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FUNDAÇÃO DE ENSINO “EURÍPIDES SOARES DA ROCHA”

CENTRO UNIVERSITÁRIO EURÍPIDES DE MARÍLIA – UNIVEM


GRADUAÇÃO EM DIREITO

CARLA FALOTICO

VITIMOLOGIA

MARÍLIA
2007
CARLA FALOTICO

VITIMOLOGIA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Direito do Centro Universitário
Eurípides de Marília – UNIVEM, mantido pela
“Fundação de Ensino Eurípides Soares da
Rocha”,como requisito parcial para a obtenção
do Título de Bacharel em Direito.

Orientador:
Prof.: José Eduardo L. dos Santos.

MARÍLIA
2007
FALOTICO, Carla
Vitimologia / Carla Falotico; orientador: José Eduardo
Lourenço dos Santos.
Marília, SP: [s.n.], 2007.
51f.

Trabalho de Conclusão de Curso - Centro Universitário


Eurípides de Marília - Fundação de Ensino Eurípides Soares da
Rocha.

1. Vitimologia 2. Vitima 3. Criminologia.

CDD: 341.53327
Aos meus familiares
Ao meu companheiro de todas as horas
Aos meus queridos amigos
AGRADECIMENTOS

A Deus, nosso Pai, pois sem Ele não somos capazes de nada.
A todos que de certa forma contribuíram para a elaboração deste trabalho, amigos, colegas de
trabalho, chefes...
Aos meus pais, pela colaboração e compreensão nos meus momentos de confinamento.
Ao meu namorado, pelo apoio moral e material, pesquisando textos e artigos para este
trabalho.
Ao professor José Eduardo, pela paciência e dedicação com que me orientou na elaboração
deste trabalho.
Aos meus cães, gatos e hamsters, que se comportaram nos momentos de concentração e me
alegraram nos momentos de descanso.
“O caminho para estar fora de perigo
é nunca sentir-se seguro”

Ben Franklin
FALOTICO, Carla. Vitimologia. 2007. 51 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado
em Direito), Centro Universitário Eurípedes de Marília, Fundação de Ensino Eurípedes Soares
da Rocha, Marília, 2007.

RESUMO

A vitimologia é um tema novo no direito brasileiro, porém já consagrado no direito


estrangeiro, principalmente nos Estado Unidos. Busca tratar, em vários aspectos sobre a
vítima e de que forma sua conduta contribui para a prática do delito, influenciando o agente
ativo e a preocupação do Direito com a vítima, após a prática delitiva. O estudo vitimológico
orienta na elaboração de políticas de prevenção da criminalidade, bem como de assistência e
reparação à vítima. Está intimamente relacionada com a criminologia, vez que se originou
dela e também com as ciências sociais, buscando elaborar um estudo humanitário da vítima e
incluí-la no sistema legal, não só nacional como também estrangeiro. Este trabalho busca, por
meio de pesquisa bibliográfica, traçar um panorama atual da vitimologia, demonstrando tudo
o que já foi alcançado em beneficio das vitimas e o que ainda pode ser feito.

Palavras-chave: 1 Vítima. 2 Criminologia. 3 Reparação do dano


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................................ 08

CAPÍTULO 1 - VÍTIMA: CONCEITOS E TIPOS ................................................................. 10

CAPITULO 2 - CRIMINOLOGIA .......................................................................................... 17

CAPITULO 3 - VITIMOLOGIA. ............................................................................................ 21


3.1 Conceito e objetivo............................................................................................................. 22
3.2 Evolução histórica .............................................................................................................. 24

CAPITULO 4 - A VITIMOLOGIA NO DIREITO ESTRANGEIRO..................................... 27

CAPITULO 5 – A APLICABILIDADE DA VITIMOLOGIA NO BRASIL ......................... 31


5.1 Artigo 59 do Código Penal Brasileiro ................................................................................ 31
5.2 A aplicação da pena e o artigo 59 do Código Penal Brasileiro .......................................... 35
5.3 Aplicação teórica da Vitimologia ....................................................................................... 36
5.4 Aplicação prática da Vitimologia ....................................................................................... 39
5.5 Reflexo da Vitimologia no Direito Nacional...................................................................... 41

CONCLUSÃO.......................................................................................................................... 47

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................... 49
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INTRODUÇÃO

Neste trabalho trataremos da vitimologia, que consiste basicamente no estudo da

vítima em relação ao delito e ao delinqüente. Este tema é ainda pouco discutido no Brasil,

contudo já possui certa aplicabilidade.

Os delitos se transformam de acordo com as transformações da sociedade e

atualmente, entre as prioridades dessa sociedade não está a segurança, ou seja, os indivíduos

esperam muito dos governos em relação à segurança, contudo esquecem-se que tomando

algumas precauções podem afastar a possibilidade de serem vítimas de delitos. Por isso

entendo ser importante o estudo das vítimas, principalmente para se traçar um perfil de uma

vítima potencial e orientar os cidadãos para que evitem essa situação.

Daí a iniciativa deste trabalho em realizar uma compilação de tudo que já foi discutido

a fim de se chegar a um panorama atual da vitimologia no Brasil e no mundo e mensurar o

que já foi alcançado, bem como o que ainda se deve alcançar em relação às vítimas e à

criminalidade.

Em um primeiro momento trataremos da vítima, levando em conta o conceito

preliminar de que é a pessoa quem sofre as conseqüências de uma conduta lesiva praticada

por alguém, até se chegar ao conceito que inclui também a pessoa jurídica nos estudos

vitimológicos.

Analisaremos a classificação das vítimas frente à conduta delitiva, abordando desde o

processo de vitimização, sua interação com o delinqüente e a conseqüente contribuição para a

prática, ou não, do crime.

Em seguida trataremos da criminologia, considerada o berço da vitimologia e como a

vítima ganhou destaque dentro dela, até levar seus estudiosos a propor à vitimologia o status
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de ciência autônoma e interdisciplinar, por interagir com a sociologia, a psicologia, economia,

direito e até mesmo a medicina.

Abordaremos também as diferentes conceituações da vitimologia, dentre elas o

estudo da vítima como sujeito passivo de crimes, em seus aspectos físico, psicológico e social

e também em relação aos Direitos Humanos e como desencadeadora do crime.

Veremos como essa vitimologia se desenvolveu desde sua “criação” com a macro-

vitimização pelo nazismo, e ganhou destaque no cenário internacional, passando a refletir

também aqui no Brasil, ainda que timidamente.

Demonstraremos também, como o direito pátrio recepcionou esta nova tendência e

como deve se organizar, a exemplo dos Estados Unidos, entre outros países, para dar

aplicação eficaz aos seus conceitos.

Concluiremos com este trabalho que o Brasil, a exemplo de grandes potencias como

os Estados Unidos, guardadas as devidas proporções, principalmente financeiras, está

começando a ter maior consideração com as vitimas da crescente criminalidade, através da

implementação de leis e medidas de proteção, buscando minimizar os danos por elas sofridos.
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CAPÍTULO 1 - VÍTIMA: CONCEITOS E TIPOS

Antes de iniciar um estudo sobre vitimologia, é conveniente a elucidação de

importantes conceitos relativos ao tema, entre eles o conceito de vítima.

Etimologicamente, a palavra vítima tem sua raiz no latim, derivando de vincire que

significa atar, ligar, referindo-se aos animais sacrificados aos deuses após a guerra, os quais

ficavam vinculados ao ritual em que seriam vitimados. Deriva também de vincere que

significa vencer, vencedor sendo a vítima o abatido, vencido. Este conceito básico é utilizado

por vários doutrinadores, entre eles Lélio Braga Calhau e Ester Kosovski que acrescenta a ele

a seguinte definição jurídica:

“No sentido denotativo do termo, Vítima deriva de vincere – o vencido, ou


de vincire – animais que são sacrificados aos deuses. De todo modo,
penalmente, vítima é aquele que sofre a ação ou omissão do autor do delito,
(sujeito ativo, agente) e é sinônimo de ofendido, lesado ou sujeito passivo.”
(KOSOVSKI, 1990, p. 03)

Alessandra Orcesi Pedro Greco, nos apresenta um conceito mais detalhado:

“Deve-se entender que ‘vítima’ para o direito penal é o sujeito passivo de um


crime. Ele se identifica com o titular do interesse atingido pelo crime, de
forma mediata ou imediata, mas desde que seja aquele que a norma tutela.
Em todo crime há dois sujeitos passivos: um sujeito passivo constante que é
o Estado-Administração, pois todo crime viola um interesse publico, e um
sujeito passivo eventual, que é o titular do interesse concreto.” (GRECO,
2004, p. 17)

Com isso podemos ver que vítima é aquela quem sofre alguma lesão decorrente da

conduta delituosa de um outro agente, ou seja, aquele que vê sacrificado algum bem jurídico,

tutelado por uma norma jurídica.

Os doutrinadores utilizam-se de vários termos ao se referirem às vítimas,

dependendo do assunto que é tratado. Como salienta Mayr (1990) no campo jurídico, esse

termo – vítima – será aplicado quando se relacionar a crimes contra a pessoa, ou seja, quando
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a conduta recaia diretamente sobre o indivíduo, porém, se se tratar de crimes contra o

patrimônio, esta vítima será chamada de lesado e, nos crimes contra a honra e os costumes é

chamada de ofendido. (MAYR, 1990).

No conceito de Greco, será relevante para esse estudo o segundo tipo de vítima

apontado, ou seja, o “titular do interesse concreto”. Contudo, a mesma autora demonstra que

não deve ser considerada somente a pessoa física, mas também, a pessoa jurídica como

podemos observar:

“Podemos utilizar, ainda no sentido de precisar a definição da terminologia


‘vítima’, um conceito aberto que permite o reconhecimento, nesta categoria,
de toda pessoa física ou jurídica ou ente coletivo prejudicado por uma ação
ou omissão humana que constitua infração penal, levando-se em conta as
referências feitas ao conceito de crime pela criminologia. Nesse sentido,
Costa Andrade afirma que a vitimologia não deve circunscrever-se ao estudo
da pessoa física apenas, mas às pessoas coletivas ou organizações estatais,
isto porque estas também sofrem danos e são objeto de estudos
vitimológicos.” (GRECO, 2004, p. 18).

Assim, temos como vítima todo e qualquer ente – físico ou jurídico – que possa ser

lesado por uma conduta delituosa (sujeito passivo do delito). Neste sentido, temos vítima e

criminoso em pólos opostos na conduta criminosa, ou seja, quando falamos em crime

visualizamos uma vítima inocente e um criminoso culpado, exceto quando falamos em

legítima defesa, provocação injusta da vítima ou consentimento desta (OLIVEIRA, 1993).

Com isso o estudo do crime limita-se ao estudo deste e do criminoso; a vítima é simplesmente

sobre quem a conduta recai.

Entretanto, como ressalta França (1998), ao citar Hans Von Hentig, “a relação entre o

autor e a vítima, em determinado delito, não é tão mecânica como aparece nos códigos”, isso

porque em certos delitos são as vítimas que modelam, e que dão forma ao delinqüente. O

autor chega a afirmar que da personalidade da vítima seria possível deduzir a personalidade

do criminoso.
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A partir dos estudos de Benjamin Mendelsohn a vítima passou a ser estudada como

parte e, também, fator determinante no delito. Assim, o vitimólogo israelita criou a primeira

classificação de vítimas em 1956, com base na correlação da culpabilidade entre a vítima e o

infrator, trazida no artigo de Sandro Nogueira (2004) e também no trabalho de Piedade Júnior

(1990), qual seja:

a) vítima completamente inocente ou vítima ideal compreendendo aquela que

nada fez ou provocou para desencadear a situação que a lesou;

b) vítima de culpabilidade menor que a do delinqüente ou vítima por ignorância

sendo a que involuntariamente ou por um ato de pouca reflexão, provoca sua

própria vitimização;

c) vítima tão culpável como o infrator ou vítima voluntária ou vítima

provocadora são aquelas que conscientemente se expõem ao risco de serem

vitimadas como, por exemplo quem pratica roleta russa;

d) vítima mais culpável que o infrator ou pseudo-vítima que subdivide-se em

provocadora, sendo a que por conduta própria, incita o infrator à prática do

delito, que sua conduta favorece a ocorrência do crime; e vítima por imprudência

aplicável nos casos de acidentes, quando ela determina o acidente por falta de

cuidados;

e) vítima mais culpável ou unicamente culpável ou agressoras, subdividida em

vítima infratora, no caso de legitima defesa em que o agressor deve ser absolvido

posto que defendia-se de agressão injusta real ou iminente por parte da vítima; e

vítima simuladora a que, buscando fazer justiça num erro, premedita o crime para

jogar a culpa no outro.


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Essa classificação permitiu a Mendelsohn dividir as vítimas em três grandes grupos

que influenciam na aplicação de pena ao infrator. São eles:

- Primeiro grupo: vítimas inocentes ou ideais sendo as que não tiveram participação na

produção do resultado lesivo ou o provocaram.

- Segundo grupo: vítimas provocadoras, imprudentes, voluntárias e ignorantes que colaboram

para que o agente infrator alcance seu objetivo. Há aqui uma culpabilidade recíproca, devendo

ser aplicada uma pena menor ao infrator.

- Terceiro grupo: das vítimas agressoras, simuladoras e imaginárias, as “supostas vítimas”;

são as vítimas que cometem por si só a ação lesiva devendo, o não culpado, ser absolvido,

excluído de toda pena.

Almeida (2007) nos aponta ainda a classificação de Von Hentig, que divide as vítimas

simplesmente em resistentes sendo a que reage à agressão ou provocação injusta (legitima

defesa) e a vítima coadjuvante sendo a que, por imprudência ou má-fé cooperam para a

produção do resultado. Apresenta ainda, citado autor, a classificação de Guaracy Moreira

Filho, que as divide em: inocentes, as que não colaboram para o resultado; natas, as que por

seu comportamento agressivo e prepotência contribuem para o crime; omissivas, que não

denunciam a ocorrência do crime e as vítimas da política social, decorrentes da falta de

políticas públicas voltadas para o cidadão.

Atualmente, temos também as vítimas classificadas em primárias, participantes,

terciárias, testemunhais e pós-penitenciárias, como relata Serrano (2007) em seu artigo.

As vítimas primárias, também chamadas de inocentes, subdividem-se em fungível,

abrangendo as que nada contribuem para que o crime ocorra; e acidentais sendo as que se
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encontram nos locais de crimes, ficando assim sujeitas a ele, por exemplo, um cliente de

banco que lá se encontra no momento de um assalto.

A participante ou infungível (quase-inocente) é a que, por descuido, facilita a

ocorrência do delito ou a provoca e também são subdivididas em voluntárias as que

participam do delito (aquiescentes); alternativas as que deliberadamente se colocam em

posição de vítimas (exemplo: briga de gangues); familiar no caso de violência doméstica;

vulneráveis que são tidas como as mais frágeis (crianças, idosos, etc.) ou minorias

(prostitutas); a vitimização simbólica, por motivo político ou religioso e as falsas vítimas

sendo as que acreditam-se vítimas ou inventam o delito.

A vítima terciária compreende o infrator ou possível infrator submetido à tortura

policial; a testemunhal constitui a que sofre ameaça ou sevícia, algumas vezes até por

policiais; e, por fim, a vitimização pós penitenciária sendo esta a exclusão social daqueles que

“quitam suas dívidas” com a justiça e saem do sistema penitenciário.

Uma classificação mais singela e prática seria a que França aponta em sua obra:

“As vítimas podem ser: determinada, selecionada e acidental. A


determinada é aquela que representa um valor negativo para o criminoso e
que, somente com sua eliminação, soluciona o conflito do agente ativo, a
exemplo do infanticídio. A selecionada mostra-se ao delinqüente com certo
interesse particular, como, digamos no latrocínio. E, por fim, a acidental,
aquela que se converte em vítima sem ter contribuído para tanto, como, por
exemplo, no assalto.” (FRANÇA, 1998, p. 351)

De qualquer forma o comportamento da vítima tem um papel fundamental e, muitas

vezes, determinante no surgimento do delito, na conduta do criminoso e essas classificações

serão utilizadas, conforme o tipo de estudo a ser realizado.

Assim, com Mendelsohn, Von Hentig e também de outros vitimólogos, o estudo da

vítima começou a ganhar espaço dentro do estudo do crime, dando atualmente a ela maior
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destaque e importância, deixando de ser apenas a sofredora, a vencida e propiciando maior

justiça, vez que sua conduta influencia na penalização da conduta do agente ativo.

Importante se faz, também, o estudo do iter victimae, que consiste no processo de

vitimização, ou seja, o caminho percorrido pelo indivíduo até se tornar vítima, quer das

próprias ações, quer das ações de terceiros ou de fatos da natureza. Esse processo é dividido

em várias fases como nos mostra Nogueira (2004 apud Oliveira, 2001):

1. intuição, também chamada de intuito: a vítima coloca em sua mente a idéia de ser

vitimizado, prejudicado por um ofensor;

2. conatus remotus (atos preparatórios): quando a vítima, que já pensa na

probabilidade de ocorrência conduta lesiva, preocupa-se em tomar medidas

preliminares, a fim de se defender ou a comportar-se de modo consensual ou com

resignação às situações de dano ou perigo articuladas pelo ofensor;

3. conatus proximus (início da execução): quando a vítima dá inicio à sua defesa

havendo oportunidade ou coopera, apóia ou facilita a ação ou omissão pelo

ofensor;

4. executio (execução): a vítima apresenta efetiva resistência a fim de evitar a todo

custo, ser atingida pelo resultado querido pelo agressor ou deixa-se vitimizar;

5. consummatio (consumação) ou crime falho ou conatus proximus (tentativa): é a

consumação pela obtenção do resultado pretendido pelo autor, com ou sem a

adesão da vítima; ou a tentativa quando a vítima obtém êxito na repulsa durante

a execução, assim o agressor não atingiu o seu propósito por circunstâncias

alheias à sua vontade.

Esse processo de vitimização é facilitado por vários fatores cotidianos, tais como a

mídia, principalmente a televisiva, que tornou-se escola para criminosos e vítimas ao exibir
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em sua programação violência ou transformando bandidos e delinqüentes em heróis em

programas sensacionalistas; o desemprego que exclui o indivíduo da sociedade, constituindo o

crime a única opção de quem não tem como sustentar a si próprio e a sua família e também

uma forma de vingança contra o sociedade que o marginalizou; o receio em exercer as

legitima defesa e ser preso até que se prove essa excludente, encoraja delinqüentes a

praticarem crimes já que as vítimas tem medo de revidar.

Não obstante, podemos levar em conta no processo de vitimização o abandono

infantil, o preconceito racial e também daquele que já pagou pelo seu crime e a posse de arma

de fogo em casa que acabam vitimando os próprios moradores, por motivos fúteis (brigas de

casais, crianças que desconhecem o seu perigo, etc.).

Assim, podemos concluir que o indivíduo pode tornar-se vítima não somente por

deixar de tomar os cuidados necessários a sua proteção mas também pela ausência de

informação e educação da nossa sociedade, gerando assim uma ocorrência maior de delitos.
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CAPÍTULO 2 – CRIMINOLOGIA

Outro ponto importante para o desenvolvimento tranqüilo deste trabalho é o estudo da

criminologia, vez que a um dado momento a vitimologia foi considerada um desdobramento

desta ciência. Segundo França, a criminologia “preocupa-se com os mais diversos aspectos da

criminogênese, do criminoso, da vítima e do ambiente.” (FRANÇA, 1998).

O termo “criminologia” tem origem greco-latina e significa o estudo do crime. Este

vocábulo foi atribuído primeiramente ao italiano R. Galofalo dando titulo à sua principal obra,

todavia, há quem diga que o termo já teria sido anteriormente utilizado na França, por P.

Topinard.

Alguns doutrinadores buscaram definir criminologia, entre eles temos Lyra:

“A criminologia é a ciência que estuda: a) as causas e as concausas da


criminalidade (IV) e da periculosidade preparatória da criminalidade; b) as
manifestações e os efeitos da criminalidade; c) a política a opor,
assistencialmente, à etiologia da criminalidade e da periculosidade
preparatória da criminalidade, suas manifestações e seus efeitos”. (LYRA,
1990, p. 6)

Já Molinas nos traz uma definição mais completa para ela:

“Cabe definir a Criminologia como ciência empírica e interdisciplinar, que


se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle
social do comportamento delitivo, e que trata de subministrar uma
informação válida, contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis
principais do crime – contemplando este como problema individual e como
problema social -, assim como sobre os programas de prevenção eficaz do
mesmo e técnicas de intervenção positiva no homem delinqüente.”
(MOLINAS, 1997, p. 33)

A criminologia surgiu no século XIX tendo como precursor o belga Adolphe

Quetelet (1796-1874), que entendia a criminalidade como “fenômeno normal da vida social”

em que se deveria levar em conta fatores como clima, estação, sexo, profissão, raça, etc..
18

Afirma que a sociedade prepara os crimes, o criminoso apenas os executa; concepção esta

retomada por Durkheim. (LYRA, p. 33)

Lyra (1990) nos mostra que esta ciência surgiu da sociologia, mais especificamente,

na Física Social de Quetelet, que contribuiu para o esboço daquela, buscando conhecer o

mundo social, e não simplesmente dirigí-lo.

O italiano Cesare Lombroso (1835-1909) foi o primeiro a realizar um estudo técnico

científico do “criminoso sistematizado”, iniciado a partir do estudo do cadáver de um

criminoso no qual encontrou, na base de seu crânio a fosseta occipital média, característica do

homem primitivo, revelando a relação entre o instinto sanguinário e a regressão atávica

(identificação do criminoso com o selvagem). Após outros exames, Lombroso chegou à

seguinte hipótese:

“a) o criminoso, propriamente dito, é nato; b) é idêntico ao louco


moral; c) apresenta base epiléptica; d) constitui, por um conjunto de
anomalias, tipo especial (o chamado tipo lombrosiano). Tais
anomalias seriam variáveis segundo a classe do criminoso e até do
crime. [...] a distinção entre louco e criminoso é de quantidade, de
grau na regressão atávica e não de qualidade.” (LYRA, 1990, p. 39)

Embora tendo seu estudo se baseado no físico, Lombroso não deixou de lado a

influência do meio social, ou seja, os criminosos são produto da sociedade que os modela e

aperfeiçoa, para depois abandoná-los. (LYRA, 1990)

Juntamente com os estudos de Lombroso temos os estudos do, também italiano,

Enrico Ferri (1856-1929), precursor da sociologia criminal, que apresentou uma classificação

mais detalhada dos criminosos, sendo eles natos, loucos, passionais, ocasionais e habituais.

Ressalta Lyra (1990), que Ferri relacionou o número de crimes com as condições ordinárias

da vida social, esta refletindo naqueles.


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Foi Ferri quem criou as penas substitutivas (substitutivos penais) com o objetivo de

prevenir os crimes.

Lyra (1990) dividiu a criminologia em três partes sendo a primeira a Sociologia

Criminal que tem como fim o estudo das “causas da criminalidade e da periculosidade

preparatória da criminalidade”, objetivando fixar a ação ou omissão resultante da concausa

natural, tida por ele como as resultantes do meio natural, da sociedade.

A segunda é a Antropologia Criminal que, assim como a Sociologia Criminal, ocupa-

se do estudo das causas da criminalidade e da periculosidade preparatórias da criminalidade,

contudo voltada para as causas internas, sendo estas voltadas para o individuo, as causas que

ele traz consigo e que adquire ao longo de sua vida.

Segundo ele, ao contrário das afirmações de Lombroso, o homem fica ou está

criminoso, ele não nasce criminoso. O autor admite que existem criminosos doentes, e não só

doentes mentais, cujas ações podem resultar ação ou omissão criminosa, porém, nem todo

louco virá a se tornar um criminoso assim como nem todo criminoso apresenta traços de

loucura.

A terceira, consiste na Política Criminal que levará a criminologia do plano cientifico

ao técnico administrativo, com o fim de orientar o Direito Penal na prevenção da incidência e

reincidência do crime. Constitui a aplicação da criminologia.

No Brasil, a criminologia teve inicio com Tobias Barreto (1839-1889), como aponta

Lyra (1990). Para ele, o crime era conseqüência dos “vícios da organização social”, dentre

estes a riqueza mal distribuída e o trabalho mal remunerado.

Nesta mesma linha de pensamento, temos também o brasileiro Silvio Romero (1851-
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1914) pregando que o “homem tem a feição do meio que habita”, dando como exemplo os

criminosos que saem das prisões piores do que entraram.

Temos ainda entre os criminologistas brasileiros, Clovis Beviláqua (1859-1944),

autor do primeiro livro de criminologia aplicada, seguido por Euclides da Cunha (1866-1909),

que primeiro aplicou a Sociologia Criminal no Brasil, comparando a concepção de Lombroso

à uma descrição psíquica minuciosa e por Júlio Pires Pôrto-Carrero (1887-1937) que primeiro

aplicou a psicanálise à criminologia brasileira.

A criminologia brasileira ganhou impulso com os congressos internacionais dos

quais participaram ilustres criminologistas brasileiros, ficou estagnada por um tempo, em

segundo plano ao pensamento dogmático que prosperava na época,voltando à crescer a partir

de 1980, voltando-se as investigações criminológicas para a política criminal.

De início, a ciência denominada criminologia, ocupava-se somente da pessoa do

delinqüente e do delito por ele praticado, todavia, seu objeto, após o redescobrimento da

vítima e do controle social do crime, foi ampliado, passando a criminologia a ocupar-se do

delinqüente, do delito, da vítima e a prevenção e controle social. (MOLINAS, 1997)

Assim, a “moderna criminologia”, nos termos de Molinas (1997), permite uma melhor

compreensão cientifica do problema criminal a fim de preveni-lo e também intervir com

maior eficácia e de forma positiva no delinqüente.


21

CAPÍTULO 3 - VITIMOLOGIA

Na antiguidade, com o declínio da vingança privada, decorrente da transferência da

Administração da justiça penal, até então exercida pelo particular, para o Poder Publico, a

vítima passou a ser mero elemento de prova testemunhal no processo penal. Esse quadro não

se alterou com o advento do Iluminismo no século XVIII cuja preocupação no campo penal

eram as garantias fundamentais da pessoa do criminoso.

Todavia, com a evolução dos estudos criminológicos, fez-se necessário como

demonstra França (1998), além de se reformular o conceito de delinqüente/criminoso e a

capitular o delito como um fenômeno natural e social em que se encaixam, primeiramente, o

autor e o ambiente no qual o crime ocorreu e depois estudar juridicamente o delito em si, se

viu necessário o estudo da vítima que como já demonstramos, exerce um papel significativo

na eclosão dos delitos, formando assim, não mais um binômio, mas sim um trinômio:

criminoso - crime - vítima.

Para o estudo dessa relação é necessária a aplicação de princípios vitimodogmáticos

que constituem segundo Greco (2004) “uma série de postulados vitimológicos no qual se

estuda o comportamento da vítima em face do crime – mais especificamente, sua contribuição

para que este ocorresse” e, apesar da vitimodogmática dar a impressão de uma co-

culpalização da vítima diante do crime, não é o que ocorre, ela apenas busca atribuir uma

penalização justa ao réu.

Essa redescoberta da vítima não busca uma regressão à vingança privada, mas sim,

uma “redefinição global do status da vítima”, seu relacionamento com o delinqüente, o

sistema legal, a sociedade, etc., bem como identificar suas expectativas e seus anseios por

justiça. (MOLINAS, 1997)


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3.1 Conceito e objetivo

Primeiramente, cabe analisar a origem etimológica da palavra vitimologia, que

deriva da palavra vítima e da raiz grega logos significando o estudo das vítimas.

Juridicamente falando, a vitimologia pode ser conceituada de várias formas, como

nas enciclopédias especializadas:

“Vitimologia.
(dir. pen.)
Estudo do comportamento da vítima frente a lei, através de seus
componentes bio-sociológicos e psicológicos, para a apuração das condições
em que o indivíduo pode apresentar tendência a ser vítima de uma terceira
pessoa (o delinqüente) ou de processos decorrentes dos próprios atos, tais
como os acidentes de trabalho ou de circulação. O termo foi criado por B.
Mendelsohn, advogado em Jerusalém, tendo este estudo se desenvolvido por
obra do criminologista Hans Von Hentig. Discute-se ainda para saber se a
vitimologia é uma ciência autônoma ou um capítulo da criminologia geral.
B. - Edgard de Moura Bittencourt, Vitimologia com ciência, in Revista
Brasileira de Criminologia e Direito Penal, ano I, nº 1, abril-junho de 1963.”
(SOIBELMAN)

E principalmente nas doutrinas como faz Mayr:

“Vitimologia é o estudo da vítima no que se refere à sua personalidade, quer


do ponto de vista biológico, psicológico e social, quer do de sua proteção
social e jurídica, bem como dos meios de vitimazação, sua inter-relação com
o vitimizador e aspectos interdisciplinares e comparativos.” (MAYR, 1990,
p. 18)

Assim, vitimologia é o estudo da vítima e seu comportamento, não somente em face

do crime ou do criminoso, mas em todos os ramos das ciências sociais, daí o seu caráter

interdisciplinar. É o estudo da vítima em seus aspectos psicológico, social, econômico e

jurídico.

Seus objetivos finais , como elenca Semedo (2005), consistem em evidenciar a

importância da vítima; explicar a conduta da vítima; viabilizar a implementação de medidas

de comportamento individual e de assistência à vítima, bem como a redução da ocorrência do

dano no âmbito das políticas públicas


23

A vitimologia busca explicar não somente a interação vítima-delinqüente mas,

também, as variáveis que intervêm no processo de vitimização e como estas influem no modo

como o delinqüente escolhe a sua vítima ou esta percebe seu agressor e seu modus operandi.

O risco de uma pessoa vir a ser vítima não depende de fatalidades ou azar mas sim, de

certas circunstâncias concretas, passiveis de verificação, como ressalta Molinas (1997), que

são o objeto de estudo da vitimologia.

Essa pormenorização das predisposições passíveis de tornar a vítima mais vulnerável

ao crime, como ressalta Marques (2001), permite a implementação de programas de

prevenção, por meio de orientação e informação a fim de evitar que outros indivíduos venham

a ser vítima nas mesmas circunstâncias; é a chamada “prevenção vitimária”. (MOLINAS,

1997)

Molinas (1997) também nos mostra que o delito não acarreta na vítima somente o

dano decorrente da lesão ou ameaça de lesão do bem jurídico, ocasiona também um sério

impacto psicológico, gerando na vítima um sentimento de impotência frente ao mal e angústia

e temor de que ele se repita. Essa vítima sofre também uma estigmatização da própria

sociedade, destinando à ela, não sentimento de solidariedade e justiça, mas sim, mera

compaixão e até desconfiança e receio, produzindo “isolamento social”

Os policiais e juízes, que exercem o controle penal formal, agravam ainda mais, com

sua extrema burocracia, o dano ocasionado pelo delito nas vítimas não levando em conta seus

anseios e necessidades, fazendo com que ela sinta-se menosprezada, tratando-a como se fosse

mero objeto de investigação.

Essa situação produz uma vitimização secundária, ainda mais preocupante que a

vitimização primária, produzida pelo delinqüente, pois a vítima deixa de confiar no sistema

legal, passa a não notificar a ocorrência do delito gerando impunidade dos criminosos e,

conseqüentemente, incentivando-os à prática de novos delitos


24

Não é raro também infratores que, antes de delinqüir, foram também vítimas de

delitos. Por esta razão, a vitimologia vem chamando a atenção para a criação e implementação

de programas de assistência, reparação e tratamento das vítimas de delitos, programas estes já

utilizados em países como Nova Zelândia, Reino Unido e Estados Unidos.

3.2 Evolução histórica

A preocupação com a reparação causada injustamente como medida de justiça

remonta desde a antiguidade, embora sem a clareza científica da vitimologia atual, como

podemos verificar através dos Códigos e Leis antigos, dentre eles o Código de Ur-Nammu, as

Leis de Eshnunna, o Código de Hammurabi, o Alcorão, o Código de Manu e a Lei das XII

Tábuas.

A vitimologia nasceu após segunda Guerra Mundial, mais especificamente em 1947,

dois anos após seu término, em decorrência do sofrimento dos judeus pelo nazismo de Hitler

que teve como resultado milhões de mortos, feridos e desaparecidos que chocou o mundo e

influenciou o Direito Penal na Europa.

Com isso, o estudo da vítima, que se encontrava esquecida desde a época da vingança

privada, voltou a ter importância deixando de ser o Direito Penal, o Direito dos Criminosos,

como afirmou Carrara. (SERRANO, 2007)

Nos mostra Calhau (2002) que o estudo da vítima teve como seu precursor Benjamim

Mendelsohn, Professor Emérito da Universidade Hebraica de Jerusalém e também vítima da

Guerra, quando falou em 1947 sobre o assunto na conferencia realizada na Universidade de

Bucareste cujo tema foi “Um horizonte novo na ciência biopsicossocial: a vitimologia”.

No ano seguinte o tema foi abordado por Hans Von Hentig ao divulgar sua pesquisa

“O criminoso e sua vítima” na universidade de Yale, onde traçou a importância da psicologia


25

no estudo da vítima juntamente com seu ofensor.

Após estes estudiosos que deram o primeiro passo, outros vieram a discutir o tema,

com destaque para Vasile Stanciu autor de grandes obras sobre sociologia criminal, com

enfoque para a vitimologia.

A vitimologia se consagrou como disciplina criminológica em 1956 quando o próprio

Mendelsohn sistematizou vários estudos de sua autoria; começou a crescer, chegando em

1965 à América Latina, com Jimenez de Asúa, sendo ali o primeiro jurista a se ocupar dela

em seminário realizado na Faculdade de Direito de Buenos Aires. Em seguida, chegou a

Israel, onde foi realizado no ano de 1973, na cidade de Jerusalém, sob a supervisão de Israel

Drapkin (diretor do Instituto de Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade

Hebraica de Jerusalém), o I Congresso Internacional de Vitimologia onde se discutiu as

causas da vitimização e sua prevenção e pesquisa.

Após este, vários outros simpósios foram organizados ao longo dos anos pelo mundo:

1976 em Boston, Estados Unidos; 1979 em Münter, República Federal da Alemanha; 1982

em Tóquio e Quioto, Japão; 1985 em Zagreb, Iugoslávia e os Congressos Internacionais

realizados em 1980 nos Estados Unidos e em 1982 na Itália. (OLIVEIRA, 1993)

O surgimento repentino da vítima, a exemplo do que ocorrera no passado com o

criminoso, fez com que Mendelsohn propusesse à ONU que considerasse a vitimologia como

uma ciência e não mais como um desdobramento da criminologia, o que foi objetado por

Pinatel sob o argumento de que criminoso e vítima são indissociáveis, sendo a criminologia e

a vitimologia o estudo do fato criminoso como um todo, definindo a tese de Mendelsohn

como abrangente.

Todavia, este argumento posteriormente fora refutado por Mendelsohn, que ao ampliar

seu conceito, considerando todas as categorias de vítimas na sociedade, inclusive as não

decorrentes de crimes, antecipou-se à concepção atual de vitimologia. É por esta amplitude


26

conceitual que transcende o estudo das vítimas criminais, que a vitimologia era considerada

por Mendelsohn e hoje, por vários outros estudiosos, como ciência autônoma.

Essa consolidação da vitimologia como ciência independente, veio a se confirmar com

a Declaração dos Princípios Básicos de Justiça para as Vítimas de Delitos e Abuso de Poder,

no 7° Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e Tratamento do

Delinqüente, no ano de 1985, em Milão.

Nesse congresso firmou-se um conceito mundial de vítima, como sendo o individuo

ou coletividade que tenha sofrido lesões de qualquer tipo (físicas ou psíquicas) em

decorrência de violações da legislação de cada Estado-Membro ou ainda de normas

reconhecidas mundialmente, relativas a Direitos Humanos.

No Brasil, temos como estudiosos do tema Edgard de Moura Bittencourt, Laércio

Pelegrino e a professora Arminda Bergamini Miotto, que contribuíram para a difusão da

vitimologia no país.
27

CAPITULO 4 – A VITIMOLOGIA NO DIREITO ESTRANGEIRO

Este movimento teve relevância na Europa, principalmente na Alemanha, em

decorrência do horror nazista e na Espanha.

No mundo todo, os Estados reconhecem cada vez mais a importância da vítima e

passam a vinculá-la também à questão da cidadania. (CALHAU, 2002)

Gonzáles Vidosa, em seu artigo Derechos humanos y la victima, publicado no

Cuaderno Del Instituto Vasco de Criminología, em San Sebastián, ponderou sobre as

necessidades e importância da vítima criminal, fixando alguns entendimentos:

“a) a vítima, em primeiro lugar, necessita encontrar um interlocutor válido,


que compreenda suas emoções e seus sentimentos;b)em segundo lugar, a
vítima necessita na maior parte dos casos de assessoramento legal antes de
formular denuncia. Assessoramento que principia por estruturar devidamente
a representação; c) educar a vítima sobre a importância que têm os meios de
prova, tanto documentais como testemunhais; d) outras vezes, ajuda à vítima
na obtenção de informações em bancos de registro de dados, determinando a
solvência real do acusado; e) quando são impetradas as ações judiciais, as
vítimas não tem capacidade jurídica para entender o que está acontecendo,
muitas vezes, não sendo comunicadas da sentença com o resultado final; f) a
vítima necessita saber como se desenvolve a instrução de sua causa; g)
finalmente, a vítima criminal demanda presença e acompanhamento pessoal
na exposição oral de seus motivos ao juiz.” (CALHAU, 2002, p. 48)

Com isso, vemos que a informação da vítima é uma forma de garantir seus direitos e é

este o trabalho dos grupos de apoio às vítimas, sejam eles governamentais ou não-

governamentais. A informação permite à vítima não somente uma melhor instrução com

provas, mas com conhecimento básico das leis, podendo verificar se seus direitos estão sendo

observados com a devida técnica em juízo. (CALHAU, 2002)

Os estudos atuais sobre a vítima e a implementação de modernos sistemas jurídicos de

sua proteção são uma demonstração de que a vítima saiu de sua inércia em relação ao crime,

do esquecimento em que se encontrava passando a ser tratada com maior humanidade e

solidariedade. Calhau mostra que, em decorrência disso, faz-se necessário falar da vítima não
28

só nos Tribunais como nos mais variados lugares. Isso levou a Escola de Chicago a estudar o

que eles chamam de Ecologia da Vitimidade, ao abordarem comportamentos desviados.

Países como Alemanha, Grécia, Portugal e Itália, vem criando legislações semelhantes

a nossa Lei 9.099/95 (Lei das Contravenções Penais), e instituindo a reparação do dano à

vítima como medida de política criminal, buscando substituir as sanções por outras menos

graves, simplificar o processo penal e diminuir a carga judicial e penitenciária.

O direito alemão, em dezembro de 1986 publicou a Lei de Proteção à Vítima que

passou a vigorar em abril de 1987. Entre os direitos assegurados por esta lei à vítima, estão o

direito desta preservar-se em relação as questões da vida pessoal, a possibilidade de remoção

do acusado da audiência, a possibilidade de restrição da publicidade do processo, direito de

ser assistida por um advogado, emprego da ação civil, isenta de custas para a reparação dos

danos, e muitos outros. (CALHAU, 2002)

O Código Penal de Portugal em seu artigo 129 também prevê que a legislação especial

garantirá, por meio da criação de um seguro social, a indenização da vítima que não puder ter

seu dano reparado pelo infrator.

Foi nos Estados Unidos que este movimento ganhou mais força como ilustra Calhau

(2002). Em 1975, foi fundada a Organização Nacional para Assistência (NOVA), sendo a

primeira organização no mundo na prestação de assistência às vítimas. Esta organização está

sediada em Washington e presta auxilio à outras entidades reconhecidas, orientando e

controlando programas de apoio, treinando agentes, realizando anualmente a Semana

Nacional dos Direitos da Vítima e também instruindo a alocação de recursos, a fim de dar

compensação e assistência médico-hospitalar e farmacêutica em favor das vítimas

impossibilitadas de trabalhar.

Nos Estados Unidos também o “ato Vítimas de Crime” de 1984 instituiu no

Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, um fundo exclusivo para as vítimas (VOCA),
29

onde são depositados milhões de dólares todos os anos, e o Departamento de Justiça, criou a

OVC (Office for Victms of Crime), fornecendo fundos para a assistência da vítima e sua

compensação e dando suporte e treinamento para a educação na Justiça Criminal.

Não obstante, vários Estados da Federação norte-americana criaram seus próprios

programas de compensação à vítima de crimes de ordem federal e estadual. Segundo dados

trazidos por Calhau (2002) existem nos E.U.A. cerca de 10.000 organizações que prestam

auxilio à vítima, intervindo em situações de crise, fornecendo consultas jurídicas e advocacia

na Justiça Criminal e abrigos e transportes de emergência; dessas, aproximadamente 2.800

recebem recursos do VOCA.

Os americanos acreditam que a ênfase na prevenção, como demonstra Augusto (2007),

ajuda a evitar que as pessoas se tornem vítimas da violência, que a comunidade investindo na

prevenção do crime torna-se mais forte, segura e unida para enfrentá-lo. Foi o que procurou

demonstrar uma pesquisa realizada pela organização educacional privada NCPC (National

Crime Prevention Council) em conjunto com a ADT Security Services, Inc (uma das maiores

empresas provedora de segurança eletrônica doa E.U.A.), com o titulo “nós estamos

seguros?”

Heitor Piedade Junior, citado por Calhau (2002) nos mostra que movimentos

semelhantes existem na Argentina, onde há um centro de apoio às vítimas de abuso de poder;

na Espanha, com mais de 50 centros do tipo; em Portugal com a Associação de Apoio à

Vítima (APAV), composta por técnicos, voluntários e estagiários de várias formações

acadêmicas, e não apenas jurídica e na Austrália a “The Victim Support Service Inc. of South

Australia”, que fornece apoio as pessoas que sofrem danos resultantes de crimes.

Como se vê, essas iniciativas demonstram que o mundo começa a se conscientizar em

favor da vítima, seu tratamento passa a integrar o exercício efetivo do conceito de cidadania.

No Brasil, essa proteção à vítima ainda está engatinhando mas, como diz Calhau, as
30

mudanças buscadas com os modelos de gerenciamento de segurança pública e a adoção de

medidas definidas no Plano Nacional de Segurança Pública, aliados ao investimento na

prevenção de crimes e criação de núcleos de assistência a vítima, refletirão em benefícios para

os vitimizados, principalmente os de classe média e baixa. Um exemplo disso foi a criação da

“Delegacia da Mulher”.
31

CAPÍTULO 5 – A APLICABILIDADE DA VITIMOLOGIA NO BRASIL

Atualmente temos o que podemos chamar de criminalidade oculta vez que nem todos

os delitos que ocorrem são levados a conhecimento das autoridades policiais e judiciária (cifra

negra) devido ao medo de represálias ou pela descrença na justiça penal, fazendo com que as

estatísticas oficiais não representem fielmente a real criminalidade.

Assim, as pesquisas de vitimização compostas por questionários estruturados,

direcionados às vítimas dos delitos, sem levar em conta as estatísticas oficiais, como aponta

Molinas (1997), “permitem avaliar cientificamente a criminalidade real, constituindo a técnica

mais adequada para quantificá-la e identificar suas variáveis”. Permitem identificar variáveis

como idade, nível econômico e sexo das vítimas em cada tipo de delito, facilitando os

programas de prevenção.

Nosso pais é recordista em analfabetismo, desigualdade social pela alta concentração

de renda nas mão de poucos, desemprego, desnutrição infantil e falta de saneamento básico e

água potável. Esses fatores favorecem, e muito, o processo de vitimização da nossa

população, como veremos em momento oportuno. Daí a necessidade de se dar maior

importância à vitimologia, não só buscando a punição do infrator ou a reparação das

conseqüências de sua conduta mas também orientando o Poder Público na prevenção dessas

causas de vitimização.

5.1 Artigo 59 do Código Penal Brasileiro

Nosso Código Penal, em seu artigo 59, orienta o juiz na primeira fase de fixação da

pena, levando em conta não só o agente ativo ou as circunstâncias, mas também a vítima,

sendo o primeiro dispositivo legal que permite a aplicação da vitimologia. Assim dispõe o
32

artigo:

“art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta


social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e
conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima,
estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e
prevenção do crime” (DELMANTO, 2000, p. 92)

Com base neste artigo, o juiz deverá fixar o tipo de pena, sua quantidade, o regime de

cumprimento e, quando permitido, a substituição de pena, necessários e suficientes para a

repressão do crime cometido e sua prevenção. (DELMANTO, 2000)

Esse dispositivo busca atender ao princípio constitucional da individualização da pena,

a fim de alcançar reprovação e a prevenção do crime praticado, bem como a ressocialização

do agente, levando em consideração as circunstâncias judiciais, assim chamadas por servirem

de base para uma atividade jurisdicional, nele mencionadas. A reprovação equivale à punição

do agente pelo delito praticado, já a prevenção está não só em fazer com que o agente não

volte a delinqüir, como também em evitar que outras pessoas venham a delinqüir pelo medo

da punição.

As circunstâncias judiciais são subdivididas em subjetivas, compreendendo os

antecedentes, a conduta, a personalidade e os motivos do delito e objetivas, que constituem as

circunstâncias do crime, suas conseqüências e o comportamento da vítima. (BARREIROS,

2006)

Estas circunstâncias são descritas por Barreiros (2006), detalhadamente em seu artigo.

Pelos antecedentes, entendemos as ocorrências criminais na vida pregressa do infrator,

embora o STF esteja hoje levando em consideração como antecedentes as circunstâncias do

crime e a personalidade do agente. Independente desse posicionamento entende-se mais

acertado não considerar antecedente, nada além das ocorrências criminais, já que o artigo 59

traz circunstâncias mais apropriadas para a análise desses outros fatores. Deve se ressaltar que

os crime prescritos não devem ser levados em consideração neste caso, embora haja
33

entendimento diverso.

A conduta social do acusado está relacionada, com a comunidade em que ele se

encontra inserido, seu comportamento familiar, no trabalho, na vizinhança. Esse fator faz com

que o juiz conheça a pessoa que está julgando a fim de analisar se merece maior ou menor

reprimenda.

A personalidade do réu, não pode ser confundida com maus antecedentes, servindo

para determinar o âmbito de autodeterminação do indivíduo, a fim de firmar o grau de sua

culpabilidade

Os motivos são os fatos que levaram o individuo à prática da conduta criminosa. É o

elemento psicológico que propulsiona a conduta e, para dosagem da pena, deve-se levar em

conta sua natureza e qualidade

As circunstâncias do crime constituem um complemento ao tipo penal, não existindo

sem ele. Elas promovem mudanças qualitativas e quantitativas na reprovabilidade da conduta

e, conseqüentemente na sua gravidade. Não se confundem com as circunstâncias legais dos

rtigos 61, 62, 65 e 66 do Código Penal.

As conseqüências do crime representam o dano causado pela conduta delituosa e sua

repercussão social e clamor público.

O comportamento da vítima, em estudo neste trabalho, poderá aumentar ou diminuir a

reprovabilidade da conduta delituosa, não podendo haver compensação de culpas. Essa

contribuição da vítima é levada em conta apenas para o abrandamento da pena aplicada,

entretanto é de grande importância sua análise como explana Delmanto:

“O comportamento do ofendido deve ser apreciado de modo amplo no


contexto da censurabilidade do autor do crime, não só diminuindo, mas
também aumentando, eventualmente. Não deve ser igual a censura que recai
sobre quem rouba as fulgurantes jóias que uma senhora ostenta e a
responsabilidade de quem subtrai donativos, por exemplo, do Exercito da
Salvação” (DELMANTO, 2000, p. 104)

O processo de fixação da pena, como demonstra Barreiros (2006), ao citar Nucci, é ato
34

de discricionariedade onde o juiz, observando o limite mínimo e máximo da pena

estabelecidos na lei para o determinado delito, estabelece o quantum de acordo com seu

convencimento, formado durante o processo.

Todavia, essa discricionariedade é limitada a fim de prevalecer uma pena justa e

suficiente para aquele delito e aquele delinqüente. Essa limitação está exatamente na

exigência de fundamentação de todos os argumentos utilizados na sentença, seja ela

condenatória ou absolutória, prevista no artigo 93, inciso IX da Constituição Federal.

A fundamentação faz-se necessária também, como lembra Barreiros, em caso de

recurso. Estando a parte inconformada com a decisão, irão exercitar e fundamentar seu direito

de recurso com base na motivação.

Atualmente, entende-se que essa fundamentação somente se faz necessária, em relação

aos pontos desfavoráveis ao infrator, vez que, para fixação da pena o juiz parte do mínimo

previsto em lei e a pena final não pode ser inferior a esse mínimo. Presume-se assim que as

circunstâncias não mencionadas são favoráveis ao réu (BARREIROS, 2006)

O Código Penal, como ressalta Damásio (2003) adotou o sistema de fixação de pena

de Nelson Hungria, que a divide em três fases. Na primeira, o juiz deve considerar primeiro as

circunstâncias judiciais do artigo 59, dentre elas o comportamento da vítima, em relação à

pena abstrata, para depois levar em conta as circunstâncias legais genéricas, sendo elas as

agravantes e atenuantes, para, em seguida, aplicar as causas de aumento ou diminuição. Estas

últimas fases são aplicadas em relação à pena fixada na primeira fase.

Essa posição é questionada pela doutrina, pois pode levar o juiz a considerar duas

vezes a mesma circunstâncias, ou seja, ao fixar a pena base levaria em conta, por exemplo, o

motivo, com fundamento no artigo 59, e depois, na segunda fase, consideraria o mesmo

motivo, com fundamento no artigo 61, II, “a”.

Essa discussão, contudo, segundo Damásio, não é correta, tendo em vista que o juiz,
35

ao levar em conta qualquer circunstância, deve fundamentá-la de forma pormenorizada.

5.2 A aplicação da pena e o artigo 59 do Código Penal Brasileiro

O artigo 68 do Código Penal trata da aplicação da pena, disciplinando que esta se dará

segundo os critérios do artigo 59, já estudado no item anterior, seguida da aplicação das

circunstâncias atenuantes ou agravantes e das causas da diminuição ou aumento da pena.

Cabe primeiramente diferenciar as elementares, que são os componentes essenciais do

tipo sem as quais este não existe ou pode se configurar em outro, das circunstâncias que,

como aponta Capez (2005), são dados que se agregam à figura típica sem alterar o tipo,

servindo apenas para a dosagem da pena.

Os critérios do artigo 59 bem como as atenuantes ou agravantes, as causas de aumento

ou diminuição, são circunstâncias, levadas em conta na fixação da pena. As circunstâncias do

referido artigo são judiciais, pois são fixadas pelo juiz, de acordo com seu convencimento. Já

as causas de aumento ou diminuição e as atenuantes ou agravantes são causas legais, que,

quando presentes, devem obrigatoriamente ser apreciadas pelo juiz, ficando a critério deste

somente o quantum da atenuação ou agravamento. As causas de aumento ou diminuição

trazem o quantum já previsto no dispositivo legal.

Neste artigo 68, podemos observar o sistema trifásico de aplicação da pena de Nelson

Hungria. O artigo 59, com suas circunstâncias judiciais é a primeira fase desse sistema, não

bastando a mera menção à essas circunstâncias, sendo necessária sua fundamentação, sob

pena de nulidade do ato decisório, seguida das circunstâncias legais que atenuam ou agravam

e aumentam ou diminuem a pena.

Todavia, faz-se importante o juiz, antes do início da fixação da pena, observar se

existe qualificadora no caso em análise uma vez que a qualificadora altera a pena base, como
36

ressalta Capez (2005) citando o exemplo do homicídio, cuja pena base está entre 6 e 20 anos,

mas quando qualificado, esta passa para 12 a 30 anos.

Na primeira e segunda parte é impossível a fixação da pena abaixo do mínimo ou

acima do máximo, independente do fato de todas as agravantes estarem contra o autor, ou

todas as atenuantes a seu favor, posto que a lei não estabelece quanto deve diminuir ou

aumentar.

Já na terceira fase, onde são aplicadas as causas de aumento e diminuição, tendo em

vista que a lei traz previsão de quanto deve aumentar ou diminuir, a pena final aplicada pode

ficar abaixo do mínimo ou acima do máximo previsto para o tipo penal do caput.

Havendo conflito entre circunstâncias judiciais favoráveis e desfavoráveis ao agente,

deve-se levar em conta primeiramente as que digam respeito à personalidade do agente, aos

motivos do crime e aos antecedentes, em seguida as circunstâncias subjetivas e, finalmente, as

conseqüências do crime e o comportamento da vítima. (CAPEZ, 2005).

Nos ensina Capez (2005) que as circunstâncias judiciais do artigo 59, além de

influenciarem na fixação da pena, também são levadas em conta na fixação do regime de

cumprimento da pena final fixada, devendo também ser fundamentada com base nelas a

fixação de um regime mais severo ou mais brando.

O artigo 59 também terá relevância quando a lei e o caso concreto permitirem a

substituição da pena privativa de liberdade por outra.

5.3 Aplicação teórica da Vitimologia

É de se ressaltar que existem várias correntes teóricas a cerca da vitimologia. Uma

delas apontada por Semedo (2005) é a vitimologia feminista.

Após a década de 60, a violência deixou de ser exclusividade das ruas, passando a
37

invadir o espaço doméstico, até então não observada pela criminologia e vitimologia

tradicionais, ocupadas dos crimes públicos.

Com a abordagem feminista, novas representações de vítimas puderam ser teorizadas,

tornando-se objetos de estudo. Foi o que ocorreu com a criança maltratada na década de 60, a

mulher que sofre com a violência conjugal em 70, as vítimas de abuso sexual em 80 e o idoso

maltratado e negligenciado em 90.

A ênfase alcançada pela vitimização familiar fez com que a vitimologia voltasse seus

olhos para esta nova realidade e adaptasse seus conceitos a fim atender as necessidades dessas

novas vítimas e transformar a estrutura dessas práticas sociais que favorecem a vitimização.

Outra corrente teórica apontada pelo autor é a vitimologia critica, ocupada de todas as

condições passiveis de lesar a dignidade e os direitos dos cidadãos, configurando uma

“criminologia dos direitos humanos”. Esta corrente teórica foi uma reação à corrente anterior,

criticando seu enfoque individualista. Essa corrente é mais focada na situação do sistema

judiciário, vez que, embora os direitos sejam legalmente reconhecidos, nem todos os cidadãos

tem oportunidade de exercê-los.

Aponta também a vitimologia atual, surgida nos anos 80, com a crescente politização

do fenômeno criminal e o alarme social em torno da insegurança. A justiça penal de então,

torna-se politicamente conservadora e crescentemente punitiva. Nessa corrente, recupera-se

visão de vítima inocente e criminoso culpado e a enfatizar-se os crimes ocorridos nas ruas.

Independentemente dessas correntes teóricas, os estudos da vitimologia contribuem

para a melhor compreensão da criminalidade e da interação vítima-delinqüente, permitindo

identificar, como demonstra Maia (2003), em que medida a vítima interfere para o

desencadear da conduta criminosa ou na sua precipitação, como suas ações condicionam ou

direcionam as ações de seus agressor e em quais delitos sua participação é de maior ou menor

importância.
38

Essas informações servem de base para a elaboração de textos legais, como é o caso

do nosso Código Penal que prevê vários crimes onde a participação ativa da vítima é

fundamental, como nos demonstra Almeida (2007) em seu texto:

1 - homicídio privilegiado (artigo 121, §1° do CP) onde há a provocação injusta da

vítima, levando o agente a cometer o crime sob forte emoção ou em caso de eutanásia onde a

forte emoção é desencadeada pelo sofrimento da vítima;

2 - rixa (artigo 137 do CP) onde vítimas e criminosos se misturam, tornando difícil

diferenciá-los e são provocadas lesões em todos os participantes;

3 - estelionato (artigo171 do CP), crime que ocorre devido a ganância da vítima que na

ânsia de ver aumentado seu patrimônio se deixa ludibriar pelo criminoso;

4 - corrupção ativa e passiva (artigo 317 e 333 do CP), esses dois tipos não ocorrem

necessariamente ao mesmo tempo, mas quando ocorre as vítimas são tão culpadas quanto os

infratores;

Como vemos existem, na teoria, várias oportunidades de aplicação da vitimologia,

contudo, na prática, não é o que ocorre. Ainda estamos muito atrelados ao estudo do crime e

de seu autor, deixando de dar atenção a quem estes atingiu; mesmo quando estamos

defendendo o autor, deixamos de levar em conta a vítima quando esta poderia diminuir ou até

isentá-lo de pena e nos restringimos ao crime objeto da ação.

Outra oportunidade de aplicação da vitimologia está em relação ao crime organizado.

Esta é uma nova preocupação dessa ciência, contudo, os estudos a ele relacionados ainda não

são consistentes. Assevera Calhau (2002), que o crime organizado vem derrotando o sistema

repressivo, fazendo uso de métodos distintos da criminalidade comum e aproveitando-se da

desorganização da Justiça Criminal. Nesse sentido, a vítima é a sociedade, que encontra-se

desorganizada.

Podemos ainda citar outros casos onde a participação da vítima pode ser muito
39

relevante, como os delitos de furto, de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, dentre

outros.

Faz-se necessário, com isso, um maior incentivo e investimento em pesquisas

vitimológicas a fim de identificar o que torna essa sociedade tão vulnerável a esse crime

organizado como, por exemplo, o trafico de drogas, gerando subsídios para a elaboração de

modelos de programas de prevenção e a implementação do mais adequado ao caso concreto.

Esses estudos podem ser utilizados também na identificação e de indivíduos com

tendência a ser vítima (perigosidade Vitimal) e sua orientação/educação no sentido de evitar

que torne-se vítima de fato, uma vez que incitando a pratica do delito, não coloca somente a si

em risco mas também a sociedade, já que o crime é perturbador da paz pública. (ROIDIS,

2000)

5.4 Aplicação prática da Vitimologia

O estudo vitimológico, segundo Calhau (2002) “tornou mais claros os horizontes da

repressão ao delito bem como apontou importante roteiro para a elaboração de políticas de

prevenção dos mesmos, não só orientando o legislador no sentido de reformular as leis como

também na prática de meios de orientação das vítimas em potencial em relação a todo tipo de

infração, desde acidentes de transito, até os crimes sexuais.

A vitimologia tem crescido em todo mundo sendo criadas Sociedades e Associações

de pesquisa e estudo do tema, com freqüentes realizações de congressos, simpósios e

seminários nacionais e mundiais, uma delas é a Sociedade Mundial de Vitimologia que realiza

um importante seminário internacional onde reúne grande número de pesquisadores de vários

países.

No Brasil não poderia ser diferente. Em janeiro de 1984, foi fundada no Rio de Janeiro
40

a Sociedade Brasileira de Vitimologia com as finalidades de:

“a) realizar estudos e seminários ligados à pesquisa vitimológica; b)


desenvolver de qualquer forma o estudo e a ampliação da Vitimologia no
Brasil; c) manter contatos com grupos nacionais e internacionais,
promovendo reuniões para discutir aspectos relevantes da ciência penal e
criminológica relacionados com a Vitimologia.” (DOTTI, 2001, p. 102)

Essa Sociedade, em conjunto com a World Society of Victimology e a Universidade

Federal do Rio de Janeiro Realizaram o VII Simpósio Internacional de Vitimologia, versando

sobre vários temas como a vitimização pelas drogas, as vítimas do abuso de poder, as

minorias, entre outros (DOTTI, 2001). Mais recentemente, em 2000 organizou-se o V

Congresso Brasileiro de Vitimologia voltado, no enfoque interdisciplinar, à apresentação de

novas reflexões e soluções no campo da Justiça, dos Direitos Humanos e Sobrevivência da

Humanidade (CALHAU, 2002).

Temos ainda no Brasil, o Pró-Cevic – Programa de Atendimento às Vítimas de Santa

Catarina que busca facilitar o acesso de todos aos seus direitos fundamentais, principalmente

a parcela menos favorecida da população, buscando a reestruturação moral, psicológica e

social não só da vítima como também de seus familiares.

Os resultados dos estudos dessas organizações podem orientar na prevenção de crimes

que presenciamos nos jornais todos os dias, como expõe Almeida (2007).

Entre eles temos os crimes contra o patrimônio que, na maioria das vezes se dão pela

necessidade de se adquirir recursos para o consumo de drogas. Neles temos como vítima não

só individuo que teve seu bem subtraído como também o delinqüente que por conseqüência é

vítima dos chefões do tráfico. Esses crimes podem ser diminuídos com uma forte campanha

de conscientizar e desestimular o consumo de entorpecentes.

É o que ocorre também com o abandono intelectual, que consiste em não providenciar

a educação primária do filho. Esse abandono se dá, na maioria das vezes, por

desconhecimento dos pais de que essa conduta é crime ou até, como ocorre no interior do
41

país, pela dificuldade do acessão à escola e pela ajuda do filho no trabalho da roça. O governo

já tem implementado programas a fim de corrigir esta situação, dentre eles o bolsa família,

todavia, esse programa não é eficaz, devido à corrupção e fraude existentes.

No caso das lesões corporais, como demonstram os Boletins de Ocorrência, a maioria

delas se dá dentro de bares e padarias e a maior parte dos envolvidos encontra-se em estado de

embriaguez. Assim uma prevenção sobre o uso indiscriminado de bebidas alcoólicas pode

reduzir consideravelmente essas ocorrências.

Nos crimes sexuais, a maioria das vítimas deixa de levar sua ocorrência ao

conhecimento da polícia por medo ou por vergonha. Assim, torna-se necessário um programa

de incentivo à denúncia desses delitos e à garantia de preservação da vítima durante a

investigação.

5.5 Reflexos da Vitimologia no direito nacional

A vitimologia teve reflexos, ainda, na legislação pátria, como já mostramos com o

artigo 59 e outros do Código Penal, na Lei 9.099 de 26 de setembro de 1995, e ainda com as

Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006 e a Lei 9.714 de 25 de novembro de 1998 ao instituir a

pena restritiva constituída em perda de bens e valores em favor do Fundo Penitenciário

Nacional (FUNPEN), criado pela Lei Complementar n° 79/1994, com o objetivo de

assistência à vítima de crimes, com o recurso obtido, dentre outras fonte, das multas fixadas

em sentenças transitadas em julgado. (DOTTI, 2001)

A Lei 9.099/1995, que facultou a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais,

veio atender, embora não totalmente, uma das principais reivindicações da vitimologia, como

demonstra Molinas (1997), vez que enaltece a reparação dos danos.

Até então o crime constituía um enfrentamento entre seu autor e as leis do Estado,
42

deixando de lado o conflito humano que o baseou e gerou expectativas além da pretensão

punitiva estatal.

A lei traz um modelo comunicativo e resolutivo à medida que permite o diálogo entre

o autor do fato e a vítima a fim de chegar a uma composição dos danos, resolvendo assim o

mencionado conflito humano.

Por ser a reparação do dano condição para a suspensão condicional do processo, a

Lei 9.099/1995 serve também aos propósitos da criminologia pois permite ao delinqüente,

visualizar a extensão do dano que causou a vítima e sentir suas conseqüências, vez que irá

repará-lo, como também permite a suspensão do processo, impedindo que este infrator junte-

se a criminosos mais perigosos na prisão e posteriormente volte a sociedade, pior do que saiu

dela.

Essa justiça consensual tende a crescer no direito pátrio, como aponta Calhau (2002),

buscando a composição e prevenção do conflito, no caso de infrações leves e médias, sem a

necessidade da sentença penal condenatória, tendo em vista que o sistema penal hoje não é

capaz de atender a todos os casos que lhe são apresentados.

Apesar de a reparação dos danos neste caso ser obrigatória somente quando o agente

tiver condições de fazê-lo e os réus na maioria das vezes são pessoas incapazes de reparar o

dano, a vitimologia apresenta como solução a este problema a instituição de um fundo de

reparação dos danos à vítima com receitas obtidas com as multas, incluindo a penal, e com

verbas estatais, uma vez que o Estado, como afirma Brega Filho (2004), “em última instancia,

tem por obrigação garantir os bens jurídicos e, em caso de lesão, deve promover a sua

indenização”

Outro diploma relevante constitui a Lei 11.430/2006 conhecida como Lei Marina da

Penha que visa proteger a mulher vítima de violência doméstica e familiar definidas pela lei

como “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento
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físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”, dando um tratamento penal e

processual diferenciado a crimes já elencados na nossa legislação penal. (MOREIRA, 2007)

A Lei Maria da Penha prevê a aplicação de medidas protetivas de urgência, como a

própria lei denomina, consistentes em afastamento do agressor do lar em que conviva com a

ofendida, proibição de condutas do agressor como a aproximação ou contato com a ofendida,

restrição à visita dos dependentes menores, encaminhamento da ofendida e seus dependentes

a programas de proteção e determinação da separação de corpos, dentre outras previstas nos

artigos 22 a 24 da lei.

Como ensina Moreira (2007), essas medidas serão concedidas pelo juiz a requerimento

do Ministério Público ou a pedido da ofendida dispensando que o pedido seja subscrito por

advogado e “independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério

Público.”

Essas medidas contribuem não só para a proteção da mulher como também para evitar

a aplicação da prisão preventiva ou temporária tendo assim, um aspecto “descarcerizador”.

Ensina ainda referido autor que por ter natureza cautelar, para que seja concedida uma medida

protetiva de urgência é necessário que se demonstre a presença do fumus commissi delicti e do

periculum in mora, podendo, em casos específicos ser concedida inaudita altera pars.

Podemos também citar, a Lei 9.807/1999 que regulamenta a organização de programas

especiais de proteção à vítima e testemunhas ameaçadas. Todavia, este diploma é pouco

exeqüível, em decorrência da falta de recursos, vez que a realidade brasileira, diferente da

Itália ou dos Estados Unidos, não permite o investimento de milhões de dólares nesse tipo de

programa. Uma alternativa para este problema é a apontada por Belisário dos Santos Junior,

que consiste em utilizar o dinheiro proveniente dos bens apreendidos de condenados por

envolvimento no crime organizado, uma grande fonte hoje no país.

A nível municipal, a redescoberta da vítima levou a prefeita Marta Suplicy, em


44

outubro de 2001, a instituir a lei n° 13.198 dispondo sobre a assistência à vítima da violência

que, como vemos nos noticiários, cresce vertiginosamente nas grandes metrópoles e também

o Decreto n° 43.667 de outubro de 2006 para a regulamentação da Lei 13.198, instituindo o

Comitê Gestor, composto por representantes das Secretarias Municipais de Assistência Social,

da Saúde, de Segurança Urbana e de Educação, bem como das Coordenadorias Especiais da

Mulher e da População Negra, a fim de implementar e manter um sistema de informação

sobre os atendimentos das vítimas de violência bem como dividir entre as secretarias esses

atendimentos. (MAIA, 2003)

Temos também no Direito Penal Brasileiro, outros institutos que levam em

consideração à vítima. Entre eles podemos destacar o arrependimento posterior, elencado no

artigo 16 do Código Penal Brasileiro, como medida de política criminal, beneficiando não só

o criminoso como também a vítima. (CALHAU, 2002)

Diz o referido artigo que “nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à

pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denuncia ou da queixa, por

ato voluntário do agente a pena será reduzida de um a dois terços”. Esse dispositivo beneficia

a vítima ao permitir que tenha o seu dano reparado e, também, o criminoso por ser causa de

redução da pena ou até extinção da punibilidade nos crimes de peculato culposo, sendo

posterior à denuncia configura atenuante genérica e permite ao agente obter sursis especial ou

livramento condicional.

Todos este benefícios concedidos ao réu são um incentivo à reparação do dano à

vítima, conseqüentemente, também, são benéficos à vítima.

Podemos citar também o instituto da legítima defesa onde se faz necessária e de

extrema importância, diz Calhau (2002), uma análise da atuação da vítima no caso concreto

fim de um perfeito enquadramento da excludente de ilicitude. Exemplifica o autor que, não

será possível sua aplicação se a vítima se colocou na situação de agredida para que,
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“protegida” pela lei, pudesse consumar a agressão ao pretenso ofensor, ou seja, não pode

alegar legítima defesa quem deu causa ao acontecimento.

Esse dispositivo, como ressalta o delegado Guaracy Moreira Filho (CALHAU, 2002),

deve ainda ser alterado a fim de uma maior proteção aos direitos da vítima, uma vez que

somente o juiz pode averiguar se a conduta configurou realmente a legitima defesa e, até que

isto ocorra, o cidadão que reagiu a uma agressão injusta, encontra-se recolhido ao cárcere.

Assevera que “o agente que reagiu a um ataque injusto deve ser estimulado, protegido desde o

inicio de sua ação e não acovardado.”

Esse receio do indivíduo em reagir e ser reprimido por isso, acaba por encorajar o

delinqüente a prática do delito.

Temos ainda o consentimento da vítima, que o Código Penal, não incluiu como causa

excludente do crime, mas a doutrina o considera como cláusula supralegal. Para ser levado em

conta este consentimento deve ser eficaz, para tanto, será analisada a capacidade jurídica e

mental da vítima e da finalidade do ato para o qual consente, dentre outros fatores.

Assim, resume Greco (2004), “o consentimento para ser válido deverá ser claro, sério,

livre e determinado, identificando de forma inequívoca uma manifestação de vontade por

parte do titular do bem jurídico”, demonstrado de forma tácita ou expressa.

Diz Calhau (2002) que, quando este consentimento constituir elementar do tipo,

configurará excludente de tipicidade, já se não for elementar, poderá constituir excludente de

ilicitude.

Para que exista o consentimento eficaz, principalmente nos delitos sexuais, Francisco

de Assis Toledo, elenca seus requisitos:

“a) que o ofendido tenha manifestado sua aquiescência livremente, sem


coação, fraude ou outro vicio de vontade; b) que o ofendido, no momento da
aquiescência, esteja em condições de compreender o significado e as
conseqüências de sua decisão, possuindo, pois, capacidade para tanto; c) que
o bem jurídico lesado ou exposto a perigo de lesão se situe na esfera de
disponibilidade do aquiescente; d) finalmente, que o fato típico penal
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realizado se identifique com o que foi previsto e se constitui em objeto de


consentimento pelo ofendido.” (CALHAU, 2002, p.83)

Assim, um estudo da vítima em relação ao caso concreto faz-se necessário para o

enquadramento e aplicação corretos deste instituto.

Pode-se vislumbrar também a participação da vítima no Direito Processual Penal,

quando a lei faculta a vítima o inicio da ação penal como é o caso da Ação Penal Privada que

só se procede mediante queixa do ofendido, da Ação Penal Pública Condicionada à

Representação na qual, apesar de ser promovida pelo Ministério Público, exige a prévia

representação do ofendido ou requerimento do Ministro da Justiça e, finalmente, a Ação Penal

Privada Subsidiária da Pública que se dá quando decorre o prazo para oferecimento da

denuncia sem que o Ministério Público o faça, permitindo à vítima ingressar com a ação penal

e ainda sua participação nesta como assistente de acusação.

A vitimologia também encontra aplicação no Direito Administrativo, quando falamos

de trânsito. Nosso Código de Trânsito Brasileiro inovou nesse sentido, instituindo a multa

reparatória, prevista em seu artigo 297 e que não tem nenhuma ligação com a multa

administrativa, aplicada pelo agente de trânsito. Este artigo prevê, como ensina Calhau que:

“[...] em caso de ocorrência de vítimas em crime de trânsito, a penalidade de


multa reparatória consiste no pagamento, mediante depósito judicial em
favor da vítima, ou de seus sucessores, de quantia calculada com base no
disposto no §1° do art. 49 do Código Penal, sempre que houver prejuízo
material resultante do crime. Diz ainda o §1° do referido artigo que a multa
reparatória não poderá ser superior ao valor do prejuízo demonstrado no
processo”. (CALHAU, 2002, p. 77/78)
Esta é mais uma conquista da vítima, uma vez que poderá ver reparado seu dano sem a

necessidade de recorrer ao juízo cível, embora o instituto receba fortes críticas.


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CONCLUSÃO

Pudemos observar que a vítima teve sua idade de ouro na antiguidade, com a

vingança privada onde ela detinha a administração da justiça penal e que, com a posterior

transferência desse poder punitivo para o Estado, a vítima deixou de ter importância na ação

penal, passando a ser mero elemento de prova.

Este quadro se reverteu com o fim da Segunda Guerra Mundial, quando o horror do

nazismo colocou a vítima novamente em evidência. O primeiro a estudar a vítima foi

Mendelsohn que elaborou a primeira classificação das vítimas de acordo com sua

contribuição para a ocorrência do delito. A partir daí, muito tem se falado sobre a vítima pelo

mundo, tendo esta hoje um papel de grande importância.

Vimos também que a vítima passa por um processo de vitimização que vai desde o

momento em que a vítima mentaliza a idéia de ser vitimizada, até a obtenção do resultado

pretendido pelo autor.

A vitimologia teve origem na criminologia que consiste no estudo da criminalidade e

do criminoso. Com a redescoberta da vítima, a vitimologia passou a crescer dentro da

criminologia, ao ponto de se propor àquela o status de ciência autônoma, acarretando a

realização de vários Simpósios e Congressos específicos sobre o tema no mundo todo,

inclusive no Brasil.

Os estudos vitimológicos, como ficou demonstrado, permitiram a criação e

implementação de vários programas de prevenção da criminalidade e também de reparação às

vítimas em países como Alemanha, Portugal, Argentina e principalmente nos Estados Unidos,

onde foi fundada a Organização Nacional para Assistência e instituído o Fundo Para as

Vítimas de Crimes, vinculado ao Departamento do Tesouro dos Estados Unidos.

No Brasil, a participação da vítima já é levada em conta em nosso Código Penal, não


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só no artigo 59 onde é evidente, mas também nos artigos 61, 62, 65 e 66 do mesmo diploma.

Outro exemplo marcante é a Lei 9.099/95 que prevê uma tentativa de composição

entre o autor do delito e a vítima, a fim de se evitar uma ação penal, onde dificilmente a

vítima terá seu dano reparado. Esse modelo de justiça consensual vem crescendo no direito

pátrio.

Temos ainda a participação da vítima nos crimes de homicídio privilegiado, rixa,

estelionato, corrupção ativa e passiva, furto e auxilio ao suicídio.

No Brasil, já podemos ver iniciativas de proteção à vítima como a criação do Pró-

Cevic - Programa de Atendimento às Vítimas de Santa Catarina, que busca facilitar o acesso

da vítima aos direitos fundamentais e o FUNPEN - Fundo Penitenciário Nacional,

objetivando a assistência à vítima de crimes com recursos obtidos principalmente das multas

fixadas em sentenças transitadas em julgado.

Este trabalho mostrou que, no Brasil, muito se fala sobre a vitimologia e seus

resultados, contudo, pouco se faz, quer em políticas de prevenção a criminalidade ou em

assistência à vítima, quer em aplicação da justiça, vez que na prática, ao se julgar um delito, a

defesa e a acusação deixam de levar em consideração este elemento importante no fato

“crime”, podendo em alguns casos, condenar um inocente ou absolver um culpado.

Assim, resta claro que ainda há muito o que se fazer em relação à vítima, não só

buscando a reparação dos danos por ela sofridos mas também uma efetiva redução na

criminalidade, com políticas de prevenção. Para tanto, é necessário a conscientização não só

da sociedade, fazendo com que surjam associações pelo país, mas também do Governo, em

todos os seus Poderes.


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VITIMOLOGIA. In ENCICLOPÉDIA Jurídica Leib Soibelman – CD-Rom. Editora Elfez.

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