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PARMENTIER, R. J. (1985).

Sign’s place in medias res: Peirce”s


concept of semiotic mediation. In: MERTZ, E. & PARMENTIER, R. J.
(1985). Semiotic mediation. Orlando: Academic Press.

I – Pontos Centrais
1 – Signos – categorias, relações e papéis
2 – A concepção de Peirce sobre Mediação Semiótica.

II – Desafios
- Traduzir uma síntese e interpretação da obra de Peirce
- Tratar de metapensamento

III – Conteúdo

Introdução do Editor
- Peirce desenvolveu uma vertente semiótica aplicável tanto às ciências da
natureza, quanto às chamadas de culturais, sendo tal dicotomia presente
também na abordagem da semiótica russa.
- Para ele, “toda cognição é mediada por signos, ou seja, por veículos de
expressão cujas regularidades estruturais representam as regularidades
encontradas na realidade como ela é, isoladamente de qualquer
concepção”. [p. 23]
- Cognição e realidade são trazidas para articulações possibilitadas pela
mediação da semiose, um processo dialógico no qual um signo determina
signos interpretantes subsequentes enquanto, simultaneamente, esses
interpretantes formam novas representações desta determinação. [p. 23]
- Mediação, definida também como a simples junção da regulação
normativa de elementos plurais, é a característica comum de muitos
fenômenos naturais e intencionais não comumente caracterizados como
semióticos. [p. 24] – Uma definição mais importante virá em seguida.

Introdução
- Para Peirce, a cognição humana, incluindo percepção sensorial,
sentimentos emotivos, assim como raciocínio inferencial, envolve “signos
internos” interligados, por um lado, entre si, numa infinita série de estágios
de diálogo mental e, por outro lado, com a realidade externa, representados
como objetos interagindo de modos similares às interações entre
constituintes das relações entre signos. Em todo ato mental, algum traço de
realidade, definida como aquela que é como tal por estar afastada de todo
e qualquer pensamento sobre ela, é colocado em contato com uma cadeia
de representações mentais que têm o poder singular de interpretar a
realidade de modos diferentes do que ela, de fato, é. Mas desde que os
objetos reais possuem as qualidades ou características, eles as possuem
independentemente da representação humana, o padrão de percepção é

1
sempre “determinado” ou causado por regulações naturais; uma cognição
resultante é verdadeira/válida para o grau que as relações desenvolvidas
entre signos mentais equilibram-se com as relações desenvolvidas entre
signos externos. Há, para dizer a verdade, um mundo de fato e um mundo
representado, mas a descoberta fundamental de Peirce é que esses dois
diferentes domínios são articulados pelo papel mediador dos signos. [p. 24-
25]

O modelo fundamental de mediação semiótica


- Em seu sentido mais elementar, a noção de mediação pode ser definida
como qualquer processo em que dois elementos são colocados em
articulação pelo significado ou pela intervenção de algum terceiro elemento
que sirva como veículo ou mídia de comunicação. [p. 25]
- Como um Signo, entendo qualquer coisa, real ou fictícia, capaz de adquirir
forma sensível, aplicável a outra coisa que não ele próprio, que já é
conhecido, e que seja capaz de ser interpretada em outro signo que eu
chamo de seu interpretante, por comunicar algo que não seja previamente
conhecido sobre seu objeto. Há, então, uma relação triádica entre qualquer
signo, um objeto e um interpretante. [p. 26 – citação]
- Signo – objeto – interpretante [p. 26-27]
- Determinação [p. 27]
- Representação – noção de Peirce, baseada em exemplos [p. 27-28]
- Figura [p. 28]
- É óbvio porque Peirce menciona, primeiro, que a ação do objeto sobre o
representante é “determinação mediada” e, segundo, que o interpretante,
em si, é uma “representação mediada”. [p. 28]
- Semiose é, portanto, um “processo infinito” ou uma “série sem fim” (MS
599.32, c. 1902) em que o interpretante aproxima-se de uma representação
do objeto à medida que novas determinações são acumuladas em cada
momento. É claramente reconhecido por Peirce que este processo funciona
em duas direções, “de volta ao objeto” e “seguindo rumo ao interpretante”
(MS 599.38, c. 1902). [p. 29]
- (...) o objeto de uma representação pode ser uma representação (...).[p. 29
– citação]
- (...) relação simbólica, na qual o representamen e o objeto estão
relacionados apenas porque o interpretante os representa como
relacionados. [p. 30] – Novas relações podem ser e são criadas, como se
faz em arte.
- É esse terceiro, simbólico modo de relação entre representamen e objeto
que causa a assimetria entre determinação e representação, (...). [p. 30]
- Uma análise atenta dessas referências demonstra que Peirce alterou a
ênfase na mediação entre dois polos gerais. [p. 31]
o O primeiro polo foca no papel sintético do interpretante na
formação da representação de uma relação entre objeto e

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representante no sentido de estes dois elementos tornarem-se
ligados numa rede semiótica e não serem mais eles mesmos; deste
modo, o interpretante é chamado de mediador da relação entre signo
e objeto como um todo.
o O segundo polo foca na idéia de mediação por um representante
como veículo ou meio de ligação entre objetos e ulteriores
representações mentais ou interpretantes.
- Portanto, o signo por si mesmo, ou seja, a forma perceptível, é dito como
mediador entre objeto e interpretante, e o interpretante é mediatamente
determinado pela representação, substituindo o objeto. Esses dois pólos
correspondem à dupla preocupação de Peirce com níveis de semiose e
representações mediadas, de um lado, e cadeias de semiose e
representações mediadas, de outro. [p. 31-2]
- DEFINIÇÕES [p. 32]
o Forma ou marca (?) é a qualidade ou característica que, quando
associada com uma representação, constitui sua conotação1 ou
intensidade;
o Objeto é algo real ou fictício que, quando associado com uma
representação, constitui sua denotação2 ou extensão.
- O modelo de Peirce para representação aqui apresentado aproxima-se de
sua preocupação com as causas lógicas de proposições, nas quais o
elemento denotado pelo conteúdo da proposição é entendido como aquele
que engloba a forma conotada pelo predicado (WCP 1:228, 1865). E
partindo dessa tripartição ontológica, baseada na forma proposicional,

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substantivo feminino
1 algo que uma palavra ou coisa sugere; implicação
Ex.: <um cobertor macio encerra a c. de aconchego> <a palavra brotinho tem c. de coisa ultrapassada>
2 Rubrica: lógica.
na filosofia medieval e moderna, propriedade por meio da qual um nome designa uma série de atributos implícitos
em seu significado, para além do vínculo direto e imediato que mantém com os objetos da realidade
Obs.: p.opos. a denotação (lóg)
3 Rubrica: lingüística.
conjunto de alterações ou ampliações que uma palavra agrega ao seu sentido literal (denotativo), por associações
lingüísticas de diversos tipos (estilísticas, fonéticas, semânticas), ou por identificação com algum dos atributos de
coisas, pessoas, animais e outros seres da natureza (p.ex., porco, rato, pavão, cisne, garça etc.), ou do mundo
social (ligação da palavra com profissões, grupos de idade, ideologias, crenças, classes sociais, países ou regiões
geográficas etc.), ou com coisas, personagens ou pessoas que inspiram sentimentos de admiração, amor, ódio,
temor, asco etc.
Obs.: cf. denotação, compreensão e extensão
2
substantivo feminino
ato ou efeito de denotar
1 Rubrica: filosofia.
vínculo direto de significação (sem sentidos derivativos ou figurados) que um nome estabelece com um objeto da
realidade
Obs.: p. opos. a conotação (fil)
2 Rubrica: lingüística, semiologia.
relação significativa objetiva entre marca, ícone, sinal, símbolo etc., e o conceito que eles representam (p.ex., a
relação entre cruz e 'hospital', entre caveira com dois ossos cruzados e 'perigo' ou 'veneno', entre a forma sonora
[masã] maçã e 'fruto da macieira' etc.)
3 Rubrica: lingüística.
extensão do conceito que constitui o significado de uma palavra; propriedade que tem um significante de se referir
genericamente a todos os membros de um conjunto [Designa o sentido literal das palavras.]
Obs.: p. opos. a 1referência e a conotação (ling)

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Peirce deduziu as três referências necessárias, os três objetos ou
correlatos de toda representação:
o uma representação “substitui” seu objeto, –ícone
o “concretiza” sua forma, e –índice
o traduz uma representação equivalente, como demonstrado na figura
três, em seguida (p. 33). –símbolo
- O terceiro objeto de uma representação é, portanto, outra representação na
qual o produto da denotação e da conotação da primeira representação é
traduzido e comunicado; Peirce denominou esse produto “informação”
da representação. E, finalmente, dada a distinção entre denotação e
conotação, ou seja, entre algo sobre aquilo que é dito e aquilo que é dito
sobre algo. [p. 32-3]
o Primeiro, cópias ou análogos são representações que conotam sem
denotar pelo mérito de assemelharem-se a seus objetos (como, por
exemplo, pinturas, estátuas e hieróglifos); – ícone
o segundo, signos ou marcas são representações que denotam sem
conotar, na base de alguma fixidez ou convenção prévia (como
quando um nome próprio é atribuído em batismo); – índice
o terceiro, “símbolos” são representações que denotam pela virtude
de conotarem e que, quando apresentadas para a mente, chamam
imediatamente uma concepção do objeto, não em razão de
convenções prévias ou semelhanças formais, mas antes pela virtude
de relações equivalentes com outra representação ou sistema
simbólico (WCP 1: 304, 1865). – símbolo
- (...) forma é uma qualidade abstrata atribuída a um objeto e denotada pelo
conteúdo (CP 1.548, 1867).
- As três referências de uma representação (forma, objeto, e representação
equivalente) tornam-se aqui as três concepções universais ou categorias:
[p. 33]
o referência a uma “causa” – ícone
o referência a um “correlato”, e – índice
o referência a um “interpretante” – símbolo
- Nesta terminologia revisada, causa é a qualidade ou relação na qual a
representação aponta para seu objeto ou correlato; e o interpretante é
representação mediata que “representa a relação como uma representação
da mesma correlação que esta representação mediada, por si mesma,
representa” (CP 1.553, 1867). Há, portanto, três níveis distintos de
referência: [p. 33-4]
o Referência singular à causa ou “Qualidade” – ícone
o Dupla referência ao par causa-correlação ou “Relação”, e – índice
o Tripla referência à tríade causa-correlação-interpretante ou
“Representação” – símbolo

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- E esses três níveis, em curso, correspondem a três categorias metafísicas
fundamentais, que Peirce nomeou Primeiridade, Secundidade e
Terceiridade. [p. 34]
- Essa ligação direta dos constituintes semióticos e categorias metafísicas
dependem não apenas de causas isoladas dos três termos das relações
entre os signos, mas também na hierarquia arquitetônica necessária em que
a referência ao correlato ou objeto pressupõe referência à causa e
referência ao interpretante, pressupõe referência tanto à causa, quanto ao
correlato. [p. 34]
- Desta análise, Peirce prosseguiu deduzindo que deve haver três tipos de
representação. [p. 34]
o No primeiro e mais simples caso, referência à causa envolve uma
qualidade compartilhada pelo representante e pelo objeto; - ícone;
primeiridade
o no segundo caso, referência a uma causa envolve uma qualidade que
desloca [tenta deslocar] a representação do objeto contra ele
próprio, a ponto de a correspondência de fato; e – índice;
secundidade
o no terceiro caso, referência à causa é impossível sem (não pode
“prescindir” de) referência ao interpretante, que supre a qualidade
causal, sustentando a relação entre representação (relato ou signo) e
objeto (ou correlato). – símbolo; terceiridade
- Esses três casos correspondem à conhecida tricotomia do ícone, índice e
símbolo (ainda que em 1860 Peirce tenha usado, freqüentemente, os
termos cópia e semelhança para ícone e sinal, para índice).
- Não apenas operações intelectuais como conceituações e julgamentos, mas
também sentimentos e percepções são todas inerentemente semióticas, ou
seja, envolvem a mediação processual de cognições (representações) por
representações subsequentes, com cada representação adicional trazida
pela esquematização das anteriores. [p. 34]
- (...), Peirce direcionou seu ataque filosófico, ao final de 1860, contra todos
os tipos de intuições Cartesianas que postulam sobre a existência de
imediata (e, portanto, não-semiótica) cognição. [p. 35]
- E é este discernimento que o leva a afirmar que há mais para a realidade do
que a existência bruta/irracional (Secundidade) e possibilidade qualitativa
(Terceiridade). De fato, a realidade genuína das terceiras ou tríades,
incluindo representações puramente simbólicas prototípicas com suas três
referências, implica o fato de elas não serem redutíveis nem a Segundos
ou Primeiros, ainda que requeiram essas categorias inferiores tanto
quanto por elas são determinadas. [p. 35]
- Por Terceiro, quero dizer o meio/a mídia ou conexão entre o estritamente
primeiro e o último. O início é o primeiro; o final, segundo; o meio,
terceiro. (CP 1.337, c. 1875) [p. 35-6]

5
- Dois temas emergem deste fragmento: primeiro, Terceiridade como
pertencente a uma posição intermediária ou a um termo intermediário num
sistema, e segundo, Terceiridade como pertencente a um princípio
racional ou normativo que regula objetos, percepções e eventos. [p. 36] –
Entretanto, de forma diferente da conexão – mencionada anteriormente –
entre o índice e as convenções.
- Já citamos a passagem principal desse manuscrito, mas é importante
relembrar que a tríade não é signo, objeto e interpretante, mas sim
objeto, significado e interpretante: (...) [p. 37]
- De noção preliminar sobre o funcionamento do interpretante como um
poder sintético de unir, numa representação posterior do signo, significado
e objeto (uma marca (?), um correlato, no vocabulário elementar), Peirce
aqui foca na própria função mediadora do signo na criação de uma tríade
irredutível. [p. 37]
- [p. 38]
o Deve haver uma simples relação racional entre o signo e a coisa
significada; neste caso, o signo é um ícone.
o Ou deve haver uma conexão física direta; neste caso, o signo é um
índice.
o Ou deve haver uma relação que consiste no fato de a mente associar
o signo com seu objeto; neste caso, o signo é um nome. (CP 1.372,
1885)
- (...): no sistema de 1867, as três categorias eram qualidade, relação, e
representação, enquanto neste artigo de 1898, Peirce prefere qualidade,
reação e mediação.
- Primeira tem sido simples em si mesma; Segunda é aquela que é, por
força, outra coisa; e “a Terceira é aquela que é o que é devido às coisas
que medeia e entre as quais é capaz de criar uma relação” (CP 1.356, c.
1890). [p. 40]
- Primeira é a concepção de ser ou existir independentemente de qualquer
outra coisa. Segunda é a concepção de ser relativa a, a concepção de
reagir com outra coisa. Terceira é a concepção de mediação, por meio da
qual a primeira e a segunda são postas em relação... (...) Em psicologia,
Sentimento é Primeira, Instinto de Reação, Segunda, Concepção
Generalizada, Terceira, ou mediação. [p. 40]
- Um contrato legal, para mencionar um exemplo, não pode ser avaliado
simplesmente pela combinação de duas relações diádicas, a primeira sendo
a assinatura do documento C por A e a segunda sendo a assinatura do
documento C por B. A essência do contrato reside na “intenção” [ou no
significado] do contrato, que estipula certas regras condicionais para
governar o comportamento futuro de A e B (CP 1.475, c. 1896). Portanto, o
ato de fazer um contrato não pode ser reduzido à composição dos pares
componentes, e ainda a função da Terceiridade inerente ao contrato, por

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si só, é trazer esses dois pares para uma relação comprometida para o
futuro. [p. 41]
- Em 1902, a afirmação é que esta mediação é uma modificação da
Primeiridade e da Secunidade pela Terceiridade (CP 2.92, c. 1902), e
em 1903, novamente, Terceiridade é definida como “a mediação entre
Secundidade e Primeiridade” (CP 5.121, c. 1903). E finalmente, em
1904, Peirce diz explicitamente que “Uma Terceira é algo que traz a
Primeira a uma relação com a Segunda” (PW 31, 1904) e interpreta a
relação entre signos numa linguagem semelhante. [p. 41]
- Por toda a primeira década do século, Peirce manteve dois postulados sobre
Terceiridade e signos: primeiro, essa função de “relacionar” é baseada
numa regulação racional, intelectual e quase legal que supre a característica
comum natural assim como o processo cognitivo; e segundo, o signo,
por si mesmo, é o meio, a mídia, o significado, ou mediação que
liga objeto e interpretante num sistema comunicativo. [p. 42]
- Agora, em qualquer processo de comunicação, deve haver uma mídia,
significados ou veículos por meio dos quais a mensagem é convertida de
uma cognição para a próxima, e isso é precisamente a qualidade dos signos
como “terceiros mediadores” que leva Peirce a afirmar que um signo é
uma espécie de “meio de comunicação” entre duas mentes que se
aproximam para tornarem-se uma única (MS 339, 1906; MS 498). [p.
42]
- No ato de jogar uma pedra, por exemplo, há uma genuína relação diádica
entre a pessoa que joga e a pedra jogada, mas há também uma relação
triádica envolvida quando o ar, a mídia pela qual a pedra é jogada, é
considerado (MS 12.5-6, 1912). [p. 42]
- Apenas quando signos, por si mesmos, desaparecem/morrem por tornarem-
se totalmente transparentes às relações lógicas de determinação e
representação por ele mediadas é que a ciência dos signos se transforma
em ciência do pensamento. [p. 44] – A semiótica como um suporte prévio
para aplicação de postulados do cognitivismo, entre outros tantos.
- O signo perfeito, então, assemelha-se com a máquina de tradução mecânica
idealizada por Peirce, a qual traduz de uma linguagem para outra sem a
intervenção da mente humana e transmite, perfeitamente, o significado da
primeira linguagem à segunda (MS 283.102, 1905). Ainda que ele tenha
fundamentado sua filosofia semiótica na noção de mediação de pensamento
e realidade pelos signos, Peirce, ao final, reduziu o papel dos signos a
veículos cegos para comunicação de significados que eles não influenciam.
[p. 45]

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