barroco, é imperativo conhecer os trabalhos conciliados à atuação das grandes
ordens religiosas (como a Companhia de Jesus) para a retomada de força da Igreja
Católica na edificação de grandes e novas igrejas, originalmente uma iniciativa
italiana. Esses princípios serão absorvidos e adaptados às demais categorias
artísticas, dentre elas: pintura, escultura, literatura e teatro. Além disso, pode-se incluir
nessas categorias o urbanismo — por meio dos traçados urbanos — e o paisagismo
— por meio das monumentais arquiteturas da paisagem, realizadas especialmente
sob o domínio dos governos absolutos, como no caso da França.
Fato, a arquitetura barroca (tanto a religiosa quanto a cortesã) incorpora os
elementos da arquitetura clássica, reunindo todas as peças formais já conhe-cidas:
colunas (novidade na utilização de meias colunas e pilastras), arquitrave e frisos. A
distribuição dessas peças formais também emprega características clássicas, como a
vasta entrada central emoldurada por colunas e ladeada por duas entradas menores.
No entanto, o modo como os elementos clássicos passam a ser arranjados indica que
as regras greco-romanas e renascentistas ficaram para trás. Há, por exemplo, a
duplicação de pilastras (em outros casos, há duplicação de mais elementos), com
objetivo de imprimir maior riqueza, solenidade e variedade de linguagem (GLANCEY,
2001) Uma importante característica da Igreja de Il Gesù é a cenografia. O arqui-teto
tratou a fachada de forma a evitar a repetição e a monotonia, organizando as partes
de modo a conseguir um clímax no centro da composição, realçando a entrada
principal por uma dupla coluna. Sobre esse aspecto cenográfico, Gombrich (1999, p.
389) observa: “Na fachada de Giacomo della Porta para a primeira igreja jesuíta tudo
depende do efeito proporcionado pelo conjunto. Tudo está fundido num vasto e
complexo padrão”. Uma forma recorrente na arquitetura barroca de igrejas e
completamente inédita é o emprego das volutas, ausentes na arquitetura clássica. As
volutas laterais realizam a conexão entre os andares inferior e superior, e são
justamente essas formas curvas e espirais as responsáveis por grande parte das
censuras aos construtores barrocos pelos defensores da pureza das formas clássicas.
Na arqui-tetura sacra barroca, as volutas operam de modo a conferir coerência e
unidade às complexas composições das fachadas (GLANCEY, 2001; GOMBRICH,
1999). O Barroco é um estilo que abusa dos ornamentos e das decorações, e os inte-
riores são notadamente espetaculares, como revela o interior de Il Gesù (Figura 3). A
profusão de elementos decorativos marca a estética barroca, criando um espaço
49
cenográfico com forte apelo emocional, no qual arquitetura, a escultura e a pintura se
fundem. Fazio (2011, p. 361) destaca o teto da nave central.
Figura 25: (a) Interior de Il Gesù com (b) afresco do teto da nave central.
Fonte: (a) Rom Il Gesu Hauptorgel (2007, documento on-line); (b) Triumph of the Name of Jesus
(2015, documento on-line).
50
Figura 26: (a) Palácio de Versalhes e seus (b) jardins (1661–1750), França.
51
estava diretamente comprometida com a nova realidade (Contrarreforma Católica e
Absolutismo), promovendo o anúncio dos seus valores. Nas categorias artísticas
(arquitetura, escultura e pintura), as obras romperam o equilíbrio entre o sentimento e
a razão, com o predomínio das emoções. O Quadro 1, a seguir, apresenta os
princípios caracterizantes do Barroco, estabelecendo uma comparação com os
princípios renascentistas, visando à compreensão da revolução formal e conceitual
barroca, sem, contudo, adentrar em critério de juízo estético em relação às distintas
produções.
52
os sentidos e despertar
as emoções
Artes Individualizadas Fundem-se na unidade
barroca, criando um
espetáculo dinâmico,
colorido e brilhante, que
se traduz em exaltação
Composição pictórica Linha central imaginária Linha diagonal
e escultórica imaginária
Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.
53
Figura 26: (a, b) Baldaquino da Basílica de São Pedro (1624–1633), Roma.
54
Figura 27: A vocação de São Mateus (1596–1598).
55
um virtuoso na técnica, Velázquez preferia a moderação à ostentação, o realismo ao
idealismo” (STRICKLAND, 2002, p. 60).
O Barroco espanhol recebeu influências diretas do Barroco italiano,
principalmente no uso expressivo da luz e sombra. A pintura espanhola, porém,
conserva preocupações próprias do espírito nacional, com ênfase no domínio técnico
e no realismo. Os principais pintores do Barroco espanhol são: El Greco (1541–1614),
cuja característica é a verticalidade das figuras, e Diego Velázquez (1599–1660), que
representa as distinções particularizastes do Barroco na Espanha. Desde muito jovem
(com 24 anos), Velázquez foi admitido como pintor oficial da corte espanhola, e, a
partir de então, passou o resto de sua vida pintando a aristocracia da Espanha.
Soberbamente talentoso, o artista também retratava os tipos populares do seu país,
documentando o dia a dia do povo naquele momento histórico. Impressionado com a
obra de Caravaggio, estudou profundamente a aplicação da luz. “[...] mas, em
Velázquez a luz tem uma função diferente: ela estabelece um clima mais intimista para
as cenas retratadas” (SANTOS, 2000, p. 111). Além do realismo e do exímio domínio
técnico, o que caracteriza a obra de Velázquez é a dignidade com a qual ele retratava
seus modelos: quer pintasse o rei, quer pintasse o bobo da corte. A rígida tradição
formal dos retratos da nobreza foi humanizada pela pintura do artista, abordando os
personagens em poses mais naturais, sem acessórios exagerados. “Apesar de ser
um virtuoso na técnica, Velázquez preferia a moderação à ostentação, o realismo ao
idealismo” (STRICKLAND, 2002, p. 60).
56
Figura 28: A lição de anatomia do Doutor Tulp (1632).
57
8. ARTE BARROCA NO BRASIL
58
possuem duas torres. A Figura 11, a seguir, apresenta dois modelos análogos: a Igreja
de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos (século XVIII), no Pelourinho, em Salvador,
e o Santuário Bom Jesus do Monte (início das obras no século XVII) em Braga, em
Portugal.
No início do século XVIII, há algumas manifestações de exuberância das
fachadas no barroco brasileiro, contudo, trata-se de uma exceção. Mesmo no seu
período áureo, as igrejas barrocas nacionais — a exemplo das igrejas portuguesas —
são marcadas pelo contraste entre a simplicidade dos exteriores e a opulência
decorativa dos interiores. Esse aspecto diz respeito à virtude do recolhimento,
requisito fundamental à alma cristã, pregado pelos jesuítas. “Esses primeiros 30 anos
marcam a difusão no Brasil do estilo ‘nacional português’, sem grandes variações nas
diversas regiões” (BARROCO BRA-SILEIRO, 2018, documento on-line). Em meados
do século XVIII, inicia-se um período de estagnação na economia do Nordeste — com
exceção de Pernambuco —, coincidindo com o surgimento de um novo centro de
produção, localizado no Rio de Janeiro, que passa a ser capital da colônia (1763).
Simultaneamente, na região de Minas Gerais, a descoberta de ouro (1695) e diamante
(1730) propicia o florescimento dos maiores artistas barrocos brasileiros: Mestre
Valentim (1745–1813), no Rio de Janeiro, e Aleijadinho (1730–1814), em Ouro Preto
e adjacências, em Minas Gerais. (MACHADO, 1978) A riqueza da exploração do ouro
trouxe prosperidade para a região de Minas Gerais, onde se desenvolveu um núcleo
tardio do Barroco riquíssimo. Além do valor agregado pelo ouro, o requinte da
arquitetura ali desenvolvida será referência para o Barroco nacional, que passará a
ser conhecido como Barroco mineiro. A Igreja de São Francisco de Assis (1765–
1812), em Ouro Preto, é um exemplar incomparável da tradição do Barroco mineiro
(Figura 29). De acordo com Lemes (2012, p. 53–54): “[...] possui um traçado curvilíneo
alongado; as paredes externas ora são côncavas ora são convexas; as torres são
embutidas no corpo da igreja que lembra, segundo os guias turísticos locais, uma
caravela de cabeça para baixo, em um capricho de Aleijadinho que não esqueceu
nem mesmo dos canhões nas janelas”.
59
Figura 29: (a) Fachada e (b) detalhe da porta da Igreja de São Francisco de Assis, Ouro Preto.
60
9. MANEIRISMO
61
Outro artista de destaque do maneirismo foi Domenico Theotocopoulos, conhecido
como El Greco, por ter nascido na ilha grega de Creta. Ele viveu por pouco tempo na
Itália e finalmente fixou moradia na Espanha, onde produziu muitas pinturas que
exploram as distorções dos corpos e da composição com teor sacro. A Espanha
possuía um povo cristão fervoroso, por isso o maneirismo popularizou-se rapidamente
no país, culminando no aumento das encomendas de pinturas de El Greco
(GOMBRICH, 1999). Na Figura a seguir, você pode ver uma das obras do artista.
Figura 31: A adoração dos pastores (1612–1614), El Greco. Óleo sobre tela, 319 × 180 cm. Museu
do Prado, Madrid, Espanha.
62
num espaço restrito, o que torna a luminosidade emanada do menino Jesus um fator
de contraste e expressividade. De modo semelhante aos pintores maneiristas, os
escultures Jean de Bou-logne (1529–1608) e Benvenuto Cellini (1500–1571)
exploraram ao máximo as dinâmicas e movimentos das esculturas, apresentando
poses e composições com entrelaçamento dos corpos e muitos detalhes. Na Figura
3, você pode ver tais características presentes na escultura O rapto da Sabina, de
autoria de Giambologna, como ficou popularmente conhecido o escultor Jean de
Boulogne. Essa obra “[...] deu a Giambologna a oportunidade de descobrir uma
maneira de reunir várias imagens em uma composição única e relativamente compli-
cada. O escultor incluiu o alongamento sutil na solução para os complexos problemas
espaciais criados pelos três corpos entrelaçados [...]” (FARTHING, 2011, p. 203). Os
corpos estão unidos de tal forma que se torna necessária muita atenção para
identificar a quem pertence as mãos e os braços dispostos na escultura.
63
10. ROCOCÓ
Acredita-se que [a palavra] tenha sido cunhada por um aluno de Jacques-Louis David (1748–
1825) na década de 1790, quando a reputação do rococó estava em seu momento mais baixo.
A palavra é uma fusão bem-humorada de “recaille”, um estilo extravagante de enfeite com
pedras usado em fontes, e “barroco”, palavra italiana que deu origem ao estilo barroco
(FARTHING, 2011, p. 250).
64
Enquanto a arquitetura barroca trabalhava com fortes efeitos dramáticos entre
seus elementos, servindo-se da pintura e da escultura para criar um mundo de glória
divina, a arquitetura rococó buscava o requinte e a sofisticação. Por isso, teve mais
destaque na decoração de interiores, compondo espaços com suavidade e sem os
excessos barrocos. A arquitetura rococó só floresceu na França após a morte do rei
Luís XIV e a ascensão de Luís XV ao trono. Até então, a arquitetura barroca era
recorrente tanto nas construções religiosas quanto em palácios de reis e príncipes que
queriam exibir seu poderio e se diferenciar de seus súditos. Na arquitetura rococó, era
recorrente o uso de cores aporcelanadas, os brancos e o ouro, preferencialmente tons
claros que davam luz a fantasias da ornamentação com arabescos, pássaros, cenas
campestres, conchas, etc., pintados ou entalhados. Na parte exterior dos edifícios do
estilo rococó, é frequente uma arquitetura mais sóbria do que a barroca, que
exagerava na ornamentação exterior, replicada no interior (READ, 1978). São
utilizadas menos colunas e elementos decorativos, pois o foco principal são os
interiores, que buscam um espaço equilibrado e sem os excessos barrocos.
Como a arte rococó teve mais destaque no campo ornamental, houve ampla
produção de tapeçarias, porcelanas, pinturas e esculturas delicadas e agradáveis. Os
móveis desse período recebem atenção especial: seus pés cabriolet apresentam
sinuosidade em formato de S; em algumas áreas, ocorre o uso de ornamentações
com conchas, folhagens espiraladas e flores esculpidas; como acabamento, os
móveis são laqueados com verniz que realça o veio da madeira. A arte rococó
produziu uma visão de elegância fantasiosa e compôs um universo à parte para os
nobres e aristocratas. As suas funções principais eram a distração e a beleza, por isso
causou tanta revolta em artistas do movimento posterior, neoclassicismo. Entretanto,
mesmo repleta de frivolidade, a arte rococó desvendou caminhos interessantíssimos
ao valorizar a transitoriedade da beleza e romper com a dramaticidade da arte barroca.
65
Figura 32: Salão oval do príncipe, Hotel Soubise, Paris, França.
66
11. NEOCLASSICISMO
67
um tutor para educar seus filhos. Mestre e aprendiz faziam uma rota educativa por
cidades importantes da Europa. Nessas viagens, além de adquirir conhecimentos e
fazer aulas de línguas, dança, etc., os nobres compravam pinturas para enriquecer a
coleção de suas famílias
Esse novo olhar sobre as culturas clássicas, incitado tanto pelas ideias
iluministas quanto pelo Grand Tour, rompe com as fantasias amorosas e as
ornamentações repletas de rocaille. As pinturas divertidas de amantes envoltos em
erotismo com cores claras e elegantes perdem espaço para pinturas com narrativas
literárias e históricas. Nesse momento, a própria aristocracia investe em obras
neoclássicas, devido à ampla divulgação desse tipo de arte pelos nobres que
realizavam o Grand Tour.
Do mesmo modo que a arte neoclássica rompe com a arte Rococó, ela também
questiona o exagero no uso dos ornamentos e a dramaticidade religiosa da arte
barroca. Por isso, pode-se dizer que a arte neoclássica, mesmo estando presente em
países de regime monárquico, é a arte da burguesia, que nega tanto o totalitarismo
da aristocracia quanto o catolicismo. Na França revolucionária, os estilos Barroco e
Rococó são varridos, pois os revolucionários almejavam a liberdade de uma Atenas
ressurgida (GOMBRICH, 1999). A arte neoclássica foi utilizada para a divulgação dos
valores da burguesia, que culminou na Revolução Francesa. O artista Jacques-Louis
David, um dos principais representantes do Neoclassicismo, produziu pinturas que
exaltavam os valores da vida moral da Antiguidade como um ensaio à Revolução. A
Figura 1, O Juramento dos Horácios, é considerada por Farthing (2011) a primeira
obra-prima neoclássica. Ela retrata a lealdade dos irmãos Horácio à nação. A imagem
foi estruturada com cores fortes e um desenho rígido, no qual as sombras são
minuciosamente estruturadas para realçar o heroísmo da cena. Todos os elementos
retomam o passado romano. As roupas dos irmãos Horácio, em vermelho vivo,
realçam a sua paixão e a sua entrega ao Estado. Certamente, imagens como O
Juramento dos Horácios foram fundamentais para divulgar os ideais revolucionários e
contribuir com a criação de um espírito de revolta e sacrifício. Entretanto, após a
ascensão de Napoleão Bonaparte, os temas das pinturas neoclássicas tomaram
novos rumos e “[...] os artistas começaram a dar mais destaque ao esplendor do
Império Romano, e não ao caráter moral da República [...]” (FARTHING, 2011, p. 261).
68
Figura 33: O Juramento dos Horácios (1784), Jacques-Louis David. Óleo sobre tela, 330 × 425 cm.
Museu do Louvre, Paris, França.
69
sentido, a retomada dos valores clássicos justificava e mascarava a luta pelos valores
arbitrários da burguesia, defendidos como universais. Afinal, a luta pela beleza
absoluta e pela verdade seria uma luta digna (PINELLI, 1977). Para os Neoclássicos,
a beleza era a junção entre as ideias e a matéria, ou seja, a sujeição da matéria às
normas, buscando as verdades permanentes e racionais. A beleza era considerada
divina, cabendo ao artista possibilitar à humanidade a contemplação da perfeição. A
arte teria papel superior por revelar a verdade universal burguesa e servir como fonte
de mobilização social. De acordo com Pinelli (1977), a imitação da natureza era o foco
principal dos artistas, mas não se pode confundir imitação com cópia, pois são
conceitos distintos. A imitação representa a essência do objeto, seguindo as leis do
belo que estavam ocultas pela matéria. Por isso, o artista deveria agir filosoficamente
para não descer ao nível do artesanato, que apresentava cópias da natureza sem
preocupação com o belo. Afinal, a distinção entre as artes liberais e o artesanato
instaurada pelos teóricos renascentistas volta a ser central na arte. A imitação da
natureza se estendia à imitação da história, buscando re-presentar uma verdade
universal determinada a partir da seleção crítica. Um episódio famoso foi o do artista
John Singleton Copley, que produziu uma pintura, em 1785, sobre a recusa do
presidente da Câmara dos Comuns em entregar cinco membros ao rei Carlos I, que
os acusava de traição à Coroa. O artista fez uma exaustiva pesquisa sobre os
membros da Câmara dos Comuns para ser o mais fiel possível ao acontecimento.
Inclusive, utilizou retratos dos membros como base para a sua pintura (GOMBRICH,
1999). A pintura de Copley anunciava a ruptura com o poder absolutista, explorada
também por outros artistas Neoclássicos. A preferência por temas do heroísmo
clássico ia ao encontro do espírito revolucionário, pois as “[...] pessoas achavam estar
vivendo tempos heroicos e [acreditavam] que os acontecimentos de seus próprios dias
eram tão dignos de atenção do pintor quanto os episódios da história grega e romana
[...]” (GOMBRICH, 1999, p. 382).
Um ótimo exemplo é a obra A morte de Marat , de Jacques--Louis David. Nela,
o artista representa o assassinato de Jean-Paul Marat, um importante participante da
Revolução que promoveu a divulgação de listas de nomes de pessoas que deveriam
ser guilhotinadas por serem traidoras do novo sistema. De acordo com Farthing
(2011), Marat foi retratado como um santo martirizado, o que realçou o seu heroísmo
e a sua morte trágica. Marat foi assassinado pela jovem Charlotte Corday, que o havia
visitado com o pretexto de transmitir informações sobre traidores da Revolução.
70
Figura 34: A morte de Marat (1793), Jaques-Louis David. Óleo sobre tela, 1,28 × 1,62m. Museu dos
Mestres Anti-gos, Bruxelas, Bélgica.
71
A arte neoclássica se expandiu para diversos países. No Brasil, ela chegou com a
Missão Artística Francesa em 1816, a pedido do príncipe regente Dom João VI, que
pretendia criar a Academia e Escola Real de Belas-Artes. Os artistas que vieram na
Missão influenciaram a arte e a arquitetura nacionais. O arquiteto Grandjean Montigny
criou o projeto para a Academia a partir da estética neoclássica, dando origem à
disseminação do estilo, que mais tarde seria empregado em diversas construções.
Entre elas, estão: o hospício D. Pedro II, transformado na Santa Casa de Misericórdia,
e o Palácio do Catete, que hoje é o Museu da República.
72
à Bíblia, além de retratos, naturezas-mortas e paisagens. Todas as pinturas deveriam
apresentar a perfeição a partir das leis do desenho e da pintura. Como você pode
imaginar, “esse trabalho de imitação só era possível através de um cuida-doso
aprendizado das técnicas e convenções da arte clássica”. Vem daí “[...] o
convencionalismo e o tecnicismo [que] reinaram nas academias de belas-artes, até
serem questionados pela arte moderna [...]” (PROENÇA, 1991, p. 122). Além de
delimitar os temas e as técnicas, a Academia restringia os estilos em duas grandes
áreas. De um lado, estava a arte neoclássica, que buscava um desenho limpo e linear,
sujeitando a cor à delimitação do desenho. Do outro, a arte romântica, que explorava
a expressividade da cor e composições com mais movimentos e dinamismo. A
Academia buscava controle total sobre a produção artística e inclusive fazia a
mediação entre os artistas de destaque e os investidores da arte por meio de
concursos de pintura. O Prix de Rome era o mais famoso, e os seus ganhadores eram
agraciados pelo reconhecimento da crítica e por estudos gratuitos por tempo
determinado na Academia. Anualmente, também era realizado o Salão de Paris,
expondo pinturas de diversos artistas da Academia e possibilitando o seu
reconhecimento (FARTHING, 2011). A seção de arquitetura da École des Beaux-Arts
não defendia um estilo específico. Contudo, os estudantes passavam longos períodos
em Roma para fazer desenhos das construções clássicas que serviriam de inspiração
para a criação de seus próprios projetos (FAZIO; MOFFET; WODEHOUSE, 2011).
Assim como a École des Beaux-Arts detinha o controle sobre a produção de pinturas
e esculturas, ela também detinha o controle sobre a arquitetura. Os alunos passavam
por uma rigorosa avaliação para serem admitidos na Academia e depois participavam,
a cada dois meses, de concursos que determinavam a sua progressão nos estudos.
Os estudantes de arquitetura também recebiam a premiação do Prix de Rome, que
conferia estudos por longo período em Roma. A arte e a arquitetura neoclássicas
também ficaram conhecidas como “estilo Luís XVI”. Tal estilo aplica elementos tendo
por referência o espírito grego e romano. Nesse sentido, “Da antiguidade, conserva
sobretudo as ricas guarnições dos frontões das portas assentados em consolos, os
dentículos, o friso de guirlandas contínuo da cornija e os relevos mitológicos nos
painéis [...]” (DUCHER, 2001, p. 158). A École des Beaux-Arts manteve o seu império
sobre a produção artística por vários séculos. Ela só foi questionada pelos artistas
realistas e impressionistas, que criaram exposições paralelas, explorando um olhar
modernista tanto na temática quanto nas técnicas artísticas. Assim, com o surgimento
73
dos movimentos artísticos de vanguarda, a exatidão formal e a rigorosidade no
tratamento da temática são abandonados em busca de novos caminhos para a arte.
74
12. IMPRESSIONISMO
75
Figura 35: Impressão, nascer do sol (1872), óleo sobre tela, 48 cm × 63 cm, Claude Monet, Museu
Marmottan, Paris, França.
76
em um objeto amarelo, ele deveria utilizar pequenas pinceladas violetas ao lado de
pinceladas amarelas.
O círculo cromático é composto por três grupos de cores: cores primárias,
secundárias e terceárias. As cores primárias são amarelo, vermelho e azul, já as cores
secundárias são resultantes da mistura entre duas cores primárias — a mistura do
vermelho com o azul resulta no violeta, a mistura do amarelo com o azul resulta no
verde e a mistura do vermelho com o amarelo resulta no laranja —; assim, as três
cores secundárias são o violeta, o verde e o laranja. Por fim, as cores terciárias são
resultantes da mistura entre uma cor primária e uma cor secundária que se encontra
ao lado no círculo cromático, por exemplo, a mistura entre o amarelo e o verde resulta
no verde-amarelado. As novas combinações de cores, que buscavam constituir uma
pintura ótica, somadas a pinceladas aparentes e com excesso de tinta constituíram a
estética impressionista, a qual revolucionou a arte, dando origem aos movi-mentos
modernistas posteriores. Entretanto, os artistas impressionistas não eram bem vistos
pelos críticos e artistas acadêmicos, ainda centralizados no gosto neoclássico ou
romântico, por isso fizeram sua primeira exposição, em 1874, no estúdio do fotógrafo
Nadar. A relação do Impressionismo com a fotografia não se resume ao uso do estúdio
para a primeira exposição, pois os artistas buscavam a mesma esponta-neidade do
registro fotográfico em suas pinturas. Com a invenção das câmeras fotográficas
portáteis, tornou-se comum a produção de fotografias de figuras humanas em
movimento, resultando em borrões. “A máquina fotográfica ajudou a descobrir o
encanto da cena fortuita e do ângulo inesperado. Além disso, o desenvolvimento da
fotografia iria impulsionar ainda mais os artistas em seu caminho de exploração e
experimento” (GOMBRICHT, 1999, p. 416). Antes da fotografia portátil, o artista era
requisitado para imortalizar as pessoas mais ricas em suas pinturas, dando à arte uma
finalidade utilitária. Entretanto, os artistas “[...] até então incumbidos de retratar
pessoas e paisagens são substituídos por fotógrafos, tornando-se assim mais livres
para realizar novas pesquisas e experimentos com as telas e os pincéis” (CANTON,
2002, p. 18). Isso justifica os novos caminhos para a arte encontrados pelos artistas
modernistas do Impressionismo e de outros movimentos artísticos do fim do século
XIX e da primeira metade do século XX. Além da influência da fotografia, os artistas
impressionistas foram impactados pelas gravuras japonesas. Os artistas do novo
movimento as admiravam, pois eram imagens que rompiam com os padrões da arte
clássica ao desprezarem a centralização da composição ou produzirem
77
representações recortadas pela mar-gem. De acordo com Gombricht (1999), as
gravuras japonesas se disseminaram pela Europa a partir das trocas comerciais da
época. As estampas japonesas eram encontradas nas casas de chá, normalmente
utilizadas para envolver os produtos.
78
13. EXPRESSIONISMO
79
do homem apresentam acentuada distorção, aproximando-se da representação de
máscaras utilizadas por povos africanos. Isso denota a admiração que Kirchner tinha
pelo primitivismo e pela simplicidade.
O grupo O Cavaleiro Azul foi composto por artistas que exploravam sua própria
maneira de representar os estados de espírito. Enquanto Kandinsky explorava uma
arte pura que se assemelhasse à música, Franz Marc se atinha às forças vitais da
vida animal e “[...] inspirava-se na beleza natural, no jogo da luz sobre flores e folhas
que desejavam concentrar e tornar claras nas telas que pintavam” (READ, 1978, p.
142). Foi Wassily Kandinsky (1866–1944) que os artistas do grupo Os Cavaleiros
Azuis seguiram. Ele era um artista intelectualizado que almejava uma arte que
expressasse tão bem quanto possível os efeitos psicológicos da disposição dos
elementos formais na obra de arte.
A arte abstrata surgida a partir de Kandinsky não se limitou ao Expressionismo
alemão e, durante as próximas décadas, deu origem a outros movimentos artísticos.
Entretanto, o interesse de Kandinsky era a criação de pinturas que explorassem os
elementos da visualidade, assim como a música explora as sonoridades. Suas
pinturas não tinham interesse na imitação da natureza, pois estavam voltadas à
captura da expressão de sentimentos por meio da disposição dos elementos formais
80
da visualidade, ou seja, como as cores, as linhas, as formas e texturas poderiam
atingir o espírito humano. Outra característica dos expressionistas foi a retomada da
produção de xilogravuras, pois a técnica refletia a simplicidade que almejavam na arte.
A técnica de xilogravura foi muito utilizada durante a Idade Média e pelo artista
Albrecht Dürer, pertencente ao Renascimento germânico. O uso de poucas cores
resultou em um trabalho de extrema expressividade nas mãos dos artistas alemães.
Por explorarem a expressividade por meio das pinturas, o que culminava na distorção
e na representação do lado sombrio da humanidade, o governo nazista perseguiu os
artistas que pertenciam ao movimento e fez exposições de suas obras, classificando-
as como arte degenerada. Nesse período, os artistas fugiram para outros países e
levaram consigo as influências desse tipo de arte para várias regiões do mundo.
81
14. ARTE MODERNA
82
As vanguardas artísticas costumam ser estudadas a partir de alguns
movimentos principais, são eles: Futurismo; Expressionismo; Cubismo, Dadaísmo; e
Surrealismo. Esses movimentos tinham em comum a organização de grupos de
artistas que publicavam manifestos para divulgar os seus projetos artísticos. São
esses manifestos que validavam cada movimento, ao propor princípios estéticos,
mantendo os artistas coerentes tanto em estética quanto em temática. O caráter
inovador da arte de vanguarda fez o cenário artístico viver uma constante
transformação, uma vez que não existiam mais preceitos estéticos universalmente
válidos. O público estava aberto às inovações e almejava saber o que existia de mais
novo no cenário artístico. Os críticos e negociantes organizavam exposições às
pressas para conseguir dar conta da atualidade das produções.
No Brasil, as vanguardas se manifestam a partir de artistas que, ao viajarem
para a Europa, traziam a nova visão sobre o cenário artístico vanguardista e buscavam
modernizar a arte brasileira, ainda guiada pelos princípios aca-dêmicos. Uma das
artistas que introduziu a Arte Moderna no Brasil foi Anita Malfatti, que, em 1917, expôs
seus quadros do período em que esteve estudando na Alemanha e em Nova Iorque.
Dentre as pinturas estavam A boba, A estudante russa e O homem amarelo, que
exibiam um novo modo de utilizar a cor (CANTON, 2009). Na obra A boba (Figura 1),
pode-se perceber como a pintura de Malfatti havia superado os padrões acadêmicos
ao apresentar cores fortes e linhas tortas. Há referências das vanguardas europeias,
principalmente do movimento Expressionista, que explorava a expressividade por
meio da cor. O fundo é marcado com pinceladas que criam um cenário incômodo,
contrastando com a figura central, representada com o rosto torto e um olhar disperso.
83
Figura 37: A boba (1915-1916), Anita Malfatti, óleo sobre tela, 61 cm/50,6 cm. Mac-Usp, São Paulo,
Brasil.
84
vibrante. Inicialmente, os artistas realizavam misturas de cores, mas, aos poucos,
passam a explorar pinceladas espontâneas, com cores puras. O grupo fauvista,
mesmo tendo durado pouco, apresentou uma nova maneira de lidar com a pintura. “O
que esses artistas têm em comum é o desejo de dispensar tudo o que é ‘extra’ na
representação de uma imagem na tela, dando chance para a cor, com seus próprios
contrastes, de cobrir superfícies e dar forma à representação” (CANTON, 2002, p. 41).
Na obra Ponte sobre o rio (Figura 38), de André Derain, pode-se observar como
se dava o uso da cor e da deformação pelos fauvistas. As cores não criam uma
representação naturalista, pois o artista utilizou tons de azuis, verdes, laranjas e
amarelos para representar uma árvore que aparenta estar em chamas. O interesse
também não é captar os efeitos luminosos, como faziam os impressionistas, pois a
pintura faz o uso das cores sem se ater à sua combinação ótica.
Figura 38: Ponte sobre rio (1906), André Derain, óleo sobre tela, 82,5 cm/101,5 cm, MoMA, Nova
Iorque, Estados Unidos.
85
de profundidade da tela. O tema da pintura foi um grupo de prostitutas de Barcelona,
mas a deformação de seus rostos sugere a influência das máscaras africanas sobre
os trabalhos do artista. A pouca variação de cores e o uso da fragmentação nas formas
foram técnicas inovadores para a época, colocando Picasso como um dos principais
artistas das vanguardas europeias (FARTHING, 2011).
Figura 39: Les Demoiselles d’Avignon (1907), Pablo Picasso, óleo sobre tela, 2,44 m/2,34 m, Museu
de Arte Moderna, Nova Iorque.
86
Ele só pode ser usado com formas mais ou menos familiares. Quem olha para o
quadro deve saber qual é o aspecto de um violino, para poder relacionar entre si
os vários fragmentos no quadro. É por isso que os pintores cubistas escolhem
usualmente motivos familiares – guitarras, garrafas, fruteiras ou, ocasionalmente,
uma figura humana – onde podemos facilmente encontrar o nosso caminho
através dos quadros e entender as relações entre as várias partes (GOMBRICH,
1999, p. 456).
87
desenvolvimento tecnológico, em oposição a qualquer tipo de tradição. O manifesto
futurista anunciava uma arte inovadora, que via na guerra e na destruição do passado
a chance de construir uma nova arte, mais coerente com uma sociedade desenvolvida
tecnologicamente. As experimentações cubistas foram influentes entre tais artistas,
que utilizavam a fragmentação das formas e das cores para representar as dinâmicas
da velocidade.
88
15. POP ART
89
(Figura 1). O artista empregava a sua técnica apurada de detalhamento inspirada nas
histórias em quadrinhos para reproduzir pinceladas orgânicas, comuns nas obras
expressionistas, a fim de demonstrar que aquele tipo de registro não se referia ao
estado emocional absoluto. Lichtenstein evidenciou que o Expressionismo Abstrato
se estruturava a partir de um conjunto de símbolos que as pessoas costumavam
associar à expressão de sentimentos.
A Pop Art tornou o cenário artístico mais dinâmico, possibilitando a livre
comercialização das obras. Os artistas aceitaram a arte como produto, e a imprensa
divulgava a ideia de uma arte divertida. A oposição à arte expressionista abstrata
parecia ser a melhor saída para o artista da época, que não precisava continuar
contestando a burguesia por meio de atitudes boêmias. Lembre-se de que as
vanguardas artísticas buscavam uma arte de ruptura com os sistemas sociais,
principalmente de ruptura com a burguesia. Os artistas viviam uma imensa
contradição: ao mesmo tempo em que negavam a ordem social estabelecida,
precisavam ser aceitos para conseguirem comercializar as suas obras. Entretanto, a
partir da Pop Art, os artistas passaram a viver entre os burgueses, pois não tinham
medo de serem confundidos com eles. Como certa vez “[...] disse Warhol (apud
WOLFE, 2009, p. 93) [...]: nada é mais burguês do que ter medo de ser burguês”.
90
Além de contestar o Expressionismo Abstrato que tomava conta do mercado
norte-americano, a Pop Art buscava romper com a distinção entre cultura de elite e
cultura de massa. Tal ruptura, contudo, não foi bem-sucedida. Afinal, as pinturas
criadas na Pop Art não atingiam o grande público e recebiam um alto valor agregado
quando eram comercializadas nas galerias de arte, devido à sua autenticidade. Seria
mais coerente dizer que a Pop Art contaminou a cultura de elite com a cultura de
massa. Em suma, a Pop Art surgiu como uma arte jovem e de ampliação da atuação
do artista, que poderia utilizar qualquer imagem que a cultura de massa lhe
oferecesse. Nas palavras do artista Richard Hamilton (apud FARTHING, 2011, p. 484–
485), a Pop Art buscava ser: “[...] popular (feita para o grande público); efêmera
(extinção em curto prazo); descartável (facilmente esquecível); barata; produzida em
massa; jovem (dirigida para a juventude); espirituosa; sexy; ‘macetada’; glamourosa;
big business”. Como você pode perceber, produzir arte para o consumo deixou de ser
um problema ético entre os artistas. Os artistas de vanguarda se opunham ao
consumismo e à cultura de massa. Já os artistas da Pop Art não se preocupavam com
a separação entre a arte e o consumo. Na verdade, os artistas da Pop Art se
interessavam por uma nova abordagem, baseada em princípios estéticos que
utilizavam as referências da cultura de massa para criar uma arte desprovida de crítica
social. É claro, contudo, que houve produções artísticas que foram exceções ao fazer
críticas ao consumismo e à massificação.
A Pop Art começou a decair ainda no final da década de 1960. Ela se constituiu
como uma referência da arte pós-moderna ao questionar a relação do artista com o
mercado da arte num mundo repleto de propagandas e imagens vinculadas à
sociedade de consumo. Pode-se dizer que a Pop Art liberou o artista do puritanismo
que buscava um distanciamento entre a arte e o mercado. Dessa perspectiva, o artista
poderia experimentar todas as imagens do mundo para criar arte sem se preocupar
com a expressão ou com a produção de crítica social.
A Pop Art não foi um movimento coerente. Assim, cada artista explorava à sua
maneira as imagens midiáticas e os produtos de consumo de massa. Alguns
produziam colagens de imagens advindas de revistas ou anúncios publicitários,
enquanto outros utilizavam técnicas de serigrafia, pintura ou escultura a fim de
representar objetos de consumo. Os primeiros artistas a trabalhar com a nova estética
foram os ingleses, mas os norte-americanos deram grande repercussão ao
movimento.
91
Richard Hamilton (1922–2011) participava do Grupo Independente, que havia
se formado em Londres para discutir arte contemporânea na década de 1920. O
interesse comum entre os integrantes do grupo era a cultura de massa e a sua
reprodutibilidade (FARTHING, 2011). Hamilton elaborou uma colagem com o título O
que é que torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes? (Figura 41),
consagrando-se como um dos artistas pioneiros de um novo modo de pensar as
contaminações entre arte erudita e cultura de massa.
Figura 41: O que é que torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes? (1956), Richard
Hamilton, colagem.
Andy Warhol foi o artista símbolo da Pop Art. Ele contestava os valores
expressivos da arte, trabalhando com imagens massificadas por meio de uma técnica
impessoal, a serigrafia. As suas obras eram feitas numa espécie de linha de produção
que repetia diversas vezes a mesma imagem, omitindo o gesto artístico da pincelada
— tão valorizada na arte moderna, principalmente no Expressionismo Abstrato.
Warhol [...] procurou eliminar de sua obra os valores artísticos tradicionais. Em seu
estúdio de Nova York, provocativamente batizado de “A Fábrica”, ele se propôs a
produzir imagens por meio de processos impessoais (como a serigrafia), proclamando
que elas não tinham nenhum valor, salvo o monetário no inflacionado mercado da arte
(FARTHING, 2011, p. 487).
92
Warhol costumava utilizar imagens de pessoas famosas da época e reproduzi-
las repetidas vezes, com pequenas alterações. As fotografias de Marilyn Monroe e
Elvis Presley eram referências para Warhol, que os representava como produtos de
consumo ao utilizar uma técnica mecânica para copiar as suas imagens
repetidamente. Warhol mostrava os artistas como produtos de massa que poderiam
ser consumidos e tornava as suas imagens atraentes por meio do uso de cores vivas,
aplicadas à mão e sem preocupação com o perfeccionismo. A primeira exposição de
Pop Art de Warhol, realizada em 1962, consistia em pinturas de diversas latas
individuais de sopa Campbell
dispostas sobre prateleiras.
As suas pinturas posteriores
também versavam sobre a
reprodução de produtos
voltados ao consumo, tais
como garrafas de Coca-Cola,
caixas de Brillo ou imagens de
pessoas famosas. As obras
partiam da ideia de que a arte
deveria ser uma mercadoria
como os objetos que ela
representava.
93
16. ARTE PÓS-MODERNA
94
de obras de diversos artistas, principalmente modernistas. Entre suas diversas
réplicas, encontra-se Not Warhol. Nesse trabalho, o artista reproduz as Brillo Boxes
de Warhol. As questões sobre originalidade e reprodutibilidade tornam-se centrais
nesse tipo de produção e refletem uma das dimensões de análise da Pós-
Modernidade: a confusão entre o real e a fantasia.
Figura 42: Not Warhol (Brillo Boxes, 1964), 2005, Mike Bidlo.
95
colagens fora do senso histórico, sem organizar o tempo de modo linear; por isso, são
acusados de produzir uma arte super-ficial. As suas obras podem comportar
diferentes modos de organização e produção. As obras de Anselm Kiefer, como
Maikäfer flieg (Figura 2), por exemplo, examinam a noção de identidade alemã a partir
do ponto de vista histórico. A série de pinturas do artista chamada Terra devastada,
de 1974, explora paisagens esfumaçadas pela queima de palha e pela guerra
(ARCHER, 2012).
Figura 43: Maikäfer flieg, Anselm Kiefer, 1974, óleo sobre estopa.
96
animais e pessoas, ocupam o espaço das estações de metrô, posteriormente
marcando presença nas galerias de arte. Muitas de suas obras consistem em cartazes
negros com desenhos em giz.
97
fabricados pelas indústrias. Todo gesto expressivo é evitado para dar forma a um
objeto mecânico, numa atitude similar à que levou aos ready-made de Duchamp. Judd
utilizou o mínimo de elementos compositivos — no caso, o retângulo, que é repetido
inúmeras vezes na estrutura do objeto. Todas as faces são retangulares, inclusive a
parte vazada do paralelepípedo.
98
artesania quanto os materiais são amplamente frios. O artista não precisa fabricar a
obra de arte, podendo criar os seus projetos a partir de materiais prontos ou
contratando outras pessoas para construí-los. A obra Diagonal de 25 de maio de 1963,
de Dan Flavin (Figura 5), consiste numa lâmpada fluorescente amarela disposta na
parede, formando uma linha diagonal com ângulo de 45 graus. O artista não pretendia
expressar sentimentos ou emoções, pois criava um ambiente único ao brincar com a
luz para transformar a galeria de arte. As suas obras que exploram luzes fluorescentes
rompem definitivamente com a divisão entre pintura e escultura ao unir as duas
linguagens artísticas para alterar os aspectos do espaço.
Figura 46: Diagonal de 25 de maio de 1963, Dan Flavin, 1963, lâmpada fluorescente amarela.
Minha obra é [...] estética porque não possui forma transcendente, nem qualidades
intelectuais ou espirituais. Materialista, porque é feita com seus próprios materiais,
sem pretensão de empregar outros. E é comunista, porque sua forma é acessível a
todos os homens (ANDRE apud FARTHING, 2011, p. 522).
99
Na obra Plano em aço e zinco (Figura 47), ele dispôs no chão 18 placas de aço
e 18 de zinco, formando uma imagem que lembra um tabuleiro de xadrez. A obra
possibilita que as pessoas caminhem sobre ela ou a explorem por meio do tato. Desse
modo, Andre cria uma nova relação entre obra e observador, que não precisa observar
a distância e de maneira passiva.
100
produção possui um engajamento com questões sociais e políticas. Artistas como
Hélio Oiticica, Lygia Clark e Lygia Pape criaram produções que incorporaram
elementos sociais e físicos do Brasil em obras de destaque internacional. Tais artistas
acreditavam na arte enquanto fator determinante para a transformação da sociedade,
que precisava ser pautada na coletividade e na participação social (CHIARELLI,
2002). Em decorrência da transformação, em escala global, das funções básicas do
cotidiano em mercadoria, muitos dos artistas buscaram propor experiências que
transgredissem as proposições de que a arte deveria apresentar um objeto a ser
apreciado. Os artistas propunham as obras “[...] como suportes de experiências: a
arte, ao tentar romper a lógica do espetáculo, restitui-nos o mundo como experiência
a ser vivida” (BOURRIAUD, 2009, p. 32). Nesse sentido, a arte pós-moderna
brasileira, principalmente a arte neoconcreta, foca a elaboração de possibilidades de
habitar melhor o mundo, negando alguns de seus projetos anteriores de criação de
realidades imaginárias ou utópicas. A arte neoconcreta surge como uma alternativa
para contrapor as ideias dos concretistas, que reduziam a arte a uma mera ilustração
de conceitos advindos da ciência. Nesse sentido, os neoconcretistas propõem a
espacialização da obra para negar a arte enquanto representação de conceitos a
priori.
Hélio Oiticica foi um dos expoentes do Neoconcretismo, tendo proposto
diversas obras voltadas à interatividade entre os participantes e o espaço. Em suas
obras denominadas Penetráveis (Figura 48), o fruidor percorre o espaço explorando
as suas percepções visuais, táteis, olfativas, auditivas e palativas, o que culmina numa
experiência multissensorial. Todavia, os Penetráveis não são objetos que refletem as
ortodoxias científicas; afinal, eles se apresentam enquanto espaços de
experimentação sensível que fazem o resgate da subjetividade do participante na
construção artística.
101
Figura 48: Tropicália-Penetráveis PN2 e PN3, Hélio Oiticica, 1967. Montagem para a XXIV Bienal
Internacional de São Paulo, 1998.
As obras da artista Lygia Clark também trazem o lado humano e, até mesmo,
psicológico para a arte. Ao contrário dos minimalistas e concretistas, que focavam
numa relação fria e mecânica com a arte, os neoconcretistas tratam do ser humano
como um todo, explorando os diversos sentidos. O corpo do participante e a sua
relação com o espaço é primordial para a constituição da obra como relação, como
espaço a ser experimentado por meio dos cinco sentidos. Inicialmente, Lygia Clark
construía objetos que precisavam da participação do público para terem vida artística.
Nesse período, destaca-se a obra Bichos (Figura 8), que consiste em formas
geométricas unidas por dobradiças que permitem a criação de novas disposições
entre elas a partir do seu manuseio. Entretanto, a artista queria que a participação em
suas obras fosse além do simples manuseio de formas, por isso começou a produzir
espaços interativos. Na obra A Casa é o Corpo: Labirinto, a artista cria uma instalação
em que a pessoa precisa experimentar um espaço de 8 m de comprimento subdivido
em quatro ambientes: a penetração, a ovulação, a germinação e a expulsão.
102
Figura 49: Bichos, Lygia Clark, 1960.
103
17. ARTE CONTEMPORÂNEA
104
A impossibilidade de fixar limites para a arte contemporânea — afinal, não existem
mais materiais ou técnicas que façam uma produção ser qualificada como arte — faz
as atividades e os objetos não artísticos serem confundidos com arte. Um exemplo
ocorreu em 2016, quando um adolescente, entediado com algumas obras do museu,
resolveu colocar os óculos no chão, e os visitantes, acreditando que se tratava de arte,
tiraram várias fotos e se colocaram na posição de apreciadores.
Em consequência da ampliação do conceito artístico, resultante das correntes
modernistas, hoje, não há “[...] nenhuma limitação a priori de como as obras de arte
devem parecer – elas podem assumir a aparência de qualquer coisa. Isso por si só se
deu por encerrada a agenda modernista [...]” (DANTO, 2006, p. 19). Enquanto a arte
acadêmica contava com princípios estéticos e temáticos para definir qual era a arte, a
arte modernista, por sua vez, construía o conceito de arte a partir de narrativas de
grupo, ou seja, os artistas produziam a partir de princípios estéticos comuns na arte
contemporânea, tanto com a normatização estética quanto com a eleição de princípios
estéticos comuns.
Danto (2006), ao ilustrar as descontinuidades na arte, afirma que o
renascimento inaugurou a era da arte ao criar a figura do artista e as teorias que
distanciavam o fazer artístico (artes liberais) do fazer artesanal, que não exigia
reflexões filosóficas. Isso não significa que antes da era da arte não existisse arte. Na
verdade, o que não existia era o conceito de arte, visto que as imagens elaboradas
eram puramente religiosas e os monges e padres que as construíam seguiam regras
iconográficas. Outra descontinuidade ocorreu na década de 1980, a qual causou a
morte da arte inaugurada no Renascimento. As figuras do artista genial, da obra prima,
da originalidade, da perfeição técnica, dentre outras facetas, são abandonadas pela
maioria dos artistas. Assim como existe arte antes da era da arte, também é
igualmente válida a afirmativa de que existe arte após a era da arte. Entretanto, sua
ruptura é tão drástica que torna a constituição de arte imprecisa, convergindo para
“[...] um período de incrível produtividade experimental no campo das artes visuais,
sem nenhuma direção narrativa única a partir da qual outras pudessem ser excluídas,
estabilizando-se como norma [...]” (DANTO, 2006, p. 16). Entretanto, a falta de
definição do que seja ou não arte não torna a produção artística da atualidade um
completo caos, uma vez que os artistas inter-relacionam seus trabalhos com as
produções das vanguardas e dão continuidade a alguns preceitos estéticos surgidos
105
nas décadas anteriores. A arte contemporânea, ao contrário dos movimentos
modernistas e, principalmente, dos movimentos de vanguardas, não nega o passado
da história da arte. Ao não apresentar rupturas e estar em desenvolvimento em um
período de liberdades, seja na temática ou na técnica, a arte contemporânea se utiliza
de produções de diferentes períodos da história ao produzir colagens. Tais colagens
se apropriam de obras canônicas sem manter qualquer relação entre as referências
utilizadas, além do intensão do artista. A arte contemporânea atribui “[...] um valor
positivo ao remake, de articular usos, relacionar formas, em lugar da heroica busca
do inédito e do sublime que caracteriza o modernismo [...]” (BOURRIAUD, 2009a, p.
45). O artista brasileiro Vik Muniz utilizou materiais inusitados para reproduzir obras
de arte mundialmente reconhecida. Na obra Medusa Marinara (Figura 2), o artista
utilizou macarrão para reproduzir a obra Medusa, de Caravaggio. Ele não inventou a
imagem, apenas aplicou um novo arranjo ao dispor elementos incomuns à obra de
Caravaggio, famoso artista barroco.
106
totalizando 175 quilos. Quando as pessoas se serviam, eram informadas de que
estavam ingerindo balas de portadores de Aids. Nessa proposta, a produção artística
não é o amontoado de balas, mas sim o processo de participação do público. Tal
participação acontece em um momento específico e, ao contrário das pinturas,
esculturas, fotografias, etc., precisam se servir do registro como forma de
documentação. Na contemporaneidade, muitas obras são efêmeras e sua duração só
é imortalizada pelo registro.
O uso da fotografia como arte também é comum entre os artistas
contemporâneos. Por ter uma relação com a verdade, acaba causando mais
incômodo no público, pois esse é um dos objetivos da arte contemporânea. A arte não
é utilizada para confortar, e para causar estranhamento e colocar as pessoas em
condições desconfortáveis. A obra fotográfica O Cristo do mijo (1987), de Andres
Serrano (1950), causou muita revolta, pois o artista explorou várias imagens
fotográficas envolvendo fluidos humanos. Nessa obra, o artista fez uma fotografia de
um crucifixo submerso em urina. Houve uma série de questionamentos por parte da
sociedade, que discutira sobre “[...] as questões do racismo e do machismo bem como
blasfêmia e homofobia [...]” (ARCHER, 2012, p. 215). Outro fator importante na
produção de arte contemporânea é a utilização de meios tecnológicos para a
manipulação de imagens e vídeos ou para a manipulação de espaços virtuais, como
ocorre no site JODI, criado por Joan Heemskerk e Dirk Paes Man, em 1994. Esse site
rompe com todas as expectativas de um ambiente virtual convencional, propiciando
uma visão da linguagem computacional, aliada à experiência de um devir em que o
internauta acessa os links sem saber a que local virtual será remetido.
A arte contemporânea criou novos métodos de produção artística que não
necessitam resultar na construção de um objeto, pois podem levar os espectadores a
participar, em vez de apenas observar. As propostas artísticas surgem da
subjetividade dos artistas e seus campos de experiências, não estando atreladas a
grupos de artistas vanguardistas, como acontecia na arte moderna. O artista pode
atuar politicamente para denunciar um problema social ou pode apresentar uma visão
diferente sobre alguma questão, que pode ser interna ou externa. Para fazer arte,
podem ser usados quaisquer materiais, o que, às vezes, pode resultar em obras
efêmeras.
A arte conceitual tem como centralidade o questionamento dos limites do que
pode ou não ser considerado arte. Ela rompe com muitas ideias que foram construídas
107
durante séculos sobre os objetivos, as técnicas e os meios de produção da arte. Nesse
novo conceito, o artista não precisa construir suas obras, pois não é a materialidade
ou o rigor técnico que qualificarão o objeto como arte, mas sim o conceito elaborado
pelo artista. O termo arte conceitual foi utilizado pela primeira vez, em 1967, em um
texto do artista Sol LeWitt (1928–2007), no qual ele explicitava alguns dos princípios
comuns utilizados pelos artistas conceituais. LeWitt afirmava que a arte conceitual
valorizava mais a ideia ou conceito do que a matéria. “[...]. Quando um artista utiliza
uma forma conceitual de arte, isto significa que todo o planejamento e as decisões
são feitas de antemão, e a execução é uma questão de procedimento rotineiro. A ideia
se torna uma máquina que faz a arte [...]” (ARCHER, 2012, p. 56). As produções de
arte conceitual não buscam expressar sentimentos, pois voltam-se à exploração das
relações entre os objetos de modo intelectual. Por isso, podemos dizer que a arte
conceitual se desenvolve na contramão do que as pessoas costumam aceitar como
obra de arte. Como não é necessário que o artista produza sua obra, desaparece a
ideia de originalidade. Freire (2006, pp. 8–9) apresenta algumas das rupturas
presentes na arte conceitual: em “[...] vez de permanência, a transitoriedade; a
unicidade se esvai frente a reprodutibilidade, contra a autonomia, a contextualização;
a autoria se esfacela frente às poéticas de apropriação; a função intelectual é
determinante na recepção [...]”. Entretanto, nem todas essas rupturas eram novidade
no cenário artístico, e podemos perceber alguns desses princípios nos readymade,
construídos nas primeiras décadas do século XX por Marcel Duchamp, resultantes da
combinação de objetos produzidos em série. “Com os readymade, Duchamp pedia
que o observador pensasse sobre o que definia a singularidade da obra de arte em
meio à multiplicidade de todos os outros objetos [...]” (ARCHER, 2012, p. 3). A arte
conceitual surgiu como uma ruptura à consideração da arte enquanto mercadoria. Um
ótimo exemplo dessa ruptura foi a obra Merda de Artista, de Piero Manzoni (1933–
1963), que produziu 90 latinhas supostamente cheias de fezes do artista que deveriam
ser vendidas pelo mesmo peso em ouro. “Como se acreditava que abrir as latas
significaria destruir o valor da obra, durante muito tempo não se soube ao certo o que
as latinhas continham de fato [...]” (FARTHING, 2011, p. 501), entretanto, após serem
vendidas algumas das latas no ano de 2007, o colaborador de Manzoni declarou que
as latas estavam cheias de gesso.
Todavia, a arte conceitual não ficava restrita à produção de objetos como os
readymade ou as latas supostamente com fezes de artista. Era comum a organização
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de situações simbólicas, como a proposta do artista e professor John Baldessari
(1931), na qual ele, estando impossibilitado de viajar para uma exposição de arte em
que participaria, acabou instruindo seus alunos a escreverem nas paredes da galeria
a frase “Eu não vou criar mais arte chata”. Os alunos aceitaram a proposta e, como
se fosse um castigo, deixaram as paredes completamente cobertas pelas palavras
(FARTHING, 2011). O artista On Kawara (1932–2014), por sua vez, produziu registros
para informar que continuava vivo. Suas obras consistiam em telegramas com a frase
afirmativa “I am still alive” (Eu ainda estou vivo). Na década de 1970, ele enviava esses
telegramas aos amigos, familiares, merchands e galeristas para informá-los de que
continuava vivo. Desse modo, a arte deixa de ser um produto para refletir a vida do
artista e o contexto que o cerca, e a ideia de arte enquanto pintura ou escultura dá
lugar a novas possibilidades. De acordo com Archer (2012, p. 78): “[...] o
conceitualismo é frequentemente identificado como um período durante o qual a arte
se tornou insubstancial. Onde antes havia pinturas e esculturas, agora havia itens de
documentação, mapas, fotografias, lista de instruções [...]”. As obras não podem ser
experimentadas sensorialmente em sua inteireza, mas podem ser experimentadas a
partir de sua documentação. Desse modo, os registros de documentação se integram
ao fazer artístico, porém não substituem a experiência ocorrida, apenas dão
materialidade e permanência ao transitório. A ruptura com os meios tradicionais é
central para a arte conceitual, conforme salienta o artista Joseph Kusoth (ARCHER,
2012, p. 80–81): Ser um artista hoje significa um meio de questionar a natureza da
arte. Se alguém questiona a natureza da pintura, não pode estar questionando a
natureza da arte. Se um artista aceita a pintura (ou escultura), está aceitando a
tradição que a acompanha. Isto se deve ao fato de que a palavra “arte” é geral, e a
palavra “pintura” é específica. A pintura é um tipo de arte, Se se fazem pinturas, já
está se aceitando (e não questionando) a natureza da arte. Assim, está-se aceitando
que a natureza da arte é a tradição europeia de uma dicotomia pintura-escultura. O
questionamento sobre os limites da arte e a sua proposição enquanto jogo linguístico
ficou aparente na obra Uma e três cadeiras (1965), de Joseph Kosuth (1945) (Figura
3). A obra consiste na exposição de uma cadeira juntamente com uma fotografia em
preto e branco do mesmo tamanho do objeto e uma descrição retirada do dicionário
sobre o conceito de cadeira. De acordo com Archer (2012, p. 82), “[...] a definição
nomeia o objeto diante de nós, diz-nos o que ele é, mas também designa uma
categoria da qual a ‘cadeira real’ é apenas um exemplo individual [...]”.
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Freire (2006) salienta que
essa relação da arte conceitual com
a filosofia da linguagem é algo mais
relacionado à arte anglo-saxã, pois a
arte conceitual latino-americana está
intrinsecamente ligada à realidade
política social de seu contexto de
produção. No caso do Brasil, a arte
conceitual contestou as ações da
ditadura militar que, por meio do AI-
5, reprimiu a produção e a circulação artística, o que desencadeou um boicote
internacional e nacional às Bienais de Arte de São Paulo que ocorreram entre 1968 e
1983. Os artistas Hélio Oiticica, Guilherme Vaz, Arthur Barrio e Cildo Meireles
participaram da exposição no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA), em
1970, com obras conceituais. O artista Cildo Meireles, por exemplo, participou com o
projeto intitulado Inserções em circuitos ideológicos (Figura 4), que ainda estava em
desenvolvimento. Meireles utilizava os sistemas de circulação comuns à população
como meio para divulgar frases de protesto às barbaridades do governo ditatorial
brasileiro. Foram estampadas em garrafas de Coca-Cola retornáveis e cédulas de
dinheiro frases de protesto, tais como “yankees, go home!”, para criticar o colonialismo
norte--americano, ou “Quem matou Herzog?”, para expor o assassinato do jornalista
e a dissimulação do regime militar ao forjar seu suicídio. No caso do projeto Coca-
Cola, as impressões foram produzidas no corpo das garrafas com a cor branca,
dificultando a sua leitura quando elas estavam vazias e revelando seu conteúdo
quando estavam cheias.
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Figura 51: Inserção em circuitos ideológicos: Projeto Coca-Cola (1970), de Cildo Meireles.
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A arte performática consiste no uso do corpo do artista “[...] como meio para realizar
ações que podiam incorporar música e dança, tinha duração variável e poderiam ser
repetidas em lugares diferentes [...]” (FARTHING, 2011, p. 512).
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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BELTING, Hans. Após o fim da história da arte, (1985) São Paulo: Coisac Naify, 2012.
DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. São Paulo: ed.34, 1998
[Ce que nousvoyons, ce qui nous regarde, Paris: Minuit, 1992].
FAURE, Élie. Histoire de l’art. L’art antique. Prefácio à edição de 1921, Livre de Poche,
p.32 (História Antiga. História Medieval. História Moderna. São Paulo: Martins Fontes).
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