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ASPECTOS DA HISTÓRIA DA ARTES -

EDUCAÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 3
1.1 Conceito ........................................................................................................ 3
1.2 Panorama Geral da História Arte ................................................................ 6
2. ARTE PRÉ-HISTÓRICA ..................................................................................... 12
2.1. Arte Rupestre ............................................................................................. 14
3. ARTE GREGA .................................................................................................... 19
3.1 O Belo e a Estética ..................................................................................... 19
3.2 Escultura ..................................................................................................... 23
4. ARTE ROMANA ................................................................................................. 27
4.1 Influências Gregas e Etruscas na Produção Artística Romana ............. 27
4.2 Pintura e Escultura Romanas ................................................................... 27
5. IDADE MÉDIA .................................................................................................... 31
5.1 Contexto...................................................................................................... 31
5.2 Expressões Artísticas Medievais .............................................................. 32
5.3 Arte Românica ............................................................................................ 34
5.4 Arte Gótica .................................................................................................. 35
6. RENASCIMENTO ............................................................................................... 39
6.1 Contexto...................................................................................................... 39
6.2. Pintura ......................................................................................................... 41
6.3 Escultura ..................................................................................................... 45
7. BARROCO ...................................................................................................... 48
8. ARTE BARROCA NO BRASIL .......................................................................... 58
9. MANEIRISMO .................................................................................................... 61
10. ROCOCÓ ........................................................................................................ 64
11. NEOCLASSICISMO ........................................................................................ 67
11.1. A Arte Neoclássica ................................................................................. 69
11.2. É Cole des Beaux-Arts ................................................................................ 72
12. IMPRESSIONISMO ......................................................................................... 75
13. EXPRESSIONISMO ........................................................................................ 79
14. ARTE MODERNA ........................................................................................... 82

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15. POP ART ........................................................................................................ 89
16. ARTE PÓS-MODERNA .................................................................................. 94
17. ARTE CONTEMPORÂNEA .......................................................................... 104
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA............................................................................ 113

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1. INTRODUÇÃO
1.1 Conceito

Se buscarmos uma resposta objetiva e definitiva para o conceito de arte, nos


frustraremos, pois, as definições podem ser divergentes e até contraditórias. Ainda
que sem definir claramente o conceito de arte, identificamos algumas produções da
cultura na qual estamos inseridos como “arte”.
Há um consenso sobre o nosso comportamento em relação à ideia de arte, pois
nossa atitude diante dela é de admiração. No entanto, nossa tranquilidade se desfaz
quando nos deparamos com objetos artísticos que não se conformam exclusivamente
à apreciação admirativa. Exemplificamos a pluralidade do conceito de arte com dois
ícones da arte ocidental, ilustrados pela Figura 1. Não há dúvidas que a escultura
Davi, de Michelangelo, é uma obra de arte. Entretanto, quando nos deparamos com
um mictório de louça — absolutamente idêntico a todos os mictórios masculinos do
mundo inteiro — conservado no acervo de um consagrado museu, assinado por R.
Mutt e datado de 1971, nos sentimos automaticamente incomodados em atribuir a
esse objeto o mesmo status conferido a Davi, uma vez que esse mictório não
corresponde exatamente à ideia que temos de “arte”.

Figura 1: Pluralidade da arte: Davi e Fonte.

Fonte: Thomas Hernandez/Shutterstock.com.

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Os aspectos em comum de produções tão distintas — como uma pintura
renascentista, uma catedral gótica ou um poema de Homero, por exemplo —
adquirem um conceito geral de arte no mundo Ocidental a partir do século XVIII. É
incontestável que, antes disso, a palavra “arte” já era utilizada para designar
habilidades especiais de algumas realizações: pintura, escultura, música, teatro, etc
(EAGLETON, 2005).
Esse conceito geral de arte está associado à noção do “belo” no Ocidente,
decorrente dos conhecimentos da estética, um ramo da filosofia. Os conceitos têm a
necessidade de ter personagens conceituais que contribuam para a sua definição —
os personagens ou os “objetos” da filosofia são, em grande parte, a arte, o artista e a
criação artística, seja esta de qualquer categoria: música, teatro, artes plásticas,
literatura. Sob esse aspecto, a filosofia da arte pode ser entendida como um ramo da
estética, uma vez que a atividade artística promove a emergência do belo. A estética
tem como objeto todas as poéticas, sejam elas de uma arte compromissada ou não,
realista ou idealista, naturalista ou lírica, figurativa ou abstrata, douta ou popular.
Fischer (2002) defende que a arte quer ser contemplada por leis que lhe são
próprias, sem abdicar da totalidade dos seus valores espirituais, sociais e éticos, de
forma que toda a plenitude de significado e de funções que a obra irradia advém, na
verdade, da sua própria realidade de arte. Assim, a obra não adquire validade pela
função, e sim possui uma função justamente por ser suficiente.
A função da arte modificou-se ao longo da história humana desde a sua origem.
O homem adequou à arte as mudanças ocorridas na sociedade, nos seus costumes,
na sua religiosidade, na sua forma de fazer política, de conceber a ética. Na busca
humana de fazer de seu espaço algo significativo, a arte sempre teve, desde o início
da humanidade, um papel essencial na compreensão do universo, na relação dialética
com a realidade, com os fenômenos e com a sua imaginação lúdica. Durante muito
tempo, a validade da arte estava centrada na sua função na sociedade, ou seja, a
obra de arte só tinha validade mediante a função que ela desempenhava dentro da
sociedade.
Quando enfocamos, por exemplo, a arte clássica, observamos que ela era uma
produção de arte que não era entendida em primeiro plano como arte, “[...], mas como
formas que se encontravam no meio religioso ou também no mundano, como
decoração do próprio mundo em seus atos de destaque: o culto, a representação dos
soberanos e outros” (GADAMER, 1985, p. 27).

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Circundando a definição do conceito de arte, nos deparamos com a
necessidade de fornecer uma resposta objetiva e clara para a pergunta: “O que é arte?
Embora não haja uma definição exata, objetiva e cientificamente comprovada,
o termo “arte” remete a dois conceitos básicos, segundo Ferreira (2014, documento
on-line)
[...] um mais restrito, pois trata da arte como ‘obra de arte’, circunscrita na
história da arte, feita por artistas e na maioria das vezes localizada em instituições
artísticas; o outro é mais amplo, pois concebe a arte como o conjunto de atos criadores
ou inovadores presentes em qualquer cultura humana.
O conceito mais restrito surge em um contexto histórico-cultural delimitado
espacial e temporalmente, e é a partir dele que a história da arte se desenvolve, uma
vez que é balizada pelo contexto teórico e institucional legitimador, como, por
exemplo, museus, teatros e galerias de arte. Ao conceito amplo, podemos associar a
noção de “arte” como um adjetivo: a arte da gastronomia, a arte da perfumaria, a arte
da joalheria, por exemplo.
Há algumas possibilidades específicas do objeto artístico que permitem
classificar o conceito de arte. As chamadas definições estéticas destacam como
condição necessária a intenção de provocar experiências estéticas; as definições
institucionalistas se referem ao caráter condicional da legitimação da obra pelas
instâncias da teoria e da crítica da arte, cumprindo certas regras e procedimentos; e
as definições históricas identificam a relação das produções artísticas com uma
determinada tradição histórica (ALMEIDA, 2014).
Danto (2010) não afirma que algo pode ser considerado arte apenas pela
afirmação do artista e pela legitimação por parte dos críticos e curadores. O autor
pressupõe que objetos ou eventos podem ser reconhecidas como obras de arte por
conter determinadas características que as coisas banais não possuem.
Corroborando com a teoria de Danto (2006), Mammi (2012) reconhece que o
conceito moderno de arte surge no Renascimento, porém seu significado (da arte) tem
a ver com algo atemporal e inesgotável. O autor concorda com a perspectiva dantiana
(relativa ao pensamento de Danto) de que tudo pode, em um primeiro momento, ser
arte. Não porque é legitimado pelo mundo da arte, mas sim quando passa a
desempenhar um papel fundamental na totalidade da cultura: a possibilidade de gerar
novas experiências significativas. É a sua capacidade de inaugurar novos campos de
experiência. Seu significado pertence ao agora. Conforme defende Mammi (2012, p.

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9): Talvez seja próprio da obra de arte não pertencer a nenhum tempo específico – ou
talvez a todos, mas sempre como se proviesse de outro tempo, passado ou futuro.
Quem sabe um dia outra civilização, ou uma outra fase desta, desvelará a valência
artística de uma luta de Ali, ou de um número de dança de Astaire. Uma obra de arte
é um objeto que sobrevive à vida e à intenção que a gerou, e a todos os discursos
produzidos sobre ela. Nesse sentido, “o que resta” é, simplesmente, sinônimo de
“arte”.
A partir das vanguardas artísticas do século XX, a construção dos conceitos de
arte se tornou complexa, volátil e subjetiva, inviabilizando definições abrangentes o
suficiente para dar conta de abarcar todas as experiências ou linguagens da arte. A
crítica e a teoria da arte estabeleceram parâmetros externos (não mais relacionados
apenas com a virtuosidade ou o domínio técnico do artista, ou do conteúdo da obra)
que pudessem definir o fato artístico, como: o discurso que sustenta a obra, a
consagração institucional e a resposta dos especialistas e do público, por exemplo
(ECO, 2004).
Uma possibilidade para contornar o dilema pode ser ancorada nos raciocínios
de Wittgenstein (2000), que alega que compreender o conceito de arte não é,
necessariamente, ser capaz de defini-lo teoricamente. O importante é saber usá-lo
para reconhecer e elucidar obras de arte e para distinguir, diante de novas
experiências artísticas, aquilo que pode ser denominado arte ou não.

1.2 Panorama Geral da História Arte

Em estreita relação com a cultura popular, as artes aplicadas (em alguns


autores encontraremos o termo artes decorativas) estiveram presentes em todos os
períodos históricos, em alguns momentos, inclusive, com status semelhante às
demais categorias de arte. Podemos exemplificar com o caso da cerâmica grega ou
da laca chinesa (Figura 2). Nesse caso, estamos falando de culturas milenares que
produziam seus utensílios do cotidiano artesanal e artisticamente, perpetuando
tradições dos seus antepassados, ou mesmo inovando na utilização de materiais,
técnicas e iconografia.

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Figura 2: Laca chinesa da Dinastia Ming (séc. XVI) e ânfora grega (500 – 350 a.C.)

Fonte:
Thomas Hernandez/Shutterstock.com.

As artes aplicadas se referem a modalidades de produção artística orientadas


para a vida cotidiana por meio da criação de objetos (peças, utensílios) úteis ao
homem. O termo artes aplicadas se refere a alguns setores da arquitetura, do design,
das artes gráficas, do mobiliário, entre outros, e traz oposição em relação às belas
artes.
A substituição da autoria — por meio figura do artista criador — pelo trabalho
realizado pelos artesãos de guildas e corporações medievais fez surgir a ideia do
artista como um estudioso teórico e intelectual. Recebendo formação especializada
nas academias, o artista se afasta do mero “fazer técnico” e passa a representar as
belas artes. O termo belas artes passa a ser o sinônimo de arte acadêmica,
estabelecendo a distinção entre arte e artesanato, artistas e mestres de ofício (ou
artesãos).
Ao longo da história da arte, é possível verificar períodos ou movimentos em
que ocorrem afastamentos e aproximações entre as belas artes e as artes aplicadas.
Curiosamente, na arte moderna, podemos presenciar os dois fenômenos
simultaneamente: no primeiro deles, temos a figura do artista como o principal crítico
à industrialização em curso — que lançava o artesanato numa crise inédita na história
—, posicionando-se como um intelectual arredio à produção industrial. Paralelamente,
temos o surgimento de movimentos que se apropriam da mesma produção industrial

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(p. ex., Deutscher Werkbund e Bauhaus), defendendo a ruptura da distinção entre
artista e artesão (ARGAN, 1998).
A definição de belas artes foi incorporada ao vocabulário da crítica e da história
da arte no século XVIII, para denominar as tradições e regras acadêmicas europeias,
instituídas pela obra Les Beaux-Arts Réduits à un Même Principe (As belas-artes
reduzidas a um mesmo princípio), publicada em 1746, de autoria de Charles Batteaux
(1713–1780). Logo, essas regras foram normatizadas e detalhadas pela École des
Beaux Arts (Escola de Belas Artes) de Paris (BEAUX-ARTS, 2017). O conceito original
de beaux arts (belas artes) foi aplicado às consideradas “artes superiores”, de caráter
não utilitário, opostas às artes aplicadas e decorativas.
Gombrich (1999) destaca que, embora a noção de beaux-arts remeta ao século
XVIII, já havia distinção entre “artes maiores” e “artes menores” na Antiguidade
Clássica, que separava as artes liberais, aquelas relacionadas às atividades mentais,
das “artes mecânicas”, que se referiam aos trabalhos práticos e manuais. Também os
gregos caracterizaram separações entre as “artes superiores”, que são associadas
aos sentidos considerados superiores, como a visão e a audição, das “artes menores”,
geralmente associadas aos ofícios e ao artesanato.
Quando houve a distinção das artes maiores ou menores (séc. XVIII) a partir
de suas finalidades, designou-se que as artes aplicadas têm como fim aquilo que é
útil ao homem e às belas artes, sendo aquelas cuja finalidade é o belo. “Com a ideia
de beleza surgem as sete artes ou as belas-artes, modo pelo qual nos acostumamos
a entender a arte” (CHAUI, 2000, p. 406). O Manifesto das Sete Artes foi publicado
em 1923, escrito pelo pesquisador italiano Ricciotto Canudo, onde foi mencionado,
pela primeira vez, o termo “sétima arte” para se referir ao cinema.
Atualmente, as sete artes são as seguintes: 1. Música (som). 2. Artes cênicas
(Teatro/Dança/Coreografia — movimento). 3. Pintura (cor). 4. Escultura (volume). 5.
Arquitetura (espaço). 6. Literatura (palavra). 7. Cinema (audiovisual — contém artes
anteriores, como a música para trilha sonora, artes cênicas para dublagem, captura
de movimentos, pintura, escultura e arquitetura para o design e literatura, para
roteiros) (COVALESKI, 2012; CHAUI, 2000).
Posteriormente, outras categorias passaram a integrar a lista das belas artes:
8. Fotografia (imagem). 9. História em quadrinhos (cor, palavra, imagem). 10.
Videogames (integra os elementos de outras artes). 11. Arte digital (integra artes
gráficas computadorizadas 2D, 3D e programação).

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As artes aplicadas ganham evidência em um cenário relativamente mais
recente, a exemplo do movimento Arts & Crafts, surgido na Inglaterra no fim do século
XIX. O Arts & Crafts dedica-se à criação das artes manuais em plena era industrial,
produzindo móveis e padronagens exclusivas para têxteis e papéis de parede,
comercializados até os dias atuais, como ilustra a Figura 3 (ARGAN, 1998).

Figura 3: Padronagem têxtil de William Morris.

Fonte: Thomas Hernandez/Shutterstock.com.

Na esteira do movimento Arts & Crafts, o Art Nouveau emerge na Europa,


atenuando a fronteira entre arte e artesanato por meio da valorização dos ofícios e
trabalhos manuais. Os dois movimentos possuem filosofias distintas; enquanto o
primeiro tende a resistir à produção industrial, o Art Nouveau apropria-se dos novos
materiais do mundo moderno — como o ferro e o vidro — e da racionalidade das
ciências e da engenharia. Entretanto, os dois movimentos mantêm em comum o
desenho inspirado nas formas da natureza, no qual a fauna e a flora são iconografias
recorrentes.

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Figura 4: "O Beijo", de Gustav Klimt, 1909.

Fonte: Thomas Hernandez/Shutterstock.com.

Fundada na Alemanha por Walter Gropius, em 1919, a Bauhaus agregou de


forma definitiva arte, artesanato e indústria. Ao ideal defendido do artista--artesão
soma-se a defesa da complementaridade das diferentes categorias artísticas sob a
coordenação da arquitetura e do design, reintegrando a ideia das artes e dos ofícios
medievais. Essas fortes conexões entre arte e indústria consolidam as marcas
características do que conhecemos como “estilo Bauhaus”: objetos e mobiliário
concebidos como arte, para serem produzidos em série, utilizando materiais advindos
da produção industrial (em particular o aço), conforme a cadeira de Mies van der Rohe
(1886–1969), a “MR 20”, criada em 1927, ilustrada na Figura 5 (ARGAN, 1998).

 SAIBA MAIS:

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Figura 5: Cadeira MR 20.

Fonte: Thomas Hernandez/Shutterstock.com.

O Modernismo de 1922, no Brasil, concedeu lugar para às artes aplicadas


representadas por tapeçarias, móveis e objetos, com destaque para o móvel brasileiro
que manteve a tradição artística durante todo o século XX, com a criação de
cooperativas e empresas voltadas ao seguimento de móvel-arte, como a Unilabor e a
Hobjeto Móveis (ARTES APLICADAS, 2017).
A história da arte, a crítica e a teoria da arte, os museus, teatros, cinemas de
arte, as revistas especializadas, as salas de concerto e a vasta literatura são todos
instrumentos que instauram a arte em nosso mundo. Para podermos ser tocados pela
arte, é necessário estabelecer um conjunto de relações e referências que nos permita
adentrar nas frequentes transformações dos objetos, conceitos e discursos artísticos.
A arte é polissêmica, ambígua, mutável e complexa, portanto, não podemos aprender
regras de apreciação para o fenômeno artístico. A história da arte tem um papel
importante, e até impactante, para o conhecimento, não só relacionado à linguagem
e à produção artística, mas ao mundo que nos cerca. Ela nos conduz ao domínio da
compreensão dos fundamentos que sustentam a articulação da arte diante da
diversidade da produção artística.

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2. ARTE PRÉ-HISTÓRICA

A origem da arte está na Pré-História, no Paleolítico Superior. Antes, no


Paleolítico Inferior (50.000–30.000 a.C.), a utilização de ferramentas era uma etapa
básica dessa transformação. Pela prática de experiências sucessivas, em um
processo de ensaio e erro, o homem determinou sua forma de poder sobre a natureza.
A ferramenta nasce, então, como um instrumento para o exercício de poder do homem
sobre a natureza (FISCHER, 2002).
Ao fabricar seus instrumentos — necessários para garantir sua sobrevivência
—, o homem descobriu que algumas pedras, por exemplo, possuíam uma forma mais
conveniente do que outras e as classificou como utensílios, guardando-as para usar
posteriormente. Nesse momento, o homem começou a associar a forma à função. A
partir de então, ele começou a manipular esses utensílios com fins específicos,
desbastando-os, a fim de aperfeiçoar a sua forma. A essa fase da evolução humana,
denominamos período Paleolítico.
Essa prática, porém, não corresponde integralmente ao que hoje entendemos
por “arte”. Podemos considerar que as primeiras expressões do que concebemos
como arte surgem em tempos muito remotos, quando o homem torna visível os
pensamentos invisíveis, ou seja, cria símbolos (BELL, 2008).
Muito mais tarde, no século V a.C., o filósofo grego Aristóteles afirma: “O
objetivo da arte não é representar a aparência externa das coisas, mas seu significado
interior [...]” (HODGE, 2018, p. 6).
Do francês rupestre, o termo designa gravação, traçado e pintura sobre suporte
rochoso, qualquer que seja a técnica empregada. Considerada a expressão artística
mais antiga da humanidade, a arte rupestre é realizada em cavernas, grutas ou ao ar
livre.
Com o objetivo de estudar a evolução da arte ao longo do tempo, é comum
lançar um olhar apurado para a arte produzida a partir do Paleolítico Superior, pois é
quando os pesquisadores registram as primeiras manifestações artísticas. Essas
manifestações foram encontradas principalmente no interior de cavernas na França e
na Espanha.
Corroborando com a teoria mágica ou religiosa, Gombrich (1999) destaca que,
na Pré-História, a arte nasce na sua grande parte “interessada”. Por meio dela, o
homem parece se relacionar com o universo desconhecido e assustador. A Pré-

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História foi uma idade do homem dominada pelo terror cósmico, e a arte estava
centrada nas sensações, nos sentidos, na memória e no mimetismo. O homem estava
voltado para a observação da natureza, dos animais, para a magia (conceitos
totêmicos e místicos). A arte vinha impregnada, em suas representações, de questões
místicas.

 Saiba Mais:
Mimetismo é adaptação na qual um organismo possui características que o
confundem com um indivíduo de outra espécie. Podendo ser também o processo
pelo qual um ser se ajusta a uma nova situação; adaptação.

A arte na Pré-História tinha um caráter eminentemente social e não seria


praticada se não fosse útil — temos aqui a conexão da teoria da arte utilitária e da
teoria da função expressiva. O homem pré-histórico — extremamente ligado ao grupo
social, aos animais e à natureza — integrava esses fatos à arte de forma realista no
Paleolítico e simbólica no Neolítico. Além disso, podemos dizer que a arte pré-histórica
é intelectual, no sentido de que o artista confere a si mesmo uma certa liberdade de
deformar, a fim de dar mais força de expressão às suas representações — vemos isso
acontecer em algumas representações de animais.

A arte possuía a magia da transformação, o homem podia transformar o mundo,


dar a ele significado: a crença no poder da imagem vê na arte uma magia.

Segundo Fischer (2002, p. 42): Essa magia encontrada na própria raiz da


existência humana, criando simultaneamente um senso de fraqueza e uma
consciência de força, um medo da natureza e uma habilidade para controlá-la, essa
magia é a verdadeira essência de toda arte. O primeiro a fazer um instrumento, dando
nova forma a uma pedra para fazê-la servir ao homem, foi o primeiro artista.
Por um lado, a arte pré-histórica estava extremamente voltada para o utilitário,
em consonância com a teoria da arte utilitária, porém, ao lado dessa arte
“interessada”, existia um lado estético altamente desenvolvido, ratificando a teoria da
necessidade inata, conforme o pensamento de Bayer (1979). Observa-se isso nos
utensílios de caça e nos objetos domésticos. Para adequar o objeto aos seus

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objetivos, os homens buscavam a simetria harmoniosa, linhas agradáveis ao olhar,
decorando com primor o cabo das facas, esculpindo os ossos e o marfim, pintando
com beleza todos os seus objetos de uso. Isso nos conduz a pensar que os homens
da Pré-História tinham um forte sentido das formas, dos volumes e das cores e que
obedeciam a certas normas e convenções nas suas representações dos animais,
humanas e simbólicas.

2.1. Arte Rupestre

Do francês rupestre, o termo designa gravação, traçado e pintura sobre suporte


rochoso, qualquer que seja a técnica empregada. Considerada a expressão
artística mais antiga da humanidade, a arte rupestre é realizada em cavernas,
grutas ou ao ar livre.

As expressões de arte rupestre mais significativas foram encontradas na


Europa, em particular no norte da Espanha e no sul da França, datando de
aproximadamente 25.000 a.C., portanto, no Paleolítico Superior. A descoberta das
cavernas de Altamira (Espanha) e Lascaux (França), representadas na Figura 6,
fomentaram uma revolução no que até então se conhecia sobre o passado da arte.

Figura 6: Teto das cavernas de Altamira e Lascaux.

Fonte: Juan Aunion/Shutterstock.com e thipjang/Shutterstock.com.

As pinturas de Chauvet são as mais antigas conhecidas e revelam uma


linguagem gráfica sofisticada. Os desenhos de carvão representam imagens
sobrepostas de cabeças de cavalos e bisões e a cena de dois rinocerontes lutando.

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Essas cenas são pouco comuns na arte rupestre, pois quase não há registros de
figuras que interagem (BELL, 2008).

 SAIBA MAIS:

Frente aos deslumbrantes conjuntos pictóricos, algumas perguntas são


recorrentes, as quais dizem respeito a como se desenvolveu essa arte e como
sobreviveu intacta por tantos milhares de anos, por exemplo. As pinturas não se
encontram na proximidade das entradas das cavernas, pois foram realizadas nas
profundidades da terra, nos tetos e nas paredes laterais das formações rochosas.
Estando ocultas, os historiadores supõem que essas imagens se prestavam a um
objetivo mais complexo do que mera decoração.
As evidências nos levam a acreditar que nenhum homem teria se deslocado
até as íngremes distâncias dos interiores das cavernas para simplesmente decorar
um lugar tão inacessível. Para os homens do Paleolítico, não havia uma distinção
muito clara entre imagem e realidade; ao reproduzirem a imagem de um animal,
pretendiam trazê-lo para o seu alcance, dominá-lo simbolicamente. Ao matarem a
imagem, julgavam ter matado o espírito do animal, assim, a imagem só tinha utilidade
até o momento da morte do animal.
Do ponto de vista plástico, a principal característica dos desenhos, das pinturas
e das gravações do Paleolítico Superior é o naturalismo. O artista reproduzia o animal
do modo como o via de uma determinada perspectiva, reproduzindo a natureza tal
qual sua visão captava; assim, o artista retratava apenas o que encontrava na
natureza. Utilizando a sintaxe da linguagem visual proposta por Dondis (2007),
podemos encontrar todas as configurações dos elementos visuais (linha, cor, forma,
direção, textura, escala, dimensão e movimento) nas composições rupestres.
Para obter as cores em suas pinturas, o homem do Paleolítico utilizava óxidos
minerais, ossos carbonizados, carvão, vegetais e sangue de animais. Os elementos
sólidos eram esmagados e dissolvidos na gordura dos animais caçados. Utilizavam

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os dedos como pincéis, porém há indícios de terem empregado pincéis feitos de penas
e pelos (SANTOS, 2000). A aplicação de cores nos seus desenhos era criteriosa,
havendo nuances de claro–escuro em alguns animais. A cor destaca algumas figuras
evidenciadas em vermelho, frequentemente utilizado, criando efeitos visuais
estimulantes, corroborando com a colocação de Dondis (2007, 38): “A cor está, de
fato, impregnada de informação, e é uma das mais penetrantes experiências visuais
que temos todos em comum [...]”Há pinturas que revelam, inclusive, forças direcionais
curvas, que possuem potencial dramático de transmissão de informações, formadas
pelos grupos de animais pintados nas paredes de pedra.
Podemos reconhecer a textura como uma combinação de ambos os sentidos
(tato e visão) nas pinturas rupestres. Elas são realizadas sobre as pedras e utilizam
pigmentos naturais, que, por vezes, possuem texturas granuladas. A noção de
projeção para além da superfície também é presente nos conjuntos pictóricos
paleolíticos.
A nova forma de vida instituída pelo Neolítico (5.000–3.000 a.C.) originou
muitas habilidades e invenções humanas, ampliadas com a manipulação dos metais
(Idade do Metais, aproximadamente 3.300–1.000 a.C.). Dentre elas, a cerâmica, a
tecelagem e a fiação se constituíram como métodos básicos para a construção
arquitetônica, acrescidos do domínio da fabricação de instrumentos em pedra
(JANSON; JANSON, 2009). Na transição para a agricultura, ao abandonar a vida
nômade que conduzia o homo sapiens e suas famílias a abrigarem-se nos lugares
que a natureza oferecia, certamente surgiram moradias que se assemelhavam a
cabanas construídas com os mais diversos materiais. Esses abrigos, construídos com
madeira, peles de animais e fibras que as pessoas começaram a tecer, não resistiram
ao tempo. Baumgart (1999, p. 10) afirma que “[...] cabanas dos mais diversos
materiais, não eram arquitetura no sentido de uma arte da construção, que somente
pode ser designada como tal quando excede a necessidade puramente prática
através de uma conformação espacial [...]”. Os monumentos megalíticos são os mais
significativos representantes da arquitetura pré-histórica, conhecidos como
construções de culto. Hauser (2003, p. 11) esclarece que “Os ritos religiosos e os atos
de culto assumem agora o lugar da magia e da feitiçaria [...]”. Isso significa que o
homem neolítico superou o esforço pela defesa contra os ataques do inimigo e as
necessidades materiais que o levaram a recorrer a práticas mágicas no período
Paleolítico. A vida neolítica gravitava em torno da casa e do campo, da lavoura e da

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pastagem, da aldeia e do santuário. As formações megalíticas conhecidas são: o
menir, o dólmen e os círculos de pedra (CROMLECH).
Figura 7: Monumentos megalíticos: (a) menir; (b) dólmen; (c) círculo de pedra.

Fonte: (a) AlexMorozov1204/Shutterstock.com; (b) Lyd Photo-graphy/Shutterstock.com, (c)


Spumador/Shutterstock.com.

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O menir é um dos grandes monólitos pré-históricos, o qual consiste em grandes
pedras verticais isoladas, encontradas principalmente no norte da Europa, como
Irlanda, e no nordeste da França.

O dólmen é um monumento druídico, composto de uma grande pedra plana


sustentada por outras duas ou mais pedras verticais. A configuração resultante
alude a uma câmara que servia de acesso a locais de sepultamento ou de culto à
morte:

O monumento megalítico que mais se aproxima de uma grande arquitetura é, sem


dúvida, o santuário circular Stonehenge. O cromlech (círculo de pedra) foi erigido
entre 2.000 a.C. e 1.000 a.C. Com finalidade religiosa, a estrutura inteira é voltada
para o ponto exato em que o Sol nasce no dia mais longo do ano, aludindo a um
ritual de adoração do sol.

No fim do período Neolítico, os artistas puderam trabalhar os metais,


produzindo peças com requinte de detalhes, em decorrência do domínio da produção
do fogo. As denominadas “sociedades primitivas” da África tropical, das Américas e
do Pacífico Sul produziram uma grande variedade de objetos artísticos — produção
conhecida como arte primitiva.
A mente primitiva entendia todas as coisas como sendo animadas por espíritos
poderosos: homens, animais, plantas, terra, águas, vento, sol e chuva.
Consensualmente, a história se inicia com a invenção da escrita, fenômeno que
constitui uma das diferenças fundamentais entre as sociedades pré-históricas e
históricas.

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3. ARTE GREGA
3.1 O Belo e a Estética

O interesse estético é inato à humanidade, e há, inclusive, contextos que


definem o homem como “o animal que tem capacidade estética”. Os gregos foram os
primeiros a estudar sistematicamente a essência da beleza, mais do que qualquer
outro povo da Antiguidade, visto que estudaram a beleza e escreveram com
dedicação acerca de suas propriedades e implicações. Em um contexto mais amplo,
os gregos se dedicaram a questionar o mundo e o pensamento, originando aquilo que
hoje conhecemos como filosofia.
Uma significativa parte dos estudos de filosofia considera que o pensamento
ocidental se estrutura como sequência dos escritos de Platão e Aristóteles, incluindo
o ramo da filosofia conhecido como estética. Nos escritos originais, os gregos não
atribuíam ao termo “estética” os significados que hoje conferimos: a partir do século
XVIII, a estética é a disciplina voltada para o estudo da beleza (BAYER, 1979; CHAUI,
2000). Entre os gregos, não havia uma disciplina com esse escopo exclusivo, no
entanto, o belo sempre esteve presente nas reflexões e nos escritos dos filósofos
gregos, além de ter sido o grande objetivo de toda a produção artística daquele povo.
Há um senso comum sobre a beleza entre os antigos gregos, no qual o belo está
sempre associado a outras qualidades. Cabe pontuar que, quando nos referimos aos
“antigos gregos”, estamos falando do Período Arcaico, situado entre 800 a.C. e 500
a.C., que antecede ao Período Clássico.
Na Grécia Antiga, a beleza não possuía um estatuto autônomo, uma estética
propriamente dita, ou uma teoria da beleza, conforme observa Eco (2004, p. 37): “[...]
À pergunta sobre o critério de avaliação da Beleza, o oráculo de Delfos responde: O
mais justo é o mais belo”. Até mesmo no período áureo da arte grega, a beleza foi
associada a outros valores, como a “medida” e a “conveniência”. A primeira
compreensão de beleza, portanto, é associada às diversas artes que a expressam,
não possuindo um estatuto unitário. Pode ser identificada nos hinos, nos quais a
beleza se exprime na harmonia do cosmo; na poesia, que encanta e faz os homens
se deliciarem; na escultura, que revela a correta medida e simetria das partes; e na
retórica, mediante o ritmo justo.
O poeta arcaico Píndaro apresentou uma descrição da beleza, identificando-a
como uma qualidade a ser percebida pelos olhos: “Belo é aquilo que se contempla

19
com prazer, deleita o olho e se expõe para ser admirado” (OLIVEIRA, 2003,
documento on-line).
O Período Arcaico é delimitado historicamente entre o século VII a.C. até a
época das Guerras Pérsicas, no século V a.C., quando se inicia o Período Clássico,
que dura até o fim da Guerra do Peloponeso, no século IV a.C. O século de Péricles
corresponde ao século V a.C., período em que as atividades intelectuais, artísticas e
políticas manifestaram “[...] o esplendor da cultura helênica” (SANTOS, 2000, p. 27).
Foi o período de ascensão de Atenas como grande potência militar, econômica e
cultural, quando surge uma noção mais clara do belo estético.
Nesse momento histórico, observa-se o imenso desenvolvimento das artes
figurativas gregas. Em relação às demais manifestações artísticas ocorridas em
períodos anteriores — a arte egípcia, por exemplo —, a arte grega representa uma
significativa evolução na representação. Se os egípcios produziam sua arte de forma
subordinada a cânones de representação, desvinculando-a, portanto, das exigências
da visão, a arte grega propõe a visão subjetiva em primeiro plano. O contexto no qual
se insere a arte grega clássica é voltado à vida — não há significativos registros de
uma arte que cultuasse a morte, como na arte dos egípcios, por exemplo —, pois essa
arte liga-se diretamente com o saber, com a inteligência. A inteligência conduz ao
belo, e a arte o representa, de modo que a arte possui um grande diferencial na
civilização grega, ocupando um lugar de destaque na vida cotidiana do povo. Não
restringindo sua produção artística a um único aspecto (o culto, para exemplificar) e
nem aos interesses de um determinado grupo social, a arte esteve inserida em um
âmbito autônomo, sem amarras com influências externas. A arte grega — ligada à
inteligência — tinha em seus líderes (representantes do povo) a figura de seres com
atributos de grande conhecimento e sentido de justiça, que se dedicavam ao bem-
estar da sociedade.
O hedonismo grego justifica a expressão de uma arte voltada ao prazer, à vida:
os gregos contemplavam a natureza em sua total harmonia, proclamando, em suas
produções, o entusiasmo pela vida, suas paixões e deleites. Conforme afirma Santos
(2000, p. 27):

20
Dos povos da antiguidade, os que apresentavam uma produção cultural mais livre
foram os gregos. Eles não se submeteram às imposições de sacerdotes ou de reis
autoritários e valorizaram especialmente as ações humanas, na certeza de que o
homem era a criatura mais importante do universo. Assim, o conhecimento através
da razão, esteve sempre presente acima da fé em divindades.

Além do hedonismo, outro aspecto fundamental para compreender a estética


grega é o antropocentrismo, caracterizado pelo protagonismo do homem: os deuses
deram lugar aos homens como centro do universo (REALE, 1991). Paralelamente ao
pensamento racional, a filosofia e a busca das formas perfeitas nas proporções e
medidas marcam as variadas formas estilísticas gregas. A imagem e a semelhança
dos homens na cultura grega podem ser explicadas pela mitologia, fundamento
essencial para compreender suas manifestações artísticas. Os mitos se manifestaram
na vida grega, pois as pessoas representavam seus deuses mitológicos com forma
humana — ocasionalmente também em formas antropozoomórficas, ou seja, metade
homem, metade animal — e acreditavam que eles possuíam valores, virtudes e
defeitos, como os seres humanos. Janson e Janson (2009) ponderam que esse
aspecto foi manifestado na escultura, com características individualistas e racionais,
à imagem e semelhança dos homens virtuosos.
A pintura grega era aplicada à arquitetura, e, como em outras civilizações, era
constituída de painéis pintados que cobriam as paredes das edificações. Entretanto,
a pintura grega manifestou-se ricamente na arte da cerâmica. Os vasos gregos são
conhecidos pelo equilíbrio de suas formas, pela harmonia do desenho, das cores e
dos espaços destinados à ornamentação. Os pintores inventaram o escorço, que não
representa a exatidão objetiva das belas formas, que será realizada integralmente na
escultura.

21
Figura 8: Detalhe da pintura em cerâmica.

Fonte: Silviu Hisom/Shutterstock.com.

Na escultura, há uma pesquisa empírica que tem como objetivo a “[...]


expressão da Beleza viva do corpo” (ECO, 2004, p. 45). A geração de Fídias e Míron
(importantes escultores da Grécia Clássica) trabalha com a representação realista da
beleza das formas humanas. Não se trata da idealização de um corpo abstrato, mas
da busca de uma beleza ideal, que realiza a síntese dos corpos vivos e exprime
também a beleza do caráter (ou da alma) do modelo. A beleza representada pela
harmonia entre o corpo e alma é o ideal da kalokagathía (REALE, 1991). De fato, o
corpo nu (quase exclusivamente o masculino) é objeto de admiração e representava
a saúde por meio das suas perfeitas proporções. O corpo era valorizado quando era
atlético e saudável e sintetizava os aspectos estético, físico e intelectual: o corpo belo
é tão importante quanto uma mente brilhante. Em sua constante busca pela perfeição,
o artista grego produz uma arte escultórica elaborada intelectualmente, na qual
predominam o ritmo, a proporção e a harmonia, materializados no corpo ideal, afinal,
o homem é o centro de todas as coisas.
Aristóteles se refere ao termo mímesis, defendendo a máxima grega de que “a
arte imita a natureza”, que pode ser aplicada a uma escultura de Praxíteles ou à poesia
e à música. Aristóteles defende que a mímesis também deve estar na composição
dos produtos da arte não propriamente estéticos, como os objetos utilitários
(OLIVEIRA, 2003). Entende-se o pensamento de mímesis em relação à natureza.

22
3.2 Escultura

Os gregos começaram a esculpir em mármore grandes figuras humanas no fim


do século VII a.C., e, nas suas esculturas, era evidente a influência da arte escultórica
egípcia, tanto como fonte de inspiração quanto pela técnica de esculpir em grandes
blocos.
Os escultores gregos arcaicos apreciavam a simetria natural do corpo humano,
e, para representá-lo com o realismo desejado, os artistas começaram a usar os
próprios olhos, não se contentando apenas com seguir as fórmulas já consagradas.
Para evidenciar ao observador a simetria, esculpiam figuras nuas, eretas, em posição
frontal e com o peso do corpo distribuído igualmente nas duas pernas.

Figura 9: Esculturas gregas período arcaico.

Fonte: Silviu Hisom/Shutterstock.com.

Os escultores, em suas oficinas, ensaiavam novos modos de representação da


figura humana, que eram adotados por outros escultores. A escultura grega evoluiu
livremente, e, logo, um escultor descobriu que uma estátua pode parecer mais viva se
os pés não forem plantados firmemente no chão, por exemplo.
 Período Clássico
Entre os séculos V a.C. e IV a.C., a democracia ateniense atingiu seu nível mais
elevado, e a arte grega chegou no apogeu do seu desenvolvimento.
Péricles confiou o projeto dos templos ao arquiteto Ictino, e as esculturas que
modelariam as figuras dos deuses na decoração das arquiteturas ficaram sob a

23
responsabilidade do escultor Fídias. A escultura da Grécia Clássica, então, alcançou
um realismo inédito na história da arte. Não se satisfazendo mais com a postura rígida
das esculturas arcaicas, a exemplo dos kouros, os escultores gregos estudaram
possibilidades de avançar na representação e criaram escolas nas quais regras e
padrões de proporções foram instituídos. Eco (2004) destaca que a harmonia
pitagórica (resultante do perfeito equilíbrio dos opostos da natureza) associou-se à
exigência de simetria, que se impôs como um cânone do belo na arte da Grécia
Clássica. No século IV a.C., a noção de cânone já incorporava elementos à simetria
das esculturas, e os escultores estabeleceram novas regras para uma justa
proporção, que não eram apenas baseadas no equilíbrio de dois elementos iguais.

Figura 10: Escultura grega período clássico.

Fonte: Silviu Hisom/Shutterstock.com.

A possibilidade de perceber ação, mesmo nas figuras em repouso, é exem-


plificada no grupo das Três Deusas (frontão leste do Partenon, 438–432 a.C.),
ilustrado na Figura 4. A escultura representa Atena nascendo da cabeça de seu pai,
e, embora todas as figuras femininas estejam semirreclinadas, a curvatura dos corpos
sob as detalhadas dobraduras das vestes revela um movimento impressionante.

24
Figura 11: Três Deusas, Museu Britânico de Londres.

Fonte: Marco Tiberio/Shutterstock.com.

A escultura do Período Helenístico apresenta um realismo e expressividade


acentuados, maior intensidade no drapejamento das vestes e a postura das figuras
exibe movimentos de torção consideráveis. A arte grega sofreu uma profunda
mudança no Período Helenístico, sobretudo nas esculturas. Os artistas buscaram,
nesse período, a obtenção de fortes efeitos dramáticos e exploraram aspectos
psicológicos dos retratados. Pela primeira vez, retrata-se individualmente os
personagens, desvinculando-os dos tipos heroicos e ideais. Os traços são
profundamente detalhados, supondo-se que devam ter sido modelados em cera, e
não em argila, como era o padrão antes da fundição (JANSON; JANSON, 2009, p.
63).
A grande conquista da escultura helenística foi a representação, não apenas
de uma figura, mas de grupos que mantivessem a sugestão de mobilidade e
dramaticidade e que pudessem manter a apreciação estética em quaisquer dos
ângulos de observação.

25
Figura 12: “Laocoonte e seus filhos” é uma escultura do período helenístico que se encontra no
museu do Vaticano.

Fonte: Marco Tiberio/Shutterstock.com.

26
4. ARTE ROMANA
4.1 Influências Gregas e Etruscas na Produção Artística Romana

A era da arte helenística aos poucos deu lugar ao predomínio da arte romana,
após a vitória romana sobre os coríntios, em 146 a.C. A Grécia foi fundamental como
província do Império Romano, influenciando profundamente sua cultura, que passou
a ser conhecida como cultura greco-romana. A Roma dos césares adotava uma
administração uniforme do Império e produziu uma “arte imperial” (HAUSER, 2003),
que incorporou a estética grega e, no decorrer do tempo, fixou o padrão universal de
moda e bom gosto. Os etruscos viveram na Itália Central e efetuaram a transição da
Idade do Bronze pré-histórica para a histórica. A principal contribuição dos etruscos
para os romanos se concentra na arte de construir.
As culturas grega e etrusca convergiram para o desenvolvimento da arte
romana principiada a partir do século II a.C., momento em que Roma dominava a
totalidade do Mediterrâneo e avançava sobre o norte da Europa e da Ásia. A cultura
etrusca possuía características orientalizadas, acentuadas pelas relações comerciais
que este povo realizava com os demais povos da bacia do Mediterrâneo. A partir do
século IV a.C., observou-se um processo gradativo de helenizarão dos romanos, o
qual se manifestou em todas as esferas da sua cultura artística, a exemplo da
escultura, da arquitetura, da literatura e, inclusive, da língua e da religião. Os romanos
importavam esculturas e demais objetos da Grécia e reproduziam cópias em suas
oficinas de arte. A estrutura de pensamento romano era muito diferente do caráter
grego: a sabedoria do grego era uma tentativa para explicar a beleza, já a do romano,
um esforço para consolidar o poder. O grego era muito especulativo, o romano, muito
prático.

4.2 Pintura e Escultura Romanas

Assim como nas demais artes, as produções dos etruscos influenciaram a


pintura romana, o que foi revelado em trabalhos arqueológicos que encontraram
numerosos afrescos etruscos no interior de túmulos. As pinturas encontradas
representam cerimônias religiosas, ritos fúnebres, alegorias e motivos ornamentais.
De modo simultâneo, a pintura enriqueceu-se e definiu-se ao contato dos modelos
gregos e, sobretudo, helenísticos. Infelizmente, não conhecemos quadros de cavalete

27
romanos, porém Baumgart (1999) sugere que devem ter existido, levando-se em
consideração o costume de representar em amplas composições as batalhas dos
generais vitoriosos. Pompeia era uma cidade romana com muitos reflexos da arte
helenística, e o pouco que foi preservado, tanto da pintura grega quanto da pintura
romana, deve-se, em grande parte, à erupção do vulcão Vesúvio (79 d.C.), que
soterrou os edifícios construídos. Nossa imaginação especula sobre o tipo de pintura
existente antes da catástrofe, já que, conforme Janson e Janson (2009, p. 77): “O que
resta é capaz de surpreender o observador como sendo o aspecto mais excitante,
bem como desconcertante, da arte sob o domínio romano [...]”

Figura 13: Vila dos Mistérios, Pompeia (50 a.C.).

Fonte: Peeradontax/Shutterstock.com e S-F/Shutterstock.com.

Elementos importantes da pintura romana são referenciados pelas pinturas


encontradas em Pompeia. As pinturas autônomas, ou pinturas em tela (pinturas de
cavalete de modo geral, independentemente do suporte), não eram comuns nos
tempos romanos. Não há registros significativos desse tipo de pintura, ao contrário
das pinturas que faziam parte da decoração dos interiores, os afrescos. Os afrescos
de Pompeia narram muito do que conhecemos sobre a pintura romana.

28
O afresco é uma técnica de pintura mural executada sobre uma base de gesso ou
nata de cal ainda úmida. Seu nome deriva da expressão italiana fresco, de mesmo
significado no português. No afresco, o artista deve aplicar pigmentos puros diluídos
somente em água, de modo que as cores penetrem no revestimento e, quando secas,
passem a integrar a superfície em que foram aplicadas. Pode ser feito em parede,
muro ou teto, porém a durabilidade do trabalho é maior em regiões secas, uma vez
que a umidade pode provocar rachaduras na parede e danificar a pintura. O termo
afresco também é utilizado ao se referir a pinturas feitas dessa forma, com as pinturas
em igrejas e edifícios públicos, que ocupam grandes extensões (AFRESCO, 2017).

A questão da originalidade na escultura romana tem provocado debates na


história da arte. A preferência pela decoração opulenta levou os romanos a
importarem a estatuária grega, ou a cópia massificada delas, realizadas em seus
ateliers, em Roma. Janson e Janson (2009, p. 73) alegam que “[...] existem categorias
inteiras de escultura romana que merecem a designação de ‘ecos desativados’ das
criações gregas, esvaziados de seu significado original e reduzidos à condição de
obras de uma apurada perícia [...]”. Certos tipos de escultura romanas tiveram forte
significação na tradição escultórica: os retratos e os baixos-relevos narrativos são os
dois tipos de escultura que mais expressam a sociedade romana. Definida sob a ação
das correntes etruscas e gregas, a escultura romana encontra suas melhores
afirmações nessas duas modalidades de escultura. O baixo-relevo romano é
extremamente realista, exemplificando um verdadeiro documento histórico. Pode
permitir a reconstituição, em todos os detalhes, desde os arreios dos cavalos até as
armas dos combatentes, do gesto à vestimenta, do acontecimento militar ou histórico
que representa (BAU-MGART, 1999). A escultura romana é realista, descritiva e
documental. Esses traços artísticos definem o caráter romano, feito de senso prático
e de instintos políticos de domínio.

29
Figura 14: Baixo-relevo romano.

Fonte: Alexander A.Trofimov/Shutterstock.com.

O temperamento realista e prático dos romanos é expresso em suas esculturas,


que não pretendem instituir um padrão de beleza humana — como nas esculturas
gregas —, mas representar fielmente uma pessoa. Não se pode desprezar a
apropriação das técnicas e da estética gregas na escultura romana. A escultura
romana culmina no retrato. Em simples bustos ou estátuas de corpo inteiro, os
escultores deixaram verdadeiras obras-primas, devido à técnica e ao poder de
emoção. As tradições do retrato romano são carregadas de sugestões religiosas e
identificam-se com o culto dos mortos, de origem etrusca.
Nos séculos III e IV, a escultura entra em decadência, refletindo a própria
decadência da civilização romana. Todas as recordações da beleza ou do realismo
comovente desvanecem-se quando aparecem as primeiras representações de Cristo,
aproximadamente em IV d.C. No entanto, não são apenas as obras religiosas do
período do declínio do Império Romano que mudam de aspecto: A arte antiga declinou
nesse período, no entanto, não podemos atribuir esse fato à perda de habilidade dos
artistas. O ponto fundamental a ser considerado é que, em meio a guerras, invasões
e revoltas, os artistas já não se mostravam satisfeitos com a representação helênica
virtuosa e passaram a buscar outros efeitos e significados na arte.

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5. IDADE MÉDIA
5.1 Contexto

A Idade Média começa com a queda de Roma, em 476, na era cristã, e se


estende até a queda de Constantinopla, em 1453, um longo período, sendo, portanto,
quase impossível de ser descrito uniformemente. Antes mesmo da queda de Roma, o
imperador Constantino Magno declara o fim da perseguição aos cristãos. Nos séculos
seguintes, a história da arte se adaptou ao preceito de que suas imagens seriam úteis
para ensinar aos leigos a palavra sagrada.
A Idade Média tinha a arte como símbolo divino, que refletia em si a perfeição
divina e como meio pelo qual se podia contemplar a Deus. O artista continua a obra
de Deus, quando, por meio de sua arte, imita a natureza, não no sentido de reproduzi-
la, mas de continuar sua tarefa, como uma operação produtiva. Essa ideia já é
conhecida em Aristóteles, quando este classificou a arte e a natureza como atividades
semelhantes, pois ambas davam forma a alguma coisa, ambas eram práxis (CHAUÍ,
2000). A obra de arte imitava a atividade da natureza, o que, na Idade Média, era uma
forma de oração, em que imitar é rezar, e a sua atividade prática, um ato de fé. “A
Idade Média esteve sempre voltada para a vida contemplativa, seu ideal é o Santo,
aquele que destrói em si o sensual, destrói o animal, mata as paixões. A estética foi
um ramo da filosofia orientado para a teologia[...]” (DUARTE, 1997, p. 45). A Idade
Média se caracteriza, portanto, por uma ideia essencial: justificar a fé. No medievo, a
obra de arte era um símbolo, uma imagem, uma teofania (i.e., manifestação de uma
divindade transcendente, do Divino), assim como tudo o que era criado. A beleza da
obra de arte não era independente da verdade, pois revela, além de sua materialidade,
uma realidade invisível, inteligível. A arte da música, por exemplo, contribuía para
criar, nas catedrais, uma atmosfera celestial, indispensável para a realização das
cerimônias (FISCHER, 2002). A arte, além de uma teofania, era valorizada pela sua
função pedagógica. No início, a arte não era aceita pela Igreja — porque ela era uma
herança do paganismo —, mas, com o passar do tempo, os clérigos perceberam que
ela seria uma forma eficaz de ensinar ao povo iletrado e rude as condutas morais e a
doutrina cristã. A ideia de pintar as paredes das igrejas com passagens sacras trazia
a esperança de que as formas e as cores se apoderassem dos simples camponeses.
“Através das suntuosas e luminosas catedrais góticas, verticalmente tentando
alcançar os céus, os simples mortais experimentavam um pedacinho do céu na terra.

31
As paredes e os vitrais falavam da vida de Cristo [...]” (WOLFFLIN, 2000, p. 78). A
função da música na Idade Média, portanto, era levar os fiéis a um estado de contrição
e drástica humildade, apagando os traços de individualidade, diluindo-os em uma
coletividade submissa. Segundo Fischer (2002), o conteúdo dessa música era
determinado pelo contexto litúrgico e por suas associações: sofrimento divino, pecado
humano. A finalidade da música não era produzir um sentimento subjetivo indefinido,
mas de produzir uma emoção coletiva uniforme. Ela tinha um caráter objetivo, se a
compararmos com o caráter subjetivo e expressivo da música profana, cuja ascensão
coincidiria com a ascensão da burguesia, no fim da Idade Média. A Idade Média, de
modo geral, acaba com o naturalismo do pensamento grego, pois não vê mais a
beleza sensual e física que se manifesta na arte e na literatura e descarta o sensível
como forma de conhecimento, além de que o homem passa a querer sair do “mundo
das sombras” (a realidade) para contemplar a perfeição divina. Chauí (2000) observa,
então, um retorno ao pensamento platônico. A base da filosofia se encontra em Santo
Agostinho e São Tomás de Aquino, dois pensadores medievais importantes, os quais
definiram duas grandes vertentes do pensamento: a Patrística e a Escolástica.

5.2 Expressões Artísticas Medievais

Da tomada de Roma pelos povos bárbaros até o século IX, quando Carlos
Magno foi coroado imperador do Ocidente, a cultura clássica praticamente
desapareceu na Europa Ocidental. Os valores culturais e as expressões artísticas dos
povos invasores são radicalmente diferentes das artes produzidas pelos gregos e os
romanos. Percebemos a ausência da representação da figura humana e uma forte
preocupação decorativa. Santos (2000) destaca que o caráter decorativo da arte
bárbara é consequência do nomadismo daqueles povos. Nesse sentido, eles criaram
pequenos objetos — particularmente joias — que pudessem ser transportados com
facilidade.

32
Figura 15: Coroa Imperial (séc. X).

Fonte: CSvBibra (2009, documento on-line).

A produção artística dos bárbaros destacou-se pelos trabalhos de ourivesaria,


concretizando-se dentro de uma concepção decorativa. No longo período inicial da
Idade Média (até o séc. X), o Ocidente foi se estruturando em torno de uma nova
aristocracia, mantendo a autoridade da Igreja Católica e a estrutura econômica do final
da época romana, caracterizada pelas grandes propriedades agrícolas produtivas.
A Europa presencia, nesse momento, a evidente decadência das cidades
(BENEVOLO, 1997), e o campo não possui condições propícias para o
desenvolvimento de criações artísticas, não havendo, portanto, reconhecidas
evoluções na arte e na cultura nesse período. As únicas fontes de propagação —
mesmo que tímida e autocentrada — da educação, arte e preservação da cultura
greco-romana eram as escolas ligadas às catedrais e mantidas pelos bispos para a
formação do clero. Portanto, o conhecimento estava integralmente centrado nos
mosteiros.
A Igreja, ocupando o lugar central do conhecimento, tornou-se particularmente
poderosa: as igrejas eram as únicas instituições educacionais que estavam aptas a
receber os filhos dos grandes proprietários. Consequentemente, seu poder se
assemelhou ao poder do Estado. Foi também a Igreja que continuou a contratar

33
artistas, artesãos, decoradores e construtores, pois as igrejas eram os únicos edifícios
públicos que continuaram a ser construídos.

5.3 Arte Românica

O estilo artístico vigente entre o século XI e o início do século XIII na Europa foi
denominado “Arte Românica”, correspondendo ao período caracterizado pela
decadência do sistema feudal. Observa-se, na literatura de história da arte, porém,
que a Igreja conservava poder e influência, determinando a produção cultural e
artística do momento, cuja maior representação foram as basílicas. Pode-se constatar,
então, que a produção artística — seja a pintura ou a escultura — é indissociável da
arquitetura (GOMBRICH, 1999; JANSON; JANSON, 2009). O elemento religioso
conseguiu manter uma unidade de toda a produção artística na Europa, cuja coesão
foi reforçada pela Arte Românica.

O termo “românico” refere-se às influências da cultura do Império Romano,


dominante por muitos séculos em todo o continente europeu.

Os mosteiros se fortaleceram paralelamente ao desenvolvimento comercial e


ao surgimento de peregrinações religiosas, contribuindo para difundir os novos
modelos artísticos. Assim como a pintura, a escultura românica desenvolveu-se
principalmente junto à arquitetura das basílicas, muito frequente nos pórticos e
arcadas na forma de colunas, capitéis decorados, frisos e tímpanos repletos de
relevos .
Nas composições escultóricas, as figuras eram expostas em profusão, e, junto
à iconografia recorrente de Jesus Cristo, alternavam-se personagens do Velho
Testamento, representações do demônio, animais fantásticos e elementos vegetais.
É importante salientar que a escultura tinha um papel didático importante: os relevos
tinham o objetivo de narrar as histórias sagradas, e, quando organizados em faixas,
eram lidos da direita para a esquerda. Hauser (2003) afirma que as igrejas absorviam
a quase totalidade do trabalho dos escultores da Arte Românica. A pintura românica
reproduz a técnica dos afrescos romanos no interior das basílicas. A própria
arquitetura favorece a pintura de grandes murais nas paredes internas das igrejas,
pois as espessas paredes laterais, com escassas aberturas, criavam grandes

34
superfícies para aplicar os afrescos (SANTOS, 2000). Os murais românicos eram
inspirados nas iluminuras dos livros religiosos, vastamente produzidos nos mosteiros
e conventos, os quais narravam a história sagrada. A pintura românica não descrevia
assuntos profanos.

Figura 16: Afresco Cristo em Majestade (1123).

.
Fonte: Mestre de Taüll (2002, documento on-line).

5.4 Arte Gótica

Para Hauser (2003), a ascensão do estilo gótico opera uma mudança


fundamental na história da arte, pois os ideais estilísticos — fidelidade à natureza,
profundidade de sentimento, sensualidade e sensibilidade —, válidos até os dias
atuais, tiverem origem com o estilo.
As obras góticas apresentam figuras em proporções normais, movimento
natural e beleza. Elas representam claramente o declínio do equilíbrio estático da arte
e da cultura românicas. Se o período românico pode ser categorizado com a época
das basílicas, o período gótico representa a época das grandes catedrais. Em relação
às artes visuais, somente nos últimos cem anos nos habituamos a ler sobre a pintura
e a escultura góticas, permanecendo ainda algumas incertezas acerca dos limites
exatos do estilo gótico nesses campos. A história da arte trata o conceito de arte gótica

35
da forma que o estilo se desenvolveu: iniciou-se na arquitetura e, por
aproximadamente um século (de 1150–1250, período equivalente à Época das
Grandes Catedrais), manteve nessa categoria seu papel dominante.
A escultura gótica, incialmente, era rigorosamente arquitetônica em espírito,
porém, após 1200, perdeu essa exclusividade; a pintura gótica, por sua vez, atingiu
seu apogeu criativo entre 1300 e 1350, na Itália Central. Quando examinamos a época
gótica como um todo, observamos uma mudança gradual de ênfase: da arquitetura
para a pintura — ou do caráter arquitetônico para o pictórico. Na fase inicial, tanto a
escultura quanto a pintura gótica refletiram o contexto monumental das grandes
catedrais; na fase final, conhecida como Gótico Tardio, as duas categorias se
empenharam em buscar os efeitos pitorescos, ricos em pequenos detalhes (JANSON;
JANSON, 2009).
Enquanto as estátuas de santos aplicadas às basílicas românicas pareciam
sólidos pilares firmemente encaixados na moldura arquitetônica, o mestre que
trabalhou nas esculturas da Catedral de Chartres (França, 1145–1220) imprimiu vida
a cada uma das figuras.

Figura 17: Esculturas da Catedral de Chartres.

Fonte: Pack-Shot/Shutterstock.com.

As imagens parecem movimentar-se e olhar umas para as outras, e cada uma


das figuras é reconhecível para todos que conheçam o Antigo Testamento. Suas
vestes possuem um drapejado intenso, porém próximo à realidade, e indicam que
existe um corpo por detrás das roupas.

36
A pintura gótica prenunciou o Renascimento de forma gradativa, e, claro,
durante muitos séculos antes. É perceptível a procura do realismo na representação
pictórica, sem, contudo, ter obtido êxito naquele momento. Essa categoria artística
desenvolveu-se nos séculos XIII, XIV e início do século XV, com importantes
representações na Itália. Gombrich (1999) atribui à arte italiana o protagonismo na
pintura gótica, devido ao contato da Itália com a Arte Bizantina: os italianos
conseguiram — antes dos demais artistas — transpor a barreira que separa a
escultura da pintura. Apesar de toda a rigidez, a arte bizantina já modelava as faces
em luz e sombra e revelava uma compreensão correta dos princípios do escorço. Um
exemplo da influência da arte bizantina na pintura gótica é encontrado na obra de
Giovanni Gualteri, conhecido como Cimabue, o pintor mais importante do século XIII.
Sua nítida preocupação com o realismo das figuras é exemplificada pela obra Madona
Entronizada.

Figura 18: Madona Entronizada (1295–1300), Museu do Louvre, em Paris.

Fonte: Galeria Uffizi (2002, documento on-line).

A pintura gótica apresenta um aspecto puro e leve da religiosidade, que,


caracterizada pelo simbolismo e o naturalismo, explorou as cores claras em suas
composições (frequentemente afrescos). A iconografia cristã já estava consolidada, e
a linguagem das cores, definida: tons claros de azul para a Virgem Maria, e marrom
para São João Batista, por exemplo. Esses padrões foram aplicados tanto nas

37
pinturas murais e nos afrescos quanto na ilustração de livros (as iluminuras
medievais). As iluminuras e os vitrais são apartes importantes da arte gótica. As
iluminuras são as ilustrações dos manuscritos bíblicos, os quais compartilham os
princípios da pintura gótica. Já os vitrais multicoloridos são fortemente representativos
da arte gótica, sobretudo da arquitetura gótica.

38
6. RENASCIMENTO
6.1 Contexto

A Europa do século XV foi o palco do surgimento de importantes revoluções


tecnológicas, culturais, sociais e artísticas, identificadas pelo termo Renascimento. Do
ponto de vista social, o Renascimento é caracterizado pelo fim das invasões, pelo
florescimento das cidades e do comércio e pelo grande despertar científico. Houve
uma grande revolução científica e tecnológica no Renascimento, com importantes
descobertas e invenções, como: a bússola, a pólvora, a impressão de livros, as
grandes navegações, as lentes, o relógio, entre outras. Nesse contexto, o homem
recupera seu valor no mundo, e já não se sente uma figura ínfima perante Deus, como
na Idade Média. Tem-se, então, o contexto ideal para o surgimento do Humanismo.
O Humanismo se caracteriza por conhecimentos abrangentes, a não
especialização. Leonardo da Vinci, por exemplo, somava as atividades de cientista,
pesquisador, anatomista, matemático e pintor.
O início do Renascimento é datado dos séculos XV — incialmente apenas na
Itália — e XVI — em toda a Europa —, tendo características e especificidades
particulares conforme cada país. Sem dúvida, seu maior fulgor foi na Itália, cuja
sociedade, ligada à vida urbana, tinha em Veneza e Gênova poderosas classes de
ricos mercadores, devido ao fato de serem cidades portuárias. Conforme apontam
Janson e Janson (2009), outro fator que propiciou o brilho do Renascimento italiano
foi a presença da cultura clássica, já que a Itália era o centro do Império Romano.
Quando Constantinopla foi conquistada pelos turcos, vários sábios bizantinos fugiram
para a Itália, levando manuscritos e obras de arte. Hauser (2003) observa que havia,
na Itália, um estímulo para a produção cultural, de modo que o comércio com o Oriente
formou uma poderosa classe de ricos mercadores e banqueiros, e esse grupo formou
um mercado em potencial para as obras de arte. Surge, então, o Mecenato, classe de
poderosos investidores que protegia os artistas, consumindo suas obras. Os principais
mecenas foram os papas Alexandre II, Júlio II e Leão X e ricos mercadores e políticos,
como a família Médici. No Renascimento, o emprego da técnica da pintura à óleo
substituiu definitivamente as técnicas do afresco, da têmpera e da encáustica,
possibilitando uma verdadeira autonomia da pintura, que poderia ser executada,
comercializada e transportada de forma muito mais ágil e independente da arquitetura.

39
No Renascimento, a arte deixa de ser serva do dogma, uma vez que o
Humanismo a salva desse cativeiro. Ela deixa de ser o “útil” de Aristóteles e da Idade
Média e assume a função de mostrar aos homens a realidade da forma lógica e exata,
e o belo assume a definição de perfeição. A arte se une à ciência empírica e passa a
ser reconhecidamente uma forma de conhecimento, é cosa mentale, ou seja, do
espírito e da inteligência. Ela pressupõe o ensino dos mestres, e não dos teólogos. É
racional, e os sentimentos são, em grande parte, vistos como inimigos (SÁNCHEZ
VÁZQUEZ, 1999). A arte no Renascimento conserva as ideias clássicas gregas de
harmonia, equilíbrio, proporção, nas quais a natureza é concebida como a ordem de
todas as coisas. Todavia, não é entendida somente como independente do homem,
visto que abrange todo o universo, todas as ações práticas dos homens, ou seja, as
leis, as convenções estabelecidas pelos homens, a organização política e social.
Sánchez Vázquez (1999) e Eco (2004) observam, no entanto, um conceito de
natureza bastante amplo no Renascimento. A arte utiliza-se das ideias clássicas e das
novas conquistas, como a perspectiva geométrica. A arte cria, dessa maneira, uma
segunda natureza, uma nova realidade, porém de uma forma que transcende a própria
realidade, pois ela manifesta a perfeição racional desejada e idealizada para suas
vidas, mas que só pode ser conhecida por intermédio da razão.

Importante descoberta científica do Renascimento, a perspectiva geométrica


surgiu como um esforço de representação tridimensional em uma superfície
bidimensional. Da observação da natureza, formulou-se um código de
representação espacial, reforçando o ideal humanista, ao descrever a realidade
em termos matemáticos. A arte passa a se associar à matemática para demonstrar
seu domínio intelectual. Para saber mais a respeito da perspectiva geométrica, leia
o artigo “A perspectiva na arte do Renascimento”, disponível no link a seguir.

40
O artista tem a sua personalidade própria, é original e criador, principalmente
na pintura. Portanto, este se distingue do artesão, e sua arte se diferencia das artes
mecânicas, manuais e servis. O Renascimento altera a relação medieval entre o divino
e o humano. Deus é mais humano e o ser humano é mais divino. Assim, a natureza e
o corpo do homem entram na estética de beleza platônica da provação e da ordem.
O corpo humano aparece idealizado (homem divinizado), é o belo ideal dos corpos
sensíveis (não o transcendente do medieval). O Renascimento, dessa forma, exclui a
categoria do feio na arte, que existia na Idade Média (GOMBRICH, 2002; ECO, 2004).

6.2. Pintura

Representar a realidade de tal forma que ela pareça algo orgânico e vivo é um
dos objetivos da pintura renascentista. A pintura provocou uma nova concepção de
obra de arte, que, como tal, também deve se tornar um organismo. Não era possível
conceber os organismos de uma pintura — homens, animais, plantas, etc. —, por si
só, como organismos vivos, seu conjunto, que, na natureza, nunca se apresentava
dessa forma, deveria também se tornar uma unidade orgânica (HAUSER, 2003)
A pintura do Renascimento alcança duas importantes conquistas que vinham
sendo buscadas na pintura medieval: a perspectiva e o sfumato, que permitiram o
alcance de um inédito realismo. A combinação da técnica da perspectiva científica e
da aplicação do sfumato permitiu o alcance de um inédito realismo nas pinturas. Ao
dominar esses inventos, o Renascimento viu surgir inúmeros mestres da pintura, cada
qual mantendo suas características próprias. A pintura como imitação do real encontra
na obra de Masaccio (1401–1428) sua manifestação. Primeiro mestre reconhecido da
Renascença Italiana (do período Quattrocento), Masaccio produziu afrescos com uma
plasticidade e realismo nunca vistos. O cuidadoso realismo de Masaccio parece
convencer o espectador da veracidade da cena retratada e convidá-lo a participar da
pintura, como no grande afresco da igreja de Santa Maria Novella, em Florença.

41
Figura 19: Santíssima Trindade (1427) — Mural em Santa Maria Novella, Masaccio.

Fonte: Masaccio (2016, documento on-line).

Os pintores renascentistas incluíam a paisagem como plano de fundo para a


representação das figuras humanas, este, porém, era um grande desafio a ser
vencido: a nova arte da perspectiva deveria integrar a figura e o fundo. Entre os
pintores florentinos da segunda metade do século XV que se ativeram à busca da
solução para esse problema, Sandro Botticelli (1446–1510) foi o mais bem-sucedido
até então. Botticelli foi o artista que melhor expressou um ritmo suave e gracioso das
figuras representadas.
A mais notável obra de arte do mundo ocidental é a Mona Lisa (1502). Am-
plamente divulgada pela publicidade, a pintura tem um amplo grau de realismo,
conforme assegura Gombrich (1999, p. 300): “Ela parece realmente olhar para nós e
possuir um espírito próprio. Como um ser vivo, parece mudar ante os nossos olhos e
estar um pouco diferente toda vez que voltamos a olhá-la”. O caráter enigmático da
mulher retratada produz uma sensação quase sobrenatural, seu sorriso misterioso

42
tem despertado a atenção dos observadores e proporcionado diversas leituras,
teorias, textos, música e, inclusive, filmes.

Figura 20: Mona Lisa (1502), Da Vinci. Museu do Louvre, Paris.

Fonte: Mona Lisa, (2019, documento on-line).

Para a história da arte, interessa particularmente investigar como Leonardo


obteve esse efeito e por quais meios. Grande observador da natureza, o artista
conhecia profundamente as questões de ótica, além de identificar que todo o
conhecimento adquirido no Quattrocento sobre desenho, composição e utilização
rigorosa da perspectiva não havia conseguido resolver o problema da rigidez das
figuras. Leonardo da Vinci identificou o problema da rigidez à excessiva delimitação
do contorno, encontrando a verdadeira solução, que passou a ser adotada na pintura:
o sfumato. Essa técnica permite que uma forma se funda com outra por meio de sutil
sombreamento, assim, os contornos são deixados indefinidos e desaparecem em uma
sombra.
Em quatro anos de trabalho solitário nos andaimes da capela papal,
Michelangelo executou uma façanha física nada comparável à genialidade intelectual
e artística. A grandeza e a riqueza das pinturas com execução rigorosa de todos os
detalhes revelaram aos artistas posteriores o poder de um gênio. Dentre tantas cenas
da rica composição, uma particularmente representativa é a criação do homem, que

43
ocupa o retábulo central do conjunto (SANTOS, 2000; BAUMGART, 1999). Deus é
representado por uma figura masculina com corpo vigoroso, cercada de anjos, e
estende a mão para tocar a mão de Adão, representado por um homem jovem, “[...]
cujo corpo forte e harmonioso concretiza magnificamente o ideal de beleza do
Renascimento” (SANTOS, 2000, p. 89).

Figura 21: A Criação do Homem, Teto da Capela Sistina (1508–1512), Vaticano, Roma.

Fonte: Creative Lab/Shutterstock.com.

As figuras humanas de Michelangelo possuem forma natural, considerada


“perfeita”, bem como representam dignidade e tragicidade. De certa maneira, são o
oposto das figuras humanas representadas por outro importante mestre da pintura
renascentista, Rafael Sanzio (1483–1520).
Em Rafael, encontra-se o equilíbrio e a simetria — foi o artista que melhor
desenvolveu os ideais clássicos de beleza: harmonia e regularidade de formas e
cores. Rafael evitou os excessos e o decorativismo, e um sentimento de ordem e
segurança é comunicado ao observador por meio de composições em espaços
amplos e claros, em composições simétricas e equilibradas. Seu trabalho se
transformou em modelo para o ensino acadêmico de pintura. Uma obra que revela
claramente esses valores é a Escola de Atenas.

44
Figura 22: Escola de Atenas (1509–1511), Stanza della Segnatura, Vaticano, Roma.

Fonte: Escola de Atenas (2019, documento on-line).

Nessa pintura, percebe-se a exata aplicação das regras da perspectiva na obra


de Rafael, em particular pela representação do espaço conferindo profundidade por
meio da beleza monumental dos elementos arquitetônicos (arcadas e estátuas). No
centro da pintura estão Platão e Aristóteles, e à sua volta agrupam-se outros sábios.
A pintura serena e eloquente do artista sempre mantém a ordenação harmônica, com
uma linha imaginária central nos dois eixos (vertical e horizontal) (BAUMGART, 1999;
SANTOS, 2000). A pintura renascentista consegue expressar a natureza e sua beleza
intrínseca por meio da exata aplicação das regras matemáticas. O intelecto apreende
a realidade perfeita, e a pintura é o meio pelo qual os homens podem apreciar o belo.
A dignidade da pintura é a união do belo com a natureza, que também é proclamada
pela escultura da Renascença

6.3 Escultura

A escultura renascentista evidencia as descobertas científicas da perspectiva,


incluída na categoria simultaneamente ao desenvolvimento dos estudos das
proporções antigas. A escultura adquire total autonomia quando se desvincula da
exclusividade à arquitetura. Agora, as esculturas são expostas em nichos na parede
ou em pedestais para que possam ser observadas de todos os ângulos possíveis.

45
Figura 23: Monumento Equestre a Colleoni (1480–1488), Veneza.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

Figura 24: Davi de Verrocchio (1473–1475) e Davi de Michelangelo (1501–1504).

Fonte: (a) David (Verrocchio); (b) Gurb101088/Shutterstock.com.

46
Na escultura da juventude artística de Michelangelo, Argan (2003) ressalta o
conceito de “inacabado”, que será adotado pelo artista em suas esculturas da fase
madura. Nessa obra, ao contrário, deve-se falar do “demasiadamente acabado”: “As
imagens são concebidas em uma dimensão que está além da realidade natural, além
do espaço: a luz deve fluir sobre a forma polida sem penetrar nela, o ar não deve
envolvê-la nem ofuscá-la” (ARGAN, 2003, p. 28).

47
7. BARROCO

Na história da arte, refere-se à arte produzida no século XVII até meados século
XVIII (consensualmente entre 1600 e 1750) como barroco. O termo foi utilizado pela
primeira vez no fim século XVIII e aplicava-se aos fenômenos que, de acordo com a
estética classicista predominante, eram considerados extravagantes, confusos e
bizarros. É importante salientar que o Classicismo (o modelo renascentista) não se
incluía nesse conceito e permaneceu presente nas expressões artísticas até quase o
fim do século XIX — o estilo neoclássico atesta sua prevalência. Embora não exista
consenso quanto ao significado do termo Barroco, uma das correntes o identifica
como um nome originário da Península Ibérica que significa “pérola de origem
irregular” (WOLFFLIN, 2000; HAUSER, 2003; BAUMGART, 1999). Essa acepção foi
utilizada de maneira depreciativa para caracterizar as inovações artísticas posteriores
ao Renascimento e como denúncia aos exageros cometidos pelos artistas pós-
renascentistas.
As subdivisões mais importantes do Barroco são: o Barroco cortesão--católico
e o Barroco classicista. O Barroco cortesão-católico tem uma tendência sensualista,
monumental e decorativa, é aquilo que se entende pela acepção tradicional de
“barroco”. Já o Barroco classicista é um estilo mais estrito, formalmente mais rigoroso.
Nessas duas tendências, os fatores sociais que determinam o Barroco geram
impactos distintos e serão estudados à luz da teoria e das obras produzidas
(HAUSER, 2003).
O contexto do surgimento do movimento na Europa possui estreita ligação com
a reação da Igreja Católica à Reforma Protestante (século XVI). A Contrarreforma ou
Reforma Católica decretou que a arte deveria inspirar os espectadores com temas
fervorosamente religiosos.
O Barroco é reflexo de aspectos importantes desse período da história da
civilização ocidental (século XVII), em que ocorreram mudanças que conferiram novas
feições à Europa da Idade Moderna. Embora tenha sido um movimento de caráter
religioso, a Reforma Protestante teve consequências que ultrapassaram os limites da
fé, provocando mudanças em outros aspectos da cultura europeia. A mais significativa
vertente dessas mudanças o surgimento dos Estados nacionais e dos governos
absolutos, fenômeno em que cada nação conseguiu se libertar da submissão
exclusiva ao papa (WOLFFLIN, 2000). Contudo, para entender os princípios do

48
Barroco, é imperativo conhecer os trabalhos conciliados à atuação das grandes
ordens religiosas (como a Companhia de Jesus) para a retomada de força da Igreja
Católica na edificação de grandes e novas igrejas, originalmente uma iniciativa
italiana. Esses princípios serão absorvidos e adaptados às demais categorias
artísticas, dentre elas: pintura, escultura, literatura e teatro. Além disso, pode-se incluir
nessas categorias o urbanismo — por meio dos traçados urbanos — e o paisagismo
— por meio das monumentais arquiteturas da paisagem, realizadas especialmente
sob o domínio dos governos absolutos, como no caso da França.
Fato, a arquitetura barroca (tanto a religiosa quanto a cortesã) incorpora os
elementos da arquitetura clássica, reunindo todas as peças formais já conhe-cidas:
colunas (novidade na utilização de meias colunas e pilastras), arquitrave e frisos. A
distribuição dessas peças formais também emprega características clássicas, como a
vasta entrada central emoldurada por colunas e ladeada por duas entradas menores.
No entanto, o modo como os elementos clássicos passam a ser arranjados indica que
as regras greco-romanas e renascentistas ficaram para trás. Há, por exemplo, a
duplicação de pilastras (em outros casos, há duplicação de mais elementos), com
objetivo de imprimir maior riqueza, solenidade e variedade de linguagem (GLANCEY,
2001) Uma importante característica da Igreja de Il Gesù é a cenografia. O arqui-teto
tratou a fachada de forma a evitar a repetição e a monotonia, organizando as partes
de modo a conseguir um clímax no centro da composição, realçando a entrada
principal por uma dupla coluna. Sobre esse aspecto cenográfico, Gombrich (1999, p.
389) observa: “Na fachada de Giacomo della Porta para a primeira igreja jesuíta tudo
depende do efeito proporcionado pelo conjunto. Tudo está fundido num vasto e
complexo padrão”. Uma forma recorrente na arquitetura barroca de igrejas e
completamente inédita é o emprego das volutas, ausentes na arquitetura clássica. As
volutas laterais realizam a conexão entre os andares inferior e superior, e são
justamente essas formas curvas e espirais as responsáveis por grande parte das
censuras aos construtores barrocos pelos defensores da pureza das formas clássicas.
Na arqui-tetura sacra barroca, as volutas operam de modo a conferir coerência e
unidade às complexas composições das fachadas (GLANCEY, 2001; GOMBRICH,
1999). O Barroco é um estilo que abusa dos ornamentos e das decorações, e os inte-
riores são notadamente espetaculares, como revela o interior de Il Gesù (Figura 3). A
profusão de elementos decorativos marca a estética barroca, criando um espaço

49
cenográfico com forte apelo emocional, no qual arquitetura, a escultura e a pintura se
fundem. Fazio (2011, p. 361) destaca o teto da nave central.

Figura 25: (a) Interior de Il Gesù com (b) afresco do teto da nave central.

Fonte: (a) Rom Il Gesu Hauptorgel (2007, documento on-line); (b) Triumph of the Name of Jesus
(2015, documento on-line).

A consolidação das monarquias absolutistas foi fundamental para a for-mação


da estética barroca, em particular na França, cujos valores eram con-sagrados por
meio da arte. O Barroco passa a ser a exibição do poder e da grandeza do Estado
centralizado, representado pela monumentalidade dos seus palácios, a exemplo do
Palácio de Versalhes (iniciado em 1661), construído por Luís XIV (Figura 4) (JANSON;
JANSON, 2009).

50
Figura 26: (a) Palácio de Versalhes e seus (b) jardins (1661–1750), França.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

Ícone do Barroco cortesão, o Palácio de Versalhes foi transformado em um


monumento da arquitetura, que envolveu o projeto paisagístico de André Le Nôtre e o
projeto de interiores do decorador Charles Le Brun. O centro da corte francesa foi
acomodado nas imensas edificações projetadas por Louis Le Vau e Jules Hardouin-
Mansart (após a morte de Le Vau). A magnitude do Barroco francês encontrou em
Versalhes sua maior expressão. De acordo com Janson e Janson (2009, p. 280):
O projeto, de André Le Nôtre, em uma relação tão estreita com a planta do
palácio que se torna uma continuação do espaço arquitetônico. Com o interior de
Versalhes, pretendia-se que esses jardins formais, com terraços, fontes, cercas vivas
aparadas e estátuas, constituíssem um cenário à altura das aspirações públicas do
rei. A regularidade geométrica imposta a toda uma região nos arredores do palácio
revela, de forma de ainda mais impressionante no palácio em si, o espírito do
absolutismo.
A partir dos exemplos apresentados, que sintetizam os contextos de surgimento
e os aspectos generalizantes do movimento, pode-se afirmar que o Barroco renovou
completamente a iconografia e as formas da arte sacra, ao mesmo tempo que foi uma
expressão cortesã, refletindo o Absolutismo da monarquia no fausto da decoração.
Essa grandiosidade pode ser explicada pelo contexto histórico, marcado pela reação
da Igreja à teologia protestante e pela ostentação das cortes que representavam o
Estado absoluto. O Barroco foi uma forma de expressão propagandista, em que a arte

51
estava diretamente comprometida com a nova realidade (Contrarreforma Católica e
Absolutismo), promovendo o anúncio dos seus valores. Nas categorias artísticas
(arquitetura, escultura e pintura), as obras romperam o equilíbrio entre o sentimento e
a razão, com o predomínio das emoções. O Quadro 1, a seguir, apresenta os
princípios caracterizantes do Barroco, estabelecendo uma comparação com os
princípios renascentistas, visando à compreensão da revolução formal e conceitual
barroca, sem, contudo, adentrar em critério de juízo estético em relação às distintas
produções.

Quadro 1: Princípios caracterizantes.


Aspectos Estética renascentista Estética barroca
Racionalidade Profundamente racional: Predominância das
Arte é “cosa mentale” emoções
(Leonardo da Vinci)
Ornamentação Absolutamente Arte emocional e
dispensável, arte sensual, opulência das
racional, intelectual formas e excesso de
ornamentação
Intelectualização Tendência a fixar Oposição ao intelecto,
princípios rígidos apelo ao emocional ou
dramático
Disciplina Estruturas artísticas Momento de libertação
disciplinadas, de formas
comedidas, clássicas
Religiosidade Interpretação idealizada Religiosidade ligada a
das sagradas escrituras, uma visão de mundo
fechada aberta, combinando
misticismo e
sensualidade
Simetria Rigorosa Assimetria, noção de
espaço infinito,
movimento contínuo,
com o objetivo de tocar

52
os sentidos e despertar
as emoções
Artes Individualizadas Fundem-se na unidade
barroca, criando um
espetáculo dinâmico,
colorido e brilhante, que
se traduz em exaltação
Composição pictórica Linha central imaginária Linha diagonal
e escultórica imaginária
Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

O Barroco europeu consolidou-se como um estilo teatral condizente com a nova


era, na qual o teatro, a ópera e uma opulenta vida urbana floresciam. A Igreja Católica
captou rapidamente a mensagem que o teatro e a ópera enviavam: desejava-se
conquistar o espírito das massas e deter o avanço do protestantismo, de modo que
se deveria oferecer ao público, nos dias de culto, o equivalente da ópera e do teatro.
A arte barroca combinou a técnica avançada da Renascença com a emoção, a
intensidade e a dramaticidade, fazendo do estilo Barroco o mais suntuoso e
ornamentado da história da arte, como se observa por meio de suas produções
escultóricas e pictóricas:
 Pictóricas: pintura;
 Escultóricas: escultura.
Enquanto as esculturas renascentistas apresentavam um equilíbrio entre os
aspectos intelectuais e emocionais, as obras barrocas apagaram esse equilíbrio,
dando lugar à exaltação dos sentimentos, com formas recobertas de efeitos
decorativos que expressam o movimento. Nessas obras predominam as linhas curvas,
a aplicação do dourado, a movimentação e o drapeado das vestes. A expressão das
figuras também revela emoções violentas, atingindo uma dramaticidade desconhecida
nas obras do Renascimento (SANTOS, 2000). A escultura barroca pode ser
representada pelo nome de Gianlorenzo Bernini (1598–1680), que deixou sua marca
em Roma: suas fontes, suas esculturas religiosas e o seu projeto da Basílica de São
Pedro são ícones do estilo Barroco. Bernini foi escultor, arquiteto, pintor, teatrólogo,
compositor, cenógrafo de teatro e um brilhante caricaturista.

53
Figura 26: (a, b) Baldaquino da Basílica de São Pedro (1624–1633), Roma.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

Os artistas italianos assumiram pioneirismo na instauração da nova linguagem


renascentista, e, naquele período, foram fundadas academias de arte para ensinar as
técnicas de representação recém-descobertas. Com o domínio da representação —
logo expandido para os demais países europeus —, deve-se também aos italianos a
mudança da ênfase da racionalidade para a emoção e do estático para o dinâmico.
Em diferentes meios, os italianos representaram com excelência o fastígio do Barroco.
Se, na escultura, reverencia-se Gianlorenzo Bernini, na pintura, Michelangelo Merisi,
conhecido como Caravaggio (1571–1610) é o mais notável artista do Barroco italiano.
Caravaggio se interessava pela beleza que encontrava em modelos incomuns — ao
contrário da beleza clássica renascentista —, descobertos entre as pessoas do povo.
Eram geralmente frequentadores das tabernas, vendedores, músicos ambulantes,
ciganos. Não havia, para o artista, a distinção entre beleza e aristocracia (GOMBRICH,
1999).
O que melhor caracteriza a pintura de Caravaggio é o modo revolucionário
como ele utiliza a luz, fenômeno que foi estudado e assimilado por vários outros
mestres da pintura barroca. A luz, em Caravaggio, não aparece apenas como reflexo
da luz natural, mas é intencionalmente criada para dirigir a atenção do observador: o
pintor é conhecido como o criador do estilo luminista. Um exemplo referencial do
emprego da luz feito por Caravaggio é o quadro A vocação de São Mateus (1596–
15898).

54
Figura 27: A vocação de São Mateus (1596–1598).

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

O Barroco espanhol recebeu influências diretas do Barroco italiano,


principalmente no uso expressivo da luz e sombra. A pintura espanhola, porém,
conserva preocupações próprias do espírito nacional, com ênfase no domínio técnico
e no realismo. Os principais pintores do Barroco espanhol são: El Greco (1541–1614),
cuja característica é a verticalidade das figuras, e Diego Velázquez (1599–1660), que
representa as distinções particularizantes do Barroco na Espanha. Desde muito jovem
(com 24 anos), Velázquez foi admitido como pintor oficial da corte espanhola, e, a
partir de então, passou o resto de sua vida pintando a aristocracia da Espanha.
Soberbamente talentoso, o artista também retratava os tipos populares do seu país,
documentando o dia a dia do povo naquele momento histórico. Impressionado com a
obra de Caravaggio, estudou profundamente a aplicação da luz. “[...] mas, em
Velázquez a luz tem uma função diferente: ela estabelece um clima mais intimista para
as cenas retratadas” (SANTOS, 2000, p. 111). Além do realismo e do exímio domínio
técnico, o que caracteriza a obra de Velázquez é a dignidade com a qual ele retratava
seus modelos: quer pintasse o rei, quer pintasse o bobo da corte. A rígida tradição
formal dos retratos da nobreza foi humanizada pela pintura do artista, abordando os
personagens em poses mais naturais, sem acessórios exagerados. “Apesar de ser

55
um virtuoso na técnica, Velázquez preferia a moderação à ostentação, o realismo ao
idealismo” (STRICKLAND, 2002, p. 60).
O Barroco espanhol recebeu influências diretas do Barroco italiano,
principalmente no uso expressivo da luz e sombra. A pintura espanhola, porém,
conserva preocupações próprias do espírito nacional, com ênfase no domínio técnico
e no realismo. Os principais pintores do Barroco espanhol são: El Greco (1541–1614),
cuja característica é a verticalidade das figuras, e Diego Velázquez (1599–1660), que
representa as distinções particularizastes do Barroco na Espanha. Desde muito jovem
(com 24 anos), Velázquez foi admitido como pintor oficial da corte espanhola, e, a
partir de então, passou o resto de sua vida pintando a aristocracia da Espanha.
Soberbamente talentoso, o artista também retratava os tipos populares do seu país,
documentando o dia a dia do povo naquele momento histórico. Impressionado com a
obra de Caravaggio, estudou profundamente a aplicação da luz. “[...] mas, em
Velázquez a luz tem uma função diferente: ela estabelece um clima mais intimista para
as cenas retratadas” (SANTOS, 2000, p. 111). Além do realismo e do exímio domínio
técnico, o que caracteriza a obra de Velázquez é a dignidade com a qual ele retratava
seus modelos: quer pintasse o rei, quer pintasse o bobo da corte. A rígida tradição
formal dos retratos da nobreza foi humanizada pela pintura do artista, abordando os
personagens em poses mais naturais, sem acessórios exagerados. “Apesar de ser
um virtuoso na técnica, Velázquez preferia a moderação à ostentação, o realismo ao
idealismo” (STRICKLAND, 2002, p. 60).

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Figura 28: A lição de anatomia do Doutor Tulp (1632).

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

A técnica de Rembrandt evoluiu dos detalhes minuciosos para figuras em


maiores dimensões, pintadas com grandes borrões de tinta. O efeito é uma superfície
irregular, que cria um brilho ao refletir e difundir a luz, ao passo que as zonas escuras
recebem uma fina camada vidrada, que realça a absorção da luz (STRICKLAND,
2002).

57
8. ARTE BARROCA NO BRASIL

Os colonizadores portugueses — leigos ou religiosos — foram os responsáveis


por trazer o Barroco para o Brasil. Seu desenvolvimento pleno ocorre cem anos após
o surgimento do Barroco na Europa. No brasil, o período de incidência do estilo se dá
no século XVIII, estendendo-se até as primeiras décadas do século XIX. O estilo se
manifestou no Brasil como um híbrido de diversas tendências barrocas europeias, e
as características do Barroco português dos colonizadores somam-se aos aspectos
estilísticos do Barroco francês, italiano e espanhol. A combinação dos elementos
característicos do Barroco das diversas origens foi acentuada pelas oficinas, que se
multiplicaram no decorrer do século XVII, nas quais os mestres portugueses se unem
aos filhos de europeus nascidos no Brasil e seus descendentes caboclos e mulatos,
produzindo obras que trazem a marca incomparável do Barroco brasileiro (2018). Há,
então, um amálgama de elementos populares e eruditos produzidos nessas confrarias
artesanais, cujo resultado traz à tona outros estilos associados ao Barroco nacional,
como as formas do Gótico Tardio alemão, presentes na obra de Aleijadinho (Antônio
Francisco Lisboa, 1730–1814). A partir de 1760, o Barroco atinge o auge artístico no
Brasil, com a particular variação rococó no Barroco mineiro.
Em grande parte da América do Sul, as construções barrocas foram originadas
pelos jesuítas, que adequavam os projetos a partes das edificações militares,
extremamente simples e funcionais. Os edifícios portugueses que desempenhavam
funções de defesa à beira-mar — como os fortes — deram origem às plantas baixas
das nossas construções barrocas. Em solo brasileiro, a liberdade para edificar e
propor novos traçados urbanos foi possível, pois não havia um tecido urbano pré-
existente, como a morfologia das cidades medievais da Europa (OLIVEIRA, 2003),
Uma particularidade das igrejas barrocas em todas as regiões do Brasil é a iconografia
adotada na decoração de seus interiores. Nas igrejas europeias, particularmente
portuguesas e espanholas, os elementos decorativos eram arabescos e ornatos em
linhas curvilíneas assimétricas, ao passo que, no Brasil, os temas tradicionais são
combinados com elementos da flora e da fauna, motivos indígenas, trançados e
tramas. Lemes (2012) sugere que esse fenômeno se deve à proximidade dos
indígenas ou à intenção de atrair as comunidades para os cultos. Na época colonial,
a cidade de Salvador, na Bahia, assumiu protagonismo na construção de igrejas.
Grande parte delas eram adaptações de modelos portugueses, cujas fachadas típicas

58
possuem duas torres. A Figura 11, a seguir, apresenta dois modelos análogos: a Igreja
de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos (século XVIII), no Pelourinho, em Salvador,
e o Santuário Bom Jesus do Monte (início das obras no século XVII) em Braga, em
Portugal.
No início do século XVIII, há algumas manifestações de exuberância das
fachadas no barroco brasileiro, contudo, trata-se de uma exceção. Mesmo no seu
período áureo, as igrejas barrocas nacionais — a exemplo das igrejas portuguesas —
são marcadas pelo contraste entre a simplicidade dos exteriores e a opulência
decorativa dos interiores. Esse aspecto diz respeito à virtude do recolhimento,
requisito fundamental à alma cristã, pregado pelos jesuítas. “Esses primeiros 30 anos
marcam a difusão no Brasil do estilo ‘nacional português’, sem grandes variações nas
diversas regiões” (BARROCO BRA-SILEIRO, 2018, documento on-line). Em meados
do século XVIII, inicia-se um período de estagnação na economia do Nordeste — com
exceção de Pernambuco —, coincidindo com o surgimento de um novo centro de
produção, localizado no Rio de Janeiro, que passa a ser capital da colônia (1763).
Simultaneamente, na região de Minas Gerais, a descoberta de ouro (1695) e diamante
(1730) propicia o florescimento dos maiores artistas barrocos brasileiros: Mestre
Valentim (1745–1813), no Rio de Janeiro, e Aleijadinho (1730–1814), em Ouro Preto
e adjacências, em Minas Gerais. (MACHADO, 1978) A riqueza da exploração do ouro
trouxe prosperidade para a região de Minas Gerais, onde se desenvolveu um núcleo
tardio do Barroco riquíssimo. Além do valor agregado pelo ouro, o requinte da
arquitetura ali desenvolvida será referência para o Barroco nacional, que passará a
ser conhecido como Barroco mineiro. A Igreja de São Francisco de Assis (1765–
1812), em Ouro Preto, é um exemplar incomparável da tradição do Barroco mineiro
(Figura 29). De acordo com Lemes (2012, p. 53–54): “[...] possui um traçado curvilíneo
alongado; as paredes externas ora são côncavas ora são convexas; as torres são
embutidas no corpo da igreja que lembra, segundo os guias turísticos locais, uma
caravela de cabeça para baixo, em um capricho de Aleijadinho que não esqueceu
nem mesmo dos canhões nas janelas”.

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Figura 29: (a) Fachada e (b) detalhe da porta da Igreja de São Francisco de Assis, Ouro Preto.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

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9. MANEIRISMO

O maneirismo, devido à sua constituição estética individualizante, é


representado por diversos artistas com modos distintos de pintar ou esculpir,
culminando num estilo pluralizado e pouco coerente. Suas formas exageradas e
distorcidas podem causar estranhamento, principalmente nas pessoas que buscam
os valores da arte clássica para qualificar e apreciar as obras. As características mais
marcantes do maneirismo podem ser percebidas: na distorção dos corpos; no exagero
do uso de cores fortes, às vezes berrantes; na busca pela estilização que extrapolava
os cânones clássicos; no movimento que os personagens conferem à pintura; e nas
disposições incomuns da composição, que não segue a centralização do
Renascimento (os seres representados são dispostos organicamente pelo espaço da
tela).
Tais características são fruto da ruptura com o racionalismo renascentista,
dando origem a uma arte inovadora que, mesmo representando cenas cristãs,
consegue apresentar o inesperado repleto de excentricidades. O maneirismo
mobilizou diversos pintores espalhados por toda a Europa, cada um com estilo próprio,
como demanda o movimento artístico. Entre os principais artistas do movimento, você
pode considerar: Pieter Bruegel (1525–1569), que produz pinturas repletas de
enigmas; Tintoretto (1518–1594), com a exploração de jogos de iluminação e
perspectiva incomuns; Parmigianino (1503–1540), que transmite sensações
estranhas com suas pin-turas que deformam os corpos; Jacopo Pontormo (1494–
1557), que apresenta cores incomuns até então e rompe com os padrões da
composição clássica; Hans Holbein (1497–1543), que cria incríveis pinturas com
anamorfoses, explorando modos inovadores na representação; e Giuseppe
Arcimboldo (1526–1593), que, de acordo com Farthing (2011, p. 203), “[...] levou o
estranhamento do maneirismo a um novo patamar [...]” ao criar figuras humanas a
partir da disposição de flores, legumes, frutas e verduras.
A anamorfose consiste no uso de imagens distorcidas que adquirem sentido
quando vistas de determinado ângulo. Você pode encontrar exemplos de anamorfose
na obra Os Embaixadores, de Hans Holbien. Esse é um elemento utilizado tanto na
arte maneirista quanto em produções de arte contemporânea de artistas como Shigeo
Fukuda e István Orosz

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Outro artista de destaque do maneirismo foi Domenico Theotocopoulos, conhecido
como El Greco, por ter nascido na ilha grega de Creta. Ele viveu por pouco tempo na
Itália e finalmente fixou moradia na Espanha, onde produziu muitas pinturas que
exploram as distorções dos corpos e da composição com teor sacro. A Espanha
possuía um povo cristão fervoroso, por isso o maneirismo popularizou-se rapidamente
no país, culminando no aumento das encomendas de pinturas de El Greco
(GOMBRICH, 1999). Na Figura a seguir, você pode ver uma das obras do artista.

Figura 31: A adoração dos pastores (1612–1614), El Greco. Óleo sobre tela, 319 × 180 cm. Museu
do Prado, Madrid, Espanha.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

De acordo com Farthing (2011), as formas distorcidas dos trabalhos de El


Greco fizeram com que no passado alguns críticos de arte insinuassem que o artista
apresentava sinais de insanidade. Entretanto, a maestria de El Greco, seu fervor
espiritual e o desejo de contar histórias bíblicas de forma emocionante não devem ser
reduzidos a alcunhas pejorativas (GOMBRICH, 1999). A adoração dos pastores é uma
de suas últimas obras e condensa toda a visão maneirista do artista, que buscava a
autossatisfação em suas pinturas, sem tentar agradar aos clientes. Nessa obra, há
uma composição relativamente complexa: os corpos estão dispostos em dois grupos

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num espaço restrito, o que torna a luminosidade emanada do menino Jesus um fator
de contraste e expressividade. De modo semelhante aos pintores maneiristas, os
escultures Jean de Bou-logne (1529–1608) e Benvenuto Cellini (1500–1571)
exploraram ao máximo as dinâmicas e movimentos das esculturas, apresentando
poses e composições com entrelaçamento dos corpos e muitos detalhes. Na Figura
3, você pode ver tais características presentes na escultura O rapto da Sabina, de
autoria de Giambologna, como ficou popularmente conhecido o escultor Jean de
Boulogne. Essa obra “[...] deu a Giambologna a oportunidade de descobrir uma
maneira de reunir várias imagens em uma composição única e relativamente compli-
cada. O escultor incluiu o alongamento sutil na solução para os complexos problemas
espaciais criados pelos três corpos entrelaçados [...]” (FARTHING, 2011, p. 203). Os
corpos estão unidos de tal forma que se torna necessária muita atenção para
identificar a quem pertence as mãos e os braços dispostos na escultura.

63
10. ROCOCÓ

Como os movimentos artísticos se constituem em revoluções estéticas, a arte


rococó refuta o movimento artístico anterior, o barroco, e propõe uma arte leve e
prazerosa. A arte barroca retratava cenas bíblicas com muita dramaticidade, pois seu
intuito era comover os fiéis e transmitir mensagens cristãs. Às vezes, a arte rococó é
vista como uma ampliação do barroco. Outras vezes, é encarada como um novo
movimento de contestação, afinal ocorre uma ruptura visível com relação à temática
e ao excesso de ornamentação da arquitetura barroca.
Para Ducher (2001, p. 144), a arte rococó era “[...] uma arte de superfície mais
inclinada à ondulação geral das linhas, ao jogo delicado e movimentado do relevo do
que ao excesso plástico [...]”. Ou seja, a arte rococó era um estilo decorativo voltado
às frivolidades da corte. Por isso, foi alvo de diversas críticas, advindas principalmente
dos artistas do movimento posterior, o neoclassicismo. Inclusive o próprio nome do
estilo foi cunhado de forma pejorativa:

Acredita-se que [a palavra] tenha sido cunhada por um aluno de Jacques-Louis David (1748–
1825) na década de 1790, quando a reputação do rococó estava em seu momento mais baixo.
A palavra é uma fusão bem-humorada de “recaille”, um estilo extravagante de enfeite com
pedras usado em fontes, e “barroco”, palavra italiana que deu origem ao estilo barroco
(FARTHING, 2011, p. 250).

A arte rococó desenvolveu-se no século XVIII, na França, expandindo-se para


a Áustria e a Alemanha em pouco tempo (READ, 1978). Sua predileção por cores
claras e alegres, na busca por uma atmosfera leve e prazerosa, conquistou espaço
na corte e deu origem a uma estética que teve destaque na pintura, na escultura e na
arquitetura. Os principais pintores do rococó foram Jean-Honoré Fragonard (1732–
1806), François Boucher (1703–1770) e Jean-Antoine Watteau (1684–1721). Tais
artistas exploravam efeitos teatrais na representação, criando imagens fantasiosas
carregadas de sensualidade em cenários fabulosos. O tema principal de tais pinturas
são os jogos amorosos e as cenas pastoris: “[...] depois das metáforas pesadas e das
histórias do barroco, esse interesse provou ser um alívio necessário para os patronos
da aristocracia da época [...]” (FARTHING, 2011, p. 251).

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Enquanto a arquitetura barroca trabalhava com fortes efeitos dramáticos entre
seus elementos, servindo-se da pintura e da escultura para criar um mundo de glória
divina, a arquitetura rococó buscava o requinte e a sofisticação. Por isso, teve mais
destaque na decoração de interiores, compondo espaços com suavidade e sem os
excessos barrocos. A arquitetura rococó só floresceu na França após a morte do rei
Luís XIV e a ascensão de Luís XV ao trono. Até então, a arquitetura barroca era
recorrente tanto nas construções religiosas quanto em palácios de reis e príncipes que
queriam exibir seu poderio e se diferenciar de seus súditos. Na arquitetura rococó, era
recorrente o uso de cores aporcelanadas, os brancos e o ouro, preferencialmente tons
claros que davam luz a fantasias da ornamentação com arabescos, pássaros, cenas
campestres, conchas, etc., pintados ou entalhados. Na parte exterior dos edifícios do
estilo rococó, é frequente uma arquitetura mais sóbria do que a barroca, que
exagerava na ornamentação exterior, replicada no interior (READ, 1978). São
utilizadas menos colunas e elementos decorativos, pois o foco principal são os
interiores, que buscam um espaço equilibrado e sem os excessos barrocos.
Como a arte rococó teve mais destaque no campo ornamental, houve ampla
produção de tapeçarias, porcelanas, pinturas e esculturas delicadas e agradáveis. Os
móveis desse período recebem atenção especial: seus pés cabriolet apresentam
sinuosidade em formato de S; em algumas áreas, ocorre o uso de ornamentações
com conchas, folhagens espiraladas e flores esculpidas; como acabamento, os
móveis são laqueados com verniz que realça o veio da madeira. A arte rococó
produziu uma visão de elegância fantasiosa e compôs um universo à parte para os
nobres e aristocratas. As suas funções principais eram a distração e a beleza, por isso
causou tanta revolta em artistas do movimento posterior, neoclassicismo. Entretanto,
mesmo repleta de frivolidade, a arte rococó desvendou caminhos interessantíssimos
ao valorizar a transitoriedade da beleza e romper com a dramaticidade da arte barroca.

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Figura 32: Salão oval do príncipe, Hotel Soubise, Paris, França.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

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11. NEOCLASSICISMO

No caso da transição da arte Rococó para a arte neoclássica, pode-se dizer


que o Neoclassicismo foi ao mesmo tempo a arte da revolução e da tradição. Os
artistas Neoclássicos revolucionaram ao questionar as frivolidades da arte Rococó e
servir à divulgação das ideias da Revolução Francesa. Por outro lado, foram
tradicionais ao retomar os valores da arte clássica greco-romana e renascentista por
meio do academicismo; afinal, era necessário adquirir as técnicas e valores clássicos
nas academias de belas-artes. O Neoclassicismo não surgiu no século XVIII por
acaso. Ele foi reflexo de alterações de ordem filosófica e social. A filosofia iluminista
já possuía muitos adeptos que buscavam a dissociação entre o Estado e a Igreja,
apresentando ideias de liberdade e fraternidade, bem como a necessidade de a razão
orientar a vida das pessoas. Do mesmo modo, o absolutismo evidenciava a sua
ineficiência para governar a França, que estava cada vez mais endividada — afinal,
gastava 20% mais do que arrecadava. A dívida se justificava pelos gastos para manter
a vida extravagante dos nobres no Palácio de Versalhes, os custos de guerra e as
taxas e serviços da dívida externa (HOBSBAWM, 2003). A arte neoclássica estava
em consonância com os valores do Iluminismo, que refletiam a busca por leis
orientadas pela razão. Tais leis eram reflexos da retomada dos valores clássicos.
Pinelli (1977) afirma que a relação da arte com o seu passado é uma constante na
história. As recuperações de preceitos estéticos são utilizadas para negar o presente
ou o passado próximo e instaurar um novo modo de pensar a expressão artística.
Nesse sentido, o passado pode ser utilizado como um exemplo a ser evitado ou como
um escudo para lutar contra dada realidade. No caso do Neoclassicismo, os dois
viéses estão presentes, pois se questiona o passado da aristocracia e se recupera o
passado clássico como um modelo para a ação.
De acordo com Farthing (2011), foram os pensadores da época que
impulsionaram o Neoclassicismo. Eles fizeram isso por meio das ideias iluministas,
que confrontavam a desmoralização do estilo Rococó e a aristocracia decadente. Por
isso, almejavam uma arte racional, intelectualizada e moralista, voltando--se para o
mundo clássico, que refletia uma estética transmutada numa ética de valores
universais. A ampla divulgação e a disseminação da arte neoclássica pela Europa
foram impulsionadas pelos viajantes ingleses que participavam do Grand Tour. Como
as universidades estavam em declínio, era comum as classes abastadas contratarem

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um tutor para educar seus filhos. Mestre e aprendiz faziam uma rota educativa por
cidades importantes da Europa. Nessas viagens, além de adquirir conhecimentos e
fazer aulas de línguas, dança, etc., os nobres compravam pinturas para enriquecer a
coleção de suas famílias
Esse novo olhar sobre as culturas clássicas, incitado tanto pelas ideias
iluministas quanto pelo Grand Tour, rompe com as fantasias amorosas e as
ornamentações repletas de rocaille. As pinturas divertidas de amantes envoltos em
erotismo com cores claras e elegantes perdem espaço para pinturas com narrativas
literárias e históricas. Nesse momento, a própria aristocracia investe em obras
neoclássicas, devido à ampla divulgação desse tipo de arte pelos nobres que
realizavam o Grand Tour.
Do mesmo modo que a arte neoclássica rompe com a arte Rococó, ela também
questiona o exagero no uso dos ornamentos e a dramaticidade religiosa da arte
barroca. Por isso, pode-se dizer que a arte neoclássica, mesmo estando presente em
países de regime monárquico, é a arte da burguesia, que nega tanto o totalitarismo
da aristocracia quanto o catolicismo. Na França revolucionária, os estilos Barroco e
Rococó são varridos, pois os revolucionários almejavam a liberdade de uma Atenas
ressurgida (GOMBRICH, 1999). A arte neoclássica foi utilizada para a divulgação dos
valores da burguesia, que culminou na Revolução Francesa. O artista Jacques-Louis
David, um dos principais representantes do Neoclassicismo, produziu pinturas que
exaltavam os valores da vida moral da Antiguidade como um ensaio à Revolução. A
Figura 1, O Juramento dos Horácios, é considerada por Farthing (2011) a primeira
obra-prima neoclássica. Ela retrata a lealdade dos irmãos Horácio à nação. A imagem
foi estruturada com cores fortes e um desenho rígido, no qual as sombras são
minuciosamente estruturadas para realçar o heroísmo da cena. Todos os elementos
retomam o passado romano. As roupas dos irmãos Horácio, em vermelho vivo,
realçam a sua paixão e a sua entrega ao Estado. Certamente, imagens como O
Juramento dos Horácios foram fundamentais para divulgar os ideais revolucionários e
contribuir com a criação de um espírito de revolta e sacrifício. Entretanto, após a
ascensão de Napoleão Bonaparte, os temas das pinturas neoclássicas tomaram
novos rumos e “[...] os artistas começaram a dar mais destaque ao esplendor do
Império Romano, e não ao caráter moral da República [...]” (FARTHING, 2011, p. 261).

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Figura 33: O Juramento dos Horácios (1784), Jacques-Louis David. Óleo sobre tela, 330 × 425 cm.
Museu do Louvre, Paris, França.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

11.1. A Arte Neoclássica

O próprio termo “Neoclassicismo” já presume uma relação com a Antiguidade


Clássica e a recuperação do ideário greco-romano e renascentista. Enquanto as
ideias clássicas de beleza, perfeição e mimese davam materialidade formal às obras,
os temas focavam tanto no contexto dos séculos XVIII e XIX quanto nos mitos e fatos
históricos da Antiguidade. Portanto, a sua temática refletia o contexto sociocultural de
ruptura com o absolutismo na representação de narrativas em prol da Revolução
Francesa. A idealização na arte seguia regras rígidas, na tentativa de imitar os
clássicos. Afinal, uma “[...] obra de arte só seria perfeitamente bela na medida em que
imitasse não as formas da natureza, mas as que os artistas clássicos gregos e os
renascentistas italianos já haviam criado [...]” (PROENÇA, 1991, p. 122). Por isso, era
importante que os artistas realizassem estudos contínuos dos modelos clássicos para
internalizá-los, elaborando as suas criações dentro de tais moldes. De acordo com
Gombrich (1999), a representação de acontecimentos políticos da atualidade da
época foi inovadora na arte e causou revoltas na aristocracia. Até então, era comum
os artistas se ocuparem de temas similares, tais como: os episódios bíblicos e as
histórias dos santos, a mitologia grega e as histórias dos heróis romanos. Mas tanto
os acontecimentos da época quanto os temas mitológicos presentes na arte
neoclássica tinham a função social de subverter o sistema aristocrático. Nesse

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sentido, a retomada dos valores clássicos justificava e mascarava a luta pelos valores
arbitrários da burguesia, defendidos como universais. Afinal, a luta pela beleza
absoluta e pela verdade seria uma luta digna (PINELLI, 1977). Para os Neoclássicos,
a beleza era a junção entre as ideias e a matéria, ou seja, a sujeição da matéria às
normas, buscando as verdades permanentes e racionais. A beleza era considerada
divina, cabendo ao artista possibilitar à humanidade a contemplação da perfeição. A
arte teria papel superior por revelar a verdade universal burguesa e servir como fonte
de mobilização social. De acordo com Pinelli (1977), a imitação da natureza era o foco
principal dos artistas, mas não se pode confundir imitação com cópia, pois são
conceitos distintos. A imitação representa a essência do objeto, seguindo as leis do
belo que estavam ocultas pela matéria. Por isso, o artista deveria agir filosoficamente
para não descer ao nível do artesanato, que apresentava cópias da natureza sem
preocupação com o belo. Afinal, a distinção entre as artes liberais e o artesanato
instaurada pelos teóricos renascentistas volta a ser central na arte. A imitação da
natureza se estendia à imitação da história, buscando re-presentar uma verdade
universal determinada a partir da seleção crítica. Um episódio famoso foi o do artista
John Singleton Copley, que produziu uma pintura, em 1785, sobre a recusa do
presidente da Câmara dos Comuns em entregar cinco membros ao rei Carlos I, que
os acusava de traição à Coroa. O artista fez uma exaustiva pesquisa sobre os
membros da Câmara dos Comuns para ser o mais fiel possível ao acontecimento.
Inclusive, utilizou retratos dos membros como base para a sua pintura (GOMBRICH,
1999). A pintura de Copley anunciava a ruptura com o poder absolutista, explorada
também por outros artistas Neoclássicos. A preferência por temas do heroísmo
clássico ia ao encontro do espírito revolucionário, pois as “[...] pessoas achavam estar
vivendo tempos heroicos e [acreditavam] que os acontecimentos de seus próprios dias
eram tão dignos de atenção do pintor quanto os episódios da história grega e romana
[...]” (GOMBRICH, 1999, p. 382).
Um ótimo exemplo é a obra A morte de Marat , de Jacques--Louis David. Nela,
o artista representa o assassinato de Jean-Paul Marat, um importante participante da
Revolução que promoveu a divulgação de listas de nomes de pessoas que deveriam
ser guilhotinadas por serem traidoras do novo sistema. De acordo com Farthing
(2011), Marat foi retratado como um santo martirizado, o que realçou o seu heroísmo
e a sua morte trágica. Marat foi assassinado pela jovem Charlotte Corday, que o havia
visitado com o pretexto de transmitir informações sobre traidores da Revolução.

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Figura 34: A morte de Marat (1793), Jaques-Louis David. Óleo sobre tela, 1,28 × 1,62m. Museu dos
Mestres Anti-gos, Bruxelas, Bélgica.

Fonte: Adaptada de Cris Foto/Shutterstock.com.

A pintura apresenta uma iluminação que confere nitidez à cena, principalmente


ao corpo sem vida de Marat, que contrasta com um fundo escuro. O artista se
preocupou em dar aos pequenos detalhes extremo realismo. Por exemplo: a faca
utilizada pela assassina encontra-se ensanguentada no chão; a pena, ainda presa
entre os dedos de Marat, contrasta com as áreas de sombra dos tecidos que envolvem
a banheira; e o papel que era examinado apresenta manchas de sangue. Janson
(1989) afirma que a composição foi inspirada num relevo clássico de Policleto, que
provavelmente representava a cena amorosa entre Psique e seu filho Cupido. A obra
de Jaques-Louis David é um ótimo exemplo para você compreender as características
estéticas do Neoclassicismo, pois é dado destaque ao desenho linear em relação à
pintura. O desenho determina as formas e as cores ficam circunscritas a elas, sempre
buscando a sobriedade e a pureza, sem os exageros da coloração barroca ou Rococó
(PINELLI, 1977).

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A arte neoclássica se expandiu para diversos países. No Brasil, ela chegou com a
Missão Artística Francesa em 1816, a pedido do príncipe regente Dom João VI, que
pretendia criar a Academia e Escola Real de Belas-Artes. Os artistas que vieram na
Missão influenciaram a arte e a arquitetura nacionais. O arquiteto Grandjean Montigny
criou o projeto para a Academia a partir da estética neoclássica, dando origem à
disseminação do estilo, que mais tarde seria empregado em diversas construções.
Entre elas, estão: o hospício D. Pedro II, transformado na Santa Casa de Misericórdia,
e o Palácio do Catete, que hoje é o Museu da República.

11.2. É Cole des Beaux-Arts

A academia, sob o domínio aristocrático, visava a uma arte de caráter uniforme


e realizada com perfeição, que refletisse os valores absolutistas e possuísse validade
universal, mesmo que tal universalidade fosse restrita aos valores da elite. Assim, a
arte se afasta do povo e rompe definitivamente com os valores da Idade Média que o
Renascimento havia questionado. Nesse momento, a representação tem uma
preocupação maior com a forma do que com o conteúdo, pois as leis e regras da arte
acadêmica buscam manter os artistas subservientes à coroa (HAUSER, 1972). Em
1648, foi fundada a Academia Real de Pintura e Escultura (Acadèmie Royale de
Peinture et de Sculpture), logo transformada numa instituição do Estado que buscava
representar o poder do rei. A academia assume o lugar das antigas guildas de
artesãos, ampliando a distinção entre as artes liberais e outros fazeres técnico-
artesanais. Assim, ela se torna “[...] o caminho mais seguro para os artistas
profissionais pela via do aprendizado, de concursos e exposições [...]” (FARTHING,
2011, p. 276). Vinte e sete anos após a Revolução Francesa, ocorre a transformação
da Academia Real de Pintura e Escultura em Academia de Belas-Artes (École des
Beaux-Arts). A nova instituição realça ainda mais a distinção entre as artes liberais e
o trabalho artesanal ao fornecer uma educação voltada para o estudo dos métodos
da arte. A École era amplamente seletiva; quando o aluno era dmitido, passava por
um processo de treinamento dentro do ideário clássico. Era necessário que copiasse
os modelos greco-romanos, por isso precisava, primeiramente, dominar o desenho
para depois aprender a pintar. As temáticas também eram restritivas e abordavam
principalmente as pinturas históricas, com temas da mitologia clássica ou relacionados

72
à Bíblia, além de retratos, naturezas-mortas e paisagens. Todas as pinturas deveriam
apresentar a perfeição a partir das leis do desenho e da pintura. Como você pode
imaginar, “esse trabalho de imitação só era possível através de um cuida-doso
aprendizado das técnicas e convenções da arte clássica”. Vem daí “[...] o
convencionalismo e o tecnicismo [que] reinaram nas academias de belas-artes, até
serem questionados pela arte moderna [...]” (PROENÇA, 1991, p. 122). Além de
delimitar os temas e as técnicas, a Academia restringia os estilos em duas grandes
áreas. De um lado, estava a arte neoclássica, que buscava um desenho limpo e linear,
sujeitando a cor à delimitação do desenho. Do outro, a arte romântica, que explorava
a expressividade da cor e composições com mais movimentos e dinamismo. A
Academia buscava controle total sobre a produção artística e inclusive fazia a
mediação entre os artistas de destaque e os investidores da arte por meio de
concursos de pintura. O Prix de Rome era o mais famoso, e os seus ganhadores eram
agraciados pelo reconhecimento da crítica e por estudos gratuitos por tempo
determinado na Academia. Anualmente, também era realizado o Salão de Paris,
expondo pinturas de diversos artistas da Academia e possibilitando o seu
reconhecimento (FARTHING, 2011). A seção de arquitetura da École des Beaux-Arts
não defendia um estilo específico. Contudo, os estudantes passavam longos períodos
em Roma para fazer desenhos das construções clássicas que serviriam de inspiração
para a criação de seus próprios projetos (FAZIO; MOFFET; WODEHOUSE, 2011).
Assim como a École des Beaux-Arts detinha o controle sobre a produção de pinturas
e esculturas, ela também detinha o controle sobre a arquitetura. Os alunos passavam
por uma rigorosa avaliação para serem admitidos na Academia e depois participavam,
a cada dois meses, de concursos que determinavam a sua progressão nos estudos.
Os estudantes de arquitetura também recebiam a premiação do Prix de Rome, que
conferia estudos por longo período em Roma. A arte e a arquitetura neoclássicas
também ficaram conhecidas como “estilo Luís XVI”. Tal estilo aplica elementos tendo
por referência o espírito grego e romano. Nesse sentido, “Da antiguidade, conserva
sobretudo as ricas guarnições dos frontões das portas assentados em consolos, os
dentículos, o friso de guirlandas contínuo da cornija e os relevos mitológicos nos
painéis [...]” (DUCHER, 2001, p. 158). A École des Beaux-Arts manteve o seu império
sobre a produção artística por vários séculos. Ela só foi questionada pelos artistas
realistas e impressionistas, que criaram exposições paralelas, explorando um olhar
modernista tanto na temática quanto nas técnicas artísticas. Assim, com o surgimento

73
dos movimentos artísticos de vanguarda, a exatidão formal e a rigorosidade no
tratamento da temática são abandonados em busca de novos caminhos para a arte.

74
12. IMPRESSIONISMO

O Impressionismo foi um movimento artístico revolucionário que apresentou um


novo modo de pintura, pois sua preocupação central passou a ser os próprios
aspectos da arte, ou seja, o registro das alterações que a luz causa sobre os objetos.
Os artistas impressionistas não constituíram uma escola coesa, mas tinham um fator
comum — a ruptura com a arte acadêmica, que ditava o que pintar e como pintar —,
por isso criaram uma arte em consonância com um olhar moderno. Os artistas
inovaram tanto na técnica quanto na temática, “[...] eles saiam de seus estúdios para
observar o mundo ao redor e pintavam o que viam: paisagens de Paris, bailarinas
amarrando a sapatilha, lavadeiras trabalhando – cenas que, na época, eram
consideradas radicais e até impróprias” (FARTHING, 2011, p. 316). A arte acadêmica
ainda centrava seus registros nos temas históricos, religiosos ou mitológicos com uma
pintura impecável, na qual as pinceladas deveriam ser misturadas até se tornarem
invisíveis. Por romperem com as regras da arte acadêmica, a instituição responsável
por definir o gosto artístico da época, eles não foram bem vistos pela comunidade
artística. Inclusive, o nome Impressionismo foi cunhado a partir de uma crítica severa
de Louis Leroy, na qual, ao escrever sobre a obra Impressão, nascer do sol de Claude
Monet, afirma: “Impressão... qualquer papel de parede é mais bem-acabada do que
esta marina!” (FARTHING, 2011, p. 316).

75
Figura 35: Impressão, nascer do sol (1872), óleo sobre tela, 48 cm × 63 cm, Claude Monet, Museu
Marmottan, Paris, França.

Fonte: (FARTHING, 2011).

De fato, as pinturas dos impressionistas não apresentavam um acabamento a


contento das regras acadêmicas, visto que muitos artistas faziam suas pinturas ao ar
livre, de modo a capturar a fugacidade da iluminação. Harbert Read (1978, p. 122–
123) afirma que o impressionismo representa a “[...] expressão perfeita do lirismo ou
complexo da natureza, a beleza que vem e vai com as flutuações da luz”. A
representação da luz torna-se central aos impressionistas, o que cria um novo modo
de pintar: rápido e com novas combinações cromáticas.
Herbert Read (1978) afirma que os artistas impressionistas representavam a
natureza como se a vissem por meio de um prisma, por isso romperam com a tradição
de representar as sombras, os relevos e a profundidade por meio da variação na
quantidade de tinta preta, que havia sido iniciada por Leonardo da Vinci. Em vez de
aplicar camadas de preto para obter áreas escuras, os artistas utilizavam a teoria das
cores complementares, ou seja, as cores que se encontram no lado oposto do círculo
cromático (Figura 2). Por exemplo, se um artista quisesse fazer a sombra presente

76
em um objeto amarelo, ele deveria utilizar pequenas pinceladas violetas ao lado de
pinceladas amarelas.
O círculo cromático é composto por três grupos de cores: cores primárias,
secundárias e terceárias. As cores primárias são amarelo, vermelho e azul, já as cores
secundárias são resultantes da mistura entre duas cores primárias — a mistura do
vermelho com o azul resulta no violeta, a mistura do amarelo com o azul resulta no
verde e a mistura do vermelho com o amarelo resulta no laranja —; assim, as três
cores secundárias são o violeta, o verde e o laranja. Por fim, as cores terciárias são
resultantes da mistura entre uma cor primária e uma cor secundária que se encontra
ao lado no círculo cromático, por exemplo, a mistura entre o amarelo e o verde resulta
no verde-amarelado. As novas combinações de cores, que buscavam constituir uma
pintura ótica, somadas a pinceladas aparentes e com excesso de tinta constituíram a
estética impressionista, a qual revolucionou a arte, dando origem aos movi-mentos
modernistas posteriores. Entretanto, os artistas impressionistas não eram bem vistos
pelos críticos e artistas acadêmicos, ainda centralizados no gosto neoclássico ou
romântico, por isso fizeram sua primeira exposição, em 1874, no estúdio do fotógrafo
Nadar. A relação do Impressionismo com a fotografia não se resume ao uso do estúdio
para a primeira exposição, pois os artistas buscavam a mesma esponta-neidade do
registro fotográfico em suas pinturas. Com a invenção das câmeras fotográficas
portáteis, tornou-se comum a produção de fotografias de figuras humanas em
movimento, resultando em borrões. “A máquina fotográfica ajudou a descobrir o
encanto da cena fortuita e do ângulo inesperado. Além disso, o desenvolvimento da
fotografia iria impulsionar ainda mais os artistas em seu caminho de exploração e
experimento” (GOMBRICHT, 1999, p. 416). Antes da fotografia portátil, o artista era
requisitado para imortalizar as pessoas mais ricas em suas pinturas, dando à arte uma
finalidade utilitária. Entretanto, os artistas “[...] até então incumbidos de retratar
pessoas e paisagens são substituídos por fotógrafos, tornando-se assim mais livres
para realizar novas pesquisas e experimentos com as telas e os pincéis” (CANTON,
2002, p. 18). Isso justifica os novos caminhos para a arte encontrados pelos artistas
modernistas do Impressionismo e de outros movimentos artísticos do fim do século
XIX e da primeira metade do século XX. Além da influência da fotografia, os artistas
impressionistas foram impactados pelas gravuras japonesas. Os artistas do novo
movimento as admiravam, pois eram imagens que rompiam com os padrões da arte
clássica ao desprezarem a centralização da composição ou produzirem

77
representações recortadas pela mar-gem. De acordo com Gombricht (1999), as
gravuras japonesas se disseminaram pela Europa a partir das trocas comerciais da
época. As estampas japonesas eram encontradas nas casas de chá, normalmente
utilizadas para envolver os produtos.

78
13. EXPRESSIONISMO

O Expressionismo alemão foi composto por alguns artistas independentes e


outros que se reuniram em dois grupos: A Ponte e O Cavaleiro Azul. Isso acarretou
um movimento artístico heterogêneo que comporta diferentes visões sobre a
representação da subjetividade dos artistas e seus estados de espírito, característica
recorrente desse movimento artístico. Mostrar o lado desagradável da vida tornou-se
a premissa da arte que buscava a ruptura com qualquer padrão de beleza, pois
acreditava-se que a beleza havia nascido a partir da falta de sinceridade dos artistas.
Para representar uma visão pessoal sobre o mundo e expressar o estado de espírito,
o Expressionismo alemão “[...] incluía certos elementos essenciais: distorção linear,
reavaliação do conceito de beleza artística, simplificação radical de detalhes e cores
intensas” (FARTHING, 2011, p. 378). As cores não deveriam convergir com o natural,
e as formas eram alongadas e exageradas para criar cenas grotescas que refletissem
o pessimismo e a maldade humana, uma vez que o “[...] desprendimento de energia
psíquica é capaz de conduzir a gestos exagerados, a distorções de aparência natural,
atingindo o grotesco” (READ, 1978, p. 139).
Tais possibilidades formais eram exploradas de maneiras distintas por cada
artista ou grupo de artistas, pois o movimento não era um todo coeso. Os artistas que
não se integraram a grupos tiveram uma produção diversificada, ao passo que os
artistas do grupo A Ponte buscavam criar uma arte específica para o grupo,
respeitando uma estética em comum. De acordo com Farthing (2011), essa busca por
um estilo comum convergiu para a separação dos integrantes do grupo, que passaram
a buscar uma arte mais individual quando se mudaram para Berlim. As primeiras obras
do grupo A Ponte apresentavam muita proximidade com os trabalhos dos artistas pós-
impressionistas, mas, aos poucos, seus integrantes desenvolveram uma arte peculiar.
A obra Banhistas (Figura 2), de Ernst Ludwig Kirchner, ilustra perfeitamente as
características exploradas pelo grupo na busca por uma arte dramática. Observe
como a representação distorce os corpos ao criar figuras esguias e simplificadas a
partir de pinceladas rápidas e com excessos de tinta. A imagem foi composta por cores
vivas, resultante da oposição entre cores complementares, que destacam a figuração
por meio de um contorno. As pinceladas curtas dão forma a uma perspectiva limitada,
visto que as cores, que poderiam ampliar a profundidade da tela, apresentam a
mesma tonalidade vibrante das outras áreas da imagem. Os rostos das mulheres e

79
do homem apresentam acentuada distorção, aproximando-se da representação de
máscaras utilizadas por povos africanos. Isso denota a admiração que Kirchner tinha
pelo primitivismo e pela simplicidade.

Figura 36: Banhistas (1910), de Ernst Ludwig Kirchner.

Fonte: (FARTHING, 2011).

O grupo O Cavaleiro Azul foi composto por artistas que exploravam sua própria
maneira de representar os estados de espírito. Enquanto Kandinsky explorava uma
arte pura que se assemelhasse à música, Franz Marc se atinha às forças vitais da
vida animal e “[...] inspirava-se na beleza natural, no jogo da luz sobre flores e folhas
que desejavam concentrar e tornar claras nas telas que pintavam” (READ, 1978, p.
142). Foi Wassily Kandinsky (1866–1944) que os artistas do grupo Os Cavaleiros
Azuis seguiram. Ele era um artista intelectualizado que almejava uma arte que
expressasse tão bem quanto possível os efeitos psicológicos da disposição dos
elementos formais na obra de arte.
A arte abstrata surgida a partir de Kandinsky não se limitou ao Expressionismo
alemão e, durante as próximas décadas, deu origem a outros movimentos artísticos.
Entretanto, o interesse de Kandinsky era a criação de pinturas que explorassem os
elementos da visualidade, assim como a música explora as sonoridades. Suas
pinturas não tinham interesse na imitação da natureza, pois estavam voltadas à
captura da expressão de sentimentos por meio da disposição dos elementos formais

80
da visualidade, ou seja, como as cores, as linhas, as formas e texturas poderiam
atingir o espírito humano. Outra característica dos expressionistas foi a retomada da
produção de xilogravuras, pois a técnica refletia a simplicidade que almejavam na arte.
A técnica de xilogravura foi muito utilizada durante a Idade Média e pelo artista
Albrecht Dürer, pertencente ao Renascimento germânico. O uso de poucas cores
resultou em um trabalho de extrema expressividade nas mãos dos artistas alemães.
Por explorarem a expressividade por meio das pinturas, o que culminava na distorção
e na representação do lado sombrio da humanidade, o governo nazista perseguiu os
artistas que pertenciam ao movimento e fez exposições de suas obras, classificando-
as como arte degenerada. Nesse período, os artistas fugiram para outros países e
levaram consigo as influências desse tipo de arte para várias regiões do mundo.

81
14. ARTE MODERNA

A Arte Moderna surgiu na segunda metade do século XIX e teve destaque na


primeira metade do século XX, por meio das vanguardas artísticas. Mas, afinal, o que
é uma vanguarda? O termo avante-guarde, do francês, tem origem na guerra, sendo
utilizado para designar os soltados que estão no front de batalha. De acordo com
Canton (2009), a sua transposição para o campo artístico pressupõe duas premissas
básicas: a ruptura com os padrões artísticos acadêmicos e sociais e a inovação
constante, que deu origem a diversos movimentos artísticos tão radicais quanto a vida
naquela época. A invenção da fotografia também teve papel de destaque para o
surgimento da Arte Moderna, pois o artista não precisava mais fazer retratos, já que a
fotografia servia melhor a esse objetivo, visto que era mais rápida e seu custo era
menor. Alguns artistas viam, na fotografia, uma inimiga, outros se tornaram fotógrafos
e houve aqueles que buscaram novos caminhos para a pintura, ficando conhecidos
como impressionistas. Os artistas impressionistas romperam com os padrões de
representação da arte acadêmica e passaram a pintar os efeitos luminosos. O tema
assume função secundária, e surge a ideia da arte pela arte, em que o verdadeiro
objetivo da pintura seria explorar sua própria constituição, ou seja, cor sobre uma
superfície plana. Enquanto a arte acadêmica seguia o princípio literário, a arte
moderna não precisa representar uma narrativa e o tema da pintura pode ser colocado
em segundo plano, ao dar-se preferência à exploração dos elementos formais da obra.
No Impressionismo, a pintura não transmitia uma história ou mito e seu tema pouco
interessava aos artistas que buscavam capturar as dinâmicas da iluminação. A cor
representava a luz, e não o objeto, por isso usavam-na a partir de sua combinação
ótica. Para pintar as sombras, os artistas não utilizavam a cor preta, como faziam os
acadêmicos, mas sim empregavam a cor complementar para dar o efeito de contraste
desejado. De acordo com Wolfe (2009, p. 57): artistas que se seguiram ao
Impressionismo foram chamados de pós--impressionistas, uma vez que não se
restringiam a simples captura dos fenômenos luminosos e ampliaram a ruptura, com
a ideia da pintura como janela para observar uma história. Enquanto Paul Cézanne
buscava capturar as formas básicas dos objetos, Vincent van Gogh produzia uma
pintura para refletir a sua alma e Paul Gauguin cobria grandes áreas da tela com cores
vibrantes. Esses artistas lançaram as bases estéticas para diversos movimentos
artísticos posteriores, incluindo os movimentos de vanguarda (CANTON, 2009).

82
As vanguardas artísticas costumam ser estudadas a partir de alguns
movimentos principais, são eles: Futurismo; Expressionismo; Cubismo, Dadaísmo; e
Surrealismo. Esses movimentos tinham em comum a organização de grupos de
artistas que publicavam manifestos para divulgar os seus projetos artísticos. São
esses manifestos que validavam cada movimento, ao propor princípios estéticos,
mantendo os artistas coerentes tanto em estética quanto em temática. O caráter
inovador da arte de vanguarda fez o cenário artístico viver uma constante
transformação, uma vez que não existiam mais preceitos estéticos universalmente
válidos. O público estava aberto às inovações e almejava saber o que existia de mais
novo no cenário artístico. Os críticos e negociantes organizavam exposições às
pressas para conseguir dar conta da atualidade das produções.
No Brasil, as vanguardas se manifestam a partir de artistas que, ao viajarem
para a Europa, traziam a nova visão sobre o cenário artístico vanguardista e buscavam
modernizar a arte brasileira, ainda guiada pelos princípios aca-dêmicos. Uma das
artistas que introduziu a Arte Moderna no Brasil foi Anita Malfatti, que, em 1917, expôs
seus quadros do período em que esteve estudando na Alemanha e em Nova Iorque.
Dentre as pinturas estavam A boba, A estudante russa e O homem amarelo, que
exibiam um novo modo de utilizar a cor (CANTON, 2009). Na obra A boba (Figura 1),
pode-se perceber como a pintura de Malfatti havia superado os padrões acadêmicos
ao apresentar cores fortes e linhas tortas. Há referências das vanguardas europeias,
principalmente do movimento Expressionista, que explorava a expressividade por
meio da cor. O fundo é marcado com pinceladas que criam um cenário incômodo,
contrastando com a figura central, representada com o rosto torto e um olhar disperso.

83
Figura 37: A boba (1915-1916), Anita Malfatti, óleo sobre tela, 61 cm/50,6 cm. Mac-Usp, São Paulo,
Brasil.

Fonte: (FARTHING, 2011).

Os movimentos artísticos conhecidos como Fauvismo e Cubismo poucas


coisas têm em comum, além da ruptura com a representação convencional da arte
acadêmica e a busca por uma representação moderna. Enquanto os fauvistas
exploravam as combinações entre as cores puras com pinceladas exageradas, os
cubistas tinham interesse principal na forma dos objetos e sua representação
simplificada, a partir de formas geométricas. O Fauvismo foi o movimento de
vanguarda mais curto, tendo se desenvolvido entre 1905 e 1907. Sua preocupação
principal era o uso da cor para explorar a expressão do instinto artístico. O artista
procurava criar sua arte com a mesma pureza de uma criança que não segue regras,
de modo que distorcia a representação e usava cores não condizentes com a
realidade.
Os principais artistas fauvistas foram Maurice de Vlaminck (1876–1958) e
André Derain (1880–1954), liderados por Henri Matisse (1869–1954). Todos
buscavam conferir à cor uma nova possibilidade, ao fugir da representação descritiva
da realidade. A cor era mais importante do que a representação, principalmente a cor

84
vibrante. Inicialmente, os artistas realizavam misturas de cores, mas, aos poucos,
passam a explorar pinceladas espontâneas, com cores puras. O grupo fauvista,
mesmo tendo durado pouco, apresentou uma nova maneira de lidar com a pintura. “O
que esses artistas têm em comum é o desejo de dispensar tudo o que é ‘extra’ na
representação de uma imagem na tela, dando chance para a cor, com seus próprios
contrastes, de cobrir superfícies e dar forma à representação” (CANTON, 2002, p. 41).
Na obra Ponte sobre o rio (Figura 38), de André Derain, pode-se observar como
se dava o uso da cor e da deformação pelos fauvistas. As cores não criam uma
representação naturalista, pois o artista utilizou tons de azuis, verdes, laranjas e
amarelos para representar uma árvore que aparenta estar em chamas. O interesse
também não é captar os efeitos luminosos, como faziam os impressionistas, pois a
pintura faz o uso das cores sem se ater à sua combinação ótica.

Figura 38: Ponte sobre rio (1906), André Derain, óleo sobre tela, 82,5 cm/101,5 cm, MoMA, Nova
Iorque, Estados Unidos.

Fonte: (FARTHING, 2011).

O Cubismo se desenvolveu a partir das pesquisas dos artistas Pablo Picasso


(1881–1973) e Georges Braque (1882–1963), que se interessavam pelas pinturas do
pós-impressionista Paul Cézanne e sua representação da natureza a partir de formas
geométricas básicas. Entretanto, os cubistas exploraram não apenas a simplificação
do desenho, uma vez que queriam explorar a representação integral do objeto, ou
seja, queriam que a pintura apresentasse o objeto sendo visto a partir de diversos
ângulos em uma mesma pintura. A obra Les Demoiselles d’Avignon, de Pablo
Picasso, é considerada a primeira pintura cubista (Figura 3). Nela, pode-se perceber
a distorção das figuras a partir do uso de formas geométricas, reduzindo a sensação

85
de profundidade da tela. O tema da pintura foi um grupo de prostitutas de Barcelona,
mas a deformação de seus rostos sugere a influência das máscaras africanas sobre
os trabalhos do artista. A pouca variação de cores e o uso da fragmentação nas formas
foram técnicas inovadores para a época, colocando Picasso como um dos principais
artistas das vanguardas europeias (FARTHING, 2011).

Figura 39: Les Demoiselles d’Avignon (1907), Pablo Picasso, óleo sobre tela, 2,44 m/2,34 m, Museu
de Arte Moderna, Nova Iorque.

Fonte: (FARTHING, 2011).

O Cubismo teve como premissa básica a ruptura com a perspectiva da arte


acadêmica, que representava os efeitos de profundidade por meio do emprego de
complexas leis da geometria. No Cubismo, há a fragmentação para representar os
diversos ângulos de visão sobre o objeto, de maneira sobreposta e com cores nos
tons terrosos. Essa preocupação inicial dos cubistas ficou conhecida como Cubismo
Analítico (CANTON, 2002). Em pouco tempo, os cubistas levaram o programa da
fragmentação e da representação simultânea ao extremo, chegando muito próximo
da abstração total da figura. Todavia, o cubismo é, por natureza, um movimento
figurativo que buscava uma nova maneira de representar os objetos, rompendo com
a perspectiva tradicional. Por isso, houve a limitação temática dos artistas do Cubismo
Analítico:

86
Ele só pode ser usado com formas mais ou menos familiares. Quem olha para o
quadro deve saber qual é o aspecto de um violino, para poder relacionar entre si
os vários fragmentos no quadro. É por isso que os pintores cubistas escolhem
usualmente motivos familiares – guitarras, garrafas, fruteiras ou, ocasionalmente,
uma figura humana – onde podemos facilmente encontrar o nosso caminho
através dos quadros e entender as relações entre as várias partes (GOMBRICH,
1999, p. 456).

Em 1912, o Cubismo tomou novos rumos, pois iniciava-se o Cubismo Sintético,


que teve duração até a década de 1920. Nesse período, novos artistas aderiram ao
grupo, dentre eles: Robert Delaunay (1883–1941), Francis Picabia (1879–1953), Jean
Metzinger (1883–1956) e Marcel Duchamp (1887–1968). Na fase sintética, os cubistas
fazem novos usos da cor, que deixa de ser esmaecida, sendo utilizada de maneira
mais decorativa. “Essa visão mais decorativa da arte tornou o cubismo sintético mais
popular do que as outras obras cubistas junto ao público” (FARTHING, 2011, p. 390).
O Cubismo Sintético não exagerava na fragmentação, como acontecia no Cubismo
Analítico. Houve o uso de colagens de jornais, madeira, tecido, e tal interesse levou
alguns artistas a pintarem quadros que pareciam somente colagens, sem uso de
cores. De modo que um quadro era “Construído a partir de elementos de colagem e
da habilidade dos artistas da época de transformar os conteúdos de uma lata de lixo
em imagens bonitas e revolucionárias” (FAR-THING, 2011, p. 390). As colagens
faziam os materiais utilizados perderem seu significado utilitário, ao assumir um valor
construtivo na obra. O artista utilizava a colagem, assim como utilizava a linha, a cor
e as texturas. As obras cubistas apresentavam uma nova maneira de lidar com a
pintura e abriram caminho para outros movimentos artísticos, tais como: o Futurismo,
que se valerá da fragmentação para a representação da velocidade e das dinâmicas
de movimento; o Suprematismo e o Construtivismo, que utilizaram as relações entre
formas abstratas geométricas; o Dadaísmo e o Surrealismo, que darão atenção ao
uso de colagens (FARTHING, 2011).
O Futurismo foi fortemente influenciado pelas inovações tecnológicas, que
culminaram em uma nova relação entre as distâncias e o tempo. A invenção do
automóvel, do avião e da telefonia desencadearam um novo ritmo nas transformações
sociais. O Futurismo surgiu na Itália e buscava justamente valorizar a velocidade e o

87
desenvolvimento tecnológico, em oposição a qualquer tipo de tradição. O manifesto
futurista anunciava uma arte inovadora, que via na guerra e na destruição do passado
a chance de construir uma nova arte, mais coerente com uma sociedade desenvolvida
tecnologicamente. As experimentações cubistas foram influentes entre tais artistas,
que utilizavam a fragmentação das formas e das cores para representar as dinâmicas
da velocidade.

88
15. POP ART

A Pop Art surgiu num momento em que as imagens midiáticas, a propaganda


e o consumo estavam em alta. Ao contrário de outras correntes artísticas, a Pop Art
se integrou ao mercado, transformando a obra em mercadoria. Os artistas buscavam
produzir uma arte atraente e jovem, com cores vivas e que resultassem de um
processo mecânico, similar ao que dava origem aos objetos industrializados. A ideia
de originalidade na criação artística foi contraposta à ideia de reprodutibilidade. Os
trabalhos de Andy Warhol, por exemplo, eram compostos pela reprodução seriada de
uma mesma imagem por meio do processo de serigrafia. O artista utilizava imagens
da cultura de massa, tais como fotografias de artistas famosos ou produtos de
consumo, e as reproduzia diversas vezes, alterando pequenos detalhes ou cores.
A Pop Art foi o movimento de transição entre a arte moderna, ainda guiada
pelos movimentos de vanguarda, e a arte pós-moderna, centrada na integração entre
as diferentes correntes artísticas e as imagens da atualidade. O termo inglês pop art
pode ser traduzido como “arte popular”. Entretanto, a Pop Art não trata das mesmas
questões que costumam ser englobadas pela expressão “arte popular”. Afinal, a Pop
Art trabalha com imagens da cultura de massa, enquanto a arte popular refere-se à
arte produzida por comunidades específicas. De acordo com Archer (2012), as
experimentações artísticas do final da década de 1950 que prezavam pelo corriqueiro
e pelo acaso convergiram em dois movimentos artísticos: o Minimalismo e a Pop Art.
Enquanto o Minimalismo trabalhava com uma abordagem formal, evitando os
excessos ao produzir uma arte impessoal, a Pop Art utilizava imagens da cultura de
massa para criar produções mecânicas e sem expressão, uma espécie de reprodução
voltada ao consumo. A utilização de técnicas como a serigrafia e a pintura detalhista
convergia para uma ruptura com a arte expressionista abstrata. A serigrafia era
utilizada, por exemplo, por Andy Warhol (1928–1987), que reproduzia a mesma figura
muitas vezes. Já a pintura detalhista era utilizada, por exemplo, por Roy Lichtenstein
(1936–1997), que reproduzia quadros de histórias em quadrinhos. Ainda em tom
vanguardista, os expoentes da Pop Art buscavam uma arte fria que omitisse o trabalho
singular do artista e revelasse uma nova relação entre ele e a sociedade. A ideia era
aproximar a arte do público por meio do uso de imagens da cultura de massa, comuns
à maioria das pessoas. A ruptura com o Expressionismo pode ser percebida numa
série de obras produzidas por Roy Lichtenstein em 1965 com o título Pinceladas

89
(Figura 1). O artista empregava a sua técnica apurada de detalhamento inspirada nas
histórias em quadrinhos para reproduzir pinceladas orgânicas, comuns nas obras
expressionistas, a fim de demonstrar que aquele tipo de registro não se referia ao
estado emocional absoluto. Lichtenstein evidenciou que o Expressionismo Abstrato
se estruturava a partir de um conjunto de símbolos que as pessoas costumavam
associar à expressão de sentimentos.
A Pop Art tornou o cenário artístico mais dinâmico, possibilitando a livre
comercialização das obras. Os artistas aceitaram a arte como produto, e a imprensa
divulgava a ideia de uma arte divertida. A oposição à arte expressionista abstrata
parecia ser a melhor saída para o artista da época, que não precisava continuar
contestando a burguesia por meio de atitudes boêmias. Lembre-se de que as
vanguardas artísticas buscavam uma arte de ruptura com os sistemas sociais,
principalmente de ruptura com a burguesia. Os artistas viviam uma imensa
contradição: ao mesmo tempo em que negavam a ordem social estabelecida,
precisavam ser aceitos para conseguirem comercializar as suas obras. Entretanto, a
partir da Pop Art, os artistas passaram a viver entre os burgueses, pois não tinham
medo de serem confundidos com eles. Como certa vez “[...] disse Warhol (apud
WOLFE, 2009, p. 93) [...]: nada é mais burguês do que ter medo de ser burguês”.

Figura 40: Pinceladas (1965), Roy Lichtenstein.

Fonte: (FARTHING, 2011).

90
Além de contestar o Expressionismo Abstrato que tomava conta do mercado
norte-americano, a Pop Art buscava romper com a distinção entre cultura de elite e
cultura de massa. Tal ruptura, contudo, não foi bem-sucedida. Afinal, as pinturas
criadas na Pop Art não atingiam o grande público e recebiam um alto valor agregado
quando eram comercializadas nas galerias de arte, devido à sua autenticidade. Seria
mais coerente dizer que a Pop Art contaminou a cultura de elite com a cultura de
massa. Em suma, a Pop Art surgiu como uma arte jovem e de ampliação da atuação
do artista, que poderia utilizar qualquer imagem que a cultura de massa lhe
oferecesse. Nas palavras do artista Richard Hamilton (apud FARTHING, 2011, p. 484–
485), a Pop Art buscava ser: “[...] popular (feita para o grande público); efêmera
(extinção em curto prazo); descartável (facilmente esquecível); barata; produzida em
massa; jovem (dirigida para a juventude); espirituosa; sexy; ‘macetada’; glamourosa;
big business”. Como você pode perceber, produzir arte para o consumo deixou de ser
um problema ético entre os artistas. Os artistas de vanguarda se opunham ao
consumismo e à cultura de massa. Já os artistas da Pop Art não se preocupavam com
a separação entre a arte e o consumo. Na verdade, os artistas da Pop Art se
interessavam por uma nova abordagem, baseada em princípios estéticos que
utilizavam as referências da cultura de massa para criar uma arte desprovida de crítica
social. É claro, contudo, que houve produções artísticas que foram exceções ao fazer
críticas ao consumismo e à massificação.
A Pop Art começou a decair ainda no final da década de 1960. Ela se constituiu
como uma referência da arte pós-moderna ao questionar a relação do artista com o
mercado da arte num mundo repleto de propagandas e imagens vinculadas à
sociedade de consumo. Pode-se dizer que a Pop Art liberou o artista do puritanismo
que buscava um distanciamento entre a arte e o mercado. Dessa perspectiva, o artista
poderia experimentar todas as imagens do mundo para criar arte sem se preocupar
com a expressão ou com a produção de crítica social.
A Pop Art não foi um movimento coerente. Assim, cada artista explorava à sua
maneira as imagens midiáticas e os produtos de consumo de massa. Alguns
produziam colagens de imagens advindas de revistas ou anúncios publicitários,
enquanto outros utilizavam técnicas de serigrafia, pintura ou escultura a fim de
representar objetos de consumo. Os primeiros artistas a trabalhar com a nova estética
foram os ingleses, mas os norte-americanos deram grande repercussão ao
movimento.

91
Richard Hamilton (1922–2011) participava do Grupo Independente, que havia
se formado em Londres para discutir arte contemporânea na década de 1920. O
interesse comum entre os integrantes do grupo era a cultura de massa e a sua
reprodutibilidade (FARTHING, 2011). Hamilton elaborou uma colagem com o título O
que é que torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes? (Figura 41),
consagrando-se como um dos artistas pioneiros de um novo modo de pensar as
contaminações entre arte erudita e cultura de massa.

Figura 41: O que é que torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes? (1956), Richard
Hamilton, colagem.

Fonte: (FARTHING, 2011).

Andy Warhol foi o artista símbolo da Pop Art. Ele contestava os valores
expressivos da arte, trabalhando com imagens massificadas por meio de uma técnica
impessoal, a serigrafia. As suas obras eram feitas numa espécie de linha de produção
que repetia diversas vezes a mesma imagem, omitindo o gesto artístico da pincelada
— tão valorizada na arte moderna, principalmente no Expressionismo Abstrato.
Warhol [...] procurou eliminar de sua obra os valores artísticos tradicionais. Em seu
estúdio de Nova York, provocativamente batizado de “A Fábrica”, ele se propôs a
produzir imagens por meio de processos impessoais (como a serigrafia), proclamando
que elas não tinham nenhum valor, salvo o monetário no inflacionado mercado da arte
(FARTHING, 2011, p. 487).

92
Warhol costumava utilizar imagens de pessoas famosas da época e reproduzi-
las repetidas vezes, com pequenas alterações. As fotografias de Marilyn Monroe e
Elvis Presley eram referências para Warhol, que os representava como produtos de
consumo ao utilizar uma técnica mecânica para copiar as suas imagens
repetidamente. Warhol mostrava os artistas como produtos de massa que poderiam
ser consumidos e tornava as suas imagens atraentes por meio do uso de cores vivas,
aplicadas à mão e sem preocupação com o perfeccionismo. A primeira exposição de
Pop Art de Warhol, realizada em 1962, consistia em pinturas de diversas latas
individuais de sopa Campbell
dispostas sobre prateleiras.
As suas pinturas posteriores
também versavam sobre a
reprodução de produtos
voltados ao consumo, tais
como garrafas de Coca-Cola,
caixas de Brillo ou imagens de
pessoas famosas. As obras
partiam da ideia de que a arte
deveria ser uma mercadoria
como os objetos que ela
representava.

93
16. ARTE PÓS-MODERNA

A arte moderna, que se utilizava das vanguardas artísticas para explorar as


possibilidades dos materiais e das linguagens, chega ao limite com o Expressionismo
abstrato. Em seguida, surge a Pop Art, com foco na mecanização do fazer artístico
por meio de imagens advindas da cultura de massa. A partir de então, o cenário
artístico rompe com a busca frenética pelo novo e começa a utilizar os diferentes
períodos da história da arte como referência. Os processos mecânicos ganham
espaço nas propostas da Pop Art, da Op Art e principalmente do Minimalismo, que
utiliza elementos industriais para construir objetos que transpõem os limites entre
pintura e escultura. Nesse contexto, o entendimento tradicional e moderno sobre
autoria e genialidade artística é refutado, pois o artista não precisa mais construir o
objeto; basta contratar uma pessoa especializada e lhe apresentar o projeto a ser
executado. Neste capítulo, você vai ver como surgiu e se desenvolveu a arte pós--
moderna e conhecer as suas reverberações no cenário artístico brasileiro. Tais
reverberações foram marcadas pela arte neoconcreta, que propunha a participação
do público na constituição da obra. Além disso, você vai conhecer as características
da Minimal Art e se familiarizar com algumas das propostas artísticas da segunda
metade do século XX.
A segunda metade do século XX foi composta por uma série de eventos que
romperam com a ideia moderna de linearidade entre os movimentos artísticos. Além
das inovações tecnológicas que acarretaram a disseminação de informações com
certa rapidez, houve a consolidação das lutas políticas contra o racismo e em prol da
liberdade das mulheres. O mundo pós-guerra estava pronto para estabelecer uma
nova relação entre arte e vida ao romper com os limites da arte moderna. Com o
surgimento da Pop Art, nos anos 1960, ficou difícil continuar a de-limitação da
produção artística a partir das ideias de evolução histórica da arte moderna. Afinal,
Greenberg, o principal crítico modernista, havia se colocado contra o novo estilo
artístico. Para ele, tal estética rompia com os preceitos de originalidade e
expressividade da arte moderna. A Pop Art apresentava réplicas de objetos de
consumo, como as caixas de sabão Brillo produzidas por Andy Warhol. Esse trabalho
mostrava que não seria mais possível distinguir a arte dos objetos cotidianos e da
realidade a partir da simples constatação visual. A ruptura com a ideia de arte
enquanto algo original é levada a novos caminhos por Mike Bidlo, que realiza cópias

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de obras de diversos artistas, principalmente modernistas. Entre suas diversas
réplicas, encontra-se Not Warhol. Nesse trabalho, o artista reproduz as Brillo Boxes
de Warhol. As questões sobre originalidade e reprodutibilidade tornam-se centrais
nesse tipo de produção e refletem uma das dimensões de análise da Pós-
Modernidade: a confusão entre o real e a fantasia.

Figura 42: Not Warhol (Brillo Boxes, 1964), 2005, Mike Bidlo.

Fonte: (FARTHING, 2011).

Depois das experimentações da Pop Art e da arte conceitual, os limites do que


poderia ou não ser arte são questionados e os artistas percebem que a arte não está
na técnica ou no material utilizado. Não existiria algo capaz de definir como a arte
deveria ser. A partir de então, surge uma série de artistas que experimentam novos
caminhos para a arte, “[...] sem nenhuma direção narrativa única a partir da qual outras
pudessem ser excluídas” (DANTO, 2006, p. 16). No Pós-Modernismo, nada é
permanente, pois está em constante trans-formação. Os artistas podem explorar a
temática que quiserem, da maneira que desejarem. Nessa perspectiva, a arte pode:
ser colocada a serviço de certos objetivos sociais ou pessoais; explorar a ampla gama
de imagens da história da arte ou da mídia por meio do processo de apropriação, con-
ferindo sentidos novos às imagens; ser desmaterializada e existir apenas como
relação entre pessoas; e, também, utilizar técnicas tradicionais ou artesanais. Os
artistas pós-modernos não buscam uma obra estável e original, pois muitos
estruturam as suas produções a partir de citações, cópias, referências. Eles fazem

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colagens fora do senso histórico, sem organizar o tempo de modo linear; por isso, são
acusados de produzir uma arte super-ficial. As suas obras podem comportar
diferentes modos de organização e produção. As obras de Anselm Kiefer, como
Maikäfer flieg (Figura 2), por exemplo, examinam a noção de identidade alemã a partir
do ponto de vista histórico. A série de pinturas do artista chamada Terra devastada,
de 1974, explora paisagens esfumaçadas pela queima de palha e pela guerra
(ARCHER, 2012).

Figura 43: Maikäfer flieg, Anselm Kiefer, 1974, óleo sobre estopa.

Fonte: (FARTHING, 2011).

O feminismo também ganha corpo na arte pós-moderna, principalmente nas


produções de Jenny Holzer, Sherrie Levine, Louise Lawler, Bárbara Kruger e Cindy
Sherman. As estratégias adotadas por tais artistas são diversas. Cindy Sherman, por
exemplo, questiona a relação entre o feminismo e o consumo. As suas fotografias da
série Imagens de vômito apresentam corpos distorcidos e comida podre com cores
atraentes. Holzer também explora a relação entre feminismo e consumismo ao colocar
pôsteres em camisetas ou cabines telefônicas com frases do tipo “Proteja-se do que
eu quero” (ARCHER, 2012). A abertura propiciada pela arte pós-moderna deu
destaque à arte pública, inclusive à arte do grafite, que estava se difundindo em
diversos locais do mundo. As obras de Keith Haring, que representam figuras de

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animais e pessoas, ocupam o espaço das estações de metrô, posteriormente
marcando presença nas galerias de arte. Muitas de suas obras consistem em cartazes
negros com desenhos em giz.

Figura 44: Sem título, Keith Haring, 1983.

Fonte: (FARTHING, 2011).

A Pop Art e a Minimal Art, também conhecida como Minimalismo, foram as


tendências artísticas que deram origem à arte pós-moderna. A Pop Art reproduzia as
imagens da cultura de massa por meio de técnicas que omi-tiam a expressividade dos
artistas. Já a Minimal Art explorava o mínimo de elementos possível na produção
artística e a utilização de objetos industriais ou a fabricação de objetos de modo
mecânico. De acordo com Archer (2012), a expressão minimal art surgiu como uma
crítica aos trabalhos de artistas que não se enquadravam mais na estética de
vanguarda por explorarem grandes áreas vazias ou com poucos elementos. Muitos
artistas seguiam princípios do minimalismo em sua arte, mas os que mais se
destacaram foram Carl Andre, Robert Morris, Dan Flavin, Sol LeWitt e Donald Judd.
O Minimalismo, assim como a Pop Art, rompeu com o Expressionismo Abstrato ao
produzir uma arte mecânica que evitava qualquer tipo de expressividade. Era uma
arte com “[...] aparência monocromática, engenhada, impessoal” (ARCHER, 2012, p.
43), que explorava a simplicidade. Judd dizia que o Minimalismo havia rompido
também com as linguagens artísticas tradicionais; afinal, as suas obras não poderiam
ser consideradas pintura ou escultura. Elas realizavam a mescla entre elementos das
duas linguagens, o que resultava em objetos tridimensionais.
Na Figura 4, você pode observar uma obra de Donald Judd e ver como ele
explora os elementos da visualidade por meio da construção de objetos similares aos

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fabricados pelas indústrias. Todo gesto expressivo é evitado para dar forma a um
objeto mecânico, numa atitude similar à que levou aos ready-made de Duchamp. Judd
utilizou o mínimo de elementos compositivos — no caso, o retângulo, que é repetido
inúmeras vezes na estrutura do objeto. Todas as faces são retangulares, inclusive a
parte vazada do paralelepípedo.

Figura 45: Sem título, Donald Judd, 1968.

Fonte: (FARTHING, 2011).


As obras de Judd rompem com a tradição da pintura e da escultura europeia
ao trabalharem com objetos inexpressivos. Além disso, o artista deixa de lado o
racionalismo, que não dava mais conta de explicar o mundo influenciado pelo
consumismo e pelas novas mídias. A representação pictórica ou escultórica que
tendia ao ilusionismo (por meio de formas e seres alheios à materialidade da arte) é
questionada pelos minimalistas. Eles, amparados por uma visão pragmática, dão
atenção especial à própria materialidade da arte e às suas experimentações, sempre
buscando manter a sua verdade. Nas obras de Judd, por exemplo, o alumínio
continuará sendo alumínio, e não será omitido para representar um ser ou objeto do
mundo visível. Como afirma Archer (2012, p. 50), “[...] a arte minimalista não
representava nem se referia diretamente a nenhuma outra coisa de uma forma que
fizesse sua própria autenticidade depender da adequação de sua semelhança
ilustrativa com essa outra coisa”. A ruptura com a figuração e a representação pode
ser percebida facilmente nas obras que evitam a utilização de títulos para não se
subordinarem ao que o nome poderia evocar. No Minimalismo, tanto o processo de

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artesania quanto os materiais são amplamente frios. O artista não precisa fabricar a
obra de arte, podendo criar os seus projetos a partir de materiais prontos ou
contratando outras pessoas para construí-los. A obra Diagonal de 25 de maio de 1963,
de Dan Flavin (Figura 5), consiste numa lâmpada fluorescente amarela disposta na
parede, formando uma linha diagonal com ângulo de 45 graus. O artista não pretendia
expressar sentimentos ou emoções, pois criava um ambiente único ao brincar com a
luz para transformar a galeria de arte. As suas obras que exploram luzes fluorescentes
rompem definitivamente com a divisão entre pintura e escultura ao unir as duas
linguagens artísticas para alterar os aspectos do espaço.

Figura 46: Diagonal de 25 de maio de 1963, Dan Flavin, 1963, lâmpada fluorescente amarela.

Fonte: (FARTHING, 2011).

As obras de Carl Andre também transformam e se integram ao ambiente,


rompendo com muitas formalizações teóricas da arte moderna. Ele buscava uma arte
que fosse materialista e comunista, como é possível notar no seu relato:

Minha obra é [...] estética porque não possui forma transcendente, nem qualidades
intelectuais ou espirituais. Materialista, porque é feita com seus próprios materiais,
sem pretensão de empregar outros. E é comunista, porque sua forma é acessível a
todos os homens (ANDRE apud FARTHING, 2011, p. 522).

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Na obra Plano em aço e zinco (Figura 47), ele dispôs no chão 18 placas de aço
e 18 de zinco, formando uma imagem que lembra um tabuleiro de xadrez. A obra
possibilita que as pessoas caminhem sobre ela ou a explorem por meio do tato. Desse
modo, Andre cria uma nova relação entre obra e observador, que não precisa observar
a distância e de maneira passiva.

Figura 47: Plano em aço e zinco, Carl André, 1969.

Fonte: (FARTHING, 2011).

A arte minimalista integrou processos mecânicos e materiais industriais na


fabricação de suas obras. Muitas vezes, os artistas contratavam operários para
produzi-las. Afinal, a arte evitava o teor expressivo do Modernismo ao manter íntima
relação entre o material e a proposta estética, rompendo com qualquer tipo de
figuração e elaboração narrativa. O Pós-Modernismo se pauta em alguns desses
princípios e rompe com a necessidade de artesania do artista, possibilitando o
emprego de qualquer material nas suas obras, que podem ou não representar
simbologias.
A arte pós-moderna brasileira conta com muitos desdobramentos e é carente
de teorização. Talvez isso ocorra porque o termo “pós-modernidade” não é bem visto
pelos teóricos da arte, que preferem evitar tal classificação e continuar se referindo às
obras dos anos 1960 até os dias atuais como “arte contemporânea”. Entretanto, é
possível perceber alterações no cenário artístico brasileiro, que, ao romper com o
Modernismo e com a ideia de construir uma arte brasileira, enfatiza a
desmaterialização da obra de arte, advinda das experiências da arte conceitual e da
participação do público no processo artístico. Nesse contexto, grande parte da

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produção possui um engajamento com questões sociais e políticas. Artistas como
Hélio Oiticica, Lygia Clark e Lygia Pape criaram produções que incorporaram
elementos sociais e físicos do Brasil em obras de destaque internacional. Tais artistas
acreditavam na arte enquanto fator determinante para a transformação da sociedade,
que precisava ser pautada na coletividade e na participação social (CHIARELLI,
2002). Em decorrência da transformação, em escala global, das funções básicas do
cotidiano em mercadoria, muitos dos artistas buscaram propor experiências que
transgredissem as proposições de que a arte deveria apresentar um objeto a ser
apreciado. Os artistas propunham as obras “[...] como suportes de experiências: a
arte, ao tentar romper a lógica do espetáculo, restitui-nos o mundo como experiência
a ser vivida” (BOURRIAUD, 2009, p. 32). Nesse sentido, a arte pós-moderna
brasileira, principalmente a arte neoconcreta, foca a elaboração de possibilidades de
habitar melhor o mundo, negando alguns de seus projetos anteriores de criação de
realidades imaginárias ou utópicas. A arte neoconcreta surge como uma alternativa
para contrapor as ideias dos concretistas, que reduziam a arte a uma mera ilustração
de conceitos advindos da ciência. Nesse sentido, os neoconcretistas propõem a
espacialização da obra para negar a arte enquanto representação de conceitos a
priori.
Hélio Oiticica foi um dos expoentes do Neoconcretismo, tendo proposto
diversas obras voltadas à interatividade entre os participantes e o espaço. Em suas
obras denominadas Penetráveis (Figura 48), o fruidor percorre o espaço explorando
as suas percepções visuais, táteis, olfativas, auditivas e palativas, o que culmina numa
experiência multissensorial. Todavia, os Penetráveis não são objetos que refletem as
ortodoxias científicas; afinal, eles se apresentam enquanto espaços de
experimentação sensível que fazem o resgate da subjetividade do participante na
construção artística.

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Figura 48: Tropicália-Penetráveis PN2 e PN3, Hélio Oiticica, 1967. Montagem para a XXIV Bienal
Internacional de São Paulo, 1998.

Fonte: (FARTHING, 2011).

As obras da artista Lygia Clark também trazem o lado humano e, até mesmo,
psicológico para a arte. Ao contrário dos minimalistas e concretistas, que focavam
numa relação fria e mecânica com a arte, os neoconcretistas tratam do ser humano
como um todo, explorando os diversos sentidos. O corpo do participante e a sua
relação com o espaço é primordial para a constituição da obra como relação, como
espaço a ser experimentado por meio dos cinco sentidos. Inicialmente, Lygia Clark
construía objetos que precisavam da participação do público para terem vida artística.
Nesse período, destaca-se a obra Bichos (Figura 8), que consiste em formas
geométricas unidas por dobradiças que permitem a criação de novas disposições
entre elas a partir do seu manuseio. Entretanto, a artista queria que a participação em
suas obras fosse além do simples manuseio de formas, por isso começou a produzir
espaços interativos. Na obra A Casa é o Corpo: Labirinto, a artista cria uma instalação
em que a pessoa precisa experimentar um espaço de 8 m de comprimento subdivido
em quatro ambientes: a penetração, a ovulação, a germinação e a expulsão.

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Figura 49: Bichos, Lygia Clark, 1960.

Fonte: (FARTHING, 2011).

Entretanto, a arte pós-moderna brasileira não ficou restrita à arte neoconcreta.


Em trabalhos dos artistas Waltércio Caldas, José Resende, Luiz Paulo Baravelli,
Carlos Alberto Fajardo e outros, ele [o espectador] devia voltar à condição original
daquele que contempla, guardando uma certa distância física e afetiva em relação ao
objeto de arte (CHIARELLI, 2002). Algumas das obras de Carlos Fajardo possuem
uma relação com o Minimalismo por utilizarem materiais industrializados e serem
produzidas por operários.

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17. ARTE CONTEMPORÂNEA

Você deve saber que o contemporâneo demarca o tempo presente. No entanto,


pensar as artes que figuram sob o termo contemporâneo é uma tarefa difícil, pois, por
mais que utilizemos definições conceituais que possam representar boa parte da
produção artista contemporânea, sempre corremos o risco de não dar conta de outras,
que superam tais perspectivas. Afinal, a arte contemporânea não é apenas a arte
produzida no tempo presente, uma vez que apresenta uma nova relação com a
produção artística, distinta daquela perseguida pelos artistas modernistas. Para dar
conta das novas produções artísticas surgidas a partir dos anos 1980, foi inventado o
termo arte pós-moderna. Danto (2006) afirma que a utilização desse termo poderia
deixar de lado diversas produções contemporâneas, devido à falta de unidade
estilística nas obras dos artistas que não seguem mais os princípios da arte moderna.
As experiências da Pop Art, “[...] cujas obras utilizavam temas extraídos da
banalidade dos Estados Unidos urbano [...]” (ARCHER, 2012, p. 6), que rompia com
a ideia de arte como expressão ao buscar um arranjo artístico mecanizado tanto na
técnica quanto na forma. Assim como as produções dos artistas conceituais, como,
por exemplo, a obra A Base do Mundo (Figura 1), de Piero Manzoni, dificultaram a
distinção entre os objetos da arte e os objetos do mundo. Essa obra consiste em um
pedestal, comumente utilizado como base para esculturas. O pedestal de Manzoni,
aparentemente, está sem uma escultura para torná-lo útil, mas, em sua face, há a
seguinte frase: “Base do mundo, base mágica n° 3 de Piero Manzoni, 1961,
Homenagem a Galileu [...]” (FERVENZA, 2006, p. 83). Logo, percebemos que a obra
conceitual de Manzoni, ao utilizar uma base de escultura com o título “Base do
Mundo”, está transformando o mundo em arte. De fato, ao refletirmos sobre a arte
contemporânea, torna-se difícil distinguir a arte da vida, pois ambas estão intimamente
interligadas.

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A impossibilidade de fixar limites para a arte contemporânea — afinal, não existem
mais materiais ou técnicas que façam uma produção ser qualificada como arte — faz
as atividades e os objetos não artísticos serem confundidos com arte. Um exemplo
ocorreu em 2016, quando um adolescente, entediado com algumas obras do museu,
resolveu colocar os óculos no chão, e os visitantes, acreditando que se tratava de arte,
tiraram várias fotos e se colocaram na posição de apreciadores.
Em consequência da ampliação do conceito artístico, resultante das correntes
modernistas, hoje, não há “[...] nenhuma limitação a priori de como as obras de arte
devem parecer – elas podem assumir a aparência de qualquer coisa. Isso por si só se
deu por encerrada a agenda modernista [...]” (DANTO, 2006, p. 19). Enquanto a arte
acadêmica contava com princípios estéticos e temáticos para definir qual era a arte, a
arte modernista, por sua vez, construía o conceito de arte a partir de narrativas de
grupo, ou seja, os artistas produziam a partir de princípios estéticos comuns na arte
contemporânea, tanto com a normatização estética quanto com a eleição de princípios
estéticos comuns.
Danto (2006), ao ilustrar as descontinuidades na arte, afirma que o
renascimento inaugurou a era da arte ao criar a figura do artista e as teorias que
distanciavam o fazer artístico (artes liberais) do fazer artesanal, que não exigia
reflexões filosóficas. Isso não significa que antes da era da arte não existisse arte. Na
verdade, o que não existia era o conceito de arte, visto que as imagens elaboradas
eram puramente religiosas e os monges e padres que as construíam seguiam regras
iconográficas. Outra descontinuidade ocorreu na década de 1980, a qual causou a
morte da arte inaugurada no Renascimento. As figuras do artista genial, da obra prima,
da originalidade, da perfeição técnica, dentre outras facetas, são abandonadas pela
maioria dos artistas. Assim como existe arte antes da era da arte, também é
igualmente válida a afirmativa de que existe arte após a era da arte. Entretanto, sua
ruptura é tão drástica que torna a constituição de arte imprecisa, convergindo para
“[...] um período de incrível produtividade experimental no campo das artes visuais,
sem nenhuma direção narrativa única a partir da qual outras pudessem ser excluídas,
estabilizando-se como norma [...]” (DANTO, 2006, p. 16). Entretanto, a falta de
definição do que seja ou não arte não torna a produção artística da atualidade um
completo caos, uma vez que os artistas inter-relacionam seus trabalhos com as
produções das vanguardas e dão continuidade a alguns preceitos estéticos surgidos

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nas décadas anteriores. A arte contemporânea, ao contrário dos movimentos
modernistas e, principalmente, dos movimentos de vanguardas, não nega o passado
da história da arte. Ao não apresentar rupturas e estar em desenvolvimento em um
período de liberdades, seja na temática ou na técnica, a arte contemporânea se utiliza
de produções de diferentes períodos da história ao produzir colagens. Tais colagens
se apropriam de obras canônicas sem manter qualquer relação entre as referências
utilizadas, além do intensão do artista. A arte contemporânea atribui “[...] um valor
positivo ao remake, de articular usos, relacionar formas, em lugar da heroica busca
do inédito e do sublime que caracteriza o modernismo [...]” (BOURRIAUD, 2009a, p.
45). O artista brasileiro Vik Muniz utilizou materiais inusitados para reproduzir obras
de arte mundialmente reconhecida. Na obra Medusa Marinara (Figura 2), o artista
utilizou macarrão para reproduzir a obra Medusa, de Caravaggio. Ele não inventou a
imagem, apenas aplicou um novo arranjo ao dispor elementos incomuns à obra de
Caravaggio, famoso artista barroco.

Figura 50: Medusa Marinara (1997), de Vik Muniz.

Fonte: (FARTHING, 2011).

Outro aspecto relevante na arte contemporânea é a participação do público na


constituição de algumas propostas. Nesse tipo de arte, o público abandona o papel
passivo de apreciador para integrarem e transformarem a dinâmica artística. Nessa
proposta, cabe ao artista a tarefa de criar espaços/situações que instiguem as
relações entre as pessoas. A arte relacional está presente nas obras do artista
Gonzales-Torres, como pode ser visto na proposta Untitled (Portrait of Ross in L.A.),
de 1991, em que o artista dispôs em uma sala o seu peso e o de seu companheiro em
balas. O público poderia se servir das balas, que eram repostas diariamente,

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totalizando 175 quilos. Quando as pessoas se serviam, eram informadas de que
estavam ingerindo balas de portadores de Aids. Nessa proposta, a produção artística
não é o amontoado de balas, mas sim o processo de participação do público. Tal
participação acontece em um momento específico e, ao contrário das pinturas,
esculturas, fotografias, etc., precisam se servir do registro como forma de
documentação. Na contemporaneidade, muitas obras são efêmeras e sua duração só
é imortalizada pelo registro.
O uso da fotografia como arte também é comum entre os artistas
contemporâneos. Por ter uma relação com a verdade, acaba causando mais
incômodo no público, pois esse é um dos objetivos da arte contemporânea. A arte não
é utilizada para confortar, e para causar estranhamento e colocar as pessoas em
condições desconfortáveis. A obra fotográfica O Cristo do mijo (1987), de Andres
Serrano (1950), causou muita revolta, pois o artista explorou várias imagens
fotográficas envolvendo fluidos humanos. Nessa obra, o artista fez uma fotografia de
um crucifixo submerso em urina. Houve uma série de questionamentos por parte da
sociedade, que discutira sobre “[...] as questões do racismo e do machismo bem como
blasfêmia e homofobia [...]” (ARCHER, 2012, p. 215). Outro fator importante na
produção de arte contemporânea é a utilização de meios tecnológicos para a
manipulação de imagens e vídeos ou para a manipulação de espaços virtuais, como
ocorre no site JODI, criado por Joan Heemskerk e Dirk Paes Man, em 1994. Esse site
rompe com todas as expectativas de um ambiente virtual convencional, propiciando
uma visão da linguagem computacional, aliada à experiência de um devir em que o
internauta acessa os links sem saber a que local virtual será remetido.
A arte contemporânea criou novos métodos de produção artística que não
necessitam resultar na construção de um objeto, pois podem levar os espectadores a
participar, em vez de apenas observar. As propostas artísticas surgem da
subjetividade dos artistas e seus campos de experiências, não estando atreladas a
grupos de artistas vanguardistas, como acontecia na arte moderna. O artista pode
atuar politicamente para denunciar um problema social ou pode apresentar uma visão
diferente sobre alguma questão, que pode ser interna ou externa. Para fazer arte,
podem ser usados quaisquer materiais, o que, às vezes, pode resultar em obras
efêmeras.
A arte conceitual tem como centralidade o questionamento dos limites do que
pode ou não ser considerado arte. Ela rompe com muitas ideias que foram construídas

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durante séculos sobre os objetivos, as técnicas e os meios de produção da arte. Nesse
novo conceito, o artista não precisa construir suas obras, pois não é a materialidade
ou o rigor técnico que qualificarão o objeto como arte, mas sim o conceito elaborado
pelo artista. O termo arte conceitual foi utilizado pela primeira vez, em 1967, em um
texto do artista Sol LeWitt (1928–2007), no qual ele explicitava alguns dos princípios
comuns utilizados pelos artistas conceituais. LeWitt afirmava que a arte conceitual
valorizava mais a ideia ou conceito do que a matéria. “[...]. Quando um artista utiliza
uma forma conceitual de arte, isto significa que todo o planejamento e as decisões
são feitas de antemão, e a execução é uma questão de procedimento rotineiro. A ideia
se torna uma máquina que faz a arte [...]” (ARCHER, 2012, p. 56). As produções de
arte conceitual não buscam expressar sentimentos, pois voltam-se à exploração das
relações entre os objetos de modo intelectual. Por isso, podemos dizer que a arte
conceitual se desenvolve na contramão do que as pessoas costumam aceitar como
obra de arte. Como não é necessário que o artista produza sua obra, desaparece a
ideia de originalidade. Freire (2006, pp. 8–9) apresenta algumas das rupturas
presentes na arte conceitual: em “[...] vez de permanência, a transitoriedade; a
unicidade se esvai frente a reprodutibilidade, contra a autonomia, a contextualização;
a autoria se esfacela frente às poéticas de apropriação; a função intelectual é
determinante na recepção [...]”. Entretanto, nem todas essas rupturas eram novidade
no cenário artístico, e podemos perceber alguns desses princípios nos readymade,
construídos nas primeiras décadas do século XX por Marcel Duchamp, resultantes da
combinação de objetos produzidos em série. “Com os readymade, Duchamp pedia
que o observador pensasse sobre o que definia a singularidade da obra de arte em
meio à multiplicidade de todos os outros objetos [...]” (ARCHER, 2012, p. 3). A arte
conceitual surgiu como uma ruptura à consideração da arte enquanto mercadoria. Um
ótimo exemplo dessa ruptura foi a obra Merda de Artista, de Piero Manzoni (1933–
1963), que produziu 90 latinhas supostamente cheias de fezes do artista que deveriam
ser vendidas pelo mesmo peso em ouro. “Como se acreditava que abrir as latas
significaria destruir o valor da obra, durante muito tempo não se soube ao certo o que
as latinhas continham de fato [...]” (FARTHING, 2011, p. 501), entretanto, após serem
vendidas algumas das latas no ano de 2007, o colaborador de Manzoni declarou que
as latas estavam cheias de gesso.
Todavia, a arte conceitual não ficava restrita à produção de objetos como os
readymade ou as latas supostamente com fezes de artista. Era comum a organização

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de situações simbólicas, como a proposta do artista e professor John Baldessari
(1931), na qual ele, estando impossibilitado de viajar para uma exposição de arte em
que participaria, acabou instruindo seus alunos a escreverem nas paredes da galeria
a frase “Eu não vou criar mais arte chata”. Os alunos aceitaram a proposta e, como
se fosse um castigo, deixaram as paredes completamente cobertas pelas palavras
(FARTHING, 2011). O artista On Kawara (1932–2014), por sua vez, produziu registros
para informar que continuava vivo. Suas obras consistiam em telegramas com a frase
afirmativa “I am still alive” (Eu ainda estou vivo). Na década de 1970, ele enviava esses
telegramas aos amigos, familiares, merchands e galeristas para informá-los de que
continuava vivo. Desse modo, a arte deixa de ser um produto para refletir a vida do
artista e o contexto que o cerca, e a ideia de arte enquanto pintura ou escultura dá
lugar a novas possibilidades. De acordo com Archer (2012, p. 78): “[...] o
conceitualismo é frequentemente identificado como um período durante o qual a arte
se tornou insubstancial. Onde antes havia pinturas e esculturas, agora havia itens de
documentação, mapas, fotografias, lista de instruções [...]”. As obras não podem ser
experimentadas sensorialmente em sua inteireza, mas podem ser experimentadas a
partir de sua documentação. Desse modo, os registros de documentação se integram
ao fazer artístico, porém não substituem a experiência ocorrida, apenas dão
materialidade e permanência ao transitório. A ruptura com os meios tradicionais é
central para a arte conceitual, conforme salienta o artista Joseph Kusoth (ARCHER,
2012, p. 80–81): Ser um artista hoje significa um meio de questionar a natureza da
arte. Se alguém questiona a natureza da pintura, não pode estar questionando a
natureza da arte. Se um artista aceita a pintura (ou escultura), está aceitando a
tradição que a acompanha. Isto se deve ao fato de que a palavra “arte” é geral, e a
palavra “pintura” é específica. A pintura é um tipo de arte, Se se fazem pinturas, já
está se aceitando (e não questionando) a natureza da arte. Assim, está-se aceitando
que a natureza da arte é a tradição europeia de uma dicotomia pintura-escultura. O
questionamento sobre os limites da arte e a sua proposição enquanto jogo linguístico
ficou aparente na obra Uma e três cadeiras (1965), de Joseph Kosuth (1945) (Figura
3). A obra consiste na exposição de uma cadeira juntamente com uma fotografia em
preto e branco do mesmo tamanho do objeto e uma descrição retirada do dicionário
sobre o conceito de cadeira. De acordo com Archer (2012, p. 82), “[...] a definição
nomeia o objeto diante de nós, diz-nos o que ele é, mas também designa uma
categoria da qual a ‘cadeira real’ é apenas um exemplo individual [...]”.

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Freire (2006) salienta que
essa relação da arte conceitual com
a filosofia da linguagem é algo mais
relacionado à arte anglo-saxã, pois a
arte conceitual latino-americana está
intrinsecamente ligada à realidade
política social de seu contexto de
produção. No caso do Brasil, a arte
conceitual contestou as ações da
ditadura militar que, por meio do AI-
5, reprimiu a produção e a circulação artística, o que desencadeou um boicote
internacional e nacional às Bienais de Arte de São Paulo que ocorreram entre 1968 e
1983. Os artistas Hélio Oiticica, Guilherme Vaz, Arthur Barrio e Cildo Meireles
participaram da exposição no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA), em
1970, com obras conceituais. O artista Cildo Meireles, por exemplo, participou com o
projeto intitulado Inserções em circuitos ideológicos (Figura 4), que ainda estava em
desenvolvimento. Meireles utilizava os sistemas de circulação comuns à população
como meio para divulgar frases de protesto às barbaridades do governo ditatorial
brasileiro. Foram estampadas em garrafas de Coca-Cola retornáveis e cédulas de
dinheiro frases de protesto, tais como “yankees, go home!”, para criticar o colonialismo
norte--americano, ou “Quem matou Herzog?”, para expor o assassinato do jornalista
e a dissimulação do regime militar ao forjar seu suicídio. No caso do projeto Coca-
Cola, as impressões foram produzidas no corpo das garrafas com a cor branca,
dificultando a sua leitura quando elas estavam vazias e revelando seu conteúdo
quando estavam cheias.

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Figura 51: Inserção em circuitos ideológicos: Projeto Coca-Cola (1970), de Cildo Meireles.

Fonte: (FARTHING, 2011).

A arte conceitual abriu caminho para as novas experimentações artísticas que


ocorriam no cenário artístico do século passado. Tanto a performance quanto as
instalações se beneficiaram desse modo questionador de produzir arte. Atualmente,
são incontáveis os números de artistas que valorizam mais as ideias do que o
processo artístico e trabalham seguindo alguns dos princípios da arte conceitual.
A arte contemporânea traz no seu bojo a superação da divisão entre as
linguagens artísticas tradicionais (artes visuais, música, dança, teatro), ao criar formas
que, muitas vezes, tornam-se indistinguíveis da vida cotidiana, visto que o importante
não é o material ou a técnica utilizada, mas o arranjo poético realizado pelo artista.
Entretanto, há algumas formas comuns entre os artistas contemporâneos que
consistem no uso de performances, fotografias, videoarte, instalações, land art,
intervenção urbana, entre outras. Archer (2012) afirma que, atualmente, há a
popularização desse tipo arte, voltada à externalização dos problemas sociais,
principalmente as opressões, o racismo e os problemas advindos das discriminações
de gênero/sexualidade. A arte contemporânea, ao se aglutinar à vida, acaba causando
muito incômodo e dando visibilidade aos problemas sociais, como ocorreu na
performance La Bête.

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A arte performática consiste no uso do corpo do artista “[...] como meio para realizar
ações que podiam incorporar música e dança, tinha duração variável e poderiam ser
repetidas em lugares diferentes [...]” (FARTHING, 2011, p. 512).

Em 2017, o artista Wagner Schwartz realizou a performance La Bête no Museu


de Arte Moderna de São Paulo (MAM) e foi acusado de pedofilia, pois, durante a
performance, ele ficava nu, e as pessoas eram convidadas a intervir sobre seu corpo,
modificando suas posições corporais, e uma criança tocou no seu pé, com o consenso
de sua mãe. Essa performance causou muitas discussões nas redes sociais, uns
defendiam a liberdade artística, outros questionavam a presença da nudez nos
museus, e, ainda, havia pessoas que questionavam a idoneidade do artista, que
permitiu que a criança tocasse seu corpo. Ao contrário de muitas outras produções
artísticas, a de Wagner Schwartz não tinha intensão de debater tais temas, pois sua
proposta era apresentar o corpo como um objeto que pode ser modificado pela
participação do público. Schwartz se inspirou na série Bichos (1965), da artista Lygia
Clark (1920–1988), que consistia em uma série de formas geométricas unidas por
dobradiças, e o público poderia alterar sua disposição por meio da participação.
Entretanto, há produções artísticas que têm a intensão de debater diretamente sobre
as questões sociais. As fotografias de Rosana Paulino, por exemplo, fazem uma
crítica à posição da mulher na sociedade, ao racismo, à escravidão. São fotografias
impressas sobre um tecido disposto em um bastidor e com bordados sobre a boca, os
olhos ou a garganta. O bastidor é uma referência à própria história da arte, em que se
usava esse formato de telas para pintar figuras de santas. O bordado, atividade legada
às mulheres, lhes imputa às atividades domésticas e lhes tolhe a liberdade de falar,
ver, gritar, etc.

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

BELTING, Hans. Bild-Anthropologie, München: Wilhelm Fink Verlag, 2001.

BELTING, Hans. Após o fim da história da arte, (1985) São Paulo: Coisac Naify, 2012.

CHASTEL, André. «Histoire de l’art et histoire», Encyclopaedia Universalis, vol.


«Enjeux», 1989,
p.491-498.

DAMISCH, Hubert. L’origine de la perspective, (1987), Paris: Flammarion, col.


«Champs», 1994.

DIDI-HUBERMAN, Georges. Diante da imagem. Questão colocada aos fins de uma


história da arte. (1990), São Paulo: ed.34, 2013.

DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. São Paulo: ed.34, 1998
[Ce que nousvoyons, ce qui nous regarde, Paris: Minuit, 1992].

DIDI-HUBERMAN, Georges. A imagem sobrevivente. História da arte e tempo dos


fanstamas segundo Aby Warburg, (2000). Rio de Janeiro: Contraponto, 2013.

DIDI-HUBERMAN, Georges. Devant le temps, Paris: Minuit, 2000.

DILLY, Heinrich. «Heinrich Wölfflin: histoire de l’art et germanistique entre 1910 et


1925», in: Histoire et théories de l’art. De Winckelmann à Panofsky. Revue
Germanique Internationale, n0 2, Paris:PUF, 1994.

FAURE, Élie. Histoire de l’art. L’art antique. Prefácio à edição de 1921, Livre de Poche,
p.32 (História Antiga. História Medieval. História Moderna. São Paulo: Martins Fontes).

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