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Responsabilidade ambiental

Qual é o papel da ética na responsabilidade ambiental?

Neste ensaio será abordada a temática da responsabilidade que as pessoas possuem


sobre o ambiente e o papel da ética nisso. Tem como objetivo sensibilizar as pessoas
face às responsabilidades que cada um é encarregue face ao ambiente de forma a “criar”
o mundo o melhor possivel para as gerações atuais e futuras não só de humanos, mas
também de todas as espécies de animais.

Este problema da responsabilidade ambiental começou já na era da Revolução


Industrial. Esta, como o nome indica, revolucionou o mundo dos humanos, através da
criação de bens materiais em massa que melhoraram significativamente as condições de
vida dos seres humanos do século XVIII. Mas essa revolução acarretou um custo
pesado, não em termos económicos, mas sim ambientais. A revolução industrial
conseguiu possibilitar essa criação de bens através do desenvolvimento de industrias,
com a criação de fábricas com máquinas a vapor. O problema é que além de
necessitarem de recursos como o carvão para o seu funcionamento, também emitiam
gases poluentes para o ar que as pessoas respiravam, algo que causou eventos como O
Grande Nevoeiro de 1952, que consistiu na acumulação perto do solo de gases nocivos
libertados por fábricas em Londres durante 5 dias, que acabou por provocar a morte de
entre 4 mil a 12 mil pessoas. Esses aspetos negativos da Revolução Industrial não
ficaram no passado, aliás esses efeitos intensificaram-se com o tempo, pois ocorreu o
desenvolvimento dessas industrias, o que aumentou imenso essas emissões de gases
nocivos para o ar que respirámos e, com o consequente aumento da população mundial,
o número de recursos mundiais gastos atingiu níveis cada vez mais elevados. Isso tudo
leva-nos aos dias de hoje e à atualidade deste problema. De acordo com a FAO
(Organização das Nações Unidas para a Alimentação e agricultura), por ano são
destruídos 10 milhões de hectares de floresta, se juntarmos esses dados com outros
sobre a emissão de 43 biliões de toneladas de dióxido de carbono (em 2019) podemos
verificar que a qualidade de ar no planeta Terra está a diminuir, algo que, de acordo a
OMS, mata aproximadamente 7 milhões de pessoas por ano. A emissão de gases de
efeito de estufa (GEE) também vai provocar o efeito de estufa, que vai causar o
aumento da temperatura terrestre, esse aumento da temperatura global vai causar o
derretimento do gelo dos polos e então a subida do nível das águas do mar que já
começa a afetar as zonas costeiras do globo. Isto tudo mostra a assustadora atualidade
da necessidade da responsabilidade ambiental e o porquê de eu necessitar de fazer esta
tese.

Face a este tema da responsabilidade ambiental surgiram várias teses que debatem sobre
o problema. Uma dessas teses, criada pelo filosofo Hans Jonas, aborda-o numa posição
antropocêntrica, no seu ensaio: O Principio da Responsabilidade. Segundo Jonas, os
avanços científicos permitiram que o ser humano adquirisse um poder e controlo sob o
planeta Terra enorme. Mas “com grande poder vem grande responsabilidade” (Lee. S.,
1962: 13) e essas vantagens, rapidamente se podem tornar desvantagens devido às suas
enormes capacidades destrutivas (como energia nuclear). Então vai ser imperativo
intervir para garantir a sobrevivência das futuras gerações de humanos na Terra, “Aja de
forma que os efeitos da sua ação sejam compatíveis com a permanência de uma vida
humana autentica na Terra.” (Jonas, H., 1995:40). Em suma segundo Hans Jonas, n’O
Principio da Responsabilidade, defende que a ação humana na natureza tem de ser
pautada e responsável de forma a permitir a sobrevivência das gerações futuras com
uma qualidade de vida boa. É por isso que esta ética vai ser considerada
antropocêntrica, pois os instigadores da responsabilidade ambiental são, segundo Jonas,
os interesses e necessidades humanas, para continuar com a sua espécie, e não a
natureza e a sua estabilidade e integridade.

Outra tese sobre o tema do papel da ética na responsabilidade ambiental foi proposta,
não por um filosofo de profissão, mas sim por um engenheiro florestal e ambientalista
norte-americano chamado Aldo Leopold. No seu livro Pensar Como uma Montanha,
Leopold critica a relação entre os humanos e a natureza e o impacto que estes têm sobre
ela. O autor, na sua ética denominada a Ética da Terra, opõe-se ao antropocentrismo e
rejeita o individualismo, defendendo que todo o ecossistema, ou como ele denomina,
toda a comunidade biótica tem um estatuto moral “A ética da terra simplesmente
aumenta os limites da comunidade para incluir os solos, a água, plantas, e animais, ou
em coletivo: a terra.” (Leopold A., 1949: 204). Segundo Leopold, os seres humanos vão
passar a ter deveres morais para com a comunidade biótica “Em suma, a Ética da Terra
muda o papel do Homo Sapiens de conquistador da comunidade terrestre para um
simples membro. Isso implica respeito para com os outros membros e respeito pela
comunidade biótica em todo.” (Leopold A. 1949:204), passando a ser necessário então
preocupar-nos primariamente com a preservação de todo o ecossistema e não com os
interesses de cada um dos organismos individuais, ou seja, o valor intrínseco do todo
(comunidade biótica) é superior ao dos indivíduos que a compõem. Devido a esta
posição esta ética é considerada holista, pois dá prioridade ao todo face às partes que
constituem esse todo. A Ética da Terra defende então, que nós devemos fazer aquilo que
promove a integridade, estabilidade e beleza da comunidade biótica sendo o bem desta o
padrão último do valor moral das ações (Callicott J. s/d:216) e só assim
desenvolveremos uma verdadeira responsabilidade ambiental.

A minha posição e a tese que vou defender é a que fundamenta que a nossa
responsabilidade ambiental tem de ter em vista o bem da comunidade biótica e não os
interesses das partes que a constituem, ou seja defendo a Ética da Terra. Tomo esta
posição pois a razão de estarmos numa situação de emergência climática, no meu ponto
de vista, é exatamente a falta de preocupação que os seres humanos têm com a natureza,
proveniente de um antropocentrismo ético, que considerava a natureza um mero
instrumento, o que levou aos seres humanos abusarem desta, colocando-nos nesta
situação.

Para apoiar esta minha posição apelo à ética de Kant. Segundo este uma ação respeita a
lei moral se é realizada com uma boa vontade, ou seja, se é realizada por dever. Ao
tomarmos ações de responsabilidade ambiental apenas porque queremos permitir a vida
das gerações futuras estamos a fazer uma ação em mera conformidade com o dever,
pois a ação está condicionada por inclinações próprias (o desejo da continuação da
espécie) e não pelo dever, que ter responsabilidade ambiental é o correto de se fazer,
não só para com os humanos, mas para com toda a natureza em si, pois esta possui um
valor intrínseco superior ao dos indivíduos que a compõem, incluindo os humanos.

Além disso o antropocentrismo “esquece-se” que os humanos também são seres vivos,
provenientes da Natureza e que foi ela que permitiu aos humanos realizar todas as
conquistas que atingiram e se orgulham, pois sem a Natureza, o ser humano não teria
nem recursos nem abrigo para os realizar. O antropocentrismo ético permitiu abusos da
Natureza, então é necessária uma mudança no modo de pensar dos seres humanos,
descartando esse individualismo e valorizando-a pelo seu valor verdadeiro, pois sem ela
não teríamos as praias que certas pessoas gostam de frequentar, atividades de
campismo, rafting, entre outras atividades ao ar livre.

A aparente radicalidade desta ética fez com que vários filósofos a criticassem. Estes
defendiam que a Ética da Terra ao dar prioridade ao todo face às partes que o
constituem iam permitir maus tratos e desrespeito das partes que o constituem, inclusive
de humanos, fazendo uma comparação ao fascismo, este, com o ultranacionalismo, diz
que o bem da nação é superior a tudo o resto e podem-se sacrificar pessoas para atingir
esse bem. Esses filósofos também apontaram que ao se defender a Ética da Terra
também se iria defender a aniquilação de milhões de humanos, pois a sobrepopulação
humana, como foi mencionado anteriormente, é uma das principais ameaças à
comunidade biótica. Essas comparações ao fascismo fizeram com que este argumento
fosse denominado por Ecofascismo.

Devido a estes contra-argumentos, um filosofo norte-americano chamado J. Baird


Callicott fez notar que cada individuo, além de pertencer à comunidade biótica também
pertence a outras comunidades menores, como a nossa família e o facto de termos
obrigações para com a comunidade biótica não significa que não estejamos sujeitos a
outras obrigações “…as nossas obrigações holistas não são exclusivas. Não deixamos de
estar sujeitos a todos os outros deveres…” (Callicott J. 1989: 216-217). Então da mesma
forma que podemos não fazer uma viagem para férias num resort para ajudar as crianças
famintas em África, também podemos fazer sacrifícios pessoais como a diminuição do
número de produtos que compramos de forma a promover o bem do ambiente.

Em suma a crescente evolução da ciência trouxe imensos benefícios para a espécie


humana, mas ao mesmo tempo também trouxe malefícios, não só para os humanos, mas
para o planeta como um todo. Para reverter esse problema é imperativo mudar a nossa
abordagem para com o ambiente, passando a preocupar-nos com o bem da comunidade
biótica, deixando de parte individualismos e o antropocentrismo, dando prioridade ao
todo face ao individuo, corrigindo os erros do passado e de forma passarmos a respeitar
a Natureza pelo seu verdadeiro valor intrínseco de forma a desenvolvermos uma
verdadeira responsabilidade ambiental.

Bibliografia:
JONAS, Hans, (1995), O Principio da Responsabilidade, Barcelona, Espanha, Editorial
Herder; páginas 38 a 40

Leopold Aldo, (1949) Pensar Como uma Montanha, Estados Unidos da América,


Oxford University Press, páginas 201 a204

Callicott John Baird, (1989) Libertação dos Animais: uma questão triangular, Porto
Editora páginas 216 a 217

Lopes António, Galvão Pedro, Mateus Paula, (2019) Razões de Ser, Portugal, Porto
Editora páginas 266 a 277

Webgrafia:

PEREIRA (Francisco) “Como escrever um ensaio filosófico?” in: #ESTUDOEMCASA


https://www.rtp.pt/play/estudoemcasa/p7885/e522843/filosofia-area-de-integracao-10-e-11-ano
- consultado no dia 29/05/2021

CHAKELIAN (Anoosh) e CALCEA (Nicu) “Ella Adoo-Kissi-Debrah and the Great

Smog of modern London” in: New Statesman


https://www.newstatesman.com/politics/environment/2020/12/ella-adoo-kissi-debrah-
and-great-smog-modern-london consultado no dia 1/06/2021

ANONIMO “The State of the world’s forests” in: FAO http://www.fao.org/state-of-


forests/en/ - consultado no dia 06/06/2021

ANONIMO “Tons of CO2 emitted into the atmosphere” in The World Counts
https://www.theworldcounts.com/challenges/climate-change/global-warming/global-
co2-emissions/story - consultado no dia 06/06/2021

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