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Epidemiologia |

República de Moçambique
Ministério da Saúde
Direção de Recursos Humanos
Departamento de Formação

Manual de Formação
para Técnicos de Medicina
Preventiva e Saúde do Meio
Epidemiologia
ii | Epidemiologia

© 2011. Ministério da Saúde.

Esta publicação do Ministério da Saúde de Moçambique (MISAU) foi realizada com apoio da Agência de Cooperação Inter-
nacional do Japão (JICA). É permitida a reprodução total ou parcial desta obra, desde que citada a fonte.
1.ª edição – Ano 2011

Elaboração, distribuição e informações:

MINISTÉRIO DA SAÚDE

Direcção de Recursos Humanos

Departamento de Formação

Repartição de Planificação e Desenvolvimento Curricular (RPDC)

Av. Eduardo Mondlane, 4º andar

Maputo – MZ

Coordenação

Lucy Sayuri Ito (JBPP/DRH - Departamento de Formação)

Extra Chadreque (DRH - Departamento de Formação)

Colaboradores

Fidel Luis Paizone (Direcção Provincial de Saúde - Inhambane)

Carlos Bambo (DRH - Departamento de Formação)

Elisa Mavili (Direcção Nacional de Saúde Pública)

Revisor de português

Extra Chadreque (DRH - Departamento de Formação)


Epidemiologia | iii

PREFÁCIO

Este manual foi concebido para estudantes de nível médio e tem a finalidade
de introduzir os princípios básicos de epidemiologia ciência médica que trata
de questões-chave como “Quem fica doente?” e Quais são os factores prog-
nósticos importantes?”
Ela tem o objectivo de descrever as condições de saúde e avaliar o impacto das
acções com vista a intervir na prevenção da doença
A elaboração deste manual contou com a colaboração de profissionais da área
de Medicina Preventiva, docentes e técnicos do departamento de formação.
Os capítulos que o constituem foram organizados seguindo a estrutura do pla-
no temático da disciplina do novo currículo de Técnicos de Medicina Preventi-
va e Saneamento do Meio. Apresentam no início de cada tema um quadro de
sugestões de metodologias de ensino e objectivos de aprendizagem e incluin-
do um glossário de termos comummente usados em epidemiologia.
A inserção efectiva do uso da epidemiologia na planificação das acções de
prevenção de enfermidades preveníveis é um assunto importante, por sugerir
uma tomada de decisão mais acertada no campo da saúde, podendo reflectir-
-se na prevenção de doenças e promoção da saúde.
O manual foi escrito numa linguagem simples e acessível para que seja de fácil
compreensão para o aluno das Instituições de Formação em Saúde. Neste sen-
tido, e com vista a melhorar cada vez mais, continuaremos a rever e analisar o
seu conteúdo de forma permanente.

Maputo, Novembro de 2011.

Alexandre J. L. Manguele
Ministro da saúde
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Objectivos da Aprendizagem

No final do tempo lectivo desta disciplina, o formando deverá ser capaz de:

1. Reconhecer os determinantes do processo saúde – doença

2. Reconhecer as diferentes fases da História Natural da Doença

3. Aplicar os níveis de prevenção e intervenção na História Natural da Doença

4. Reconhecer os factores responsáveis pelo aparecimento de uma doença

5. Compreender conceitos básicos aplicados em Epidemiologia

6. Aplicar os princípios e métodos de estudo em epidemiologia

7. Associar a distribuição das doenças e os factores de risco correlacionados com


as doenças mais prevalentes

8. Implementar a vigilância epidemiológica para o controle de problema de saúde

9. Elaborar e utilizar o canal endémico da sua área de saúde e interpretar os pro-


blemas de saúde

10. Elaborar e analisar os Boletins Epidemiológicos Semanais

11. Conceituar as principais terminologias utilizadas na epidemiologia


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Í ndice
1. Contexto histórico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.1. História da epidemiologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

2. Introdução à epidemiologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
2.1. Definição da epidemiologia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
2.2. Objectivo da epidemiologia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
2.3. Aplicação da epidemiologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

3. Glossário epidemiológico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

4. Processo saúde- doença e a história natural (hnd). . 23


4.1. Processo saúde – doença. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
4.2. História natural das doenças. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
4.3. Importância da hnd . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
4.4. Determinantes do processo saúde-doença. . . . . . . . . . . . . 28
4.5. Factores determinantes na saúde-doença. . . . . . . . . . . . . . 29
4.6. Cadeia epidemiológica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
4.7. Acções para intervir no processo saúde - doença classifica-
das em relação ao hospedeiro e ao meio ambiente. . . . . . . . . . 31
4.8. Níveis de prevenção e intervenção na HND. . . . . . . . . . . . . 32

5. Modelos de causalidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
5.1. Modelo da tríade epidemiológica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
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5.2. Modelo de componentes causais ou de multicausalidade . . . 36

6. Métodos epidemiológicos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
6.1. Estudos descritivos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
6.2. Estudos analíticos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
6.3. Estudos experimentais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
6.4. Estudos observacionais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
6.5. Relações entre incidência e prevalência. . . . . . . . . . . . . . . . 50
6.6. Relações entre exposição e doença . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50

7. Vigilância epidemiológica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
7.1. História . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
7.2. Definição. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
7.3. Propósitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
7.4. Sistema de vigilância epidemiológica em Moçambique. . . 56
7.4. Classificação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
7.5. Funções da vigilância epidemiológica. . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
7.6. Elementos da vigilância. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
7.7. Mecanismos para obtenção dos dados . . . . . . . . . . . . . . . . 65
7.8. Princípios básicos do SVE. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
7.9. Boletim epidemiológico semanal (BES) . . . . . . . . . . . . . . . . 68
7.10. Fluxograma de envio do BES de Moçambique. . . . . . . . . . 70
7.11. Elaboração e interpretação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71

8. Canal endêmico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
8.1. Definição. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
8.2. Métodos para construção de um canal endêmico. . . . . . . . 75
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8.3. Componentes do canal endêmico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76


8.4. Elaboração do canal endêmico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
8.5. Interpretação do canal endêmico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81

9. Referências bibliográficas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
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1. CONTEXTO HISTÓRICO

OBJETIVOS
99 Conhecer o início dos estudos epidemiológicos na história da me-
dicina

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Ensino/Aprendizagem
Conteúdo Objectivos da Aprendizagem
Actividades
As aulas consistirão em exposições
dialogadas. Elas abordarão aspectos da
Conhecer o início dos
História da historia da epidemiologia.
estudos epidemiológicos na
epidemiologia Os recursos didáticos a serem utilizados
história da Medicina
constarão de projetor multimídia
(datashow), quadro e canetas de filtro.

1.1. História da epidemiologia


A história da epidemiologia confunde-se com a história da medicina

Alguns marcos:

Evolução até o século XIX

99 Hipócrates: há 2.500 anos, analisava as doenças em bases racionais, como produto


da relação do indivíduo com o ambiente. O clima, a maneira de viver, os hábitos de
comer e de beber deveriam ser levados em conta ao analisar as doenças.
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99 Preservação de seus ensinamentos (Hipócrates) - Galeno (Roma antiga) – Árabes


(idade média) – clínicos (Europa Ocidental, Renascença).

99 Teoria miasmática.

99 Primórdios da quantificação dos problemas de saúde iniciada há três séculos me-


diante a quantificação dos dados de mortalidade.

99 John Graunt (1620-1674): tratado sobre as tabela mortuária em Londres: mortalida-


de por sexo e região: quantos óbitos ocorriam em relação ao total da população.”Pai
da demografia e das estatísticas vitais”.

O século XIX

99 Europa como centro das ciências - Revolução industrial e deslocamento das popu-
lações para as cidades e a ocorrência das epidemias de cólera, febre tifóide e febre
amarela. Os estudiosos se dividiam entre a teoria dos miasmas e teoria dos germes.

99 Pierre Louis: introduziu o método estatístico na contagem dos eventos, revelou a


letalidade da pneumonia em relação à época em que era iniciado o tratamento por
sangria.

99 Louis Villermé: investigou a pobreza, as condições de trabalho e suas repercussões


sobre a saúde e a estreita relação entre situação socio-econômica e mortalidade
(saúde dos trabalhadores das indústrias de algodão, lã e seda).

99 William Farr: trabalhou 40 anos no escritório geral de registros da Inglaterra: clas-


sificação das doenças, descrição das leis das epidemias (lei de Farr). Possibilitou o
acesso dos estudiosos a um manancial de informações. Conclusões: mais da ½ das
crianças não chegava à idade de 5 anos; a idade média do óbito nas classes altas
era de 36 anos, trabalhadores do comércio era de 22 anos e da indústria 16 anos.

99 John Snow: investigações sobre epidemia de cólera: o consumo de água poluída


como responsável pelos episódios da doença e traçou os princípios de prevenção
e controle de novos surtos válidos ainda hoje, mas fixados muito antes ao isolada-
mento do agente etiológico. Pai da “epidemiologia de campo”: colheita planificação
de dados.
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99 Louis Pasteur; “pai da bacteriologia”, bases biológicas para o estudo das doenças
infecciosas, identificou e isolou numerosas bactérias, estudo da fermentação da
cerveja e do leite, investigação das bactérias patogênicas e dos meios de destruí-las
ou impedir sua multiplicação e os princípios da “pasteurização”: consolidação das
teoria do agente. Seguem-se inúmeras pesquisas (Robert Koch), abandona a teoria
dos miasmas com a descoberta dos agentes causais das doenças.

Primeira metade do sec XX

99 Influência da microbiologia: estudos concentrados no laboratório, os demais ramos


da medicina eram subordinados à este conhecimento. A formação do sanitarista
centrava-se no laboratório.

99 Oswaldo Cruz (1872-1917): fundou o Instituto em Manguinhos-RJ, propiciando uma


gama de pesquisas e investimentos na área, além de combate à febre tifóide, peste
e varíola.

99 Desdobramentos da teoria dos germes, saneamento ambiental, vectores e reserva-


tórios de agentes e ecologia

99 Base de dados para a moderna epidemiologia: estatísticas vitais; informações so-


bre nascimentos, óbitos, informações sobre morbidade a partir dos dados oficiais e
sem as quais não seriam possível as investigações etiológicas.

99 Epidemiologia nutricional: algumas doenças tidas como infecciosas tinham, na ver-


dade natureza nutricional.

Segunda metade do século XX

99 mudanças das doenças prevalentes infecciosas para as doenças crônicas e degene-


rativas como causa de mortalidade e morbidade.

99 A determinação das condições de saúde da população (inquéritos de morbidade e


de mortalidade).

99 A busca sistemática de factores antecedentes ao aparecimento das doenças, que


possam ser rotulados como agentes ou factores de risco (rubéola, cigarro, e coro-
4 | Epidemiologia

nariopatias).

99 A avaliação da utilidade e da segurança das intervenções propostas para alterar a


incidência ou a evolução da doença, através de estudos controlados (estreptomici-
na na tuberculose, fluoretação da água, vacina contra poliomielite e outros).
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2. INTRODUÇÃO À
EPIDEMIOLOGIA

OBJETIVOS
99 Definir epidemiologia e explicar os seus principais objectivos

99 Conhecer a aplicação e a importância da epidemiologia

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Objectivos da Ensino/Aprendizagem
Conteúdo
Aprendizagem Actividades
Definir epidemiologia e As aulas consistirão em exposições
Definição
explicar os seus principais dialogadas. Elas abordarão os conceitos
epidemiologia
objectivos de epidemiologia, sua aplicação e
importância.
Aplicação e a Conhecer a aplicação Os recursos didáticos a serem utilizados
importância da e a importância da constarão de projetor multimídia
epidemiologia epidemiologia (datashow), quadro e canetas de filtro.

Os temas tratados na epidemiologia não são novos; relativamente novo é a disciplina aca-
démica que responde por este nome. Há registo, de uma sociedade de Epidemiologia,
fundada em Londres, em 1850. A partir desta época, aproximadamente, as investigações
etiológicas sobre as doenças transmissíveis tomaram grande impulso e geraram um vasto
conhecimento científico, que passou a constar de capítulos, nos livros de higiene, com a
denominação de “epidemiologia”. O status de disciplina científica, porém, só foi alcançado
6 | Epidemiologia

na metade do século XX, data do aparecimento dos primeiros livros-texto, detalhando con-
ceitos e métodos, exclusivamente dedicados ao assunto.

2.1. DEFINIÇÃO DA EPIDEMIOLOGIA


Etimologicamente, “epidemiologia” (epi = sobre; demo = população; logos=tratado) sig-
nifica o estudo do que afecta a população. “É a ciência que estuda a distribuição e os de-
terminantes dos problemas de saúde (fenômenos e processos associados) em populações
humanas”.

2.2. OBJECTIVO DA EPIDEMIOLOGIA


O objectivo geral da epidemiologia é o de concorrer para o controle dos problemas de saú-
de da população, através do melhor conhecimento da situação, de seus factores determi-
nantes e das oportunidades de prevenção, de cura, de reabilitação e no desenvolvimento
de políticas de saúde. O objectivo específico da epidemiologia é de fornecer os conceitos, o
raciocínio e as técnicas para estudos populacionais, no campo da saúde.

2.3. APLICAÇÃO DA EPIDEMIOLOGIA


As principais aplicações da epidemiologia podem ser colocadas em três grandes grupos,
que guardam estreita relação com a definição de epidemiologia apresentada anteriormen-
te que são:

99 Descrever as condições de saúde da população

99 Investigar os factores determinantes da situação de saúde

99 Avaliar o impacto das acções para alterar a situação de saúde

1. A descrição das condições de saúde da população visa informar a situação de saúde


da população. Isto inclui a determinação das frequências, o estudo da distribuição
dos eventos e consequente diagnóstico dos principais problemas de saúde ocorri-
dos, inclusive com a identificação dos segmentos da população afectados em maior
ou menor proporção, por estes problemas.
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2. Investigar os factores que influenciam a situação da saúde – trata-se do estudo


científico das determinantes do aparecimento e manutenção dos danos à saúde,
na população;

3. Avaliar o impacto das acções propostas para alterar a situação encontrada – en-
volve questões relacionadas à determinação da utilidade e segurança das acções
isoladas, dos programas e dos serviços de saúde.

Estas três formas de uso da epidemiologia fornecem valiosos subsídios para auxiliar as de-
cisões, seja a nível colectivo seja a nível individual.

A nível colectivo, as decisões são tomadas pelos planificadores de saúde, a partir das evi-
dências proporcionadas pela epidemiologia, no sentido de implementar novas interven-
ções, reorientar as actualmente existentes ou manter as mesmas estratégias em curso.

A nível individual, valem-se dos subsídios, apurados com o uso da epidemiologia, os profis-
sionais de saúde que lidam directamente com as pessoas, no sentido de fundamentar cien-
tíficamente decisões e conductas, tais como o diagnóstico clínico, a solicitação de exames
complementares e a prescrição de vacinas, de drogas e de regimes alimentares.
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3. GLOSSÁRIO EPIDEMIOLÓGICO

OBJETIVO
99 Conhecer as principais terminologias utilizadas na epidemiologia.

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Objectivos da Ensino/Aprendizagem
Conteúdo
Aprendizagem Actividades
As aulas consistirão em discussão em grupo
dos conceito e terminologias frequentemente
Conhecer as principais
Termos usadas em epidemiologia utilizando
terminologias utilizadas na
epidemiológicos diferentes artigos cientificos. Os estudantes
epidemiologia
com base no material de estudo irão
interagindo.

Este glossário foi incluído com o objetivo de esclarecer a terminologia mas frequentemente
usada na epidemiologia.

Acurácia (sinônimo: validade; ver Reprodutibilidade): O grau em que um valor resultante de


uma mensuração representa o verdadeiro valor da variável que está sendo medida.

Agente: Entidade biológica, física ou química cuja presença ou deficiência é capaz de causar
doença.

Agente Infeccioso: Agente biológico capaz de produzir infecção ou doença infecciosa.

Aleatório: Descreve um acontecimento ou evento ocorrido devido ao acaso e não determi-


nado por outros factores.
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Amostra: Um subgrupo selecionado de uma população. Uma amostra pode ser aleatória ou
não, podendo ser representativa ou não.

Amostra Aleatória: Amostra obtida através de uma selecção em que cada unidade da
amostragem (um setor censitário, um domicílio ou uma pessoa) tem a mesma chance de
ser incluída na amostra.

Amostra Representativa: Amostra que se assemelha à população original ou à população


de referência sob todos os aspectos.

Amostragem por Conglomerados: Método de amostragem no qual cada unidade da amos-


tragem seleccionada é composta por um grupo de pessoas em vez de um único indivíduo
(exemplo: setores censitários ou domicílios).

Anatoxina (toxóide): Toxina tratada pelo formol ou outras substâncias que perde a sua ca-
pacidade toxigênica mas conserva sua imunogenicidade. Os toxóides são usados para indu-
zir imunidade activa e específica contra doenças.

Anos de Vida Potencialmente Perdidos (APVP): Medida de impacto da mortalidade prema-


tura da população, calculada como a soma das diferenças entre uma idade mínima prede-
terminada e a idade em que ocorreu o óbito entre indivíduos que faleceram antes da idade
predeterminada.

Anticorpo: Globulina encontrada em fluídos teciduais e no soro, produzida em resposta ao


estímulo de antígenos específicos e capaz de combinar-se com estes, neutralizando-os ou
destruindo-os.

Antígeno: Porção ou produto de um agente biológico capaz de estimular a formação de


anticorpos específicos.

Anti-sepsia: Conjunto de medidas empregadas para impedir a proliferação microbiana.

Antitoxina: Anticorpos contra a toxina de um microrganismo, usualmente uma exotoxina


bacteriana.

Assepsia: Conjunto de medidas utilizadas para impedir a penetração de microrganismos


(contaminação) em local que não os contenha.
10 |  Epidemiologia

Associação: Relação estatística entre dois ou mais eventos, características ou outras variá-
veis.

Bias: Veja Viés

Capacidade vetora: Propriedade do vetor, medida por meio de parâmetros, como abun-
dância, sobrevivência e grau de domiciliação, relacionada à transmissão do agente infec-
cioso em condições naturais.

Caracteres epidemiológicos: Modos de ocorrência natural das doenças em uma comunida-


de, de acordo com a sua estrutura epidemiológica.

Caso: Uma pessoa identificada como portadora de uma característica particular, como uma
doença, comportamento ou problema. A definição epidemiológica de um caso não é neces-
sariamente a mesma que a definição clínica. Os casos podem ser divididos entre possíveis,
prováveis e confirmados, à medida que satisfazem determinados critérios específicos.

Categoria: Conjunto de valores de uma variável, agrupados por conveniência da análise


(exemplo: os valores da hemoglobina podem ser classificados em intervalos de 1g/dl para
efeitos de análise). Também chamada de classe.

“Cluster”: É o surgimento de casos de qualquer agravo à saúde, particularmente cancro e


malformações congênitas, agregados no tempo e no espaço. O número de casos pode ou
não exceder o esperado; frequentemente, o número esperado não é conhecido.

Cobertura: Medida, normalmente expressa como um percentual, das pessoas ou domi-


cílios que receberam um determinado serviço, em relação àquelas que necessitam dele
(exemplo: percentual de domicílios com abastecimento adequado de água, percentual de
crianças vacinadas com três doses da vacina DTP).

Coeficiente (sinônimo: taxa): Em epidemiologia, demografia e estatística vital, coeficiente


é uma expressão da frequência em que um evento ocorre em uma dada população. Os
coeficientes são essenciais para a comparação de experiências entre populações durante
diferentes períodos, diferentes lugares, ou entre diferentes variáveis sociais e econômicas
da população.

Coeficiente específico por faixa etária: Taxa relativa a uma determinada faixa etária; o nu-
Epidemiologia | 11

merador e o denominador incluem pessoas do mesmo grupo de idade.

Coeficiente de fecundidade total: Estimativa do número total de crianças que uma mulher
viria a dar à luz, se ela continuasse tendo filhos de acordo com os coeficientes vigentes de
fecundidade de cada grupo etário.

Coeficiente de incidência: Taxa em que novos eventos ocorrem em dada população. O nu-
merador é o número de novos eventos ocorridos em período definido; o denominador, a
população exposta ao risco durante aquele período.

Coeficiente de morbidade: Medida de frequência de doença em uma população. Existem


dois grupos importantes de taxa de morbidade: as de incidência e as de prevalência.

Coeficiente de mortalidade: Medida de frequência de óbitos em uma determinada popula-


ção durante um intervalo de tempo específico. Se incluirmos os óbitos por todas as causas,
temos a taxa de mortalidade geral. Caso venhamos a incluir somente óbitos por determina-
da causa, teremos a taxa de mortalidade específica. A taxa também pode ser calculada para
cada sexo e faixa etária, obtendo-se uma taxa de mortalidade específica para uma doença
em determinado sexo e faixa etária.

Coeficiente de mortalidade ajustado pela idade: Coeficiente de mortalidade modificado


estatísticamente para eliminar o efeito de diferentes distribuições de idade em diferentes
populações.

Coeficiente de mortalidade infantil: Medida do grau em que ocorrem mortes no primeiro


ano de vida.

Coeficiente de mortalidade neonatal: Número de mortes de crianças menores de 28 dias


de vida em um dado período, normalmente um ano, por 1.000 nascidos vivos no mesmo
período.

Coeficiente de mortalidade perinatal: Número de mortes fetais tardias (28 semanas ou mais
de gravidez) mais as mortes pós-natais na primeira semana de vida, dividido pelo número
de mortes fetais mais o total de nascidos vivos na mesma população no mesmo período.
Em alguns países onde os registros de estatísticas vitais não são bons, as mortes fetais são
excluídas do denominador. Normalmente é apresentada como uma taxa por 1.000 nasci-
mentos por ano.
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Coeficiente de prevalência: Número total de casos, eventos ou problemas em um determi-


nado ponto no tempo, dividido pela população total sob risco no mesmo ponto no tempo.
As taxas de prevalência são usadas mais frequentemente para doenças ou eventos que
tenham uma duração média longa.

Colonização: Propagação de um microrganismo na superfície ou no organismo de um hos-


pedeiro, sem causar agressão celular. Um hospedeiro colonizado pode atuar como fonte de
infecção.

Comensal: Organismo associado a outro, ambos pertencentes a espécies distintas entre si,
não sofrendo efeitos adversos em decorrência desse relacionamento.

Conglomerado: Quadro resultante do procedimento em que os agravos são agrupados em


relação ao tempo e/ou ao espaço que são subsequentemente submetidos à análise.

Coorte: Grupo bem definido de pessoas que possuem uma experiência ou exposição em
comum, grupo esse que é acompanhado para que se identifique a incidência de novas do-
enças ou eventos, como no caso de um estudo de coorte ou prospectivo.

Confusão (ou factor de confusão): Situação em que os efeitos de duas variáveis são difíceis
de serem separados um do outro (exemplo: idade materna e paridade como causas de
baixo peso ao nascer).

Contágio: Ver Transmissão directa.

Controle: Quando aplicado a doenças transmissíveis e algumas não transmissíveis, significa


a redução da incidência e/ou prevalência de determinada doença, por meio de diferentes
tipos de intervenção, a níveis muito baixos, de forma que ela deixe de ser considerada um
problema importante em saúde pública.

Correlação: Medida de associação que indica o grau em que dois ou mais grupos de obser-
vação apresentam uma inter-relação de tipo linear ou em linha reta. A correlação pode ser
positiva, quando ambas as variáveis aumentam concomitantemente, ou negativa, quando
uma aumenta à proporção que a outra diminui.

Demografia: Estudo de populações, com referência a factores como tamanho, estrutura de


idade, densidade, fecundidade, mortalidade, crescimento e variáveis sociais e econômicas.
Epidemiologia | 13

Denominador: Porção inferior da fração utilizada para calcular a proporção ou razão. Nas
taxas e coeficientes, o denominador é constituído pela população exposta ao risco.

Determinantes de saúde: Os determinantes de saúde são definidos como factores sociais,


econômicos, culturais e ambientais, a maioria dos quais fora do sector saúde, mas respon-
sáveis pela manutenção da saúde ou instalação da doença no indivíduo.

Doença notificável: Doença que, de acordo com exigências estatutárias, deve ser notificada
à autoridade de saúde pública responsável.

Ecologia: Estudo das relações entre seres vivos e seu ambiente. Ecologia humana diz respei-
to ao estudo de grupos humanos em face da influência de factores do ambiente, incluindo
muitas vezes factores sociais e do comportamento.

Ecossistema: É o conjunto constituído pela biota e o ambiente não vivo, em determinada


região.

Endemia: É a presença contínua de uma enfermidade ou de um agente infeccioso dentro


de uma zona geográfica determinada; pode também expressar a prevalência usual de uma
doença particular numa zona geográfica. O termo hiperendemia significa a transmissão in-
tensa e persistente e holoendemia, um nível elevado de infecção que começa a partir de
uma idade precoce e afeta a maior parte da população, como, por exemplo, a malária em
algumas regiões do globo.

Epidemia: É a manifestação, em uma colectividade ou região, de um grupo de casos de


alguma enfermidade que excede claramente a incidência prevista. O número de casos que
indica a existência de uma epidemia varia com o agente infeccioso, o tamanho e as caracte-
rísticas da população exposta, sua experiência prévia ou falta de exposição à enfermidade
e o local e a época do ano em que ocorre. Por decorrência, a epidemicidade guarda relação
com a frequência comum da enfermidade na mesma região, na população especificada e
na mesma estação do ano. O aparecimento de um único caso de doença transmissível que
durante um lapso de tempo prolongado não havia afetado uma população ou que invade
pela primeira vez uma região requer notificação imediata e uma completa investigação de
campo; dois casos dessa doença associados no tempo ou no espaço podem ser evidência
suficiente de uma epidemia.
14 |  Epidemiologia

Epidemiologia: Estudo da distribuição e dos determinantes da saúde e da doença em po-


pulações e sua aplicação para a prevenção e o controle das doenças e problemas de saúde.

Epidemiologia analítica: Aspecto da epidemiologia voltada à busca de causas e efeitos re-


lacionados à saúde. Usa grupos de comparações, provendo bases de dados com o objetivo
de quantificar associações entre exposições e efeitos, assim como para testar hipóteses a
respeito de relações causais.

Especificidade: Proporção de verdadeiros não-casos (pessoas que realmente não têm o


problema) entre os indivíduos identificados como negativos por um teste de triagem (Ver
Valor preditivo, Sensibilidade e Rastreamento).

Estatística vital: Informação sistematicamente tabulada sobre nascimentos, casamentos,


divórcios e mortes, baseada no registro desses eventos vitais.

Estudo analítico: Estudo comparativo realizado com o objetivo de identificar e quantificar


associações, testar hipóteses e identificar causas. Dois tipos mais frequentemente utiliza-
dos são os estudos de coortes e tipo caso-controle.

Estudo de casos e controles: Estudo epidemiológico de tipo analítico que examina casos de
uma determinada doença e uma amostra adequada de indivíduos que não apresentem a
condição (controles), comparando a frequência de factores associados à condição entre os
dois grupos. Às vezes é também chamado de estudo retrospectivo. Frequentemente é usa-
do para testar hipóteses etiológicas, como, por exemplo, a relação entre câncer de pulmão
e tabagismo.

Estudo observacional: Estudo, levantamento ou investigação feitos por meio da observação


das pessoas e onde nenhuma intervenção, ou pelo menos nenhuma intervenção sob con-
trole do investigador, é implementada no mesmo período.

Estudo experimental: Estudo destinado ao esclarecimento, por meio da experiência dire ta,
das relações causais. Geralmente levado a efeito em populações de animais de laboratório.

Estudo longitudinal: Nome genérico que em epidemiologia é empregado para designar o


estudo de coorte, nos seus aspectos prospectivos e retrospectivos.

Estudo retrospectivo: Termo frequentemente utilizado como sinônimo de estudo de casos-


Epidemiologia | 15

controles, embora existam outros tipos de estudo retrospectivo.

Estudo transversal (Sinônimo: estudo de prevalência): Pesquisa ou levantamento que estu-


da pessoas de uma população definida em um determinado ponto do tempo. Os estudos
transversais normalmente fornecem dados de prevalência, mas, se forem repetidos, po-
dem também servir para estimar incidência.

Estrutura epidemiológica: Conjunto de factores relativos ao agente etiológico, hospedeiro


e meio ambiente, que influi na ocorrência natural de uma doença em uma comunidade.

Exposição: Frequência com que determinado grupo de indivíduos é exposto à fonte do


agravo em estudo.

Factor de risco: Termo usado pelo menos de duas maneiras diferentes: 1) uma caracterís-
tica, variável ou exposição associada a um aumento na probabilidade de que um evento
específico ocorra, como um aumento na frequência de uma doença; tais factores não são
necessáriamente causais, sendo também chamados de marcadores de risco; 2) uma carac-
terística, variável ou exposição que realmente aumente a probabilidade de que um evento
específico ocorra, sendo, portanto, aceita como causal; também chamada de determinante.

Fonte primária de infecção (sinônimo: reservatório): Homem ou animal e, raramente, o solo


ou vegetais, responsáveis pela sobrevivência de uma determinada espécie de agente etio-
lógico na natureza. No caso dos parasitas heteroxenos, o hospedeiro mais evoluído (que
geralmente é também o hospedeiro definitivo) é denominado fonte primária de infecção,
e o hospedeiro menos evoluído (em geral, hospedeiro intermediário) é chamado de vetor
biológico.

Fonte secundária de infecção: Ser animado ou inanimado que transporta um determinado


agente etiológico, não sendo o principal responsável pela sobrevivência deste como espé-
cie. Essa expressão é substituída com vantagem pelo termo veículo.

Frequência (sinônimo: ocorrência): Termo genérico utilizado em epidemiologia para des-


crever a frequência de uma doença ou de outro atributo ou evento identificado na popula-
ção, sem fazer distinção entre incidência ou prevalência.

Grupo controle: Grupo de pessoas utilizadas para fins de comparação que não apresentem
uma determinada doença ou problema, ou que não tenham sido expostas à doença, inter-
16 |  Epidemiologia

venção, procedimento ou outra variável que esteja sendo estudada. Controles de vizinhan-
ça, que freqüentemente são usados por comodidade, são pessoas que vivem na mesma
vizinhança. Ver também Estudos de casos e controles.

Grupo de risco: Conjunto das pessoas que têm, em comum, excesso de risco, ou seja, expo-
sição ao fa tor de risco além do grau a partir do qual pode ocorrer a doença.

Grupo exposto: Grupo de indivíduos com contato com determinado fa tor relacionado ao
agravo à saúde que está sendo focalizado.

Hipótese: Conjecturas com as quais se procura explicar, por tentativa, fenômenos ocorridos
ou ocorrentes. Serão científicas à medida que responderem a problemas colocados cien-
tíficamente, e mais: se afirmarem relações entre variáveis e se forem abertas à refutação.

História natural da doença: Descrição que inclui características das fontes de infecção,
distribuição da doença segundo os atributos das pessoas, tempo e espaço, distribuição e
características ecológicas do(s) reservatório(s) do agente; mecanismos de transmissão e
efeitos da doença sobre o homem.

Hospedeiro: Organismo simples ou complexo, inclusive o homem, que é capaz de ser infec-
tado por um agente específico.

Imunidade: Resistência usualmente associada à presença de anticorpos que têm o efeito


de inibir microrganismos específicos ou suas toxinas responsáveis por doenças infecciosas
particulares.

Indicadores de saúde: Indicador de saúde é uma variável que pode ser medida directamen-
te para refletir o estado de saúde das pessoas dentro de uma comunidade. Anualmente, a
OMS apresenta dados atualizados para 50 indicadores de saúde de todos os países mem-
bros. Os indicadores de saúde podem ser utilizados como componentes no cálculo de inú-
meros índices de desenvolvimento social. O melhor exemplo é o Índice de Desenvolvimen-
to Humano (IDH), que, baseado nos níveis de desenvolvimento econômico, social, literário,
educacional e expectativa de vida ao nascer, classifica anualmente os países (http://hdr.
undp.org).

Infecção: Penetração, alojamento e, em geral, multiplicação de um agente etiológico ani-


mado no organismo de um hospedeiro, produzindo danos a este, com ou sem aparecimen-
Epidemiologia | 17

to de sintomas clinicamente reconhecíveis. Em essência, a infecção é uma competição vital


entre um agente etiológico animado (parasita sensu lato) e um hospedeiro; é, portanto,
uma luta pela sobrevivência entre dois seres vivos, que visam à manutenção de sua espécie.

Inquérito epidemiológico: Levantamento epidemiológico feito por meio de colheita ocasio-


nal de dados, quase sempre por amostragem, que fornece dados sobre a prevalência de
casos clínicos ou portadores em uma determinada comunidade.

Intervalo de confiança: É a variação de valores da variável de interesse; por exemplo, uma


taxa construída de tal forma que essa variação tenha uma específica probabilidade de in-
cluir o verdadeiro valor da variável. Essa específica probabilidade é denominada

intervalo de confiança e os limites desse intervalo de confiança, limites de confiança.

Investigação epidemiológica de campo (classicamente é conhecida por investigação epide-


miológica): Estudos efetuados a partir de casos clínicos ou de portadores com o objetivo de
identificar as fontes de infecção e os modos de transmissão do agente. Pode ser realizada
em face de casos esporádicos ou surtos.

Latência: Período na evolução clínica de uma doença parasitária no qual os sintomas desa-
parecem, apesar de estar o hospedeiro ainda infectado e de já ter sofrido o ataque primá-
rio, ou uma ou várias recaídas. Terminologia utilizada com frequência em relação à malária.

“Odds ratio” (OR): Medida de associação tipo proporcionalidade, que é uma estimativa do
risco relativo, específica para a análise dos estudos caso-controle.

Padronização: Aplicação de técnicas estatísticas para padronizar duas ou mais populações


quanto a diferenças que possam existir entre elas, especialmente com relação à estrutura
de sexo e idade, de forma a permitir comparações válidas entre populações.

Pandemia: Epidemia de uma doença que afeta pessoas em muitos países e continentes.

Parasita: Organismo, geralmente microrganismo, cuja existência se dá a expensas de um


hospedeiro. O parasita não é obrigatoriamente nocivo ao seu hospedeiro. Existem parasi-
tas obrigatórios e facultativos; os primeiros sobrevivem somente na forma parasitária e os
últimos podem ter uma existência independente.
18 |  Epidemiologia

Pareamento: Processo mediante o qual, nos estudos de coorte ou de casoscontrole, esta-


belecem-se grupos de elementos que sejam comparáveis aos dos casos em estudo, no que
concerne às variáveis.

Patogenicidade: Capacidade de um agente biológico causar doença em um hospedeiro sus-


cetível.

Patógeno: Agente biológico capaz de causar doenças.

Período de incubação: Intervalo entre a exposição efetiva do hospedeiro suscetível a um


agente biológico e o início dos sinais e sintomas clínicos da doença nesse hospedeiro.

Período de transmissibilidade (sinônimo: período de contágio): Intervalo de tempo duran-


te o qual uma pessoa ou animal infectados eliminam um agente biológico para o meio
ambiente ou para o organismo de um vetor hematófago, sendo possível, portanto, a sua
transmissão a outro hospedeiro.

Período latente (sinônimo: período de incubação aplicado a doenças não infecciosas): In-
tervalo entre a exposição a agentes químicos tóxicos e o início dos sinais e sintomas da
doença.

Período prodrômico: Lapso de tempo entre os primeiros sintomas da doença e o início dos
sinais ou sintomas com os quais o diagnóstico pode ser estabelecido.

Prevalência: Número de casos clínicos ou de portadores existentes em um determinado


momento em uma comunidade, dando uma idéia estática da ocorrência do fenômeno.
Pode ser expressa em números absolutos ou em coeficientes.

Pródromos: Sintomas indicativos do início de uma doença.

Profilaxia: Conjunto de medidas que têm por finalidade prevenir ou atenuar as doenças,
suas complicações e consequências.

Quarentena: Isolamento de indivíduos ou animais sadios pelo período máximo de incuba-


ção da doença, contado a partir da data do último contato com um caso clínico ou portador,
ou da data em que esse comunicante sadio abandonou o local em que se encontrava a
fonte de infecção. Na prática, a quarentena é aplicada no caso das doenças quarentenárias.
Epidemiologia | 19

Quimioprofilaxia: Administração de uma droga, inclusive antibióticos, para prevenir uma


infecção ou a progressão de uma infecção com manifestações da doença.

Rastreamento (“Screening”) (sinônimo: triagem): Tentativa de identificação de pessoas


portadoras de uma doença ou comportamento não reconhecido, através do uso de testes,
exames, questionários ou outros procedimentos.

Recaída: Reaparecimento ou recrudescimento dos sintomas de uma doença antes de o


doente apresentar-se completamente curado. No caso da malária, recaída significa nova
aparição de sintomas depois do ataque primário.

Recidiva: Reaparecimento do processo mórbido após sua cura aparente. No caso da malá-
ria, recidiva significa recaída na infecção malárica entre a 8a e a 24ª semanas posteriores
ao ataque primário.

Recorrente: Estado patológico que evolui através de recaídas sucessivas. No caso da malá-
ria, recorrência significa recaída na infecção malárica depois de 24 semanas posteriores ao
ataque primário.

Recrudescência: Exacerbação das manifestações clínicas ou anatômicas de um processo


mórbido. No caso da malária, recrudescência é a recaída na infecção malárica nas primeiras
8 semanas posteriores ao ataque primário.

Reprodutibilidade (sinônimo: confiabilidade; ver Acurácia): Grau de estabilidade exibida


quando uma mensuração é repetida sob condições idênticas.

Em outros termos, a reprodutibilidade refere-se ao grau pelo qual os resultados obtidos por
uma mensuração podem ser reproduzidos.

Risco: Probabilidade de que um evento (morte ou adoecimento) venha a ocorrer dentro


de um determinado período ou em uma faixa etária. O termo comumente é usado com
relação a eventos desfavoráveis.

Risco atribuível (sinônimo: diferenças de incidências): O quanto da incidência na população


em estudo pode ser imputado ao efeito do suposto fator de risco.

Essa medida é obtida através da subtração entre a proporção do evento entre os expostos e
20 |  Epidemiologia

a proporção entre os não-expostos. Assume-se que o efeito das outras causas é igual entre
os expostos e os não-expostos.

Risco relativo (sinônimo: razão de risco ou razão de incidências): Razão entre o risco de
morrer, ou de ter uma doença, em uma população exposta a um determinado fator e em
uma população não exposta ao fator. Um RR com valor 1,0 implica ausência de associação,
porque será o resultado da razão entre dois riscos iguais. A razão de prevalência é um su-
cedâneo do risco relativo, geralmente estimado a partir de dados de estudos do tipo corte
transversal.

Sensibilidade: Proporção de casos verdadeiros, entre os resultados identificados como po-


sitivos pelo teste de triagem (ver Valor Preditivo, Especificidade, Sensibilidade, Acurácia e
Reprodutibilidade).

Surto epidêmico: Ocorrência de dois ou mais casos epidemiologicamente relacionados.

Suscetível: Qualquer pessoa ou animal que supostamente não possui resistência suficiente
contra um determinado agente patogênico que a proteja da enfermidade caso venha a
entrar em contacto com o agente.

Taxa de letalidade: Medida de frequência de óbitos por determinada causa entre membros
de uma população atingida por essa doença.

Taxa (ou coeficiente) de natalidade: Medida de frequência de nascimentos em uma deter-


minada população durante um período especificado.

Tendência secular: Comportamento da incidência de uma doença em um longo intervalo de


tempo, geralmente medido em décadas.

Toxina: Proteínas ou substâncias protéicas conjugadas, letais para certos organismos.

Transição epidemiológica: Resultado de uma série complexa de mudanças interrelaciona-


das nos padrões de saúde e doença, explicitadas por indicadores de morbi-mortalidade,
que ocorrem nas populações humanas, observado um longo período.

Transição demográfica: Na análise da transição demográfica é dada ênfase à sequência do


declínio, primeiro das taxas de mortalidade e em seguida das de fertilidade; nos estágios
Epidemiologia | 21

mais “avançados”, ela se caracteriza pelo envelhecimento da população.

Transmissão: Transferência de um agente etiológico animado de uma fonte primária de in-


fecção para um novo hospedeiro. A transmissão pode ocorrer de forma directa ou indire ta.

Transmissão directa (contágio): Transferência rápida do agente etiológico sem a interferên-


cia de veículos.

Transmissão directa imediata: Transmissão directa em que há um contato físico entre a


fonte primária de infecção e o novo hospedeiro.

Transmissão directa mediata: Transmissão directa em que não há contato físico entre a fon-
te primária de infecção e o novo hospedeiro; a transmissão se faz por meio das secreções
oronasais (gotículas de Flügge).

Transmissão indirecta: Transferência do agente etiológico por meio de veículos animados


ou inanimados.

Tratamento profilático: Tratamento de um caso clínico ou de um portador com a finalidade


de reduzir o período de transmissibilidade.

Vacina: Preparação que contém microrganismos vivos ou mortos ou frações deles possui-
dora de propriedades antigênicas. As vacinas são empregadas para induzir em um indivíduo
a imunidade ativa e específica contra um microrganismo.

Validade: (ver Acurácia).

Valor de p: A letra p seguida por < (o símbolo de “menor que”) e um número (normalmente
0,05, 0,01 ou 0,001) é uma expressão da probabilidade de que uma associação ou observa-
ção possa ter acontecido por acaso. O número 0,05 significa que se poderia esperar que tal
observação fosse devida ao acaso em 1 de cada 20 vezes; da mesma forma, 0,01 significa
que 1 em cada 100 vezes o achado poderia ser devido unicamente ao acaso. Frequente-
mente uma associação é aceita como estatisticamente significativa se o p for < 0,05.

Valor preditivo: Probabilidade de que uma pessoa com um resultado positivo (ou negati-
vo) em um exame de triagem ou exame diagnóstico seja verdadeiramente um caso ou um
não-caso. Estas são chamadas, respectivamente, de valores preditivos positivo e negativo
22 |  Epidemiologia

do exame. O valor preditivo depende da sensibilidade e da especificidade do teste e da


prevalência do problema investigado.

Variável dependente: Por definição, são expressas pelas medidas de ocorrência de doença.

Variável independente: Corresponde à medida do suposto factor de risco, geralmente de-


signada por medida de exposição.

Viés (ou bias): Qualquer influência durante a colheita ou a interpretação dos dados que
leve a um erro sistemático em uma determinada direcção; por exemplo, erros resultantes
de balança, que dá peso inferior ao peso real da criança, ou uma tendenciosidade do en-
trevistador ao interpretar respostas às perguntas de um questionário. Também é chamado
de vício ou tendenciosidade.

Vigilância de doença: Ver capítulo Vigilância Epidemiológica.

Virulência: Grau de patogenicidade de um agente infeccioso.

Zooantroponose: Infecção transmitida aos animais a partir de reservatório humano.

Zoonoses: Infecção ou doença infecciosa transmissível, sob condições naturais, de homens


a animais, e vice-versa.
Epidemiologia | 23

4. PROCESSO SAÚDE- DOENÇA E A


HISTÓRIA NATURAL (HND)

OBJETIVOS
99 Conhecer o processo Saúde-Doença

99 Conhecer a história natural da doença e sua multifatorialidade

99 Conhecer os conceitos relativos aos determinantes da cadeia epi-


demiológica

99 Descrever as acções de intervenção no processo saúde-doença

99 Situar a doença dentro dos níveis de prevenção e aplicação de Le-


avell e Clarck
24 |  Epidemiologia

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Ensino/Aprendizagem
Conteúdo Objectivos da Aprendizagem
Actividades

Processo Saúde-Doença Conhecer o processo Saúde-Doença. As aulas consistirão em


exposições dialogadas.
Conhecer a história natural da Elas abordarão aspectos
doença e sua multifatorialidade; do processo Saúde-
Conhecer os conceitos relativos Doença até níveis de
História natural
aos determinantes da cadeia prevenção e aplicação de
da doença e sua Leavell e Clarck.
epidemiológica;
multifatorialidade Conhecer os conceitos relativos Trabalho em grupo sobre
aos determinantes da cadeia o tema e debate sobre
epidemiológica. os niveis de prevenção
de doenças como: TB,
Niveis de prevenção e Situar a doença dentro dos níveis cólera, malária, HIV;
aplicação de Leavell e de prevenção e aplicação de Leavell Apresentação final de
Clarck e Clarck cada grupo

4.1. PROCESSO SAÚDE – DOENÇA


O homem é um ser dotado de uma capacidade de adaptação fisiológica, que permite que
viva ou sobreviva em quase todos os ambientes do continente terrestre. O meio onde vive
oferece obstáculos naturais e/ou artificiais que se transformam ciclicamente em novas
barreiras, à medida que o homem se adapta à condição existente. Esses obstáculos ou
barreiras promovem mudanças permanentes ou transitórias na vida do indivíduo sendo
denominados factores determinantes do processo saúde-doença e oferecem a base para
estudos epidemiológicos.

Desde os primórdios da civilização humana, a doença, o processo como ela se desenvolve,


suas causas e consequências, conquistam o pensamento do homem no intuito de controlá-
las ou evitá-las.

Desde os primordiais agrupamentos nômades até a civilização contemporânea, cultural-


Epidemiologia | 25

mente praticaram-se quatro políticas de saúde, cada qual na sua época, definindo-se pelo
imenso panteão de filósofos, clérigos, estudiosos e pessoas comuns que praticavam a me-
dicina.

A primeira fase ou política de saúde foi conhecida como a fase da magia ou dos aspectos
sociais, onde entendia-se que os factores determinantes da doença provinham de forças
sobrenaturais, atribuídos a deuses ou demônios, ou forças do mal.

Na segunda fase, imperavam os factores físico-químicos, os ‘’miasmas’’, que se caracteri-


zavam por emanações do solo ou do ar, supostamente nocivos, como o chorume do lixo e
sujidades que porventura vinham produzir a doença no corpo sadio.

A terceira fase, denominada biológica ou microbiológica, que se estabelece com a desco-


berta do microscópio e do mundo das bactérias, se enfatiza a ação dos germes e a conse-
quente degradação sobre a saúde.

Essas três primeiras fases têm um ponto em comum, a abordagem unicausal, que relaciona
o agravo à saúde a um único agente etiológico, e assim, as intervenções se direccionavam
para um único factor determinante da doença. Uma visão simplificada, que deixa de tratar
o homem como ser complexo, dotado de necessidades, desejos e vontades, de ordem in-
termitente, cíclica, sazonal, regional e variável.

A quarta fase muda a abordagem da doença, relacionando-a a uma causalidade múltipla e


incorporando os aspetos sociais ou psicossociais no processo de adoecer, buscando expli-
car o aparecimento e a manutenção da doença na colectividade como resultante da intera-
ção do homem com os factores biológicos, químicos e físicos. Na abordagem multicausal,
uma única doença é proveniente de diversos factores determinantes, inter-relacionados e
dinâmicos.

A intervenção é baseada em múltipla direcção de modo a abranger os factores multicau-


sais.

Nessa perspectiva, a saúde e a doença estão interligadas num processo dinâmico, inter-
dependente que, quando desequilibrado, leva o individuo a um estado não favorável de
satisfação orgânica, que então chamaremos de doença. Ainda segundo essa concepção, o
adoecer deixa de ser o resultado de apenas um factor, passando a ser entendido como um
26 |  Epidemiologia

processo em que inúmeros fatores estão envolvidos.

A identificação, o registro e a análise dos factores determinantes da cólera em Londres


foram observados no estudo realizado pelo médico inglês John Snow, nos anos compre-
endidos entre 1848-1849 e 1853-1854. Em suas anotações sobre o surto de cólera, Snow,
recém-formado em medicina demonstrou a relação entre os óbitos gerados por uma des-
conhecida infecção gastrointestinal e as empresas que abasteciam a cidade de Londres com
água de caminhões-pipa. Antes que pudesse concluir seus estudos, Snow morreu vítima de
um acidente vascular cerebral em 1858, mas suas anotações sobre uma nova teoria, a da
infecção por via enteral, serviria de base para os futuros estudos que eclodiram derruban-
do a teoria miasmática e inspirando cientistas como Robert Koch e Fillipo Pacini a desenvol-
ver novos estudos sobre o processo de adoecer.

4.2. HISTÓRIA NATURAL DA DOENÇA


A História Natural das Doenças (HND) é composta por dois períodos: o período pré-pato-
gênico (antes do indivíduo adoecer, desequilíbrio entre agente e hospedeiro, factores am-
bientais condicionantes que são o estímulo) e o período patogênico (a patogênese precoce
ou período de incubação).

A História Natural das Doenças define, assim, duas dimensões da causalidade:

1. Epidemiológica: é a da determinação do aparecimento das doenças.

2. Fisiopatológica: trata-se da evolução das mesmas.


Epidemiologia | 27

Figura 1. Modelo da história natural da doença

Proposto por Leavell e Clark (1976), esse modelo da HND considera a interação, o relacio-
namento e o condicionamento de três elementos fundamentais:

a) Ambiente

b) Agente

c) Hospedeiro

A doença seria resultante de um desequilíbrio nas auto-regulações existentes no sistema.

A história natural das doenças na ausência da interferência médica, pode ser subdividida
em quatro fases:

a) Fase inicial ou de susceptibilidade.


28 |  Epidemiologia

b) Fase patológica pré-clínica.

c) Fase clínica.

d) Fase de incapacidade residual.

Na fase inicial, ainda não há doença, mas, sim, condições que a favoreçam. Dependendo da
existência de factores de risco ou de protecção, alguns indivíduos estarão mais ou menos
propensos a determinadas doenças do que outros.

Na fase patológica pré-clínica, a doença não é evidente, mas já há alterações patológicas.

A fase clínica corresponde ao período da doença com sintomas.

Por último, se a doença não evoluiu para a morte nem foi curada, ocorrem as sequelas da
mesma - fase de incapacidade residual.

4.3. IMPORTÂNCIA DA HND


Conhecendo-se e atuando-se nas diversas fases da história natural da doença, poder-se-á
modificar o curso da mesma; isso envolve desde as acções de prevenção consideradas pri-
márias até as terciárias, para combater a fase da incapacidade residual.

4.4. DETERMINANTES DO PROCESSO SAÚDE-DOENÇA


Desde a sua concepção, o homem, visto como espécie, sofre acções provindas do meio
em que está inserido, estando suscetível a uma grande variedade de agentes do meio, que
podem ser de natureza orgânica ou inorgânica, que com ele interagindo provocam disfun-
ções. A suscetibilidade está ligada intrinsecamente à natureza do homem . O meio, segun-
do a teoria da História Natural da Doença, oferece uma grande variedade de estímulos que
se complementam, potencializando, limitando ou anulando a acção do outro factor esti-
mulante. Essa interação é chamada de sinergismo multifactorial. Os factores estimulantes
pertencentes ao ambiente agirão sobre o indivíduo – o suscetível, provocando alterações
desde o nível celular chegando a atingir todo o organismo, alterando sua funcionabilida-
de temporariamente ou permanentemente, podendo levá-lo a deformidades irreversíveis,
cura ou morte .
Epidemiologia | 29

Esses factores estimulantes ou determinantes incluem causas necessárias e as suficientes


para a instalação de um processo de doença. A exposição a um conjunto de determinantes
nem sempre pode promover a alteração orgânica de imediato. Para este estudo o trinômio
ambiente-determinante-suscetível provocará o desequilíbrio homeostático tardiamente,
quando oportuno.

4.5. FACTORES DETERMINANTES NA SAÚDE-DOENÇA


Os agentes da doença podem ser classificados em:

1. Biológicos: por exemplo, bactéria

2. Genéticos: translocação de cromossomas (síndrome de Down)

3. Químicos: nutrientes, drogas, gases, fumo, álcool, ácido úrico

4. Físicos: radiação, atrito e impacto de veículos a motor

5. Psíquicos ou psicossociais: estresse do desemprego e da migração

Factores do hospedeiro

1. Herança genética

2. Anatomia e fisiologia do organismo

3. Estilo de vida

Factores relacionados com o meio ambiente

1. Ambiente físico

2. Ambiente biológico

3. Ambiente social

4.6. CADEIA EPIDEMIOLÓGICA


Cadeia epidemiológica é uma série de eventos necessários para que uma doença ocorra
30 |  Epidemiologia

em um indivíduo ou em um rebanho, ou como o conjunto de componentes do meio ou do


animal, que favorecem a disseminação.

A identificação dos mecanismos de propagação das doenças, torna possível a adopção de


medidas sanitárias, capazes de prevenir e impedir a sua disseminação.

Segundo CORTÊS (1993), as seguintes questões poderiam ser formuladas e respondidas:

1. Quem hospeda e elimina o agente? Fonte de infecção (FI).

2. Como o agente deixa o hospedeiro? Via de eliminação (VE).

3. Que recurso o agente utiliza para alcançar um novo hospedeiro? Via de transmis-
são (VT).

4. Como o agente se hospeda no novo hospedeiro? Porta de entrada (PE).

5. Quem pode adquirir a doença? Susceptível.

Se estes conceitos forem colocados sequencialmente tem-se, a caracterização da cadeia


epidemiológica.

FI --à VE --à VT --à PE ----à Susceptível

Se estes elos da cadeia forem combatidos conjuntamente, é possível o controle de enfermi-


dades, especialmente as transmissíveis.

O saneamento procura atuar em todos os elos desta cadeia, principalmente na via de trans-
missão e fontes de infecção.
Epidemiologia | 31

Figura 2. A cadeia epidemiológica

4.7. ACÇÕES PARA INTERVIR NO PROCESSO SAÚDE - DOENÇA CLASSIFICADAS EM


RELAÇÃO AO HOSPEDEIRO E AO MEIO AMBIENTE
Hospedeiro

1. Em relação à herança

99 Aconselhamento genético

99 Diagnóstico pré-natal

99 Aborto terapêutico

2. Em relação a anatomia e fisiologia humana

99 Imunização activa e passiva

99 Manutenção de peso corporal em níveis adequados


32 |  Epidemiologia

99 Exercícios físicos

3. Em relação ao estilo de vida das pessoas

99 Não fumar

99 Evitar promiscuidade sexual

99 Tomar precauções quanto a água de beber

Meio ambiente

1. Meio físico

99 Saneamento das águas

99 Saneamento do ar

99 Saneamento do solo

2. Meio biológico

99 Controle dos vectores por competição biológicas

99 Vigilância de alimentos

99 Eliminação de certos vectores nas cidades

3. Meio Social

99 Provisão de empregos, habitação, meios de transporte, escolas, áreas de lazer e


outras necessidades básicas

99 Organização dos serviços de saúde, de modo a permitir acesso das pessoas a meios
eficazes de prevenção, cura e reabilitação.

4.8. NÍVEIS DE PREVENÇÃO E INTERVENÇÃO NA HND


A prevenção primária é limitar a ocorrência da doença pelo controlo das causas e factores
de risco.
Epidemiologia | 33

A prevenção secundária resume-se em reduzir as consequências mais importantes da do-


ença através do seu diagnóstico precoce e respectivo tratamento.

A prevenção terciária tem por finalidade reduzir a progressão ou as complicações da doen-


ça já estabelecida.
34 |  Epidemiologia

5. MODELOS DE CAUSALIDADE

OBJETIVO
99 Descrever e compreender os critérios epidemiológicos da “causa-
lidade”

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Objectivos da Ensino/Aprendizagem
Conteúdo
Aprendizagem Actividades
As aulas consistirão em estudos de casos
em grupo, onde os estudantes distribuídos
Descrever e em grupos de 6 discutirão o modelo de
Critérios compreender casualidade associando com a doença em
epidemiológicos da os critérios análise, em seguida cada grupo deverá fazer a
“causalidade” epidemiológicos da apresentação em plenária.
“causalidade” Os recursos didáticos a serem utilizados
constarão de projetor multimídia (datashow),
quadro e canetas de filtro.

Causalidade

No enfoque epidemiológico, não só interessa a descrição dos eventos em saúde e a quem


atinge, onde e quando, senão, também, está orientado para procurar explicações do por-
quê acontecem esses eventos.

É o processo de busca da causalidade que permite essas aproximações, com a finalidade de


orientar as medidas de intervenção adequadas e a posterior avaliação de sua efetividade.
Epidemiologia | 35

O enfoque epidemiológico considera que a doença na população:

a) não ocorre por acaso;

b) não está distribuída de forma homogênea;

c) têm factores associados que, para serem causais, cumprem com os seguintes
critérios: a temporalidade (toda causa precede a seu efeito, o chamado princípio
do determinismo causal), a força de associação, a consistência da observação, a es-
pecifidade da causa, o gradiente biológico (efeito dose-resposta) e a plausibilidade
biológica (Hill, 1965).

O enfoque epidemiológico também considera que a doença na população é um fenômeno


dinâmico e sua propagação depende da interação entre a exposição e a suscetibilidade
dos indivíduos e grupos constituintes da referida população aos factores determinantes da
presença da doença.

De acordo com esse foco, existem dois modelos de causalidade em epidemiologia ampla-
mente aceitos:

a. Tríade Epidemiológica

b. Causas Componentes

5.1. MODELO DA TRÍADE EPIDEMIOLÓGICA


A Tríade Epidemiológica é o modelo tradicional de causalidade das doenças transmissíveis;
nesse, a doença é o resultado da interação entre o agente, o hospedeiro suscetível e o am-
biente (Figura 3).

Ela nos indica que as relações recíprocas entre “agente-hospedeiro”, “agente-meio ambien-
te” e “hospedeiro-meio ambiente” devem ser detalhadamente examinadas, para esclare-
cer factores causais – assim como todo o conjunto “agente-hospedeiro-meio ambiente”.

Qualquer que seja a representação escolhida, ela sugere que tanto as características do
agente quanto as características do hospedeiro e do meio ambiente devem ser analisadas,
a quando do estudo de qualquer agravo à saúde.
36 |  Epidemiologia

Figura 3. A tríade epidemiológica

Os agentes podem ser infecciosos ou não infecciosos e serem necessários, mas nem sem-
presuficientes, para causar a doença.

Os agentes não infecciosos podem ser químicos ou físicos. Os fatores do hospedeiro são
os que determinam a exposição de um indivíduo, sua suscetibilidade e capacidade de res-
posta e suas características de idade, grupo étnico, constituição genética, gênero, situação
socioeconômica e estilo de vida. Por último, os factores ambientais englobam o ambiente
social, físico e biológico.

5.2. MODELO DE COMPONENTES CAUSAIS OU DE MULTICAUSALIDADE


O Modelo de Componentes Causais é um modelo de multicausalidade que se aplica a

todo tipo de doenças. Conforme esse modelo, a doença se produz por um conjunto mínimo
de condições que agem em sintonia. Todas as possíveis condições ou eventos são denomi-
nados causas componentes.

O conjunto mínimo de condições que age em sintonia e causa a doença é denominado cau-
sa suficiente. Desse modo, uma causa suficiente é um conjunto de causas componentes,
nenhuma das quais é supérflua. Uma causa suficiente representa um mecanismo causal de
doença: a doença inicia-se quando se completa uma causa suficiente.

Uma doença pode ter várias causas suficientes, cada uma “suficiente” para produzi-la.
Epidemiologia | 37

As causas componentes podem actuar em um, dois ou três mecanismos causais. A causa
componente cuja presença é imprescindível em todos os mecanismos causais da doença é
chamada causa necessária (componente A).

Os factores que representam causas componentes de doença incluem os factores do agen-


te, hospedeiro e ambiente da tríade epidemiológica, assim como também do modelo de
determinantes da saúde.

Os modelos de causalidade têm importantes implicações para a prevenção de doenças.

Em termos gerais, não é necessário identificar todos os componentes de uma causa sufi-
ciente para efetuar uma prevenção eficaz, já que a remoção de um só dos seus componen-
tes bloqueia a interação com os outros e previne a ocorrência do efeito, isto é, da doença.
Não obstante, a doença na população pode continuar produzindo-se pela acção de outras
causas suficientes. Entende-se por isto que a única opção para erradicar uma doença é a
remoção de sua causa necessária.
38 |  Epidemiologia

6. MÉTODOS EPIDEMIOLÓGICOS

OBJETIVOS
99 Descrever os princípios em que se baseiam os métodos epidemio-
lógicos, bem como os usos destes

99 Aplicar as técnicas para medir a frequência de fenómenos de saúde


e de doença e descrever as respectivas distribuições

99 Descrever os principais tipos de estudos epidemiológicos, reconhe-


cer as suas vantagens, fragilidades, condições e indicações de apli-
cação

99 Apoiar na execução de uma investigação em saúde

99 Analisar e interpretar trabalhos de investigação na área biomédica


Epidemiologia | 39

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Ensino/Aprendizagem
Conteúdo Objectivos da Aprendizagem
Actividades
Descrever os princípios em
que se baseiam os métodos
Métodos epidemiológicos As aulas consistirão em
epidemiológicos, bem como
os usos destes exposições dialogadas sobre os
métodos epidemiológicos
Aplicar as técnicas para medir Medidas de frequência dos
Medidas de frequência
a frequência de fenómenos de fenómenos de saude
dos fenómenos de
saúde e de doença e descrever
Saude as respectivas distribuições
Descrever os principais tipos Exercicios práticas serão
de estudos epidemiológicos, desenvolvidos através de leitura
Tipos de estudos
reconhecer as suas vantagens, de artigos científicos publicados
epidemiológicos
fragilidades, condições e de pesquisas epidemiológicas.
indicações de aplicação Os alunos devem discutir em
grupo o método, a amostragem,
o resultado da pesquisa e como
Apoiar na execução de uma poderiam utilizar o resultado
Investigação em saúde
investigação em saúde para a prevenção da doença que
foi analizada na pesquisa

Os estudos epidemiológicos constituem um ótimo método para colher informações adicio-


nais não-disponíveis a partir dos sistemas rotineiros de informação de saúde ou de vigilân-
cia.

Os métodos utilizados na epidemiologia são encontrados em outras áreas do conhecimen-


to, embora seja frequente a referência a métodos da epidemiologia ou métodos epidemio-
lógicos. Tais métodos são descritos como sendo estudos descritivos e analíticos, experi-
mentais e não experimentais (ou de observação).

6.1. ESTUDOS DESCRITIVOS


Os estudos descritivos informam sobre a frequência e a distribuição de um evento.
40 |  Epidemiologia

Como o próprio nome diz, têm o objectivo de descrever, epidemiologicamente, os dados


colhidos na população. Estes em geral referem-se a mortalidade e a morbilidade, estão
organizados de maneiras a mostrar as variações com que os óbitos e as doenças se encon-
tram no seio da própria população (por exemplo entre as faixas etárias), ou entre regiões
e épocas distintas. Por vezes, a descrição tem como foco outros eventos – caso de factores
de risco, a as características da população.

6.2. ESTUDOS ANALÍTICOS


Os estudos analíticos têm o objectivo de investigar em profundidade a associação entre
dois eventos, no intuito de estabelecer uma explicação para uma eventual relação obser-
vada entre eles.

Por exemplo em pesquisa sobre a relação entre o fumo de tabaco e o cancro do pulmão.
Tenta-se verificar se o consumo das substâncias contidas no tabaco acarretam risco dife-
renciados de ocorrência daquele tipo de doença pulmonar. Os dois eventos analisados são
respectivamente uma suposta causa (o consumo de tabaco) e um dos seus efeitos (o cancro
do pulmão). Se os riscos são consideravelmente elevados entre os fumadores, tem-se forte
evidência da relação causal entre o fumo de tabaco e o cancro do pulmão.

De uma maneira esquemática, a exposição de uma “exposição-doença” pode ser feita de 3


modos em função do ponto de partida das observações. A figura 4. resume a direcção das
observações nas diversas modalidades de estudo analítico:
Epidemiologia | 41

Figura 4. Resumo esquemático de estudos analíticos

Estudo de coorte

Exposição Doença

Estudo de caso-
controle

Estudo Transversal

6.3. ESTUDOS EXPERIMENTAIS


É possível, ao investigar produzir uma situação artificial para pesquisar o seu tema, o que
caracteriza os estudos experimentais por vezes ditos de intervenção. Serve de ilustração
a verificação do efeito das vacinas. A eficácia de medicamentos, cirurgias, condutas mé-
dicas, exames periódicos, conselhos profissionais, programas de saúde e uma infinidade
de outras formas de intervenção no processo da doença podem ser avaliado de maneiras
idêntica a das vacinas. A grande vantagem dos estudos experimentais é a possibilidade de
neutralizar as variáveis extrínsecas.

Não há limites à criação de situações artificiais para investigação, a não ser as ditas pelos
condicionantes práticos ou preceitos éticos. A etiologia das doenças por exemplo é dificil-
mente pesquisada de maneira experimental. É impossível fazer com que as pessoas jovens,
sadias, por exemplo, limitem suas actividades físicas e outras não, durante anos, com intui-
to de verificar a relação entre o sedentarismo e a saúde. Por outro lado é anti-ético provo-
car doenças em seres humanos a fim de estudá-la cientificamente.

Por estas limitações, os estudos não experimentais, vistos a seguir ocupam posição de des-
taque como método de investigação.
42 |  Epidemiologia

6.4. ESTUDOS OBSERVACIONAIS


Os estudos não-experimentais ou de observação, são largamente maioritários na área mé-
dica. Eles referem-se a pesquisa de situações que ocorrem naturalmente. Neles, como in-
dica o próprio nome o pesquisador apenas observa as pessoas ou grupos e compara as
suas características. O investigador não cria a situação como nos estudos experimentais,
somente colhe e organiza os dados respectivos, para que possa investigá-la. Serve de exem-
plo o estudo comparativo da incidência de cardiopatias em indivíduos vegetarianos e não-
vegetarianos.

Os estudos observacionais, compreendem:

99 Estudo ecológico

99 Estudo transversal

99 Estudo de caso-controle

99 Estudo de coorte

6.4.1. Estudo ecológico

Nos estudos ecológicos, a unidade de observação é um grupo de pessoas, e não o


indivíduo. Esses grupos podem ser turmas de alunos em escolas, fábricas, cidades,
países, etc.

O princípio do estudo é o de que, nas populações onde a exposição é mais frequente,


a incidência das doenças ou a mortalidade serão maiores.

Incidência e mortalidade são as medidas mais usadas para quantificar a ocorrência


de doenças nesse estudo.

A análise de correlação mostrará a associação entre o factor de risco e a doença (isso


não quer dizer relação de causa/efeito).

Os estudos ecológicos são conhecidos como estudos de correlação. É frequente a uti-


lização de dados secundários para os estudos ecológicos, pois seria muito dispendio-
so e demorado realizar uma pesquisa para obterem-se dados primários em grandes
Epidemiologia | 43

grupos. O estudo ecológico pode utilizar dados primários, quando, por exemplo, o
propósito do estudo é averiguar difusão de doenças infecciosas.

Fontes dos dados sobre doença

99 Registros de mortalidade.

99 Registros de morbidade.

99 Dados censitários sobre morbi-mortalidade e população.

Fontes dos dados sobre exposição

99 Censos demográficos.

99 Censos econômicos.

99 Dados de produção ou consumo.

6.4.2. Estudo transversal (CROSS-SECTIONAL)

É um tipo de estudo que examina as pessoas em um determinado momento, forne-


cendo dados de prevalência (vide glossário); aplica-se, particularmente, a doenças
comuns e de duração relativamente longa. Envolve um grupo de pessoas expostas e
não expostas a determinados factores de risco, sendo que algumas dessas apresen-
tarão o desfecho a ser estudado e outras não.

A idéia central do estudo transversal é que a prevalência da doença deverá ser maior
entre os expostos do que entre os não-expostos, se for verdade que aquele factor de
risco causa a doença.

As vantagens do estudo transversal são a rapidez, o baixo custo, a identificação de


casos e a detecção de grupos de risco. Uma desvantagem é que se a prevalência da
doença a ser avaliada for muito baixa, o número de pessoas a ser estudado precisará
ser grande.

A medida de ocorrência dos estudos transversais é a medida da prevalência, expres-


sa da seguinte maneira:
44 |  Epidemiologia

         Número de casos existentes


Taxa de prevalência = __________________________________________
         Número de pessoas estudadas na população

Para obter-se uma melhor estimativa da medida da prevalência, utiliza-se a medida


do intervalo de confiança de 95% (IC 95%). Ao estudar-se uma amostra da popula-
ção, e, não todos os habitantes, a medida da prevalência pode ter uma variação.
(Vide glossário)

Para o cálculo do IC (95%)

IC 95% = P ± 1,96 √ (P (1 – P) / N)

6.4.3. Força da Associação

Existem duas dimensões quando estudamos uma associação entre variáveis: uma
em que a Estatística nos diz até que ponto o que vemos na nossa amostra poderá ser
o que existe na população, ou seja, até que ponto é estatisticamente significativo;
outra em que procuramos verificar até que ponto os nossos resultados implicam
associações fortes entre variáveis, calculadas através de simples subtracções (Dife-
rença de Riscos ou Risco Atribuível) ou quoeficiente (Risco Relativo, Odds Ratio, etc).
É possível haver uma associação forte nos resultados da nossa amostra que, no en-
tanto, não sendo estatisticamente significativos, têm pouco interesse porque não te-
mos garantias de existirem na população real. Por outro lado, tal como já referimos,
é possível haver uma associação estatisticamente significativa mas que, por ser tão
fraca, não tem importância nenhuma.

Duas importantes medidas da força da associação é o Risco Relativo e o Odds Ratio.

O risco relativo (RR) é uma medida da força da associaçäo entre um factor de risco
e o desfecho em um estudo epidemiológico. E definido como sendo a razão entre a
incidência entre indivíduos expostos e a incidência entre os não-expostos. É usual-
mente utilizado em estudos de coorte.
Epidemiologia | 45

Risco, ou proporção de incidência ou incidência acumulada

nos expostos: IE = a / a+b

nos não expostos: INE = c / c+d

RR = IE /INE= (a / a+b)/(c / c+d)

O odds ratio (OR) é uma estimativa do risco relativo. Possui a mesma interpretação,
apesar de ser baseado em uma fórmula diferente. Esta medida é particularmente
indicada para estudos de caso-controle.

Outras medidas de associação encontradas na literatura epidemiológica incluem a


razão de prevalências e o risco atribuível na população. (Vide glossário)

Conclusão: As medidas de associação baseadas em razões, como risco relativo e o


odds ratio, fornecem dados sobre a força da associação entre o factor em estudo e o
desfecho, permitindo que se faça um julgamento sobre uma relação de causalidade.
Assim, o risco relativo e o odds ratio são medidas de escolha para estudarmos os
possíveis determinantes das doenças.

6.4.4. ESTUDO DE CASOS E CONTROLES

O estudo de casos e controles parte do desfecho (do efeito ou da doença) para che-
gar à exposição. O grupo, tanto de casos quanto de controles, não precisa ser neces-
sáriamente representativo da população em geral. Os casos podem ser um subgrupo
de pessoas, desde que atendam aos critérios de elegibilidade préviamente estabele-
cidos pelo pesquisador.

Por exemplo, o propósito do investigador pode ser o estudo de pacientes com asma
grave que requeiram hospitalização. A população de origem dos casos, portanto, é a
população de asmáticos, e desta mesma população devem originar-se os controles.
Os controles devem representar a população de onde se originaram os casos, e não
a população geral.
46 |  Epidemiologia

Definição dos casos

A definição dos casos ou eventos necessita de critérios objectivos; se o projecto pre-


tende estudar cancro de pulmão, é preciso que os casos sejam confirmados através
de laudos anatomopatológicos, e não casos possíveis ou prováveis. Outro cuidado
nesse tipo de estudo, refere-se à duração da doença; se os casos estudados forem
casos prevalentes, aqueles que sobrevivem por mais tempo estarão super-represen-
tados na amostra. Com casos incidentes, não ocorre esse problema. Uma alternativa,
se quisermos incluir casos prevalentes, é estipular que somente poderão entrar no
estudo casos que tenham sido diagnosticados há, no máximo, por exemplo, seis me-
ses, e não casos diagnosticados há muito tempo.

Fonte dos casos

As fontes dos casos podem ser:

1. Fontes de base populacional: aqui a chance de ocorrer viés de seleção é menor,


pois teóricamente todos os casos podem ser incluídos no estudo.

As fontes de base populacional podem ser através de:

99 Registros de mortalidade.

99 Registros de morbidade. Exemplo: registros de doenças infecciosas etc.

2. Fontes ligadas a serviços médicos:

99 Hospitais. Incluir todos os hospitais do local.

99 Centros de saúde.

Critérios de inclusão e exclusão.

Os mesmos critérios de inclusão e exclusão para os casos devem ser aplicados aos
controles. Por exemplo, para simplificar o estudo em termos logísticos, decide-se
estudar casos de cancro de pulmão somente da zona urbana de uma localidade; os
controles também deverão ser apenas da zona urbana.

Definição dos controles. Um dos princípios básicos para a escolha dos controles é
Epidemiologia | 47

que a probabilidade de incluir um controle não pode estar associada com o factor
de risco em estudo (a exposição), para não ocorrer viés de seleção. Por exemplo, um
controle para um caso de cancro de pulmão não deve ser um paciente com cancro
de bexiga, já que esse tipo de câncer está bastante ligado ao fumo (factor de exposi-
ção). Outro item a considerar é que o controle deve ser alguém, que, se desenvolver
a doença, deve ser detectado pelo estudo e participar como caso.

Fontes dos controles. As fontes dos controles podem ser:

99 Controles hospitalares (ou de serviços de saúde): pessoas hospitalizadas nos mes-


mos hospitais dos casos, mas com outros diagnósticos.

99 Controles comunitários ou populacionais: as pessoas são selecionadas da mesma


comunidade de onde se originaram os casos, de forma aleatória.

Os estudos de caso-controle têm como vantagens o fato de que são estatísticamen-


te eficientes, permitem testar hipóteses, podem ser rápidos e baratos, estudarem
doenças raras e comuns e, se forem de base populacional, permitirem descrever a
incidência e características da doença.

A medida de ocorrência no estudo de caso-controle é a medida da prevalência da


exposição:

(a/a + c) > (b/b + d)

6.4.5. ESTUDO DE COORTE

É um tipo de estudo em que um grupo de pessoas com alguma coisa em comum


(nascimento, exposição a um agente, trabalhadores de uma indústria etc.) é acom-
panhado ao longo de um período de tempo para observar-se a ocorrência de um
desfecho. Por exemplo, uma coorte de nascimentos pode ser um grupo de pessoas
que nasceram no mesmo ano, e, a partir daí são acompanhadas por um período para
avaliar-se um desfecho como a mortalidade infantil, as hospitalizações no primeiro
ano de vida, a duração da amamentação ou outro desfecho qualquer. Sendo a di-
mensão tempo a base do estudo de coorte, torna-se possível determinar a incidência
48 |  Epidemiologia

de doenças.

No início do acompanhamento do estudo de coorte, os participantes devem estar


livres da doença ou do desfecho sob estudo, segundo os critérios empíricos usados
para medir a doença. O princípio lógico do estudo de coorte é a identificação de
pessoas sadias, a classificação das mesmas em expostas e não-expostas ao factor de
risco e o acompanhamento destes dois grupos por um período de tempo suficien-
temente longo para que haja o aparecimento da doença. A análise do estudo será a
comparação da incidência da doença em estudo entre os indivíduos expostos e entre
os não-expostos. Esse tipo de coorte é a coorte prospectiva. A fórmula pode ser as-
sim representada:

(a/a + b) > (c/c + d)

A coorte histórica ou retrospectiva é quando a exposição é medida através de infor-


mações colhidas do passado e o desfecho é medido daquele momento em diante.

Os estudos de coorte são excelentes para avaliar várias exposições e doenças ao


mesmo tempo; são indicados para doenças frequentes e doenças que levam à selec-
ção dos mais saudáveis; por outro lado, sendo estudos caros e demorados, as perdas
de acompanhamento podem distorcer o estudo, não servem para doenças raras e as
associações podem ser afectadas por variáveis de confusão.
Epidemiologia | 49

Quadro 1. Diferença entre Prevalência e Incidência

DIFERENÇA ENTRE PREVALÊNCIA E INCIDÊNCIA DE DOENÇA


Ambas são medidas de frequência de ocorrência de doença. Prevalência mede
quantas pessoas estão doentes, incidência mede quantas pessoas tornaram-se do-
entes. Ambos os conceitos envolvem espaço e tempo – quem está ou ficou doente
num determinado lugar numa dada época.
O quadro abaixo representa um espaço e tempo imaginários, com o período de
estado de uma doença sendo representado por barras com um comprimento igual
a 1 mês. De 10 casos observados, um (caso 1) iniciou o período de observação já
doente (barra pela metade), 7 tornaram-se doentes neste período, 2 não registra-
ram doença.

A prevalência da doença seria 80% (8 doentes entre 10 casos), e a incidência se-


ria de 70% (7 tornaram-se doentes entre 10 casos). Neste universo de espaço e
tempo, poder-se-ia ter cortes específicos para medidas específicas. Num corte de
espaço, sendo os 5 primeiros casos mulheres e os 5 últimos homens, poder-se-ia
dizer, por exemplo, que a prevalência é igual em ambos os sexos (4 doentes entre 5
casos cada) embora a incidência seja maior entre homens (4 homens tornaram-se
doentes entre 5 casos e 3 mulheres tornaram-se doentes entre 5 casos). Num corte
de tempo, poder-se-ia, por exemplo, examinar o mês 3 e concluir que a prevalência
de doença é 20% (casos 2 e 7 estão doentes entre os 10 casos) e que a incidência é
10% (caso 2 torna-se doente no mês 3).
50 |  Epidemiologia

6.5. RELAÇÕES ENTRE INCIDÊNCIA E PREVALÊNCIA


A prevalência de uma doença depende da incidência da mesma (quanto maior for a ocor-
rência de casos novos, maior será o número de casos existentes), como também da duração
da doença. A mudança da prevalência pode ser afetada tanto pela velocidade da incidência
como pela modificação da duração da doença. Esta, por sua vez, depende do tempo de cura
da doença ou da sobrevivência.

A relação entre incidência e prevalência segue a seguinte fórmula:

P = Incidência X duração média da doença

6.6. RELAÇÕES ENTRE EXPOSIÇÃO E DOENÇA


Na população, algumas pessoas são expostas a um dado factor de risco e outras não. De-
corrido algum tempo deste exposição algumas ficam doentes e outras não. Tem-se assim 4
possíveis desfechos, indicados pelas letra a, b, c e d que podem ser resumidos da seguinte
maneira:
Epidemiologia | 51

Quadro 2. Resumo esquemático da relação entre exposição e doença

Doentes (a)

Expostos

Ñ Doentes (b)

População

Doentes (c)

Ñ Expostos

Ñ Doentes (d)

a) O exposto que ficou doente


b) O exposto que não ficou doente
c) O não-exposto que ficou doente
d) O não-exposto que não ficou doente
52 |  Epidemiologia

Quadro 3. Tabela padrão para apresentação dos dados

Os resultados dos 4 tipos de estudos: ensaio clínico, estudo de coorte,


caso-controle e transversal podem ser apresentados através da tabela
padrão denominada 2x2 ou quádrupla, e que são utilizadas para resumir
os achados de estudos epidemiológicos analíticos. À esquerda , no qua-
dro está colocada a exposição, seja ela uma intervenção, ou um factor de
risco.

Doença
Exposição ao factor Total*
Sim Não
Sim a b a+b
Não c d c+d
Total a+c b+d N

a= no de indivíduos expostos e doentes


b= no de indivíduos exposto e sadios
c = no de indivíduos não exposto e doentes
d= no de indivíduos não expostos e sadios
N= no total de pessoas = a + b + c + d
*= No estudo caso-controle a coluna total é desnecessária
Epidemiologia | 53

7. VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA

OBJETIVOS
99 Compreender os princípios básicos da Vigilância Epidemiológica e
sua importância

99 Conhecer a organização do Sistema de Vigilância epidemiológica de


Moçambique

99 Identificar os principais factores de mudanças nos padrões epide-


miológicos

99 Aplicar as ferramentas básicas de construção dos principais indica-


dores utilizados na VE epidemiologica

99 Elaborar, analisar e enviar a tempo, os Boletins Epidemiológicos Se-


manais
54 |  Epidemiologia

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Ensino/Aprendizagem
Conteúdo Objectivos da Aprendizagem
Actividades
Compreender os princípios As aulas consistirão em
básicos da Vigilância exposições dialogadas.
Vigilância Epidemiológica
Epidemiológica e sua
Elas abordarão aspectos
importância
inerentes a Vigilância
Conhecer a organização Epidemiológica,
do Sistema de Vigilância Sistema de Vigilância
epidemiológica de epidemiológica
Sistema de Vigilância
Moçambique. Factores de mudanças
epidemiológica
Identificar os principais nos padrões
factores de mudanças nos epidemiológico.
padrões epidemiológicos Os recursos didáticos
Dominar as ferramentas a serem utilizados
básicas de construção constarão de projetor
Factores de mudanças nos multimídia (datashow),
dos principais indicadores
padrões epidemiológico quadro e canetas de
utilizados na VE
epidemiológica. filtro e formulário do BES

7.1. HISTÓRIA
A expressão vigilância epidemiológica passou a ser aplicada ao controle das doenças trans-
missíveis na década de 50, para designar uma série de actividades subsequentes à etapa
de ataque da campanha de erradicação da malária, vindo a designar uma de suas fases
constitutivas. Originalmente, significava “a observação sistemática e activa de casos suspei-
tos ou confirmados de doenças transmissíveis e de seus contactos”. Tratava-se, portanto,
da vigilância de pessoas, com base em medidas de isolamento ou quarentena, aplicadas
individualmente, e não de forma coletiva.

Na década de 60, o programa de erradicação da varíola também instituiu uma fase de vigi-
lância epidemiológica, subsequente à de vacinação em massa da população. Simultanea-
mente, o programa disseminou a aplicação de novos conceitos que se firmavam no âmbito
Epidemiologia | 55

internacional e não se vinculavam à prévia realização de uma fase de ataque. Pretendia-


se, mediante busca activa de casos de varíola, a detecção precoce de surtos e o bloqueio
imediato da transmissão da doença. Essa metodologia foi fundamental para o êxito da er-
radicação da varíola em escala mundial e serviu de base para a organização de sistemas
nacionais de vigilância epidemiológica.

7.2. DEFINIÇÃO
Vigilância em Saúde é um acompanhamento sistemático de recolha, análise e interpreta-
ção de dados sobre eventos de saúde ou condições relacionadas, cujo principal objectivo é
alertar as autoridades competentes, com oportunidade suficiente para tomar as medidas
necessárias, sejam preventivas ou controle.

Este monitoramento inclui a colheita e avaliação sistemática de:

a. Informes de morbidade e mortalidade.

b. Informes especiais de investigações de campo sobre epidemias e casos individuais.

c. Dados relativos a isolamento e identificação de agentes infecciosos em laboratório.

d. Dados relativos a disponibilidade, uso e efeitos adversos de vacinas, toxóides, imu-


noglobulinas, inseticidas e outras substâncias empregadas no controle de doenças.

e. Dados sobre níveis de imunidade em certos grupos da população.

Todos esses dados devem ser reunidos, analisados e apresentados na forma de informes,
que serão distribuídos a todas as pessoas que colaboraram na sua obtenção e a outras que
necessitem conhecer os resultados das actividades da vigilância. Esses procedimentos se
aplicam a todos os níveis dos serviços de saúde pública, desde o local até o internacional.

7.3. PROPÓSITOS
A vigilância epidemiológica deve fornecer orientação técnica permanente para os profissio-
nais de saúde que têm a responsabilidade de decidir sobre a execução de acções de con-
trole de doenças e agravos, tornando disponíveis, para esse fim, informações atualizadas
sobre a ocorrência dessas doenças e agravos, bem como dos factores que a condicionam,
56 |  Epidemiologia

numa área geográfica ou população definida.

Subsidiáriamente, a vigilância epidemiológica constitui-se importante instrumento para a


planificação, organização e operacionalização dos serviços de saúde, bem como a normati-
zação das atividades técnicas correlatas.

7.4. SISTEMA DE VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA EM MOÇAMBIQUE


O sistema de vigilância epidemiológica (SVE) em Moçambique é parte integrante do SIS
(Sistema de Informação para a Saúde). O SVE foi estabelecido no país em 1977, dois anos
após a independência e tinha como base a notificação semanal de uma grande lista de do-
enças para ser reportadas por todas as unidades sanitárias do país. Em 1985, este sistema
foi revisto e estabelecidos dois sub-sistemas nomeadamente o BES (Boletim Epidemiológi-
co Semanal) e o BEM-PS (Boletim Epidemiológico Mensal – Postos Sentinela). O BES incluía
a notificação de 11 doenças notificadas em todas as unidades sanitárias enquanto o BEM-
PS funciona somente nos hospitais centrais (3) e provinciais (7) e inclui doenças de difícil
diagnóstico nas unidades sanitárias periféricas.

A partir de 1990 com a introdução do novo sistema de informação para a saúde, o sistema
anterior foi revisto e as alterações introduzidas foram:

99 Siplificação das normas

99 Alterações da lista de doenças a notificar

99 Introdução de novos intrumentos

Para completar os sub-sistema do BES e do BE-PS, a Vigilância Epidemiológica (VE) passou


a englobar:

1. Os resumos mensais de internamento dos Postos ou Centros de Saúde com ca-


mas (níveis I);

2. Os resumos mensais de internamento dos hospitais rurais (níveis II).

3. As notificações paralelas, principalmente:

Tuberculose/Lepra, DTS/HIV/SIDA e cólera por via rápida


Epidemiologia | 57

7.4. CLASSIFICAÇÃO
Os dados e informações que alimentam o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica
são os seguintes:

a. dados demográficos

b. ambientais

c. socioeconômicos

Os dados demográficos permitem quantificar grupos populacionais, com vista à definição


de denominadores para o cálculo de taxas. Dados sobre o número de habitantes, nascimen-
tos e óbitos devem ser discriminados segundo características de sua distribuição por sexo,
idade, situação do domicílio, escolaridade, ocupação, condições de saneamento, etc.

A disponibilidade de indicadores demográficos e socioeconômicos é primordial para a ca-


racterização da dinâmica populacional e das condições gerais de vida, às quais se vinculam
os factores condicionantes da doença ou agravo sob vigilância. Dados sobre aspectos cli-
máticos e ecológicos também podem ser necessários para a compreensão do fenômeno
analisado.

Dados de morbidade

São os dados mais utilizados em vigilância epidemiológica, por permitirem a detecção ime-
diata ou precoce de problemas sanitários. Correspondem à distribuição de casos segundo a
condição de portadores de infecções ou patologias específicas, como também de sequelas.
Trata-se, em geral, de dados oriundos da notificação de casos e surtos, da produção de
serviços ambulatórios e hospitalares, de investigações epidemiológicas, da busca activa de
casos, de estudos amostrais e de inquéritos, entre outras formas.

Seu uso apresenta dificuldades relacionadas à representatividade e abrangência dos siste-


mas de informações disponíveis, à possibilidade de duplicação de registros e a deficiências
de métodos e critérios de diagnóstico utilizados. Merecem, por isso, cuidados especiais na
colheita e análise.
58 |  Epidemiologia

Dados de mortalidade

São de fundamental importância como indicadores da gravidade do fenômeno vigiado, sendo


ainda, no caso particular de doenças de maior letalidade, mais válidos do que os dados de
morbidade, por se referirem a factos vitais bem marcantes e razoavelmente registrados. Sua
obtenção provém de declarações de óbitos, padronizadas e processadas a nível nacional. Essa
base de dados apresenta variáveis graus de cobertura entre as regiões do país, algumas delas
com subenumeração elevada de óbitos. Além disso, há proporção significativa de registros
sem causa definida, o que impõe cautela na análise dos dados de mortalidade.

Atrasos na disponibilidade desses dados dificultam sua utilização na vigilância epidemio-


lógica. A disseminação eletrônica de dados tem contribuído muito para facilitar o acesso a
essas informações. Considerando tais factos, os sistemas locais de saúde devem ser estimu-
lados a utilizar de imediato as informações das declarações de óbito.

Notificação de surtos e epidemias

A detecção precoce de surtos e epidemias ocorre quando o sistema de vigilância epidemio-


lógica local está bem estruturado, com acompanhamento constante da situação geral de
saúde e da ocorrência de casos de cada doença e agravo sujeito à notificação. Essa prática
possibilita a constatação de qualquer indício de elevação do número de casos de uma pa-
tologia, ou a introdução de outras doenças não incidentes no local e, consequentemente,
o diagnóstico de uma situação epidêmica inicial para a adopção imediata das medidas de
controle. Em geral, esses factos devem ser notificados aos níveis superiores do sistema para
que sejam alertadas as áreas vizinhas e/ou para solicitar colaboração, quando necessária.

Fontes de dados

A informação para a vigilância epidemiológica destina-se à tomada de decisões – informa-


ção para a acção. Este princípio deve reger as relações entre os responsáveis pela vigilância
e as diversas fontes que podem ser utilizadas para o fornecimento de dados. Dentre essas,
a principal é a notificação, ou seja, a comunicação da ocorrência de determinada doença ou
agravo à saúde feita à autoridade sanitária por profissionais de saúde ou qualquer cidadão,
para fins de adopção de medidas de intervenção pertinentes.

Históricamente, a notificação compulsória tem sido a principal fonte da vigilância epidemiológi-


ca, a partir da qual, na maioria das vezes, se desencadeia o processo informação decisão-acção.
Epidemiologia | 59

7.5. FUNÇÕES DA VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA


A operacionalização da vigilância epidemiológica compreende um ciclo de funções específi-
cas e intercomplementares, desenvolvidas de modo contínuo, permitindo conhecer, a cada
momento, o comportamento da doença ou agravo seleccionado como alvo das acções, de
forma que as medidas de intervenção pertinentes possam ser desencadeadas com oportu-
nidade e eficácia.

São funções da vigilância epidemiológica:

99 Colheita de dados

99 Processamento dos dados coletados

99 Análise e interpretação dos dados processados

99 Recomendação das medidas de controle apropriadas

99 Promoção das acções de controle indicadas

99 Avaliação da eficácia e efectividade das medidas adoptadas

99 Divulgação de informações pertinente

Colheita de dados (colheita, recolha de dados)

A colelheira dos dados deve ser precedida de uma selecção cuidadosa de quais doenças
ou condições serão objecto de vigilância e se fará a colheita, como e com que frequência.
Deve-se evitar a colheita de dados supérfluos. Não se deve solicitar dados para os quais não
esteja prevista uma utilização específica.

Uma vez definidos os dados necessários, os passos a seguir são:

1. Identificar as pessoas ou serviços (médicos, auxiliares, hospitais, registo cívil,


líderes comunitários) que possam fornececer dados.

2. Estabelecer instrumentos adequados de recolha dos dados entre os notificantes


e os serviços de saúde (formulários, visitas aos serviços, telefone, etc.) e a frequência
60 |  Epidemiologia

com que devem ser notificados.

3. Organizar registos simples dos dados no serviço de saúde (fichas, livros, arqui-
vos, etc.).

A colheita de dados requer um sistema de notificação que proporcione, em períodos de-


finidos, dados confiáveis sobre o comportamento das doenças. Quando se identificam as
fontes de notificação, deve se considerar o pessoal e as instituições que estejam, em maior
contacto com os casos das doenças que são objectos de vigilância. A identificação adequa-
da e selecção destas fontes de notificação serão de grande valor para conhecer a distribui-
ção e ocorrência das doenças que deverão ser controladas. Além destas fontes regulares de
notificação, é conveniente seleccionar um grupo de hospitais ou clínicas que actuem como
“postos sentinelas” e cuja notificação inclua a informação epidemiológica necessária.

Se estes “postos sentinelas” são selecionados adequadamente, em função da patologia


que atendem a informação que proporcionam poderá servir também para estabelecer um
sistema para detecção precoce de situações de alarme e de surtos epidémicos. O sistema
de notificação deve cobrir, em forma ideal, toda a população da área.

Cada um dos centros de notificação deverá ser claramente instruído sobre o tipo de dados
que deverá colectar quando identifica algum caso suspeito de algumas das doenças ob-
jecto de vigilância. Geralmente os dados mínimos requeridos são: idade do paciente, seu
endereço, data do início dos sintomas e, se for o caso, antecedentes de vacinação. Quando
se pretende realizar alguma investigação individual de casos o nome também deverá ser
anotado.

Para cada um dos níveis de notificação deverá ser elaborado um formulário que torne ho-
mogenica a colheita dos dados. A frequência com que estes formulários deverão ser envia-
dos aos níveis superiores será estabelecida de acordo com a capacidade de resposta e das
acções de controlo que serão executadas.

O envio rotineiro dos formulários deverá realizar-se mesmo em situações em que caso não
tenham sido detectados, de tal maneira que os responsáveis pelos programas de controlo
conheçam a situação epidemiológica e que saibam também que os centros de notificação
estão vigiando de maneira activa e contínua as doenças que foram estabelecidas como de
notificação obrigatória.
Epidemiologia | 61

Entretanto, nem todos os casos ocorridos numa área são notificados e é importante que se
saibam as razões que explicam o sub-registo.

Quando uma pessoa se infecta na área de uma jurisdição de saúde e a notificação provém
de outra, a autoridade que recebe a informação deve notificar a primeira em relação ao
ocorrido, principalmente se a doença exige o exame de contactos para descobrir a fonte de
infecção, ou investigação do abastecimento de água, alimentos, vectores ou reservatórios
como possíveis veículos.

Além da notificação sistemática de determinadas doenças, regularmente se exige a noti-


ficação sistemática de determinadas doenças ou surtos de doenças, inclusive aquelas que
não aparecem nas listas de notificação obrigatória.

1.2. Consolidação e Apresentação dos Dados

A consolidação e apresentação é o agrupamento e ordenação dos dados colectados em


tabelas, gráficos ou mapas que podem facilitar a sua análise e interpretação.

1.3. Análise e Interpretação

A análise é uma actividade que inclui primeiramente um processo de comparação de dados


com o propósito de:

1. Estabelecer as tendências das doenças, a fim de identificar aumentos ou dimi-


nuições e/ou mudanças no comportamento das mesmas.

2. Identificar os factores associados com um aumento eventual ou decréscimo de


casos e/ou óbitos e identificar grupos de maior risco.

3. Especificar os pontos mais vulneráveis para a aplicação das medidas de controlo.

As comparações podem ser feitas em relação ao tempo, às pessoas e aos lugares.

A. Comparações em relação ao Tempo

I. De períodos imediatamente anteriores na mesma localidade.

II. De períodos iguais (mesmo mês por exemplo) de anos anteriores, na mesma localidade.
62 |  Epidemiologia

III. De períodos iguais em lugares diferentes.

B. Comparações em relação às Pessoas

Os dados sobre os casos ou óbitos podem ser comparados segundo determinadas carac-
terísticas das pessoas, como: sexo, idade, situação sócio-econômica, lugar de residência,
grupo étnico e ocupação.

C. Comparações em relação ao Lugar

1.4. Tomada de acções

Como resultado da análise dos dados, se iniciará, tão cedo quanto possível, a aplicação das
medidas de prevenção ou controlo mais adequadas à situação.

Se existem condições de se efectuar a análise em um nível mais periférico, na estrutura de


serviços de saúde, mais oportunas e eficazes serão as acções executadas.

1.5. Divulgação da Informação

A divulgação periódica da informação, resultante da análise e interpretação dos dados cole-


tados, e em relação às medidas de controlo tomadas, constitue uma das etapas cruciais da
vigilância epidemiológica, sobretudo quando os diferentes fornecedores de dados recebem
em troca uma imagem mais completa e integral do problema de saúde objecto de controlo.
A experiência indica que, para evitar que o pessoal que notifica a ocorrência de casos ou
óbitos perca o entusiasmo, é necessário fazê-lo participar de todo o processo, desenvolven-
do, de maneira regular, relatórios consolidados da situação epidemiológica, para que ele,
por sua vez, possa julgar a sua própria contribuição no desenvolvimento dos programas de
controlo.

Ao nível local essa divulgação de informação pode ser feita de várias maneiras: em reuniões
de trabalho, por rádio, por jornal, ou por contactos pessoais. Se as circunstâncias o justifi-
cam, um relatório específico pode ser publicado e distribuído aos interessados.

7.6. ELEMENTOS DA VIGILÂNCIA


Os dados usados para a vigilância epidemiológica relacionam-se básicamente com os se-
Epidemiologia | 63

guintes elementos:

99 Casos

99 Mortes

99 Resultados de laboratório

99 Medidas de prevenção ou controlo

99 Meio ambiente

99 Vectores

99 Reservatórios

99 População

7.6.1. Casos e Mortes

São os dados obtidos com o resultado do estudo de casos e mortes devido a determi-
da doença. Além do número total de casos e/ou mortes, da data e do local de ocor-
rência, utilizam-se dados sobre as características dos doentes e/ou falecidos como,
por exemplo, a idade, o sexo, a profissão.

7.6.2. Resultados de Laboratório

São os dados obtidos das actividades de rotina dos laboratórios (de saúde pública e
outros) e que correspondem a resulados de provas que podem permitir:

99 A confirmação de casos (isolamento, sorologia)

99 A detecção de resistência bacteriana a antibióticos e quimioterápicos

99 A determinação de níveis imunitários na população (sorologia, provas cutâneas,


etc.)

99 A determinação de contaminação ambiental


64 |  Epidemiologia

7.6.3. Medidas de Prevenção ou Controlo

São os dados que se obtém dos programas em geral e que se relacionam com a
extensão das medidas de prevenção ou controlo usadas (doentes tratados, casas
raciadas, vacinas aplicadas).

7.6.4. Meio Ambiente

São os dados sobre as condições ambientais - cobertura e qualidade dos serviços de


água, cobertura da população com serviços de eliminação de excretas e lixo, níveis
de contaminação do ar.

7.6.5. Vectores

São os dados sobre os tipos de vectores existentes na área, sua distribuição geográfi-
ca, seus hábitos e seu nível de resistência ou susceptibilidade aos inseticidas.

7.6.6. Reservatório

São os dados sobre a existência e tipos de portadores humanos e sobre tipos e distri-
buição dos reservatórios animais.

7.6.7. População

São os dados sobre o tamanho da população; sua composição por idade, por sexo
e outras características; sua distribuição geográfica e seus movimentos migratórios;
sua susceptibilidade ou resistência a determinadas doenças.

A selecção de dados para a vigilância dependerá de:

A. característicaS da doença

O conhecimento da epidemiologia da doença permitirá selecionar os dados mais


indicativos da sua presença e distribuição. Por exemplo: o modo de transmissão de-
terminará que elementos são úteis para indicar a ocorrência da doença.

Por outro lado, quando a letalidade é alta, o conhecimento dos óbitos pode permitir
uma avaliação aproximada do total de casos ocorridos. Ao contrário, em doenças
com letalidade muito baixa ou nula (varicela, rubéola), os dados sobre óbitos são
Epidemiologia | 65

inúteis para a vigilância.

B. estrutura e desenvolvimento dos serviços de saúde

A quantidade de dados utilizados para a vigilância das doenças deverá ser propor-
cional à capacidade de análise e de resposta dos serviços de saúde. Uma grande
quantidade de dados tem importância limitada se os serviços de saúde não tem pos-
sibilidade de analisar e de tomar acções para prevenção ou controlo dos problemas
identificados.

7.7. mECANISMOS PARA OBTENÇÃO DOS DADOS


Os mecanismos através dos quais se obtém os dados sobre os elementos anteriormente
estudados são, basicamente:

99 Notificação

99 Registos

99 Rumores

99 Investigação epidemiológica

99 Inquéritos

7.7.1. Notificação

É o procedimento através do qual o pessoal de saúde informa rotineiramente, aos


encarregados dos programas, os casos ou outros eventos ocorridos na sua área de
trabalho. Em geral os dados que devem ser informados são estalecidos pelo serviço
de saúde.

7.7.2. Registos

São anotações regulares de determinados eventos (mortes, nascimentos, vacina-


ções, casos hospitalizados, etc) realizadas pelos serviços de saúde e por outras insti-
tuições públicas ou privadas.
66 |  Epidemiologia

7.7.3. Rumores

Referem-se a opiniões populares espontâneas, em geral, associadas a um aumento


de casos ou mortes por uma determinada causa. Estes rumores surgem na comuni-
dade e são divulgados pelos seus líderes ou pelos jornais.

7.7.4. Investigação Epidemiológica

É o procedimento através do qual se obtém, de forma activa, informação comple-


mentar sobre um ou vários casos de determinadas doenças.

A Investigação Epidemiológica inicia sempre a partir das notificações recebidas, dos


rumores ou das análises dos dados de registo.

7.7.5. Inquéritos

São procedimentos, em geral eventuais, através dos quais se obtém informações


sobre as características das populações, a distribuição de alguma doença, o funcio-
namento e cobertura dos serviços de saúde, etc. São geralmente usados quando os
dados disponíveis, obtidos por outros mecanismos, são pouco confiáveis ou incom-
pletos, ou quando existe ausência de registos.

A seguir são apresentadas algumas situações de uso dos vários mecanismos.

No esquema (1), as acções de controlo são tomadas com base na análise dos dados
obtidos através de registo, de notificação e de rumores. Não se faz investigação epi-
demiológica.
Epidemiologia | 67

Esquema 1.

Casos

Mortes
Notificação
População
Acção
Registro
Laboratório

Medidas de con-
trole

No esquema (2), a partir dos dados de Notificação, Registo e Rumores realiza-se uma
invesigação epidemiológica de casos para orientar as acções de controlo.

Esquema 2.

Casos Notificação Investigação Epide-


Acção
Mortes Registro miológica

Em qualquer das 2 situações, dependendo das circunstâncias locais, pode-se parale-


lamente obter dados através de inquéritos.

Uma outra possibilidade de uso do inquérito, como foi comentado anteriormente, é


quando não existem registos ou notificações sobre determinadas doenças ou sobre
medidas de controlo e se necessita conhecer a extensão do problema.
68 |  Epidemiologia

Esquema 3.

Casos
Inquéritos Acção
Mortes

7.8. PRINCÍPIOS BÁSICOS DO SVE


1. A notificação de doenças de declaração obrigatória é da responsabilidade de
qualquer US do país.

2. Nas US, a responsabilidade das primeiras etapas da notificação (registo nos li-
vros de consulta e recolha para as fichas de contagem de novos casos). Cabe ao pes-
soal envolvido no diagnósticos das doenças, ou seja, ao pessoal clínico.

7.9. BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO SEMANAL (BES)


Neste sistema devem participar todas as unidades sanitárias do país:

99 Postos de saúde (PS)

99 Centros de saúde (CS)

99 Hospitais rurais e gerais (HR e HG)

99 Hospitais privinciais e centrais (HP e HC)


Epidemiologia | 69

O BES serve para notificar as seguintes doenças:

Código da Classificação Internacional


Doença
das doenças
Sarampo 055
Tétano 037
Meningite 136
Malária 084
Raiva 071

Diarreias 009

Desinteria 009.2

Cólera* 001
Peste* 020
Poliomielite/PFA 045
Tripanossomíase 086
Tosse convulsa** (coqueluche) 033

*Doenças sujeitas ao Regulamento Sanitário Internacional


** Se houver casos, escrever na parte correspondente as observações

A notificação através do BES é semanal. Deve ser feita cumprindo com a semana epidemi-
ólogica, ou seja de Domingo a Sábado de cada semana.

Anualmente, elabora-se um calendário epidemiológico que indica a semana epidemiológi-


ca a que pertence cada dia do ano. (vide anexo 1, 2 e 3 )
70 |  Epidemiologia

7.10. FLUXOGRAMA DE ENVIO DO BES DE MOÇAMBIQUE

Direcção Distrital de
Postos de saúde
Saúde/Direcção de
Centros de saúde
Saúde da cidade (capi-
Hospitais Rurais
tais Provinciais)

Direcção Provincial de
Hospitais Provinciais Saúde/ Direcção de
Hospitais Centrais Saúde da cidade (Cida-
de de Maputo)

Cidade de Maputo,
todas as Unidades Hospital Geral da qual
Sanitárias de nível depende a US
Primário

Direcção de saúde
Hospital Central de da cidade (Centro de
Maputo profilaxia e exames
médicos)

BES da US

Na segunda-feira de cada semana, o responsável do BES da US recolhe as folhas de conta-


gem de todos os serviços ( triagem de adultos e crianças, consultas, internamento, banco
de socorros) da semana epidemiológica anterior e entrega outra folha de contagem para a
nova semana. Em seguida, soma os casos e os óbitos das diferentes folhas de contagem e
preenche os quadros correspondentes no BES da US.

Antes de enviar o BES para o nível superior, deve se fazer o controle de qualidade , ou seja,
verificar se os dados estão completos , correctos e lógicos.
Epidemiologia | 71

Nível Distrital

O BES da US deve ser enviado Terça feira e, até Sábado deve dar entrada na Direcção Dis-
trital de Saúde (DDS). Na DDS, a sua entrada deve ser registada na folha de controle do BES
colocando-se um (X) no quadro correspondente à US e à semana epidemiológica.

Envio do BES Distrital: Os procedimentos relacionados com o envio do BES distrital são se-
melhantes aos BES da US, assim: O BES deve ser enviado á DPS terça feira.

Nível Provincial:

À semelhança dos níveis anteriores, o BES distrital deve dar entrada na DPS até sábado.

Envio do BES Provincial:

O envio do BES ao Gabinete de Epidemiologia (MISAU) deve ser feito á terça –feira.

Mensalmente, respeitando o calendário epidemiológico, cada uma das Províncias deve ela-
borar um Boletim Epidemiológico Mensal. Devem também elaborar Boletins Trimestrais e
Anuais.

Nível Central: O BES Provincial deve dar entrada no Gabinete de Epidemiologia no MISAU
até sábado.

O BES Nacional deve ser enviado para :

Direcções Provinciais de Saúde

Secções, repartições e programas específicos da Direcção Nacional de Saúde.

Departamentos da Direcção de Planificação e Cooperação

Organização Mundial da saúde (OMS)

Outras entidades nacionais e internacionais

7.11. ELABORAÇÃO E INTERPRETAÇÃO


Para interpretar a informação, torna-se necessário o cálculo de indicadores.
72 |  Epidemiologia

INDICADORES

Um indicador é uma medida que pode ser utilizada para descrever uma situação actual
comparando lugares ou pessoas, ou para verificar mudanças no tempo; por outras pala-
vras, um indicador dá informação sobre uma situação. Apresenta-se muitas vezes sobre
a forma de taxas e permite comparar informaçao entre os diferentes lugares, tempo ou
grupo de pessoas.

Os indicadores mais utilizados na VE são:

Taxa de Incidência (TI)

Taxa de Prevalência (TP)

Taxa de letalidade (TL)

Taxa de mortalidade (TM)

Taxa de incidência: A taxa de incidência mede o número de casos novos de uma doença,
episódios ou eventos na população dentro de um período definido de tempo (dia, semana,
mês, ano); é um dos melhores indicadores para avaliar se uma condição está diminuindo,
aumentando ou permanecendo estável, pois indica o número de pessoas da população que
passou de um estado de não-doente para doente

No. de casos novos num lugar


Taxa de I = ________________________________________________ X 100%
População do mesmo lugar
(No mesmo periodo de tempo)

Taxa de Prevalência: A taxa de prevalência mede o número total de casos, episódios ou


eventos existentes em um determinado ponto no tempo. O coeficiente de prevalência,
portanto, é a relação entre o número de casos existentes de uma determinada doença e o
número de pessoas na população, em um determinado período. Esse coeficiente pode ser
multiplicado por uma constante, pois, assim, torna-se um número inteiro fácil de interpre-
tar (essa constante pode ser 100, 1.000 ou 10.000).
Epidemiologia | 73

número de casos existentes num certo lugar


Taxa de P = ___________________________________________x 100%
número de pessoas na população do mesmo lugar

Taxa de letalidade: A letalidade refere-se à incidência de mortes entre portadores de uma


determinada doença, em um certo período de tempo, dividida pela população de doentes.
É importante lembrar que, na letalidade, o denominador é o número de doentes.

 Número de mortes de uma determinada


 doença em certo período
Letalidade = ___________________________________________ X 100%
Número de casos da mesma doença no mesmo período

Taxa de mortalidade: É a razão entre o total de óbitos numa enfermaria ou hospital, e o


total de altas nessa mesma enfermaria ou hospital.

número total de óbitos num


determinado hospital/ enfermaria
Taxa de mortalidade= __________________________________________X 100%
número de altas no mesmo hospital/enfermaria.
74 |  Epidemiologia

8. CANAL ENDÊMICO

OBJETIVOS
99 Compreender os métodos de verificação da ocorrência de uma epi-
demia

99 Construir um diagrama de controle ou canal endêmico e interpretar


os resultados.

RELACIONANDO CONTEUDO, OBJECTIVOS DA APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIA DE ENSINO/


APRENDIZAGEM
Objectivos da Ensino/Aprendizagem
Conteúdo
Aprendizagem Actividades
Compreender
Métodos de
os métodos de As aulas consistirão em exposições dialogadas
verificação da
verificação da sobre as métodos de verificação da ocorrência
ocorrência de uma
ocorrência de uma de uma epidemia
epidemia
epidemia
As aulas práticas serão desenvolvidas com
Construir um diagrama demostração de construção de um canal
de controle ou canal endemico. Cada estudante deve praticar
Canal endêmico
endêmico e interpretar individualmente a construção do canal
os resultados endemico e em seguida fazer a apresentação
dos resultados e sua interpretação

Provavelmente a definição mais curta e simples de epidemia foi formulado por Benenson
da seguinte forma: “A ocorrência de uma doença acima do esperado”. É uma comparação
Epidemiologia | 75

implícita entre o número de casos detectados e o número “de casos normais”. Este número
“normal” óbviamente depende da população, da área geográfica e o período de tempo
considerado. Este último é particularmente importante na doenças agudas em que a sazo-
nalidade desempenha um papel importante.

Embora o princípio da definição de epidemia tenha sido projetado para doenças transmis-
síveis, o seu uso é totalmente compatível com as doenças não transmissíveis. Por exemplo,
durante um final de semana longo (feriado em uma sexta-feira ou segunda-feira), aconte-
cem reais “epidemias” de acidentes de trânsito.

Face ao exposto, na condução de vigilância epidemiológico da população, é fundamental


saber qual é a incidência normal da doença nesta população ou grupo pessoas nessa época
do ano. Neste ponto, a importância de se preparar os canais endêmicos onde a incidência
actual pode ser representada gráficamente sob uma ocorrência histórica e assim detectar
precocemente números anormalmente altos (ou baixos) de casos da doença em estudo.

8.1. DEFINIÇÃO
O canal endêmico foi criado por Selwyn Collins em 1932 para a vigilância das epidemias de
gripe e é amplamente utilizada, desde então, devido à simplicidade de sua construção e
interpretação e é uma ferramenta para entender o comportamento e avaliar a natureza de
uma doença endêmica ou uma epidemia.

É uma representação gráfica da incidência real da ocorrência histórica e permite a detec-


ção precoce de números anormalmente elevados ou baixos de casos da doença em estudo.
Em 1970, Hector Boffi Borggero e Carlos Alvarez Herrera descreveram vários métodos para
construir canais endémicos.

8.2. MÉTODOS PARA CONSTRUÇÃO DE UM CANAL ENDÊMICO


Um dos métodos utilizados para a verificação de ocorrência de uma epidemia, consiste
na representação gráfica da distribuição da média mensal e desvio-padrão dos valores da
frequência (incidência ou casos) observada, em um período de tempo (habitualmente 10
anos).
76 |  Epidemiologia

A construção deste diagrama pode ser feita da seguinte forma:

99 Verificar se a distribuição do número de casos/incidência da doença, registrado


mensalmente durante os últimos anos (geralmente dez anos ou mais), apresenta
grandes variações;

99 Excluir os dados referentes a anos epidêmicos;

99 Calcular a média aritmética e os desvios-padrão (pode ser calculado no programa


Excel) de cada distribuição mensal das incidências registradas no período selecio-
nado;

99 Observar que os valores compreendidos entre aqueles correspondentes à média


de cada mês acrescidos de 1,96 desvios-padrão e aqueles de cada média mensal
menos 1,96 desvio-padrão, (distribuição normal), correspondem ao nível endêmico
da doença, ou seja, o limite de variação esperada para cada mês;

99 Representar gráficamente (diagrama curvilinear) a distribuição das médias e des-


vios-padrão da incidência (diagrama de controle);

99 Observar que quando os valores observados ultrapassam os do limite máximo da


variação esperada, diz-se que está ocorrendo uma epidemia. Desta maneira, quan-
do uma doença deixa de ocorrer em determinada área, o registro de um único caso
pode configurar uma epidemia ou surto.

8.3. COMPONENTES DO CANAL ENDÊMICO


Os componentes que devem ser considerados na análise e interpretação da série são:

I) Tendência: observada a longo prazo na evolução de um evento. Também chamada de


variação geral, histórica ou secular. O objetivo é detectar e interpretar a evolução da in-
cidência do evento. Deve-se atentar para modificações nos critérios diagnósticos, na ter-
minologia, nas taxas de letalidade, etc., que podem refletir nas variações de incidência da
doença, influenciando poderosamente as estatísticas. As séries históricas mais longas são
particularmente sujeitas a problemas, pela combinação de muitos factores de confusão.

Algumas situações peculiares podem ocorrer na interpretação da tendência histórica:


Epidemiologia | 77

99 mudanças bruscas na frequência, como aquelas ocorridas após campanhas de va-


cinação em massa.

99 mudanças graduais na frequência, como as resultantes da melhoria da qualidade


diagnóstica e da assistência médica. Neste caso, a interpretação de informações
estatísticas é dificultada pela presença de factores de confusão, que também pode-
riam ser responsabilizados pela tendência da doença.

99 mudanças na forma de apresentação das estatísticas, como alterações na maneira


de compor a distribuição etária da mortalidade.

99 mudanças nas características das pessoas e do lugar, como tamanho e estrutura da


população e áreas que deixam de ser rurais.

A análise da tendência geral de uma série temporal deve estabelecer se há variação de fre-
quência, e quais são as características desta variação. É preciso analisar:

99 Tempo mínimo de observação: possibilita a percepção da tendência do fenômeno,


se estacionária, ascendente ou descendente. Na maioria das situações a duração da
série histórica é determinada pela disponibilidade dos dados. O período de tempo
necessário é variado, e quando o evento é expresso em frequências anuais alguns
quinquênios podem ser suficientes.

99 Fontes de dados: costumam limitar-se às estatísticas de notificação obrigatória e às


de mortalidade.

99 Tabelas e gráficos: possibilitam a análise de uma série de dados dispostos em or-


dem cronológica. Nas tabelas, os números apontam para a tendência dos coefi-
cientes, e os gráficos, se adequadamente produzidos, permitem mesmo de relance
presumir a tendência dos eventos. Muitas vezes, os métodos simples de compara-
ção de frequências são suficientes para informar sobre a tendência do evento em
termos absolutos ou relativos; porém, o uso de números-índice é uma alternativa
para realçar a alteração proporcional dos casos (o marco de referência é fixado com
o valor “1” ou “100”, e os demais anos são expressos em termos proporcionais em
relação ao valor de referência). Em casos em que as observações seriadas apresen-
tam ziguezagues, podem ser feitos ajustamentos para suavizá-los.
78 |  Epidemiologia

A análise de dados pode apresentar alguns problemas bastante comuns. Um problema fre-
quente é haver observações perdidas durante um certo período de tempo; outro problema
são as observações aberrantes (excepcionalmente altas ou baixas), que podem ser reflexo
de erros ou também ser reais, com um significado que merece maior atenção; pode tam-
bém não haver uniformidade de conceitos e procedimentos empregados na obtenção dos
dados referentes a todo o período da série; e as frequências reais podem ser diferentes das
detectadas, não demonstrando a exata incidência experimentada pela população.

Para a comparação e interpretação das tendências, pode-se avaliar a prevalência do evento


em diferentes épocas e a evolução de dois eventos distintos.

A comparação das prevalências em dois ou mais períodos é muito usada em procedimentos


relacionados ou não à saúde. Um exemplo clássico é a evolução de candidatos a eleições
na preferência popular em pesquisas amostrais sucessivas, montando-se gráficos que res-
saltam as tendências.

O mesmo procedimento pode ser empregado na área de saúde. Os resultados podem,


porém, ser influenciados pela presença de factores de confusão, como variações nas carac-
terísticas da população incluída e na forma de aferição do agravo.

A evolução e comparação das tendências dos coeficientes de uma doença com os de outra
podem ser a melhor forma de se conhecer apropriadamente sobre a matéria. Um exemplo
clássico é a comparação da incidência crescente de câncer de pulmão com os demais tipos
de câncer, confirmando que a evolução reflete um real aumento de incidência do agravo à
saúde.

II) Variações cíclicas: oscilações periódicas de frequências em períodos superiores a um


ano. Esta periodicidade independe da tendência ser ascendente ou descendente, e aparece
mesmo quando não se configura qualquer tendência.

Picos de incidência podem formar ondas regulares, e são comumente observados nas sé-
ries temporais das doenças infecciosas, como ocorre com o sarampo e a febre amarela. Cri-
ses econômicas e grandes secas também são eventos que costumam apresentar variação
cíclica.

O estudo deste tipo de variação é importante pois as oscilações tendem a se repetir perio-
Epidemiologia | 79

dicamente, podendo-se prever a ocorrência dos eventos e adoptar medidas preventivas.

As abordagens utilizadas para analisar outras variações devem ser empregadas também
nas cíclicas, utilizando-se tabelas e gráficos com valores absolutos ou relativos ou ainda
números-índice.

O tempo mínimo de observação depende do evento considerado e da duração do intervalo


entre os picos de freqüências altas (é importante que se disponha de, pelo menos, três
períodos de altas frequências na série temporal). Em séries históricas de curta duração po-
dem surgir conclusões equivocadas, e a sua interpretação exige prudência. Dependendo do
período estudado, séries curtas podem, inclusive, induzir a conclusões opostas.

III) Variações sazonais: oscilações periódicas de frequências cujos ciclos configuram ritmo
sazonal, geralmente ao longo de um ano. Um exemplo indiscutível de variação sazonal é a
que ocorre com a temperatura, alta no verão e baixa no inverno.

Acompanhando as oscilações de temperatura, está a sazonalidade de algumas doenças,


com uma maior incidência de diarréias no verão e de infecções transmitidas por via respira-
tória no inverno. Os acidentes de trabalho ligados à colheita agrícola também são eventos
sazonais.

A forma de ocorrência do dano à saúde pode estar relacionada a múltiplos factores, como
condições meteorológicas e outras condições ambientais, entre outros, e a sazonalidade
destes eventos pode explicar a sazonalidade dos agravos à saúde. Oscilações de curto pra-
zo podem ser bem visualizadas em alguns acidentes, como afogamento, apresentando um
padrão com maior incidência em fins de semana.

A informação sobre sazonalidade pode ser usada tanto para permitir uma atuação de ma-
neira preventiva em tempo útil, como também é útil no levantamento de hipóteses, já que
as oscilações fazem pensar em variação concomitante dos agentes e dos factores de risco
de doenças.

8.4. ELABORAÇÃO DO CANAL ENDÊMICO


Para construção do diagrama é necessário os dados de frequência da doença por vários
anos, não podendo computar os anos em que houve a epidemia.
80 |  Epidemiologia

Diagrama de Controle

É composto graficamente por três linhas:

1. Limite superior do canal endêmico

2. Limite Inferior do canal endêmico

3. Valor Central (índice endêmico)

Figura 5. Diagrama de Controle

Como Construir

Deve ter-se previamente uma série histórica sem anos epidêmicos. Para cada mês deter-
mina-se o valor central, o limite superior e inferior . Para tanto pode-se usar a mediana e a
frequências inframáximas e supramínimas ou pode-se usar a média e desvio padrão.

Mediana, Infra Max e Supra Min

1. Pega-se a série histórica do mês que se vai calcular: JANEIRO

2. Ordena-se de modo decrescente: 11, 10, 9, 8, 7, “6”, 6, 5, 5, 4, 2


Epidemiologia | 81

3. O índice endêmico será a mediana (está entre aspas) : 6

4. O limite superior será o valor inframáximo da série (o valor imediatamente abaixo do


máximo) : 10

5. O limite inferior será o valor supramínimo da série (o valor imediatamente acima do


mínimo) : 4

6. O uso deste valores inframax e supramin é para descartar possíveis valores extremos
discrepantes (p.ex. no caso de inclusão de um ano epidêmico na série histórica)

Média e Desvio Padrão

Neste tipo de construção a Média das incidências da série histórica é utilizada como índice
epidêmico (parâm. central)

Média = 11+10+9+8+7+6+6+5+5+4+2 = 73/11 = 6,6

Para determinar o Limite Superior e Inferior soma-se e subtrai-se da média dois desvios-
padrão calculados previamente na série histórica

Lim. Sup = Média + 2 DP = 6,6 + 2 x 2,6 = 11,8

Lim. Inf. = Média – 2 DP = 6,6 – 2 x 2,6 = 1,4

8.5. INTERPRETAÇÃO DO CANAL ENDÊMICO


A interpretação do diagrama de controle é voltada principalmente para a linha superior do
gráfico, que ao ser ultrapassada, requer que providências imediatas sejam tomadas, para
eliminar a epidemia que está surgindo.

Quando os casos situam-se dentro da faixa esperada (canal endêmico), considera-se que
são apenas o resultado de variações aleatórias da incidência do evento e sem maior signi-
ficado epidemiológico. Quando o objetivo é controlar doenças evitáveis, a meta é alcançar
níveis abaixo do esperado.

O diagrama de controle demonstrando os limites endêmicos da incidência de infecção hos-


pitalar por mil pacientes dia é mostrado na figura 6.
82 |  Epidemiologia

Figura 6. Nível endêmico de infecção hospitalar/ paciente dia no período de janeiro de


1998 a dezembro de 200.

Questão. Em junho de 2006, suspeitou-se de um surto de meningite. Como você confirma-


ria a ocorrência de um surto de meningite? Construa um diagrama de controle com esses
dados.

Número de casos confirmados de meningite, segundo o distrito de notificação, 2006 (Fon-


te: MISAU)

Limite Limite
Desvio-
Média

Inferior Superior
2001

2002

2003

2004

2005

2006

MÊS/ ANO padrão


(Média (Média
(DP)
-1,96DP) +1,96DP)
Janeiro 28 29 36 35 44 39 34,4 6,43 21,80 49,16
Fevereiro 18 31 43 25 32 28 29,8 9,26 11,66 32,10
Março 30 25 29 39 32 34 31 5,15 20,91 46,13
Abril 33 26 28 51 37 29 35 9,92 15,55 40,40
Maio 26 25 37 56 49 31 13,76
Epidemiologia | 83

Junho 29 24 28 45 29 36 31 8,09 15,14 37,76


Julho 25 26 38 40 34 55 32,6 6,84 19,19 44,46
Agosto 42 38 33 30 37 29 36 4,64 26,91 57,38
Setembro 37 38 31 39 18 34 32,6 8,73 15,48 39,07
Outubro 29 36 34 36 34 21 33,8 2,86 28,19 58,11
Novembro 35 34 36 41 35 30 2,77
Dezembro 31 39 62 53 31 25 43,2 13,83 16,10 45,38

1) Construa um canal endêmico com esses dados.

2) Como você confirmaria a ocorrência de um surto de meningite?


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9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

99 Bonita R., Beaglehole R., Kjellström T. Epidemiologia básica. 2.ed. São Paulo, 2010.

99 Marcelo B. Elaboración de corredores o canales endémicos mediante planillas de


cálculo. http://www.scielosp.org/pdf/rpsp/v5n1/5n1a1.pdf

99 Menezes, A.M.B. Noções básicas de epidemiologia. In: SILVA, L.C.C. Epidemiologia


das doenças respiratórias. Rio de Janeiro: Revinter, 2001.

99 Ministério da Saúde. Direcção nacional de Saúde. Manual de Vigilância Epidemioló-


gica para o nível Distrital. 3ª. Ed. Maputo: Ministério da Saúde, 2003.

99 Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância epide-


miológica. 6. ed. Brasília : Ministério da Saúde, 2005.

99 Módulo de Princípios de Epidemiologia para o Controle de Enfermidades (MOPECE)

99 Organização Mundial da Saúde – Representação Brasil. Brasília – DF

99 Pereira, M. G. Epidemiologia - teoria e prática. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guana-


bara Koogan , 1995.

99 Sano, P.T. e Mori, L. Biologia: Ecologia. Módulo 4. São Paulo: Secretaria da Educação
do Estado de São Paulo, 2010

99 http://www.paho.org/spanish/ad/dpc/nc/guidelines-5-sp.PDF
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Anexos
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