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Docente: Patricia Sposito Mechi

Discente: Gustavo Bitencourt dos Santos

Ensaio interpretativo "This is not América"

A apresentação do video produzido para a música “This is not America”, resultado da


colaboração do rapper porto-riquenho Residente e da dupla franco-cubana Ibeyi, obteve
muitas visualizações no YouTube pra ser mais exato 19.169.478 (dezenove milhões cento
e sessenta e nove mil e quatrocentos e setenta e oito ) . Assim, como o espetacular clipe da
canção Latinoamerica (Calle 13) que em letras icônicas como “um pueblo sin piernas pero
que camina” exibiu muitas definições para a identidade multifacetada do povo latino-
americano, This is not America é mais que uma canção , é uma grandiosa aula de história e
sociologia política sobre o continente americano. Posicionando-se como uma ligação
fraterna e um acréscimo à canção do artista Childish Gambino, que já tinha impressionado o
mundo com um videoclipe revelador da turbulência racista nos EUA e a falsidade da
sociedade separatista estadunidense, Residente não poupa as referências ao expansionismo
“ianque” e o roubo da identidade do continente presente nos versos “America no es solo USA,
papa”.

A iustração da luta nacionalista porto-riquenha abre o video, ao soar dos disparos de Lolita
Lebrón em frente ao congresso dos EUA, além da menção ao grupo Los Macheteros, que
age há décadas pela independência de Porto Rico no refrão “Si quieres mi machete, te
muerde”. Com uma sinfonia rica em arranjos e vibrações, a letra da canção é igualmente
robusta e contém numerosas referências a ocasião da “conquista”, isto é, usurpação
espanhola, enquanto mostra menções da intervenção dos EUA na soberania dos países
latino-americanos e a submissão econômica criada pelo controle imposto pelas grandes
transnacionais. Em meio a tudo isso, os impasses e instabilidades políticas e a violência
estruturante desses grupos, que é tanto legado colonial quanto objeto imperialista, compõe a
forte trama da obra.
Além da recordação de cenas da colonização ibérica, contrastando com cenas da atualidade,
tal qual a pirâmide maia em meio aos edifícios de uma grande cidade e o assasinato do líder
combatente inca Tupac Amaru II representada na atual resistência indígena à violência
policial, o videoclipe nos leva às imagens do que Luciana Ballestrin denomina de
“imperialidade”, uma conexão perdida do chamado “giro decolonial”. Segundo ela, “a nova
forma de globalidade imperial baseada na liderança dos Estados Unidos articula uma ordem
econômica, militar e ideológica que subordina pessoas, regiões e economias ao redor do
mundo e que projeta uma colonialidade global sobre o conhecimento e a cultura dos grupos
subalternos”. (BALLESTRIN, 2017, p. 520-521). Assim, se torna escasso falar de
colonialidade na América Latina sem entender como o mecanismo de poder do imperialismo
funciona .

Por meio de sua obra , ao entrelaçar itens que aludem aos ferimentos coloniais de um
continente secularmente usado para interesses mercantis erocêntricos com o violento
domínio estadunidense que ameaça a soberania do continente, Residente busca de volta
esse elo perdido da imperialidade. De fato, a América Latina não foi a única zona de
intervenção dos EUA, mas se caracterizou historicamente como seu “quintal de influência”.
Na convicção no destino manifesto e a “doutrina Monroe” que pregava “a América para os
americanos” à política do “big stick” de Roosevelt que outorgava a intervenção dos Estados
Unidos no território de países americanos para afastar a influência europeia, a hegemonia
norte-americana sobre o continente se ampliou militarmente. Desde o final do século XIX,
após a guerra hispano-americana e, especialmente, após a Segunda Guerra Mundial, essa
hegemonia se consolida por meio da inserção de capitais, estabelecimento de bases
militares, apoio à governos subservientes, golpes de estado anticomunistas e do estímulo à
dependência econômica e tecnológica, além do avanço da dominação cultural introduzida
pelo “american way of life” da sociedade de consumo.
Deixo aqui um link de uma entrevista onde o autor fala a respeito de sua obra.

ÁVILA CLAUDIO, Ronald. 'Bolsonaro começou a destruir o continente': rapper Residente


explica por que destacou presidente brasileiro em clipe.https://www.bbc.com/portuguese,
2022. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-60842427. Acesso em: 05,
julho de 2022.

REFERÊNCIAS

 BALLESTRIN, Luciana M. de Aragão. Modernidade/Colonialidade sem


“Imperialidade”? O Elo Perdido do Giro Decolonial. Dados: Revista de Ciências
Sociais, v. 60, n. 2, 2017, p. 505-540.

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