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EMOÇÃO É MOVIMENTO PARA FORA: POR ISSO

O INCONSCIENTE É AUSÊNCIA DA
MEDIAÇÃO DAS EMOÇÕES1
Inara Barbosa Leão

Resumo
Neste estudo revisamos as explicações sobre o que seria a função das
emoções e se implicam no inconsciente. Buscamos por alguns dos criadores
e estudiosos da teoria psicológica Sócio-Histórica que tiveram como foco a
participação do processo afetivo emocional na constituição da consciência e
do inconsciente individual, tal como Vigotski e, dentre os brasileiros, Silvia
Lane. Nosso objetivo é recompor a origem das ideias acerca desse processo
psíquico e da sua função mediadora nas relações interpsicológicas, sociais e
intrapsicológicas, estabelecidas entre as demais funções e sistemas da
consciência. Ao retomarmos tal discussão, pretendemos contribuir para o
entendimento do processo afetivo emocional, que, apesar de ser fundante da
ciência psicológica, geralmente é secundarizado nas analises da consciência
e suas as características racionais, por serem estas as que são valorizados na
sociedade capitalista, orientada pelas ciências naturalistas e preditivas.
Porém, o afeto e a emoção são processos dialéticos que promovem as
relações sociais ou interações interpsicológica, as quais afetam os seus
participantes levando-os a interiorizarem-las transformam-as de processos e
conteúdos sociais em processos e conteúdos sociais que permitem e
promovem as atividades intrapsicológicas. Assim, sofrem alterações devidas
às relações entre as emoções e a racionalidade. É que estas se tornaram
mediadas pelas representações simbólicas, que ao possibilitarem o
raciocinio os condicionam conforme as regras culturais do momento
histórico as manifestações emocionais. Mas as situações sócio-emocionais –
aquelas em que as emoções são condições sociais para o acontecimento -
implicam, na construção do sentido individual que promove no plano do
pensamento, a necessidade de objetivar o real, de pensá-lo com as categorias
lógicas elaboradas pelo grupo social. Quando essa transformação não
ocorre, temos conteúdos inconscientes.

Palavras Chave: Emoção. Consciência. Inconsciente. Teoria Psicológica


Sócio-Histórica.

1
Capitulo do Livro: PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA E O CONTEXTO BRASILEIRO:
INTERDISCIPLINARIDADE E TRANSFORMAÇÃO SOCIAL.
Neste estudo pretendemos analisar as explicações sobre o afeto
feitas por alguns estudiosos da teoria psicológica Sócio-Histórica, que
tiveram como foco a participação do proceso afetivo emocional na
constituição da consciência individual. Para tanto, selecionamos alguns
estudos clásicos (Vigotski, 1925/1972; Vygotski, 1925/1991a; Vygotski,
1930/1991b; Vygotski, 1932/1993; Vigotsky, 1933/2004; Vigotski,
1934/2004; Heller, 1979; Veer, 1987; Leontiev, 1978/1978; Lane & Sawaia,
1995), que nos permitiram retomar a gênese das ideias acerca do que seja a
afetividade, entendida e explicada psiologicamente mas, a partir dos
fundamentos do materialismo histórico dialético. Que mostra-nos que é um
processo psíquico desencadeado pelo afeto e cuja função é mediar as
relações interpsicológicas, sociais e as intrapsicológicas, estabelecidas entre
as pessoas e suas funções e sistemas psíquicos.
Ao retomarmos a esta temática, pretendemos ampliar o
entendimento do processo afetivo que, apesar de ser inerente a psicologia,
foi secundarizado nas discussões sobre a consciencia, desde que esta, como
as demais ciencias, passou a ser determinada pelo capitalismo. Sob este a
característica humana mais valorizadas pela sociedade é a racionalidade;
que lhe é propia e necessária para reproduzir a sua orientação derivada das
ciências naturalistas e preditivas. Tanto é que o afeto e suas transformações
em sentimento e emoção, só vão merecer investigações mais aprofundadas e
serem mostrados como centrais ao psiquismo nas teorías psicológicas de
base epistemica materialista histórica e dialética, pois esta ultima impõe as
suas considerações, tal como constatamos na Teoria de Wallon, elaborada
na França, e na teoría Sócio-Histórica, desenvolvida na União Soviética.
Porém, examinaremos a relação entre esses dois elementos:
consciencia e afeto, como decorrente das suas capacidades de organizarem a
consciência, uma vez que a sensibilidade ao afeto é o critério principal da
definição do que seja a propriedade consciente do psiquismo (Vigotski,
1932/1993, 1925/1972). Nos humanos, cujo nível da organização do
psiquismo é o mais desenvolvido, a consciência está constituída por dois
subcomponentes básicos: o intelecto e o afeto. Portanto, a compreensão da
primeira só pode se dar quando ela é abordada de maneira a explicar como
os outros dois se relacionam. Consideramos, então, como Vigotsky
(1932/1993) que a separação do aspecto intelectual de nossa consciência do
seu lado afetivo, volitivo, é uma das falhas fundamentais da psicologia
tradicional, idealista. Devido a este equívoco, o intelecto passou a ser
considerado como um fluxo autônomo de pensamentos que se pensam a si
mesmos; como se fosse independente da vida real, dos motivos de viver, dos
interesses e das atrações do ser humano inteligente, tal como podemos
constatar nas explicações cognitivistas, como as de Piaget.
Contra tal posicionamento, Vigotski (1925/1991a) faz a crítica
às teorias sobre emoção presentes na psicologia do fim do século XIX e
começo século XX, que são as mesmas que ainda são, extemporaneamente,
tomadas como fonte de explicações sobre os homens do século XXI. Nesta,
afirma que a Teoria das Emoções de James (1905), desevolvida nos Estados
Unidos, dá sustentação a aquela interpretação da consciência ao minimizar a
importancia psíquica dos aspectos sentimentais. Isso porque, James alterou a
ordem dos três elementos habituais que constroem a emoção: a causa dos
sentimentos, sua manifestação corporal e o próprio sentimento, e assim
inverteu a sequencia do proceso afetivo-emocional, e tornou o afeto
decorrente do sentimento. Também, deslocou os sentimentos e as emoções
únicamente para as condições bio-fisiológicas, tal como a Reflexologia
russa já vinha insistindo em explicar. A pesar dos equivocos, Vigotsky
destacou que analisada dialeticamente a Teoria de James mostrava algumas
características verdadeiras do processo e indicou que assinalaria
[…] tão só que nela se põe perfeitamente às claras: o
caráter reflexo dos sentimentos, o sentimento como
sistema de reflexos e o caráter secundário da consciência
dos sentimentos, quando sua própria reação serve de
excitante a uma reação nova, interna. Também pode ver-
se aqui o valor biológico do sentimento enquanto reação
avaliadora rápida de todo o organismo ao seu próprio
comportamento, como ato do interesse do organismo na
reação, como organizador interno de todo o
comportamento presente no momento dado.
(VYGOTSKI, 1925/1991a, p. 55).

Daqui podemos esclarecer que, incialmente, a afetividade se


manifesta como suscetibilidade aos estímulos, afetos que nos incitam a
desenvolver experiências afetivas. Dessas decorre a necessidade de exprimir
em linguagens o que elaboramos sobre o experimentado, transformando o
afeto em emoção, bem como desenvolvemos a capacidade de despertar em
outros emoção idêntica.
Por promover essa mediação entre os aspectos afetivos sociais,
interpsicológicos e as funções intrapsicológicas; a afetividade proporciona
as forças integradoras e motivacionais à consciência; mas as relações entre
os afetos do meio e o psiquismo são interfuncionais e se caracterizam por
transformações constantes e influências mútuas. Isto porque as relações
interfuncionais são dialéticas e no decorrer do desenvolvimento ocorrem
mudanças que promovem novas mudanças. Portanto, após o aparecimento
das formações psicológicas superiores, estas passam a influir nesse processo
que as engendrou, acarretando alterações entre as conexões interfuncionais,
em particular entre as relações do intelecto e da afetividade.
As relações entre o intelecto e a afetividade, segundo Vygotski
(1930/1991b), criam sistemas psicológicos, que são resultados complexos
da vida coletiva, cuja formação se deu mais recentemente na história
humana do que a memória, o sentido de orientação, a percepção e a atenção.
Isso porque a complexidade dos sistemas psiquícos deriva de as
experiências na vida coletiva unirem elementos de espécies diversas,
decorrentes dos padrões culturais interdependentes e agrupados em torno de
um elemento nuclear. Também é dessa relação complexa que se
estabelecem as ideias com força emotiva, que promovem as atividades
inconscientes.
Dentre estes sistemas que nos são dados socialmente,
encontramos a forma de pensar os afetos definida pelo sistema de conceitos
e que inclui também os nossos sentimentos. Tanto que não sentimos
simplesmente; o sentimento é percebido de forma específica como o ciúme,
a cólera, o ultraje, a ofensa. Ou seja, o processo de elaboração do afeto
implica em os sentimentos promovidos por esse serem nomeados e, então se
explicitarem conforme os elementos culturais que os caracterizam, devido à
relação que mantêm com os pensamentos. Ou seja,

[…] é algo parecido com o que ocorre com a


memória, quando se converte em parte interna do
processo de pensamento e começa a denominar-se
memória lógica, é exatamente o que se dá no nível da
afetividade, nunca experimentamos ciúmes de maneira
pura, pois a cada vez somos conscientes de suas conexões
conceituais. (VYGOTSKI, 1930/1991b, p. 87).

Este entendimento foi influenciado pela filosofía determinista de


Spinoza, - que concordava e desenvolveu as ideias filosóficas de que todo
acontecimento, inclusive os mentais, devem ser explicados pelas relações de
causalidade. Por isso, afirmou que o homem tem poder sobre os afetos, que
a razão pode alterar a ordem e as conexões das emoções e fazer com que
concordem com a ordem e as conexões dadas na razão.
Vygotski (1930/1991b) considerou que Espinoza manifestava
uma atitude genética correta, pois no processo de desenvolvimento
ontogenético, as emoções humanas vinculam-se à autoconsciência da
identidade como à consciência da realidade. Portanto, a forma como
caracterizamos uma pessoa sofre a influencia da valorização que atribuimos
a essa pessoa, bem como com a compreensão temos dela. E é nessa síntese
que transcorre nossa vida. O desenvolvimento histórico dos afetos, e destes
até as emoções, consiste fundamentalmente na alteração das relações iniciais
em que foram produzidas e criando novas organizações e conexões entre o
elemento afetivo e o sujeito que experimenta o afeto.
Baseando-se ainda em Espinoza, Vygotski (1930/1991b)
reconheceu que a identificação do afeto altera-o, transformando-o de um
estado passivo em outro ativo. Isto porque quando pensamos as coisas que
estão fora de nós não alteramos nada nelas, mas quando pensamos os afetos,
situamo-los em outras relações com nosso intelecto e outras instâncias e
alteramos muito nossa vida psíquica. Ou seja, nossos afetos influenciam em
nossos conceitos criando um sistema complexo, por isso as emoções são
históricas, se alteram conforme os meios ideológicos e psicológicos se
diferenciando entre os sujeitos, de acordo com a sociedade e o momento
histórico, apesar de neles permanecer o radical biológico, em virtude do
qual surge os sentimentos.
Por consequência das emoções complexas só aparecerem
historicamente e serem a combinação de relações que surgem na vida, suas
diferenciações e inter-relações com os processos intelectuais se deram no
transcurso do processo evolutivo. Na ontogênese estas conexões entre a
afetividade e a intelectualidade se mostram mais claramente na fase que se
denomina de idade de transição e que tratamos tradicionalmente por
adolescencia. Portanto, nos estágios iniciais de desenvolvimento da criança
é muito difícil localizar qualquer afeto – Vigotski explicitava tal situação
dizendo que é impossível ofender um bebê.
Isto porque as emoções humanas são produto de determinados
signos e os signos representam símbolos que têm significados determinados.
O que implica para o trabalho de investigação do desenvolvimento da
consciência, que se deve centrar na análise das emoções, pois estas se
constituem com a interiorização dos signos sociais e, portanto, espelham os
significados e sentidos presentes na consicência porque exitem na
sociedade.
Ou seja, acompanhado a analogía usada por Vigotski, estamos
entendendo que o signo2 é uma ferramenta, que não modifica materialmente
o mundo dos objetos, mas que modifica a consciencia da pessoa que o
utiliza como mediador e, atua sobre a interação de uma pessoa com seu
meio. Entre os muitos sistemas de signos existentes na nossa sociedade,
encontramos a linguagem, os sistemas de medição, a cronologia, a
aritmética, os sistemas de leitura e escritura.

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Vale lembrar que em sua origem o signo é qualquer coisa material perceptivel pelos
sentidos, que devido a certas peculiaridades, pode tornar-se um meio de transmissão de
infromações sobre outras coisas ou processos. Neste sentido os signos são substitutos de
outros objetos. Os signos não são resultados da interação imediata entre diferentes objetos
materiais, uma vez que são criados pelo homem. Neles esta presente o elemendo das
convenções e por isso, se estabelece entre tal signo e a coisa designada, uma relação de
representação, uma aparencia na identidade de ser, entendendo este último como
complemento da realidade.
Leontiev (1978/1987) complementa o enunciado de Vigotski
sobre a emoção ser sociocultural e depender da ontogeneses, ao afirmar que
as especificidades, a diversidade e a complexidade dos estados emocionais
resultaram da divisão da sensorialidade primária, onde os aspectos
cognitivos e afetivos se encontravam fundidos. Foi esta divisão que
possiblitou que quando a afetividade e o pensamento surjam em situações
objetivas sejam percebidos através da linguagem.
Isto se deveu, às mudanças nas funções desempenhadas pela
afetividade e as suas consequentes diferenciações ao longo do
desenvolvimento. Os efeitos das alterações das funções da afetividade se
apresentam imediata e independentemente da vontade: transformam-se em
diferentes emoções.
As emoções são, então, estados predominantemente ideais e
situacionais, com os quais estão vinculados sentimentos objetivos, tais como
as vivências emocionais estáveis, cristalizadas no objeto da atividade; que
tornam-se estados de ânimo, fenômenos subjetivos muito importantes por
suas funções nos comportamentos dos sujeitos.
É assim que a afetividade, sob a influencia social e maior
independência da sensorialidade, passa a ser manifestada pelas palavras e
torna-se emoções. Como tal, se diferencia em varias formas de expressão
porque ao ser determinada pelos pensamentos ou pelas situações torna-se
estado. Os estados são condições relativamente duradouras, persistem
enquanto a situação ou o pensamento desencadeador se mantém. Estes
estados manifestam os sentimentos que são as formas como as emoções são
vivenciadas, e que se cristalizam na palavra. Mas, a emoção tem função
específica para cada pessoa e esta função individualizada é que promove a
atividade. Esta função especificamente motivadora da atividade é
denominada na Teoria Sócio-Histórica de sentido pessoal da emoção. (Leão,
1999).
Heller (1979), também argumenta que a afetividade
funcionalmente é a energia para as atividades, e está estruturada conforme o
meio sóciocultural. Afirma que a condição para aprender a atividade
intencional e o pensamento, no caso de seres não guiados pelos instintos
como os homens, são os sentimentos. E, a formação dos tipos de
sentimentos necessários para a homeostase e a seleção, em uma sociedade
ou meio, é uma pré-condição para a ação e para o pensamento. O fato de
que o homem sinta não é algo adquirido, mas cada sentimento particular
está relacionado de algum modo com a aprendizagem ou é claramente
aprendido. Os afetos exigem que se aprenda a identificar não só os
sentimentos como também os objetos que os produzem. Os estímulos em
relação aos quais devemos reagir afetivamente são culturalmente definidos.
Já os sentimentos orientativos e as emoções são totalmente aprendidos em
todos os seus aspectos. Cada um desses sentimentos é conseqüência da
reintegração do conhecimento e da ação no sentimento.
Assim cada homem constitui seu mundo próprio em sua relação
com o mundo, através dos processos de interiorização, objetivação e auto-
expressão e trata de manter e expandir sua identidade no mundo dado, sobre
o qual seleciona o quê perceber, pensar e agir. Portanto, os componentes
sentimentais reais desse mundo próprio são sempre sentimentos orientativos
e emoções.
Ainda que o sentimento seja primário filogeneticamente em
comparação com o pensamento e a ação, o elemento constitutivo que se
torna mais importante do homem nas sociedades complexas é ser consciente
porque a consciencia lhe permite atuar inteligentemente. Para tanto, só pode
cumprir esta função na realidade o sentimento no qual se tenha integrado o
conhecimento e a ação que o leva a estabelecer objetivos.
Conseqüentemente, os sentimentos se diferenciam pela aprendizagem, o que
os torna parte orgânica do processo da aprendizagem social em geral.

A Emoção

O termo emoção deriva da palavra latina emovere, na qual o e- é


uma variação do ex – e significa fora e o movere exprime movimento.
Portanto, emoção é um movimento de dentro para fora. Do psicológico para a
sociedade. Ou seja: o meio afeta, o individuo sente o afeto, o individuo se
movimenta devido ao que sentiu, a sociedade regula os movimentos de
acordó com a sua cultura, ese processo é interiorizado e gera a emoção. Por
isso, as emoções são mediadoras. Medeiam a atividade do homem, que é
constituída por ações, que estabelecem as relações com a realidade objetiva,
com as pessoas circundantes, com a sociedade e consigo mesmo.
Como a atividade é pólimotivada, por responder ao mesmo tempo
a vários motivos do indivíduo, a forma como as relações entre os motivos que
interessam se organizam constituem a estrutura da personalidade.
Concomitantemente organizam a maneira como os estados emocionais vão se
manifestar e mediar a manifestação das emoções no meio social e a avaliação
das atividades derivadas dessa manifestação emocional.

Para o entendimento destas funções relacionais devemos


lembrar que a coincidência entre os interesses e os fins da atividade humana
só ocorrem quando estes últimos se tornam conscientes para o sujeito. Essa
consciencia dos fins que leva a uma atividade, dos interesses motivadores,
depende da realização da atividade, porém, eles estão presentes nos
processos psíquicos porque se manifestam pela sua representação
psicológica, sob a forma do tônus emocional das ações.
Os estados emocionais sinalizam o interesse do sujeito por um
objeto nas diversas relações. Assim, determinam o tônus emocional da
atividade ao especificar as características do objeto: o signo, a intensidade e
a característica qualitativa, que a promoveu. Esta necessidade de
especificação do objeto ocorre porque até então ele é representado de forma
difusa e cumpre a função de transformar as vivências emocionais em uma
representação social concreta. Os estados emocionais constroem, portanto, o
sentido pessoal3 da representação interna do objeto percebido ou pensado e
dirige o interesse da atividade estabelecendo a avaliação da possibilidade de
êxito da atividade que o objeto demanda.
Esta avaliação da atividade é anterior ao pensamento sobre as
relações que promoveu. Dá-se ainda no nível da representação sensorial
direta da situação ou do pensamento e, portanto, está baseada no sentimento,
que permite apenas a vivência do que foi sentido emocionalmente. A
representação interna do objeto, porém, se constitui em signos sociais: por
uma imagem simbólica ou por elementos da linguagem, que permite ao
processo emocional avaliativo, ao desencadear a análise das relações
possíveis para a atividade, introduzi-la no sistema do pensamento.
O pensamento racional analisa a vivência emocional e a
categoriza sob uma determinada denominação, explicitando-a como emoção
caraterizada pelas construções socioculturais. É como emoção que o sentido
pessoal da atividade demonstra os interesses do sujeito pelo objeto e o
relaciona com a possibilidade de êxito da atividade condicionada pelas
relações sociais.
Assim, conforme Leontiev (1978/1987), a emoção é constituída
quando se dá a conscientização de qual é o objeto que é o seu motivo e antes
que se construa a valorização social da atividade que engendra. É assim na
atividade de trabalho, que apesar de estar socialmente motivada, é dirigida
também por motivos tais como a recompensa material. Ambos os motivos,
ainda que coexistam, estão situados em diferentes planos. Por isso as
emoções são elementos constituintes da atividade e não das ações ou
operações realizadoras da atividade. Tanto que processos idênticos,
envolvidos na realização de atividades diferentes, podem ter sentidos
emocionais diversos, porque a avaliação, positiva ou negativa de uma
emoção depende do interesse, aspecto que se mostrará como o motivo
preestabelecido no sujeito com respeito aos efeitos da atividade que

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O sentido é subjetivo e decorre da individualização do significado que o representado tem
para cada consciência. Isto se dá porque a realidade aparece ao homem na sua significação
social, mas mediada pela sua experiência individual da prática social e a ela integrada. É
um fato psicológico que depende de cada um se apropriar e assimilar, ou não, uma dada
significação, do grau da assimilação e do que ela se torna para cada um. Ou seja, o sentido
subjetivo e pessoal é dependente da interação entre o sujeito e o seu meio. (LEÂO, 1999)
desencadeia. Consequentemente, os motivos que impulsionam a atividade
geram as emoções propriamente ditas.

Emoção, consciencia e inconsciente

Porém, em ocasiões intensamente afetivo-emocionais outros


motivos que coexistem com os primeiros impulsionam a atividade apenas
pelo sentido pessoal e, portanto, não geram o significado social-racional.
Nessas condições, prevalece o sentido pessoal. Mas, em função do sentido
pessoal caracterizar-se fundamentalmente pela correlação com as
determinações sociais, Leontiev afirma que
[...] a distribuição das funções de gerar sentido é o único
impulso entre os motivos de uma ou outra atividade que
permite compreender as relações fundamentais que
caracterizam a esfera motivacional da personalidade: as
relações de hierarquia dos motivos. Esta hierarquia não se
forma em absoluto segundo a escala de sua proximidade
com as necessidades vitais, nem com o grau de poder
impulsionador e a afectogênese de uns ou outros motivos.
O que define as relações hierárquicas existentes entre os
motivos são os nexos que se vão constituindo na
atividade do sujeito, por suas mediações e, são, por isso,
relativas. Isto diz respeito também à correlação
fundamental: a que se dá entre os motivos geradores de
sentido e as emoções. Na estrutura de uma atividade,
certo motivo pode cumprir a função de gerador de sentido
e em outra, a função de estimulação complementar.
Porém os motivos geradores de sentido sempre ocupam
um lugar hierárquico mais elevado, inclusive quando não
possuem um efeito genético direto. (LEONTIEV, 1978.
p.58).
Os motivos emocionais, que funcionalmente são apenas
estimuladores e não determinantes da atividade, apesar de serem os
reguladores da dinâmica da personalidade, podem permanecer implícitos
para o próprio sujeito, tanto no plano da consciência como no plano de sua
afetividade imediata. Isto se dá porque apenas os conteúdos sensoriais dos
objetos motivadores são percebidos e representados.
Nesta representação apreende-se qual é o conjunto de
características do objeto que impulsiona a atividade ou a impede. Mas não
se alcança a representação consciente do objeto que motiva a mesma
atividade. Este permanece diluído nas sensações primárias (odor, sabor,
forma, sensação tátil etc.) que são refletidas como vivências do desejo ou
tendência para um fim, mas sem serem elaboradas pelo pensamento
racional.
Os motivos, em sua maioria, são inconscientes mas constituídos,
como qualquer outra representação psíquica, pela vida real, pela atividade
do homem no mundo objetivo. O não consciente e o consciente não são
termos opostos, trata-se apenas de formas e níveis diferentes da
representação psíquica e que dependem do lugar que ocupa o objeto
representado na estrutura da atividade, no movimento do sistema. Enquanto
se pode tomar consciência dos fins e das ações que atendem às
representações, não ocorre o mesmo com a compreensão de seus motivos,
ou seja, daquilo em virtude do que se propõe e se alcança tais fins.
Por isso, Leontiev (1978/1987) afirma que só é possível
esclarecer o autêntico motivo de forma objetiva a partir das ações que
permitem descobrir o sentido pessoal e, por consequência, o seu motivo
social interiorizado e transformado em interesse pessoal:
Para compreender os autênticos motivos de sua atividade
o sujeito é orientado pelos sinais - vivências, as marcas
emocionais dos acontecimentos. E, quando se encontra
perante uma tarefa de sentido pessoal, deve considerar
que esta se converteu em tarefa determinada sob a
correlação dos motivos que o caracterizam como
personalidade. A tarefa de penetrar na personalidade
consiste em esclarecer os nexos hierárquicos dos
motivos. Subjetivamente parecem expressar as
“validades” psicológicas inerentes aos motivos mesmos.
(LEONTIEV, 1978/1987, p. 160 – destaque do original).

Estas explicações do processo mediacional da emoção é um


aspecto em desenvolvimento na Psicologia e o seu entendimento exige que
compreendamos a evolução da abordagem da afetividade até a constituição
das emoções propriamente ditas. Por isso faremos uma resenha de como
esse processo se deu, enfatizando, principalmente, que Vigotski buscava
demonstrar sua função dentre os processos psicológicos superiores gerados
na interação social.
Em 1932, pouco antes de sua morte, Vigotski realizou uma série
de conferências e em duas delas abordou a questão das emoções. Como são
as últimas exposições públicas de Vigotski, podemos analisá-las como
sínteses do desenvolvimento do seu pensamento. Naquela intitulada A
Imaginação e Seu Desenvolvimento na Idade Infantil, estabeleceu o papel
das emoções para o pensamento criativo.
Na conferência seguinte, denominada As Emoções e seu
Desenvolvimento na Idade Infantil apresenta seu enfoque para as emoções a
partir da análise das principais teorias daquela época. Nessa indica também
que as emoções se tornaram um aspecto depreciado na psicologia, porque
seu estudo foi o único a se desenvolver exclusivamente sob a abordagem
naturalista, enquanto os demais aspectos psicológicos só tiveram esta
abordagem posteriormente, a partir do behaviorismo e outras correntes que
se dedicaram ao comportamento humano.
Atribuiu as causas dessa especificidade à influência de Darwin,
que no trabalho A Origem dos Movimentos Expressivos do Homem
estabeleceu uma conexão geral entre as emoções humanas e as
correspondentes reações afetivas e instintivas que se observam nos demais
animais. A aceitação de tal proposição, que contrariava a idéia dominante
segundo a qual os sentimentos são manifestações do interior da alma
humana, foi grande e por motivos variados. Baseou-se na perceptível
semelhança das expressões emocionais humanas com a dos animais
superiores mas, também, motivou a psicologia inglesa, onde dominava o
pensamento escolástico com fortes tradições medievais, a aceitá-la como
demonstração de que as paixões terrenas do homem, suas inclinações
egoístas, suas emoções, relacionadas com as preocupações sobre seu próprio
corpo, são de origem animal. Daí que deveriam ser reprimidas e tornarem-se
inconscientes.
Nestas condições, surgiram diferentes correntes no pensamento
psicológico sobre as emoções. Uma delas deu desenvolvimento às ideias de
Darwin, dedicando-se ao aprofundamento da proposição da origem
biológica das emoções humanas a partir das reações afetivas e instintivas do
animais. Desses estudos, empreendidos principalmente pela psicologia
alemã de orientação biológica, por Spencer na Inglaterra e por Ribot e
outros positivistas franceses, surgiu a Teoria dos Rudimentos. Nesta, todos
os movimentos expressivos foram considerados retrospectivamente, a partir
da manifestação dos animais.
Vygotski (1932/1993) criticou tal posição salientando que estas
idéias não permitiram esclarecer como se desenvolvem as emoções desde a
infância, mas ensinaram como se reprime e se elimina as descargas
emocionais próprias desta idade. E, contrariando seus próprios princípios,
deixou de considerar as variações sofridas pela emoção desde o homem
primitivo até a atualidade como uma continuidade evolutiva. Frisou
(1932/1993) que não só a experiência psicológica imediata, mas, também, as
investigações experimentais do aspecto biológico da vida emocional,
demonstraram a inconsistência dessa idéia da morte paulatina de todo um
aspecto da vida psíquica. Tanto que, James como psicólogo e Lange como
fisiólogo ao se proporem, individualmente, a tarefa de investigar as emoções
humanas, encontraram suas fontes nas reações orgânicas que acompanham
os processos emocionais e liberaram-se do enfoque retrospectivo das
emoções humanas como funcionalmente próprias dos animais não humanos.
Entretanto, Vygotski (1932/1993) considerou que esta teoria
conduziu ao dualismo das emoções superiores e inferiores, e por
consequência disto, também ao dualismo característico da psicologia
intuitiva e descritiva. Pois, ao mostrar que as emoções não estavam
involuindo e relacionarem-nas aos órgãos internos invariáveis, ao jogo das
reações vasomotoras e outras mudanças semelhantes que seriam os
momentos vegetativos, viscerais e humorais, de cuja percepção se
formariam os sentimentos e depois as emoções, permitiram toda uma série
de teorias metafísicas na doutrina das emoções. Isso significava que as
emoções eram consideradas separadamente do conjunto global de toda a
vida psíquica do homem, e proporcionou a justificativa anátomo-fisiológica
da idéia do “estado dentro do estado”. (1932/1993, p.407-8).
Ainda neste sentido, Vigotsky (1933/2004) considerou que estes
autores estabeleceram, por um lado, a importância puramente espiritualista
de uma série de emoções superiores e, por outro, uma série de emoções
inferiores puramente orgânicas, de valor fisiológico. Quando o próprio
James disse que enquanto o cérebro é o órgão do pensamento humano, o das
emoções era constituído pelos órgãos vegetativos internos, deslocou o
verdadeiro substrato das emoções do centro para periferia, e as suas teorias
representaram um retrocesso em comparação com os trabalhos de Darwin e
com a corrente que se desenvolveu imediatamente a partir dele.
Ao apresentar as críticas dos experimentalistas à proposição da
teoria de James e Lange, segundo a qual no aspecto biológico a emoção
constitui o reflexo dos estados fisiológicos na consciência e que estes
estados são específicos para as distintas emoções, Vigotsky (1933/2004)
comentou que os ataques experimentais foram feitos tanto pelos laboratórios
fisiológicos com pelos psicológicos.
Foi dos laboratórios de fisiologia que saíram os trabalhos de
Cannon (1929), e sua escola que, com a ajuda de métodos de investigação
muito complicados, de extirpações, intoxicações artificiais, complexas
análises bioquímicas, demonstraram experimentalmente que em animais os
estado de fúria, ira, terror produzem implícitas e profundas alterações em
todo o sistema visceral, quer dizer, todos os órgãos internos reagem a isto,
em função do que cada emoção está relacionada com sérias mudanças no
estado do organismo. Encontrou, porém, emoções distintas com a mesma
expressão orgânica. Ou seja, em emoções diametralmente opostas do ponto
de vista psicológico, as mudanças corporais resultam iguais. Mas percebeu
que a clareza de tais manifestações depende não tanto da qualidade da
própria emoção, mas da força de sua manifestação. E que a emoção persiste
na ausência das reações vegetativas.
Apesar de na grande maioria dos que realizaram a prova não se
observar emoções, em alguns deles as injeções experimentais as
provocaram. Isso sucedeu quando a pessoa estava preparada em certo
aspecto para a descarga emotiva, tinha motivos para a aflição ou para a
alegria, e a injeção serviu de excitante para produzir essas emoções. No
informe introspectivo dos que foram submetidos às provas, todos
explicaram seus estados como a reprodução da vivência que recordava a
emoção, porém a própria emoção, em sentido verdadeiramente psicológico,
não existia.
As conclusões gerais a que chegou Cannon consistem em duas
teses fundamentais. A primeira, levou à negação da teoria de James e Lange.
A outra dedução é que qualquer reação emocional forte no animal é por si só
unicamente o princípio, mas não o fim da ação e surge em uma situação
crítica, de importância vital para ele. Portanto, a conseqüência das reações
emocionais fortes do animal será o aumento da sua atividade. Assim, a
conclusão lógica do terror é a fuga, a da fúria ou da raiva, a luta ou o ataque.
Consequentemente, todas as reações orgânicas são importantes não para a
emoção como tal, mas sim para o que se segue a ela. Todas as mudanças são
importantes porque, biologicamente, a uma forte reação se segue no animal
uma intensa atividade muscular e essa preparação do organismo deverá
acontecer. Daí perceberam que todos os sintomas vegetativos eram mais
fenômenos concomitantes e interpretações de uma atividade muscular
intensa que emoções. Desse ponto de vista, como já apontara Cannon, a
teoria de Darwin se vê justificada, pois, não há dúvida que os nossos
movimentos expressivos podem ser considerados como rudimentos da
expressão de emoções nos animais. Porém, a própria emoção não morre,
mas sim os componentes instintivos dela. Ou seja, para Vigtotsky
(1933/2004) o papel das emoções na psique humana é outro; estão isolando-
se do reino dos instintos e se deslocando para um plano totalmente novo.
Destes estudos voltados para os aspectos biológicos e as suas
relações com as chamadas emoções superiores e inferiores Vigotsky
concluiu que
[...] quando se aborda a doutrina das emoções no
conjunto de seu desenvolvimento histórico se vê que [...]
As investigações psicológicas da vida emocional
conduziram ao mesmo que as investigações
experimentais no campo da psicofisiologia. A conclusão
básica mais importante sobre os trabalhos da corrente a
que me refiro é o peculiar deslocamento do centro da
vida emocional. Cannon [...] expôs que na qualidade de
substrato material das emoções não intervém nenhum
mecanismo extracerebral [...] mas sim que é a emoção o
que constitui um mecanismo cerebral. Ligou o
mecanismo das emoções com o cérebro, e esse
deslocamento do centro da vida emocional dos órgãos da
periferia para o cérebro incorpora as reações emocionais
ao contexto anátomo-fisiológico geral de todos os
conceitos anátomo-fisiológicos, que os relacionam
estreitamente com o restante da psique do homem [...].
(VIGOTSKY, 1933/2004, p. 413).

Isso corrobora as descobertas de outros experimentadores do


aspecto fisiológico: a estreitíssima relação e dependência entre o
desenvolvimento das emoções e o de outros aspectos da vida psíquica do
homem. Também nas investigação no campo da psicologia, os
investigadores perceberam uma série de reações comparativas e de
dependências na vida emocional que tornam impossível duas classes de
emoções – superiores e inferiores, independentes uma da outra.
O primeiro dos investigadores a negar as duas clases de
emoções foi Freud, que se aproximou, não experimental, mas clinicamente,
de forma teórica, do que constituiria a principal linha das investigações
ulteriores neste campo. Ao analisar a psicopatologia da vida emocional,
negou que o mais importante no estudo da emoção são os componentes
orgânicos que a acompanham e expôs a extraordinária dinâmica da vida
emocional ao demonstrar como é ambivalente a emoção nas primeiras
etapas do desenvolvimento.
E apesar do equívoco da explicação que dá à emoção
ambivalente, permaneceu incorporado às teorias o fato das emoções não
existirem como as mesmas desde o começo, que primeiro tem lugar uma
certa diferenciação do núcleo, que contém sentimentos contraditórios.
Mostrou que as emoções não têm sido sempre o que agora são, que nas
etapas iniciais do desenvolvimento infantil foram diferentes das do homem
adulto. Sendo que algunas serão reprimidas e integrarão o inconsciente, de
onde participam da dinámica psíquica.
Esta tese apresentou, também, novas possibilidades para a
interpretação do movimento da vida emocional ao demonstrar que as
emoções só podem ser entendidas no contexto de toda a dinâmica da vida
humana, que só aí os processos emocionais alcançam seu sentido e seu
significado. Porém, como James, Freud continuava a ser um naturalista, que
interpretava a psique do homem como um processo puramente natural, e um
investigador, que enfocava as mudanças dinâmicas das emoções somente
nos limites naturalistas.
Considerou os resultados alcançados por Adler e sua escola em
seus trabalhos dedicados às emoções como análogos aos anteriores. Porém,
a partir de suas observações, percebeu
[...] que no que diz respeito à sua importância funcional,
a emoção guarda relações não só com a situação
instintiva em que se manifesta, como sucede
concretamente com os animais, mas que é um dos
momentos que formam o caráter, porque, por um lado, os
conceitos gerais do homem sobre a vida, a estrutura de
seu caráter, se vêm refletidos em um determinado círculo
da vida emocional, e por outro, estas sensações
emocionais o determinam. (VIGOTSKY, 1933/2004, p.
415)
Estas ideias levaram as teorias das emoções a se converterem
em uma parte da teoria do Caráter humano; e a emoção passou a ser
relacionada com os processos de organização e formação da estrutura
psicológica fundamental da personalidade.
Também na teoria de Bühler, Vigotsky (1933/2004) encontrou
avanços quanto ao lugar que as emoções ocupam com relação a diferentes
processos psíquicos. Pois, partindo da crítica das idéias freudianas sobre a
vida emocional, Bühler verifica que na fase inicial do desenvolvimento a
vida psíquica e a atividade da criança não estão determinadas
exclusivamente pelo princípio do prazer, mas que também na idade infantil
o próprio prazer, que a induz a realizar tal ou qual ato, vaga, muda de lugar
dentro do sistema de outras funções psíquicas. Relaciona isto com a sua
teoria, que divide esquematicamente o desenvolvimento do comportamento
em três fases: o instinto, o ensino e o intelecto. Baseado nessa teoria,
mostra, em jogos infantis organizados experimentalmente, que o momento
do prazer se desloca à medida que a criança se desenvolve, modificando a
sua atitude para com os processos com os quais está relacionado.
Segundo Bühler, (apud VIGOTSKY, 1933/2004, p. 415) o
primeiro estádio do prazer é o prazer final, quando à emoção de prazer
pertence o papel final, de resolução. O segundo é o prazer funcional, no
qual, psicologicamente, o nascimento do prazer imediato está localizado não
no afeto final, mas no próprio processo da atividade. E, finalmente,
distingue do segundo, um terceiro estádio, relacionado com a antecipação do
prazer, quando este ponto central se desloca para o começo.
Vigotsky (1933/2004, p. 415-6) conclui que
[…] se enfocamos estes avanços na atividade da criança
do ponto de vista de sua importância, veremos que
coincidem com as três fases do desenvolvimento do
comportamento, a que se refere Bühler. No plano da
atividade instintiva predomina uma organização da vida
emocional, relacionada com o momento final. O prazer
que se experimenta durante o processo de atividade
constitui o momento biológico necessário para formar
qualquer hábito, o qual exige que a própria atividade e
não seus resultados encontre em si mesma, todo o
tempo, um estímulo de apoio. Finalmente, a atividade,
transformada em intelectual, cuja essência consiste no
que Bühler chama de reação de adivinhação (ou reação
de confirmação) se caracteriza por uma organização da
vida emocional, em que a criança manifesta uma
sensação emocional ao começo dessa atividade; neste
caso o próprio prazer põe em movimento a atividade da
criança de modo diferente de quando se desenvolve
segundo os dois planos que falamos antes.

Outra conclusão geral consiste em que os processos emocionais,


como mostra a investigação de Bühler, não são sedentários em nossa vida,
mas sim nômades; não dispõem de um lugar determinado, fixo para sempre.
Seus dados o convenceram que os avanços encontrados do prazer final até o
prazer antecipado são um pálido reflexo da expressão de toda a diversidade
possível na vida emocional, diversidade que constitui o conteúdo real do
desenvolvimento da vida emocional da criança.
Considerou ainda os trabalhos de Claparède. Este juntou a
investigação de crianças normais e deficientes, para demonstrar
experimentalmente a diferença dos conceitos de emoção e sentimento e sua
expressão externa. Revelou, assim, que junto com as emoções biológicas
úteis existem processos que denominou sentimentos. São desfechos
dramáticos no comportamento e surgem quando é impossível ocorrer a
reação biológica adequada à situação. Segundo Claparède (apud Vigotsky,
1933/2004), se a percepção de um fenômeno desencadeia um
comportamento que resolve a situação tem-se uma emoção, porém quando o
comportamento, por si só, não resolve a situação, acontece um processo de
outro gênero, que desencadeia estratégias de solução e se tem um
sentimento. Neste caso nos encontramos ante processos que desempenham
papéis totalmente diferentes se os consideramos em seus aspectos internos,
ainda que pareçam semelhantes se o fazemos em seus aspectos externos.
Asim, Vigotski destaca que esses estudos mostram a estreitíssima relação
existente entre as emoções e os demais processos da vida psicológica e a
diversidade psíquica das próprias emoções são mostradas.
Vigotsky (1933/2004), também volta-se para os estudos de Kurt
Lewin, psicólogo alemão, pertencente à escola da psicologia estrutural, a da
Gestalt. Este realizou uma série de estudos experimentais no campo da
psicologia afetiva e da vida volitiva de pessoas adultas, que mostraram
experimentalmente esta complicada dinâmica das relações emocionais
dentro do sistema de outros processos psíquicos. Demonstrou como um
estado emocional se transforma em outro, como surge a situação das
sensações emocionais, como uma emoção não resolvida continua existindo,
com frequência ocultamente, e como o afeto forma parte de qualquer
estrutura com a qual tenha relação. Ou seja, este também afirma que afeto é
o que quebra a nossa homeostase e provoca os sentimentos e emoções.
Segundo Vigotsky (1933/2004), a ideia principal de Lewin
consiste em que as reações afetivo-emocionais são o resultado singular de
uma estrutura concreta do processo psíquico e podem apresentar-se isoladas,
como elementos especiais da vida psíquica e que só depois se combinam
com outros elementos. Tanto que as reações emocionais iniciais podem
surgir na atividade desportiva, desenvolvida em movimentos externos, como
na atividade que transcorre na mente, como, por exemplo no xadrez. E em
cada caso surgem diferentes conteúdos que correspondem a diferentes
reações, mas o lugar estrutural dos processos emocionais continua sendo o
mesmo.
Para concluir suas idéias Vigotski acrescentou que as duas
linhas que examinou anteriormente - as investigações anatômicas e
fisiológicas que mudaram o centro da vida emocional do mecanismo
extracerebral para o cerebral, e as investigações psicológicas que
deslocaram as emoções para o primeiro plano da psique humana e as
retiraram do isolamento, incorporando-as às estruturas dos demais processos
- também se encontram na psicopatologia, como acontece sempre no estudo
da vida psíquica. Explicou que
[...] as investigações procedentes, fundamentalmente, de
clinicas neurológicas, têm proporcionado, por um lado,
material psicológico, que mostra os acertos do ponto de
vista de Cannon; por outro, esclarecem que o substrato
anatômico das reações emocionais parece ser constituído
por determinados mecanismos do subcórtex cerebral,
mais exatamente, da zona do tálamo ótico, relacionado
através de numerosos caminhos com os lóbulos frontais
do córtex. Daí que a localização cortical-subcortical das
emoções é para a neurologia atual tão determinada como
a localização dos centros motores da linguagem na zona
de Broca e os centros sensoriais da linguagem na zona de
Wernike. (VIGOTSKY, 1933/2004, p. 420).
Estas investigações se referiam concretamente à patologia da
esquizofrenia. Sobre a qual, os trabalhos de Bleuler tinham revelado que as
emoções principais se conservam, porém se deslocam:
O indivíduo é capaz de reagir emocionalmente mas,
mostra em seu conjunto um quadro de transtornos da
consciência, devido às emoções terem perdido o lugar
estrutural que lhes pertencia anteriormente. Em
conseqüência disso, surge no paciente um sistema
completamente singular de relações entre as emoções e o
pensamento. Em particular, o exemplo mais claro de
semelhante sistema psicológico novo, que tem sua
analogia na consciência normal, é o estado de
pensamento autista, bem estudado por Bleuler e
demonstrado experimentalmente por Scheneider”
(VIGOTSKY, 1933/2004, p. 419).

No Brasil, os estudos de Vigotski e os de Leontiev, foram


analisados por Lane em conjunto com varios de seus colaboradores. Em
1995, Lane e Camargo apresentam no livro Novas Veredas da Psicologia
Social um texto analítico de vários trabalhos de Vigotski, denominado de
Contribuição de Vigotsky para o estudo das emoções, com considerações
que demonstram que é lógica a dedução de que a emoção é um dos
mediadores constituintes da unicidade do fisiológico e do psicológico no ser
humano e explicam os fatos acima reafirmando que
[…] apesar de Vigotsky não ter desenvolvido estudos
sistemáticos sobre as emoções, elas estão presente em
toda a sua obra, desde “A Psicologia da Arte”, onde
analisa a emoção estética como um processo catártico
inconsciente, até nos processos motivacionais e no
próprio pensamento. (1995, p. 117. Destaques no
original.)

As deduções acima apresentadas, resultaram da análise da


afirmação de Vigotski, na obra Psicologia da Arte, que as leis que regem o
pensamento emocional diferem-se totalmente daquelas a que está
subordinado o pensamento lógico discursivo, uma vez que no pensamento
emocional o processo cognitivo perde a prevalência, mantendo-se em
intensidade menor e dificultando o seu reconhecimento.
Por isso propõem que são as emoções não verbalizadas que
constituem o inconsciente; uma vez que no processo de constituição do
pensamento pela interiorização da linguagem, esta se transforma mas
estabelece as mediações necessárias para a realização dos demais processos
psicológicos. Tanto que Vigotski concordava com Freud sobre a dinâmica
da vida emotiva, mas discordava da prioridade do inconsciente sobre a
consciência, considerando que a própria dinâmica das relações leva a que
processos que começam no inconsciente podem se tornar conscientes ou
inversamente dar-se o deslocamento para o inconsciente de fenômenos
conscientes.
Destacam ainda que neste mesmo livro Vigotski acrescenta que
A imaginação e a fantasia estão a serviço da esfera
emocional, mesmo que sua expressão apareça muitas
vezes como pensamento lógico, a finalidade e a direção
são dadas pela emoção. A principal finalidade do
processo é completamente distinta, mesmo que as formas
exteriores coincidam minuciosamente. A atividade da
imaginação representa uma descarga de afetos, do mesmo
modo que os sentimentos se resolvem em movimentos
expressivos. (LANE & CAMARGO, 1995, p.118).
Portanto as representações carregadas de afeto supõem um ato
emotivo e tanto no pensamento lógico como no emocional estabelece-se um
fenômeno que tem na base uma emoção. Ainda que ela fique inconsciente e
de difícil reconhecimento.
Além destes aspectos as autoras esclarecem que Vigotski
demonstrou tais proposições em relação à emoção através da análise
funcional, ou interfuncional do princípio organizativo dos sistemas
psicológicos que promove o aparecimento de novas relações devido à
reorganização das funções. Explicou que durante o desenvolvimento os
sistemas psicológicos se formam, principalmente, através da interiorização
dos signos, que são símbolos convencionais que têm significado
sociocultural, e passam a mediar as funções psíquicas, porém
[...] a motricidade adquire um caráter relativamente
independente com respeito aos processos sensoriais e
estes últimos isolam-se dos impulsos diretos, surgindo
entre eles relações mais complexas. O mais interessante é
que, quando o processo retorna de novo a uma situação
na qual o sujeito está em tensão emocional, restabelece-se
a conexão direta entre os impulsos motores e sensoriais.
Quando o homem não se dá conta do que está fazendo e
atua sob a influência de uma reação afetiva, pode-se
comprovar seu estado interno e suas características
perceptivas através de sua motricidade, observando-se
novamente o retorno à estrutura característica de estágios
prematuros de desenvolvimento. (LANE, CAMARGO,
1995, p. 124)

Isto se dá porque os signos4 garantem a formação das complexas


conexões psicológicas que se estabelecem entre as funções por serem
originalmente meios de comunicação e de relacionamento entre os homens
e, através dos seus conteúdos, transmitirem e determinarem como são
distribuídas estas funções no sistema psicológico. Entretanto, só as suas
conexões não podem converter-se nas complexas relações em que se tornam
graças à linguagem. São os conteúdos dos significados, extraídos do meio
social onde desenvolve suas atividades que estabelecem o aparecimento de
novos sistemas e de novas formas de comportamento das pessoas.
O pensamento assim estabelecido, pela interiorização de uma
atividade vinculada à solução de problemas concretos, acarreta emoções
específicas, cujas características principais são a maior autenticidade e a
significação daquelas vinculadas à lógica emotiva da imaginação fantasiosa.
A solução de tarefas concretas estabelece conexões diferenciadas entre o
pensamento e a emotividade.
Van der Veer (1987), em uma análise do estudo de Vigotski
intitulado A Teoria da Emoções: Uma Investigação Histórico-Psicológica,
publicado em Moscou, no sexto volume das Obras Completas, no ano de
1984, enfatiza que a busca de Vigotski por elementos que demonstrassem a
unicidade das várias instâncias formadoras do ser humano e as suas
interações na consciência basearam-se, também, na critica à influência da
filosofia de Descartes. Em outros trabalhos (1999) já comentamos algumas
implicações da sua posição de filósofo natural que, em As Paixões da Alma,
busca explicar a natureza das emoções descrevendo seu processo corporal e
afirmando que todas as sensações dependem dos nervos serem excitados
pelos espiritus animalis; o que estabeleceu a divisão entre mente e corpo.
Analisando as explicações de Descartes, Vigotski apreendeu
nelas uma teoria aferente (periférica) e outra eferente (central) da emoção,
tal como nas explicações de James e Lange. Expôs, então, que estas
proposições eram insatisfatórias, também, pelo fato de que tanto na
abordagem de James-Lange, como nos pressupostos filosóficos de Descartes
as emoções serem entendidas como imutáveis e em última análise como
inatas. Atribuiu ambas as conclusões às suas vinculações diretas ao

4
Signos entendidos como entidade semiológica que substitui o objeto a conhecer,
representando-o aos indivíduos e apresentando-lhes em lugar do objeto.
pressuposto da divisão natural entre mente e corpo e, à proposição das
emoções como processos corporais que não podem dar origem às emoções
„superiores‟ e nem permitir a conexão entre as emoções e os demais
processos psicológicos e com a consciência em geral. Consequentemente,
não se poderia abordar a diferença de qualidade das emoções infantis em
relação à dos adultos; ainda mais quando se atribui estas diferenças à sua
vinculação ao desenvolvimento dos processos cognitivos.
Na crítica à chamada dimensão centrífuga da teoria de James-
Lange e seu suporte nas propostas de Descartes, Vigotski salientou que, ele
aceitava, condicionalmente, e na mesma perspectiva anunciada por
Descartes (de emoções produzidas na alma), a possibilidade de se dar
emoções intelectuais puras, sem correlações corporais, mas que manteriam
um caráter mecanicista inadequado ao entendimento das qualidades
superiores das emoções humanas. Na dimensão centrípeta das emoções
considerou o enfoque mecanicista e causal inadequado à abordagem e
explicação dos processos psicológicos superiores tais como o pensamento, a
volição etc.
Discordou, porém, das conclusões daqueles que dizem ser
impossível qualquer explicação causal e que por isso se deve voltar às
interpretações hermenêuticas.
A crítica de Vigotski é que tanto os subjetivistas
(hermenêuticos) como os objetivistas compartilham de uma mesma
interpretação equivocada da causalidade, ainda que abordem fenômenos
diferentes e os estudem desvinculadamente um dos outros. Isto impediria de
se encontrar um caminho para entender o vínculo entre os pensamentos e os
sentimentos por um lado, e destes com a atividade do corpo.
Buscou, então, a possibilidade de construir uma explicação mais
aceitável da causação em Psicologia na Ética, de Espinoza. Mas as
contribuições e modificações que a obra de Espinosa poderiam determinar
para o estudo das emoções e da psicologia, elaboradas por Vigotski, nunca
foram localizadas pois o artigo acima mencionado estava incompleto e já foi
publicado sob várias denominações como: Espinosa, As teorias de Descartes
e Espinosa sobre as paixões à luz da neuropsicologia moderna, o que
evidentemente tem dificultado o esclarecimento de suas intenções neste
estudo.
O que se pode destacar dessa vinculação de Vigotski a Espinosa
é que este contrapôs-se a seu contemporâneo Descartes. Tanto que em
vários pontos na parte três da sua Ética, negou a dicotomia entre alma e
corpo e apresentou o homem numa perspectiva monista, como duas
manifestações da mesma substância. Deduz-se que Espinosa estendia o
enfoque determinista a todas as ações humanas e à alma, negando a alma
livre e indeterminada de Descartes, bem como criticando o seu dualismo.
Calcado nestes pressupostos e esforçando-se para entender como
se dá a causalidade e o determinismo5 nos processos psicológicos superiores
e as relações entre os processos emocionais superiores e inferiores, Vigotski
parte da perspectiva genética para comprovar que é impossível dividir as
emoções em duas partes, uma que pertença à classe superior e outras à
inferior e que a única diferença ocorre em complexidade, uma vez que todas
as emoções são capazes de atingir todos os níveis da nossa evolução
sentimental.
Em sua tese de doutoramento apresentada na PUC-SP em 1996,
Bonin investiga os trabalhos de Luria que aprofundam os estudos sobre a
função genética da linguagem e sua participação nos processos de
constituição e desenvolvimento emocionais e da consciência. A partir destes
estudos afirma que Luria e Vigotski consideravam que tanto os primatas
como as crianças pré-verbais expressam emoções através de gritos e choros,
sem que a atividade intelectual esteja imbricada no planejamento dessas
ações. Somente quando a criança une sua vocalização ao pensamento, passa
a entender que os sons podem se referir a determinados objetos (referentes),
inicia a fala propriamente dita e a partir dela dá-se a modificação de
diferentes processos elementares, tal como a emoção. A emoção, através da
fala, passa de processo elementar a processo superior.
Neste novo patamar ocorrem mudanças nas vivências
emocionais devidas ao fato do mundo emocional do homem ser mais rico e
não só vinculado aos motivos biológicos. Isto promove a avaliação das
correlações das ações realmente exeqüíveis com as intenções iniciais e
possibilita a previsão dos seus acertos, levando a que as categorias afetivas
formem no homem vivências e estados emocionais que superam os limites
das reações afetivas imediatas vinculadas ao seu pensamento e processadas
com a participação imediata da linguagem - formam o caráter.
Bonin (1996) demonstra estas afirmações apresentando alguns
estudos de Luria. Este, sob a influência de Freud, estava interessado na
dinâmica da vida mental, mas procurava estudar os estados emocionais
complexos por meios experimentais, enfatizando a observação da atividade.
Dedicou-se ao estudo das condições emocionais que provocam neuroses,
centrando-se, principalmente, na questão do conflito.

5
O Determinismo é uma Teoria filosofica segundo a qual todos os fatos são considerados
como consequências necessárias de condições antecedentes.Sua expressão como
deteminismo cultural propões que a conduta individual é modelada pelo tipo de sociedade
em que vive.Já o deteminismo psíquico é uma teoria que afirma que o curso do pensamento
e da decisão voluntária é condicionado por certos princípios gerais.
Nestes estudos Luria conseguiu mostrar que o afeto alterava a
dinâmica dos processos mentais superiores, obstruindo e dificultando certas
associações. A possibilidade de associações era diminuída, as reações
motoras também tornavam-se instáveis e, em alguns casos, havia aparente
perda de uma habilidade coordenada e regular de pressionar uma bolinha de
borracha; os sujeitos chegavam a ter tremores nas mãos, antes que
demonstrassem problemas na fala. Assim, notou que os indivíduos podiam
reagir de maneira diferenciada a situações traumáticas e que isto
provavelmente estava relacionado ao tipo de personalidade dos sujeitos.
Buscou então descobrir quais os problemas que levam à desorganização das
reações emocionais relatadas acima e como na maioria dos casos, o
comportamento desses indivíduos que demonstram alterações emocionais,
se desviavam minimamente das pessoas “normais”, chegou à conclusão que
existe uma certa relação entre esses distúrbios e a neurastenia produzida por
uma vida estressante.
Luria realizou também pesquisas para estudar o efeito de
traumas e complexos emocionais no comportamento. Os resultados
revelaram que o conflito afetava a associação com determinadas palavras
relacionadas ao mesmo, distúrbios nas suas reações motoras e variação na
respiração. Porém, quando a situação afetiva aparecia na consciência, o
comportamento do sujeito mostrava uma agitação motora intensa, o que o
levou a explicação que esta renova a estrutura dinâmica porque a separação
da consciência e a simultânea separação da área motora, parece ser o
mecanismo que preserva a personalidade da super excitação e da
desorganização relacionada aos conflitos explícitos. A presença desta
barreira funcional entre a expressão motora e o conflito afetivo, na atividade
da pessoa, evita a desorganização total do seu comportamento e mantém, de
certa forma, a integridade da personalidade evitando crises intensas.
Luria (apud BONIN, 1996) procurou também estudar
experimentalmente a neurose e demonstrou a existência de mediação verbal
entre a estimulação e a reação motora, seguida de outros aspectos
fisiológicos. Entendeu que a fala pode regular o comportamento, e que a
regulação pela auto-instrução pode acontecer com outros tipos de elementos
das atividades e funções. E concluiu, assim como Bruner, que existem
signos icônicos, que como a fala, podem controlar a excitação e, ao mesmo
tempo, organizar o comportamento. Ou seja, é possível que até símbolos
visuais ao atuarem sobre as manifestações afetivas, tenham o mesmo valor
da fala nessa regulação. Pois, também as imagens que surgem na arte
plástica, no cinema, etc., em uma determinada cultura, servem para regular a
afetividade.
Portanto, corroborando os resultados acima, Leontiev
(1978/1987) confirma que os processos e estados emocionais dos homens
adquiriram seu próprio desenvolvimento em função da sua vinculação com a
atividade e a linguagem e, assim, participam da estruturação da
personalidade.
A interação intrapsicológica entre as emoções e a racionalidade
se tornou dependente do desenvolvimento do pensamento organizado com
representações simbólicas, que condicionam conforme as regras culturais do
momento histórico as manifestações emocionais. Estas mediações
simbólicas levaram a que a evolução de uma controle as manifestações da
outra, reciprocamente. Como na nossa cultura é o pensamento que tende a se
desenvolver mais intensamente e a representar-se pela linguagem verbal,
será principalmente através desta que a emoção passará a se expressar. Mas
as situações sócio-emocionais implicam, no plano do pensamento, a
necessidade de objetivar o real, de pensá-lo em potencial. Isto será
possibilitado pela apropriação das categorias enquanto noções lógicas que
refletem as propriedades e as relações mais gerais dos fenômenos reais, já
elaboradas pelo grupo social. A ausencia da efetivação desse processo ou de
parte da simbolização e construção do sentido, manterá a representação
inconsciente.

REFERÊNCIAS
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São Paulo.
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