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João Pessoa
2019
INGRID MARIA MELQUIADES JUREMA
João Pessoa
2019
J91c Jurema, Ingrid Maria Melquiades.
Crianças que matam: um breve estudo sobre as implicações
diagnósticas na infância.
Data: ________________
( ) Aprovada
( ) Reprovada
BANCA AVALIADORA
________________________________________________________________
Profa. Dra. Maria das Mercês Maia Muribeca.
(Orientadora - UNIPÊ)
________________________________________________________________
Profa. Esp. Monica Domingos Bandeira
(Membro – UNIPÊ)
________________________________________________________________
Prof. Esp. Cristóvão de Melo Goes Júnior
(Membro – UNIPÊ)
AGRADECIMENTOS
À minha mãe, por ser meu porto seguro e minha maior fonte de admiração.
Hebert de Souza
RESUMO
The main objective of the present work was to understand psychopathy, addressing
how it was understood throughout history to the present day, also clarifying its vision
under a psychoanalytic approach, which incorporates its terminology, explaining the
psychic instances as well as the structure characterization of this pathology. It is
understood that psychopathy is a topic that generates controversy, since it is not
included in medical books of pathologies, such as DSM-5, which were cited in this
study. Thus, this research also investigated the consequences of behavioral disorders,
more specifically antisocial personality disorder and challenging oppositional disorder,
in the development of deviant child behavior from the point of view of psychiatry. In
addition, the understanding of psychopathy was included in the forensic context, as
well as an analysis of some scenes from the film The Evil Angel and of real cases that
illustrate the perverse conduct of a child, seeking to verify the correlation of these
conducts with the pathologies mentioned above. In its elaboration, the methodology
used was a bibliographical research where theoretical, scientific articles and books that
explored the subject in question were explored. With this, it was aimed to integrate
more knowledge about this little topic that is the child perversion, in order to understand
its implications in a future diagnosis of psychopathy in its adult phase.
1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................5
1 INTRODUÇÃO
Com isso, tendo como objetivo principal trazer esclarecimentos acerca desta
temática, no primeiro capítulo poder-se-á observar como inicialmente surgiram os
primeiros estudos sobre a psicopatia, bem como a mesma é compreendida sob o
contexto psicanalítico. No segundo capitulo, tratou-se de elucidar a respeito da
psicopatia, tomando como base sua visão no aspecto da psicopatologia, clarificando
os transtornos de conduta, presentes no DSM-5, tais como o Transtorno de
Personalidade Antissocial e o Transtorno Opositor Desafiante, que podem estar
relacionados a mesma, para assim verificar suas correlações com a perversão infantil.
Dentro do terceiro capitulo, abordou-se sobre a psicopatia no âmbito forense,
especificando comportamentos de indivíduos que podem ser considerados psicopatas
de acordo com este contexto. Ademais, foram trazidas cenas do filme O Anjo Malvado,
bem como exemplos de casos reais de crianças perversas que cometeram crimes
com requintes de crueldade, que foram analisados no presente trabalho, para assim
averiguar a possível presença de um diagnóstico de psicopatia nesta precoce fase de
desenvolvimento biopsicossocial, com base nos comportamentos apresentados pelas
mesmas.
Hare elabora uma escala, revisada e validada no Brasil nos anos 2000, denominada
Escala Hare PCL-R (Psycopathy Checklist Revised), o teste tem por finalidade
mensurar os graus de psicopatia de um indivíduo para verificar o risco de reincidência
criminal do mesmo (HARE,2004). Esta escala analisa de maneira precisa várias
características da personalidade psicopática, desde os relacionados aos sentimentos
e relacionamentos interpessoais até o modo de viver dos psicopatas, bem como seus
comportamentos explicitamente antissociais e transgressores (SILVA, 2008). Os
critérios adotados por Hare para diagnosticar este transtorno de personalidade são
globalmente aceitos até hoje.
Atualmente a nomenclatura da psicopatia não está inserida no DSM-5, porém
ela pode ser relacionada ao Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS).
Entretanto, alguns autores entendem a psicopatia como uma co-mordidade do TPAS,
associada a comportamentos antissociais mais violentos. Com isso, concebe-se que
o TPAS envolve indivíduos com personalidade psicopática, bem como com
comportamento antissocial, no entanto, em alguns casos há a ausência dos demais
atributos interpessoais e afetivos da psicopatia, considerados fundamentais para a
classificação do diagnóstico (MARTENS, 2000 apud HAUCK; TEXEIRA; DIAS, 2009).
responsáveis pela regulação dos nossos conteúdos mentais, tais como pensamentos
e sentimentos, através de mecanismos de defesa, bem como, por suprir ou motivar
nossos desejos e prazeres.
Sendo assim, Freud (1923, p. 11), descreve o Ego da seguinte forma:
Formamos a idéia de que em cada indivíduo existe uma organização coerente
de processos mentais e chamamos a isso o seu ego. É a esse ego que a
consciência se acha ligada: o ego controla as abordagens à motilidade - isto
é, à descarga de excitações para o mundo externo. Ele é a instância mental
que supervisiona todos os seus próprios processos constituintes e que vai
dormir à noite, embora ainda exerça a censura sobre os sonhos. Desse ego
procedem também as repressões, por meio das quais procura-se excluir
certas tendências da mente, não simplesmente da consciência, mas também
de outras formas de capacidade e atividade.
Com isso, entende-se que o Ego diz respeito a nossa experiência consciente e
a autorregulação de nossos instintos, ele é o nosso Eu, a “camada’’ do nosso aparelho
psíquico que podemos acessar mais facilmente.
Ainda nesta obra, Freud se refere a instância psíquica denominada Superego
que, tal qual o Id, age no inconsciente do indivíduo, porém é entendido como um
‘’sentimento inconsciente de culpa’’ (1923, p. 16) e descrito pelo mesmo como o ideal
do Ego. Assim, compreende-se que o Superego corresponde aos aspectos morais da
personalidade, agindo como o algoz do Ego (Freud, 1923).
Partindo deste pressuposto, Freud (1923, p. 21) distingue o Ego e o Superego
da seguinte maneira:
Enquanto que o ego é essencialmente o representante do mundo externo, da
realidade, o superego coloca-se, em contraste com ele, como representante
do mundo interno, do id. Os conflitos entre o ego e o ideal, como agora
estamos preparados para descobrir, em última análise refletirão o contraste
entre o que é real e o que é psíquico, entre o mundo externo e o mundo
interno.
Sendo assim, Freud (1923, p. 89), também diferencia estas duas estruturas de
personalidade, indagando que “a neurose é o resultado de um conflito entre o Ego e
o Id, ao passo que a psicose é o desfecho análogo de um distúrbio semelhante nas
relações entre o Ego e o mundo externo’’.
Com base nisto, pode-se compreender que a neurose é normalmente abordada
como uma contraposição à psicose, pois ambas divergem na forma como geram a
perda da realidade bem como o adoecimento psíquico.
Portanto, a partir do exposto acima percebe-se que a neurose e a psicose são
estruturas de personalidade que podem ocasionar patologias ligadas a sentimentos
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traumáticos experienciados por um indivíduo, que podem advir tanto do seu mundo
externo quanto do seu mundo interno, porém, em indivíduos com a estrutura de
personalidade perversa, os sentimentos são empobrecidos, devido à ausência de
moral e de culpa.
No entanto, Freud (1905), em seu artigo Fragmento da Análise de um Caso de
Histeria, descreveu a perversão como um desvio de personalidade de indivíduos que
apresentavam conduta sexual atípica, que estava ligada as pulsões, bem como
postulava que nem todo indivíduo que apresenta perversão sexual possui uma
estrutura de personalidade perversa propriamente dita. Ainda de acordo com o mesmo
(1905, p. 53-54):
Todos os psico-neuróticos são pessoas de inclinações perversas fortemente
acentuadas, mas recalcadas e tornadas inconscientes no curso do seu
desenvolvimento. Por isso suas fantasias inconscientes exibem um conteúdo
idêntico ao das ações documentadas nos perversos [...]
A partir disso, também pode-se observar que Freud não se utiliza do termo
psicopatia, tema central deste trabalho, para designar estes tipos de indivíduos
mencionados acima, classificando-os como perversos, assim, para o mesmo, a
perversão pode ser entendida como uma categoria particular de base subjetiva,
anseio e desvario (ROUDINESCO, 2011).
Ainda a respeito da estrutura de personalidade perversa, Aulagnier-Spairani
(1967 apud MENESES; FERREIRA, 2011) afirma que estes possuem uma formatação
de seu aparelho psíquico distinta dos neuróticos e dos psicóticos, pelo fato de que no
perverso o Ego barganha suas condições com as vontades do Id, bem como com a
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realidade. Com isso, estes indivíduos realizam os anseios que os neuróticos não
conseguem externar, ou seja, o perverso consegue de modo simultâneo reflexionar
as exigências do Id e do Ego, sem que as mesmas entrem em conflito. Assim, não há
a repressão dos anseios, presente no neurótico, nem mesmo a negação da realidade,
presente no psicótico.
Por conseguinte, embora muitos teóricos da abordagem psicanalítica não se
utilizem da nomenclatura da psicopatia, pode-se perceber que existem pontos comuns
entre esta e a perversão, como o fato de não reprimirem os seus desejos e serem
regidos pelo princípio do prazer.
Ainda de acordo com Carvalho (1996), Freud diferencia determinados números
de pulsões, constantemente relacionadas as pulsões sexuais que rememoram o
desenvolvimento do processo de perversão. Porém, a noção de pulsão parcial é
trazida por Freud após suas comparações entre a neurose e a psicose.
Com isso, compreende-se que a sexualidade perversa está relacionada a este
tipo de pulsão, descrevendo assim, segundo Carvalho (1996, p. 36), “a perversidade
polimorfa, no centro da organização sexual infantil’’. Sendo assim, faz-se importante
elucidar como se entende a perversão no âmbito da infância, tema de interesse do
presente trabalho.
que haja algum interesse por trás, bem como incapacidade de reconhecer valores
morais, de cumprir com suas obrigações, apresentando também a ausência de culpa.
Na estrutura antissocial propriamente dita, o indivíduo também possui as
mesmas condutas antissociais descritas anteriormente, porém sem a presença do
narcisismo maligno. Já na personalidade narcisistica com conduta antissocial, além
deste comportamento desviante, o indivíduo tem uma estruturação de personalidade
narcisistica, embora também não haja o narcisismo maligno nesta conjuntura e o
indivíduo apresente as características comportamentais descritas anteriormente,
nesta categoria o mesmo é capaz de sentir culpa (KERNBERG, 1995).
Ainda de acordo com Kernberg (1995), os sintomas mais presentes nestes
indivíduos são: encanto superficial e manipulação, mentiras sistemáticas e
comportamento fantasioso, ausência de sentimentos afetuosos, amoralidade,
impulsividade, incorrigibilidade e falta de adaptação social.
Fundamentado nestas características, Kernberg buscou obter uma melhor
compreensão da personalidade de um psicopata, de acordo com a abordagem
psicanalítica, para assim relacionar o tipo de narcisismo que está vinculado a essa
patologia, com o intuito de obter um diagnóstico mais preciso da mesma.
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Ainda de acordo com DSM-5 (2014, p.659), para haver um diagnóstico preciso
de transtorno de personalidade antissocial devem ser considerados os seguintes
critérios:
A. Um padrão difuso de desconsideração e violação dos direitos das outras
pessoas que ocorre desde os 15 anos de idade, conforme indicado por
três (ou mais) dos seguintes:
1. Fracasso em ajustar-se as normas sociais relativas a comportamentos
legais, conforme indicado pela repetição de atos que constituem motivos
de detenção.
2. Tendência a falsidade, conforme indicado por mentiras repetida, uso
de nomes falsos ou de trapaça para ganho ou prazer pessoal.
3. Impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro.
4. Irritabilidade e agressividade, conforme indicado por repetidas lutas
corporais ou agressões físicas.
5. Descaso pela segurança de si ou de outros.
6. Irresponsabilidade reiterada, conforme indicado por falha repetida em
manter uma conduta consistente no trabalho ou honrar obrigações
financeiras.
7. Ausência de remorso, conforme indicado pela indiferença ou
racionalização em relação a ter ferido, maltratado ou roubado outras
pessoas.
B. O indivíduo tem no mínimo 18 anos de idade.
C. Há evidências de transtorno de conduta com surgimento anterior aos 15
anos de idade.
D. A ocorrência de comportamento antissocial não se dá exclusivamente
durante o curso de esquizofrenia ou transtorno bipolar.
Com isso, compreende-se que embora não haja cura para esta patologia, com o
passar do tempo indivíduos que a apresentam tendem a diminuir a incidência de seus
comportamentos desviantes
Em crianças, este tipo de transtorno é entendido como um transtorno de conduta,
no qual obedece um parâmetro de comportamento recorrente e perseverante,
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infringindo os direitos dos outros sem se importar com as consequências de seus atos
na vida dos mesmos, pois não sentem culpa em desobedecer as normas sociais
pertinentes a idade (DSM-5, 2014).
O DSM-5 (2014) também destaca que a possibilidade de desenvolvimento de
um transtorno de personalidade antissocial na fase adulta pode ser ampliada se o
transtorno de conduta teve seu surgimento ainda na infância, antecedendo os 10 anos
de idade, bem como, a presença de déficit de atenção e hiperatividade interligada a
este aspecto.
O referido manual (2014, p. 661) ainda afirma que “abuso ou negligencia
infantil, paternidade/maternidade instável ou errática ou disciplina parental
inconsistente podem aumentar a probabilidade de o transtorno de conduta evoluir para
transtorno da personalidade antissocial’’. Isto reafirma a persuasão que os fatores
externos tem na construção da personalidade de uma pessoa.
No entanto, fatores internos, como os genéticos e fisiológicos também podem
ser correlacionados com o desenvolvimento desta patologia, visto que a mesma é
mais frequente em indivíduos que possuem familiares biológicos de primeiro grau que
também tem este transtorno (DSM-5, 2014).
No que se refere ao transtorno de conduta propriamente dito, o DSM-5 (2014)
o aborda na categoria de transtornos disruptivos, do controle de impulsos e da
conduta, no qual abarca circunstâncias ligadas a dificuldades de autocontrole de
emoções, bem como de comportamentos. Ainda faz-se importante ressaltar que
embora o transtorno de personalidade antissocial esteja inserido na categoria de
transtornos de personalidade, ele também é considerado um transtorno de conduta,
devido ao fato de ambos estarem relacionados a comportamentos transgressores.
Sendo assim, são extensos os critérios para diagnosticar o transtorno de
conduta, com isso, das características de comportamentos exibidos por um indivíduo
que possui esta patologia, estão: a agressão a pessoas e animais, destruição de
propriedade, falsidade ou furto e violações graves de regras (DSM-5, 2014).
O presente manual (2014, p. 470) ainda traz os seguintes subtipos deste
transtorno, que são primordiais para se obter um diagnóstico do mesmo:
312.81 (F91.1) Tipo com início na infância: Os indivíduos apresentam pelo
menos um sintoma característico de transtorno de conduta antes dos 10 anos
de idade.
312.82 (F91.2) Tipo com início na adolescência: Os indivíduos não
apresentam nenhum sintoma característico de transtorno de conduta antes
dos 10 anos de idade.
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Então, pode-se observar que este transtorno geralmente aparece como uma
comorbidade de outros transtornos, como o transtorno depressivo maior e transtornos
de ansiedade. Assim como é importante destacar que fatores ambientais e sociais
também podem colaborar para o aparecimento deste transtorno em crianças, como
experienciar interações problemáticas, frequentemente relativas ao convívio com pais
hostis, tal qual mencionado anteriormente.
Devido a isso, é imprescindível identificar a existência de outros transtornos por
trás deste, bem como averiguar a influência do ambiente familiar na formação de sua
conduta para que haja maior êxito em seu diagnóstico e tratamento.
A partir dos conteúdos explanados no presente capítulo, podemos observar
como transtornos que se caracterizam por comportamentos transgressores são
entendidos através de um contexto clínico, assim, percebe-se que tais aspectos
podem possuir uma relação direta com a conduta perversa de uma criança.
Com isso, no capítulo a seguir, estas condutas serão abordadas sob a visão
forense, fazendo uma análise da ligação da psicopatia com a execução de delitos
impudicos, bem como exemplificadas de acordo com a ficção, além de casos verídicos
de crianças que exibiram desvios de comportamento que as levaram ao limite, afim
de compreender a relação entre estes transtornos com sua motivação para matar.
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indivíduo já é encarado como doente, não tendo capacidade de responder por seus
atos. O nível 21 corresponde aos psicopatas que não comentem o homicídio de fato,
mas coloca suas vítimas sob intensa tortura e por fim, no nível 22, estão os psicopatas
que torturam suas vítimas por um longo tempo e por fim, as matam, o principal
estimulo destes indivíduos é a tortura, porém na maioria dos casos o homicídio tem
uma justificativa sexual, mesmo que inconscientemente (CABRAL, 2018).
Assim, a partir dessa escala, pode-se observar que a maldade não é um
atributo pertencente somente a indivíduos psicopatas, bem como percebe-se que
existem vários níveis de psicopatia. Deve-se salientar também que é importante
conhecer estes graus de maldade para estabelecer uma análise do comportamento
das crianças que cometeram crimes hediondos, que serão mencionadas no presente
trabalho, para assim verificar se as mesmo podem ser classificadas como possíveis
psicopatas ou se trataria apenas de transtornos de conduta, que também serão
discutidos neste estudo.
Entretanto, no tocante ao tipos de psicopatia, como já mencionado
anteriormente, existem aqueles psicopatas que não incorrem necessariamente em
homicídios, devido a isso, eles se misturam dentro da sociedade facilmente, por serem
hábeis manipuladores, conseguem passar uma falsa imagem de credibilidade e com
isso adquirindo tudo que almejam, isto dificulta o reconhecimento destes predadores
sociais no meio em que vivemos.
Com isso, pode-se mencionar o psicopata subclinico que, como dito
anteriormente, é aquele que está integrado na sociedade, passando despercebido
pela mesma. Este tipo de indivíduo possui uma vida aparentemente perfeita, porém
trata-se de um predador emocional, que age causando intenso sofrimento psicológico
aqueles que lhe rodeiam, provocando uma violência invisível e, portanto, de difícil
detecção. Por vezes, este tipo de psicopata ocupa grandes cargos em empresas,
tendendo a levar seus funcionários ao limite do esgotamento e obtendo prazer com
isso, porém seu comportamento é visto como aceitável devido ao mercado de trabalho
atual enxergar este indivíduo como alguém competitivo e de ambição, características
valorizadas neste meio (VELASCO, 2015).
Com isso, Velasco (2015) afirma que, de acordo com o âmbito forense, a
principal distinção entre psicopatas criminosos e psicopatas subclínicos, integrados a
sociedade, reside no fato de que os psicopatas criminosos transgridem as leis de fato,
cometendo atos ilícitos, tais como roubo, prevaricação, delito fiscal, homicídio,
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agressão sexual, dentre outros, enquanto que os subclínicos não praticam tais ações.
Portanto, embora ambos compartilhem de igual estrutura básica de personalidade e
emoções, há uma diferença em seus aspectos comportamentais que faz com que
alguns apresentem atitudes antissociais e delinquentes e outro não.
A partir disto, tendo em vista a dificuldade de reconhecer e de se estudar
indivíduos com psicopatia, a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva (2008, p. 74) traz a
seguinte explicação:
Um grande e limitante problema em realizar pesquisas sobre os psicopatas é
que elas, em geral, só podem ser feitas em penitenciárias, e isso é
perfeitamente compreensível, afinal é muito difícil um psicopata
‘’subcriminal’’, ou seja, aquele que nunca foi preso ou internado em
instituições psiquiátricas, falar espontaneamente sobre seus atos ilícitos. Na
grande maioria das vezes, eles não possuem nenhum interesse em revelar
algo significativo para os pesquisadores ou mesmo para os funcionários do
presidio e quando o fazem tentam manipular a verdade somente para obter
vantagens, como a redução da pena por ‘’ bom comportamento’’ e
‘’colaborações de cunho social’’ [...]
ápice quando a mãe de Henry se vê tendo que fazer uma difícil escolha, com cada um
de seus braços segurando os dois, sem forças para puxá-los conjuntamente, larga o
próprio filho, que depois de tudo ainda lhe suplicava cinicamente para soltar o primo
e lhe ajudar, e opta por salvar o sobrinho. E assim se dá o término do filme.
Neste contexto, pode-se perceber que Henry era um garoto de personalidade
deformada, que apesar de crescer em um lar estruturado e amoroso, não suportava
dividir a atenção dos pais com os irmãos, não por amor excessivo, mas pelo
sentimento de posse que tinha sob ambos, de ter a necessidade de ser o único na
vida deles.
Nota-se também que seus pais eram relativamente omissos, pois nunca se
deram conta do comportamento transgressor do garoto, talvez devido ao seu alto
poder de persuasão ou até mesmo por se negarem a acreditar que o próprio filho era
perverso, precisando chegar alguém de fora (Mark) para reconhecer que tais atitudes
não eram compatíveis com o comportamento típico de um garoto da sua idade. O fato
é que Henry pode ser considerado o exemplo autentico de uma criança psicopata.
Ao indagar estas cenas, pode-se pensar que se trata apenas de ficção, porém
existem casos reais de crianças com condutas tão perversas quanto as descritas
anteriormente. Assim, dentre os casos mais conhecidos de crimes cometidos por
crianças, destacam-se os cometidos por Mary Bell, que aos 10 anos de idade fez suas
duas primeiras vítima e aos 11 sua terceira vítima, ambos meninos de 3 e 4 anos de
idade, respectivamente. Desde mais nova, Mary já apresentava sinais de um possível
transtorno de personalidade antissocial, maltratando animais, surrando suas bonecas
e até mesmo treinando estrangulamento em outras crianças de sua escola e
cometendo roubos e depredações.
No ano de 1968, Mary foi suspeita de empurrar o próprio primo, sua primeira
vítima, de uma escada, causando-lhe sérios ferimentos na cabeça. Ainda no mesmo
ano, com a ajuda de uma amiga, Mary fez sua segunda vítima em uma casa
abandonada, ambas só foram descobertas porque após vandalizar uma creche,
escreveram em uma parede a confissão do assassinato de sua segunda vítima, bem
como, logo em seguida ao ocorrido cometeram outro estrangulamento, fazendo assim,
sua terceira vítima (RANGEL, 2017).
O que impressionou a polícia foram os requintes de crueldade utilizador para
assassinar a criança, que foi encontrada com as genitais despeladas e com a letra M
talhada em sua barriga, bem como sua indiferença e ausência de remorso pelo que
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havia feito. Mary foi declarada culpada por seus crimes e levada a uma clínica
psiquiátrica judiciária, em 1973, sendo solta em 1980 por não ser mais considerada
como um perigo para a sociedade (RANGEL, 2017).
Entretanto, ao analisarmos a infância e o ambiente familiar no qual Mary
cresceu, observa-se que ela se tomou um produto do meio em que viveu, um lar
marcado por constantes agressões e abusos físicos e psicológicos provocados por
sua própria mãe, uma mulher de sanidade mental duvidosa, que a rejeitava e cometia
diversos tipos de negligencia com a mesma. Isso fez com que Mary desenvolve-se
uma conduta transgressora como forma de descontar toda a raiva que tinha dentro de
si, por tudo que já havia sofrido.
Este caso exemplifica claramente como fatores ambientais e sociais podem
influenciar no surgimento de um transtorno de personalidade antissocial infantil, como
mencionado nos capítulos anteriores do presente trabalho, isto pode ser averiguado
ao notar que a partir do momento que Mary foi retirada do ambiente nocivo no qual
vivia e colocada em outro ambiente completamente diferente de sua antiga realidade,
seu comportamento mudou, levando a mesma hoje em dia uma vida normal.
Outro caso verídico de crianças que cometeram crimes perversos que deve-se
destacar, se refere ao caso ocorrido no ano de 1993 e que impactou a sociedade na
época, onde os dois garotos Jon Vernables e Robert Thompson, de apenas 10 anos
de idade, sequestraram, violentaram, torturaram e mataram o pequeno James Bulger,
de apenas 3 anos de idade.
No dia do crime, os garotos se encontravam desacompanhados em um
shopping de sua cidade já cometendo pequenos delitos como cabular aula e furto de
doces, ao passo que a futura vítima dos mesmos passeava pelas imediações com sua
mãe, quando por apenas alguns minutos de distração ela lhe perdeu de vista.
Sendo assim, os dois garotos, que como mostraram as filmagens de câmeras
localizadas nos arredores de onde tudo aconteceu naquela época, que já estavam
espreitando crianças pequenas por lá, provavelmente buscando possíveis vítimas,
encontraram o pequeno James ali desacompanhado e viram nele a oportunidade de
executarem suas atrocidades. Então, atraíram a criança para acompanhá-los em uma
caminhada a aproximadamente quatro quilômetros de distância do local de origem e
exatamente ali ele encontrou seu fim. Os garotos o apunhalaram com uma barra de
metal e o violentaram sexualmente, por cerca de 45 minutos e posteriormente,
arrastaram seu corpo já sem vida para os trilhos de um trem que havia nas
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da sensação de matar alguém, nele ela confessa que estrangulou sua vítima e depois
cortou sua garganta, afirmando ainda que foi incrível. Assim, embora sua defesa
alegasse que a garota possuía problemas psiquiátricos, ela foi julgada como adulta e
recebendo a pena de prisão perpetua (SODRÉ, 2015).
No caso em questão, pode-se então observar evidências de um possível
transtorno de conduta, com tendências antissociais, visto que a adolescente
premeditou o crime, bem como se vangloriou de seu feito, sem remorso algum, tal
qual um psicopata. Entretanto, também faz-se importante ressaltar que, assim como
nos outros casos acima citados, a garota advinha de um lar desestruturado, com pais
divorciados e ausentes, este fator também pode ter contribuído para desencadear sua
conduta digressiva.
Por fim, como último caso que faz-se relevante mencionar no presente trabalho,
é o caso Graham Young, que desde muito jovem já demonstrava interesse assíduo
pela química, principalmente sobre venenos e seus impactos. Assim, aos 14 anos de
idade deu início aos seus experimentos. Alegando se tratar de trabalhos escolares, o
garoto consegui ter acesso as substâncias e com isso, começou a fazer suas primeiras
vítimas, que foram sua família e amigos, dentre eles, seu próprio pai foi o primeiro
familiar que o garoto começou a envenenar e posteriormente, sua mãe e sua irmã,
todos exibiam os mesmos sintomas: diarreia, vômitos e fortes dores no estomago
(SODRÉ, 2015).
Por conseguinte, no ano de 1962, sua madrasta faleceu vítima de
envenenamento, mas até então ninguém suspeitava do garoto, até que seu professor
começou a perceber atitudes suspeitas advindas de Graham, como por exemplo, os
experimentos que ele sugeria em sala. Sendo assim, ao examinar sua carteira,
descobriu venenos, estudos a respeito da utilização de tais substancias, bem como
desenhos de pessoas mortas. Com isso, o garoto foi condenado a cumprir pena em
um hospital de segurança máxima (SODRÉ, 2015).
Mas sua conduta criminosa não parou por ai, durante sua permanência no
hospital, Graham envenenou outros internos e até mesmo a equipe médica. Contudo,
aos 23 anos de idade, foi liberado, indo viver com sua irmã. No entanto, ele ainda não
estava reabilitado e continuou a envenenar as pessoas, tais como seus colegas de
trabalho. Isto fez com que o mesmo voltasse para a prisão, onde permaneceu até o
ano de sua morte, em 1990 (SODRÉ, 2015).
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
CRUZ, L. Justiça solta assassinos de James Bulger. Folha Uol, 2001. Disponível
em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2306200101.htm. Acessado em 02 de
maio de 2019.
DOLTO, F. – Seminário de Psicanálise de Crianças – vol.II. Editora Guanabara,
Rio de Janeiro,1985
FREUD, S. (1905). Fragmento da análise de um caso de histeria, ESB, v. VII, P.
53-54, 1989.
FREUD, S. (1916). Instinto e suas Vicissitudes. Edição Standard Brasileira das
Obras Psicológicas Completas. Vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
FREUD, S. (1923). Neurose e psicose. In: Freud S. O ego e o ID e outros trabalhos.
Rio de Janeiro: Imago, 1987.
HARE, R. D. Manual Escala Hare PCL - R: critérios para pontuação de
psicopatia - revisados. Versão brasileira: Hilda Morana. São Paulo: Casa do
Psicólogo, 2004.
HAUCK, N. F.; TEIXEIRA, M. A. P.; DIAS, A. C. G. Psicopatia: o construto e sua
avaliação. Aval. psicol. v.8 n.3 Porto Alegre dez. 2009.