Você está na página 1de 7

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ


PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO PROFISSIONAL EM LETRAS
DISCIPLINA: TEXTO E ENSINO

O texto e seus contextos, organizado por Ronaldo de Oliveira Batista. Cap. 5, O texto na
semiótica. Diana Luz Pessoa Barros. 1 ed. – São Paulo: Parábola Editorial, 2016.
Célia Lopes
Selma Alves
CAPÍTULO 5

O texto na semiótica

5.1 Introdução
• Semiótica discursiva francesa
• Noções de texto e discurso
• Conceito semiótico de texto:
- organização temporal (plano da expressão)
- relação entre expressão e conteúdo (semissimbolismo e simbolismo)
• Expressão de texto não verbais.

5.2 Noções de texto e discurso na semiótica discursiva


• Conceitos diferentes, conforme teorias linguísticas do texto e a do discurso.
• Ponto de vista em comum, intersecções nas concepções de texto e de discurso estabelecidas em
cada teoria.
• A teoria semiótica discursiva tem se marco fundador nos seminários de A. J. Greimas (1973[1966],
1975 [1970], 2014 [1982]).
• Além da filiação saussuriana, a semiótica, em suas origens, dialoga fortemente com a semântica
estrutural (Hjelmslev, Lèvi-Strauss, Dumézel e Propp).
• Semiótica francesa tem características específicas em relação a outras teorias do discurso: estudo
do texto e do discurso tem, cada um, um quadro teórico metodológico bem estabelecido, com graus
de formação diferentes.
• Para explicar o sentido do texto essa teoria examina os mecanismos e procedimentos do seu plano
de conteúdo.
• A semiótica francesa tem a finalidade de examinar os processos de significação do texto, mostrar
o que o texto diz, que sentidos produz e com que procedimento linguístico-discursivos constrói os
sentidos:
- Relações intertextuais
- Relações interdiscursivas
• Percurso gerativo da significação:
- 1ª etapa mais simples e abstrata: nível fundamental (significação oposição semântica);
- 2ª etapa é a narrativa: se organiza a partir do ponto de vista de um sujeito;
- 3ª etapa é a mais complexa e concreta, é discursiva graças aos procedimentos usados:
temporalização, espacialização, actorialização, tematização e figurativização.
• O discurso é textualizado por meio da relação com o plano da expressão e torna-se objeto de estudo
– texto – de uma semiótica qualquer, linguística ou não.
• O caráter particular de cada texto é recuperado pela abordagem das questões do plano de
expressão, no nível propriamente textual, e das relações entre expressão e conteúdo.
5.3 Conceito semiótico de texto
• Na semiótica o texto se define pela relação entre expressão e conteúdo.
• Para o exame de um texto é preciso colocar-se para além do percurso gerativo da significação e
estudar as decorrências da organização dos diferentes planos da expressão e das relações entre
expressão e conteúdo para a produção de sentidos.
• Os dois princípios, o da arbitrariedade do signo (Saussure, 2006) e o da linearidade do significante,
estão por detrás da discussão que segue sobre o conceito de texto na semiótica.
5.3.1 Da organização temporal do texto verbal ou programação textual
• Linearidade (princípio saussuriano) – decorre do fato de os signos verbais falados serem expressos
pela substância sonora e, portanto, seguirem a linha do tempo devido ao som.
• Operação de linearização – consiste em reescrever em contiguidades temporais os elementos
narrativos e discursivos hierárquicos ou concomitantes.
• Consequência da linearização – duas organizações temporais:
* discursiva: plano do conteúdo
- cronológica e histórica
- sentido dado por suas relações com a instância da enunciação (Fiorin, 1996)
* textual: linearidade do plano da expressão
- segue a linha do tempo, devido a sonoridade da expressão
- rompe com a cronologia e com a história
• Linearidade espacial – na língua escrita, os signos se seguem em sucessão espacial; a escrita
reproduz a linha do tempo da língua falada.
• Exemplo de organização “temporal” do texto (a linearidade – acontecimentos concomitantes):
romance O homem que amava os cachorros, de Leonardo Padura (2013):
“Os acontecimentos concomitantes da vida de Trotski, no exílio, e da de Ramon
Mercader, o homem que o matou, são contatos na ordem que se seguem. Essa ordem
altera o sentido da obra, pois aproxima e põe em diálogo, a crenças, a força e o
sofrimento dos dois comunistas, sem que eles se conheçam ou se aproximem
espacialmente”. (p. 76)
• Na modalidade falada, a sonoridade leva à linearidade do significante verbal. A escrita produz a
linha do tempo da língua falada.
• Os textos poéticos fazem uso tanto do espaço quanto da linha temporal: poesia concretista.
• Texto em comunicação em língua falada:
* definido superficialmente como a interação entre dois falantes com conhecimentos e objetivos
comuns, que se desenvolve em dado tempo em com pelo menos uma troca de turno;
* fortemente programada, regulamenta por regras e convenções de diferentes de ordens;
* regra geral: “fala um de cada vez” (Marcuschi, 1986) – decorre da linearidade do significante.
* regulamentação de gestão de turno: esperar a vez de falar, ceder a vez para que haja alternância
de turno. Quando desrespeitado, ocorre sobre posição de vozes, causando ruptura da linearidade
pela “concomitância” que deve ser reparada.
• Infrações – violações das regras do sistema de gestão de turnos:
* falar quando não é sua vez
* falar ao mesmo tempo que o outro
* não ceder o turno, entre outros.
• Questões específicas do texto falado:
* O efeito de concomitância da elaboração e da produção desses textos e a presença, na
linearidade, de marcas de reformulação
* Os recursos linguístico-discursivos do texto falado têm função de dar o tempo ao falante
para que ele formule ou reformule sua fala, sem perder o turno.
* O ritmo textual da fala, que se apresenta em jatos e borbotões.
• A fala traz marcas de formulação e reformulação na linearidade do texto, enquanto na escrita o
texto é reelaborado sem deixar pistas.
• Na fala o efeito de sentido é de concomitância da elaboração e da produção do discurso, mas
devido a linearidade do significante sonoro, as vacilações, as correções e as reformulações do
discurso falado são expostas em sucessão – fala incompleta, inacabada.
• Os participantes da conversação procuram, com o emprego de procedimentos e recursos diversos
garantir a intercompreensão.
• Esses procedimentos discursivos são principalmente atos de composição textual, entre os quais
se encontram os de reformulação, como a correção ou a paráfrase, e constroem o dispositivo
persuasivo-argumentativo do texto falado e sua organização afetivo-passional (Barros, 1998,
2000, 2006).

5.3.2 Relações entre expressão e conteúdo

• A função primeira do plano da expressão, na tradição saussuriana, é a de expressar"


conteúdos.
• No âmbito das teorias do texto e do discurso, a semiótica tem obtido bons resultados:
* no exame do plano da expressão
* nas manifestações textuais
* na pintura
* na música
* nos textos sincréticos em geral.

• O discurso, a especificidade do literário do ponto de vista linguístico e discursivo não pode ser
determinado, a não ser pela organização do plano da expressão e pela forma peculiar de inserção
desse tipo de texto na cultura, na sociedade, na história.
• Os aspectos da organização da expressão e o das relações com o "extralinguístico" são
fundamentais no exame da literatura.
• O caráter "literário" ou poético" de um texto não pode ser determinado:
* por um único elemento ou por um único nível de descrição
* a partir do exame das estruturas narrativas ou das elaborações discursivas tomadas
separadamente.
• A inclusão do exame do plano da expressão na rota dos estudos semióticos leva, portanto, ao
estabelecimento de diálogos com:
* os estudos sobre a arte em geral
* a estética e a retórica,
* no Brasil, principalmente a literatura, a música, a canção e as artes visuais,
• Autores que produzem diálogos entre semiótica e retórica:
* Perelman, 1970, 1977;
* Dubois,
* Edeline & Klinkenberg, 1974;
* Perelman & Obbrechts-Tyteca, 1970;
* Discini, 2003

• Entre semiótica e literatura dirigem-se, sobretudo:


*ao tratamento das questões discursivas de persuasão e argumentação,
*da construção da identidade ou do éthos do enunciador
*do narrador e do exame das figuras de conteúdo e de expressão
• A semiótica trata das figuras retóricas de três formas (Barros, 19881), 2008, 2014):
* entre as figuras de conteúdo, as de "pensamento" são estudadas na sintaxe discursiva,
* no jogo de vozes instalado no discurso, as de "palavras",
* na semântica discursiva, a partir dos conceitos de isotopia, de tematização e de
figurativização.
- As figuras de expressão, por sua vez, são tratadas no âmbito das relações entre expressão e
conteúdo (Barros, 1988a, 2005, 2014).

Nos estudos semióticos das figuras de conteúdo, dos dois tipos, as figuras de retórica deixam
de ser figuras de palavras' ou de "pensamento", para ser retomadas como figuras de discurso.
• As figuras da expressão — simbolismos e semissimbolismos — são diferentes das figuras do
conteúdo, anteriormente citadas:
* as figuras do conteúdo produzem os efeitos de sentido de uma sensorialidade "de papel", de
"linguagem";
* as figuras da expressão estabelecem relações sensoriais novas entre a expressão e o conteúdo,
e criam efeitos de leitura do mundo, entre a novidade e a estereotipia cultural.
• O conceito de semissimbolismo assinala, em semiótica, a relação entre uma categoria (uma
relação) da expressão e uma categoria do conteúdo e diferencia-se, assim, dos sistemas
simbólicos de Hjelsmelv (1968), em que há relação termo a termo entre expressão e conteúdo.
• Os dois tipos de sistemas criam relações motivadas" entre expressão e conteúdo, são fortemente
sensoriais e corporais, e estão fundamentados sobre a tensividade que sobredetermina os termos
dos dois planos.
• A diferença entre eles, decorrente da diferença de relação que os caracteriza, é que, nos
sistemas simbólicos, a relação entre expressão e conteúdo é culturalmente determinada e
perpassa diferentes textos.
• A relação com a tensividade permite o exame das relações simbólicas semissimbólicas em um
patamar mais afastado do da substância da expressão e do conteúdo.
• Duas importantes variações do semissimbolismo:
* a da extensão do semissimbolismo no texto;
* a de nível de analise, tanto no plano do conteúdo quanto no da expressão.
• Os textos falados conversacionais, graças aos diferentes recursos e procedimentos utilizados
correlaciona-se, por sua vez, com organizações do plano do conteúdo construindo assim um
sistema semissimbólico que recobre o texto inteiramente.
• Em relação ao plano do conteúdo, podem ser correlacionadas a categorias da expressão
categorias abstratas fundamentais do plano do conteúdo. ação.
• Dessa forma, os semissímbolos, nos discursos poéticos, refazem o mundo e o saber sobre ele,
nas conversações, criam envolvimento interacional e emocional.
• Os textos conversacionais e os poéticos distinguem-se, portanto, pela dimensão do
semissimbolismo — de texto inteiro ou localizado — e pelo tipo de conteúdo — do nível
fundamental ou interacional — envolvido no semissimbolismo.
• O semissimbolismo nos textos sincréticos poderá, portanto, ser diferente, conforme as
categorias da expressão, com substâncias de ordens sensoriais diversas, correlacionem-se a uma
só categoria do conteúdo ou homologuem-se, cada uma delas, a uma categoria do conteúdo,
produzindo efeitos de sentido também diferentes:
* no primeiro caso, o efeito de sinestesia é quase o de confusão, sem distinção, das ordens
sensoriais;
*no segundo, as ordens sensoriais são mais bem diferenciadas e a relação
sinestésica entre elas aparece como o resultado de um trabalho de construção de sentidos.

• Hipótese sobre a gradação entre os sistemas simbólicos e os semissimbólico:


* de que há uma gradação, nos textos, entre os sistemas semissimbólicos e os sistemas
simbólicos, tal como aqui definidos.
• Exemplo em anúncio publicitário:
- O banco Bradesco, que emprega o vermelho para construir sua identidade visual, usa a cor tanto
simbolicamente — em anúncio do Dia dos Namorados.

5.3.3. O plano da expressão de textos não verbais

• A semiótica desenvolveu e continua a construir uma proposta teórica e metodológica para o


exame dos sentidos dos textos em geral.
*o percurso gerativo da significação apresentado metodologicamente para a construção dos
sentidos do texto aplica-se aos textos:
* verbais,
*orais ou escritos,
*aos textos não verbais
* aos textos sincréticos
• O plano da expressão se organiza, em qualquer texto, como um percurso gerativo. Nos textos
verbais, num primeiro nível, os traços fonético-fonológicos ou femas se combinam em
fonemas, nos níveis seguintes, os fonemas se combinam em sílabas, as sílabas em palavras"
fónético-fonológicas e essas palavras em expressão de textos.
• Os sistemas simbólicos e semissimbólicos ocorrem nos diferentes níveis de organização do
plano da expressão (e também no do conteúdo).
*o poema de João Cabral de Melo Neto, «os reinos do amarelo" (1975), a relação ocorre entre
os traços fonético-fonológicos ou femas da expressão e a categoria semântica fundamental do
conteúdo.
-Exemplo: primeira estrofe "A terra lauta da mata (...) e termina com (...) de um animal cobre,
pobre, podremente".
• Para o exame do plano da expressão dos textos visuais bidimensionais,os estudos dos
precursores dos semioticistas Jean Marie Floch e Felix Thulemann estabelecem níveis de
descrição e da aplicação do plano da expressão do visual.
• Na estrutura profunda do nível imanente, distinguem-se dois tipos de categorias: as
constitucionais e as topológicas ou não constitucionais.
• As constitucionais, por sua vez, são ditas constituintes ou cromáticas, como, por exemplo, a
categoria quente vs. frio, e constituídas ou eidéticas, como, por exemplo, a categoria reto vs.
curvo. As categorias topológicas estabelecem a disposição das configurações plásticas no
espaço, como, por exemplo, a categoria alto vs. baixo.

5.3.4 Considerações finais

• No texto em estudo foi construído no conceito de texto na perspectiva da semiótica discursiva


francesa, mostrando como a semiótica diferencia texto e discurso.
*Para a semiótica, o texto distingue-se do discurso por ter conteúdo e expressão.
*O texto, para a semiótica, não é, portanto, apenas o texto escrito ou mesmo verbal.

• Três questões principais foram apontadas:


*a programação temporal do texto verbal, decorrente de seu plano da expressão e com base,
sobretudo, no princípio linearidade do significante;
*as relações entre expressão e conteúdo, e as figuras da expressão, semissímbolos e símbolos,
em textos verbais escritos e falados e em textos visuais bidimensionais (pintura e fotografias
publicitárias);
*a expressão de textos não verbais
• A semiótica sempre se apresentou como uma teoria do discurso, mas, cada vez mais, para dar
conta dos sentidos dos discursos, precisa se debruçar sobre o texto e sobre as questões que
envolvem o plano da expressão.

Você também pode gostar