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Bioenergética e Metabolismo - Prof. Me.

Bernardo Bernardi

Saltar, correr, estudar, digerir alimentos, todos estes processos envolvem gasto de energético.
Neste sentido, como o organismo consegue extrair a energia dos alimentos? Ainda, como é possível
ficar várias horas e até mesmo dias sem ingerir alimentos? Por fim, como podemos correr durante duas,
três quatro horas sem parar?
Para tanto, o conhecimento sobre o metabolismo e a bioenergética que serão expostos neste texto
permitem responder a estas perguntas.
Não obstante, é preciso enfatizar que particularidades acerca de outras espécies fogem do escopo
deste texto, ou seja, o foco será no ser humano.

1. Metabolismo
O metabolismo é compreendido por todas as reações químicas e transformações do organismo
catalisadas por enzimas. As reações de síntese de moléculas compreendem o anabolismo e as reações
de degradação compreendem o catabolismo. Entre as moléculas sintetizadas estão o glicogênio, os
ácidos nucleicos (DNA e RNA), o triacilglicerol, bem como a síntese de proteínas (NELSON; COX,
2014). É possível observar na figura 1 como precursores mais simples dão origem a moléculas mais
complexas e como os macronutrientes são degradados e oxidados a moléculas mais simples.
Figura 1 – Reações anabólicas e catabólicas

Macromoléculas Celulares Nutrientes Energéticos


Proteínas (ex: Enzimas) Carboidratos
Polissacarídeos (Ex: Glicogênio) Gorduras
Lipídeos (Ex: Triacilgliceróis) Proteínas
Ácidos Nucleicos
ADP + HPO2
NAD+
NADP+
FAD

ATP
NADH
NADPH
Moléculas Precursoras FADH2
Produtos Finais sem
Aminoácidos Energia
Monossacarídeos Energia Química
CO2
Ácidos Graxos H2O
Bases Nitrogenadas NH3

Fonte: NELSON; COX, 2014. Adaptado.


Adicionalmente, as reações anabólicas são antagônicas as catabólicas. Quando as vias de
biossíntese estão ativas, as de degradação estão inativas. A compreensão deste conceito elementar é
fundamental no âmbito esportivo, pois é comum observar profissionais corroborando com a ideia de
que é possível aumentar a massa muscular e perder gordura simultaneamente. Enquanto o primeiro é
um processo anabólico, ou seja, requer síntese proteica, a perda de gordura é um processo catabólico,
exige lipólise. Ademais, é importante a compreensão de outros fatores que podem estimular ambas as
vias como o balanço energético e o estado alimentado.
O balanço energético é a diferença entre quantidade de energia ingerida versus a quantidade de
energia necessária para atender as funções vitais do organismo, bem como as atividades diárias de um
indivíduo. Costuma-se denominar balanço energético positivo quando a ingestão de energia está maior
do que o gasto e balanço energético negativo, quando as necessidades energéticas estão superiores a
ingestão. Ainda, o balanço energético precisa ser encarado com uma visão de longo prazo, pois é
possível ficar um dia em balanço positivo de 200 kcal e um dia em balanço negativo de 200 kcal, sendo
a resultante o equilíbrio. Neste exemplo, o indivíduo não ganha e nem perde gordura. Portanto, é
necessário se observar o balanço ao longo do tempo. Dito isto, sempre que o balanço for positivo, haverá
estímulo para as vias anabólicas, e sempre que o balanço for negativo, haverá estímulo para as vias
catabólicas.
Com relação ao estado alimentado, o período pós-prandial normalmente é acompanhado de
reações anabólicas, bem como o jejum é acompanhado de reações catabólicas. Contudo, o ganho ou
perda de peso (gordura) dependerá do balanço energético. O mesmo raciocínio vale para situações de
exercício, pois é muito comum a prática de determinadas metodologias de treino com foco no
emagrecimento, sendo que estas normalmente focam apenas no momento da realização do exercício,
mas carecem de uma visão global. Com efeito, por maior que seja o catabolismo durante o exercício, o
que prevalecerá é o balanço energético final.
Adicionalmente, um ponto importante do metabolismo no tocante a estocagem de energia, é a
capacidade do corpo humano em armazenar energia de forma que seja capaz de permanecer longos
períodos sem se alimentar. A principal reserva energética do ser humano é tecido adiposo, em
específico, a molécula de triacilglicerol. Já os carboidratos são armazenados na forma de glicogênio no
fígado e músculo esquelético. Com relação as proteínas, este macronutriente não possui uma molécula
específica com função de reserva, ou seja, significa dizer que toda proteína presente no organismo
desempenha alguma função e, caso haja necessidade de aminoácidos, estas precisarão ser degradadas.
Nas próximas seções serão abordas as principais vias metabólicas de síntese e degradação de
moléculas, sendo a primeira a glicogênese.
2. Glicogênese

A molécula de glicogênio é um polímero de glicose e, como já mencionado, está presente,


principalmente, no fígado e no músculo esquelético (HEARRIS et al., 2018). Ainda, sua síntese regulada
pelo hormônio insulina, ou seja, é uma via do estado pós absortivo. O tecido hepático armazena
aproximadamente 100 g de glicogênio, enquanto o músculo esquelético pode armazenar de 300 até 1000
g de glicogênio (BURKE; VAN LOON; HAWLEY, 2016). Esta variação está relacionada ao percentual
de fibras do tipo II, bem como ao estado de treinamento, visto que um dos ajustes ao treinamento
anaeróbio é o aumento dos estoques de glicogênio muscular. Ademais, outro aspecto a ser destacado é
que cada grama de glicogênio armazenado retém de três a cinco gramas de água. Este fator tem
relevância em modalidades esportivas cujas competições possuem classe de peso, pois é possível
diminuir o peso reduzindo o consumo de carboidratos e, consequentemente, os estoques de glicogênio.
Ainda, quanto maior a massa muscular de um indivíduo, maior é sua capacidade de modular o peso
mediante alterações hídricas.
A duração dos estoques de glicogênio depende da duração e intensidade do exercício. Em
exercícios de alta intensidade, estes estoques são depletados em pouco mais do que uma hora, enquanto
em exercícios moderados, estes podem durar cerca de duas horas (BURKE; VAN LOON; HAWLEY,
2016). Sendo assim, fica claro como o consumo de carboidratos durante exercícios de longa duração se
torna imperativo quando o objetivo for o desempenho.
Na seção seguinte será abordado como ocorre a degradação do glicogênio.

3. Glicogenólise

A degradação do glicogênio tem importantes, mas diferentes funções, dependendo do tecido. No


tecido hepático, a glicogenólise tem o objetivo de fornecer glicose para o sangue, enquanto a
glicogenólise que ocorre na fibra muscular tem como função o fornecimento de glicose-6-fosfato para
a glicólise. Vale ressaltar, que a fibra muscular não possui a enzima glicose-6-fostase e, por isso, é
incapaz de regular a glicemia, o que significa que a glicose captada pelo músculo não deixa o músculo
(MARIEB; HOEHN, 2009).
Neste sentido, a glicogenólise hepática predomina no jejum prologado, bem como durante o
exercício prolongado, sendo ativada pelo hormônio glucagon. Em contrapartida, a glicogenólise
muscular está ativada apenas durante a contração muscular, sendo estimulada pela adrenalina (FRANK
I. KATCH, 2016).
As concentrações de glicogênio hepático têm relevante papel no organismo, pois à medida que
estas vão reduzindo, o fígado aumenta a síntese de glicose pelas vias da gliconeogênese. No estado de
jejum, isto se dá pela utilização de aminoácidos oriundos da degradação muscular. Neste sentido, é
plausível inferir que a manutenção das concentrações hepáticas de glicogênio, mediada pela ingestão
de carboidratos, tem papel anticatabólico, pois evita a proteólise muscular (MAHAN; ESCOTT-
STUMP; RAYMOND, 2012).
Na próxima seção será abordada a síntese de glicose a partir de esqueletos de carbono não
glicídicos.

4. Gliconeogênese

O sistema nervoso central dos seres humanos utiliza principalmente glicose como fonte de
energia (NELSON; COX, 2014). Com efeito, este não é capaz de utilizar ácidos graxos, por exemplo.
Neste sentido, a glicemia é rigorosamente controlada por hormônios secretados pelo pâncreas como
insulina e glucagon, mas o fígado tem um importante papel, pois este tanto é capaz de secretar glicose
para a corrente sanguínea pela degradação do glicogênio, como este também é capaz de sintetizar
glicose. A via que sintetiza glicose é a gliconeogênese.
A gliconeogênese utiliza esqueletos de carbono de moléculas que não são glicídios para
sintetizar glicose. A moléculas que podem dar origem a novas moléculas de glicose são aminoácidos
desaminados, o lactato e o glicerol. Algo que não pode ser confundido é que ácidos graxos, em hipótese
algum, podem dar origem a novas moléculas de glicose, contudo o contrário pode ocorrer, ou seja,
moléculas de glicose podem originar novas moléculas de ácidos graxos. O glicerol, apesar de constituir
o triacilglicerol, não é um lipídio.
A síntese de novas moléculas de glicose ganha importância durante o jejum prolongado, sendo
que neste caso os principais precursores serão aminoácidos e glicerol. Em repouso, as concentrações
séricas de lactato estão reduzidas. Neste sentido, é importante lembrar que o lactato é um produto da
glicólise em condições de hipóxia ou quando a via está predominando durante exercícios moderados e
intensos. Durante os exercícios, o lactato ganha relevância como precursor de moléculas de glicose.
Adicionalmente, a glicose sintetizada pelo fígado pode retornar para o músculo e dar origem a uma nova
molécula de lactato, criando-se assim um ciclo denominado, ciclo de Cori, em homenagem ao casal de
cientistas Carl e Gerty Cori, que o descreveram pela primeira vez (NELSON; COX, 2014). Mais adiante
a síntese e metabolização do lactato serão abordados mais detalhadamente.
Na próxima seção iremos abordar como os lipídios são sintetizados.
5. Lipogênese

Os lipídios são armazenados na forma de triacilglicerol. Esta molécula é composta por três
ácidos graxos e uma molécula de glicerol. Assim como na glicogênese, a insulina tem papel fundamental
na ativação da lipogênese, sendo esta característica do estado pós absortivo (MARIEB; HOEHN, 2009).
Outro fator que estimula a síntese de triacilgliceróis, bem como a síntese de ácidos graxos, é o
equilíbrio energético (FRANK I. KATCH, 2016). Sempre que a ingestão de calorias totais for maior
que as calorias necessárias para manter o organismo, o chamado balanço energético positivo, haverá
estímulo para síntese de triglicerídeos e de ácidos graxos. Os ácidos graxos podem ser oriundos da dieta,
mas também podem ser sintetizados a partir de aminoácidos ou glicose.
Os ácidos graxos são sintetizados a partir da molécula de acetil-coenzima A (acetil-CoA), esta
molécula é produzida a partir a partir da glicose ou de aminoácidos desaminados. Quando há abundância
de energia, o destino das moléculas de acetil-CoA são a síntese de lipídeos e não o ciclo do ácido cítrico.
Ademais, é importante reforçar este conceito, pois ainda é forte a crença de que proteínas não
“engordam”. Na verdade, sempre que o balanço energético estiver satisfeito o excesso de aminoácidos
será oxidado, e os esqueletos de carbono desaminados poderão forma acetil-CoA e, consequentemente,
ácidos graxos. No tocante a glicose, se destino primário é a formação do glicogênio, mas caso sobre
glicose, estas poderão servir como substrato para a síntese de ácidos graxos. Por fim, sempre que o
balanço energético estiver em equilíbrio, todos os lipídios ingeridos serão destinados para a formação
de triacilgliceróis.

6. Lipólise

A lipólise é a quebra da molécula de triacilglicerol mediada pela enzima lipase hormônio


sensível. Com efeito, esta reação predomina durante o jejum e o exercício prolongado, sendo os ácidos
graxos liberados pelo tecido adiposo têm como principais destinos o miocárdio e musculatura em
esforço (TURNER et al., 2014). Por fim, alguns dos hormônios envolvidos são a adrenalina, cortisol e
o hormônio do crescimento (GH). Este último, além de possuir um importante papel lipolítico, possui
também a capacidade de estimular a síntese proteica.
É importante ressaltar que a lipólise não pode ser confundida com a oxidação de gorduras. A
oxidação dos ácidos graxos ocorre na mitocôndria, como será mais bem detalhado adiante. A oxidação
dos ácidos graxos depende da lipólise e de que estes sejam transportados do tecido adiposo até o órgão
alvo, normalmente, músculo esquelético e miocárdio. Contudo, a lipólise ocorre no tecido adiposo e
não necessariamente levará há um aumento na oxidação de ácidos graxos.
7. Metabolismo proteico

As proteínas possuem diversas funções no organismo como enzimática, imunológica, transporte,


hormonal, estrutural, entre outras. É possível notar, que a função energética, apesar de possível, não é
uma atribuição primária de um aminoácido. Estes podem contribuir para síntese de ATP e glicose, mas
isto só ocorrerá em situações específicas como o jejum ou durante o exercício prolongado (MARIEB;
HOEHN, 2009). Como já mencionado, baixas concentrações de glicogênio estimulam a proteólise e,
consequentemente, a utilização de aminoácidos pela via da gliconeogênese. Ademais, é importante
deixar claro que a degradação de proteína está aumentada em situações de jejum prolongado, bem como
durante o exercício prolongado. Entretanto, a síntese de proteínas predomina durante o repouso e no
estado pós absortivo, sendo fundamental a presença de aminoácidos essenciais.
Outro ponto importante no tocante ao metabolismo proteico, é de que algumas proteínas estão
em constante síntese e degradação, processo conhecido como turnover proteico (THOMAS M.
DEVLIN, 2008). Isto ocorre devido a meia vida curta de algumas proteínas; para corrigir uma proteína
defeituosa; ou mesmo para o fornecimento de aminoácidos para síntese de proteínas mais importantes.
Diferente dos carboidratos e das gorduras, as proteínas não possuem uma molécula cuja função seja
armazenar aminoácidos. Todas as proteínas têm uma função específica. Neste sentido, caso haja a
necessidade de se obter aminoácidos para sintetizar uma proteína, estes aminoácidos necessariamente
deverão ser oriundos de dois caminhos: dieta ou degradação de proteínas.
Até o momento, tratamos das principais vias anabólicas e catabólicas. Na sequência, iremos
estudar o fluxo de transferência de energia.

8. Bioenergética

Bioenergética refere-se ao fluxo e à troca de energia em um sistema vivo, contudo,


diferentemente das propriedades físicas da matéria, não é possível definir energia em termos concretos
de tamanho, formato ou massa (NELSON; COX, 2014). Pelo contrário, o termo energia reflete um
estado dinâmico relacionado com uma mudança. Portanto, a energia emerge somente quando ocorre
uma mudança. Nesse contexto, energia relaciona-se com a realização de um trabalho, ou seja, quando
o trabalho aumenta, o mesmo ocorre com a transferência de energia e, consequentemente, com a
mudança.
É importante frisar que as transformações biológicas de energia obedecem às leis da
termodinâmica. A primeira lei é o princípio da conservação da energia: para qualquer mudança física
ou química, a quantidade total de energia no universo permanece constante; a energia pode mudar de
forma ou pode ser transportada de uma região para outra, mas não pode ser criada ou destruída. A
segunda lei da termodinâmica, que pode ser enunciada de diferentes formas, diz que o universo sempre
tende para o aumento da desordem: em todos os processos naturais, a entropia do universo aumenta.
Neste sentido, todos os sistemas orgânicos tendem a se desorganizar, mas para que isto não aconteça,
gasta-se energia para manter tudo em perfeito estado. Um ótimo exemplo é o quarto onde dormimos,
pois para que este sempre permaneça arrumado, é necessário gastar energia. Caso contrário, a tendência
é para a desorganização.
A energia total de um sistema consiste em energia potencial e em energia cinética. Um dos
melhores exemplos para ilustrar a transferência de e energia é pelo mecanismo de movimento de uma
roda d’água. Aproveita-se a energia potencial de uma queda de água para movimentar a roda. Quanto
maior a altura da queda, maior será a energia potencial do sistema, e maior será a energia cinética do
movimento da roda. No caso de uma pedra que cai do topo, toda a energia potencial é transformada em
energia cinética e será dissipada na forma de calor inútil. Com efeito, o organismo utiliza a energia
potencial contida nos alimentos é transformada em energia cinética, ou seja, gerando movimento. Em
alguns casos, a energia contida em uma substância será transferida diretamente para outras substâncias
a fim de aumentar a energia potencial desta substância. As transferências de energia desse tipo
proporcionam a energia necessária para o trabalho químico do organismo representado pela biossíntese.
Adicionalmente, as reações de transferência de energia podem ser do tipo exergônicas ou
endergônicas. O termo exergônico refere-se a qualquer processo físico ou químico que libera energia
para suas adjacências.
Essas reações representam processos “descendentes”, por causa de um
declínio na energia livre, ou seja, a energia “útil” para o trabalho biológico que
engloba todos os processos que exigem energia e que são responsáveis pela
preservação da célula. As reações químicas endergônicas armazenam ou
absorvem energia essas reações representam processos “ascendentes” e
prosseguem com aumento na energia livre para o trabalho biológico. Às vezes
os processos exergônicos se unem ou acoplam a reações endergônicas a fim de
transferir alguma energia para o processo endergônico. No corpo, as reações
acopladas conservam, de forma utilizável, grande parte da energia química
armazenada nos macronutrientes (FRANK I. KATCH, 2016).

Não obstante, compreendendo que energia não pode ser criada, mas sim transformada, pode-se
realizar a seguinte pergunta: de onde vem a energia que sustenta a vida na terra?

8.1. Origem da energia

A resposta para a pergunta do parágrafo anterior é o Sol. As plantas realizam fotossíntese


utilizando energia irradiada do Sol para sintetizar glicose a partir do dióxido de carbono e água com
liberação de oxigênio (NELSON; COX, 2014). Ademais, as plantas também são capazes de sintetizar
lipídios e proteína. Por conseguinte, os animais comem as plantas, seus frutos, e os seres humanos
podem comer tantos os vegetais como se alimentar da carne dos animais. Ainda, ambos utilizam o
oxigênio produzido pelos vegetais.
Contudo, qual a finalidade da energia no organismo?

8.2. Trabalho biológico nos seres humanos

Como supramencionado, a energia é a capacidade de realizar trabalho, e os seres humanos


realizam três tipos de trabalho: trabalho mecânico, trabalho químico e trabalho de transporte (FRANK
I. KATCH, 2016). Um dos exemplos mais práticos de trabalho mecânico é a contração muscular, pois
os filamentos proteicos de actina e miosina utilizam a energia química para deslizar um sobre os outros.
Em relação ao trabalho químico, os principais exemplos são a utilização de energia para sintetizar
moléculas mais complexas, por exemplo a síntese proteica. Por fim, o trabalho de transporte pode ser
exemplificado quando proteínas transmembrana gastam energia para manter gradientes de concentração
e, consequentemente, gerar um gradiente eletroquímico.
É possível perceber como a energia é passada adiante, mas sem nunca ser criada, mas também
como ela é importante para o organismo. Na próxima seção será abordado a quantidade de energia
presente nos alimentos.

8.3. Energia nos Alimentos

Para a energia dos alimentos, uma caloria ou, mais precisamente, uma quilocaloria (abreviada
kcal), expressa o calor necessário para elevar em 1°C a temperatura de 1 kg ou 1 ℓ de água. Por exemplo,
se um determinado alimento contém 400 kcal, a liberação da energia potencial contida na estrutura
química desse alimento eleva em 1°C a temperatura de 400 ℓ de água. Alimentos diferentes contêm
energia potencial diferente. Meia xícara de pasta de amendoim com um valor calórico de 759 kcal
contém energia térmica equivalente capaz de elevar em 1°C a temperatura de 759 ℓ de água.
Foge do escopo desta obra aprofundar em detalhes as metodologias de como são aferidas a
energia dos alimentos, mas, em resumo, cada 1 g de carboidrato fornece efetivamente 4 kcal, bem como
cada 1 g de lipídeos fornece 9 kcal e cada um 1 g de proteína fornece 4 kcal. É importante ressaltar, que
há certa variação na digestibilidade de certos alimentos (MAHAN; ESCOTT-STUMP; RAYMOND,
2012). Entre os fatores que podem influenciar a digestibilidade estão se o alimento é ingerido cru ou
cozido, e se possui fibras, pois estas não são digeridas.
Não obstante, é notório como os lipídios são os alimentos mais energéticos se comparados a
proteínas e carboidratos. Com efeito, sempre que houver necessidade de restrição energética, como no
caso de dietas com fins de perda de peso, estes deverão ser restringidos.
Além dos conceitos de energia já expostos, outro ponto fundamental para a compreensão da
bioenergética são as reações de oxidação e redução que serão abordados na próxima seção.

9. Oxidação e Redução

Em termos gerais, oxidação e redução podem ser consideradas como reações que doam ou
recebem elétrons. Nas reações de oxidação ocorre uma perda de elétrons. Ademais, as reações de
redução envolvem qualquer processo no qual os átomos em um elemento ganham elétrons. As reações
de oxidação e de redução estão sempre caracteristicamente acopladas, de modo que qualquer energia
liberada por uma reação é incorporada aos produtos de outra reação. Essencialmente, as reações
liberadoras de energia estão acopladas às reações dependentes de energia. O termo agente redutor
descreve uma substância que doa ou perde elétrons quando se oxida. A substância que é reduzida ou
ganha elétrons é chamada de aceptora de elétrons, ou agente oxidante. O termo reação redox descreve
uma reação acoplada de oxidação e redução.
Um exemplo excelente de uma reação de oxidação envolve a transferência de elétrons dentro
das mitocôndrias. Ali, moléculas carreadoras especiais transferem átomos de hidrogênio oxidados e
seus elétrons removidos para que sejam fornecidos ao oxigênio, que se torna reduzido. Os carboidratos,
lipídios e proteínas fornecem a fonte de hidrogênio. Enzimas desidrogenases (oxidases) aceleram
enormemente as reações redox. Duas coenzimas desidrogenases aceptoras de hidrogênio contendo
vitamina B são a nicotinamida adenina dinucleotídeo (NAD+), derivada da vitamina B niacina, e a
flavina adenina dinucleotídeo (FAD), derivada de outra vitamina B, a riboflavina. A transferência de
elétrons de NADH e FADH2 gera energia na forma de ATP (BROOKS, 2012), conforme será abordado
mais adiante.
Na próxima seção será abordado de maneira mais detalhada os processos de transferência de
energia no corpo humano.

10. Transferência de energia por meio das ligações químicas

É importante ressaltar, que o corpo humano não é capaz de utilizar a energia contida nos
alimentos de maneira direta, pois caso isto ocorresse, seria gerado muito calor e tudo poderia pegar fogo
(FRANK I. KATCH, 2016). Ao contrário, a extração da energia química armazenada nas ligações
químicas dos carboidratos, proteínas e gorduras é liberada em quantidades relativamente pequenas
durante reações complexas e controladas enzimaticamente dentro do ambiente celular aquoso e
relativamente frio. Isso conserva temporariamente uma parte da energia que de outro modo se dissiparia
na forma de calor e fornece maior eficiência para as transformações energéticas. Neste contexto, é
possível dizer que as células recebem a energia conforme necessário.
Se a energia dos alimentos não pode ser utilizada de maneira direta, de onde vem a energia para
o trabalho biológico? A energia utilizada para a contração muscular, transporte transmembrana e nas
reações químicas é a contida na molécula de adenosina trifosfato (ATP), por meio de reações de
transferência de energia denominadas fosforilação.
A molécula de ATP é constituída de adenina, ribose e três moléculas fosfato. As ligações que
unem os dois fosfatos mais externos são chamadas de ligações de alta energia, porque elas representam
uma energia potencial considerável da contida na molécula de ATP. Durante a hidrólise do ATP, este é
convertido em adenosina difosfato (ADP) e fosfato inorgânico (Pi), junto com liberação de energia, mas
também é possível quebrar ambas as ligações de alta energia, e assim formar a adenosina monofosfato
(AMP). O ATP é considerado um composto de fosfato de alta energia, e como alimenta praticamente
todos os tipos de trabalho biológica, é também chamado de moeda energética da célula, conforme pode
ser observado na figura 2.

Figura 2 – ATP, a moeda energética

Condução Nervosa

Digestão Contração
Muscular

Síntese de
Macromoléculas

Fonte: Elaborado pelo autor

Adicionalmente, as células possuem uma concentração de ATP relativamente constante, e isto é


possível devido a existência de diversas vias de síntese de ATP. Apenas durante o exercício intenso é
que as concentrações de ATP no músculo estriado esquelético sofrem redução (BROOKS, 2012). Um
aporte limitado de ATP proporciona um mecanismo biologicamente útil para regular o metabolismo
energético. Graças a manutenção de pouco ATP, a concentração relativa de ATP (e as concentrações
correspondentes de ADP, Pi e AMP) modificasse rapidamente em resposta a redução apenas mínima
no ATP. Qualquer aumento na demanda de energia rompe imediatamente o equilíbrio entre ATP, ADP
e Pi. O desequilíbrio estimula a degradação de outros compostos que contêm energia armazenada para
ressintetizar o ATP. Dessa maneira, o início do movimento muscular ativa rapidamente vários sistemas
que aumentarão a transferência de energia. O aumento da transferência de energia depende da
intensidade do movimento. A transferência de energia aumenta cerca de quatro vezes na transição da
posição sentada em uma cadeira para uma caminhada lenta. Quando se passa de uma caminhada lenta
para um sprint, é acelerada quase imediatamente em cerca de 120 vezes a velocidade de transferência
de energia nos músculos ativos.
Com efeito, a síntese de ATP pode ocorrer tanto pelo metabolismo aeróbio, como pelo
metabolismo anaeróbio, conforme pode ser observado na figura 3. As vias mais rápidas, as que não
precisam da participação do oxigênio, são as vias anaeróbias.
Figura 3 – Vias de síntese de ATP
Célula
Citoplasma Mitocôndria
(Anaeróbia) (Aeróbio)
Fosfocreatina (PCr) Ácidos Graxos
Glicólise (glicose/glicogênio); glicerol; Piruvato proveniente da glicólise
aminoácidos desaminados Alguns Aminoácidos Desaminados

ATP ATP

Trabalho Trabalho
Biológico Biológico

Fonte: FRANK I. KATCH, 2016. Adaptado.


10.1. Fosfocreatina (PCr)

Além do ATP, outra molécula considerada fosfato de alta energia é PCr. Esta é formada pela
junção de um grupo fosfato e uma molécula de creatina, que é uma amina não proteica. A PCr possui
ligações covalentes de alta energia, que quando hidrolisadas liberam energia suficiente para sintetizar
uma molécula de ATP. Esta reação é acoplada a hidrólise do ATP, sendo, portanto, a via de síntese de
ATP mais rápida, sustentando esforços de até 15 s, conforme pode ser observado na figura 4. A
velocidade com que a hidrólise da PCr supre as demandas de ATP durante o exercício são muito
superiores ao sistema glicolítico. Com efeito, uma das formas de aumentar a eficiência deste sistema
energético é por meio da suplementação de creatina monohidratada, pois assim se consegue aumentar
os estoques de creatina.
Figura 4 – ATP e PCr

ATP ADP + Pi +

PCr Creatina + Pi +

Fonte: Elaborado pelo autor

Pode-se considerar que a potência máxima que o ser humano pode realizar só pode ser sustenta
por estes sistemas energético. Exercícios que possuam duração superior a 15 segundos terão uma queda
considerável na capacidade trabalho.
Nas próximas seções será abordado como o organismo consegue sintetizar ATP a partir dos
macronutriente, ou seja, carboidratos, lipídios e proteínas.

10.2. Fosforilação Oxidativa e Cadeia Transportadora de Elétrons

A principal forma como o organismo consegue sintetizar é ATP é mediante reações de oxidação
e redução acopladas. A oxidação dos macronutrientes, ou mais precisamente da glicose, dos ácidos
graxos e de alguns aminoácidos desaminados ocorre mediante a doação de átomos de hidrogênio para
moléculas carreadoras de destes átomos, que serão oxidadas na mitocôndria, local em que ocorre a
síntese de ATP (BROOKS, 2012). O agente redutor final é a molécula de oxigênio. As moléculas
carreadoras de átomos de hidrogênio são NAD+ e FAD.
Não obstante, o processo não é tão simples. Em um primeiro momento, as moléculas de glicose,
ácidos graxos e os aminoácidos precisam ser oxidadas até formarem uma molécula de dois carbonos
chamada acetil-CoA. Na sequência, a molécula de acetil-CoA entra no ciclo do ácido cítrico, sendo
oxidada até gás carbônico CO2 e a energia é conservada nas moléculas de NADH e FADH2 (MARIEB;
HOEHN, 2009). Em um terceiro estágio, mais precisamente na membrana mitocondrial interna, as
moléculas NADH e FADH2 irão doar seus elétrons para os citocromos, uma série de proteínas
carreadoras de elétrons contendo ferro. Os citocromos transferem elétrons até o destino final, quando
eles reduzem o oxigênio e formam água. O NAD+ e FAD, então, são reciclados para o uso subsequente
no metabolismo energético. O transporte de elétrons por moléculas carreadoras específicas constitui a
cadeia respiratória. Esta age como a via final comum, em que os elétrons extraídos do hidrogênio são
transferidos para o oxigênio. Com efeito, no curso da transferência de elétrons, a grande quantidade de
energia liberada é conservada na forma de ATP, por um processo chamado de fosforilação oxidativa.
Para tanto, a energia proporcionada pela oxidação de NADH e FADH2 é responsável pela
ressíntese de ADP para ATP, porém é necessária também uma quantidade adicional de energia para
lançar a NADH do citoplasma na célula através da membrana mitocondrial para levar H+ até o
transporte de elétron. Essa maior troca de energia decorrente do lançamento de NADH através da
membrana mitocondrial reduz a produção efetiva de ATP para o metabolismo da glicose e modifica a
eficiência total da produção de ATP. A oxidação de uma única molécula de NADH produz em média
apenas 2,5 moléculas de ATP. Esse valor decimal para ATP não indica a formação de meia molécula
de um ATP, e sim o número médio de ATP produzido por oxidação de NADH com a energia para o
transporte mitocondrial subtraída. Quando FADH2 doa hidrogênio, será formada a seguir apenas 1,5
molécula de ATP para cada par de hidrogênio oxidado.
Por fim, conforme mencionado anteriormente, a fosforilação oxidativa é responsável por mais
de 90 % da síntese de ATP, contudo alguns fatores podem inibir esta via, como a disponibilidade de
oxigênio ou número insuficiente de mitocôndrias e suas respectivas enzimas (FRANK I. KATCH,
2016). Ambas as situações são características dos esforços intensos, também denominados anaeróbios.
Nestes casos, a síntese de ATP deverá ser suprimida elas vias anaeróbias (PCr e glicólise). Esta última
será abordada após breve explicação do ciclo do ácido cítrico.

10.3. Ciclo de Krebs

O Ciclo do ácido cítrico, também chamado de ciclo do ácido tricarboxílico ou ciclo de Krebs,
em homenagem ao seu descobridor, Hans Krebs, pode ser considerado o centro gerador de energia livre
para o trabalho. Ainda, o nome ácido cítrico faz menção a primeira reação do ciclo, em que o acetil-
CoA é condensado com oxaloacetato para formar citrato, catalisada pela enzima citrato sintase
(NELSON; COX, 2014). Entretanto, esta obra não irá aprofundar nos detalhes deste ciclo complexo de
oito etapas, todas elas contendo enzimas, sendo algumas delas reguladoras.
Contudo, é imprescindível ressaltar que este ciclo pode ser comparado a um motor, cujo
combustível é o acetil-CoA, pois cada rodada completa do ciclo, a partir de um grupo acetil com dois
carbonos gera duas moléculas de CO2, três NADH, um FAD e uma molécula de ATP ou guanosina
trifostado (GTP), que possui ligações de alta energia iguais ao ATP, mas com alteração na base
nitrogenada. Neste sentido, é possível perceber que para cada acetil-CoA que adentra o ciclo, serão
gerados 10 ATPs. É possível observar na figura 5 abaixo as diversas fontes de acetil-CoA que alimentam
o ciclo de Krebs.
Figura 5 – Origens do acetil-CoA

Glicose

Glicólise

Ácidos β-Oxidação Ciclo do Transaminação


graxos Ácido Aminoácidos
Cítrico

Cadeia
Cetólise Transportadora de
Elétrons e ATP
Fosforilação
Corpos
Oxidativa
Cetônicos
Trabalho
Biológico

Fonte: Elaborado pelo autor.

Nas próximas seções serão abordadas de maneira resumida cada uma das vias que geram acetil-
CoA e, consequentemente, alimentam o ciclo de Krebs.
10.4. Glicólise

A glicólise é a oxidação completa de uma molécula e glicose e compõe as vias glicolíticas


(WELLS; SELVADURAI; TEIN, 2009). Está presente em todas as células do organismo, possui 10
etapas, ocorre no citoplasma, e é independente de oxigênio, ou seja, é uma via anaeróbia. Contudo,
apesar de ser uma via que acontece em condições de anaerobiose, a presença do oxigênio influencia o
produto final. Com efeito, alguns autores dividem didaticamente em glicólise aeróbia e glicólise
anaeróbia. Em condições de grande oferta de oxigênio, por exemplo, o repouso ou exercícios leves e
moderados, o produto final desta via será a molécula de piruvato. Entretanto, caso haja baixa oferta e
oxigênio, ou seja, exercícios de alta intensidade, o produto será a molécula de lactato.
A glicólise é dividida, de maneira didática, em duas etapas. A primeira etapa caracterizada pelo
investimento de ATP, e a segunda etapa pela síntese de ATP. Ainda, o saldo final de glicólise é de duas
moléculas de ATP, caso esta se origine de uma molécula de glicose ou três moléculas de ATP, caso esta
tenha origem no glicogênio muscular, além de duas moléculas de NADH. Entretanto, a quantidade de
NAD em uma célula é muito menor que a quantidade de glicose metabolizada em poucos minutos. A
via glicolítica pararia se o NADH formado nesta etapa da glicólise não fosse continuamente reoxidado
e reciclado. Neste sentido, em condições de aerobiose, os NADH reduzidos serão lançados para entro
da mitocôndria, onde serão oxidados na cadeia transportadora de elétrons junto com os NADH
provenientes do acetilCoA originado do piruvato. Não obstante, caso as condições sejam de
anaerobiose, a fosforilação oxidativa está inibida e, consequentemente, as moléculas de NADH não
poderão ser regeneradas na cadeia transportadora de elétrons (RÔMULO CÁSSIO DE MORAES
BERTUZZI, ADRIANO EDUARDO LIMA SILVA, 2009). Desta forma, a única maneira e oxidá-las
e, assim, permitir com que a glicólise possa continuar é por meio da formação do lactato, pois quando
está molécula é formada, uma molécula de NADH é regenerada.
Ademais, o lactato produzido é escoado para fora da célula a fim de que seja metabolizado por
fibras adjacentes, fígado e coração. O miocárdio (músculo cardíaco) é um dos principais destinos do
lactato produzido durante o exercício, pois este tecido e é rico em mitocôndrias, o que favorece o
metabolismo aeróbio. Assim que captado pelo miocárdio o lactato será reconvertido a piruvato e seguirá
o caminho inverso até ser completamente oxidado na fosforilação oxidativa. Outro destino bastante
conhecido da molécula de lactato é o fígado. No hepatócito, a molécula de lactato será convertida em
glicose, podendo novamente retornar ao músculo para produzir ATP. Este ciclo é denominado Ciclo de
Cori. A síntese de glicose a partir do lactato é uma das vias metabólicas que caracterizam a
gliconeogênese, que será mais detalhada adiante.
Adicionalmente, como o lactato produzido pode ser mensurado facilmente na corrente
sanguínea, por meio de sangue capilar, ele é usualmente utilizado por fisiologistas do exercício como
marcador de intensidade de esforço, pois, quanto maior a intensidade do esforço, maior a necessidade
de produção de ATP pela via glicolítica, por conseguinte, maior será a produção de lactato.
Ainda, durante muito tempo o lactato foi considerado como causador das dores musculares
tardias após esforço intenso. Contudo, as dores musculares tardias, estas são causadas por processos
inflamatórios decorrentes de microtraumas na fibra muscular. Este processo inflamatório tem um pico
em 24 a 48 horas após o término do exercício, sendo que o lactato é removido em poucos minutos.
A via glicolítica pode ser regulada pela maior ou menor disponibilidade de substrato, bem como
pela necessidade de síntese de ATP, pela intensidade do esforço, pela presença de hormônios com
insulina, adrenalina e glucagon (BROOKS, 2012)b. Alguns destes hormônios são comuns tanto ao
estado de jejum como ao exercício físico.
Por fim, foge do escopo desta obra detalhar cada etapa da glicólise, bem como as suas enzimas,
sendo que o objetivo aqui é de proporcionar uma visão geral. É possível observar na figura 6 abaixo um
resumo da via glicolítica, ressaltando que apenas a primeira etapa de fosforilação da glicose entrou no
esquema. Ainda, a tabela 1 contém a produção de ATP a partir da oxidação completa da glicose:

Figura 6 – Resumo da glicólise

Glicogênio

9 Etapas ↑ O2
Piruvato + 2 ou 3 acetilCoA
Glicose Glicose-6-
fosfato ATPs + 2 NADH (Mitocôndria)

↓ O2

Lactato + NAD

Fonte: Elaborado pelo autor


Tabela 1 – Produção de ATP pela via glicolítica
Processo Produto direto ATP Final
Glicólise 2 NADH (citosólico) 5
2 ATP 2
Oxidação do Piruvato (dois por glicose) 2 NADH (Matriz Mitocondrial) 5
Oxidação da acetil-CoA no ciclo do 6 NADH (Matriz Mitocondrial) 15
ácido cítrico (duas por glicose 2 FADH2 3
2 ATP ou 2 GTP 2
Produção total por Glicose 32
Fonte: NELSON; COX, 2014. Adaptado

Na próxima seção será aborda a formação do acetil-CoA a partir dos ácidos graxos.
10.5. β-oxidação

A β-oxidação é o processo por meio do qual os ácidos graxos são convertidos em acetil-CoA
(TURNER et al., 2014). Este processo ocorre dentro das mitocôndrias. Contudo, uma etapa limitante da
oxidação dos ácidos graxos é a sua entrada na mitocôndria, cuja molécula de carnitina compõe o
complexo enzimática que irá carrear os ácidos graxos do citoplasma para dentro da mitocôndria. Após
a entrada, os ácidos graxos são oxidados para formar acetil-CoA reduzindo os carreadores de elétrons
NAD e FAD. Com efeito, um dos ácidos graxos mais comuns no corpo humano é o ácido palmítico,
que possui 16 carbonos. Abaixo é possível observar a equação balanceada da oxidação completa deste
ácido graxo:

Palmitoil-CoA + 7CoA + 7FAD + 7NAD + 7H2O → 8 acetil-CoA + 7FADH2 + 7NADH + 7H+

Nota-se que que são formadas oito moléculas de acetil-CoA, sete de FADH2 e sete de NADH.
Ainda, cada molécula de acetil-CoA entrará no ciclo do ácido cítrico para assim gerar ATP, três NADH
e um FADH2. Neste sentido, já possível perceber o quão energético é um ácido graxo, mas a tabela 2
contém o rendimento energético da oxidação completa do ácido palmítico.
Apesar de serem extremamente energéticas, os ácidos graxos são o combustível do repouso, do
jejum prolongado e dos exercícios de baixa intensidade e longa duração. A utilização dos ácidos graxos
nos esforços de alta intensidade é bastante limitada. A partir deste conceito, não é incomum perceber
indivíduos realizando exercícios em baixa intensidade com o intuito de perder peso, contudo a
quantidade de lipídios em gramas oxidada por minuto de exercícios não passa de um grama. Sendo
clinicamente insignificante.
Na próxima seção será abordado com os aminoácidos podem formar acetil-CoA

Tabela 2 – Produção de ATP a partir do ácido palmítico


Processo Produto direto ATP Final
β-oxidação 8 acetil-CoA
(ácido palmítico) 24 NADH (Matriz Mitocondrial) 60
8 FADH2 12
8 ATP ou 8 GTP 8
7 FADH2 10,5
7 NADH (Matriz Mitocondrial) 17,5
Produção total por ácido graxo 108
Fonte: NELSON; COX, 2014. Adaptado
10.6. Desaminação e Transaminação

No tocante a utilização dos aminoácidos como fonte de acetil-CoA

As vias do catabolismo dos aminoácidos, em conjunto, representam


normalmente apenas 10 a 15% da produção de energia no organismo humano.
Essas vias são bem menos ativas que a glicólise e a oxidação dos ácidos graxos.
O fluxo ao longo das vias catabólicas também varia muito, dependendo do
equilíbrio entre as necessidades para processos biossintéticos e a
disponibilidade de determinado aminoácido. As 20 vias catabólicas convergem
para formar apenas seis produtos principais, os quais podem entrar no ciclo do
ácido cítrico. Desse ponto, os esqueletos de carbono tomam vias distintas, sendo
direcionados para a gliconeogênese ou para a cetogênese, ou oxidados
completamente a CO2 e H2O (NELSON; COX, 2014).

Vale ressaltar, que os aminoácidos, principalmente os aminoácidos de cadeia ramificada leucina,


isoleucina, valina, glutamina e aspartato, são primeiramente convertidos para uma forma que entra
prontamente em vias de geração de energia. Essa conversão requer a remoção do nitrogênio (amina) da
molécula de aminoácido. O fígado é o principal sítio de desaminação, mas o músculo esquelético
também contém as enzimas que removem o nitrogênio de um grupo amina de um aminoácido, passando
esse grupo amina para outros compostos durante a transaminação. Nessa via, os “esqueletos de carbono”
provenientes dos aminoácidos doadores participam diretamente do metabolismo energético dentro do
músculo.
Em síntese, cada aminoácido que for convertido em uma molécula de acetil-CoA terá a
contribuição energética desta molécula, ou seja, não são boas fontes energia, sendo possível afirmar que
são fontes alternativas de energia.
Na próxima seção será abordada a cetogênese, ou seja, a síntese de corpos cetônicos, bem com
sua capacidade de fornecer acetil-CoA.

10.7. Corpos Cetônicos

O acetil-CoA formado no fígado durante a oxidação dos ácidos graxos pode entrar no ciclo do
ácido cítrico ou sofrer conversão a “corpos cetônicos”, acetona, acetoacetato e D-β-hidroxibutirato, para
exportação a outros tecidos.
A acetona, produzida em menor quantidade do que os outros corpos cetônicos, é exalada. O
acetoacetato e o D- β -hidroxibutirato são transportados pelo sangue para outros tecidos que não o fígado
(tecidos extra-hepáticos), onde são convertidos a acetil-CoA e oxidados no ciclo do ácido
cítrico, fornecendo muito da energia necessária para tecidos como o músculo esquelético e cardíaco e o
córtex renal. O cérebro, que usa preferencialmente glicose como combustível, pode se adaptar ao uso
de acetoacetato ou D-b-hidroxibutirato em condições de jejum prolongado, quando a glicose não está
disponível. A produção e exportação dos corpos cetônicos do fígado para tecidos extra--hepáticos
permite a oxidação contínua de ácidos graxos no fígado quando acetil-CoA não está sendo oxidada no
ciclo do ácido cítrico.

11. Da teoria à prática

É possível perceber que o metabolismo anaeróbio tem baixa produção energética se comparado
ao aeróbio, contudo sua relevância se dá pela velocidade com que consegue fornecer energia. Ademais,
é importante a compreensão de que estes sistemas energéticos funcionam em mecanismo de
sobreposição, e não de maneira separada conforme pode ser observado na figura 7.
Figura 7 – Sistemas Energéticos

Sistemas Energéticos
TAXA DE PORDUÇÃO DE
ENERGIA

0 2 15 60 120 Infinito
TEMPO (S)

Aeróbio (Glicogênio+Ácidos Graxos) Glicolítico (glicogênio)


ATP PCR

Fonte: Elaborado pelo autor


Há vários fatores que podem favorecer ou não a utilização de uma via energética. Por exemplo,
a intensidade do esforço realizado é um dos fatores. Quanto mais intenso é o esforço, maior é a
necessidade de ATP e maior será a necessidade de reposição. Um fator normalmente associado a
intensidade, mas não obrigatório, é a disponibilidade de oxigênio. Baixas pressões parciais de oxigênio
favorecem o metabolismo anaeróbio. Adicionalmente, esforços relativamente mais leves favorecem o
metabolismo aeróbio, entre eles, o próprio repouso. Outro fator que pode influenciar a utilização de uma
via energética é a disponibilidade do substrato energético, ou seja, a presença de carboidratos favorece
as vias glicolíticas e a presença de ácidos graxos favorece as vias lipolíticas. Vale reforçar que uma via
anula outra.
Além da intensidade do esforço e sua consequente oferta de oxigênio, a duração do esforço se
relacionada com estas vias. Por óbvio, o entendimento destas vias e seu funcionamento permite a
compreensão do porquê exercícios de alta intensidade tem curta duração, bem como exercícios de baixa
intensidade relativa tem longa duração. O termo relativo é importante, pois a intensidade do esforço
físico sempre precisa ser relativizada. Por exemplo, um maratonista de elite percorre os 42 km da
maratona a uma velocidade média de 20 km/h, aproximadamente. Indivíduos minimamente treinados,
mas não atletas, correm a maratona para uma velocidade média entre 12 e 14 km/h. A velocidade
atingida pelo maratonista de elite é extremamente intensa para estes indivíduos, enquanto a velocidade
utilizada por eles é extremamente leve para o atleta de elite. Em ambos os casos, o metabolismo
predominante é o aeróbio.
Vale mencionar, que os carboidratos são o único macronutriente capaz de fornecer energia tanto
para o metabolismo aeróbio como para o anaeróbio. Ainda, proteínas e lipídios fornecem apenas para o
metabolismo aeróbio.

12. Conclusão

Este texto demonstrou as principais vias metabólicas, bem como os contextos em que predominam.
E é justamente este um dos pontos fundamentais, ou seja, o dinamismo do metabolismo e das reações
químicas. É de extrema importância entender que as vias de síntese e degradação, ou mesmo as vias de
relacionadas a transferência de energia se sobrepõem em resposta a alimentação, jejum e intensidade do
esforço.
Por fim, também é importante entender que há muito mais complexidade nestas vias metabólicas do
que foi exposto.
Referências

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562, 2012.
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